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Relações Étnico Raciais

Luciene Maria Pires Pereira


INFORMAÇÕES SOBRE O AUTOR

Luciene Maria Pires Pereira

● Graduada em História

● Especialista em História Econômica]

● Mestre em História]

Sobre o Autor

Graduada em História pela Universidade Estadual de Maringá (UEM). Especialista em História


Econômica pela Universidade Estadual de Maringá (UEM). Especialista em Educação Especial
pela Faculdade América do Sul e Instituto Paranaense de Ensino. Especialista em Psicopedagogia
Institucional pela Faculdade América do Sul e Instituto Paranaense de Ensino. Especialista em
Atendimento Educacional Especializado pela Unicesumar. Mestre em História pela Universidade
Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho-UNESP/FCL de Assis/SP. Doutoranda no Programa de
Pós-graduação em História da Universidade Estadual de Maringá (UEM). Docente no curso de
História, modalidade EAD, da Unicesumar. Membro do Grupo de Apoio à Pesquisa e Docência
em História (GAPDH Unicesumar). Membro do Laboratório de Estudos do Império Português
(LEIP-UEM).
INTRODUÇÃO DO LIVRO

Prezado(a) acadêmico(a),

Apresentamos a você um material cuja proposta é compreender as relações étnico-


raciais que marcaram e ainda marcam o processo de formação da sociedade brasileira.
Para tanto, discorreremos acerca de conceitos importantes como raça, etnia, grupos
étnicos e etnicidade a fim de levá-los a um maior entendimento das questões que
envolvem a diversidade cultural no Brasil.
Dessa forma, na primeira unidade deste livro, abordaremos o processo de formação
das sociedades brasileira e africana, buscando evidenciar as semelhanças e diferenças
entre esses processos. Na segunda unidade, percorreremos o desenvolvimento das
relações entre Brasil e África, com o intuito de identificar as conjunturas que
caracterizaram tais relações, além de identificar como o contato entre os dois países
ocorre na atualidade. Na terceira e última unidade, discutiremos o contexto educacional
brasileiro na perspectiva da pluralidade cultural, uma vez que a educação é, ou ao menos
deveria ser, instrumento por meio do qual a superação das diferenças e preconceitos
chegará ao fim.
Esperamos que você aproveite as discussões apresentadas e contribua com a ampliação
do debate sobre a temática.

Bons estudos!
UNIDADE II

Relações Étnico-Raciais no Brasil


Professora Me. Luciene Maria Pires Pereira
INTRODUÇÃO

Prezado(a) aluno(a), na unidade um percorremos o processo de formação da


sociedade brasileira a partir da interação de grupos e culturas diversas, que resultou em
uma sociedade com características diferentes das encontradas nas sociedades europeias.
Acompanhamos, ainda, o processo de formação da sociedade africana, sendo esta
também resultado da convergência de grupos e culturas distintas que ocuparam o
continente em diferentes momentos da história.
Neste momento, convido você a entender um pouco acerca das relações
estabelecidas entre esses dois países, África e Brasil, e de que maneira essa relação
influenciou e contribuiu para o desenvolvimento tanto da sociedade brasileira quanto da
sociedade africana, assim também a verificar como as interações entre os dois países
ocorrem na atualidade.
1. CONSIDERAÇÕES SOBRE OS CONCEITOS DE RAÇA E ETNIA

Para iniciarmos a nossa discussão, recorreremos aos estudos de Munanga (2003).


De acordo com o autor, a palavra raça deriva do latim e tem, sob a óptica da semiótica,
o sentido de categoria ou espécie. Outros estudos destacam ainda a utilização deste
conceito para caracterizar espécies humanas, caracterização que traz em si aspectos
históricos, ideológicos e sociológicos (PAULA, 2013). Dessa forma, entendemos que
compreender esse conceito significa percorrer caminhos que vão além da natureza
linguística e perpassa aspectos históricos e culturais das sociedades.
Diante da realidade que o mundo globalizado enfrenta na atualidade – marcada
por um cenário de contato e trocas em diversos aspectos entre diversas nações, povos e
culturas – e considerando o cerne das discussões propostas nesta disciplina – que dizem
respeito, sobretudo, às relações estabelecidas entre o Brasil e a África –, analisar,
discutir e entender o significado de alguns conceitos-chave ajuda-nos a compreender as
conjunturas que marcaram a história da sociedade brasileira e que tiveram como
consequência a criação de uma legislação e políticas paliativas com o objetivo de
combater o preconceito no Brasil e oferecer oportunidades para que afrodescendentes
possam desfrutar dos direitos dispostos a todos os cidadãos brasileiros.
Considerando também as discussões acerca das influências e contribuições dos
africanos para a formação do Brasil e a maneira como tanto o governo quanto a
sociedade enxergam essas influências e contribuições, cada vez mais é preciso voltar o
olhar para nossa história buscando descaracterizar fatos e análises que relegaram os
negros africanos que estiveram presentes ao longo do processo de desenvolvimento do
Brasil a um papel ínfimo e pouco valorizado em nossa história e sociedade. Tal fato está
embasado, muitas vezes, na interpretação de teses baseadas em superioridades de raças
e culturas.
Trazidos para o Brasil no período da colonização como mão de obra para a
produção açucareira na condição de escravo, os africanos viveram por cerca de
aproximadamente 350 anos privados de sua liberdade e de direitos políticos e civis, o
que lhes conferiam uma existência à margem da sociedade, situação que ainda nos dias
de hoje faz sentir suas consequências. Essa situação encontra fundamentação no fato de
que, pensando-se historicamente, o conceito de raça foi utilizado como justificativa para
a disseminação de práticas preconceituosas e excludentes de indivíduos no que diz
respeito a direitos e deveres ao longo de nossa história.

Figura 2.1 - Preconceito Racial


Fonte: Wilhan Gomes / Pixabay.

E qual seria então o sentido de raça? Como devemos compreender este conceito
a fim de evitar julgamentos preconceituosos, como os que ocorreram nos séculos que
compreendem a história do Brasil?
Voltando nossos olhos para a história, podemos perceber que a compreensão do
sentido do termo raça perpassa as concepções e valores de momentos históricos
distintos. Por exemplo, na Idade Média, raça era empregada no sentido que referia-se à
linhagem, isto é, o termo designava um grupo de pessoas que teriam em comum um
ancestral, um indivíduo de pele negra (PAULA, 2013).
Diante das transformações políticas, econômicas e sociais que assolaram a
Europa na transição da Idade Média para a modernidade, o conceito de raça passou a ser
utilizado como forma de evidenciar as diferenças entre os homens, sobretudo, as
diferenças baseadas em aspectos físicos, tidas como justificativas para o
estabelecimento de novas características das relações de poder na Europa (MUNANGA,
2003).
A concepção clássica de que os indivíduos estariam divididos em três grandes
raças – branca, negra e amarela – foi elaborada no século XVIII a partir dos estudos
impulsionados pelo Iluminismo. Essa concepção foi difundida e amplamente aceita,
sendo que apenas no século XX passou a ser contestada, a partir da ampliação dos
estudos científicos que apresentaram a tese das três raças como insuficiente ante as
características genéticas dos indivíduos.

Figura 2.2 - Três Matrizes Raciais (século XVIII)


Fonte: Clker Free Vector Images / Pixabay.

Caro(a) aluno(a), é importante destacar que definir o conceito de etnia, sob o


ponto de vista das ciências humanas, tornou-se tarefa árdua, considerando que o
processo histórico de desenvolvimento das sociedades é marcado pelo intercâmbio de
povos, ideias e culturas, isto é, uma sociedade é formada a partir do encontro e relação
entre diversos grupos étnicos, fato do qual o Brasil é um exemplo claro. Diante disso,
como definir a etnia de determinado indivíduo ou grupo, ou qual a característica cultural
de uma nação específica, uma vez que é formada por indivíduos e grupos diversos
culturalmente e etnicamente falando?
PENSE NISSO
Na sua opinião, como podemos entender ou definir a etnia de uma nação?

Para que possamos melhor analisar e entender o conceito de etnia, aproximamo-


nos de outro conceito que, pode-se dizer, é complementar à ideia de etnia. Trata-se do
termo etnicidade que, segundo Schnapper (1991 apud POUTGNAT; STREIFF-
FENART, 1998), foi elaborado pelos ingleses na primeira metade do século XX e foi
utilizado tanto para denominar aqueles que não eram anglo-americanos como para
embasar estudos comportamentais.
Na segunda metade do século XX, impulsionados pelo contexto do pós-guerra –
marcadamente conflituoso político e socialmente – os estudos relativos à etnicidade
ganharam força, sobretudo, com a criação da revista Ethnicity, uma publicação voltada
para as discussões relacionadas à etnicidade. Embora importante, a publicação da
revista e o crescente número de estudos acerca do tema não significaram
necessariamente a definição exata dos conceitos de etnia e etnicidade. A dificuldade na
definição e interpretação dos termos assenta-se no fato de que as análises propostas
estão carregadas das experiências e concepções particulares de cada estudioso. Assim, o
olhar particular de cada autor pressupõe uma compreensão de tais conceitos.
A consequência imediata das variadas formas de compreensão do sentido de
raça, etnia e etnicidade é uma verdadeira confusão dos sentidos e uma não compreensão
dos termos que levam à criação e perpetuação de estereótipos atribuídos a indivíduos,
grupos e sociedades que comprometem o sentimento de pertencimento a uma
determinada realidade. Além disso, a aproximação ou confusão entre os conceitos de
raça e etnia pode levar a análises e entendimentos equivocados em relação às
características de um indivíduo, grupo ou sociedade.
Segundo Georges Vacher de Lapouge, raça dizia respeito a uma
associação de características morfológicas e qualidades
psicológicas, em grupos formados a partir de laços intelectuais,
como cultura ou língua, que seriam agrupamentos resultantes
da reunião de elementos de raças distintas. Esses agrupamentos
encontram-se sujeitados, em virtude de questões históricas, a
instituições, organizações políticas, costumes ou ideias comuns
(CARVALHO; SALAINI, 2013, p. 116 apud CARVALHO et
al., 2013).

O mesmo autor salienta que o conceito de etnia reflete a existência de laços de


solidariedade de grupo, sendo que aos indivíduos pertencentes não recaem obrigações
de cunho político ou antropológico entre si (CARVALHO; SALAINI, 2013, p. 116
apud CARVALHO et al., 2013). Partindo dessa tese, conclui-se que etnia não refere-se
necessariamente à existência e manutenção de um grupo de origem, sendo os laços
étnicos definidos pela existência de uma ligação entre indivíduos baseada em aspectos
subjetivos.

Figura 2.3 - Diversidade Étnica

Fonte: Elenitatequiero4 / Wikimedia Commons.

Já mencionamos aqui, caro(a) aluno(a), o termo grupos étnicos, a fim de


discutirmos os conceitos de etnia e etnicidade. Mas qual o sentido de grupo étnico? O
que possibilita o sentimento de pertencimento de indivíduos em um determinado grupo
étnico?
O sociólogo alemão Max Weber defendia que o que define um grupo étnico é a
crença subjetiva dos indivíduos em uma origem comum. Nesse sentido, o pertencimento
a determinado grupo étnico fundamenta-se em interesses comuns, na crença em uma
honra que leva a ações comunitárias políticas que, por fim, produzem a ideia de laços de
sangue. Dessa maneira, o sociólogo diferencia a pertença étnica da pertença racial no
sentido de que a primeira relaciona-se à crença do sentimento e representação coletiva
da existência de uma comunidade, enquanto a segunda diz respeito a laços
característicos biológicos (WEBER, s.d. apud CARVALHO; SALAINI, 2013, p. 117).
Já o antropólogo norueguês Fredrik Barth, defende que
o grupo étnico é o "sujeito" da etnicidade: embora possa haver
grupos que compartilhem uma mesma cultura, as diferenças
culturais não conduzem à formação ou ao reconhecimento de
grupos étnicos distintos. Para Barth, o fato de compartilhar uma
cultura é uma consequência, não a causa, a condição ou, menos
ainda, a explicação da etnicidade (BARTH, 1969 apud
VILLAR, 2004, on-line).

Portanto, para este autor, a existência de crenças comuns não é o que define um
grupo étnico que deve então ser reconhecido com base em sua capacidade de organizar
as relações entre os indivíduos, independentemente de limitações geográficas e sociais.
A partir dessa análise, o autor propõe que a noção de grupo étnico seja estabelecida com
base na compreensão de que as delimitações das fronteiras de um determinado grupo
étnico são flexíveis e que se constroem a partir de práticas sociais e no desenvolvimento
das relações entre os indivíduos do grupo.

PENSE NISSO
Qual a importância de um indivíduo ter sua identidade étnica reconhecida?
2. RELAÇÕES ÁFRICA E BRASIL: CULTURA E IDENTIDADE AFRO-
BRASILEIRA
Caro(a) aluno(a), após refletirmos um pouco a respeito das noções de raça, etnia
e etnicidade, podemos aplicar os conhecimentos adquiridos para analisarmos o
desenvolvimento das relações entre o Brasil e a África ao longo de nossa história,
buscando compreender as inter-relações entre os diversos grupos e culturas que formam
nossa sociedade e as consequências dessas relações para o crescimento do país em todos
os seus aspectos.

Figura 2.4 - Cultura Africana

Fonte: Jason Sackey / Pixabay.

Compreender as inter-relações entre os povos que formaram a sociedade


brasileira significa conhecer e refletir sobre os agentes históricos e atores sociais que
compõem a base da nossa formação histórico-social. Diante disso, discorreremos acerca
do papel e contribuições dos africanos e afrodescendentes no processo de evolução
histórica do Brasil em todos os seus aspectos.
As relações entre Brasil e África intensificaram-se no contexto da colonização da
América Portuguesa, quando Portugal optou pela utilização da mão de obra escrava
como forma de promover o desenvolvimento da atividade produtiva neste território.
Assim, no século XV, começaram a chegar no Brasil os primeiros africanos em regime
de escravidão. Nesse contexto, observamos que as relações entre Brasil, Portugal e
África estavam inseridas “em um processo histórico de longa duração e repleto de
interações sociais, humanas e culturais” (ROCHA, 2015).

PENSE NISSO
Alguns estudiosos, assim como defensores do movimento negro, acreditam que o Brasil
possui uma dívida histórica com os afrodescendentes, o que legitimaria a adoção de
medidas paliativas como forma de amenizar as consequências dos mais de 300 anos de
existência da escravidão no Brasil. Qual a sua opinião sobre essa discussão?

Como já mencionamos anteriormente nesse material, o contato entre os


europeus, africanos e os povos indígenas que viviam no Brasil no período da
colonização brasileira possibilitou o nascimento de uma base social diferente de outras
regiões da Europa. Tais diferenças imprimiram no Brasil o principal elemento na
construção de sua identidade, isto é, características próprias resultantes de uma intensa
troca cultural e miscigenação entre povos e culturas.
Por essa razão, tanto os povos africanos quanto os povos indígenas deveriam
receber uma maior atenção quanto aos estudos e valorização de suas respectivas
histórias. No entanto, infelizmente, no Brasil – mesmo com a criação de uma legislação
que busca inserir a temática referente à história e cultura afro-brasileira no sistema de
ensino do Brasil – as contribuições dessas populações são reduzidas a poucas páginas e
na maioria das vezes, são discutidas em um contexto que reduzem os atores sociais a
personagens estereotipados de nossa história.

SAIBA MAIS
Para saber mais sobre a obrigatoriedade do ensino de História e Cultura Afro-
brasileira no sistema educacional brasileiro, acesse:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2003/L10.639.htm>.
Ao reproduzirmos as ideias presentes nesse tipo de estudos, acabamos por ignorar as
diferenças que marcavam também esses povos, à medida em que, embora estejamos
falando de povos africanos, viviam em diferentes partes do continente africano, o que
significa que a diversidade cultural presente no interior do Brasil a partir do século XVI
era significativamente superior ao que estamos acostumados e condicionados a pensar.

De acordo com Prandi (2000), os africanos que vieram para o Brasil no século
XVI, representavam múltiplas etnias, línguas e nações, dentre as quais destacamos os
africanos bantos, sudaneses e iorubas. Diante disso, ressaltamos a importância de
compreendermos que, quando falamos e pensamos em pluralidade cultural no Brasil,
temos que pensar em larga escala, visto a diversidade existente no interior do país desde
o início da sua colonização.
Estes povos, ao chegarem no Brasil, lutaram para manter vivas suas tradições,
valores, costumes e suas crenças, ou seja, sua cultura e foi a partir dessa luta para não
perder sua identidade que os africanos deixaram um legado cultural que,
gradativamente, era incorporado aos hábitos e costumes de outros povos que aqui
viviam. Essa influência se refletiu na comida, na dança, na música e na língua do povo
brasileiro tal como é possível observarmos hoje em dia.
Segundo Santos (2017), a presença e influência do africano e dos
afrodescendentes fez-se presente em nossa história tanto no campo político quanto
econômico, mas foi também, de acordo com esse autor,
graças aos africanos, seus filhos e netos que a feijoada e a
capoeira transformaram-se em manifestações brasileiras; que
muitas igrejas barrocas de Minas Gerais se destacam por terem
sido ornadas com búzios e santos de feições negras; que o
samba tornou-se um dos ritmos musicais mais ouvidos e
dançados no Brasil; que o português que falamos aqui tem
palavras como moleque, dengoso e cafuné (SANTOS, 2017, p.
164).
Figura 2.5 - Capoeira

Fonte: Augustus Earle / Wikimedia Commons.

A seguir, veremos as interações entre Brasil e África na atualidade e todas as relações


que decorrem dessas interações.

3. INTERAÇÕES BRASIL-ÁFRICA NA ATUALIDADE


Prezado(a) acadêmico(a), vimos que a presença do africano e descendentes no
processo constitutivo da sociedade brasileira foi de suma importância para a formação
da identidade e do caráter nacional. Vimos também que, apesar disso, reconhecer essa
importância ainda é um desafio no Brasil, um país que se caracteriza pela presença
desconcertante de práticas racistas e preconceituosas. Segundo Guimarães (1999, p. 11),
“o racismo é, portanto, uma forma bastante específica de ‘naturalizar’ a vida social, isto
é, de explicar diferenças pessoais, sociais e culturais, a partir de diferenças tomadas
como naturais”.

Essa postura do brasileiro em relação aos afrodescendentes e outros povos e


culturas que hoje chamamos de minorias, deve-se em grande parte pela falta de
conhecimento de nossa história e pelo pouco interesse em se aprofundar nas discussões
em campos ou áreas espinhosas e que demandam atenção rigorosa. Se houvesse maior
atenção por parte da parcela dos brasileiros que não reconhecem ou valorizam as
contribuições que o continente africano trouxe ao Brasil desde os primeiros contatos,
conseguiriam entender o crescente esforço dos últimos governos brasileiros para uma
maior aproximação com aquela região.
Desde os anos 2000, o Brasil vem ampliando a sua rede atuação na região
africana motivados por questões políticas e econômicas que, dependendo da maneira
como forem conduzidas, podem trazer benefícios socioculturais para ambos os países.
Nesse período, o governo brasileiro colaborou com a criação da Cúpula da América do
Sul-África (ASA), cujos objetivos assentam-se em práticas governamentais
cooperativas que visam beneficiar o desenvolvimento dos países da América do Sul e da
região africana.
As relações comerciais com a África continuam sendo desenvolvidas e chegando
a marcas significativas dentro do contexto da política externa das duas regiões, que
trabalham juntas para a adequação das estruturas financeiras internacionais a fim de que
possam oferecer os subsídios necessários para a realidade tanto do Brasil quanto da
África.

SAIBA MAIS

Para saber mais sobre as relações econômicas entre o Brasil e a África, acesse:
<http://www.funcex.org.br/publicacoes/rbce/material/rbce/116_PMV.pdf.>.
Fonte: Veiga (on-line).

Aqui cabe ressaltar, prezado(a) aluno(a), que embora economicamente as


relações entre Brasil e África estejam evoluindo e a colaboração mútua tem sido a
marca desse tipo de relação, no campo sociocultural, ainda há muito a se pensar e
evoluir, sobretudo, no interior da sociedade brasileira. Mesmo com o crescimento do
movimento negro, o racismo e o preconceito refletem-se na igualdade de oportunidades
para os afrodescendentes, tanto no âmbito político e econômico quanto no que se refere
ao âmbito educacional e cultural, o que resulta em mais discriminação e violência.
Ao que parece, a abolição da escravidão em 1888 não veio acompanhada de
políticas de inserção do africano e seus descendentes na sociedade e na mesma medida
em que alguns avanços são conquistados nesse sentido, práticas que eram comuns no
período da escravidão ainda podem ser observadas na atualidade.
Em tempos de discussões sobre “apropriação cultural”, faz-se necessário a
reflexão acerca das questões aqui apresentadas e a discussões sobre os discursos e as
práticas que remetem aos elementos culturais formadores da sociedade e do povo
brasileiro.

SAIBA MAIS
A revista Nova Escola publicou em uma de suas edições uma matéria a respeito das
relações entre Brasil e África, complementada por entrevistas e recursos para a
discussão do tema. Para conhecer, acesse: <https://novaescola.org.br/arquivo/africa-
brasil/.>.
Fonte: Nova Escola (2018, on-line).

Figura 2.6 - Ato contra o racismo e fundação do Movimento Negro Unificado (MNU),
nas escadarias do Teatro Municipal de São Paulo, em 7 de julho de 1978

Fonte: 37 anos de luta… (2015, on-line).


Caro(a) aluno(a), chegamos ao fim de nossa unidade e nesse momento
esperamos que você tenha mergulhado nas discussões aqui apresentadas. O objetivo
dessa unidade foi apresentar alguns aspectos de discussões que se referem ao
desenvolvimento das relações entre o Brasil e a África, destacando as contribuições e
influências que os africanos e afrodescendentes trouxeram ao longo do processo de
constituição da identidade e do caráter brasileiro.
Espera-se que, a partir dessas discussões, você possa refletir e ampliar as
discussões sobre a temática, contribuindo para a diminuição de práticas e discursos que
representam posturas e ideias preconceituosas e estereotipadas não só dos povos
africanos, mas também do brasileiro, uma vez que, conforme procuramos apontar nessa
unidade, também somos frutos da cultura africana.

DICA DE LEITURA

Nome do livro: Uma Gota de Sangue

Editora: Contexto

Autor: Demétrio Magnoli

ISBN: 9788572445832

Comentário: O livro levanta discussões polêmicas e reflexões necessárias em torno do debate


acerca das questões raciais, racismo, preconceitos e discriminação no Brasil e no mundo. Sua
leitura implica promover o debate a partir da apresentação de ideias e concepções distintas em
torno da temática.
ATIVIDADE OBJETIVA

1. A partir das discussões apresentadas até o momento, analise as afirmativas abaixo:

I- O conceito de raça pode ser definido a partir de apenas uma matriz teórica, o que o
torna de fácil compreensão.
II- As discussões acerca do termo raça perpassam o conhecimento do processo de
constituição de povos e culturas diversas.
III- Ao se basear em diferenças socioculturais, o emprego do conceito de raça pode
levar a práticas e discursos discriminatórios.
IV- A divisão em negros, brancos e amarelos atende às necessidades epistemológicas e
científicas de explicação das diferenças entre os indivíduos.

Estão corretas:
a. I apenas.
b. I e II apenas.
c. II e III apenas.
d. I, II e III apenas.
e. II, III e IV apenas.

2. Assim como o conceito de raça, o conceito de etnia também demanda atenção e rigor
ao ser definido e utilizado. Com relação a esse termo, analise as afirmativas abaixo:

I- O conceito de etnia pode ser empregado para definir os traços culturais de um grupo
de indivíduo.
II- Para serem considerados de uma mesma etnia, os indivíduos devem dividir o mesmo
espaço geográfico, ou seja, uma mesma região.
III- Os estudiosos do termo destacam que não existem diferenças entre os conceitos de
raça e etnia.
IV- Os termos etnia e etnicidade são representativos dos vínculos políticos, geográficos
e culturais de uma nação.
Estão corretas apenas as afirmativas:

a. I.
b. II.
c. III.
d. I, II e III.
e. I, III e IV.

3. O reconhecimento de um indivíduo como pertencente a uma determinada sociedade


não implica necessariamente que entenda que a sociedade na qual está inserido
represente sua etnia no contexto global. Com relação ao assunto, leia as afirmativas
abaixo:

I- A compreensão do conceito de grupo étnico passa pelo reconhecimento dos


elementos históricos e sociológicos do processo constitutivo de um povo.
II- Alguns teóricos defendem que o sentimento de pertença a um grupo étnico é
resultado da crença dos indivíduos em um ancestral comum.
III- Embora existam vários estudos acerca da discussão sobre grupos étnicos, é
consenso entre os estudiosos de que para ser considerado de um determinado grupo
étnico o indivíduo deva compartilhar de suas crenças.
IV- As reflexões em torno de etnias e grupos étnicos configuram elementos importantes
no contexto sociocultural atual.

Estão corretas apenas as afirmativas:


a. I.
b. II.
c. III.
d. I, II e IV.
e. I, III e IV.
4. Leia o documento a seguir:
Seguiu-se uma apresentação de música e dança. Não havia
diferença entre o que tocavam e um samba brasileiro. Parecia
não ter existido a longa ausência de contatos directos entre os
dois lados do Atlântico. Representou-se o “burrinhão”, o mesmo
bumba-meu-boi do Nordeste; as canções, idênticas às que eu
entoei, menino. Os versos eram em português, num português
estropiado, mas em português.
Começou uma espécie de cordão carnavalesco. Alguns
bailarinos usavam máscaras semelhantes às que se viam nas
folias cariocas que se viam no início do século. Máscaras
representando gente branca.

SILVA, A. C. O vício da África e outros vícios. Lisboa: Edições João Sá da Costa,


1989, p. 23.

A partir da leitura do documento, analise as afirmativas que se seguem:

I- O documento apresenta elementos característicos da cultura africana.


II- O documento remete-se às influências mútuas das culturas africanas e brasileiras.
III- O documento permite a percepção de um certo distanciamento entre os povos
brasileiros e africanos.
IV- No documento é possível identificar uma ironia em relação às representações
culturais na festividade citada.

Estão corretas as afirmativas:

a. I e II apenas
b. I e III apenas.
c. II e III apenas.
d. I, III e IV apenas.
e. I, II, III e IV.
5. Considere o trecho:

De acordo com Veiga (2018, p. 05, on-line),

desde 1995 até 2008 a integração da África à economia


internacional através dos fluxos comerciais se aprofundou
aceleradamente. As exportações totais do continente cresceram
em torno de cinco vezes, aumentando a participação do
continente nas exportações mundiais no período e contribuindo
para quase duplicar a relação entre as exportações e o PIB
regional.

Com base no texto apresentado acima, leia as afirmativas abaixo e assinale a


alternativa correta.

a. O texto aponta para a pouca relevância do continente africano para o


desenvolvimento econômico internacional.
b. O Brasil tem procurado aumentar a sua participação no contexto de relações
comerciais com a África.
c. Historicamente analisando, a África não representa uma região forte
economicamente, o que explica o pouco interesse das nações na atualidade em
formar alianças com o continente.
d. O estabelecimento de acordos políticos e econômicos entre Brasil e África não
apresentou resultados positivos para o primeiro.
e. Os conflitos vividos pelo continente africano após o processo de descolonização
fizeram com que a região desenvolvesse sua economia, transformando-a em uma
potência econômica.
REFERÊNCIAS

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Disponível em: <https://www.cut.org.br/noticias/37-anos-de-luta-contra-o-preconceito-racial-
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Disponível em: <http://diariohistoria.blogspot.com/2008_02_21_archive.html>. Acesso em: 26
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