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“ O mundo das formas, ensinando


química para Argos e Tirésias:
O uso de maquetes táteis como
recurso didático nas aulas de
ligação iônica para alunos com
deficiência visual
Edivanda Silva Pontes Reginaldo da Silva Sales
SEDUC - PA IFPA

Darlison Guto Travassos de Sousa Vanessa Pires Santos Maduro


IFPA IFPA

Gilbson Santos Soares Rudinei Alves dos Santos


IFPA IFPA

Nila Luciana Vilhena Madureira Verônica Solimar dos Santos


IFPA IFPA

10.37885/201001938
RESUMO

Um dos grandes desafios da Educação na atualidade é a educação inclusiva. O presente


artigo traz uma reflexão sobre a implementação de recursos didáticos alternativos para
o ensino de química. A pesquisa foi desenvolvida a partir da experiência da utilização
de maquetes táteis como metodologia facilitadora, para a compreensão do tema liga-
ções iônicas a alunos com deficiência visual. Em seu dia a dia, o professor de química
é desafiado a adotar diferentes estratégias para conseguir atrair os discentes, haja vista
que por ser uma ciência complexa carrega em si o peso de ser considerada difícil e
pouco atrativa. Nesse viés, quando se trata de alunos com necessidades especiais, os
desafios da docência nessa disciplina se multiplicam. No entanto, a criatividade somada
ao planejamento pode ser capaz de grandes inovações. Com o uso de materiais de fácil
acesso foram produzidas 5 maquetes, as quais o público-alvo pode tocar e compreender
os fenômenos de ligação de maneira mais concreta e facilitadora.

Palavras-chave: Educação Inclusiva-Recurso Didático, Educação Especial-Cegos, Ligação


Iônica-Ensino Aprendizagem.
INTRODUÇÃO

Na Grécia da Antiguidade, havia uma figura que se destacava pela visão, trata-se do
gigante Argos Panoptes, que possuía, espalhado sobre todo o corpo, cem olhos. Assim,
ninguém conseguia enxergar tão bem quanto ele. Por outro lado, havia um velho cego,
Tirésias, que apesar da limitação visual era reconhecidamente de muito destaque, por sua
inteligência, sabedoria e conhecimento. Para se destacar, Tirésias ganhou de Zeus, habili-
dades aumentadas nos outros sentidos que lhes restaram, incluindo o tato.
Para além dos ensinamentos da mitologia grega, hodiernamente, sabe-se que pessoas
com deficiência visual têm os demais sentidos amplificados, refinados, com destaque para
a audição e o tato (BATES, 2012). Não à toa, a linguagem padrão de escrita e leitura para
cegos e demais deficientes visuais, ou seja, a linguagem Braille é uma linguagem tátil.
Nos últimos tempos, a busca por isonomia, em todos os aspectos da vida, tem sido
uma das metas daqueles que lutam por igualdade de direitos. Nessa busca, a comunidade
de deficientes do Brasil, ganhou a partir de 2015, uma proteção legal com a promulgação
do Estatuto da Pessoa com Deficiência, a lei federal Nº 13.146, (BRASIL, 2015). Apesar do
avanço, a inclusão de pessoas com deficiência visual nos educandários brasileiros continua
sendo um dos grandes desafios da Educação Inclusiva.
Pressionados pela legislação, a preocupação com recursos pedagógicos inclusivos
se transformou nos últimos anos com o advento da tecnologia, levando os professores a
buscarem recursos alternativos com o objetivo de atrair a atenção dos alunos, fugindo, as-
sim, do ensino tradicional, em que o professor é o detentor do saber e os alunos, sujeitos
passivos no processo de ensino.
O ensino tradicional de Química, muitas vezes, faz com que os alunos percam o inte-
resse e, consequentemente, acabem tendo baixo aproveitamento. O desafio dos docentes,
portanto, é buscar recursos didático-pedagógicos, tornando as aulas mais atrativas e esti-
mulantes aos alunos para aprenderem e construírem seu próprio conhecimento.
Souza (2007, p. 111) afirma que “recurso didático é todo material utilizado como auxílio no
ensino-aprendizagem do conteúdo proposto para ser aplicado pelo professor a seus alunos”.
A fim de fugir do tradicionalismo, muitos educadores têm buscado por novos recursos
didáticos. Construindo seu próprio material ou utilizando materiais desenvolvidos pelos pares.
Sobre essa questão da utilização de recursos pedagógicos inovadores Castoldi e Polinarski
(2009, p. 685) destacam que:

[...] com a utilização de recursos didático-pedagógicos, pensa-se em preencher


as lacunas que o ensino tradicional geralmente deixa, e com isso, além de
expor o conteúdo de uma forma diferenciada, fazer dos alunos participantes
do processo de aprendizagem.

Educação: Desafios, Perspectivas e Possibilidades 427


Para desenvolver o ensino e aprendizagem, vale-se utilizar de diversos materiais que
auxiliem no processo, facilitando, assim, a relação entre o professor, o aluno e o conhecimen-
to (SOUZA, 2007). O uso dos recursos didáticos torna o ensino mais interessante à medida
que os alunos se sentem mais confiantes, assimilam melhor o conteúdo, construindo, assim,
conhecimentos mais complexos, como afirma Becker (1992 apud SILVA et al. 2012, p. 2).

Não resta dúvida de que os recursos didáticos desempenham grande im -


portância na aprendizagem. Para esse processo, o professor deve apostar
e acreditar na capacidade do aluno de construir seu próprio conhecimento,
incentivando-o e criando situações que o leve a refletir e a estabelecer relação
entre diversos contextos do dia a dia, produzindo, assim, novos conhecimentos,
conscientizando ainda o aluno de que o conhecimento não é dado como algo
terminado e acabado, mas sim que ele está continuamente em construção,
através das interações dos indivíduos com o meio físico e social.

É importante frisar que a utilização de ferramentas didáticas exige que os docentes


dominem sua aplicação, pois, caso contrário, constituíram apenas um novo material não
aproveitado, mal explorado. Nesse sentido, um dos lugares apropriados para se buscar esse
domínio é a formação continuada. Outro aspecto importante que se deve levar em conside-
ração é que o material didático deve valorizar a criatividade e participação dos discentes.
Assim, pode-se incluir os alunos na construção dos mesmos, tendo um planejamento ade-
quado por parte do professor, para assim alcançar os objetivos propostos (SOUZA, 2007).
Apesar de auxiliarem no ensino-aprendizagem, muitos docentes evitam o uso de novos
recursos didáticos, seja por medo do novo ou por padrões estabelecidos por instituições de
ensino que não permitem a utilização desses recursos (NICOLA e PANIZ, 2016).
A proposta desta pesquisa é apresentar as maquetes táteis como recurso didático alter-
nativo no ensino de ligação iônica para alunos com deficiência visual da Unidade Educacional
Especializada Dr. José Tadeu Duarte Bastos (UEES) de Santarém, no Pará.

DIDÁTICA

Como fator determinante para o sucesso dessa pesquisa, faz-se necessário levantar
alguns conceitos e definir a sua importância, como a Didática. Segundo Libâneo (1992), a
didática é uma área de estudo da Pedagogia que tem como objetivo investigar os funda-
mentos, as condições e modos do processo de ensino e aprendizagem. Haydt (2011, p. 13)
completa da seguinte forma:

A didática é uma seção ou ramo específico da pedagogia e se refere aos


conteúdos do ensino e aos processos próprios para a construção do conheci-
mento. Enquanto a pedagogia pode ser conceituada como ciência e a arte da
educação, a didática é definida como ciência e a arte do ensino.

428 Educação: Desafios, Perspectivas e Possibilidades


A Didática também estuda a relação entre professor e aluno, tendo como relação os
conhecimentos teóricos e a aprendizagem do aluno, como afirma Libâneo (1992, p. 52):

A didática define-se como mediação escolar dos objetivos e conteúdos do en-


sino, a didática investiga as condições e formas que vigoram no ensino e, ao
mesmo tempo, os fatores reais (sociais, políticos, culturais, psicossociais) con-
dicionantes das relações entre docência e aprendizagem. Ou seja, destacando
a instrução e o ensino como elementos primordiais do processo pedagógico
escolar, traduz objetivos sociais e políticos em objetivos de ensino, seleciona e
organiza os conteúdos e métodos e, ao estabelecer as conexões entre ensino
e aprendizagem, indica princípios e diretrizes que irão regular a ação didática.

Nessa perspectiva, o professor tem que ter ciência de que o seu ensino e a aprendiza-
gem do aluno andam de mãos dadas, sendo que o ensino é aquilo que é passado pela ação
do professor e a aprendizagem, portanto, é a ação realizada pelo aluno, mas que também
faz parte do aprendizado do professor, ao passo que este ensinando também aprende, como
afirma Haydt (2011) ao dizer que ensinar e aprender é um processo que enfatiza a relação
de professor e aluno e norteia a prática pedagógica.
A didática não é algo novo, ela já vem acompanhando o ensino por décadas, sobretu-
do no Brasil. Segundo Berbel (2014), a partir da segunda metade do século XX, a didática
passou a ter diferentes propostas de ensino, a abordagem escolanovista e posteriormente
a escola tecnicista.
Segundo Hamze (2010), as ideias da Escola Nova chegaram ao Brasil em 1882 trazi-
das por Rui Barbosa. Os ideais escolanovistas eram a favor de uma escola laica e gratuita,
fazendo o oposto da escola tradicional e religiosa e acreditavam que a educação é o princi-
pal elemento de transformação da sociedade, levando o aluno a refletir sobre a sociedade,
respeitando a diversidade e individualidade dos sujeitos.

A didática e o ensino da Química

Em todos os âmbitos da vida do homem, para que se alcancem os objetivos, é necessá-


rio o planejamento. Foi através do planejamento que se criaram as mais diversas ferramentas
de trabalho. Na docência não é diferente. O conjunto de ferramentas utilizadas para realizar
a tarefa de ensinar é a didática. No ato de planejar, o professor irá estipular seus objetivos,
logo sabendo onde se almeja chegar, irá selecionar qual/quais ferramenta(s) utilizará.
No entanto, alguns profissionais, após realizarem sucessivas vezes a mesma tarefa,
usando a mesma ferramenta, acomodam-se e mesmo que o trabalho seja duro, utilizando
esta mesma técnica, insiste em continuar. Com isso, alguns de seus objetivos acabam não
sendo alcançados com êxito. Buscando novas estratégias didáticas o professor pode se

Educação: Desafios, Perspectivas e Possibilidades 429


tornar um profissional deveras habilidoso, capaz de envolver seus alunos e apresentar-lhes
conteúdos de maneira interessante e instigante à Química. Berton (2015, p. 26554) frisa que:

A química tem que se tornar ao aluno uma disciplina que realmente este julgue
importante ao seu aprendizado, porém sem deixá-lo com medo. Esta disciplina,
em outras épocas, e como quando muitos de nós professores atualmente fize-
mos nosso antigo Colegial ou Ensino Superior, foi ministrada com estratégias
de ensino que fizeram muitos temerem a simples menção do nome Química.
(Berton, 2015 p.26554)

É notória, em nosso dia a dia, a presença desta disciplina, nos filmes ela vem en-
volta de magia, porém, no decorrer do ano letivo, essa impressão se perde, dando lugar
ao desinteresse.

Contudo, hoje, o professor de Ciências em geral tem muita tecnologia para


conseguir explicar, contextualizar e fazer a diferença nesta disciplina. Portan-
to, Práticas como debates, estudos de casos, demonstrações da química no
dia-a-dia, estudos de artigos científicos sobre os diversos assuntos abordados
nos conteúdos essenciais da química, vídeos educativos e até engraçados que
fazem com que os discentes entendam a essência do seu estudo. (Berton,
2015 p.26555)

Sobre a didática no ensino de química, o conceituado educador Attico Inácio Chassot pu-
blicara em 1993 a obra Catalisando transformações da educação. Nessa obra, ele apresenta
uma das maiores dificuldades dos professores de química: fazer imagens de um mundo quase
imaginário. Chassot enfatiza que a química para sem cabalmente compreendida necessita
ser explorada em três níveis: visual/macroscópico, simbólico e ultramicroscópico/molecu-
lar. E, como o mundo químico molecular, átomos e moléculas, não podem ser visualizados
mesmo nos mais potentes microscópios da atualidade, ele destaca que essa é a missão
dos professores de química, fazer os alunos imaginarem esse mundo ultra-microscópico.
Apesar de as pessoas que tem visão, também não conseguirem enxergar esse mundo
micro ou nano da química, eles podem enxergar o outro aspecto da química, o viés macros-
cópico, ou seja, para as pessoas que tem visão é possível, facilmente, distinguir um pouco
de sulfato de cobre penta hidratado, dado sua coloração azul intensa, que lembra sabão em
pó, de uma porção de dicromato de potássio, que apesar de também ser sólido, porém tem
uma coloração laranja tão marcante que dificilmente um aluno que foi apresentado a esse
sal não o reconhecerá sempre que se deparar com ele.
De igual modo, os ditos normais, quanto à visão, podem facilmente notar o que se
processa quando uma pequena lâmina de cobre e depositada dentro de um recipiente com
ácido nítrico concentrado, uma vez que a reação é tão marcante, pois aquece intensamente e

430 Educação: Desafios, Perspectivas e Possibilidades


libera um gás castanho amarronzado, de odor característico, que por sinal é nocivo à saúde,
pois o gás é óxido nitroso, um poluente ambiental, prejudicial à saúde humana.
Entretanto, os deficientes visuais são privados dessas observações. Assim, a missão
dos professores de química com estes é duplamente dificultada. Por isso, é tão importante
elaborar modelos táteis para que eles também possam construir suas imagens mentais desse
minúsculo mundo químico. Afinal, a partir do mundo das formas físicas, percebidas através
do sentido do tato, os deficientes visuais conseguem construir imagens desse mundo quase
imaginário, denunciado pelo professor Chassot (VIVEIROS; CAMARGO, 2011).
São muitas as ferramentas didáticas que podem ser adotadas pelo professor em sala de
aula, a partir dessa constatação almejou-se uma estratégia que contemplasse os alunos com
deficiência visual. Partindo de suas limitações e seus sentidos aguçados, foram construídas
as maquetes para que estes possam, através do tato, entender como as ligações iônicas
ocorrem. Pois somente com teoria seria impossível fazer a assimilação de um conteúdo
tão abstrato. Tornando a distribuição eletrônica, os átomos (núcleo e eletrosfera) e ligação
iônica algo concreto. Frisa-se que não são maquetes fidedignas dos elementos abordados,
mas um modelo para fins de entendimento.

A perspectiva da ciência, tecnologia, sociedade e ambiente para o ensino de ciências


a alunos especiais.

O movimento CTSA, conhecido como movimento Ciência, Tecnologia, Sociedade e


Ambiente, tem o objetivo de estudar a relação destas quatro categorias. Pinheiro, Matos e
Bazzo (2007, p. 163) afirmam que há necessidade do enfoque CTSA “ser introduzido já no
ensino fundamental, a fim de formar um cidadão que tenha sua atenção despertada para
os aspectos que envolvem o contexto científico-tecnológico e social”.
A Lei de Diretrizes e Bases da Educação aborda os conteúdos com foco no CTSA
quanto à dimensão social da ciência e tecnologia no que se refere às suas aplicações e seus
impactos na sociedade contemporânea, buscando uma formação voltada para o exercício
da cidadania, como afirmam Santos e Mortimer (2002, p. 5):

O objetivo central da educação de CTS no ensino médio é desenvolver a


alfabetização científica e tecnológica dos cidadãos, auxiliando o aluno a cons-
truir conhecimentos, habilidades e valores necessários para tomar decisões
responsáveis sobre questões de ciência e tecnologia na sociedade e atuar na
solução de tais questões.

Ao integrar interrelações CTSA no ensino das ciências, os recursos e estratégias uti-


lizados tornam-se mais relevantes, pois dão sentido a temas e problemas, ajudando assim
os alunos a verem sentido neles.

Educação: Desafios, Perspectivas e Possibilidades 431


Além disso, Reis et al. (2017, p. 2) comentam sobre as principais características do
CTSA, corroborando o que já foi dito pelos outros autores:

Dessa forma, destacam-se as principais características do ensino CTSA, tais


como a organização das matérias em temas sociocientíficos, como saúde, ali-
mentação e agricultura, recursos energéticos, indústria e tecnologia, ambiente,
transferência de informação e tecnologia, ética e responsabilidade social; a
exploração, uso e decisões submetidas a julgamento de valor; lidar com pro-
blemas verdadeiros em seus contextos reais, por meio de uma abordagem
interdisciplinar, entre outros.

No Brasil, o enfoque CTSA ainda é relativamente novo, apesar de crescente, ainda se


encontra poucos estudos sobre o tema. Um dos avanços propiciados pelos estudos CTSA
no que se refere à educação está no saber de que o ensino-aprendizagem não pode mais se
basear em concepções superficiais idealizadas no desenvolvimento científico e tecnológico,
sem considerar suas consequências socioambientais. Para tanto, temos visto a inclusão de
metodologias de ensino diferenciadas na escola, com a consequente necessidade de adesão
dos professores de Química a estas inovações.

Inclusão social e o processo de ensino-aprendizagem

A inclusão social ganhou bastante força na última década, tornando um desafio a ser
superado pelos docentes quanto ao ensino e aprendizagem. A Lei de Diretrizes e Bases
(LDB) nº. 9.394/96 abriu possibilidades para que pessoas com deficiência sejam educadas
junto aos demais estudantes, assegurando a todos, inclusive aos deficientes, o direito de
estudar na rede regular de ensino. A LDB, pautada na política de direitos, estabelece o aten-
dimento de necessidades específicas e individuais a todos os educandos (BRASIL, 1996).
Esse ganho de atenção para a inclusão tem forçado as escolas de ensino regular a
se adaptarem e até mesmo a se reestruturarem, sobretudo formando as chamadas turmas
mistas, nas quais os alunos com e sem necessidades especiais aprendem juntos (BRASIL,
2001). Uma das necessidades especiais encontradas em turmas mistas é a cegueira.
Professores de diversas disciplinas que têm alunos com cegueira em suas salas de aula
batalham para contornar o desafio que é ensinar um aluno com esse tipo de necessidade
(LAPLANE; BATISTA, 2008).
Para compreender melhor o que é a deficiência visual, Laplane e Batista (2008, p.
210) afirmam que:

[...] a deficiência visual engloba uma variedade de condições orgânicas e sen-


soriais que têm consequências diferentes no desempenho visual dos sujeitos. A
deficiência visual compreende desde pequenas alterações na acuidade visual
até a ausência de percepção de luz, mas as alterações que têm implicações

432 Educação: Desafios, Perspectivas e Possibilidades


mais sérias para a vida das pessoas com necessidades especiais e para as
suas famílias são a baixa visão e a cegueira.

Laplane e Batista continuam esclarecendo sobre as pessoas com baixa visão e ceguei-
ra, sendo que as pessoas com baixa visão ou visão subnormal “apresentam uma redução
na sua capacidade visual que interfere ou limita seu desempenho, mesmo após a correção
de erros de refração comuns (LAPLANE; BATISTA, 2008 p. 210)” e quanto à cegueira eles
esclarecem, “A cegueira ocorre quando a visão varia de zero (ausência de percepção de
luminosidade) a um décimo na escala optométrica de Snellen, ou quando o campo visual é
reduzido a um ângulo menor que 20 graus (LAPLANE; BATISTA, 2008 p. 210)”.
Raposo e Mól (2010) asseveram que a elaboração de recursos didáticos para serem
explorados didaticamente com estudantes deficientes visuais devem ser construídos de tal
modo que propiciem um processo inclusivo no ambiente escolar, ou seja, em que todos –
com e sem deficiência visual – aprendam e participem.
De acordo com dados do IBGE (2010), há cerca de 500 mil pessoas incapazes de
enxergar no Brasil e mais de 6 milhões com algum tipo de deficiência visual, e esse núme-
ro em escolas regulares tem aumentado nos últimos anos no ensino regular (MEC, 2009),
porém, isso não garante a diminuição dos problemas, visto que não há, em regra geral,
uma formação para os professores voltada para a inclusão dessas pessoas, sobretudo os
professores de Química, levando esses alunos a um aprendizado incipiente na disciplina.
No ensino de Química, o professor ao explanar seu conteúdo, acaba tendo que mostrar
aos alunos, visualmente, a forma de reações, símbolos, cores de reações, entre outros, visto
a enorme quantidade de imagens, tabelas, gráficos e representações específicas, e essas
possuem um grau elevado para a aprendizagem dos conteúdos, pois a aprendizagem em
Química deve contemplar os três diferentes níveis de abordagem: o macroscópico, o mi-
croscópico e o representacional, o que mostra a importância da visão no ensino e também
na aprendizagem de Química (MORTIMER et al. 2000).
No entanto, uma aula para deficientes visuais pode ser considerada inclusiva se con-
siderarmos que a aquisição de conhecimento independe de ver e sim da necessidade da
contribuição dos outros sentidos (CAMARGO, 2005).
Conforme as Diretrizes Nacionais para a Educação Especial na Educação Básica
(BRASIL, 2002), a Educação Especial perpassa por todos os níveis de ensino, transversal-
mente, oferecendo o suporte necessário para a prática educacional inclusiva. Dessa forma,
considera-se importante o apoio oferecido pela Educação Especial ao professor do ensino
regular, para que ele desenvolva, com o aluno cego, os mesmos conteúdos que desenvolve
com os demais alunos, sem causar-lhe prejuízos na aprendizagem.

Educação: Desafios, Perspectivas e Possibilidades 433


Vygotsky (1995) diz que a cegueira não pode ser tratada apenas como uma deficiência,
mas, em certo ponto, como uma fonte de manifestação de habilidades, ou seja, o teórico
enfatiza que a deficiência visual provoca outras necessidades, o que acaba desenvolvendo
outras capacidades para completar a falta da visão, como a utilização das mãos. No entanto,
o aluno cego apesar de ter uma excelente memória auditiva, não consegue assimilar a gran-
de quantidade de conceitos e informações trabalhadas na escola. Por esse motivo, faz-se
necessário a aquisição ou construção de materiais didáticos que possibilitem ao aluno cego
assimilar tanto os conteúdos da disciplina Química quanto as demais.
Infelizmente, na literatura nacional e internacional, existem poucos casos de relatos
de propostas de atividades de química para serem desenvolvidas com deficientes visuais,
tornando a inclusão de deficientes visuais em classes regulares uma problemática que me-
rece a devida atenção, gerando nos professores a busca por metodologias alternativas que
despertem o interesse e gerem a aprendizagem adequada para essas pessoas.

PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

Para verificar se as maquetes táteis são eficientes no ensino de química, é necessário


entender melhor sobre o tema em questão que se pretende atuar, além de diversas especi-
ficidades acerca de seu público-alvo, dessa forma, podemos dizer que essa pesquisa tende
a ser um estudo de caso, pois Gil afirma que “o estudo de caso é caracterizado pelo estudo
profundo e exaustivo de um ou de poucos objetos, de maneira a permitir o seu conhecimento
amplo e detalhado, tarefa impossível mediante outros tipos de delineamentos considerados”
(GIL, 2008 p.57).
Segundo Yin (2001), os estudos de casos investigam fenômenos contemporâneos
inseridos em algum contexto da vida real. Para Oliveira, eles podem ser divididos em:

Exploratórios: quando se quer encontrar informações preliminares sobre o


assunto estudado. Para Estudos de Casos explanatórios, uma boa abordagem
é quando se utiliza de considerações rivais, em que existem diferentes pers-
pectivas, aumentando as chances de que o estudo seja um modelo exemplar.
Descritivos: cujo objetivo é descrever o Estudo de Caso.
Analíticos: quando se quer problematizar ou produzir novas teorias que irão
procurando problematizar o seu objeto, construir ou desenvolver novas teo-
rias que irão ser confrontadas com as teorias que já existiam, proporcionando
avanços do conhecimento (OLIVEIRA, 2003, p.1)

Dessa forma, como estudo de caso descritivo, sabemos que os deficientes visuais
possuem grande dificuldade em imaginar o processo de ligações iônicas. Diante disso, foi
desenvolvida uma pesquisa de cunho qualitativo, haja vista que “se desenvolve numa situação

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natural, é rico em dados descritivos, tem um plano aberto e flexível e focaliza a realidade de
forma complexa e contextualizada” (LUDKE; ANDRÉ, 1986, p. 18).
Inicialmente, confeccionaram-se maquetes, optou-se por utilizar material alternativo e
de baixo custo (garrafas pet, palitos de dente, barbante, folhas e bolas de isopor, cola de
silicone, TNT, EVA, tinta guache e papel sulfite), a escolha por esses materiais justificou-se
pela facilidade da reprodução futura desse recurso material pelos professores que atuam
com alunos que possuem deficiências relacionadas à visão.
Após a construção das maquetes, planejou-se, junto ao coordenador da Unidade
Regional de Educação Especial (UEES) na cidade de Santarém-PA, dois dias com três au-
las de 40 minutos a serem ministradas a 4 alunos (A1, A2, A3 e A4) com deficiência visual
da UEES, três apresentavam baixa visão, sendo dois congênita e uma adquirida após uma
meningite e somente um deles tinha cegueira congênita total. Anteriormente, foi mostrado
ao coordenador todo o material produzido para averiguação da qualidade dele. Assim que
aprovados foram levados para serem traduzidos para o braille, a fim de inserir nas maquetes
para facilitar o ensino do conteúdo de ligação iônica para esses alunos cegos. Infelizmente,
o planejamento teve que ser alterado, devido às condições climáticas da região, impossibi-
litando esses alunos de comparecerem a UEES nos dois dias. Com isso, tivemos que fazer
a aula em apenas um dia.
Foram utilizadas duas maquetes sobre ligação iônica, duas maquetes sobre distribuição
eletrônica e uma maquete sobre número máximo de elétrons por camada e por subnível (Fig. 1)

Figura 1. Apresentando as Maquetes Táteis.

Fonte: PONTES, 2019.

A princípio, foi feita a apresentação das maquetes (Figura 1), explanando a aplicabili-
dade do conteúdo de química no dia a dia das pessoas e, inicialmente, a aula foi ministrada
sobre a importância de relacionar as ligações químicas com o nosso cotidiano e foi utilizado
o tema “Produção de Alimentos e Agrotóxicos para revisar distribuição eletrônica, regra do

Educação: Desafios, Perspectivas e Possibilidades 435


octeto e ligações químicas”. E para correlacionar o tema citado anteriormente com o con-
teúdo de ligações químicas, foram utilizados dois vídeos “Tudo se transforma – Ligações
Químicas” e “Como a produção de alimentos com agrotóxicos impacta na vida do brasileiro”
como suporte para mostrar aos alunos a importância do conhecimento que a Química está
diretamente envolvida em tudo na vida dos seres vivos.
Foi explanado que, com o passar dos anos, a população aumentou e, consequentemen-
te, também a necessidade de se produzir mais alimentos para suprir a demanda populacional
e com isso se torna indispensável a utilização de substâncias químicas, conhecidas como
agrotóxicos, defensivos agrícolas para eliminar quaisquer germes que venham a destruir as
plantações. Na figura 8, foi explicado aos alunos que todo alimento, toda as substâncias,
inclusive os agrotóxicos, são constituídos por elementos químicos como o carbono, o oxigê-
nio , o hidrogênio, o nitrogênio etc. que, para adquirir a sua estabilidade, precisa se unir uns
aos outros, como por exemplo, o sal de cozinha (cloreto de sódio, NaCl), no qual o sódio,
para adquirir a sua estabilidade, precisa doar um elétron da sua última camada e o cloro
que já possui 7 elétrons necessita receber somente um para obedecer a regra do octeto.
Essa união do sódio ao cloro é possível através de ligação química, mas especificamente
denominada de ligação iônica.
Após esclarecer a relevância do estudo da relação do assunto de ligações químicas
“ligação iônica” aos alimentos, tratou-se dos benefícios e malefícios dos agrotóxicos para
a população. Como exemplo prático, citou-se o hábito de algumas pessoas irem à feira e
buscarem aquelas verduras mais robustas e mais bonitas, o que muitas vezes elas não
sabem é que os defensivos agrícolas tornam os alimentos maiores e com boa aparência,
entretanto são causadores de várias doenças como o câncer, problemas neurológicos,
alergias e dentre outras.

Figura 2. Número máximo de elétrons por camada e por subníveis.

Fonte: PONTES, 2019.

436 Educação: Desafios, Perspectivas e Possibilidades


Posteriormente (Figura 2), foi falado sobre a divisão do átomo: em núcleo e eletrosfera,
em que individualmente foi explicado e mostrado para os alunos (Figura 3) o núcleo sendo
representado por uma bola de isopor na cor vermelha e as camadas da eletrosfera através
do barbante na cor amarela e as quantidades de elétrons encontrados em cada camada
estavam representados por bolinhas de isopor brancas e lisas para representar o subnível
s, rosas e rugosas para representar o subnível p, brancas com alfinetes vermelhos para
representar o subnível d e brancas com alfinetes verdes para representar o subnível f. E na
parte inferior da maquete, foi explicada a quantidade máxima que cada subnível comporta,
utilizando-se para isso caixinhas de fósforo e bolinhas de isopor representando os elétrons.
Seguindo o fio de lã, o aluno irá acompanhar também a distribuição dos elétrons em cada
camada e em cada subnível.

Figura 3. Utilização de maquete “Número de Elétrons por Camada e por subníveis”.

Fonte: PONTES, 2019.

Para o ensino de distribuição eletrônica de Linus Pauling, foram utilizadas duas ma-
quetes com o intuito de verificar qual seria mais adequada para o ensino deste conteúdo
nas aulas de química para alunos cegos.

Educação: Desafios, Perspectivas e Possibilidades 437


Figura 4. Maquete Diagrama de Pauling 01.

Fonte: PONTES, 2019.

Na figura 4, temos a primeira maquete de distribuição eletrônica de Linus Pauling, os


subníveis (s, p, d, f) estava descrito em braille, e os elétrons (2, 6, 10, 14) representados
por bolas de isopor de tamanhos diferentes, onde cada tamanho de bola representava um
subnível, que conforme a distribuição eletrônica de cada elemento da tabela periódica, eram
distribuídas através da maquete baseando-se pelo barbante e setas sempre na diagonal.

Figura 5. Maquete Diagrama de Pauling 02.

Fonte: PONTES, 2019

438 Educação: Desafios, Perspectivas e Possibilidades


Na figura 5, temos a segunda maquete de distribuição eletrônica de Linus Pauling,
representada por quadros descritos em braille feitos com barbantes na cor amarela que ti-
nham como finalidade o alto relevo, bem como as setas ao lado. O aluno deverá memorizar
os subníveis que estão na primeira linha, sendo que cada coluna representa um subnível;
após isso, ele deverá seguir os quadros na orientação das setas, iniciando na segunda linha
da quarta coluna em sentido a primeira coluna, a qual irá descer para a terceira linha e, ao
chegar na quarta coluna, descer novamente até chegar a primeira e assim sucessivamente,
conforme a distribuição eletrônica de determinado elemento químico (Figura 6).

Figura 6. Utilização da maquete Diagrama de Pauling 02.

Fonte: PONTES, 2019

Com a finalidade de repassar conhecimentos sobre ligações iônicas, foram utilizadas


mais duas maquetes: a primeira (Figura 7) para explicar a distribuição dos elétrons dos
átomos de sódio (Na) e cloro (Cl) em cada uma de suas camadas eletrônicas e a segunda
(Figura 8) para enfatizar os elétrons da última camada desses átomos. A primeira maquete
foi necessária para torná-la de tamanho acessível, visto que a distribuição eletrônica desses
átomos, fazendo uso de garrafas pets, demandaria muito espaço no instrumento.

Educação: Desafios, Perspectivas e Possibilidades 439


Figura 7. Maquete de Ligação Iônica 01.

Fonte: PONTES, 2019.

Figura 8. Maquete de ligação iônica 02.

Fonte: PONTES, 2019

A utilização da maquete de ligação iônica 01 (Figura 9) permitiu, de uma forma mais


dinâmica, representar a saída do elétron da última camada do sódio (Na) para o cloro (Cl).
Nessa maquete, o fio de lã que representava a última camada do átomo de sódio (Na), foi
fixado com velcro para demonstrar aos alunos que, após a doação do elétron dessa última
camada para o cloro (Cl), a camada desapareceria, fato esse identificado pela retirada do
fio preso pelo velcro. Outrossim, a penúltima camada do sódio (Na) passaria a ser a última,
garantindo a estabilidade do átomo por possuir oito elétrons.

440 Educação: Desafios, Perspectivas e Possibilidades


Figura 9. Utilização da maquete de Ligação Iônica 01.

Fonte: PONTES, 2019.

Em seguida, deu-se continuidade com a maquete 02 mais relacionada à estabilidade


dos elétrons com aplicação da regra do octeto. As garrafas pets representavam os elétrons
da camada de valência de cada átomo e a transferência dos elétrons fora guiada sempre
pelas tampas e o barbante da maquete (Figura 10), favorecendo assim a fundamentação
da ligação iônica.

Figura 10. Utilização da maquete de Ligação Iônica 02.

Fonte: PONTES, 2019.

Educação: Desafios, Perspectivas e Possibilidades 441


RESULTADOS E DISCUSSÃO

Com o intuito de obter respostas acerca do uso de maquetes táteis como recurso di-
dático alternativo no ensino de ligação iônica para alunos com deficiência visual da Unidade
Educacional Especializada Dr. José Tadeu Duarte Bastos (UEES), aplicou-se um questio-
nário com perguntas abertas e fechadas com o objetivo de verificar a aprendizagem dos
alunos após a utilização das maquetes táteis como recurso didático para ensinar química
aos alunos com deficiência visual.
Ao utilizar as maquetes sobre distribuição eletrônica, percebeu-se que a maquete
Linnus Pauling 02 (Figura 5) foi a que mais agradou aos participantes. Fato esse, atribuído
a praticidade e a facilidade de aprender a ordem da distribuição e contagem de elétrons.
Quando solicitado aos discentes, para fazerem a distribuição eletrônica para alguns elemen-
tos, como o magnésio, que possui o número atômico 12, o sódio com o número atômico 11
e o alumínio com o número atômico 13. Notamos que três deles (A1, A2 e A4) conseguiram
resolver o exercício no momento solicitado. No entanto, durante o uso da maquete Linnus
Pauling 01 (Figura 4), percebeu-se que apenas o aluno A3 se sentiu mais confortável ao
utilizá-la. De acordo com esse aluno “fica mais fácil de aprender”. Viveiros e Camargo (2011
p. 41) consideram que a estimulação tátil com a utilização de modelos tridimensionais para
simular átomos e moléculas, com a identificação em Braille e o monitoramento do profes-
sor, contribuem para construção mental do objeto em estudo em casos de alunos com
deficiência visual.
Após a utilização das maquetes táteis para o ensino de química, foi aplicado o ques-
tionário, para os alunos. Na primeira questão, foi solicitado que os alunos avaliassem em
uma escala numérica de 01 a 10 a metodologia aplicada a eles referente ao ensino do
conteúdo abordado.

Gráfico 01. Avaliação dos alunos quanto a metodologia.

Fonte: PONTES, 2019.

442 Educação: Desafios, Perspectivas e Possibilidades


O gráfico 01 demonstra-nos que 100% dos alunos avaliaram positivamente a meto-
dologia para o ensino de química com maquetes táteis, reforçando o que dizem Raposo e
Mól (2010), a elaboração de recursos para serem explorados didaticamente com estudantes
deficientes visuais pode propiciar um processo inclusivo em que todos – com e sem defi-
ciência visual – aprendem e participam.
Foi questionado também acerca do conhecimento e segurança da docente na expla-
nação dos conteúdos através das maquetes táteis e 100% dos entrevistados avaliaram
como excelente. Esse resultado evidencia que o planejamento feito para as aulas atingiu o
objetivo esperado.
Quando indagados sobre o entendimento do conteúdo repassado através das maquetes
táteis (Gráfico 02), percebeu-se que metade dos alunos entenderam os conteúdos perfei-
tamente, enquanto, a outra metade disse ter entendido razoavelmente, reforçando o que
Azevedo (2012, p.4) diz quando fala que “[...] a dificuldade de compreensão, devido à falta
de visualização por parte do aluno, e a grande falta de material didático formam a grande
barreira desse aprendizado”.

Gráfico 02. Entendimento do conteúdo passado através das maquetes táteis.

Fonte: PONTES, 2019.

Percebemos que esse resultado se deve também as dificuldades enfrentadas para as-
segurar os encontros com os alunos previamente escolhidos pelo corpo técnico da unidade.
Diante disso, participaram os alunos que estavam disponíveis na unidade de atendimento no
horário agendado. Entretanto, alguns deles não conheciam o Sistema de Escrita Tátil – Braille
– por serem alunos, apenas de baixa visão. Isso reflete diretamente o que Azevedo afirma:
O professor deverá antes de iniciar o processo de ensino-aprendizagem, conversar com
o aluno, com seus familiares, com professores que já trabalharam com ele para obtenção
de informações mais precisas e, assim, poder traçar as estratégias necessárias para iniciar
o processo de ensino-aprendizagem. (Azevedo, 2012 p.4).

Educação: Desafios, Perspectivas e Possibilidades 443


Após essa questão, perguntamos se os alunos recomendariam o uso de maquetes
táteis para outros alunos com deficiência visual e o resultado foi unânime, ou seja, todos os
alunos responderam que recomendariam o uso desses recursos didáticos.
Na quinta pergunta, verificamos sugestões para a melhoria da metodologia no uso das
maquetes, ao passo que dois dos alunos sugeriram o uso de alto contraste nas maquetes
e outro sugeriu aumento e melhor divisão de tempo para o ensino com as maquetes táteis.
Antes de entrar nas respostas subjetivas, é importante ressaltar algumas das carac-
terísticas dos discentes. O aluno A1 possui 45 anos, não sabe o braille, possui baixa visão
congênita e está cursando o 8º módulo do fundamental CEEJA. O aluno A2 possui 46 anos,
é pós-graduada em Educação Especial, trabalha no programa de tecnologia assistiva desde
2005 na UEES, possui baixa visão congênita e não sabe o braille. O aluno A3 possui 46
anos, tem cegueira congênita total, não sabe o braille e está no 5º módulo o fundamental
CEEJA. O aluno A4 possui 20 anos, sabe ler o braille, adquiriu baixa visão após uma me-
ningite, e faz os módulos do ensino médio CEEJA.
Passadas as perguntas objetivas, iniciamos as subjetivas. Primeiramente, buscamos
verificar informações sobre as maquetes de Distribuição Eletrônica, em que foram mostrados
dois modelos para fazer a distribuição. Questionamos qual delas os alunos acharam melhor
para a sua compreensão.
O aluno A1 disse ter gostado mais da maquete “Diagrama de Pauling 02 (Figura 5), por
ter achado ela mais objetiva, mais fácil para identificar numerações e fazer as somas. Os alu-
nos A2 e A4 também preferiram o “Diagrama de Pauling 02” (Figura 5), o primeiro disse
que nessa dá para entender melhor a contagem de elétrons, e o segundo achou a maquete
mais fácil para aprender. Já o aluno A3 disse ter gostado mais do “Diagrama de Pauling
01” (Figura 4), dizendo que, por causa dos fios, dá para entender melhor como se faz a
distribuição eletrônica.
Em um segundo momento, buscamos verificar informações em relação às maquetes
de Ligação Iônica, em que foram mostrados dois tipos: uma com garrafas pet (Figura 9) e
outra com bolinhas de isopor (Figura 7), e solicitamos para os alunos que identificassem
quais delas acharam melhor para sua aprendizagem.
Os alunos A1, A3 e A4 preferiram a maquete de ligação iônica 01 (Figura 7), pois com
base em seus relatos, o primeiro (A1) justificou dizendo que com a retirada do fio, ficou claro
que o átomo de sódio (Na) doou 1 elétron para o cloro (Cl) e perdeu uma camada. O tercei-
ro (A3) apenas respondeu sem justificar e o aluno A4 justificou sua resposta dizendo que
ela é mais objetiva. Já o aluno A2 achou a maquete de ligação iônica 02 (Figura 9) mais
lúdica, mais concreta dessa forma, e acredita que com esta maquete é possível trabalhar
não só com pessoas com deficiência visual, mas também com pessoas com problemas

444 Educação: Desafios, Perspectivas e Possibilidades


cognitivos, pessoas com deficiência intelectual, autistas, abrangendo, assim, várias cate-
gorias de deficiência.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Esta pesquisa buscou responder a seguinte pergunta norteadora: É eficaz o uso de


maquetes táteis como recurso didático alternativo no ensino de ligação iônica para alu-
nos com deficiência visual da Unidade Educacional Especializada Dr. José Tadeu Duarte
Bastos? A partir da pesquisa, podemos concluir que o uso das maquetes é válido para o
ensino de química, sobretudo ligações iônicas.
Concluímos também que existem algumas falhas na utilização destas maquetes, haja
vista que existe a necessidade de o aluno ter conhecimento do sistema de escrita tátil, Braille,
pois algumas informações de plena relevância estão postas nesse sistema. Contudo, isso
não desqualifica a importância desta ferramenta para o ensino de Química para alunos com
deficiência visual que não conhecem a linguagem Braille. Enfatiza a real necessidade de
ferramentas como estas serem utilizadas desde a alfabetização desses alunos. Confirmou-
se que o uso de maquetes táteis para o ensino da química é essencial em todos os níveis
de ensino, pois poder tocar nesses materiais torna a ciência algo palpável e concreto – de
certa maneira – e influi no interesse e entendimento dos alunos na disciplina.
De fato, o uso das maquetes para o ensino do tema Ligação Iônica foi instigante aos
participantes do estudo, pois alguns conceitos abordados, como eletrosfera e distribuição
eletrônica, só são possíveis de se assimilar através do modelo atômico, como os discentes
não contam com o sentido da visão, torna-se bem difícil compreender como se comporta
um elétron. A maquete sobre o número máximo de elétrons e de subníveis (Figura 2) faci-
litou muito o entendimento sobre o assunto, pois houve uma interação e solucionou alguns
questionamentos que esses alunos tinham sobre a divisão do átomo. A Maquete Diagrama
de Pauling 02 (Figura 5) que representa o diagrama de Linus Pauling foi bastante proveitosa;
com ela explorou-se a formatação do diagrama, a ordem e a distribuição eletrônica. Através
desta os alunos puderam compreender o sentido das flechas do diagrama, algo que seria
imaginável ao entendimento se esta ferramenta não fosse utilizada.
Diante do explanado, ratifica-se a essencial relevância da utilização das maquetes
táteis para o ensino de Ligações iônicas e consequentemente para o ensino da Química
em geral. A partir dos materiais confeccionados, espera-se que os professores, da Unidade
Educacional Especializada Dr. José Tadeu Duarte Bastos (e de tantas outras as quais o
presente artigo alcance) possam ser influenciados a criar novos materiais didáticos ou repli-
car os aqui demonstrados para serem utilizados como estratégias facilitadoras para ensinar
alunos com deficiência visual.

Educação: Desafios, Perspectivas e Possibilidades 445


Dessa maneira, acredita-se que o trabalho conseguiu proporcionar ferramentas didáticas
para que os alunos com deficiência visual pudessem construir imagens do mundo químico
quase imaginário, uma vez que o mundo cognitivo desses sujeitos é extremamente um
“mundo de formas”. De igual modo, colaborou para que através das formas apresentadas,
tanto Argos Panoptes, quanto Tirésias possam aprender, ou na linguagem de Raposo e Mól,
serviu para propiciar um processo inclusivo no ambiente escolar, em que todos – estudantes
com e sem deficiência visual – aprendam e participem.

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Educação: Desafios, Perspectivas e Possibilidades 447

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