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No Brasil o 

charlatanismo é um tipo penal, tipificado no


artigo 283 do Código Penal Brasileiro, tratando a matéria
no capítulo dos Crimes contra a incolumidade pública e não
naquele referente às fraudes.
Título: Dos Crimes contra a Incolumidade Pública
Capítulo: Dos Crimes contra a Saúde Pública
Pena: Detenção, de seis meses a 2 anos

Art. 284 - Exercer o curandeirismo:


I - prescrevendo, ministrando ou aplicando, habitualmente,
qualquer substância;
II - usando gestos, palavras ou qualquer outro meio;
III - fazendo diagnósticos:
Pena - detenção, de seis meses a dois anos.
Parágrafo único - Se o crime é praticado mediante
remuneração, o agente fica também sujeito à multa.

Professor Orientador: Ricardo Martins – Doutorando pela


Universidade Mogi das Cruzes – UMC, Mestre em Direitos
Fundamentais pela UNIFIEO, Especialista em Direito Penal e
Direito Processual Penal pela Pontifícia Universidade
Católica de São Paulo – PUC.
 
Resumo: Descreve-se como a liberdade religiosa pode ser
utilizada por criminosos para adquirir benefício próprio e
partindo-se do conceito de liberdade religiosa e
estelionato, tem por objetivo propor a reflexão ao que
concerne o crime de estelionato religioso no qual se dá
ênfase aos atos de líderes religiosos que pedem para que o
fiel dê dinheiro ou outro bem para que em troca receba uma
benção, gerando dano ao patrimônio particular da vítima.
Conforme pesquisas do IBGE quantificando cada segmento
religioso, bem como relatos de pessoas religiosas sejam
líderes ou não exemplificando como ocorre o estelionato
religioso e matérias jornalísticas, foi possível entender a
dimensão da temática, com isso, a informação tem chegado a
muitas pessoas que tem tomado coragem para denunciar tais
práticas. E quanto mais pessoas souberam do fato, outras
mais perderão o medo e denunciarão também. Portanto, quanto
mais se falar e mais investigar este assunto, mais pessoas
terão acesso à informação e poderão agir de forma correta
para reduzir casos de estelionato religioso e inibir essas
práticas.

Palavras-chave: Estelionato.  Liberdade religiosa.


Charlatanismo, Curandeirismo. Patrimônio particular.
 
 
Sumário: Introdução. 1. Conceito de estelionato. 2.
Conceito de liberdade religiosa. 3. Liberdade religiosa na
constituição de 1988. 4. Abuso da fé no brasil. 5. Tipos de
religião no brasil. 6. Práticas religiosas ilícitas. 7.
Estelionato religioso. 8. Charlatanismo. 9. Curandeirismo.
10. Casos concretos. 11. Modus operandi do estelionato. 12.
Penas. Considerações finais. Referências bibliográficas.
 
INTRODUÇÃO
Vemos habitualmente nos noticiários fatos gerados por
pessoas egoístas que furtam, roubam e muitas vezes matam
para adquirir proveito para si mesmo, em sua maioria, um
proveito material. Da mesma forma, existe um grupo
determinado de pessoas que se aproveitam de situações no
meio religioso, através de cultos e/ou liturgias, para
conseguir vantagem ilícita, sendo as vítimas induzidas ao
erro por aqueles que se dizem pregadores da fé distorcendo
os reais valores e princípios de determinada religião.
Claramente não se pode dizer que todas as pessoas são
assim, que todos os pregadores da fé são golpistas ou que
todas as religiões e denominações são desonestas e
aproveitadoras. Não podemos generalizar, mas devemos ser
realistas e assumir que, sim, existem golpes religiosos.
É pelo exposto, que o presente artigo científico tem como
objetivo demonstrar e analisar fatos sociais, em especial,
aqueles ocorridos no meio religioso praticado por pessoas
com má índole e que se aproveitam das dificuldades
enfrentadas pelos fiéis para a prática de atos ilícitos
abusando do direito à liberdade de religião que é direito
fundamental conforme nossa Carta Magna em seu artigo 5º,
consagrado no inciso VI. Com base nisso, este artigo
pretende enfatizar que apesar de ser um direito adquirido,
não se pode ultrapassar os limites legais, bem como
esconder as práticas criminosas se valendo do argumento de
direito à religião.
Pretende-se, também, seguir uma ordem temática para melhor
compreender o conjunto da obra, visto que há um escasso
conteúdo sobre o assunto de Estelionato Religioso, o que se
mostra ainda mais necessário que abordemos essa questão.
Visa, então, conceituar os principais títulos e fundamentar
para maior credibilidade do artigo. Este artigo será
dividido em Títulos e Subtítulos visando melhor compreensão
acerca do tema a ser desenvolvido.
 
 CONCEITO DE ESTELIONATO

Seguindo as palavras do nosso ordenamento jurídico, no


Código Penal, em seu artigo 171, o estelionato se
caracteriza em “obter, para si ou para outrem, vantagem
ilícita, em prejuízo alheio, induzindo ou mantendo alguém
em erro, mediante artifício, ardil, ou qualquer outro meio
fraudulento.”. Ou seja, quando um indivíduo, sem uso de
força, se utiliza da fraude e de sua influência como meio
de adquirir vantagem sobre alguém, de fazer com que essa
pessoa lhe dê bens, dinheiro ou algum outro patrimônio da
vítima.
É um crime que envolve a vítima, a faz acreditar que dar o
bem ou dinheiro ao criminoso é a coisa certa a ser feita,
pois a intenção do criminoso é enganar a vítima para
aplicar golpes e fraudes a fim de adquirir o patrimônio
desta.
Neste crime, com base no artigo 171 do Código Penal, se faz
necessário quatro pontos principais para que possamos o
classificar como estelionato, os quais são:
1. Adquirir vantagem ilícita sobre o patrimônio da vítima
2. Causar danos à vítima
3. Que seja ardiloso, fraudulento, enganoso.
4. Levar a vítima a cometer erro.

Tais características são muito fáceis de serem cometidas o


que faz com que o crime seja praticado com mais
regularidade e facilidade, visto que qualquer pessoa pode
praticá-lo, por isso o chamamos de crime comum, pois
qualquer pessoa pode cometer este crime e qualquer pessoa
também pode ser vítima do mesmo, basta que tenha sofrido
prejuízo patrimonial.
Conforme já citado acima, o artigo 171, do Código Penal
Brasileiro, nos dá o tipo penal com seu conceito e também
com suas penas, sendo Reclusão de 1 à 5 anos e multa. No
mesmo artigo, existem algumas particularidades quanto à
pena, como por exemplo no caso de o criminoso ser réu
primário e o prejuízo que este causou a vítima seja
considerada de pequeno valor, o juiz pode não aplicar pena
de reclusão, mas de detenção, pode também reduzir a pena ou
tão somente aplicar multa, entraremos com mais afinco no
quesito de pena mais à frente deste artigo.
Retornando ao conceito e suas características, o
estelionato não precisa seguir o padrão criminoso engana
vítima para pegar seu dinheiro para ser considerado
estelionato, se alguém vende algum bem que não lhe pertence
a outrem ou então se vende algo próprio, promete entrega e
não o faz; ou se um prestador de serviços é contratado para
um determinado fim e não tem capacidade de o fazer e ainda
cobra tal serviço, isso também é considerado estelionato.
 
 CONCEITO DE LIBERDADE RELIGIOSA

Entende-se como liberdade religiosa aquela na qual você tem


liberdade de professar sua fé, seja qual for a religião,
liberdade de realizar cultos referente cada crença,
liberdade para mudar de religião, liberdade para não ter
religião ou ser ateu, estando diretamente ligada ao
laicismo. Essa liberdade é garantida por Leis, podendo ser
diferentes conforme entendimento de cada Estado. A
liberdade religiosa pode até ser considerada como uma
liberdade de consciência, de pensamento, pois é também uma
forma de viver com seus princípios éticos e morais.
Conforme artigo 5º da Constituição Federal, o Brasil é
oficialmente um Estado Laico, ou seja, um país neutro com
relação a religião, com opiniões imparciais e sem
discriminação de qualquer crença. Valendo lembrar que ainda
que um país tenha uma religião centro, pode haver liberdade
para que outras pessoas tenham outra religião ou nenhuma,
como por exemplo, a Dinamarca. Outro exemplo é o Vaticano,
que é um Estado teocrático, sendo então a religião a
comandar a política do país, o contrário da Dinamarca no
qual a religião não é tão predominante e o domínio do país
está na política.
Ainda que se entenda que o Brasil tenha extensa liberdade
religiosa, não se pode deixar de lado a questão da
limitação de tal liberdade, sim, limitar essa liberdade se
faz necessário em vista de práticas consideradas ilícitas,
criminosas e ilegais que alguns indivíduos tendem a
praticar em nome de sua religião. Portanto, deve haver
punição para aqueles que praticam atos indevidos, ainda que
diga que sua motivação foi a crença, como por exemplo
sacrifícios, incitar o ódio e violência, entre outros.
Dessa mesma maneira, agem os terroristas que se utilizam de
determinada religião para propagar o extremismo e
violência.
 
 LIBERDADE RELIGIOSA NA CONSTITUIÇÃO DE 1988

Nossa Constituição Federal de 1988 em seu artigo 5º, inciso


VI, resguarda como um direito fundamental a liberdade
religiosa e dá a seguinte redação:
“Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de
qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos
estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do
direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à
propriedade, nos termos seguintes: 
VI –  é inviolável a liberdade de consciência e de crença,
sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e
garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de culto
e a suas liturgias”.
Este dispositivo constitucional que traz o direito
fundamental de liberdade à religião e garante tal liberdade
como um direito inviolável, é para alguns juristas, uma
liberdade primária. O inciso VII já traz a questão de
assistência religiosa e também não permite privação de
direitos por causa de crenças. Depois deste artigo mais
conhecido, temos os artigos 19, inciso I; e 150, VI, alínea
b, que limitam algumas ações dos entes federativos no tema
religioso, inclusive, o artigo 120 estipula como matéria
facultativa o ensino religioso em escolas públicas de
ensino fundamental. Mais adiante, encontramos no artigo
226, §3º que garante o casamento religioso com efeito
civil.
Diante da importância deste direito estipulado em nossa
Constituição, se pode concluir que o Brasil é um Estado que
visa proporcionar harmonia na sociedade, não permitindo
preconceitos e extremismos no quesito crença-religião. Não
obstante, há uma grande distinção entre Igreja e Estado,
que é uma característica do Estado Laico, no qual por um
lado tem-se um país que não opta por religião central e por
outro lado, dá-se a possibilidade a sociedade de escolher
qualquer que seja a crença, com proteções e garantias do
Estado. Ressaltando que no âmbito político não se pode
haver pessoa que tenha alguma aliança ou vínculo com
qualquer instituição religiosa. Nesse sentido, apesar de
haver tal impeditivo, Jorge Miranda entende que não há como
separar o direito à liberdade de religião do direito à
liberdade política, pois, segundo ele, “onde falta a
liberdade política, a normal expansão da liberdade
religiosa fica comprometida ou ameaçada”. (MIRANDA, 1988.
v. 4, p. 348).
Não se pode dizer que o Estado ofereça esse direito como
uma forma de beneficiar somente o indivíduo, mas
claramente, como principal objetivo o de intensificar no
país a união familiar, valores morais e éticos como forma
de tornar a sociedade mais empática e caridosa. Porém,
apenas em tese isso faz sentido, a realidade vivida
atualmente é outra, e é isso que abordaremos mais adiante.
 
 ABUSO DA FÉ NO BRASIL

Do termo latim “fide”, a fé é acreditar em algo que não se


pode comprovar, é a crença, a confiança em algo como uma
verdade incontestável. Se há dúvida, não há fé, visto que a
característica principal desta é crer indubitavelmente.
Também pode-se entender como fé a crença de que as coisas
podem mudar de forma positiva, há esperança.
Em contexto religioso, a fé cristã, por exemplo, é baseada
na crença da Bíblia Sagrada e fé em Deus, no qual podemos
exemplificar com o contexto da Bíblia no livro de Hebreus,
capítulo 11, versículo 1, que diz “Ora, a fé é o firme
fundamento das coisas que se esperam, e a prova das coisas
que se não veem”, já em contexto jurídico, o termo “fé”
pode remeter a diversos dizeres neste âmbito como a “boa-
fé” que é quando alguém age honestamente, de forma honrosa;
ou “dar fé” quando se tem a intenção de afirmar que tal
fato é uma verdade.
É possível crer em diversas coisas além de Deus ou Diabo,
como é comumente discutido, é possível crer em objetos,
animais, natureza, filosofias e diversos outros e por ser
algo exclusivamente dependente de uma confiança em algo que
não se vê, a ciência não se encaixa com o pensamento da fé,
pois a ciência crê naquilo em que se vê e que se possa
comprovar.
Dito isto, o abuso da fé nada mais é que ultrapassar os
limites da fé, no sentido em que alguém se utiliza deste
meio para satisfação pessoal com intuito de persuadir,
enganar ou até ferir outrem, se aproveitando do contexto de
crença em que está inserida.
Pode-se perceber que a fé, de modo geral, está banalizada
diante de tanta enganação feita por pessoas que se dizem
ser autoridades espirituais, estes utilizam a fé para
persuadir os fiéis e adquirir a satisfação própria, como
por exemplo, o uso da fé para obtenção de votos, em sentido
eleitoral.
 
 TIPOS DE RELIGIÃO NO BRASIL
No Brasil há uma grande diversidade de religiões com seus
direitos garantidos pela Constituição de 1988, com base nos
dados informados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e
Estatística – IBGE, a religião predominante no país é a
católica que abrange 64,6% (123 milhões aproximadamente) da
população brasileira, sendo os demais 22,2% de evangélicos
(cerca de 42,3 milhões), 2,0% espíritas (3,8 milhões),
umbanda e candomblé 0,3% e sem religião, cerca de 8% (15,3
milhões) se enquadrando aqui os agnósticos, ateus e
deístas; e “outros” cerca de 2,9%, incluso o budismo que
representa aproximadamente 243.966 seguidores. Quanto ao
judaísmo, há cerca de 107 mil seguidores; aos indígenas 65
mil tradições; islamismo com 35 mil e 5 mil são do
hinduísmo. (Governo do Brasil – IBGE 2010). Há também
relatos de pessoas com religião baha’ís e wiccanos, porém
não se sabe determinar ao certo a quantidade de pessoas que
seguem essas religiões.
Ainda segundo os dados do IBGE, os católicos estão
concentrados nas regiões do Nordeste e Sul do país, sendo
que o Piauí tem certa de 85,1% e o Rio de Janeiro com a
menor proporção com cerca de 45,8%. Do âmbito protestante,
considerado o segundo maior depois do catolicismo, há
divisões entre batistas, presbiterianos, adventistas,
luteranos, metodistas e a cada dia se encontram mais ramos
do protestantismo. Segundo o IBGE, este segmento cresceu de
forma significativa nos últimos anos apresentando um
aumento de 61% dos fiéis entre 2000 e 2010. A terceira
maior religião no Brasil é o espiritismo, que em 2010
contava com cerca de 4,8 milhões de pessoas, é também o
segmento que têm maior renda e escolaridade.
Por ter a liberdade de religião, o Brasil conta com esta
diversidade de crenças, ainda que em sua maioria seja uma
população cristã, conta com outras religiões parecidas e
outras completamente diferentes.  Foi mencionado acima as
três principais religiões predominantes no Brasil, mas isso
não retira a importância das demais, como o Islamismo que
conta com mulçumanos que podem ser de imigrantes sírios à
palestinos, egípcios e africanos. De acordo com líderes
desta religião, estima-se certa de 70 a 300 mulçumanos no
país que podem ou não ser islamistas. Há que se falar
também no judaísmo, que representa cerca de 107 mil
seguidores, segundo o IBGE. Esta religião, ainda que
parecida com o cristianismo em alguns pontos, se trata de
religião diferentes, além de alguns costumes e doutrinas
diferentes, seus seguidores acreditam em Jesus, mas não
como um messias, assim como os cristãos acreditam, para os
judeus, Jesus não cumpriu inteiramente com as profecias
estabelecidas. Outras religiões conhecidas são a Umbanda e
o Candomblé, que se tratam de religiões afrodescendentes e
que apesar de estarmos em um país laico que não deveria
fazer distinção de crença, estas religiões ainda sofrem
muito preconceito e violência, talvez por justamente serem
de origem africana. Dentro do Candomblé há diversas
divisões, sendo algumas delas o Batuque e o Xambá que foram
trazidas pelos escravos que cultuavam seu deus e outras
divindades. Já a umbanda é considerada por seus seguidores
como a única religião brasileira, pois segundo eles, ela
nasceu no Rio de Janeiro. Outra religião interessante é o
Neopaganismo, que são as Wiccas, Ádatrús e Neo-druidismos,
sendo a Wicca relaciona a bruxaria moderna, tendo um
crescimento maior no Rio de Janeiro, Nordeste e São Paulo,
segundo o IBGE estas religiões estão dentro do número de
esotéricos, outras religiões ou religiões não determinadas,
chegando num total de aproximadamente 700 mil seguidores. E
então chegamos a população que não tem religião, em sua
maioria declaradas como ateias, porém, há aquelas pessoas
também que creem em algo, porém optam por não escolher uma
determinada religião. A predominância de pessoas sem
religião se dá novamente no Rio de Janeiro, conforme IBGE.
 
 PRÁTICAS RELIGIOSAS ILÍCITAS

Houve um distanciamento da real essência da fé e com isso é


cada vez mais comum ver pessoas, geralmente consideradas
líderes agindo de forma persuasiva envolvendo as pessoas,
por exemplo, para entregar ofertas e as vezes até seus
objetos pessoais como uma maneira para Deus abençoar mais.
Por outro lado, há pessoas que vão muito mais além e vendem
um “pedaço do céu” ou “água milagrosa”, estes são
considerados, de fato, “falsos profetas” ou juridicamente
falando, estelionatários. São inimigos da fé em sua
verdadeira essência, no qual se contradizem, utilizam de
textos fora de contextos para adquirir de alguma forma
benefício próprio.
Não se trata de atos isolados e vem ocorrendo há mais tempo
do que se pode imaginar, porém, somente nos últimos tempos
que ficou escancarado tais atos ilícitos por meio da fé de
modo geral. Essas pessoas distorcem a fé e ensinamentos de
determinada religião-crença e propagam um ensinamento de
prosperidade, de recompensa ou até de cura, que não é nada
mais, nada menos que um enriquecimento ilícito de pessoas
que deveriam ensinar a caridade, a humildade, mas não o
fazem. Já não se trata mais de uma vida espiritual ou
religiosa, mas sim de um negócio que tirou toda a essência
da fé e banaliza e ridiculariza a crença de muitos,
chegando a ser controverso dizer para aqueles que creem,
que a vida miserável deles irá mudar se derem todos os seus
bens para determinada entidade religiosa, pois qual é o
sentido do líder enriquecer enquanto a comunidade
empobrece?! Por outro lado, há pessoas que enriquecerem,
mas através de seu próprio trabalho que independe da
religião ou do engano de fiéis.
 
 ESTELIONATO RELIGIOSO

É extremamente fácil enganar as pessoas, ainda mais quando


a vítima está em situação delicada, seja financeira,
emocional, física. Quando um indivíduo pratica um ato
fraudulento, quando induz alguém a erro com objetivo de
obter vantagem ilícita por meio da fé, isso se torna um
estelionato religioso.
Atualmente é muito comum ver em igrejas os pastores dizendo
que os fiéis devem dar o dízimo para que Deus abençoe sua
casa, ou então pais de santo ou espiritualistas que
prometem algo, um amor de volta, uma cura, em troca de uma
vantagem própria, ainda que sua promessa seja vã e que não
seja milagrosa. O estelionatário pode consumar o ato
ilícito ou não, no caso negativo, é admitida a tentativa de
estelionato, visto que o fato somente não se consumou por
vontades alheias à vontade do agente. Esses atos acontecem,
pois, o criminoso se sustenta debaixo da garantia da
Constituição Federal de uma liberdade religiosa, sem
distinção. O que é um tema delicado, pois temos dois
direitos envolvidos, temos a liberdade religiosa e temos o
direito a proteção do patrimônio particular, no caso do
estelionato e proteção à saúde no caso do charlatanismo.
Segundo o Teólogo, Escritor e Mestre em Ciências da
Religião, Ed René Kivitz, muitos líderes religiosos
conseguem enganar fiéis através dos três pilares “culpa,
medo e ganância”. Essa é chave do estelionatário religioso.
Para Kivitz, a religião “tem um potencial diabólico
escravizador que é um campo para oportunista mau caráter”,
ele continua o pensamento dizendo que “esse mecanismo
religioso é um instrumento de manipulação, especialmente
das pessoas que sofrem e que estão abatidas pelo peso da
sua culpa”.
A religião em nosso país está deturpada e perdendo sua
essência, por causa de pessoas manipuladoras e criminosas
que usam a fé de pessoas humildes para adquirir benefício
para si de forma esdrúxula e ilegal. O nosso ordenamento
jurídico claramente condena essa ação fraudulenta em seu
artigo 171 do Código Penal que estabelece como crime a
obtenção de vantagem ilícita no qual se induz alguém a erro
mediante artificio, ardil ou qualquer outro meio
fraudulento. Além do Estelionato, há o charlatanismo que,
conforme o artigo 283, do mesmo Código, se configura em
alguém anunciar uma cura infalível, e tenta ludibriar a
vítima. Diante disso, percebe-se que o ordenamento jurídico
brasileiro zela sim pela liberdade religiosa, mas acima
disso, se comprovado ato que remeta lucro ilegal e fraude
com intenção puramente de obter vantagem ilícita e não uma
intenção religiosa, de fato, não cabe a estes ser amparado
pelo direito constitucional de liberdade religiosa, mas
cabe sim ser julgado por ação criminosa.
 
 CHARLATANISMO

Conforme Dicionário Aurélio, a palavra charlatanismo


significa uma “exploração da credulidade pública através da
venda de produtos e/ou serviços incapazes de curar
doenças”, em outras palavras, como já mencionado
anteriormente, o charlatanismo é quando um indivíduo
promete uma cura infalível para alguém com alguma doença,
mesmo sabendo que não há eficácia no método, pois quase se
sabe, o crime irá se enquadrar em exercício ilegal da
medicina (artigo 282, CP). Com base no artigo 283 do Código
Penal, é o ato de “inculcar ou anunciar cura por meio
secreto ou infalível”. Tendo como pena prisão de 3 meses a
1 ano. O charlatão se encontra em todas as religiões e
crenças e visa sempre o lucro tão somente, cometendo crime
contra a saúde pública. Isso porque todo método precisa ser
previamente estudado, replicável e validado pela ciência,
dessa forma, são descumpridas regras básicas no quesito
saúde.
O crime se encontra na questão da promessa de cura secreta
ou infalível, esse é o charlatanismo, não tão somente dizer
que vai curar, mas sim garantir a cura através de um método
100% eficiente, sendo parecido com o curandeirismo.
 
 CURANDEIRISMO

O curandeirismo se trata de um crime, também, contra a


saúde pública que se encontra tipificado no artigo 284 do
Código Penal, no qual dispõe:
“Art. 284. “Exercer o curandeirismo:
I – Prescrevendo, ministrando ou aplicando, habitualmente,
qualquer substância;
II – Usando gestos, palavras ou qualquer outro meio;
III – fazendo diagnósticos:
Pena – detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos.
Parágrafo único. Se o crime é praticado mediante
remuneração, o agente fica também sujeita à multa”.
Este crime, conforme o artigo menciona, se trata do
curandeiro que procura curar algum enfermo por meio de
método não comprovado cientificamente, porém, a grande
questão aqui que o diferencia dos crimes mencionados
anteriormente é que o curandeiro realmente acredita na
eficácia da ação, mas ainda que o faça com boas intenções,
ainda é um meio perigoso que pode piorar o quadro da pessoa
doente. Seguindo nesse raciocínio, pode-se afirmar também
que o curandeirismo não será considerado um crime desde que
seja cometido por alguém ligado a alguma instituição
religiosa que faça parte de seus procedimentos tais
métodos. Há que se considerar que ao mesmo que o curandeiro
pode agir conforme suas crenças e com boas intenções,
também pode o curandeiro agir de má-fé, por isso é de
extrema importância se observar a intenção do agente que
este principalmente caracterizará o crime.
Em suma, o curandeirismo é a forma que alguém utiliza para
promover a cura de outro, mas sem aprovação ou comprovação
de tal método, assim sendo, o curandeiro precisa praticar
estes atos com frequência, e se, além disso, o curandeiro
cobrar pela “cura”, este terá pena de detenção de 6 a 2
anos e multa.
 
 CASOS CONCRETOS

Comumente se vê pessoas caindo em golpes como o do bilhete


premiado ou o sequestro de algum familiar, são inúmeros
casos e o mesmo acontece no meio religioso também, como
videntes cartomantes que revelam seu futuro, pai de santo
que promete trazer seu amor de volta, padres e pastores
desviando dinheiro, dentre muitos outros casos. Segue
exemplos reais abaixo:
CASO 1 (Fortaleza, Ceará – Diário do Nordeste)
Um rapaz de apenas 27 anos foi preso por comercializar um
líquido verde, um tipo de xarope, no qual prometia cura
para câncer e alcoolismo, este líquido era vendido por
R$400,00. Após investigações, foi apurado que se tratava de
um criminoso que enganava as vítimas com promessas de cura,
foi caracterizado crime de estelionato.
CASO 2 (Goiânia, Goiás – Globo G1)
O suposto médium conhecido como João de Deus, segundo
investigações, abusou sexualmente de diversas mulheres que
buscavam ajuda espiritual. João de Deus se aproveitou da
vulnerabilidade das vítimas e abusou delas afirmando que
seria necessário que ele tocasse em partes íntimas para que
houvesse cura e se a vítima tentasse se esquivar, ele
prontamente dizia que a mesma não era digna da cura dele e
não iria engravidar, conforme relato da promotora de
Justiça Ariane Patrícia Gonçalves. O mesmo poderá ser
condenado a no mínimo 48 anos de reclusão, de acordo com os
promotores envolvidos.
 
 MODUS OPERANDI DO ESTELIONATO

O estelionatário estuda o ambiente e sua vítima para


adquirir vantagem ilícita e para isso ocorrer, o mesmo se
utiliza de meio ardiloso, sutil, com uma lábia que engana
qualquer um e acaba já ganhando a vítima no primeiro
contato. Diante disso, as vítimas começam a depositar um
pouco de confiança e deixam escapar alguns detalhes
pessoais e é aí que o criminoso encontra sua chance, pois
ele entra no contexto de vida da vítima e tenta consolar ou
animar fingindo estar sensibilizado.
Podem ser crimes diferentes, mas o método geralmente é o
mesmo: criminoso encontra vítima vulnerável, finge empatia
e piedade e faz seu show para convencimento da outra parte;
ou então, tenta ganhar a vítima pelo dinheiro, envolvendo-a
na própria ganância, as vezes até afirmando métodos rápidos
para se adquirir dinheiro. Veja bem, ainda que em minoria,
pessoas experientes, espertas e bem de vida também caem no
“conto do vigário”.
Infelizmente, as vítimas muitas vezes ficam com traumas
emocionais, com medo de confiar nas pessoas e além disso,
se sentem culpadas pelo acontecido, sendo recorrente a
visita destas vítimas em psicólogos e terapeutas.
 
 PENAS

Para o crime de estelionato, as penas possíveis a serem


aplicadas são multa e prisão, podendo chegar a 5 anos de
reclusão. De acordo com o disposto no §1º do art. 171, do
CP, no caso de o réu ser primário e a vantagem ilícita ter
sido de baixo valor o juiz pode mudar a pena de reclusão
para detenção e diminuir de 1/3 à 2/3 ou aplicar somente a
multa. Já em seu §3º, está disposto que a pena aumentará de
1/3 se for cometido em detrimento de entidade de direito
público ou de instituto de economia popular, assistencial
ou beneficente.
Por outro lado, os crimes cometidos por pastores ou pessoas
que fingem ter recebido cura com pura intenção de obter o
dinheiro dos fiéis, podem ser enquadrados na Lei nº
1.521/51 que trata de crimes contra a economia popular,
tendo como pena 6 meses à 2 anos mais multa.
 
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Se por um lado há pessoas que se utilizam da fé de forma
fraudulenta para adquirir benefício próprio, por outro lado
há pessoas do bem, empáticas, caridosas e com bom coração
que fazem o bem sem distinção, que são fiéis às suas
crenças e agem de forma honesta e honrosa. Porém, por causa
de algumas laranjas podres, todas são vistas como podres
também, de forma errada, assim, a população começa a ter um
preconceito com a religião em geral, seja com os
umbandistas, com os judeus ou cristãos.
No Brasil, há uma margem pequena de pessoas que se
denominam sem religião ou crença, isso porque em sua
maioria, nosso país se firma sob diversas crenças, diversas
culturas e formas de pensamento. Diante disso, o número de
pessoas que se utilizam da fé é consideravelmente grande,
pois claramente se vê lucro e retorno pelos fiéis para com
seus “líderes religiosos”, seja por fé ou ignorância, é um
tema ainda polêmico e não tanto discutido dentro das
religiões.
Por isso, o ordenamento jurídico brasileiro auxilia de
forma significativa, pois ainda que não haja muitas leis
especificando tais crimes por serem temas não muito
abordados, o Código Penal resguarda o direito esmagado de
muitas vítimas lesadas e que procuram um meio para
ressarcimento ou para, ao menos, diminuir o prejuízo. Estes
criminosos precisam, sim, ser punidos. Talvez por não
chegar ao conhecimento de muitos, ainda há um sentimento de
pena ou dó de algumas vítimas que foram completamente
manipuladas, dificultando a prisão destes estelionatários e
charlatões, pois isso, é de extrema importância que o
assunto seja cada vez mais abordado, para que o número de
vítimas reduza e o número de criminosos presos aumente,
pois, a justiça deve ser feita.

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