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Gliconeogênese

Molécula da glicose

Gliconeogênese ou neoglicogénese ou
ainda neoglucogénese("formação de
novo açúcar") é a rota pela qual é
produzida glicose a partir de compostos
aglicanos (não-açúcares ou não-
carboidratos), sendo a maior parte deste
processo realizado no fígado
(principalmente sob condições de jejum)
e uma menor parte no córtex dos rins.
Em humanos, os principais precursores
são: lactato, glicerol e aminoácidos,
principalmente alanina. Exceto por três
sequências específicas(Piruvato para
PEP, Frutose1.6-bifosfato para frutose-6-
p, Glicose-6-p para glicose), as reações
da gliconeogênese são inversas às da
glicólise. [1]

Em mamíferos, a maioria dos tecidos é


capaz de suprir suas necessidades
energéticas a partir da oxidação de
vários compostos, tais como
aminoácidos, açúcares e ácidos graxos,
porém alguns tecidos dependem quase
completamente de glicose como fonte
de energia metabólica. Para o cérebro
humano e o sistema nervoso, assim
como os eritrócitos, testículos, medula
renal e tecidos embriônicos, a glicose
sanguínea é a única ou principal fonte de
energia. Apenas o cérebro requer cerca
de 120g de glicose a cada dia - mais do
que metade de toda a glicose
armazenada como glicogênio em
músculos e fígado.[2] A longo prazo,
todos os tecidos também requerem
glicose para outras funções, tais como a
síntese da ribose dos nucleotídeos ou da
porção carboidrato de glicoproteínas e
glicolipídeos. Portanto, para sobreviver,
os organismos precisam ter
mecanismos para manutenção dos
níveis sanguíneos de glicose.[1]

Quando a concentração de glicose


circulante vinda da alimentação diminui,
o glicogênio hepático e muscular é
degradado (glicogenólise) fazendo com
que a glicemia volte a valores normais.
Entretanto, o suprimento de glicose
desses reservatórios não é sempre
suficiente; entre as refeições e durante
longos jejuns, ou após exercícios
vigorosos, o glicogênio é depletado
(consumido), situação que também
ocorre quando há deficiência do
suprimento de glicose pela dieta ou por
dificuldade na absorção pelas células.
Nessas situações, os organismos
necessitam de um método para
sintetizar glicose a partir de precursores
não-carboidratos. Isso é realizado pela
via chamada gliconeogênese, a qual
converte piruvato e compostos
relacionados de três e quatro carbonos
em glicose.[2]

As modificações que ocorrem no


metabolismo da glicose durante a
mudança do estado alimentado para o
estado de jejum são reguladas pelos
hormônios insulina e glucagon. A insulina
está elevada no estado alimentado, e o
glucagon se eleva durante o jejum. A
insulina estimula o transporte de glicose
para certas células, tais como as dos
músculos e tecido adiposo, e também
altera a atividade de enzimas chave que
regulam o metabolismo, estimulando o
armazenamento de combustível. O
glucagon contrarregula os efeitos da
insulina, estimulando a liberação dos
combustíveis armazenados e a
conversão de lactato, aminoácidos e
glicerol em glicose.[1]

A gliconeogênese é um processo ubíquo,


presente em plantas, animais, fungos e
outros microrganismos, sendo que as
reações são praticamente as mesmas
em todos os tecidos e todas as
espécies.[2]

Nas mudas de plantas, gorduras e


proteínas armazenadas são convertidas,
através de rotas que incluem a
gliconeogênese, no dissacarídeo
sacarose para transporte através da
planta em desenvolvimento. A glicose e
seus derivados são precursores da
síntese das paredes celulares das
plantas, nucleotídeos e coenzimas, e
uma variedade de outros metabólitos
essenciais. Em muitos microorganismos,
a gliconeogênese inicia a partir de
compostos orgânicos simples de dois ou
três carbonoso, tais como acetato,
lactato e propionato no seu meio de
crescimento. Embora as reações da
gliconeogênese sejam as mesmas em
todos os organismos, o contexto
metabólico e a regulação da rota diferem
de uma espécie para outra e de tecido
para tecido.[2]

Precursores
As três maiores fontes de carbono para
a gliconeogênese em humanos são
lactato, glicerol e aminoácidos,
particularmente alanina. O lactato é
produzido pela glicólise anaeróbica em
tecidos como músculo em exercício ou
hemácias, assim como por adipócitos
durante o estado alimentado, sendo
convertido em piruvato pela enzima
lactato desidrogenase. Glicerol é
liberado das reservas adiposas de
triacilglicerol e entra na rota
gliconeogênica como diidroxiacetona
fosfato (DHAP). Aminoácidos provém
principalmente do tecido muscular, onde
podem ser obtidos pela degradação de
proteína muscular. Todos os
aminoácidos, exceto a leucina e a lisina,
podem originar glicose ao serem
metabolizados em piruvato ou
oxaloacetato, participantes do ciclo de
Krebs. A alanina, o principal aminoácido
gliconeogênico, é produzida no músculo
a partir de outros aminoácidos e de
glicose.[1]

Ácidos graxos não podem ser


convertidos em glicose em animais, com
exceção de ácidos graxos de cadeia
ímpar ou ramificada, os quais liberam
propionato, um precursor do succinil
CoA, sendo fonte mais importante de
glicose em ruminantes. Em plantas,
especificamente nas mudas, o ciclo do
glioxilato pode ser usado para converter
ácidos graxos (acetato) como fonte
primária de carbono do organismo. O
ciclo do glioxilato produz ácidos
dicarboxílicos de quatro carbonos que
podem entrar na gliconeogênese.[3]

Rotas da glicólise e gliconeogênese no fígado.

Ciclo de Cori e ciclo da alanina …

Dois ciclos importantes dependem do


processo de gliconeogênese: o ciclo de
Cori e o ciclo da alanina. O ciclo de Cori
ocorre no músculo esquelético e nas
hemácias e consiste na oxidação de
glicose em lactato, com posterior
transporte desse produto para o fígado.
Já o ciclo da alanina, que ocorre
somente no músculo esquelético,
consiste na oxidação da glicose em
piruvato, metabolização do piruvato em
alanina,(com intuito de retirar NH3 tóxico
ao músculo), transporte para o fígado,
onde será reconvertida em piruvato e o
NH3 excretado como ureia. O lactato e o
piruvato oriundos de tais processos são,
então, utilizados na gliconeogênese.[1]

Reações da gliconeogênese
O processo de gliconeogênese superpõe-
se ao da glicólise, sendo que, iniciando
pelo piruvato, a maioria das reações de
síntese de glicose são no sentido inverso
aos da glicólise. As enzimas envolvidas
na catalização desses passos são
reguladas para que, ou glicólise, ou
gliconeogênese predomine, dependendo
das condições fisiológicas. A maioria
das etapas da gliconeogênese usa as
mesmas enzimas que catalizam o
processo da glicólise, porém, o fluxo de
carbonos, é claro, é na direção reversa.[1]
Entretanto, em três pontos as reações da
glicólise são irreversíveis in vivo (por
liberarem energia livre em forma de
calor): conversão de glicose em glicose
6-fosfato pela hexoquinase, a
fosforilação da frutose 6-fosfato em
frutose 1,6-bisfosfato pela
fosfofrutoquinase-1 e a conversão de
fosfoenolpiruvato em piruvato pela
piruvato quinase.[2] Para contornar essas
barreiras energéticas, reações e enzimas
especiais são necessárias.[1]

1° desvio: Dentro da mitocôndria, a


piruvato-carboxilase catalisa a
formação de oxalacetato a partir de
ATP e CO2, liberando ADP + Pi. A partir
daí, pode-se tomar 2 caminhos:
a) Ação da PEP-carboxilase (PEPCK)
mitocondrial, formando
fosfoenolpiruvato a partir de GTP, e
liberando GDP + CO2.

b) Redução do oxalacetato para


produção de malato, ganhando dois H. O
malato, por sua vez, irá sair da
mitocôndria e será oxidado, perdendo 2
H e voltando a ser oxalacetato. Este
oxalacetato sofrerá ação da PEP-
carboxilase citosólica, que o
transformará em fosfoenolpiruvato.

O caminho a ser tomado depende da


concentração de NADH citosólico. Se for
alta, a via b é inibida, pois causa acúmulo
de produtos (malato e oxalacetato). O
piruvato então toma a via a,
transformando-se em fosfoenolpiruvato
ainda dentro da mitocôndria. Caso a
concentração de NADH no citosol seja
baixa, acontece o contrário, e a via b é
estimulada por falta de produtos.

2º desvio: No citosol, a frutose-1,6-


bifosfato é hidrolisada pela  frutose-
1,6-bifosfatase, liberando um Pi e
formando  frutose-6-fosfato, que logo
em seguida será isomerizada a
glicose-6-fosfato pela fosfoglicose-
isomerase.
3º desvio: Nesta etapa faz-se a
conversão de glicose-6-fosfato em
glicose. O grupo fosfato ligado ao
carbono 6 da glicose-6-fosfato sofre
hidrólise catalisada pela glicose-6-
fosfatase. O produto dessa reação é a
glicose não fosforilada que, assim,
pode atravessar a membrana
plasmática. A enzima glicose-6-
fosfatase só ocorre no fígado e rins.

Reações da gliconeogênese a
partir de lactato mostradas
por projeções de Fischer e
por modelo poligonal
As reações mostradas por projeções de
Fischer podem ser comparadas à
representação utilizando o modelo
poligonal. [4]
Reações da gliconeogênese a partir do lactato
mostradas por projeção de Fischer, à esquerda, e
pelo modelo poligonal, à direita. Exceto para a
desidrogenação do lactate a piruvato, as reações
aqui mostradas são aquelas não comum às reações
da via glicolítica, pois algumas das mesmas são
irreversíveis in vivo. Os compostos correspondem
ao lactato (LAC), piruvato (PIR), oxaloacetato (OxA),
fosfoenolpiruvato (PEP), frutose 1,6-bifosfato (
F16BP), frutose 6-fosfato (F6P), glicose 6-fosfato
(G6P) e glicose (Glu). As enzimas que participam
dessas reações são indicadas pelos números
sublinhados, e correspondem à lactato
desidrogenase (1), piruvato carboxilase (2),
fosfoenolpiruvato carboxiquinase (3), frutose 1,6-
bifosfatase (4) e glicose-6-fosfatase (5). A única
reação que ocorre na mitocôndria é a carboxilação
do piruvato a oxaloacetato, que é dependente de
biotina como grupo prostético da enzima 4. As
outras reações ocorrem no citoplasma. As
coenzimas participantes (NAD+, NADH + H+, ATP,
GTP, ADP e GDP) foram omitidas nessas
representações. As reações de fosforilação
utilizando ATP ou GTP são representadas como ~P
entrando nas reações. A reação de oxirredução
utilizando NAD+ pode ser observada como
hidrogênios “2H” entrando na reação. Os fosfatos
inorgânicos liberados são representados como Pi
saindo das respectivas reações.

Balanço energético da
gliconeogênese
A neoglicogênese é uma reação de
síntese porque utiliza um precursor de 3
carbonos e tem como produto final a
glicose, com seis carbonos. Assim como
as demais reações de síntese, a
neoglicogênese consome energia na
forma de ATP. Para cada molécula de
glicose formada a partir de piruvato, seis
moles de pontes de fosfato de alta
energia são clivadas[1]: quatro ATP, dois
GTP, e dois NADH,[2] que são utilizados
nas reações catalisadas por piruvato
carboxilase, fosfoenolpiruvato
carboxiquinase e fosfoglicerato quinase.
Dois moles de ácido pirúvico são
requeridos para a síntese de um mol de
glicose.[1]

  Reação Global

2 Ácido pirúvico + 4 ATP + 2 GTP + 2 NADH +


6 H2O -----------> Glicose + 4 ADP + 2 GDP + 6
Pi + 2 NAD + 2 H+

Regulação
O controle da gliconeogênese é realizado
pelo glucagon, que estimula esse
processo, e pela insulina, que atua de
maneira oposta.[1] Glicólise e
gliconeogênese são reguladas
reciprocamente. Se glicólise (a
conversão de glicose em piruvato) e
gliconeogênese (a conversão de piruvato
em glicose) fossem permitidas ocorrer
simultaneamente em altas taxas, o
resultado seria o consumo de ATP e a
produção de calor.[2] Embora a
gliconeogênese ocorra durante o jejum, é
também estimulada durante exercício
prolongado, por uma dieta altamente
protéica, e sob condições de estresse.
Os fatores que promovem o fluxo geral
de carbono do piruvato até glicose
incluem a disponibilidade de substrato e
mudanças da atividade ou quantidade de
certas enzimas chave da glicólise e
gliconeogênese.[1]

Referências
1. Michael Lieberman e Allan D Marks
(2009). Mark's Basic Medical
Biochemistry: a clinical approach 3rd
edition ed. USA: Lippincott Williams
& Wilkins. 1011 páginas.
ISBN 078177022x Verifique |isbn=
(ajuda)
2. David L Nelson e Michael M Cox
(2000). Lehninger Principles of
Biochemistry. USA: Worth
Publishers. 724 páginas. ISBN 1-
57259-153-6
3. Reginald H Garrett e Charles M.
Grisham (2002). Principles of
Biochemistry with a Human Focus.
USA: Brooks/Cole, Thomson
Learning. pp. 578,585. ISBN 0-03-
097369-4
4. Bonafe, C. F. S.; Bispo, J. A. C.; de
Jesus, M. B. (2018). The Polygonal
Model: A Simple Representation of
Biomolecules as a Tool for Teaching
Metabolism. Biochemistry and
Molecular Biology Education. 46: 66-
75. DOI - 10.1002/bmb.21093.

Ver também
Ciclo de Cori
Ciclo de Calvin
Glicogenólise
Glicólise
Glicogênese

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