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Pública de Medicamentos
Metodologia para Formação da Cesta de Preços
Aceitáveis e Geração de Economia ao Erário
RESUMO
As aquisições de bens e serviços, em regra, são realizadas por meio de processo licitató-
rio. Dentre os diversos conceitos e princípios que disciplinam as licitações no arcabouço jurídico
brasileiro, maior parte deles dispostos na Lei nº 8.666/93, destaca-se a seleção da proposta mais
vantajosa para a Administração Pública. Contudo, fatores mercadológicos por vezes dificultam
ou inviabilizam a Administração de realizar boas compras em termos de custo. Em se tratando de
saúde pública, a situação torna-se ainda mais complexa, haja vista os recursos destinados serem
escassos e as necessidades quase infinitas. Sendo assim, ao realizar as compras de medicamen-
tos, a Administração precisa de valer de uma metodologia que auxilie na busca por otimizar os
recursos. O presente artigo abordará os aspectos inerentes a pesquisa de preços na aquisição
pública de medicamentos fazendo uma análise das tabelas de referência inerentes a esse mercado,
concluindo com uma metodologia que auxilie na realização das licitações desses produtos.
1. ORGANIZAÇÃO
DA ASSISTÊNCIA
FARMACÊUTICA NO
ÂMBITO DO SISTEMA
ÚNICO DE SAÚDE
regra, por União, Estados e Municípios, ficando a para aquisição de medicamentos do CESAF
aquisição e dispensação a cargo dos Municípios. (quatro bilhões e setecentos milhões de reais);
do CEAF (trezentos e treze milhões e trezen-
No Componente CEAF, por sua vez, os tos mil reais); e do CBAF (vinte e dois milhões
medicamentos estão divididos em três grupos. e duzentos mil reais). O restante foi enviado
O financiamento, no Grupo 1, é de responsabi- para os entes subnacionais (MASSI, 2018).
lidade exclusiva da União, cabendo a aquisição Considerando que o total de despesas exe-
de parte deles à União e de parte aos Estados e cutadas para a área de atuação de saúde no
Distrito Federal. No Grupo 2, o financiamento referido ano foi de R$ 102,71 bilhões, conclui-
é das Secretarias Estaduais de Saúde, que -se que mais de 17% por cento do orçamento
também se responsabilizam pela aquisição. Já foi destinado à Assistência Farmacêutica. Tal
no Grupo 3, há os medicamentos de financia- constatação vai ao encontro do que entende a
mento tripartite, cuja aquisição e dispensação Management Sciences for Health (MSH) que
ficam a cargo dos Municípios. considera esse um dos setores mais represen-
tativos em termos de impacto financeiro, e uma
Já o CESAF engloba medicamentos e ausência de gerenciamento efetivo nessa área
insumos para prevenção, diagnóstico, trata- pode acarretar grandes desperdícios de recur-
mento e controle de doenças e agravos de perfil sos (MSH, 1997).
endêmico, com importância epidemiológica,
impacto socioeconômico ou que acometem
populações vulneráveis, contemplados em pro-
gramas estratégicos de saúde do SUS. Estes
são financiados e adquiridos pelo Ministério da
Saúde e distribuídos para os Estados, que os
armazenam e os remetem para os Municípios.
tem sua metodologia de cálculo e já considera no mercado sendo que a maioria foge do senso
todos os tributos incidentes. comum do consumidor médio, que não está
habituado com a maior parte deles. Um deter-
O resultado da equação formada pela minado valor pode ser considerado caro ou
aplicação do CAP sobre o PF, dá origem ao barato a depender do seu referencial de compa-
PMVG, sendo este o teto a ser pago pela Admi- ração. Por exemplo, uma caneta esferográfica,
nistração Pública na aquisição dos medica- corpo de plástico cristal transparente sextavado
mentos. Outrossim, as operações realizadas com furo de respiração lateral no centro, “tipo
com os fármacos listados no Convênio Confaz Bic”, cotada a R$ 50,00, não parece um preço
ICMS 87/2002, oriundo do Conselho Nacio- razoável a nenhuma pessoa com o mínimo de
nal de Política Fazendária, quando destinados discernimento da realidade do mercado, da
a Administração Pública de todas as esferas mesma forma que cotá-la a R$ 0,10 também
receberão isenção do Imposto sobre Circula- soa como inexeqüível, mesmo ao consumidor
ção de Mercadorias e Serviços – ICMS. Des- médio. Essas conclusões prévias apenas ocor-
sarte, nos medicamentos listados, além do des- rem devido a descrição do produto ser do conhe-
conto CAP, haverá a isenção do citado imposto. cimento comum e, por conseguinte, seu preço
de mercado é muito difundido. Diferente reali-
O descumprimento dos referenciais dade é encontrada no mercado de medicamen-
máximos e demais atos emanados pela CMED tos, onde descrições incorretas ou mudanças
no exercício de suas competências de regula- de forma farmacêutica podem ocasionar varia-
ção e monitoramento do mercado de medica- ções muito grandes de preços. Para enfrentar tal
mentos, sujeita os infratores às sanções admi- desafio, o gestor necessita contar com um banco
nistrativas previstas no Código de Defesa do de dados confiável que lhe forneça a referência
Consumidor, nos termos da Lei 10.742/2003. de preço, de modo a possibilitar o julgamento
Cabe a própria CMED e ao Ministério Público objetivo das propostas.
apurar casos de negativa de aplicação dos des-
contos, tanto o CAP quanto a isenção tributá- Essa lacuna foi preenchida com o
ria. A CMED mantém um endereço de correio Banco de Preços em Saúde – BPS, sistema
eletrônico1 para receber as denúncias. criado pelo Ministério da Saúde cujo objetivo é
registrar e disponibilizar informações das com-
pras públicas e privadas de medicamentos e
4.2 Banco de Preços em produtos para a saúde. A plataforma é gratuita
a qualquer cidadão ou instituição que queira
Saúde - BPS
acessá-lo para consultar preços registrados.
1
CMED@anvisa.gov.br
e produtos para a saúde; (ii) fornecimento de e produtos relacionados com a saúde em geral.
subsídios ao gestor público para a tomada de Para isso, a atuação dos órgãos de controle de
decisão; (iii) aumento da transparência e visibili- todas as esferas (Tribunais de Contas, Minis-
dade, no que se refere à utilização dos recursos tério Público e Poder Judiciário em casos
do SUS para a aquisição de medicamentos e extremos), é fundamental. A atuação seria no
produtos para a saúde; (iv) disponibilizar dados sentido de cobrar a alimentação do BPS pelos
que possam subsidiar o controle social quanto entes jurisdicionados, conforme reconheceu
aos gastos públicos em saúde. o próprio TCU, no Acórdão 2.901/2016-TCU-
-Plenário. Além disso, o BPS está alinhado
O BPS tornou-se uma ferramenta indis- com a cobrança fulcrada na Lei de Licitações,
pensável aos gestores públicos a medida que inciso V do art. 15, que orienta que as compras,
disponibiliza dados, contribui para a melho- sempre que possível, deverão balizar-se pelos
ria das negociações com fornecedores, gera preços praticados no âmbito dos órgãos e enti-
conhecimento acerca de um mercado pouco dades da Administração Pública.
conhecido pelo consumidor comum e aumenta
a transparência e a visibilidade para aquisição Outro ponto destacável na ferramenta
de medicamentos e produtos. Dessa maneira, é a possibilidade de fazer consultas regionali-
transformou-se em ferramenta indispensável zadas, por volume e tipo de produtos. Consi-
ao desenvolvimento do SUS. derando as dimensões continentais do Brasil,
é de se esperar que uma aquisição na cidade
A alimentação do sistema era facultativa de Rio Branco, capital do Estado do Acre, por
até a publicação da Resolução nº 18 da Comis- exemplo, seja totalmente diferente da mesma
são Intergestores Tripartite, em junho de 2017, aquisição realizada nas capitais dos estados
que tornou obrigatório o envio das informações do sudeste ou no Distrito Federal. As espe-
necessárias à alimentação do BPS pela União, cificidades de cada caso, por si só, já podem
Estados, Distrito Federal, e Municípios. Isto vir a causar discrepâncias nos preços. Desse
posto, a partir de dezembro de 2017, todas as modo, a ferramenta permite fazer classifica-
compras homologadas deverão ser enviadas ções e seleções que permitam encontrar com-
para a composição do banco de dados do BPS. pras similares a cada realidade, considerando
aspectos logísticos, tributários ou mesmo de
Apesar da obrigação de alimentar o disponibilidade de fornecedores no mercado.
BPS ser recente, este já possui um considerá-
vel número de registros. Contudo, para, maior Conquanto, o TCU por meio do Acórdão
efetividade da ferramenta, é necessário um 3759/2014-1C não reconheceu o BPS como
número ainda mais representativo de regis- parâmetro para apuração de sobrepreço em
tros, de modo a tornar as consultas mais fide- medicamentos devido as suas fragilidades e
dignas com o mercado de medicamentos. Por limitações para obtenção do preço de mercado.
ser tratar de uma resolução acordada entre os Porém, acredita-se que com a obrigatoriedade
próprios gestores, espera-se que haja ampla da alimentação da ferramenta com todas as
adesão, de modo a popularizar a ferramenta compras homologadas de medicamentos, possa
como referencial de preços em medicamentos vir a reduzir as vulnerabilidades do sistema.
2
No mesmo sentido: Acórdão Nº 5.810/2017-2ªCâmara, Ministra Relatora Ana Arraes.
Com relação ao BPS, o TCU mais grande vantagem para a Administração Pública
recentemente decidiu ser plenamente viá- em termos de ganho com economia de escala,
vel a utilização do sistema do Ministério da já que comprar 10 unidades de um determinado
Saúde como referencial de preços e, inclu- item é diferente de adquirir 10.000 unidades do
sive, o próprio órgão de controle poderia mesmo produto. Os gestores precisam se valer
utilizá-lo para avaliar a economicidade dos dessa vantagem competitiva para negociar con-
contratos conseqüentes (TRIBUNAL DE dições mais vantajosas ao erário.
CONTAS DA UNIÃO,2016)3.
Não obstante, as referidas revistas
Embora no ano 2016, época da publica- podem auxiliar na formação do juízo de valor
ção do Acórdão supramencionado, não estava dos preços, lembrando que boa parte dos pro-
positivada a obrigatoriedade de alimentação dutos da área da saúde não são conhecidos do
do BPS, limitação solucionada com o advento grande público, realidade que dificulta a apli-
da Resolução nº 18/2017 da Comissão Inter- cação de juízo de valor para a classificação das
gestores Tripartite, as informações do sistema propostas recebidas.
já foram consideradas fidedignas, pois a maior
parte dos medicamentos contava com uma
número considerável de registros. Atualmente, 5.1 Operacionalização da
com a obrigatoriedade de alimentação pelos
metodologia
gestores e a cobrança por parte dos órgãos
de controle, a confiabilidade tende a crescer e
consolidar a ferramenta como indispensável
ao desenvolvimento do SUS. Defronte todo o detalhamento normativo
e jurisprudencial apresentado, somado a ferra-
No tocante às publicações especializa- mentas, tabelas e referenciais de preço existen-
das que trazem de tabelas de referência para tes para formulação de uma efetiva pesquisa
o mercado de varejista de medicamentos, a de preços para as aquisições públicas de medi-
jurisprudência nos ensina que não é possível camentos, os gestores públicos e os responsá-
utilizá-las como única fonte de referência na veis por operacionalizar os certames se vêem
pesquisa de preços, do mesmo modo que é perdidos e com limitadas condições de buscar
vedada a utilização de percentual de desconto vantajosidade para a Administração Pública.
genérico sobre quaisquer uma das tabelas.
Com objetivo de orientação, será elabo-
Outro ponto digno de destaque é a dife- rado um roteiro do tipo passo a passo, de modo
rença existente entre as compras realizadas a realizar uma pesquisa de preços efetiva, capaz
no varejo e as aquisições públicas, estas geral- de conduzir a uma contratação dentro dos parâ-
mente refletem grande volumes de produtos metros do mercado e que atenda aos órgãos
enquanto aquelas se caracterizam por quanti- de controle. Por óbvio, existirão limitações em
dades mais modestas. Tamanha distinção oferta cada caso concreto que não permitirão que
3
No mesmo sentido: Acórdãos 2.901/2016-Plenário e 1.304/2017-Plenário
todo o roteiro seja seguido, afinal não cabe a contratado, é também um grande desafio para
este trabalho abordar todas as possibilidades, os operadores de licitação. Como se não bas-
tampouco esgotar o assunto, por se tratar de tasse, ainda temos a urgência inerente à área
matéria com elevada complexidade. Por outro de saúde, onde a falta de um medicamento pode
lado, conseguir adequar os fornecedores, habi- causar complicações nos tratamentos ou até
tuados com a ultrapassada sistemática de envio mesmo a morte do paciente.
de orçamento, que acaba superestimando os
preços de referência para as licitações, resul- Desta maneira, elaboramos um quadro
tando em contratações muito vantajosas para o com o roteiro e o fundamento:
4
SANTOS, Franklin Brasil. Preço de Referência em Compras Públicas. Disponível em: < https://portal.tcu.gov.br/lumis/portal/file/
fileDownload.jsp?fileId=8A8182A15454C22F015458F003AC340A> Acesso em: 7 abr 2020.
A “média saneada” consiste em realizar uma avaliação crítica dos preços obtidos na pesquisa, a fim de descartar valores que apre-
sentem grandes variações em relação aos demais.
DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito admi- MINISTÉRIO DA SAÚDE. Sobre a Assistên-
nistrativo. 27. ed. - São Paulo: Atlas, 2014. cia Farmacêutica. Disponível em :< https://
www.saude.gov.br/assistencia-farmaceutica/
DRESCH, Renato Luís e BICALHO, Fábia sobre-a-assistencia-farmaceutica> Acesso em:
Madureira de Castro. Manual de direito à 30 mar 2020.
saúde: normatização e judicialização –
Comitê Executivo da Saúde de Minas Gerais. MOTTA, Alexandre R. O combate ao desper-
Belo Horizonte: Del Rey, 2019. dício no gasto público: uma reflexão baseada
na comparação entre os sistemas de compra
GDF refaz edital que teve sobrepreço de privado, público federal norte-americano e
até 18.400% apontado por tribunal. G1 brasileiro. Dissertação (Mestrado em Econo-
– Globo, Distrito Federal, 15 de fev. de mia). Universidade de Campinas, 2010.
2013. Disponível em : <http://g1.globo.
com/distrito-federal/noticia/2013/02/