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Acidade eo urbano no Brasil Ruy Moreira © movimento reivindicatorio que ocupou as twas fem junho de 2013 veio para reazer o que acre- sltavamos ser um direio & cidade, comigindo-nos com @ proclamanéo de um direto ao urbana e nos ‘mostranco o quao diferentes szo, no Brasil, a ci ade € 0 urbano que nao tinhamos visto, Historicamente, no Brasil sempre tivernos 2 ‘cidade. O urban, no. Eos protestos disseram A cidade no Brasil A cidade surge no Brasil como um combinado ci ddade-Cémare-municipio, no qual a CEmara, entéo ‘gramada de Senado municipal, 60 dado principal, Ena Cémera que se definem rumos e detalhes do Cokidiano da cidade. Seu prédio, 20 lado ca igreja, 0 centro de reteréncia da cidade, ali se reunindo, fem umn 36 Poder 0 que hoje S80 0 Executvo, o Le- isletive eo Judiciéio enquanto formas separadas {e poder. No subterréneo do prédio funciona a cadsia e, no andar de cima, 0 governo da cidade, E¢ este ndcleo tinica que define e dd vida 20 municipio, ‘A Cimare é formada pelos quadres politco- -edministratvos desses Poderes unificadios de ‘govern, reunindo Was vereadores,eleitos entre ‘5 homens de bens da cidade, o juiz de dentro, or eles indicaco, eo juiz de fora, indicado pela Coroa, alm do escrivao, o ouvidor e demais com- Donentes. Nola se representam, assim, os entes de Dodie dos colonas e da Corca. E se acertam desde 28 ragras e normas de organizago de espaco da cidade e do municipio até os termos de ajuste dos Confitos entre 0s colons eo rei (Leal, 1975), ‘edo surge no comeco coma uma pléiade de Pequenas aglomerados populacionaiscriados para ® finalidade iogistca de assontar colonos, calégios e jesuitase instalacdes militares, e dai progre #550, come que concordande com a afirmagso dé Lefebvre de que a cidade é uma déclva da revo- lucao burguesa, mas 0 urbano 86 pode ser uma Conquista da revolugde popular (Lefebvre, 1869 ¢ 1998) O cerne da diferenga esté na que tem sido “ce dade" n0 Brasil, um fato mais da geografa politics do que da geografia urbana. para o status de vila e, depois, de cidade. 0 que \éi determinar 2 evolugao diferenciada de escale entre esses nticleos € a presenca da Camara, urs prvilégio da cidade. € ela o crtério que demarce 2 Cidade dos demais aglomerados urbana © dence fentdo a define com um ente politica, A cidade no Brasil nao é, assim, um ente de Ccunho propriamente econdmica, braga de exe. ‘ug do exerccio do poder militar ou elo de con- Guista da metr6pole, Antes, & um elemento estrv- tural da formagdo espacial da colénia, na funczo ‘cogestora do colons e do rei (Azevedo, 1970, ¢ Geiger, 1963). A insttuicéo sesmarial da grande propriedad= ‘como estrutura fundisria da colbnia val, entre tanto, aproximé-ia da fazenda, seja de lavoura, seja de gao. Dessa forma, esse bindria cidade —te- ‘ends veio a sero contetido real das cémaras e, assim, de instituigso da cidade como um feto Ge _B00gratia politica desde © comeco O elemento desse elo $0 caréter cosmopo- Ita do grande fazendeiro, particularmente o da fazenda de lavoura — caréter esse vind do fuse amento essenciaimente mercantil da economia 2 coldnia, Desse fundamento vem um olhar ‘metropaltano, no sentido geral e de pare alem ds ‘mettépole portuguesa, e por decorréncia um gosto ‘cidade eo ursano no Brash 2 nébito de vida em si de cidade desde dentra da vend © cavater cultural se funde, dese modo, ao rater politica, tomando 6 colana ums classe sennorial rural que empolga em sau dominio o serfil de dominante econdmico, cultural e politico, através do binémio cidace~fazenda, que dessa ‘forma determina o contetido, seja da fazenda, saja a cidade. 0 desenvolvimento ecandmica e 0 desdobra- ‘Tanto territorial da colénia sobre espagos suces- Svemente mais amplos vao adicionar formas ‘ovas de atividades produtivas, de intercambio & ce classes socials na vida rural e da cidade. Entre -sst28, praticantes de um comércio atacadista & de v2re)o interno; pequenos e grandes produtores de subsisténcia, de procucao familiar e fazendeitos # gedo, respectivamente para 0 abastecimento alimenticio das fazendas e das cidades; e uma ‘multidao de homens livres de funcées diversas, © que vai complexifcar a vida e 0 perfil cotidiano 2 cidade. Esta fol mantida e definida, entretanto, como um fato de geografia politica por seu cardter de local de sediagao da Camara municipal e pela fongd0 de frum de cogestao de senhores e Coroa portuguesa sobre a colénia, © ciclo da mineracdo vai trazerihe um novo salto. Forma de atividade extrativista e de re- ‘2580 de trabalho por exceléncia de cooperacio, 2 par de fornecedora de um produto de destino intelramente de mercado, o ciclo minerador & urn ‘memento histérico da col6nia de natureze essen- crelmente urbana, Isso 0 leva a ser uma fase da “ormagao espacial brasileira de habitos e menta- ‘‘cades de cultura topicamente social de cidade com sua demanda de acessibilidades caracteris- "amente urbanas, propiciando um quadyo de ‘cosmopolitismo distintamente diferente daquele e cunha senhorial. Multiplicam-se, entdo, com o ciclo as classes de economia de subsisténcia, Ge comerciantes de atacaco e varejo de consumo ‘ntemo e de homens livres urbanas, que vo im- actar intensamente o estilo de vida da sociedade +=g18rio-senhorial existente, Emibora ndo dure muito como fase, inaugura-se ‘orgnica. Para isso, a cidade 6 reafiemada como lum ente geogralico de natureza politica, insttucio- nalizada agora pura e simplesmente como sece Se "municipio. & consolidecao do que era embriae na ‘oreo maduro do formato federativo republican val assim encontrévla estabelecida nesses termos, E. conformacao juridico-polticn-administrative = congeltual-estatistice que a regulamenta em um odo de entendimento, que no undo & 0 mesma {do tempo colonial que a d'stingue por esse pape! cautional da vila e do povoado, vai apenas reiterer ‘2550 cardter © conteddo historico, mesmo a des- Deito da industralizacso, Culturatmentee, a seguir ecanomicament, o todo dda sociadade, Assim, surgem a cidade, 4 socie- ‘fade e 0 Estado burgueses na histiria, gevalmente nessa ordem (Moreira, 2011 ¢ 2013), Nao vem junto com a cidade, enttetanto, © ur- bano. Este significa um quadra sociale cultural de exsténcia, que funda na cidade e em simulta- ‘edad no campo um modo de vida de qualidade ‘material nova, que por decorréncia chamamas “um modo de vida urbano”. A revolugéo burguesa cria um.modo citadino, mas é a revolugo popular {que 0 recria como um modo urbano de vida. Fac. litada pelo foto de 2 face econémica da revolugao instalar nos tugiris industria da cidade os Prorios agentes do urbano na forma do campe- inato proletaizado, uma revoluedo sequencia-se ‘a outa. A revolucdo urbana néo vem, pois, das ‘mos da revolugdo burguesa, mas da ro des, Portadores da farca de trabalho barata que val Imovimentar a cidade e que por si mesmo a terdo de fazer. Convertendo assim o diveto burgués & ‘sonst utbaneno Brasil Ec £7 um dito popular ap ube des ‘Sen inteeuzindo na souedae componente = “oto vce bene sae turgics evs omar ‘Basi cde squat crit, mas jet ots cu a smear. Areebyo bgere ae jose se domi de acer Ga bres tes Srocoe come ars nee cone ura SoS tegin cots qos nasa cere SEA Aetae tana da sta SSoseate ess arora rece paste lacdo. Ea cidade 60 funda formador da ideologia ace que mata, pr ao ade SSeS frestecate do dav on ante vies de ente de geografia politica mesmo ee Saracen camp aso SESE to te nda um eo ee ito pir ecele sre espa nee otora 03K" ee sere bine wr ee rasan 2 roar Soe Sale po ce oandectnare- Fee aad oubano sez UM seen era ciege doin, 0 ce recon decade pret See elfen cOe- ere saindeordent ae so SS ene tae Sra seen ee Gactiinoda miner —2 Scam, Ea elite senhorial que prociama a abolica0 eee un qn metus deescas a sono tne atrae fs cee nee nection ‘Sra o fagam. E a elite oligarquico-monarquica ae totea ots qese mesa rr meebo temo | separagdo cidade/urbano que assim se forma & Se soso za chega, todavia, 20 seu limite quelta- ve przcisamente no limite quantitativoatingido ele forma Seauers sto cidades médias, e estas, andes Terrépotes par sua vez. O espaco disperso do Ses0 € 6 transformado mo espago nacional in cistintas e aistantes. ‘acolerade e de afogaeilho comma se de > soanizacao demogratia. As vilas © povoads do “Sezsada s80 hoje uma rede de cidades. As cidades Srsce de hoje Gantos, 1993). E, nao obstante, “zee e urbano seguem sendo realidades geogré- lta dus tea no mis 9022 stam Eo gronpaets rararans tones ena eee ee ease mila niente estore arsis, antes que estas por si mesmas.o facam. E ume Sena acnce thos pine veeedencnere i Cee ioc ht ae nee Si perso eno> SS omar pueon care se eign ae aca cra i atop wae me Por uma cidade de modo de vida urbano (0 que seria um problema de incompietde urbana permanente vira ent8o um forte entrave Gociopoltion na vide do pova brasileiro. Efelto da Cultura politica do federalsmo no mode como fete se implantou, a ineompletude urban € uma ‘caugdo da cidade na forma histérica como esta foi 6 agora. Urge, assim, transtormé:ta “Tudo ver do modo hisiérica camo murtcipio ‘e Unido, enquanta entes exteros da federacao, fe conectam em seus concertos de relac8o Po- Ita, hoje engaiada na politica arcementiia {que os ineriga. Os recursos s#0 vansferids dos _municipios (eestados) para a Uniao, de modo {ue pelos cAlcuios reciprocas de relacao re. celte-cespese, nem sempre compatives com as ‘orefas respectivas dos implementos de politicas publicas, retornam por redistribuigdo da Uniao 20s Tn ciplos. Tel mode constituclonal vigonte de clsponibilizagdo e uso do recurso pibico apenas ‘eitere © que tam sido a politica coronelista que fez a cidade, sua sede paltica, e do urtiano, o seu 12 exciuldo, Cabem aos municipios as des esas de cunhoefetimente urbano, e & Uniao, as de grande transparéncia paisagistica, Um dis- ‘riduigdo de tarefas que ao fim alimenta um tenaz {ogo de manipulagéo politica. &é tarefe da Unido, uma vez concentrados os recursos trbutérios mu Dicipals, estacuais e federals em suas maos, 1edis- tribui-los segundo os termos contratuais que veem @ cidade como 0 focus prioritirio de alocacso cas ‘recursos mediante poltcas sociais efetuadas pelos municipios. A despesa & municipal, a caneta &, todavia, federal. Foi a constatacdo desse federalisma e sous efeitos cissaciativos da cidade e do urbana que ‘motivou e moveu os protestos de junho. Ques- tionase a forma e a natureze de cidade e urbane ue femos. Denuncie-se 0 divdrcio entre o direita @ cidade eo direito ao urbane. Preconiza-se um ‘modelo novo de cidade que seja um modelo ae "00 Ge vids urbano. Rejoita-e 0 mode histérco de fazer politica, locallzanda-se na monstrévolis (em que se transformou a grande concentraedo da Populagéo brasileira nas cidades metropolitanas) "no mais que uma urbanizacia demogratca sem Vi acompanhada ~ tal qual a abolicao da escra. valura que néo viu a reforima agraria~ de uma \ubenizagéo da cidade, almejando-se a revolugso Urbana que nao howve. 26 Retencts ldo Aevedo, As cides’ in: Brasil teva 0 omem, ‘1 Sao Paulo: Companhia Estos Navona 199, plge15e) Festa Pichas Giger, Evolve as re urbane basi, Ri de Jers. COPENNEPMEG, 1963, Hen Lefebwe, Otero a sade, $0 Palo: Ctra Documenta, 2968 ~ A reveups0 wars, Bol Heron: Humanitas & Eiora UFMG, 1998 ete Wunes Leal, Cormetismo, ented e voto, So Pas toe aite Omega, 1975 uy Morea, Societe epa;0 gegen no Bras, So Pau: Ets Contato, 2011 ~ Omouinsno pert e = quedo cidade-camoo ‘to Brasil. casss urtanase ais mo formorse 0 eecerotia perils base, Rio de Jane, Conseautnea, 2013 ion Santos, 4 uitoniae so ras, Sao Paulo: Esirs NucTeC, 1988 uy Moreira postr pxmanent do Posrama de Ps: -Brsduaco em Grograia da UF © protessurvgtnte doa (urges do eradagso cps crag an Geomaa so rFy eR

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