Você está na página 1de 51

SUSANA THÉNON – UMA TRADUÇÃO

Ao poema compete tudo, mesmo a terra mais ingrata, a prova mais dura. De seu
confronto consigo mesmo não está ausente a guerra com o estrangeiro.

Tudo e nada estão para ser ditos. O poema é o poente que une dois extremos
ignorados. Mas é também esses extremos. O poema é uma aventurosa incursão pelo
ignorado.

Para o leitor brilhará outro elemento não previsto: uma raiz, um ramo. O Poema
total seria então um resultado de somas infinitas, de confrontos, contradições e
memórias, de recuperações e perdas, de esquecimento, morte e ser: (seria como um
deus) algo imortal nascido de criaturas mortais.

______________________________________________________________________

Al poema le incumbe todo, aun la tierra más ingrata, la prueba más dura. De su
confrontación consigo mismo no está ausente la guerra con lo ajeno.

Todo y nada están ahí para ser dichos. El poema es el puente que une dos
extremos ignorados. Pero es también esos extremos. El poema es una venturosa
incursión por lo ignorado.

Para el lector brillará otro elemento no previsto: una raíz, una rama. El Poema
total sería entonces un resultado de sumas infinitas, de confrontaciones, contradicciones
y memorias, de recuperaciones y pérdidas, de olvido, muerte y ser: (sería como un dios)
algo inmortal nacido de criaturas mortales.

IN: distancias (1984), epígrafe que antecede os poemas em LA MORADA IMPOSIBLE,


tomo 1.

N.T.: O mesmo texto já foi publicado à maneira de um poema com três estrofes (3, 4, 6
versos respectivamente), mas preferimos mantê-lo, nesta tradução, em linha reta.
APRESENTAÇÃO: TRADUÇÃO, TRADUTOR, TRADUZIDO

- SUSANA QUEM?

Os poemas de Susana Thénon me chegaram como um presente de outra poeta


argentina, Alejandra Pizarnik, com quem tenho me deitado, silenciado, enjaulado e me
debatido em fuga, rumo e risco à sua tradução. Numa das leituras sobre Pizarnik,
estavam citadas Susana Thénon e Juana Bignozzi, como poetas da chamada geração de
[19]60 da Argentina, geração que alude mais à época que a classificação de uma mesma
linguagem, temática, estilo, etcétera.

E o que se vai a ler nessa tradução, a tradutora ou a traduzida?

Antes de tudo, a traduzida; mas essa leitura é feita através da tradutora; sendo
assim, sempre as duas.

Nenhuma tradução abolirá o original - no caso de um grande escritor como


Baudelaire, que traduziu outro grande escritor como Allan Poe, o resultado final deu
lugar a um novo belo texto em francês, mas ninguém deixará de poder ler a primeira
versão em inglês.

Traduzo poemas que amo e constantemente pensando em duas coisas: a sempre


pertinente lição de Ezra Pound “melopéia, logopéia e fanopéia” (o sentido som; a
combinação de forma e conteúdo; e as imagens evocadas, respectivamente) e,
sobretudo, no espaço literário criado pelo autor. Não traduzo um poema, antes leio tudo
quanto posso, buscando percorrer o mesmo caminho poético trilhado originalmente,
desse modo, muitas palavras poderão não encontrar o termo original, pois traduzir não é
entregar o sentido literal de uma interpretação de tudo, traduzir poemas é dar conta de
vocabulário, ritmos, rimas (quando existem), figuras de linguagem, termos próprios da
língua materna, gírias e o mergulho no outro... Traduzir poemas é uma declaração de
amor ao infinito literário de determinado escritor.

Assim como no poema/processo nunca chegaremos à tradução definitiva, cada


uma é uma aproximação marcada pelo presente do tradutor. Assim, apresento a
Habitante do Nada, Susana Thénon, ainda inédita no Brasil, convidando a ler o original,
inclusive a fazer sua tradução pessoal - que findamos fazendo mentalmente quando
lemos noutra língua.
HABITANTE DO NADA

Iris Scaccheri, fotogtafia de Susana Thénon


CARRASCO

Uma voz próxima

me repete: descansa,

e eu

descansar não poderia

senão como em sonho

latente,

como flecha que repousa

em sua aljava.

Cada dia

minhas horas

se tornam mais agudas,

mais ásperas,

desde que estou sufocada

e o sol me arde.

Conheço as palavras

cujo som

as portas voam como plumas

e o céu é uma almofada para os pés.


Conheço o castigo.

Conheço todos os castigos.

Mas hoje amanheci carrasco.

VERDUGO

Una voz cercana


me repite: descansa,
y yo
descansar no podría
sino como en sueño
latente,
como flecha que reposa
en su carcaj.

Cada día
mis horas
se tornan más agudas,
más ásperas,
desde que no respiro
y el sol me arde.

Conozco las palabras


a cuyo sonido
las puertas vuelan como plumas
y el cielo es un cojín a los pies.

Conozco el castigo.
Conozco todos los castigos.

Pero hoy amanecí verdugo.


MINUTO

Em todo instante

se renova

a fugaz memória dos espelhos,

o perfil tosco dos corpos oxidados,

o andaime de palavras

não habitadas por mãos

ou por bocas escuras.

O tempo enruga os caminhos,

apaga os olhares longínquos,

vai iluminando a morte nas esquinas.

E como não saber isto:

chegará um minuto vazio

que almeja nossos rostos.

MINUTO

En todo instante
se renueva
la fugaz memoria de los espejos,
el perfil hosco de los cuerpos oxidados,
el andamiaje de palabras
no habitadas por manos
o por bocas oscuras.
El tiempo arruga los caminos,
borra las miradas lejanas,
va encendiendo la muerte en los rincones.
Y cómo no saber esto:
llegará un minuto vacío
que añore nuestros rostros.

CÍRCULO

Digo que nenhuma palavra

detém as algemas do tempo,

que nenhuma canção

afoga os estrondos da lamento

que nenhum silêncio

abarca os gritos que se calam.

Digo que o mundo é um imenso pântano

onde submergimos lentamente,

que não nos conhecemos nem nos amamos

como creem os que ainda podem remontar sonhos.

Digo que os poentes se rompem

ao mais leve som,

que as portas se fecham

ao murmúrio mais débil,

que os olhos se apagam

quando algo geme perto.


Digo que o círculo se estreita cada vez mais

E tudo que existe

Caberá num ponto.

CÍRCULO

Digo que ninguna palabra


detiene los puños del tiempo,
que ninguna canción
ahoga los estampidos de la pena,
que ningún silencio
abarca los gritos que se callan.
Digo que el mundo es un inmenso tembladeral
donde nos sumergimos lentamente,
que no nos conocemos ni nos amamos
como creen los que aún pueden remontar sueños.
Digo que los puentes se rompen
al más leve sonido,
que las puertas se cierran
al murmullo más débil,
que los ojos se apagan
cuando algo gime cerca.

Digo que el círculo se estrecha cada vez más


Y todo lo que existe
Cabrá en un punto.

HOJE

Falo, corneta, rosa


do anjo-barro: o amor

selou

seus vasos comunicantes.

Guardemos o incenso

para os verões públicos.

Deus não funciona.

HOY

Falo, corneta, rosa


del ángel-barro: el amor
ha obturado
sus vasos comunicantes.
Guardemos el incienso
para los veranos públicos.
Dios no funciona.

NÃO

Me nego a ser possuída

por palavras, por jaulas

por geometrias abjetas.

Me nego a ser

rotulada

violentada

absorvida.
Só eu sei como me destruir

como bater minha cabeça

contra a cabeça do céu,

como cortar minhas mãos e senti-las à noite

crescendo para dentro.

Me nego a receber esta morte

esta dor

estes planos tramados, inconcebíveis

só eu conheço a dor

que leva meu nome

e só eu conheço a casa de minha morte.

NO

Me niego a ser poseída


por palabras, por jaulas,
por geometrías abyectas.
Me niego a ser
encasillada,
rota,
absorbida.
Sólo yo sé como destruirme,
cómo golpear mi cabeza
contra la cabeza del cielo,
cómo cortar mis manos y sentirlas de noche
creciéndome hacia adentro.
Me niego a recibir esta muerte,
este dolor,
estos planes tramados, inconmovibles.
Sólo yo conozco el dolor
que lleva mi nombre
y sólo yo conozco la casa de mi muerte.

CAMINHOS

Cegueira do gesto

quando em vão se agarra

ao muro espesso dos feitos consumados.

Densa guitarra de sangue

acompanhando a canção

noturna e subterrânea.

Vagueia entre gritos

anônimos,

entre multidões de fome,

sob céus estrangeiros.

Entre humildes,

Ecos desesperançados.

CAMINOS

Ceguera del gesto


cuando en vano se aferra
al muro espeso de los hechos consumados.

Densa guitarra de la sangre


acompañando la canción
nocturna y subterránea.

Deambular entre gritos


anónimos,
entre multitudes de hambre,
bajo cielos ajenos.

Entre mansos,
Desesperanzados ecos.

AQUI

Crava-te, desejo

em meu lado raivoso

e molha suas pupilas

por minha última morte.

Aqui o sangue,

aqui o beijo dissoluto,

aqui a torpe fúria de deus

florescendo em meus ossos.


AQUÍ

Clávate, deseo,
en mi costado rabioso
y moja tus pupilas
por mi última muerte.

Aquí la sangre,
aquí el beso roto,
aquí la torpe furia de dios
medrando en mis huesos.

NÃO É UM POEMA

Os rostos são os mesmos,

os corpos são os mesmos,

as palavras voam para o desluzido,

as ideias de cadáver antigo.

Isto não é um poema:

é um ataque de raiva,

raiva pelos olhos ocos,

pelas palavras torpes

que digo e que me dizem,

por baixar a cabeça

para ratos,

para cérebros cheios de mijo,


para mortos persistentes

que interrompem o ar do jardim.

Isto não é um poema:

é um pontapé universal,

um soco no estômago do céu,

uma enorme náusea

vermelha

como era o sangue antes de ser água.

NO ES UN POEMA

Los rostros son los mismos,


los cuerpos son los mismos,
las palabras huelen a viejo,
las ideas a cadáver antiguo.

Esto no es un poema:
es un grito de rabia,
rabia por los ojos huecos,
por las palabras torpes
que digo y que me dicen,
por inclinar la cabeza
ante ratones,
ante cerebros llenos de orín,
ante muertos persistentes
que obstruyen el jardín del aire.

Esto no es un poema:
es un puntapié universal,
un golpe en el estómago del cielo,
una enorme náusea
roja
como era la sangre antes de ser agua.

POEMA

“Eu creio nas noites”.

R. M. Rilke

Ontem à tarde pensei que nenhum jardim justifica

o amor que se afoga desaforadamente em minha boca

e que nenhuma pedra colorida, nenhum jogo,

nenhuma tarde com mais sol que de costume

é o bastante para formar a sílaba,

o sussurro esperado como um bálsamo,

noite e noite.

Nenhum significado, nenhum equilíbrio, nada existe

quando o não, o adeus,

o minuto morto agora, irreparável,

se levantam inesperadamente e cega,

até morrermos em todo o corpo, infinitos.

Como uma fome, como um sorriso, penso,

deve ser a solidão

assim nos engana bem e entra

e assim a surpreendemos uma tarde


reclinada sobre nós.

Como uma mão, como um canto simples

e sombrio

deveria ser o amor

para tê-lo perto e não renegá-lo

cada vez que nos invade o sangue.

Não há silêncio nem canção que justifiquem

esta morte tão lenta,

este assassinato que nada condena.

Não há liturgia nem fogo nem exorcismo

para deter o fracassar ridículo

dos idiomas que conhecemos.

A verdade é que não me afogo sem lamentar,

pelo menos tenho resistido ao engano:

não participei da festa mansa, nem do ar cúmplice,

nem da metade da noite.

Mordo entretanto e ainda que pouco o bastante

meu sorriso guarda um amor que assustaria a deus.

POEMA

“Yo creo en las Noches”.


R. M. Rilke
Ayer tarde pensé que ningún jardín justifica
el amor que se ahoga desaforadamente en mi boca
y que ninguna piedra de color, ningún juego,
ninguna tarde con más sol que de costumbre
alcanza a formar la sílaba,
el susurro esperado como un bálsamo,
noche y noche.
Ningún significado, ningún equilibrio, nada existe
cuando el no, el adiós,
el minuto recién muerto, irreparable,
se levantan inesperadamente y enceguecen
hasta morirnos en todo el cuerpo, infinitos.
Como un hambre, como una sonrisa, pienso,
debe ser la soledad
puesto que así nos engaña y entra
y así la sorprendemos una tarde
reclinada sobre nosotros.
Como una mano, como un rincón sencillo
y umbroso
debería ser el amor
para tenerlo cerca y no desconocerlo
cada vez que nos invade la sangre.
No hay silencio ni canción que justifiquen
esta muerte lentísima,
este asesinato que nadie condena.
No hay liturgia ni fuego ni exorcismo
para detener el fracaso risible
de los idiomas que conocemos.
La verdad es que me ahogo sin pena,
por lo menos he resistido al engaño:
no participé de la fiesta suave, ni del aire cómplice,
ni de la noche a medias.
Muerdo todavía y aunque poco se puede ya,
mi sonrisa guarda un amor que asustaría a dios.

AQUI, AGORA

Sei que em algum lugar

a alegria se espalha

como o pólen

e que há tempos

os homens se erguem

como jardins definitivos.

Mas eu vivo aqui e agora

onde tudo é horrível

e tem dentes

e velhas unhas petrificadas.

Aqui e agora,

onde o ar sufoca

e o medo é impune.

AQUÍ, AHORA

Sé que en algún lugar


la alegría se desparrama
como el polen
y que hace tiempo
los hombres se yerguen
como jardines definitivos.
Pero yo vivo aquí y ahora,
donde todo es horrible
y tiene dientes
y viejas uñas petrificadas.
Aquí, ahora,
donde el aire
se asfixia
y el miedo es impune.

RAZÃO DE MINHA VOZ

Por que são muitos e sofrem,

por que estamos conscientes de longínquos gritos

ou sabemos que há silêncio

em uma esquina da cidade

ou porque salta de um livro e nos fala

o menino que morreu afogado.

Por que agora sem dúvida um homem pede socorro

e uma mulher se joga de sua janela escura

e quatro crianças respondem perguntas

em um quarto imenso

enquanto a uma boneca falta o braço e alvo.

RAZÓN DE MI VOZ

Porque son muchos y sufren,


porque nos enteramos de lejanísimos gritos
o conocemos que hay silencio
en un rincón de la ciudad,
o porque de un libro salta y nos habla
el niño que murió ahogado.
Porque ahora sin duda un hombre pide socorro
y una mujer se arroja por su ventana oscura
y cuatro niños responden preguntas
en un cuarto inmenso
mientras a un muñeco le falta el brazo y mira.

MEDIADOR DEI

O contrabandista dos medos antigos

o malabarista delirante em sua varanda vermelha

(com pequenos pés enferrujados)

lava as mãos no peito das nuvens

e se cobre de azul para não ver sangue.

MEDIATOR DEI

El contrabandista de los miedos antiguos,


el malabarista delirante en su balcón rojo
(con pequeños pies oxidados),
baña las manos en el pecho de las nubes
y se cubre de azul para no ver sangre.

MUNDO
Este é o mundo em que vivemos

os mendigos buenos aires século vinte

junto ao fumo descalço

flutuando sem asas sobre os tetos

efêmeros como pedacinhos de chocolate

inúteis como pássaros ocos.

Estes são nossos rostos que caem aos pedaços

enquanto o sol migra cansado de nos olhar

e o frio nos celebra com sua festa de morte.

Mas eu não quero esta sina de espantalho:

meu olfato busca ávido o cheiro da alegria

e minha pele se expande quando digo amor.

MUNDO

Este es el mundo en que vivimos


los mendigos buenos aires siglo veinte
junto al humo descalzo
flotando sin alas sobre los techos
efímeros como pastillas de chocolate
inútiles como pájaros huecos.
Estos son nuestros rostros que se caen a pedazos
mientras el sol emigra cansado de mirarnos
y el frío nos celebra con su fiesta de muerte.
Pero yo no quiero este sino de espantapájaros:
mi olfato busca afanoso el olor de la alegría
y mi piel se agranda cuando digo amor.
HABITANTE DO NADA

Vivo entre pedras

sua forma se parece à minha.

Eu sou uma pedra,

um brinquedo no túmulo de uma criança,

uma medalha escurecida?

Sou antes um espelho gasto

uma superfície que não reflete,

um rosto estranho

um dia que termina.

HABITANTE DE LA NADA

Vivo entre piedras,


su forma se me parece.
¿Yo soy una piedra,
un juguete en la tumba de un niño,
una medalla ennegrecida?
Soy más bien un espejo gastado,
una superficie que no refleja,
un rostro impar,
un día que termina.

INFERNO
Acredita no ódio

que joga veneno em seu lábio?

Acredita no rancor

que te morde até diluir seu inferno?

Acredita na lenda

dos polos opostos

e nesta adorável mentira

da inimizade entre água e azeite?

Hoje?

quando o amor se disfarça de ódio

para sobreviver,

quando o carrasco chora

atrás da morte

e deus descansa?

INFIERNO

¿Crees en el odio
del que arroja veneno en tus labios?

¿Crees en el rencor
del que te muerde hasta apagar su infierno?
¿Crees en la leyenda
de los polos opuestos
y en esa venerable mentira
de la enemistad entre el agua y el aceite?

¿Hoy,
cuando el amor se disfraza de odio
para sobrevivir,
cuando el verdugo llora
detrás de la muerte
y dios descansa?

CAOS

O suposto caminho é a consagração

de seus passos,

não têm mais que avançar

- o retrocesso os surpreenderá um dia -,

não á outra alternativa além de seguir adiante.

Sua culpa não nasceu,

isto que vem e tocam e tem todo ele

sabor de coisa digerida em sonhos.

São sinais de nada,

mostram com sons quase envelhecidos já

o progresso do variante símio.

Vão sozinhos.

Um grande cansaço não ajuda,


não convida ao caos, preparado como uma festa.

CAOS

El supuesto camino es la consagración


de sus pasos,
no tienen más que avanzar
-el retroceso los sorprenderá un día-,
no tienen más alternativa que adelante.
Su culpa no ha nacido,
esto que ven y tocan tiene todo el
sabor de cosa digerida en sueños.
Son señales de nada,
muestran con sonidos casi envejecidos ya
el progreso de la variante simiesca.
Van solos.
Un gran cansancio no ayuda,
no invita al caos, preparado como una fiesta.

ONDE

“Só o mistério

Nos faz viver.

Só o mistério.”

F. García Lorca

Abaixo a teoria da gestalt

as estatísticas anuais

o observador no pólo
os conselhos de controle.

Abaixo o sol meteorológico

o tetranitrato de pentaeritritol

a força motriz aproveitável

e o robô eletrônico.

Abaixo o predicado nominal

a glossemática de Hjelmslev

o catálogo de códigos e documentos

a patogenia do coma hepático.

Abaixo as categorias dimensionais

a soma dos ângulos interiores de um sonho

a cosmovisão do eu

os graus do amor cibernético

como seguir

o que ser

onde morrer

DÓNDE
“Sólo el misterio
nos hace vivir.
Sólo el misterio.”
F. García Lorca.

Bajo la teoría de la gestalt


las estadísticas anuales
el observador en el polo
los tableros de control.

Bajo el sol meteorológico


el éster nítrico del alcohol tetrahídrico
la fuerza motriz aprovechable
y el robot electrónico.

Bajo el predicado nominal


la glosemática de Hjelmslev
el catálogo de códices y documentos
la patogenia del coma hepático.

Bajo las categorías dimensionales


la suma de los ángulos interiores de un sueño
la cosmovisión del yo
los grados del amor cibernético

cómo seguir
qué ser
dónde morir

HABITANTE

É o habitante
de meus desejos proibidos.

teu ritmo se levanta

perto de meu lado mais tênue.

Tua credencial

é um gemido.

HABITANTE

Eres habitante
de mis deseos prohibidos.
Tu ritmo se levanta
cerca de mi latido más tenue.
Tu credencial
es un gemido.

ORAÇÃO

Quando deixará a lua

de preferir a esses poucos

que tanto à meia-noite

como ao amanhecer

gritam seu ardor sem freio.

Quando será definitivo

o direito a sonhar

sem verificar números

papéis rasgados, sexos,


velocidade sem pressa do sangue.

Quando morrerá o céu

- seus castigos –

e o raio será um menino

entre as folhas.

Quando arderão os ventos

sepultados.

ORACIÓN

Cuándo dejará la luna


de preferir a esos pocos
que tanto a media noche
como al alba
gritan su ardor sin freno.
Cuándo será definitivo
el derecho a soñarse
sin verificar números,
papeles rotos, sexos,
velocidad sin prisa de la sangre.
Cuándo morirá el cielo
-sus castigos-
y el rayo será un niño
entre las hojas.
Cuándo arderán los vientos
sepultados.

POEMA
É inútil que a amada se arraste

em busca da mão que desenha sombras

sob sua pele.

É inútil que voe

perseguindo a nuvem de pedra que a feriu.

Em vão saltará de folha em folha

perguntando pelo rosto

que se afogou

no ar.

POEMA

Es inútil que la amada se arrastre


buscando la mano que dibuja sombras
bajo su piel.
Es inútil que vuele
persiguiendo a la nube de piedra que la hirió.
En vano saltará de hoja en hoja
preguntando por el rostro
que se ahogó
en el aire.

SEDE

Sei que tua sede se estendeu

para além do mais distante fio d’água:

tua é a sede dos verões,


a que habita na garganta do meio-dia.

Faz muito tempo que o sal

ancorou em tuas vísceras

e é ali onde se dá de beber

o lábio vermelho de nosso atos impunes.

Sim um castigo foi criado

é o do teu silêncio

que grita mais alto que as palavras.

Sim um castigo foi criado

é o de permanecer

como uma cega

em uma selva de olhares.

SED

Sé que tu sed se ha dilatado


más allá del más lejano hilo de agua:
tuya es la sed de los veranos,
la que anida en la garganta del mediodía.
Mucho tiempo hace que la sal
ha fondeado en tu entraña
y es allí donde abreva
el rojo labio de nuestros actos impunes.

Si un castigo has creado


es el de tu silencio
que grita más alto que las palabras.

Si un castigo has creado


es el de permanecer
como una ciega
en una selva de miradas.

MAIS ALÉM

Remontar teu violento mistério

além do sangue,

além do esquecimento,

longe, até o confim do tempo.

Saber-te amanhecendo

na tarde sonora,

no profundo sabor de tuas pernas

subindo meu beijo

até sua boca indefesa,

abrindo tuas portas

lambendo tuas praias secretas

com furor de ressaca do mar .

Descobrindo a rosa em tua língua,

tua bandeira vermelha.

Arrancando do coágulo as horas,


nascendo em segredo.

MÁS ALLÁ

Remontar tu violento misterio


más allá de la sangre,
más allá del olvido,
lejos, hasta el confín del tiempo.
Saberte, amaneciendo
en la tarde sonora,
en el hondo sabor
de tus piernas,
irguiendo mi beso
en tu boca indefensa,
abriendo tus puertas,
lamiendo tus playas secretas
con furor de marea creciente.
Descubriendo la rosa en tu lengua,
tu roja bandera.
Arrancando de cuajo las horas,
naciendo en secreto.

AMOR

Agora conhece o que assovia o sangue

à noite

como a escura serpente extraviada.

AMOR
Ahora conoces lo que silba la sangre
de noche
como la oscura serpiente extraviada.

UM

Te dizer

que eu sou mais 1

dentro do NÃO mundo.

Te dizer

idiomas com espinhos sob as unhas.

Te dizer

nada

para você algo quase nada.

UNO

Decirte
que yo soy 1 más
dentro del NO mundo.

Decirte
idiomas con espinas bajo las uñas.

Decirte
nada
para tu algo casi nada.

NOMES

Na desolação do meu sangue,

sob a angústia que me cega

eu busco nomes para meu amor:

meu amo quase ódio,

apenas sol.

NOMBRES

En la desolación de mi sangre,
bajo la angustia que me enceguece
yo busco nombres para mi amor:
mi amor casi odio,
apenas sol.

SER

Morder teu significado

Nesta escala de magnitudes

Inateráveis.

Ser, ao extremo

de teu meridiano,
um ponto,

um breve sinal

peregrino por tuas fronteiras.

Desfazer teu limite,

afundar em tua sonora latitude,

reconhecer um por um teus portos

e nomeá-los por seus nomes.

SER

Morder tu significado
en esta escala de magnitudes
inalterables.
Ser, al extremo
de tu meridiano,
un punto,
un breve signo
peregrino por tus aledaños.
Desvanecer tu límite,
ahondar en tu sonora latitud,
reconocer uno por uno tus puertos
y nombrarlos por sus nombres.

HISTÓRIAS DE MAGIA

Um garoto espera

que o mar o alcance.

Quer ser o garoto


ausente, à hora do passeio.

Se cobre de areia.

É um barco naufragado.

Um administrador para

e pensa, quatro vezes quis demasiado.

(Os números celestes determinam

aos números sujos de terra

em Cannes, nos porões violentos

de Cannes, e em

todos todos os presságios de amor).

Um louco estende a mão

e pede água, é cinza

a água com o cristal, com a parede,

com a tarde

esparramada no relógio de sol.

Um sacerdote pensa, sou um homem

com altura e pele de cepa:

Minha rosa vive ainda,

enlouquece debaixo da túnica.

Sou um sino de luto.


Um homem de sentará e dirá estou cansado

Um homem se estenderá ao sol e dirá por quê

Um homem será o bastante para dizê-lo

Um homem pulará o muro

e dirá não.

HISTORIAS DE MAGIA

Un muchacho espera
que lo alcance el mar.
Quiere ser el muchacho
ausente, a la hora del paseo.
Se cubre de arena.
Es un barco ahogado.

Un administrador se detiene
y piensa, cuatro veces quise demasiado.
(Los números celestes determinan
a los números sucios de tierra
en Cannes, en los sótanos violentos
de Cannes, y en
todos todos los augurios de amor).

Un loco alza la mano


y pide agua; es gris
el agua con el cristal, con la pared,
con la tarde
espolvoreada en el reloj de sol.

Un sacerdote piensa, soy un hombre


con altura y pie de tallo:
mi rosa vive aún,
enloquece por debajo del ropón.
Soy una campana de luto.

Un hombre se sentará y dirá estoy cansado


Un hombre se tenderá al sol y dirá por qué
Un hombre será bastante para decirlo
Un hombre saltará su valla
y dirá no.

O MORTO

Seu rosto murmura

minhas fases não são doces,

como um esporte a pele mergulha

e a boca explode em redemoinhos do tempo.

A terra canta

Sobre meu nariz golpeado.

Como uma festa saltam os olhos

embora a morte deva ser quietude.

Como verdes loucos fugitivos da noite

minhas mãos são inflamáveis.

EL MUERTO

Su rostro murmura,
mis etapas no son dulces,
como un deporte la piel se sumerge
y la boca estalla
en remolinos de tiempo.
La tierra canta
sobre mi noser.
Como una fiesta saltan los ojos
aunque la muerte deba ser quietud.
Como verdes locos fugitivos de la noche
mis manos son inflamables.

O DANÇARINO

O dançarino disse, danço,

meu vestido é ar e sombra,

meu cabelo é fumaça.

O passado e o futuro dançam em mim.

Cada minuto deixa uma âncora em meu rosto.

Sou o tempo a cada passo,

a morte em minha quietude.

Bailo todos os bailes, me desafogo

e me uno.

Sou mar, o homem do mar:

meu corpo é onda, minha mão é peixe,

minha dor é pedra e sal.


EL BAILARÍN

El bailarín dice, bailo,


mi vestido es aire y sombra,
mi cabello es humo.
El pasado y el futuro bailan en mí.
Cada minuto deja un ancla en mi rostro.
Soy el tiempo a cada paso,
la muerte en mi quietud.
Bailo todos los bailes, me desahogo
y me uno.
Soy mar, el hombre mar:
mi cuerpo es ola, mi mano es pez,
mi dolor es piedra y sal.

A SÓS

É certo:

A seriedade de seu sorriso.

Imagina-se a sós

com tanto grito à sua volta?

O tempo caminha entre os perfumes,

destampa um frasco, perde minutos a deixar morrer

entre os trajes para meio vivos,

como recém afogados.

Compreendo:

os gritos silenciados,
os peixes, nascimento perpétuo.

Antes, uma vez...

Ninguém nunca saberá.

Imagina-se a sós

com tanto abismo à sua volta?

A SOLAS

Es cierto:
la seriedad de su sonrisa.
¿La imaginas a solas
con tanto grito alrededor?
El tiempo entre los perfumes camina,
destapa un frasco, pierde minutos de dejar morir
entre los trajes a media vivos,
como recién ahorcados.

Comprendo:
los gritos enmudecidos,
los peces, nacimiento perpetuo.

Antes, una vez...


Nadie lo sabrá nunca.

¿La imaginas a solas


con tanto abismo alrededor?

RESTO
Ficam os movimentos elementares

do sangue

e o rosto, espelho cego

onde se precipita o meio-dia.

Ficam as mãos, apenas,

suavemente desenhadas

nas costas negras do ar.

Ficam as palavras, não a música,

não o rumor equidistante do sol

quando faz noite, dor e medo.

Ficam os animaizinhos cansados

de golpear, cara e estio,

em sua jaula de ossos.

RESTO

Quedan los movimientos elementales


de la sangre
y el rostro, espejo ciego
donde se precipita el mediodía.

Quedan las manos, apenas,


suavemente dibujadas
en la espalda negra del aire.

Quedan las palabras, no la música,


no el rumor equidistante del sol
cuando hace noche, dolor y miedo.

Quedan los animalitos cansado


de golpear, cara y seca,
en su jaula de huesos.

EU

Eu vivo o tempo,

recomponho velhos verbos destroçados

nos fornos do frio

e me invento uma palavra para cada lágrima.

Eu saio para passear

e me inclino sobre as fontes vazias

para beijar minha boca inexistente.

Eu tenho o olhar cheio de sal

e corpos como estrelas de areia

e flores vorazes

que me consomem lentamente.


Eu vivo e tremo,

ressuscito e me arrasto pelo ar quente

das florações

e pelo olho sempre aberto do dia.

Eu, lua tíbia

me amando e morrendo.

YO

Yo vivo y tiemblo,
recompongo viejos verbos destrozados
en los hornos del frío
y me invento una palabra para cada lágrima.

Yo salgo a pasear
y me inclino sobre las fuentes vacías
para besar mi boca inexistente.

Yo tengo la mirada llena de sal


y cuerpos como estrellas de arena
y flores voraces
que me consumen lentamente.

Yo vivo y tiemblo,
resucito y me arrastro por el aire caliente
de las floraciones
y por el ojo siempre abierto del día.
Yo, luna tibia,
amándome y muriendo.

ELA

Pela madrugada

(ela se deu conta das mãos).

Pela madrugada, apenas.

Ela lembra que nada importa

embora sua sombra siga correndo

em volta da noite.

Algo se deteve em algum momento

algo marchava debilmente

e se deteve em algum momento.

Ela tremeu como um som

congelado entre os lábios de um morto.

Ela se desvaneceu como uma lembrança

evocada até a saciedade.

Ela se dobrou sobre sua respiração

e compreendeu que ainda vivia.

Deu-se conta da liberdade

e a deixou escorrer como uma pequena noite.

Amarrou a angústia ao redor do pescoço

e lembrou sua cor desaparecida.


Ela mordeu às cegas na escuridão

e escutou gritar o silêncio.

E aprendeu a rir

do cheiro antigo que dava adeus a seu sangue.

Pela noite

(ela cortou as mãos).

Pela noite, apenas.

Ela recolhe seu pequeno ocaso.

Ela sonha na ereção da rosa.

ELLA

De madrugada
(ella se tocó las manos).
De madrugada, apenas.
Ella recuerda que nada importa
aunque su sombra siga corriendo
alrededor de la noche.
Algo se detuvo en algún momento,
algo marchaba débilmente
y se detuvo en algún momento.
Ella tembló como un sonido
congelado entre los labios de un muerto.
Ella se deshizo como un recuerdo
convocado hasta la saciedad.
Ella se inclinó sobre su respiración
y comprendió que aún vivía.
Se tocó la libertad
y la dejó escurrirse como una pequeña noche.
Se anudó la angustia alrededor del cuello
y recordó su color extraviado.
Ella mordió a ciegas en la oscuridad
y escuchó gritar al silencio.
Y aprendió a reírse
del olor a tiempo que despedía su sangre.
De noche
(ella se cortó las manos).
De noche, apenas.
Ella recoge su pequeño crepúsculo.
Ella sueña en la erección de la rosa.
***

BREVE BIOGRAFIA

Susana Thénon (Buenos Aires/ Argentina, 1937-1990). Além de poeta, foi tradutora,
ensaísta e fotógrafa artística. Sua poesia não se assemelha a de nenhum outro
conterrâneo. Senhora de uma voz irônica, de crítica pungente e mundos criados com a
ideia do Belo e da Arte, acionando como poeta o Real, mas a partir do maravilhoso. Faz
parte, junto com Alejandra Pizarnik e Juana Bignozzi, da chamada geração de 60, muito
embora não tenha feito parte de nenhum grupo ou movimento literário. Sua relação com
os poetas de sua geração é quase nula, salvo exceções como Maria Negroni, que mais
tarde compilou seus livros póstumos La Morada Imposible I y II, e Alejandra Pizarnik,
com quem publicou na Revista Literária Agua Viva, nos anos 60 e uma de suas poucas
amigas. Não publicou nada entre 1970-82, anos em que se dedicou ativamente à
fotografia, embora continuasse escrevendo.

OBRAS

Edad sin trégua, 1958


Habitante de la nada, 1959
De lugares extraños, 1967
Distancias, 1984
Ova completa, 1987
La morada imposible, Tomo I e II, 2001 (póstumo)
Iris Scaccheri, brindis a la danza - Leviatán, 2011 (fotografia; póstumo)
HABITANTE DO NADA
SUSANA THÉNON

Seleção e tradução: Nina Rizzi

Iconografia/ Capa: Nina Rizzi, sobre desenho de Júlia Barata “As aventuras pós-
modernas de Cecília, a peixa” [http://www.julia-barata.blogspot.com.br/].

Página Oficial:
www.ellenismos.com

Endereço eletrônico:
ellenismosrevista@gmail.com

Editora Responsável: Nina Rizzi

© 2013 Ellenismos - Diálogos com a Arte.


ISSN: 2316-1779.

Você também pode gostar