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A morte, o ponto final da sequência definida de atos, reveste cada ato particular de sentido,

e o entrelaça com os atos vizinhos, confere a capa e a contra-capa de cada biografia. Mais
do que isto, é a voz final que confere o sentido absoluto a cada um dos atos, removendo
qualquer possibilidade de modificação, confere à uma vida a imagem estática, passível de
ser contemplada, e amada, que digo eu? É a base da felicidade de uma alma imortal
quando moralmente reta. A imortalidade corporal não é somente uma contradição ao
sentido real de felicidade, é a própria definição do estado infernal, não é à toa que a
representação do inferno na cosmovisão cristã é composta por um sujeito queimando, tendo
recepções corporais intoleráveis, e limitado pela forma delineada do corpo e de seu
funcionamento circuncidado, já o paraíso, pelo contrário, a ausência de corpo, uma
imortalidade que reduz-se à consciência contemplativa dissolvida no ser absoluto. A morte é
a recompensa dos justos, e a punição dos injustos. Cada vida particular possui uma
vocação que lhe é própria, uma coordenada de ações significativas que cabe somente a ela
fazer, não podendo ser substituída por nenhuma outra vida, que a imortalidade faz com
isto? Reduz a nada. Exclui o fim que Deus impõe a cada ser humano, exclui a satisfação
em toda sua plenitude que só pode ser o efeito do dever cumprido, como haverá dever
cumprido se a vida corporal não possui fim? A morte, de fato, é a maior dádiva.

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