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Quantificação e higienismo na Primeira República: possibilidades e limites

Alexandre de Paiva Rio Camargo


alexandre.camargo.2009@gmail.com
Instituto de Estudos Sociais e Políticos / UERJ

Resumo

O presente trabalho pretende analisar o lugar das práticas de quantificação nos debates do
meio médico-higienista, entre a revolução pasteuriana dos anos 1890 e a generalização da
perspectiva sanitarista para o conjunto da sociedade brasileira, com a chamada “questão
nacional”, formulada entre os anos 1910 e 1920. Entendemos que é possível identificar três
marcos distintos ao longo do período em apreço, que nos propomos a examinar.
Nos anos 1890, a organização dos serviços de demografia sanitária, subordinada desde o
início às necessidades do laboratório bacteriológico, concorreria para estabilizar o
entendimento dos médicos em torno do pressuposto pasteuriano de combate à causa única das
doenças. O modelo institucional que associava demografia, parasitologia e profilaxia das
moléstias transmissíveis, estabelecido com a criação do Instituto Sanitário Federal (1893),
mostrou-se essencial na imposição do monopólio médico do atestado de óbito, sem os quais,
diziam os produtores de dados, não se poderia garantir a qualidade das estatísticas sanitárias,
fonte principal de confirmação do diagnóstico pasteuriano.
Outro marco encontra-se nas reformas de saúde pública lideradas por Oswaldo Cruz, entre
1902 e 1906. A erradicação da febre amarela e da varíola seria monumentalizada em números
nos trabalhos da Diretoria Geral de Saúde Pública, criando um padrão de disposição e
interpretação dos dados em relatórios ministeriais e anuários estatísticos do Distrito Federal,
aqui analisados. A experiência seria levada a outras partes do país e sustentaria a expansão do
programa sanitário, de modo a abranger outras doenças na qualidade de males “nacionais”,
como a tuberculose.
Finalmente, nos anos 1910 e 1920, veremos como as estatísticas oficiais, assim como outras
práticas de quantificação, contribuíram para generalizar a perspectiva sanitarista da sociedade,
manifesta na ideia de “Brasil-doente”. É o caso dos postos de profilaxia rural, das unidades de
assistência à infância e da inspeção médica escolar, os três espaços principais de higiene na
zona rural e no subúrbio das capitais, criados no bojo do movimento sanitarista. Nas páginas
do Brazil-Médico, o dimensionamento constante dos atendimentos e da distribuição
geográfica destes aparelhos sanitários se tornaria um meio de provar sua eficiência e, mais
ainda, de garantir a liderança dos médicos na definição das políticas de saúde. Tentaremos
mostrar em que medida, ao longo da Primeira República, as práticas de quantificação, em
especial as estatísticas sanitárias, se constituem em tecnologia de tradução de interesses e de
formulação dos problemas públicos.
Introdução

Este trabalho procura analisar o lugar das tecnologias de quantificação na rede que se
forma em torno do combate às doenças, no período que se estende da revolução pasteuriana à
chamada questão nacional, passando pelas reformas de saúde pública, lideradas por Oswaldo
Cruz, entre 1902 e 1906. Cabe-nos investigar a monumentalização estatística das campanhas
junto a atores externos ao meio médico-científico. Nossa finalidade é examinar os efeitos da
perspectiva sanitarista e da implantação da medicina experimental sobre a interdependência
social e o campo visual do governo. Para tanto, nos valeremos da teoria do ator-rede de Bruno
Latour, e das reflexões sobre a governamentalidade, desenvolvidas por Michel Foucault, em
Segurança, Estado, População e O nascimento da biopolítica.
Na historiografia das ciências e da saúde no Brasil, há diversas obras dedicadas a estas
temáticas. Há aquelas que analisaram a mitificação de Oswaldo Cruz e suas reformas como
ponto zero da ciência brasileira1. Existem trabalhos que se dedicaram a examiná-las como
momento de formação de uma comunidade médica engajada na construção de uma ciência
nacional, mas em luta por sua autonomia profissional2. Outros autores procuraram abordar a
revolução pasteuriana na longa duração, recuperando a atuação da primeira geração de
bacteriologias, que ajudaram a construir uma visibilidade internacional para a medicina
brasileira antes que suas teorias fossem proscritas como equívocos científicos, sendo
esquecidas pela história3. Cabe mencionar, igualmente os que remeteram a gênese de uma
tradição experimental para o Império, no campo de estudos da parasitologia médica4, e ainda,
os que abordaram a reforma sanitarista do ponto de vista da modernização capitalista e da
edificação da gestão de Rodrigues Alves e Pereira Passos5.
Por fim, há uma literatura abundante sobre a revolta da vacina (1904), que tende a
privilegiar sua dimensão política e social6, em detrimento da científica, isto é, da resposta de

1 BRITO, Nara. Oswaldo Cruz: a construção de um mito na ciência brasileira. 2. ed. Rio de Janeiro, Fiocruz,
2006.
2 STEPAN, Nancy. Gênese e evolução da ciência brasileira: Oswaldo Cruz e a política de investigação
científica e médica. Rio de Janeiro, Arte Nova, 1976.
3 BENCHIMOL, Jaime Larry. Dos micróbios aos mosquitos: febre amarela e revolução pasteuriana no Brasil.
Rio de Janeiro, Fiocruz/UFRJ, 1999.
4 EDLER, Flavio Coelho. A medicina no Brasil Imperial: climas, parasitas e patologia tropical. Rio de Janeiro,
Fiocruz, 2011.
5 BENCHIMOL, Jaime Larry. Pereira Passos: um Haussmann tropical. Rio de Janeiro, Secretaria Municipal de
Cultura, Turismo e Esportes, 1990b.
6 Cf. SEVCENKO, Nicolau. A revolta da vacina: mentes insanas em corpos rebeldes. São Paulo, Brasiliense,
1984; CARVALHO, José Murilo de. Os bestializados: o Rio de Janeiro e a república que não foi. São Paulo: Cia
das Letras, 1987; CHALHOUB, Sidney. Cidade febril: cortiços e epidemias na corte imperial. 2. Ed. São Paulo,
Cia das Letras, 2011.
uma população cerceada em seus espaços e movimentos a uma nova forma de abordagem e
sustentação do poder. Uma abordagem que passava pela confiança pública e pelo
disciplinamento dos corpos no governo liberal, e que, aqui, se realiza pela coação e pela
extorsão direta, reforçando a desconfiança generalizada das massas populares contra o Estado
e seus agentes. A este respeito, são reveladoras as metáforas belicosas empregadas pelo
Estado sanitário para nomear os novos serviços de saúde: “brigada contra o mosquito”,
“polícia de focos epidêmicos” e “delegacia sanitária”, todas instituídas durante o combate à
febre amarela, à varíola e à peste, na capital federal, entre 1902 e 1906.
A nosso ver, o problema em comum entre os autores que trataram da revolta da vacina
é que partilham de uma visão estritamente negativa e despótica do higienismo e das reformas
sanitárias, acusando frontalmente sua ideologia da tutela, a mesma da escravidão e da
repressão dirigida indiscriminadamente à população urbana e rural, examinadas mais acima.
Esta caracterização nos parece pertinente porque ajuda a explicar a proeminência conhecida
pela saúde e pelas estratégias biopolíticas de regulação da população, ao longo da República
Oligárquica. Por outro lado, perde-se de vista justamente que queremos apreender: como a
epistemologia democrática das doenças, ao ignorar as fronteiras de classe e a estadualização
da saúde e da educação – consagrada pela Constituição de 1891-, vai costurar a
interdependência social a partir do movimento de saneamento dos principais centros urbanos?
Como as estatísticas, enquanto tecnologia de construção de equivalência, terão seus
significados estabilizados e ampliados por meio deste movimento, que alinha diferentes
interesses em torno da perspectiva sanitarista e da definição da situação produzida a partir do
laboratório pasteuriano?
Para responder tais questões, nossa contribuição difere da historiografia mencionada,
procurando mostrar a passagem que se verifica entre dois momentos: o primeiro pode ser
situado, aproximadamente entre a aurora republicana, marcada pela onda epidêmica dos anos
1890, e a conclusão, por fim vitoriosa, da reforma sanitária do distrito federal, em 1906,
mesmo ano de realização do censo do Rio de Janeiro, que, como veremos, foi concebido
como um instrumento cognitivo de consolidação daquela reforma. Caracteriza-se por uma
estratégia belicosa, que oscilava entre a simples repressão, que visava a preservação das
distâncias sociais, e o disciplinamento dos corpos, em um programa de ação que independia
da vontade ou da conduta dos governados, desde que imposto “pelo alto”. A estratégia
belicosa acentuava a necessidade de combate, eliminação e erradicação das doenças, e, dessa
forma, permanecia indiferente à hostilidade e à desconfiança generalizada da população. Sua
operacionalização, nesse primeiro instante, foi garantida pela tradução bem-sucedida entre os
interesses dos médicos-sanitaristas e os das elites oligárquicas e políticas.
O segundo momento é geralmente localizado na eclosão do movimento sanitarista em
bases nacionais, que seguiu a mobilização cívica da conjuntura de guerra e a comoção
despertada pela publicação dos relatórios da expedição de Artur Neiva e Belisário Pena pelo
interior do país, em 1916. O trabalho pioneiro neste sentido é o de Luiz Antonio de Castro
Santos (1985)7, o primeiro a analisar o movimento sanitarista como desencadeador de uma
ideologia nacionalista, sedimentando uma linha de investigação posteriormente retomada
pelos estudos de Gilberto Hochman (2012)8 eNisia Trindade Lima 9(1999), com quem
dialogaremos aqui.
De um lado, concordamos que se trata de um turning point decisivo na construção da
questão nacional e da interdependência social. Procuramos, inclusive, oferecer subsídios a
este recorte, na medida em que nossa análise da (re) configuração do discurso estatístico
aponta na mesma direção, redefinindo a apresentação visual dos dados no censo de 1920 e no
anuário estatístico brasileiro. De outro lado, o aporte foucaultiano da governamentalidade,
combinado à teoria do ator-rede de Latour, nos permitirá localizar a problematização do
sujeito ético nos anos imediatamente posteriores à reforma sanitária na capital federal, entre
1906 e 1914, quando o novo foco dos médicos sobre doenças crônicas como a tuberculose e
as condições de moradia dos pobres e operários alçou ao primeiro plano a questão da conduta
e da ambiência de vida da população, a ser produzida como sujeito saudável. Isto implicava
recrutá-la como aliado na rede pasteuriana, tornando-a proativa na administração de hábitos
higiênicos, sem o que não seria possível controlar determinadas moléstias que ganhariam
visibilidade, caso da mencionada tuberculose. Tal deslocamento transparece na hierarquia de
moléstias privilegiadas pelos sanitaristas a cada tempo, assim como no discurso quantitativo
que monitora o seu desempenho. Nesta chave, formulamos a hipótese de que a projeção da
perspectiva médico-sanitarista da sociedade como problema-síntese da nação, a partir de
1916, constitui um deslocamento interno da própria rede pasteuriana, em seu campo visual de
problematização dos sujeitos doentes e dos espaços de doença.

7 SANTOS, Luiz Antonio de Castro. O pensamento sanitarista na Primeira República: uma ideologia de
construção da nacionalidade. Dados, v. 28, n. 2, p. 193-209, 1985. p. 193-209.
8 HOCHMAN, Gilberto. A era do saneamento: as bases da política de saúde pública no Brasil. 3. Ed. São Paulo,
Hucitec, 2012.
9 LIMA, Nísia Trindade. Um sertão chamado Brasil: intelectuais e representação geográfica da identidade
nacional. Rio de Janeiro, Iuperj/Revan, 1999.
A razão estatística da rede pastoriana

Como mostraram diferentes trabalhos, ao longo dos anos 1880, se produz uma nova
organização institucional da medicina e da higiene, incluindo uma articulação mais coesa de
interesses e programas de pesquisa entre a Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro, a
Sociedade de Medicina e Cirurgia do Rio de Janeiro (SMCRJ), criada em 1886, e a imprensa
médica, com destaque para o periódico Brazil-médico, editado desde 188710. Através das
relações tecidas entre aqueles espaços ao longo de duas décadas, a multicausalidade do
modelo climático-telúrico vai ser revogada pela busca pasteuriana da causa única, dedicada à
descrição do agente patógeno e da etiologia específica das doenças. Cabe-nos avaliar a
importância do argumento estatístico e da organização da demografia sanitária nesta
passagem.
Como mostramos em nossa tese de doutoramento11, o cálculo estatístico e os métodos
matemáticos eram conhecidos e utilizados pela coletividade médica desde os anos 1830-40,
mas permaneciam restritos aos registros hospitalares, e empregados para avaliação da
freqüência de incidências infecciosas e da eficácia dos tratamentos e das técnicas terapêuticas.
Por conseguinte, a estatística médica permanecia subordinada ao julgamento e à prática
profissional do clínico. Não havia uma agência especializada em organizar os eventos vitais
de forma sistemática, cabendo aos dirigentes da Junta Central de Higiene (1851-1886) e
outros médicos interessados na evolução das epidemias o trabalho de compilar as estatísticas
hospitalares e realizar estimativas sobre a salubridade da Corte.
Dito de outro modo, as estatísticas sobre os eventos vitais eram privadas, no sentido de
que eram produzidas por indivíduos particulares, sendo os registros hospitalares
complementados com projeções, na mesma linha do raciocínio por estimativas (Camargo,
2016). Em geral, eram ocasiões em que o recurso aos dados apenas atestava a tese que se
queria defender, não raro antecipando os argumentos em contrário. Convém notar, ainda, que
a classificação dos óbitos por doenças não era padronizada, o que somente ocorreria com o

10 O movimento de dinamização da pesquisa médica foi estudado por Ferreira, Maio e Azevedo, que
identificaram na associação entre a SMCRJ, a Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro e a o periódico Brazil-
médico a formação de uma rede institucional alternativa, que em resposta à diversificação da coletividade
médica, contribuiu para estruturar um campo de relações sociais específicas aos praticantes do ofício, à margem
da tutela estatal e da medicina oficial. Cf. FERREIRA, Luiz Otávio; MAIO, Marcos Chor. e AZEVEDO, Nara.
A Sociedade de Medicina e Cirurgia do Rio de Janeiro: a gênese de uma rede institucional alternativa. História,
Ciências, Saúde – Manguinhos, Rio de Janeiro, v.4, n.3, p. 475-491. nov. 1997- fev. 1998.
11 Cf. CAMARGO, Alexandre de Paiva Rio. A construção da medida comum: estatística e política de população
no Império e na Primeira República. Tese de Doutoramento em Sociologia. Instituto de Estudos Sociais e
Políticos. Universidade do Estado do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro, 2016.
modelo proposto por Jacques Bertillon, em 1893, e rapidamente adotado por diversos países,
inclusive o Brasil.
Encontramos um primeiro ponto de inflexão no movimento de renovação dos anos
1880. Foram executadas as reformas do ensino médico em 1879 e 1884; as reformulações da
legislação sanitária em 1882 e 1884; a criação da Policlínica do Rio de Janeiro, em 1882, e do
Instituto Pasteur do Rio de Janeiro, em 1888; a realização dos dois primeiros congressos
médicos nacionais em 1888 e 1889; e o início da circulação regular do Brazil-médico, em
188712. Para os nossos propósitos, tiveram particular importância a criação do cargo de
médico-demografista, por decreto de 1886, e a lei que garantia aos médicos o monopólio do
atestado de óbito.
Vale marcar que tais iniciativas não apontavam para um movimento contínuo de
centralização da higiene, uma vez que estes seriam transferidos aos estados pela Constituição
de 1891, cabendo-lhes providenciar os recursos para sua administração. À União, ficavam
reservados o controle sanitário dos portos do país, o controle sobre o exercício da medicina, a
higiene defensiva da capital federal13, além da competência sobre as pesquisas bacteriológicas
em laboratório e a produção das estatísticas demográfico-sanitárias, já então associadas pela
legislação.
A organização da estatística vital e sua subordinação às necessidades do laboratório
bacteriológico seriam delineadas com a criação do Instituto Sanitário Federal, em janeiro de
1894. Voltado ao estudo da natureza, etiologia, tratamento e profilaxia das moléstias
transmissíveis, com destaque para a parasitologia médica, o Instituto reunia quatro seções: os
hospitais de isolamento, os desinfetórios, o serviço de estatística demográfico-sanitária e o
laboratório para estudos bacteriológicos e análises químicas e terapêuticas14. Estava posto o
modelo institucional, mesmo que o laboratório ainda fosse bastante frágil e precisasse se
mostrar eficaz no diagnóstico das doenças e no controle das epidemias, em um meio formado
por uma maioria de adeptos do modelo climático-telúrico15.
As epidemias oneravam pesadamente a expansão do Estado Oligárquico. As doenças
do gado; as endemias que que fechavam os portos à navegação; a falta de uma rede eficiente

12 FERREIRA et alli, Op. Cit, 1998.


13 A higiene defensiva envolvia a vigilância sanitária, a assistência hospitalar, o isolamento e a desinfecção de
objetos, moradias, logradouros e embarcações.
14 BENCHIMOL, 1999, op. cit., nota 578, p. 254.
15 Mesmo este grupo maior dificilmente chegava a um acordo sobre as premissas mínimas. Jaime Benchimol
(2000, p. 269) chama a atenção para o prolongamento do debate que opunha médicos convencidos de que a febre
amarela era produto de miasmas, de algum outro envenenamento químico ou ainda de fermentos inanimados;
alopatas e homeopatas que propunham tratamentos rivais; doentes que os endossavam ou criticavam; cronistas
que escreviam com humor sobre as experiências feitas pelos médicos na capital brasileira.
de estradas, portos e ferrovias; a peste nos portos do Rio e Santos; a malária dizimando
trabalhadores que abriam estradas; enfim, toda a paralisia econômica concorria para ampliar a
visibilidade política da insalubridade nos centros urbanos e dos efeitos do desacordo entre os
médicos. A incapacidade dos médicos “decidirem, intramuros e interpares, quem havia
desatado o nó-górdio da saúde pública brasileira, levou, inclusive, à proposição, no Congresso
e na imprensa, de tribunais onde a questão pudesse ser dirimida”16.
A epidemia de cólera de 1894-95, no Vale do Paraíba paulista, coração da economia
cafeeira, é apontada pela historiografia como o episódio inaugural das lutas protagonizadas
pelos bacteriologistas, na tentativa de impor sua especialidade como pedra-de-toque do
diagnóstico e das ações de prevenção e neutralização das doenças17. Foram os boletins
demográficos, elaborados por Bulhões Carvalho como o médico-demografista do Instituto
Sanitário Federal e publicados no Brazil-médico, que mostraram a exata medida da incidência
de moléstias contagiosas, sublinhando a urgência política de resolução do problema.
Em um ano sem grandes surtos epidêmicos no Rio de Janeiro, como o de 1895, por
exemplo, em primeiro lugar no índice de mortalidade constava a tuberculose, responsável por
15% das mortes no distrito federal. Seguiam-se, em ordem de grandeza, os casos de febre
amarela, varíola, malária, cólera, beribéri, febre tifoide, sarampo, coqueluche, peste, lepra e
escarlatina, que, juntos, totalizavam 43% das mortes registradas na cidade18. De 1868 a 1914,
a tuberculose fez 11.666 vítimas, o que transformava o Rio de Janeiro na cidade de maior
incidência em escala mundial (Brazil-médico apud SCHWARCZ)19. Todavia, apesar de sua
letalidade mais elevada, a tuberculose não era o foco das atenções, por razões que ficarão
mais claras à frente. A mortalidade decorrente desta doença só era realçada quando se tratava
de exaltar a calamidade dos surtos epidêmicos de febre amarela, quando o número de óbitos
ocasionados suplantava o da tuberculose.
A série de boletins quinzenais, iniciada em abril de 1893, desnudava a extrema
insalubridade nacional, evidenciando um padrão demográfico bastante alarmante: a taxa de
mortalidade superava de muito a de natalidade na capital federal, mesmo nos anos em que as
doenças grassavam apenas endemicamente. Ao mesmo tempo em que a objetivação estatística
tornava muito mais sensível a incapacidade dos médicos de responderem aos desafios
impostos pela epidemiologia, abria novas possibilidades nos procedimentos de prova e

16 BENCHIMOL, Jaime Larry. A instituição da microbiologia e a história da saúde pública no Brasil. Ciência e
Saúde Coletiva, Rio de Janeiro, v. 5, n. 2, p. 265-292, 2000. p. 272-273.
17 BENCHIMOL, 1999, op. cit.; CUKIERMAN, 2007, op. cit..
18 BRAZIL-MÉDICO. Rio de Janeiro, v. 10, 1896. p. 62.
19 SCHWARCZ, 1993, op. cit., nota 298, p. 225.
argumentação próprios ao debate médico-higienista20. A perspectiva seriada inaugurada pelos
boletins produziria um efeito comparável - em menores proporções - à “avalanche dos
números impressos”, na Europa do segundo quartel do século XIX,. Seu impacto passou,
sobretudo, pela normalização das categorias de classificação e sua aderência ao julgamento
profissional dos médicos e bacteriologistas, facilitada pela recém-criada nomenclatura
internacional de doenças, recém-elaborada por Jacques Bertillon.
Levados pela perspectiva analítica de seus produtores, os médicos-demografistas, os
dados oficiais serão crescentemente apropriados, a partir de 1895, com foco na evolução dos
índices de mortalidade e sua distribuição geográfica pelos bairros e distritos da cidade,
corroborando as visões dos alinhados com a perspectiva pasteuriana de identificação e
combate à causa única.
Para se ter uma ideia da pequena revolução que se opera na quantificação, as
estatísticas sanitárias permitiam acessar o movimento urbano, modelizando a capital federal
em zonas sanitárias, de acordo com a incidência dos focos epidêmicos. Quer dizer que, pela
primeira vez, constituiu-se um observatório social na escala da cidade, inaugurando a
perspectiva seriada como fonte de julgamento profissional sobre a doença e os fenômenos
vitais. Uma tecnologia de visualização completamente diversa da estatística hospitalar, que
consistia na agregação de registros administrativos, e apenas daqueles que deram entrada na
rede assistencial. O campo visual da saúde saía do interior dos espaços fechados para o campo
das modulações abertas pelo monitoramento dos fluxos populacionais.
Ainda em relação ao lugar do argumento estatístico nas controvérsias internas ao meio
médico-higienista, temos o papel da demografia sanitária na formulação do diagnóstico
pasteuriano. Nossa questão recorrente da construção da credibilidade, que será decisiva na
montagem da rede sanitarista, reaparece aqui. Políticos, imprensa, fazendeiros e cafeicultores
desconfiavam das provas laboratoriais que atestavam o diagnóstico de epidemias letais, como
cólera e febre amarela, valendo-se da opinião de higienistas ou do conhecimento do clínico,
baseado unicamente nos sintomas dos doentes que atendia e em sua experiência pessoal.
Tentavam, assim, contornar as medidas extenuantes e paralisantes de quarenta, isolamento e
desinfecção, contra as quais, aliás, já se insurgiam os pasteurianos, em sua insistência de
combate à causa única. As estatísticas de mortalidade por doenças e sua distribuição
geográfica pelos focos epidêmicos viriam a confirmar o diagnóstico e a eficiência profilática,

20 CAMARGO, Alexandre de Paiva Rio. A demografia no discurso médico-higienista: um estudo baseado no


Brazil-médico (1887-1900). In: SENRA, Nelson de Castro et al (Orgs). Em Associação das Américas, as
estatísticas públicas como objeto de estudo. Salvador, SEI, 2011. Série Estudos e Pesquisas. p. 257-282.
exercendo um papel decisivo a cada nova epidemia, inclusive no meio da classe médica, pois
as resistências iam diminuindo, enquanto aumentava a confiança na autoridade sanitária21.
Com a criação do Instituto Soroterápico de Manguinhos (logo Instituto Oswaldo Cruz)
e do Instituto Butantã, em São Paulo, ambos em 1900, temos o primeiro registro do que
Latour (1988) chamou de circuito de tradução. Parte-se da situação anterior de não-
equivalência entre interesses - dos políticos, dos fazendeiros, dos higienistas e dos
bacteriologistas - e chega-se a uma equivalência entre as proposições22. Isto ocorreu com a
vinculação bem-sucedida do destino da peste ao projeto dos sanitaristas e às aspirações dos
cafeicultores, agora convencidos de que lutar contra a peste equivaleria a preservar o livre-
comércio no porto de Santos, o que era o primeiro passo para recrutá-los à causa de uma
soroterapia brasileira23.
A função original dos institutos consistia na produção do soro antipestoso, em
decorrência da peste que se alastrou em Santos, em 1899. Mas a rede de tradução,
minuciosamente dissecada por Cuckierman (2007), já estava posta e seria amplificada, com a
promessa de erradicação da febre amarela da capital federal. Como colocou Latour, o
momento inicial de tessitura da rede é marcado pelo atrelamento de questões particulares

21Veja-se o caso de São Paulo, onde o serviço sanitário foi criado, em 1892, com uma seção de estatística
demógrafo-sanitária igualmente ligada ao bacteriológico. Segundo Almeida e Dantes (2001, p. 140), “a seção
publicaria boletins trimestrais sobre a mortalidade do estado e suas causas, e desempenhou uma importante
função junto à classe médica paulista, de normatização da classificação de doenças”. ALMEIDA, Marta;
DANTES, Maria Amélia M. O serviço sanitário de São Paulo, a saúde pública e a microbiologia. In: DANTES,
Maria Amélia M. (Org.). Espaços de ciência no Brasil (1800-1930). Rio de Janeiro, Fiocruz, 2001, p. 135-155.
Acrescentemos que os serviços de demografia sanitária implementaram, quase imediatamente, a padronização
internacional da classificação de óbitos por doenças, criada por Jacques Bertillon, em 1893. Com relação ao
diagnóstico, cabe esclarecer que o serviço sanitário do estado, a exemplo de seu congênere federal, também teve
seus diagnósticos contestados por parcela significativa da classe médica paulista. Os médicos simplesmente não
aceitavam os resultados apresentados. Em 1893, recusaram o diagnóstico de cólera entre os doentes da
hospedaria de imigrantes, insistindo na disenteria. O dilema só foi resolvido com o envio de amostras ao instituto
de medicina tropical de Hamburgo, que confirmou aquele diagnóstico (Ibid. p. 142). O mesmo ocorreria em
1897, quando o órgão alertou que a ocorrência das chamadas “febres paulistas” eram, na verdade, manifestações
de febre tifoide. Novamente, o questionamento do diagnóstico só seria resolvido pelo recurso à autoridade
internacional. Neste caso, o envio de amostras ao bacteriologista que havia descoberto o agente causador da
doença. (Ibid. p. 144.)
22 LATOUR, 1988, op. cit., nota 43, p. 253.
23 Segundo Cuckierman, a fundação dos institutos teria que atender às seguintes traduções: “1) que a peste, uma
vez manifesta em Santos, se espalharia inexoravelmente pelo país, na sua pior forma, deixando atrás de si um
rastro de pânico e morte (a terrível epidemiologia da peste com sua contabilidade trágica de óbitos assegurava
perspectiva tão sombria); 2) que somente o soro vencia a peste (confirmavam-no a sanção do Instituto Pasteur ao
soro de Yersin); 3) que um punhado de cientistas brasileiros estava apto a produzi-lo no país (este punhado
estivera reunido em Santos, trabalhando na identificação da moléstia e, ao mesmo tempo, exibindo sua
capacitação técnica para combater o bacilo); 4) que não havia soro disponível para importação e que valia mais a
pena investir em sua produção”. CUCKIERMAN, Henrique. Yes, nós temos Pasteur: Manguinhos, Oswaldo
Cruz e a História da Ciência no Brasil. Rio de Janeiro, Relume Dumará, FAPERJ, 2007, p. 58.
(como o orçamento da ciência) às questões maiores (como a sobrevivência do país), que se
tornam tão bem vinculadas que ameaçar as primeiras equivale a ameaçar as últimas24.
Como resultado da campanha urbana e sanitária de 1902-1906, e da demonstração
estatística de seu êxito, o IOC ganharia unidades de pesquisa experimental e autonomia
financeira, que lhe garantiria patentes sobre suas descobertas e contribuições científicas, além
de participação na venda dos soros de sua produção. Não por acaso, o laboratório de pesquisa
e a escola do IOC, que garantiriam a visibilidade internacional e o recrutamento autônomo,
viriam imediatamente após a campanha de combate à febre amarela. Pouco depois, em 1907,
o instituto já estaria instalado no suntuoso e dispendioso palácio em estilo mourisco,
conhecido como “a meca da ciência brasileira”, um hibridismo que marcaria a construção da
imagem da medicina tropical de excelência universal, perseguida pelos pesquisadores de
Manguinhos, praticamente desde a sua fundação25.
Entre 1900 e 1907, a rede havia se ampliado por meio de novas traduções, graças à
ascensão de Oswaldo Cruz ao comando da Diretoria Geral de Saúde Pública (DGSP), o que
lhe permitiu acumular o braço científico e o burocrático da saúde, minando as últimas
resistências interpares que os pasteurianos enfrentavam. Restaria à resistência da população,
confirmada pela revolta de 1904, contra a obrigatoriedade da vacinação antivariólica. A
reforma sanitária, empreendida com truculência e plenos poderes às brigadas de mata-
mosquito, constitui o segundo tópico do nosso roteiro: a construção da autoridade política por
meio da coordenação administrativa e do disciplinamento da observação. Neste caso, era
preciso justapor competências previstas pela constituição à União e à municipalidade do
Distrito Federal, resolvendo-se a heterogeneidade de procedimentos e a heteronomia das
categorias constantes dos relatórios sanitários. Depois de muitas tentativas e obstáculos,
somente em 1902 foi possível alçar a higiene defensiva a cargo da Inspetoria do DF à esfera
federal, o que permitia reunir o que o pacto político separou, mas que estava sendo construído
como uma unidade indissolúvel através do campo visual da saúde.
Um obstáculo a ser vencido era a descontinuidade de interesses entre as agências de
saúde, e também entre as de estatística, onde se apresentava dificuldade semelhante: as
repartições estaduais não se mostravam dispostas a colaborar com as requisições da Diretoria

24 LATOUR, Bruno. Ciência em ação: como seguir cientistas e engenheiros sociedade afora. São Paulo, Unesp,
2000. p. 117.
25 Para Nancy Stepan, a tríade formada pela fábrica, o laboratório e a escola constituiu a base do êxito da
experiência de Manguinhos, sem equivalente na América Latina: “A história do Instituto Oswaldo Cruz mostrou
que o sucesso na ciência dependeu de a instituição reunir, num único centro, pesquisa, aplicação, treinamento e
atividade empresarial, devido à falta de organismos de apoio”. STEPAN, Nancy. Gênese e evolução da ciência
brasileira: Oswaldo Cruz e a política de investigação científica e médica. Rio de Janeiro, Arte Nova, 1976, p.
167.
Geral de Estatística, nos tempos estimados para as operações censitárias. Em alguns casos as
convocações da DGE eram boicotadas abertamente. Ofícios entre repartições não eram
respondidos por conta de rivalidades de ordem pessoal, política e regional, num quadro em
que as relações entre representantes institucionais eram mais regidas por códigos gerais de
conduta do que pelas orientações do estatuto legal26. Assim, as deficiências no registro civil,
que ameaçavam a qualidade das tão desejadas estatísticas vitais, base da demonstração da
eficácia profilática, no Brasil e no exterior, seriam sanadas a duríssimas penas, e sob forte
pressão dos demógrafos sanitaristas.
Para tanto, seria preciso remediar a principal dificuldade enfrentada na organização
das estatísticas vitais, apontada por Telarolli Júnior (1993): o sub-registro de óbitos e
nascimentos, a notação incorreta de idades e erros na definição de natimortos e óbitos infantis
perinatais. A seção de estatística demógrafo-sanitária do serviço sanitário de São Paulo,
durante as duas décadas iniciais de atuação, ficou restrita à capital, uma vez que quase
nenhuma informação provinha do interior. Mesmo na capital, eram constantes os problemas
de remessa irregular de registros civis27.
Na República Oligárquica, a obtenção regular das informações não poderia ser
garantida apenas por lei ou decreto, frequentemente descumpridas, porque emanadas de uma
autoridade estatal de reconhecimento limitado, que dependia da associação com poderes
locais e privados para governar. Mesmo assim, tal associação poderia funcionar
eventualmente, para sanar conflitos ou tragédias episódicas, como levantes armados e
epidemias, porém, sem o monopólio da violência legítima, se revelava incapaz de criar formas
sociais duráveis, cristalizar procedimentos administrativos e estabilizar rotinas sociais, em
meio a um ambiente de suspeição generalizada contra as iniciativas estatais. Uma das
principais dificuldades da rede médico-científica consistiria justamente em trazer atores
diversos e dispersos para a perspectiva sanitarista, que só cederiam suas vontades quando seus
interesses particulares fossem vinculados ao interesse geral identificado a um projeto de
centralização.
É este movimento que começamos a assistir na década de 1900, quando se tornava
claro para os sanitaristas que a estabilização da rede médico-científica dependia da

26 Vale mencionar um dos exemplos levantados por Nelson Senra, acerca das relações turbulentas entre a
Repartição de Arquivo e Estatística do Estado de São Paulo e a Diretoria Geral de Estatística, cujos diretores
trocaram acusações públicas e insultos pessoais, motivadas pelo descumprimento de uma solicitação de
informações. SENRA, Nelson. História das estatísticas brasileiras. v. 2: Estatísticas legalizadas (1889-1936).
Rio de Janeiro, IBGE, 2006, p. 273).
27 TELAROLLI JÚNIOR, Rodolpho. A secularização do registro de eventos vitais no estado de São Paulo.
Revista Brasileira de Estudos de População, v. 10, n. 1/2, p. 145-156, 1993. p. 150.
estabilização dos registros e das margens de interpretação da estatística. Para tanto, seria
preciso tornar obrigatória a notificação compulsória dos óbitos por doença. Na capital da
República, ela foi assegurada pela implantação de um serviço permanente de verificação geral
de óbitos, ainda em 1902. Tratava-se aqui de supervisionar a prática dos clínicos,
constrangendo-os a observar um procedimento burocrático que cerceava sua autonomia e cujo
sentido lhes escapava. Mais ainda, desenhava-se uma intervenção permanente, à distância,
sobre a sintomatologia médica, corrigindo os “vícios” e os “erros de notação” do clínico, e
levando-o a ver o que os pasteurianos viam desde seu laboratório e desde seu observatório
estatístico28. Uma intervenção que logo não seria mais percebida pelos próprios clínicos como
uma ingerência, à medida que o novo protocolo observacional se acomodasse em sua rotina
profissional, o que era indispensável à estabilidade da rede e à demonstração estatística de sua
eficiência, capaz de apontar para sua desejável expansão, para outras moléstias - como a
tuberculose -, e para outros espaços - como os subúrbios do Rio de Janeiro.
Neste ponto, é preciso lembrar que o insulamento dos estados em matéria de
assistência e questão social delimitava a expansão e a problematização da ação pública e, por
tabela, da saúde. O período das grandes reformas, na década de 1900, seria marcado pelos
saneamentos urbanos e pelos combates às epidemias, não sendo possível criar um serviço
permanente de controle das endemias ou de combate a doenças crônicas. Como afirmou
Cuckierman, “relegava-se a segundo plano as escaramuças incapazes de gerar o efeito

28 Os problemas com a medicina clínica apareceram em diferentes ocasiões, como no relatório da DGSP, de
1905, especificamente na parte relativa à febre amarela, em que são relatadas as dificuldades derivadas da falha
de diagnóstico e da subnotificação: “no correr do primeiro semestre deste ano, recebemos 137 notificações de
casos de febre amarela. Desses casos, com excessivo rigor de observação, foram considerados positivos 95 e
negativos 42. A demografia registrou rigorosamente como lhe cumpria, os 95 casos de febre amarela. Entre os
42 negativos, tivemos casos de varíola, impaludismo, embaraço gástrico, nefrite, hérnia estrangulada, gripe
congestão útero-ovariana, tuberculose pulmonar, infecções intestinais, pneumonias, etc. Releva notar uma
circunstância: esta Inspetoria registra e transmite à Seção Demográfica todos os casos em que os médicos
mantêm o diagnóstico da febre amarela, qualquer que possa ser seu modo clínico de julgar o caso. Assim, entre
os 95 casos confirmados, alguns há que nos pareceram apenas suspeitos, outros que nos pareceram perfeitamente
negativos. Entretanto, não pensamos nunca em contestar a opinião, muito responsável, dos nossos colegas”
(relatório apud CUCKIERMAN, 2007, p. 167). O comentário acurado e irônico de Henrique Cuckierman a
respeito merece ser citado: “o relatório tratava dos colegas com todas as mesuras e rapapés, embora estivessem
todos pressionados pela notificação obrigatória de moléstias suspeitas. [...] a enorme confusão na notificação
verificada nos casos negativos, somada à certeza de diagnósticos equivocados em meio aos casos positivos, era
sinal de que os colegas tinham enorme dificuldade para ver a febre amarela. Vê-la exigia uma arte operatória de
exames bacteriológicos e anatomopatológicos somente possível no interior do laboratório” (Ibid.). E continua: “o
relatório queria mesmo era denunciar que, sob a aparente ingenuidade das boas intenções, escondia-se um
tremendo desserviço à erradicação da febre amarela, quando muito por obrigar a contabilizar como positivo um
caso que certamente não o era. Definitivamente, a velha medicina não era capaz de perceber a dança da
matemática, que produzia estatísticas, que apontava tendências, que consagrava certezas, tais como a erradicação
da moléstia e que, em última instância, constituía e justificava a máquina de sanear. Portanto, mais que ingênua,
era perigosa: o pior cego é aquele que não quer ver” (Ibid. p. 168-169).
espetaculoso da vitória retumbante, como era o caso da tuberculose” (2007, p. 117)29. Na
verdade, a própria hierarquia das doenças privilegiadas pelos sanitaristas neste momento
refletia esta disposição, aumentando o apelo estatístico da promessa de erradicação.

Um monumento estatístico para a reforma sanitária

O censo do Rio de Janeiro de 1906 se destacaria por uma perspectiva fortemente


sanitarista sobre a população. Ela se revela tanto no tratamento privilegiado de temas ligados
à saúde, quanto na importância inédita e central atribuída à densidade demográfica, chave
para o zoneamento sanitário da cidade e a visualização dos focos epidêmicos e das
manifestações endêmicas em períodos de normalidade. A densidade também importava como
meio de visualização das moradias urbanas, cuja inspeção e regulação era uma das principais
estratégias para o saneamento da cidade. Neste sentido, um segundo volume, inteiramente
dedicado à estatística predial, respondia por cerca de metade da publicação, destacando os
níveis de aglomeração e as condições sanitárias de habitação e cohabitação, foco da política
de saúde que então se implantava.
Instrumento da reforma sanitária, organizado por Aureliano Portugal, o demógrafo
sanitarista que respondia pela inspetoria de higiene do Distrito Federal, o censo não se deteve
na preferência pelos temas de saúde. As demais variáveis, como a composição etária, a
instrução e a ocupação da população foram trabalhadas com o fim de realçar a vitalidade da
população brasileira e natural da cidade, em relação ao desempenho que os imigrantes
apresentaram nestas mesmas variáveis. Assim, a distribuição por sexo e fecundidade
apresenta a composição e o crescimento relativo dos dois grupos. O coeficiente de natalidade
por mulher, que daria a ver a fecundidade, não é comparado por ser inferior a 120% entre os
nacionais, e julgado “muito baixo”, porém por causa das “deficiências do registro civil” e das
“condições especiais no tocante à imigração que se fixa na cidade”, o que dispensava a
comparação30. Quanto ao estado civil, outra superioridade brasileira. As proporções de
solteiros, casados, viúvos e de mulheres relativamente a homens mostra-se favorável aos
nacionais, grupo que apresentava maior presença relativa de solteiros e, portanto, maior
potencial de crescimento e fecundidade.

29 CUCKIERMAN, 2007, op. cit., p. 117.


30 BRASIL. Diretoria Geral de Estatística. Recenseamento da cidade do Rio de Janeiro (Distrito Federal)
realizado em 20 de setembro de 1906. Rio de Janeiro, Oficina de Estatística, 1907-1908. p. 81.
Em nenhum outro aspecto, todavia, a grade da vitalidade transparece mais do que na
avaliação da instrução e da ocupação. A primeira se esgota na mera verificação da
alfabetização, sem nada dizer sobre escolaridade ou frequência escolar, exatamente como no
censo de 1890. Confrontado com o dado de 48,1% de analfabetos no que era a vitrine do país,
o organizador do censo limita a desagregá-lo por nacionalidade, contentando-se com a
demonstração da menor participação relativa dos estrangeiros, especialmente portugueses,
espanhóis e italianos, entre os 51,9% de alfabetizados.

Gráfico 1 – Analfabetismo por sexo e nacionalidade -1906

Fonte: Brasil, 1907-1908, p. 111.

O mesmo censo traz uma leitura da ocupação ainda mais controversa. É o primeiro a
se alinhar à normalização internacional sugerida para o tópico, classificado segundo setores
produtivos: “produção de matérias-primas”, “transformação de matérias-primas”;
“administração pública” e “profissões liberais”. Dois dados chamam atenção. Primeiro: para a
comissão censitária, o fato de os estrangeiros representarem cerca de 50% da totalidade de
pessoas empregadas no segundo setor (indústria e manufatura) é “compensado” pela
participação em quase 90% dos brasileiros na classe de “administração pública e profissões
liberais”, sem mencionar que esta compõe apenas 6% da população total, ou seja, a pequena
burocracia e uma elite de políticos e intelectuais31. Tal como a instrução, a ocupação é mais

31 A cifra de 6% parece-nos bastante baixa para servir de referência à comparação proposta pelo organizador do
censo, preocupado em mitigar o peso da participação estrangeira no setor de indústria e manufatura, que
respondia por um número várias vezes maior de ocupados. Por outro lado, a mesma cifra se torna
um indicador da vitalidade da população. Segundo: o fato de existir uma quarta categoria,
“diversas”, que agrupa trabalhadores domésticos e braçais, “profissões mal especificadas” e
“classes improdutivas”, responder por cerca de 70% do total da população ocupada. Cifra que,
paradoxalmente, tornava inútil o modelo de codificação da estrutura ocupacional. Um modelo
originalmente concebido para uma economia industrial, e que se aplicava muito mal em um
país fortemente marcado por formas intermediárias de trabalho dependente, no campo, e até
mesmo na cidade.

assombrosamente alta quando considerada a absorção estatal dos segmentos mais altos, face à iniquidade do
Estado para regular a ação e se fazer presente no território nacional.
Tabela 1 – Profissões por sexo, 1906

Fonte:Brasil, 1907-1908, p. 104.

Como se pode depreender, saúde e instrução encontravam-se, então, longe de serem


associadas pela via da educação sanitária, ao contrário do que sucederá a partir da conjuntura
de guerra e da descoberta sanitarista dos sertões. O mesmo sucede em relação à ocupação,
tabelada e analisada sem qualquer referência à destituição e ao abandono, característicos da
fase nacionalista. Reforça-se, assim, nossa interpretação do período que se estende até 1907-
1908, que seria marcado pela estratégia militar ou belicosa da higiene em relação à população.
Era possível seguir indiferente à sua hostilidade ao Estado, neste primeiro momento, na
medida em que o programa sanitário se concentrava sobre as doenças controláveis pela
combinação de medidas de higiene agressiva e um regime de profilaxia que podia ser imposto
“por cima”, pois não dependia da reforma dos hábitos, nem da alteração das condições de
vida, moradia e alimentação da população.
Esta mudança deve ser buscada, ainda que de forma indiciária, nos anexos da seção de
demografia sanitária ao relatório ministerial, cobrindo o intervalo que decorre entre o censo e
a publicação das memórias da expedição de Artur Neiva e Belisário Pena, em 1916. É
possível dividir os relatórios em dois momentos. Entre 1904 e 1907, são destacados os
quadros estatísticos que dispõem a mortalidade da febre amarela por nacionalidade, sexo e
idade, entre 1873 e 1897, apontando para um padrão de ciclos epidêmicos, alternados por
manifestações da doença sob a forma endêmica, consagrando a visão de que ela sempre esteve
presente entre nós, desde a primeira epidemia. Um outro conjunto de tabelas reforçavam o
contraste produzido em muito pouco tempo. Com títulos como “influência da nova profilaxia
sobre a mortalidade da febre amarela”, tabelas e diagramas atestavam a velocidade e o êxito
da campanha empreendida entre 1902 e 1906, enfatizando a redução a zero no número de
casos.
Nos relatórios subsequentes à reforma sanitária da capital, uma mudança significativa
pode ser observada. A profilaxia da tuberculose passa a ganhar crescente importância entre os
alvos da saúde pública, na apresentação dos sanitaristas da DGSP. Os elevadíssimos níveis
que atingia a moléstia entre nós, antes relativizados pela companhia de coeficientes
mortuários semelhantes encontrados em cidades como Paris e Viena, agora começavam a se
transformar no grande inimigo. Antes, o argumento de que se tratava de uma moléstia
estabilizada, que matava há anos com a mesma regularidade, indicava um “descontrole sob
controle”, que lhe assegurava um processo natural de domesticação, desde que mantida em
um patamar estatístico determinado, ao contrário do que se verificava nos paroxismos
epidêmicos do trio febre amarela-peste-varíola.
A partir de 1907, será justamente o caráter estável e crônico da doença a razão da
urgência em combatê-la. De início, a ênfase gira em torno na criação de moradias populares e
da adoção de medidas profiláticas indiretas, que passavam pela fiscalização sanitária, como a
tuberculização das vacas que forneciam o leite para a capital. O relatório de 1913 é o primeiro
a destacar “a falta de higiene no trabalho, a nutrição insuficiente, o alcoolismo, e a miséria
como obstáculos à ação profilática”32. Ao mesmo tempo, o volume de páginas reservado à
descrição da tuberculose na seção sobre as moléstias infecciosas vai sendo ampliado. Outro
deslocamento na mesma direção se encontra no novo padrão visual de apresentação dos dados
de óbitos por doenças. A contar de 1907, estes se distribuem em quadros que opõem a
redução a zero dos casos de febre-amarela-peste-varíola ao índice constantemente elevado das
mortes por tuberculose, em toda a série histórica. Realçava-se sua saliência para a salubridade
da cidade, assim como a eficácia dos meios científicos para combatê-la, exemplificados e
monumentalizados a cada novo quadro, a cada novo relatório, a cada novo ano.
De descontrole sob controle, a tuberculose tornava-se a nova fronteira de tradução da
rede, e, com ela, introduzia-se uma racionalidade singular sobre a educação sanitária e a
conduta do sujeito saudável. É sintomático que, quase ao mesmo tempo, a doença de Chagas
fosse identificada, em 1909, e seu desenho clínico estabelecido, entre 1910 e 1913. A doença
de Chagas seria representada como entidade médico-científica e, simultaneamente, como
questão nacional. Como mostrou Simone Kropf (2009), Carlos Chagas - graças à rede já
organizada - construiria a moléstia como uma moldura para a sociedade, ao permitir
descortinar os males do Brasil, as endemias rurais. Nesta conta, a doença deveria servir de
bandeira para que o Estado, orientado pelo centro de cálculo da rede, promovesse o
saneamento dos sertões33, o grande tema da mobilização nacionalista que se desencadeia a
partir de 1916. Ao tornar o bócio endêmico, extremamente disseminado entre as populações
rurais do Brasil, um dos sintomas principais da doença, transformando-o em uma decorrência
da ação patogênica do barbeiro sobre a tireoide, a ação em rede ampliou a tradução para as
doenças crônicas e degenerativas, que comprometiam o desenvolvimento orgânico dos
indivíduos.
Dessa forma, os elementos visuais de degradação foram realçados, especialmente
quando se demonstrou que, em sua fase aguda, a infecção atingia, sobretudo, as crianças, e
que, nos casos com manifestações cerebrais graves, o indivíduo que escapasse à morte ficaria
permanentemente inutilizado, portanto, inapto para o trabalho34. Tal tradução seria ainda
amplificada na conjuntura de guerra, uma vez que a drástica redução na entrada de

32 BRASIL. Relatório apresentado ao Presidente da República dos Estados Unidos do Brasil pelo ministro do
Estado da Justiça e Negócios InterioresWadislau Herculano de Freitas, em 1914. Rio de Janeiro, Imprensa
Nacional, 1915. p. 54-55.
33 KROPF, Simone. Doença de Chagas, doença do Brasil: ciência, saúde e nação, 1909-1962. Rio de Janeiro,
Fiocruz, 2009. p. 131.
34 Ibid. p. 138.
trabalhadores estrangeiros levaria os cafeicultores a zelar pelas condições de saúde da força de
trabalho nas fazendas35. A dramaticidade da associação entre a imagem do doente e o do
destituído, que se torna inválido pelo abandono, revelou-se fundamental não apenas para a
construção da tripanossomíase como fato científico, mas também para a imaginação do sertão
como espaço de doença, de cuja salvação dependia a proteção de nossa identidade nacional. A
expressão de Miguel Pereira, cunhada no bojo do movimento sanitarista, encarna bem a nova
associação de imagens e de interesses: “o Brasil é um imenso hospital”, ao que o educador e
sanitarista Afrânio Peixoto, acrescentaria, à mesma época: “Os sertões do Brasil começam
onde termina a Avenida Central”. Revelava-se, assim, o êxito da rede em ampliar sua
tradução junto aos políticos, intelectuais, profissionais liberais e também às classes médias
urbanas, que aderiram à eficácia simbólica do sertão como um espaço empaticamente
imaginado, corroído por doenças transmissíveis e crônicas, cuja prevenção dependeria
unicamente da vontade política.
Doravante, a tradução estabelecia a equivalência entre sertão e nação, que fundaria
uma nova representação sobre o espaço nacional, opondo litoral e interior, urbano e rural. O
mesmo pode ser dito sobre a perspectiva de regionalização dos males públicos, que ofereceria
novas possibilidades à crítica política da ordem oligárquica. Por sua vez, educar e formar o
sertanejo equivaleria a produzir o sujeito de trabalho, cujo abandono surgia como a verdadeira
causa da estagnação econômica e do obstáculo ao progresso, somente remediáveis pela
generalização da assistência e pela interiorização do Estado.

A generalização da perspectiva sanitarista

A questão nacional surge com força no contexto da Primeira Guerra Mundial, não
tanto pela geopolítica internacional. Para fazer frente a uma eventual participação no conflito,
procede-se a um alistamento militar, que se mostra um fracasso completo. As ligas
nacionalistas foram fundadas, recrutando as forças armadas para a perspectiva médico-
sanitarista, combinando-se a visão de salvação nacional do exército e do tenentismo à ênfase
na inanição, na doença e no abandono do interior brasileiro. Mais do que expor a soberania do
país, este quadro precipitou uma consciência da nacionalidade, ligando-se às então recentes
ações de saúde pública nos centros urbanos para afirmar a necessidade de saneamento físico e

35 SANTOS, Luiz Antonio de Castro. A reforma sanitária “pelo alto”: o pioneirismo paulista no início do século
XX. Dados, v. 36, n. 3, p. 361-381, 1993. p. 365.
moral dos sertões. Enquanto a tuberculose foi construída como causa principal da mortalidade
evitável nas grandes cidades, a febre amarela, a malária e a ancilostomíase constituíam o
flagelo evitável dos sertões; as endemias rurais que baseariam os acordos sanitários pela
cooperação entre os poderes. Vale a pena nos determos sobre os acordos, uma vez que foram
a experiência mais consistente de centralização da autoridade política, gerando reflexos para
outros campos de saber e ação sobre a população, como a educação e a estatística, durante os
anos 1920.
Como vimos, estes acordos tiveram na transferência da higiene do Distrito Federal
para a União a sua gênese, entendendo-se que seus problemas sanitários afetavam o restante
do país e as relações dele com o exterior - na aquisição de empréstimos, na atração de
imigrantes, etc. A penetração do poder central continuaria através de comissões federais de
combate à febre amarela e com os primeiros acordos para os programas de saneamento e
profilaxia rural entre a União e os estados36. Como mostrou o instigante estudo de Gilberto
Hochman (2012), inicialmente a colaboração se deu através de medidas pontuais e isoladas,
como a distribuição gratuita da quinina aos estados, o que contornava as alterações
constitucionais e a necessidade de beneplácito do legislativo37. Depois, viria o Serviço de
Profilaxia Rural, instituindo a possibilidade de acordo com os estados para o saneamento
rural38. Neste momento, apenas os estados mais pobres e débeis na representação oligárquica
aderiam ao acordo, cedendo o comando das operações sanitárias aos recursos e à equipe do
governo federal. Uma vez celebrados os acordos e instalada a base técnica e administrativa
pelo poder central, novas demandas locais surgiriam possibilitando a ampliação da
responsabilidade federal e dos benefícios estaduais, para o que os postos sanitários seriam a
chave. Segundo o mesmo autor,
[...] entre 1920 e 1924, os dezessete estados que haviam feito acordos para o
saneamento rural, estenderam-nos para a profilaxia da lepra, sífilis e doenças

36 Embora a Constituição de 1891 estabelecesse que cada estado devesse cuidar de si, em matéria de higiene, a
transmissibilidade da doença, segundo GulbertoHochman, “foi sendo percebida como um problema nacional,
não contido na moldura constitucional. O recurso ao Governo Central seria uma alternativa tanto para a
regulação da interdependência (territorialidade) e para o enfrentamento dos males públicos, quanto para impedir
a ação dos caronas e os efeitos dos ineptos (coercitividade). HOCHMAN, Gilberto. A era do saneamento: as
bases da política de saúde pública no Brasil. 3. ed. São Paulo, Hucitec, 2012, p. 42.
37 Durante a década de 1910, antes da criação do serviço de saneamento e de postos permanentes de profilaxia,
verificaram-se diversas intervenções sanitárias provisórias por solicitação de alguns estados, a maioria para
debelar os surtos epidêmicos de febre amarela e peste. Uma expedição liderada por Oswaldo Cruz combateu a
febre amarela em Belém, em 1910, Em 1913, o governo do Amazonas requisitou intervenção para a extinção da
febre amarela em Manaus. Em 1917, uma epidemia de febre amarela foi debelada em Vitória, novamente com
assistência federal. Em 1912 e 1913, Rio Grande do Norte, Paraíba e Rio de Janeiro solicitaram ajuda para
combater surtos de peste. Em 1919, o governo federal uniu-se a vários estados nordestinos para eliminar focos de
febre amarela (Ibid, p. 98-99).
38 HOCHMAN, op. cit., nota 663, p. 138.
venéreas. Estados importantes, como Bahia e Pernambuco, tradicionalmente
reticentes à presença federal, mas considerados problemáticos, em termos
sanitários, acabaram por aderir. O Rio Grande do Sul fez um acordo direto
com a Inspetoria de Profilaxia da Lepra. Em meados da década de 1920, a
autoridade sanitária federal estava ausente apenas em Goiás e São Paulo
(HOCHMAN, 2012, p. 174-175)39.

Neste processo, um código sanitário foi aprovado e um imposto de saúde foi criado.
Várias atribuições da municipalidade do Distrito Federal foram transferidas para o novo
Departamento Nacional de Saúde Pública, a unidade mais operosa e presente nos relatórios do
ministério da Justiça e Negócios do Interior, ao longo de todos estes anos. Tentou-se criar,
sem sucesso, a mesma base de acordos em nível nacional para a fiscalização de alimentos –
carne e leite – em especial os que seriam consumidos nas grandes cidades, produzidos longe
do centro fiscalizador, revelando que a atenção se deslocava para a regulação de um mercado
de consumo interno, em rápida expansão. Além disso, entre 1920 e 1923, foram criadas uma
seção de higiene infantil e assistência à infância no Departamento Nacional de Saúde Pública
(DNSP), um serviço de propaganda e educação sanitária e uma inspetoria de higiene
industrial e profissional, ambas no âmbito do Distrito Federal40.
Refletia-se, assim, a nova fronteira de tradução da rede médico-sanitarista: a educação
da população em assuntos de saúde e as condições de higiene no trabalho. O novo programa
sanitário, com ênfase na tuberculose nos centros urbanos e nas endemias rurais no interior,
passava pela formação de um sujeito pedagógico, orientando o homem comum para os efeitos
nocivos e desejáveis dos comportamentos individuais e coletivos frente à sociedade, fazendo
uso de amplas técnicas de difusão de conhecimentos, do cinematógrafo e do rádio a revistas e
panfletos de toda sorte, para variados públicos. A tradicional hostilidade da população à
autoridade estatal seria revertida por seu recrutamento como sócia na empresa coletiva de
gestão da higiene. Isto significaria agir no tecido da sociabilidade, de modo a modificar
hábitos arraigados, como o consumo de álcool, a prostituição, a não-utilização de calçados e
latrinas, o despejo de lixo em rios e vias públicas, a manutenção de focos de moscas, ratos e
mosquitos, a fraude no leite e nos alimentos, entre outros.
Quer dizer que tanto o sujeito pedagógico quanto o sujeito de trabalho foram
inicialmente problematizados pela perspectiva médico-sanitarista, como sugere, inclusive a
precedência do seguro por acidente no trabalho, desencadeados pelo debate sobre a higiene
industrial e, salvo engano, a primeira lei trabalhista brasileira. A criação da infra-estrutura
sanitária também aponta na mesma direção. Uma vez instalados, os postos de profilaxia não

39 Ibid. p. 174-175.
40 Ibid. p. 176.
se restringiriam ao exercício de uma competência técnica em saúde, isto é, a erradicação da
doença mediante o saneamento e o tratamento do doente. Escolas foram criadas como anexos
aos postos sanitários, enquanto as escolas existentes adotavam cartilhas de educação sanitária.
Os professores recebiam treinamento em higiene pessoal, capacitando-se ao ensino da matéria
a seus alunos41.
Segundo Luiz Antonio de Castro Santos,

[...] o médico de saúde pública é retratado como um ‘evangelizador moderno’ que


difunde o ‘evangelho revolucionário’ da reforma sanitária. Os usos simbólicos da
saúde pública residem na missão dos reformadores de salvar a população rural da
doença e do abandono, parte da cruzada nacional de ´salvação do interior durante os
anos 1920” (SANTOS, 1985, p. 383-384)42.

Trata-se, agora, de construir a autoridade do agente estatal pela conversão das


obrigações recíprocas tradicionais em um compromisso paternal, posto que missionário e
salvacionista.
Por tudo isso, o movimento sanitarista alterou o significado anterior do nacionalismo,
calcado na grandeza exuberante do território e na qualidade das raças que formaram o homem
brasileiro, o que se harmonizava bem com o argumento imigrantista embutido na tese da
inferioridade racial. A figura do homem nacional deixava de ser a do antisujeito ético por
excelência para se tornar transparente à racionalidade política, através da urgência de sua
reabilitação como agente produtivo. Como o Jeca de Monteiro Lobato expressava bem, a
indolência, a insubordinação e a preguiça que o caracterizavam resultavam apenas de suas
condições de vida. Por meio da ação indireta sobre sua formação e sua socialização, seria
perfeitamente possível reverter este quadro e produzir um sujeito dócil e laborioso. Afinal, “é
dele, mesmo doente, que se extrai grande parte da riqueza nacional” (Lobato apud
SANTOS)43.

A quantificação da dimensão nacional

O censo de 1920 refletiria e ajudaria a instituir o novo quadro, constando dele uma
inédita estatística do custo do trabalho agrícola. Criadores e proprietários rurais passam a
demandar boletins regulares, que, a exemplo da demografia sanitária na saúde pública,

41 O binômio higiene-educação se desdobrava na articulação entre agentes sanitários e professores, que não
teremos condições de explorar aqui, mas consta de nosso plano original de pesquisa.
42 SANTOS, L., 1985, op. cit., nota 662, p. 383-384.
43 Ibid. p. 196.
adensassem a série numérica para diferentes escalas temporais, revelando a superfície
cultivada, seus rendimentos, preço médio dos produtos, estado de colheita e produção das
safras, oscilação de preço dos artigos de alimentação. Começava a se desenhar, assim, uma
estatística de produção e consumo agrícolas, que se queria a cargo do ministério da
Agricultura, face à iniquidade de vários estados em criar ou manter um serviço dessa
natureza.
Surgia, pela primeira vez, uma estatística econômica orientada para as forças que
constituem a população como capital humano. Mais ainda, como veremos, a estatística de
superfície cultivada em relação à extensão territorial dos estados, produzida pelo censo de
1920, serviria de parâmetro para avaliar a desigualdade entre eles, sedimentando a região
como recorte de visualização do desenvolvimento.
O tema da região destoava do recorte político-administrativo adotado pelo discurso
estatístico até então. O censo de 1890 é emblemático a este respeito, organizando todas as
suas informações por estado e em ordem alfabética, escolha que parecia mais neutra à luz da
nascente federação. Ao levantar a instrução, distingue “brasileiros” e “estrangeiros” quanto à
categoria “sabe ler e escrever”, adotando o procedimento inverso, isto é, aglutina brasileiros e
estrangeiros quando se trata de compor a categoria “não sabe ler nem escrever”. Como se
pode observar na figura 1, esta opção não permite calcular o coeficiente de analfabetos
nascidos no Brasil, uma vez que se torna impossível descontar os estrangeiros da população
total de analfabetos. Tampouco se podia conhecer a distribuição dos analfabetos por estados e
municípios. A disposição dos dados aponta para a invisibilidade estrutural do letramento
como problema social de dimensão nacional. As assimetrias entre os estados restavam
invisíveis, contornando-se eventuais rivalidades entre eles.
Tabela 2 – População quanto ao analfabetismo (1890)

Fonte: Brasil (1898, p. 373)

O anuário estatístico e o censo de 1920 rompem este padrão, tabulando as informações


de maneira a reforçar a comparação e a desigualdade entre os estados. O anuário foi publicado
em três partes: 1) Território e População, lançado em 1916; 2) Economia e finanças, lançado
em 1917; 3) Estado moral e intelectual, editado em 1927; todos com referência ao período
1907-1912. Os dados relativos ao Distrito Federal ajudaram a monumentalizar a reforma
sanitária havida no Rio entre 1902 e 1906, e a impô-la como modelo aos estados mais
assolados pelas doenças transmissíveis, especialmente aquelas já erradicadas na capital
federal.
A disposição das informações, reservando uma página para o Distrito Federal e outra
para os estados, permitia um confronto direto, evidenciando a redução em cerca de 40% do
total de « óbitos por moléstias », em favor do primeiro, contra a elevada incidência ou a
redução apenas residual verificada para o conjunto dos estados no período em apreço (Brasil,
1916, p. 420-24). Para realçar ainda mais este desnível, um gráfico sobre o coeficiente
mortuário dispõe as moléstias transmissíveis nas capitais, não mais no padrão da ordem
alfabética, mas por ordem de ocorrência, especialmente de óbitos (Brasil, 1916, p. 426).
Esta opção revelava que seis das dez capitais em situação mais crítica de mortalidade
geral se encontravam no que hoje se conhece por norte e nordeste do Brasil. A disparidade
regional ficava mais acentuada quando se consideravam as doenças transmissíveis,
especialmente mortais em Recife, Manaus e São Luiz, que ostentavam índices muito acima da
média geral do país. E que os subúrbios do distrito federal, assim como o estado do Rio de
Janeiro (mesmo a capital Niterói), ainda sofriam com as doenças transmissíveis - que exigiam
dos governos ações sistêmicas de higiene agressiva – e, assim como a capital da república,
padeciam com os altos índices de tuberculose, que só seriam remediados por um forte e
inédito investimento em higiene preventiva.
Em relação ao tema da educação, a mudança é igualmente significativa. O anuário foi
o primeiro registro nacional do movimento da população e do sistema escolar, vista em uma
série histórica. Fazendo aparecer os totais de escolas, docentes, matrículas e frequência pelos
ramos de cada nível de ensino e desagregando os dados por estados e municípios, o anuário
torna visível a concentração das escolas em Rio, São Paulo, Minas e Bahia, e a profunda
assimetria na distribuição espacial das mesmas, com cerca de metade dos estados
respondendo por 10 a 20% de toda a rede escolar. Uma concentração que tende a se manter ou
ampliar ao longo dos cinco anos examinados pelo anuário. Vejamos como exemplo a
agregação do ensino profissional.
Do total de 156 escolas existentes no ano de 1907, aproximadamente 48% encontrava-
se no eixo formado pelo Distrito Federal (21), São Paulo (27) e Minas Gerais (27), sendo que
seis (Espírito Santo, Goiás, Mato Grosso, Piauí, Santa Catarina e Sergipe) dos dezessete
estados restantes contam com apenas uma unidade, e um sétimo estado (Rio Grande do Norte)
não possui nenhuma unidade de ensino profissional. Para o ano de 1912, que fecha o período,
temos um aumento de 95% do total de escolas – agora em 299. Pese aqueles sete estados mais
fracos estarem agora mais bem representados – Rio Grande do Norte com 2; Espírito Santo e
Santa Catarina com 3; Goiás, Mato Grosso e Sergipe com 4 escolas cada – observa-se outra
ampliação no crescimento desigual, uma vez que as 157 unidades localizadas no Distrito
Federal (28), em São Paulo (66) e em Minas Gerais (63) respondem agora por 53% do total,
um aumento absoluto de 5% em relação ao ano que inicia a contagem (Brasil, 1927, p. 1014-
1037).
A comparação sistemática entre os estados se completava na apresentação dos dados
por regiões. O novo padrão cristalizava a percepção visual de que os estados mais pobres e
politicamente fracos na ordem oligárquica concentravam-se no norte e no centro do país - que
então incluíam o que o IBGE viria, em 1942, a classificar como regiões nordeste e centro-
oeste - verificando-se a relação entre a alfabetização alarmante, a baixa densidade
demográfica e a desorganização da produção.
No censo de 1920, a região já aparece como unidade de visualização dos fenômenos
de população. Sintomaticamente, a regionalização dos dados se verifica justamente na saúde,
na educação e na organização do trabalho e da produção. Em todos os casos, o Distrito
Federal aparece como ponto de referência, para situar a deficiência dos estados e orientar seu
futuro desenvolvimento.
No volume sobre a instrução a tabulação por regiões é empregada duas vezes: no
monitoramento da frequência escolar, e do grau de instrução da população em idade escolar (7
a 14 anos) e acima dela (maiores de 15 anos). Mesmo sendo o coeficiente geral considerado
muito baixo, para o conjunto do país, a ênfase maior recai sobre as distorções entre os estados
do « norte » e do « sul », como se depreende da tabela abaixo:

Tabela 3 – População em idade escolar por grau de instrução e por região (1920)

Fonte: Brasil (1929, p. XVIII)

Voltaremos a encontrar a regionalização na forma como foram apresentados e


tabulados os dados referentes à produção agrícola. O censo levantou o número de
estabelecimentos rurais e sua superfície cultivada, cruzando estes dados com a extensão
territorial dos estados. A escolha das variáveis em cruzamento evidenciava que alguns estados
(como o Pará e o Mato Grosso) poderiam ter o tamanho comparável a uma região inteira, sem
possuir a décima parte de sua superfície cultivada. As densidades muito fracas desses estados,
em alguns casos verdadeiros vazios demográficos, também ficavam em evidência. Em plena
ordem oligárquica, não se pensava em atacar a propriedade improdutiva em si mesma.
Tratava-se de visualizar a distribuição desproporcional da concentração fundiária entre os
estados, caracterizando-a como um entrave ao abastecimento interno e ao desenvolvimento da
produção agrícola do país.

Tabela 4 – Estabelecimentos rurais por extensão territorial e por região (1920)

Fonte: (Brasil, 1923, p. XIV)

A tabulação dos dados por regiões, e não somente por estados, foi decisiva para as
comparações que identificamos em vários artigos de imprensa. O Correio da Manhã, um dos
mais influentes diários do Rio de Janeiro, publicou uma série de artigos sobre o número de
estabelecimentos rurais agrícolas e sua distribuição no território nacional. Um deles constatou
que o número de estabelecimentos rurais não estava ligado diretamente ao tamanho ou a
expressão de cada estado. Demonstrava surpresa ao somar as áreas de Mato Grosso com
Goiás e verificar que ambos tinham uma superfície maior que todos os estados do sul
reunidos (atuais sul e sudeste), e, no entanto, o total de estabelecimentos dos dois grandes
estados não chegava a 5% do total dos oito estados meridionais. Na comparação com os
estados do norte (atuais norte e nordeste), a proporção chegava a 43% (Guedes, 1923, p. 2).
Constatações como estas parecem simplórias aos olhos de hoje, e certamente não escapavam
aos contemporâneos do período em análise quais eram os estados mais ricos e quais eram os
mais pobres. A ruptura que então se produzia era outra: a descoberta da medida da
desigualdade por uma equivalência que a sustentava. A região fornecia esta equivalência,
configurando um padrão socioespacial dos fenômenos populacionais, que o recorte político
dos estados contribuía para isolar e mitigar.

Considerações finais

Nos anos 1890, os boletins e anuários de demografia sanitária compuseram o arsenal


dos higienistas para impor o diagnóstico pasteuriano e disciplinar o certificado de óbito
produzido pelos clínicos, através do cumprimento de protocolos observacionais. Na década
seguinte, a monumentalização estatística das campanhas de erradicação das epidemias na
capital federal criaria um padrão de disposição dos dados sobre a saúde. Formava-se, assim,
uma leitura construtivista dos números, que consagrava o sucesso do programa sanitário e a
necessidade de difundi-lo entre os estados do Brasil.

Nos anos 1910 e 1920, a estatística vai assumir uma dimensão nacional, no
movimento que generaliza a perspectiva médico-sanitarista para o conjunto da sociedade. O
anuário estatístico do Brasil é o primeiro a dispor as informações de maneira a apontar as
disparidades no desenvolvimento dos estados. O censo de 1920 foi mais longe, fazendo da
região uma nova grade de visualização do espaço nacional. Através da regionalização
estatística, a saúde e a educação serão construídas como um problema público, emancipando-
se da sua antiga condição de ramos da administração local para se tornarem esferas do social,
pontos de ancoragem da crítica política e de dilatação da ordem oligárquica.

Esta tendência também se verifica em outra pesquisa em curso, ainda exploratória. No


estágio inicial da pesquisa, percebemos que a quantificação da insalubridade e sua
apresentação como questão nacional figura nos principais periódicos médicos do período.
Tratam-se de publicações regulares sobre a capacidade de atendimento, tratamento e
vacinação dos postos de profilaxia rural, do serviço de proteção à infância e do serviço de
inspeção escolar, os principais espaços de higiene nas zonas suburbanas e rurais, instalados
em diferentes cidades ao longo dos anos 1920, na esteira dos acordos entre União e estados.
Por um lado, procura-se demonstrar a eficiência do modelo de ação defendido pelas
lideranças do movimento sanitarista. Por outro lado, à medida que estes espaços se
institucionalizam, ou passam a ser geridos por órgãos e orientações políticas contestados pela
agenda dos higienistas, as estatísticas de atendimento à população vão se tornando escassas, a
ponto de quase desaparecerem da imprensa médica, na virada para os anos 1930.
Este fato chama atenção para os limites das práticas de quantificação no higienismo do
primeiro terço do século XX. As estatísticas vitais mantêm-se como uma tecnologia
secundária de validação da hierarquia das doenças e do programa sanitário formulado pelos
sanitaristas. Uma vez que não há atores e corporações que rivalizem ou disputem os
significados dos dados e das categorias fora do meio médico-científico, as estatísticas vitais
jamais chegam a fornecer um marco regulatório para estabelecer os focos prioritários da
intervenção pública, na saúde, na educação ou no mundo do trabalho. Antes, porém,
permanecem uma tecnologia secundária de validação da hierarquia das doenças e do
programa sanitário formulado pelos higienistas, os quais definem o campo de possibilidades
do uso dos números no debate público da Primeira República.

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