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Formação ABFascias:

Fáscia Visceral I
SUMÁRIO:

• Introdução
• Nomenclatura
• Embriologia
• Anatomia e histologia
• Inervação
• Movimentos viscerais
• Resumo comparativo entre fáscia insercional e de revestimento
• Avaliação das fáscias insercionais – Método ABFascias
• Avaliação da fáscia de revestimento – Método ABFascias
• Sistema de sustentação visceral
• Faringe
• Laringe
• Traqueia
• Esôfago
• Pulmão
• Coração
• Estômago
• Fígado
Introdução:

A fáscia visceral é constituída por um conjunto de membranas internas de tecido


conjuntivo que reveste e conecta os órgãos, vasos e glândulas da parte interna do corpo
(Tutassus e col, 2015; Stecco e col, 2013). Ela participa de funções fisiológicas vitais
(como respiração, digestão, imunológicas e cardíacas), e secundárias (como
verbalização) (Tozzi e col, 2017; Stecco e col, 2013; Ader e col, 2007). Permite um
deslizamento das estruturas internas do corpo (uma em relação a outra) devido a
mudanças de volume, pressões e movimentos do sistema musculoesquelético. Permite
também o fluxo de líquidos no tecido intersticial do parênquima visceral (Helsmoortel
e col, 2010).
O diafragma encontra-se intimamente ligado à função visceral, alterando a
pressão abdominal e promovendo movimentação entre as vísceras (Meert, 2013). Os
movimentos do corpo também promovem movimento e adaptação visceral (Lowen,
2017).
As fáscias viscerais conectam o conteúdo (vísceras) com o continente (esqueleto)
e apresentam um grande número de receptores neurais que levam vários tipos de
informação para o sistema nervoso central, incluindo: propriocepção, dor, temperatura,
alterações mecânicas, nocicepção e interocepção (Craig e col, 2016; Schleip e col, 2013;
Janig e col, 2006).

Fig. 1: Fáscias viscerais (omento menor e maior) conectando as vísceras abdominais.

Nomenclatura das fáscias viscerais:

A fáscia mais externa foi denominada, pela Associação Mundial de Pesquisa em


Fáscia, em 2014, de Fáscia Insercional. Essa seria a fáscia “parietal”, com a função de
conectar o conteúdo (víscera) com o continente (esqueleto). Ela pode ser dividida em 2
ou 3 subcamadas, com as fibras de colágeno anguladas em 54 graus entre elas (Stecco
e col, 2017). Os ligamentos, omentos e mesos são expansões dessa fáscia (Stecco, 2015).
Fig. 2: Ligamentos, omentos e mesos (expansões da fáscia insercional).

A camada mais interna foi denominada de Fáscia de Revestimento pelo comitê


de pesquisadores em 2014, no IV Congresso Mundial de Fáscia em Washington. É a
fáscia “visceral” que está em contato direto com o parênquima visceral e penetra para
dentro da víscera, ajudando a organizar sua função (Paoletti, 2015).

Fig. 3: Pericárdio visceral (fáscia de revestimento) e parietal (fáscia insercional).

Embriologia:

O crescimento embriológico é regido por leis biodinâmicas e influências


genéticas (Blechschmidt, 2004). Inicialmente o desenvolvimento é possível através da
atividade metabólica dos tecidos e das relações entre eles (campos metabólicos)
(Hoppner, 2018). Após a 3ª semana de vida o embrião está com as 3 camadas formadas:
ectoderme, mesoderme e endoderme (Moore e col, 2017).
O tubo endodérmico é formado pelas forças de desenrolamento no sentido
crânio-caudal e lateral, e é enrolado pelo ectoderma (que apresenta um crescimento
muito mais rápido) (Blechschmidt, 2003). O tubo digestivo é conduzido pelo tecido
mesenquimal em paralelo, sendo formado por duas camadas de mesoderme distintas:
1) Somatopleura: é a associação do mesoderme com o ectoderme, e forma a fáscia
insercional;
2) Esplancnopleura: é a associação do mesoderme com o endoderme para originar a
fáscia de revestimento (Blechschmidt, 2003).

Fig. 4: Endoderma, mesoderma (que forma a esplancnopleura e somatopleura) e


ectoderma.

Anatomia e histologia:

A fáscia insercional é uma camada rica em fibras de colágeno e subdivide-se


microscopicamente em 2 ou 3 camadas, separadas por tecido conjuntivo frouxo, que
apresentam alinhamento de colágeno de 54º, em média, entre as respectivas camadas
(Purslow 2010; Benetazzo e col 2011; Tesars e col 2011).

Fig. 5: Angulação das fibras de colágeno nas subcamadas da fáscia insercional.

Ela tem uma maior quantidade de fibras de colágeno, apresentando uma


espessura maior que as fáscias mais internas. Tem, por outro lado, menor quantidade
de fibras elásticas (Stecco e col, 2017).
A fáscia de revestimento, por sua vez, apresenta uma camada mais fina de
colágeno associado com uma grande quantidade de fibra de elastina (com exceção do
rim e do coração, menos elásticos). Apresenta, em média, 5% de sua constituição de
fibras de elastina (Stecco e col, 2017), o que permite alterações de volume importantes
para, por exemplo, permitir a passagem do alimento pelo tubo digestivo.
Fig. 6: Comparação entre as fáscias de revestimento e insercional, com relação a
porcentagem de fibras elásticas (Fig. A) e espessura (Fig. B) (Fonte: Stecco e col, 2017).

Fig 7: Porcentagem de fibras elásticas (Fig. A) e espessura (Fig. B) de diferentes fáscias


viscerais (Fonte: Stecco e col, 2017).

Inervação:

A fáscia insercional apresenta inervação autonômica e somática (Standring e col,


2009) e apresenta receptores mielinizados (proprioceptores) e desmielinizados (C.
Stecco e col, 2017; Schleip e col, 2013). Os receptores nociceptivos e as terminações
nervosas livres presentes levam ao SNC informações relacionadas à dor visceral (Janig e
col, 2006; Cevero e col, 2012). Suas aferências são transmitidas pelo SNAS e pelos nervos
espinhais (Schleip, 2013). Ela tem grande relação com os gânglios extramurais, gânglios
simpáticos e vagais que se localizam entre a fáscia insercional e de revestimento.
A fáscia de revestimento se relaciona com a função da própria víscera. Sua
inervação é feita pelo SNA entérico, SNAP e alguma inervação simpática (através dos
vasos intrínsecos). Apresenta receptores neurais do tipo C e interoceptores (Craig e col,
2016). Não apresentam receptores de dor (Janig e col, 2017). Apresenta relação com os
gânglios intramurais, plexo submucoso de Meissner e mioentérico de Auerback, e o
sistema nervoso autônomo entérico (Stecco e col, 2013).
Fig. 8: Gânglios extramurais, de Meissner e Auerbach.

Movimentos viscerais:

1) Motilidade: movimentos internos, de forma ativa, de expansão e retração em


relação à linha média do corpo (Barral e Mercier, 2016). Esses movimentos
acontecem durante o período embrionário. Podem ser chamados de Inspir (o
movimento de expansão do parênquima do tecido, afastamento da linha média) e
Expir (é o retorno para linha média, ou retorno do parênquima visceral para a
posição neutra) (Barral e Mercier, 2016).

O inspir é favorecido pela expiração de repouso, embora não tenha


necessariamente uma relação de dependência com a respiração. O movimento de expir
é favorecido pela inspiração em repouso, onde o movimento de compressão
proporcionado pelo diafragma gera uma aproximação do parênquima tecidual
(Helsmoortel e col, 2010). Na motilidade o órgão se expande no sentido craniocaudal,
frente-trás, látero-lateral e rotação sem necessariamente afetar o órgão ao lado
(Yamada, 2001). Esses movimentos iniciam por volta da 5ª a 11ª semana pós
fecundação. Apresentam uma frequência de 7-8 ciclos/min (Barral e col, 2015).

Fig. 9: Motilidade visceral (Fonte: Helsmoortel e col, 2010).

2) Mobilidade: movimentos passivos dos órgãos em relação às forças do sistema


respiratório. Movimento da víscera na cavidade abdominal gerado pela contração
do diafragma (Barral e Mercier, 2016). O movimento de respiração fisiológica não
afeta de forma consistente o movimento da víscera (Yamada, 2001), apenas a
respiração profunda. O movimento visceral aumentado está relacionado a uma
adaptação para conseguir compensar a função e a perda de motilidade visceral
(Helsmoortel e col, 2010). Exemplos: a) Movimento do coração em relação ao
pulmão (Barral e col, 2016): na inspiração profunda o coração desce até 30º (Meert,
2012) e, ao mesmo tempo, o coração desliza inferiormente em relação ao pulmão,
que se expande em todas as direções; b) Pessoas com mobilidade diminuída do
fígado em relação ao rim direito podem apresentar dor lombar crônica. Ao melhorar
essa relação houve uma melhora significativa da dor lombar nesses indivíduos (Tozzi
e col, 2012).

Fig. 10: Mobilidade visceral (Fonte: Helsmoortel e col, 2010).

3) Motricidade: movimento passivo da víscera em relação ao sistema


musculoesquelético. Toda vez que movimentamos o corpo as vísceras reagem
internamente (Helsmoortel e col, 2010). Temos como exemplos: a) Diminuição do
deslizamento da Fáscia Renal em relação à Fáscia do Psoas em indivíduos dor lombar
crônica (Tozzi e col, 2012); b) Alteração de ADM de rotação cervical relacionada à
alteração na tensão dos ligamentos suspensórios da pleura e pulmão (McKenzie,
2015); c) Movimento do pulmão acompanhando a caixa torácica durante a rotação
de tronco (Barral, 2017).

Fig. 11: Relação da fáscia toracolombar com as vísceras.


4) Movimento de compressão diafragmático: é um movimento gerado pela respiração
em repouso, que aumenta a pressão nas vísceras sem que, necessariamente, ocorra
deslocamento considerável de uma víscera em relação à sua vizinha. Esse movimento
favorece os movimentos embrionários de Inspir e Expir, embora não apresente relação
de causa-efeito com os mesmos (Helmoortel e col, 2010).

Resumo: comparação entre fáscia insercional e de revestimento:

A figura abaixo apresenta um resumo dos aspectos abordados acima, fazendo


um paralelo entre as fáscias insercionais e de revestimento.

Fig. 12: Comparação entre fáscia insercional e de revestimento.

Avaliação das fáscias insercionais - Método ABFascias:

* Usar inspiração profunda


Quando o desconforto ou limitação do movimento alivia com apnéia inspiratória ou lift
visceral;
Ausculta local leva para mais de uma víscera;
Avalia se, na respiração, o movimento visceral acontece de forma harmônica;
Avalia a relação com as fáscias de movimento com testes de movimento associado a
inibição visceral;
Avaliar o movimento de uma víscera em relação a outra.
Avaliação das fáscias de revestimento - Método ABFascias:

* Usar a respiração de repouso


Usar após tratar a fáscia insercional;
Ausculta muito forte somente de uma víscera;
Na ausculta das glândulas, testar a espinhosa mais rígida de C3-C5; para as vísceras não
glandulares, posicionar a mão no lado mais rígido na base do crânio;
Testar o movimento de inspir com a expiração; testar o movimento de expir com a
inspiração;
Para tratar usar a regulagem do expir e inspir junto com a pressão leve na base do crânio
ou vértebra (C3-C5). Objetivo do tratamento é de regular a tensão e os movimentos do
parênquima da víscera.

Sistema de sustentação visceral:

1) Órgãos cervicais
Envolve a fáscia bucofaríngea, que conecta na apófise basilar do osso occipital -
na impressão para a fáscia faríngea (Stecco e col 2013), e na porção posterior do
bucinador (Tozzi e col, 2017).

Fig. 13: Apófise basilar do osso occipital (inserção da fáscia bucofaríngea).

Cria conexões com a fáscia pré-vertebral ou camada profunda da fáscia profunda


da cervical. Essa camada dá sustentação e envolve o plexo braquial (Chila e col, 2015).
A lâmina profunda da camada média da fáscia profunda da cervical forma a fáscia
tireóidea, suspensa pelo hióideo (Paoletti, 2015).
A bainha carotídea é formada pelas três camadas da fáscia profunda da cervical
– superficial, média e profunda (Tutassus e col, 2015).
O músculo estilohióideo se insere no processo estilóide do osso temporal (Grays,
2018).
Fig. 14: Fáscias profundas da cervical.

2) Órgão torácicos
Espessamentos da camada média e profunda da fáscia profunda da cervical
formam o mecanismo suspensório da pleura e pericárdio (Stecco, 2015; Paoletti, 2015).
A fáscia de Sibson (membrana suprapleural) é formada pelo encontro das fáscias dos
membros superiores, cervical e pleural.

Fig. 15: Mecanismo suspensor do pericárdio.


Fig. 16: Fáscia de Sibson.

3) Órgãos abdominais
O diafragma desempenha um papel importante na sustentação dos órgãos
abdominais, já que há várias inserções ligamentares e fasciais nele:
- Ligamento coronário do fígado-crura;
- Ligamentos triangulares do fígado com a parte lateral do diafragma;
- Ligamento falciforme do fígado com o diafragma e umbigo (lig. redondo);
- Ligamento gastrofrênico;
- Ligamento suspensório da suprarenal;
- Ligamento hepatocólico e ligamento frenocólico;
- Mesogastro.

O sistema de sustentação envolve ainda a participação de outros sistemas


fasciais:
• Mesentério;
• Mesoduodenal;
• Mesotransverso;
• Mesosigmóide;
• Fáscia de Told;
• Fáscia de Treitz;
• Ligamento medial, mediano e lateral da bexiga.
Fig. 17 (A, B e C): Mecanismo suspensório dos órgãos abdominais.

• Sistema de dupla membrana com líquido entre elas;


• Turgescência ou efeito Turgor: distensão da camada protoplásmica e da parede de
uma célula. Ocorre quando uma célula incha devido à pressão exercida pelos fluidos e o
conteúdo celular na parede das células;
• Pressões intracavitárias:
- cabeça: 15 mm/Hg
- tórax: -5 mm/Hg
- abdomen: 5 mm/Hg
- pelve: 30 mm/Hg
Fig. 18: Pressões intracavitárias

• Ligamentos viscerais: expansões do peritônio parietal para ligar os órgãos ao tronco,


ou um órgão a outro:
- Ligamento gastrofrênico: conecta a parte posterior do fundo do estômago ao
diafragma;
- Ligamentos frenocólicos direito e esquerdo: conectam as 2 flexuras cólicas ao
diafragma e ao tórax;
- Ligamento falciforme do fígado: conecta o fígado à cavidade abdominal anterior. Antes
do nascimento contém a veia umbilical;
- Ligamentos coronários direito e esquerdo: conectam o fígado a parte superoposterior
do diafragma. Limitam a área nua do fígado.

• Ligamento de Treitz: conecta a junção duodeno jejunal com a crura do diafragma

Fig. 19: Ligamento de Treitz (importante na suspensão da flexura duodenojejunal).

• Ligamento gastroesplênico: conecta a parte medial do baço à curvatura maior do


estômago. Deriva do mesogastro posterior e contém vasos e nervos. É contínuo com o
peritônio parietal posterior via baço;
• Ligamento esplenocólico: é uma expansão do mesocólon transverso. Vai da flexura
cólica até a região lateral do baço. Pode conter vasos;
• Ligamento gastrocólico: conecta a grande curvatura do estômago ao cólon transverso.
Deriva do omento maior e contém vasos e nervos para a curvatura maior do estômago;
• Ligamento cisticoduodenocólico: conecta a vesícula, duodeno e cólon transverso.
O peritônio estabelece conexões com o continente:
• O peritônio parietal cobre as vísceras da parte anterior, lateral e inferior do abdômen
e pelve maior;
• O peritônio parietal posterior delimita o espaço retroperitonial: medialmente contém
os vasos e os rins e lateralmente os ureteres;
• O peritônio parietal inferior (pélvico) conecta com o Fundo de Saco de Douglas e com
o diafragma pélvico. Contém vasos e vísceras pélvicas.

Faringe:

A faringe comunica a cavidade oral e nasal com o esôfago e laringe, sendo


dividida em orofaringe, nasofaringe e faringe inferior. Constitui um tubo de 15cm em
média que, ao contrair, aumenta 3cm longitudinalmente (Grays, 2018). Nela acontece o
processo de deglutição. É envolvida pela fáscia bucofaríngea e por uma fáscia visceral
(Fáscia Faringobasilar) (Stecco, 2015).
Sua parte muscular pode ser dividida em duas camadas:
①Camada circular externa: constritor superior, médio e inferior da faringe;
②Camada longitudinal interna: músculos palatofaríngeo, estilofaríngeo e
salpingofaríngeo.
Os músculos constritores tem um forte revestimento fascial interno, a fáscia
faringobasilar, e um revestimento fascial externo mais fino, que é a fáscia bucofaríngea
(Tutassaus, 2015).

Fig. 20: Faringe em suas divisões: nasofaringe, orofaringe e laringofaringe.


Fig. 21: Musculatura da faringe: camada circular externa (mm. constritores) e
longitudinal interna (m. estilofaríngeo).

A inervação motora da faringe acontece por derivações do nervo acessório


(interno), que são transportadas pelo nervo vago para os músculos da faringe e palato
mole, com exceção do estilofaríngeo (inervado pelo IX par) e o tensor do véu palatino
(inervado pelo V par). O músculo constritor inferior recebe fibras do laringo-recorrente
e laríngeo externo (X par).
As fibras sensitivas derivam do nervo glossofaríngeo e vago (Pauwels, 2015).
A irrigação é feita pelas artérias: Tonsilar, Palatina Ascendente, Palatina
Descendente, Faríngea Ascendente. A drenagem é feita para a veia palatina externa.

Fig. 22: Inervação da faringe.


Laringe:

A laringe se estende da faringe até a traqueia. Tem função de proteger a entrada


de alimentos na cavidade respiratória e produzir sons. Apresenta várias cartilagens, das
quais se destacam a tireóidea, em V, e a cartilagem cricóide. É inervada pelo vago e
ramos simpáticos do plexo cervical. As cordas vocais são inervadas pelo nervo laríngeo
superior e laringo-recorrente (ramos do X par). Ramos do acessório também participam
da inervação (Bordoni, 2018).

Fig. 23: Inervação da laringe: nervos laríngeo superior e laringo-recorrente.

Traqueia:

A traqueia é um órgão de forma tubular com aproximadamente 10 a 12 cm de


comprimento e 1,5cm de diâmetro. Começa no nível de C6, e no nível de T4 ela bifurca
para continuar nos brônquios (Bifurcação Carina). O lado D é mais vertical, justificando
um maior índice de aspiração pelo pulmão D. É mantida aberta por vários semicírculos
de cartilagem hialina, e é revestida por epitélio ciliado mucoso.

Fig. 24: Traqueia e seus pontos de referência.

Fig. 25: Cartilagens da traqueia (a esquerda). Epitélio ciliado (a direita).


Na inspiração profunda, ocorre uma diminuição do ângulo da bifurcação carina
(ângulo se torna mais agudo). Na expiração, o ângulo aumenta (como pode ser visto na
figura 26):

Fig. 26: Mudança do ângulo da bifurcação carina durante a respiração.

Esôfago:

O esôfago se inicia na parte inferior da cartilagem cricóide. Apresenta 4 camadas:


serosa, muscular, submucosa e mucosa. Apresenta um esfíncter esofágico superior e
inferior. O esfíncter superior é formado por fibras musculares com a capacidade de
manutenção constante do tônus, e possui inervação do SNAS.

Fig. 27: Esôfago e esfíncteres superior e inferior.


Fig. 28: Camadas do esôfago.

Na porção torácica, o esôfago se encontra posteriormente à traqueia, separado


desta por tecido conjuntivo frouxo (Barral, 2005). Na sua trajetória, desvia para
esquerda, onde estabelece relações com o bronquio E. Frequentemente encontra-se
aderido à pleura. Apresenta contato direto com o pericárdio através da adventícia
(contínua com a fáscia bucofaríngea) (Paoletti, 2015). Em T4 conecta com a coluna,
seguindo os movimentos dessa. Em T7-T8 se separa da aorta. Sua porção abdominal tem
2cm, e sua fáscia emite expansões para a região posterior do fígado (ligamento
triangular E) (Barral, 2005).

Fig. 29: Esôfago e suas relações com a pleura, pericárdio e fígado.

Na região da cárdia (localizada na altura da 7ª cartilagem costal, a E do esterno)


o esôfago torce sobre seu eixo para ajudar a válvula.
O piloro, por sua vez, situa-se próximo da região medial do corpo de L1 (Grays,
2015). O controle da musculatura dos esfíncteres é basicamente realizado pelo nervo
vago (parte aferente) que funciona como os fusos musculares (Powley e col, 2013).
Fig. 30: Esfíncter da Cárdia e Piloro.

Pulmão:

O pulmão, através das fáscias que o recobrem, está ligado a várias estruturas ao
seu redor. Superiormente, liga-se às vértebras e costelas pelos:
• Ligamento transverso-pleural ou músculo escaleno menor (origina-se no
processo transverso de C7)
• Ligamento costo-pleural (origina-se no colo da primeira costela)
• Ligamento vértebro-pleural (origina-se na aponeurose pré-vertebral de C6 a T1).

Fig. 31: Ligamentos que ligam a cúpula pleural às costelas e vértebras.

Na abertura torácica superior, a fáscia endotorácica torna-se mais densa e forma


o diafragma cervico-torácico, também conhecido como membrana suprapleural ou
Fáscia de Sibson (que vimos anteriormente, estudando o sistema de sustentação dos
órgãos torácicos). Esse espessamento da fáscia endotorácica constitui o assoalho da
região supraclavicular, onde os ligamentos suspensórios da cúpula pleural foram
identificados.
Fig. 32: Fáscia de Sibson

O pulmão é dividido em lobos. No lado D, são 3 lobos:


①Lobo superior: delimitado pela fissura superior direita. Palpado anteriormente entre
a 3ª e 4ª costelas e posteriormente no nível da espinhosa de T4.
②Lobo médio: localizado entre a fissura superior D e a fissura inferior D. Palpado
anteriormente entre o 6º e 7º espaço intercostal e posteriormente no nível de T8.
③Lobo inferior: localizado entre a sutura inferior D e o diafragma.

O pulmão E, por sua vez, é dividido em 2 lobos:


①Lobo superior: superiormente à fissura E. Palpado anteriormente no nível do 5º, 6º
e 7º espaço intercostal, e posteriormente no nível da espinhosa de T4.
②Lobo inferior: inferiormente à fissura E.

Fig. 33: Lobos do pulmão.

Fig. 34: Referências para palpação dos lobos do pulmão.


Na parte interna do pulmão, localiza-se o hilo, região de passagem dos vasos e
brônquios. Envolvendo o hilo localiza-se o ligamento pulmonar, que se liga ao esôfago e
ao diafragma.

Fig. 35: Hilo e ligamento pulmonar. Fonte: Barral e Mercier (2014).

O pulmão é envolvido pela pleura parietal (que se relaciona com o continente) e


pela pleura visceral (mais interna, que se relaciona com o funcionamento do órgão).

Fig. 36: Pleura parietal (nas relações com as costelas, diafragma e mediastino) e visceral

Os vasos que irrigam o pulmão correm ao lado das vias aéreas, possibilitando as
trocas (como pode ser observado na figura 37):
Fig. 37: Relações anatômicas entre artéria pulmonar, artéria bronquial, brônquios,
linfáticos e veia pulmonar. TB: Terminal bronchioles; RB: respiratory bronchioles; A:
alveoli; AD: alveolar ducts.

A respiração sofre influência do SNA. A área anterolateral do bulbo ajuda no


controle dos centros superiores (eferência). O trato reticuloespinhal interage essas
informações com a medula e controla a musculatura respiratória do tórax. A porção
dorsolateral do bulbo, por sua vez, contém a rede neural aferente. Os centros bulbares
de controle cardiovascular se encontram bem próximos dos centros respiratórios.
A respiração sofre influência também do córtex frontal. Essa ação torna-se
importante para o uso da consciência no tratamento, usando padrões respiratórios
específicos (Herrero e col, 2017).
As áreas relacionadas ao controle da respiração são: NTS, bulbo respiratório,
Substância Periaquedutal Cinza, córtex motor e proprioceptivo, áreas límbicas e
diencéfalo (Tozzi e col, 2017; Holtege e col, 2014).

Fig. 38: Mecanismo de controle da respiração. O aumento da pressão de CO2 estimula


quimiorreceptores, levando a aumento da frequência e amplitude da respiração.
Fig. 39: Controle da respiração a partir das informações aferentes.

Os efetores da respiração são os músculos, inspiratórios e expiratórios:


①Músculos inspiratórios: diafragma, intercostais externos, musculatura laríngea, ECM,
escalenos;
②Músculos expiratórios: intercostais internos, músculos da parede abdominal e
torácica.
A inspiração leva a um aumento da pressão na cavidade abdominal e diminuição
na torácica; uma diminuição na pressão intratorácica/intrapleural e subsequente
ventilação nos pulmões e troca gasosa por alteração do gradiente de pressão (Troyer e
col, 2016). A FC aumenta e a PA diminui na inspiração e inverte na expiração (Billman e
col, 2011).

Fig. 40: Controle neurológico do diafragma

Na respiração fisiológica e em repouso, a expiração acontece de forma passiva.


(a partir do recoil das fibras elásticas, alongadas na inspiração). O ciclo respiratório
normal em repouso dura, em média, 3-4 segundos, e normalmente a fase expiratória é
mais longa que a inspiratória. O ritmo respiratório deve ser eficiente em conjunto com
a troca gasosa e o transporte do sistema cardiovascular (Varga e col, 2017).
O ritmo respiratório influencia na frequência cardíaca: ocorre um aumento da
descarga eferente vagal na fase pós-inspiratória e diminuição na fase inspiratória; esse
mecanismo aumenta o fluxo circulatório no pulmão quando esse encontra-se cheio de
O2 (Bordoni e col, 2018). O SNAS e SNAP modulam a intensidade e frequência cardíaca,
e são controladas por células marca-passo (Moore e col, 2012).
Informações periféricas sobre mecânica, química e temperatura são levadas para
o Núcleo do Trato Solitário pelos nervos: I, V, IX e X, regulando o trabalho respiratório
do corpo (Pauwels e col, 2012). Vários reflexos como: tosse e vômito (laringe / traqueia),
espirro (nasal), aspiração (nasofaríngeo) e também comportamental, como “fungar”,
são explicados por essas conexões (Moore, 2012). Receptores de estiramento bronquial
inibem a inspiração protejendo os pulmões de um estiramento excessivo (Reflexo de
Hering-Breuer) (Guyton e col, 2013).

Fig. 41: Regulação da respiração

O controle da pressão arterial é feito por barorreceptores vagais do arco aórtico


(ramo laringorrecorrente leva informações para o NTS), juntamente com as aferências
do glossofaríngeo no corpo e seio carotídeo (que também vão para o NTS) (Scheffers e
col, 2010).
• Aumento da PA: informação para o NTS no bulbo e informação para o núcleo
ambíguo e núcleo motor dorsal do vago, agindo nos gânglios intramurais
cardíacos (nó sinoatrial e nó atrioventricular) (Haibara e col, 2000).
• Diminuição da PA: gera uma inibição desse reflexo. Isso gera uma grande
descarga simpática excitatória para compensar a queda de PA, estimulada pelos
centros superiores (Braz e col, 2009).

Quando ocorre uma alteração nos níveis de O2 no sangue, como por exemplo
em uma diminuição durante uma atividade física, ocorre uma inibição do reflexo acima.
Essa inibição somente acontece quando os níveis estão muito baixos (Lang, 1990).
Alterações no pH (que podem ocorrer pelas mudanças no ritmo respiratório)
repercutem de forma importante no sistema fascial.
• Hipercapnia deixa o corpo mais ácido (Scheffers e col, 2010);
• O fígado, os rins e os pulmões são os principais controladores do PH (Valentini
e col, 2009);
• As terminações nervosas livres percebem alterações de PH na MEC,
influenciando diretamente na viscosidade da fáscia (Thomas e col, 2012);
• Variações ambientais, alimentação, variações respiratórias e atividade física
alteram efetivamente o PH da MEC (Shen e col, 2012; Arent e col, 2010).

O padrão normal da respiração é 10 a 20 ciclos por minuto. Estudos mostram


que a respiração lenta (em 6 ciclos/min) ajuda no controle entre a PA e FC, ajudando na
sincronização de ambos (Radaelli e col, 2004; Chang e col, 2013). A respiração lenta
diminuiu a PA e os batimentos cardíacos na fase inspiratória (Zhang e col, 2016; Marc e
col, 2017).
O padrão respiratório mais lento e profundo demonstrou também:
• Aumentar a eficiência do diafragma (Stromberg e col, 2015);
• Estimular o córtex insular E e hipotálamo E, levando a um aumento do tônus
parassimpático (Craig e col, 2016);
• Afetar a hemodinâmica: altera PA, favorecendo sincronização entre batimento
cardíaco e as flutuações do pulso pela resistência periférica e fluxo capilar
(Hsiech e col, 2003);
• Aumentar o retorno venoso (em relação ao ciclo normal) (Bordoni e col, 2013;
Byeon e col, 2012; Kimura e col, 2011).

A percepção respiratória engloba 2 estágios:


①Consciência Física da respiração: “o que é sentido”
②Consciência Afetiva: “como isso é sentido”
Na consciência física, as sensações somáticas e consciência discriminativa
determina a interação entre os grupos de aferências e o controle da parte motora do
tronco respiratório.
A consciência afetiva por sua vez é um estágio cortical paralelo subsequente ao
estágio somatosensorial. As respostas vêm do tipo e qualidade da respiração; podem
provocar sofrimento e motivar mudança comportamental (Davenport e col, 2008). É
possível que sensações respiratórias angustiantes possam condicionar os seres
humanos a terem um aumento da percepção de sua respiração; a ansiedade está
intimamente relacionada a alterações do padrão respiratório (respiração mais curta e
hiperventilação) (Masaoka e Homma, 2001).

A respiração tem uma relação com os movimentos viscerais. Durante uma


respiração normal em repouso não ocorre grande movimento visceral, porém ocorre
um aumento da pressão, uma aproximação nos contornos viscerais. Essas mudanças
estimulam o ritmo das torções internas das vísceras (motilidade). Quando se tem uma
perda da fisiologia dos órgãos ocorre uma alteração do movimento respiratório para
compensar a motilidade e função perdidas (Helsmoortel e col, 2010).
Fig. 42: Movimentos viscerais relacionados à respiração.

Coração:

Grande quantidade de fibras de colágeno estão presentes e alinhadas em


paralelo para ajudar no controle da expansão cardíaca na fase de enchimento das
câmaras. Em processos de falha cardíaca, os níveis de colágeno transmural aumentam,
levando a hipertrofia e aumento da rigidez passiva (o que gera uma deterioração da
função ventricular).
O enchimento do coração na diástole determina a quantidade de distensão, e o
volume determina a força de contração. Os receptores de pressão no tecido intersticial,
principalmente a nível atrial, junto com elastina e colágenos, ajudam a controlar a
função cardíaca (Calaghan e col, 2007).
Forças mecânicas e elétricas influenciam na remodelagem e diferenciação da
MEC cardíaca (Wen e col, 2014). Alterações na formação da MEC do coração geram
alterações morfogenéticas na formação das câmaras cardíacas (Bowers e col, 2010). As
forças contráteis da MEC, somadas às dos cardiomiócitos, interagem moldando o
crescimento e desenvolvimento do órgão (Wen e col, 2014; Trappmann e col, 2012).

Fig. 43: Desenvolvimento do coração.

Os níveis de titina vão modificando com o aumento da rigidez na evolução do


feto para o adulto (Walkr e col, 2004; Lahmers e col, 2004). Titina é uma proteína que
mantém a homeostase do sarcômero, limitando o stress do alongamento na fase de
enchimento passivo. Junto com os elementos da MEC, colágeno e elastina, ela inicia a
contração sobre a forma de recoil, protegendo a ação dos sarcômeros na posição de
máximo alongamento e otimizando sua função. O recoil ajuda no sincronismo A-V
(Calaghan e col, 2007).

Fig. 44: Sarcômeros em posição de repouso e contraída.

Na fibrilação atrial (arritmia mais comum) ocorre um aumento dos fibroblastos


na MEC, alterando a propagação do impulso (Takahashi e col, 2013; Yu e col, 1999).
Alterações de cardiomegalia com alteração ventricular demonstram alterações na MEC
e no citoesqueleto, titina, vinculina e desmina, dentre outras (Seth e col, 2006).
Em condições normais, os fibroblastos se dispõem em uma proporção de 2 para
cada 3 cardiomiócitos (Baudino e col, 2006). Os fibroblastos na MEC do coração
apresentam funções primordiais em condições normais, mantendo as estruturas
colagenosas tipo I e tipo III e em menor grau fibronectina, laminina e fibras elásticas
(Langevine e col, 2004; Iwasaki e col, 2005). Uma boa relação do colágeno da MEC
cardíaca com os cardiomiócitos ajuda na perpetuação do estímulo elétrico cardíaco
(Kumar e col, 1996; Rohr e col, 2012). A MEC do coração não se comporta como uma
unidade estática, mas está submetida a um contínuo turnover, promovido pelos
fibroblastos (Spinale e col, 2002). As taxas de turnover do colágeno cardíaco variam de
0,6% a 5% por dia (Rohr e col, 2012).
Em pessoas normais a MEC praticamente não apresenta células
miofibroblásticas (Clement S e col 1999; Stephan Rohr e col 2012). O aumento da
densidade de miofibroblasto na MEC do coração atrasa a condução elétrica e reduz a
polarização da membrana pelos cardiomiócitos (Miragoli e col, 2006).

Fig. 45: Miofibroblastos na MEC cardíaca.


Os movimentos do diafragma produzem movimento do coração: na inspiração,
o coração desce, e ocorre um aumento no ângulo cardiodiafragmático. Na expiração
ocorre o contrário.

Fig. 46: Movimento do diafragma / coração.

Estômago:

A inervação e irrigação da fáscia de revestimento (visceral) e insercional


(parietal) pode ser vista na figura abaixo:

Fig. 47: Inervação e irrigação das fáscias do estômago.

As fáscias insercionais relacionadas ao estômago são: omento maior; omento


menor; ligamento gastrofrênico (expansão do ligamento triangular E); ligamento
gastroesplênico; ligamento gastroduodenal.
Os omentos permitem alterações de volume razoáveis do estômago e favorecem
o sincronismo do peristaltismo desse órgão. Devido às grandes alterações de volume e
à quantidade de movimento, os omentos não têm inserções no esqueleto e sim em
outros órgãos. O omento menor promove um sincronismo perfeito da transmissão de
força e função digestiva entre: esôfago, estômago, duodeno, fígado e vesícula.
Fig. 48: Fáscias insercionais do estômago.

Internamente às fáscias insercionais está a fáscia de revestimento (ou visceral).


Quando o alimento chega ao estômago ocorre um estiramento dessa fáscia, ativando os
gânglios entéricos e tendo como resposta a contração da musculatura longitudinal
(aproximando o fundo do piloro). Com isso, ocorre um afastamento da curvatura menor
da maior ativando as fibras colágenas transversais e os gânglios entéricos, gerando
agora ativação da camada transversal e oblíqua (com inibição da longitudinal). Esse ciclo
vai se perpetuando, gerando um sistema de mistura constante no estômago.

Fig. 49: Gânglios extramurais.


Fig. 50: Regulação do peristaltismo do estômago.

Os movimentos intrínsecos e extrínsecos do estômago são demonstrados na


figura abaixo (Fig. 51). No movimento intrínseco (A) a parte proximal roda posterior e
para esquerda, a parte inferior desliza para a direita, gerando uma torção. No
movimento extrínseco, ocorre o movimento de rotação horária e superior em relação
ao fígado (B):

Fig. 51: Movimento intrínseco e extrínseco do estômago.


Fígado:

As fáscias insercionais relacionadas ao fígado são: ligamento coronário D e E;


ligamento triangular D e E; ligamento falciforme; ligamento redondo; omento menor;
ligamento hepatoduodenal; ligamento renal. A fáscia de revestimento é a cápsula de
Glisson.

Fig. 52: Cápsula de Glisson (fáscia de revestimento) e ligamento falciforme e redondo


(fáscia insercional)

A inervação e irrigação da fáscia de revestimento (visceral) e insercional


(parietal) podem ser vistas na figura abaixo:

Fig. 53: Inervação e irrigação das fáscias do fígado.

Através das suas fáscias insercionais, o fígado estabelece relação direta de


movimento com os órgãos vizinhos: estômago; rim D; cólon D; diafragma; duodeno;
vesícula biliar e flexura hepática. Mantém também relações diretas com as costelas (e
consequentemente com o tronco)
Fig. 54: Relações do fígado.

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