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Na época das revoluções digitais, criar, compôr, sentir e amar ainda são características que

diferenciam homens e mulheres de máquinas e computadores. Por essa razão, fortalecer as habilidades
criativas e a inteligência emocional se torna um passo importantíssimo para o desenvolvimento social.

Para mim, o Processo Criativo é conjugado sempre num plural de pessoas e tempos, pois ninguém
cria nada isolado e sem referências de outros processos. Sem Pitágoras para descobrir as relações das
frequências dos harmônicos, sem J.S.Bach para temperar as 12 notas, e sem os ritmos trazidos da África,
Pixinguinha não tinha composto os belos temas que brotavam de sua flauta.

Capital de uma República recém-proclamada, o Rio de Janeiro de Pixinguinha era o caldeirão onde
se misturavam as culturas europeias e afro-brasileiras. Conectado com o seu passado e seu presente, o mestre
criou uma música que sintetizava essas raízes culturais e, assim, nasceu o Choro - primeiro gênero musical
genuinamente brasileiro.

Ai seguiu: Pixinguinha, Radamés Gnatalli, Villa-Lobos, Luiz Gonzaga, Cartola, Tom Jobim, Hermeto
Pascoal e tantos outros que (re)criam nossa música, plural desde o nascimento. Muitos desses nomes
conviveram durante anos entre si, seus processos criativos foram multifacetados, compartilhados e em
harmonia.

Partindo para a minha experiência, tive a sorte de aprender com importantes músicos do Ceará:
Tarcísio Sardinha, Carlinhos Patriolino, Márcio Resende e Adelson Viana, são alguns dos exemplos que
influenciaram fortemente minha iniciação musical. Ouvir e observar de perto o talento e a experiência desses
músicos foi tão importante para mim quanto os meus anos na faculdade de música.

Hoje, como diretor da Orquestra Popular do Nordeste - OPN me relaciono musical e afetivamente
com os integrantes do projeto, onde vão se multiplicando as diferenças e potencializando os dispositivos de
coletividade e invenção que surgem das inúmeras convergências e divergências presentes nesse processo
onde todos podem dialogar de modo horizontal. Nesse encontro, emerge um sistema onde vários elementos
se cruzam e se tornam fundamentais para a experiência da criação como: a escuta, a imaginação, a pausa, o
diálogo e a repetição, dentre outros; Algo que está para além do resultado e que considera o que cada artista
possui, faz a música participar de um campo cinestésico, sensitivo, organico, mais da ordem da poética do que
do produto.

A OPN nasceu da amizade e da vontade de CRIAR algo que tivesse outro modo de operar,
diferente das composições com especificidade em um só lugar, me interessou o encontro entre estilos,
linguagens, sonoridades e pessoas; assim seguimos criando um jeito de fazer essa tal ORQUESTRA - como um
conjunto de desejos de mergulhar das histórias musicais, primeiro do Nordeste e depois seguindo para todo
Brasil.

Estamos apresentando o concerto "CANTO DA JANDAIA" que é uma reinterpretação de


compositores cearenses tais como: Alberto Nepomuceno, Lauro Maia, Belchior entre outros autores
contemporâneos e peças autorais, trazendo uma estética e poética que propõem uma visitação em muitos
cantos do Ceará.

Já com o Madeira Trio, grupo oriundo da OPN, que é formado de bandolim, baixo e bateria,
desenvolvemos uma pesquisa sobre a música brasileira no concerto Pau-Brasil com: Villa Lobos, Garoto,
Pixinguinha, Jacob do Bandolim entre outros. Dialogando nessa tríade aproveitamos as possibilidades de cada
instrumento misturando e saindo das nossas zonas de conforto, indo para zonas de transição, de onde emana
uma musicalidade de fronteira, sem lugar definido. Fazer música no encontro com esses grandes músicos e
amigos, tem sido um aprendizado que desperta desejo e inspiração para crescer e inventar outras atmosferas
de sons e brasilidades.

Agora integrando a "Plataforma Sinfonia do Amanhã", a Orquestra Popular do Nordeste espera


contribuir e aprender com essa rede de projetos de ensino musical, criando novas relações e processos
criativos pelo Ceará e pelo Brasil afora.

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