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VICTOR FERREIRA CARDOSO DIAS

ANÁLISE DOS CASOS DE INÊS ETIENNE ROMEU E ANDOR STERN

Trabalho Final apresentado ao Professor


ALEXANDRE PEREIRA DA ROCHA, como
requisito avaliativo da disciplina de
“Humanidade, Sociedade e Ética”, no 3º
Módulo de 2020, no curso Tecnológico em
Logística.

2020
É assustador e aterrorizante analisar os casos de Inês Etienne Romeu e de
Andor Stern. Casos que aconteceram com uma diferença de décadas e mais de
9.000 quilômetros distância, mas com o mesmo enredo. Línguas distintas, culturas
diferentes, mas atitudes semelhantes, humanos se agarrando a uma moral
distorcida, renunciando à ética e tratando pessoas diferentemente de pessoas.
No primeiro caso analisamos a situação de uma mulher, negra, trabalhadora,
brasileira, que por lutar por seus ideais, sofreu na mão de homens, militares,
paramilitares, brasileiros. Foi perseguida, capturada, humilhada, torturada,
estuprada. Tentou o suicídio diversas vezes por não aguentar toda a dor física e
psicológica que sofria constantemente.
Ela foi viveu todas essas barbáries sem ter sua prisão oficiada. Após pouco
mais de 90 dias passando situações indescritíveis, fingindo concordar com seus
torturadores para trabalhar como infiltrada para o Centro de Informações do
Exército, foi libertada. Doente, Inês foi levada ao hospital onde teve então sua prisão
oficializada.
Após pouco mais de 8 anos, Inês Etienne começou sua luta para mostrar
esse lado sombrio da História Brasileira. Com a ajuda da OAB, ganhou voz. Tornou-
se a Voz dos torturados e mortos na ditadura militar brasileira. Em 2003, sofreu um
atentado contra sua vida, possivelmente, por seus algozes que desejavam calá-la.
Inês foi encontrada desmaiada e ensanguentada, com traumatismo cranioencefálico,
depois de receber a visita de um, suposto, marceneiro contratado para um serviço
doméstico. Em 2009, recebeu o Prêmio de Direitos Humanos, na categoria “Direito à
Memória e à Verdade”, outorgado pelo governo brasileiro.
No segundo caso é analisado a história do brasileiro nato, Andor Stern, que
aos 13 anos de idade, fugindo da perseguição na Hungria, terra natal de seus pais,
foi capturado e viveria cerca de um ano no campo de concentração em Auschwitz,
na Polônia. Auschwitz é o maior e mais cruel símbolo do Holocausto. Calcula-se que
mais de 1 milhão de pessoas, judeus em sua grande maioria, tenham morrido de
fome, doenças ou em câmaras de gás no complexo de 40 campos de concentração
de Auschwitz.
Os relatos de Andor são impactantes. Ele fala da degradação física e
psicológica sofrida por ele e seus conterrâneos. Devido a tanto sofrimento, com
apenas 13 anos de idade, devido a perdas irreparáveis, como seus avós, seu tio e
sua tia grávida que foram levados diretamente para a Câmara de Gás (pessoas
abaixo de 12 anos de idade e acima de 55 anos de idade eram sumariamente
exterminadas), devido à perda de sua mãe, após certo período na prisão de
Auschwitz, o levaram a tentar cometer suicídio jogando-se contra as cercas elétricas
que cercavam o campo de concentração.
Stern foi impedido de tirar a própria vida. Ele escapou da morte e aos 14
anos de idade escaparia novamente ao ser poupado por ter um porte atlético
ocasionado pela prática de esportes no passado e começou a trabalhar
compulsoriamente. Foi selecionado pelo próprio Josef Mengele, notório membro da
equipe de médicos responsáveis pela seleção das vítimas a serem mortas
nas câmaras de gás e por realizar experimentos humanos mortíferos em
prisioneiros, conhecido como “Todesengel” (O Anjo da Morte), para trabalhar em
uma fábrica de produção de gasolina. Certo tempo depois, Andor, foi escolhido por
uma comissão para trabalhar no Gueto de Varsóvia com objetivo de recolher tijolos
inteiros para ajudar na reconstrução da Alemanha, que já estava sob ataque. Não
existiam mais olarias para fornecerem os tijolos devido aos sucessíveis bombardeios
sofridos pela Alemanha. O extermínio era por meio do trabalho forçado.
Esses casos guardam semelhança entre si e com a história de vida do filósofo
judeu lituano, naturalizado francês, Emmanuel Lévinas. Lévinas passou por
situações semelhantes de Andor Stern e de Inês Etienne Romeu. Todos beberam do
mesmo cálice amargo da moral tortuosa do ser humano e sobreviveram para nos
ensinar a ter sensibilidade ética e moral, além de que devemos ser responsáveis e
justos com as outras pessoas.
As éticas tradicionais concentram-se no Eu, como um egocentrismo
endêmico.  Na modernidade, o Eu toma o lugar do ser e inflige uma violência insólita
para com a outra pessoa. A pessoa que sofre a violência passa a perder sua
humanidade gradativamente. Ela cria uma realidade própria que aceita a forma de
tratamento e todas as aflições impostas pelo Eu violento da pessoa que julga ser
superior e que não reconhece a humanidade da pessoa violentada. Assim o Outro
torna-se o Eu e tudo aquilo que o Eu presa. O homem chega ao ponto de deixar de
homem, perde totalmente sua humanidade.
A filosofia do poder, que levou ao totalitarismo, é injusta quando não
questiona o poder, o Eu. O ser humano consegue se transformar em exterminadores
da própria raça. Não há uma ética verdadeira quando não se olha para o outro. O
mundo não é constituído de apenas um indivíduo, uma língua, um povo, uma
cultura, um território. O mundo é formado por indivíduos de diversas línguas e
povos, de diferentes culturas e territórios, que juntas formam um coletivo. Há a
necessidade do ser humano se relacionar com outro ser humano.
O clamor de Inês e Andor pela responsabilidade e pela justiça de tudo o que
passaram e viveram, tornou-se um clamor pela verdade, por mais dura e
vergonhosa que possa ser. Ambos lutaram pera a Voz dos Excluídos chegassem
aos ouvidos da sociedade. Conseguiram. Agora vivem com o sentimento de dever
cumprido.
A humanidade nos indaga a sermos pessoas justas, a acolher o outro como
outro, respeitando-o com ser humano, de paramos de salvar as aparências. Não
podemos fugir de cuidar do outro assim como cuidamos de nós mesmos.  o outro
não é "isso" ou "coisa". Ele é pessoa humana que merece reconhecimento,
tratamento respeitoso e dignidade, pois todos somos seres humanos.

Referências

INÊS ITIENNE ROMEU. Memórias da Ditadura, 2020. Disponível em:


<http://memoriasdaditadura.org.br/biografias-da-resistencia/ines-etienne-romeu/>.
Acesso em: 05 de setembro de 2020.

RELATÓRIO DE INÊS ETIENNE ROMEU, ENTREGUE EM


05/09/1979. CONSELHO FEDERAL DA ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL.
Comissão da Verdade do Estado de São Paulo, 2020. Disponível em:
<http://comissaodaverdade.al.sp.gov.br/arquivos/documentos/048-relatorio-entregue-
por-ines-romeu-a-oab-rubens-paiva>. Acesso em: 06 de setembro de 2020.

DEPOIMENTOS DOS FAMILIARES E AMIGOS DE INÊS ETIENNE ROMEU.


Comissão Nacional da Verdade, 2014. Disponível em:
<https://www.youtube.com/watch?v=MCxW3W0Qu9w&t=744s>. Acesso em: 06 de
setembro de 2020.

AUSCHWITZ: SOBREVIVENTE BRASILEIRO DESCREVE HORRORES DO


CAMPO DE CONCENTRAÇÃO. British Broadcasting Corporation (BBC) News
Brasil, 2020. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=q0ULzaJtuec>.
Acesso em: 08 de setembro de 2020.

HOLOCAUSTO: O ÚNICO BRASILEIRO SOBREVIVENTE. Mulheres, 2019.


Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=lrnP_j5ePFU>. Acesso em 08 de
setembro de 2020.

O ÓDIO NÃO RESOLVE NADA. Isto é, 2020. Disponível em: <https://istoe.com.br/o-


odio-nao-resolve-nada/>. Acesso em 09 de setembro de 2020.

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