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Uns fazem uma interpretação alegórica, outros preferem ser mais literais. Quem
estará certo? Que interpretação estaria mais próxima da verdade? Alguma seria
confiável o bastante? Algo como 100% certo?
Primeiro, temos que considerar que as Escrituras não são o único instrumento
pelo qual Deus Se revela aos homens. Antes que me tachem de herege, deixem-
me explicar:
Paulo, o maior defensor das Escrituras, afirma que “o que de Deus se pode
conhecer, neles se manifesta, porque Deus lho manifestou. Pois os seus
atributos invisíveis, o seu eterno poder e divindade, são claramente vistos desde
a criação do mundo, sendo percebidos mediante as coisas criadas, de modo que
eles são inescusáveis” (Romanos 1:19-20).
As palavras do apóstolo dos gentios fazem eco ao que fora declamado por Davi:
“Os céus proclamam a glória de Deus e o firmamento anuncia a obra das suas
mãos. Um dia faz declaração a outro dia, e uma noite revela conhecimento a
outra noite. Não há fala, nem palavras; não se lhes ouve a voz.” Salmos 19:1-3
“Pergunte, porém, aos animais, e eles o ensinarão, ou às aves do céu, e elas lhe
contarão; fale com a terra, e ela o instruirá, deixe que os peixes do mar o
informem. Quem de todos eles ignora que a mão do SENHOR fez isso?” Jó 12.7-
9
Mesmo antes que o cânon fosse fechado, a Palavra de Deus Se revelava através
do livro da natureza. De modo que, mesmo um aborígene, perdido no outback
australiano, ou um índio brasileiro no alto Xingu, não poderá alegar que jamais
tenha tido oportunidade de conhecer a Deus.
Porém, as Escrituras nos fornecem a revelação dos propósitos de Deus ao longo
da história. Por isso, não se pode prescindir delas. Se pela natureza
vislumbramos Sua majestade e atributos, pelas Escrituras conhecemos Sua
vontade e propósito.
“E temos ainda mais firme a palavra profética à qual bem fazeis em estar
atentos, como a uma candeia que alumia em lugar escuro, até que o dia
amanheça e a estrela da alva surja em vossos corações; sabendo primeiramente
isto: que nenhuma profecia da Escritura é de particular interpretação. Porque a
profecia nunca foi produzida por vontade dos homens, mas os homens da parte
de Deus falaram movidos pelo Espírito Santo.” 2 Pedro 1:19-21
Jesus garantiu que Seu Espírito nos guiaria a toda a Verdade. De nada adianta
dominarmos a arte hermenêutica, conhecermos a fundo as línguas originais, se
o Espírito Santo não for nosso guia. Ainda que contando com a direção do
Espírito, é improvável que façamos uma leitura cem por cento isenta. Nossa
subjetividade sempre interferirá na maneira como interpretamos seus textos. E
deve ser assim para que nos mantenhamos humildes, sem pretender sermos
donos da verdade. Apesar de a verdade revelada ser absoluta, nossa leitura
sempre será relativa. Sobra pouco lugar para a presunção. Mesmo os maiores
intérpretes da Bíblia, homens do quilate de Calvino, Lutero, Agostinho,
cometeram seus equívocos interpretativos, jamais reivindicando para si a
infalibilidade. Todos foram filhos de seu próprio tempo. Jesus admite tal
possibilidade em Seu diálogo com um doutor da Lei:
“E eis que se levantou certo doutor da lei e, para o experimentar, disse: Mestre,
que farei para herdar a vida eterna? Perguntou-lhe Jesus: Que está escrito na
lei? Como lês tu?” Lucas 10:25-26
Repare que são duas perguntas, uma de caráter objetivo e a outra de caráter
subjetivo. A resposta à pergunta “que está escrito na lei?” revela quem Deus é e
quais os Seus propósitos. Trata-se de uma verdade absoluta. Mas a pergunta
“Como lês tu?” revela quem somos, nossos pressupostos e preconceitos, e, por
isso mesmo, relativiza nossas leituras.
Aproximar-se das Escrituras é como olhar-se no espelho. Quão difícil é resistir à
tentação de conferir a aparência quando passamos por qualquer coisa que reflita
nossa imagem. Quando lemos a Bíblia, deparamo-nos com nossa própria
imagem que parece emergir do texto como um holograma; e, para que saibamos
se estamos bem ou não, precisamos de uma referência, de um padrão, e este é
ninguém menos que Jesus.
“Quando eu era menino, pensava como menino; mas, logo que cheguei a ser
homem, acabei com as coisas de menino. Porque agora vemos como por
espelho, em enigma, mas então veremos face a face; agora conheço em parte,
mas então conhecerei plenamente, como também sou plenamente conhecido.” 1
Coríntios 13:11-12
Precisamos ler as Escrituras tendo Jesus por referência. Tudo deve passar por
este filtro. E é aí que muitos tropeçam, pois seu conhecimento de Jesus está
condicionado pela cultura ou pelas teologias em voga em nossos dias. Em vez do
Jesus das Escrituras, seguem a um Jesus genérico, um ídolo inventado pela
imaginação humana.
Não era à toa que Paulo confessava temer que muitos fossem enganados,
seguindo a outro Jesus, abraçando a outro Evangelho, e, por conseguinte,
recebendo outro espírito (2 Co.11:4). De fato, como diria o salmista, um abismo
chama outro abismo (Sl.42:7).
Penso que há uma valiosa pista para que entendamos a razão de Deus permitir
tal coisa. Trata-se de uma palavra profética proferida por Simeão na ocasião em
que José e Maria levaram o menino para ser consagrado no Templo em
Jerusalém.
O mesmo Jesus que é pedra de esquina para alguns, serve de pedra de tropeço
para outros. Criamos um ídolo e tentamos identificá-lo com o Jesus das
Escrituras. Esse “Jesus Genérico” nada mais é do que fruto de nossas projeções.
Um ídolo feito a partir de ideias preconcebidas, alinhado a uma determinada
ideologia, justificado por dogmas forjados pela religião. Um Jesus feito à nossa
imagem, e que, acaba por revelar as reais motivações de nossos corações (Is.
44:13).
O Cristo autêntico não se dobra aos nossos caprichos, nem se presta a ser garoto
propaganda de ideologia alguma. Em vez de ser a imagem de quem o forjou, Ele
é a imagem do Deus invisível (Col.1:15). Quando fitamos os olhos n’Ele, somos
conformados à Sua própria imagem, pois para tal fomos predestinados
(Rm.8:29).
Jesus é a Palavra de Deus de uma maneira singular. O Verbo feito carne. Quer
saber como é Deus, vislumbre-O n’Ele, pois Ele e o Pai são Um. Ele não é uma
fotocópia, mas a expressão exata do Seu ser (Hb.1:3). Enquanto o livro da
natureza revela os atributos divinos (o seu poder e sabedoria), as Escrituras
revelam a Sua vontade, e Jesus revela Seu próprio Ser.
Geralmente um espelho tem sua moldura. Buscar nosso reflexo nesta moldura é
perda de tempo. Semelhantemente, temos que compreender que as Escrituras,
apesar de terem sido inspiradas pelo Espírito, foram escritas por homens dentro
de suas próprias culturas e cosmovisão.
O problema é que tem quem queira devolver a casca ao fruto, voltando aos
velhos rudimentos presentes na Antiga Aliança. Querem um Jesus guerreiro,
que destrua nossos inimigos, que mate os primogênitos do Egito, que patrocine
genocídios, que prescreva restrições dietéticas, que exija sacrifícios, etc. Se
alguém se satisfaz com a casca, nada posso fazer. Porém, eu prefiro a polpa com
toda a sua doçura.