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Resumo Os princípios da estratigrafia de seqüência foram utilizados para realizar uma análise estratigráfica
nas seqüências sedimentares neoproterózoicas da Bacia do São Francisco (Brasil Central). Foram reconhecidos
três períodos de deposição separados por discordâncias na Megasseqüência São Francisco: (1) Seqüências 1
e 2, seqüência glaciogênica de Idade Criogeniana seguida de uma rampa carbonática distalmente escarpada
desenvolvida sobre condições tectônicas estáveis, (2) Seqüência 3, rampas homoclinais estaqueadas com se-
dimentação mista carbonática-siliciclástica de idade Criogeniana Superior, depositada sobre uma progressiva
influência dos esforços compressivos do Ciclo Brasiliano, (3) Seqüência 4, plataforma rasa de idade Ediacara-
na Inferior dominada por sedimentação siliciclástica de natureza molássica, produto da erosão dos cinturões de
empurrão em elevação nas áreas adjacentes. Cada uma das seqüências carbonáticas apresenta uma assinatura
isotópica δ13C distinta. A superposição com a curva de variação isotópica global do carbono permite o reconhe-
cimento de um hiato deposicional entre as megasseqüências Paranoá e São Francisco, e sugere que a deposição
dos diamictitos (Formação Jequitaí) teve lugar mais provavelmente ao redor de 800 Ma. Isto limita a deposição
da Megasseqüência São Francisco ao intervalo entre 800 e 600 Ma (idade reconhecida do limite superior da
Orogenia Brasiliana). Um hiato deposicional de expressão menor (700-680 Ma) foi também identificado sepa-
rando as seqüências 2 e 3. As análises isotópicas sugerem que a partir desse momento, condições ambientais
mais restritas estabeleceram-se na bacia, provavelmente associadas com um evento global de primeira ordem,
que prevaleceu durante toda a deposição da Seqüência 3.
Abstract Stratigraphical Analysis of the Neoproterozoic Sedimentary Sequences of the São Fran-
cisco Basin. A stratigraphical analysis was performed under the principles of Sequence Stratigraphy on the
neoproterozoic sedimentary sequences of the São Francisco Basin (Central Brazil). Three periods of deposition
separated by unconformities were recognized in the São Francisco Megasequence: (1) Sequences 1 and 2, a
cryogenian glaciogenic sequence, followed by a distal scarp carbonate ramp, developed during stable condi-
tions, (2) Sequence 3, a Upper Cryogenian stack homoclinal ramps with mixed carbonate-siliciclastic sedimen-
tation, deposited under a progressive influence of compressional stresses of the Brasiliano Cycle, (3) Sequence
4, a Lower Ediacaran shallow platform dominated by siliciclastic sedimentation of molassic nature, the erosion
product of the nearby uplifted thrust sheets. Each of the carbonate-bearing sequences presents a distinct δ13C
isotopic signature. The superposition to the global curve for carbon isotopic variation allowed the recognition
of a major depositional hiatus between the Paranoá and São Francisco Megasequences, and suggested that the
glacial diamictite deposition (Jequitaí Formation) took place most probably around 800 Ma. This constrains
the São Francisco Megasequence deposition to the interval between 800 and 600 Ma (the known ages of the
Brasiliano Orogeny defines the upper limit). A minor depositional hiatus (700−680 Ma) was also identified
separating sequences 2 and 3. Isotopic analyses suggest that from then on, more restricted environmental
conditions were established in the basin, probably associated with a first order global event, which prevailed
throughout deposition of the Sequence 3.
Figura 1 - Desenho esquemático sobre linha sísmica da Bacia do São Francisco, mostrando duas sismofácies
distintas: (A) Megasseqüência Paranoá com raras reflexões internas, e que em direção a borda oeste apresenta
um conjunto de reflexões paralelas no topo e (B) Megasseqüência São Francisco com três conjuntos de reflexões
internas de alta freqüência, intercalados às áreas de caráter caótico, correspondentes aos ciclos deposicionais
carbonáticos separadas por (C) uma superfície de forte amplitude (discordância).
superfície com seu correspondente sísmico. ralógico, localização e preservação da fábrica original
Por outro lado, a Megasseqüência São Francisco da amostra. Isto sugere que esses registros representam
exibe três conjuntos de reflexões internas, de alta freqü- um sinal isotópico primário, com condições de correla-
ência, intercalados às áreas de caráter caótico ou com ção em escala regional.
variações laterais de amplitude, que correspondem aos A figura 2 exibe a comparação dos perfis de δ13C
ciclos deposicionais carbonáticos desse intervalo (Fig. obtidos por vários autores, em diferentes localizações
1) e que foram amplamente amostrados pelos poços. no cráton, correlacionando anomalias similares. Da base
A discordância, que separa essas seqüências, para o topo, os valores δ13C foram assim agrupados: (a)
aparece sismicamente como uma superfície de forte carbonatos da Megasseqüência Paranoá com valores em
amplitude, contra a qual são observados recobrimen- torno de 0‰, (b) carbonatos menos enriquecidos em
tos em onlap dos carbonatos basais da Megasseqüência δ13C (valores inferiores a 5‰, área cinza hachurada) da
São Francisco (Fig. 1). Megasseqüência São Francisco (Fm. Sete Lagoas) e (c)
carbonatos mais enriquecidos em δ13C (valores superio-
ANÁLISE ISOTÓPICA DO δ13C Os trabalhos mais res a 5‰) do topo da Megasseqüência São Francisco.
sistemáticos envolvendo a estratigrafia isotópica, ao Observa-se que, valores acentuadamente mais
longo de seções completas no Cráton do São Francis- negativos (em torno de -5,0‰) ocorrem na base dos
co, concentram-se principalmente nos carbonatos dos grupos Bambuí/Una ou Megasseqüência São Francis-
grupos Bambuí e Una (Martins 1999). A maior parte co (base da área hachurada da Fig. 2), associados às
dos valores de δ13C obtidos nos perfis isotópicos segue fácies dolomíticas avermelhadas e imediatamente após
uma tendência geral, independente do conteúdo mine- sedimentos glaciogênicos. Essas correlações permitem
Figura 2 - Seção comparativa dos perfis δ13C modificado de Martins (1999) com datum posicionado na quebra
isotópica que marca a passagem dos carbonatos menos enriquecidos em δ13C (valores inferiores a 5‰, área
hachurada) para os mais enriquecidos (valores superiores a 5‰) no Grupo Bambuí. Os carbonatos do Grupo
Paranoá amostrados apenas na Serra de São Domingos (em cinza claro). Para a bacia de Irecê foram plotados
os valores médios (número de amostras indicados no perfil). Escala vertical em metros.
caracterizar essa anomalia negativa como um evento picos de carbono, os resultados de δ18O apresentam um
isotópico negativo de δ13C de expressão regional. Ano- enriquecimento progressivo em 18O em direção ao topo
malias negativas de δ13C são características de carbona- da seqüência. Esse enriquecimento pode ser interpre-
tos depositados logo após períodos glaciais, refletindo tado como resultado de uma taxa de evaporação mais
mudanças na composição da água do mar decorrentes alta que a precipitação, provavelmente em condições
da deglaciação no Proterozóico Superior (Kaufman et ambientais de águas mais rasas e restritas. Essas condi-
al. 1998, entre outros). ções concordam com o quadro paleogeográfico propos-
A partir dessa anomalia, os carbonatos da área to para a seqüência carbonática inferior da Megasseqü-
hachurada apresentam uma assinatura de δ13C normal- ência São Francisco (Formação Sete Lagoas), de rampa
mente positiva (entre 0,0 e 5,0‰), sucedida por um distalmente escarpada e estaqueada, com as áreas rasas
salto isotópico para valores em torno de 10‰. Nota-se prolíferas em microbialitos.
ainda, que o comportamento isotópico do intervalo com Outro mecanismo possível para explicar o en-
valores de δ13C entre 0,0 e 5,0‰ varia na direção nor- riquecimento em δ13C nos carbonatos do topo da Me-
deste, isto é, nessa direção o enriquecimento em δ13C é gasseqüência São Francisco seria pelo processo de me-
gradual até atingir valores máximos próximos de 5,0‰ tanogênese (matéria orgânica® 12CH4 + 13CO2). Se na
(vide perfis 1-RF-1-MG, 9-PSB-13-MG e 1-MA-1-MG diagênese esse 13CO2 for incorporado aos carbonatos,
na Fig. 2). Para oeste existe uma constância de razões esses serão enriquecidos em δ13C, com valores superio-
isotópicas em torno de 0,0‰ (perfis 1-RC-1-GO, Serra res a 5‰. Esse mecanismo é controlado pela atividade
de São Domingos e região de Sete Lagoas na Fig. 2). microbial, sendo mais efetivo nos processos de fermen-
Qual o significado desse salto isotópico durante tação (Irwin 1980).
a sedimentação dos carbonatos da Megasseqüência São O efeito conjunto desses dois mecanismos (au-
Francisco? Levando em conta que não existe nenhuma mento da evaporação e produtividade orgânica) resulta
grande lacuna no registro sedimentar desses perfis, o numa elevação tanto das razões isotópicas δ13C, quanto
salto positivo de 5,0‰ em δ13C representaria um even- das razões δ18O (Li & Ku 1997).
to isotópico de escala regional, característico da por- O registro de δ13C mais completo na bacia é o
ção superior dos carbonatos da seqüência inferior da da Serra de São Domingos, por incluir também os car-
Megasseqüência São Francisco (leia-se Formação Sete bonatos mais antigos pertencentes à Megasseqüência
Lagoas). A sua ocorrência de forma abrupta em todos ou Grupo Paranoá (Fig. 2). Os valores de δ13C desses
os perfis, após um conjunto de valores entre 0,0 e 5,0‰, carbonatos aparecem depletados em torno de 1,5‰
é mais um indicativo de tratar-se de um marco cronoes- com relação aos carbonatos da base da Megasseqüência
tratigráfico, uma discordância, possivelmente associada São Francisco, sugerindo um aumento nas condições de
a um evento global de 1a ou 2a ordem. O mapa de loca- restrição da bacia na passagem Paranoá-São Francisco.
lização dos perfis (Fig. 2) ilustra sua ampla ocorrência Em resumo, a partir da deposição dos carbona-
na bacia. tos da Megasseqüência Paranoá observa-se uma cres-
A descrição das fácies carbonáticas associadas cente restrição nas condições deposicionais da bacia,
a essa discordância isotópica inclui feições de disso- acentuada durante a sedimentação São Francisco. Uma
lução, teepees, gretas de contração, dolomitos, brusca anomalia negativa em δ13C, associada a um evento
mudança faciológica, além de discretas variações nos glacial, marca o início da deposição dos carbonatos
mergulhos regionais (poços 1-RF-1-MG, 1-RC-1-GO, da Megasseqüência São Francisco, formando um ho-
9-PSB-13-MG). rizonte isotópico contínuo, que separa os dois grupos.
Valores extremamente altos de δ13C podem A distribuição regional dos perfis isotópicos da Fig. 2
ser explicados com base no mecanismo de enriqueci- mostra, durante a deposição da primeira seqüência car-
mento isotópico por evaporação de salmouras ou por bonática da Megasseqüência São Francisco (Formação
processos secundários. Uma coluna de água altamente Sete Lagoas), uma área progressivamente mais confina-
estratificada resulta na acumulação de carbono isoto- da na direção nordeste (valores crescentes de δ13C), ao
picamente depletado como matéria orgânica no fundo contrário da situação de aparente equilíbrio nos valo-
dos oceanos, enquanto as águas rasas tornam-se pro- res de δ13C a oeste na bacia (oceano mais ventilado). A
gressivamente enriquecidas em 13C. A evaporação de figura 3 apresenta uma recomposição paleogeográfica
uma massa de água rasa já enriquecida em 13C, pode- hipotética, para esse momento deposicional da Megas-
ria resultar em valores muito positivos de δ13C (Iyer et seqüência São Francisco, baseada nesse comportamen-
al.1995 e Li & Ku 1997). to isotópico. Esse padrão é subitamente modificado, em
Portanto, essa variação positiva no perfil de δ13C algum momento, ao final da deposição desses carbona-
reflete uma mudança no padrão de circulação oceânica, tos, quando novas condições paleogeográficas se esta-
típico de oceanos ventilados para uma situação de ma- beleceram na bacia, provavelmente associadas a algum
res estratificados, com grande potencial de preservação evento global de 1a ordem. Essa nova condição paleo-
de matéria orgânica. ambiental deverá permanecer até o final da deposição
Essa hipótese encontra apoio no comportamen- dos carbonatos da Megasseqüência São Francisco.
to das curvas de δ18O da bacia para esse mesmo inter- As variações isotópicas, que aparecem em esca-
valo conforme discutido por Martins (1999). Embora la mais localizada, foram interpretadas como possíveis
mais afetados por fatores externos que os perfis isotó- efeitos de processos diagenéticos, como por exemplo, a
dolomitização.
como variações seculares do reservatório marinho de
Implicações globais A construção da curva isotópica carbono e, tentativamente, comparados à curva isotópi-
global para o δ13C no Proterozóico constitui, ainda, um ca global da figura 4.
trabalho em andamento, requerendo um refinamento Os carbonatos da Megasseqüência Paranoá
cronológico e uma interpretação mais consistente de (Serra de São Domingos) apresentam valores compa-
seu registro, tanto do ponto de vista das causas, como tíveis com o intervalo basal do Mesoproterozóico de
das suas conseqüências na biosfera. Recentemente, a 1600 a 1300 Ma, enquanto os carbonatos da base da
compilação dos dados isotópicos e das idades já pu- Megasseqüência São Francisco (na seção apresentada)
blicadas revelou que, do Meso ao Neoproterozóico, o apresentam boa correlação a partir das primeiras excur-
registro isotópico para o carbono pode ser dividido em sões negativas do Neoproterozóico, isto é, a partir de
três intervalos distintos (Kah et al. 1998; Fig. 4): 1000 Ma. Uma vez que valores fortemente positivos de
(1) De 1600 a 1300 Ma, um intervalo de aquies- δ13C só começam a prevalecer ao final do Neoprotero-
cência isotópica (δ13C = 0,0±1,0‰), sugerindo uma es- zóico (a partir de 700 Ma), fica novamente assinalada
tabilidade nos reservatórios de oxidação e redução da a discordância entre os carbonatos da base e topo da
Terra. Megasseqüência São Francisco.
(2) A partir de 1300 Ma, uma nova linha base As excursões negativas de alta amplitude, ob-
se estabelece, com razões isotópicas moderadamente servadas na figura 4 e nos carbonatos basais da Megas-
mais elevadas (δ13C = 3,5±1,0‰), pontuada por muitas seqüência São Francisco, coincidem com unidades car-
excursões negativas breves. bonáticas transgressivas que capeiam depósitos glaciais
(3) Finalmente, entre 800 e 700 Ma, o registro e, comumente, são excelentes ferramentas de correla-
isotópico de carbono torna-se extremamente positivo ção regional. Entre os períodos glaciais, os carbonatos
(valores excedem 5,0‰) com excursões muito negati- são fortemente enriquecidos em δ13C. Essas variações
vas. isotópicas bruscas são reflexos de mudanças: (1) na
Conforme discutido, os registros isotópicos para produtividade biológica na superfície dos oceanos, (2)
o δ13C, até agora existentes na Bacia do São Francisco, na composição isotópica dos reservatórios de carbono,
mostram ampla correlação regional com padrões iso- (3) no padrão de circulação vertical dos oceanos, (4) no
tópicos dissociados de mudanças litológicas e de am- fracionamento isotópico relacionado com a concentra-
bientes deposicionais. Por isso podem ser interpretados ção do íon carbonático e (5) no fracionamento orgânico
Figura 5 - Seção paleogeográfica esquemática com as principais subdivisões ambientais. O datum de referência
são os folhelhos mais radioativos da seqüência transgressiva (Formação Serra de Santa Helena), acima das uni-
dades carbonáticas basais da cobertura cratônica.
Figura 6 - Seção esquemática da Megasseqüência São Francisco, baseada em dados de subsuperfície mostran-
do as seqüências e os tratos de sistemas reconhecidos.
trato de sistema de mar baixo, resultado da erosão do progradacional bem marcada, muito clara em perfil e
rebote isostático pós-glacial. Em ambas as alternativas, no empilhamento faciológico, podendo ser dividida em
os diamictitos amostrados não estariam registrando um dois ciclos deposicionais de maior ordem (S2a e S2b),
evento glacial, mas a erosão e retrabalhamento de seus separados por um limite de seqüência (LS2a) inferido
sedimentos (Fig. 7.1). a partir da brusca variação no padrão faciológico e de
perfis. O trato de sistema de mar baixo só pode ser ob-
Seqüência 2 A seqüência 2 abrange litoestratigrafi- servado nas porções baciais e nas áreas deprimidas dos
camente os carbonatos da base da Formação Sete La- paleoaltos, como corpos de carbonatos maciços interca-
goas até seu terço superior. Apresenta uma tendência lados a folhelhos resultantes de fluxos gravitacionais ou
fluxo de detritos (Figs. 6 e 7.2). suas fácies, que reflete um gradual aumento da lâmina
Os dolomitos, que recobrem abruptamente os d’água. Na ausência de outras feições diagnósticas, as
diamictitos glaciogênicos, estariam associados ao iní- superfícies de inundação máxima (SI2a e SI2b) foram
cio do trato de sistema transgressivo. Essa justaposi- assinaladas considerando o intervalo com leituras ra-
ção carbonato dolomítico-diamictito é encontrada em dioativas mais altas nos perfis de raios gama (Fig. 6).
muitas sucessões glaciomarinhas neoproterozóicas, Os tratos de sistema de mar alto constituem
como no Grupo Otavi, Cráton do Congo, na Namíbia quase 80% de o registro sedimentar das rampas interna,
(Hoffman et al. 1998), na Formação Egan, na região intermediária e externa nessa seqüência (Figs. 5 e 6). A
de Kimberley, Austrália (Corkeron 1998) e na platafor- deposição da seqüência S2b (superior) parece ter sido
ma carbonática neoproterozóica Krol, Índia (Kaufman o clímax da deposição carbonática, com uma sucessão
et al. 1998). Se essa capa carbonática fosse típica de progradante de fácies, quase sem aporte de terrígenos
águas quentes, implicaria numa troca climática abrupta. (Figs. 5 e 6). Nas áreas de rampa interna, os depósitos
Entretanto, os dados isotópicos de δ13C indicam águas possuem uma assinatura gama uniforme, com valores
mais doces, que podem estar associadas a uma degla- cada vez mais baixos em direção ao topo, devido à pre-
ciação e, portanto, a águas mais frias. A deposição des- sença de construções microbiálicas (estromatólitos).
ses dolomitos teria ocorrido durante o período de de- O reconhecimento de uma superfície de expo-
glaciação e subida do nível do mar, quando o aporte de sição subaérea junto à rampa interna, associada a uma
terrígenos é reduzido, ou estaria associada à existência extensa dolomitização, brusca variação faciológica e
de fluxos carbonáticos detríticos dentro dos depósitos forte quebra isotópica de amplitude regional nos valo-
glaciais (Miller 1996), o que não parece ser o caso. res de δ13C, ajudou a estabelecer o limite (LS2) entre as
Os tratos de sistema transgressivos são carac- seqüências 2 e 3. Com exceção da porção bacial da ba-
terizados, em perfil, pelo caráter retrogradacional de cia (onde só ocorre a quebra isotópica), a justaposição
desses critérios pode ser considerada regional. geometrias progradacionais e retrogradacionais sutil-
A dolomitização é interpretada como tendo mente comprimidas (Burchette & Wright 1992).
ocorrido tanto durante a deposição, quanto na exposição Na figura 6, a seqüência 3 foi subdivida a partir
subaérea dessa seqüência, no período de rebaixamento do trato de sistema de mar alto em três seqüências de
do nível do mar. O topo de sua ocorrência coincide com mais alta freqüência, predominantemente agradacio-
o salto isotópico positivo nos valores de δ13C em qua- nais, de forma a ilustrar o empilhamento vertical des-
se 5,0‰, fato interpretado como um evento isotópico sas sucessões. Em todas as três, os limites de seqüência
regional de 1a ou 2a ordem. Os dolomitos mesocrista- coincidem com uma superfície transgressiva. Na área
linos da rampa interna são mais enriquecidos em δ13C, do poço 1-FLU-1 (rampa interna), por exemplo, o li-
se comparados aos dolomitos das rampas externa e in- mite da seqüência inferior (LS3a) é marcado por uma
termediária. Isto sugere uma água do mar com tempe- súbita variação faciológica, de fácies proximal de pla-
ratura de evaporação e salinidade altas (Mutti & Simo nície de maré para fácies de afogamento. O substancial
1994) e coincide com o aumento de restrição apontado desenvolvimento de depósitos de rampa externo-inter-
pelos dados isotópicos para essas áreas. mediária por toda a bacia (Fig. 7.5) e a presença de um
Seqüência 3 Litoestratigraficamente abrange todo o sistema deposicional de rampa interna apenas a nordes-
registro sedimentar do topo da Formação Sete Lagoas até te (na região do 1-FLU-1) sugerem a existência de uma
o topo da Formação Lagoa do Jacaré. Começa com um rampa/plataforma mais permanente nessa área.
trato de sistema de mar baixo preservado como um com- Um evento transgressivo de ordem maior re-
plexo progradante siliciclástico-carbonático, associado cobre abruptamente o limite de seqüência seguinte
aos depósitos gravitacionais carbonáticos de fundo de (LS3b), uma superfície transgressiva, e atinge com me-
bacia e restrito às suas porções baciais. A presença dessa nor expressão grande parte da bacia. O último trato de
feição é mais condizente com uma fisiografia de rampa sistema de mar alto mostra um caráter progradacional,
distalmente escarpada, pois o mergulho muito baixo das bem exemplificado nos poços 1-RC-1 e 1-RF-1.
rampas homoclinais não é propício ao desenvolvimento Durante a formação dessa última seqüência
de depósitos desse tipo de associação (Figs. 5, 6 e 7.3). completa, no trato de sistema de mar alto, o influxo
Os complexos progradantes de mar baixo pos- de material siliciclástico na rampa não foi suficiente
suem uma natureza mais autóctone que os leques de para cessar a produção carbonática. À medida que o
assoalho de bacia e outros depósitos gravitacionais. A influxo de terrígenos foi aumentando e que o espaço
progradação geralmente ocorre na margem da platafor- de acomodação foi diminuindo, os sistemas de rampa
ma ou rampa, à medida que os sedimentos marinhos externa e intermediária foram sendo forçados a migrar
avançam em direção as áreas mais rasas por sobre a lateralmente em direção à bacia, até o domínio total da
topografia preexistente (Jacquin et al. 1991). sedimentação siliciclástica da próxima seqüência. O
O trato de sistema transgressivo mostra um depocentro da rampa, embora geralmente confinado à
padrão de empilhamento retrogradante, que reflete o parte central da bacia, deve ter variado lateralmente de
gradual afogamento do sistema. Nas rampas externas seqüência para seqüência.
e intermediárias, esse trato é representado por uma sé- Os termos litoestratigráficos associados a esse
rie de sedimentos de alta energia, tipo bancos e barras trato de sistema de mar alto englobam os folhelhos da
oolíticas/oncolíticas, praias e depósitos de tempestades, Formação Serra de Santa Helena a partir da SIM até os
que recobrem as fácies de água mais rasa da seqüên- carbonatos do topo da Formação Lagoa do Jacaré.
cia anterior. A linha de praia avançou fortemente em O limite de seqüência LS3 foi estabelecido a
direção ao continente, de forma a permitir que a quase partir da súbita mudança no padrão deposicional, que
totalidade da bacia fosse capeada por um espesso pa- passa de associações de fácies carbonáticas de rampa
cote de folhelhos (Fig. 7.4). É nesse intervalo que foi intermediária para associações de fácies siliciclástica
posicionada a superfície de inundação máxima (SIM) baciais. Apenas o poço 1-RF-1 amostrou essa passa-
da Megasseqüência São Francisco (Figs. 5 e 6), que gem, e como seu posicionamento é praticamente ba-
coincide com o pico deposicional da Formação Serra cial, não foram observadas evidências de exposição e
de Santa Helena. Nos perfis de raios gama, o trato de truncamentos erosivos (Fig. 5). Também foram poucos
sistema transgressivo exibe padrão bem serrilhado de e pobres os afloramentos que amostraram esse limite, o
alta freqüência, indicando tratar-se de seção muito con- que dificulta o seu traçado.
densada, com baixa taxa de sedimentação.
A partir desse momento criou-se um grande Seqüência 4 Essa seqüência não dispõe de boa amos-
espaço de acomodação, com um mergulho muito mais tragem em subsuperfície. Suas associações de fácies si-
suave que na seqüência anterior. O trato de sistema de liciclástica de muito baixa energia, com raras estruturas
mar alto seguinte exibe um padrão agradacional, empi- associadas a ondas ou correntes, são típicas dos ambien-
lhado, com uma sucessão em maior freqüência de fácies tes plataformais distais e baciais (Fig. 5, poço 1-RF-1).
de mar alto e transgressivas empilhadas verticalmente. Numa análise preliminar será considerada como a parte
Nas rampas empilhadas, a acreção vertical cumulativa distal de uma seqüência progradante de terrígenos ma-
é uma resposta a uma lenta e longa subida relativa do rinhos de plataforma dominada por tempestades (Fig.
nível do mar pontuada por pequenos rebaixamentos, 7.6), que culmina com a chegada do sistema flúvio-del-
que geram depósitos acamadados, com uma série de táico da Formação Três Marias (Chiavegatto 1992).
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