Você está na página 1de 63

Culpa

A culpa é um dos sentimentos mais


poderosos que existem. Ela é capaz
de transformar histórias lindas em
finais tristes. Mas não precisa ser
assim. Neste livro, eu, professor
Dicastro e o psicólogo Pablo
Vinícius, decidimos compartilhar
com você um pouco de nossa
experiência com famílias de pessoas
com TEA, e contribuir para que você
se sinta melhor quanto a este
sentimento e tenha mais sucesso
para lidar com sua realidade.
O que é a culpa?

É um sentimento presente em todo


e qualquer ser humano que tenha
uma relação social e/ou familiar
com outras pessoas.
Só algumas pessoas se
sentem culpadas?

Não. Ninguém está sozinho neste


sentimento. Todos, de um jeito ou
de outro expressam a culpa. Alguns
podem se sentir estressados, outros
se afastam, outros podem se viciar
em algo, etc. As formas de
expressar a culpa são muitas.
A culpa está relacionada
com o quê?

Com a dificuldade de perdoar os


outros ou a si mesmo. Muitos de
nós nos sentimos culpados por algo
que alguém tenha feito a nós,
mesmo que não sejamos culpados
pelo que aconteceu; e outros
também se sentem culpados por
algo que fizeram ou que
aconteceram a outras pessoas.
Porque é tão difícil perdoar?

A nossa dificuldade de lidar com o


perdão está muito relacionada com
a nossa história de vida, onde as
experiências que tivemos ao longo
da existência influenciam a nossa
maneira de lidar com a emoção.
Quem sofre mais com o
sentimento de culpa?

Muitas pessoas que tiveram uma


infância mais rígida, controladora e
com ‘’vista grossa’’ tendem a sofrer
mais com isso, pois o perdão para
elas é quase uma palavra que não
cabe em seu vocabulário.
E como eram tratadas dessa forma,
sem conhecer os benefícios do
perdão, é natural que transmitam
durante toda a vida para seu
marido/esposa, filhos, amigos,
colegas de trabalho, etc.
O que nossa infância tem a
ver com o sentimento de
culpa?

Muitos pais agiram como figuras


que valorizavam muito o
comportamento rígido, fazendo
com que alguns desvios ou erros da
criança fossem considerados como
sendo imperdoáveis, levando-as a
verem o perdão como algo distante.
O que essa falta de
perdão ocasiona?

Isso tende a gerar um sentimento


de auto culpa muito grande nas
pessoas, pois nunca experimentam
a experiência libertadora do ‘’eu te
perdoo’’. Assim sendo, os erros
cometidos na vida adulta tendem a
se arrastar por muito tempo, tendo
a tendência a carregar fardos
pesados durante anos.
Como podemos perceber
esse sentimento em nós ?

São pessoas que cobram muito das


outras, buscando excessivamente
estar em conformidade com tudo o
que lhe é pedido, seja no trabalho,
com as amizades, na igreja, etc.
De onde vem toda essa
culpa?

Isso tudo vem como resultado das


experiências que tiveram quando
eram mais novas, sendo que na vida
adulta todas as consequências de
marcas infantis tendem a aparecer.
Todo sentimento de culpa
é igual?

Isso não se constitui uma regra


geral, visto que existem pessoas
que não passaram por situações
semelhantes as que foram citadas,
porém, ao viverem uma experiência
(ou um conjunto delas) que trouxe
um trauma pessoal, onde decisões
geraram consequências, pode
ocorrer sentimento de culpa
carregado.
O que fazer quer num ou
noutro caso?

Em ambos os casos, sejam de


marcas passadas, ou de situações
pontuais que geraram sentimentos
carregados de culpa, se faz
necessário desenvolver aptidões
emocionais a fim de lidar bem com
aquilo que sentimos.
Para tal sentimento, algumas dicas
podem contribuir para que haja um
controle. Vamos utilizar a história
de Joana para uma explicação mais
clara.
Uma história como muitas
outras

Joana mora em Juazeiro da Bahia,


uma cidade que fica a mais ou
menos 500 km de Salvador. Ela tem
42 anos e tem duas filhas. Está em
seu segundo casamento com quem
é casada com Paulo a 15 anos.
Paulo é natural da cidade onde
moram e trabalha como mecânico
numa oficina de caminhões.
Para ajudar nas constas de casa,
Joana decidiu parar de frequentar o
curso de Pedagogia numa
universidade próxima e começou a
trabalhar dentro de casa.
Joana é mãe e esposa dedicada.
Não deixa faltar nada para suas
filhas, e é estimada pelas pessoas
do bairro aonde mora.
Das duas filhas de Joana, uma se
chama Sara. Sara tem 22 anos e é
fruto do primeiro casamento de
Joana.
Sua segunda filha se chama Carla.
Carla tem 13 anos de idade e é filha
do Paulo, com quem Joana é casada
atualmente.
Sara, a filha mais velha de Joana,
aos 4 anos de idade começou a
apresentar os primeiros sintomas
do Transtorno do Espectro do
Autismo.
A menina não se expressava
verbalmente, falando apenas
poucos conjuntos de sílabas e
palavras, não demonstrando avanço
com o decorrer da idade.
O comportamento da filha era
sempre de isolamento, não
gostando de estar em espaços com
muitas pessoas, não interagindo
com amigos da escola, mas sempre
fugindo e tendo comportamentos
repetitivos dentro da sala de aula.
A relação de Sara com as
professoras era de desvio e
desinteresse, sempre dando
preferência para atividades que
envolvessem música, pintura,
desenhos.
Assim, despertando a curiosidade, a
mãe começou uma trajetória de
consultas e atendimentos com
muitos especialistas que estivessem
associados com o desenvolvimento
infantil, voltando seus esforços,
recursos, fé e tempo para a situação
da filha.
Contudo, o seu primeiro marido
não lhe dava força na caminhada,
reclamando que o casamento
estava desgastado e insustentável
devido tudo o que os rodeava. Seu
marido decidiu arranjar uma
amante e quebrar a aliança eterna
que haviam feito no altar, negando-
a a fidelidade na saúde e doença.
Assim, a descoberta do diagnóstico
do Transtorno do Espectro Autista
da Sara foi carregada de marcas na
vida da Joana, questões que se
somaram e a fizeram criar maus
pensamentos a respeito do mundo,
sobre si mesma e das pessoas.
Depois que esses eventos
começaram a ocorrer, Joana sofreu
com sintomas depressivos
constantes por muito tempo,
sintomas que ainda se refletem na
sua afeição e postura corporal
cotidiana.
Ela teve dificuldades financeiras
pelo rompimento com o marido,
bem como a separação de bens que
ocorreu devido ao divórcio.
Todos esses elementos juntos foram
como um furacão que atravessou a
vida estável que estava tendo,
permitindo que ela visse a filha
como a culpada pela reviravolta que
ocorrera em sua vida.
Muitas vezes Joana se pegava em
choros, lágrimas e gritos no seu
quarto da nova casa alugada,
reclamando aos céus o porquê de
todas essas coisas estarem
acontecendo a ela.
Joana se considerava uma pessoa
que sempre foi de boa índole e
moralidade, porém sempre se
levantava do chão sem respostas.
Assim, viveu por muitos anos até
uma situação que mudou a sua
vida.
Três semanas antes conhecer Paulo,
Joana estava caminhando nas ruas
do centro de Juazeiro a fim de
comprar material escolar para Sara.
Nesse trajeto, ela vislumbrou uma
mulher que estava em uma
papelaria.
Essa estava vestida com um vestido
azul marinho e rasteirinha, tendo
uma criança gritando ao seu lado,
sentada e repetindo a palavra ‘’luz’’
e um comportamento de
movimentação do corpo.
O olhar de Joana foi diretamente
para a maneira como a mãe estava
conduzindo toda aquela situação,
sem apresentar espantos ou
agitação pelo desconforto social
presente na situação.
Isso a impactou e a levou a
reconhecer as ações da criança
como sendo os mesmos que ela via
em casa todos os dias.
Ela então esperou a mulher finalizar
as atividades que fazia na loja e a
abordou logo na saída.
Joana se apresentou e perguntou o
que havia acontecido ali.
A mulher, com a mesma
naturalidade que estava na situação
anterior, se referiu a ela se
apresentando e explicando que o
filho era autista.
Diante disso, Joana inquieta, fez a
pergunta que tanto lhe interessava:

-Como você conseguiu reagir


daquele jeito?

A mulher fechou os olhos, fazendo


uma expressão pensativa e
silenciosa...
-Já tive muitos problemas com isso
no passado. Já chorei, gritei e
reclamei pelas situações que me
aconteceram, pelas oportunidades
perdidas devido a realidade que
vivo com o meu filho.
-Hoje, eu tenho consciência de que
essa é a minha realidade, não posso
alterá-la. Eu amo esse menino mais
do que minha própria vida. Aquela
cena na loja foi apenas uma
situação em que meu filho se sentiu
desconfortável, por causa disso ele
reage assim.
-Ele é assim, eu o amo assim. É meu
filho. Já sofri muito colocando a
culpa em mim, em Deus, meu
marido, na genética da família, etc..
Decidi viver a realidade que tenho
pensando que vivê-la e aproveitá-la
é melhor do que não enfrentá-la e
lutar por uma vida melhor para
mim e para meu filho.
A História de Joana se
parece com a sua?

Joana teve uma filha com TEA, fator


este que ela não pôde escolher,
tendo influência genética, bem
como de outros fatores orgânicos.
Assim, ela não tinha mínimas
condições de controlar isso, sendo
algo que fugia das mãos dela.
Além disso, também não tinha
condições de supor que seu marido
iria deixá-la, confirmando que a
culpa em momento algum foi dela
sobre o término do casamento.
Ela não é culpada da incapacidade
do marido de assumir a posição de
cônjuge. Logo, Joana não tem culpa
da série de eventos que se
sucederam na sua vida.
Devido ao contexto em que estava
envolvida, é natural que ela
analisasse tudo de forma emocional
e não racionalmente, sendo levada
pelo sentimento de culpa e tristeza.
Isso favoreceu que Joana olhasse
para Sara como a ocasionadora do
‘’vendaval’’ de mudanças que
ocorreram na vida da família.
Com isso, Joana têm probabilidades
maiores de fazer más
interpretações da vida que está
levando.
Isso vai afetar as ideias que ela tem
sobre a filha (‘’Foi a Sara que
começou tudo’’), sobre o futuro
dela (‘’não serei nada’’) e sobre ela
mesma (‘’sou uma fracassada’’),
demonstrando que o sentimento de
culpa se relaciona com outras áreas
da sua vida.
Fatores que nos ajudam a
ter sentimentos de culpa

A falta de conhecimento sobre o


Autismo atrapalha na resolução de
muitos problemas com relação à
culpa.
Isso se deve a vários fatores, como a
falta de conscientização da
população sobre o assunto, a
necessidade de políticas de ensino
para esse público específico, a
dificuldade de profissionais da
educação identificarem sintomas do
TEA, etc.
Portanto, perceba que o sentimento
de culpa da mãe da Sara é
compreensível a julgar pelo
sofrimento que viveu.
Por isso, é muito importante pensar
sobre o que você está sentindo
neste momento, já que
possivelmente você terá uma
interpretação do que está
acontecendo parecida com a que
Joana estava tendo.
As pessoas não tem o hábito de
pensar sobre aquilo que estão
sentindo.
Muitas pessoas quando se sentem
culpadas, vão tentar se distrair de
diversas maneiras.
Algumas tentam preencher essa
lacuna em festas, passeios,
trabalho, álcool, vícios, etc.
O fato é que por mais que você
tente esquecer esse sentimento, a
tendência é você se sentir cada vez
mais culpada ou culpado,
fracassada ou fracassado.
O ideal é você refletir sobre aquilo
que está sentindo e procurar
maneiras de se entender e resolver
a questão.
Não faça de conta que o problema
não existe. Todos passam por
problemas grandes ou pequenos e
existem pessoas e profissionais
sérios que estão esperando você
abrir seu coração e desabafar com
eles.
O que Joana nos ensina?

Com a história de Joana, notamos


que a dificuldade em lidar com o
sentimento da culpa pode estar
relacionado com questões
anteriores e que esses fatores
devem ser avaliados o mais rápido
possível.
Um exercício que vem a contribuir
para que haja uma melhora nesse
quadro é o hábito de avaliar os
próprios sentimentos, analisá-los
através dos fatores (fatos,
evidências) que estejam envolvidos
no problemas.
Com isso, você vai perceber que
não é só você quem se sente
culpado. A culpa é algo que todos
sentem e podem se livrar.
Além disso você perceberá que é
impossível ao ser humano estar no
controle de tudo à sua volta.
Somente Deus pode fazer isso.
Para algumas pessoas que tenham
sentimentos e pensamentos
comuns a Joana, recomenda-se que
tenham uma experiência de terapia
psicológica com um profissional,
visto que nessa relação, aspectos
mais profundos podem ser
abordados e trabalhados.
Isso permitirá, que a pessoa tenha
um espaço de acolhimento sem
preconceitos e onde possa ser
sincera nas suas colocações, nos
seus medos, seus pensamentos e
desenvolver novos objetivos.
Isso irá gerar novos caminhos para
que essa culpa que tanto a
consome, seja transformada numa
renovação emocional, espiritual e
física.
Lembre-se: Você nunca está sozinha
ou sozinho. Deus está querendo
ouvir sua voz e espera que você
entregue seus problemas a Ele, pois
Ele cuida de você.

“Não tenha medo, porque Eu estou


contigo; não fique assustado,
porque Eu Sou o teu Deus; eu te
fortaleço e te ajudo; e te sustento
com a mão direita da minha
justiça.”
Isaías 42:10
OBRIGADO POR TORNAR A VIDA
DE UMA PESSOA AUTISTA CADA
VEZ MELHOR.
Fale conosco

professordicastro@gmail.com

Whatsapp 87 98179-9848

professordicastro.com.br

Você também pode gostar