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A PROPRIEDADE INDUSTRIAL E A PROPRIEDADE INTELECUTAL

O direito de propriedade industrial está intrinsecamente relacionado ao direito de


propriedade intelectual, podendo ser visto como uma espécie deste e que, também, abrange o
direito autoral e até o antitruste.1 Assim, podemos afirmar que o direito de propriedade intelectual é
gênero e que são espécies o direito do inventor (direito de propriedade industrial), intrinsecamente
ligado ao direito empresarial, e o direito do autor (direito autoral), ligado ao direito civil. 2 A
compatibilidade do direito de propriedade industrial frente ao direito autoral, que protegem bens
imateriais, são agrupados sob a denominação comum de direito de propriedade intelectual.3
Apesar do direito do autor e do direito do inventor sejam agrupados sob o prisma
do direito de propriedade intelectual, existe várias diferenças entre eles, principalmente sobre o
regime de proteção jurídica aplicável, e isso é possível porque4 o direito autoral protege a obra em
si, enquanto o direito de propriedade industrial protege uma técnica. 5 No que tange a distinção entre
descoberta e invenção, a constituição de 1988, cuida dos direitos de propriedade industrial na parte
dos direitos e garantias individuais, estabelecendo, em seu art. 5º, inciso XXIX, o seguinte:

A lei assegurará aos autores dos inventos industriais privilégio temporário para a sua
utilização, bem como proteção às criações industriais, à propriedade das marcas, aos nomes de empresas
e a outros signos distintivos, tendo em vista o interesse social e do desenvolvimento tecnológico e
econômico do País.

A Lei nº 9.279/96 – Lei de Propriedade Industrial (LPI), que substituiu a antiga


Lei nº 5.772/71 e que regula, atualmente, os direitos e obrigações relativos á propriedade industrial
no Brasil, estabelecendo, em seu art. 2º, que:

A proteção dos direitos relativos à propriedade industrial, considerado o seu


interesse social e o desenvolvimento tecnológico e econômico do País, efetua-se mediante: I – concessão
de patentes de invenção e de modelo de utilidade; II – concessão de registro de desenho industrial; III –
concessão de registro de marca; IV – repressão às falsas indicações geográficas; e V – repressão à
concorrência desleal.

Os bens protegidos pelo direito de propriedade industrial são quatro: a invenção e


o modelo de utilidade, que são protegidos mediantes a concessão de patente, através da respectiva
1
HAMMES, Bruno Jorge apud RAMOS, André Luiz Santa Cruz, Propriedade Industrial. In: Curso de direito
empresarial. 3ª ed., Bahia: Podivm, 2009. p. 183.
2
RAMOS, André Luiz Santa Cruz, Propriedade Industrial. In: Curso de direito empresarial. 3ª ed., Bahia: Podivm,
2009. p. 183.
3
Idem.
4
COELHO, Fábio Ulhoa apud RAMOS, André Luiz Santa Cruz, idem, p. 183.
5
Idem, p. 184.
carta-patente, a marca e o desenho industrial, protegidos mediante a concessão do registro, através
do respectivo certificado de registro. O direito de propriedade industrial reprime as falsas
indicações geográficas e a concorrência desleal.6
A LPI é coerente com a normatização de acordo internacional firmado pelo Brasil,
a Convenção da União de Paris. O Brasil é signatário original da desta Convenção e não admite em
seu ordenamento a distinção entre nacionais e estrangeiros em matéria de direito industrial.
Reconhece o princípio da prioridade, em que:

qualquer cidadão de país signatário da União pode reivindicar prioridade de patente


ou registro industrial, no Brasil, à vista de igual concessão obtida, anteriormente, em seu país de origem,
desde que o façam em 6 meses, para o modelo ou desenho industriais, marca ou sinal de propaganda, ou
em 12 meses, para a invenção ou modelo de utilidade contados da apresentação de seu primeiro pedido7

Destaque-se ainda que a LPI considera os direitos de propriedade industrial coisas


móveis, segundo disposição constante do seu art. 5º: consideram-se bens móveis, para os efeitos
legais, os direitos de propriedade industrial.
Os direitos de propriedade industrial são concedidos, no Brasil, pelo Instituto
Nacional de Propriedade Industrial – INPI, que é uma autarquia federal, vinculada ao Ministério do
Desenvolvimento, Indústria e Comércio, e que possui a atribuição de conceder privilégio e garantias
aos inventores e criadores em âmbito nacional. 8 O artigo 2º da Lei nº 5.648/70, com a redação dada
pela LPI, dispõe que:

O INPI tem por finalidade principal executar, no âmbito nacional, as normas que
regulam a propriedade industrial, tendo em vista a sua função social, econômica, jurídica e técnica, bem
como pronunciar-se quanto á conveniência de assinatura, ratificação e denúncia de convenções, tratados,
convênios e acordos sobre propriedade industrial.

As decisões do INPI podem sempre ser submetidas ao Poder Judiciário, baseado


no princípio da inafastabilidade do controle jurisdicional dos atos do Poder Público, previsto no art.
5º, inciso XXXV, da Constituição da República.9

INDICAÇÕES GEOGRÁFICAS

6
Idem, p. 187.
7
COELHO, Fábio Ulhoa. Propriedade industrial. In: Manual de direito comercial. SP: Editora Saraiva, 18ª
ed., 2007. p. 93.
8
RAMOS, op. cit., p. 188.
9
Idem.
A LPI protege os bens da propriedade industrial (a invenção, o modelo de
utilidade, o desenho industrial e a marca), e coíbe a concorrência desleal, matéria ligada ao direito
econômico, e trata das chamadas indicações geográficas.10
A Lei de Propriedade Industrial, Lei Nacional n.º 9.279, de 14 de maio de 1996,
deixa a desejar sobre a definição do que é Indicação Geográfica, ressaltando suas espécies, a
Indicação de Procedência e a Denominação de Origem. A lei revela a ausência de hierarquia legal
entre elas, sendo possibilidades paralelas à escolha dos produtores ou prestadores de serviços que
mostrem interesse em buscar esta modalidade de proteção, atendidos os requisitos da lei e de sua
regulamentação. Mas podemos definir a Indicação Geográfica como sendo:

a identificação de um produto ou serviço como originário de um local, região ou


país, quando determinada reputação,característica e/ou qualidade possam ser vinculadas essencialmente a
esta sua origem particular. Em suma, é uma garantia quanto a origem de um produto e/ou suas qualidades
e características regionais.11

De acordo com o art. 176 da LPI, constitui indicação geográfica a indicação de


procedência ou a denominação de origem.

A Indicação de Procedência – IP é caracterizada por ser o nome geográfico


conhecido pela produção, extração ou fabricação de determinado produto, ou pela prestação de dado
serviço, de forma a possibilitar a agregação de valor quando indicada a sua origem, independente de
outras características. Ela protegerá a relação entre o produto ou serviço e sua reputação, em razão de sua
origem geográfica específica, condição esta que deverá ser, indispensavelmente, preexistente ao pedido de
registro. Desta forma, os produtores ou prestadores, através de sua entidade representativo, deverão fazer
prova desta reputação ao pleitear o reconhecimento junto ao INPI a Indicação de Procedência, juntado
documentos hábeis para tanto.
A Denominação de Origem – DO cuida do nome geográfico “que designe produto ou
serviço cujas qualidades ou características se devam exclusiva ou essencialmente ao meio geográfico,
incluídos fatores naturais e humanos”. Em suma, a origem geográfica deve afetar o resultado final do
produto ou a prestação do serviço, de forma identificável e mensurável, o que será objeto de prova quando
formulado um pedido de registro enquadrado nesta espécie ante ao INPI, através de estudos técnicos e
científicos, constituindo-se em uma prova mais complexa do que a exigida para as Indicações de
Procedência.12

A repressão às falsas indicações geográficas é de extrema importância, uma vez

10
Ibidem, p. 219.
11
http://www.inpi.gov.br/menu-esquerdo/indicacao/o-que-e-indicacao-geografica
12
Idem.
que a indicação inverídica do local de origem ou de procedência do produto ou serviço pode induzir
o consumidor a erro. A indicação de procedência está manifestada no art. 177 da LPI, que assim
trata:

Considera-se indicação de procedência o nome geográfico de país, cidade, região ou


localidade de seu território, que se tenha tornado conhecido como centro de extração, produção ou
fabricação de determinado produto ou de prestação de determinado serviço.

A denominação de origem, por sua vez, está disciplinada no art. 178 da LPI, que
assim prescreve:

Considera-se denominação de origem o nome geográfico de país, cidade, região ou


localidade de seu território, que designe produto ou serviço cujas qualidades ou características se devam
exclusiva ou essencialmente ao meio geográfico, incluídos fatores naturais e humanos.

Franca, cidade paulista, é um conhecido pólo produtor de calçados, sendo,


portanto, considerada uma indicação de procedência no que se refere a esse produto específico. Já a
região francesa de champagne, é um local que designa produto específico cujas características estão
a ela diretamente associadas, considerando-se, assim, uma denominação de origem. No que diz
respeito à cachaça, vale ressaltar que, a expressão “cachaça do Brasil”, é considerada indicação
geográfica pelo Decreto nº 4.062/01. O art. 179 da LPI prevê ainda que:

A proteção estender-se-á à representação gráfica ou figurativa da indicação


geográfica, bem como à representação geográfica de país, cidade, região ou localidade de seu território
cujo nome seja indicação geográfica.

O art. 180 da LPI faz uma ressalva à proteção legal, indicando que quando o
nome geográfico se houver tornado de uso comum, designando produto ou serviço, não será
considerado indicação geográfica.13 Uma vez não se aplicando o art. 180, só podem usar a
indicação geográfica aqueles produtores ou prestadores de serviços que (i) sejam estabelecidos no
local e (ii) atendam requisitos de qualidade para tanto14. É o que determina o art. 182 da LPI:

O uso da indicação geográfica é restrito aos produtores e prestadores de serviço


estabelecidos no local, exigindo-se, ainda, em relação às denominações de origem a atendimento de
requisitos de qualidade .
PATENTE
13
RAMOS, op. cit., p. 219.
14
Idem, p. 220.
A patente está relacionada ao modelo de utilidade e à invenção.

A invenção é o ato original do gênio humano. Toda vez que alguém projeta algo que
desconhecia, estará produzindo uma invenção. Embora toda invenção seja, assim, original, nem sempre
será nova, ou seja, desconhecida da demais pessoas. E a novidade, conforme se verá em seguida, é
condição de privilegiabilidade da invenção.
Já o modelo de utilidade é o objeto de uso prático suscetível de aplicação industrial, com o
novo formato de que resulta melhores condições de uso ou fabricação. Não há propriamente invenção,
mas acréscimo na utilidade de alguma ferramenta instrumento de trabalho ou utensílio, pela ação da
novidade parcial que lhe agrega. É chamada, também, de 'pequena invenção' e goza de proteção autônoma
em relação à da invenção cuja utilidade foi melhorada.15

A patente precisa dispôr dos seguintes requisitos: novidade (deve ser desconhecida pela
comunidade científica, técnica e industrial), atividade inventiva (deve despertar um sentido de real
progresso), aplicação industrial (somente a invenção ou modelo suscetível de aproveitamento
industrial pode ser patenteado) e não-impedimento (proibição de patenteabilidade de objetos que
afrontem a moral, os bons costumes, à segurança, à ordem e à saúde pública).16
A patente tem um prazo de duração de 20 anos para a invenção e 15 anos para o modelo de
utilidade, a partir da data do depósito do pedido.

Para garantir ao inventor pelo menos um tempo razoável de utilização da invenção ou


modelo, contudo, o prazo de duração do direito industrial não poderá ser inferior a 10 anos, para as
invenções, ou 7, para os modelos, contados da expedição da patente (LPI, art. 40).17

A patente também pode ser explorada por terceiro, desde que esta tenha um caráter de
relevante interesse social relacionado ao acesso às comodidades propiciadas pelo desenvolvimento
industrial. É importante ressaltar que os licenciados pela sua exploração remunerarão o dono da
patente. A extinção da patente dá-se através do término do prazo de duração e da caducidade, tendo
também como outras hipóteses: a renúncia aos direitos industriais, desde que não haja prejuízo a
terceiros; a falta de pagamento da taxa devida ao INPI (retribuição anual) e falta de representante de
no Brasil, quando o titular é domiciliado no exterior.18

PRESSUPOSTOS INICIAIS: A FARINHA DE CRUZEIRO DO SUL/ACRE


15
COELHO, Fábio Ulhoa. Propriedade industrial. In: Manual de direito comercial. SP: Editora Saraiva, 18ª
ed., 2007. p. 86.
16
Idem. p. 86-87.
17
Idem. p.87.
18
Idem. p.88.
A farinha é o principal derivado da mandioca para a alimentação humana no Brasil, visto ser
consumida em todo o País, chegando a ser, em algumas regiões do Norte e Nordeste, a principal
fonte energética. Apesar de a farinha constituir a forma mais ampla de aproveitamento industrial da
mandioca, ela não é um produto muito valorizado, sobretudo pela elevada variabilidade de tipos de
farinha, o que dificulta a comercialização.19
Essas diferenças nas farinhas oferecidas ao mercado são decorrentes de vários fatores como
cultivar, clima, solo, ponto de colheita, variabilidade genética, matéria-prima e outros, mas o
principal fator responsável é o método de processamento. Segundo Lima (1982), a heterogeneidade
da farinha é devida, principalmente, à fabricação por pequenos produtores para seu uso diário.20
No Estado do Acre, a farinha de mandioca é processada de forma artesanal em pequenas
unidades denominadas casas-de-farinha, que utilizam matéria-prima e mão-de-obra provenientes da
agricultura familiar, e grande parte está localizada no próprio local de produção da matéria-prima.
Nestes estabelecimentos, cada produtor segue um processo próprio de fabricação da farinha. Cereda
(2005) cita que fornos muito quentes ou frios, cargas grandes ou muito pequenas, prensagem mais
ou menos intensiva são alguns dos fatores que podem influenciar o padrão de qualidade da farinha.
Essas variações tornam quase impossível a proposta de um padrão nacional de qualidade. Mesmo
em uma única propriedade, por conseqüência do sistema artesanal de produção, é raro ocorrer
uniformidade em fabricações sucessivas.21
A farinha de mandioca ou macaxeira, como é conhecida popularmente no Acre, é
reconhecida como um produto da mais alta relevância e um dos produtos que mais produz
carboidratos dentre as principais culturas, sendo a quarta mais importante cultura agrícola nos
países em desenvolvimento depois do arroz, milho e trigo. Também é importante ressaltar que se
constitui num produto essencial no cardápio alimentar da maioria da população acreana.22
A farinha de Cruzeiro do Sul está se tornando uma marca com uma forte identidade regional.
Para qualquer acreano se trata da melhor farinha do mundo! Sua tecnologia de produção foi
desenvolvida ao longo de cem anos de ocupação do Alto Juruá por populações nordestinas. Nos
últimos anos, o governo estadual vem apoiando a melhoria das condições de produção, mas a base
de todo este investimento governamental é uma tecnologia e produtos genuinamente locais. Há

19
http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0101-20612008000400022&script=sci_arttext
20
idem
21
idem
22
MELO, Ueliton Alves de. Processo de classificação como atributo de diferenciação de produto. IESACRE
(monografia). Rio Branco, 2005. p. 11.
1 – Fabrico da farinha, ou farinhada, é um momento no qual toda a família
se reúne para um esforço produtivo que garante a base da dieta alimentar

inúmeras ameaças ao sucesso comercial da farinha de Cruzeiro do Sul. Além das dificuldades de
transporte e escoamento do produto, percebe-se hoje que o nome “farinha de Cruzeiro do Sul” pode
estar designando farinhas nem sempre produzidas em Cruzeiro do Sul.23
Uma forma de defesa da nossa agrobiodiversidade é valorizar cultural e economicamente os
produtos dela oriundos. Entre as estratégias possíveis para isso está o mecanismo da indicação
geográfica, um tipo de certificado de origem do produto que o associa a características
socioculturais e ecológicas específicas de uma região determinada. Um aspecto interessante deste
mecanismo de proteção e valorização, bastante difundido na Europa, é que a solicitação de
indicação geográfica deve partir de grupos de produtores. Este tipo de mecanismo poderia ser uma
alternativa ao emprego do sistema de patentes, e poderia permitir a promoção social e
economicamente justa de produtos como a farinha de Cruzeiro do Sul, cujo nome passaria a
designar apenas aquela farinha feita nessa região, por um universo determinado de produtores, de
acordo com saberes e técnicas tradicionais.24

23
http://www2.uol.com.br/pagina20/18122005/papo_de_indio.htm
24
idem
2 – A farinha de Cruzeiro do Sul-AC
REFERÊNCIAS

Bibliografia
COELHO, Fábio Ulhoa. Propriedade industrial. In: Manual de direito comercial. SP: Editora
Saraiva, 18ª ed., 2007. p. 85-93.
MELO, Ueliton Alves de. Processo de classificação como atributo de diferenciação de produto.
IESACRE (monografia). Rio Branco, 2005. 62 p.
RAMOS, André Luiz Santa Cruz. Propriedade Industrial. In: Curso de Direito Empresarial. 3ª
ed., Bahia: Podivm, 2009. p.p 183-220.

Sites

http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0101-20612008000400022&script=sci_arttext Acessado em
02/06/09 às 17 hs E 28 min
http://www2.uol.com.br/pagina20/18122005/papo_de_indio.htm Acesso em 30/05/09 em 15 hs 06
min
http://www.inpi.gov.br/menu-esquerdo/indicacao/o-que-e-indicacao-geografica Acesso em 09/07/09
às 15hs e 54 min

Fotografias

1) http://www2.uol.com.br/pagina20/18122005/papo_de_indio.htm Acesso 30/05/09 em 15 hs 06


min
2)http://3.bp.blogspot.com/_tUkHHCyk8_k/Sb14hEuXQ4I/AAAAAAAAFHs/b9rzFRLHly8/s1600
-h/farinhaacre.jpg Acesso em 02/06/09 às 18hs e 48 min.

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