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GENERO E DESIGUALDADES LIMITES DA DEMOCRACIA NO BRASIL FLAVIA BIROLI © Boitempo, 2017 © Flivia Millena Biroli Tokarski, 2016 Todos os direitos reservados speu apoio do CNPq (405604/2013-0) ¢ da FAP-DF (0193,00033 79, chew a 15), 1 puiblcasi0 °° Jinkings Directo editorial Marcatti Edigto Assisténcia editorial Preparagdo Revisio Coordenagio de producio Capa Antonio Kehl sobre Dey [ou Green Girl] (acrlica sobre madeira), de Edgar Garcia Diagramagao Crayon Editorial Equipe de a ‘Ana Carolina Meira, Ana Yumi Kajiki, André Albert, Artur Reno, Bibiana Lem duardo Marques, Elaine Ramos, Frederico Indiani, Heleni Andrate, Isabella Barboza, Ivam Oliveira, Kim Doria, ‘Marlene Baptista, Mauricio Barbosa, Renato Soares, “Thais Barros, Tulio Candiotto CIP-BRASIL. CATALOGAGAO NA PUBLICAGAO. ‘SINDICATO NACIONAL DOS EDITORES DE LIVROS, RJ Birol, Fivia, 1975- Género e desigualdades: os limites da democracia no Brasil / Flévia Biroli.~ 1. ed. - Sio Paulo : Boitempo, 2018. Inclui bibliograia ISBN 978-85-7559-604-3 1, Sociologia. 2. Cigncia politica. I. Titulo, 17-46758 CDD: 306 (DU: 3167 i E vedada a reproducé : j dada a reprodugio de qualquer parte deste livro sem a expressa autorizagio da eit 1 edigao: fevereiro de 2018 BOITEMPO EDITORIAL Jinkings es Associados Ltda, Rua Pereira Leite, 373 05442.000 Sao Paulo SP Vel.Mfax: (11) 3875-7250 / 3875-7285 editor@boi www.boitempoeditorial.combr com.br esbeternaco | wovw.blogdaboitempo.com.br _ pp piwicisrccialedisn abet prnyoutibecominbie a edivoraboirempo a! DIVISAO SEXUAL DO TRABALHO alar de diviséo sexual do trabalho é tocar no que vem sendo definido, historicamente, como trabalho de mulher, competéncia de mulher, lugar de mulher. E, claro, nas consequéncias dessas classificagées. As hierarquias de género, classe € raga nao s4o explicaveis sem que se leve em conta essa divisao, que produz, ao mesmo tempo, identidades, vantagens e desvantagens. Muitas das percepgdes sobre quem somos no mundo, o que representamos para as pessoas préximas e 0 nosso papel na sociedade estéo relacionadas & diviséo sexual do trabalho. Nela se definem, também, dificuldades cotidianas que v4o conformando trajetérias, possibilidades diferenciadas na vida de mulheres ¢ homens. Trata-se de questo sensivel, ainda, porque confere a todas as mulhe- res uma posicao semelhante (a elas séo atribuidas tarefas de que os homens sio liberados) ¢ porque as distingue dos outros atores (elas so diferentemente marcadas e oneradas pela divisio de tarefas e responsabilidades segundo os recursos que detém para “driblar” o tempo ea energia que tais tarefas requerem). Acompanhando tendéncias verificadas em outros paises latino-americanos, foi nas tiltimas décadas do século XX que o perfil do acesso das mulheres brasi- leiras & educacao e ao trabalho remunerado se alterou significativamente. Entre 1970 € 0 inicio do século seguinte, 0 percentual de mulheres economicamente ativas passou de 18,5% para cerca de 55%, tendo alcangado um teto de 59% em 2005. Modificaram-se, assim, os ritmos € as feigdes da vida cotidiana. A posicao delas se modificou, também, no acesso a escolarizagao. Hoje tém, em meédia, 7 = ssando a ser maioria e mais tempo de educacao formal do que os homens, pas e entre Apesar disso, a diferenga entre 0 aS pessoas matriculadas no ensino superior. rendimento médio das mulheres ¢ 0 dos homens permanece em torno de 25%, : oe -esso igualitirio as diferentes ocupagées'. € a profissionalizacao nao garantiu acesso igual pagdes', Em, Luana Simoes Pinheiro et al.. Mulherese trabalho: breve analise do periods 2004-2014, Ipea, nota técnica n. 24, 2016, p. 3-28. 22 GENERO £ DESIGUALDADES todos os casos, na conjugacao entre género, classe € raca que as posicées . Jativas se estabelecem de fato. Na piramide de renda € no acesso a postos de trabalho, 4 escolarizagao ¢& profissionalizagao, as mulheres brancas estio mais proximas dos padres de oportunidades ss homens brancos e apresentam vantagens em relacao aos homens negros. Sao as mulheres negras, acompanha. das de seus filhos, que integram a faixa mais pauperizada da populacio, ‘A divisao sexual do trabalho incide sobre mulheres ¢ homens em conjuntg com sua posicio de classe e com o racismo estrutural. Nao é possivel, assim, pressupor que os privilégios estéo sempre entre os homens, e as desvantagens eas formas mais acentuadas de exploracao, entre as mulheres. Como afirmou Heleieth Saffioti, “se as mulheres da classe dominante nunca puderam dominar os homens de sua classe, puderam, por outro lado, dispor concreta ¢ livremen- te da forca de trabalho de homens e mulheres da classe dominada””. Quando se observa a distribuigo, na populagao, do trabalho precarizado, as mulheres negras esto na posicao de maior desvantagem. Elas s4o 39% das pessoas que exercem esse tipo de trabalho, seguidas pelos homens negros (31,6%), pels mulheres brancas (27%) e, por fim, pelos homens brancos (20,6%)’. Se acres centarmos a esses dados 0 fato de que 98% das pessoas que exercem trabalho doméstico remunerado séo mulheres e que, entre estas, muitas esto inserides em relagées precarizadas de trabalho, teremos um dos eixos em que a divisi sexual do trabalho se funde com as hierarquias entre mulheres, permitindo padroes cruzados de exploragio. Em 2013, quando foi aprovada a legislasi® Que equipara os direitos das trabalhadoras domésticas aos dos demais trabalh™ dores no Brasil, apenas 31,8% delas tinham carteira assinada. A formalizas® 5 ae : "esceu com legislacéo, em um period de redugéo do percentual de mh tes ocupadas a cupadas como trabalhadoras domésticas. Nos dois casos, as tendénci® Parecem estar sendo invertidas, agravado pela a em novo ciclo de concentragio de ren4* balhador Provagao, em 2017, de leis que reduzem as garantias para as © trabalhadores, O 6 BEnerO nao se confi i os "40 se configura de mancira independente em relagao ad raga" “octal nem & acessério rel : formag on ado em seus p tivamente a e as Vat “0 conjunta do capitalismo ¢ do patriare tdrdes acuais® leith Satins Poxatth Silos A mulher na wcledade de las a Luana Simbes Pj ae ‘mito ¢ realidade ( ‘mheivo et al., “Mutheres ¢ trabalho”, DIVISRO SEXUAL DO TRABALHO 23 ( posicionadas como um grupo onerado pelo cotidiano de trabalho prestado gratuitamente, direcionado a ocupagées especificas, menos remune- rado que os homens que desempenham as mesmas atividades e sub-representado na politica. Pretendo mostrar aqui que esses quatro elementos estéo conectados de forma significativa, 0 que permite explicar elos importantes das desigualda- des correntes. Argumento que a divisio sexual do trabalho é um locus importan- te da producao do género. O fato de ela nao incidir igualmente sobre todas as mulheres implica que a produgao do género que assim se dé é racializada ¢ atende a uma dindmica de classe. mulheres Parto, assim, de dois pressupostos ancorados na literatura e em um conjun- tode dados, que serio discutidos neste capitulo para apresentar a divisio sexual do trabalho como problema tedrico ¢ como problema empirico situado. O primeiro deles € que a diviséo sexual do trabalho é uma base fundamental sobre a qual se assentam hierarquias de género nas sociedades contemporaneas, ativando restrigdes e desvantagens que modulam as trajetérias das mulheres. O segundo pressuposto ¢ que as hierarquias de género assumem formas dife- renciadas segundo a posicao de classe e raga das mulheres. A divisio sexual do trabalho, no entanto, nao se detém nos limites das vantagens de classe e raga; impacta também as mulheres privilegiadas, porém com consequéncias distin- tas daquelas que se impéem & maioria das mulheres. A partir desses dois pressupostos, que sero desenvolvidos com vagar neste capitulo, & que se define a hipétese que procuro aqui demonstrar ¢ que conecta a divisio sexual do trabalho aos padroes de participagio politica, Entendo que a divisio sexual do trabalho doméstico incide nas possibilidades de participacéo Politica das mulheres porque corresponde & alocagao desigual de recursos funda- ‘mentais para essa participacao, em especial o tempo livre ea renda. Estudos feitos no Brasil, em consonancia com a literatura internacional sobre participagao politica, tém mostrado que priticas e valores que sustentam a divisio sexual do trabalho fundada em concepgées convencionais do femini- no € do masculino tém impacto no acesso das mulheres a cargos politicos! ¢ que “a auséncia da mulher na esfera politica nao pode ser pos a unicamente na ‘Ver Clara Araiijo ¢ Maria C re a intengio © o gesto”, Revista Brasileira de Ciéncia Politica, v. 21, 0. 62s 2006, p. 45-68; Clara Aradjo e José Eustéquio Diniz Alves, “Impactos de indicadores socais edo sistema eletorl sobre as chances das mulheres nag legs e suas interagdes com as cots”, Dados v 50, n. 3, 2007, p. 535-77; Luis Felipe Miguel ¢ livia Biri, Cleidoepi conven muller polite emidia (Si Paulo, Bdvorada Unesp, 2011), icalon, “Género e a distancia 24 GENERO # DESIGUALDADES santa dos limites da democraci liberal”, com ofuncionamento select instituigdes e suas “limitag les Embora as hierarquias de 1 aos espagos de poder, a o do feminino a ela relacionad: es estruturais para incluir novos sujeitos’s classe e raga incidam na definigao de quem divisio sexual do trabalho e a forms dag as fazem com que as mulheres ten, omens de ocupar posses nap, acess truga Jativamente menores do que os hi cional e de dar expresso politica, no debate ptiblico, a perspectivas cial. Tém, com a chances rel licica insticu interesses relacionados & sua posicéo so ades também de influenciar as decis6es © a produsio das diretamente, A cidadania das mulheres €, portant, sexual do trabalho, que em suas formas corrente 0 acesso a ocupagées € recursos, & participacio os discutida neste capitulo, 4 autonomia necessidades € menores possibilid: normas que as afetam comprometida pela divisio contribui para criar obstéculos a politica auténoma e, numa frente men deciséria na vida doméstica € intima’. Examino, a seguir, abordagens que colocam dadinimica de opressao das mulheres e da produgao lem que essa relacio é fundamental para a comp! mas também, de forma mais ampla, da organ ses de poder nas sociedades contemporineas. Depois diss discutindo a produgao do género nas relages (numa concepsi° Ivo a diviséo do trabalho no cento do género, Tais abordages entend reensio nao apenas dt posigéo desigual das mulheres, zacéo das relag trato do segundo pressuposto, de trabalho como algo que se dé na interse¢éo com classe que, assumo desde jé, desliza entre classe e renda) e raga. Por fim, desenva © problema central deste capitulo, que conecta a divis4o sexual do trabalho! sub-representagao politica das mulheres. Divisdo sexual do trabalho e posigdo desigual das mulheres A divisao sexual do trabalho nao é tema novo nem pouco discutido nas ili décadas, O estudo das formas assumidas pelo trabalho feminino foi dein” Cali Regina J. Pinto, “Feminis c evista de 2010, p. 22. “Feminismo, historia ¢ poder”, Revista de Sociologia e Potirca, x 18:9 Para a nogio de sia decisoria, ver Jean Cohen, “Rethink ; and the Abortion Cont pape itt oa acy: Auronomy, Ident 7 sition Comoversy" em fel Weintraub e Krishan Kumar (ongs.), Pbjiergd Pa "ong and Pracie (Chicago, Ue Uo crsity of Chicago Pr 1 cublleana s em que assumo essa perspectiva, ver Flivia Biroli, Autonomia e desig un nla isualdades de gente contribuicées do feminismo para a crttica democnitica (NiterilValinhos, E. lorizonce, 2014 © “Autonomia Pulte mia e justga no debate tedrico sobre abort: implicages tebe Brasileira de Ciéncia Politica, n. 15, 2014, p. 37-68. CAS © politica”, DIVISAO SEXUAL DO TRABALHO 25 0 “a porta de entrada dos estudos sobre a mulher na academia brasileira”, com “endo sido o primeiro [tema] a logo conqui ar o selo da legitimidade” nas universidades do pais”. E.0 problema central da obra que pode ser considerada pioneita das pesquisas contemporineas sobre a posigio das mulheres na socie- dade brasileira: A mulher na sociedade de classes, de Heleieth Saffioti, publicada pela primeira vez em 1969. ‘As pesquisas sobre género ¢ trabalho compartilham o entendimento de que adivisdo sexual do trabalho permeia as relagées sociais e é fundamental na sua organizacio. Sua problematizagao permite questionar “categorias ¢ métodos que aprendemos a considerar neutros”, como constatou, ainda nos anos 1980, Elizabeth Souza-Lobo'. Isso nao significa, no entanto, que a questéo tenha sido incorporada como problema, seja nos estudos sobre trabalho — que podem padecer, ainda citando Souza-Lobo, de categorias “sexualmente cegas” —, seja nos estudos sobre género, nos quais a conex4o com a divisio sexual do trabalho nem sempre avanca para além da mengao desta como enquadramento teérico adotado de partida. Isso remete, sem diivida, a uma dinamica mais ampla de resisténcias de di- versos tipos, no campo das Ciéncias Sociais, que fixam “fronteiras entre teorias gerais ¢ particulares”, compartimentando “problematicas que atravessam as rclagdes sociais e [que], a0 serem circunscritas a espagos ‘especificos’, sao isoladas e perdem todo alcance e extensio”. Essa dindmica é, a0 mesmo tempo, carac- teristica dos processos de especializacio ¢ do isolamento de problemas, expe- riéncias e atores em nichos que nao sao incorporados as teorias nem as explicagées de carder mais geral. Esses nichos se definem internamente &s dis- ciplinas, mas também atuam na produsao das fronteiras disciplinares, seletivas na sua permeabilidade a temas e problemas. Assim, se na Sociologia a divisio sexual do trabalho ganhou terreno, mas permanece ainda como questo espe- cifica, na Ciéncia Politica nao alcanga nem mesmo esse estatuto. Hirata ¢ Kergoat, em um balango feito décadas depois ¢ ma producao francesa, chamam atengao para outro limite: a nogio de “divisio centrado na séria de um te ‘dos Feminists, v. 2, n, 3, 1994, citada em Maggla Neves, “Anotagées sobre Cadernos de Peiguiva, v. 43, n, 149, 2013, p- 405. Elizabeth Souza-Lobo, A elase openiria tem dois sexos: trabalho, dominasio e resistencia (Sao Paulo, Fundagio Perseu Abramo, 2011 [1991]) p. 149. Idem, perspectiva para o futuro”, B= nero ¢ trabalho”, 26 GENEROE ‘DESIGUALDADES ornaria mais comum nas Ciéncias Humanas, por ; Porm lc balho” se sua radicalidade, apresentando desctigbes desproyi Vidas ue reduz conceitual””. tico a partir dos anos 199 s como ‘dupla jornada’, ‘actimulo’ e ‘conciliagio de tae apéndice do trabalho assalariado”” a ver, concentra-s¢ nas pesquisas feitas nos Es. alho-familia foi o tema predominante nos nas décadas seguintes, pelos estudos ) ¢ identidade-sexualidade (oo yndéncia no caso brasileiro, que tiveram ateng los estudos sobre sexual do tral uma forma q de conotagao ao trabalho domés neira fraca “em termo’ fas’, como se fosse apenas um Joan Williams, que, por su Unidos, afirma que o par trab 80, mas teria sido suplantado, sexo-violéncia (nos anos 1990, | No mesmo texto, elas constatam a menor ate ; Nig (0. Este passaria a figurar de my 1 tado’ anos 19) sobre os pares anos 2000), Nao é algo que encontre correspo Sexualidade e violencia foram, sem ditvida, teméticas rescence também no Brasil, mas sem que a perda de espago d género e trabalho ocorresse em igual medida. Ume explicagio pode estar mo faro de que, a partir dos anos 1970, a presenga das mulheres na populacio triplicando entre essa década e os anos 2000. olarizagdo ¢ as mudancas unerado permitiram desafat longo dos anos, mas mani: economicamente ativa se ampliou, Foi também nesse perfodo que a ampliacao da eso padroes de insergéo das mulheres no trabalho rem a disparidade salarial entre eles ¢ elas, reduzida 20 da, como dito, em torno de 25%. Essas parecem ser algumas das raz6es para a atengao dada, no ambien acadé nico brasileiro, 4s conexées entre género e trabalho nas décadas de 19" € 2000. As principais revistas ferninistas brasileiras publicaram dossiés sobre? tema nos anos 2000, ¢ a produgio das pesquisas tem sido continua ™ ho Ver Helena Hirata e Daniéle Kergoat, “ ; niéle Kergoat, “Novas ses da di Cadernos de Pesquisa, v.37, 0. 132, 2007, p. eee ch die slang " bidem, p. 599. i & Joan C. Williams, Reshapi , Reshaping the Work-Family Debate: Harvard University Press, 2010), p. ind ede Why Mew and Cl Mane (Caos 1 Sho urs dossi bolica publicados na revista Pgu em 2002 ¢ vamente, por Angela Araijo Carncito ‘ anh 2009 ¢ organi ‘ jo Carneiro e por Nadya Araujo Guintaries, cot + que também foi 8 nizadora de in dossié na revista ‘ sié na revista Fitudes Feminitas em 2004 tore puss’ gifalalle (Clea ange 5 ante ainda um dossié da tevist ‘o aa de Poquist, ¥. 43, 0. 149, 20,3, 8 NO artge “Ano ” satiuaideat ts 2 Socolgias ho ano 2000, mas arco ergge Pe A021, mene guns cats, nd central no dss nent nos artigon eettae © BERETO oe tos. Ui Jin exemplo da p Pesquis » Banco de dudes sobye *Cloras da Funds? ‘cio continuada dle pesquisas sobre 0 tema no Brasil &o da equipe dk Carlos Chagas, Ente suas contrib as conttibuigdes dlisponivel em: ) 41 riimeros da revista Estudos Feministas, publicados entre 2001 ¢ 2015, © 28 miimetos da revis agus, publicados no mesmo perfodo. Christine Delphy, Lennemi principal, v. 1: Economie plitique du patriarcat (Pats, Syllepse, 2013, (1997), e v. 2: Penser le genre (Paris, Syllepse, 2013 2001) foram, sta, 28 GENERO F pesiGUALDADES ica do capitalismo. Uma explicagio que ria uma fusio equivocada entre tm a ambiente de trabalho ~ e sua formg ma necessidade histor jbute bu ribuida a nen . “ m conta produzil levar isso ¢! a separagao entre casa ¢ Essa forma particular € q uum problema incontornavel ~ “quem tomati dos doentes, das pessoas com deixasse de | rendéncia geral — hisedrica particular. do trabalho. Por meio dela, «ea dascriancas?” (e, podemos complementas dos * deficiéncia e dos idosos) — foi resolvido “em beneficio dos homens”, lancandy méo de “uma ideologia de género que precede 0 capitalismo”"®, Ativamente incorporada pelos capitalistas, mas também pelos trabalhadores organizados, fez parte da luca sindical, manifestando-se m assem aos homens sustentar a familia. A separacio © para justificar hierarquias dentro ¢ fora do espacgo doméstico ue corresponde & diviséo sexus, a aposta em saldrios que possibili ntre a casa e 0 trabalho serviu, assim, familia, ultrapassando 0 universo burgués. O fato dea industrializacao ter transferido parte da produgao realizada no espaco doméstico para as fabricas nao restringiu a casa a espaco reprodutivo. A responsabilizacdo desigual de mulheres ¢ homens por um trabalho que se de- fine, assim, como produtivo e ndo remunerado seria a base do sistema patriarcal no capitalismo. O patriarcado, como sistema polftico, consistiria numa estru- tura de exploragéo do trabalho das mulheres pelos homens. Seu nticleo, ness perspectiva, € a divisio sexual do trabalho, em que se configurariam dois tien a int ia letivamente desse sistema”. A distingao 40 entre trabalho remunerado e néo remunerado é, assim, U" Ponto central. O trabalho que as mulheres fornecem aquel sem remunerag4o, com? le que estd implicado na criaga na cria domésticas, deixa os homens li ‘40 dos filhos € no cotidiano das atividadss Sio elas apena livres para se engajar d =p jue ‘ no trabalho remunerae? ttidade ce dof que fornecem esse tipo de trabalho gratui a fine numa relagio: 0 casamento. E nee en © essa grt E nele que o trabalho gratuite Michele B, — y ‘arent, Women's ’ 1986 [19Bo)), p. rr persion Today: ‘the Ma MReminise fy apitalistay - Para Barrett, essa ideologia foi ane” Lecou 85, mas também pelos te ideologia foi ativamente in inter (Londres, Ves” alhadores organiza em ver da lta py rporagi afi do wabalho Edenton Lonard, Hemiliar By (Cambridge, Polivy . apomn tPorada nao ape™® clevagio de yc um saldrio caP™ de diferenge °° ©8 salitios, éu™ ' ; Mierarquiag g,, 1S habilidades biden, Valorizam deg 7 loitati lity rent A New 4, : ara os homens i explicitas dessa ince » Papel na divi Societies DIVISAO SEXUAL DO TRABALHO 29 das mulheres pode ser caracterizado como nao produtivo. Os produtos que sao tém valor quando decorrem do trabalho da mulher em casa passam, no ater valor econdmico fora de ca Gano. » quando atendem as necessidades de ourtas pessoas que no 0 marido". Vale obs que, para Delphy, isso inclui a preparagao de alimentos, a lavagem de roupas, mas também o cuidado dascriangas as formas de apoio moral e de trabalho sexual e reprodutivo que am sido parte do casamento (algo que ser retomado no préximo capitulo). Dai aafirmagéo de que, “se um homem se casa com sua empregada doméstica oucom uma prostituta, 0 mesmo trabalho a mesma mulher repentinamente se tornam nao remunerados e ‘improdutivos””, Os efeitos dessa forma de exploracéo nao permanecem, no entanto, nos limites da casa. As “obrigagées familiares” restringem e moldam as ocupagées fora de casa, 20 mesmo tempo que se tornam um pretexto para ampliar a ex- ploracio capitalista do trabalho remunerado das mulheres, Essa exploragéo se daria em dois niveis: um coletivo e um individual. O primeiro consistiria em “atribuir coletivamente a responsabilidade pelas criangas as mulheres ¢ liberar coletivamente os homens” dessas mesmas responsabilida- des", E sobre a apropriagio coletiva do trabalho das mulheres que se organiza- ria a exploracio individual, isto é, a apropriagéo do trabalho de cada mulher pelo proprio marido. Como a isengéo do homem ¢ coletiva e institucionalizada, um homem pode “exigir como retorno pela sua participacéo na provisio finan- ccira das criangas a totalidade da forga de trabalho de sua mulher”. Essa exploracdo, no entanto, néo termina no casamento. E poderiamos actescentar que nao se esgota em formas convencionais da conjugalidade, em que os homens podem estar posicionados como provedores. Com 0 divércio, % mulheres permanecem responsdveis pelas criangas ¢ vivenciam desdobra- mentos da apropriacéo do seu trabalho: por um lado, os limites na sua forma- $40 € sua profissionalizacao, derivados das responsabilidades assumidas durante o casamento; por outro, os limites que se impéem pelo fato de perma- "eterem as principais responsveis pelas criangas quando termina o casamento, hrisine Delph, Lennemi principal, v1, cits p. 123. x oe Delphy e Diana Leonard, Familiar Exploitation, ci a = Delphy, Lennemi principal, v. 1, cit p. 51- a idem, p. 131 Thidem, p. 133, : » p. 84; aqui, em traducéo minha,

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