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Pozzobon Jorge. O lumpen-indigenismo do estado brasileiro. In: Journal de la Société des Américanistes. Tome 85, 1999. pp.
281-306.
doi : 10.3406/jsa.1999.1738
http://www.persee.fr/web/revues/home/prescript/article/jsa_0037-9174_1999_num_85_1_1738
Abstract
The low-grade indigenism of the Brazilian State This paper focuses on the Fundação Nacionál do Índio
(FUNAI), the Brazilian State department of Indian affairs. The inefficiency and anomy of this institution is
eloquent proof of the neglect of Indian problems by the Brazilian government. The FUNAI often seems
to be merely a means of life for its functionaries, since many of them act as if the Indians were, rather
than the object of their professional care, a kind of additional embarrassement. Some of these
functionaries engage in illicit activities such as the robbing of equipment, the illegal sale of Indian land,
illegal gold mining and timber exploitation. Others manipulate the Indians through a clientelist system of
exchange of favors and trade-goods. It is thus very difficult to deliver the FUNAI from the grip of these
internal « Maffias ». The present article analyses the process of deterioration of the FUNAI, presents a
diagnosis of its current situation and offers a series of proposals for a structural change in the policy of
the Brazilian State in regard to indigenous peoples.
Résumé
L'indigénisme de misère de l'État brésilien L'article traite de la Fundação Nacionál do Índio (FUNAI),
l'organisme gouvernemental brésilien en charge des affaires indigènes. L'état d'anomie et l'inefficacité
qui caractérisent cet organisme démontrent de façon éloquente la place mineure que les pouvoirs
constitués du pays réservent à la question indigène. Tout se passe comme si la FUNAI ne servait qu'à
assurer l'existence de ses propres cadres : plusieurs d'entre eux agissent d'ailleurs, en effet, comme si
les Indiens, loin d'être les groupes au service desquels ils exercent leur profession, étaient des gêneurs.
Certains fonctionnaires se livrent à des activités illicites comme le vol d'équipements, le négoce des
terres indigènes ou le trafic du bois et de l'or exploités illégalement. La manipulation des Indiens par le
biais du clientélisme en échange de faveurs et de marchandises est aussi monnaie courante et rend
très difficile l'élimination des maffias qui régnent au sein de la FUNAI. La présente étude analyse le
processus de détérioration de la FUNAI, pose un diagnostic de la situation actuelle et présente une
série de propositions de changements structurels dans la politique de l'État brésilien à l'égard des
populations indiennes.
Resumen
Trata-se da Fundação Nacionál do índio (FUNAI), organismo através do qual o governo brasileiro
presta assistência ás populacões indígenas do país. О estado de ineficácia e anomia no qual se
encontra a Fundação é uma prova éloqüente do papel secundário reservado à questão indígena pelos
poderes constituídos. Tudo se passa como se a FUNAI fosse apenas um meio de vida para seus
funcionários, pois muitos agem como se os índios nào fossem a substância que justifica sua profissão,
mas apenas um incômodo adicional. Alguns se entregam a atividades ilícitas, tais como o roubo de
equipamentos, as negociatas com terras indígenas, bem como ao tráfico de madeira e ouro ilegalmente
explorados. Há mesmo aqueles que manipulam os índios através de um sistema clientelista de troca de
favores e mercadorias, о que torna extemamente dificil a tarefa de livrar о orgào dessas « máfias »
internas. Este artigo analisa o processo de deterioração da FUNAI, faz um diagnóstico de sua situaçâo
atual e apresenta uma série de proposiçôes de mudança estrutural na politica do Estado brasileiro para
os povos indígenas.
О LUMPEN-INDIGENISMO DO ESTADO BRASILEIRO
Jorge POZZOBON *
This paper focuses on the Fundaçâo Nacionál do índio (FUNAI), the Brazilian State
department of Indian affairs. The inefficiency and anomy of this institution is eloquent proof of
the neglect of Indian problems by the Brazilian government. The FUNAI often seems to be
merely a means of life for its functionaries, since many of them act as if the Indians were, rather
than the object of their professional care, a kind of additional embarrassement. Some of these
functionaries engage in illicit activities such as the robbing of equipment, the illegal sale of
Indian land, illegal gold mining and timber exploitation. Others manipulate the Indians through
a clientelist system of exchange of favors and trade-goods. It is thus very difficult to deliver the
FUNAI from the grip of these internal « Maffias ». The present article analyses the process of
deterioration of the FUNAI, presents a diagnosis of its current situation and offers a series of
proposals for a structural change in the policy of the Brazilian State in regard to indigenous
peoples.
Key words : public policies, Brazilian Indians, clientelism.
1 . OS VÍCIOS DE ORIGEM
os indios eram aldeados para facilitar a assistência à saúde, mas nos aldeamentos eles
se tornavam muito mais vulneráveis as doenças que se pretendia combater. Por outro
lado, seus padrôes alimentares se deterioravam, uma vez que a concentraçâo espacial
dificultava a prática da agricultura itinérante, da pesca, da caça e da coleta. Impossi-
bilitados de praticar a economia tradicional, os indios se tornavam dependentes do
fornecimento de ferramentas agricolas, gado e outras alternativas econômicas. Porém,
dada a inconstância de um orgâo indigenista depauperado, esse fornecimento era
irregular, sendo a distribuiçâo deixada ao encargo de chefes de posto despreparados e
fora de contrôle da direçâo do orgâo. Grande parte destes distribuia mercadorias
apenas entre as lideranças indigenas que os apoiavam. Isso aprofundava os facciona-
lismos tradicionais e rompia paulatinamente о tecido social dos grupos onde о orgâo
atuava, além de camuflar os desvios de verba, os arrendamentos ilegais e a exploraçâo
dos recursos naturais em benefício próprio e dos indios cooptados. 6
É bem verdade que os militares combateram os desvios de verba da renda
indígena, mas, ao absorverem na estrutura do novo orgâo uma boa parte dos
funcionários do SPI, trouxeram para a FUNAI о modelo assistencialista, com vários
dos seus vicios de origem, como a criaçâo de dependência e a manipulaçâo de
lideranças indigenas. A diferença em relaçâo ao periodo anterior era que os militares,
dispondo de somas incomparavelmente maiores de recursos financeiros, 7 puderam
implementar projetos de grande impacto, como de resto todos os projetos decorrentes
das estratégias de integraçâo nacionál e modernizaçâo do pais. 8
A contrapartida indigenista do gigantismo rodoviário dos anos 70 foi o quase
desaparecimento de vários povos indigenas, cujo território era cortado pelas novas
rodovias. 9 Um dos casos mais tipicos foi о dos indios Panará, conhecidos na época
como Kren-a-karore. О traçado da rodovia Cuiabá-Santarém passava pela area
tradicional destes indios, mas mudar o traçado de uma rodovia federal para preservar
um grupo indígena estava totalmente fora das estratégias de modernizaçâo e integra
çâo do governo militar. Entâo, sob o pretexto de que os Kren-a-karore seriam
dizimados pelas doenças e pela violência das frentes de expansâo, eles foram removi-
dos das imediaçôes da Serra do Cachimbo, no sul do Para, para dentro do Parque
Indígena do Xingu. Em pouco tempo, a populaçâo Panará decaiu de 600 para 1 80
pessoas. 10
Casos como este, que proliferaram durante a ditadura militar, atrairam para os
dirigentes da FUNAI severas criticas por parte de vários funcionários, incluindo a
geraçâo de novos indigenistas que eles, militares, haviam trazido para о orgâo a fim de
modernizá-lo. Esta nova geraçâo nâo tardou a se identificar aos anseios progressistas
de redemocratizaçâo da sociedade nacionál, colocando-se contra о que chamavam de
« política genocida dos militares ». Porém, a nova geraçâo nâo deixou de se aliar, por
conveniência política ou falta de alternativa, a um grupo de funcionários fisiológi-
cos, n que os militares haviam reaproveitado na FUNAI ao extinguirem o SPI. Essa
nova geraçâo tampouco foi capaz de superar a relaçâo assistencialista com os indios.
Assim, criou-se dentro do novo orgâo uma curiosa aliança entre aqueles que se
indignavam corn о « genocídio » promovido pelos militares e aqueles que se sentiam
prejudicados com a « moralizaçâo » que os mesmos se dispunham a implantar no
orgâo. E com esta aliança surgiu dentro da FUNAI, em meados dos anos 70, uma
cultura de conspiraçâo e golpe que vale a pena descrever.
Pozzobon, I] O LUMPEN-INDIGENISMO DO EST ADO BRASILEIRO 285
Por outro lado, o modelo de gestâo que os militares haviam implantado mantivera
durante cerca de 20 anos as diretorias e departamentos do orgâo atrelados vertical-
mente a sua presidência, sem que se desenvolvessem formas horizontais de gerencia-
mento. Corn о advento da Nova República, era natural que a presidência do orgâo
perdesse o caráter autocrático do periodo militar. Porém, essa desconstruçâo do
autoritarismo nâo se fez acompanhar de uma reconstruçâo administrativa, de modo
que as diretorias e departamentos da FUNAI, na falta da presidência todo poderosa
que as unia e em consequência das nomeaçôes negociadas que passaram a vigorar a
partir da Nova República, transformaram-se em pequenos feudos, agindo de forma
desconexa e quase independente.
Desfalcada de seus melhores quadros técnicos durante o governo militar, a
FUNAI da Nova República passou a ser um orgâo externamente controlado pelos
compromissos résultantes dos sucessivos loteamentos politicos em nivel federal e
internamente feudalizado pelos antagonismos entre funcionários.
О motivo desses antagonismos é basicamente a luta pelos cargos de confiança. О
caráter acirrado desta luta decorre das progressivas perdas salariais que o funciona-
lismo público em gérai sofreu desde о final da ditadura militar, corn о fim dos grandes
empréstimos internacionais e as exigências impostas pelo FMI a cada novo emprés-
timo ou negociaçâo da divida externa.
Desmotivado pelos baixos salários, o servidor público passou a cumprir suas
obrigaçôes normais apenas quando detentor de um cargo de confiança. Mais do que
isso, passou a conceber este о cargo como complementaçâo salarial e direito adqui-
rido. A destituiçâo de um cargo de confiança passou a ser vista como injustiça e
pretexto suficiente para justificar sabotagens e manobras visando a derrubada da
chefia que a praticou. Na FUNAI essas atividades assumem um caráter particular-
mente agudo, dado que os indios sâo usados como massa de manobra, como veremos
adiante.
Contribuiu para о agravamento deste estado de coisas o sucateamento generali-
zado da administraçâo publica federal, decorrente da estratégia neo-liberal de mini-
malizaçâo do Estado, que trouxe novas perdas salariais, precários investimentos na
qualificaçâo do servidor público, cortes orçamentarios e obsolescência da infra-
estrutura fisica. Na FUNAI, desde 1986 nâo se fazem cursos de qualificaçâo de
funcionários. O resultado perverso para os indios é que se proliferou no orgâo a
prática do desvio de funçâo : 13 vários chefes de posto e mesmo administradores
regionais foram recrutados entre os motoristas, os auxiliares de serviços gérais e
outros servidores administratives, sem o menor preparo para lidar com as populaçôes
indigenas ou para aplicar corretamente о orçamento do orgâo. Por outro lado, os
cortes orçamentarios progressives e a degradaçâo dos equipamentos fisicos, tais como
postos indigenas, viaturas e enfermarias de campo, trouxe, para aqueles que nâo
integram os círculos do poder, a desmotivaçâo nas tareras diárias, o descomprometi-
mento com os indios e a apatia em relaçâo aos destinos do orgâo.
Esse desmazelo nào deixa de ter seus efeitos psicológicos sobre os setores técnicos
especializados do orgâo em Brasilia, entre eles, os departamentos de Saúde e Educa-
çâo. Nesses setores, о desânimo com as açôes do orgâo em campo tem levado à
naturalizaçâo da ineficiência, como se ela fizesse parte da ordem do mundo. É comum
ouvir-se afirmaçôes do tipo « a FUNAI nâo tem jeito. » Mas quando se trata de
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10. chantagem a membres de facçôes opostas por meio de documentos que provam participa-
çào em atividades ilícitas (na sede da FUN AI em Brasilia).
Tudo isso tem um efeito deletério adicional para os índios : mobiliza os poucos
advogados da FUNAI em comissôes de sindicância e processos administratives
disciplinares, de modo que a defesa dos direitos indigenas, que deveria estar no centra
das preocupaçôes desses advogados, fica relegada a um segundo piano, a tal ponto que
se criou entre eles uma estranha cultura juridica, segundo a quai os advogados estâo là
para resolver os problemas do orgâo e nâo os dos índios. Um dos présidentes récentes
da FUNAI (1994), nâo dispondo de sustentaçâo interna capaz de mudar esta cultura
juridica, viu-se obrigado a criar a Coordenaçâo Gérai de Defesa dos Direitos Indige
nas, que funcionava de modo independente e sem intercâmbio com a Procuradoria
Juridica, о que vem a ser mais uma prova de esquizofrenia administrativa e deterio-
raçâo.
Como se nâo bastassem todas essas distorçôes, a comissâo de anistia da FUNAI
readmitiu (1990 em diante), junto com os funcionários que os militares haviam
demitido por motivos políticos, uma série de funcionários demitidos por corrupçâo,
de modo que se futuramente alguém questionar a anistia concedida aos funcionários
demitidos por improbidade, terá de questionar também a anistia aos que de fato
sofreram perseguiçâo politica durante a ditadura militar.
E bem verdade que a readmissâo de funcionários realmente comprometidos com
a defesa dos índios teve um efeito positive Foi por conta desta readmissâo que о orgâo
logrou nâo perder por completo a credibilidade, especialmente no que diz respeito à
demarcaçâo de terras indigenas. Nos dois primeiros anos da década de 90, a FUNAI
promoveu uma campanha de demarcaçâo sem précédentes na história do pais, sob a
égide do Art. 231 da Constituiçâo de 1988 e do Decreto 22, de 1991, que regulamen-
tava os procedimentos administratives de demarcaçâo de areas indigenas.
Para entender por que no inicio dos anos 90 a Diretoria de Assuntos Fundiários da
FUNAI se destacou do marasmo e da incompetência caracteristica das demais
diretorias e departamentos é preciso levar em conta dois fatores. 14 De um lado, a
esquizofrenia administrativa do orgâo, que permite aos diferentes setores agirem de
modo independente, sem qualquer meta em comum. De outro lado, o caráter para
doxal do Governo Collor de Mello, que se apresentara como a única alternativa capaz
de deter о avanço das esquerdas, sem ser ao mesmo tempo uma coalizâo da direita
tradicional. Apoiado maciçamente pelos meios de comunicaçâo de massa, Collor de
Mello se elegera sem recorrer ao loteamento politico que embasou todos os demais
governos da Nova Republica, inclusive os que о sucederam. Portanto, ele podia se dar
ao luxo de tomar medidas de agrado internacional, como por exemplo o reconheci-
mento oficial da Area Indígena Yanomami durante a ECO 92 e a campanha sem
précédentes de demarcaçâo de terras indigenas que se seguiu a este ato, mesmo que
essas medidas desagradassem a bancada ruralista, a cupula militar e os neo-liberais. 15
De qualquer forma, a excelêneia da FUNAI nos assuntos fundiários tinha o indese-
jável efeito colateral de minimizar aos olhos da opiniâo publica o caos administrativo,
a incompetência e a corrupçâo nos demais setores. A despeito de um desempenho
espetacular no setor fundiário, a FUNAI continuava e continua até hoje na rota da
degeneraçâo.
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A esta altura cabe perguntar por que motivo as organizaçôes indigenas sérias, as
ONGs, a Igreja, os parlamentares ligados à causa indígena e os funcionários etica-
mente corretos da FUNAI ainda nâo conseguiram desbaratar os esquemas de poder
e corrupçâo dentro do orgâo. A resposta é simples. O assistencialismo impossibilita o
saneamento no âmbito de governos sem vontade política para criar outro tipo de
relaçâo entre о Estado e os povos indigenas. Vejamos como isto funciona na prática.
Ao longo de quase um século de indigenismo oficial, desde o SPI até a FUNAI de
hoje, os indios foram acostumados a um tratamento assistencialista. 16 Em vista disso,
demonstram dificuldade para entender os poucos projetos de desenvolvimento sus-
tentável que a Fundaçâo tem sido capaz de formulář e lhes propor nos ultimos anos.
Projetos sâo coisas abstratas. Seus rendimentos demoram a aparecer. A fim de que a
produçâo indígena de banana-passa, por exemplo, renda o suficiente para satisfazer a
demanda dos indios por bens industrializados, é preciso racionalizar a produçâo,
padronizar о produto e coloca-lo no mercado a preços competitivos ou com algum
apelo adicional do tipo « produto natural », « produçâo indígena » etc. Dada a
incompetência dos setores responsáveis da FUNAI, nada disso acontece, de modo
que os projetos se convertem amiúde em frustraçâo para os indios. A saida que eles
encontram é fazer pressâo sobre os dirigentes do orgâo para que estes simplesmente
doem as mercadorias que eles desejam, o que, alias, vem ocorrendo desde a época do
SPI. Nâo é fácil se livrar de uma longa história de assistencialismo, sobretudo com
alternativas acanhadas e técnicos despreparados.
Porém, o maior obstáculo à formulaçâo e à implementaçâo de qualquer projeto
que confira autonomia aos indios nâo é о despreparo dos técnicos. О maior obstáculo
é o clientelismo, essa forma degenerada de assistencialismo, que se estabeleceu na
FUNAI da Nova Republica e constitui prática corrente até os dias atuais. Čada grupo
de interesse dentro do orgào possui uma espécie de « curral eleitoral » ou « clientela »
entre os indios, a fim de garantir a permanência em postos-chave e cargos de
confiança. Na época do SPI e mais tarde durante o periodo militar, o indigenismo
oficial brasileiro se encarregara de criar e aprofundar a dependência dos indios em
relaçâo aos bens industrializados, sem dar-lhes condiçôes de adquiri-los por meio de
seu próprio trabalho. A partir da Nova Republica, além de gerar dependência, о
assistencialismo assumiu um caráter francamente clientelista. A distribuiçâo de bens
e vantagens entre os indios passou a ser feita seletivamente a fim de garantir a
permanência de grupos no poder e derrubar grupos antagônicos.
Um dos principais meios de cooptaçâo de indios é a propina. Habitualmente ela
assume a forma de uma « ajuda de custo » que os indios obtêm cada vez que vâo a
Brasilia. A quantia é variável. Alguns caciques importantes recebem quantias de até
US$ 1.500,00. Houve um reajuste, que estabeleceu US$250,00 para os caciques,
US$ 150,00 para os vice-caciques 1? e US$ 68,00 para os demais indios. Essa verba é
repassada junto com as passagens de volta para os municí pios em que incidem as areas
indigenas. Alega-se que eles precisam corner na viagem. Porém as quantias excedem
bastante о que se gasta em refeiçôes de Brasilia até о leste do Mato Grosso, de onde
vem a maior parte da « clientela » da FUNAI. Diante disso, os indios vào a Brasilia
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cerca de duas vezes рог mes, о que rende para cada cacique um salário mensal de
US$ 500,00.
Visto que о dinheiro nâo faz parte dos bens que normalmente integram as trocas
tradicionais entre os grupos de parentesco que constituem a malha social de uma etnia
indigena, a distribuiçâo de propinas, além de ser um desperdício de recursos fmancei-
ros, acaba gerando privilégios e, com eles, algumas perigosas rupturas no tecido social
das comunidades indigenas envolvidas. 18
Um outro meio utilizado pelos funcionários para garantir o apoio dos índios é
oferecer-lhes emprego na FUNAI. Inicialmente, isso era usado pela presidência do
orgâo como antidoto à mobilizaçâo de índios рог parte de funcionários descontentes.
Corn о passar do tempo, о descontrole e a feudalizaçâo administrativa resultaram na
disseminaçâo e na cristalizaçâo desta prática, de modo que cada grupo organizado de
funcionários passou a ter um grupo de funcionários índios como apoiadores.
Absorver índios na estrutura da FUNAI nâo é por si coisa condenável, desde que
eles demonstrem capacitaçâo para desempenhar as funçôes que se lhes designam.
Porém, о modo como os índios sâo absorvidos e os critérios de escolha têm sido
inteiramente ditados pělo oportunismo. Salvo algumas exceçôes, empregam-se nâo os
índios que tenham algum preparo, mas aqueles cujos laços de parentesco com
lideranças e aldeias importantes asseguram apoio a quem os coloca na FUNAI.
Este problema é particularmente agudo nos postos indigenas. Quando se conduz
um índio à chefia de um posto indigena sem o devido treinamento, ele dificilmente
compreenderá que deve atender as comunidades sem discriminaçâo de afiliaçâo tribal,
clânica ou de linhagem. Dará preferência ao seu grupo de parentesco, deixando
desassistidos os demais. Por exemplo, usará a viatura do posto em tareras que
extrapolam suas funçôes, tais como pescarias, passeios na cidade mais próxima,
visitas a parentes que moram em outras areas. Enquanto isso, nas aldeias que nâo têm
a sorte de serem sedes de postos indigenas, crianças morrem de diarréia e outras
doenças perfeitamente controláveis. 19
Um terceiro meio bastante utilizado para obter о apoio dos índios, sobretudo o
apoio dos índios do Brasil Central, é a distribuiçâo estratégica de viaturas utilitárias.
A demanda por viaturas foi criada na época da ditadura militar : a fim de inibir a
mobilizaçâo de índios e também para dar uma versâo indigenista das estratégias de
desenvolvimento e integraçào nacionál que norteavam seus pianos de governo, os
militares haviam fomentado entre os índios do Brasil Central uma série de « projetos
de desenvolvimento », que nâo passavam de imensas plantaçôes de arroz, com farta
distribuiçâo de viaturas e máquinas agrícolas. Com a falência dos projetos — atri-
buivel à falta de previsâo da capacidade de absorçâo dos mercados locais e à falta de
transmissâo de tecnologia aos índios — o saldo foi uma énorme demanda indigena de
viaturas, que a FUNAI da Nova Republica passou a satisfazer segundo o apoio dado
pelos índios as pretensóes políticas e salariais dos diferentes grupos organizados.
Obviamente, isso géra revolta e faccionalismos entre os índios excluídos, pois os
beneficiados nâo se sentem obrigados a estender o benefício das viaturas segundo as
linhas tradicionais de cooperaçâo e solidariedade. Para mitigar as brigas internas,
adotou-se a regra segundo a quai haveria uma viatura para cada aldeia. Mas os índios
cada vez mais se dâo conta da demanda de apoio politico por parte dos grupos
organizados da FUNAI, que usam a viatura como moeda de troca. Com isto, os
Pozzobon, 1} O LUMPEN-INDIGENISMO DO ESTADO BRASILEIRO 291
índios passam a subdividir suas próprias aldeias no intuito de ganhar mais viaturas, o
que novamente résulta em ruptura do tecido social. Esse processo é particularmente
agudo entre os Xavante. Suas aldeias tradicionais tinham em média 150 pessoas. 20
Hoje em dia há uma grande quantidade delas com 30 ou 40 pessoas — um decréscimo
que nâo pode ser atribuído à depopulaçâo, posto que a populaçâo Xavante aumentou
desde a década de 60, mas a uma mudança nos padrôes de assentamento devido à
disputa pelas viaturas e outras mercadorias.
■l.l l.ll-.l
///////s/// '//'/
O Gráfico 1, acima, dá uma idéia dos demandas colocadas pelos índios. Foi
elaborado a partir de uma amostra de 78 pedidos formulados por eserito e entregues
por índios nas mâos do presidente do órgáo em Brasilia, entre 29/02/96 e 01/4/96. 21
Salta aos olhos a desproporçâo entre os pedidos de emprego, viaturas e dinheiro face
aos demais pedidos. Isso revela, antes de mais nada, um grande desconhecimento por
parte dos índios das atribuiçôes da FUNAI, que sâo a demarcaçâo e a proteçâo das
terras indigenas, bem como a assistência à saude, à educaçâo e as atividades produti-
vas das comunidades. Apenas très dos 78 pedidos — dois projetos de produçâo
agricola e uma solicitaçâo de équipe volante de saúde — enquadram-se em tais
atribuiçôes. Com boa vontade, podemos incluir também as ferramentas de trabalho, o
gado e as máquinas agrícolas. De qualquer forma, isso deveria partir das administra-
çôes regionais da FUNAI e nâo da direçâo central do orgâo em Brasilia, cujo papel é
coordenar о trabalho das administraçôes regionais. Muitas vezes a viagem dos índios
a Brasilia sai mais cara do que comprar о que desejam na cidade mais próxima.
О uso combinado desses très meios de cooptaçâo — propinas, empregos e
viaturas — produziu ao longo dos anos uma espécie de clientela preferencial da
FUNAI, cujos membros mais reivindicativos pertencem aos povos Xavante e Kayapó.
Um dos motivos do constante assédio desses dois povos indigenas à sede da FUNAI
292 JOURNAL DE LA SOCIÉTÉ DES AMÉRICANISTES [85, 1999
investimento
em présentes
incremerto
da demanda
indígena
descompro-
inetimento desassistência alianças entre incapacidade
e despreparo nos setores indios.madeireiros corrupçâo de
dos vitais e garimpeiros planejatnento
.
funcionários
operaçôes de
vigilâneia
mau emprego
do orçamento
carencias na
formaçâo de pessoal
6. Perspectivas
gerencial : os serviços prestados serâo avaliados pela qualidade, pela agilidade e pela
capacidade de baixar os custos do atendimento através de um planejamento eficaz.
— 5.1. Na verdade, as fundaçôes públicas, entre elas a FUNAI, foram concebidas
para implementar formas gerenciais, nào burocráticas, de administraçâo dos serviços
sociais. Para tanto, tinham maior liberdade na contrataçâo de pessoal (regime CLT) e
no emprego de verbas públicas (licitaçôes menos rigidas). Porém, a ausência de
instrumentes de contrôle e avaliaçâo por parte do Estado e da sociedade civil abriu
espaço para a oligarquizaçâo e o apodrecimento desses organismos, de modo que foi
preciso reestabelecer a antiga centralizaçâo do sistema, através do Regime Jurídico
Único e da nova lei de licitaçôes.
— 5.2. Para evitar a deterioraçâo mencionada acima, é preciso que a nova agêneia
seja dirigida por um conselho de composiçâo mista, governamental e nâo governa-
mental. Do lado governamental, devem participar os ministérios implicados nas açoes
indigenistas, isto é, о Ministério da Saúde, Ministério do Meio Ambiente, o Ministério
da Educaçào, о Ministério da Justiça e о Ministério da Agricultura. 29 Do lado nâo
governamental, deverâo participar organizaçôes indigenas, organizaçoes nào gover-
namentais de idoneidade e tradiçâo comprovadas e pessoas de notório saber no
domínio em questâo.
— 5.3. A presença de membres da sociedade civil organizada no conselho, bem
como a flexibilidade na contrataçâo de pessoal e os critérios gerenciais, nâo buroerá-
ticos, de avaliaçâo de desempenho, serâo mecanismos impedidores do surgimento, na
nova agêneia, do assistencialismo e do clientelismo caracteristicos do indigenismo
tradicional.
— 5.4. A nova agêneia deverá estar vinculada ao Ministério do Meio Ambiente,
cujas caracteristicas mais téenicas do que politicas serâo a garantia minima de que о
fomento aos projetos indigenas nâo padeça da descontinuidade tipica dos ministérios
de vocaçâo mais política, como o Ministério da Justiça.
— 5.5. A nova agêneia nâo implica de modo algum em qualquer espécie de
monopólio no trato das questôes indigenas. Neste sentido, nâo haverâ concorrêneia
com a FUNAI, tanto mais quanto esta se tem demonstrado sistematicamente incapaz
de avaliar e fomentar os projetos indigenas de autonomia e cooperaçâo com a
sociedade nacionál.
— 5.6. Tendo em vista as grandes potencialidades econômicas de certas areas
indigenas, os rendimentos dos projetos fomentados pela nova agêneia serào destina-
dos nâo apenas à aquisiçâo dos bens industrializados que os indios necessitam, mas
também pata implementar açoes de saúde e educaçào indigenas, agindo de forma
complementar à FUNAI, a fini de cobrir as falhas crônicas do orgâo nestes dominios.
— 5.7. A capacitaçào dos indios através do fomento de projetos trará com о tempo
a eliminaçào dos intermediaries na exploraçào das riquezas das areas indigenas
(garimpeiros, madeireiros etc.) e о fini das alianças entre eles e os indios. Com isto, as
operaçôes de vigilâneia e fiscalizaçâo das areas indigenas se tornarâo bem mais fáceis
e menos dispendiosas para a FUNAI, que poderâ aplicar mais verbas na assistência à
saúde e à educaçào dos indios.
6. Quanto aos grupos indigenas que tradicionalmente têm feito parte dos esque-
mas de cooptaçào praticados pelo indigenismo oficial, é preciso um tratamento de
302 JOURNAL DE LA SOCIÉTÉ DES AMÉRICANISTES [85, 1999
NOTAS
6. A politica da dependência praticada na época do SPI e aquela que se pratica hoje em dia nâo sâo
diferentes na estrutura, apenas no valor das mercadorias envolvidas : naquela época barganhava-se apoio
indigena por ferramentas, sementes, animais de tiro e corte. Hoje, barganha-se o mesmo apoio por viaturas
utilitárias. Porém, dada a diversidade geogránca e a desigualdade econômica do pais, em muitas regiôes as
barganhas ainda envolvem os antigos itens, sobretudo na Amazônia. Um bom exemplo deste ultimo ponto
é o caso dos Waimiri-Atroari, contactados pela FUNAI em meados dos anos 70, porém segundo os mesmos
métodos do antigo SPI (cf. Baines, 1990).
7. Recursos financeiros eram fáceis e fartos no primeiro decênio da ditadura militar, com as injeçôes
advindas dos paises ricos do Ocidente, preocupados em deter о avanço do comunismo internacional no
terceiro mundo.
8. Sobre os grandes projetos, veja Gomes, 1988.
9. Cf. Davis, 1978.
10. Cf. Cohen, 1996.
11. О termo « fisiológico » é uma ironia corrente na administraçâo publica brasileira. Aplicado a um
funcionário ou a um politico, désigna o indivíduo que exerce cargo público em benefício próprio, para
satisfazer suas necessidades « fisiológicas » — isto é, seus anseios de enriquecimento fácil e rápido mediante
о desvio de verbas, o tráfico de influência e o apadrinhamento politico.
12. As delegacias regionais eram unidades administrativas intermediárias entre a sede da FUNAI e os
postos indigenas. Em alguns casos, havia entre os postos e as delegacias uma unidade chamada ajudância. As
delegacias regionais sào as atuais administraçôes regionais.
13. « Desvio de funçâo » é uma expressào tipica da administraçâo publica brasileira. Um funcionário
esta em desvio de funçâo quando foi contratado para fazer um tipo de trabalho, mas na verdade faz outro,
geralmente comissionado (cargo de confiança) e para о quai о nào recebeu treinamento — daí o termo
« desvio ».
14. Sobre a FUNAI e a demarcaçâo de terras indigenas, veja Oliveira e Almeida, 1998.
15. Sobre o periodo Collor de Melo, veja Vilas Boas, 1991.
16. Ao final desta seçâo, retomo о assunto do costume indigena corn о assistencialismo.
17. Vice-cacique é alias uma categoria burocrática alienigena. Foi criada pělo SPI sob o pretexto de
dividir as responsabilidades e com isto garantir um maior engajamento das lideranças nas atividades
assistenciais dos postos indigenas, mas na prática o vice-cacicato acirrava e cristalizava os faccionalismos
internos, impedindo que eles se resolvessem conforme a tradiçâo. No mais das vezeš o vice-cacicato tern a
funçâo de captar mais « ajuda de custo » quando das idas a Brasilia.
18. Pode-se dizer que a fragilidade dos grupos indigenas diante dos meios monetários de troca decorre
da natureza de suas economias, fundadas no modo de produçâo doméstico (Sahlins, 1974 ; Gianotti, 1983),
cuja caracteristica principal é a subprodutividade. Esta, por sua vez decorre, de alguns fatores culturais
encontre veis em maior ou menor grau em qualquer sociedade indigena : (1) idéias modestas de demanda
e satisfaçào ; (2) certas barreiras sócio-políticas ao incremento da produçâo, tais como o faccionalismo
e a dispersâo populacional que ele provoca ; (3) sub-uso da força de trabalho, pois dadas as idéias modestas
de satisfaçào, os grupos domésticos mais produtivos trabalham menos que os menos produtivos para
produzir as mesmas coisas. О incremento produtivo só ocorre em situaçôes rituais, quando os grupos
domésticos mais produtivos compensam о menor esforço diârio com présentes que celebram a vida coletiva.
Ora, se as idéias modestas de satisfaçào forem substituídas pělo desejo de mercadorias ou de dinheiro para
comprá-las, as situaçôes rituais, que tinham sentido apenas diante daquelas idéias modestas, já nâo serào
mais capazes de obrigar os grupos domésticos mais jovens a doar excedente de trabalho em prol da
coletividade. Daí o caráter desagregador do dinheiro e das mercadorias (Cf. Hugh-Jones, 1992 e Appadurai,
1986).
19. O individualismů dos indios chefes de posto certamente chocará os espiritos afeitos à ideologia do
bom selvagem e do comunismo primitivo, fantasias que serviram de justificativa para as Utopias ocidentais,
de Morus a Voltaire, de Rousseau a Marx, e que só fazem atrapalhar a investigaçào etnológica. As sociedades
indigenas reais sâo cindidas por diversos segmentos e segmentes de segmentos que se estruturam em torno
das idéias locais de parentesco e incorporaçâo social. A reciprocidade e solidariedade interna e externa
variam de uma « tribo » para outra, conforme essas idéias. Em alguns casos, a reciprocidade pode ser
francamente negativa (cf. Sahlins, 1974), daí o perigo de se colocar um índio sem treinamento na chefia de um
posto indigena.
20. Cf. Maybury-Lewis, 1984 : 52.
21. О eixo horizontal contém os tipos de pedidos. О vertical, as quantidades de pedido de cada tipo.
22. О termo, criado por Jaulin (1970), aplica-se perfeitamente ao caso.
Pozzobon, J] O LUMPEN-INDIGENISMO DO ESTADO BRASILEIRO 305
23. A esta altura, o leitor atento quererá saber quais sào os mecanismos que possibilitam, pělo lado dos
índios, esse costume com o clientelismo e essa comunhào de interesses com os funcionários fisiológicos da
FUNAI. O assunto merece sem dúvida pesquisa de campo demorada e nào pode ser desenvolvido no curto
espaço děste artigo. Mas pode-se formulář algumas hipóteses a respeito. A mais óbvia é que a « gramática »
do clientelismo nào é estranha as sociedades indigenas, pois além dos modelos formais de organizaçào
(mormente expressos nas estruturas de parentesco e nas hierarquias etárias, rituais ou ligadas à filiaçào), em
muitas delas prevalece о regime do big man, isto é, do homem alçado à condiçào de lider рог força de carisma
e habilidade politica na formaçâo de clientelas, e nào por pertencer a esta ou àquela linhagem, classe etária
ou segmento ritual. A partir desta hipótese genérica, podemos formulář hipóteses específicas sobre o caráter
mais ou menos propenso aos apelos clientelistas da FUNAI, conforme a sociedade em estudo se oriente mais
pelo kinship ou mais pelo bigmanship. Um estudo comparativo dos Karibe e Kayapó, por exemplo, poderá ser
bastante esclarecedor a este respeito.
24. Vale lembrar que na administraçâo publica nào se pode realizar empenho ou licitaçâo sem cobertura
orçamentaria.
25. Por exemplo, os gastos efetuados no aluguel de helicópteros de pequeno porte para a operaçâo
Yanomami desde 1990 seriam suficientes para adquirir 2,5 helicópteros de médio porte a US$ 7.000.000,00
cada.
26. Varias versôes foram discutidas, mas todas giravam em torno das seguintes areas : Acre, Javari,
Solimôes, Rio Negro, Roraima (lavrado), Roraima (mata), Norte do Para, Amapá, Sudoeste do Amazonas,
Sudoeste do Para, Sudeste do Para, Maranhào, Nordeste, Rondônia, Oeste de Mato Grosso, Xingu, Leste de
Mato Grosso, Mato Grosso do Sul I (Terena, Xerente etc.), Mato Grosso do Sul II (emergencial Kaiová),
Tocantins, Leste, Sul.
27. No programa Màos à obra, Brasil, Sâo Paulo : PSDB, 1994, lê-se à p. 209 « О Governo Fernando
Henrique Cardoso fárá da parceria Estado-Sociedade uma das suas características marcantes, aprofundando
:
e consolidando о processo de democratizaçâo, aumentando a eficácia do gasto governamental e dando
transparência as acóes públicas. » Mais adiante (p. 241), esta escrito : « A participaçâo das populaçôes e
comunidades indigenas nas questôes que afetam seu modo de vida é condiçào bàsica para a manutençào de
seus bens naturais e culturais. » (grifos meus)
28. О futuro dos grupos já cooptados se discute adiante, na recomendaçâo de numero 6.
29. Até о présente momento, este ultimo pouco tem contribuído para о indigenismo oficial. Mas com a
implementaçâo de uma politica de fomento aos projetos indigenas, deverá ser cada vez mais solicitado.
30. Um desses fatores é provavelmente a tradiçâo ibérica do centralismo burocrático, de que tanto
padecemos desde о Brasil Colônia até os dias atuais. Além desse, devemos levar em conta o corporativismo
que о servidor público herdou da ditadura varguista, bem como a inércia que possuem os órgáos públicos em
gérai, muitos dos quais seguem existindo a despeito de nâo cumprirem mais as funçôes para as quais foram
concebidos. A titulo de ilustraçâo, conto о caso de um servidor da FUNAI que declarou, aparentemente sem
se dar conta, a seguinte barbaridade « Até que é bom trabalhar na FUNAI. О problema é o índio. »
:
BIBLIOGRAFIA
Appadurai, Arjun, 1986. — The social life of things, Cambridge University Press, Cambridge.
В aines, Stephen, 1990. — E a FUNAI que sabe : a frente de aîraçâo Waimiri-Atroari, Museu
Paraense Emilio Goeldi, Belém.
Cardoso, Fernando Henrique, 1994. — Màos à obra, Brasil, PSDB, Sâo Paulo.
Cohen, Marleine, 1996. — « О caminho de volta : a saga dos gigantes Panará », em : Carlos
Alberto Ricardo (Org.), Povos indigenas no Brasil, Instituto Socioambiental, Sâo Paulo.
Davis, Shelton, 1978. — As vitimas do milagre : о desenvolvimento e os índios do Brasil, Zahar,
Rio de Janeiro.
Gianotti, José Artur, 1983. — Trabalho e reflexâo. Ensaios para uma dialética da sociabilidade,
Brasiliense, Sâo Paulo.
306 JOURNAL DE LA SOCIÉTÉ DES AMÉRICANISTES [85, 1999