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Revista do

Instituto
Arqueológico,
Histórico e
Geográfico
Pernambucano
REVISTA DO INSTITUTO ARQUEOLÓGICO, HISTÓRICO E GEOGRÁFICO
PERNAMBUCANO - IAHGP
Número 71. Recife, 2018. ISSN 0103-1945
Capa: José Hygino Duarte Pereira. Acervo do IAHGP.
Foto: Dirceu Marroquim

EDITORES
Bruno Romero Ferreira Miranda (UFRPE/IAHGP)
Dirceu Marroquim (USP/IAHGP)

ASSISTENTE DE EDIÇÃO
Larissa Rodrigues de Menezes (DPPC/UFPE)

CONSELHO EDITORIAL
Antônio Jorge de Siqueira (UFPE/IAHGP)
Bruno Augusto Dornelas Câmara (UPE/IAHGP)
Ernst van den Boogaart (IAHGP)
José Luiz Mota Menezes (IAHGP)
Marcus Joaquim Maciel de Carvalho (UFPE/IAHGP)
Onésimo Jerônimo Santos (IAHGP)
Yony de Sá Barreto Sampaio (UFPE/IAHGP)

CONSELHO CONSULTIVO
Acácio Catarino (UFPB)
Ana Lúcia do Nascimento Oliveira (UFRPE)
Antônio Paulo Rezende (UFPE)
Brodwyn Fischer (Universidade de Chigago)
Carla Mary da Silva Oliveira (UFPB)
Celso de Castro (CPDOC/FGV)
Daniel de Souza Leão Vieira (UFPE)
Giselda Brito Silva (UFRPE)
José Manuel Santos Pérez (Universidade de Salamanca - Espanha)
Maria Ângela de Faria Grillo (UFRPE)
Mariana de Campos Françozo (Universidade de Leiden - Países Baixos)
Rômulo Luiz Xavier do Nascimento (UFPE/IAHGP)
Scott Joseph Allen (UFPE)
Severino Vicente da Silva (UFPE)
Suely Creusa Cordeiro de Almeida (UFRPE)
Wellington Barbosa da Silva (UFRPE)

INSTITUTO ARQUEOLÓGICO, HISTÓRICO E


GEOGRÁFICO PERNAMBUCANO – IAHGP
FUNDADO EM 1862
 Rua do Hospício, 130, Boa Vista, Recife-PE, Brasil. CEP 50.080-060

55 81 3222-4952
@ iahgp.info@gmail.com
Revista do
Instituto
Arqueológico,
Histórico e
Geográfico
Pernambucano

Número 71
Recife, 2018
DIRETORIA DO INSTITUTO ARQUEOLÓGICO, HISTÓRICO E GEOGRÁFICO PER-
NAMBUCANO – IAHGP PARA O BIÊNIO 2017-2019

Presidente: George Felix Cabral de Souza


1º Vice-Presidente: Margarida de Oliveira Cantarelli
2º Vice-Presidente: Silvio Tavares de Amorim
3º Vice-Presidente: Maria de Betânia Correia de Araújo
1º Secretário: Reinaldo José Carneiro Leão
2º Secretário: Tácito Luiz Cordeiro Galvão
1º Tesoureiro: Yony de Sá Barreto Sampaio
2º Tesoureiro: Maurício Barreto Pedrosa Filho
Diretoria de patrimônio: Fernando Guerra de Souza

Comissão de Admissão de Associados:


Fernanda Ivo Neves
Nilzardo Carneiro Leão
Ramires Cotias Teixeira (in memoriam)

Comissão de Publicação e Divulgação:


Bruno Dornelas Câmara
Bruno Romero Ferreira Miranda
Marcelo Casseb Continentino

Comissão de História e Geografia:


Carlos Bezerra Cavalcanti
Marcus Joaquim Maciel de Carvalho
José Luiz Mota Menezes

Comissão de Arqueologia e Etnografia:


Ciema Mello
Antônio Jorge de Siqueira
Jacques Alberto Ribemboim

Comissão de Genealogia e Heráldica:


Reinaldo José Carneiro Leão
Tácito Luiz Cordeiro Galvão
Rafael Henriques Pimentel de Paula
Conselho Fiscal:
Luís Jorge Lira Neto
Dirceu Salviano Marques Marroquim
José Raimundo de Oliveira Vergolino

Suplentes:
George Emílio Bastos Gonçalves
Francisco Bonato Pereira da Silva
Tácito Augusto Medeiros

Assessoria Jurídica:
Margarida de Oliveira Cantarelli
Nilzardo Carneiro Leão
Ramires Cotias Teixeira

Assessoria da Gestão:
Alípio Durans

Assessoria de Patrimônio e Infraestrutura:


Reinaldo José Carneiro Leão (Acervo Museológico)
Tácito Luiz Cordeiro Galvão (Acervo Bibliográfico e Documental)
Alberto Neves Salazar (Infraestrutura)

Assessoria Relações Internacionais:


Ana Maria Penha Brasil
Isnard Penha Brasil Júnior

Assessoria de Relações Institucionais:


Francisco Carneiro da Cunha
Luiz Cláudio Aguiar
Alexandre Furtado
ASSOCIADOS EFETIVOS ATIVOS E BENEMÉRITOS DO IAHGP EM 2018

EFETIVOS ATIVOS
Alberto Neves Salazar Margot de Queiroz Monteiro
Alexandre Furtado de A. Correa Maria Cristina Cavalcanti de Albuquerque
Alípio Fernandes Durans da Silva Maria Digna Pessoa de Queiroz
Aluísio José de Vasconcelos Xavier Marieta Borges Lins e Silva
Antônio Jorge Siqueira Maurício Barreto Pedrosa Filho
Bruno Augusto Dornelas Câmara Nilse Fontes de Souza
Bruno Romero Ferreira Miranda Nilzardo Carneiro Leão
Carlos A. Barreto Campelo de Melo Paulo Frederico Lobo Maranhão
Carlos Alberto Lopes Asfora Rafael Henriques Pimentel de Paula
Carlos Bezerra Cavalcanti Ramires Cotias Teixeira (in memoriam)
Carmen Cardoso Rita de Cássia Araújo
Ciema Silva de Mello Roberto Cavalcanti de Albuquerque
Dirceu Salviano Marques Marroquim Roberto Mauro Cortez Motta
Diva Gonsalves de Mello Robin de Rooy
Fernando Guerra de Souza Rômulo Luís Xavier do Nascimento
Francisco Bonato Pereira da Silva Sílvio Tavares de Amorim
Francisco Carneiro da Cunha Tácito Augusto de Medeiros
Francisco Sales de Albuquerque Valéria Agra de Oliveira
George Emílio Bastos Gonçalves
George Félix Cabral de Souza BENEMÉRITOS
Gilda Maria Whitaker Verri Ana Maria Penha Brasil
Harlan de Albuquerque Gadelha Filho Fernanda Ivo Neves
Jacques Alberto Ribemboim Francisco Tadeu Barbosa Alencar
João Mendonça de Amorim Filho Gustavo Krause Gonçalves Sobrinho
José Raimundo de Oliveira Vergolino Isnard Penha Brasil Júnior
Limério Moreira da Rocha José Luiz Mota Menezes
Luís Jorge Lira Neto Marco Antônio de Oliveira Maciel
Luiz Cláudio Aguiar Marcos Vinícius Vilaça
Luiz de Gonzaga Braga Barreto Reinaldo Carneiro Leão
Marcelo Casseb Continentino Tácito Luiz Cordeiro Galvão
Marcus Joaquim Maciel de Carvalho Taney Queiroz e Farias
Margarida de Oliveira Cantarelli Yony de Sá Barreto Sampaio
Maria de Betânia Correia de Araújo
Sumário

NOTA DOS EDITORES............................................................................ 9

DOSSIÊ JURISDIÇÕES DA AMÉRICA PORTUGUESA


Jeanne da Silva Menezes; Virgínia Maria Almôedo de Assis....................13

A FAZENDA REAL DE PERNAMBUCO: FAMÍLIA, COMÉRCIO E PODER


ENTRE OS SÉCULOS XVII E XVIII
Suely Creusa Cordeiro de Almeida.......................................................19

NASCIMENTO, CASAMENTO, VIUVEZ E MORTE: A CONDIÇÃO FEMININA


E OS “ESTADOS” NA ORDEM SOCIAL DO ANTIGO REGIME IBÉRICO, UMA
LEITURA DE ANTÓNIO MANUEL HESPANHA
Suzana do Nascimento Veiga.....................................................................43

CONFLITOS DE JURISDIÇÃO NA “NOVA ALFÂNDEGA DE PERNAMBU-


CO”: GOVERNADOR vs. PROVEDOR DA FAZENDA REAL (1727-1737)
Luanna Maria Ventura dos Santos Oliveira...............................................63

JUÍZO DO FISCO REAL E INQUISIÇÃO – NORMAS E PRÁTICAS DA APREEN-


SÃO, POSSE E ADMINISTRAÇÃO DE BENS CONFISCADOS PELO SANTO
OFÍCIO
Davi Celestino da Silva..............................................................................89

CASTIGAR OU PERDOAR? A DESERÇÃO MILITAR NA LEGISLAÇÃO POR-


TUGUESA (1750-1808)
Giovane Albino Silva................................................................................115

ARTIGOS E ENSAIOS...........................................................................141

ESTUDO BIOANTROPOLÓGICO DO ESPÓLIO OSTEOLÓGICO PROVE-


NIENTE DO CONVENTO FRANCISCANO DE NOSSA SENHORA DAS NE-
VES, OLINDA-PERNAMBUCO
Danúbia Valéria Rodrigues de Lima; Flávio Augusto de Aguiar Moraes;
Onésimo Jerônimo Santos........................................................................143
EVOLUÇÃO E OBSOLESCÊNCIA: FORTIFICAÇÕES PORTUGUESAS EM
PERNAMBUCO ANTERIORES À OCUPAÇÃO HOLANDESA
Manuela Xavier Gomes de Matos; Paulo Martin Souto Maior..................159

DA HISTÓRIA REGIONAL À NACIONAL. EXEMPLO DE 1817


Vamireh Chacon......................................................................................189

O CONTEXTO HISTÓRICO DOS PAÍSES-BAIXOS NA ÉPOCA DA RESTAU-


RAÇÃO PERNAMBUCANA
Roberto Chacon de Albuquerque..............................................................203

BICENTENÁRIO DA REVOLUÇÃO DE 1817: BREVE RELATO DAS COME-


MORAÇÕES.............................................................................................209

DOCUMENTOS PARA A HISTÓRIA DO BRASIL..............................275

A MISSIVA DE JORIS ADRIAENSEN CALF RELATANDO A CAMPANHA DO


CERCO E CONQUISTA DE PORTO CALVO EM 1637
Benjamin Nicolaas Teensma....................................................................277

AS CARTAS DO CONDE MAURÍCIO DE NASSAU COMUNICANDO A VITÓ-


RIA NO CERCO E CONQUISTA DE PORTO CALVO EM 1637
Benjamin Nicolaas Teensma....................................................................287

LISTA DA ARTILHARIA E MUNIÇÃO DE GUERRA ENCONTRADAS NOS


PAIÓIS DAS FORTIFICAÇÕES DE PORTO CALVO EM 1637
Benjamin Nicolaas Teensma....................................................................303

OS FOLHETOS DE CRISTÓVÃO ARTISCHEVSKY NOTICIANDO O CERCO


E A CONQUISTA DE PORTO CALVO PELO CONDE DE NASSAU EM 1637
Benjamin Nicolaas Teensma....................................................................329

AS “NOTAS HISTÓRICAS E CURIOSAS” DE SALVADOR HENRIQUE DE


ALBUQUERQUE (2ª PARTE)
Tácito Luiz Cordeiro Galvão....................................................................339

POLÍTICA EDITORIAL E NORMAS GERAIS PARA A APRESENTAÇÃO


DE TEXTOS ...........................................................................................407
NOTA DOS EDITORES

Um dos principais compromissos do Instituto Arqueológico, His-


tórico e Geográfico Pernambucano – IAHGP, desde as suas origens, é
levar a cabo esforços para a divulgação das pesquisas sobre a história
e a cultura de Pernambuco. Esse objetivo continua guiando todas
as ações realizadas por este mais que sesquicentenário sodalício. A
Revista que o leitor tem em mãos nasceu com o Arqueológico no
século XIX. Seu primeiro número viu a luz em 1863. Desde então,
colaboradores e editores trabalharam para manter vivo o periódico
que é um marco incontornável da produção historiográfica brasileira.
Períodos de grandes dificuldades resultaram em longas pausas na
publicação da Revista, mas, ela jamais deixou de circular, sendo por
isso, um dos mais antigos periódicos de história em funcionamento
no mundo. É com muita alegria que chegamos ao ano 156 de existên-
cia do Arqueológico e que podemos anunciar a publicação de mais
um número da Revista.
O presente número da Revista do IAHGP traz o dossiê “Jurisdi-
ções da América Portuguesa”, sob coordenação das professoras Dr.a
Jeannie da Silva Menezes, do Departamento de História da Universi-
dade Federal Rural de Pernambuco, e Dr.a Virgínia Maria Almoêdo de
Assis, do Departamento de História da Universidade Federal de Per-
nambuco. Este dossiê reúne os estudos de historiadores de diversos
níveis de formação e suas reflexões sobre os poderes jurisdicionais
da América Portuguesa nos mais variados âmbitos de autoridade do
espaço-tempo colonial. As pesquisas produzidas por Davi Celesti-
no da Silva, Giovane Albino Silva, Luanna Maria Ventura dos Santos
Oliveira, Suely Creusa Cordeiro de Almeida e Suzana do Nascimen-
to Veiga foram devidamente apresentadas pelas coordenadoras do
dossiê nas páginas seguintes, o que dispensa a redundância de uma
nova apresentação.
Na sessão de artigos e ensaios, Danúbia Rodrigues de Lima, Flá-
vio Moraes e Onésimo Santos apresentam os resultados das análises
realizadas no espólio osteológico proveniente das atividades de ar-
queologia preventiva no Convento Franciscano de Nossa Senhora das
Neves, de Olinda-Pernambuco. Já Manuela Xavier Gomes de Matos
10 Bruno Romero Ferreira Miranda | Dirceu Marroquim | George F. Cabral de Souza

e Paulo Martin Souto Maior abordam a influência dos tratados de


fortificações europeus em fortificações construídas na Capitania de
Pernambuco entre fins do século XVI e início do século XVII, bem
como discorrem sobre as adaptações locais no processo de cons-
trução das mesmas. Em seguida, o texto apresentado por Vamireh
Chacon analisa a historiografia relativa à Revolução de 1817 produ-
zida a partir de 1840 e seu impacto no contexto nacional. Roberto
Chacon de Albuquerque oferece em seu texto um contexto histórico
dos Países-Baixos na época da vitoriosa campanha pela Restauração
Pernambucana. Fechando a sessão, encontramos um relato das co-
memorações do Bicentenário da Revolução ocorridas entre janeiro de
2016 e dezembro de 2018.
Contamos também com a colaboração de nosso sócio correspon-
dente nos Países Baixos, o professor emérito da Universidade de
Leiden, Benjamin Nicolaas Teensma, que traz a tradução comentada
de quatro documentos produzidos no Tempo dos Flamengos. Todos
eles documentam os confrontos, em Porto Calvo, entre as tropas da
Companhia das Índias Ocidentais e as forças ibéricas em 1637. O pri-
meiro deles é a tradução comentada da carta de Joris Adriaensen Calf
aos diretores da Câmara zelandesa da Companhia das Índias Oci-
dentais, em Midelburgo. É relato que adiciona informação a outros
dois textos igualmente traduzidos pelo professor Teensma: a carta de
Johan Maurits van Nassau-Siegen onde comunica a vitória neerlande-
sa em Porto Calvo e os panfletos de autoria de Cristóvão Artischevsky
publicados por Johan Blaeu e Jan van Hilten que davam conta do
mesmo feito de 1637. Por fim, Teensma, em minucioso trabalho, traz
uma lista com toda a artilharia e munição de guerra encontrada nas
defesas de Porto Calvo e tomada aos portugueses. São documentos
que marcam a derrocada dos portugueses na região e a ascensão
neerlandesa que os expulsaria até o outro lado do Rio São Francisco,
constituindo-se assim a fronteira Sul do Brasil neerlandês.
Encerrando o presente número, trazemos a segunda parte dos có-
dices intitulados Notas Históricas e curiosas referentes aos séculos 16º, 17º e 18º...,
com estudo introdutório e índices onomástico e de assuntos organi-
zados por Tácito Luís Cordeiro Galvão. Trata-se de um conjunto de
cópias de assentos eclesiásticos e cartoriais feito no século XIX e que
é de suma importância para a pesquisa histórica em Pernambuco, haja
Notas dos Editores 11

visto que muitos dos originais desapareceram das igrejas e cartórios


onde estavam depositados.
A publicação desse número não seria possível sem a colaboração
dos associados do IAHGP e de pesquisadores de diversas instituições
que gentilmente submeteram seus trabalhos aos pareceristas
do nosso periódico. Desde já, registramos nossos mais sinceros
agradecimentos. A circulação de um periódico não-comercial como é
o nosso depende, obviamente, de apoio material. Esta nova fase da
Revista do IAHGP jamais ocorreria não fosse o apoio incondicional
e constante da Companhia Editora de Pernambuco - Cepe. Devemos
um pleito de gratidão aos quadros dirigentes da Cepe que nunca
hesitaram em fazer valer o dispositivo constitucional estadual que de-
lega à imprensa oficial de Pernambuco o dever de produzir a Revista
do IAHGP. Agradecemos ainda aos quadros técnicos que realizam de
forma primorosa a confecção deste periódico.

Recife, outubro de 2018.

Os Editores.
DOSSIÊ JURISDIÇÕES DA AMÉRICA PORTUGUESA

Organizadoras
Jeannie da Silva Menezes1
Virgínia Maria Almôedo de Assis2

Este dossiê reúne reflexões que contemplam os poderes jurisdicio-


nais em múltiplas versões de autoridade exercidas no espaço-tempo
colonial. A experiência político-administrativa daquele tempo cravou
às jurisdições um leque de significados nas esferas da “administração”
e do “governo”. Distribuí-las entre as autoridades instituídas fazia par-
te do programa político da Coroa na América Portuguesa.
Deste modo, a governação em grande parte dos espaços trans-
formados em territórios sob a administração portuguesa, no reino e
no além-mar, entendia-se por jurisdição até meados do século XVIII.
Por uma via contenciosa, que competia aos tribunais da justiça, ou
por uma via voluntária que envolvia a “mercê e a graça” enquanto
uma atribuição do monarca, os poderes jurisdicionais recaíam no que
genericamente se entendia por “governação”, como sintetiza Pedro
Cardim, em seu texto de 2005 para o livro Modos de Governar.
Como uma experiência de tempos passados a distribuição de ju-
risdições teve entre seus desdobramentos a persistência de algumas
relações tipicamente coloniais, cujos resquícios são visíveis na socie-
dade brasileira ainda na atualidade, sobretudo a que ilustra o apelo
ao bacharelismo e a formação cartorial como formas de apropriação
do poder político e obtenção de prestígio social. O que se configura
como um tema a merecer estudos históricos mais aprofundados.
Os textos aqui reunidos lançam olhares sobre institutos e autorida-
des diversas providas de jurisdição específica e por vezes concorren-
te, ainda que seus objetivos político-administrativos fossem comuns,
como seja, assegurar a ordem, a justiça e a paz sobre os povos.

1 Professora do Departamento de História da Universidade Ferderal Rural de Pernambuco,


além de integrar o corpo docente do Programa de Pós-graduação em História da Cultura
Regional.
2 Professora nos Cursos de Graduação e Pós-Graduação em História e integra o corpo do-
cente do Mestrado Profissionalizante em Ensino de História da UFPE.
14 Jeannie da Silva Menezes | Virgínia Maria Almôedo de Assis

De início, como já observado, as relações entre governação e jus-


tiça constituíram a marca do exercício “burocrático” em muitas locali-
dades da América Portuguesa ao longo de toda a época colonial bra-
sileira. Naquele momento, o fazer justiça, por delegação régia, estava
presente nos mais variados aspectos da vida cotidiana e, ao mesmo
tempo, ocupava o papel de principal ferramenta dos modos de go-
vernar. O zelo pelo bem-estar coletivo pautava-se no bom governo
da “casa”, que se estendia da monarquia para o governo doméstico
no seio das famílias.
Aos magistrados e conselhos superiores. Por atribuição essencial-
mente régia, cabia o exercício da justiça ou a sua invocação que
era disseminada nas vilas, senhorios, paróquias, acordos, contratos,
dotes, heranças, estudos, compêndios, resoluções, ordens, alvarás e
nas outras infinitas possibilidades de manifestação do poder e da
autoridade personificadas na jurisdição.
Muitas localidades da América vivenciaram o que o historiador
Jack Greene, em seu texto de 2010 publicado no livro Na trama das
redes, chama de “crioulização da burocracia”, fenômeno segundo o
qual os nascidos na América teriam pouco a pouco absorvido os car-
gos antes previstos apenas para os nascidos na Europa. Isto implicou
em algumas culturas políticas que enraizaram práticas e costumes.
Se observarmos a circulação de cargos e ofícios na América Por-
tuguesa, Pernambuco figura como uma área central. Seu complexo
litorâneo sediou a movimentação comercial, jurídica e administrativa
além de ter reunido em seu território alguns contingentes militares. As
abordagens recentes sobre a história político-administrativa colonial
têm buscado as redes comerciais, as culturas políticas e os modos de
governar, nos quais as carreiras do oficialato e sua apropriação pelas
famílias dos ‘potentados locais’ ganham relevo. Aos poucos transpa-
recem as relações entre os cargos e a ampliação do patrimônio de
grupos de famílias, além da permanência de determinados cargos nas
mãos destes mesmos grupos.
Investigar aquelas relações nos aproxima dos percursos que eno-
breciam determinados grupos e facilitavam suas intervenções na or-
dem política e social na América Portuguesa a partir do que constata-
mos em Pernambuco. A centralidade de Pernambuco nas negociações
de poder na vastidão territorial das municipalidades é exemplar no

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Dossiê Jurisdições da América Portuguesa 15

sentido da caracterização da extensão das jurisdições sob a ótica da


abordagem do historiador português do direito António Hespanha.
Dois trabalhos foram percussores da inserção de Pernambuco
nas temáticas jurisdicionais. A obra Jurisdição e Conflitos, de Vera
Acioli (1997), e a tese de doutoramento Palavra de rei – autono-
mia e subordinação na capitania hereditária de Pernambuco, de
Virgínia Almoedo (2001), são estudos acerca das problemáticas em
torno da administração e do governo colonial que apontam muitos
dos percursos seguidos pelos especialistas da temática em estudos
recentes.
O Império marítimo português atualmente é visto pela historio-
grafia brasileira e portuguesa, como o império do pluralismo, do
localismo, do corporativismo e, acima de tudo, do improviso, princi-
palmente no que concerne às questões jurídico-administrativas. São
esses novos vieses historiográficos que abrem espaço para análises
das instituições e da atuação dos sujeitos no cotidiano da América
Portuguesa como estas aqui reunidas neste dossiê.
Os temas diversos que remetem para as jurisdições de tempos co-
loniais presentes neste dossiê foram realizados por professores dou-
tores e também por doutorandos que concluíram seus mestrados nas
pós-graduações em História da UFRPE e da UFPE e hoje se vinculam
ao doutorado da UFPE ou de outras instituições fora de Pernambuco.
Começamos com o artigo A Fazenda Real de Pernambuco: Fa-
mília, comércio e poder entre os séculos XVII e XVIII, no qual a pes-
quisadora Suely Almeida expõe a incorporação da Provedoria ao pa-
trimônio familiar de modo sucessório na capitania, dando margem a
exacerbação do poder auferido pelos detentores dos cargos nas suas
relações sociais e políticas com os demais elementos da administra-
ção e governo locais e, por vezes, com agentes do poder central.
Com a perspectiva das jurisdições e de suas repercussões para os
sujeitos, o artigo de Suzana Veiga, intitulado Nascimento, casamen-
to, viuvez e morte: A condição feminina e os “estados” na ordem
social do Antigo Regime Ibérico, uma leitura de Antônio Manuel
Hespanha, trata da ideia da hierarquia naturalmente concebida para
os sexos e sua apropriação pelo direito, originando uma relação
muito peculiar do grupo das mulheres na sociedade.
Em se tratando das instituições e seus apelos jurisdicionais, Luan-

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16 Jeannie da Silva Menezes | Virgínia Maria Almôedo de Assis

na Oliveira discute, no artigo intitulado Conflitos de jurisdição em tor-


no da “Nova Alfândega de Pernambuco”: Governador X Provedor da
Fazenda Real (1727-1737), as disputas de poder em torno da cons-
trução do novo edifício da Alfândega de Pernambuco. Ainda, sob este
aspecto fazendário e fiscal das jurisdições, Davi Silva, no artigo Juízo
do fisco real e Inquisição – normas e práticas da apreensão, posse e
administração de bens confiscados pelo Santo Ofício, analisa os con-
troles fiscais em matéria de fé como parte do Império português.
Se o atributo real da graça se manifestou, entre outros, na
distribuição de cargos e ofícios e se fez sentir nos espaços ultra-
marinos do império português, a transgressão aos desígnios do
monarca deu causa ao castigo ou a seu perdão. Nesse sentido
também trazemos um estudo das transgressões que culmina-
vam em punições conforme previam as Ordenações do Rei-
no. Nessa direção, procuramos identificar quais seriam os ele-
mentos históricos que levaram às penalidades para a deserção.
Finalizando nosso dossiê, Giovane Albino Silva, em Castigar
ou perdoar? A deserção militar na legislação portuguesa (1750-
1808) apresenta um aspecto das jurisdições que é a fuga do
seu aparato de autoridade e dedica-se ao estudo dos decretos e
alvarás existentes na Coleção da Legislação Portuguesa na sua
investigação sobre a fuga.
Somente recentemente com a mobilização de uma nova his-
tória política é que o território das instituições ganhou novas
abordagens como aquelas acima citadas. Fértil campo histo-
riográfico para o debate e a reflexão sobre as categorias de
abordagem que interagem com regionalismos e particularismos
sociais tanto no reino quanto em suas colônias.
Em resumo, algumas linhas de discussão se apresentam nes-
te dossiê em cada um daqueles artigos. Desde o tema da cultu-
ra letrada, produzida na Real Academia da História, passando
pelas relações familiares e representações dos sujeitos que as
corporificavam até os comportamentos que negavam a autori-
dade, os poderes jurisdicionais se fazem presentes nas análises.
É bastante plural o conjunto documental presente nas análises
dos diferentes estudos contidos neste dossiê. Alguns já conhe-
cidos dos catálogos do Arquivo Ultramarino, das cópias ma-

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Dossiê Jurisdições da América Portuguesa 17

nuscritas existentes nos nossos arquivos nacionais, estaduais e


locais. Ou ainda arquivos portugueses disponibilizados on-li-
ne, além das fontes impressas da legislação da época colonial,
produzidos fora das colônias. No entanto, as abordagens sobre
estes conjuntos documentais nos chamam a atenção para a po-
tencialidade da nossa geração de historiadores e historiadoras
que deixaram aqui uma amostra do que os estudos coloniais
têm a dizer sobre muitas das nossas relações do presente.

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 13-17, 2018


A FAZENDA REAL DE PERNAMBUCO:
Família, comércio e poder entre os séculos XVII e XVIII

Suely Creusa Cordeiro de Almeida1

Resumo: Um conjunto de normas para o controle das dinâmicas


portuárias no território da América portuguesa foi disposto nos regi-
mentos dados às provedorias reais. O Regimento de Provedoria da
Fazenda Real de 1548 coloca nas mãos do Provedor Mor da Fazenda
Real um poder que pode ser descrito como um dos de maior âmbito.
Na da Capitania de Pernambuco desde 1675 o cargo foi ocupado por
um membro da família Rego Barros. Para discutir essa questão apro-
ximamos o Regimento Geral de 1548 ao Regimento dado a Provedo-
ria da Fazenda de Pernambuco de 1754. Através das fontes é possível
perceber a entrada e saída no Porto do Recife, a geografia do poder
da Provedoria e do Provedor da Fazenda, além do lugar que a família
Rego Barros detinha entre a “Nobreza da Terra”, inclusive por deter
o cargo da Provedoria da Fazenda Real na forma de sucessão here-
ditária e pela cabeça do Morgado das Salinas por quase um século.

Palavras-chave: Regimento. Comércio. Família.

The royal treasury of Pernambuco:


Family, trade and power between the 17th and 18th centuries

Abstract: A set of norms for the control of the port dynamics in the
territory of Portuguese America was arranged in the regiments given
to the royal ombudsmen. The Rules of the Royal Treasury Ombuds-
man of 1548 place in the hands of the Primary Ombudsman of the
Royal Treasury a power that can be described as one of the largest. In
the Captaincy of Pernambuco, since 1675, the position was occupied
by a member of the Rego Barros family. In order to discuss this issue,
we approximate the General Regiment of 1548 to the Rules of Pro-
cedure given to the Pernambuco Provincial Ombudsman’s Office of
1754. Through the sources it is possible to perceive the entry and exit

1 Professora da Graduação e Pós-Graduação em História da Universidade Federal Rural de


Pernambuco. Pesquisa financiada pelo CNPq. E-mail: suealmeida.ufrpe@hotmail.com
20 Suely Creusa Cordeiro de Almeida

in the Recife Port, the geography of the power of the Ombudsman


of the Treasury, besides the place that the Rego Barros family held
among the “Landed nobility”, including for holding the position of the
Royal Treasury Ombudsman in the form of hereditary succession and
the head of the Morgado das Salinas for almost a century.

Keywords: Regiment. Trade. Family.

Lugar singular para acompanhar a atividade mercantil e controlar


o comércio foi a Provedoria da Fazenda Real. Cargo honroso para
quem o exerceu e vital para a saúde econômica dos cofres da Coroa.
Esteve nas mãos, por quase um século, na forma de sucessão linha-
gística, na família Rego Barros em Pernambuco (MELLO, 1896: 8-9)
Desde a instalação do Governo Geral em 1548 foi criado o oficio
de Provedor Mor da Fazenda. A responsabilidade do oficial designa-
do incidia sobre o estabelecimento de uma dinâmica de comércio,
bem como a fiscalização das receitas e despesas geradas na conquis-
ta portuguesa da América. Primitivamente foram os donatários que
se responsabilizaram pela organização da administração da Fazenda
Real. Estabeleceram-se inicialmente em cada capitania os cargos de
feitor e almoxarife, para arrecadar as rendas reais e administrar as
feitorias. Mas logo após as primeiras décadas foi um oficial designa-
do especificamente para a tarefa, e criada a Provedoria Real com o
objetivo de acentuar a atividade fiscalizadora. Em cada capitania foi
criada uma provedoria, e aos provedores cabia a responsabilidade
por todos os negócios da Fazenda Real (Regimento da Provedoria da
Fazenda Real, 1548: 354).
Em Portugal os provedores das comarcas foram magistrados, e
o cargo foi criado no antigo ordenamento jurídico. A jurisdição da
Provedoria da Fazenda Real incidia sobre os aspectos administrativos,
quando tinha direito a gerir os bens individuais ou coletivos de pes-
soas ou instituições que estivessem impossibilitadas de administrar
eficientemente seu patrimônio, a exemplo: dos órfãos, cativos, au-
sentes, das capelas, confrarias e hospitais. Os provedores poderiam
substituir tutores de órfãos negligentes e/ou mover demandas contra
incompetentes administradores por quebra de contrato. Os testamen-
teiros teriam que prestar contas aos provedores do que recebessem
e despendessem. Os provedores seriam fiscais destes testamenteiros

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 19-42, 2018


A FAZENDA REAL DE PERNAMBUCO: Família, comércio e poder entre os séculos XVII e XVIII 21

fazendo cumprir as vontades dos defuntos. Ficava assim sob sua tu-
tela, e passíveis de averiguação as notas de tabeliães e escrivães sob
pena de privação de ofício. Desta forma eles atuavam como Juízes de
Defuntos e Ausentes.
No que tange aos aspectos fiscais/financeiros, o Provedor, junto
aos oficiais que o assistiam, como o Almoxarife e o Escrivão, exami-
navam a escrituração das receitas e despesas conferindo constante-
mente as contas do almoxarifado. A Provedoria esteve intimamente
ligada a Alfândega comandando ainda um grupo de oficiais perten-
centes a essa instituição como: escrivães, meirinhos, porteiros e te-
soureiros (SILVA, 1859). Eles também acumularam o cargo de juiz dos
descaminhos e da alfândega, pois realizavam despacho e cobranças
de direitos alfandegários, bem como o julgamento de irregularidades
e descaminhos (SALGADO, 1985: 158-160).
É de 1548 o Regimento dos Provedores da Fazenda “del Rei
nosso senhor” nas terras do Brasil. Através deste ordenamento fica
esclarecida a abrangência da jurisdição do provedor, ou seja, até o
quanto ele pode dizer a justiça, bem como, o poder que passava a
gozar frente as demais autoridades da capitania (HESPANHA, 1994:
195). Em princípio ficou determinado que houvesse uma alfândega
em cada capitania além do que, as contas das mesmas deveriam ser
tomadas constantemente por esse oficial real. Ele deveria abrir o lei-
lão no mês de novembro de cada ano e estabelecer a forma para que
se fizesse a arrematação das rendas reais; quais eram os contratos
que seriam leiloados; por quanto tempo e os valores dos mesmos; os
arrematantes e fiadores e, como seria feito o pagamento do montante
que ia de 25% a 50% dos valores acordados segundo as regras esta-
belecidas. Toda a escrituração deveria ser realizada pelo almoxarife
junto ao escrivão da provedoria. As cobranças das dívidas deveriam
ser feitas no mês de janeiro de cada ano e as contas prontas até mea-
dos de fevereiro, para serem enviadas ao Provedor Mor que servia na
Bahia. Os inadimplentes deveriam ser presos e seus bens executados
para que fossem pagas as suas dívidas com a Fazenda Real.
Também sobre a provedoria incidia a responsabilidade de ser juiz
da alfândega. Era responsável por arrecadar a dízima das mercado-
rias no ato do descarregamento da nau. Esta responsabilidade em
princípio estava nas mãos do Capitão Donatário, e foi normatizada

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 19-42, 2018


22 Suely Creusa Cordeiro de Almeida

no Foral da Capitania de Duarte Coelho em 1534. Sabemos que esse


podia nomear na terra pessoa de sua confiança para o exercício do
cargo. No entanto, passou posteriormente depois da instituição do
Governo Geral para a alçada do Governador Geral na Bahia, nomear
um provedor mor que controlasse as ações e pedisse contas a todos
os provedores das capitanias fossem reais ou não. É fato que, no que
tange a Pernambuco, essa norma não foi aplicada, pois o donatário
impediu a gerência do Governo Geral sobre a Nova Lusitânia (Fo-
ral da Capitania de Duarte Coelho, 1534, itens 6 e 7). O primeiro
Provedor da Fazenda Real de Pernambuco foi Francisco de Oliveira,
nomeado em 10 de janeiro de 1537. Seguiram-se as nomeações em
número de 31, e só em 1675 a família Rego Barros arrematará a pro-
priedade do oficio, juntamente a de juiz da alfândega pelo donativo
de 12.000 cruzados. João do Rego Barros, o primeiro, jurou o cargo
na Chancelaria Mor do reino. (GODOY, 2002: 15)
Através do Regimento dos Provedores da fazenda Real de 1548,
é possível vislumbrar o poder da pessoa e da família que foi agra-
ciada com a mercê quanto ao controle das dinâmicas comerciais da
aduana de uma capitania. Desde o XVI, que as orientações reais são
no sentido de haver alfândegas em todas as capitanias, e isso já era
estabelecido no foral das mesmas arrecadando-se as “dízimas das
mercadorias que as ditas terras forem ou saírem, por me pertencerem
segundo a forma do foral dado a cada uma”, e o provedor será juiz
da alfandega “em quanto eu houver por bem” (Foral, 1534, idem).
Segundo o foral da Capitania de Pernambuco, ficou o donatário
responsável por cobrar a dízima das mercadorias circulantes e dela
retirar a redizima. Assim percebe-se que seria de muito interesse que
a fiscalização fosse intensa e feita por pessoas de sua confiança. No
que concerne à orientação da documentação, foral e carta de doa-
ção, o monarca procurava orientar no sentido de haver escrituração e
controle da entrada e saída de mercadorias feitas nas aduanas, então,
infere-se que desde muito cedo havia algum tipo de cobrança e de
escrituração dos bens que circularam no porto de Pernambuco. A
orientação dada foi da emissão de certidões aos mercadores e aos
seus vasos nas quais constasse o pagamento dos direitos reais refe-
rentes aos senhorios visitados.
Na normatização está expressa uma detalhada orientação para fis-

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A FAZENDA REAL DE PERNAMBUCO: Família, comércio e poder entre os séculos XVII e XVIII 23

calização dos navios chegados aos portos da América portuguesa. O


provedor mais almoxarife e escrivão eram requisitados para proceder
ao inventário da carga junto ao capitão do navio, tudo anotando e
taxando. Era exigido ao capitão o “livro de carregação ou folha de
avalias”, e dos viajantes que abrissem as “camas ou arcas de bitalhas”.
Tudo que fosse avaliado pelo provedor ou almoxarife como artigos
que pagassem direitos deveriam ser levados para as dependências
da alfândega. Ao navio até que se concluíssem a vistoria, deveria
ser controlada a circulação de pessoas e bens por um guarda da
aduana. Os donos das mercadorias ficavam sob fogo cruzado até
que toda a inspeção acabasse. Em tudo o provedor foi o mestre
de cerimônias podendo confiscar mercadorias àqueles que fossem
denunciados como desobedientes às orientações. Assim punir-se-ia:
a abertura de arcas sem licença, bens de valor não declarados, visi-
tas de pessoas durante o processo de descarregamento chegando-se
a confisco, claro dependendo da importância do caso. Mercadorias
consideradas de difícil transporte como: trigo, vinho, louça e alcatrão,
eram dizimadas/taxadas pelo provedor, não sendo necessário que
passassem pela alfândega, mas apenas registradas e cobradas as taxas
pelo almoxarife. Em caso de artigos de ferro, couro ou outros que
não pudessem chegar às mesas de registro, o provedor, almoxarife
e escrivão as dizimavam no local onde estivessem e assentavam os
valores no livro (Regimento, 1548: passim).
Em Pernambuco o Provedor da Fazenda também era o Juiz da
Alfândega e junto ao almoxarife foram responsáveis pelo aforamento
das mercadorias chegadas. Eles o fizeram a partir do parâmetro dos
preços da terra. Seguindo essa avaliação o mercador pagava a dízima.
Uma a uma, as mercadorias (de vara ou côvado, de quintais ou arro-
bas) deveriam ser anotadas e calculadas a dízima.
Em cada alfândega deveria haver dois selos um para selar as mer-
cadorias que pagariam direitos e outro para as isentas. Eles eram
guardados em arca da qual só o provedor e o escrivão teriam a cha-
ve. O texto do Regimento procura denotar uma fiscalização rigorosa,
pois toda a malversação no processo deveria ser denunciada, os pro-
dutos confiscados e repartidos entre a alfândega e os denunciantes.
Para realizar uma intervenção firme o provedor teve foro de juiz e
julgou as causas que montavam até dez mil réis, dando apelação para

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 19-42, 2018


24 Suely Creusa Cordeiro de Almeida

aquelas que desta quantia ultrapassassem. Foi responsável pela ven-


da das mercadorias recolhidas com a cobrança da dízima, e deveria
ter tudo anotado no livro do almoxarife (Regimento, 1548: passim).
Atracando navios no porto de Pernambuco o provedor deveria ser
avisado do momento do carregamento das mercadorias da terra. Antes
da partida, o mestre do navio apresentaria ao provedor o rol dos pro-
dutos acondicionados na nave. Após a fiscalização, e sem mais intro-
dução de objeto algum, e com a licença do provedor o navio poderia
partir, pois sem a licença o mestre corria o risco de perder o vaso.
Nesse ponto é impossível não refletir sobre o poder da Provedoria
Real e da pessoa que detinha a investidura no cargo, e finalmente
da família que a controlava. Analisando o provimento de ofícios no
Antigo Regime, Roberta Stumpf elaborou uma hierarquia que colo-
cava a Provedoria da Fazenda Real entre os “cargos importantes da
monarquia”. Ela define-o como de concessão perpétua/propriedade,
embora admita que também fosse dado temporariamente. Seu provi-
mento se dava em Lisboa, e tinha a característica de ser remunerado
e nobilitante (STUMPF, 2014: 631). Ele estaria abaixo dos cargos su-
periores que seriam os de: presidentes de tribunais, vice-reis, gover-
nadores de armas e governadores de capitanias. Ressalte-se aqui que
embora o cargo seja colocado hierarquicamente numa posição de
subalternidade a vice-reis, governadores de capitanias e até de ouvi-
dores providos em Lisboa, o raio de ação da Provedoria, poderia ser
definido como de maior abrangência em relações a estes, pois cabia
ao provedor administrar todos os recursos financeiros da Coroa em
conquista. Assim sendo e tomando o exemplo da Capitania de Per-
nambuco que teve a provedoria nas mãos de uma única família por
quase um século (COSTA, 1983), esse oficial régio ombreava-se com
autoridades vidas do reino, pois ele mesmo, foi empossado e inves-
tido e sendo indiscutível seu poder e confiança da qual gozava por
representar financeiramente a Coroa nas localidades de ultramar nas
quais atuava. Na capitania era o provedor que pagava salários ao go-
vernador e as tropas; normatizava o leilão dos contratos; recolhia os
impostos da importação de mão de obra, ou seja, taxava a carga dos
negreiros e de todas as demais mercadorias que entravam e saiam
do porto de Pernambuco. Desta forma tinha em suas mãos recursos
financeiros; a possibilidade de aplicação de leis para o ordenamento

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A FAZENDA REAL DE PERNAMBUCO: Família, comércio e poder entre os séculos XVII e XVIII 25

dos processos ligados ao comércio; o controle total sobre os barcos


ancorados no porto desde as mais elementares atividades como o
concerto das naves, até as mais complexas como o desembarque de
pessoas escravizadas. Aqui nos cabe destacar a família Rego Barros
a o processo de sucessão da mesma, por gerações, no comando da
Provedoria da Fazenda Real de Pernambuco.
Também o comércio entre as capitanias feito por mar, deveria ser
do conhecimento das provedorias segundo a ritualística já tratada
para os vasos atlânticos. Ou seja, nos portos de partida deveria ha-
ver fiscalização, e nos de chegada averiguação das origens dos bens
transportados, bem como dos impostos pagos.
A construção de navios nos senhorios brasílicos estava sob a ótica
do Governador Geral e do Provedor Mor, mas também por desdo-
bramento, dos governadores de capitanias e seus respectivos prove-
dores. Havia uma necessidade de ter o controle dos barcos e seus
proprietários, pois sem esse controle ficaria impossível ter a mínima
dimensão do comércio Atlântico fosse entre continentes ou realiza-
dos na base da cabotagem. Por fim vale ressaltar que o alealdador,
avaliador do açúcar, era eleito ou escolhido pelo provedor.
O poder era de tal sorte que podemos concluir, que mesmo não
estando de direito em posição hierárquica cimeira, o estava de fato,
por ter em suas mãos o controle das atividades mais importantes
para a monarquia em uma conquista. Após o Regimento de 1548 as
competências das provedorias foram sendo atualizadas, ampliadas e
reforçadas pelos regimentos dos governadores-gerais de 1588, 1612
e 1677, que acentuaram o caráter fiscalizador do cargo especificando
atividades a serem exercidas em conjunto com governadores e as
câmaras (MENDONÇA, 1972: 99-116).
Em 1754 foi dado a Pernambuco um novo Regimento da Provedoria
da Fazenda Real da Capitania. Nesta altura governava a Capitania Luís
José Correia de Sá. Havia uma preocupação em normatizar a dinâmica
comercial com a presença das naus de comboio e as guarda- costa. A
responsabilidade em atender as demandas dessas naus no Recife foi
do Comissário das Fragatas. O ofício foi extinto em 1753, e responsa-
bilizado das tarefas, acumulando, o Provedor de Fazenda Real e seus

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26 Suely Creusa Cordeiro de Almeida

oficiais. Para tal foi elaborado o Regimento que passamos a comentar.2


A preocupação central são as naus de comboio e as guarda-costas,
pois as de comboio se constituíam de uma marinhagem que deveria
estar a postos para realizar defesa dos produtos que circulavam pelo
Atlântico, já as naus guarda-costas faziam a cabotagem nas águas da
capitania para impedir incursões de piratas e corsários ao porto da
vila do Recife. Para as de comboio o procedimento era semelhante
aos dos navios mercantes, e estava definido desde 1548 no primeiro
Regimento. O provedor deveria ir a bordo e conferir por nome toda
a guarnição (RAU e SILVA, 1955, verbete 43).
Mas voltando ao Regimento de 1754, destacamos que o mesmo,
impunha ao Provedor da Fazenda Real os cuidados mais minuciosos
com a tripulação dos comboios e guarda-costas. Ele devia acomodar
a guarnição, encaminhar doentes para os hospitais, e nesse caso a
época cremos ser o do Paraíso na vila do Recife. Todo um pro-
cesso de fiscalização das cargas dessas naus deveria ser realizado
nos moldes do Regimento de 1548, que era fazer desembarcar todos
os mantimentos, fossem para tornar a Portugal ou a qualquer outro
porto, como o restou da viagem de vinda. Se a nau ficasse retida,
toda a carga deveria ser guardada em terra. Anotações deveriam ser
tomadas pelo escrivão e acompanhadas pelo almoxarife. Percebesse
que se acrescentou e muito as tarefas a serem desempenhadas pela
Provedoria da Fazenda Real. Algo que nos chama a atenção é o fato
de estar explícito no regimento que se “fará desembarcar todos os
materiais que forem de cabedal dos meus armazéns de Guiné e Índia
para provimento dos daquele Recife.”
O abastecimento dos navios deveria ser acompanhado pelo Prove-
dor da Fazenda Real e pelo Governador da Capitania, tudo registrado
pelos oficiais da Provedoria, mas também sabemos que a presença
do secretário do governador era de extrema importância. A tríade al-
moxarife e escrivão da Provedoria mais secretário do Governo teriam
que ter tudo sob controle em registro. A compra era feita aos mer-
cadores da mesa de despacho acertados os preços em conjunto com
as autoridades já citada, tudo devidamente assinado por Provedor e
Governador, pelo menos deveria ser!

2 Regimento de 1754. AHU/PE, Cx. 75, N.6335

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A FAZENDA REAL DE PERNAMBUCO: Família, comércio e poder entre os séculos XVII e XVIII 27

Há uma demanda imensa de ações que eram da alçada da prove-


doria, por exemplo: quando os navios precisassem de reparo, era o
Provedor quem intermediava as negociações, encaminhando-as para
a vistoria do Patrão Mor e Mestre da Ribeira até que se ajustassem os
valores para pagamento. Estavam envolvidos carpinteiros, calafates,
serralheiros, tanseyro (sic), ferreiro, funileiro, polieyro (sic), vidracei-
ro, pintor, carpinteiro de obra branca, esparteyro (sic) e fundidor de
cobre. Os juízes desses oficiais deveriam ser chamados à presença
do Provedor da Fazenda Real para ajustar o preço, e escolhendo os
Mestres de sua confiança para a execução, e por fim, interferindo o
almoxarife para ajustar e registrar as arrecadações. Ou seja, o Prove-
dor da Fazenda Real comandava todo o processo de acerto, execução
e pagamento dos oficiais mecânicos tantos os da Ribeira como os de
fora, além do piloto que manobrava os navios na entrada da barra.
Os soldos dos soldados e capitães das naus eram pagos pelo Pro-
vedor antes de zarparem, como estratégia para manter a ordem e a
possibilidade de governo dessas tropas. O soldo adiantado deveria
cobrir as despesas de viagem, completando-se nos portos de chegada
o numerário que ainda fosse devido. Ele também era o responsável
por realizar os descontos necessários a esses soldos, como por exem-
plo, os gastos com enfermidades nos hospitais da terra. As naus não
deveriam zarpar com a marinhagem descontente ou doente. Falhas
nesse sentido poderiam acarretar motins e a possível perda de mer-
cadorias embarcadas. Esses cuidados deveriam ser tomados em todas
as margens atlânticas.
Cabia por fim ao Provedor da Fazenda Real ter tudo escriturado
através dos escrivães de seus oficiais, Tesoureiro e Almoxarife. Papel
para os registros havia, pelo menos no regimento há verba para com-
pra. Todas as contas deveriam ser enviadas ao Conselho da Fazenda
Real anualmente.
Após analisar os regimentos que normatizaram a atuação da Pro-
vedoria da Fazenda Real fica evidente o poder que detinha a pessoa
e família que ocupavam esse lugar. O provedor era responsável pelo
dinheiro do rei, e por sua vez, controlava todos os seus oficiais in-
clusive os graduados como o governador da capitania, pois ficava
responsável pelo pagamento de seu salário e indiretamente o pa-
gamento das tropas regulares. Também poderia controlar a câmara

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28 Suely Creusa Cordeiro de Almeida

a exemplo de Pernambuco, pois açambarcou os seis contratos de


subsídios que são: carne, açúcar, tabaco, balança, garapas e vinhos,
além de rendas de subsídios pagos a Olinda por outras câmaras da
capitania.
É indiscutível que as prerrogativas da provedoria real de uma
capitania eram muitas: fiscalizar, arrecadar, administrar receitas e
despesas, além do que era de sua alçada realizar o pagamento dos
oficiais registrando todos os trâmites burocráticos, como já foi dito.
Mas ainda entre as responsabilidades de um provedor estava a de
promover os “autos de arrematação”, atividade ligada ao ordena-
mento da arrecadação dos impostos da Coroa. Era um processo que
propiciava a “terceirização” das atividades fiscais do Estado e consis-
tia em leilões nos quais eram feitos lances pelos interessados em ar-
rematar contratos, aquele que desse o maior lance seria o contratador
(SILVA, 2016: 394).
Junto ao provedor o almoxarife destacava-se como oficial de ex-
trema importância. Ele fiscalizava e cobrava os direitos régios aos
contratadores, realizava as notificações e arrecadava no mês de janei-
ro o que era devido a Fazenda Real, prestando contas ao provedor.
Já o escrivão assistia e registrava as rendas e direitos régios, acom-
panhava as entradas e saídas de mercadorias o que viabilizava as
cobranças na alfandega. Arrolado como ofício menor o porteiro era
o guardião dos livros de registro, mas também o responsável pelos
proclamas correndo as ruas da cidade anunciando o auto de arrema-
tação, divulgando o último lance e ou notificando os novos até que
se cumprissem completamente o processo, chegando a insistir nas
ruas todos os dias (MENDONÇA, 1972: 91-98; SALGADO, 1985: 287).
Através dos “autos de arrematação” eram definidos os homens de
negócio que ficavam responsáveis pelas atividades fiscais de uma capi-
tania. Os lances eram feitos seguindo-se um processo que tomava um
cunho exaustivo, pois prosseguia até que a melhor oferta fosse sancio-
nada com o bater do martelo e o lançador tomasse os ramos verdes
nas mãos, o que simbolizava a posse do contrato (SILVA, 2016: 395).
As fontes nos revelam um processo complexo que passamos a
narrar: a cada três anos, a Fazenda real ordenava o lançamento de
editais que eram postos em lugares públicos. No dia previsto para
acontecer o leilão ele era anunciado pelo porteiro, contando com a

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A FAZENDA REAL DE PERNAMBUCO: Família, comércio e poder entre os séculos XVII e XVIII 29

presença do provedor da Fazenda Real para presidir os trabalhos. Or-


ganizada a mesa anunciava-se o início do pregão, seguia-se o auto ao
sabor dos interessados que iam dando seus lances (SILVA, 2016: 397).
Em Pernambuco os autos deveriam acontecer na Casa dos Contos,
local privilegiado, pois era o coração da Praça comercial do Recife ao
lado da alfândega (OLIVEIRA, 2016: passim). “Cada auto possuía ca-
racterísticas muito próprias, como duração, valores e quantidade de
lançadores” (SILVA, 2016: 401), assim os contratos para arrematação
dos direitos dos escravos, contaram com a presença de representan-
tes dos negociantes reinóis na capitania de Pernambuco durante a
primeira metade do XVIII depois, sendo arrematados por mercadores
residentes e, por fim, deslocando-se o processo para Lisboa depois
de 1731. Vicissitudes do processo foi a possibilidade de interrupção
por falta de lançadores ou a de durar mais de um mês adentrando
ao ano seguinte.3
Se o pregão não obtivesse lances a contento o provedor poderia
reiniciar o processo “reformar o edital”, pois segundo o regimento
dos provedores, os contratos teriam que receber lances sempre su-
periores aos do ano anterior. No entanto, a norma encontrava óbices
em anos de seca, ou quaisquer outros fenômenos ou acontecimen-
to que comprometesse o poder aquisitivo dos homens de negócio.
Aceito o último lance, o arrematador submetia-se a algumas cláusulas
como: realizar o pagamento com “dinheiro de contado”; pagamento
da décima parte nos primeiros trinta dias; o contrato deveria ser pago
em partes um terço cada ano. Para os contratos que envolviam a
produção de víveres deveria ser complicado, pois o meio circulante
era escasso. Mas para os que envolviam o pagamento de direitos de
escravos poder-se-ia recorrer além da moeda provincial, ao ouro em
pó ou em barras e as conhecidas letras.4
A finalização dos autos de arrematação se dava quando o contrato
era assinado pelo contratante, provedor e demais oficiais e testemu-
nhas presentes. Metia-se, portanto, o ramo nas mãos (DIAS, 2014: 228).
Ao papel e importância do provedor na organização, viabilização
e saúde financeira da Fazenda Real não há dúvidas. No que tange

3 AHU/PE, Cx. 42, N. 3786


4 AHU/PE, Cx. 121, N. 9242

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30 Suely Creusa Cordeiro de Almeida

a Pernambuco destacamos a importância de família Rego Barros e


a abrangência de seu poder, torna-se impossível não concluir pelo
tremendo destaque e capacidade de influenciar na sociedade per-
nambucana setecentista.
Em referência aos contratos e aos processos de arrematação, in-
ferimos que ao transferir os ramos verdes para as mãos dos arre-
matadores simbolicamente transferia-se prestígio e responsabilidade,
direitos e deveres. O contratador tomava para si a “responsabilidade
de arrecadar por sua conta o imposto ou direito, devendo contar com
as incertezas” da vida, pois por múltiplos motivos poderia não rea-
lizar o seu contrato com êxito financeiro como era esperado. Stuart
Schwartz já afirmou que arrematadores tinha uma ideia aproximada
da empreitada na qual estava se metendo quando arrematavam, se
o contrato envolvesse produção conheciam da cultura e de sua pro-
dutividade, não podendo, no entanto, prever fenômenos climáticos,
sociais e epidêmicos. Portanto, tinham condições de estabelecer uma
estimativa da produção e, por conseguinte do retorno do investimen-
to feito no ato do contrato. Se o contrato envolvesse o pagamento de
importação de cativos, também tinham que lutar contra as mudanças
da ordem e dos climas nas praças que negociavam, embora soubes-
sem o quão rentável era a atividade. As incertezas levaram aqueles
que aplicavam seus cabedais em arrematações de contrato a investir
em diferentes ramos e praças.

A Provedoria da fazenda real e a família Rego Barros

A família Rêgo Barros formou-se a partir do consócio entre Luiz do


Rego Barros e a filha de Arnau de Holanda e desta união surgem dois
troncos que são Rego Barros e Barros Barreto (PEREIRA DE COSTA,
1985, v 1: 150). Foi uma família que construiu um lugar de destaque
na capitania Duartina. Fez parte de uma herança material e imaterial
da América portuguesa, pois tornaram-se fidalgos e detentores de
hábitos e honraria as mais ambicionadas no Império Português.
Francisco do Rêgo Barros, o primeiro de sua família, foi fidalgo da
casa de sua majestade, cavaleiro da Ordem de Santiago, casado com
Dona Arcângela Josefa da Silveira. Filho de pais nobres e abastados,

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A FAZENDA REAL DE PERNAMBUCO: Família, comércio e poder entre os séculos XVII e XVIII 31

nascido em Olinda, foi juiz de órfãos, vereador e presidente da câ-


mara do senado da vila. Pai de Luís do Rêgo Barros e João do Rêgo
Barros. Ele era proprietário do engenho “Massiape” em São Lourenço,
mas o abandonou e seguiu para a Bahia na época da invasão holan-
desa. Foi também proprietário das Salinas, lugar de obtenção de sal
antes de 1630. Nesta localidade possuía boa casa de vivenda. A casa
ficava fronteiriça ao Forte do Brum, na margem oposta. Depois da
restauração voltou a Pernambuco, mas já era falecido em 1656. Está
sepultado com sua mulher na capela do capítulo do Convento de São
Francisco de Olinda (PEREIRA DE COSTA, 1985, v 2: 400-401, 554,
559, 561-562).
Luís do Rêgo Barro, seu filho, foi provedor da Fazenda Real entre
os anos de 1672 e 1675. Assumiu o cargo durante o período que seu
irmão, João do Rego Barros proprietário da mercê estava em Portugal
recebendo a honraria. Morreu no exercício de sua função. Foi fun-
dador da capela de Santo Amaro das Salinas. Capitão Mor, militou
nas fileiras do exército restaurador de Pernambuco. Em 1681 instituiu
o vínculo ou morgado de Santo Amaro das Salinas. Área extensa
inicia-se antes do atual cemitério dos ingleses, e vai até a camboa
do Tacaruna. De leste a oeste da margem oriental do Rio Beberibe,
um pouco além da ponte do Maduro. Ele constituiu nesta área casa
de vivenda e escravos. O vínculo foi extinto em 1835 em virtude da
disposição legislativa que abolia todos os bens vinculados (PEREIRA
DA COSTA, 1985, v 1: 365; v 2: 562; v 3: 365-370). Capitão-mor de São
Lourenço, Luís do Rêgo Barros foi fidalgo da Casa Real, filho de pais
nobres e abastados, seguiu a carreira das armas e figurou com muita
distinção na guerra de restauração de Pernambuco contra a domina-
ção holandesa. Recebeu patente de coronel de ordenanças das vilas
das Alagoas, Rio São Francisco, Rio São Miguel, todas conferidas pelo
governador Pedro de Almeida em 1674. Ele assumiu a provedoria
real em 1675, enquanto seu irmão João do Rêgo Barros regressava de
Lisboa, como já dissemos (MELLO, 1896: 10).
João do Rêgo Barros, o primeiro, foi natural da cidade de Olinda,
fidalgo da Casa Real e Comendador da Ordem de Cristo. Recebeu
patente de capitão em 19 de novembro de 1650 em retribuição aos
serviços prestados nas guerras do Estado do Brasil. Lutou na guerra
da “liberdade divina” e por seus feitos chegou a Capitão do Terço da

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 19-42, 2018


32 Suely Creusa Cordeiro de Almeida

Infantaria de André Vidal de Negreiros. Contribuiu nas fintas e doou


escravos para o esforço da guerra (MELLO, 1896: 8-9).5 Foi Capitão-
-Mor da Paraíba entre os anos de (1663/1670). Sua nomeação, não se
sabe ao certo, foi feita pelo Governador Geral ou pelo Governador
de Pernambuco. Passando ao reino conseguiu a propriedade do ofi-
cio de Provedor da Fazenda Real, por mercê,6 mais dois escudos de
vantagem sobre qualquer ordenado que viesse a receber, além dos
soldos dos ajudantes dos terços da Infantaria de Pernambuco, me-
diante o donativo em moeda de 4:800$000rs, mais o pagamento de
150$000rs de novo direito (MELLO, 1896: 18-22).7 Tomou posse em
1675 realizando juramento na Chancelaria Real, seguindo o costume,
e tudo foi anotado no verso da carta que registrou no livro da Chan-
celaria do Conselho Ultramarino e Casa da Mina, exerceu o cargo até
1697 quando veio a falecer (CALMON, 1995, v 1: 148).
Ele casou-se com Dona Catarina Theodora Valcacer. Foi provedor
da Santa Casa de Misericórdia por duas vezes. Também foi homem
envolvido e influente na política local chegando a escrever ao rei
minuciosa carta sobre a morte de Fernão Cabral, e as dúvidas sobre
a sucessão do governo da capitania. Certo tempo depois, foi acatada
sua ideia, de que em vacância sucederia o bispo (PEREIRA DA COS-
TA, 1985, v 4: 340).
Obteve carta de sesmaria em 1679, do governador de Pernambuco
além de uma data de terras no local do antigo Forte de São Jorge, e
depois mais uma data até a praia em 1682, no Fora de Portas, local
em que edificou a Capela Nossa Senhora de Pilar (PEREIRA DA COS-
TA, 1985, v. 1: 154-155). Neste terreno unido construiu mais algumas
casas para romeiros e patrimônio da capela. Edificou também uma
casa nobre ao lado da igreja para sua residência e após sua morte
seus descendentes lá viveram por muitos anos. Foram os primeiros
prédios construídos no local no extremo da Rua do Bom Jesus, pró-
ximo ao poste de suplício da Polé (PEREIRA DA COSTA, 1985, v. 1:
154-155). Para garantir a sustentação da Capela de Nossa Senhora do

5 APBA- Registro de Patentes de 1648 a 1684.


6 A mercê foi dada até quando fosse da vontade e conveniência real, sem obrigação de
satisfação.
7 Novo Direito: pagamento que se fazia quando do recebimento de um cargo.

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 19-42, 2018


A FAZENDA REAL DE PERNAMBUCO: Família, comércio e poder entre os séculos XVII e XVIII 33

Pilar, moradores e mareantes que vinham ao Porto de Pernambuco


faziam boas ofertas que foram empregadas em adorno e asseio da
igreja. Também pagavam os navios e embarcações que entravam pela
barra uma certa devota pensão. Observe-se que todas as contribui-
ções pagas foram impostas pelo grande poder que possuía como
Provedor da Fazenda Real, que era responsável pelas atividades de
embarque e desembarque de cargas no porto do Recife. A fundação
da capela deu-se em 1680, mas só em 1683 passou a funcionar. Foi
nesta capela que se alojaram os Terésios, carmelitas descalços, no
que ficou chamado Hospício do Pilar até terem outro destino. O en-
genho Massiape, em São Lourenço da Mata, foi vinculado por João
do Rego Barros com mais outros bens, ou seja, a capela e terras, para
a instituição de uma missa cotidiana por sua alma. Esses bens servi-
ram para satisfação desses encargos pios instituídos em 1697 feitos
em disposição testamentária situação que perdurou até 1831. O pro-
vedor da Fazenda foi sepultado na capela do Pilar em 1697 (PEREIRA
DA COSTA, 1985, v 4: 173-176).
Segundo Antônio Joaquim de Mello, quando João do Rego Barros
faleceu foi tirada uma residência de seu mandato e anotado no verso
de seu diploma de propriedade do ofício de Provedor da Fazenda
Real, ter “governado e servido com bom procedimento”, consideran-
do-se assim que sua residência foi limpa (MELLO, 1896: 9). Salien-
temos, que está foi a primeira das quatro investigações sofridas pela
Provedoria da Fazenda durante o encartamento da família, sucedidos
que comentaremos abaixo. No entanto, vale ressaltar que esse pe-
ríodo foi extremamente favorável à formação do patrimônio familiar
com a agregação de sesmarias e múltiplas contribuições ofertadas
pelos barcos aportados em Pernambuco para a execução da obra da
capela e demais dependências. Há de se considerar, que pelo poder
em que foi investido, o Provedor da Fazenda Real seria atendido em
seus interesses independente da aceitação ou não daqueles envolvi-
dos no transporte de mercadorias e que cruzassem o seu caminho na
aduana do Recife.
Francisco do Rêgo Barros o segundo, nascido no Recife, foi Pro-
vedor da Fazenda Real, casou-se com Dona Monica Josefa de Barros
e teve João do Rêgo Barros natural do Recife. Fidalgo da casa real e
comendador da Ordem de Cristo. Permaneceu no cargo durante os

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 19-42, 2018


34 Suely Creusa Cordeiro de Almeida

anos de 1699 a 1703 (MELLO, 1896: 9).


João do Rego Barros o segundo, foi fidalgo da Casa Real e co-
mendador da Ordem de Cristo. Natural do Recife foi Provedor da
Fazenda Real, servindo de março de 1704 até novembro de 1738.
Casou-se com Dona Luzia Pessoa de Mello e teve Francisco do Rêgo
Barros (MELLO, 1896: 9). Foi em sua administração que a câmara
de Olinda perdeu o direito de cobrar os seis contratos de subsídios
que são: carne, açúcar, tabaco, balança, garapas e vinhos, além de
rendas de subsídios pagos a Olinda por outras câmaras da capitania.
A provedoria passou a pagar a câmara 600$000 por ano do contrato
dos rendimentos do vinho. Esses contratos passaram a ser adminis-
trados por particulares, seguindo-se os leilões segundo a normativa
do Regimento dos Provedores de 1548. Essa nova ordem fortaleceu
exponencialmente o poder da provedoria. Cremos que nesse mo-
mento o provedor e sua família tornaram-se as pessoas mais impor-
tantes da Capitania de Pernambuco, pois administravam o dinheiro
do rei, tendo sob sua tutela os demais graduados funcionários régios
como inclusive o governador, ao qual pagava os salários acudindo-os
também com o pagamento das tropas. Os anos de sua administração
foram devassados pelo ouvidor geral da capitania de Pernambuco,
José de Lima Castro, o qual não encontrou indícios de irregularidades
(LOPES, 2008: 257).
Francisco do Rego Barros, o terceiro, foi fidalgo da casa real e
nasceu na Paraíba. Entrou a servir como Provedor da Fazenda Real
de novembro de 1738 e o foi até junho de 1750. Casou-se com Maria
Manuela de Mello e teve João do Rego Barros, (MELLO, 1896: 9). Foi
o último Francisco a exercer o cargo. Francisco teve sua gestão de-
vassada evidenciando-se grande escândalo de desvio de patrimônio
real. Questão a qual passaremos a comentar.
Quando o último Francisco do Rego Barros já estava em fase avan-
çada de sua atuação na Provedoria da Fazenda de Pernambuco, em
1750, sua gestão sofreu uma devassa movida pelo juiz de fora de
Olinda Antonio Teixeira da Mata. A ordem partiu de Lisboa e era
para que se devassasse a Fazenda Real de Pernambuco. A diligência
foi feita através da coleta de depoimentos dos homens de negócio
da Praça do Recife, da Casa dos Contos e Alfândega que parecessem
mais dignos. Ressalte-se que os comerciantes de grosso trato, fossem

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 19-42, 2018


A FAZENDA REAL DE PERNAMBUCO: Família, comércio e poder entre os séculos XVII e XVIII 35

de produtos ou de gente depuseram em duas etapas. A primeira


perante o juiz de fora Antônio Teixeira da Mata e na segunda ao
desembargador Manuel da Fonseca Brandão da Relação da Bahia.
Todo o relatório da investigação foi encaminhado para apreciação no
Conselho Ultramarino.
Implantada a diligencia vai ser concluído que os prejuízos da Fa-
zenda Real se deram pelo fato das ordens reais não estarem sendo
cumpridas. O Secretário do Estado Marco Antonio já havia informado
ao então Capitão General D. Marcos de Noronha, que deveriam ser
recolhidos aos cofres da Fazenda Real os “quarteis vencidos dos con-
tratos” e mais todo o restante de numerário que estivesse em mãos
do almoxarife em exercício. No entanto, o almoxarife Antonio de Tor-
res Bandeira, “ausentou-se ocultamente para a Corte”, tentando apre-
sentar contas em Lisboa. Foi neste meio tempo que as testemunhas
arroladas pelo juiz de fora sentiram-se mais livres para revelar fatos,
pois “não se atreviam a jurar o que sabem” fosse por temor, respeito
e suborno, silenciando! Foram revelados detalhes das relações entre
Francisco do Rego Barros, o proprietário da Provedoria da Fazenda
Real e Antonio de Torres Bandeira, seu almoxarife. Contaram que
o provedor recebera do almoxarife “quantias tão consideráveis que
completariam a de cinquenta mil cruzados”.8
Retornado de Lisboa o almoxarife, trouxe provisão real de que
as suas contas foram dadas na corte a um ministro especial e, ain-
da mais, para poder voltar a capitania e nela também apresentar os
mesmos balanços contábeis. Foi nesse momento que, segundo o juiz
de fora, o almoxarife confessou serem verdadeiras as denúncias de
empréstimos em dinheiro, pertencentes a Fazenda, obtidos por Fran-
cisco do Rego Barros e que, na altura, lhe passou “vários créditos”
os quais ficaram em poder de sua mulher, a do almoxarife. Contou
Antonio de Torres Bandeira, que durante sua ida a corte, o irmão do
provedor, Pedro Velho Barreto associado a um irmão seu, forçaram a
uma escrava de sua mulher para que furtasse a chave da papeleira,
ou cômoda, na qual estavam depositados os referidos “créditos”, os
quais foram subtraídos durante a noite para que não houvesse provas
da dívida. Asseverava o almoxarife que era uma dívida significativa,

8 AHU/PE, Cx. 72, Doc. 6024.

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 19-42, 2018


36 Suely Creusa Cordeiro de Almeida

pois “não havia dinheiro que bastasse ao dito Francisco do Rego


Barros para as suas despesas”.9 Muitas pessoas na vila do Recife eram
sabedoras dos empréstimos, muitos de destacada situação que foram:
Coronel João Lobo de Lacerda, Capitão de Infantaria Manoel Rodri-
gues Campelo, João de Oliveira Gouvim, Henrique Martins, Antonio
da Silva Santiago, Sebastião Antunes de Araújo, Guilherme de Oli-
veira, Felix Garcia Vieira, Antonio Baptista Coelho, Manoel Ferreira
Curado, entre outros.10 No entanto, rogou o almoxarife segredo, pois
temia por sua vida.
Naquele momento o juiz de fora Antonio Teixeira da Mata não
mandou fazer um termo de confissão juramentada, procrastinado a
atitude, portanto deu azo para que todas a denúncia feita pelo almo-
xarife fossem parar aos ouvidos da família Rego Barros, que tomou
providências para afastar o juiz de fora do caso, deslocando-o para
a Paraíba. O juiz fez ciente ao Conselho Ultramarino as suas descon-
fianças, levando o Procurador da Fazenda a remeter toda a acusação
em segredo para o Desembargador da Relação da Bahia Manuel da
Fonseca Brandão pedindo novas averiguações.11
A investigação teve sequência agora feita por Manuel da Fonseca
Brandão e entre outras coisas foi apurando que um filho do Provedor
da Fazenda fôra a casa de João de Oliveira Gouvin em “uma noite
a pedir-lhe abonasse o seu pai na devassa dizendo-lhe que ele não
tinha tido culpa nos descaminhos da Fazenda Real e se o tramassem,
levaria a ponta de espada quem falasse na honra de seu pai”. Perce-
be-se que o caso tomou proporções chegando às ameaças públicas
de morte.
A devassa revelou que “a Fazenda Real padeceu de descaminhos
por muitos e diferentes modos e que, os teve grandes e irreparáveis
no tempo em que foi almoxarife Antonio de Torres Bandeira”, pois
nunca foram ocultos os desperdícios e a profusão de extraordinárias
despesas que eram feitas em banquetes, saraus, danças ao estilo da
terra e outros divertimentos nas casas e engenhos do provedor e seus

9 Idem.
10 Sobre os homens de negócio em Pernambuco citados nesta devassa, ver: SOUZA, 2012.
Passim.
11 AHU/PE, Cx. 72, Doc. 6024.

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A FAZENDA REAL DE PERNAMBUCO: Família, comércio e poder entre os séculos XVII e XVIII 37

irmãos, tudo assistido pelo almoxarife Antonio de Torres Bandeira


estando os dois, provedor e almoxarife, com contas a ajustar, pois era
público que ambos não possuíam recursos para tantas festas.12
Também foram denunciados, almoxarife e provedor, por Henrique
Martins de que levaram de sua loja sedas, veludos, galões de ouro
e prata no valo de 23 mil cruzados e que, o mesmo almoxarife, lhes
dissera ser a maior parte para a casa do provedor da fazenda, bens
que depois foram reconhecidos em vestidos da família de Francisco
do Rego Barros pelas testemunhas.
Na finalização do relatório em 1752, o Desembargador Manoel da
Fonseca Brandão conclui que eram verdadeiras as suspeitas do juiz
de fora, pois não era possível a um almoxarife em Pernambuco, em
cinco anos que serviu ao ofício, alcançar avultado cabedal atingindo
a quantia de 137:900$00. O desembargador denuncia os descami-
nhos como uma realidade de muitos anos, pois os recenseamentos
das contas não eram feitos desde a época do almoxarife Mariano de
Almeida. Já havia tentado tomar as contas da Fazenda Real o gover-
nador D. Marcos de Noronha. Em sua investigação procurou alcançar
os três anteriores almoxarifes e dois tesoureiros da dízima da Alfan-
dega chegando a soma de 229:7007$00, para a qual não se teria um
destino.13
Mas embora toda esta investigação tenha se dado na década de
50 do setecentos, ela não foi impedimento para que a família conti-
nuasse proprietária do ofício, o que demostra a força da nobreza da
terra em articular poderes superiores, que abafassem os descaminhos
por ela praticados.
João do Rêgo Barros, o terceiro e último, já exercia o cargo em
1757 e permaneceu até 1769 quando a provedoria foi extinta. Apesar
disso continuou servindo na Junta de Administração e Arrecadação
da Fazenda Real, como provedor e contador com seu antigo orde-
nado de 500$000 anuais (PEREIRA DA COSTA, 1985, v 1: 366). A
Junta constituía-se em Tribunal da Fazenda, havendo duas sessões ou
conferencias por semana, além das extraordinárias. Os membros da
Junta eram chamados de deputados, funcionando até 1833 quando

12 Idem.
13 Idem.

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 19-42, 2018


38 Suely Creusa Cordeiro de Almeida

se transformou em Tesouraria da Fazenda. Funcionava no edifício do


Erário Régio, junto ao palácio de Friburgo ou das Torres, construído
por Nassau, que quando estava em ruínas cedeu seu material para a
construção do prédio do referido Erário Régio (PEREIRA DA COSTA,
1985, v 6: 305). O Capitão-mor foi proprietário do engenho Apipu-
cos, que ficava à margem esquerda do Rio Capibaribe junto à casa
grande e a capela. O açúcar produzido descia em batéis pelo rio até
o mercado da Praça do Recife (PEREIRA DA COSTA, 1985, v 2: 53-56).
Participou como acionista da Companhia das Minas de Ouro de
São José dos Cariris, na Capitania do Ceará, nesta fase, subalterna a
capitania de Pernambuco. Para incorporação desta companhia con-
correram o governador Luís Diogo Lôbo da Silva, o ouvidor da co-
marca Dr. João Bernardo Gonzaga, o juiz de fora Dr. João Rodrigues
Colaço, o procurador da provedoria Dr. Caetano Ribeiro Soares e
o ouvidor da Paraíba Dr. Domingos Monteiro da Rocha. O que de-
monstra esforço e interesse das autoridades mais graduadas. Após a
morte de João do Rego Barros, mais uma vez a família sofreu os reve-
ses de uma devassa nas contas da Provedoria da Fazenda e desta vez,
na quarta, tiveram seus bens inventariados para confisco. “Um dia a
casa cai”, no que toca aos Rego Barros depois de vinte quatro anos as
denúncias que foram comprovadas, mas haviam sido abafadas, vêm
a luz e o Estado tratou de cobrar a conta. Muita gente morreu sem
ver a derrocada da família, que certamente havia amealhado muitos
inimigos, mas a geração do final do setecentos viu ameaças vigorosas
sobre as suas fazendas.
A devassa de 1774, ano da morte do último João do Rego Bar-
ros, foi intensa e aprofundou-se sobremaneira ao patrimônio fami-
liar. Todos os membros da família tiveram suas posses inventariadas,
constituindo-se um rol de tudo o que possuíam de bens móveis e
imóveis. Chegou-se aos detalhes do registro de quadros, cadeiras,
joias, santos, baús, escravos, etc.
Em 21 de outubro de 1777, chegou em Pernambuco uma ordem
expedida de Lisboa oriunda do Tribunal de Erário Régio, dirigida a
Junta da Fazenda Real, para que se procedesse ao sequestro de todos
os bens de Pedro Velho Barreto, filho de João do Rego Barros e seus
herdeiros, por não ter realizado, o Provedor, o recenseamento das

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A FAZENDA REAL DE PERNAMBUCO: Família, comércio e poder entre os séculos XVII e XVIII 39

contas da Fazenda Real junto ao almoxarife Antonio Baptista.14


O Capitão Mor Pedro Velho Barreto foi aquele que citado na do-
cumentação parece-nos que respondeu as demandas da investida da
Coroa sobre os bens da família. Ele assevera que as dívidas de seu pai
foram pagas pelo fiador do almoxarife, restando apenas dois contos
de réis e no mais que restasse era por conta dos credores. A família
fez uma petição para ficarem isentos das cobranças provocadas pelo
inventário de João do Rego Barros e só se fazendo herdeiros em caso
de benefícios, pois em caso contrário, como criam que a herança foi
muito agravada, eximiam-se de participar da partilha do que ficou de
seu pai, deixando o que restou para saldar as dívidas.
A petição pedia a preservação do patrimônio da viúva, filhos e fi-
lhas. Pedro Velho Barreto entendia que seu patrimônio não podia ser
arrolado como herança, pois havia arrematado o engenho Apipucos
que estava penhorado a Santa Casa de Misericórdia em hasta pública
por quarenta mil cruzados. Este estratagema buscava colocar parte do
patrimônio fora das garras da Fazenda Real que resolvera cobrar o
que lhe pertencia e foi desviado para a formação de um patrimônio
individual e familiar.
O inventário foi traumático, pois foram juntados devedores e cre-
dores e sendo feitas as contas para saldar as dívidas e satisfazer aos
herdeiros. No entanto, desde de 1774 elaborou-se uma autuação do
Régio Tribunal da Junta da Fazenda Real para promover sequestro e
avaliação dos bens da família e que retroagia duas gestões da pro-
vedoria, as anteriores que foram: as de João do Rego Barros (1704-
1738), Francisco do Rego Barros (1738-1750) e, por fim, de João
do Rego Barros, que dividia sua gestão como provedor entre (1757-
1769) e quando foi criada a Junta da Fazenda Real, continuando na
mesma Junta até seu falecimento em 1774. Todo o patrimônio foi
inventariado, bens móveis e imóveis, principiando-se pelo engenho
Apipucos de invocação Nossa Senhora da Madre de Deus, ou das
Dores no termo de Olinda; Engenho da Guerra, por invocação Santa
Luzia na freguesia Cabo; Engenho Massiape, por invocação Nossa Se-
nhora da Conceição na freguesia de São Lourenço; Engenho dos Pin-
tos, por invocação Nossa Senhora do Loreto em Jaboatão. Também

14 AHU/PE-Cx. 117, Doc. 8973.

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 19-42, 2018


40 Suely Creusa Cordeiro de Almeida

foram inventariadas casa e capela do Pilar e os sítios de Água Fria e


Santo Amaro. A documentação depositada nos arquivos do Conselho
Ultramarino não nos traz a finalização do processo com o leilão dos
bens, e os valores arrecadados, mas deixa claro que foi feito um tra-
balho exaustivo de catalogação de tudo que havia nas propriedades
listadas e que o intuito era a recuperação do que havia sido desviado
dos cofres reais. Além do aparato de significativas proporções de juí-
zes, procuradores, escrivães e testemunhas envolvidas, a derrocada e
humilhação da família Rego Barros, outrora poderosa, foi pública e
notória. Nada é para sempre! Todo o processo foi acompanhado pelo
governador da capitania José Cesar de Menezes.

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AHU/PE, Cx. 75, N.6335
AHU/PE, Cx. 42, N. 3786
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Relação da Bahia.

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 19-42, 2018


NASCIMENTO, CASAMENTO, VIUVEZ E MORTE:
A condição feminina e os “Estados” na ordem social do antigo
regime Ibérico, uma leitura de Antônio Manuel Hespanha

Suzana do Nascimento Veiga1

Resumo: O presente trabalho se propõe a discutir os principais es-


tados da vida feminina no contexto da ordem social do Antigo Regi-
me à luz das concepções do historiador Antônio Manuel Hespanha.
Tendo em vista que a ideia de ordem nessas sociedades advinha da
ideia de uma hierarquia naturalmente estabelecida entre os sexos
e essa ideia era apropriada pelo direito, fosse o civil ou o consue-
tudinário, procuramos entender as mulheres dentro dos meandros
dos acontecimentos que lhes modificavam os “estados” e, portanto, a
forma como as mesmas viviam e sobreviviam dentro dessa já referida
ordem.

Palavras-chave: Mulheres. Direito. Antigo Regime. Estados.

Birth, marriage, widowhood and death: The feminine


condition and the “states” in the social order of the Old Iberian
Regime, a reading of Antônio Manuel Hespanha

Abstract: This paper intends to discuss the women roles in the so-
cial order of the Ancien régime through the conceptions of historian
Antônio Manuel Hespanha. The idea of order in these societies was
based on the assumption of a natural established hierarchy between
the sexes, and this idea was appropriate by law, whether civil or tra-
ditional. We aim to understand women in the middle of the events
that changed their lives and also their roles within that social order.

Palavras-chave: Women. Law. Ancien régime. State.

Introdução

1 Doutoranda do Programa de Pós-Graduação em História da Universidade Federal de


Pernambuco.
44 Suzana do Nascimento Veiga

Como historiadores, ao nos propormos trabalhar as sociedades do


Antigo Regime ibérico, já se faz necessário nos munirmos de ferra-
mentas teórico-metodológicas que nos possibilitem entender aquela
sociedade da forma que ela compreendia seu próprio funcionamen-
to, ou seja, de entendermos as lógicas de suas engrenagens. E muito
desse nexo era advindo das continuidades históricas do pensamento
e das estruturas medievais.
A obra que é a espinha dorsal deste trabalho, Imbecillitas, nos traz
algumas dessas ferramentas, já que a proposta de A. M. Hespanha
(HESPANHA, 2010) é nos mostrar que naquele período havia uma ló-
gica própria de funcionamento social que é pouco ou nada parecida
com a nossa, até mesmo quando a palavra de referência é idêntica.
Ao trazer esta questão da palavra, Hespanha nos remete à discus-
são trazida por Koselleck de uma história dos conceitos, ao entender
que as mesmas carregam as marcas de seu tempo e, portanto, são
assim como os sujeitos, espaços de ação. Palavras, termos, ganham
diferentes significados dependendo do seu uso em determinado es-
paço-tempo, como afirma Cardim:

En realidad, solo recientemente se ha comprendido


que palabras como “política”, “administración” o “go-
bierno”, además de ser, desde um ponto de vista se-
mântico, um tanto ambivalentes, aluden a esferas de
actuación muy diferentes de a lãs que hoy se refieren
esos mismos términos. “estado”, “soberania”, “ley”,
“derecho”, “libertad”, “jurisdiccion”, “administración”
“gobierno”, “política”, “monarquia”, “república”, “ciu-
dadano”, etc. son palabras que actualmente se utili-
zan com mayor rigor, debido, em gran parte, a que
nos hemos beneficiado de um corpus de reflexión
sólidamente fundamentada sobre El carácter histórico
de su significado (CARDIM, 2008: 349-388).

Ainda há de se acrescentar que, quando dentro dessas sociedades


se pretende trabalhar com os “marginais da história”; as mulheres,
os loucos, os pobres, as viúvas e tantos outros o trabalho é ainda

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NASCIMENTO, CASAMENTO, VIUVEZ E MORTE:
A condição feminina e os “Estados” na ordem social do antigo regime Ibérico, uma leitura de
Antônio Manuel Hespanha
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mais específico. É ainda mais necessário que se entenda o lugar que


estes sujeitos deveriam ocupar, os papéis imaginados, entendidos e
idealizados para estes e por fim, como acabavam ocupando nessas
sociedades estes mesmos excluídos espaços dissonantes, lugares de
poder e de prestígio dependendo de seu “estado”.
Antes mesmo de iniciar uma análise sobre a condição feminina e
suas posições no Antigo Regime somos instigados a refletir teorica-
mente sobre nossos objetos. Hespanha em seu texto provoca ques-
tionamentos e reflexões aos historiadores, em sua brincadeira com
os termos: “conceito”, “representação”, “categoria” levantando uma
importante discussão sobre a necessidade de que muitas vezes pre-
cisamos deixar de lado os métodos e teorias da mais em voga e nos
munirmos de um aparato teórico-metodológico que seja coerente
com nosso trabalho e não tentarmos adequar nosso objeto de es-
tudo a teoria mais “inovadora” ou a metodologia mais utilizada no
momento.
Sua opção pela categoria em sua análise é a prova desse embate.
Para o que Hespanha pretende fazer, a ideia de representação “de-
notava alguma passividade” enquanto que o conceito acabava por:

(...)insinuar um esforço mental consciente e reflectido,


típico dos pensadores e dos filósofos, gente de que
não me vou ocupar muito, enquanto tais, ou seja, en-
quanto produtores conscientes e individualizados de
ideias. Temo que, se optasse por falar de ― conceitos
se confundisse o meu trabalho com uma empresa de
― história das ideias, concebida como história de ilus-
tres pensadores e dos seus intencionais pensamentos.
E não é disso que vou tratar (HESPANHA, 2010: 5).

Então ele opta pela categoria, pois segundo o mesmo, seria a mais
ampla e, portanto, a que conteria mais espaço para ação de sujeitos
e discursos, mesmo que ele não descarte o uso secundário da repre-
sentação, segundo o próprio, até mesmo “para evitar a monotonia do
discurso” (HESPANHA, 2010: 4).
A categoria de Hespanha, portanto, possibilita que se historie com
uma ferramenta que agrega o plano da ação dos sujeitos históricos,

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46 Suzana do Nascimento Veiga

ao mesmo tempo em que engloba a importância dos discursos na


“ordem” dessas sociedades. E é nesta outra frente que ele decide
“combater o bom combate”: a da defesa do discurso enquanto força
criadora e definidora dos lugares sociais, como também a ação que
cria a ordem.
Essa opção teórico-metodológica, agrega uma crítica a história so-
cial, cujos adeptos optam apenas por entender que o lugar desta está
nos “actos humanos e não de palavras”, (o que ele condena, pois
acredita que a palavra também é parte do social), bem como nos pos-
sibilita enxergar a utilização da palavra enquanto criadora de práticas
sociais, de lugares e marcas de distinção e de poder.
A palavra é revestida de grande força simbólica na sociedade ju-
daico-cristã. Tanto na cosmogonia judaica, quanto na cristã a palavra
(verbo) de Deus cria, dá vida, institui ordem em meio ao caos. O
capítulo primeiro do livro de Gêneses, comum aos livros sagrados ju-
deu e cristão, é o capítulo que melhor exemplifica a ideia de uma or-
dem natural instituída desde o momento da criação. E é nessa “ordem
natural” que teólogos e juristas vão se basear para justificar a ordem
social do Antigo Regime. Instituída, portanto, de uma base simbólica
aparentemente inquestionável as sociedades Ibéricas Modernas do
Antigo Regime definem os lugares dos sujeitos.
Não deixemos de perceber a clara influência da visão bourdieusia-
na da qual Hespanha se apropria para o trabalho com os sujeitos na
ordem social do Antigo Regime e que casa harmonicamente com as
influências foucaultianas em sua obra (apesar das obras de Bourdieu
e Foucault não conversarem em muitos aspectos nestes termos e para
a opção do fazer historiográfico de Hespanha, elas casam bem com
a proposta). Hespanha coloca em evidência a questão do discurso e
da força das palavras nessas sociedades salientando a importância de
que a historiografia se dedique a entender como a palavra era deter-
minante de formas de poder, ele diz:

Pierre Bourdieu generalizou esta perspectiva a todos


os mecanismos de distinção social, construindo uma
teoria geral sobre o modo de organizar estratégias de
luta por símbolos, por marcas de distinção. E também
explicou que, já quando se fala, se estão a fazer coisas

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NASCIMENTO, CASAMENTO, VIUVEZ E MORTE:
A condição feminina e os “Estados” na ordem social do antigo regime Ibérico, uma leitura de
Antônio Manuel Hespanha
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muito mais complicadas do que designar objectos exis-


tentes aí, em estado bruto, fora do discurso. Na verda-
de, não apenas se estão a construir, de novo, objectos;
como se está a construir poder, por vezes um poder
imenso, com essas coisinhas aparentemente voláteis e
frágeis que são as palavras (HESPANHA, 2010: 8).

Nesta opção teórica está o maior trunfo da obra Imbecillitas e da


análise de Hespanha. Antes mesmo de historiadores de diversas áreas
da história social optarem pelo trabalho com categorias e especial-
mente com classificações, Hespanha evidencia como essa tendência
já estava ganhando força entre os historiadores portugueses e a apli-
ca com maestria. A classificação, dentro das sociedades ibéricas do
Antigo Regime eram ferramentas de poder, de manutenção da ordem
e de mobilidade social, ou seja, a palavra importava a palavra atuava.
Ele diz:

O próprio facto de estas categorias serem objecto de


um confronto social – i.e., de os seus contornos e
conteúdos serem objecto de despique – fá-las, evi-
dentemente, mover, mas apenas nos termos de uma
gramática que é a delas. Ou seja, é o próprio sistema
das categorias que selecciona as regras da luta. Nem
todos os argumentos serviam, nem todas as autori-
dades eram sempre invocáveis, nem todos os limites
eram sempre ultrapassáveis (HESPANHA, 2010: 8).

Ao mesmo tempo em que nos alerta para a importância das pa-


lavras e do discurso dentro da lógica de funcionamento dessas so-
ciedades, Hespanha deixa espaço para continuarmos analisando os
sujeitos e suas ações. Sua ampliação de perspectiva quanto às formas
de se construir práticas sociais e de poder, não é excludente, pelo
contrário, é agregadora e por isso mesmo Hespanha escolhe a cate-
goria como instrumento de análise, já que esta permite que ele ana-
lise as ações e as palavras.
O diálogo com Bourdieu nos aponta para outro detalhe: a impor-
tância da conversa com as demais ciências sociais, especialmente a

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48 Suzana do Nascimento Veiga

sociologia neste caso, para enriquecimento e alargamento de nossas


possibilidades de análise. Na forma como A. M. Hespanha observa
seus objetos nos parece clara a influência do entendimento bourdieu-
siano de poder, especialmente na teoria dos campos desenvolvida
pelo sociólogo.2 Na citação acima, podemos identificar que as cate-
gorias as quais o autor se refere como objetos de confronto social
cujos contornos e conteúdos são objetos, é a própria definição de
campo do sociólogo francês.
Por fim é do profícuo diálogo com os trabalhos de Bourdieu e
Hespanha que apresentamos nosso objeto de forma mais inteligível,
já que apenas nos é possível entender a lógica pela qual viviam nos-
sas mulheres, com as ferramentas que nos permite problematiza-las
e nos aproximar das formas pelas quais as mesmas viviam. Portanto,
daqui em diante apresentaremos as condições, ou estados da mulher
no Antigo Regime português, do seu nascimento, casamento, viuvez
e morte.

Ordem e Estado: A condição feminina nas sociedades ibéricas


do Antigo Regime

A base para a compreensão das sociedades ibéricas do Antigo


Regime reside nos conceitos de “ordem” e “estado”. Ao disso tratar,
Hespanha consegue articular claramente estes conceitos, primeiro
buscando a origem de seu significado para aquelas sociedades e
depois explicando as diferenças e complementaridades destes con-
ceitos para o funcionamento das mesmas.
A ideia de ordem parte do princípio criacionista da origem do
mundo e da própria ideia do Deus cristão. Foi esse Deus quem pri-
meiro colocou ordem nas coisas, para que o mundo trabalhasse har-

2 O conceito de campos, para o sociólogo, é na verdade discutido em termos de um espaço


social de poder com regras próprias de funcionamento, onde os agentes circulam. Esse es-
paço é onde ocorrem as relações de poder e onde elas são significadas e reproduzidas pelos
agentes, ou sujeitos. Sendo esses sujeitos, que reproduzem e/ou exercem estas relações de
poder de forma consciente e outras vezes de forma inconsciente. Como ele explicita na
seguinte citação: “o poder simbólico é, com efeito, esse poder invisível o qual só pode ser
exercido com a cumplicidade daqueles que não querem saber que lhes estão sujeitos, ou
mesmo que o exercem.” (BOURDIEU, 1989: 8).

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NASCIMENTO, CASAMENTO, VIUVEZ E MORTE:
A condição feminina e os “Estados” na ordem social do antigo regime Ibérico, uma leitura de
Antônio Manuel Hespanha
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monicamente e assim funciona o pensamento medieval sobre a or-


dem social e assim o herda a Idade Moderna.
Esta ideia de ordem é, por sua vez, perpassada pela noção de que
existe “um enorme conjunto de coisas infinitamente diferentes entre si
e, em virtude dessas diferenças hierarquizadas”, ou seja, o mundo es-
tava naturalmente ordenado. Podemos aqui voltar a referência ao livro
de Gênesis, neste livro Deus cria a luz, mas a separa das trevas dando
lugar a cada uma delas, plantas diversas e animais cada um em sua
função, assim como cria homem e mulher, macho e fêmea cada um
com sua “função natural” e tendo sido a mulher criada da costela do
homem, a hierarquia estaria assim também claramente estabelecida.3
Hespanha logo de início do texto de Imbecillitas escreve sobre a
ideia de uma ordem natural, a ordem naturalmente estabelecida é o
eixo sobre o qual os papéis sociais foram definidos e redefinidos nes-
sas sociedades cuja lógica girava em torno da ideia da criação cristã
do mundo. Essas representações medievais que permaneceram até a
Idade Moderna como uma herança é estruturante dessa ordem, ou
melhor, da “boa ordem”:

Aí, Deus aparece, fundamentalmente, dando ordem


às coisas: separando as trevas da luz, distinguindo o
dia da noite e as águas das terras, criando as plantas
e os animais “segundo as suas espécies” e dando-lhes
nomes distintos, ordenando as coisas umas para as
outras (a erva para os animais, estes e os frutos para
os homens, o homem e a mulher, um para o outro e
ambos para Deus) (HESPANHA, 2006: 26-27).

A “função natural” instituída por Deus na criação é a base também


para os teólogos afirmarem a hierarquia social; os homens servem a

3 Sobre o estabelecimento da ideia de hierarquia entre homens e mulheres, a discussão se


amplia com as cartas dos Apóstolo Paulo, especialmente na escrita aos Efésios. No capí-
tulo 5 do referido livro, Paulo trata dos “deveres do casamento” e estabelece que Deus é
a cabeça do homem e por sua vez o homem é a cabeça da mulher”. A Bíblia de Jerusa-
lém. 2002. 2º Ed. São Paulo: Editora Paulus, p. 1115. Em seu Compendium sacramentorum in
duos tommos distributum universae theologiae moralis quaestiones. Antonio de San Jose reforça esta
questão reafirmando as palavras de São Paulo sobre o homem ser a cabeça da mulher. SAN
JOSÉ, António de (1797) apud HESPANHA (2006).

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50 Suzana do Nascimento Veiga

Deus, seu cabeça e por sua vez e especialmente devido ao pecado, a


mulher serve ao homem e por isso mesmo tanto as diferenças entre
os sexos quanto a hierarquia entre estes era natural.4
Para que esta ordem funcionasse de forma hierarquizada era ne-
cessário que o entendimento sobre as diferenças (sociais especial-
mente) e a naturalidade da hierarquia delas fosse respeitado. É aqui
que entra a ideia de estado, o estado era a inclinação de cada nature-
za, ou seja, o que cada um nascera e fora designado para fazer fosse
mulher, que deveria ocupar estado de casada, mãe ou até mesmo
religiosa, fosse por sua vez o homem que tinha diversas funções de
governo enquanto marido, religioso ou governante etc. a ideia era de
que se estava respeitando “uma permanente maneira de estar, uma
espécie de hábito correspondente à sua função natural”, a função
natural a qual cada indivíduo estava destinado desde o nascimento
(HESPANHA, 2006: 32). Frei Luiz de León em seu “A perfeita mulher
casada” nos dá uma clara explicação de como a ideia de “estado” era
entendida no Antigo Regime, ele diz:

Antes disso, que é declarar as leis e condições que


carrega a mulher casada em razão de seu estado, será
bom que você entenda a estreita obrigação que tem
que empregar no cumprimento delas, se empenhan-
do em todas elas com ardente desejo. [...] Ao que
teme a Deus, para que deseje e procure satisfazer seu
estado, basta-lhe saber que Deus o manda, e que o
próprio e particular que pede a cada um é que res-
ponda às obrigações de seu ofício, cumprindo com a
sorte que lhe coube. Se falhar nisso, mesmo que em
outras coisas cumpra, o ofende (LEÓN, 2008: 16)

Com suas instruções o Frei de León demonstra de forma clara


a ideia dessa sociedade de que se conformando com seu estado o
indivíduo estaria não só contribuindo para a boa ordem social, mas

4 A consequência do pecado da mulher, foi que sua “vontade” passa a ser do seu marido
e o domínio da mesma é dele. “E a mulher disse: Multiplicarei grandemente a tua dor, e
a tua conceição; com dor darás à luz filhos; e o teu desejo será para o teu marido, e ele te
dominará.” A Bíblia de Jerusalém (2002: 12).

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NASCIMENTO, CASAMENTO, VIUVEZ E MORTE:
A condição feminina e os “Estados” na ordem social do antigo regime Ibérico, uma leitura de
Antônio Manuel Hespanha
51

obedecendo ao próprio Deus que para aquela função o criara. Ele


continua:

Cristo diz no evangelho que cada um pegue sua


cruz; não diz que pegue a alheia, [grifo nosso] mas
manda que cada um carregue a sua própria. Não quer
que a religiosa esqueça do que é e carregue os cuidados
da mulher casada: nem que a mulher casada se esqueça
do ofício de sua casa e se torne freira (LEÓN, 2008: 16).

Com a frase em destaque, podemos observar como era importante


dentro das sociedades ibéricas o respeito a cada um dos estados e
a ordem que deveria ser seguida, onde cada um tinha sua função. É
evidente que a realidade social da época era muito mais complexa e
via de regra destoava desse ideal estabelecido pelos teólogos. Porém
compreender desses papéis atribuídos aos sujeitos é importante para
compreendermos o funcionamento dessas sociedades e principal-
mente como a mulher se encaixava dentro desses espaços discursivos
e também das práticas.
Assim, nos perguntamos, como Simone de Beauvoir (BEAUVOIR,
1970): “Que é uma mulher?” Para nós, muito além do questionamen-
to da autora sobre como a ideia de mulher foi construída enquanto
“outro” dentro da sociedade judaico-cristã ocidental, esta pergunta
encerra uma necessidade de um entendimento histórico da ideia do
“ser” e “estar” da mulher dentro da ordem social do Antigo Regime.
Entendemos assim que questionar o porquê de nossos sujeitos den-
tro da ordem em que viviam é também dar organização ao caos de
uma realidade social que nos é distinta.
A configuração da mulher na Idade Moderna nos reinos ibéricos,
assim como em grande parte da Europa, descendia de construções
sobre a mulher e o feminino legados pela Idade Média. A mulher
era vista como o mal, como agente de satã. Como afirma Socolow as
mulheres não eram apenas mentalmente inferiores aos homens, mas
eram consideradas também como:

(...)morally fragile and prone to error. Their fleshly na-


ture meant that women tended to have uncontrollable

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52 Suzana do Nascimento Veiga

carnal appetites and could little resist temptation. They


were particularly susceptible to evil and easily swa-
yed by the devil. Unable to govern their own passions
and behaviour, women were dangerous to themsel-
ves, their families, and society at large uncontrolled or
uncloistered. Popular culture and literature not only
accepted this vision of women; it also stressed that
women were inconsistent, gossipy, overly emotional,
irrational, changeable, weak, prone to error, deceitful,
and profligate (SOCOLOW, 2000: 6).

As características a elas atribuídas pela literatura, pelos teólogos


da patrística e pelos juristas, as enquadraram em uma representação
de futilidade, fraqueza espiritual, engano e malícia, falta de domínio
de si, entre outros. Essas representações, esses discursos tem uma
origem comum, o pensamento grego e a cosmogonia judaico-cristã.
Como afirma o próprio Hespanha:

Se, pegando em textos de direito, explorarmos as


suas genealogias, é muito provável que terminemos
no Génesis ou na Física de Aristóteles. E, se partirmos
de textos de medicina, chegaremos provavelmente
aos Aforismos de Hipócrates ou nos textos de Galeno
sobre a natureza e as doenças das mulheres (HESPA-
NHA, 2010: 65).

O campo jurídico e o administrativo eram pilares de sustentação


das coroas portuguesa e espanhola. No ultramar estes campos eram
dominados pela presença masculina. Era direito inerente do macho
assumir os morgadios, os cargos oficiais do império, a herança fami-
liar, os postos de juízes, juízes de fora, ouvidores etc. Ou seja, o exer-
cício consciente, ou não, do poder simbólico eram privilégios mas-
culinos. À mulher cabia certo exercício de poder dependendo de sua
posição social dentro dos campos em que deveria circular e mesmo
assim, sempre sujeita, como Imbecillita sexi, a tutela masculina fosse
do pai, irmão, marido, ou das autoridades eclesiásticas e seculares.
Socolow tratando sobre essa “ordem” que estabelecia hierarquia diz:

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NASCIMENTO, CASAMENTO, VIUVEZ E MORTE:
A condição feminina e os “Estados” na ordem social do antigo regime Ibérico, uma leitura de
Antônio Manuel Hespanha
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One overarching limitation in both spanish and por-


tuguese America was the existence of a patriarchal
social organization. In the New World as in the old,
a clear sexual hierarchy placed women below men.
By Law and by tradition, men held the lion’s share
of power in government, religion, and society. Fur-
thermore, a man, particularly a father was supreme
within his family. Legally, all those who living within
the household were require to obey him (SOCOLOW,
2010: 1).

A documentação colonial, no entanto, nos mostra realidade diver-


sa. Assim como Bourdieu nos alerta que os campos de poder simbó-
lico são lugares de produção e reprodução de relações com regras
próprias, mas sujeitos a influências internas e externas e, portanto,
espaços de constantes disputas, nada era engessado nas relações de
poder no Antigo Regime, pelo menos não tanto quanto se acreditava
inicialmente. A realidade era plástica e assim podemos através dos
estudos como os do próprio Hespanha e de tantas pesquisas sobre
a história dos sujeitos “tutelados” dessas sociedades, observar as mu-
lheres circulando e como sujeito das lutas e tensões desses campos
de exercício de poder simbólico.5
Diversos requerimentos de mulheres tentando assumir a posse
de ofícios, sendo titulares de morgados ou até solicitando renúncia
a propriedade do oficio em prol de usá-lo como dote já que pela
legislação não pode assumir oficialmente, nos remetem as tensões
na execução da legislação no período. Assumir um ofício na América
Portuguesa ou em qualquer parte do Reino ou do ultramar era um
direito inerente dos homens. Esses requerimentos nos mostram que
as mulheres encontravam nos meandros das leis, um modo de ad-
quirir certos direitos e prerrogativas que muitas vezes não encontrava

5 Quando falamos em “campo de poder simbólico” estamos nos apropriando do concei-


to de campo trabalhado pelo sociólogo Pierre Bourdieu, mas no nosso caso falamos de
campos específicos do Antigo Regime como o campo jurídico e administrativo, lugares
restritos às mulheres que deveriam ocupar apenas os campos religiosos e da família. Neste
caso, estamos pensando um conceito de campo jurídico do Antigo Regime Ibérico, assim
como Campo administrativo do Antigo Regime Ibérico etc.

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54 Suzana do Nascimento Veiga

respaldo na legislação oficial posta para elas, mas que viviam nas leis
de funcionamento próprias do campo jurídico (habitus) dentro do
Antigo Regime, fosse nos trópicos ou fosse nos Reinos. Como afirma
Susan Socolow:

In this society women were defined first and foremost


by their sex and only secondarily by their race or
social class. In many colonial documents the lack of
attention to women’s race and class suggests that the-
se attributes were malleable. Sex was not. Indeed, it
can be argued that sex was the most important factor
in the determining a person’s status in society. No-
netheless gender alone does not explain the various
experiences of women in colonial Latin America. We
must also keep in mind the importance of race, class,
demography, life course, spatial variations, local eco-
nomy, norm and reality, and change over time (SO-
COLOW, 2000: 1).

O protagonismo desses sujeitos do sexo feminino é percebido, por


exemplo, nos primeiros passos para a ocupação da capitania de Per-
nambuco na primeira metade do século XVI, já que se não fossem as
alianças feitas entre os colonos e os índios através especialmente de
matrimônios o sucesso de Pernambuco talvez não fosse tão imediato,
ou tão grande. Não podemos esquecer as senhoras de engenhos e
de sesmarias da capitania. Fazendo um simples levantamento dos
engenhos de Pernambuco e seus respectivos senhores, entre os anos
de 1593 até 1765, podemos perceber que os principais engenhos da
capitania, em algum momento, passaram por mãos femininas e mui-
tas vezes foram inclusive administrados por elas (quadro 1).

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NASCIMENTO, CASAMENTO, VIUVEZ E MORTE:
A condição feminina e os “Estados” na ordem social do antigo regime Ibérico, uma leitura de
Antônio Manuel Hespanha
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Quadro 1: Resultado parcial de levantamento dos engenhos da capitania de


Pernambuco que tiveram mulheres referidas como “donas” ou “administra-
doras”:

Data Donas Engenhos


1636 6
D. Isabel de Moura Trapiche/ Bom Jesus
16237/1636 D. Catarina Barreto Jurissaca8
1636/1638 /1640
9 10
D. Adriana de Almeida Trapiche/ Nossa Sra. da
Conceição
1638/1640/165511 D. Catarina de Albuquerque Muribeca
159312
Felipa de Sá Guararapes
1623/1638/1640 Maria Barrosa Maria Barrosa
1593 Violante Fernandes Apipucos
1593 Ana de Paz Camaragibe
Fontes: Cf. notas de rodapé.

Solteirice, Casamento, maternidade e viuvez: Os estados femini-


nos e as possibilidades de negociação pelos espaços de poder das
mulheres no Antigo Regime.

Em seu trabalho “Sem embargo de Ser fêmea”, a historiadora Jean-


nie Menezes (2010) nos possibilita visualizar as mulheres dentro das
práticas da justiça colonial, por exemplo. Seu status jurídico no pe-
ríodo as colocava, para a maioria dos juristas no status de “imbecil-
lita sexi” o que deveria assentar sempre a mulher na condição de
tutelada, fosse pelo pai, marido ou até irmãos e parentes masculinos.
Entretanto, podemos perceber que tanto a lei possuía algumas “bre-

6 Relatório do conselheiro Willem Schott.


7 Relatório de José Israel da Costa.
8 O relatório dá conta de que o Engenho Jurissaca é parte de um morgado, instituído por
João Velho Paes Barreto em favor da filha, D. Catarina, em 1614.
9 Relatório Carpentier.
10 Relatório do Senhor Adriaen Van Der Dussen.
11 Translado do Rendimento das Pensões, Dízima e Vintena.
12 Denunciações e confissões de Pernambuco.

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56 Suzana do Nascimento Veiga

chas” ou, como Menezes mostra, que a prática da justiça acabava


possibilitando um espaço de atuação muito maior do que o previsto
para as mulheres, especialmente para as de condição mais abastadas,
ou mesmo, que os “estados” onde esses sujeitos se encontravam, lhes
davam mais possibilidades, ou não, de poder e de atuação.
É importante ter em perspectiva que para a sociedade do Antigo
Regime o capital simbólico era mais importante que a posse de
determinados bens. A riqueza, diferentemente da posição social, não
era um fator social decisivo como afirma Hespanha (2007: 122). Neste
ponto, o status, ou seja, a posição social de que se gozava e na qual
se era reconhecido, importava e influenciava mais do que a pecúnia.
A realidade social de algumas mulheres nos conta sobre uma rede
de relações influenciadas por um significativo capital simbólico e so-
cial que influíam sobre os habitus sociais dos campos (administrativo
e jurídico) em que elas acabaram se inserindo, e que por fim acabava
pesando em favor das mesmas. Além disto, o próprio direito não era
de todo restritivo a participação feminina em determinados espaços e
exercendo certos poderes. Hespanha, apud Menezes (2010: 66), afirma:

O direito participava deste sistema de pré-compreen-


sões profundas sobre a identidade e a natureza dos
sexos e recebia dele as suas intuições fundamentais.
No entanto, como saber prático de um mundo social
em que as mulheres eram mais do que seres passivos
e menorizados, o direito - que, de resto, partia dos
dados da cultura romana sobre o género, muito mais
igualitária do que a cultura judaica -, diferenciara-se
como sistema produtor de imagens sobre o feminino.
Descolara dos pontos de vista extremos sobre a inca-
pacidade das mulheres, frequentes em vários lugares
das Escrituras e da Patrística, e desenvolvera algumas
valorações próprias, que permitiam a integração de
situações reais, como as da mulher dona de bens, da
mulher feudatária, da mulher rainha.

Parte das mulheres encontradas na documentação colonial, por


exemplo, que conseguiam circular pelos espaços de poder eram mu-

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NASCIMENTO, CASAMENTO, VIUVEZ E MORTE:
A condição feminina e os “Estados” na ordem social do antigo regime Ibérico, uma leitura de
Antônio Manuel Hespanha
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lheres abastadas ou de certa posição na colônia, não eram trabalha-


doras, criadas, ou mulheres sem posição na sociedade; eram mulhe-
res brancas, da chamada elite local, ou ao menos bem posicionadas
socialmente a maior parte viúvas, ou órfãs de maridos ou pais que
morreram lutando pelo império português em guerras ou prestando
serviços à Coroa. Não era incomum, porém, que fossem mulheres
cujos maridos foram presos ou degredados, mas como a família go-
zava de boa posição social e influências, elas conseguiam requerer
sustento, fortunas e até mesmo passaportes e provisões para poder
fazer a travessia do Atlântico para o reino ou para a colônia.
Era, portanto, esse status social que possibilitava as relações so-
ciais importantes e muitas vezes a benesse real que permitia a estas
mulheres transitar entre os campos e requerer domínio sobre esferas
da vida prática.
O estado, ou seja, o “ser” também era parte fundamental nesta
equação. Dependendo de quem a mulher “fosse”, ela teria mais ou
menos poder e influência na família, na sociedade, sobre o uso de
seus bens, etc.
De todos os estados de mulher, o de solteira era o que menos
dava a mulher possibilidades de atuação e ou negociação. Ser sol-
teira e especialmente menor idade era estar sob a tutela do pai, do
irmão, ou até mesmo do Juiz de órfãos designado em caso de morte
de todos os parentes e na ausência de um tutor e por fim também
deste último, sendo sempre, ou na grande parte das vezes, do sexo
masculino. As mulheres solteiras estavam sempre recolhidas dentro
de casa, ou em recolhimentos, ou conventos estudando para a vida
religiosa ou se preparando para a vida de casada, portanto, seu poder
de decisão no que concernia a sua vida era mínimo e limitado pela
lei e pelas tradições, especialmente as Ibéricas.13
As mulheres casadas deveriam, em hipótese, gozar de certos di-
reitos visto que o casamento deveria igualar os cônjuges, já que o
matrimônio “se baseia numa promessa comum e recíproca de ajuda,
fidelidade e de vida em comum, promessa cujo cumprimento, por

13 Para mais informações sobre a condição de mulheres solteiras, especialmente no que se


referem as que eram enviadas pela família para conventos ou recolhimentos no Reino ou
em outras partes do Império português, ver: ALMEIDA, 2005.

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58 Suzana do Nascimento Veiga

seu lado, seria decisivamente facilitado pela igualdade da condição


e riqueza dos cônjuges” (FRAGOSO apud HESPANHA, 2006: 168).
Entretanto, apesar de certas concessões de poder, especialmente no
que se referia a administração da casa, o casamento acentuava as
diferenças entre homens e mulheres e, portanto, seus direitos. “Em
virtude da diferente natureza do homem e da mulher, os sentimentos
mútuos dos cônjuges e, logo, os deveres correspondentes não são
iguais nem recíprocos” (HESPANHA, 2006: 169). Então, apesar da
pregada igualdade e do “carne de uma só carne” do laço cristão, na
prática, nesta “reintegração num corpo novamente único, a mulher
parece que tendia a retomar a posição de costela do corpo de adão”
(HESPANHA, 2006: 169). Portanto, a mulher casada estava sempre,
devido a ordem natural estabelecida por Deus, abaixo de seu marido,
inclusive legalmente, mesmo sendo o casamento segundo a igreja um
estado de igualdade.
Apesar disso, mesmo casada e sob a tutela do marido a herança
da mulher com que entrava no casamento a ela pertencia e poderia
ser legada a seus herdeiros em caso de falecimento via testamento.
Ao marido cabia a administração desses bens, mas não seu uso sem
autorização da mulher (SOCOLOW, 2000).
Por fim, a viuvez era o estado onde, de acordo com a documen-
tação colonial, se mostra o estado onde a mulher consegue maior
alcance de poder e negociação, seja administrando engenhos, reque-
rendo tutela de filhos e administração dos próprios bens, ou reque-
rendo a posse de ofícios que pertenciam a maridos ou filhos mortos
em combate à serviço da Coroa, ou mesmo dos que foram degra-
dados. Era no estado de viúva que habitava, talvez e isso estamos a
construir, o maior espaço de exercício de poder efetivo e simbólico
para as mulheres nos Reinos Ibéricos do Antigo Regime.
Mas antes de partirmos para as considerações finais, não pode-
mos esquecer que a morte era também um momento onde as pos-
sibilidades de poder e perpetuação de símbolos do mesmo ocorria
e para as mulheres não seria diferente. Negras ou brancas, da elite
ou até mesmo escravas, as mulheres encontravam usos para suas
fortunas acumuladas ou herdadas. Fosse deixando para parentes (fi-
lhos, parentes, maridos) ou para irmandades, ordens religiosas que
as mesmas encontravam espaços para executar seus desejos finais,

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 43-61, 2018


NASCIMENTO, CASAMENTO, VIUVEZ E MORTE:
A condição feminina e os “Estados” na ordem social do antigo regime Ibérico, uma leitura de
Antônio Manuel Hespanha
59

expressos através de seus testamentos que acabavam, dependendo


de sua fortuna, por lhes conferir prestígio. Mostravam assim suas
estratégias de manutenção patrimonial, benefícios a parentes, perpe-
tuação de sua memória, especialmente como grandes benfeitoras etc.
Nos muitos estados de mulher e fora deles (já que também passaram
atuar em espaços de prerrogativa masculina como a administração de
engenhos) vemos que as mesmas buscavam seus espaços de atuação
e exercício de poder mesmo que fosse limitado pelas mais diversas
razões impostas a condição de seu sexo no Antigo Regime.

Considerações finais

Quando nos propusemos a construir este trabalho queríamos bus-


car entender de forma mais sucinta e também mais clara como as
mulheres lutavam, como sujeitos históricos, pelos espaços de poder
dentro das sociedades do Antigo Regime Ibérico e para tanto, preci-
samos entender o que era ser uma mulher nessas sociedades e quais
eram seus estados e as margens de atuação e possibilidades que es-
ses sujeitos possuíam em cada um.
Para que pudéssemos alcançar este entendimento dialogamos es-
pecialmente com a obra de Antonio Manuel Hespanha. Muito mais
do que nos apresentar o estatuto jurídico dos inferiores no Antigo
Regime Ibérico o autor nos traz um modelo de trabalho que dialoga
com as ciências vizinhas e enriquece sua análise através delas: Bour-
dieu, Foucault, entre outros contribuem para uma maior compreen-
são do panorama social da época estudada, assim como nos auxiliam
com entendimento da atuação dos sujeitos históricos e dos discursos
construídos sobre eles. Os discursos são entendidos neste contexto
como parte da ação dos que criam a ordem social e dela se alimen-
tam e se apropriam.
É importante a busca de conceitos mais especializados para
trabalhar realidades muito específicas e distintas nos diversos espaços
e tempos da história, portanto nos abrir às novas possibilidades de
interpretação advindas de outros campos de trabalho e produção é
essencial para a renovação do olhar do historiador sobre suas fontes
e para a produção de sua narrativa e esta é uma das grandes contri-

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 43-61, 2018


60 Suzana do Nascimento Veiga

buições de Hespanha que já dialoga há tempos com o direito, assim


como outras ciências sociais
Percebemos assim, ainda mais intensamente que como sujeitos
históricos inseridos dentro de realidades múltiplas e plásticas, redes
de relações e inúmeras tramas, as mulheres de diversas condições so-
ciais têm suas histórias contadas não apenas como vozes silenciadas,
mas como atores que se posicionaram estrategicamente dentro de
suas possibilidades e necessidades nas brechas e espaços das opor-
tunidades vivenciadas em cada um dos lugares e estados que ocupa-
vam. O direito era a ferramenta que através da palavra escrita (lei) ou
falada (tradição) ora negava, hora criava a possibilidade de atuação.
Por fim, acreditamos que muito ainda se tem a debater e construir
partindo de contribuições teórico-metodológicas de historiadores
como Hespanha, assim como dos profícuos, porém ainda modestos
diálogos com antropólogos, sociólogos, teólogos e juristas.

Referências

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Relatório de José Israel da Costa
O relatório dá conta de que o Engenho Jurissaca é parte de um morgado,
instituído por João Velho Paes Barreto em favor da filha, D. Catarina, em
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A condição feminina e os “Estados” na ordem social do antigo regime Ibérico, uma leitura de
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CONFLITOS DE JURISDIÇÃO NA “NOVA
ALFÂNDEGA DE PERNAMBUCO”:
Governador versus Provedor da Fazenda Real (1727-1737).

Luanna Maria Ventura dos


Santos Oliveira1

Resumo: O presente artigo pretende discutir as disputas em torno da


construção do novo edifício da Alfândega de Pernambuco, ocasiona-
das pela intromissão jurisdicional do governador Duarte Sodré Perei-
ra, sob a alçada do provedor da Fazenda Real, e do juiz da alfândega
João do Rego Barros. As querelas em torno dessa construção, que se
arrastaram por anos a fio, como se observa nas consultas do Conse-
lho Ultramarino, envolveram diversas autoridades da capitania e do
ultramar, como engenheiros, capitães de navios, práticos, religiosos e
até um vice-rei da Índia.

Palavras-chave: Jurisdição; Alfândega de Pernambuco; dízima da al-


fândega.

Jurisdiction conflicts around the “New Customs of Pernambuco”:


Governor versus Provedor of Real Estate (1727-1737).

Abstract: In this paper, we propose a discussion about the quarrels


involved on the construction of the new customs’ building, caused
by the juridical intervention of governor Duarte Sodré Pereira in the
jurisdiction of the Provider of the Royal Treasury and customs’ judge
João do Rego Barros. The quarrels around this building, which have
dragged on for years, as observed in the consultations of the Archive
of the Conselho Ultramarino, involved many authorities of the cap-
taincy and overseas, such as engineers, ship captains, harbor pilots,
religious and even one vice king of India.

Keywords: Jurisdiction; Overseas customs; Power relations.

1 Doutoranda do PPGH/UFPE e Mestra em História Social da Cultura Regional pela UFRPE.


64 Luanna Maria Ventura dos Santos Oliveira

A Alfândega de Pernambuco foi transferida provisoriamente para


o trapiche de Pedro Mascarenhas em 1724.2 O edifício sofreu algumas
reformas derivadas das exigências do primeiro contratador da dízima
da Alfândega de Pernambuco e da Paraíba, Jerônimo Lobo Guima-
rães (Oliveira, 2016: 97). O governador Duarte Sodré Pereira decidiu,
no ano de 1730, retirar a alfândega da casa alugada, que onerava a
Fazenda Real com os gastos de 320$000 anuais (COSTA,1983: 508) e
construir uma nova alfândega para a capitania de Pernambuco dentro
do Forte do Matos.3
O rei teria ordenado que se fizesse o orçamento sobre os custos
de construir a alfândega, os armazéns para tabaco, e outros petreixos
que se fariam no forte, tentando avaliar a viabilidade do projeto. Em
resposta, o melhor lugar para construir a nova alfândega, segundo o
governador, seria o forte que custaria trinta mil cruzados.4
O governador entendia que a construção deveria ser paga através
da renda da alfândega em funcionamento, expondo também, por
meio de uma certidão, atestada pelo escrivão da alfândega, José Ri-
beiro Ribas, que a Fazenda Real já teria feito alguns reparos no dito
forte: “desentulho do cais do mesmo forte”, a mando do governador
Dom Manuel Rollim de Moura; a demolição do “cavaleire com o
parecer dos engenheiros”; e o reparo do telhado dos armazéns do
forte em 1729, sendo o montante investido de “um conto e quarenta
e quatro mil e quatrocentos e trinta réis”.5
Outra carta foi enviada ao Rei por Duarte Sodré Pereira, no dia 28
de novembro do mesmo ano, sobre o orçamento da construção da
nova alfândega dentro do Forte do Matos, obra avaliada em cinquen-
ta mil cruzados. Foram dois engenheiros, Diogo da Silveira Vellozo
e João (na fonte, ilegível, mas tudo leva a crer seja o João Macedo

2 Documentos Históricos da Biblioteca Nacional, per094536_099, p. 205 e 206.


3 Ficava ao sul do istmo do Recife e tinha uma forma semicircular. Foi construído por Antô-
nio Fernandes de Matos e doado ao rei, no entanto, anteriormente a construção do Forte, o
terreno tinha sido doado aos religiosos de São Felipe Néri pelo construtor (MELLO, 1981:
50).
4 Recife, 27 de abril de 1730. CARTA do [governador da capitania de Pernambuco], Duarte
Sodré Pereira Tibão, ao rei [D. João V], Arquivo Histórico Ultramarino (AHU), Acervo
Central de Lisboa (ACL), Conselho Ultramarno (CU), 015, Caixa 40, Documento 3630.
5 Idem

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 63-87, 2018


CONFLITOS DE JURISDIÇÃO NA “NOVA ALFÂNDEGA DE PERNAMBUCO”:
Governador vs. Provedor da Fazenda Real (1727-1737) 65

Corte Real), que fizeram a avaliação. O governador desconfiou do


valor orçado, dizendo ao Rei que Diogo Silveira era “apaixonado
pelos padres quentais”6, interessados pelo terreno do forte ao ponto
de pedi-lo em doação.7
A obra da nova alfândega, segundo o governador, seria de grande
utilidade, visto que pagavam anualmente o aluguel de dois armazéns,
um que servia de alfândega e o outro para a recolha de fazendas.
Além desse inconveniente, a distância entre esses dois armazéns pre-
judicava a arrecadação, “por estarem divididos um do outro mais
de um tiro de mosquete”.8 Como o capitão fez uma reforma nesse
armazém, ampliando-o e criando um lugar para o Tribunal da Supe-
rintendência, onde se dava o despacho do tabaco, através do sistema
de louvados, foi acrescentada ao aluguel essa ampliação no valor de
setecentos e vinte oito réis, “pagando tudo noventa e seis mil réis”.
Além do dispêndio financeiro, outro grande inconveniente desses
dois armazéns alugados eram os moradores que residiam no andar
de cima, pois segundo a carta enviada por Duarte Sodré, poderiam
furtar as mercadorias recolhidas, fossem elas artigos vindos do reino
ou o próprio tabaco que era um artigo importante para exporta-
ção e consumo na capitania. Também levantava a possibilidade de
“cair-lhes águas de que resultem avarias”, e, como se não bastasse,
apresentava os armazéns como locais passíveis de descaminhos das
mercadorias depositadas entre a Alfândega e a Superintendência do
Tabaco que faziam parte de um único complexo.
É possível que vários comerciantes se esquivassem de levar seus
produtos, pois temiam o extravio ou avarias nas mercadorias que
eram entregues para selagem. Acrescente-se ainda que eram cobra-
dos os 10% em cima do valor do produto, o imposto da dízima. Mas,
possivelmente, muitos deveriam ter a experiência de casos em que
se extraviaram produtos da alfândega ou em que a mercadoria era
entregue com avarias.

6 Quentais é um termo usado para os religiosos oratorianos de São Felipe Neri.


7 Recife, 28 de novembro 1730. CARTA do [governador da capitania de Pernambuco],
Duarte Sodré Pereira Tibão, ao rei [D. João V], AHU_ACL_CU_015, Cx. 41, D. 3684.
8 Idem o valor pago sobre o armazém que servia de alfândega era de 350 mil réis, somados
aos “sessenta mil réis anuais ao utilizado pela Superintendência do Tabaco da capitania de
Pernambuco para a recolha do produto (COSTA, 1983: 65).

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 63-87, 2018


66 Luanna Maria Ventura dos Santos Oliveira

Além da importância de um novo prédio, não é possível deixar de


ressaltar o valor da área do Forte do Matos, local “onde cada palmo
de terra vale a peso de ouro” e pelo qual a Fazenda Real não teria
custo. O forte era apresentado como tendo “toda a largueza” para
a obra, que duraria em torno de dois anos, sendo destinado para a
execução o rendimento da dízima de 20 mil cruzados, que estavam
empregados nas fortificações.
Além da dízima, era preciso vender alguns imóveis, entre eles, a
Casa dos Contos e Alfândega velha, avaliados em dois contos de réis;
mais o armazém das armas, avaliado em dois contos e seiscentos mil
reis; o armazém dos petrechos de guerra, que ficava na “rua da sen-
zala”, avaliado por “seiscentos mil réis”. O valor total dos três imóveis
orçaria em torno de cinco contos e duzentos mil réis. Esses bens de-
veriam ser vendidos por não terem utilização naquele momento e,
estando em um local privilegiado da praça, gerariam recursos que re-
duziriam os valores aplicados na construção da nova alfândega. No
projeto do governador, todas as repartições citadas deveriam ficar no
forte, “tudo junto em utilidade da Fazenda Real e da nobreza da terra”.9
Neste ponto, colocavam-se frente a frente interesses divergentes
que enlaçavam o governador da capitania e os padres oratorianos,
pois, no mesmo local onde Duarte Sodré intentava construir a “nova
alfândega”, os religiosos do oratório pretendiam alargar as cercas de
seu convento. Chegou-se a um impasse, pois forças poderosas colo-
caram-se em formação de combate. É sobre os detalhes desta luta,
um verdadeiro cabo de guerra, que nos deteremos a seguir.

O Governo da capitania versus a Provedoria da Fazenda Real

Seguindo o intento de construir um novo prédio para a alfândega,


foi preparado um orçamento e este foi enviado pelo governador à
Coroa. Logo depois foi a vez de João do Rego Barros (GODOY, 2002:
24), provedor da Fazenda Real e também juiz da alfândega, enviar
à Coroa uma carta expondo que havia chegado aos seus “ouvidos
que a Vossa Majestade representara o governador e capitão general

9 Recife, 28 de novembro 1730. CARTA do [governador da capitania de Pernambuco],


Duarte Sodré Pereira Tibão, ao rei [D. João V], AHU_ACL_CU_015, Cx. 41, D. 3684.

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 63-87, 2018


CONFLITOS DE JURISDIÇÃO NA “NOVA ALFÂNDEGA DE PERNAMBUCO”:
Governador vs. Provedor da Fazenda Real (1727-1737) 67

da Capitania de Pernambuco [...] para se fazer nova alfândega...”10 e


nesta missiva não se furtava em opinar sobre o assunto, haja vista
tratar-se de uma questão que envolvia seu serviços à Real Majestade.
Seu entendimento foi que:

[...] ficaria pouco suficiente, por ser o sítio do Forte do


Matos fora das entranhas daquela praça de onde não
podiam descarregar as lanchas dos navios se não de
maré cheia, por lhe impedir na vazia uma grande co-
roa que ao redor a cerca e que, para se fazer a dita al-
fândega com capacidade de se recolherem nela todas
as fazendas assim secas como molhadas, carecia de
uma considerável e larga despesa, a qual poderia ser
com muita desigualdade, mandando Vossa Majestade
comprar as casas que estavam servindo de alfânde-
ga, por aluguel que são de Pedro Mascarenhas, donde
com menos custo se podia fazer com uma parede de
canto a canto, pela face da rua uma alfândega que
fique com boa suficiência e, por cima dela, Casa dos
Contos, e a em que se dê as fardas às infantarias e a
outra em que se recolham as armas... para poderem
vender-se a Alfândega velha e casa do almoxarifado...11

Analisando a carta do provedor e juiz da alfândega, percebemos


que é uma reação direta ao projeto do governador de construção da
nova alfândega dentro do forte. O interesse defendido pelo prove-
dor seria a permanência da alfândega no mesmo local onde ela se
encontrava e que a Coroa comprasse as casas que eram de Pedro
Mascarenhas.12

10 Lisboa, 14 de novembro de 1738. PARECER do Conselho Ultramarino acerca da cons-


trução de nova fortaleza sobre a estrutura da fortaleza dos Matos, solicitada pelos padres
da Congregação do Oratório de São Felipe Néri, na capitania de Pernambuco. Anexos: 57
docs. Arquivo Histórico Ultramarino, Avulsos de Pernambuco. AHU_ACL_CU_015, Cx.
53, D. 4617.
11 Documentos Históricos da Biblioteca Nacional, Consultas do Conselho Ultramarino: as
Capitanias do Norte (1728-1746). per094536_100. Folha 105.
12 Idem

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 63-87, 2018


68 Luanna Maria Ventura dos Santos Oliveira

Como já discorremos, a situação em que se encontrava a Alfân-


dega de Pernambuco no início do contrato da dízima (1724) era
lamentável, visto que não cabia dentro dela a carga de mais do que
dois navios13 e, por isso, era necessário, que se fizessem inúmeras
reformas para melhorar a arrecadação do imposto da dízima, tendo-
se em conta que o fluxo do Porto de Pernambuco era o terceiro do
Brasil. Foram feitas reformas, as quais não supriram completamente
a necessidade de armazenamento dos produtos que deveriam ser
taxados pela pauta,14 sendo necessário alugar, em 1726, o trapiche
de Pedro Mascarenhas “para se acomodarem as fazendas que não
coubessem naquela alfândega...”,15 que se localizava próximo à Igreja
do Corpo Santo, como já foi apontado.
Em 1734, o governador Duarte Sodré cita que “muito mais pode-
roso que os padres quentais na capitania era”:

Um homem [...] dono do trapiche que também servia


de alfândega, não só pela perda de 250 mil réis pou-
co mais ou menos por ano que recebia de aluguel,
mas porque feita alfândega no forte ficava o seu trapi-
che perdido pelas vantagens que lhe leva o que agora
serve de alfândega que, neste caso, fica servindo para
se recolherem caixas de açúcar pela vantagem que
lhe leva em razão de ter mais água na maré vazia.16

13 Ant. 4 de março de 1723. REQUERIMENTO do contratador da Alfândega da dízima de


Pernambuco e Paraíba, Jerônimo Lobo Guimarães, ao rei [D. João V], pedindo ordem ao
provedor ou juiz da Alfândega da capitania de Pernambuco para mandar fazer uma casa
que comporte mais fazendas. Arquivo Histórico Ultramarino, Avulsos de Pernambuco
AHU_ACL_CU_015, Cx. 30, D. 2672.
14 É uma lista por ordem alfabética dos produtos e seus respectivos valores que entravam nas
alfândegas de Portugal. A pauta auxiliava os oficiais da alfândega a taxarem os produtos
com os tributos da dízima que seria 10% sobre o valor da mercadoria importada.
15 Lisboa, 18 de julho de 1726. DESPACHO do Conselho Ultramarino sobre aluguel do tra-
piche de Pedro Mascarenhas para acomodar as fazendas que não coubessem na alfândega
da capitania de Pernambuco. Arquivo Histórico Ultramarino, Avulsos de Pernambuco.
AHU_ACL_CU_015, Cx. 34, D. 3090.
16 Lisboa, 14 de novembro de 1738. PARECER do Conselho Ultramarino acerca da cons-
trução de nova fortaleza sobre a estrutura da fortaleza dos Matos, solicitada pelos padres
da Congregação do Oratório de São Felipe Néri, na capitania de Pernambuco. Anexos: 57
docs. Arquivo Histórico Ultramarino, Avulsos de Pernambuco_AHU_ACL_CU_015, Cx.

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 63-87, 2018


CONFLITOS DE JURISDIÇÃO NA “NOVA ALFÂNDEGA DE PERNAMBUCO”:
Governador vs. Provedor da Fazenda Real (1727-1737) 69

Esse “homem poderoso” era Pedro Mascarenhas. Em 1732, ele ga-


nhou os títulos de I Conde de Sadomil, Comendador das Comendas
de Santa Maria de Ala, dos Dízimos do Paul de Vicente de Fornellos,
da Ordem de Cristo e da dos Fornos e Feiras de Setúbal, na Ordem
de Santiago, pelo rei D. João V. Foi nomeado, no mesmo ano, para
ser vice-rei da Índia, onde governou até o ano de 1741. No período
em que governou, não teve muito êxito em sua administração, per-
dendo várias batalhas e parte do território sob sua jurisdição.17 Por
isso, foi citado pelo seu sucessor na Índia, o Marquês de Louriçal:
“O conde de Sadomil teve, no seu governo, em repetidas ocasiões,
demonstrado a sua constância, desinteresse e outras virtudes” (NA-
ZARETH, 1909: 141). Mas, em relação à atuação do Conde de Sadomil
em Pernambuco, temos apenas indícios, visto que até o presente não
encontramos uma documentação consistente, que comprovem sua
relação direta com o provedor da Fazenda Real, João do Rego Bar-
ros. Porém, quando o governador cita, em 1734, o Conde de Sadomil
como “homem muito poderoso”, é possível que ele já soubesse que
o conde teria sido nomeado para ser vice-rei da Índia.
Philomena Sequeira Antony (2013) cita que nesse mesmo ano o vice-
-rei da Índia fez uma representação à Coroa sobre os grandes roubos
que estavam acontecendo com os produtos oriundos das Índias e, por
uma resolução real datada de 17 de março de 1735, “o rei permitiu a
venda de tais produtos na Bahia (...) mediante pagamento de direitos
no valor de 10%” (ANTONY, 2013: 185) que seria a dízima da alfândega.
Sabemos que, teoricamente, os produtos vindos do Oriente deve-
riam seguir para o porto de Lisboa, porém, durante o percurso, as
naus das Índias acabavam arribando em vários portos da América
portuguesa em busca de alimentos, água e concertos nas embar-
cações. Durante essas paradas, os descaminhos aconteciam, com a
impossibilidade de se conter o extravio. O mais viável para Coroa era
autorizar a comercialização e receber os 10% da dízima, ao invés de
não participar de nenhuma forma do circuito comercial.
No entanto, no início da década de trinta do século XVIII, é pro-
vável que o provedor e o conde tecessem uma rede de interesses no

53. D. 4617. Folha 0054.


17 Idem

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 63-87, 2018


70 Luanna Maria Ventura dos Santos Oliveira

Atlântico Sul. Segundo Nuno Monteiro, “os vice-reis se dedicavam


à remessa de mercadorias para a Europa, geralmente contratando
com negociantes” (MONTEIRO, 2001: 275). Entre os privilégios do
Conde de Sadomil, havia o direito de “efetuar certos carregamentos
por sua conta” (MONTEIRO, 2001: 227), o que lhe proporcionava
a oportunidade de negociar com várias praças, nas quais possuísse
procuradores, enviando, neste caso, mercadorias da Índia para Per-
nambuco. Nossa pesquisa demonstrou os rendimentos das proprie-
dades do Conde de Sadomil na vila do Recife, ficando muito nítido
o investimento dele nesta praça.18 O armazém que servia de alfân-
dega na capitania, que lhe pertencia era o mais rentável. Situado em
um local estratégico próximo ao ancoradouro dos navios, lhe rendia
350$000 réis todos os anos. Além dos outros imóveis, que chega-
vam ao montante de 740$000 réis anuais. Acima e pelos lados do
armazém havia diversas casas que também rendiam dinheiro. Como
o Provedor defendia o aluguel e, posteriormente, a compra desses
armazéns pela Fazenda Real, em detrimento da construção da nova
alfândega dentro do Forte do Matos, podemos supor que era de seu
interesse esta transação.
Assim, supomos que um dos interesses do provedor teria relação
com o comércio da capitania. Mantendo uma aliança com o vice-rei
da Índia, Conde de Sadomil, poderia preservar uma rede de distribui-
ção de produtos vindos do Oriente para a capitania de Pernambuco
cuja recolha na Alfândega não era tão rígida, como as capitanias da
Bahia e Rio de Janeiro.19 Em Pernambuco, todo o processo estava sob
responsabilidade de João do Rego Barros (o provedor e, também, juiz

18 O documento estava solto entre um dos pareceres do Conselho Ultramarino, que versava
sobre a construção da nova alfândega. No entanto, podemos supor que ele tenha sido dis-
cutido na reunião do Conselho, no ano de 1730. Lisboa, 27 de janeiro de 1744. CONSUL-
TA do Conselho Ultramarino ao rei [D. João V], sobre o Forte do Matos, solicitada pelos
padres da Congregação do Oratório de São Felipe Néri, e acerca das obras de que necessita
a Alfândega da capitania de Pernambuco. Anexos: 14 docs. Arquivo Histórico Ultramarino,
Avulsos de Pernambuco_AHU_ACL_CU_015, Cx. 60. D. 5100.
19 Recife, 21 de agosto de 1725. CARTA do ouvidor-geral da capitania de Pernambuco,
Francisco Lopes de Carvalho, ao rei [D. João V], sobre a ordem para observação da entrada
de navios estrangeiros no porto de Recife sem pagamento, e ainda sobre os direitos e des-
caminhos das fazendas. Arquivo Histórico Ultramarino, Avulsos de Pernambuco_AHU_
ACL_CU_015, Cx. 32, D. 2959.

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 63-87, 2018


CONFLITOS DE JURISDIÇÃO NA “NOVA ALFÂNDEGA DE PERNAMBUCO”:
Governador vs. Provedor da Fazenda Real (1727-1737) 71

da alfândega), que poderia facilitar a sonegação da dízima, conser-


vando-se assim uma “amizade” bem lucrativa.
Colocava-se em contraposição aos interesses do governador Duar-
te Sodré Pereira, conhecido por “Fidalgo-mercador”, de acordo com
Júlia de Oliveira e Silva. Segundo ela, Duarte Sodré aproveitava-se
dos cargos ultramarinos para favorecer seus interesses mercantis e
afirmar-se como nobre, transformando parte de seus ganhos, lucros e
bens de raiz em capelas e morgados (SILVA, 1992: 20).
A autora faz uma análise sobre os negócios empreendidos pelo
“fidalgo-mercador”, demonstrando como funcionava sua máquina
de investimentos, montando mapas com os interesses comerciais do
Duarte Sodré e seus vínculos em diversas localidades, como a Ilha
da Madeira, Lisboa, Londres, colônias inglesas e, por fim, o Brasil.
Mercador experiente, pois já comerciava antes de ocupar os cargos
no ultramar como governador (Madeira, Mazagão e Pernambuco).
Não conseguimos identificar na documentação se os interesses
comerciais de Duarte Sodré estavam sendo estorvados pelo Conde de
Sadomil ou pelo provedor da Fazenda Real João do Rego Barros, que
fora denunciado pelo governador por não exercer adequadamente
seu ofício de cobrar os pagamentos da Fazenda Real. Denunciava
Sodré que “dizendo-lhe, várias vezes, que fizesse a cobrança para os
referidos pagamentos, nunca o fez, antes me dizia a mim que a fizes-
se, porque ele não havia de conseguir pela miséria em que se achava
a terra...”.20 Na mesma carta, o governador confessava ao rei que teria
ido cobrar as dívidas da Fazenda Real com medo da frota partir sem
os respectivos pagamentos.
Posteriormente, o governador foi repreendido e advertido novamen-
te pelo Conselho Ultramarino por intrometer-se na jurisdição do pro-
vedor da Fazenda, “(...) pois, pelo seu regimento e muitas resoluções
posteriores, são os provedores da Fazenda, independentes dos governa-
dores na administração, e exercício de seus ofícios e assim o ficai enten-
dendo para vos não misturardes na jurisdição alheia que não vos toca”.21

20 Recife, 16 de março de 1732. Carta do governador da capitania de Pernambuco, Duarte


Sodré Pereira Tibão, ao rei [D. João V], informando das providências que tomou para a
cobrança das dívidas à Fazenda Real. Arquivo Histórico Ultramarino, Avulsos de Pernam-
buco AHU_ACL_CU_015, Cx. 42, D. 3804.
21 Recife, 29 de março de 1732. Carta do governador da capitania de Pernambuco, Duarte

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 63-87, 2018


72 Luanna Maria Ventura dos Santos Oliveira

Retomando a consulta do Conselho sobre a construção da alfân-


dega, o rei ordenou, no dia 6 de outubro de 1731, que o cabo da frota
da capitania de Pernambuco José Soares de Andrade examinasse e
desse seu parecer em relação ao qual dos dois sítios era mais viável
para a construção da nova alfândega. Para isso, o cabo deveria exa-
minar o Forte do Matos e dar um parecer acerca das condições físicas
do local e se “podiam as lanchas dos navios descarregar com como-
didade, tanto em maré cheia como em maré vazia...” e se a coroa de
areia atrapalhava o desembarque. Também foi ordenando ao gover-
nador que o cabo fosse assistido pelos engenheiros da capitania e
que se fizesse “um mapa daquela marinha com clareza e distinção,
sinalando nele os sítios (...)”.22
Na carta enviada ao rei por José Soares, fica claro que ele foi
pressionado pelo Governador Duarte Sodré, a dar parecer favorável
à construção da alfândega. O cabo José Soares não convocara os
engenheiros da capitania de Pernambuco, pois temia que Sodré in-
terferisse nos pareceres, embora percebamos que o governador não
se afastou um só momento da averiguação. Todavia, como forma de
escapar do controle e conseguir isenção, o cabo foi ao cais do porto
do Recife e ordenou que todos os capitães dos navios da frota que se
achavam em Pernambuco naquele momento23 fossem para a ponte
da alfândega com os seus escaleres24 e, na mesma hora marcada com
os engenheiros, todos os convocados, engenheiros e capitães, entre-
gassem a José Soares seus pareceres lacrados, os quais ele remeteu
ao Reino.

Sodré Pereira Tibão, ao rei [D. João V], sobre ter sido repreendido pelos ministros do
Conselho Ultramarino por intrometer-se na jurisdição do provedor da Fazenda Real e ter
dado cumprimento à ordem passada em favor do cirurgião Vitoriano Fialho para servir na
Misericórdia com o pagamento que tinha o médico da câmara de Olinda. Arquivo Históri-
co Ultramarino, Avulsos de Pernambuco_AHU_ACL_CU_015, Cx. 42, D. 3829.
22 Documentos Históricos da Biblioteca Nacional, Consultas do Conselho Ultramarino: as
Capitanias do Norte (1728-1746). per094536_100. Folha 106.
23 Ant. 26 de outubro de 1738. REQUERIMENTO do [governador da capitania de Per-
nambuco], Henrique Luís Pereira Freire de Andrada, ao rei [D. João V], pedindo aumento
de soldo e quantias extras referentes ao frete e matalotagem de sua embarcação. Anexos: 7
docs. Arquivo Histórico Ultramarino, Avulsos de Pernambuco_AHU_ACL_CU_015, Cx.
53. D.4614.
24 Idem

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 63-87, 2018


CONFLITOS DE JURISDIÇÃO NA “NOVA ALFÂNDEGA DE PERNAMBUCO”:
Governador vs. Provedor da Fazenda Real (1727-1737) 73

Os pareceres dados pelo cabo, datado de 1732, e demais convoca-


dos a participarem da diligência foram semelhantes. Deixavam clara
a conveniência de permanecer a alfândega onde estava. Um dos pa-
receres enfatizava a boa saída das fazendas. No que tange à entrada,
argumentava-se que “fica ao pé dos navios, dos quais se não pode
tirar nada por alto, nem há outro melhor lugar para em toda a maré
vazia e cheia poder haver desembarque; e da ponte da dita alfândega
se fala com os navios, que estão no meio do arrecife...”. A conclusão
foi da inconveniência do forte, argumentando-se que era a coroa
de areia que incomodava desde o período holandês, sendo o de-
sembarque possível apenas com a maré alta. A planta foi feita pelos
engenheiros e entregue ao cabo à revelia do governador, que acabou
perdendo a compostura com os engenheiros por essa atitude.25
A planta ficou registrada no Arquivo do Conselho Ultramarino
como um mapa, de autoria dos engenheiros João Macedo Corte Real
e Diogo da Silveira Velloso, datada de 1731, e foi reproduzida no
livro: Atlas Histórico Cartográfico do Recife (MENEZES, 1988: 29). A
letra “A”, em 1733, é a “alfândega que de presente está servindo”, que
é o armazém do Pedro Mascarenhas, e “B”, “C” e “D” são os trapiches,
sendo a letra “B” o “trapiche ou ponte da mesma Alfândega”; o “C” o
“trapiche por onde se carregam as caixas”; e a letra “D” o “trapiche
chamado paço por onde também se carregam caixas.” A letra “Q”, é
referente “ao forte chamado de Matos em que se aponta fazer a nova
alfândega”. A letra “V” é o “casão místicas (SIC) ao convento dos con-
gregados”, a letra “M” é a Igreja e o convento dos oratorianos da vila
do Recife, e a letra “E” seria a praça, onde se tem a maior concentra-
ção de pessoas e comerciantes que viviam nesse entorno. Segundo
o engenheiro Diogo da Silveira, era o local onde se encontrava a
alfândega.26

25 Ant. 26 de outubro de 1738. REQUERIMENTO do [governador da capitania de Per-


nambuco], Henrique Luís Pereira Freire de Andrada, ao rei [D. João V], pedindo aumento
de soldo e quantias extras referentes ao frete e matalotagem de sua embarcação. Anexos: 7
docs. Arquivo Histórico Ultramarino, Avulsos de Pernambuco_AHU_ACL_CU_015, Cx.
53. D.4614.
26 Idem

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 63-87, 2018


74 Luanna Maria Ventura dos Santos Oliveira

Figura 1: Planta do bairro do Recife, levantada pelos engenheiros João Macedo Corte
Real e Diogo da Silveira Velosso (1733). In MENEZES (1988: 29).

O parecer do engenheiro Diogo da Silveira em relação aos dois


sítios é extremamente elucidativo em relação à descrição da área
portuária da vila do Recife e às relações do porto e da alfândega.
Nesse momento em que se cogitava construir uma “nova alfândega”,
o engenheiro, cuja posição foi a mesma da do cabo da frota José
Soares, foi a favor que a Alfândega de Pernambuco permanecesse
no mesmo lugar em que se encontrava, dando oito justificativas para
tal que foram: por se encontrar no meio da marinha do Recife; pelas
embarcações poderem chegar até o trapiche e descarregar as fazen-
das em qualquer maré; pela dificuldade de se praticar descaminhos,
visto que as embarcações ficavam em frente à alfândega onde era
possível ver tudo; por ficarem mais perto de onde se ancoram os na-
vios; por “estar em um ângulo da única praça que tem este bairro do
Recife, onde desembocam as melhores e mais largas ruas que há”;27

27 Lisboa, 14 de novembro de 1738. PARECER do Conselho Ultramarino acerca da cons-


trução de nova fortaleza sobre a estrutura da fortaleza dos Matos, solicitada pelos padres
da Congregação do Oratório de São Felipe Néri, na capitania de Pernambuco. Anexos: 57
docs. Arquivo Histórico Ultramarino, Avulsos de Pernambuco_AHU_ACL_CU_015, Cx.

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 63-87, 2018


CONFLITOS DE JURISDIÇÃO NA “NOVA ALFÂNDEGA DE PERNAMBUCO”:
Governador vs. Provedor da Fazenda Real (1727-1737) 75

por ser conveniente para “os homens de negócio, e comissários que


vêm de Portugal, pois lhes ficava em distância cômoda de suas casas.
Portanto, não faziam grandes despesas na condução das fazendas
despachadas para suas lojas, pois, de algumas destas, era possível
acompanhar a saída das mercadorias da alfândega”. Pela segurança,
não era fácil de ser aberta e roubada à noite, pois estava rodeada
de moradores; e, mesmo que fosse alugada, o que “se deve evitar”,
poder ser comprada por mais ou menos “vinte e quatro ou vinte e
cinco mil cruzados”. Esse valor poderia ser reembolsado em aproxi-
madamente doze anos da seguinte forma sugerida pelo engenheiro:

[...] alugando treze moradas de casas que são da mes-


ma propriedade, das quais seis lhe ficam por cima, e
sete encostadas, que, pelo sítio em que estão, nunca
ficam devolutas, e rendem todas quinhentos e vinte
e oito mil réis, os quais, juntos com o rendimento do
que pagam os navios pela sua descarga, abatida a
despesa que esta faz, poderão ficar líquidos dois mil
cruzados todos os anos [...].28

Vejamos que a intenção do engenheiro Silveira Veloso era que


fossem comprados os armazéns para que a alfândega ficasse no lu-
gar onde estava, visto que a localização era privilegiada, e a Fazenda
Real poderia permanecer alugando as casas que ficavam em cima e
ao lado da alfândega.
Argumentos esses fáceis de serem rebatidos, visto que os des-
caminhos poderiam acontecer exatamente por conta dessas casas
que se encontravam em torno da alfândega. Em relação a elas,
aparecem nas cartas enviadas pelo governador Duarte Sodré, que
era o lugar onde se facilitavam os descaminhos, além das “ava-
rias” que poderiam acontecer provocadas por algum vazamento

53, D. 4617.
28 Lisboa, 14 de novembro de 1738. PARECER do Conselho Ultramarino acerca da cons-
trução de nova fortaleza sobre a estrutura da fortaleza dos Matos, solicitada pelos padres
da Congregação do Oratório de São Felipe Néri, na capitania de Pernambuco. Anexos: 57
docs. Arquivo Histórico Ultramarino, Avulsos de Pernambuco_AHU_ACL_CU_015, Cx.
53, D. 4617.

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 63-87, 2018


76 Luanna Maria Ventura dos Santos Oliveira

de “água” nos produtos.29


O engenheiro Silveira Veloso alegava as desvantagens do Forte
do Matos, afirmando que lá não se podia descarregar quando a maré
estivesse baixa, e que não era um lugar muito movimentado na vila,
que as ruas que ficavam no entorno do forte eram “becos muito com-
pridos e estreitos, nos quais se podiam fazer muitos furtos, por saí-
rem as fazendas da casa dos selos abertas e soltas[...]”30 e, finalizando
o parecer, o mesmo afirma que:

Se há de precisar fazer uma muito considerável des-


pesa, e quando esta se pode evitar, parece superflui-
dade fazer-se sem urgência necessidade, isto do que
me parece de um e outro sítio e se a presente alfân-
dega serve há quinze ou desaseis anos, com frotas
grandes e bem carregadas, também poderá servir de
hoje por diante (...).31

No fim da carta, antes de o engenheiro fazer o juramento pelo


evangelho, ele se arrependeu e declarou: “onde digo acima que serve
de presente alfândega há 15 ou 16 anos foi equivocação, na que não
há mais que seis...”. Podemos concluir que esse pequeno “equivoco”,
pode demonstrar o quanto a missiva estava permeada da defesa de
interesses particulares, ou o quanto a verdade poderia ser ocultada.
Mas o temor por sua alma o fez retificar a informação, o que nos re-
mete aos conflitos do sujeito.32
O exame feito pelo capitão de mar e guerra José Soares de Andra-

29 Recife, 28 de novembro de 1730. CARTA do [governador da capitania de Pernambuco],


Duarte Sodré Pereira Tibão, ao rei [D. João V], sobre o orçamento da construção da nova
Alfândega de Pernambuco no forte chamado do Matos. Anexos: 7 docs. Arquivo Histórico
Ultramarino, Avulsos de Pernambuco. AHU_ACL_CU_015, Cx. 41, D. 3684.
30 Ibidem Arquivo Histórico Ultramarino, Avulsos de Pernambuco. AHU_ACL_CU_015, Cx.
53, D. 4617.
31 Idem
32 Lisboa, 14 de novembro de 1738. PARECER do Conselho Ultramarino acerca da cons-
trução de nova fortaleza sobre a estrutura da fortaleza dos Matos, solicitada pelos padres
da Congregação do Oratório de São Felipe Néri, na capitania de Pernambuco. Anexos: 57
docs. Arquivo Histórico Ultramarino_Avulsos de Pernambuco_AHU_ACL_CU_015, Cx.
53, D. 4617.

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 63-87, 2018


CONFLITOS DE JURISDIÇÃO NA “NOVA ALFÂNDEGA DE PERNAMBUCO”:
Governador vs. Provedor da Fazenda Real (1727-1737) 77

de, comandante da frota de 1731,33 e dos engenheiros Silveira Veloso


e João de Macedo Corte Real foi no sentido de “ser mais conveniente
(...) se conservar a dita alfândega, assim para descarga dos navios,
como para os homens de negócio, e comissários que hão de despa-
char as fazendas(...)”34 no local em que ela estava estabelecida.
Em resposta à diligência feita, o governador Duarte Sodré enviou
mais uma carta na qual apresentava-se como o único defensor da Co-
roa nos seguintes termos: “Vossa Majestade não tem alfândega e paga
seiscentos mil réis por cada ano de aluguel [...] em que se desembar-
carão as fazendas porque as caixas de açúcar nenhuma vão a ela”.35
Além disso, informou que o Pedro Mascarenhas (Conde de Sandomil)
queria trinta mil contos pelos armazéns além de denunciar os interes-
ses que perpassavam a relação de grande amizade entre o provedor
e juiz da alfândega João do Rego Barros com os padres da congre-
gação. Acrescenta os inconvenientes para o provedor da proposta
da localização da nova alfândega que “fica mais longe da sua casa,
além de outros respeitos que a isso o movem.” Percebemos, através
da carta, que o governador deixa bem claro que o provedor defende
seus interesses particulares juntamente aos padres da congregação,
que desejavam alargar o seu convento até o Forte do Matos,36 em vez
de estar defendendo os interesses da Coroa. Fica demarcado nas en-
trelinhas, que o provedor tinha “interesses” que podemos supor que
fossem ilícitos e que o moviam a ficar próximo à alfândega.
O governador ainda afirmava que o capitão da frota “havendo
aqui tido um particular trato e amizade com os ditos padres”.37 Po-
demos cogitar que o provedor possa ter auxiliado nesse “particular

33 Documentos Históricos da Biblioteca Nacional, per094536_100, p. 104-109.


34 Idem
35 Ibidem Arquivo Histórico Ultramarino, Avulsos de Pernambuco. AHU_ACL_CU_015, Cx.
53, D. 4617.
36 Para mais detalhes sobre as brigas em torno do interesse dos religiosos de São Felipe Néri
e o terreno do forte do Matos, consultar: OLIVEIRA (2016).
37 Lisboa, 14 de novembro de 1738. PARECER do Conselho Ultramarino acerca da cons-
trução de nova fortaleza sobre a estrutura da fortaleza dos Matos, solicitada pelos padres
da Congregação do Oratório de São Felipe Néri, na capitania de Pernambuco. Anexos: 57
docs. Arquivo Histórico Ultramarino, Avulsos de Pernambuco_AHU_ACL_CU_015, Cx.
53, D. 4617.

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 63-87, 2018


78 Luanna Maria Ventura dos Santos Oliveira

trato” entre o capitão e os Néris, sobre a necessidade de se aumentar


o convento e que seria mais conveniente a aduana se encontrar no
mesmo lugar. As alianças tecidas pelos frades na capitania alcança-
ram em sua malhada o provedor, os engenheiros Diogo da Silveira
Veloso e o “tenente general João de Macedo Corte Real, que era
cunhado de um padre quental”.38 Todos esses homens apoiando os
Néris, mas a partir de seus particularismos.
No entorno, estavam a Casa dos Contos, a residência do provedor
e a alfândega. Mudanças de configurações certamente gerariam alte-
rações nos valores de patrimônio solidamente edificados. Somado a
isso, ainda havia os interesses dos oratorianos que envolviam a ex-
pansão de seu convento.
Pelo orçamento do governador, era possível edificar uma alfân-
dega dentro do Forte do Matos com aproximadamente quinze mil
cruzados, metade do preço pedido pelo dono dos armazéns. Desa-
bafando sobre a situação, o governo afirma:

[...] talvez não haverá outro destas bandas que fale a


Vossa Majestade com tanta clareza como eu, e ain-
da assim não digo tudo por me não ver com novas
inquietações, e testemunhos como os que me têm
levantado os padres quentais por este respeito, e por-
que o que digo é o que basta para Vossa Majestade
saber com clareza toda a verdade[...].39

Com todos esses autos na consulta, o Conselho Ultramarino deu


o primeiro parecer em relação ao melhor sítio em 1730, que foi: que
a obra da nova Alfândega de Pernambuco fosse feita no Forte do
Matos, local apontado pelo governador, mandando-se que ele execu-
tasse a obra embora, “a maior parte dos informantes assenta ser mais
conveniente fazer-se a nova alfândega na mesma parte que agora
existe(...)”, que seria o armazém do Pedro Mascarenhas e que é colo-
cado na documentação como se estivesse “atendendo aos interesses
da dita congregação”. Elogiando o zelo do governador, que não “se

38 Idem.
39 Idem.

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 63-87, 2018


CONFLITOS DE JURISDIÇÃO NA “NOVA ALFÂNDEGA DE PERNAMBUCO”:
Governador vs. Provedor da Fazenda Real (1727-1737) 79

deixa vencer dos grandes empenhos em que têm entrado os Padres


da Congregação do Oratório da Casa do Recife para despersuadirem
a conveniência que tem a Fazenda Real em fazer a alfândega no Forte
do Matos(...)” e que, tanto um como em outro local, era preciso fazer
ponte (trapiche) para desembarque das fazendas, fazendo-se uma
maior e mais larga até o forte.
Nesse primeiro parecer do conselho, os interesses defendidos
eram, primeiramente, o de aumentar a capacidade de recolhimento
da alfândega, minimizar os gastos da Fazenda Real com o aluguel do
conjunto alfândega e armazém que sediava a Superintendência do
Tabaco, além de conseguir aumentar a arrecadação do imposto da
dízima. Outro interesse dos conselheiros era vigiar a área que se en-
contra próxima ao forte, ficando a nova alfândega no Forte do Matos
“no meio dos dois bairros: do Recife e Santo Antônio, sem grande
distância de um lugar em que os navios ancorassem, porque defron-
te do Forte do Matos atracavam alguns menores, e os que ficam no
poço não distavam muito do mesmo forte [...]”.40 Controlava-se então
o desembarque de produtos entre os dois bairros, restringindo, de
certa forma, o descaminho de fazendas sem o selo.
O primeiro parecer do Conselho Ultramarino foi favorável ao Go-
vernador, o conselho concordou com o governador em relação à cons-
trução da nova alfândega no Forte do Matos. Porém, após a consulta
ao rei, este ordenou que uma parte do processo subisse para ser con-
sultado novamente pelo Conselho e posteriormente voltasse, para ser
decidido por ele.41 O monarca pretendia analisar os pareceres de ou-
tras autoridades com mais detalhes sobre a construção da repartição.
Dentre os pareceres que subiram junto com o processo, veio in-
cluso o parecer do Coronel Manuel de Maia, um engenheiro muito
experiente do reino, o qual foi consultado em relação a essa obra de
Pernambuco três vezes: em 1734, 1735 e 1738.
No parecer do engenheiro, fica claro que o interesse defendido

40 Lisboa, 14 de novembro de 1738. PARECER do Conselho Ultramarino acerca da cons-


trução de nova fortaleza sobre a estrutura da fortaleza dos Matos, solicitada pelos padres
da Congregação do Oratório de São Felipe Néri, na capitania de Pernambuco. Anexos: 57
docs. Arquivo Histórico Ultramarino, Avulsos de Pernambuco_AHU_ACL_CU_015, Cx.
53, D. 4617.
41 Documentos Históricos da Biblioteca Nacional, per094536_100, p. 104-109.

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80 Luanna Maria Ventura dos Santos Oliveira

por ele não era apenas a melhoria da estrutura da alfândega, mas,


sobretudo, “a economia do público” que seria o menor gasto do
dinheiro da Coroa. O engenheiro coloca que o parecer do capitão
de mar e guerra, José Soares de Andrade, que foi: “não lhe nega a
possibilidade nem lhe pode deixar de conceder” em relação ao Forte
é uma abstenção, ficando em cima do muro. Segundo o coronel Ma-
nuel de Maia, o interesse do governador era de fabricar a alfândega
dentro do forte, para não permitir que se comprassem os armazéns
do Pedro Mascarenhas (I Conde de Sadomil).
Concluindo, em 1734, o engenheiro acreditava que tanto em um
lugar como no outro poderia fabricar a alfândega, porém era melhor
permanecer onde ela se achava para não ter que fazer um trapiche
novo. Ele ainda aconselhou ao rei que se fizessem todas as outras
fábricas “vedorias, treim, armazéns de munições, e petrechos” dentro
do forte, menos a alfândega. No ano seguinte, o engenheiro manteve
o parecer. O governador Duarte Sodré mandou outra carta ao conse-
lho, que a repassou ao engenheiro para que ele mesmo analisasse. Na
carta, o governador afirmava que os padres tinham vista para o mar e
não estavam sem ar para respirar, que as casas que impactavam a vista
eram construídas por eles mesmos, os quais cobravam aluguel. Junto
com a carta, o governador mandou uma planta do Forte do Matos.
Segundo o engenheiro Manuel de Maia, a carta do governador
não alterou em nada a sua decisão. Expressando categoricamente
que não tinha afeto pelos padres da congregação. Em relação ao
forte ele afirmava que “sempre me parece propríssimo para nele se
fabricarem com separação as outras fábricas pertencentes ao real
serviço, como vedorias, treim, armazéns de munições, petrechos e
tudo o mais, que não for alfândega”. Caso o rei não quisesse cons-
truir os armazéns e mais casas dentro do forte, que não o fizesse.
Porém, construísse a alfândega onde ela estava (o trapiche de Pedro
Mascarenhas). No final da carta, o coronel e engenheiro Manuel de
Maia, ainda coloca que não poderia louvar a planta (risco) feita pelo
ajudante das fortificações e assinado pelo governador, tendo em vista
a “falta da escala ou petipé, bem que só a reputo por acidental, es-
quecimento”.42 Em outras palavras, o engenheiro disse que a planta,

42 Documentos Históricos da Biblioteca Nacional, per094536_100, p. 104-109.

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CONFLITOS DE JURISDIÇÃO NA “NOVA ALFÂNDEGA DE PERNAMBUCO”:
Governador vs. Provedor da Fazenda Real (1727-1737) 81

sem as devidas medidas, não tinha como ser analisada e que nem o
governador, tampouco o ajudante das fortificações, tinham o conhe-
cimento específico para poderem elaborar uma planta, sendo cômico
mandar ao Conselho Ultramarino uma dessa forma.43
É importante ressaltar que, na carta enviada pelo governador Duarte
Sodré, no dia 4 de setembro de 1734, o governador veementemente
tenta desconstruir todos os pareceres a favor de se reformar a
alfândega mantendo-a onde ela estava e não poupando de críticas
aos padres, aos engenheiros da capitania e inclusive o engenheiro do
reino. Para o governador, todos estavam envolvidos em um complô
contra ele, ficando todos a favor dos padres.44
O parecer do Conselho e do procurador da Fazenda em relação a
essa carta foi o seguinte:

O zelo louvável com que o governador entrara na


matéria parecia que tinha já degenerado, e que a tei-
mava e o mesmo considerava ele procurador da Fa-
zenda e, os mais, e que de presente se tratava só de
defender seu primeiro parecer e argumentar contra
os depostos, mas porque não entendia o mesmo da
indiferença e verdade que reconhecia em o coronel
Manuel da Maia (...).45

Através da documentação, fica muito claro que a atuação e posi-


ção do governador já esbarravam em entendimentos de pessoas im-
portantes e próximas à Coroa, que passaram a argumentar apontando
que o governador defendia seus interesses em relação à construção
no forte e fincava-se em manter sua posição na luta pelo poder na
relação direta ao provedor da Fazenda Real e aos padres da congre-

43 Lisboa, 14 de novembro de 1738. Parecer do Conselho Ultramarino acerca da construção de


nova fortaleza sobre a estrutura da fortaleza dos Matos, solicitada pelos padres da Congrega-
ção do Oratório de São Felipe Néri, na capitania de Pernambuco. Anexos: 57 docs. Arquivo
Histórico Ultramarino, Avulsos de Pernambuco. AHU_ACL_CU_015, Cx. 53, D. 4617.
44 Idem
45 Documentos Históricos da Biblioteca Nacional, per094536_100, p. 104-109. Coronel de
Manuel da Maia foi um engenheiro magistral em sua trajetória em Portugal, o qual ajudou
na reconstrução de Lisboa após o terremoto, já com mais de 90 anos.

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 63-87, 2018


82 Luanna Maria Ventura dos Santos Oliveira

gação, do que propriamente uma melhoria para a arrecadação da


Fazenda Real.
Além de Manuel de Maia, também foi ouvido no processo o enge-
nheiro-mor Manuel Azevedo Fortes, o qual declara haver uma “por-
fiada disputa (...) entre o governador da capitania de Pernambuco
e o provedor da Fazenda Real (...) sobre qual sítio se deve escolher
para a fábrica de uma alfândega”. Em seus pareceres de 1732, 1735 e
1738, afirma ser o melhor sítio o “das casas de Pedro Mascarenhas”46,
pois, em relação ao forte, a restinga de areia era o grande inconve-
niente “que vai sempre crescendo e crescerá muito mais[...]”47. Orde-
nado por Sua Majestade Real, o engenheiro-mor analisou os papéis,
juntamente com outras duas autoridades, o brigadeiro João Masse e
o coronel Joseph de Silva Paio, e concluíram que a demora para se
fazer a execução da obra fora a “teima mal fundada do governador
que não tinha razões para botar acerto na matéria”48.
O Conselho, reunido em 28 de abril de 1735, deu seu parecer ba-
seado nos novos pareceres, decidindo separar as duas questões que
norteavam o processo. A primeira, em relação aos requerimentos dos
padres oratorianos sobre o sítio do Forte do Matos: foi decidido pelo
conselho que o rei deveria “escusar, ordenando ao governador que
lhes não permita mais obras do que têm feito ou sejam para o con-
vento ou para alugarem, e que no Forte do Matos se podem edificar
as oficinas que aponta o coronel Manuel de Maia[...]”49.
Para a segunda questão, agora envolvendo a alfândega, o con-
selheiro Gonçalo Manuel Galvão de Lacerda concorda que o lugar
escolhido seja o armazém do Pedro Mascarenhas, mas aponta as fra-
gilidades administrativas da Fazenda Real em Pernambuco:

como a Fazenda Real de Pernambuco tem maior des-

46 Lisboa, 14 de novembro de 1738. Parecer do Conselho Ultramarino acerca da construção


de nova fortaleza sobre a estrutura da fortaleza dos Matos, solicitada pelos padres da Con-
gregação do Oratório de São Felipe Néri, na capitania de Pernambuco. Anexos: 57 docs.
Arquivo Histórico Ultramarino, Avulsos de Pernambuco. AHU_ACL_CU_015, Cx. 53, D.
4617.
47 Idem
48 Idem
49 Documentos Históricos da Biblioteca Nacional, per094536_100, p.156.

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 63-87, 2018


CONFLITOS DE JURISDIÇÃO NA “NOVA ALFÂNDEGA DE PERNAMBUCO”:
Governador vs. Provedor da Fazenda Real (1727-1737) 83

pesa que a sua receita, parece a ele, conselheiro, que


Vossa Majestade seja servido ordenar à repartição dos
armazéns dê a providência necessária para se assisti-
rem em Pernambuco as despesas do comboio, visto
que esta despesa há muitos anos se faz por aquela
provedoria, o que tem impossibilitado o poder ela as-
sistir as suas despesas ordinárias, e muito mais servirá
de impedimento para se fazer uma aplicação certa
para a despesa destas novas obras, sem o que não
poderão elas fazer-se50.

O parecer do conselheiro traz à tona uma nova informação em re-


lação à “repartição dos armazéns”, órgão situado em Lisboa, que não
conseguia assistir às despesas das Naus do Comboio e, consequente-
mente, fazia com que a provedoria de Pernambuco assumisse esses
gastos, que a impossibilitava de suprir suas despesas ordinárias.51
Em decorrência do déficit financeiro da provedoria de Pernambu-
co, o Conselho Ultramarino acaba assumindo indiretamente o prejuí-
zo, pois ele teria que arcar com essas lacunas nas contas, seja através
de outra provedoria do ultramar, como a Provedoria-mor ou através
do não recebimento das receitas de Pernambuco, que ocasionavam
sérios problemas na arrecadação da receita, ou seja, um efeito do-
minó nas contas do Conselho.52
As despesas das naus, que eram responsabilidade anteriormente
da Junta de Comércio, causaram grandes problemas no âmbito fiscal
para as contas da Fazenda Real.
Percebemos, através da citação, que o problema não fora solucio-
nado, o que causava apenas um jogo de repasse de responsabilida-
des sobre as naus dos comboios. As repartições fazendárias do reino
não queriam arcar com os custos das naus, transferida a obrigação

50 Idem
51 Documentos Históricos da Biblioteca Nacional, per094536_100, p.156.
52 Como repartições, me refiro ao Conselho Ultramarino e ao Consulado de Lisboa. Aos
quais foram repassadas letras, por ordem do vice-rei, Conde de Galvéias, nesse ano de
1734. Para suprir as despesas das Naus das Índias e as Naus do Comboio. Arquivo Histó-
rico Ultramarino, Avulsos de Pernambuco_ AHU_ACL_CU_015, Cx. 53. D. 4617. Folha
0145.

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 63-87, 2018


84 Luanna Maria Ventura dos Santos Oliveira

da Junta de Comércio para o Conselho da Fazenda, e dele para as


repartições dos armazéns, que também não arcavam com as despe-
sas. Acabava sobrando para a provedoria de Pernambuco suprir com
essas despesas, mesmo que as ordens reais fossem de não se repassar
o dinheiro. Porém, como as naus do comboio seguiriam viagem sem
suprimentos? E será que o provedor não estava sendo persuadido
pelas autoridades do comboio?
O que sabemos é que o provedor não poderia deixar os soldados
do comboio passarem fome, pois acredito que a chegada desses na-
vios ao porto do Recife provocava um grande alvoroço para as auto-
ridades da capitania, que não poderiam fugir de tais despesas. Caso
não as fizessem, possivelmente a desordem tomaria a vila do Recife.
Em 24 de outubro de 1736, o rei remeteu mais uma ordem ao go-
vernador da capitania. Mandou que fizesse mais uma planta do bairro
do Recife, com orçamento para os dois projetos de construção da nova
alfândega, porém que na planta estivesse sinalizado o trapiche que es-
tava em uso e que seria comprado. Após a entrega desses orçamentos,
ele decidiria qual seria o mais vantajoso para a Fazenda Real.53
Como resposta à ordem, o governador rebateu que não iria man-
dar os orçamentos porque já estavam inclusos no processo do re-
querimento dos padres quentais de Pernambuco, e que não seria
necessário fazer-se a dita obra:

[...] pela segurança com que está a dita alfândega, tem


mostrado a experiência que se não necessita de maior
casa pelo que se tem experimentado em quatro fro-
tas, aonde coube as fazendas que nelas vi eram sem
ser necessário alugar-se armazém, porque se dava de
renda duzentos mil reis até trezentos cada ano.54

Essa foi a última carta do governador Duarte Sodré referente à

53 Lisboa, 27 de janeiro de 1744. Consulta do Conselho Ultramarino ao rei [D. João V], sobre
o forte do Matos, solicitada pelos padres da Congregação do Oratório de São Felipe Néri,
e acerca das obras de que necessita a Alfândega da capitania de Pernambuco. Anexos: 14
docs. Arquivo Histórico Ultramarino, Avulsos de Pernambuco_ AHU_ACL_CU_015, Cx.
60. D. 5100.
54 Idem

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 63-87, 2018


CONFLITOS DE JURISDIÇÃO NA “NOVA ALFÂNDEGA DE PERNAMBUCO”:
Governador vs. Provedor da Fazenda Real (1727-1737) 85

Alfândega de Pernambuco, seu governo já havia terminado. O que


ocorreu no dia 24 de agosto de 1737, data da carta acima? Talvez, de-
pois de tantas querelas, ele tenha se aborrecido, deixando para o seu
sucessor a tarefa de reorganizar a alfândega da capitania. Dois dias
após a escrita da carta, Duarte Sodré Pereira veio a falecer na cidade
de Lisboa, com 72 anos de idade (SILVA, 1992: 56).
Podemos concluir, através desse artigo, que os conflitos de juris-
dição entre o provedor e o governador partiam da intromissão de
Duarte Sodré sobre a alçada do provedor da Fazenda João do Rego
Barros. Por diversas vezes, o governador tomava a frente nas ques-
tões da administração fazendária, entre elas, a escolha do melhor
lugar para a construção da nova Alfândega de Pernambuco. Além
disso, as cobranças dos tributos da capitania feitas pelo governador
feria completamente a independência da administração do provedor,
no que tange às questões fazendárias da capitania.
Infelizmente não foi possível identificar, na documentação, as de-
núncias do provedor da fazenda sobre a intromissão do governador,
em sua correspondência com o Conselho Ultramarino do período
recortado. O provedor João do Rego Barros é bastante sintético em
relação às diferenças políticas em Pernambuco, sendo suas cartas
extremamente técnicas em relação à administração da Fazenda Real
em Pernambuco. Tal silêncio pode ser reflexo do seu poder político
na capitania, suas afrontas ao governador só aparecem por denúncia
nas cartas de Duarte Sodré. Talvez a propriedade do ofício de pro-
vedor e juiz da alfândega dessem ao João do Rego Barros segurança
de que não seria atingido e que o governo era temporário, no caso,
já em seu final.
Foi o governador Henrique Luiz Vieira Freire quem deu continui-
dade às ordens do rei, referentes ao processo da construção da “nova
Alfândega de Pernambuco”. Sabemos que foi suspensa a compra ou
a construção, pois as rendas da capitania “se achavam exaustas e sem
meio algum de poder fazer esta despesa...”.55 Por fim, a Alfândega de

55 Lisboa, 27 de janeiro de 1744. Consulta do Conselho Ultramarino ao rei [D. João V], sobre
o Forte do Matos, solicitada pelos padres da Congregação do Oratório de São Felipe Néri,
e acerca das obras de que necessita a alfândega da capitania de Pernambuco. Anexos: 14
docs. Arquivo Histórico Ultramarino, Avulsos de Pernambuco_ AHU_ACL_CU_015, Cx.
60. D. 5100.

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 63-87, 2018


86 Luanna Maria Ventura dos Santos Oliveira

Pernambuco permaneceu por muito tempo no trapiche alugado ao


vice-rei da Índia, o Conde de Sandomil.56

Referências

Fontes manuscritas

AHU_ACL_CU_015, Cx. 40, D. 3630.


AHU_ACL_CU_015, Cx. 53, D. 4617.
AHU_ACL_CU_015, Cx. 34, D. 3090.
AHU_ACL_CU_015, Cx. 60. D. 5100.
AHU_ACL_CU_015, Cx. 30, D. 2672.
AHU_ACL_CU_015, Cx. 53. D.4614.
AHU_ACL_CU_015, Cx. 41, D. 3684.

Biblioteca Nacional

Albuquerque, Francisco Bezerra Cavalcanti de. Cathalogo das Reais Ordens


existentes no arquivo da extinta Provedoria de Pernambuco, 1799. Microfil-
me.

Documentos Históricos da Biblioteca Nacional

Documentos Históricos da Biblioteca Nacional, per094536_099.


Documentos Históricos da Biblioteca Nacional, per094536_100.

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56 Idem

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 63-87, 2018


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JUÍZO DO FISCO REAL E INQUISIÇÃO –
normas e práticas da apreensão, posse e administração de bens
confiscados pelo Santo Ofício1

Davi Celestino da Silva2

Resumo: Este artigo apresenta a nossa compreensão de alguns as-


pectos acerca da atuação da justiça do Juízo do Fisco Real. Escolhe-
mos apresentar e dialogar com os assuntos relacionados a matéria de
fé que também fizeram parte do organograma institucional do Impé-
rio português. Neste sentido, tanto em Portugal, como em relação aos
espaços do além-mar, a Coroa portuguesa lançou mão dos mesmos
expedientes, ou seja, manter-se vigilante com relação às práticas re-
ligiosas de seus súditos e buscar o predomínio e fortalecimento da
Santa Fé. Garantidora da justiça, a Coroa portuguesa em matéria de fé
era assistida pelo Tribunal do Santo Ofício. Mas também contava com
outros expedientes, a exemplo de ações ordinárias voltadas àqueles
que incidiam em erros de fé, como o crime da heresia, executadas
pelo Juízo do Fisco Real.

Palavra- chaves: Heresia, Juízo do Fisco Real, Inquisição.

Royal treasury court and Inquisition -


norms and practices in the complex legal architecture that
affected seizures, possession and administration in the
confiscation of assets

Abstract: This article presents our understanding of some aspects


about the performance of the justice of the Royal Treasury Court. We
chose to present and discuss matters related to faith that were also
part of the institutional structure of the Portuguese Empire. In this

1 Nota dos editores: Uma primeira versão desse texto foi publicada no XXIX Simpósio
Nacional de História, organizado pela Associação Nacional de História, em 2017. Para
a versão, cf.: http://www.snh2017.anpuh.org/resources/anais/54/1501628002_ARQUI-
VO_Artigo-davisilva-Inquisicaoeconfiscodebens.pdf
2 Mestre em História pela Universidade Federal Rural de Pernambuco. Doutorando em
História pela Universidade Federal de Pernambuco.
90 Davi Celestino da Silva

sense, both in Portugal and in relation to the overseas territories, the


Portuguese Crown used the same expedients, that is, to be vigilant
in relation to the religious practices of its subjects, that is, to seek the
predominance and strengthening of Santa Fé. Guarantor of justice,
the Portuguese Crown was assisted in matters of faith by the Court of
the Holy Office. But also, it counted on other expedients, like ordi-
nary actions directed to those that committed errors of faith, such as
the crime of heresy, executed by the Royal Treasury Court.

Keywords: Heresy, Royal Treasury Court, Inquisition.

Para além do zelo pelos domínios e possessões que possuíam os


monarcas lusitanos, também fazia parte do plano português, no que
diz respeito à expansão territorial de seu império, reprimir o cresci-
mento e a proliferação do protestantismo e calvinismo nos domínios
do Império Português (HESPANHA, 2010) – evento que já ocorria na
Europa – sobretudo, nas áreas de interesses econômicos como as
capitanias da Bahia e Pernambuco. Das perseguições e condenações
ocorridas nos Estados europeus, decorre desse ambiente a institu-
cionalização de órgãos cuja composição e atuação consolida uma
cooperação entre Estado e Igreja, buscando o controle, a vigilância e
a orientação da vida em sociedade (CRUZ, 2007: 107-126).
A Coroa portuguesa em matéria de fé era amplamente fundamen-
tada pelo Tribunal do Santo Ofício, instituição bicéfala, ou seja, criada
pela Santa Fé, mas regulada e administrada pelos monarcas. Diferen-
temente da Espanha que implantou um tribunal inquisitorial em sua
porção territorial na América espanhola, Portugal apenas contou com
alguns dos agentes e oficiais inquisitoriais. Para além de comissários,
notários e qualificadores, a malha inquisitorial atuante em Pernambu-
co também contou com revedores, visitadores das naus e familiares
do Santo Ofício.
Em linhas gerais, àqueles agentes da Fé buscavam no âmbito de um
contexto de controle social reprimir crimes contra a ordem e a moral.
Isto é, os crimes contrários a ordem eram aqueles que ofendiam os
dogmas religiosos, já os crimes de caráter natureza moral, eram aque-
les que ofendiam a moral imposta pela Igreja católica, a exemplo de
desobediências às regras do casamento, desvios sexuais, ou mesmo,

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 89-113, 2018


JUÍZO DO FISCO REAL E INQUISIÇÃO –
normas e práticas da apreensão, posse e administração de bens confiscados pelo Santo Ofício
91

pensamentos impuros em relação à vida sexual. Outras penas também


merecem destaque, como o confisco de bens, crime este pertencente
ao rol dos crimes contra a ordem (CIDADE, 2009: 19).
Acertadamente, a professora Sônia Siqueira destaca que a ação do
Santo Ofício na América portuguesa prendeu-se à tônica que domi-
nou a vida colonial. Na criação de uma réplica do mundo português
além-mar, impôs-se o Direito, que se converteu num instrumento de
aplicação a cambiante realidade dos valores cotidianos, tidos por uni-
versais e permanentes. Na América portuguesa, estiveram em vigor
tríplices leis, a saber, régias, eclesiásticas e inquisitoriais, que muitas
das vezes se misturaram para atender as exigências de dois planos:
o da defesa da ortodoxia, da Igreja, e o da defesa da unidade das
consciências, do trono, leis estas que representaram a complexidade
jurídica vigente tanto em Portugal, quanto aqui na América portugue-
sa (SIQUEIRA, 1996: 497).
Para o teórico do direito António Manuel Hespanha os juízes por-
tugueses, ainda que tivessem jurisdição sobre os nativos, cabia-lhes
aplicar o seu próprio direito, ou seja, o direito específico do nativo,
exceto em situações que estivessem em causa valores supremos da
ordem jurídica ou da ética europeia, isto é, o âmbito do foro religioso
(HESPANHA, 2010: 173).
À compreensão do professor Hespanha, para além de confirmar a
tese defendida por ele próprio, ou seja, a do direito pluralista portu-
guês, também alinha, no entanto, uma série de argumentos justifica-
tivos. Em primeiro lugar destacamos a importância da religiosidade,
ou seja, da grande diferença entre a visão acerca do mundo que nos
rodeia hoje daquela a séculos atrás, uma divergência amparada por
visões muito dispares sobre a existência humana e o devir universal.
O homem da época da Reforma, estivesse ele do lado católico ou
protestante, aceitava a existência de Deus e a ideia de que Ele era a
origem de toda a verdade. Esta panóplia de argumentos acima men-
cionada favorece ainda discussão acerca da concepção de um direito
inquisitorial há pouco lembrado por Sônia Siqueira.
Ou seja, partindo de situações nas quais o indivíduo era sub-
metido a julgamentos no âmbito do foro religioso, incluindo aí a
jurisdição inquisitorial, era por meios dos regimentos do Tribunal do
Santo Ofício que se materializavam as regras e práticas processais, ou

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92 Davi Celestino da Silva

seja, a processualística inquisitorial. Também eram nos regimentos


que se estatuíam ritos, etiquetas, cerimônias públicas ou privadas,
como também a regularização acerca das aplicações de penas que
serviram como parâmetros moral e religioso, como numa espécie de
controle pedagógico nas sociedades tanto lusitana como da Améri-
ca portuguesa. Neste sentido, analisando por meio dessa pequena
amostragem de casos, comporta-se à compreensão de um direito
inquisitorial.
O estudo da Inquisição tem sido feito em linhas gerais seguindo
dois tipos de enfoques: analisar as transgressões como determinan-
tes das perseguições empreendidas pela Inquisição, ou, sob a ótica
voltada aos aspectos jurídico-institucionais do Tribunal do Santo Ofí-
cio, a proposta deste estudo se enquadra nesta segunda vertente. Ao
tentarem compreender a ação da Inquisição Ibérica, vários autores
fizeram uso de certas interpretações, das quais a ideia de que a per-
seguição ao cristão-novo era motivada pelas condições econômicas,
identificando os perseguidos como burguesia nascente, os quais se-
riam alvo da cobiça dos cristãos-velhos, identificados com a nobreza
(SARAIVA, 1985).
Em termos conceituais o Tribunal do Santo Ofício português, ins-
tituído em 1536, fez parte dos grandes conselhos portugueses, ou
seja, o rei, ao mesmo tempo em que garantia a realização da justiça,
era assistido por uma série de grandes conselhos especializados nas
diferentes áreas da vida na época (CAMARINHAS, 2010: 59). Já com
relação a Inquisição, esta se enquadrava dentro da ação jurídica da
Igreja Católica Romana, cujo objetivo era combater os crimes contrá-
rios a ordem e a moral da Santa Fé católica. Ainda segundo Michel
Foucault, foi a Inquisição medieval, que de uma forma ou de outra
instaurou as bases do processo judicial moderno, participando da
construção de toda a cultura ocidental, já que no processo inquisito-
rial começam a se reduzir a escrito as memórias, isto é, depoimen-
tos e decisões do julgamento. Neste sentido, surge uma burocracia
judicial: meirinhos e notários; as fases processuais são organizadas
seguindo uma certa clareza e, mesmo, se reconhece a necessidade da
presença de um advogado de defesa (FOUCAULT, 2002).
A atividade jurisdicional da justiça do Fisco é pouco estudada
na literatura inquisitorial aqui no Brasil; como também é muito mal

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JUÍZO DO FISCO REAL E INQUISIÇÃO –
normas e práticas da apreensão, posse e administração de bens confiscados pelo Santo Ofício
93

conhecida: o silêncio das fontes, o desinteresse de estudos sobre a


temática, como também, a ausência de funcionários, criaram na his-
toriografia inquisitorial a propensão para subvalorizar a importância
do juízo do Fisco. Embora, neste último quesito, a saber, a falta de
agentes do Fisco na colônia portuguesa, nos foram de grande valia
algumas literaturas que puderam iluminar nossa análise. Antônio
José Victoriano Borges da Fonseca, registra, para a região da Capita-
nia de Pernambuco, a presença de Gonçalo Novo de Lira, tesoureiro
fiscal do Santo Ofício da Capitania de Pernambuco – em data não
indicada – quando o ouvidor de Pernambuco fez arrematar os bens
de Beatriz Fernandes, filha de Diogo Fernandes e Branca Dias (FON-
SECA, 1935: 477).
Já José Antônio Gonsalves de Melo, ressalta, em sua obra Gente
da Nação, que durante o processo de habilitação a familiar do Santo
Ofício de Gonçalo Novo de Lira – o filho –, o coronel Francisco Be-
renguer de Andrade, em depoimento de 10 de julho de 1710,3 afir-
mou ser Gonçalo Novo de Lira – o pai – tesoureiro e fiscal do Santo
Ofício (MELLO, 1996: 164-165). Apesar das informações de Borges da
Fonseca em sua Nobiliarquia com relação a Gonçalo Novo de Lira ao
longo do texto, pois, ora o refere como procurador fiscal do Santo
Ofício, ora como promotor fiscal, como já discutido, a região da Capi-
tania de Pernambuco não contou com funcionários do Juízo do Fisco,
logo, lançou mão de outros funcionários, situação que acreditamos
também ocorrera nas demais capitanias anexas.
Pensar na aplicação de uma das principais penas impostas pelo Tri-
bunal do Santo Ofício – o confisco de bens – aos condenados pelo cri-
me de heresia, na qual acarretava a ruína de toda uma família, devido
sua intervenção ser voltada diretamente ao âmbito financeiro, é propor
alguns questionamentos sobre gestão, uso e aplicabilidades daqueles
bens confiscados por meio das instituições que os administrava.
De acordo com Anita Novinsky, uma das pioneiras a se debruçar
sobre a literatura inquisitorial no Brasil, em sua obra Gabinete de
investigação: uma “caça aos judeus” sem precedentes, aponta que
as investigações sobre a ação inquisitorial na América portuguesa

3 O identificamos como testemunha no caso de Felipe Paes Barreto (MELLO, 2009), como
também do fidalgo José Gomes de Melo (SILVA, 2016).

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 89-113, 2018


94 Davi Celestino da Silva

num período entre os séculos XVI ao XVIII revelam a existência de


sociedades subterrâneas, onde pululavam crenças, valores e tradi-
ções proibidas pela ação do Santo Ofício. Novinsky também registra
que existe um certo exagero na literatura inquisitorial em afirmar a
influência dos judeus na formação da Companhia das Índias Oci-
dentais, como também no mundo financeiro holandês (NOVINSKY,
2007: 11).
Anita Novinsky também nos dá outras importantes contribuições
para uma melhor compreensão dos mecanismos jurídicos acerca da
ação do Juízo do Fisco na série Fontes para a História de Portugal e
do Brasil. A coleção é composta por quatro volumes, incluindo a já
mencionada. No primeiro volume Inquisição - Inventários de Bens
Confiscados a Cristãos Novos no Brasil, Século XVIII (1976) destaca a
transcrição de 129 inventários dos bens confiscados aos presos cris-
tãos-novos de várias regiões do Brasil no século XVIII. Já o segundo
volume, Inquisição Rol dos Culpados, apresenta um índice com 1819
nomes de cristãos-novos no Brasil no século XVIII, uns presos, outros
apenas denunciados com suspeita de judaísmo (NOVINSKY, 1992).
Por fim, o terceiro volume Inquisição- Prisioneiros do Brasil (2009)
destaca um total de 1.076 nomes de brasileiros presos pelo Santo
Ofício entre os séculos XVI ao XIX, incluindo ai cristãos-novos e cris-
tãos-velhos acusados por diversas heresias.
Apesar da contribuição à historiografia inquisitorial dos trabalhos
acima, Novinsky preocupa-se em avaliar a atuação da prisão do he-
rege apenas transversalmente do ponto de vista religioso, ou seja,
a partir do âmbito persecutório da Inquisição. A autora destaca as
prisões de judeus e cristãos-novos devidamente aos seus comporta-
mentos e crenças.
Cumpre lembrar, que tal linha de observação foi por muito tempo
adotada por aqueles que dedicaram algumas linhas acerca da pre-
sença inquisitorial na América portuguesa a exemplo do sociólogo
Gilberto Freyre ao destacar que a inquisição escancarou nossa vida
íntima da era colonial, sobre as alcovas e suas camas que em geral
parecem ter sido de couro, rangendo as pressões dos adultérios e dos
coitos danados. Sobre as relações de brancos com escravos, as confis-
sões e denúncias reunidas pelo Santo Ofício na América portuguesa
reunem material precioso sobre a vida sexual e de família entre os

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 89-113, 2018


JUÍZO DO FISCO REAL E INQUISIÇÃO –
normas e práticas da apreensão, posse e administração de bens confiscados pelo Santo Ofício
95

séculos XVI e XVII (FREYRE, 2006: 45).


Os estudos direcionados acerca da ação e procedimentos do Juízo
do Fisco na América portuguesa ainda são escassos. Lina Gorenstein
no livro A Inquisição contra as mulheres retrata a ação inquisitorial
na praça fluminense entre os séculos XVII e XVIII, destaca que nas
quatro primeiras décadas do século XVIII a Inquisição prendeu tre-
zentos e vinte e cinco cristãos-novos no Rio de Janeiro, dos quais
cento e sessenta e sete eram mulheres. Analisando seus processos a
autora constatou nos inventários de bens daquelas mulheres que o
“bem” mais constante era a posse de escravos (GORESTEIN, 2005:
111, 183).
Gorenstein também menciona a existência, no Arquivo Nacio-
nal da Torre do Tombo, de documentos que expõem reclamações
ao confisco de bens e de tentativas de burlar o Fisco (GORESTEIN,
2005: 137). Com relação às reclamações temos informações que os
herdeiros dos condenados – esposas, filhos ou maridos – poderiam
requisitar a sua parte antes que o confisco fosse efetivado, assim
como qualquer pessoa que tivesse alguma dívida a receber dos réus
(SIQUEIRA, 1970: 323-340).
Ainda de acordo com o professor Bruno Feitler, a história do Juízo
do fisco real – diferenciado do Conselho da Fazenda – é difícil de
se apreender por causa de seu estatuto ambíguo. Ou seja, segundo
as leis canônicas, os bens dos hereges devem ser confiscados em
benefício da Coroa, daí seu estatuto real do Tribunal do Fisco. No
entanto, era o Inquisidor geral, ou o Conselho Geral do Santo Ofício
que controlava a gestão dos bens confiscados, nomeando assim os
juízes do fisco. Ainda segundo o autor, essa origem “bicéfala” esteve
no cerne de vários conflitos entre a Coroa e os inquisidores (FEI-
TLER, 2007: 104).
Nossa proposta é sair das questões mais gerais, ou seja, dos dados
quantitativos acerca daqueles que foram penalizados com o confisco
de bens por si só, isto é, que sofreram a ação ordinária da justiça
inquisitorial – os cristãos-novos – que em linhas gerais apresentam-
-se tão somente como números em quadros e tabelas. Priorizamos
esboçar a arquitetura jurídica dos mecanismos institucionais que le-
gitimam e enquadram nas ações jurisdicionais os condenados pelo
Santo Ofício, com a aplicação do confisco de bens, a saber, o Re-

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gimentos dos Juízes das Confiscações Pelo Crime de Heresia, como


também o Regimento do Juízo das Confiscações Pelo Crime de Heresia
e Apostasia.4
Para uma melhor compreensão acerca da ação e dinâmica do
Juízo do Fisco, faz-se necessário ressaltar alguns detalhes. Primeira-
mente, quem é o Juiz do Fisco? Quais critérios são impostos para tal
cargo? E mais, quem o nomeia? Essas perguntas podem ser respondi-
das pela principal fonte distribuidora da justiça, isto é, próprio o rei:
primeiramente, o juiz do fisco será pessoa de boa consciência, letras
e de muita confiança. Sem descendência moura ou judia, e será por
mim nomeado e provido de tal ofício.5 Vários são os fatores que tal
enunciado real nos fornece. Contudo, fica claro, a fundamentação ado-
tada pelo monarca àqueles que fazem parte do corpo funcional de
suas instituições, ou seja, a adoção do critério de limpeza de sangue,
dispositivo legal jurídico que normatiza os valores vigentes das socie-
dades da Europa e Além-mar à época do Antigo Regime, forjada pela
fenda étnica, social e religiosa entre cristãos-velhos e cristãos-novos.
Também é interessante destacar que para o estudo da pro-
cessualística inquisitorial, iniciada por aquele juízo, é necessário que
entendamos o modo por meio do qual as pessoas eram denunciadas
pelo crime da heresia, que, por conseguinte, caso fossem considera-
das culpadas, aplicava-se o confisco de bens.
Nas Constituições Primeiras do Arcebispado da Bahia, fica cla-
ro àqueles que incorrem em erros de fé, neste sentido, “[...] que o crime
da heresia, e judaísmo se extinga, [...] possa ser punido pelo Tribu-
nal do Santo Ofício o delinquente, conforme os Breves Apostólicos”
(VIDE, 1853: 311). Desse modo, cabia aos Familiares do Santo Ofício
em seu exercício no âmbito da justiça inquisitorial executar a prisão,
sendo logo em seguida dado início aos sequestros dos bens dos acusa-
dos, por crimes como os acima mencionados nas constituições.
Vale lembrar que o confisco de bens também era aplicado

4 Cumpre salientar que o primeiro Regimento é datado no período do monarca Dom Sebas-
tião, enquanto que o seguinte Regimento foi elaborado durante o período da União Ibérica.
5 Regimento dos juízes das confiscações pelo crime de heresia. Códice 311- Relação
da Bahia – 1752. Arquivo Nacional – Rio de Janeiro.

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JUÍZO DO FISCO REAL E INQUISIÇÃO –
normas e práticas da apreensão, posse e administração de bens confiscados pelo Santo Ofício
97

aos culpados pelo crime de sodomia.6 Ou seja, tanto as Ordenações


Afonsinas, quanto as Manuelinas preconizavam que a sodomia era
o mais sujo, torpe, desonesto de todos os crimes, sentenciando seus
praticantes à fogueira (CIDADE, 2009: 79).
Vejamos no livro V das Ordenações Filipinas, o mais dura-
douro código legal português que fora promulgado em 1603 por
Filipe I, rei de Portugal, e que ficou em vigência até 1830. Nele veri-
fica-se que para além de apontar um conjunto de dispositivos legais
que definiam os crimes e a punição dos criminosos, constituindo
assim uma forma explícita de afirmação do poder régio, tal conjunto
também nos esclarece acerca do crime de sodomia:

Toda a pessoa, de qualquer qualidade que seja, que


pecado de sodomia por qualquer maneira cometer,
seja queimado e feito por fogo em pó, para que nun-
ca de seu corpo e sepultura possa haver memoria,
e todos seus bens sejam confiscados para a Coroa
de nossos reinos, posto que tenha descendentes pelo
mesmo caso seus filhos e netos ficarão inábeis e infa-
mes, assim como os daqueles que cometem crime de
lesa-majestade7.

Já com relação ao crime de heresia o código filipino nos esclarece que:

O conhecimento do crime da heresia pertence prin-


cipalmente aos juízes eclesiásticos.8 E porque eles
não podem fazer as execuções nos condenados no
dito crime por serem de sangue, quando condena-

6 É licito destacar que só a partir do Regimento de 1613 que a sodomia passou a ser um
crime da alçada inquisitorial, como também vale destacar que a Inquisição só punia pelo
crime de sodomia quando esta era considerada “perfeita”, ou seja, devendo haver ejacula-
ção no “vaso traseiro”.
7 Título 13. DOS QUE COMETEM PECADO DE SODOMIA E COM ALIMÁ-
RIAS. In: Ordenações Filipinas: Livro V / Organização Silvia Hunold Lara, – São Pau-
lo: Companhia das Letras, 1999. p.91.
8 O juízo eclesiástico regia-se pelo direito canônico, não pelas Ordenações. O Tribunal
eclesiástico mais importante era o do Santo Oficio.

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98 Davi Celestino da Silva

rem alguns hereges, os devem remeter a nós com


as sentenças que contra eles derem, para os nossos
desembargadores as verem, aos quais mandamos que
as cumpram, punindo os hereges condenados, como
por direito devem. E além das penas corporais que
aos culpados no dito maleficio forem dadas, serão
seus bens confiscados, para se deles fazer o que nos-
sa mercê for, posto que filhos tenham.9

Vários são os pontos e pistas que podemos observar a partir das


duas colocações expostas pelas Ordenações Filipinas acima. Nossa
primeira observação encontra-se na menção que o primeiro texto
exprime: ou seja, toda a pessoa, de qualquer qualidade que seja. Aqui
fica claro por meio desse anunciado que a Inquisição buscava um
nivelamento acerca de suas sentenças, no entanto, pessoas de boa
condição social e que fossem discretas, a sentença era lida dentro das
“instalações” inquisitoriais; já, no caso de pessoas menos afortunadas
financeiramente e, ademais, escandalosas, lia-se a sentença durante
um auto-de-fé (CIDADE, 2009: 87). Desse modo, enquanto a denún-
cia igualava a todos no sentido de que à todos permitia-se o dever
de denunciar; a sentença era encarada como sendo um elemento so-
cialmente desnivelador. Em seguida, o que observamos no segundo
texto é que essa dupla sujeição criou um espaço de incerteza hierár-
quica, isso é, materializava e revestia-se num frenético vai e vem de
apelações e conflitos jurisdicionais.
A par das colocações acima acerca do confisco de bens sobre
os hereges, que se revestiu num fator decisivo diante das prisões,
sobretudo, dos cristãos-novos; buscamos em outra documentação a
complementariedade sobre aquela ação inquisitorial, que incluía ri-
cos e pobres,

Tanto que o dito juiz [do fisco] tiver especial Recado


dos Inquizidores por escrito em que lhe fação saber
que mandarão prender algúma pessoa, era logo mui-

9 Título 1. DOS HEREGES E APOSTATAS. In: Ordenações Filipinas: Livro V. Op.


cit. pp. 55- 6.

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JUÍZO DO FISCO REAL E INQUISIÇÃO –
normas e práticas da apreensão, posse e administração de bens confiscados pelo Santo Ofício
99

ta diligencia as cazas donde moravam os culpados


com o escrivaõ do seu cargo, e com outro escrivam,
ou Tabeliaõ, e Tomará, e haverá a sua maõ Todas as
chaves das ditas cazas, e das cazas, que nellas estive-
rem, para que Senaõ possa sobnegar, nem esconder
couza alguã, e mandará (?) hum dos ditos escrivães
que faça seu inventario por (?) apartado de todos os
bens moveis e de Raiz. [...] se possão conhecer, e
saber quaes saõ, e Ter ido pessas de ouro, ou de
prata; Se pezarão; e avaliarãm, por officiaes e pessoas
bem entendidas. [...] e se aSentara nos ditos inventa-
rios com declaraçaõ da validade dellas, [...] naõ possa
haver engano nas ditas pessoas, nem se possaõ por
outras (peças) em seu lugar, nem haja sobre isso du-
vida alguma.10

A documentação acima nos oferece algumas pistas acerca da dinâ-


mica da justiça do Fisco. Privilegiamos dá destaque a organicidade na
distribuição operacional de sua ação. Isto é, para que seja acionado
o procedimento do juiz, torna-se necessário a autorização por escrito
dos inquisidores, logo, essa confidencia, já revela de saída o zelo por
parte do monarca, na tentativa de evitar abusos e descaminhos dos
bens confiscados. No entanto, também havia lugar no Regimento do
Juízo das Confiscações para pessoas de poucas posses, como também
relacionado ao âmbito matrimonial,

E quando os prezos forem Taõ pobres, naõ Tenhaõ fa-


zenda alguma, de que se possa fazer inventarios, os
Officiaes passaraõ Certidaõ de como se naõ fez inveta-
rio da Tal pessoa, por naõ ter fazenda alguma; e estas
Certidões se ajuntaraõ aos mais inventarios, que se fize-
rem: e dado cazo que prendendo-se sômente o marido,
ou só a mulher, se faça inventario de toda a fazenda,
que ao Tal Tempo houver no casal; e depois se pren-

10 Regimento dos juízes das confiscações pelo crime de heresia. Códice 311- Relação
da Bahia – 1752. Arquivo Nacional – Rio de Janeiro.

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100 Davi Celestino da Silva

der aquelle que ficou solto, se fará outro inventario de


novo, porque poderia adquirir bens no meio Tempo.11

Já aqui, a documentação nos revela um outro procedimento jurí-


dico adotado pela justiça do fisco, isto é, a utilização de uma certidão
para contar nos autos que o réu não continha nenhum tipo de bens,
isto é, os denominados presos pobres; e finalmente, a obrigatorieda-
de de um novo inventário no caso do segundo cônjuge também ser
preso, mesmo que já tenha ocorrido um inventário à época da prisão
do primeiro, justificado pela lógica da possibilidade de aquisição de
algum bem durante o período intermediário.
Na tentativa de uma melhor instrumentalização de nosso trabalho,
recorremos aos estudos da historiadora portuguesa Isabel Drumond
Braga, sobretudo, Bens de Hereges. Inquisição e Cultura Material.
Portugal e Brasil (séculos XVII-XVIII). Aqui Isabel Braga compreende
que com o estabelecimento do Santo Ofício em 1536, Portugal12 não
obteve imediatamente a possibilidade de proceder ao confisco de
bens face aos réus. Ainda segundo a autora, a 18 de novembro de
1559, a rainha regente D. Catarina, na menoridade de D. Sebastião,
promulgou um alvará, com aprovação papal, isentando, outra vez, os
cristãos-novos do confisco de bens, por mais 10 anos. No entanto, no
ano de 1563, o cardeal infante D. Henrique, igualmente na qualidade
de regente, revogou o referido alvará com efeitos retroativos. O mes-
mo, por alvará de 26 de Novembro de 1563, isentou do pagamento
da sisa os bens confiscados pelo Santo Ofício e vendidos pelos in-
quisidores, “havendo respeito a serem bens que pertenciam à Coroa
de meus reinos e eu os ter dado e aplicados ao Santo Ofício para
ajuda das despesas dele e os vendedores serem eclesiásticos” (BRA-
GA, 2012: 45).
Tomando por base o quadro acima descrito, ou seja, do mate-
rial confiscado podia-se deles fazer o que nossa mercê for, resume-se

11 Regimento do Juízo das Confiscações Pelo Crime de Heresia, e Apostasia, de 10 de julho


de 1620, de 57 capítulos, publicado por José R. M. de Campos e Soiza no Tomo III do Sys-
tema ou Coleção dos Regimentos Reaes. In: O Governo dos outros: Imaginários Políticos
no Império Português. (Lisboa, 1785), a pp. 196-219.
12 Já com relação à Espanha – leia-se Castela – a Inquisição medieval praticou o sequestro de
bens, a título de medida cautelar. Cf. MILLAN (1984).

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JUÍZO DO FISCO REAL E INQUISIÇÃO –
normas e práticas da apreensão, posse e administração de bens confiscados pelo Santo Ofício
101

àquilo que poderíamos chamar na falta de palavra melhor, “um lugar


de fusão de interesses”. Como também dar-se destaque à outra com-
preensão, isto é, nos faz entender que tais procedimentos estavam
sujeitos à fatores políticos como também monetários.
Por seu lado, Evaldo Cabral de Mello também nos oferece uma
outra compreensão para que possamos entender aquilo que conce-
bemos como “fusão de interesses”; ele aponta em sua obra Olinda
Restaurada: Guerra e açúcar no Nordeste, 1630- 1654, alguns dos
contornos da emblemática “quebra de braço” entre o rei Dom João IV
e o Tribunal do Santo Ofício, acerca do projeto da criação da Compa-
nhia Geral de Comércio do Brasil, projeto este que tivera como maior
incentivador o padre Antônio Vieira.
Mello compreende que à época da Restauração Pernambucana o
restabelecimento da navegação e o livre comércio dependiam da res-
tauração dos engenhos. Como solução o padre Antônio Vieira insistia
no estabelecimento de duas companhias de comércio, uma no Brasil
e a outra para o Estado da Índia. Tais companhias seriam custeadas
com capital judeu, desde que os homens de negócios – a grande
maioria cristãos-novos – tivessem seus bens isentos do confisco pela
Inquisição. A ideia apontada por Vieira fora descartada devido à re-
sistência da Inquisição, em não concordar com a isenção do confisco
de bens dos cristãos-novos. Em 1649, desagradando o Tribunal do
Santo Ofício, Dom João IV por meio de um alvará concede isenção
do confisco de bens;13 aprova a criação da companhia geral de co-
mércio do Brasil, incluindo aí a companhia de comércio de Pernam-
buco (MELLO, 2007: 105-125). Tal procedimento da Coroa em favor
dos cristãos-novos fazia parte da audácia política de Dom João IV, ou
seja, boa parte do financiamento da guerra contra Castela seria pro-
veniente de capital dos cristãos-novos (BETHENCOURT: 2000: 331).
Ainda a respeito desses ecos de forças em colisão, dispomos de
uma significativa explanação apontada pelo historiador português,
João Lúcio de Azevedo em História dos Cristãos-Novos Portugueses.
Segundo Azevedo, com a morte de Dom João IV, entrou em fase
crítica a controvérsia acerca dos confiscos de bens, e devido os acon-

13 Este fato ocasionou na excomunhão do rei D. João IV, pois o alvará régio foi passado sem
prévia autorização papal. Cf.: BRAGA (2012: 46).

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tecimentos, ou seja, devido as ameaças holandesas em relação ao ter-


ritório das Índias,14 era necessária uma expedição de socorro àquele
território. Expedição esta que custaria aos cofres da Coroa trezentos
mil cruzados. Segundo informações do Conselho da Fazenda, não se
podiam desviar das obrigações correntes trezentos mil réis. Com isso,
segundo Azevedo, tomar aquela quantia emprestada não se devia
pensar, pois todos os homens de negócios tinham investido todos os
seus capitais na Companhia do Brasil; os demais eram vassalos po-
bres, o único recurso eram os bens do Fisco (AZEVEDO, 1921: 274).
Recorrendo mais uma vez aos estudos de António Manuel Hespa-
nha com relação aos orçamentos do reino português, o autor aponta
que na categoria das condenações, os rendimentos da justiça também
decorriam do confisco, no qual os condenados pelo Santo Ofício
devessem perder seus bens para a Coroa (HESPANHA, 1994: 122). Já
Francisco Bethencourt nos aponta que a imagem da ação arbitrária –
da Inquisição – é complementada pela imagem da ação interessada.
As penas para os crimes de heresia revestiam-se nos condenados não
apenas a ruína de toda a sua família, sem falar na inabilitação dos
seus descendentes para o exercício de ofícios ou profissões; com
relação ao caso da Inquisição espanhola, o autor compreende que a
remuneração dos funcionários não era estável e tanto as multas quan-
to os confiscos de bens desempenhavam papel significativo na ad-
ministração do Tribunal do Santo Ofício espanhol (BETHENCOURT:
2000: 340). Ainda no recorte espanhol, José Martinez Millan defende
a tese de que as finanças da Inquisição, já na segunda metade do
século XVI, eram relativamente estáveis devido às rendas regulares
provenientes ou da igreja ou do estado. No entanto, parte de seu
orçamento dependia de recursos “flutuantes”, isto é, ordens explicitas
dos organismos de controle social com intuito de aumentar os con-
fiscos de bens nas conjunturas mais difíceis (MILLAN, 1984: 59-81).
Daí decorria naturalmente a suspeita, levantada pelos cristãos-novos,

14 Identificamos uma documentação no Arquivo Nacional Torre do Tombo (online) – do-


ravante ANTT – na qual o conteúdo da ementa registra: CONFISCO de bens. Data de
produção: 1646 – 1657. Âmbito e conteúdo: Cópia de consultas, pareceres e breves sobre
a confiscação de bens aos cristãos novos penitenciados pelo Santo Ofício, sobre o em-
préstimo do dinheiro das confiscações para o socorro da Índia e sobre a Companhia de
Comércio do Brasil. PT/TT/TSO-CG/010.

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JUÍZO DO FISCO REAL E INQUISIÇÃO –
normas e práticas da apreensão, posse e administração de bens confiscados pelo Santo Ofício
103

de que a ação dos inquisidores não era desinteressada do ponto de


vista material, dado o volume de riqueza de numerosos perseguidos.
Como já vimos, de acordo com a determinação regimental, quan-
do a prisão ocorresse com sequestro de bens – ponto que será reto-
mado mais abaixo – encaminhava-se recado ao Juízo do Fisco para
que fosse iniciado o inventário, como também para pôr em seguran-
ça a fazenda do confiscado. No entanto, em locais que não houvesse
Juízo do Fisco, primeiramente recorria-se ao corregedor ou juiz de
fora e, na falta deste, o juiz da terra.15
Em função dessa pequena amostra sobre os usos e aplicações do
confisco de bens aos reconhecidamente culpados pela Inquisição,
importa destacar um dos mais significativos documentos de que dis-
pomos, a saber, Regimento dos Juízes das Confiscações pelo crime de
Heresia, publicado no ano de 1572. Seu conteúdo não fora feito no
vazio. Dispõe de um sistemático conjunto de procedimentos proces-
suais organizados por uma burocracia judicial e, ao mesmo tempo,
nos revela uma série de critérios que busca salvaguardar os acusados
de possíveis abusos ou transgressões por parte de seus funcionários:

Regimento dos Juizes das Confiscações


pelo crime da Heresia

Dom Sebastião [...] Faço saber, que querendo eu pro-


ver, e dar ordem acerca do modo de proceder, e jul-
gar, que haja de ter os juizes executores, e mais offi-
ciaes dos bens confiscados pelo crime da Heresia, e
apostasia, e aplicados para o fisco, e minha Camera
Real, em Todos meus Reynos, e Senhorios mandey
ver por letrados de boa consciencia, e de muita ex-
periencia nos negocios, e couzas do Santo Officio da
Inquiziçam o Regimento de aqui thé gora se uzou, e
por ser necessario declarasse algumas couzas e ac-
crescentaremse outras com informação dos ditos Le-

15 Livro I – Dos ministros e oficiais do Santo Ofício e das coisas que nele há de haver.
Cf.: SIQUEIRA (1996: 745).

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104 Davi Celestino da Silva

trados, Ordeney o Regimento seguinte, do qual hey


por bem, que se uze daqui em diante. Primeiramente
o Juiz das Confiscaçoes sera huma pessoa de cons-
ciencia, e letras, e de muita confiança, sem raça alguã
de Mouro, ou Judeo, e Sera por mim nomeado, e
provido do dito officio. Tanto que o dito Juiz Tiver
especial Recado dos Inquisidores por escrito em que
lhe fação saber que mandarão prender alguma pes-
soa, era logo com muita diligencia as cazas donde
morarem os culpados com o escrivão de seu cargo, e
com outro escrivam, de tabelião, que tambem consi-
go levará, e tomará, e haverá a sua mão todas as cha-
ves das ditas cazas, e das cazas que nelas estiverem,
para que não possam sobnegar, nem esconder couza
alguã (?) e mandará hum dos ditos escrivães que faça
seu inventário.16

Entendemos, em acréscimo, ao enunciado acima exposto, sem


excluir totalmente as interpretações, e sugerindo um olhar mais prag-
mático sobre as disposições dos regimentos, tendo em vista interes-
ses pessoais - por parte da Coroa – que é importante destacar que em
nenhum momento vê-se registrado pelo regimento acima a partici-
pação naquela ação jurídica de algum membro da esfera eclesiástica,
isto é, membros da Igreja católica. Nesse sentido, cremos que o con-
fisco de bens se tornou um dos mais importantes dispositivos legais
de sustentação do Santo Ofício.
Partindo do que antes dissemos, importa destacar que na com-
preensão de José Veiga Torres, para se esboçar o perfil social de uma
instituição, como também para compreendermos como se estrutura
e articulam-se os vários setores que uma instituição cria para o de-
sempenho do papel que pretende desempenhar numa sociedade,
um dos fundamentais elementos da sua história a ser analisado é sem
sombra de dúvidas, a sua vida financeira (TORRES, 1993: 24-39).
Na sequência de outras observações, recorremos mais uma vez

16 Regimento dos juízes das confiscações pelo crime de heresia. Códice 311, Relação
da Bahia, 1752. Arquivo Nacional, Rio de Janeiro.

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JUÍZO DO FISCO REAL E INQUISIÇÃO –
normas e práticas da apreensão, posse e administração de bens confiscados pelo Santo Ofício
105

às pesquisas da historiadora Maria Leonor Garcia da Cruz acerca do


confisco de bens, destacando que a concórdia ou aliança Estado-
-Igreja, ao apropriar-se do espaço público garantindo a sua manuten-
ção por meio de medidas coativas e censórias, evidentemente que
impõem ao coletivo a obediência a regras dominantes, dificultando
um conhecimento alargado do diferente, de outras concepções, cer-
ceando uma liberdade individual absoluta. Ainda de acordo com a
autora, o estudo dos mecanismos institucionais de gestão das finan-
ças públicas, torna-se interessante por serem essas finanças o nervo
fundamental no processo da construção do Estado moderno, cujo
estudo, ainda nos permite elucidar teias e relações sociais e políticas,
econômicas e religiosas, que se submetem às instituições, as condi-
cionam e as modificam (CRUZ, 2007: 107-126).
Tal compreensão do trecho acima tecido pela historiadora, tam-
bém reflete parte da política adotada pela Coroa portuguesa com
relação aos descaminhos acerca do confisco de bens, sobretudo, com
relação à América portuguesa,

Eu El Rey faço saber aos que esta minha provisão


virem que fui informado, que na Rellação do Brazil o
Juiz da Coroa, e minha fazenda se intrometem fazer
Sequestros, e inventarios das fazendas das pessoas
que se prendem pelo Sancto Officio, ou tem culpas
pertencentes a elle, o que faz fundado no Regimento
da Rellação, que ordena, que o dito Juiz de minha
Coroa, e fazenda vivia tambem do fisco, e posto que
isso tenha força em alguns dos cazos, não tem nos
bens que são Confiscados, e Sequestrados pelos In-
quizidores, porque estes somentes sam de Sequestrar,
e Confiscar por Ordem dos Inquizidores, ou Juiz do
Fisco da Caza da Supllicação. [...] e mando que o dito
Juiz de minha Coroa, e fazenda, Senão intrometa nes-
te cazo, Senão quando os Inquizidores, ou Juiz do
fisco lho deprecarem. [...] em Lisboa, vinte e tres de
Setembro de mil seiscentos e onze.17

17 Regimento dos Juízes das Confiscações pelo crime de heresia de 1572. Op. Cit.

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106 Davi Celestino da Silva

Em linhas gerais, a América portuguesa, a par das outras instân-


cias inquisitoriais,18 não contou com a presença de funcionários do
Juízo do Fisco – fato anteriormente já enunciado. Considerando a
relevância da ausência destes funcionários, acrescida do volume de
mercadorias e bens confiscados, sobretudo, de cristãos-novos, con-
denados pela Inquisição no Brasil, já revela de saída o cerne de uma
das preocupações da Coroa. Ou seja, ao se utilizar dos critérios acima
descritos na documentação, sobressai, sobretudo, na provisão real, a
preocupação do monarca com os descaminhos proporcionados pelas
outras justiças, sobretudo a apropriação indevida dos recursos e bens
oriundos do confisco de bens dos condenados pela Santo Ofício.
Como nós bem sabemos, os assuntos relacionados aos bens de here-
ges são de exclusividade do Juízo das Confiscações.
António Manuel Hespanha, por sua vez, observa que a organização
da vida financeira da Inquisição portuguesa e do seu Conselho Geral
acompanhou as vicissitudes da sua evolução. As suas fontes de recei-
ta oscilaram entre rendimentos provindos de um tipo de economia
senhorial-eclesiástica, rendimentos originários de uma economia mer-
cantil, como também da sua específica atividade, isto é, penalizações
pecuniárias, sobretudo, os confiscos de bens (TORRES, 1993: 24-39).
Creio que nesta seara de discussões voltada ao âmbito jurídico-
-institucional é interessante ressaltar o estudo das instituições. Estu-
dos estes, que são instrumentos necessários para se esboçar o perfil
social de instituições como o Tribunal do Santo Ofício. António Ma-
nuel Hespanha promove uma leitura da história das instituições, na
qual destaca que a história das instituições surge como reação con-
trária a dois modelos de entender a história do direito: a história das
fontes que analisa a evolução das normas jurídicas com suas leis e
costumes; a outra seria a história dogmática, que descreve a evolução
das doutrinas e sistemas de conceitos. O autor compreende que estas
duas orientações tendiam isolar realidades que tratavam de outras

18 A América portuguesa, ao contrário da espanhola, não contou com um Tribunal do Santo


Ofício. Além disso, a própria presença inquisitorial no Brasil se compôs de forma de-
ficitária. Em diversas situações a inquisição portuguesa contou com o apoio da justiça
eclesiástica, como também, algumas funções devidamente pertencentes a agentes e oficiais
inquisitoriais eram realizadas por indivíduos não pertencentes aos quadros do Santo Ofí-
cio.

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JUÍZO DO FISCO REAL E INQUISIÇÃO –
normas e práticas da apreensão, posse e administração de bens confiscados pelo Santo Ofício
107

realidades a exemplo dos sistemas políticos, econômicos e culturais,


aspectos que conjuntamente com o direito, organizavam a vida social
(HESPANHA, 1982: 11-20). Na sequência, optamos por registrar a
compreensão de Maurice Hariou, no qual ele aponta que uma ins-
tituição é uma ideia que se realiza e dura juridicamente num meio
social; e que para a realização dessa ideia, organiza-se um poder que
lhe confere órgãos; por outro lado, entre os membros do grupo social
interessado na realização daquela ideia, produzem-se manifestações
de comunhão dirigidas pelos órgãos do poder e reguladas por proce-
dimentos (HAURIOU, 2009: 19).
Os Regimentos de 1572 e 1640 do Tribunal do Santo Ofício são
de extrema importância, uma vez que estabelecem o delineamento
das esferas de competência e do funcionamento ordinário de órgãos
e de oficiais da Inquisição e da Coroa, assim como revelam objetivos
do Estado face a preocupações e controvérsias decorrentes do dina-
mismo social e seus condicionantes de natureza variada (CRUZ, 2007:
107-126). Este tipo de compreensão nos permitiu observar a vigência
de critérios explícitos ou implícitos, de restrição e dificuldades por
parte da Coroa portuguesa em evitar os possíveis abusos e descami-
nhos arquitetados por agentes e oficiais do Fisco,

O Juiz das Confiscações naõ fará composiçaõ alguma


sobre os bens confiscados, nem os mandará vender,
nem os arrematar fóra da almoeda; e nem elle, nem
o Escrivaõ de seu cargo, nem outro Official algum
das ditas confiscações, nem da Inquiziçaõ, comprará,
nem haverá por si, nem por outra interposta pessoa
couza alguma das ditas fazendas: e fazendo o contra-
rio, incorrera cada hum em pena de cem cruzados, e
seraõ privados de seus Officios, e pagaraõ Todos os
dannos, e perdas, que por isso recrescerem á fazenda
do Fisco, e perderaõ pelo mesmo fato a fazenda que
comprarem; e o Juiz do Fisco Tirará cada anno disto
devassa, e a despachará com os Adjuntos que lhe saõ
nomeados.19

19 Regimento do Juízo das Confiscações Pelo Crime de Heresia, e Apostasia, de 10 de

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 89-113, 2018


108 Davi Celestino da Silva

O documento acima, mais uma vez nos traz importantes pistas,


primeiramente configura o Tribunal do Santo Ofício num digno re-
ceituário do Antigo Regime português, ou seja, uma instituição que
procura aplicar maior rigor na execução da sua justiça, no controle
dos seus oficiais e na preservação e disponibilidade de bens que
não vindo aos seus possuidores originários, constituem propriedade
da Coroa. Tomam-se providencias até mesmo contra o próprio Juiz
do Fisco, na sua possibilidade de incorrer em apropriação indevida
daquilo que por lei pertence à Coroa portuguesa.
Uma outra relevante disposição jurídica por parte da justiça do
Fisco verificamos acerca dos bens sequestrados, e em caso de confir-
mação da sentença do condenado, a confiscação,

E sendo caso que os ditos prezos saiaõ absolutos


dos ditos Crimes por sentença dos Inquizidores, o
dito Juiz lhe fará tornar seus bens pelos mesmos in-
ventarios. [...] E sendo dada sentença final contra os
culpados pelos Inquizidores, e Deputados do Sancto
Officio, em que os condemnaõ por hereges, ou apos-
tasia de nossa santa Fé Catholica, de que se apartaõ,
em tal cazo o dito Juiz, a requerimento do Thesou-
reiro, mandará apregoar nos lugares públicos, que as
pessoas que pretendem Ter direito nos Taes bens,
conformes as acções que propozeraõ no Tempo dos
primeiros pregões, venha perante elle no Termo que
for assignado, e que fará cumprimento de justiça.20

Aqui privilegiamos dar destaque ao papel da justiça do Fisco, que


podia, ainda que remotamente, absolver o suspeito do crime de he-
resia. Observa-se na documentação que o rei faz expressar, de forma
objetiva, que os bens serão devolvidos aos presos pelos mesmos in-
ventários. Ou seja, no momento da devolução dos bens dos supostos

julho de 1620, de 57 capítulos, publicado por José R. M. de Campos e Soiza no Tomo III
do Systema ou Coleção dos Regimentos Reaes. Lisboa, 1785, pp. 196-219. Disponível em:
<http://www.governodosoutros.ics.ul.pt/> Acesso em: 01 de junho de 2018.
20 Regimento do Juízo das Confiscações Pelo Crime de Heresia, e Apostasia. Op. Cit.

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 89-113, 2018


JUÍZO DO FISCO REAL E INQUISIÇÃO –
normas e práticas da apreensão, posse e administração de bens confiscados pelo Santo Ofício
109

hereges, tais bens, deveriam ser os mesmos arrolados no inventário à


época de sua prisão. Outro ponto interessante observado nessa do-
cumentação foi o da execução de leilões públicos dos bens daqueles
que eram foram considerados culpados pela Inquisição portuguesa.
Desde o início, a Inquisição portuguesa – como também o poder
civil que a desejou – pretendia viver, fundamentalmente, do produto
do seu trabalho, ou seja, das penalizações materiais, dos confiscos.
Tal lhe foi vedado pelo poder papal. Como instituição do Antigo
Regime, teve de procurar os rendimentos nas fontes do regime em
que se situava. O poderio econômico das instituições eclesiásticas
tradicionais era alvo de demasiados interesses e, obviamente, nem
era suficientemente nem elástico para satisfazer todas as ambições.
Todos os campos de poder, desde o eclesiástico romano, passando
pela realeza e pelos grupos familiares das antigas e novas aristocra-
cias, até às medianas camadas de magistrados e burocratas letrados,
pretendiam partilhar, em parte côngrua, dos rendimentos globalmen-
te consideráveis do património eclesiástico (TORRES, 1993: 24-39).
As resistências como também os conflitos deixavam tal património
à competência daquele que mais poder detinha. Desse modo, não
era com certeza a Inquisição. Instituição nova, erguida sob novos
problemas e novas necessidades. Foi gestada de um novo sistema de
relações econômicas e de relações culturais e sociais. Seria assim, em
boa lógica, no interior dessa nova realidade social, que a Inquisição
encontraria não só a matéria prima da sua reprodução, como também
a matéria financeira de relações culturais e sociais. No entanto, o Es-
tado, também se confrontava com essa nova sociedade – mercantil –
em ascensão e dela também dependia. Inquisição e Estado, com seus
discursos de solidariedade mútua, não coincidiam em seus objetivos
na prática (TORRES, 1993: 24-39).
Em linhas gerais, o Estado, no campo político e financeiro era
superior a Inquisição. Nesse sentido, a Inquisição também dependia
financeiramente da Coroa, e paradoxalmente ao depender do Estado,
também dependeria da economia mercantil, economia, esta, susten-
tada em sua grande maioria composta por cristãos-novos.
O estudo acerca do confisco de bens está muito longe de esgotar
a multiplicidade das suas relações e nem chega para explicar a ra-
zoável dinâmica sobre as sociedades modernas. Nessas sociedades,

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 89-113, 2018


110 Davi Celestino da Silva

o acesso a bens como também certos serviços se evidenciava uma


distância social, material e cultural de cada indivíduo; como também
o consumo de bens de luxo acentuava a diferenciação entre os gru-
pos sociais. Assim sendo, como pode parecer aos nossos apressados
julgamentos, acreditamos que o estudo do confisco de bens, descor-
tina contornos sobre o perfil das sociedades modernas. Até porque,
nosso foco – o confisco de bens – nos serviu de guia para outras
abordagens; apesar de que quase sempre ele nos escapa com certa
regularidade do nosso campo de visão, nos oferecendo outras pers-
pectivas de abordagens.

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CASTIGAR OU PERDOAR? A DESERÇÃO MILITAR
NA LEGISLAÇÃO PORTUGUESA (1750-1808)
Giovane Albino Silva1

Resumo: O presente artigo discute as práticas de combate a deser-


ção de soldados no exército português durante a segunda metade
do século XVIII e início do XIX. Para isso, dedica-se ao estudo dos
decretos e alvarás existentes na Coleção da Legislação Portuguesa
para entender as estratégias de contenção das fugas utilizadas em
Portugal, através das sucessivas publicações de leis que ora casti-
gavam, ora perdoavam os homens envolvidos nessas condutas. As
deserções foram frequentemente registradas pelos comandantes das
tropas portuguesas por seus imensuráveis impactos na composição
social militar, muito embora este tipo de resistência não fosse exclu-
sivo do universo luso. Deste modo, analisam-se as dinâmicas políticas
e militares que exigiram as publicações de penalizações e perdões ré-
gios relacionados ao crime militar para conter a evasão de soldados,
com base no ordenamento jurídico português.

Palavras-chave: Deserção, Legislação, Poder Régio, Punição, Perdão.

Punishment or forgiveness? Military desertion in the


Portuguese legislation (1750-1808)

Abstract: This article debates the practices to restrain the desertion


of soldiers in the Portuguese army during the second half of the eigh-
teenth century and beginning of the nineteenth. To this end, it is de-
dicated to the study of the decrees and charters available in the Cole-
ção da Legislação Portuguesa to understand the strategies to contain
the escapes used in Portugal, through the successive publications of
laws which sometimes punished or forgave the men involved in the-
se behaviors. Desertions were often recorded by the commanders of
the Portuguese troops for their immeasurable impacts on the military
social composition, although this type of resistance was not exclusive

1 Mestre em História pela Universidade Federal Rural de Pernambuco. Atualmente cursa


o doutorado em história na Universidade Federal Fluminense. Bolsista do CNPq. Pesqui-
sador dos grupos de estudo: GEHSCAL (UPE/CNPq) e Companhia das Índias (UFF/
CNPq).
116 Giovane Albino Silva

to the Portuguese universe. In this way, we analyze the political and


military dynamics that demanded the publication of penalties and
royal pardons related to military crime to contain the evasion of sol-
diers, based on the Portuguese legal system.

Key words: Desertion, Legislation, Royal Power, Punishment, Forgi-


veness.

Introdução

A historiografia sobre a constituição da monarquia portuguesa na


época Moderna passou por importantes reflexões e mudanças nas
últimas décadas. Por meio delas, foram repensados os valores atri-
buídos aos equilíbrios dos poderes e a atuação do Estado na go-
vernabilidade de Portugal e seu amplo espaço ultramarino. A partir
das contribuições de António Manuel Hespanha, como já são bem
conhecidas na historiografia brasileira, que pelos idos da década de
80 do século passado reinterpretou os laços que interligavam as ins-
tituições portuguesas no Reino com as instâncias de representação
régia entre os séculos XVI e XVII, novos olhares foram lançados
sobre o funcionamento da monarquia. Hespanha expôs os limites de
atuação da “administração central”, demonstrando o modo como os
poderes régios conviviam com pluralismos jurídicos e institucionais
e, portanto, com certo grau de autonomia e autogoverno das provín-
cias (HESPANHA, 1994).
Lançando luzes sobre essa interpretação, a historiografia colonial
ampliou os debates sobre a autonomia e os equilíbrios de poder
para os diversos espaços ultramarinos componentes da monarquia
portuguesa. No Brasil, essas concepções foram reunidas na coletânea
Antigo Regime nos Trópicos, cujas análises desenvolvidas pelos seus
autores reafirmaram os pressupostos de Hespanha, deslocando seus
olhares para reinterpretar as características da América portuguesa
em múltiplos aspectos, para além da visão dicotômica “colônia-me-
trópole” (FRAGOSO; BICALHO; GOUVÊA, 2001).
As relações entre os vassalos e seus soberanos, potencializadas a
partir da participação das elites no complexo sistema de governabili-
dade, ganharam importante lugar entre esses estudos em função de
sua centralidade no controle das decisões e do que alguns autores

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 115-140, 2018


Castigar ou perdoar? A deserção militar na legislação portuguesa (1750-1808) 117

consideram como autogoverno das vilas e cidades coloniais pelas


famílias locais, adquirido através do processo de formação das “con-
quistas” territoriais portuguesas (FRAGOSO; GOUVÊA, 2010). Nesse
sentido, os trabalhos de Evaldo Cabral de Mello sobre as elites na
Capitania de Pernambuco foram fundamentais para se pensar a no-
ção de “pacto” por um viés onde os senhores da terra tiveram intensa
participação na construção das relações que viabilizaram a presença
do governo português na região (MELLO, 2003; MELLO, 2008). Com
isso, a compreensão da historiografia utilizou de certos pressupostos
teóricos para se pensar os vínculos entre as autoridades régias e as
elites locais, como o próprio conceito de autoridades negociadas,
cunhada por Jack Greene (GREENE, 1994). Elites que desempenha-
vam funções diversas, gastavam seus próprios recursos e ajudavam
a preservar as conquistas portuguesas na expectativa de serem re-
muneradas por tais serviços (BICALHO, 2005). Elementos facilmen-
te identificáveis na documentação colonial e que, por isso, diversas
pesquisas já demonstraram as complexas relações entre o rei e os
seus diversos vassalos na criação de múltiplos vínculos que susten-
tavam o império (GUEDES, 2011; FRAGOSO; SAMPAIO, 2012). Eis o
ângulo de negociação verificado entre os diversos agentes da monar-
quia predominante entre os historiadores portugueses e brasileiros
da época Moderna para interpretar as relações e conexões no amplo
espaço territorial e marítimo luso (FRAGOSO; GOUVÊA, 2010).
Toda essa reviravolta na historiografia implicou a necessidade de
reavaliar o papel do rei e seus conselheiros nas atividades de ge-
rência política, econômica e social. O conceito de monarquia cor-
porativa induz que o monarca e seus representantes tinham diver-
sas prerrogativas, embora suas atribuições eram limitadas posto que
nem sempre elas predominavam no cotidiano, tendo em vista que
o paradigma jurisdicionalista pressupunha a existência de poderes
concorrentes no ordenamento jurídico português, inclusive nos es-
paços ultramarinos, além de outros fatores que dificultava a tomada
de decisão única e exclusivamente por parte do poder régio em suas
“conquistas” (HESPANHA, 2001).
Uma das áreas de ingerência da administração real era a das orga-
nizações militares, por meio das quais se buscava reforçar o sistema
defensivo para, assim, assegurar os territórios das colônias e do reino.

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 115-140, 2018


118 Giovane Albino Silva

O serviço das armas foi um dos alicerces da expansão e manutenção


das conquistas portuguesas, baseado no que se convencionou cha-
mar “economia de mercê” (OLIVAL, 2001). As principais patentes da
hierarquia militar, nas tropas institucionais submetidas aos reis, eram
destinadas por um lado a homens de amplo cabedal e representação
social, por outro a pessoas de confiança do monarca, oriundas do rei-
no e das nobrezas lá estabelecidas. No primeiro caso, encontram-se
sujeitos provenientes das elites locais e famílias “tradicionais” inseri-
das nas tropas auxiliares ou de ordenanças, enquanto que os fidalgos
eram vinculados ao oficialato das tropas regulares, consideradas o
exército português em razão do serviço em tempo integral, mantido
pelos soldos mensais, embora suas dificuldades de formação e ma-
nutenção não as tornem, em muitas situações, os principais corpos
armados utilizados por Portugal (COSTA, 2005; GOMES, 2010). As
dificuldades das tropas regulares eram inúmeras, desde o processo
de recrutamento de novos soldados, pagamento de seus soldos, for-
necimento dos fardamentos, manutenção das fortificações e quarteis
(ou presídios), até a constante e prejudicial evasão de recrutas através
da deserção, que por vezes impossibilitava ou limitava a atuação dos
corpos militares nas capitanias (SILVA, 2001).
Durante a segunda metade do século XVIII, observamos em nos-
sos estudos que as tropas regulares da Capitania de Pernambuco
foram constantemente afetadas pelas centenas de homens que fu-
giam dos serviços armados (SILVA, 2015). Realidade não diferente
da Capitania de São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais, Ceará ou
mesmo nas regiões fronteiriças como a Colônia de Sacramento e o
Grão-Pará.2 Aliás, essas mesmas dificuldades eram muito comuns no
próprio reino e no império, onde diversas medidas foram utilizadas
a fim de diminuir e reprimir os sujeitos envolvidos em tais condutas
(COSTA, 2010).
Fenômeno bastante presente no cotidiano das tropas regulares,
as fugas de soldados afetavam diretamente o quantitativo de homens
em serviço, muitas vezes envolvendo uma evasão em massa que
poderia produzir imensos vazios, sobretudo em épocas de guerra

2 A bibliografia é bastante ampla sobre o tema: MELLO (2009); GOMES (2010); POSSA-
MAI (2010); NOGUEIRA (2004).

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 115-140, 2018


Castigar ou perdoar? A deserção militar na legislação portuguesa (1750-1808) 119

declarada. Tema sempre pontuado pela historiografia que trata dos


exércitos, em razão de sua alta frequência e do impacto produzido,
a deserção, contudo, poucas vezes foi utilizada como objeto de estu-
do. Em geral, limitou-se a associá-la aos problemas de manutenção
das tropas régias portuguesa, como o atraso dos soldos, a precária
condição de vida de um soldado pago e os perigos que envolvia a
participação em batalhas, cuja experiência militar e material bélico
eram quase sempre insuficientes. Entretanto, uma análise mais pro-
funda sobre esse tema releva aspectos ainda pouco observados pela
historiografia e que podem servir de explicação às práticas das fugas
em massa. É o caso das constantes ordens de perdão oferecidas aos
desertores durante a segunda metade do século XVIII com a intenção
de convencê-los a retornaram aos seus antigos postos militares e com
a promessa de não serem punidos pelo seu comportamento.
Esse ponto de análise surgiu quando, em razão de nossas pesqui-
sas, encontramos o governador de Pernambuco no começo do século
XIX, Caetano Pinto de Miranda Montenegro, enviando uma carta ao
Conselho Ultramarino onde expunha o que, no seu ponto de vista,
eram os principais estímulos à deserção em suas tropas. Dentre eles,
o governador julgava negativa a prática de sucessivamente conceder
anistias aos homens que fugiam do exército, pois elas se tornaram
tão comuns que as tropas ao invés de estarem sendo reestabelecidas
com o retorno dos soldados, estavam na prática estimulando esses
comportamentos, uma vez que o perdão era quase sempre conce-
dido. Deste modo, solicitou o então governador que esses decretos
fossem devidamente cessados, pois acreditava que a punição era a
medida ideal para se evitar novas fugas (SILVA, 2015: 108-112).
Nesse sentido, o presente artigo analisa o tema da deserção a
partir dos sucessivos alvarás e decretos publicados na Coleção da
Legislação Portuguesa durante a segunda metade do século XVIII e
os primeiros anos do XIX. Debatemos as estratégias de contenção
das fugas utilizadas pelos monarcas e seus conselheiros através da
publicação dessas leis. Com efeito, atestamos que não estará presente
neste artigo o estudo empírico sobre o impacto ou eficiência dessas
medidas no cotidiano da guerra, muito embora tenhamos realizado
tais pontuações de maneira breve em função das normas aplicadas e
revogadas em seus respectivos contextos.

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 115-140, 2018


120 Giovane Albino Silva

Pensamos a publicação dessas leis a partir do jogo de negociações


em que os monarcas apelavam não apenas para a punição aos de-
sertores, ameaçando-os em alguns momentos de pena capital, mas
também para a necessidade de explorar a benevolência e perdão aos
criminosos militares, almejando, com isso, convencê-los a retornarem
aos seus antigos postos. Em que se baseavam esses perdões? Por
quais motivos foram utilizados? Qual a frequência dessas conces-
sões? Mesmo durante a segunda metade do século XVIII, auge do
processo de centralização política e econômica ou daquilo que José
Subtil designou de “administração ativa” (SUBTIL, 1993), os monar-
cas agiam sob poderes limitados, precisando adaptar suas estratégias
aos contextos e, no caso das tropas, à necessidade de recompor seus
corpos militares. Os diversos decretos e alvarás relativos ao tema da
deserção são bons exemplos para refletimos sobre esse ponto.
Num primeiro momento, observaremos a relação entre o governo
de d. José I e o surgimento dos primeiros decretos e alvarás relati-
vos a deserção na Coleção da Legislação Portuguesa, bem como ao
contexto de publicação dos mesmos. Em seguida, a ênfase se voltará
para a análise das concessões de perdão aos fugitivos do exército e
para o uso do poder da graça enquanto estratégia de recomposição
dos soldados em seus serviços militares.

O Crime da Deserção: as Leis e o combate as fugas de soldados na


segunda metade do século XVIII

O conhecido período pombalino teve como uma de suas principais


características a enorme profusão e publicação de leis, alvarás e decre-
tos régios que almejavam atender as necessidades requeridas pela ad-
ministração portuguesa e estivessem em consonância com as medidas
e transformações em curso (MONTEIRO, 2008). Assim, temas variados
de ordem política, econômica ou militar, reordenaram a legislação so-
bre vários assuntos que diziam respeito a monarquia lusa.
Um olhar mais atento sobre a Coleção da Legislação Portuguesa
a partir da subida ao trono de d. José I em 1750 revela uma atenção
voltada para as áreas de gerenciamento das tropas, principalmen-
te após a inserção de Portugal na Guerra dos Sete Anos, em 1762,
prolongando-se até meados da independência do Brasil, razão pela

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 115-140, 2018


Castigar ou perdoar? A deserção militar na legislação portuguesa (1750-1808) 121

qual realizamos o corte cronológico do artigo.


No bojo das ordens que vinham sendo publicadas na legislação
lusitana, diversos alvarás e decretos traziam como tema principal o
crime da deserção, explicitando seus prejuízos, assim como, as pena-
lidades aos que fugissem dos serviços militares. Desertar é definido,
de acordo com o dicionarista Rafael Bluteau, como um “termo mili-
tar” que significa “fugir, e deixar o campo, Exercito, Guarnição, Praça
ou Regimento, ou Companhia, em que está qualquer soldado” (BLU-
TEAU, 1712-1728: 309). Portanto, é um termo voltado essencialmente
para os corpos armados a fim de designar os indivíduos que tivessem
deixado seus postos sem as devidas autorizações, seja em tempos de
guerra, seja de paz. É um fenômeno que preocupava as autoridades
régias e militares pela sua alta frequência, sobretudo em épocas de
guerra declarada, cuja manutenção de soldados era primordial para a
obtenção de vitórias nos campos armados. Em Portugal, assim como
em outros reinos europeus, as perdas de homens eram avaliadas
como grandes desastres e, por isso, deveriam ser constantemente
combatidas (COSTA, 2010). Nesse sentido, analisamos esse momento
para expor de que maneira a legislação portuguesa tratava a deser-
ção, quais características foram se evidenciando ao longo dos anos
e, por fim, de que forma os reis buscavam alternativas para evitar as
fugas dentro do ordenamento jurídico português.3
No período que compreendeu a subida ao trono de d. José I e a
fase pré-guerra dos Sete Anos (contexto entre 1750 e 1761), os decre-
tos régios sobre temas militares foram ínfimos, quase inexistentes, es-
pecialmente devido à ausência de preocupação com a manutenção e
reformulação das tropas nos seus territórios. Com o início da guerra,
os assuntos discutidos se tornaram eminentemente militares e busca-
vam, entre outros aspectos, regularizar o pagamento dos soldados, o
fornecimento de fardamentos, o recrutamento, a formação de tropas,
o abastecimento dos corpos auxiliares e das ordenanças, cuja impor-
tância era significativa para fornecer apoio no contexto bélico.4 No

3 Por ordem ou ordenação jurídica, entende-se: “um conjunto de institutos (juízes, instru-
mentos processuais, legislação e ritos), que dependia das ações não só de juízes e legisla-
dores, como também de auxiliares que atuavam tanto na esfera judicial quanto na esfera
administrativa” (MENEZES, 2013: 39).
4 PORTUGAL. 1830. Coleção da legislação portuguesa. Lisboa. Typ. Maygrense. Tomo I.

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 115-140, 2018


122 Giovane Albino Silva

entanto, não observamos nenhuma referência explícita na Coleção da


Legislação Portuguesa sobre a deserção no contexto da guerra que
pudesse revelar quais penalidades eram destinadas aos fugitivos em
tempo de batalha, embora presume-se que fossem as mais severas
- pena de morte -, uma vez que esta estava regulamentada pelo regi-
mento de 1708 e apareceu por diversas vezes no período pós-guerra,
como veremos a seguir.
As menções à deserção se iniciam logo após o término do conflito,
quando os primeiros decretos foram um misto de perdão e reforço
das penalidades aos que optavam em resistir à incorporação na tropa.
Em 22 de junho de 1763, já findada a guerra, o rei d. José I, com um
tom de fraternidade e complacência, publicou um perdão geral aos
desertores que se recolhessem aos seus respectivos regimentos no
prazo estipulado de quinze dias, como descrito abaixo:

Usando da Minha Real Clemencia com os Soldados,


que até o dia da data deste Decreto desertarão do
Meu Exercito: Hei por bem, e por Graça perdoar-lhes
a culpa de Deserção, em que se achão incursos, com
a condição porém de se apresentarem dentro do ter-
mo de quinze dias, contados da publicação deste, em
qualquer dos Regimentos das respectivas Provincias
das suas naturalidades, nos quaes Ordeno sejao re-
cebidos, e se lhes assente Praça, não obstante have-
rem desertado de differentes Corpos, e não obstantes
quaesquer Disposiçoes, ou Ordens em contrario.5

É importante destacarmos que esta ordem refletia uma medida


tomada pela Coroa logo após o fim da guerra. Deste modo, o
fornecimento do perdão era uma tentativa de d. José em recuperar os
homens que haviam fugido dos seus corpos militares, e, assim, tentar
preencher as fileiras com aqueles que haviam resistido a permanecer.
Para tanto, ficou explícito que o perdão seria concedido na condição
de se apresentarem “em qualquer dos Regimentos das respectivas

5 PORTUGAL. Decreto de 22 de junho de 1763. Coleção da legislação portuguesa. Lisboa.


Typ. Maygrense. 1829. Tombo II, p. 37.

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Castigar ou perdoar? A deserção militar na legislação portuguesa (1750-1808) 123

Provincias das suas naturalidades”.


Dois pontos precisam ser destacados a partir dessa ordem. Primei-
ramente, a preocupação do rei com os soldados envolvidos na deser-
ção. O fato de ter sido publicado um perdão geral pós-guerra indica
que a fuga foi uma conduta presente durante o tempo em que Por-
tugal esteve envolvido nas batalhas, reforçando que tal fenômeno era
uma real preocupação e que seu quantitativo não foi pequeno, haja
vista a tentativa do monarca para que esses homens retornassem aos
seus antigos postos. Aliás, nada surpreendente, pois a historiografia
demonstrou isso por diversas vezes (COSTA, 2010). Nesse sentido, a
ameaça através da pena de morte durante a guerra não foi suficiente
para impedir as fugas do campo de batalha, o que exigia da Coroa
novas estratégias, corporificadas através da publicação das anistias
aos crimes perpetrados.
Por outro lado, observa-se a atenção do rei em oferecer, aos deser-
tores que retornassem no prazo estipulado, a possibilidade de escolher
em qual das tropas gostariam de ser recolhidos. Ou seja, a liberalida-
de régia cedia aos desertores a oportunidade de serem alistados nos
corpos que melhor lhes conviessem. Mais uma estratégia de cooptar
homens. Tal dispositivo, na realidade, era uma resposta à reação dos
soldados ao serviço militar, uma vez que a deserção também era esti-
mulada em razão dos deslocamentos efetuados pelas tropas, quando
elas eram requeridas em momentos críticos para atender uma região
fragilizada, mobilidade esta que provocava o distanciamento dos sol-
dados de seus antigos espaços de sociabilidade, dos seus laços familia-
res e da sua “pátria”.6 Dessa forma, o rei tentou remediar esse problema
aceitando o retorno dos fugitivos para tropas situadas nas províncias
de suas naturalidades, acreditando ser possível, assim, convencer um
maior número de praças a retornaram ao exército.
Um mês após a publicação desse decreto, o monarca expediu um
alvará no qual expressava sua reprovação e indignação com os fugi-
tivos, assumindo um tom bastante rigoroso não somente aos militares
que desertassem do exército, mas também a todos que induzissem
ou acolhessem esses homens, os quais deveriam, pelo Conselho de

6 Pátria aqui é entendida pela região de nascimento em âmbito circunscrito da vila ou cidade.
BLUTEAU (1712 – 1728: 320).

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 115-140, 2018


124 Giovane Albino Silva

Guerra, ser punidos diretamente com a pena de morte.7 O objetivo


era diminuir as constantes fugas, em especial aos que se deslocassem
para fora reino, penalizando, coagindo e ameaçando também os que
protegiam os soldados envolvidos nesse crime militar.
Em 6 de setembro de 1765, houve a criação de uma regulamen-
tação específica para tratar do tema da deserção, momento em que
foram expostas suas características, penalidades e prejuízos. O mo-
narca foi bem elucidativo ao citar os atributos negativos relacionados
às fugas, classificando como um dos piores crimes que poderiam ser
cometidos pelos militares.

El Rei faço saber aos que este Alvará de declaração


que sendo a deserção hum dos mais graves, e mais
perniciosos crimes Militares; por que nem a defeza
dos Reinos, e Estados, e a Paz publica, e tranquilida-
de interior, e externa delles, se podem conservar sem
os Exercitos, nem estes podem ter alguma consisten-
cia, sem que os Corpos, de que são constituídos, se
achem completos, e promptos debaixo da Disciplina
dos seus respectivos Commandantes.8

O rei completou afirmando que este mesmo crime era precavido


“em todas as Nações da Europa com as mais graves penas, e com as
mais exuberantes providencias, como também o foi sempre nestes
Meus Reinos”.9 Portugal, nesse sentido, buscava seguir o ritmo dos
outros governos ao reservar penas severas aos fugitivos. O monarca
explicitava os danos procedentes da deserção classificando-a como
“hum dos mais graves, e mais perniciosos crimes Militares” e condi-
cionando a paz e a tranquilidade pública à eficiência do exército e
este ao preenchimento completo de suas fileiras regidas pelas disci-
plinas dos comandantes.

7 PORTUGAL. 1829. Alvará de 15 de julho de 1763. Coleção da legislação portuguesa.


Lisboa. Typ. Maygrense. Tomo II, p. 37, 45.
8 PORTUGAL. 1829. Alvará de 6 de setembro de 1765. Coleção da legislação portuguesa.
Lisboa. Typ. Maygrense. Tomo II, p. 37, 45, 216-217.
9 Idem, p. 217.

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Castigar ou perdoar? A deserção militar na legislação portuguesa (1750-1808) 125

Para tanto, o alvará exposto regulamentou as penalidades desti-


nadas aos desertores e às pessoas que fornecessem ajuda, na ânsia
de diminuir os problemas da insuficiência de soldados. Ampliando as
antigas resoluções sobre a deserção, ficou estabelecido:

Aos militares que desertaram das tropas e que haviam permane-


cido no reino:

1- Os homens que estivessem ausentes do seu Regimento


sem apresentar passaporte expedido pelas autoridades e
selado com o selo do mesmo Regimento, ou então se as
licenças fossem de dois a dez dias e as mesmas estives-
sem vencidas, seriam considerados desertores e como tal
deveriam ser presos e conduzidos às tropas originárias.
2- Aos oficiais que dessem asilo aos desertores perderiam
seus respectivos postos.
3- Às pessoas de qualquer qualidade ou condição que
fornecessem asilo aos desertores pagariam, pela primeira
vez, duzentos mil réis por cada fugitivo protegido, pela
segunda quatrocentos mil réis e pela terceira perderiam
todos “os bens da Coroa, e Ordens, que tiverem; e fiquem
inabilitados para chegarem a Minha Real Presença, e exer-
citarem algum emprego no Meu Real Serviço”.10
4- Aos eclesiásticos que provessem asilo aos desertores em
suas casas o rei determinava que fossem deslocados para
quarenta léguas do lugar onde o caso sucedeu, pela se-
gunda vez seriam transferidos para uma distância de ses-
senta léguas e na terceira que ele fosse “desnaturalizado
dos Meus Reinos, e Dominios”.11
5- No caso dos eclesiásticos que tivessem dado asilo em
conventos, o rei mandava que o “mesmo se observe a
respeito dos Prelados Locaes das Casas Regulares, que
taes Desertores recolhem, ou taes asylos derem, e con-

10 PORTUGAL. 1829. Alvará de 6 de setembro de 1765. Coleção da legislação portuguesa.


Lisboa. Typ. Maygrense. 1829. Tomo II, p. 37, 45, 218.
11 Idem, p. 218.

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126 Giovane Albino Silva

sentirem nelles, contra o Bem commum, e indispensável


necessidade pública da conservação do Meu Exercito”.12
Ou seja, as punições para esses casos estariam expostas
no artigo anterior.

Já aos militares que desertassem, porém que se deslocaram


para fora do reino, o monarca iniciava com uma crítica ativa, não
abrindo espaço para anistias: “Sendo tanto mais abominável, e indig-
no de perdão o delicto dos que esquecidos do que devem ao seu Rei,
e Senhor Natural, e a Patria, em que nascerão, desertão das Minhas
Tropas para fora do Reino”.13 A punição referida era a pena de morte,
cujo regulamento de 1708 atestava para esse tipo de penalidade. E,
logo em seguida, o alvará declarava que

Se proceda a Sentença condemnatoria contra os mes-


mos Réos; declarando-os nella por infames, e bani-
dos, para que depois de ser por Mim confirmada, se
levante huma forca em lugar mais público da Terra,
e nella se affixe a cópia da referida Sentença, e fique
notório a todos que impunemente podem matar os
taes banidos, achando-os nas Terras destes Reinos, e
seus Dominios.14

O rei, portanto, vociferava um discurso de ojeriza e indignação aos


desertores do reino de Portugal, representados pelas palavras que au-
torizava a possibilidade de eliminar tais homens: “fique notório a to-
dos que impunemente podem matar os taes banidos, achando-os nas
Terras destes Reinos, e seus Dominios”, do mesmo modo que a devida
punição deveria ser notificada publicamente, a fim de servir de exem-
plo. Tais ações refletiam os prejuízos oriundos das fugas e a associação
desses criminosos com a imagem de traidores. A deserção para fora do
reino trazia ainda mais prejuízos às tropas, uma vez que não apenas o
quantitativo de militares era reduzido, mas também tais homens pode-

12 Idem, p. 218.
13 Idem, p. 218.
14 Idem, p. 218.

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Castigar ou perdoar? A deserção militar na legislação portuguesa (1750-1808) 127

riam oferecer informações importantes dos arranjos militares de Portu-


gal durante a guerra. Deste modo, o desertor serviria como um canal
de fornecimento de dados valiosos aos oponentes sobre as estratégias
de defesa e ataque do antigo corpo militar. Por isso, recompensas eram
destinadas aos homens que se dispusessem a integrar e fornecer in-
formações à tropa inimiga, sobretudo em época de guerra, razão pela
qual a fuga para outro reino era tão temerária e representava um forte
ponto a ser discutido e combatido (POSSAMAI, 2010).
Por fim, o alvará reforçava o impedimento de qualquer tipo de
perdão aos militares que desertassem após a publicação do bando,
em respeito aos que continuaram nas fileiras do exército e trabalha-
ram “tão louvavelmente [e] se distinguirão sempre no amor ao Servi-
ço do seu Rei, e no zelo do Bem commum da sua Patria”. Já aos que
não seguissem essas condutas, a ordem era que se procedesse com
penalidades rígidas e, para isso, determinava o rei que “Hei desde
logo por excluído de toda, e qualquer Amnista, ou Perdão geral, ou
particular, todas, e cada huma das pessoas que tem desertado das Mi-
nhas Tropas depois da publicação”.15 Aos homens que fugiram antes
desse alvará a punição era de serem desnaturalizados e inabilitados
aos benefícios de qualquer perdão e anistia.
Sobre as penalidades destinadas aos que protegiam os desertores
dentro do reino, podemos verificar a existência de grupos sociais
diretamente indicados, isto é, de um “perfil social dos protectores
dos desertores” (COSTA, 2004: 88). Pessoas que de acordo com as
leis abraçavam e auxiliavam os soldados em seu processo de fuga e,
por isso, deveriam ser castigados. É o caso, por exemplo, dos ecle-
siásticos que seriam punidos dependendo do espaço - residência ou
convento - em que protegiam os desertores. Do mesmo modo, os
oficiais perderiam seus postos em caso de asilo. Nesse sentido, tanto
militares quanto religiosos eram encarados, pelas autoridades régias,
como grupos que potencialmente faziam parte das redes de proteção
dos fugitivos. Fernando Dores Costa, por exemplo, citou diversos
casos de eclesiásticos protegendo os desertores, o que na prática
fragilizava o combate as fugas (COSTA, 2004: 81).
O alvará, portanto, expôs o enquadramento dos soldados deser-

15 Idem, p. 218-219.

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 115-140, 2018


128 Giovane Albino Silva

tores na legislação portuguesa na segunda metade do século XVIII.


Eles eram classificados como tal caso fugissem das tropas ou estives-
sem com a licença vencida. Ao mesmo tempo, observamos a prática
do asilo e proteção aos fugitivos, sobretudo de grupos que, de acor-
do com o que lei nos leva a induzir, estiveram várias vezes envolvi-
dos no auxílio aos criminosos. As citadas regulamentações serviram
para todo o período posterior, estando apenas restritos pelos decre-
tos que, por tempo limitado, concediam perdão aos fugitivos.

A Graça e o Perdão: a liberalidade régia no combate à deserção

O decreto régio que ofertou um perdão geral aos desertores do


exército português foi publicado no mesmo dia em que o alvará aci-
ma analisado foi expedido. Na verdade, o rei esperava que “pela Mi-
nha Lei publicada no mesmo dia de hoje cessará de todo a deserção
das Tropas do Meu Exercito”. Dessa forma, ele confiava que as amea-
ças direcionadas aos homens que incidissem na prática da deserção e
àqueles que os protegessem surtissem rápidos efeitos, de modo que
os militares não iriam mais promover fugas, por terem acabado “de
conhecer toda a gravidade de hum tão pernicioso delicto”.16 Diante
da imaginação de que as fugas iriam ser controladas, cabia ao rei
agora cativar os homens que haviam desertado a retornarem aos seus
antigos postos. Com isso, publicou-se um perdão geral que afirmava:

Hei por bem, e por Graça perdoar a todos, os que


até a data deste se acharem incursos no crime da
deserção para dentro do Reino, as culpas, em que
estiverem, e as penas, em que acharem condemnados
pelo sobredito crime: para todos serem restituídos as
honras Militares, e aos Corpos, a que pertencem ao
fim de nelles continuarem o Meu Real Serviço.17

O perdão era estendido a todos os militares envolvidos no crime


da deserção, contanto que dentro do reino (novamente deixando

16 PORTUGAL. Decreto de 6 de setembro de 1765. Coleção da legislação portuguesa. Lis-


boa. Typ. Maygrense. 1829. Tombo II, p. 220.
17 Idem, p. 220.

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Castigar ou perdoar? A deserção militar na legislação portuguesa (1750-1808) 129

a entrever que a fuga externa era quase imperdoável e, portanto,


muito mais prejudicial). Era um perdão que, no entanto, provinha da
ameaça, já que a recusa à essa anistia régia automaticamente inseria
o fugitivo nas normas de penalidade exposta pelo alvará. O rei, por-
tanto, oferecia uma oportunidade do soldado se redimir de um crime
grave, ao mesmo em que preencheria os espaços vazios das tropas
portuguesas.
A punição e o perdão eram as duas faces que compunham a
intervenção régia em matéria penal (HESPANHA, 2012: 154). O di-
reito oficial era um dos meios pelos quais se intentava disciplinar
as condutas desviantes, através da publicação e aplicação de regras
penais que impunha à sociedade os limites de seus comportamen-
tos. Analisando o direito penal da monarquia corporativa portuguesa,
António Manuel Hespanha afirmou que a sua função político-social
não estava voltada para uma intervenção punitiva, cotidiana e efetiva,
mas sim pelo papel do rei como dispensador da justiça e da graça
(HESPANHA, 2012: 134). Deste modo, a existência do poder real no
sistema penal luso esteve estritamente vinculada à própria dispensa
dos castigos e das ameaças do direito oficial por meio da publicação
de perdões. Atestamos que embora o autor esteja pensando a aplica-
bilidade dessas relações para os séculos XVI e XVII, acreditamos que
tais valores se fizeram sentir também ao longo do XVIII em alguns
setores da sociedade, haja vista as constantes publicações de alvarás
e decretos referentes às penas e perdões voltados à deserção apre-
sentados ao longo do presente artigo.
Segundo José Subtil, a graça “consiste na atribuição de um bem
que não competia por justiça, nem comutativa nem distributiva, isto
é, que não era, por qualquer forma, juridicamente devido”. Para a
ordem jurídica lusitana na época Moderna, a atribuição do poder
da graça/perdão aos monarcas, configurava-se como uma das faces
assumidas em consonância com as imagens representadas para a so-
ciedade de modo que “a cada uma destas imagens atribuía-se certas
funções e prerrogativas”. Ao rei cabia, inexoravelmente, o papel de
“fazer a justiça”, ser justo e “manter os equilíbrios sociais e tutelados
pelo direito, do qual decorria automaticamente a paz” (SUBTIL, 1993:
157-158). Manter a harmonia entre os corpos e o equilíbrio social era
uma das responsabilidades dos monarcas e por isso se utilizavam de

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 115-140, 2018


130 Giovane Albino Silva

medidas coercitivas a fim de garantir o bem-estar social. Deveria ser


rígido quando a situação assim exigisse.
Porém, a esta figura se complementava outra imagem, a do rei
“chefe de casa”, correlacionado com o papel do pai e pastor que
cuidava e perdoava os seus filhos ou o seu rebanho. Era um dom de-
pendente da liberalidade régia do qual o monarca não era obrigado
a ouvir “senão a sua consciência nem obedecer a qualquer formali-
dade”, simplesmente concedia (SUBTIL, 1993: 158). António Manuel
Hespanha, ao analisar esse dom real, acabou expondo as diversas
figuras assumidas pelo rei, que ao invés de se anularem, eram com-
plementares e essenciais para o poder real. Segundo o autor,

Pelos expedientes de graça realizava-se outro aspecto


da inculcação da ordem real. Se ao ameaçar punir
(mas punindo, efetivamente, muito pouco), o rei se
afirmava como justiceiro, dando realização a um tó-
pico ideológico essencial no sistema medieval e mo-
derno de legitimação do poder; ao perdoar, ele cum-
pria um outro traço de sua imagem – desta vez como
pastor e como pai, essencial também à legitimação.
A mesma mão que ameaçava com castigos impiedo-
sos, prodigalizava, chegando ao mesmo momento, as
medidas de graça. Por esta dialética do terror e da
clemência, o rei constituía-se, ao mesmo tempo, em
senhor da Justiça e mediador de Graça. Se investia no
terror, não investia menos no amor. Tal como Deus
ele desdobrava-se na figura do Pai justiceiro e do Fi-
lho doce e amável (HESPANHA, 2012: 159).

Portanto, a imagem do rei misericordioso, piedoso e complacente


era uma das prerrogativas do rei utilizada para seu próprio fortaleci-
mento, enquanto qualidade essencial, e estava relacionada com uma
das características de legitimação do seu poder, aquela “que repre-
sentava o príncipe como pastor e pai dos súditos, que mais se devia
fazer amar do que temer” (HESPANHA, 2012: 154-155), do pai que
ameaçava atacar, mas em seguida ignorava e perdoava.
No entanto, para Fernando Dores Costa, as constantes publica-

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Castigar ou perdoar? A deserção militar na legislação portuguesa (1750-1808) 131

ções de perdões aos desertores refletiam a ineficiência do governo


em repelir as deserções, “revelando impotência e não absolvição. O
prestígio da graça esconde a inconveniência” (COSTA, 2004: 89-90),
ou seja, o autor destaca a fragilidade do poder régio no combate ao
crime e sua necessidade em conceder perdões. De fato, as sucessivas
publicações da graça régia nos levam a pensar as negociações que
a monarquia cedia aos fugitivos para que os mesmos se sentissem
atraídos a retornarem aos seus antigos postos, com a condição de
terem suas punições suspensas. E tal necessidade era as vezes tão
imperativa que as dispensas penais chegaram a ser publicadas em
casos extremos e aos que aparentemente nunca deveriam ter o per-
dão régio: os militares que fugiam em direção a outras monarquias.
Vejamos esses momentos.
Em 7 de setembro de 1780, d. Maria concedia, por sua graça, o
perdão aos desertores que se deslocaram para fora do reino, limitando
por um ano o prazo de validade e exigindo o retorno desses homens
aos seus antigos postos. Dizia o alvará que por “motivo da Minha feliz
exaltação ao Throno, lhes fora inútil aquella Graça, que tanto deseja-
vao”, se referindo à prorrogação do perdão aos desertores, e

attendento benignamente aos motivos de súpplicas, e


a outras razões que moverão a Minha Real Piedade:
Hei por bem ampliar os referidos Perdões por tempo
de hum anno contado da Publicaçao deste, a todos
os Meus Vassallos Militares de qualquer graduação,
que por crimes estiveram ausentes, e no dito termo
se recolherem aos respectivos Corpos.18

Em complemento a esse decreto, a rainha publicava, no mês


seguinte, outro no qual perdoava os militares que desertaram do
exército e residiam no próprio reino, estipulando, para esses casos, o
prazo máximo de três meses para retornarem aos seus postos de ori-
gem sem precisar cumprir as penalidades que essa conduta exigia.19

18 PORTUGAL. Decreto de 7 de setembro de 1780. Coleção da legislação portuguesa. Lis-


boa. Typ. Maygrense. 1828. Tombo III, p 287.
19 PORTUGAL. Decreto de 6 de novembro de 1780. Coleção da legislação portuguesa.

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132 Giovane Albino Silva

Em dezembro de 1789, mais um decreto de perdão geral aos deser-


tores foi expedido. Dessa vez, enfatizou-se que só poderiam ser agra-
ciados aqueles que desertaram apenas uma vez, ainda que para fora
do reino, e que não tivessem cometidos alguns “delictos atrocíssimos,
e sempre exceptuados, e declarados em todos os perdões geraes, civis,
e militares, os quaes pela sua enormidade se não podem isentar da dis-
posição das Leis sem offensa de Deos, e escândalo do público”.20 Para
além dessas questões, esse decreto incluía, entre os passíveis de serem
perdoados, os que tinham sido processados pelo crime da deserção e
estavam pagando suas penas. E, por fim, o prazo para que os deserto-
res retornassem ao exército era de três meses aos situados no reino e
seis meses aos que estivessem ausente de Portugal.21
Já em 20 de fevereiro de 1793, temos outro perdão concedido “a
todos os Desertores dos differentes Corpos do Meu Exercito”, seja do
reino ou fora dele, reduzindo, no entanto, o prazo para que os mes-
mos retornassem às fileiras do exército. Aos residentes em Portugal
estipulou-se o máximo de um mês, contado do dia que se sucedia à
publicação do decreto. Aos que estivessem ausentes do reino o prazo
era até a data de dia vinte de maio, ou seja, três meses após a ratifica-
ção desta ordem. Porém o que chama a atenção é a solicitação para
perdoar todos os militares que estivessem sentenciados, a não ser os
casos mais graves, para serem reaproveitados nas tropas.

E outrossim Hei por bem perdoar a todos os indiví-


duos das Minhas Tropas, que se acharem prezos, e
mesmo sentenciados pelo crime de primeira deserção
(não havendo nelle circunmstancias mais aggravan-
tes) todas as penas, em que se acharem incursos, e
Mando que sejão logo soltos, e remettidos aos Re-
gimentos aonde pertencerem, para que nelles sejão
novamente incorporados.22

Lisboa. Typ. Maygrense. 1828. Tombo III, p. 287-288.


20 PORTUGAL. Decreto de 17 de dezembro de 1789. Coleção da legislação portuguesa.
Lisboa. Typ. Maygrense. 1828. Tombo III, p. 576.
21 Idem, p. 576-577.
22 PORTUGAL. Decreto de 20 de fevereiro de 1793. Coleção da legislação portuguesa.
Lisboa. Typ. Maygrense. 1828. Tombo IV, p. 95.

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 115-140, 2018


Castigar ou perdoar? A deserção militar na legislação portuguesa (1750-1808) 133

Desta forma, observam-se, a partir das exigências da rainha, a fra-


gilidade e a insuficiência dos corpos militares no território português,
quando, para a formação do seu exército foram liberados de seus
respectivos crimes os militares que não estivessem cometidos graves
delitos. Medidas extremas que almejavam recompor as frágeis e insu-
ficientes tropas lusitanas. Os perdões que esconde a pouca eficiência
do governo no combate às fugas.
Meses após esta publicação, d. Maria promulgou um decreto no
qual concedia o perdão especificamente aos desertores que estives-
sem se deslocado para o reino espanhol. Essa ordem demonstra que
a Espanha foi um espaço de refúgio para militares portugueses e,
mesmo com as leis anteriores que previam o perdão àqueles que
buscavam abrigo fora de Portugal, muitos optaram por resistir, talvez
pelo medo de serem punidos ao regressarem. Tendo em vista suprir
essa lacuna, a rainha publicou:

Hei por bem perdoar a todos os Meus Vassalos, que se


acharem Desertores no Reino de Hespanha, o crime
em que ficarão incursos pelo facto da referida deser-
ção; com tanto que se apresentem no espaço de seis
mezes, contados do primeiro de Outubro próximo
futuro em diante, ao Commandante em Chefe do Meu
Exercito [...] E outrosim os haverei por rehabilitados
no Meu Real Serviço, desde o dia em que assentarem
praça em quaesquer dos Regimentos de Infantaria, ou
no Corpo de Artilharia do mesmo Exercito.23

Com o passar dos anos, os decretos sobre a deserção foram se


sucedendo e no bojo de suas explicações não foram modificando a
maioria das características até então analisadas. Em 1795, por exem-
plo, tivemos mais uma norma, com as mesmas condições comenta-
das, porém se diferenciando acerca dos prazos estipulados para re-
tornarem às tropas os homens que estivessem no reino e os ausentes

23 PORTUGAL. Decreto de 13 de setembro de 1793. Coleção da legislação portuguesa.


Lisboa. Typ. Maygrense. 1828. Tombo IV, p. 156-157.

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 115-140, 2018


134 Giovane Albino Silva

deste.24 No ano seguinte, mais um decreto teve as medidas de perdão


prorrogadas, porém ampliavam os agraciados com esta absolvição,
atingindo também os que desertaram pela segunda vez.25
Entre os anos de 1797 e 1799, contabilizamos um total de quatro
publicações de decretos de perdão aos desertores e em todos eles
as características que norteiam as informações são idênticas às ante-
riores, não necessitando, portanto, descrevê-las. Apenas um ponto
divergia levemente entre essas normas que, como foi explicitado,
acena-se ao tempo concedido para validade da absolvição, sempre
distinguindo entre os que residiam no reino e os que dele fugiam,
variando para o primeiro caso entre dois e quatro meses, e para o
segundo de dois meses e meio a seis.26
Mais outro foi estabelecido em fevereiro de 1801. As diretrizes
continuavam bastante similares, estabelecendo, nesse caso, aos de-
sertores do reino o prazo de um mês e aos de fora três meses para
serem restituídos isentos de punição. Contudo, outro ponto chama a
atenção na leitura desta ordem e que se referia ao fato de: se o de-
sertor não tivesse cometido algum crime além da fuga, ele, para ser
absolvido, deveria retornar ao exército e estaria “livre [para] apresen-
tar-se ao Chefe daquelle Regimento, em que lhes for mais commodo
continuar o Meu Real Serviço não obstante haverem desertado de
outro”,27 ou seja, este decreto permitia que o desertor tivesse a opção
de escolher em qual Regimento preferiria regressar, aludindo à situa-
ção que comentamos acerca do favorecimento em assentar praça aos
soldados nos regimentos localizados nas suas províncias. Contudo,

24 PORTUGAL. Decreto de 4 de abril de 1795. Coleção da legislação portuguesa. Lisboa.


Typ. Maygrense. 1828. Tombo IV, p. 212.
25 PORTUGAL. Decreto de 20 de julho de 1796. Coleção da legislação portuguesa. Lisboa.
Typ. Maygrense. 1828. Tombo IV, p. 286.
26 PORTUGAL. Decreto de 27 de março de 1797. Coleção da legislação portuguesa. Lisboa.
Typ. Maygrense. 1828. Tombo IV, p. 388; PORTUGAL. Decreto de 17 de outubro de
1797. Coleção da legislação portuguesa. Lisboa. Typ. Maygrense. 1828. Tombo IV, p. 462;
PORTUGAL. Decreto de 19 de outubro de 1798. Coleção da legislação portuguesa. Lis-
boa. Typ. Maygrense. 1828. Tombo IV, p. 509; PORTUGAL. Decreto de 20 de setembro
de 1799. Coleção da legislação portuguesa. Lisboa. Typ. Maygrense. 1828. Tombo IV, p.
585.
27 PORTUGAL. Decreto de 27 de fevereiro de 1801. Coleção da legislação portuguesa.
Lisboa. Typ. Maygrense. 1828. Tombo IV, p. 674-675.

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 115-140, 2018


Castigar ou perdoar? A deserção militar na legislação portuguesa (1750-1808) 135

tal possibilidade de escolha havia sido retirada das publicações ante-


riores, retornando apenas no começo do século XIX. No mesmo ano,
agora no mês de agosto, outro decreto foi publicado para anistiar os
desertores do exército.28
Contrariando essa leva de decretos, em agosto de 1803 a rainha
resolveu cessar os perdões não aceitando nenhum tipo de reque-
rimento que almejasse obter a clemência e a graça para o caso de
fugas do exército. Assim estabelecia:

Tendo cessado os motivos, que moverão a Minha


Real Clemencia a perdoar a alguns Soldados do Meu
Exercito as penas, em que havião incorrido pelo cri-
me de primeira deserção: Sou Servido Ordenar, que
da data deste em diante sejão irremissivelmente casti-
gados com o rigor das Leis Militares, na conformidade
do que se acha disposto no Artigo quartorze dos de
Guerra, todos aquelles que se ausentaram dos seus
Regimento; e Prohibo que por qualquer Repartiçao
que subão a Minha Real Presença requerimentos di-
rigidos a obterem perdão da pena da primeira deser-
ção. O Conselho de Guerra o tenha assim entendido,
e passe as Ordens necessárias para que esta Minha
Real Determinação passe ao conhecimento do Meu
Exercito, fazendo-se ler pelos Coroneis na Frente dos
respectivos Regimentos no primeiro dia da parada,
e continuando depois a ler-se em todos os dias de
pagamento na frente das Companhias29.

Contudo, esse discurso mais agressivo e inclemente esteve direcio-


nado exclusivamente aos que fugissem após a publicação desta lei,
como explicou com mais detalhes o decreto de setembro de 1803 em
relação às dúvidas que haviam surgido. Os que haviam desertado an-

28 PORTUGAL. Decreto de 9 de agosto de 1801. Coleção da legislação portuguesa. Lisboa.


Typ. Maygrense. 1828. Tombo IV, p. 725.
29 PORTUGAL. Decreto de 3 de agosto de 1803. Coleção da legislação portuguesa. Lisboa.
Typ. Maygrense. 1820. Tombo V, p. 243.

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 115-140, 2018


136 Giovane Albino Silva

tes da publicação estavam perdoados, condição assegurada, como já


mostramos, apenas se eles retornassem aos respectivos regimentos no
prazo estipulado. Aos que “tiverem ausentando, ou se ausentaram de-
pois da data do mencionado Decreto de três de Agosto” deveriam ser
“irremissivelmente castigados” na conformidade da lei exposta acima.30
Estas ordens expressam o rigor com que a Coroa portuguesa pas-
saria a dispor nos casos de deserção dos seus exércitos, evitando
a publicação de perdões na tentativa de diminuir o quantitativo de
homens fugitivos dos corpos militares, o que nos leva a afirmar que
continuavam os casos de deserção. Vale destacar que os mesmos
perdões, sobretudo quando concedidos sucessivamente, poderiam
ser vistos como grandes estímulos para novas deserções, uma vez
que os soldados insatisfeitos com o seu posto teriam o perdão de seu
crime assegurado caso fugissem e se arrependessem posteriormente.
Estratégia observada pelo governador da Capitania de Pernambuco,
Caetano Pinto de Miranda Montenegro, no ano de 1804, que acon-
selhava evitar a publicação de tais anistias, pois ao contrário de es-
tarem ajudando a conter as fugas, estas estavam aumentando, já que
a deserção, ao invés de ser punida, estava sendo constantemente
abonada (SILVA, 2015: 108-112). Talvez por isso, surgiu a medida de
1803. E de fato, só encontraremos perdões aos desertores no período
posterior à chegada da família real ao Rio de Janeiro, cujas necessi-
dades exigiam medidas para reorganizar e aumentar o exército e uma
delas seria novamente conceder a anistia aos fugitivos.31

Considerações finais

Ao longo do artigo, visualizamos a série de publicações voltadas


para o tratamento da deserção na legislação portuguesa. A segunda
metade do século XVIII, apresentou um alto grau de perdão sucessi-
vamente concedido aos criminosos militares, indicando que essa era
uma estratégia comumente utilizada pelos monarcas em seus gover-

30 PORTUGAL. Decreto de 16 de setembro de 1803. Coleção da legislação portuguesa.


Lisboa. Typ. Maygrense. 1820. Tombo V, p. 245.
31 PORTUGAL. Decreto de 13 de maio de 1808. Coleção da legislação portuguesa. Lisboa.
Typ. Maygrense. 1820. Tombo V, p. 509.

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 115-140, 2018


Castigar ou perdoar? A deserção militar na legislação portuguesa (1750-1808) 137

nos e que deve, portanto, ser levada em consideração nas análises


sobre a deserção.
A intensa produção de decretos estabelecidos foi o resultado de
um conjunto de características. A primeira era o próprio período de
validade das ordens expedidas, que, como observamos, estabeleciam
prazos (aos desertores do reino e aos que se encontravam fora dele),
e por isso exigiam, continuamente, uma revalidação, prorrogação e
novas publicações para assegurarem o perdão aos fugitivos do exér-
cito, o que implicava, portanto, numa constante emissão através das
normas reais.
Entretanto, é necessário refletir sobre a utilidade dessas leis. Se os
decretos foram sendo publicados em períodos relativamente regula-
res é por que de alguma forma tinham eficiência no âmbito social,
ou seja, homens se sentiam agradados com o perdão e retornavam
às tropas, embora pensemos também que se os decretos exigiam o
retorno do desertor aos regimentos era devido à falta de contingente
militar, originada pela própria fuga de seus homens. Um círculo vi-
cioso que produzia uma alta circulação de pessoas no serviço militar.
Justificado por um discurso de clemência, piedade e misericórdia
através da concessão da graça régia, essas publicações objetivavam
seduzir os desertores a retornarem ao deficitário exército lusitano e,
ao mesmo tempo, expressar a bondade de seus monarcas. Com a real
intenção de evitar as fugas, os decretos tinham prazos de validade
que findados abririam espaço para ações coercivas da Coroa na puni-
ção aos desertores, embora estes poderiam ser novamente aclamados
com novos decretos e com o perdão do rei para os crimes cometidos.
Por outro lado, a graça régia era um dispositivo no qual a monar-
quia ativava as “negociações” com os criminosos de deserção, cujo
perdão era imperativo na dispensa de penas, haja vista a necessidade
de aumentar os corpos militares e a pouca eficiência dos castigos
para evitar as fugas do exército. As constantes publicações de perdão,
portanto, refletem a ineficiência do governo em controlar as evasões,
conforme interpretação de Fernando Dores Costa, exigindo por parte
dos representantes régios medidas extremas para recuperar seus ho-
mens. No entanto, mesmo essas concessões de perdões foram sujei-
tas a críticas, como as demonstradas pelo governador de Pernambuco
ao sustentar que as sucessivas concessões da graça régia eram um

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 115-140, 2018


138 Giovane Albino Silva

dos estímulos à deserção na capitania e, portanto, ao invés de serem


ratificadas deveriam ser abolidas.
Por fim, acrescentamos que o debate em torno das formas de
contenção das fugas militares exibe o modo como o poder régio teve
que atuar no combate à criminalidade. Nesse sentido, é interessante
pensar que mesmo o contexto da segunda metade do século XVIII
apresenta seus limites no que tange à intervenção real e ao enrijeci-
mento do sistema penal, demonstrados pela necessidade de aplicar
sucessivos alvarás de perdões a crimes considerados de alta gravi-
dade para amenizar os prejuízos advindos de tais comportamentos.

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Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 115-140, 2018


ARTIGOS
ESTUDO BIOANTROPOLÓGICO DO ESPÓLIO
OSTEOLÓGICO PROVENIENTE DO CONVENTO
FRANCISCANO DE NOSSA SENHORA DAS NEVES,
OLINDA-PERNAMBUCO

Flávio Augusto de Aguiar Moraes1


Onésimo Jerônimo Santos2
Danúbia Valéria Rodrigues de Lima3

Resumo: Este artigo apresenta os resultados das análises realizadas


no espólio osteológico proveniente das atividades de arqueologia
preventiva no Convento Franciscano de Nossa Senhora das Neves,
localizado no município de Olinda-Pernambuco. A obra para sua
construção, de acordo com informações documentais, teve início em
meados de 1585. Os estudos arqueológicos foram solicitados pelo
Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional em virtude de o
Convento ser um bem tombado, e intervenções de engenharia para
requalificação do adro serem necessárias. Com o intuito de proteger
o patrimônio arqueológico foram realizadas intervenções na área a
ser impactada, sendo identificada a presença de artefatos históricos
como louça, vidro, porcelanas, etc, além de material osteológico hu-
mano de dois indivíduos. Destarte, tem-se por objetivo aqui informar
acerca do grau de conservação e dos resultados obtidos com a análi-
se do material osteológico.

Palavras-chave: Convento Franciscano, bioantropologia, osteologia,


Olinda-PE.

1 Núcleo de Pesquisa e Estudos Arqueológicos e Históricos-NUPEAH/UFAL – Campus


Sertão. E-mail para contato: flavioaguiarac@gmail.com.
2 Núcleo de Pesquisa e Estudos Arqueológicos e Históricos-NUPEAH/UFAL – Campus
Sertão. E-mail para contato: onesimo.santos@gmail.com.
3 Investigadora do CIAS – Centro de Investigação em Antropologia e Saúde – Universidade
de Coimbra. E-mail para contato: danubia.rodrigues2@gmail.com.
144 Danúbia Valéria Rodrigues de Lima | Flávio Augusto de Aguiar Moraes | Onésimo Jerônimo Santos

Bioanthropological study of the osteological specimen from the Fran-


ciscan Convent Nossa Senhora das Neves, Olinda-Pernambuco.

 
Abstract: This article presents the results of the analyzes carried out on the
osteological material coming from the activities of preventive archeology in
the Franciscan Convent Nossa Senhora das Neves, located in the munici-
pality of Olinda-Pernambuco. The work for its construction, according to
documentary information, began in the middle of 1585. The archaeological
studies were requested by the Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico
Nacional due to the Convent being a listed building, and to the need of engi-
neering interventions to requalify the churchyard. In order to protect the ar-
chaeological heritage, interventions were carried out in the area to be impac-
ted, with the presence of historical artifacts such as dishes, glass, porcelain,
etc., as well as human osteological material of two individuals. From this, the
goal is to report on the degree of conservation and the results obtained with
the analysis of the osteological material. 

Key-words: Franciscan Convent, bioanthropology, osteology, Olin-


da-PE

Introdução

O Convento de Nossa Senhora das Neves, localizado à Rua São


Francisco, nº 280, na cidade de Olinda é o mais antigo convento da
Ordem Franciscana do Brasil (figura 1). O Convento, a capela, a casa
de oração e o claustro dos Terceiros Franciscanos, inclusive o Adro,
o Cruzeiro e toda a área da antiga cerca conventual, foram tombados
em conjunto. O início da construção se deu em 1585, ano em que os
franciscanos foram morar no convento e construíram também um se-
minário para recolhimento e educação dos índios e filhos de famílias
importantes da época (GUIA DOS BENS TOMBADOS, 1980).

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 143-157, 2018


Estudo bioantropológico do espólio osteológico proveniente do Convento Franciscano de
Nossa Senhora das Neves, Olinda-Pernambuco
145

Figura 1. Mapa com a localização do município de Olinda-PE, onde localiza-se o


Convento.

De acordo com informações disponíveis na obra de Germain Ba-


zin (1958), no ano de 1583 foi concedido o Alvará de Doação das
terras de Olinda à Congregação Franciscana para fundação do pri-
meiro Convento da Ordem no Brasil. Em 1585, os frades franciscanos
chegaram a Olinda e receberam de Maria da Rosa, irmã da Ordem
Terceira de São Francisco, a doação da capela de Nossa Senhora das
Neves, assim como, diversos terrenos em torno da mesma. O con-
vento recebeu acréscimos até 1590, trabalhos realizados pelo Frei
Custódio dos Anjos.
Após insistentes pedidos dos moradores de Pernambuco, inclusive
do próprio donatário, o Ministro Geral da Ordem acedeu, no Capítulo
Provincial celebrado em 13 de março de 1584, com a criação de uma
custódia franciscana no Brasil. Na mesma ocasião nomeou Frei Mel-
quior de Santa Catarina como Custódio e Frei Francisco de São Boa-
ventura como seu substituto. Em 12 de abril de 1585 desembarcaram
em Olinda, além dos dois mencionados, os freis Francisco dos Santos,
Frei Afonso de Santa Maria, Frei Manuel da Cruz, Frei Antônio dos Már-

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 143-157, 2018


146 Danúbia Valéria Rodrigues de Lima | Flávio Augusto de Aguiar Moraes | Onésimo Jerônimo Santos

tires e Frei Antônio da Ilha. Em 4 de outubro ocuparam as instalações


doadas pela irmã terceira Dona Maria da Rosa (MIRANDA, 1976).
Esses espaços religiosos, até meados do século XIX, eram os locais
utilizados para o sepultamento dos mortos (ÀRIES, 1990, REIS, 1991;
ALMEIDA, 2007, 2012, 2013; NASCIMENTO, 2013). O crescimento po-
pulacional do século XVIII, associado a disseminação do pensamento
iluminista, influenciaram a elite dita civilizada que residia nos cen-
tros urbanos e entendiam que a morte deveria ser higienizada, com
o afastamento das cidades, dos locais de enterramento (ALMEIDA,
2012; NASCIMENTO, 2013; ÀRIES, 1990). Como descreve Almeida
(2012: 2):

No início do XIX, através de Carta-régia, determinava-


-se a proibição dos enterramentos nas igrejas e orde-
nava-se a construção de cemitérios pelo bem da saú-
de pública. Em 1825 uma nova portaria legisla sobre
os sepultamentos. Em 1828 o Imperador decretava,
através da Lei de 28 de outubro, o fim dos sepulta-
mentos nos recintos religiosos, conferindo às câmaras
o dever de zelar e fazer cumprir as normas. Apesar
destas leis não terem sido colocadas em prática, de
forma efetiva, revelam a crescente preocupação do
poder público na matéria concernente ao lugar dos
mortos, bem como o interesse em sanear e higienizar
as cidades.

Inserido nesse contexto, era grande a probabilidade de encon-


trarmos material ósseo humano no Convento Franciscano de Nossa
Senhora das Neves, nomeadamente nas áreas que sofreriam inter-
venções da engenharia, como no Adro. O estudo sistemático dos
restos ósseos humanos com enfoque bioarqueológico permite obter
informações sobre a demografia, crescimento e desenvolvimento dos
indivíduos, condição de saúde, atividades que desenvolviam, além
de identificar determinados traços de práticas mortuárias. Todas essas
informações possibilitam uma melhor compreensão acerca da adap-
tação e da evolução das populações humanas no passado. A Bioan-
tropologia, portanto, introduziu na arqueologia novas possibilidades

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 143-157, 2018


Estudo bioantropológico do espólio osteológico proveniente do Convento Franciscano de
Nossa Senhora das Neves, Olinda-Pernambuco
147

de análise e interpretação, possibilitando uma maior compreensão


do objeto de estudo (BUIKSTRA, 1981; BEMENT, 1994; UBELAKER,
1982, 1989).
Para grande parte desses autores (COOK, BUIKSTRA, 1979;
COOK, 1981, 1984; UBELAKER, 2003, entre outros) se faz necessá-
rio a disponibilidade de amostras ósseas significativas provenientes
de contextos funerários para se obter uma compreensão segura das
condições de saúde das populações. Porém, as condições de con-
servação dos restos ósseos no Brasil, e falando especificamente da
região Nordeste, quase sempre não são das melhores. Esse processo
de interferência, alteração, e por vezes destruição do osso que ocorre
pós-morte, é chamada de tafonomia (WHITE, FOLKENS; 2012). A
informação coletada durante a escavação é imprescindível para as
inferências futuras (DUDAY, 1990; 2005 a; 2005b; CRUBÉZY et al,
1990; CRUBÉZY, 2000).
Tendo em vista a baixa recorrência na disponibilidade de restos
ósseos humanos provenientes de sítios arqueológicos, mesmo os de
contextos históricos, é imperativo a necessidade de se divulgar os
resultados das análises mesmo que de uma amostra reduzida, pois
assim, possibilitar-se-á a comparação com outras amostras e conse-
quentemente a ampliação do conhecimento acerca da paleobiologia
dos povos. Assim, o objetivo deste trabalho é apresentar os resulta-
dos ora obtidos com a amostra osteológica identificada no Convento
Franciscano Nossa Senhora das Neves.

Material e métodos

O material utilizado como amostra para este estudo é proveniente


do Convento Franciscano de Olinda (figura 2). Os estudos arqueoló-
gicos foram solicitados pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Ar-
tístico Nacional em virtude da realização de obras de engenharia na
área do adro do Convento. A empresa responsável pela obra e pelos
estudos arqueológicos foi à PS Engenharia, com financiamento do
Programa de Aceleração do Crescimento (PAC).

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148 Danúbia Valéria Rodrigues de Lima | Flávio Augusto de Aguiar Moraes | Onésimo Jerônimo Santos

Figura 2. Vista frontal da Igreja e Convento Franciscano Nossa Senhora das Ne-
ves. Acervo IPHAN-PE.

Para o registro e controle espacial dos materiais arqueológico,


inicialmente toda a área do adro do convento foi quadriculada, em
quadrados de um metro, num sistema cartesiano, referenciado com
letras no sentido Oeste-Leste, e com números no sentido Norte-Sul.
Com o uso de duas trenas foram locadas as dez quadrículas a serem
escavadas, conforme exigência do projeto básico. A escavação ini-
ciou-se pela remoção com ferramentas manuais dos revestimentos e
em seguida procedeu-se a escavação nos sedimentos. Para o registro
das escavações foram utilizadas formulários específicos, fotografias
digitais e etiquetas de procedência para os vestígios. Os sedimentos
escavados foram peneirados ao lado das quadrículas e ao se atingir
a profundidade de um metro a escavação era encerrada. Após todos
registros necessários, a quadrícula foi preenchida com o sedimento
delas provenientes.
O estudo bioantropológico do material ósseo coletado durante as
escavações de salvamento na área do Adro do Convento Franciscano
de Nossa Senhora das Neves em Olinda contemplou apenas a etapa
de laboratório.
O número mínimo de indivíduos foi estabelecido a partir do con-

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Estudo bioantropológico do espólio osteológico proveniente do Convento Franciscano de
Nossa Senhora das Neves, Olinda-Pernambuco
149

junto esquelético que se encontrava em cada unidade de escavação,


já que esses ossos estavam dispostos articuladamente e não houve
a necessidade de se utilizar o método de individualização das peças
ósseas.
Para o exame da diagnose sexual nesta pesquisa havia sido ela-
borado parâmetros para que fosse realizado através da observação
e edição de caracteres específicos no esqueleto, especialmente, mas
não exclusivamente, no crânio, mandíbula, pelve, ossos longos. Para
isso, foi utilizado o modelo proposto em Ferembach et al (1980), em
Buikstra e Ubelaker (1994) e que também é apresentado em Mays
e Cox (2000), Auerbach (2011), Bruzek (2002) e White e Folkens
(2012).
No que se refere a estimativa da idade, é sabido que o esqueleto
possui uma sequência cronológica para o seu desenvolvimento, por
exemplo, durante a infância e adolescência, dentes e ossos conti-
nuam a crescer e as epífises a se fusionar. Os ossos se fusionam,
mudam e se degeneram. E é a partir da observação dessas caracte-
rísticas ósseas que é possível estimar a idade dos indivíduos à morte.
A diagnose da idade a morte nos indivíduos foi pensada seguindo o
método proposto por Acsadi e Nemeskéri (1970), Buikstra e Mielke
(1985) e White e Folkens (2012), que está ligado ao progressivo en-
velhecimento do esqueleto.

Resultados e discussão

A pesquisa arqueológica realizada no Convento Franciscano de


Nossa Senhora das Neves, com intervenções na área do Adro da Igre-
ja, revelou a presença de esqueletos em duas unidades escavadas, D2
e N3. No que se refere ao número mínimo de indivíduos foram tota-
lizados dois, um em cada unidade. O material bioantrológico estava
a uma profundidade entre 25 e 33 cm e 24 a 90 cm, respectivamente
(figuras 3).

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 143-157, 2018


150 Danúbia Valéria Rodrigues de Lima | Flávio Augusto de Aguiar Moraes | Onésimo Jerônimo Santos

Figura 3. Vista da unidade D2 com presença de esqueleto no centro.

O esqueleto identificado a 25cm de profundidade na quadrícula


D2, apresentava-se em acelerado grau de destruição. Após a retirada
dos restos osteológicos identificados na unidade D2 a quantidade de
material reduziu significativamente, sendo possível realizar a coleta
apenas de fragmentos, tendo em vista a destruição natural após a
evidenciação e alteração das condições de umidades causadas pela
exposição.
Na quadrícula N3 foram identificados ossos humanos em dois
momentos estratigráficos. A cerca de 25 cm de profundidade foram
encontrados ossos dispersos não articulados, sendo eles, 3 costelas
esquerdas, um metacarpo medial esquerdo, um tálus esquerdo, uma
vértebra cervical, além de alguns fragmentos ósseos que não foi pos-
sível se identificar em virtude de seu elevado grau de fragmentação
e friabilidade (figura 4).

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 143-157, 2018


Estudo bioantropológico do espólio osteológico proveniente do Convento Franciscano de
Nossa Senhora das Neves, Olinda-Pernambuco
151

Figura 4. Material ósseo humano encontrado na quadrícula N3.

Ainda na quadrícula N3, foi encontrado um esqueleto que estava a


uma profundidade de 90 centímetros, e as peças ósseas identificadas
in situ foram rádio, ulna e úmero, não sendo possível identificar a
lateralidade (figura 5). Os ossos estavam demasiadamente úmidos e
friáveis, com as epífises completamente destruídas, fato que impossi-
bilitou também a estimativa de idade, nomeadamente em virtude de
os pontos de fusão estarem ausentes. Os ossos estavam em posição
de articulação e as possibilidades de explicação para que fossem en-
contrados apenas esses ossos articulados reside na probabilidade de
intervenções subsequentes ao sepultamento terem destruído a maior
parte do esqueleto. É provável ainda que os ossos descritos anterior-
mente, que estavam em um nível mais acima, sejam do mesmo indiví-
duo e o revolvimento da terra proveniente das intervenções alterou a
posição estratigráfica dos mesmos. A grande quantidade de interven-
ções ocorridas em subsuperfície no passado não permitiu que ficasse
evidente na estratigrafia cada momento interventivo específico.

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 143-157, 2018


152 Danúbia Valéria Rodrigues de Lima | Flávio Augusto de Aguiar Moraes | Onésimo Jerônimo Santos

Figura 5. Vista dos ossos humanos identificados na quadrícula N3.

A destruição óssea causada pelas intempéries e ações antrópicas


no local limitou as inferências passíveis de serem realizadas. Porém,
se utilizando as superfícies articulares das extremidades esternais das
costelas para a descrição e estimativa de idade, baseado em aspectos
morfológicos, conforme estabelecido por Loth e modificado por Is-
can, Loth e Writh (1985: 855, 858) e Iscan e Loth (1986: 73-74), onde
foram identificados e estabelecidos 8 estágios de crescimento e modi-
ficação óssea, relacionadas a intervalos etários. Chegamos a uma esti-
mativa de idade associada a fase 3, entre 20-24 anos (figura 6) para a
costela identificada a uma profundidade de 33 cm na quadrícula N3.
Vale ressaltar que o ideal seria termos mais elementos ósseos para se
chegar a uma estimativa segura.

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 143-157, 2018


Estudo bioantropológico do espólio osteológico proveniente do Convento Franciscano de
Nossa Senhora das Neves, Olinda-Pernambuco
153

Figura 6. Vista da extremidade esternal da costela utilizada para a estimativa de


idade a partir dos aspectos morfológicos identificados.

A ausência de alguns elementos ósseos como a pélvis, o crânio,


mandíbulas e maxilares com dentes, ossos longos passíveis de serem
medidos, impossibilitou as análises morfométricas para a diagnose
de sexo.

Considerações

As subsequentes intervenções na área provavelmente para refor-


mas do próprio Convento, e o processo de urbanização do entorno,
associado as condições climáticas da região, demasiado úmida, con-
tribuíram significativamente de forma negativa para a preservação
do material ósseo humano encontrado na área. Consequentemente
as informações passíveis de serem obtidas com uma análise mais
profunda desse material também foram comprometidas. A necessida-
de de intervenções arqueológicas limitadas explica também a coleta
dessa pequena quantidade de materiais ósseos na área do Adro, área
essa que foi intensamente utilizada para os sepultamentos até mea-
dos do século XIX (VALLADARES, 1972; REIS, 1991; ALMEIDA, 2012;
NASCIMENTO, 2013).
O material ósseo identificado na quadrícula D2, devido ao fato de
encontrar-se numa posição estratigráfica vertical muito próximo da

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 143-157, 2018


154 Danúbia Valéria Rodrigues de Lima | Flávio Augusto de Aguiar Moraes | Onésimo Jerônimo Santos

superfície, é possível que sua degradação estivesse diretamente rela-


cionada as influencias intempéricas. De acordo com White e Folkens
(2012: 463)

quando o osso não fossilizado é exposto aos elemen-


tos, particularmente à chuva e ao sol, a sua superfície
deteriora-se ao mesmo tempo que se perde o seu
conteúdo orgânico. Os primeiros ossos envelhecidos
exibem primeiro uma rede de fissuras superficiais,
geralmente paralelas. Essas fissuras progressivamente
se aprofundam e a superfície óssea começa a se de-
teriorar.

De qualquer forma, fica evidente a intensidade de registro históri-


co/arqueológico no local e que toda intervenção futura necessita de
acompanhamento arqueológico.

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Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 143-157, 2018


EVOLUÇÃO E OBSOLESCÊNCIA:
Fortificações Portuguesas em Pernambuco anteriores à
ocupação Holandesa1

Manuela Xavier Gomes de Matos2


Paulo Martin Souto Maior3

Resumo: O perfil construtivo de três fortificações da antiga Capitania


de Pernambuco nas primeiras décadas do século XVII, período an-
terior à ocupação holandesa, revelou, através de dois remanescentes
(Forte de São Francisco da Barra, de 1606, e Forte de São Francisco
de Olinda, de 1620) e de iconografias (Forte de São Jorge, de 1590),
que essas construções foram influenciadas por modelos descritos em
tratados de fortificação europeus da época. Além do mais as adapta-
ções à realidade de material, mão de obra, recursos e postura colo-
nizadora impuseram certas restrições e adaptações. Identificar essas
transformações foi o objetivo principal desta pesquisa.

Palavras chaves: Fortificações, século XVII, Pernambuco.

Evolution and Obsolescence:


Portuguese Fortifications in Pernambuco Prior to the Dutch
Occupation

Abstract: The constructive profile of three fortifications of the Cap-


taincy of Pernambuco in the first decades of the 17th Century, before
the Dutch occupation, revealed, through two remnants (São Francisco
da Barra Fort, 1606, and São Francisco de Olinda Fort, 1620) and of

1 O presente artigo foi publicado on-line, com conteúdo mais extenso, na Revista Clio Ar-
queológica: MAIOR, P. M. S.; XAVIER GOMES DE MATTOS, MANUELA. Perfil
Construtivo das Fortificações Portuguesas da Capitania de Pernambuco até 1630. Clio
Arqueológica (on-line), v. 33, p. 78-127, 2018.
2 Doutora em Arqueologia e Preservação do Patrimônio pela Universidade Federal de Per-
nambuco (UFPE). Pesquisadora, Programa de Pós-Graduação em Arqueologia, UFPE.
3 Doutor em Universidade Politécnica da Catalunha no Programa Construção, Restauração
e Reabilitação Arquitetônica (2002). Professor do Departamento de Arqueologia da Uni-
versidade Federal de Pernambuco.
160 Manuela Xavier Gomes de Matos | Paulo Martin Souto Maior

iconographies (São Jorge Fort, 1590), that these constructions were


influenced by models described in European fortification manuals. Mo-
reover, adaptations to the reality of material, labor, resources and colo-
nizing posture have imposed certain restrictions and adaptations. Iden-
tifying these transformations was the main objective of this research.

Key words: Fortifications, 17th century, Pernambuco.

Eficácia bélica

Entender uma fortificação é, antes de tudo, inseri-la em um Siste-


ma Defensivo. Isso porque uma fortificação é resultado de sua confi-
guração geométrica, dos materiais, do ambiente, do capital disponível
e dos interesses econômicos e políticos. Nessa perspectiva e ainda
mais no caso de Pernambuco, que conta com dez remanescentes do
período colonial, as fortificações formam um conjunto de estruturas
de defesa cuja função era garantir a proteção do território (COTTA,
s/d: 3; ORENSE, 2012: 11; GALBEÑO, 2007: 29; ALMEIDA, 2003: 172;
VALADARES, 2014: 54, 95; Guia de inventário, 2015: 22; MOREAU,
2011: 42, 200). Pelo menos é esse o conceito de Sistema Defensivo
recorrente nos estudos sobre o tema, ou seja, um conjunto de estru-
turas de defesa. Entretanto, nesta pesquisa, refinou-se esse conceito
ao utilizarmos Sistema Defensivo enquanto “uma ação combinada e
concomitante entre fortificações, tropas e, principalmente, embarca-
ções (devendo-se levar em conta ainda a quantidade e qualidade dos
armamentos que dispunham cada um dos elementos desta tríade)”
(TONERA, 2005: 2) e incorporarmos a noção de Eficácia Bélica. Desta
maneira acrescentou-se aos conceitos de Estruturas de Defesa e Sis-
tema Defensivo as variáveis Tipologia de Fortificação, Modelo de Con-
figuração Geométrica e Grau de Obediência ao Modelo Europeu. A
partir dessa abordagem aplicada às fortificações compreendeu-se que
as transformações tecnológicas ocorreram em decorrência de aspec-
tos econômicos, políticos, culturais e religiosos. Esse contexto per-
mitiu qualificar a eficiência bélica dessas construções remanescentes.

A proteção do litoral no século XVI até 1630

Do ponto de vista bélico, havia disputas e alianças das nações

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 159-188, 2018


EVOLUÇÃO E OBSOLESCÊNCIA:
Fortificações Portuguesas em Pernambuco anteriores à ocupação Holandesa
161

europeias entre si com relação à colônia brasileira, e Pernambuco,


em particular. Desde o final do século XVI e início do século XVII, a
necessidade de defesa da colônia brasileira aumentou e passou a so-
licitar trabalhos de fortificação. Em Pernambuco, as despesas das Ca-
pitanias com essas obras eram elevadas, chegando a representar 60%
dos recursos com infraestrutura, armas e pessoal. Havia guarnições
militares remuneradas, mas não era quantitativamente suficiente. Em
Pernambuco a escassez de soldados forçava o recrutamento de civis
para compor a estrutura militar (MATOS, s/d: 186).
Cabe ressaltar as consequências nefastas da crise dinástica no
reinado de D. João III, para suas colônias e que culminou com a
união das Coroas portuguesa e espanhola, em 1580. A chamada
União Ibérica, resultado da invasão da Espanha apoiada pela no-
breza portuguesa, significou o controle da Espanha sobre Portugal
e suas colônias, e a apropriação das riquezas produzidas nesses
lugares (WEHLING, 1999: 64).
Para Pernambuco, houve ainda outras consequências. Entre 1630
a 1654, houve a invasão da Capitania pela Companhia das Índias Oci-
dentais representando uma mudança crucial nas relações comerciais
entre Holanda e Portugal. Antes da União Ibérica, Portugal mantinha
intenso comércio com os Países Baixos. Os holandeses haviam feito
grandes investimentos e tinham instalado, na Holanda, estruturas de
refinamento para o açúcar brasileiro. No entanto, com a união das
Coroas, os inimigos de Espanha passaram a ser inimigos de Portugal.
Desde 1568 os Países Baixos estavam em guerra contra a Espanha
pela sua independência. Esse conflito motivou o governo espanhol,
nação mais poderosa da Europa naquele momento, a instituir san-
ções comerciais aos navios holandeses, inclusive nas possessões por-
tuguesas, dentre elas o Brasil (WEHLING, 1999: 126).
Num período de trégua entre Espanha e as províncias unidas dos
Países Baixos, que durou 12 anos, entre 1609 e 1621, o comércio
entre Holanda e Portugal foi reestabelecido. Nesse ano de 1621 foi
criada, por um grupo de holandeses, a Companhia das Índias Oci-
dentais que recebeu dos Estados Gerais dos Países Baixos o mono-
pólio da navegação, comércio e transporte e das conquistas de países
ao longo do Oceano Atlântico, na América e na África. Nessa época
eram os holandeses da Companhia das Índias Ocidentais que trans-

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 159-188, 2018


162 Manuela Xavier Gomes de Matos | Paulo Martin Souto Maior

portavam a maioria das mercadorias entre Brasil e Europa. Com o


fim da trégua, voltaram as sanções comerciais. Mas, pela importância
do açúcar brasileiro, a Companhia das Índias Ocidentais decidiu ocu-
par a região produtora. Em 1624, os holandeses invadiram Salvador,
mas foram expulsos em 1625, em uma ação bem coordenada pela
frota espanhola, enviada pelo Rei Felipe IV, uma frota de 52 navios
de guerra com 12.500 soldados, juntamente com as fortificações que
haviam sido construídas em Salvador (MOREAU, 2011: 175; WIESE-
BRON, 1994: 402-406).
Com a mesma motivação, os holandeses da Companhia das Índias
Ocidentais, em 1628, resolvem invadir Pernambuco. A chegada dos
holandeses implicou também na construção e modificação das forti-
ficações e em uma nova postura defensiva.

Fortificações Portuguesas em Pernambuco até 1630

Locação e situação

As primeiras fortificações da Capitania começaram a ser cons-


truídas a partir do final do século XVI. Anteriormente, no início da
colonização, em 1535, quando o Donatário, Duarte Coelho, apor-
tou à Feitoria de Pernambuco, foi fundada a Vila de Igarassu, mas
não foram construídas fortificações (LAGO, 1973: 590). Também
não foram construídas fortificações quando a Vila de Olinda, prin-
cipal vila da Capitania, foi fundada, entre 1535 e 1537 (MENEZES,
1986: 23).
De uma maneira geral, no início da colonização em todo território
brasileiro, as povoações mais antigas eram defendidas por cercas e
muros. Eram estruturas precárias. Essas povoações eram normalmen-
te construídas em terrenos elevados, pois a defesa pela altura era
parte da estratégia de defesa usualmente adotada. A Vila de Olinda
utilizou desse recurso, assim como Salvador, Rio de Janeiro e outras
(REIS, 2000: 174-177) e com essa estruturação pretendeu-se atender
às necessidades defensivas do período.
Só a partir de 1590 é que foram construídas fortificações portugue-
sas em Pernambuco. O conjunto de fortificações construídas procurou

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 159-188, 2018


EVOLUÇÃO E OBSOLESCÊNCIA:
Fortificações Portuguesas em Pernambuco anteriores à ocupação Holandesa
163

defender o território de corsários e piratas estrangeiros que circulavam,


sempre em maior número, pela costa brasileira, configurando uma
ameaça constante. Em 1578, tiveram início solicitações ao Rei para
construção de fortificações na Capitania (CAVALCANTI, 2009: 62). Po-
rém, antes mesmo de receber a resposta, tamanha era a necessidade de
defesa, mandou-se fazer uma fortificação, à custa do Donatário Jorge
de Albuquerque. Era um forte de madeira que caiu logo em ruína, por
ser de estrutura precária, Forte de São Jorge, o velho.
A partir de 1590, com autorização do Rei, começou a ser cons-
truído um conjunto de fortificações que passou a compor, de fato,
o primeiro sistema defensivo da Capitania. Essas fortificações foram
construídas para a defesa da Vila de Olinda e seu porto. Na Vila de
Olinda, no extremo norte, foi construído o Forte de São Francisco de
Olinda; e no extremo sul, a Guarita de João Albuquerque. Entre as
fortificações havia uma paliçada de pau a pique, construída no nível
da praia e havia, ainda, uma linha de arrecifes naturais, submersa,
que impossibilitava o desembarque de invasores.

Figura 1. Representação holandesa de 1630 da Vila de Olinda com as fortificações


que compunham o sistema defensivo português: a Guarita de João Albuquerque e o
Forte de São Francisco de Olinda. Algemeen Rijcksarchief, (REIS, 2000: 83).

No porto de Olinda, conhecido como povoado dos Arrecifes, por


sua vez, foi construída uma cerca de madeira e os Fortes de São
Francisco da Barra, assentado nos arrecifes, na entrada da barra, e o
de São Jorge, construído sobre o istmo. A estratégia pretendida com
a implantação dessas estruturas defensivas estava baseada no fogo
cruzado dos fortes em função de uma única entrada da barra, com-

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 159-188, 2018


164 Manuela Xavier Gomes de Matos | Paulo Martin Souto Maior

posta por arrecifes naturais e que dava acesso ao porto de Olinda,


(MENEZES, 1986: 32-33).

Figura 2. Representação holandesa de 1617 do sistema defensivo português na Capi-


tania de Pernambuco, composto pelos Fortes de São Francisco da Barra e São Jorge.
Ontvoerp van stadt Parnambuco, D. Ruit.s fecit. Algemeen Rijksarchief, Haia. Ca.
1617, (REIS, 2000: 75).

Alguns autores incluem nesse primeiro sistema defensivo algumas


outras fortificações do lado Norte da Capitania. Há referências a uma for-
taleza nas proximidades de Pau Amarelo, Fortaleza do Rio Tapado, cons-
truída para garantir a defesa de desembarque nesse porto (COELHO,
1982: 35). Há referências, ainda, ao Forte Diogo Paes, construído por
iniciativa do engenheiro de mesmo nome, cuja obra foi apenas iniciada,
em 1626, mas não foi concluída. Ainda nos arredores do Recife, até 1624,
Matias de Albuquerque mandou construir o Fortim Alternar4. Localizava-
-se em uma ilha, na confluência dos rios Capibaribe e Beberibe, quase
em frente ao Forte de São Jorge (BARRETO, 2011: 84-94).
Quando em 1628, houve a notícia que uma armada holandesa es-
tava se dirigindo ao Brasil para invadir a região produtora de açúcar,
Matias de Albuquerque foi enviado ao Brasil no cargo de visitador e

4 Segundo Barreto, o Fortim Alternar foi mandado fazer em 1629, mas nas ‘Memorias
Diárias da guerra do Brasil’, Duarte de Albuquerque Coelho fez menção a existência de
baterias nos arredores do Forte de São Jorge, no período em que Matias de Albuquer-
que era Governador da Capitania (1620-1624). Essas baterias poderiam ser as estruturas
incompletas do Forte Diogo Paes e o Fortim Alternar. Inclusive, porque ao descrever a
defesa da Capitania em 1629, na eminência da invasão holandesa, Coelho não faz menção
a nenhuma bateria sobre o banco de areia.

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EVOLUÇÃO E OBSOLESCÊNCIA:
Fortificações Portuguesas em Pernambuco anteriores à ocupação Holandesa
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fortificador das capitanias do Norte para preparar as capitanias e suas


fortificações. Em Pernambuco, constatou que as fortificações, que
ele mesmo havia levantado, ou recuperado, enquanto Governador,5
estavam desmanteladas e a Fortaleza do Rio Tapado estava sem a
artilharia. Para a defesa da Capitania mandou artilhar novamente a
Fortaleza do Rio Tapado e recuperar os fortes e baterias existentes,
no Recife e em seu porto, onde fez outras baterias (COELHO, 1982:
35, 42), Figura 3.

Figura 3. Localização das fortificações construídas pelo colonizador português antes


da invasão holandesa. Do total de nove fortificações restam apenas duas: O Forte de
São Francisco da Barra, de 1606, e o Forte de São Francisco de Olinda, de 1620. O
Forte de São Jorge, de 1590, é conhecido apenas através de iconografia.

Dentre as nove fortificações do primeiro sistema defensivo portu-


guês em Pernambuco, apenas três puderam ser estudadas: Forte de
São Francisco da Barra, construído de 1606 a 1608, (em estado de
ruina); Forte de São Francisco de Olinda, construído de 1620 a 1622,
(bem conservado), e o Forte de São Jorge, de 1590, do qual resta
apenas iconografia.

5 Matias de Albuquerque foi Governador da Capitania de Pernambuco de 1620 a 1624 e foi


Governador-Geral dos Estados do Brasil de 1624 a 1626.

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166 Manuela Xavier Gomes de Matos | Paulo Martin Souto Maior

Forte de São Jorge, de 1590

O Forte de São Jorge, localizado no bairro do Recife, região cen-


tral da cidade, foi construído pelos colonizadores portugueses a par-
tir de 1590. O Forte foi posicionado na entrada do porto do Recife,
num istmo banhado a leste pelas águas do mar e a oeste, pelo rio
Beberibe. Na atualidade não há vestígios do Forte, acredita-se que
suas ruínas estejam localizadas no entorno ou sob a Igreja de Nossa
Senhora do Pilar.

Figura 4. Possível localização do Forte de São Jorge em relação a área central do


Recife. Não foram localizados vestígios do Forte.

Cronologia

O Forte de São Jorge foi edificado, em alvenaria de pedra, a partir


do final do século XVI e finalizado em 1603. A primeira referência
a um forte construído na Capitania é de 1595. Esse pode ter sido o
Forte de São Jorge, inclusive porque, segundo Barreto, o Forte foi
construído em 1590 (BARRETO, 2011: 88). A iconografia disponível
sugere tratar-se de uma fortificação de formato quadrado, composta
por muralha com quatro torreões nos cantos. Segundo Menezes, em
1612, estava em ruína.
Em 1620, foi restaurado. Em 1630, na invasão holandesa, teve as
muralhas arrasadas. Em 1638, como estava muito arruinado, foi ce-
dido por Maurício de Nassau para ser utilizado como hospital. Em

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EVOLUÇÃO E OBSOLESCÊNCIA:
Fortificações Portuguesas em Pernambuco anteriores à ocupação Holandesa
167

1667, depois de ter sido abandonado, teve parte do seu material


construtivo utilizado para restauração do Forte do Brum. Em 1680,
no seu local foi construída a Igreja de Nossa Senhora do Pilar, que
também utilizou os materiais construtivos do velho Forte, (MENEZES,
1986: 98).
Estudos realizados por Menezes apontam para a localização de
suas estruturas no entorno ou sob a Igreja de Nossa Senhora do Pilar,
no Bairro do Recife. Escavações arqueológicas realizadas pela Funda-
ção Seridó no entorno da Igreja, de 2010 a 2014, podem ter revelado
elementos construtivos de sua fundação. No entanto, é preciso que se
realizem trabalhos arqueológicos mais sistemáticos para poder afir-
mar se se trata, realmente, do primitivo Forte de São Jorge.

Figura 5. Duas representações do Forte de São Jorge, construído no Istmo de Recife


e Olinda, em 1590. Em cores, a vista do Recife de Peeter Gillis, de 1637. Em preto
e branco, o recorte da estampa do folheto holandês de 1630: De Stadt Olinda de
Pharnambuco.

Configuração Geométrica

O Forte de São Jorge, através de sua iconografia, é uma constru-


ção com formato quadrilátero. Como suas ruinas não foram até o
momento estudadas, não há dados físicos suficientes para uma des-

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168 Manuela Xavier Gomes de Matos | Paulo Martin Souto Maior

crição aprofundada. Mas no que concerne a uma análise tipológica,


no entanto, as referências iconográficas disponíveis dão indícios de
sua forma e de que possuía muralhas relativamente altas, com tam-
bores nos ângulos, troneiras e canhoneiras abertas (tanto no terraço,
como em níveis mais baixos, para possibilitar o tiro rasante). A partir
da iconografia não há como precisar suas dimensões. Pode-se, no
entanto, verificar que sua muralha conta com um reforço na base.

Figura 6. O Forte de São Jorge é uma fortificação com formato quadrilátero. Como
suas ruinas não foram até o momento encontradas, não há dados físicos suficien-
tes para uma descrição aprofundada. Essa planta esquemática foi elaborada a partir
da iconografia conhecida: estampa e folheto holandês de 1630, De Stadt Olinda de
Pharnambuco.

Escolha dos materiais construtivos

O Forte de São Jorge, segundo alguns indícios históricos, pode


ter sido construído em alvenaria de rocha, (MENEZES, 1986: 98). Há
referência ainda de que seus materiais construtivos foram reutilizados
para a construção do Forte do Brum.

Forte de São Francisco da Barra, de 1606

O Forte de São Francisco da Barra, localizado sobre os arrecifes


na entrada da barra, na área central do Recife, foi construído pelos
colonizadores portugueses de 1606 a 1612. Como a estrutura da mu-
ralha está em ruínas, é possível visualizar, do lado oeste, trechos da

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EVOLUÇÃO E OBSOLESCÊNCIA:
Fortificações Portuguesas em Pernambuco anteriores à ocupação Holandesa
169

fundação e, do lado leste, remanescentes da muralha, que estão sob a


influência do mar. As ruinas estão localizadas em ambiente marinho e
sofrem influência das águas do mar. As ondas batem com muita força
sobre a muralha e acabam projetando as águas para o lado oeste dos
arrecifes. A influência negativa do mar sobre as estruturas do Forte
ocorre ao longo de todo o dia, mesmo em período de maré baixa.

Figura 7. Vestígios da estrutura do Forte de São Francisco da Barra. Ainda permane-


ce parte do lado leste da fortificação ainda com remanescentes da muralha.

Figura 8. O Forte de São Francisco da Barra está localizado sobre os arrecifes na


entrada da barra, na área central do Recife. Foi construído pelos colonizadores por-
tugueses entre 1606 e 1612.

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170 Manuela Xavier Gomes de Matos | Paulo Martin Souto Maior

Cronologia

Em 1591, o Forte de São Francisco da Barra teve sua construção


autorizada pelo governador da Capitania, D. Francisco de Sousa, mas
só recebeu aprovação Real para sua construção em maio de 1606. O
desenho do forte foi enviado de Recife e recomendado a Tibúrcio
Spanochi, Engenheiro-mor dos Reinos de Espanha. Em 1608, Fran-
cisco Frias de Mesquita, estava trabalhando na fortificação que só foi
concluída em 1612. As referências arquitetônicas e espaciais infor-
mam que a fortificação, com formato de noneágono, foi construída
em alvenaria de pedra. O seu armamento constava de sete peças de
artilharia, (LAGO, 1973: 589).
Em 1620 estava em ruínas em função, inclusive, da ação do mar,
e foi reformado. Em 1630, foi conquistado pelos holandeses e foi
recuperado em 1638. Com a capitulação holandesa, em 1654, os co-
lonos portugueses reassumiram a fortificação. Em 1808, o governador
da Capitania mandou reformar o Forte, com projeto do engenheiro
Antônio Bernardino Pereira do Lago. Em 1905, serviu de posto fiscal
aduaneiro para o Ministério da Fazenda. Em 1906, estava em ruínas
e durante as obras de reforma do Porto do Recife teve sua estrutura
encobertas (MENEZES, 1986: 98).

Figura 9. Fotografia do Forte São Francisco da Barra feita por Marc Ferrez em 1875
quando o Forte ainda estava bem conservado.

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EVOLUÇÃO E OBSOLESCÊNCIA:
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171

Configuração Geométrica

A partir dos dados espaciais identificou-se a configuração geomé-


trica da fortificação. Foram registrados mais de 10 pontos topográfi-
cos para cada metro linear de muralha. Esse procedimento foi neces-
sário em função da irregularidade no posicionamento dos materiais
construtivos da face exterior da muralha.

A partir dos dados levantados e analisados pode-se afirmar que


o Forte de São Francisco da Barra é uma fortificação maciça com
formato de polígono de nove lados, noneágono. Os principais itens
que compõem a fortificação são a cortina, o parapeito e o terraple-
no, onde se posicionavam as peças de artilharia. O projeto inicial,
de 1606, foi elaborado pelo engenheiro Francisco Frias de Mesquita,
autor, inclusive, do projeto de fortificação abaluartada da Fortaleza
dos Três Reis Magos em 1598. Grosso modo, a fortificação está cir-
cunscrita numa circunferência com 20,90 metros de diâmetro e o
trecho de muralha remanescente mede cerca de 4 metros de altura,
do arrecife natural até o nível atual do solo. Sua muralha é inclinada,
com caimento de cerca de 70,71°. Suas dimensões e proporções es-
tão apresentadas na figura e tabelas a seguir.

Figura 10. O Forte de São Francisco da Barra é uma fortificação maciça com forma-
to de polígono de nove lados, noneágono.

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Atualmente, por estar em ruína, é possível descrever sua estrutura


construtiva. O limite externo é formado por um anel, com largura
variando de 3,00 a 3,50 metros, de rochas retangulares talhadas de
diferentes dimensões. Internamente, a partir de cada vértice em dire-
ção ao centro da figura, como raios, partem estruturas com cerca 1,00
metro de largura, em rocha talhada de diferentes dimensões. Essa
configuração estrutural é semelhante a do Forte de São Lourenço da
Cabeça Seca, em Oeiras, Portugal, de 1589, portanto anterior ao Forte
São Francisco da Barra

Figura 11. Estrutura remanescente do Forte de São Francisco da Barra, porção norte,
em formato de um polígono regular de nove lados e trecho das fiadas com alvenaria
irregular com rocha.

Escolha dos materiais construtivos

O Forte de São Francisco da Barra está construído externamente


em alvenaria de rocha (talhadas com e sem tratamento de superfície
e de diferentes tamanhos e formatos) com argamassa de barro e cal
e conforma um anel que delimita a estrutura que possui paredes
que partem dos vértices em direção ao centro. É de supor que essa
conformação tenha como objetivo distribuir uniformemente impactos
pontuais, no caso tiros de canhão e dar mais rigidez ao sistema. Inter-
namente a estrutura é preenchida por uma argamassa com metralha
composta por fragmentos de rocha e tijolo cerâmico.
Foram realizadas três análises para identificar o tipo de rocha

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EVOLUÇÃO E OBSOLESCÊNCIA:
Fortificações Portuguesas em Pernambuco anteriores à ocupação Holandesa
173

dessas alvenarias. Macroscopicamente verificou-se que essas rochas


apresentam variação de granulometria, mas composição semelhan-
te, sugerindo tratar-se do mesmo tipo. O exame revelou que as do
anel externo são compostas por rochas moderadamente seleciona-
das, com grãos de tamanho areia média, sub-arredondados, de baixa
esfericidade, na cor creme acinzentado e que podem ser percebidos
sem auxílio de lupa. As das alvenarias internas (que partem dos vér-
tices) são compostas por rochas bem selecionadas, com grãos tama-
nho areia fina, sub-arredondados, de alta esfericidade, na cor branco
acinzentado e que podem ser percebidos sem auxílio de lupa.

Figura 12. Planta baixa e detalhe da alvenaria de rocha e preenchimento de argamassa


de cal com metralha do Forte de São Francisco da Barra.

A análise com ácido clorídrico revelou que as rochas das duas


alvenarias (anel externo e paredes que partem dos vértices) reagiram
ao ácido clorídrico, (HCl concentração de 10%), liberando CO2, abun-
dantemente por um longo tempo.
A análise de Fluorescência de Raio-X, (FRX), permitiu identificar
qualitativa e quantitativamente os elementos químicos que compõe

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 159-188, 2018


174 Manuela Xavier Gomes de Matos | Paulo Martin Souto Maior

as rochas. Os resultados evidenciaram que as rochas apresentam ele-


vadas quantidades de Cálcio e Silício com traços de Alumínio e ves-
tígios de outros elementos, como o ferro. Considerando a elevada
quantidade de Silício presente nas rochas, podemos sugerir que a
rocha utilizada na construção do Forte de São Francisco da Barra
não foi o Calcário, pois este mineral é considerado uma impureza da
rocha calcária. Infere-se, portanto, que a rocha utilizada foi o arenito
quartzoso.

Figura 13. Tipos de rocha do Forte de São Francisco da Barra. Rocha tipo (1), rocha
da alvenaria estrutural, do anel exterior que delimita a fortificação e Rocha tipo (2),
rocha da alvenaria estrutural, especificamente, dos raios que partem dos vértices em
direção ao centro. Imagem extraída a partir do Microscópio Digital portátil Dino-Lite
PLUS, com aumento de 55 vezes. Considerando a elevada quantidade de Silício pre-
sente nas rochas, podemos sugerir que a rocha utilizada na construção do Forte de
São Francisco da Barra foi o arenito quartzoso. As fontes de arenito mais próximas
estão a mais de 15 km para Norte da Capitania de Pernambuco mas há também uma
fonte de arenito de praia (beachrocks) que está localizada sob a fortificação.

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EVOLUÇÃO E OBSOLESCÊNCIA:
Fortificações Portuguesas em Pernambuco anteriores à ocupação Holandesa
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Figura 14. Resultados da análise de Fluorescência de Raio-X realizada nos tipos de rocha
utilizados no Forte de São Francisco da Barra indicando que se trata de arenito quartzo-
so. As rochas pertencem: a alvenaria estrutural do anel exterior que delimite a fortificação
e as estruturas em forma de raios que partem dos vértices em direção ao centro.

A partir do mapeamento das fontes de rocha realizado verifica-se


que as fontes de arenito mais próximas do Forte de São Francisco
da Barra estão a mais de 15 km para Norte da antiga Capitania: é
uma fonte de arenitos da Formação Beberibe. O Arenito é uma rocha
sedimentar composta pelos minerais Quartzo (SiO2), Mica, Feldspa-
to, além de minerais salinos (como Halita, Anidrita, Gipso), mine-
rais carbonatados (como calcita (CaCO3) e Aragonita), pela Dolomita
(CaMg(CO3)2), Celestita (SrSO3), além da Estroncianita (SrCO3) e mi-
nerais argilosos. Os Arenitos podem ser quatzosos quando têm mais
de 95% de Quartzo; Arcósicos quando têm mais de 25% de Feldspato;
e, líticos quando têm mais de 25% de fragmento de rocha, (SCHU-
MANN, 1972: 34).
Há também uma fonte de arenito de praia (beachrocks) que está
localizada sob a fortificação. O estudo petrográfico e geoquímico
dos arenitos de praia (beachrocks) da região central da costa de Per-
nambuco, que abrangeu os municípios de Paulista, Olinda, Recife e
Jaboatão, revelou que se trata de Arenito médio a muito grosso e Are-
nito conglomerático, composto por grãos de Quartzo arredondados,
moderadamente selecionados e cimento carbonático composto de
Calcita rica em Magnésio (Mg) (FERREIRA JÚNIOR, 2011: 557-558).

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Sua composição é de Quartzo (média 71,6%), Feldspatos – Plagioclá-


sios (média 5%), metais pesados (máximo 4%) e Bioclastos (média
5%). (FERREIRA JÚNIOR, 2011: 550-558). Portanto, as rochas utiliza-
das podem ter sido extraídas de uma dessas duas fontes.

Forte de São Francisco de Olinda, de 1620

O Forte de São Francisco de Olinda foi construído pelos coloniza-


dores portugueses entre 1620 e 1622. A estrutura da muralha está re-
vestida não sendo possível visualizar o sistema construtivo utilizado.
Apresenta bom estado de conservação, apesar de haver rachaduras
em três diferentes cortinas.

Figura 15. Forte de São Francisco de Olinda, construído pelos portugueses em 1620.

Figura 16. O Forte de São Francisco de Olinda, localizado na Praia de São Francisco,
em Olinda, PE, distante cerca de 8 km do Recife, foi construído pelos colonizadores
portugueses entre 1620 e 1622.

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Cronologia

Em 1620, Matias de Albuquerque, então governador da antiga


Capitania mandou que se construísse o Forte de São Francisco de
Olinda, na porção norte da praia de Olinda e a Guarita de João Al-
buquerque na porção sul da mesma praia. A obra foi executada pelo
mestre-pedreiro Cristóvão Alvares.6 O seu armamento constava de
4 peças de artilharia. Há referências de que era feito em alvenaria
de pedra (MENEZES, 1986: 100) e estava ligado por uma paliçada à
Guarita de João Albuquerque. Outras fontes também dizem ter sido
edificado em faxina e terra (BARRETTO, 1858). Foi concluído em se-
tembro de 1622 e em 1630 foi conquistado pelos holandeses. Não se
sabe ao certo a data em que os portugueses o reconquistaram, mas,
há notícias de que foi reconstruído em alvenaria, ainda no século
XVII, porém, em 1880, estava novamente em ruínas.

Configuração Geométrica

A partir do levantamento espacial pode-se afirmar que o Forte


de São Francisco de Olinda é uma construção maciça, de pequeno
tamanho, isolada, com formato de polígono quadrangular irregular,
sem baluartes. O Forte é composto por quatro cortinas, parapeito e
terrapleno. Sua muralha é inclinada, apresentando caimento médio
de 82,19°. Ao longo de toda a muralha, há um cordão em pedra que
sinaliza o fim da muralha e início do parapeito. Grosso modo, a forti-
ficação mede 23 metros de comprimento, 14 metros de largura e 2,70
metros de altura (do solo atual até o cordão em pedra), Figura 17.

6 Cristóvão Alvares, português alentejano, construtor experimentado com habilitação para


projetar edificações, inclusive militares (MELLO, 2011: 10).

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Figura 17. Planta Baixa da muralha do Forte São Francisco de Olinda, com indicação
das linhas e ângulos. O Forte é uma construção maciça, de pequeno tamanho, isolada,
com formato de polígono quadrangular irregular, sem baluartes.

Escolha dos materiais construtivos

O Forte de São Francisco de Olinda parece estar construído em


alvenaria de pedra com argamassa de cal. No entanto, como está
rebocado, não foi possível verificar as características físicas do seu
sistema e materiais construtivos. Apesar das rachaduras não se pode
afirmar qual sistema construtivo utilizado.

Figura 18. Não foi possível verificar as características físicas do sistema e dos mate-
riais construtivos do Forte de São Francisco de Olinda, pois toda a sua muralha está
rebocada. há apenas uma rachadura com exposição de argamassa em uma de suas
fachadas.

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Análise das três Fortificações

1. Classificação tipológica

As fortificações construídas em Pernambuco nos séculos XVI até


o início do século XVII podem ser classificadas como Fortificação de
Transição ou Fortificação Moderna. Essa classificação foi realizada a
partir da análise comparativa entre a caracterização física dos tipos
de fortificação europeias de Transição ou Moderna,7 com a carac-
terização física das fortificações construídas em Pernambuco nesse
período.

Padrão de Fortificação de Transição

Fortificação de transição é um modelo que fez parte do proces-


so de evolução da Fortificação Medieval para o tipo de Fortificação
Moderna, tendo em vista as transformações das armas de fogo. Essas
mudanças iniciaram com a descoberta da pólvora e o desenvolvi-
mento da pirobalística e da sua capacidade de destruição. Podem ser
identificadas duas fases no desenvolvimento da Fortificação de Tran-
sição. Uma primeira fase onde, grosso modo, as muralhas8 medievais
passaram a ser construídas com menor altura e base reforçada, em
talude; e surgiram troneiras9 e canhoneiras10 permitindo o tiro flan-
queado com armas de fogo (Guia de inventário, 2015: 16-18).
E uma segunda fase, marcada pelo surgimento do tambor, ou seja,
uma ampla torre circular, oca, posicionada nos ângulos da muralha
e enterrada no fosso. Surgiram ainda baluartes atípicos, ou seja, em-
brionários dos baluartes modernos. Eram estruturas pouco salientes,
com defesa frontal paralela à muralha e com grandes orelhões onde
eram colocadas as armas de fogo. Esses baluartes, no entanto, deixa-

7 Não há alusão a fortificações medievais no Brasil.


8 Muralha é uma parede possante construída em pedra, taipa ou ladrilho no período medie-
val (Guia de inventário, 2015: 91).
9 Troneiras são aberturas arredondadas e longas rasgadas na muralha para permitir o tiro
(Guia de inventário, 2015: 106).
10 Canhoneiras são troneiras retangulares onde se colocam as armas de fogo, da artilharia
pirobalistica (Guia de inventário, 2015: 71).

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vam zonas mortas junto aos orelhões, onde o inimigo não poderia ser
atingido pela artilharia, (Guia de inventário, 2015: 18).

Padrão de Fortificação Moderna

A Fortificação Moderna, por sua vez, foi desenvolvida na primeira


metade do século XVI para defender os sítios da nova artilharia piro-
balística que se desenvolveu desde 1520, resultando numa artilharia
cujo efeito de destruição passou a superar o efeito moral (Guia de
inventário, 2015: 21). Um dos principais elementos da Fortificação
Moderna era o baluarte angular que junto com a cortina compunha a
sua estrutura básica.11 A defesa era feita através de linhas flancantes,
que partiam dos flancos, paralelamente à face do baluarte contíguo.
Essas linhas eram indicativas dos tiros de canhões que a fortificação
poderia efetuar a partir dos flancos e juntas formavam faixas de defe-
sa. Quanto mais larga essa faixa, melhor defendida estaria a fortifica-
ção (GOLDMAN, 1645: 2-3).

Figura 19. Esquema de uma fortificação moderna abaluartada, com cortina e baluarte.

11 O traçado abaluartado atingiu seu auge em 1650 e por todas as razões acima apresentadas,
passou a ser a escolha dominante para a construção de fortificações até o século XIX (Guia
de inventário, 2015: 84).

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Figura 20. Representação das linhas flancantes e das faixas de defesa de uma forti-
ficação moderna, abaluartada. Essas linhas eram indicativas dos tiros de canhões que
a fortificação poderia efetuar. É a largura da faixa de defesa que demonstraria a boa
qualidade defensiva de uma fortificação. Quanto mais larga essa faixa, melhor defen-
dida estaria a fortificação, (GOLDMAN, 1645: 2-3).

Resultados da Classificação Tipológica

No caso das fortificações da antiga Capitania de Pernambuco cons-


truídas até 1630, os aspectos da caracterização física considerados
foram aqueles referentes ao conceito de Configuração Geométrica,
composto pelas variáveis formato, dimensões e proporções, modelos
e inclinação dos muros. O Forte de São Jorge é o único que pode ser
classificado como Fortificação de Transição, pois conta com os prin-
cipais itens que compõe esse tipo: muralhas relativamente altas, com
tambores nos ângulos e canhoneiras abertas nas muralhas, (tanto no
terraço, como em níveis mais baixos, para possibilitar o tiro rasante).
O Forte de São Francisco da Barra, por sua vez, é uma fortificação
com formato de noneágono regular, cujas cortinas inclinadas confor-
mam o terrapleno. Essa configuração, além de não apresentar baluar-
tes modernos, pentagonais, também não apresenta altas muralhas ou
tambores. Deve-se, portanto, considerar seus outros atributos físicos:

a) Trata-se de uma fortificação maciça, com escarpa em


talude, logo, menos frágil, e consequentemente, favorável à de-

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fesa do ataque com armas de fogo, pois se configura como um


corpo sólido;
b) Possui uma planta poligonal regular e de maior com-
plexidade geométrica, pois conta com nove lados, demonstran-
do um maior domínio das regras geométricas para dividir um
círculo em nove partes iguais, (essa é uma característica que vai
se consolidando desde o momento de Transição até o Moderno).

A partir do exposto, o Forte de São Francisco da Barra pode ser


considerado uma Fortificação Moderna, de pequenas dimensões, ou
seja, um fortim ou reduto.

O Forte de São Francisco Olinda, apresenta formato de polígono


irregular, quadrangular, e assim como o Forte de São Francisco da
Barra, não conta com baluartes modernos, nem com altas muralhas
e tambores. Nesse caso também devem ser considerados seus outros
atributos físicos:

a) Trata-se de uma fortificação maciça, com escarpa em


talude, portanto, menos frágil, estando mais bem preparada para
se defender do ataque com armas de fogo, pois se configura
como um corpo sólido.
b) Quanto ao seu formato, apesar de não contar com
formas geométricas complexas, como no Forte de São Francisco
da Barra, tem formato poligonal, mesmo irregular, que é uma
característica que vai se consolidando no modelo moderno.

A partir do exposto, o Forte de São Francisco Olinda também


pode ser considerado uma Fortificação Moderna, de pequenas di-
mensões: como um fortim ou reduto.

2. Classificação quanto a modelos europeus modernos

O objetivo foi verificar se houve a escolha por modelos europeus


para a construção dessas fortificações, buscando-se, inclusive, identi-
ficar a afiliação a alguma escola de Fortificação Moderna.

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EVOLUÇÃO E OBSOLESCÊNCIA:
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Eficácia bélica e tipologia

Como já foi apresentado, a Fortificação de Transição era um tipo


de fortificação intermediária, entre a Fortificação Medieval e a Fortifi-
cação Moderna, que foi desenvolvido porque a Fortificação Medieval
tornou-se ineficaz diante das armas de fogo da artilharia pirobalisti-
ca. No entanto, com o aprimoramento da artilharia, a partir do sur-
gimento de canhões com elevado poder de destruição, a partir de
1530, esse tipo de fortificação, por sua vez, tornou-se ineficaz diante
do aumento de poder das armas de fogo da artilharia pirobalistica.
A Fortificação de Transição, grosso modo, era formada por muralhas
altas, intercaladas por tambores vazios, uma estrutura frágil diante
dos canhões de alto calibre em uso desde 1530, em toda a Europa.
Esse tipo de fortificação, portanto, tinha reduzida capacidade de se
defender das armas de fogo em utilização no século XVI e XVII, sua
eficácia bélica nesse período era baixa.

As Fortificações Modernas, diferentemente, foram desenvolvidas


para resistir ao impacto das balas dos canhões, com suas muralhas
formadas por reparos baixos, largos e maciços. A eficácia bélica de
uma Fortificação Moderna, portanto, já é maior que a de uma Fortifi-
cação de Transição, independente do modelo utilizado.

Eficácia bélica e linhas flancantes

Esta eficácia é relativa à capacidade que tem uma fortificação de


se defender a partir da existência de linhas flancantes e, consequen-
tes, faixas de defesa. Linhas flancantes são linhas que partem dos
flancos em direção à face do baluarte contíguo, paralela à face. Cada
linha poderia significar um canhão e o conjunto de linhas formava
uma faixa de defesa. No caso das fortificações de Pernambuco cons-
truídas no século XVI e primeiras décadas do século XVII, nenhuma
das três apresentam baluartes, portanto, não contam com faixas de
defesa. As cortinas não têm como se defender, deixando-as suscetí-
veis ao ataque do inimigo, reduzindo sua eficácia bélica.

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 159-188, 2018


184 Manuela Xavier Gomes de Matos | Paulo Martin Souto Maior

Eficácia bélica e obediência a um modelo moderno

O conceito de eficácia bélica aplicado às fortificações em Per-


nambuco revela o grau de semelhança entre a forma do prédio e os
modelos dos tratados citados. No caso das fortificações estudadas,
apenas duas seguem modelos de fortificação moderna. A semelhança
delas com modelos presentes nos tratados de fortificação foi identifi-
cada a partir da sobreposição do desenho do modelo sobre as planta
baixas das fortificações existentes, Figura 21.12 A partir da sobreposi-
ção, constata-se que o Forte de São Francisco da Barra é semelhante
ao modelo europeu. Já o Forte de São Francisco de Olinda tem for-
mato diferente ao proposto pelos tratados.

Figura 21. A eficácia bélica de fortificações modernas decorre do seu grau de seme-
lhança das configurações geométricas com os modelos dos tratados de fortificação
europeus. O Forte de São Francisco da Barra assemelha-se ao modelo geométrico
simplificado de reduto ou fortim, em formato de um noneágono. Já o Forte de São
Francisco de Olinda tem formato diferente, pois é quadrangular. Isto é um indício
de que teria uma menor eficácia bélica.

Conclusão

Como explicar a opção por um determinado produto, mesmo sa-


bendo da sua inadequação para o fim a que se propõe? Inicialmente

12 Lembrando que as plantas baixas das fortificações estudadas foram elaboradas a partir de
levantamento topográfico com Estação Total, exceto o Forte de São Jorge que a Planta é
esquemática e elaborada a partir de perspectivas encontradas na Iconografia.

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 159-188, 2018


EVOLUÇÃO E OBSOLESCÊNCIA:
Fortificações Portuguesas em Pernambuco anteriores à ocupação Holandesa
185

pode parecer que houve falta de recursos financeiros e materiais ou


então desconhecimento dos construtores dos modelos de fortes mo-
dernos europeus.
No caso das fortificações construídas em Pernambuco, ao longo dos
séculos XVI e XVII, a justificativa do desconhecimento não poderia ser
aceita, haja vista todo o investimento de Portugal, enquanto Nação,
para sua introdução na arte da fortificação moderna. Desde o início do
século XV, já havia, em Portugal, preceptores italianos para os nobres,
além de intelectuais estrangeiros, que eram chamados pelo Governo e
pela Igreja para atuar em território português e nas suas colônias. Por-
tugal também estava se preparando para defender seu Império, foram
traduzidos tratados, contratados estrangeiros, enviados engenheiros
para a Itália. Portanto, foi feito todo um esforço para a formação de
profissionais na arte da guerra (WEHLING. 1999: 21, 36).
A justificativa financeira, por sua vez, não é tão simples de refutar.
De fato, o Brasil era considerado uma colônia de segunda categoria,
no século XVI e início do XVII, os interesses estavam no Oriente.
Portugal não ia investir em Pernambuco. Essa justificativa econômica,
na realidade, estava intimamente relacionada às questões de fundo
político: Portugal não estava interessado no Brasil, portanto, não ia
investir nesse território. Mas porque, então, os colonos não investi-
ram? Não financiaram obras de fortificação mais eficazes? Afinal, a
produção de açúcar de Pernambuco era responsável por 1/3 da pro-
dução de toda a colônia.
Nesse primeiro momento, foram construídas quatro fortificações,
todas muito pequenas e frágeis, sem linhas de defesa. Um sistema de-
fensivo inócuo apesar do conhecimento técnico, dos recursos que se
poderiam dispor e das ameaças constantes. A Capitania foi protegida
com fortificações que não a protegiam.
Retomando os dois conceitos de Sistema Defensivo apresentados,
enquanto um deles se restringia a um conjunto de fortificações e
estruturas de defesa; o outro considerava que, além das fortificações,
deveria se incorporar tropas e embarcações (TONERA, 2005: 2). In-
duz-se assim que as escolhas tecnológicas em Pernambuco passaram
pela compreensão de sistema defensivo como essa estrutura mais
ampla de fortificações, embarcações e tropas. E que a ausência des-
ses outros elementos (embarcações e tropas) impediu investimentos

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 159-188, 2018


186 Manuela Xavier Gomes de Matos | Paulo Martin Souto Maior

apropriados nas estruturas construtivas no século XVI e primeiras


décadas do século XVII.
Pode-se, portanto, concluir que apesar de ter havido uma transfor-
mação tecnológica nos tipos de fortificação utilizados na Capitania de
Pernambuco, nesse período, representando um aumento da eficácia
bélica das fortificações, essa transformação partiu de uma fortifica-
ção obsoleta (Fortificação de Transição) para outra também obsoleta
(Fortificação Moderna simplificada, sem baluarte). O tipo de Tran-
sição não tinha eficácia bélica para se defender das armas de fogos
existentes, e o modelo simplificado do tipo de fortificação Moderna,
tinha baixa eficácia.

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DA HISTÓRIA REGIONAL À NACIONAL. EXEMPLO DE 18171

Vamireh Chacon2

Resumo: O presente texto discute a abrangência da Revolução de


1817 e sua importância no contexto nacional a partir da análise da
historiografia produzida desde 1840 sobre o tema.

Palavras-chave: Revolução de 1817, historiografia, Pernambuco,


Nordeste, bicentenário da Revolução de 1817.

From Regional to National History. The 1817 Revolution example

Abstract: This paper discusses the comprehensiveness of the 1817


Revolution and its importance in the national context through the
analysis of historiography produced from 1840 on the subject.

Key-words: 1817 Revolution, historiography, Pernambuco, Northeast,


Bicentennial of the 1817 Revolution.

Capistrano de Abreu certa vez disse que só seria possível uma


história do Brasil quando tivessem sido pesquisadas e escritas as
histórias regionais brasileiras. A Revolução Nordestina de 1817, ini-
ciada e terminada em Pernambuco, ora com Bicentenário comemo-
rado, é mais uma prova disto.

1 Conferência apresentada na sessão de abertura do colóquio “A Revolução Pernambucana


de 1817 na construção do Brasil” que englobou o VI Congresso Nordestino de Institutos
Históricos e o I Congresso Pernambucano de Institutos Históricos Municipais. A sessão
de abertura foi presidida por George Cabral presidente do IAHGP e contou também com
a conferência pronunciada por Arno Wehling, presidente do IHGB.
2 Professor emérito da Universidade de Brasília. Sócio do IAHGP e do IHGB.
190 Vamireh Chacon

A Revolução de 1817 de Pernambuco, Paraíba e Rio Grande do


Norte – Alagoas era então parte de Pernambuco – não conseguiu
estender-se nem ao Norte, detida no Ceará, nem ao Sul contida na
Bahia, porém o tentou com grandes sacrifícios pessoais e sociais. O
que demonstra seu sentido brasileiro e não só nordestino. Portanto,
não era separatista.
Começada em 6 de março de 1817 e terminada no Recife, onde
permaneceu dois meses e meio no poder, é natural que nele mais se
cultive a sua memória, porém outros estados e cidades têm o mesmo
direito, extensivo aos pesquisadores estrangeiros. Não pretendemos,
nesta evocação bicentenária, esgotar as etapas historiográficas per-
corridas por antecessores e sim registrarmos algumas delas.
A historiografia da Revolução de 1817 teve seu inicial maior im-
pulso pela História da Revolução de Pernambuco de 1817 de autoria
de Muniz Tavares, publicada em 1840 quando ainda sobreviviam ele
e alguns revolucionários pioneiros independentistas e republicanos
de 1817, mais os republicanos e federalistas de 1824. Ele merece ser
lembrado por este e outros grandes méritos.
Francisco Muniz Tavares era pernambucano, padre e político.
Doutorou-se em teologia em Paris. Teve vida longeva, participou da
Revolução de 1817 aos vinte e quatro anos de idade, gastou mais
quatro em cárcere em Salvador, foi liberto na companhia inclusive
de Frei Caneca que viria a ser fuzilado no Recife por reincidência
revolucionária em 1824.
Eleito deputado por Pernambuco à Constituinte portuguesa de
1820, Muniz Tavares dela participou defendendo a Independência
do Brasil ao lado dos outros deputados brasileiros. O movimento
independentista logo veio a ser liderado pelo paulista José Bonifá-
cio. Também por seu irmão Antônio Carlos, que esteve envolvido na
Revolução de 1817 quando residia em Pernambuco. A Constituinte
portuguesa de 1820, mesmo com decisões liberais internas em Por-
tugal, queria extinguir o Reino Unido e devolver o Brasil à anterior
situação colonial.
Entre seus principais debates está aquele do deputado brasileiro
Muniz Tavares com o deputado português Borges Carneiro. Então
Muniz Tavares previu em 1821 que a repressão pela violência do
então governo de Portugal contra os pernambucanos, mais uma vez

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 189-202, 2018


Da história regional à nacional. Exemplo de 1817 191

insurrecto, levaria à ruptura no Brasil como ocorrera nos Estados Uni-


dos contra a repressão do governo inglês. O que veio a acontecer em
Pernambuco sob a liderança de Gervásio Pires Ferreira, antes mesmo
da proclamação da independência por Dom Pedro I.
Muniz Tavares defendeu também Francisco Paes Barreto, envol-
vido naquele levante armado logo vitorioso, antecipando mais uma
vez em Pernambuco a Independência do Brasil. Paes Barreto veio a
ser designado Marquês do Recife e primeiro governador de Pernam-
buco nomeado pelo recém-imperador Dom Pedro I. Muniz Tavares
foi eleito por Pernambuco a deputado constituinte em 1823. Voltou
ao Parlamento brasileiro na legislatura de 1845-1847, dele vice-pre-
sidente e presidente. Foi o principal fundador e primeiro presidente
do Instituto Arqueológico, Histórico e Geográfico Pernambucano no
Recife em 1862, o segundo mais antigo do Brasil logo após o Instituto
Histórico e Geográfico Brasileiro em 1838 no Rio de Janeiro.
As respectivas origens eram diferentes.
O Instituto no Rio de Janeiro teve origem na realeza imperial,
fundado por outros, porém sob o patrocínio de um pernambucano
conservador esclarecido, Pedro de Araújo Lima, Marquês de Olinda,
então regente do Império e o mais longo em permanência no cargo
até a maioridade de Dom Pedro II. O Marquês de Olinda veio a ser
quatro vezes presidente do conselho de ministros, primeiro-ministro
do Império.
O Instituto em Pernambuco foi criado por remanescentes revolu-
cionários republicanos de 1817, federalistas também revolucionários
da Confederação do Equador de 1824, liberais radicais e socialistas
utópicos outro tanto revolucionários de 1848.
Como já afirmamos, Muniz Tavares publicou a primeira edição da
sua História da Revolução de Pernambuco de 1817 em 1840, então
ainda existiam alguns sobreviventes desta revolução e de 1824. Pou-
co tempo depois irrompia a Revolução de 1848, com outros tantos
reincidentes no que se denominava o maligno vapor pernambucano:
ímpetos dos que no Brasil saíram na frente em defesa das antecipa-
ções de independência, república, federalismo, liberalismo radical,
socialismo utópico e democracia. Estas antecipações foram prosse-
guidas e ainda hoje estão presentes no Nordeste e em todo o Brasil,
mais as contribuições estrangeiras a aqueles e outros movimentos

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 189-202, 2018


192 Vamireh Chacon

brasileiros em geral. Os institutos históricos nordestinos, escolas, até


as universidades, livros, artigos, ensaios e meios de comunicação de
massa ampliam e aprofundam estas heranças.
Em 1884 surgiu a segunda edição da referida História da Revo-
lução de Pernambuco em 1817. No primeiro centenário em 1917,
Oliveira Lima revisou e anotou a terceira edição da História de Muniz
Tavares com comentários equivalentes a outro livro.
Durante a monarquia predominou a interpretação imperial do di-
plomata Visconde de Porto Seguro, Francisco Adolfo de Varnhagen,
desde sua História Geral do Brasil em dois volumes, publicados em
1854 e 1857, à mais específica História Geral do Brasil antes da sua
Separação e Independência de Portugal, de 1870.
Era natural intelectualmente a implícita posição política de Var-
nhagen contra as tentativas revolucionárias brasileiras. Varnhagen
sempre foi conservador legitimista dinástico, nunca liberal. Os mé-
ritos do historiador são outros em Varnhagen, de quem podemos
discordar das posições políticas, reconhecendo-lhe vários méritos de
pesquisador e historiador.
Durante todo o período monárquico evitou-se comemorar oficial-
mente a própria Inconfidência mesmo de Minas Gerais, província já
importante no contexto político imperial. Recusava-se também come-
moração oficial das antecipações independentistas da baiana Conju-
ração dos Alfaiates e outro tanto das independentistas, republicanas
e federalistas pernambucanas e nordestinas de 1817 e 1824, mesmo
com a já então grande importância política da Bahia e Pernambuco.
Donde proveio a maior parte do primeiro-ministros, presidentes do
Conselho de Ministros do império. Depois a maioria dos paulistas e
mineiros presidentes da república.
Ainda maiores eram a desconfiança oficiosa e o desconhecimento
oficial imperiais diante da Revolução de 1848 e 1849 de Pernambuco
e Paraíba, com suas antecipações democráticas radicais até socialis-
tas conforme demonstraram as pesquisas de Gilberto Freyre em Um
Engenheiro Francês no Brasil sobre Louis-Léger Vauthier engenheiro
francês adepto do socialismo de Victor Considérant, também as de
Amaro Quintas em O Sentido Social da Revolução Praieira e as mi-
nhas próprias na História das Ideias Socialistas no Brasil.
Coube a Oliveira Lima projetar em escala nacional o reconheci-

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 189-202, 2018


Da história regional à nacional. Exemplo de 1817 193

mento da Revolução de 1817, nos começos da república, aos vinte e


oito anos de idade já se prenunciando o historiador que veio a ser,
no seu livro Pernambuco seu Desenvolvimento Histórico publicado
em 1895 na editora alemã F. A. Brockhaus em Leipzig, quando ele já
se assinava sócio correspondente do Instituto Arqueológico, Históri-
co e Geográfico Pernambucano. Oliveira Lima, filho de rica família
portuguesa no Recife, foi levado por seus pais em 1873 aos seis anos
de idade para estudar em Lisboa, onde frequentou cursos dos básicos
aos de Faculdade, donde seguiu carreira diplomática brasileira. Sem
nunca esquecer o Brasil, sempre voltando à Academia Brasileira de
Letras no Rio de Janeiro, da qual foi um dos fundadores, e a Pernam-
buco à sua casa natal hoje sede do Conselho Estadual de Cultura na
Avenida com o seu nome no Recife. Também se deliciava com a casa-
-grande do engenho da família da sua esposa, Flora.
Oliveira Lima pertence à linhagem dos pernambucanos vivendo
fora de Pernambuco, sem nunca esquecê-lo, dele sempre se lem-
brando em atos, palavras e escritos. Confirmando Joaquim Nabuco,
quando acusado de só voltar dos Estados Unidos, Europa e Rio de
Janeiro ao Recife para pedir votos de reeleição de deputado mesmo
na nobre causam abolicionista, ele, Nabuco, respondia que morar em
Pernambuco é uma das formas de servi-lo.
Em Pernambuco seu Desenvolvimento Histórico, entre outros te-
mas, ele prossegue o trabalho de recuperação das pesquisas de Mu-
niz Tavares sobre a Revolução de 1817.
Em 1917, no Primeiro Centenário da Revolução de 1817, em pu-
blicação comemorativa, Oliveira Lima comenta a terceira edição da
História da Revolução de Pernambuco em 1817 de autoria de Muniz
Tavares. Os comentários de Oliveira Lima valem por outro livro, pela
extensão, pormenores documentados e estilo rigoroso muito bem
escrito.
Em 1975, surge a reedição de Pernambuco seu Desenvolvimento
Histórico com Prefácio de Gilberto Freyre. De 1997 é a terceira edi-
ção apresentada e organizada por Leonardo Dantas Silva, na qual se
manteve o Prefácio de Gilberto Freyre para a edição de 1975.
Outra básica fonte primária para pesquisa e interpretação da Re-
volução de 1817 está nos Autos do Processo para Julgamento dos Re-
beldes de Pernambuco, Participantes da Rebelião de 1817 coligidos e

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 189-202, 2018


194 Vamireh Chacon

comentados por José Honório Rodrigues. Entre suas revelações estão


os depoimentos sobre o Conde Pontécoulant, o Coronel Latapie, o
Ordenança Artong e o Soldado Raulet, bonapartistas franceses envol-
vidos numa das conspirações para libertar Napoleão do exílio na ilha
de Santa Helena no Atlântico Sul entre a África e o Brasil.
O que à primeira vista parece extravagância vem sendo pesquisa-
do e estudado por historiadores franceses, norte-americanos e latino-
-americanos no que se refere às movimentações de dois irmãos de
Napoleão, José e Luciano, exilados nos Estados Unidos. Em especial
as de José Bonaparte, breve rei da Espanha colocado no trono por
Napoleão, quando procurou por palavras e atos incentivar movimen-
tos independentistas na América Hispânica.
Tais movimentações chegaram inclusive ao conhecimento do escri-
tor francês Stendhal, bonapartista militante que registra suas esperan-
ças no seu Diário (Journal) no dia 1. de junho de 1817: “A insurreição
admirável no Brasil, quase a melhor coisa que pode acontecer...” Con-
tudo a Revolução de Pernambucana a Nordestina, quase se ampliando
ao Norte e Sul do Brasil, já tinha esgotado em maio seus setenta e
cinco dias no poder iniciados em 6 de março daquele ano.
Chateaubriand em torno de 1840 registra nas suas Memórias de
Além-Túmulo seu conhecimento da expedição liderada pelo Coronel
Latapie, declarando-a uma temeridade.
Depoimentos pessoais de testemunhos da Revolução de 1817 são
de estrangeiros residentes no Recife, há séculos porto cosmopolita de
exportação do açúcar, produto agrícola do mais alto valor econômico
ainda na época ao lado de alguns outros. Foram eles o francês Louis-
-François de Tollenare, com suas Notas Dominicais, e o inglês Henry
Koster com suas Viagens no Brasil, livros escritos quando residiam
no Recife.
F. A. (Francisco Augusto) Pereira da Costa nos seus Anais Pernam-
bucanos recupera dia a dia a história de Pernambuco em sua segun-
da edição de 1983 a 1985 com “Aditamentos e Correções” por José
Antônio Gonsalves de Mello, um dos maiores mestres da pernambu-
canidade ao lado de Gilberto Freyre e Oliveira Lima, a quem tanto
deve também o nosso Instituto Arqueológico, Histórico e Geográfico
Pernambucano. Ainda de F. A. Pereira da Costa é o seu básico Di-
cionário Biográfico de Pernambucanos Célebres publicado em 1882,

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 189-202, 2018


Da história regional à nacional. Exemplo de 1817 195

depois reeditado. Em ambos ressaltam entre outras as presenças dos


personagens e acontecimentos de 1817.
Dias Martins já em 1853 publicava sua pesquisa também biográfi-
ca, porém concentrada em Os Mártires Pernambucanos. Vítimas da
liberdade nas Duas Revoluções em 1710 e 1817, portanto incluindo
os companheiros de Bernardo Vieira de Melo na tentativa revolucio-
nária na Olinda desde o século dezoito.
Depois de Pernambuco é na Paraíba onde mais se estende a Re-
volução de 1817 no espaço e no tempo. Quando se lê a lista de
localidades sublevadas pelo interior da Paraíba, várias delas antes
mesmo de tornarem-se municípios autônomos, nota-se o seu fervor
revolucionário em 1817. Ele vai do litoral a Campina Grande e dali
a Pombal e Sousa nos confins do sertão quase na divisa da Paraíba
com o Ceará, mais os arredores por onde se alastra. São também nu-
merosos os ardorosos revolucionários desde um quase adolescente,
Peregrino de Carvalho, com dezessete anos, a provectos aderentes.
Dos cerca de trezentos e setenta réus revolucionários em 1817, cento
e dezessete são paraibanos. Muitos os executados por pena de morte.
A História da Paraíba de autoria de José Octávio de Arruda Melo
é tão vibrante quanto o seu autor. Horácio de Almeida, seu anteces-
sor em homônima História da Paraíba, muito recorre a fontes docu-
mentais primárias até então pouco referidas.
Uma nova geração de professores universitários, historiadores pa-
raibanos e de outros estados sobre a Paraíba emerge em conjunto
no número 28 da revista de cultura Genius, editada por Flávio Sátiro
Fernandes e dedicada na sua publicação de novembro-dezembro de
2017 ao Bicentenário da Revolução de 1817 na capital João Pessoa.
O movimento revolucionário de 1817 alastrou-se ao Rio Grande do
Norte, lá se defrontando com as vacilações do governador José Inácio
Borges, conforme o demonstrado na História do Rio Grande do Norte
por Augusto Tavares de Lira, historiador com paralela extraordinária
carreira de deputado federal, governador deste seu estado, senador
e líder do governo no Senado, ministro da Viação e Obras Públicas,
duas vezes ministro da Fazenda, ministro e presidente do Tribunal
de Contas da União. Com equilíbrio e objetividade historia a rápida
ascensão e declínio da Revolução no seu estado.
Relembra também a importância do norte-riograndense Padre Mi-

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196 Vamireh Chacon

guel Joaquim de Almeida e Castro, Padre Miguelinho, também de-


nominado Frei Miguelinho por ser frade desclaustrado, secretário do
governo provisório organizado no Recife.
Excepcional importância tem a também pormenorizada História
do Rio Grande do Norte por Luís da Câmara Cascudo. Nela estão as
presenças liderantes revolucionárias de André de Albuquerque Ma-
ranhão, coronel, ao lado de outros militares e dos padres Feliciano
José Dornelas e João Damasceno, com pouca repercussão popular, o
que em nada diminui suas coragens pessoais. O Padre Miguelinho, a
quem o português Conde dos Arcos, comandante da repressão, tenta
salvar alegando inconclusa a sua assinatura em documento de con-
clamação revolucionária, toma-lhe das mãos o documento e comple-
ta-o por extenso, assinando-o Miguel Joaquim de Almeida e Castro,
tornando inevitável sua tão desejada sentença de morte.
Outro dos principais líderes, o Padre João Ribeiro Pessoa de Melo
Montenegro, conhecido Padre João Ribeiro, enforca-se numa corda
sobre o altar-mor de um engenho após ser derrotado na Batalha de
Trapiche, uma das últimas da Revolução de 1817.
Eram rigorosos jacobinos aqueles clérigos para espanto de Tolle-
nare, que antes já testemunhara os excessos dos seus predecessores
na Revolução Francesa.
Muito grande se apresentam a quantidade e qualidade de clérigos
envolvidos na Revolução de 1817. Também as dos mações. Várias
vezes nos mesmos personagens.
A explicação vem do Seminário de Olinda criado em 1799 e insta-
lado em 1800, mais que simbólico fim de um tão importante século
quanto o começo de outro. Seminário orientado pelo bispo de Olin-
da, Azeredo Coutinho, que lhe preparou um currículo com inovações
revolucionárias ao incluir o aprendizado de ciências também naturais
e língua francesa, permitindo aos seminaristas o direto acesso aos
pensadores iluministas e enciclopedistas da época. Com o resultado
de formação de mentalidades politizadas revolucionárias. Muito mais
atraentes à juventude que a metafísica medieval.
O viajante francês Tollenare testemunha estas influências nas suas
Notas Dominicais, com os subsequentes resultados proféticos de
1817 na Independência de 1822 e República de 1889, por eles dese-
jadas populares radicais e não oligárquicas.

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Da história regional à nacional. Exemplo de 1817 197

Até ao Ceará chegam pelos insurrectos interiores de Pernambuco


e Paraíba os ecos e conclamações da Revolução de 1817 irradiando-
se do Recife. No Crato, nas divisas cearenses com as pernambucanas
e paraibanas, o líder é uma líder, a matriarca Bárbara de Alencar,
mãe de futuros estadistas do Império após a Independência mesmo
monárquica.
A Revista do Instituto do Ceará publicou no seu tomo LXXIV, ano
também LXXIV, longo artigo sobre “A Revolução de 1817 no Ceará”
de autoria de Carlos Studart Filho, descendente do eminente historia-
dor cearense Barão de Studart. Dele emerge a grande importância
de Bárbara de Alencar no movimento nos sertões cearenses do Nor-
deste, mulher rica que tinha tudo a perder e tudo arriscou por sacri-
ficado patriotismo, considerada “Muito inteligente, lida e corrida, era
a primeira senhora daquela região”. Duramente punida e com ilustre
descendência de estadistas no Império em breve independente.
Aquela edição de 1960 desta Revista foi republicada na íntegra
quando das comemorações deste Bicentenário.
A Revolução de 1817, contida pela força militar ao Norte, foi detida
no berço ao Sul na Bahia quando do desembarque do seu emissário
Padre Roma, cognome do clérigo desclaustrado José Inácio Ribeiro
de Abreu e Lima que lá tinha estudado, pai do homônimo Abreu e
Lima, único brasileiro general de Bolívar.
Braz do Amaral também a esta Revolução se refere nas Notas e
Luís Henrique Dias Tavares algo mais na História da Bahia, mere-
cendo longa referência pelas suas inspiradoras indicações para outras
pesquisas: “Têm-se como certo que este primeiro grande movimento
pela separação do Brasil de Portugal tinha ligações com a Bahia. Os
indicativos estão na passagem pela cidade do Salvador do pernam-
bucano Manuel Moreira Magalhães, que teria vindo fazer contatos e
ultimar providências, e nas advertências que o Governador Dom Mar-
cos de Noronha e Brito fez ao boticário João Ladislau de Figueiredo
e Melo, a quem revelou conhecer os nomes dos conspiradores e dos
locais em que se reuniam, e ao cirurgião prático Cipriano Barata, que,
além de advertido, foi ameaçado de prisão e degola (teria[lhe] dito:
‘Mando-lhe cortar o pescoço’)”.
O Padre Roma, que passara por Alagoas e conseguira sua adesão,
então parte Sul de Pernambuco, dele em seguida desmembrado, uma

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 189-202, 2018


198 Vamireh Chacon

das punições pela repressão ao movimento insurrecional de 1817, foi


preso quando desembarcava na Barra em Salvador.
Prossegue Luís Henrique, ainda merecedor de reprodução pela sua
síntese: “A rapidez da repressão comandada pelo Governador Dom
Marcos de Noronha e Brito [nobilitado como oitavo Conde dos Arcos],
deteve qualquer possibilidade de adesão da Bahia ao Levante no Reci-
fe. Ele mobilizou tropas e enviou-as para Pernambuco sob o comando
do Marechal português Joaquim de Melo Leite Cogominho e Lacerda.”
A síntese de Luís Henrique Dias Tavares prossegue merecedora
de reprodução na íntegra: “Derrotada a Revolução, os presos políti-
cos foram trazidos para a cidade do Salvador. Eles desembarcaram
acorrentados nos pés e nas mãos, descalços e com as roupas sujas
e rasgadas. Subiram a encosta e foram jogados na prisão do Aljube,
que tinha sido construída especialmente para religiosos, mas depois
se generalizou, por falta de espaço na cadeia instalada nos porões do
Senado da Câmara”.
Foram julgados sumariamente.
Enfim, o ainda mais trágico final: “Três desses presos, José Luiz
de Mendonça, Domingos José Martins e Padre Miguel Joaquim de
Almeida, foram executados no Campo da Pólvora. Frei Joaquim do
Amor Divino Rabelo (Frei Caneca), Gervásio Pires Ferreira, Antônio
Carlos Ribeiro de Andrada Machado e outros foram mantidos em
rigorosa prisão”.
Frei Caneca virá a ser executado por radical reincidência na Re-
volução da Confederação do Equador em 1824, antecipadora do fe-
deralismo brasileiro tanto quanto a de 1817 em Independência e
República. Gervásio Pires Ferreira veio a ser presidente da Junta da
Independência de Pernambuco às vésperas da Proclamação de 1822
por Dom Pedro I. Antônio Carlos Ribeiro de Andrada Machado era
mineiro, então ouvidor em Olinda e um dos irmãos de José Boni-
fácio, o principal preparador e consolidador da Independência de
1822, o que mais uma vez confirma o sentido nacional antecipador
independentista e republicano de 1817.
Salvador, até recentemente capital do Brasil mais longamente que
o posterior Rio de Janeiro, ainda tinha importante fastígio testemu-
nhado pessoalmente por destacados viajantes estrangeiros: o inglês
Thomas Lindley na sua Narrativa de uma Viagem ao Brasil, teste-

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 189-202, 2018


Da história regional à nacional. Exemplo de 1817 199

munho de 1803; o também inglês Henry Hill no seu Comércio do


Brasil em 1808; em seguida o alemão Maximiliano, Príncipe de Wie-
d-Neuwied, Viagem ao Brasil no Anos de 1815 a 1817; o francês
Ferdinand Denis, O Brasil, produto de viagem à Bahia em 1816; e
as já citadas Notas Dominicais de Tollenare mais as dos naturalistas
alemães Spix e Martius, Viagem ao Brasil, em anos subsequentes.
Outros tantos viajantes estrangeiros e estatísticas portuguesas e
brasileiras testemunham a importância comercial nacional e interna-
cional do porto Recife.
Estas riquezas, seus contatos comerciais com o Brasil e o mundo,
ensejaram uma tomada de consciência política independentista irra-
diando-se do Recife ao Crato no Ceará e à Paraíba, Rio Grande do
Norte e Alagoas, detida no Ceará e em Salvador da Bahia pela mais
poderosa, precavida e eficiente repressão política e militar portuguesa.
Nas oficiais comemorações pernambucanas do Bicentenário da
Revolução intelectual e armada de 1817 no Recife, não faltou indis-
pensável ativa presença intelectual espíritossantense.
O Bicentenário da Revolução de 1817 foi registrada também no
Espírito Santo, além do limite Sul da Bahia, demonstrando mais uma
vez seu sentido nacional. Lá foi republicada a edição fac-similar da
edição número 1 da Revista do Instituto Historico e Geographico do
Espírito Santo, quando da fundação deste Instituto em 1917 no Pri-
meiro Centenário da Revolução, com apresentação do seu presidente
Getúlio Marcos Pereira Neves.
Lembremos ser espiritossantense Domingos Martins, um dos prin-
cipais líderes da Revolução de 1817, próspero comerciante e com
ligações maçônicas internacionais ajudando ainda mais a missão de
Antônio Gonçalves da Cruz, o Cabugá ou Cruz Cabugá, aos Estados
Unidos onde se entrevistou com o secretário de Estado Richard Rush,
tentando falar com o próprio presidente dos Estados Unidos, enquan-
to terminava a última resistência no Recife onde começara.
Domingos Martins é nome de município espiritossantense, porém
nasceu no outrora Sítio Caxangá, hoje município Marataízes. Um an-
tigo bairro do Recife se chama Caxangá.
O orador da sessão inaugural foi Carlos Xavier Paes Barreto, con-
forme está na Acta da Fundação, em 12 de junho de 1916 do Instituto
Historico e Geographico do Espirito Santo, reproduzida na referida

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 189-202, 2018


200 Vamireh Chacon

edição fac-similar.
Em seguida vêm o texto do discurso intitulado “DOMINGOS MAR-
TINS e o papel que representou na Revolução de 17. Refutações a
Varnhagen, a Pereira da Silva e a Tollenare”, mais a reprodução de
um soneto de autoria de Domingos Martins (“Produzido na prisão,
antes de ser executado”). E os longos documentados artigos: ”1817-
1917. Culto público. Sua preeminência nos destinos humanos. A glo-
rificação de Domingos Martins” por Antônio Athayde; “A história da
Revolução de 1817” por M. Teixeira de Lacerda; “Reivindicando” por
J. M. B. Montenegro e a “História da Revolução de 1817 de Muniz
Tavares, anotada por Oliveira Lima. O livro de Muniz Tavares” por
Carlos Xavier Paes Barreto vindo até suas repercussões na Indepen-
dência pernambucana de Gervásio Pires mais uma vez antes da pro-
priamente nacional do Sete de Setembro de 1822, e ao filho do Padre
Roma, o General Abreu e Lima companheiro do Libertador Simón
Bolívar. Carlos Xavier Paes Barreto discorda destas interpretações por
Oliveira Lima, por ele consideradas subestimadoras.
Breve nota “Relíquia preciosa” por Amâncio Pereira, também im-
portantes “Documentos extraídos do ‘Livro de registros, ordens, por-
tarias para dentro da Capitania do Espírito Santo’ no ano de 1812” e
“Notas diversas. Programa organisado pelo Instituto Historico e Geo-
graphico do Espirito Santo, para a festa cívica a realizar-se no dia 12
de Junho em commemoração ao centenário da morte de Domingos
Martins, grande vulto da revolução pernambucana de 1817” comple-
tam o primeiro inaugural número da Revista do Instituto Historico e
Geographico do Espirito Santo com também longo prefácio crítico
por Luiz Guilherme Santos Neves intitulado “Considerações sobre o
primeiro número de uma Revista Centenária”. Além da localização
daquelas comemorações no espaço e no tempo, ele as aponta como
“Início da linha tradicional de glorificação da memória de Domingos
Martins”.
Todos esses textos, mais uma vez reeditados pelos institutos his-
tóricos e geográficos, mais as publicações especiais do Ceará ao Rio
Grande do Norte, Paraíba, Bahia e Espírito Santo, além dos do Insti-
tuto Histórico e Geográfico Brasileiro no Rio de Janeiro, ao lado do
Instituto Arqueológico, Histórico e Geográfico Pernambucano, pros-
seguem merecendo mais amplos e aprofundados estudos específicos

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 189-202, 2018


Da história regional à nacional. Exemplo de 1817 201

sobre o sentido pernambucano, nordestino e nacional da Revolução


de 1817 do Recife, até onde conseguiu projetar-se em presença e/ou
influência.
Centro irradiador de 1817, Pernambuco não podia faltar às oficiais
comemorações do seu Bicentenário.
Entre outras publicações se sobressai a antologia 1877 e Outros
Ensaios, nele se destacando, no que se refere às nossas presentes
análises, o texto do embaixador Gonçalo Mello Mourão, “Seis de
março, data nacional”, portanto não só regional e sim muito adiante.
Além dele, “A Revolução sem cena” de José Luiz Mota Menezes com
pormenores inclusive locacionais, mais “Modernidade e Revolução:
a Porta se abre em Cena” sobre sua perene atualidade de autoria de
Antônio Paulo Rezende. Mais “A Visão dos Viajantes Estrangeiros”
então em Pernambuco por Sylvia Costa Couceiro; “1817” pura e sim-
ples, porém não simplista, por Denis Bernardes; “Astronomia da Re-
volução” de Rodrigo Acioli, metáfora do socialmente muito além do
título; “Escravos, Afrodescendentes Livres e Libertos e a Revolução de
1817” por Luiz Geraldo Silva; “Templários da Revolução” de Antônio
Jorge Siqueira, título simbólico para os padres revolucionários forma-
dos no recém-fundado Seminário de Olinda pelo nisto revolucionário
Bispo Azeredo Coutinho, ao introduzir o obrigatório aprendizado do
idioma francês permitindo aos jovens seminaristas o direto acesso às
leituras dos atualizados revolucionários iluministas, que tanto vieram
a influenciá-los.
Sua documentação primária e secundária está muito bem alinhada
por Sílvia Carla Pereira de Brito Fonseca em “Pernambuco, 1817: Crô-
nicas, Memórias e Historiografia”. Marcelo Casseb conclui com chave
de ouro mais esta outra antecipação da “Lei Orgânica e Constitui-
ção na Revolução Republicana” de 1817, também nisto extraordinária
precursora pernambucana, nordestina e brasileira.
Tão importante também esta síntese pelos historiadores das várias
perspectivas de 1817, que vale a pena com ela concluí-las, entre as
antecipações e realizações de 1817, pelo texto exemplar de Marcelo
Casseb indo muito além da precursora mais síntese que análise por
José Honório Rodrigues nos seus comentários à publicação dos Autos
do Processo de 1817:

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 189-202, 2018


202 Vamireh Chacon

“Ao trabalharmos tal distinção entre Constituição-or-


dem e Constituição-norma, torna-se possível verificar
como os revolucionários de 1817, mesmo sem have-
rem editado uma Constituição, mas preventivamente
em seu lugar uma Lei Orgânica, foram vanguardistas,
radicalizaram e efetivaram propostas iluministas tão
em voga nas Revoluções da América e da Europa,
ao passo que, na fundação do Império do Brasil, a
Constituinte de 1823 e o Conselho de Estado, insti-
tuído por Dom Pedro que elaborou a Carta de 1824,
perfilharam caminho diverso, cujo rumo limitava-se à
ideia de consolidar as formas e estruturas do poder
então vigentes”.

“A Lei Orgânica de 1817 claramente marcava a ruptura


política com o status quo colonial. (...) A radicalidade
revolucionária também se expressou em documento
solene, que foi a ‘Declaração dos Direitos Naturais,
Civis e Políticos do Homem’, a qual, não raro, passa
desapercebida pelo olhar crítico de especialistas.”

Ela foi enviada à Oficina Tipográfica da República de Pernambu-


co, não entrando em vigor por causa da desencadeada luta armada
e do cerco ao Recife. Acuada no berço, seus apelos passaram a ser
dirigidos aos pernambucanos e não mais aos brasileiros.
As historiografias estaduais, atualizadas até o Bicentenário da Re-
volução de 1817, serão apresentadas e debatidas no I Congresso Per-
nambucano de Institutos Históricos Municipais juntamente com o VI
Congresso Nordestino de Estudos Históricos, reunidos neste colóquio
A Revolução Pernambucana de 1817 na Construção do Brasil, no
Instituto Arqueológico, Histórico e Geográfico Pernambucano e no
Museu da Cidade do Recife/ Forte das Cinco Pontas no Recife de 5 a
7 de março de 2018.

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 189-202, 2018


O CONTEXTO HISTÓRICO DOS PAÍSES-BAIXOS NA
ÉPOCA DA RESTAURAÇÃO PERNAMBUCANA1

Roberto de Araújo Chacon de Albuquerque2

Resumo: O texto apresenta uma análise do contexto histórico dos


Países-Baixos quando das lutas em Pernambuco que resultaram na
definitiva expulsão dos contingentes da Companhia das Índias Oci-
dentais em 1654, destacando os fatores que levaram ao enfraqueci-
mento do poderio daquela nação.

Palavras-chave: Países-Baixos, Pernambuco, Restauração Pernam-


bucana, Maurício de Nassau.

The historical context of The Netherlands at the time of


Pernambuco Restoration

Abstract: The text presents an analysis of the historical context of the


Netherlands when the struggles in Pernambuco resulted in the defi-
nitive expulsion of the West Indian Company’s contingents in 1654,
highlighting the factors that led to the weakening of that nation’s
power.

Key-words: The Netherlands, Pernambuco, Pernambuco Restoration,


Johan Maurits van Nassau-Siegen. 

1 Discurso de posse proferido na Sessão Magna do IAHGP em 27/01/2016.


2 Sócio Correspondente do IAHGP. Doutor em Direito pela Universidade de São Paulo.
204 Roberto Chacon de Albuquerque

Senhor Presidente do Instituto Arqueológico, Histórico e Geográ-


fico Pernambucano, Senhores e Senhoras Membros deste Instituto,
nesta comemoração da Restauração Pernambucana convém lembrar
o que se passava ao mesmo tempo nos Países Baixos, contribuindo
para enfraquecer sua dominação no Brasil e resultando na sua con-
sequente derrota.
Quando a Companhia das Índias Ocidentais invadiu Salvador da
Bahia, Maurício de Nassau  (1567-1625), o príncipe de Orange, era
estatuder, supremo chefe de Estado vitalício, monarca da República
Coroada, a das Sete Províncias Unidas dos Países Baixos. Este Mau-
rício, homônimo do primo que esteve no Brasil, foi um dos maiores
estrategistas de toda a história, tendo organizado e colocado em prá-
tica durante mais de uma década uma campanha militar implacável,
coerente e bem-sucedida contra o Império espanhol. Este Maurício
estudou em duas das mais prestigiosas universidades europeias, Hei-
delberg e Leiden, na qual ele se tornou amigo de Simon Stevin (1548-
1620), grande matemático e engenheiro militar.
O  referido Maurício transformou a anárquica rebelião contra o
Império espanhol numa revolta coerente e sistemática. O exército
dos Estados Gerais dos Países Baixos, sob seu comando, tornou-se
um exército moderno e eficiente, pronto para enfrentar e derrotar
o inimigo. Em Heidelberg e Leiden, bem como por conta própria,
Maurício estudou astronomia, estratégia, história militar, matemática
e tática, contribuindo, ao colocar em prática o conhecimento acumu-
lado, para o surgimento da Revolução Militar dos séculos XVI e XVII.
Ele foi o mais importante tático e estrategista da sua época.
Ao final da vida deste Maurício, os Países Baixos sofreram vários
reveses. Não terminou bem a primeira grande tentativa de ocupar o
Brasil, iniciada com a invasão de Salvador da Bahia em 8 de maio
de 1624, em parte uma represália ao bloqueio marítimo e terrestre
imposto aos Países Baixos pelo inimigo espanhol. O Império espa-
nhol voltou a triunfar em outra série de batalhas na Europa, com o
Sítio de Breda, conquistando a antiga residência da família Nassau,
uma verdadeira desmoralização para os Países Baixos, um fato que
repercutiu muito mal Europa afora. O Sítio de Breda, concluído com
uma decisiva vitória do Império espanhol, terminou em 5 de junho
de 1625, pouco depois da derrota dos Países Baixos em Salvador da

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 203-207, 2018


O contexto histórico dos Países-Baixos na época da Restauração Pernambucana 205

Bahia, ocorrida em 30 de abril de 1625.


Ao sucessor deste Maurício, seu meio-irmão Frederico Henrique
(1584-1647), o filho mais jovem de Guilherme I, coube não só con-
tinuar a comandar a guerra contra o Império espanhol, como teste-
munhar a conquista do Brasil pela Companhia das Índias Ocidentais.
Frederico foi um chefe militar tão bom quanto o anterior Maurício,
tendo-o superado como estadista e político. Ele governou os Países
Baixos como estatuder por vinte e dois anos (1625-1647).
Este período, a Era de Frederico Henrique, passou para a história
como o apogeu do Século de Ouro dos Países Baixos (1584-1702),
no qual a República Coroada se tornou a primeira potência capitalista
do mundo, depois superada pela Grã-Bretanha. Durante o Século de
Ouro, a ciência, a cultura e o comércio dos Países Baixos não tiveram
paralelo nem na Europa nem no mundo. Um dos principais artífi-
ces do “Milagre Neerlandês”, o legado de Frederico inclui grandes
vitórias militares e navais, um florescimento artístico e literário sem
precedentes e uma expansão comercial e marítima ultramarina que
incluiu a fundação da Nova Holanda, o Brasil Holandês.
Ao tornar-se estatuder, sucedendo Maurício, Frederico deparou-
-se com um país que continuava em plena ebulição. Não havia um,
mas dois  Países Baixos, os Países Baixos espanhóis (1581-1714) e a
República das Sete Províncias Unidas dos Países Baixos (1581-1795),
inimigos jurados de morte. Como nenhum dos dois lados esperava que
esta divisão fosse superada em proveito de um projeto de unificação
nacional, a Guerra dos Oitenta Anos continuou em grande escala.
Frederico Henrique foi sucedido por seu filho Guilherme II (1626-
1650), que veio a falecer com apenas 24 anos de idade. Como uma
estrela cadente, foi estatuder dos Países Baixos por pouco mais de
três anos. Guilherme teve planos ambiciosos que nunca conseguiu
colocar em prática. A República, com sua diversidade política e re-
ligiosa, controlada com mãos de ferro por uma oligarquia, não era
bem vista pelo jovem estatuder. Guilherme queria centralizá-la, em
torno de si mesmo, como um monarca absoluto.
Para vencer eventuais resistências ao seu projeto de poder, ele
arvorou-se em defensor da mais rigorosa ortodoxia calvinista. Gui-
lherme tornou-se, assim, um adversário convicto de qualquer política
de tolerância religiosa para com a população que era, queria conti-

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 203-207, 2018


206 Roberto Chacon de Albuquerque

nuar a ser e é, até hoje, de maioria católica romana, nos territórios


então recém-conquistados do Brabante. Guilherme tentou promover
a conversão forçada da população local ao calvinismo, sem grandes
resultados. Em 1650, Guilherme, deu um golpe de Estado. Seu princi-
pal objetivo era enfraquecer o poder da principal província dos Paí-
ses Baixos, a Holanda. Debilitada a Holanda, sua principal adversária,
Guilherme poderia transformar-se em monarca absoluto, do direito
divino, nos Países Baixos. Entre suas vítimas, constou o grande al-
mirante Witte de With, vencedor de várias campanhas navais. Com
estas medidas coercitivas, Guilherme pretendeu, sem muito sucesso,
intimidar a Holanda, a província mais rica e poderosa da República.
Guilherme tentou subjugar, em 30 de julho de 1650, com a força
das armas a própria Amsterdã, uma das cidades mais ricas do mundo
e a principal dos Países Baixos. O ataque surpresa, embora tenha fra-
cassado, surtiu algum efeito, ao prejudicar muito esta cidade, porém
não o suficiente. Pouco tempo depois, em 6 de novembro do mesmo
ano, Guilherme morreu, aparentemente de varíola. Sobretudo na Ho-
landa, por motivos mais do que compreensíveis, a grande maioria da
população estava farta de guerras civis. Guilherme  não foi sucedido
por seu filho, mas pelo Primeiro Período sem Estatuder (1650-1672),
dirigente supremo, em que este cargo ficou vacante em cinco das
sete províncias da República Coroada, período que coincide com a
perda do Brasil Holandês, em meio à devastadora Primeira Guerra
Anglo-Holandesa, à qual se seguiram três outras. Durante o Primeiro
Período sem Estatuder, os Países Baixos enfrentaram três vezes sua
antiga aliada e protetora, a Inglaterra.
Para apoderar-se do que restava do Império português no Ceilão e
no sul da Índia, os Países Baixos dispersaram suas esquadras e tropas
terrestres, conseguindo, ao fim e ao cabo, vencer Portugal na Ásia,
enquanto se enfraqueciam no Brasil, sendo derrotados e rendendo-
-se no Recife em 1654, conclusão de uma série de decisões erradas.
Ansiosa por manter-se indefinidamente no poder, a oligarquia ho-
landesa aboliu em 5 de agosto de 1667 o próprio cargo de estatuder
em sua província, com o Édito Perpétuo, adotado pelos Estados da
Holanda, o parlamento desta província. No Ano da Catástrofe, assim
chamado nos Países Baixos, 1672, em meio à  Guerra Franco-Ho-
landesa e à Terceira Guerra Anglo-Holandesa, a República Coroada

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 203-207, 2018


O contexto histórico dos Países-Baixos na época da Restauração Pernambucana 207

foi atacada e derrotada pela Inglaterra, França e por dois estados


alemães.  Em busca de um bode expiatório, o grande-pensionário
Johan de Witt e seu irmão foram assassinados por uma multidão que,
incapaz de aceitar o início da decadência dos Países Baixos, com o
término do ciclo de dominação mundial marítima da Holanda, apos-
tou todas as suas fichas na volta da Casa de Orange-Nassau ao poder,
com Guilherme III.
Os Países Baixos da conquista de Pernambuco não eram os mes-
mos da Restauração Pernambucana.
A diplomacia portuguesa, com grande competência internacional,
e o heroísmo dos brasileiros e portugueses unidos nos combates,
culminando nas batalhas dos Guararapes e o cerco final ao Recife,
triunfaram na Restauração Pernambucana, que, com muito brio, con-
tinuamos a comemorar por tantos justos motivos.
É, portanto, para mim uma grande honra ingressar no Instituto
Arqueológico, Histórico e Geográfico Pernambucano, ainda mais em
dia comemorativo tão importante para todos nós.

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 203-207, 2018


O BICENTENÁRIO DA REVOLUÇÃO DE 1817
Breve relato das comemorações

Resumo: Apresentamos aqui um relato de todas as atividades reali-


zadas durante o ano do bicentenário da Revolução de 1817. Os even-
tos aqui listados foram organizados pelo IAHGP (ou por instituições
parceiras) ou contaram com a participação de associados do Arqueo-
lógico. Incluiu-se também uma galeria de imagens.

Palavra-chave: Bicentenário da Revolução de 1817, IAHGP.

The bicentenary of the Revolution of 1817

Abstract: An account of all the activities carried out during the year
of the bicentenary of the Revolution of 1817 is presented here. The
events listed here were organized by the IAHGP (or by partner insti-
tutions) or counted on the participation of the Institute’s associates. A
gallery of images was also included.

Key-words: Bicentenary of the Revolution of 1817, IAHGP.

A salvaguarda da memória e a divulgação da história da Revolução


Pernambucana de 1817 foram algumas das principais razões para a
fundação do Instituto Arqueológico em 1862. O desejo de escrever a
história do Brasil a partir de uma perspectiva pernambucana motivou
os pioneiros da instituição a se reunirem para coletar documentos e
antiguidades que servissem como matéria-prima para a pesquisa his-
tórica, evitando assim que se dispersassem, fossem levados a outras
províncias ou que, simplesmente, desaparecessem frente à voragem
do tempo. A celebração das principais efemérides da história per-
nambucana foi o meio encontrado para manter viva a memória dos
importantes feitos aqui ocorridos (RODRIGUES, 1959:11).
Em 1917, ano que assinalou o centenário da mencionada Revo-
210

lução, o Instituto Arqueológico foi o principal ator das celebrações


realizadas no Recife e em outras cidades do estado. Destacou-se a
liderança e o empenho de Mário Melo na articulação e mobilização
de todos os meios então disponíveis para abrilhantar a comemoração
e as honras prestadas aos mártires do movimento de 6 de março.1
Em 2017, em respeito a todos os que deram suas vidas na defesa
da liberdade e em consonância com os esforços envidados por aque-
les que nos antecederam no IAHGP, nos empenhamos em realizar
as celebrações do bicentenário da forma mais adequada possível à
grandeza dos fatos rememorados. As ações do IAHGP nas comemo-
rações contaram com o inestimável apoio do Governo do Estado de
Pernambuco, Museu da Cidade do Recife/Forte das Cinco Pontas,
Companhia Editora de Pernambuco (Cepe), Grande Loja Maçônica
de Pernambuco (GLMPE), Serviço Social do Comércio em Pernam-
buco (SESC-PE), Academia Pernambucana de Letras (APL), Instituto
Histórico e Geográfico Brasileiro (IHGB), Instituto Histórico e Geo-
gráfico do Espírito Santo (IHGES), Ministério Público de Pernambuco
(MPPE), Diario de Pernambuco, Jornal do Commercio, Folha de Per-
nambuco e Revista Algo Mais.
O número 70 (2017) desta Revista do IAHGP foi inteiramente dedi-
cado ao bicentenário de 1817. O volume reuniu textos inéditos num
dossiê organizado por George Cabral, que também selecionou para
republicação textos relativos à Revolução veiculados por este perió-
dico nos séculos XIX e XX.
Neste número, apresentamos um breve relato das atividades co-
memorativas e educacionais organizadas pelo IAHGP e por outras
instituições. Listamos também os eventos nos quais os membros do
IAHGP tomaram parte entre janeiro de 2016 e dezembro de 2018. As
ações realizadas conjuntamente com os principais parceiros são apre-
sentadas inicialmente de forma segmentada. Em seguida, são lista-
das outras ações em ordem cronológica.2 Registramos nossa gratidão

1 Sobre a atuação de Mário Melo nas comemorações do centenário da Revolução de 1817 e


também da Confederação do Equador em 1824, ver CAVALCANTI, 2017:82-124.
2 Os dados foram coletados nas atas das reuniões do IAHGP, na imprensa local ou foram
comunicados pelos associados e instituições parceiras. Procuramos realizar o levantamento
mais exaustivo possível. Eventuais omissões – pelas quais pedimos sinceras desculpas ante-
cipadamente – devem ser informadas aos Editores e serão noticiadas no número 72(2019)

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 209-273, 2018


O Bicentenário da Revolução de 1817: Breve relato das comemorações 211

Wellington Passo pelo apoio administrativo na execução das ações


realizadas em parceria com a Fundarpe. Agradecemos ao denodado
trabalho de todos os associados do IAHGP que colaboraram nas ce-
lebrações participando dos eventos realizados, ministrando palestras
e divulgando a história da Revolução com a publicação de textos
informativos nos principais jornais da cidade do Recife.

Ações realizadas com o apoio do Governo do Estado

O apoio do Governo do Estado de Pernambuco foi fundamental


para tornar possível a realização de um amplo programa de ações
comemorativas, educativas e de divulgação do bicentenário. Registra-
mos o agradecimento do IAHGP ao governador Paulo Câmara, bem
como ao secretário da Casa Civil, Antônio Carlos dos Santos Figueira;
ao secretário de Cultura Marcelino Granja de Menezes; ao secretário
executivo da Casa Civil Marcelo Canuto Mendes e a presidente da
FUNDARPE, Márcia Maria da Fonte Souto.
Em 10 de março de 2015, o governador Paulo Câmara anunciou
a criação de uma Comissão para as Comemorações do Bicentenário
da Revolução Pernambucana de 1817 (lista completa dos partici-
pantes ao final desta seção).3 Os representantes do IAHGP foram os
associados Margarida Cantarelli e José Luiz Mota Menezes (ambos
presidiram o sodalício). Outros associados do IAHGP participaram
também da Comissão representando outras instituições: Nilzardo
Carneiro Leão (pela Academia Pernambucana de Letras); Maria de
Betânia Corrêa de Araújo (pela Prefeitura do Recife); Marcelo Cas-
seb Continentino (pela Procuradoria Geral do Estado); Maria Cristina
Cavalcanti de Albuquerque (pelo Comitê Pernambuco 2017). Com o
início das celebrações, o presidente do IAHGP, George Cabral, tam-
bém foi incorporado à Comissão.
Importante salientar que, por iniciativa do Governo do Estado, a
Assembleia Legislativa de Pernambuco aprovou a lei 15.877, de 12
de julho de 2016,4 que destinou uma subvenção para que o IAHGP

desta Revista do IAHGP.


3 Diário Oficial do Estado de Pernambuco, 11.iii.2015, p. 8.
4 Idem, 13.vii.2016, p. 4.

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 209-273, 2018


212

realizasse os atos das celebrações bem como para que desse outras
providências relativas às ações de salvaguarda e divulgação da his-
tória da Revolução de 1817. A lei foi sancionada pelo governador
Paulo Câmara em solenidade no IAHGP. Esta subvenção permitiu a
realização de um ciclo de palestras, a produção e itinerância de uma
exposição histórica, a organização de um congresso de Institutos His-
tóricos e a restauração de pinturas e objetos relativos à Revolução,
entre outras iniciativas. As ações ainda não foram concluídas no ano
de 2018 e se estenderão ao longo de 2019 com a continuidade dos
processos de restauração de antiguidades, publicação de catálogo e
realização de mais palestras alusivas ao tema.
No dia 6 de março de 2017, realizou-se a grande solenidade no
Palácio do Campo das Princesas que deu início ao ano de comemo-
rações do bicentenário. Na ocasião, estiveram presentes os membros
da Comissão Organizadora das comemorações, vários associados do
IAHGP e um grande número de autoridades. Na primeira parte da so-
lenidade, realizou-se desfile cívico-militar, hasteamento das bandeiras
e a aposição pelos chefes dos Três Poderes em Pernambuco de uma
coroa de flores no monumento dedicado à memória dos mártires
da Revolução situado na Praça da República. Na segunda parte da
solenidade, realizada no Salão das Bandeiras do Palácio do Campo
das Princesas, discursaram o governador Paulo Câmara e o professor
José Luiz Mota Menezes, representando a Comissão do Bicentenário.
O governador entregou a Medalha do Bicentenário a várias pes-
soas e instituições relevantes no desenvolvimento histórico, cultural e
político do nosso estado, inclusive ao IAHGP, na ocasião representa-
do pelo presidente George Cabral. Receberam também a medalha os
ex-governadores de Pernambuco ainda vivos: João Lyra Neto, Jarbas
Vasconcelos, Joaquim Francisco, Gustavo Krause, José Ramos (re-
presentado por Gustavo Paes de Andrade) e Roberto Magalhães. Do
corpo diplomático estiveram presentes os seguintes cônsules: Dur-
valino Andreotti (Bulgária), Jaime Hernando (Argentina), Jiri Jodas
(República Tcheca), Li Feiyue (China), Maria Könning de Siqueira
Regueira (Alemanha), Yasuhiro Mitsui ( Japão) e Paloma Gonzalez
(Estados Unidos).

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 209-273, 2018


O Bicentenário da Revolução de 1817: Breve relato das comemorações 213

Congressos Pernambucano e Nordestino de Institutos Históricos

De 5 a 7 de março de 2018 ocorreu a realização conjunta do VI


Congresso Nordestino de Institutos Históricos e do I Congresso Per-
nambucano de Institutos Históricos Municipais. A abertura do evento
foi feita na sede do IAHGP com a presença do presidente do Instituto
Histórico e Geográfico Brasileiro (IHGB), Arno Wehling, que pales-
trou juntamente com o associado Vamireh Chacon e o presidente
do IAHGP, George Cabral. Na mesma ocasião, o prefeito do Recife,
Geraldo Júlio, sancionou a lei que concedeu ao IAHGP o título de
utilidade pública municipal, aprovada a partir de projeto do verea-
dor Jayme Asfora. Procedeu-se a entrega da Medalha Frei Caneca
ao Museu da Cidade do Recife, representado por sua diretora Maria
de Betânia Corrêa de Araújo, em reconhecimento pelo importante
trabalho de divulgação da história da Revolução realizado ao longo
do ano de 2017.
Na manhã do dia 6 de março de 2018, os assistentes do Congresso
participaram de solenidade no Palácio do Campo das Princesas, com
a presença do governador Paulo Câmara, do presidente da Assem-
bleia Legislativa de Pernambuco, deputado Guilherme Uchôa e do
presidente do Tribunal de Justiça de Pernambuco, desembargador
Adalberto de Oliveira Melo, do arcebispo de Olinda e Recife, Dom
Fernando Saburido, além de numeroso grupo de autoridades esta-
duais, municipais e maçônicas. Na ocasião houve desfile cívico e pro-
nunciamentos do governador do Estado e do presidente do IAHGP.
Após o evento no Palácio do Campo das Princesas, a comitiva de
congressistas visitou a exposição “1817 - Revolução republicana” nas
dependências do Museu da Cidade do Recife e também a Sinagoga
Kahal Zur Israel, no Bairro do Recife. Ao longo da tarde do dia 6 e
durante todo o dia 7 de março, ocorreram as comunicações dos Ins-
titutos Históricos estaduais e municipais no auditório do Museu da
Cidade do Recife.
Estiveram presentes e participaram da programação os represen-
tantes dos seguintes Institutos Históricos estaduais: Alagoas – Clara
Fernandes Suassuna; Bahia – Eduardo de Morais Castro (presidente);
Ceará – Lúcio Gonçalo de Alcântara (presidente); Maranhão – Eu-
ges Silva de Lima (presidente); Paraíba – Guilherme Gomes d´Ávila

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 209-273, 2018


214

Lins (presidente); Rio Grande do Norte – Gustavo Sobral; Sergipe –


Terezinha Alves d´Oliva. Como convidado especial, contamos com
a participação do Instituto Histórico e Geográfico do Espírito San-
to, representado por seu presidente Getúlio Marcos Neves. Entre os
institutos municipais, participaram os de Goiana (presidente Harlan
Gadelha Filho); Olinda (presidente Luiz Maranhão Filho), Jaboatão
(presidente Ivaldo Santos Montarroyos), Igarassu (representado por
Guilherme Jorge Paes Barreto), Caruaru (presidente Josué Euzébio
Ferreira), Garanhuns (presidente Ivonete Batista Xavier), Pajeú (pre-
sidente Augusto da Fonseca, representando 22 municípios sertane-
jos), Catende (presidente Eduardo de Menezes), Petrolina (presidente
Cosme Cavalcanti), Vitória de Santo Antão (presidente Pedro Hum-
berto Ferrer de Morais), Escada (representado por Teresinha Melo) e
Lajedo (presidente Júlio César da Silva). Participou também o Centro
de Estudos de História Municipal (CEHM) representado por seu pre-
sidente, Miguel Meira de Vasconcelos.
No dia 31 de agosto de 2017 realizou-se a obliteração do selo ofi-
cial da Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos em homenagem
ao Bicentenário de 1817. O evento ocorreu no Palácio do Campo
das Princesas. As primeiras peças do selo oficial e suas cartelas fo-
ram obliteradas pelo governador Paulo Câmara, pelo presidente do
IAHGP, George Cabral, e pelo coordenador da Superintendência Es-
tadual dos Correios, Orlando Duda.
Na mesma ocasião foram entregues os prêmios para os estudantes
agraciados no “Concurso Cultural Revolução de 1817 – Pernambuco
na luta pelos ideais republicanos”, promovido pela Secretaria de Edu-
cação do Estado. Voltado para os alunos da rede estadual de ensino,
o concurso abrangeu 14 Gerências Regionais de Educação e contou
com a participação de 62 escolas. No total, foram 642 inscrições,
das quais 24 vídeos e 618 redações. Os primeiros lugares ganharam
tablets, os segundos lugares ganharam smartphones e os terceiros
lugares ganharam kits literários. O secretário de Educação, Frederi-
co Amancio, discursou ressaltando a importância da realização do
concurso como forma de sensibilizar os estudantes para o tema e
apontando a qualidade dos trabalhos submetidos. Registramos aqui
os alunos contemplados com a premiação:

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 209-273, 2018


O Bicentenário da Revolução de 1817: Breve relato das comemorações 215

Alunos vencedores do Ensino Fundamental

Categoria vídeo

1º lugar:
Título: A participação dos padres na Revolução de 1817
Alunas: Joana Grazyella Matos de Araújo e Ana Priscila Dias da Silva
Escola Santo Inácio de Loyola, Olinda

2º lugar:
Título: Invisibilidade da mulher negra na Revolução de 1817
Alunas: Alesandra Waleska Santos Silva e Rute Vitória Coimbra Santos
Escola Santo Inácio de Loyola, Olinda
 
3º lugar:
Título: Revolução de 1817
Aluna: Giovana Gomes da Silva Lima
Escola Antônia Cavalcanti e Albuquerque, Caruaru

Categoria redação
1º lugar:
Texto: A Revolução Pernambucana
Aluna: Larissa Monteiro Soares da silva
Escola Irmã Sônia, Caruaru

2º lugar:
Texto: Revolução Pernambucana na atualidade
Aluno: Clara Milenna Araújo
Escola Irmã Sônia, Caruaru

3º lugar:
Texto: Revolução Pernambucana de 1817: o passado contemporâneo
Aluno: Maria Clara de Souza Anconetani
Escola Irmã Sônia, Caruaru

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 209-273, 2018


216

Alunos vencedores do Ensino Médio

Categoria vídeo
1º lugar:
Título: Revolução Pernambucana
Alunos: Geisiane Jesus da Silva, Igor Ferreira de Oliveira e Nayara Ra-
quel da Silva
Escola Professora Jesuína Rêgo, Caruaru

2º lugar:
Título: Pernambuco na vanguarda
Aluno: José Carlos da Silva
EREM Arnaldo Assunção, Caruaru

3º lugar:
Título: 1817, mais que uma luta, uma Revolução
Alunos: Gisely Steffany Lima Souza, Thiago Lopes da Silva e Vítor
Lucas Ribeiro dos Santos
EREM Professora Eurídice Cadaval Gomes, Itapissuma

Categoria redação
1º lugar:
Texto: Aprendendo com o passado
Aluno: Emanuel da Silva Santos
EREM Arnaldo Assunção, Caruaru

2º lugar:
Texto: Pernambuco liberto! Liberto?
Aluna: Sarah Weida Sena Ferreira
EREM Professora Eurídice Cadaval Gomes – Itapissuma

3º lugar:
Texto: Revolução Pernambucana
Aluna: Ellâinne Samara Santos
Escola Professora Jesuína Pereira Rêgo, Caruaru

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 209-273, 2018


O Bicentenário da Revolução de 1817: Breve relato das comemorações 217

Estiveram presentes também na solenidade os membros da Co-


missão Organizadora do Bicentenário da Revolução de 1817: Marcelo
Canuto (secretário-executivo da Casa Civil), Márcia Souto (presidente
da Fundarpe), Marcelo Casseb (procurador do Estado de Pernam-
buco); José Luiz Mota Menezes (IAHGP), Leda Alves (secretária de
Cultura do Recife, que representou o prefeito do Recife, Geraldo Jú-
lio), Margarida Cantarelli (presidente da Academia Pernambucana de
Letras), Ricardo Leitão (presidente da Cepe) e os deputados estaduais
Laura Gomes, Aluísio Lessa e Terezinha Nunes.

Palestras

Entre setembro de 2017 e maio de 2018 foram realizadas 10 pales-


tras com o apoio do Governo do Estado por intermédio da Fundarpe.
Os eventos ocorreram no Auditório do IAHGP, no Sesc Caruaru e na
Escola Estadual Cícero Franklin Cordeiro, em Arcoverde.

30 de setembro de 2017 – “Arquitetura da Revolução”, por José Luiz


Mota Menezes.
07 de outubro de 2017 – “Com quantas revoluções se faz um bicente-
nário”, por Dirceu Marroquim.
11 de novembro de 2017 – “A Revolução de 1817 e a cultura constitu-
cional no Brasil”, por Marcelo Casseb.
25 de novembro de 2017 – “O Pan-americanismo e a Revolução de
1817”, por Carlos Bezerra Cavalcanti.
14 de março de 2018 – “A Revolução de 1817 na história do Recife”,
por José Luiz Mota Menezes.
26 de abril de 2018 – “A museologização da Revolução de 1817”, por
Maria de Betânia Corrêa de Araújo [na abertura da exposição itinerante
“1817 – Revolução republicana” no SESC – Caruaru].
05 de maio de 2018 – “Pernambuco: meio século de revoluções liber-
tárias (1800-1850)”, por Carlos Bezerra Cavalcanti.
8 de maio de 2018 – “Revolução de 1817 e o ensino de história do
Brasil”, por Dirceu Marroquim, [na Escola Estadual Cícero Franklin
Cordeiro, em Arcoverde].
8 de maio de 2018 - “A importância da Revolução de 1817 no currículo

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 209-273, 2018


218

de História”, por George Cabral [na Escola Estadual Cícero Franklin


Cordeiro, em Arcoverde].
12 de maio de 2018 – “O jacobinismo da Revolução Pernambucana de
1817”, por Marcus Carvalho.

Exposição itinerante

A exposição “Pernambuco: um estado de Liberdade”, com curado-


ria de Maria de Betânia Corrêa de Araújo, Dirceu Marroquim e Geor-
ge Cabral e design de Márcio Campos estreou em 19 de janeiro de
2018, na Galeria Ana das Carrancas do SESC, na cidade de Petrolina.
Em seguida, com o estabelecimento de parceria com a Secretaria de
Educação do Estado de Pernambuco, o material passou a ser exposto
em unidades de ensino da Rede Estadual. A primeira parada foi na
Escola de Referência de Ensino Médio Professora Yone de Gois Bar-
ros (antigo Colégio Normal), em Afogados da Ingazeira. Em seguida
a exposição foi instalada na Escola Cícero Franklin Cordeiro, em Ar-
coverde. A próxima cidade visitada pela exposição foi Igarassu, onde
os painéis ficaram à disposição do público na Escola Técnica Esta-
dual Jurandir Bezerra Lins. A itinerância em 2018 se encerrou com
a instalação da exposição no foyer do Aeroporto Internacional dos
Guararapes/Gilberto Freyre. A turnê continuará conforme a demanda
pelas escolas seja manifestada.

Membros da Comissão Organizadora do Bicentenário da Revo-


lução de 1817 nomeados pelo Governador Paulo Câmara por
decreto n. 41.531 de 10/03/2015

- Secretaria da Casa Civil: Antônio Carlos dos Santos Figueira e Marce-


lo Canuto Mendes;
- Secretaria de Educação: Frederico da Costa Amâncio e Severino José
de Andrade Júnior;
- Secretaria de Cultura: Marcelino Granja de Menezes e Márcia Maria
da Fonte Souto;
- Procuradoria Geral do Estado: Antônio César Caúla Reis e Marcelo

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 209-273, 2018


O Bicentenário da Revolução de 1817: Breve relato das comemorações 219

Casseb Continentino;
- Instituto Arqueológico, Histórico e Geográfico Pernambucano: José
Luiz Mota Menezes e Margarida de Oliveira Cantarelli;
- Academia Pernambucana de Letras: Maria de Fátima de Andrade
Quintas e Nilzardo Carneiro Leão;
- Comitê Pernambuco 2017: Maria Cristina Cavalcanti de Albuquerque
e Paulo Santos de Oliveira;
- Ministério da Cultura: José Gilson Matias Barros e Lúcio André de
Figueiredo Rodrigues;
- Assembleia Legislativa de Pernambuco: Ricardo José de Oliveira Cos-
ta e Antônio
Geraldo Rodrigues da Silva (Tony Gel);
- Prefeitura da Cidade do Recife: Leda Alves e Maria de Betânia Corrêa
de Araújo.

Realizações em parceria com o museu da Cidade do Recife

A parceria estabelecida entre o IAHGP e o Museu da Cidade do


Recife permitiu a realização de uma exposição de longa duração na
capital e uma exposição itinerante que foi apresentada em Caruaru
e Vicência.

Exposição de longa duração

No dia 12 de março de 2017, aniversário do Recife, o Museu da


Cidade inaugurou exposição “1817 - Revolução Republicana”, em
parceria com o IAHGP. A exposição esteve em cartaz até março de
2018 e tomou praticamente todos os espaços do museu, localizado
no Forte das Cinco Pontas, um dos locais emblemáticos da revolta.
A abertura contou com lançamento dos seguintes livros: edição co-
memorativa da História da Revolução de Pernambuco em 1817, de
Francisco Muniz Tavares; ABCdário da Revolução, de Maria de Betâ-
nia Correa de Araújo e da segunda edição do romance Olhos negros,
de Maria Cristina Cavalcanti de Albuquerque. Realizou-se também
a primeira apresentação da Suíte 1817, composta por Múcio Callou
e executada pelo Quarteto Aram. Até o seu encerramento, em 6 de

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 209-273, 2018


220

março de 2018, a exposição foi vista por mais de 60.000 visitantes.


A exposição foi estruturada em cinco eixos. Abrindo a visitação, a
sala “Revoluções” mostrou, por intermédio de textos e imagens his-
tóricas, o cenário que fez ebulir os ideais revolucionários. O ponto
inicial da visita era uma projeção de uma lista com os nomes dos 150
homens que, devido ao seu envolvimento com a Revolução, foram
presos no Forte de São Tiago das Cinco Pontas. A pesquisa tratou dos
ideais que moveram as revoluções em várias partes do mundo, como
a Revolução Francesa, a independência dos Estados Unidos e outras
ações libertárias na América.
No segundo eixo, o visitante era levado a um passeio pela Vila de
Santo Antônio do Recife de Pernambuco no início do século XIX. Os
desenhos do pintor francês Jean-Baptiste Debret e do comerciante
francês Louis-François de Tollenare foram utilizados na construção
de vídeos (elaborados por Lúcia Matos) para mostrar ao visitante o
cotidiano de da vila no período da Revolução.
O terceiro eixo, chamado “Dezessete”, era dedicado à Revolução
em si. Estavam expostos documentos e objetos históricos pertencentes
ao IAHGP, entre eles, a espada do Leão Coroado e a primeira prensa
que chegou ao Recife no início do século XIX e que provavelmente foi
utilizada pelos revolucionários de 1817. Posteriormente, foi utilizada
para imprimir os primeiros números do Diario de Pernambuco. A ex-
posição exibiu também fac-símiles do Preciso e da Lei Orgânica.
Em seguida, o quarto eixo, denominado “Cidade Memória”, apre-
sentou 12 vídeos que enfocam os lugares onde a Revolução se fez
presente. São locais do Recife atual exibidos em vídeos curtos (elabo-
rados pela Jacaré Vídeo). Em cada um deles, um historiador comen-
tou o episódio ali vivido. Entre esses endereços, está o próprio Forte
das Cinco Pontas.
Dedicado às bandeiras, o quinto e último eixo tinha uma proposta
interativa.  Além de estarem expostas a bandeira da Revolução Per-
nambucana e outras que inspiraram o processo republicano, o visi-
tante era convidado a criar e expor a sua própria bandeira - no local,
havia material (cartolina e lápis de cor) para a empreitada e um varal
para que a obra pudesse ser afixada e ficar exposta.
A realização da exposição foi do Museu da Cidade do Recife e
IAHGP. A organização ficou por conta de Maria de Betânia Corrêa de

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 209-273, 2018


O Bicentenário da Revolução de 1817: Breve relato das comemorações 221

Araújo. Os textos da exposição foram assinados por Marcus Carvalho,


Mateus Samico Simon, Sandro Vasconcelos, George Cabral e José
Luiz Mota Menezes. A pesquisa iconográfica foi realizada por Mateus
Samico Simon e Sandro Vasconcelos.
Simone Reis e Maria de Lourdes B. Cordeiro foram responsáveis
pela conservação museológica das peças em exposição. Os vídeos
da exposição ficaram por conta de Lúcia Matos, Leonora Lacerda e
Jacaré Vídeo. O Design Gráfico foi de Raul Kawamura. A montagem
foi realizada por Carlos Torres, Edson Barbosa, Rômulo Nascimento,
Grispim Barbosa Sobrinho, OP Produções e GS Vidros. As impressões
e aplicações dos textos foram realizadas pela Épura Gráfica Digital e
Marquinhos ATG. A revisão dos textos foi feita por Ayrton Poeta, San-
dro Vasconcelos e Simone Reis. A supervisão geral foi de Ana Maria
Silva e Eliane Maria B. Oliveira de Lucena.
A exposição contou com a parte de Educação Patrimonial execu-
tada por Jadson Joelson da Silva Barros com ajuda dos educadores
Ana Luíza Bezerra Pinto, Flávio Mandú de Souza, João Victor de Vas-
concelos Silva, Lucas de Lima Silva, Lucas José do Nascimento, Maria
Eduarda Pessoa Vieira Batista, Poliana Pinheiro, Salatieu Magno Siquei-
ra Alves, Tiago Alexandre Alves Pereira, Vanessa Lima da Mota Silveira.
O IAHGP e o Museu da Cidade do Recife agradecem: Governo
do Estado de Pernambuco, Secretaria de Educação do Estado de Per-
nambuco, Arquivo Público Estadual Jordão Emerenciano, Prefeitu-
ra do Recife, Secretaria de Educação do Recife, Emlurb, Companhia
Editora de Pernambuco, Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico
Nacional, Mosteiro de São Bento, Biblioteca Nacional, Consulado Ge-
ral da França, Museu Militar/Forte do Brum, André Monteiro, Ricardo
Leitão, Ricardo Melo , Marcelo Canuto, Renata Duarte Borba, George
Cabral, José Luiz da Mota Menezes, Maria Cristina Cavalcanti de Al-
buquerque, Margarida Cantarelli, Mateus Samico, Paulo Santos, Dir-
ceu Marroquim, Rodrigo Peixoto, Marília Ribeiro, Reinaldo Carneiro
Leão, Bruno Dornelas Câmara, Marcus Carvalho, Wanderson Édipo
de França, Ana Margarida Pereira, Telma Liege, Abade Dom Luiz Pe-
dro Soares e Dom João Cassiano (Mosteiro de São Bento de Olinda),
Maria Bernadete M. Bruto da Costa, Felipe José Dantas Cabral de
Melo, Maria Thereza do Rego Costa Amante, Marcos Cabral, Emerson
Pontes, Antônio Miguel de Oliveira e Elígia Moura. Agradecimentos

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 209-273, 2018


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especiais à Associação de Amigos do Museu da Cidade do Recife, à


equipe de funcionários e prestadores de serviço pelo trabalho diário
na conservação, pesquisa e divulgação das ações do Museu da Cida-
de e na conservação do monumento nacional do Forte de São Tiago
das Cinco Pontas.

Exposição itinerante

A exposição “Revolução Republicana de 1817”, em sua versão iti-


nerante, com curadoria de Maria de Betânia Corrêa de Araújo e de-
sign de Raul Kawamura, estreou na Galeria Zé Galdino do SESC, em
Caruaru, no dia 26 de abril de 2018. Na ocasião palestraram os asso-
ciados Maria de Betânia Corrêa de Araújo e George Cabral. O evento
de abertura atraiu um numeroso público de estudantes de escolas de
ensino médio e faculdades de formação de professores da localidade
e das cidades vizinhas.
Na sequência a exposição foi montada na sede do Engenho Poço
Comprido, em Vicência, sendo inaugurada em 10 de setembro de
2018. Na abertura da mostra naquela localidade esteve presente um
grande público de professores e estudantes universitários dos muni-
cípios da Mata Norte pernambucana. Eles puderam ouvir as palestras
dos associados Maria de Betânia Corrêa de Araújo e Dirceu Marro-
quim. Também palestrou Joana D´Arc Ribeiro, diretora do Ponto de
Cultura e Museu Engenho Poço Comprido. O encerramento da expo-
sição no Engenho Poço Comprido ocorreu no dia 20 de novembro de
2018, nas comemorações do Dia da Consciência Negra, com a parti-
cipação do Presidente George Cabral. Registramos nossos agradeci-
mentos a Valkiria Dias, coordenadora de Artes Visuais do SESC-PE e
a Joanna D´Arc Ribeiro, diretora do Museu Engenho Poço Comprido.

Ações realizadas em parceria com a grande Loja Maçônica de


Pernambuco - GLMPE

Uma das parcerias mais importantes para a consecução das ce-


lebrações do bicentenário foi firmada com a Grande Loja Maçônica
de Pernambuco (GLMPE). Agradecemos a intensa colaboração do
Sereníssimo Grão Mestre Janduhy Fernandes Cassiano Diniz e do

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 209-273, 2018


O Bicentenário da Revolução de 1817: Breve relato das comemorações 223

Grande Secretário de Relações Institucionais Marcos Luiz da Costa


Cabral, que não pouparam esforços para realizar importantes ações
comemorativas e de divulgação.

Painéis de azulejos assinalando os lugares da Revolução

Sem dúvida a mais permanente das ações realizadas foi a aposi-


ção de nove painéis de azulejos assinalando os locais onde ocorre-
ram alguns dos mais importantes lances da Revolução. A instalação
dos painéis foi um desdobramento do projeto História nas Paredes,
coordenado pelo associado Sílvio Tavares Amorim. Listamos abaixo
os locais assinalados com os marcos memoriais. Entre parênteses in-
dicamos o local onde estão fixados os painéis.
01 – Quartel do Regimento de Artilharia (fachada posterior do Edifício
Seguradora);
02 – Edifício do Erário Régio (fachada do Palácio do Governo);
03 – Campo do Erário Régio / Campo da Honra (fachada do Palácio
do Governo);
04 – Cadeia Nova (fachada do Arquivo Público Estadual);
05 – Palácio Velho/Colégio dos Jesuítas do Recife (fachada lateral nor-
te do Fórum Thomaz de Aquino)
06 – Ponte do Recife / Ponte 7 de setembro / Ponte Maurício de Nas-
sau (fachada leste do sobrado na esquina da rua 1º de Março).
07 – Forte do Brum (ao lado da ponte do fosso);
08 – Forte das Cinco Pontas (no trânsito do corpo da guarda);
09 – Seminário de Olinda (na subida para a Igreja da Graça).

No dia 03 de julho de 2017, foi realizada a inauguração simbólica


do roteiro dos marcos memoriais em frente ao painel instalado no
Museu da Cidade do Recife/Forte das Cinco Pontas. A solenidade
contou com a presença do prefeito da Cidade do Recife, Geraldo
Júlio; da diretora do Museu, Maria de Betânia Correia de Araújo; do
presidente do IAHGP, George Cabral; da Secretaria de Turismo e
Esporte do Recife, Ana Paula Vilaça; do vice-presidente do IAHGP e
coordenador do projeto História nas Paredes Silvio Tavares de Amo-
rim; do primeiro-secretário do IAHGP, Reinaldo Carneiro Leão; do
Grão Mestre Adjunto da GLMPE, João Ângelo Muniz; do Grande Se-

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 209-273, 2018


224

cretário de Relações Institucionais da GLMPE, Marcos Cabral, além


de vários associados do IAHGP e membros da GLMPE. Agradecemos
ao Sr. José Cassiano Cabral de Souza pelas providências relativas à
instalação dos painéis.

Ciclo de Sessões Magnas Culturais

Graças aos esforços de várias lojas maçônicas do estado de Per-


nambuco vinculadas à GLMPE, foi realizado um ciclo de Sessões
Magnas Culturais, abertas à comunidade de vários municípios per-
nambucanos. O objetivo do ciclo era, além da celebração do bicente-
nário, levar ao conhecimento do público a importância do movimen-
to republicano pernambucano de 1817. A programação do referido
ciclo contou com os seguintes eventos5:

28 de março de 2017 - Sessão Magna Cultural da GLMPE, com apoio


conjunto das Lojas Cleuza Veneziani Costa e Irmão Frei Caneca, na
qual palestrou a associada Maria Cristina Cavalcanti de Albuquerque
sob o título “A vocação autonomista de Pernambuco”. O evento ocor-
reu na Loja Irmão Frei Caneca.
25 de abril de 2017 – Sessão Magna Cultural realizada na Loja Antô-
nio Bernardo da Silva Filho (na antiga sede da GLMPE no bairro de
São José), com palestra do associado José Luiz Mota Menezes intitu-
lada “A vila do Recife em 1817: lugares da memória da Revolução e
da Maçonaria”.
27 de julho de 2017 – Sessão Magna Cultural promovida em Palmares
com a palestra “Revolução de 1817 – Pernambuco na vanguarda da
história”, do associado George Cabral. Também foi feita uma home-
nagem ao jornalista Mário Melo, secretário perpétuo do IAHGP e fi-
gura de destaque na Maçonaria brasileira. O evento foi realizado pela
Loja Maçônica Fraternidade Palmeirense, em cuja fachada foi afixado
um painel comemorativo do bicentenário.
19 de agosto de 2017 - Sessão Magna Cultural promovida em Gara-
nhuns com a palestra “Revolução de 1817 – Pernambuco como exem-

5 Estava prevista uma Sessão Magna Cultural em Caruaru no dia 30 de maio de 2017, o que
não foi possível devido às fortes chuvas que caíram naquela cidade neste dia.

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 209-273, 2018


O Bicentenário da Revolução de 1817: Breve relato das comemorações 225

plo para o Brasil”, do associado George Cabral. O evento realizado


pela Loja Maçônica Bandeirantes da Ordem no auditório do Clube
de Diretores Lojistas de Garanhuns contou com a presença dos asso-
ciados Reinaldo Carneiro Leão (primeiro-secretário), Yony Sampaio
(tesoureiro) e Francisco Bonato Pereira da Silva. Na mesma ocasião,
foi descerrada no Instituto Histórico, Geográfico e Cultural de Ga-
ranhuns uma placa alusiva ao bicentenário da Revolução oferecida
pela GLMPE, com a presença da presidente Ivonete Xavier e vários
associados do IHGCG. Encerrando a programação, foi realizado no
Círculo Militar do Exército daquela cidade um baile em homenagem
ao Maçom e ao bicentenário do 6 de março de 1817.
16 de setembro de 2017 – Sessão Magna Cultural promovida em Pe-
trolina pela Loja Harmonia e Fraternidade. Descerramento de painel
comemorativo na Câmara Municipal seguido da palestra “Os perso-
nagens e o legado da Revolução Republicana de Pernambuco em
1817, feita pelo associado George Cabral no auditório do Fórum da-
quela cidade. Na ocasião, a GLMPE, representada pelo Sereníssimo
Grão Mestre Janduhy Fernandes Cassiano Diniz, recebeu do IAHGP
a Medalha Confederação do Equador, em reconhecimento pelos re-
levantes serviços prestado à memória da Revolução de 1817. Este-
ve presente na solenidade Cosme Cavalcanti, presidente do Instituto
Arqueológico, Histórico e Ambiental de Petrolina (IAHAP) e sócio
correspondente do IAHGP.
29 de novembro de 2017 – O Grão-Mestre Dimas José de Carvalho
proferiu a palestra “O pan-americanismo da Revolução de 1817” na
Loja Maçônica Vale do Vernon.
5 de dezembro de 2017 – Sessão Magna Cultural realizada em Goiana.
O evento foi iniciado com descerramento de painel comemorativo na
fachada da Câmara Municipal, seguido da palestra “Goiana constrói
os caminhos da liberdade” proferida pelo presidente George Cabral.
Estiveram presentes Harlan Gadelha, presidente do IAHGGO e vá-
rios membros deste sodalício, bem como os associados do IAHGP
Sílvio Tavares de Amorim (vice-presidente), Reinaldo Carneiro Leão
(primeiro-secretário), Tácito Galvão (segundo-secretário), Rafael
Henriques Pimentel de Paula e Francisco Bonato Pereira da Silva.

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 209-273, 2018


226

Outras atividades

A GLMPE esteve presente nas celebrações dos dias 6 de março


de 2017 e 2018, realizadas no Palácio do Campo das Princesas, par-
ticipando dos atos solenes de hasteamento das bandeiras, aposição
de homenagens aos mártires da Revolução e no desfile cívico-militar
com a presença de um grupamento maçônico.
No dia 13 de janeiro de 2018, a GLMPE promoveu homenagem a
Frei Caneca no Museu da Cidade do Recife/Forte das Cinco Pontas.
A solenidade se insere no âmbito das celebrações dos bicentenários
das revoluções libertárias de Pernambuco e prestou homenagem ao
frade carmelita que, a despeito da pequena participação em 1817, foi
o grande herói da Confederação do Equador (1824), legando ao povo
brasileiro uma sólida obra política e literária e um exemplo de cida-
dania ativa. Estiveram presentes o prefeito em exercício da cidade do
Recife, Luciano Siqueira; a diretora do Museu da Cidade do Recife,
Maria de Betânia Corrêa de Araújo; o presidente do IAHGP, George
Cabral (que fez palestra alusiva ao tema); o inspetor de saúde do
Comando Militar do Nordeste, General de Brigada Médico Sergio dos
Santos Szelbrackowski; o Grão Mestre de Honra da GLMPE, Dimas
José de Carvalho; o representante da Província Carmelitana, Frei Tito
e diversas autoridades maçônicas e membros do IAHGP. Também
participaram do evento duas descendentes de Frei Caneca, as senho-
ras Marlene Caneca Sobreira e Lúcia Caneca Sobreira.
Ao longo do ano de celebrações, a GLMPE concedeu a Comenda
Maçom Frei Caneca ao ex-presidente do IAHGP, José Luiz Mota Me-
nezes, e ao presidente do biênio 2017-2019, George Cabral. Foi ou-
torgada também a Medalha da Liberdade aos membros da Diretoria
do IAHGP e ao colaborador José Cassiano Cabral de Souza.

A participação da Companhia Editora de Pernambuco - Cepe

A Companhia Editora de Pernambuco – Cepe, teve um papel im-


portantíssimo durante as celebrações do bicentenário e deixará para
a posteridade uma dos mais permanentes legados de todo o ciclo
comemorativo. Graças ao esforço concentrado da Cepe, foi possível
a publicação de uma série de obras que são fundamentais para a pes-

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 209-273, 2018


O Bicentenário da Revolução de 1817: Breve relato das comemorações 227

quisa no tema e também para a divulgação da história da Revolução,


mantendo viva, dessa forma, a sua memória. A Cepe focou seu tra-
balho em duas linhas principais: a reedição da mais importante obra
de referência sobre o movimento e o lançamento de novos títulos
com reflexões contemporâneas sobre 1817. Em paralelo, concretizou
ações na produção audiovisual.
Iniciando o ano das celebrações, a Cepe lançou o seu tradicional
calendário, que, no ano de 2017, foi dedicado a homenagear a Re-
volução. Doze artistas plásticos foram convidados a oferecer o seu
olhar sobre o movimento republicano pernambucano. Foram eles:
Jeims Duarte, Helder Santos, Daaniel Araújo, Bruno Vilela, Beto Via-
na, Plínio Palhano, Jéssica Martins, Gio Simões, Roberto Ploeg, Geor-
ge Barbosa, Renato Valle e Rinaldo Silva. As obras que compuseram
o calendário, uma para cada mês, foram apresentadas ao público na
Galeria Arte Plural, na exposição 17 por 12, que ficou em cartaz de
13 de janeiro a 10 de fevereiro de 2017.
Indiscutivelmente a mais importante obra sobre o movimento é
a História da Revolução de Pernambuco em 1817, do Monsenhor
Francisco Muniz Tavares, que foi o primeiro presidente do IAHGP
(de 1862 a 1875). O volume manteve as notas de Maximiano Lopes
Machado e Manuel de Oliveira Lima e foi prefaciado pelo associado
George Cabral. Realizou-se acurado trabalho de editoração e atuali-
zação ortográfica, possibilitando ao leitor uma maior fluidez na apre-
ciação da obra.
Quatro livros inéditos foram lançados, oferecendo ao leitor um
manancial de informação e de interpretações qualificadas sobre o
movimento. O ABCdário da Revolução, de Maria de Betânia Corrêa
de Araújo serviu como base para o roteiro da exposição de longa
duração apresentada entre março de 2017 e março de 2018 no Mu-
seu da Cidade do Recife. 1817 e outros ensaios foi organizado pelos
historiadores Antônio Jorge Siqueira (associado do IAHGP), Flávio
Teixeira Weinstein e Antônio Paulo Rezende e reúne 10 textos que
abordam o movimento em diferentes facetas. Os associados Gonçalo
de Barros Carvalho e Mello Mourão, José Luiz Mota Menezes e Mar-
celo Casseb participam com colaborações na obra.
O volume Memorial do dia seguinte – a Revolução de 1817 em
documentos da época, organizado por Evaldo Costa, Hildo Leal da

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 209-273, 2018


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Rosa e Débora Cavalcantes de Moura, reúne uma compilação de fon-


tes essenciais para aprofundar o conhecimento sobre a insurgência
pernambucana. Os documentos publicados fazem parte do acervo
do Arquivo Público Estadual Jordão Emerenciano (APEJE). Foi lan-
çada ainda a história em quadrinhos Amor e Revolução, baseada no
romance do jornalista Paulo Santos (autor de A noiva da Revolução)
com ilustrações de Pedro Zenival. Dirigido ao público mais jovem, o
material foi distribuído nas escolas públicas do estado.
Com o objetivo de potencializar a divulgação sobre a Revolução
Pernambucana, a Cepe realizou um documentário de curta-metragem
intitulado Revolução de 1817 – 74 dias de liberdade em Pernambuco,
com a participação dos associados José Luiz Mota Menezes e George
Cabral. O filme foi disponibilizado através das plataformas digitais da
Internet para uso didático. Graças ao apoio da Cepe, foi possível rea-
lizar a gravação do CD com a Suíte 1817, composta por Múcio Callou
e executada pelo Quarteto Aram sob a regência do autor da peça. O
CD foi encartado na Revista Continente de agosto de 2018 (edição
212). A editora já havia dedicado também um número especial da
revista (março de 2017, edição 195) para a divulgação do bicentená-
rio de 1817. A Cepe providenciou ainda a impressão da partitura da
Suíte 1817. Foram realizados, ademais, seminários e feiras literárias
em cidades-polo do estado. Nesses eventos promoveu-se a distribui-
ção de livros para escolas e houve palestras e treinamentos para os
docentes da rede pública de ensino.
Antecipando as comemorações vindouras no âmbito do bicentenário
dos movimentos de independência em Pernambuco, a Cepe publicou
os seguintes volumes: Frei Caneca – vida e escritos, de autoria de Frei
Tito e Poesia de Natividade Saldanha. Com esse brilhante trabalho, e
outras muitas ações, a Cepe se consolidou como um baluarte para a di-
vulgação da história de Pernambuco. Registramos aqui nosso agradeci-
mento e louvor, ressaltando ainda a parceria que tem permitido a publi-
cação, há dez anos ininterruptos, desta Revista do IAHGP. Manifestamos
ainda nossa gratidão e reconhecimento pelo trabalho do presidente da
Cepe, Ricardo Leitão e do seu diretor editorial, Ricardo Melo durante o
bicentenário e no cotidiano das ações promovidas pelo IAHGP.
Outras Atividades (Em ordem cronológica)

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 209-273, 2018


O Bicentenário da Revolução de 1817: Breve relato das comemorações 229

Para além das atividades já mencionadas acima, convém destacar


os seguintes eventos ocorridos entre janeiro de 2016 e dezembro de
2018, todos relacionados às celebrações do Bicentenário de 1817.

2016

• 28 de janeiro de 2016 – Sessão Magna do IAHGP, com a pales-


tra intitulada “A Lei Orgânica de 1817”, ministrada pela asso-
ciada e ex-presidente do IAHGP, Margarida Cantarelli.
• 02 de março de 2016 – Sessão Solene pelos 199 anos da Re-
volução Pernambucana, com palestra do embaixador Gonçalo
de Barros Carvalho e Melo Mourão, que na mesma ocasião,
tomou posse como associado correspondente do IAHGP.
• 18 de março de 2016 – A associada Maria Cristina Cavalcanti
de Albuquerque (ex-presidente do IAHGP), proferiu a palestra
“O ciclo revolucionário pernambucano” na abertura do ano
letivo da Faculdade de Medicina do IMIP.
• 8 de dezembro de 2016 – O associado George Cabral proferiu
palestra alusiva ao bicentenário da Revolução de 1817 no âmbi-
to do Congresso Acadêmico Integrado de Inovação e Tecnolo-
gia promovido pela Universidade Federal de Alagoas (Campus
Maceió).
• 14 de dezembro de 2016 – O Arquivo Público Estadual Jordão
Emerenciano (APEJE) realizou uma mesa-redonda sobre a Re-
volução de 1817 com a participação do Professor Luiz Felipe
de Alencastro (FGV) e tendo por debatedores os professores
Antônio Jorge Siqueira e Marcus Carvalho, ambos associados
do IAHGP.

2017

• 26 de janeiro de 2017 – Academia Pernambucana de Letras,


presidida por Margarida Cantarelli, fez a abertura oficial do
“Ano Literário Bicentenário de 1817”.
• 30 de janeiro de 2017 – Sessão Magna do IAHGP com palestra

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 209-273, 2018


230

do associado Marcelo Casseb Continentino intitulada “A Lei


Orgânica de Pernambuco na encruzilhada dos tempos”.
• 2 de março de 2017 – Governo de Pernambuco, por intermédio
do secretário executivo da Casa Civil, Marcelo Canuto, realizou
entrevista coletiva com os principais órgãos de comunicação do
estado, para anunciar as atividades do ano do bicentenário. Na
mesma ocasião, todas as instituições participantes da Comissão
Organizadora informaram também as suas atividades previstas.
Foi distribuída a publicação Uma breve história da pernambucani-
dade, da associada Maria Cristina Cavalcanti de Albuquerque,
impressa pelo Governo do Estado para subsidiar com informa-
ções as agências de notícias.
• 6 de março de 2017 – Grande solenidade no Palácio do Campo
das Princesas iniciou o ano de comemorações do bicentenário
(ver mais detalhes na página 212).
• Ainda durante a manhã do dia 6 de março, foi realizada uma
Sessão Solene no plenário da Câmara Municipal do Recife em
homenagem ao bicentenário da Revolução proposta pelo ve-
reador Ivan Moraes. Estiveram presentes os associados George
Cabral, Francisco Sales e Tácito Galvão.
• Às 15 horas, iniciou-se uma Sessão Solene conjunta do IAHGP
e da Academia Pernambucana de Letras, realizada no auditório
desta instituição. A sessão foi co-dirigida pela presidente da
APL, Margarida Cantarelli e pelo presidente do IAHGP, George
Cabral, e contou com a presença de um grupo numeroso de
associados do IAHGP e acadêmicos, além de autoridades
e dirigentes de instituições culturais. Na ocasião, palestrou o
professor Vamireh Chacon, associado do IAHGP e acadêmico
da APL.
• Às 18 horas, realizou-se uma Sessão Solene da Assembleia
Legislativa de Pernambuco (ALEPE), sob a presidência do
deputado Guilherme Uchôa. Estiveram presentes o governador
Paulo Câmara, e os seguintes deputados estaduais: Aluísio
Lessa, Beto Accioly, Ossésio Silva, Eduíno Brito, Eriberto
Medeiros, Isaltino Nascimento, Jadeval de Lima, Laura Gomes,
Lucas Ramos, Ricardo Costa, Rodrigo Novaes, Rogério Leão,
Romário Dias, Simone Santana, Terezinha Nunes, Tony

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 209-273, 2018


O Bicentenário da Revolução de 1817: Breve relato das comemorações 231

Gel, Waldemar Borges e Zé Maurício, para além de diversas


autoridades e representantes de instituições culturais. O
governador entregou a Medalha do Bicentenário ao arcebispo de
Olinda e Recife, Dom Fernando Saburido. A GLMPE recebeu
placa de homenagem da ALEPE, sendo representada no ato
pelo Grão Mestre Janduhy Cassiano Fernandes Diniz. O IAH-
GP esteve representado por vários de seus associados.
• 7 de março de 2017 – Sessão Solene na Câmara dos Deputados,
em Brasília. A solenidade foi proposta e presidida pelo deputa-
do Tadeu Alencar, que é associado benemérito do IAHGP. Os
hinos do Brasil e de Pernambuco foram executados pela Ban-
da do Batalhão da Guarda Presidencial. Estiveram presentes
também o governador Paulo Câmara, o vice-governador Raul
Henry, o ministro das Cidades Bruno Araújo, Carlos Siqueira
(presidente do Partido Socialista Brasileiro), a secretária de Di-
versidade e Inclusão do Ministério da Educação Ivania Siquei-
ra e a vice-presidente do IAHGP Margarida Cantarelli. Dis-
cursaram as autoridades já mencionadas e ainda os seguintes
parlamentares: Gonzaga Patriota, Guilherme Coelho, Heráclito
Fortes, Pollyana Gama, Chico Alencar, Hugo Leal, Mandetta,
Paulo Henrique Lustosa, Danilo Forte, Fernando Monteiro e
Renato Casa Grande (ex-deputado).
• 9 de março de 2017 – Seminário “200 anos da Revolução de
1817” realizado pela Fundação Joaquim Nabuco e Fundação
Astrojildo Pereira, no Auditório Calouste Gulbenkian (FUN-
DAJ). Entre os palestrantes esteve o associado José Luiz Mota
Menezes com a comunicação “Um Campo do Erário Régio,
dois pátios e uma Revolução republicana”. O evento contou
ainda com a participação dos historiadores Socorro Ferraz e
Flávio José Gomes Cabral e do senador Cristóvam Buarque.
Os trabalhos foram dirigidos por Luiz Otávio Cavalcanti, pre-
sidente da FUNDAJ.
• 11 de março de 2017 – O Instituto Histórico, Arqueológico e
Geográfico de Goiana (IHAGGO), presidido por Harlan Ga-
delha Filho, realizou um dia inteiro de atividades em memória
dos revolucionários de 1817. As celebrações incluíram a ence-
nação teatral do martírio dos heróis da Revolução, a inaugura-

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 209-273, 2018


232

ção do painel memorial de azulejos em frente ao Convento do


Carmo e a realização de missa na Igreja do referido convento,
celebrada pelo Prior Frei Juracy Barbosa. Estiveram presentes
vários associados do IAHGP.
• 11 de março de 2017 – O Instituto Histórico e Geográfico
da Vitória de Santo Antão (IHGVSA) realizou solenidade na
praça Leão Coroado, naquela cidade, em frente ao monumen-
to do escultor Bibiano Silva que homenageia José de Barros
Lima, herói de 1817. O presidente George Cabral e o secretário
Reinaldo Carneiro Leão, juntamente com o presidente do IH-
GVSA, Pedro Ferrer, fizeram aposição de coroa de flores no
monumento. A solenidade contou com a presença de inúmeros
associados dos dois sodalícios e dos moradores da cidade.
• 12 de março de 2017 – Abertura da exposição “1817 – Revo-
lução republicana” no Museu da Cidade do Recife/Forte das
Cinco Pontas com lançamento dos seguintes livros: edição co-
memorativa da História da Revolução de Pernambuco em 1817, de
Francisco Muniz Tavares; ABCdário da Revolução, de Maria de
Betânia Correa de Araújo, ambos pela Cepe; e da segunda edi-
ção do romance Olhos negros, de Maria Cristina Cavalcanti de
Albuquerque, pela Editora Bagaço. Realizou-se também a pri-
meira apresentação da Suíte 1817, composta por Múcio Callou
e executada pelo Quarteto Aram. (Ver mais detalhes na página
219).
• 12 de março de 2017 – Como parte das celebrações pelo aniver-
sário da cidade, a Prefeitura de Olinda organizou homenagens
ao bicentenário da Revolução. Pela manhã, os sinos das igrejas
da cidade repicaram festivamente e houve inúmeras manifes-
tações culturais das expressões artísticas locais durante o dia.
• 13 de março de 2017 – Solenidade no Tribunal de Justiça de
Pernambuco, presidido pelo Desembargador Leopoldo de
Arruda Raposo, com palestra de José Luiz Mota Menezes. O
evento foi promovido pelo TJPE, Centro de Estudos Judiciá-
rios e Escola Judicial.
• 13 de março de 2017 - Solenidade na Biblioteca Pública Esta-
dual, com a abertura da exposição “Bicentenário da Revolução
Pernambucana de 1817”. Na ocasião celebrou-se também o

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 209-273, 2018


O Bicentenário da Revolução de 1817: Breve relato das comemorações 233

cinquentenário da inauguração do painel “Revoluções Pernam-


bucanas”, de autoria do escultor Corbiniano Lins (1924-2018),
que esteve presente na solenidade. Discursaram o secretário de
Educação de Pernambuco, Frederico da Costa Amancio, a di-
retora da Biblioteca Pública Estadual, Roberta Alcoforado e o
escritor e acadêmico da APL, Raimundo Carreiro. O IAHGP
foi representado pelos associados George Cabral e Marcelo
Casseb.
• 22 de março de 2017 – Evento na Faculdade de Olinda (FOC-
CA), com palestra de Marcelo Casseb intitulada “A Revolução
Pernambucana de 1817”, tendo por debatedor Maurício Barre-
to Pedrosa Filho.
• 27 e 28 de março de 2017 – Seminário “1817: significados e
contemporaneidade” realizado pelo Programa de Pós-gradua-
ção em História da UFPE, com a participação dos associados
Antônio Jorge Siqueira e George Cabral.
• 28 de março de 2017 – Seminário “Aspectos Políticos e Metaju-
rídicos da Revolução de 1817”, promovido pelas Procuradoria
Geral do Estado, Faculdade de Direito do Recife (UFPE) e
Universidade Católica de Pernambuco (UNICAP), com a par-
ticipação do associado Marcelo Casseb Continentino.
• 29 de março de 2017 – Solenidade no Campo da Pólvora, em
Salvador para inauguração do painel em memória dos márti-
res de 1817 – Padre Roma, Domingos José Martins, José Luiz
de Mendonça, Padre Miguelinho – fuzilados naquele local. O
evento contou com a presença dos prefeitos do Recife e de Sal-
vador, Geraldo Júlio e Antônio Carlos Magalhães Neto, respec-
tivamente, e do presidente do Instituto Geográfico e Histórico
da Bahia (IGHB), Eduardo de Morais Castro. Em seguida, na
Igreja de Sant’Anna, ao lado do Campo da Pólvora, foi cele-
brada uma missa solene pelo cardeal primaz do Brasil, Murilo
Krieger, assistido por vários  sacerdotes e com a presença de
líderes de outras denominações religiosas. A Orquestra Sinfôni-
ca da Bahia e grande coral executaram o hino de Pernambuco
numa tocante homenagem. Representaram o IAHGP os vice-
-presidentes Margarida Cantarelli e Silvio Amorim.
• 5 e 6 de abril de 2017 – Seminário “Revolução Pernambucana

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 209-273, 2018


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de 1817”, no Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, sob a


presidência de Arno Wehling, que ministrou palestra. Apresen-
taram comunicações os associados George Cabral, Margarida
Cantarelli, Reinaldo Carneiro Leão, José Luiz Mota Menezes,
Marcelo Casseb Continentino, Cláudio Aguiar, Gonçalo Mou-
rão e Vamireh Chacon. Também apresentaram trabalhos Maria
de Lourdes Viana Lyra, Guilherme Pereira das Neves (ambos
do IHGB) e Paulo Fernando de Albuquerque Maranhão (IH-
GRN). Estiveram presentes os associados do IAHGP Fernan-
do Guerra (diretor de patrimônio), Rafael Henriques Pimentel
de Paula e George Emílio Bastos Gonçalves.
• 8 de maio de 2017 – Sessão Especial do Senado da República
em homenagem ao bicentenário da Revolução de 1817. A ses-
são foi proposta pelo senador Humberto Costa e contou com
as intervenções dos associados George Cabral, José Luiz Mota
Menezes e Vamireh Chacon. Discursaram também, o senador
Cristovam Buarque, os professores Flávio José Gomes Cabral
(UNICAP) e Luiz Carlos Villalta (UFMG) e os escritores Leo-
nardo Dantas Silva e Paulo Santos. A gravação em vídeo da ín-
tegra da sessão pode ser encontrada no sítio eletrônico https://
www.youtube.com/watch?v=mTsNMPqd5DU .
• 10 de maio de 2017 – Abertura da exposição “Pernambuco 1817,
a Revolução” na Biblioteca Nacional, no Rio de Janeiro. A mos-
tra foi inaugurada pelo ministro da Cultura, Roberto Freire, e
pela presidente da Biblioteca Nacional, Helena Severo. A cura-
doria foi feita por Maria Eduarda Marques. Na ocasião, a Cepe
fez o lançamento no Rio de Janeiro da edição comemorativa da
História da Revolução de Pernambuco em 1817, do Monsenhor Fran-
cisco Muniz Tavares. A exposição contou com peças do acervo
de manuscritos, gravuras e livros pertencentes à Biblioteca Na-
cional e esteve aberta ao público até 15 de agosto de 2017.
• 16 de maio de 2017 – Solenidade promovida pela Prefeitura de
Paulista na Igreja de Santa Isabel, em memória do Padre João
Ribeiro. Palestraram os associados José Luiz Mota Menezes e
George Cabral. Estiveram presentes os associados Reinaldo
Carneiro Leão, Tácito Galvão e Rafael Henriques Pimentel de
Paula.

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O Bicentenário da Revolução de 1817: Breve relato das comemorações 235

• 19 de Maio de 1817 – Palestra de José Luiz Mota Menezes no


Instituto Histórico, Geográfico e Cultural de Garanhuns (IHG-
CG) intitulada “1817: os espaços da Revolução”.
• 24 de maio de 2017 – O associado Carlos Bezerra Cavalcanti
realizou palestra para o Ágape Caxangá em evento cultural rea-
lizado no Restaurante Papa-Capim.
• 6 a 9 de junho de 2017 – A Fundação de Amparo à Ciência e
Tecnologia do Estado de Pernambuco (FACEPE) realizou a
21ª Jornada de Iniciação Científica, cujo título de honra foi “Bi-
centenário da Revolução Pernambucana”. Os associados José
Luiz Mota Menezes e Maria Cristina Cavalcanti de Albuquer-
que palestraram na abertura e encerramento do evento, res-
pectivamente. A atividade foi realizada no Centro de Ciências
Sociais Aplicadas da UFPE.
• 8 de junho de 2017 – Promulgação da lei 16.059 proposta pelos
deputados Terezinha Nunes e Isaltino Nascimento que voltou
a fazer do 6 de março um feriado estadual. O dia do início da
Revolução de 1817 fora fixado como Data Magna do estado de
Pernambuco pela lei 13.386 de 24 de dezembro de 2007, a par-
tir da aprovação de projeto da deputada Terezinha Nunes. Na
ocasião, ficou estabelecido o feriado estadual, sendo observado
no ano de 2008. Não obstante, em 2009, a partir da proposta
dos deputados Antônio Moraes e Ciro Coelho, a lei 13.835, de
2 de julho, revogou o feriado, determinando que as celebrações
deveriam ser realizadas no primeiro domingo do mês de março.
Lamentavelmente, a mudança praticamente esvaziou o sentido
da existência da Data Magna. A lei 16.059 de 08/06/2017, ao
garantir a existência do feriado, possibilitou que haja uma maior
atenção do público para esta efeméride tão importante da his-
tória do Brasil. Os feriados estaduais são chancelados pela lei
federal 9.093, de 12 de setembro de 1995.
• 26 de junho de 2017 – Solenidade no Palácio do Campo das
Princesas para o anúncio oficial da “Taça Bicentenário da Re-
volução Pernambucana de 1817” como troféu do campeonato
estadual de 2017. O evento contou com a presença do gover-
nador Paulo Câmara, dos secretários Antônio Figueira (Casa
Civil) e Felipe Carreras (Turismo, Esportes e Lazer); dos se-

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 209-273, 2018


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cretários-executivos da Casa Civil Marcelo Canuto e André


Campos; da presidente da Fundação do Patrimônio Histórico e
Artístico de Pernambuco (Fundarpe), Márcia Souto; do presi-
dente da Federação Pernambucana de Futebol (FPF), Evandro
Carvalho; do presidente de honra do Salgueiro Atlético Clube,
Clebel Cordeiro; do presidente do Sport Club do Recife, Arnal-
do Barros; do diretor de competições da FPF, Murilo Falcão;
dos membros da Comissão Organizadora do Bicentenário da
Revolução de 1817, Margarida Cantarelli (representado a APL)
e José Luiz Mota Menezes e George Cabral (representando o
IAHGP). A sugestão de usar o campeonato pernambucano de
futebol para divulgar o bicentenário de 1817 partiu do associa-
do George Cabral em 2016 e foi encampada pelo IAHGP, que
conseguiu junto a FPF a concretização da homenagem. O tro-
féu foi entregue ao Sport Club do Recife, após a conquista do
título de 2017, na partida final contra o Salgueiro Atlético Clu-
be no estádio Cornélio de Barros (Salgueiro), em 28 de junho.
• 1º de julho de 2017 – O presidente da Federação Pernambu-
cana de Futebol Evandro Carvalho, entregou ao IAHGP uma
réplica da “Taça Bicentenário da Revolução Pernambucana de
1817”, troféu do campeonato pernambucano de futebol de
2017.
• 9 de julho de 2017 – Solenidade em homenagem ao Vigário
Tenório, mártir da Revolução de 1817. O evento ocorreu em
Vila Velha, Itamaracá, e foi organizado pelo Venerável Mestre
da Loja Maçônica Acácia da Ilha de Itamaracá, Ricardo de Melo
Cabral, com o apoio da Prefeitura da Ilha. O evento contou
com a participação dos associados do IAHGP Silvio Amorim
(vice-presidente), Reinaldo Carneiro Leão (primeiro-secretário)
e Tácito Galvão (segundo secretário) que proferiram discursos.
Do IAHGP, estiveram presentes também Jacques Ribemboim,
Maria Cristina Cavalcanti de Albuquerque, Roberto Cavalcanti
e Harlan Gadelha (que também representava o IAHGGO).
• 10 de julho de 2017 – Abertura da exposição “Avante Patriotas!
200 anos da Revolução Pernambucana”, na Câmara dos De-
putados (hall do plenário Ulysses Guimarães). A exposição foi
subsidiada com informações e reproduções de peças do acervo

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 209-273, 2018


O Bicentenário da Revolução de 1817: Breve relato das comemorações 237

do IAHGP. Contou ainda com o apoio do Museu da Cida-


de do Recife, Arquivo Público Estadual Jordão Emerenciano
(APEJE) e do Ministério das Relações Exteriores. A curadoria
da exposição foi feita por Luciana Scanapieco e um catálogo
pode ser visualizado no sítio eletrônico http://www2.camara.
leg.br/a-camara/visiteacamara/cultura-na-camara/arquivos/
avante-patriotas . A mostra esteve aberta ao público até 2 de
agosto de 2017.
• 10 de agosto de 2017 – Palestra do associado Carlos Bezerra
Cavalcanti no Centro de Estudos de História Municipal (CON-
DEPE/FIDEM), com o título “O pan-americanismo e a Re-
volução de 1817”.
• 29 de agosto de 2017 – Palestra de Marcelo Casseb intitulada
“Dimensões jurídico-constitucionais da Revolução Pernambu-
cana de 1817”, tendo por debatedor Maurício Barreto Pedrosa
Filho na “Semana Jurídica” da Faculdade de Olinda (FOCCA).
• 31 de agosto de 2017 – Obliteração do selo oficial da Empresa
Brasileira de Correios e Telégrafos em homenagem ao Bicen-
tenário de 1817 e entrega dos prêmios do “Concurso Cultural
Revolução de 1817 – Pernambuco na luta pelos ideais republi-
canos”. O evento ocorreu no Palácio do Campo das Princesas
(ver mais detalhes nas páginas 214-217).
• 07 de setembro de 2017 – Os associados Alípio Durans e
George Emílio Bastos Gonçalves representaram o IAHGP no
desfile cívico-militar do Dia da Pátria, acompanhando o grupa-
mento maçônico da GLMPE.
• 18 de setembro de 2017 – Lançamento do livro 1817 e outros
ensaios, organizado pelo associado Antônio Jorge Siqueira em
parceria com os historiadores Antônio Paulo Rezende e Flávio
Teixeira Weinstein, com 10 textos sobre a Revolução e seus
significados. A obra contou com contribuições dos associados
José Luiz Mota Menezes e Marcelo Casseb.
• 20 de setembro de 2017 – Participação do associado George
Cabral como debatedor no lançamento do livro Antologia fantás-
tica da República Brasileira, do escritor pernambucano José Luiz
Passos, no âmbito da III Feira Nordestina do Livro (FENE-
LIVRO), promovida pela Cepe, no Centro de Convenções de

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 209-273, 2018


238

Pernambuco. Esta edição da FENELIVRO teve como tema


geral a Revolução de 1817.
• 22 de setembro de 2017 – Palestra do associado George Cabral
intitulada “1817: entre a memória e o esquecimento”, na pro-
gramação da Festa Literária Internacional de Ipojuca (FLIPO).
• Outubro de 2017 – A Fundação Joaquim Nabuco anuncia o lan-
çamento do livro Os Patriotas, poema dramático de autoria de
Methodio Maranhão, que foi várias vezes presidente do IAHGP..
• 18 de outubro de 2017 – Palestra do associado correspondente
Vamireh Chacon, sob o título “O pensamento liberal na Revo-
lução de 1817”, no auditório do IAHGP.
• 27 de outubro de 2017 - Inauguração do painel de azulejos da
rua Padre Roma, com homenagem ao herói da Revolução mar-
tirizado em 29 de março de 1817 em Salvador. Representaram
o IAHGP: o presidente George Cabral e os vice-presidentes
Margarida Cantarelli e Silvio Amorim (coordenador do Pro-
jeto História nas Paredes). A solenidade contou ainda com a
presença do prefeito do Recife, Geraldo Júlio, da secretária de
Turismo do Recife, Ana Paula Vilaça e de João Roma Neto.
• 03 de dezembro de 2017 – Lançamento do filme 1817: a Re-
volução esquecida, dirigido por Tizuka Yamasaki e Ricardo Fa-
villa. O docudrama foi realizado com o apoio do Ministério
da Educação para ser exibido na programação da TV Escola,
alcançando assim um imenso público jovem em todo o país.
As cenas foram gravadas no Recife, inclusive nas dependên-
cias do IAHGP, do Museu da Cidade do Recife/Forte das Cin-
co Pontas e do Museu Militar/Forte do Brum. Os associados
Margarida Cantarelli, José Luiz Mota Menezes e George Cabral
participaram do filme com depoimentos sobre a história da Re-
volução. Os associados Alberto Salazar e Margarida Cantarelli
cederam peças originais de época de suas coleções particulares
para uma ambientação mais realista das cenas. O lançamento
do filme aconteceu em uma concorrida sessão avant-première no
histórico Cine São Luiz, na rua da Aurora. O evento contou
com a presença do ministro da Educação José Mendonça Fi-
lho, dos diretores e atores do filme e de inúmeros associados
do IAHGP. Em julho de 2018, a produção foi agraciada com o

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 209-273, 2018


O Bicentenário da Revolução de 1817: Breve relato das comemorações 239

prêmio de melhor filme pela Televisión América Latina (TAL),


concorrendo com centenas de produções de todos os países
latino-americanos.
• 11 de dezembro de 2017 – Representado pelo presidente Geor-
ge Cabral, o IAHGP recebeu da Assembleia Legislativa de Per-
nambuco, a Medalha Comemorativa do Bicentenário da Revolução Per-
nambucana de 1817. A honraria foi entregue em sessão solene
presidida pelo deputado Guilherme Uchôa no plenário princi-
pal da Casa de Joaquim Nabuco. A proposta de concessão foi
do deputado Waldemar Borges mediante Projeto de Resolução
nº 1202/2017.

2018

• 29 de janeiro de 2018 – Sessão Magna do IAHGP. Foi oradora


oficial a associada Maria de Betânia Corrêa de Araújo, que dis-
cursou sobre as celebrações do Bicentenário. Na mesma sole-
nidade, foi entregue a Medalha Frei Caneca à Companhia Editora
de Pernambuco – Cepe, representada por seu presidente, Ricar-
do Leitão, e ao grande secretário de Relações Institucionais da
Grande Loja Maçônica de Pernambuco, Marcos Luiz da Costa
Cabral, em reconhecimento aos relevantes serviços prestados à
história de Pernambuco durante as celebrações do bicentenário
da Revolução. Pela mesma razão, foram agraciados com a Me-
dalha Confederação do Equador os deputados estaduais Terezinha
Nunes, Isaltino Nascimento e Waldemar Borges, e também o
secretário executivo da Casa Civil, Marcelo Canuto.
• 26 de fevereiro de 2018 – Encerramento do “Ano Literário
Bicentenário de 1817” na Academia Pernambucana de Letras
com palestra do presidente do IAHGP George Cabral intitula-
da “Por que celebrar a Revolução de 1817?”.
• 1º de março de 2018 – Lançamento do livro Memorial do dia
seguinte – a Revolução de 1817 em documentos da época, organizado
por Evaldo Costa, Hildo Leal da Rosa e Débora Cavalcantes de
Moura. O volume reúne uma compilação de 106 documentos
relativos à Revolução que fazem parte do acervo do Arquivo

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 209-273, 2018


240

Público Estadual Jordão Emerenciano (APEJE). Na mesma


solenidade, fez-se a abertura de exposição com os originais de
alguns do documentos compilados no livro. A exposição esteve
aberta à visitação até o dia 30 de abril de 2018.
• 6 de março de 2018 – Solenidade comemorativa dos 201 anos
da Revolução Pernambucana no Palácio do Campo das Prin-
cesas, com desfile cívico-militar e a presença dos representan-
tes dos Institutos Históricos estaduais nordestinos e Institutos
Históricos municipais pernambucanos. (Ver mais detalhes na
página 213).
• 8 de junho de 2018 – Evento alusivo à história da Revolução
de 1817 no Instituto Histórico, Geográfico e Cultural de Ga-
ranhuns (IHGCG), em sessão dirigida pela presidente Ivone-
te Xavier, com a presença de vários associados do sodalício e
grande público de professores e estudantes. Palestrou o asso-
ciado George Cabral.
• 13 de junho de 2018 - Solenidade do Instituto Histórico e
Geográfico do Espírito Santo (IHGES), presidido por Getú-
lio Neves, que é também associado correspondente do IAH-
GP. Na ocasião, o associado João Mendonça de Amorim Filho
representou o IAHGP e fez discurso alusivo ao movimento
revolucionário pernambucano, que teve entre seus principais
líderes o capixaba Domingos José Martins. No mesmo evento,
foi entregue ao IAHGP a Medalha do Mérito Cultural Renato Pa-
checo. O IHGES teve entre os seus idealizadores e fundadores o
pernambucano Carlos Xavier Paes Barreto. O sodalício iniciou
suas atividades em 12 de junho de 1916, no âmbito dos prepa-
rativos para o centenário da Revolução. A data assinala o dia
no qual, em 1817, Domingos José Martins, Padre Miguelinho e
José Luiz de Mendonça foram fuzilados no Campo da Pólvora,
em Salvador.
• 18 de agosto de 2018 – Inauguração simbólica do painel de azu-
lejos instalado na Ponte 6 de março (popularmente conhecida
como Ponte Velha). A solenidade ocorreu nos jardins do IAH-
GP onde foi instalada uma réplica do painel que registra o qua-
dro social ativo do sodalício durante as celebrações do bicente-
nário, bem como o agradecimento às pessoas e instituições que

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 209-273, 2018


O Bicentenário da Revolução de 1817: Breve relato das comemorações 241

colaboraram na realização das atividades comemorativas.


• 19 de agosto de 2018 – Lançamento do CD Suíte 1817, compos-
ta pelo maestro Múcio Callou, e executada pelo Quarteto Opus
Aram no auditório da Academia Pernambucana de Letras. A
gravação contou com o apoio da Cepe, que encartou o CD na
edição de agosto de 2018 da Revista Continente. A obra estreou
em 12 de março de 2017, na abertura da exposição dedicada
à Revolução no Museu da Cidade do Recife. Posteriormente
integrou a trilha sonora do docudrama “1817: a Revolução es-
quecida”, filme dirigido por Tizuka Yamasaki e Ricardo Favilla
com o apoio do Ministério da Educação.

As celebrações pela passagem do bicentenário da Revolução de


1817 continuarão ao longo do ano de 2019 e serão sucedidas pelas
rememorações das efemérides de 1821 (Convenção de Beberibe),
1822 (Independência do Brasil) e 1824 (Confederação do Equador).
O IAHGP – com o apoio de seus associados e das instituições par-
ceiras – continuará atuante na luta pela valorização dos feitos histó-
ricos dos pernambucanos e empenhado no trabalho de divulgação
de nossa história.

Cidade do Recife, dezembro de 2018

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 209-273, 2018


GALERIA DE IMAGENS DAS COMEMORAÇÕES DO
BICENTENÁRIO DA REVOLUÇÃO DE 1817

01 – Comissão para as Comemorações do Bicentenário da Revolução Pernambucana


de 1817 toma posse no Palácio do Campo das Princesas (10/03/2015).

02 – Governador Paulo Câmara sanciona a lei 15.877 no Auditório do IAHGP


(12/07/2016). [A partir da esq.: Márcia Souto, Reinaldo Carneiro Leão, Marcelo
Canuto, Gov. Paulo Câmara, José Luiz Mota Menezes, Margarida Cantarelli e Dep.
Waldemar Borges].
244

03 – Visita do governador Paulo Câmara ao IAHGP (12/07/2016). [Acompanhado


por José Luiz Mota Menezes, Reinaldo Carneiro Leão, Silvio Tavares de Amorim,
Dep. Waldemar Borges].

04 – Visita do governador Paulo Câmara ao IAHGP (12/07/2016). [Acompanhado


por Margarida Cantarelli, José Luiz Mota Menezes e Marcelo Canuto].

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 209-273, 2018


O Bicentenário da Revolução de 1817: Breve relato das comemorações 245

05 – Solenidade de abertura do ano do bicentenário no Palácio do Campo das Prin-


cesas (06/03/2017). [A partir da esq.: José Luiz Mota Menezes, Deps. Aluísio Lessa,
Tony Gel e Ricardo Costa, Sec. Frederico Amancio, Pe. Pedro Rubens (reitor da Uni-
cap), Secs. Pedro Eurico e Antônio Figueira].

06 – Solenidade de abertura do ano do bicentenário no Palácio do Campo das Prin-


cesas (06/03/2017). [Gov. Paulo Câmara entrega medalha ao IAHGP representado
pelo presidente George Cabral].

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 209-273, 2018


246

07 – Apresentação da tropa na solenidade de abertura do ano do bicentenário no


Palácio do Campo das Princesas (06/03/2017).

08 – Sessão Solene Conjunta do IAHGP e APL (06/03/2017). [A partir da esq.:


Marcelo Casseb, Leda Alves, Marcelo Canuto, Margarida Cantarelli, George Cabral e
Márcia Souto].

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 209-273, 2018


O Bicentenário da Revolução de 1817: Breve relato das comemorações 247

09 – Associados do IAHGP presentes na Sessão Solene Conjunta do IAHGP e APL


(06/03/2017). [A partir da esq.: Maria de Betânia Corrêa de Araújo, Yony Sampaio,
Tácito Galvão, Robin de Rooy, Reinaldo Carneiro Leão, José Luiz Mota Menezes, Ja-
cques Ribemboim, Fernando Guerra, Margarida Cantarelli, Silvio Amorim, Francisco
Bonato Pereira da Silva, Marieta Borges, George Cabral, Mauricio Pedrosa Filho, Fer-
nanda Ivo Neves, Marcelo Casseb, Gilda Verri, Rafael Henriques Pimentel de Paula,
Roberto Motta, George Emílio Bastos Gonçalves, Dep. Tadeu Alencar].

10 – Sessão Especial na Câmara dos Deputados, Brasília (07/03/2017). [A partir


da esq.: Margarida Cantarelli, Gov. Paulo Câmara, Dep. Tadeu Alencar, Dep. Carlos
Siqueira e Vice-Gov. Raul Henry].

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 209-273, 2018


248

11 – Missa na intenção dos mártires da Revolução de 1817 na Igreja do Convento


Carmelita de Goiana, celebrada pelo Prior Frei Juracy Barbosa (11/03/2017).

12 – Lançamento de livros da Cepe na abertura da exposição “1817 – Revolução


republicana” no Museu da Cidade do Recife (12/03/2017). [A partir da esq.: George
Cabral, Marcelo Canuto, Maria de Betânia Corrêa de Araújo, Gov. Paulo Câmara e
Ricardo Leitão].

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O Bicentenário da Revolução de 1817: Breve relato das comemorações 249

13 – Capa da edição comemorativa da História da Revolução de Pernambuco em 1817,


de Francisco Muniz Tavares, lançada pela Cepe no Museu da Cidade do Recife
(12/03/2017).

14 – Abertura da exposição “1817 – Revolução republicana” no Museu da Cidade


do Recife (12/03/2017). [A partir da esq.: Maria de Betânia Corrêa de Araújo, Gov.
Paulo Câmara e George Cabral].

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 209-273, 2018


250

15 – Lançamento do livro Olhos negros (de Maria Cristina Cavalcanti de Albuquerque)


na abertura da exposição “1817 – Revolução republicana” no Museu da Cidade do
Recife (12/03/2017).

16 – Palestra de Marcelo Casseb com comentário de Maurício Pedrosa Filho na FOC-


CA, Olinda (22/03/2017).

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 209-273, 2018


O Bicentenário da Revolução de 1817: Breve relato das comemorações 251

17 – Antônio Carlos Magalhães Neto e Geraldo Júlio descerram painel de azulejos em


memória dos mártires fuzilados no Campo da Pólvora, em Salvador (29/03/2017).

18 – Seminário “Revolução Pernambucana de 1817” no IHGB (05 e 06/04/2017). [A


partir da esq.: José Luiz Mota Menezes, Cláudio Aguiar, Reinaldo Carneiro Leão, Ra-
fael Henriques Pimentel de Paula, Margarida Cantarelli, George Cabral, José Almino
Alencar, Arno Wehling (presidente do IHGB), Fernando Tasso Fragoso Pires (tesou-
reiro do IHGB), Marcelo Casseb, Maria de Lourdes Viana de Lyra (segunda-secretária
do IHGB), Fernando Guerra, Gonçalo Mourão e George Emílio Bastos Gonçalves].

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252

19 – Sessão Solene no Senado Federal, Brasília (08/05/2017). [A partir da esq.: Flá-


vio Cabral, Paulo Santos, José Luiz Mota Menezes, Sem. Humberto Costa, Vamireh
Chacon, Leonardo Dantas Silva, George Cabral, Luís Carlos Villalta].

20 – Vista do Hall Central da Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro durante exposi-


ção “Pernambuco 1817, a Revolução” (de 10/05 a 15/08/2017).

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O Bicentenário da Revolução de 1817: Breve relato das comemorações 253

21 – Palestra de José Luiz Mota Menezes no evento em homenagem ao Padre João


Ribeiro, com a presença do vice-prefeito da Cidade do Paulista Jorge Carreiro. Igreja
de Santa Elizabeth, Paulista (19/05/2017).

22 – Promulgação da lei 16.059 de 08/06/2017 que tornou o 6 de março feriado es-


tadual (14/06/2017). [A partir da esq.: Margarida Cantarelli, Dep. Terezinha Nunes,
George Cabral e Dep. Isaltino Nascimento].

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254

23 – Entrega da réplica da taça “Bicentenário da Revolução Pernambucana de 1817”


ao IAHGP pelo presidente da Federação Pernambucana de Futebol, Evandro Carva-
lho (07/07/2017). [A partir da esq.: João Mendonça Amorim Filho, Betânia Corrêa
de Araújo, Ramires Cotias Teixeira, Jacques Ribemboim, Evandro Carvalho, Silvio
Amorim, Margarida Cantarelli, George Cabral, José Luiz Mota Menezes, Tácito Gal-
vão, Rafael Henriques Pimentel de Paula, Yony Sampaio, George Emílio Bastos Gon-
çalves, Fernando Guerra, Alexandre Furtado e Fábio Arruda].

24 – Inauguração do roteiro de painéis memoriais dos lugares da Revolução de 1817


no Museu da Cidade do Recife/Forte das Cinco Pontas (03/07/2017). [A partir da
esq.: João Ângelo Muniz, Prefeito Geraldo Júlio, Ana Paula Vilaça, Silvio Amorim e
George Cabral].

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O Bicentenário da Revolução de 1817: Breve relato das comemorações 255

25 – Reprodução do painel memorial instalado nas proximidades do Seminário de


Olinda.

26 – Sessão Magna Cultural promovida pela GLMPE e IAHGP em Palmares, pela


Loja Fraternidade Palmarense (27/07/2017).

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27 – Gravação de cena do filme “1817 – a Revolução esquecida” nas dependências do


IAHGP, sob a direção de Tizuka Yamasaki (07/2017).

28 – Descerramento de painel memorial no Instituto Histórico, Geográfico e Cultural


de Garanhuns instalado pela GLMPE (19/08/2017). [A partir da esq.: Profa. Ivonete
Xavier, Sra. Leopoldina Diniz, Grão-Mestre Janduhy Cassiano Diniz, George Cabral
e Marcos Cabral].

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O Bicentenário da Revolução de 1817: Breve relato das comemorações 257

29 – George Cabral oblitera o selo postal oficial em home-


nagem ao bicentenário da Revolução de 1817 no Palácio
do Campo das Princesas (31/08/2017), observado pelo
coordenador da Superintendência Estadual dos Correios,
Sr. Orlando Duda. No detalhe, reprodução do selo.

30 – Entrega dos prêmios do “Concurso Cultural Revolução de 1817 – Pernambuco


na luta pelos ideais republicanos”, no Palácio do Campo das Princesas (31/08/2017).

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31 – Palestra de Carlos Bezerra Cavalcanti alusiva à Revolução de 1817 realizada no


Auditório do IAHGP (25/11/2017).

32 - Entrega da Medalha do Bicentenário da Revolução Pernambucana de 1817 da


Assembleia Legislativa de Pernambuco (11/12/2017).

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O Bicentenário da Revolução de 1817: Breve relato das comemorações 259

33 – Solenidade de homenagem a Frei Caneca realizada pela GLMPE no Largo das


Cinco Pontas e Auditório do Museu da Cidade do Recife (13/01/2018). [A partir da
esq.: Marcos Cabral, George Cabral, vice-prefeito do Recife Luciano Siqueira, Heloísa
de Morais, Francisco Bonato Pereira da Silva, Maria de Betânia Corrêa de Araújo,
Dimas José de Carvalho, Carlos Bezerra Cavalcanti e o Gal. Sérgio dos Santos Szel-
brackowski].

34 – Vista da exposição itinerante “Pernambuco – um estado de liberdade” promo-


vida pelo IAHGP com apoio do Governo do Estado, Museu da Cidade do Recife e
SESC-PE. Galeria Ana das Carrancas, SESC, Petrolina (19/01/2018).

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35 – Sessão Magna do IAHGP (29/01/2018). [A partir da esq.: Maria de Betânia Cor-


rêa de Araújo, Francisco Bonato Pereira da Silva, Félix Filho, Reinaldo Carneiro Leão,
George Cabral, Marcelo Canuto, Maj. Rafael Brito, Cel. André Monteiro].

36 – Marcelo Canuto recebe a Medalha Confederação do Equador entregue por Mar-


celo Casseb. Sessão Magna do IAHGP (29/01/2018).

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O Bicentenário da Revolução de 1817: Breve relato das comemorações 261

37 – Marcelo Casseb entrega da Medalha Confederação do Equador ao deputado


Waldemar Borges. Sessão Magna do IAHGP (29/01/2018).

38 – Deputada Terezinha Nunes recebe de Silvio Amorim a Medalha Confederação


do Equador. Sessão Magna do IAHGP (29/01/2018).

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262

39 – Silvio Amorim entrega ao deputado Isaltino Nascimento a Medalha Confedera-


ção do Equador. Sessão Magna do IAHGP (29/01/2018).

40 – Fernando Guerra (diretor de patrimônio do IAHGP) faz entrega da Medalha


Frei Caneca a Cepe, representada por seu presidente, Ricardo Leitão. Sessão Magna
do IAHGP (29/01/2018).

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O Bicentenário da Revolução de 1817: Breve relato das comemorações 263

41 – Marcos Cabral recebe de Francisco Bonato Pereira da Silva a Medalha Frei Ca-
neca. Sessão Magna do IAHGP (29/01/2018).

42 – Encerramento do “Ano Literário Bicentenário de 1817” na Academia Pernam-


bucana de Letras (26/02/2018). [A partir da esq.: George Cabral, Luzilá Ferreira,
Margarida Cantarelli, Lucilo Varejão Neto, Rostand Paraíso e Dirceu Rabelo].

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264

43 – Encerramento do “Ano Literário Bicentenário de 1817” na Academia Pernam-


bucana de Letras (26/02/2018). [A partir da esq.: George Cabral, Luzilá Ferreira,
Margarida Cantarelli, Lucilo Varejão Neto, Múcio Callou e Dirceu Rabelo].

44 – Sanção de lei que deu ao IAHGP o título de utilidade pública municipal,


(05/03/2018). [A partir da esq.: George Cabral, Pref. Geraldo Júlio, Ver. Jayme As-
fora e Félix Filho].

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 209-273, 2018


O Bicentenário da Revolução de 1817: Breve relato das comemorações 265

45 – Sessão de abertura do VI Congresso Nordestino de Institutos Históricos e do I


Congresso Pernambucano de Institutos Históricos Municipais (05/03/2018). [A partir
da esq.: Vamireh Chacon, Reinaldo Carneiro Leão, George Cabral e Arno Wehling].

46 – Cartaz do VI Congresso Nordestino de Institutos Históricos e do I Congresso


Pernambucano de Institutos Históricos Municipais (05-07/03/2018).

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 209-273, 2018


266

47 – Desfile cívico-militar na solenidade de 6 de março de 2018, no Palácio do Campo


das Princesas.

48 – Entrega da Medalha do Bicentenário na solenidade de 6 de março de 2018, no


Palácio do Campo das Princesas. [A partir da esq.: Dom Fernando Saburido, Pref.
Geraldo Júlio, Ricardo Leitão, Gov. Paulo Câmara e o Dep. Guilherme Uchôa].

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 209-273, 2018


O Bicentenário da Revolução de 1817: Breve relato das comemorações 267

49 – Representantes dos Instituto Históricos na solenidade de 6 de março de 2018,


no Palácio do Campo das Princesas.

50 – Atividades do VI Congresso Nordestino de Institutos Históricos e do I Con-


gresso Pernambucano de Institutos Históricos Municipais no Museu da Cidade do
Recife (06/03/2018). [A partir da esq.: Josué Euzébio, presidente do IH de Caruaru;
Harlan Gadelha, presidente do IH de Goiana; Maria de Betânia Corrêa de Araújo;
Miguel Meira de Vasconcelos, presidente do CEHM; Ivonete Xavier, presidente do
IH de Garanhuns e Eduardo de Menezes, presidente do IH de Catende].

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 209-273, 2018


268

51 – Atividades do VI Congresso Nordestino de Institutos Históricos e do I Con-


gresso Pernambucano de Institutos Históricos Municipais no Museu da Cidade do
Recife (07/03/2018). [A partir da esq.: Pedro Ferrer, presidente do IH de Vitória de
Santo Antão; Cosme Cavalcanti, presidente do IH de Petrolina; George Cabral e Luiz
Maranhão Filho, presidente do IH de Olinda].

52 – Margarida Cantarelli entrega Medalha do Sesquicentenário do IAHGP ao pre-


sidente do IHGES, Getúlio Neves no encerramento do VI Congresso Nordestino
de Institutos Históricos e do I Congresso Pernambucano de Institutos Históricos
Municipais no Museu da Cidade do Recife (07/03/2018).

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 209-273, 2018


O Bicentenário da Revolução de 1817: Breve relato das comemorações 269

53 – Vamireh Chacon recebe de Reinaldo Carneiro Leão a Medalha do Sesquicente-


nário do IAHGP no encerramento do VI Congresso Nordestino de Institutos Histó-
ricos e do I Congresso Pernambucano de Institutos Históricos Municipais no Museu
da Cidade do Recife (07/03/2018).

54 – Encerramento do VI Congresso Nordestino de Institutos Históricos e do I


Congresso Pernambucano de Institutos Históricos Municipais no Museu da Cidade
do Recife (07/03/2018).

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 209-273, 2018


270

55 – Abertura da exposição “1817 – Revolução republicana” na Galeria Zé Galdino,


SESC – Caruaru (26/04/2018).

56 – Dirceu Marroquim ministra palestra na abertura da exposição “Pernambuco –


um estado de liberdade” em Arcoverde (08/05/2018).

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 209-273, 2018


O Bicentenário da Revolução de 1817: Breve relato das comemorações 271

57 – João Mendonça Filho (à dir.), representando o IAHGP, recebe do presidente


do IHGES, Getúlio Neves (à esq.), a Medalha do Mérito Cultural Renato Pacheco.
Sessão Magna do IHGES (13/06/2018).

58 – Abertura da exposição “1817 – Revolução republicana” no Museu Engenho


Poço Comprido, Vicência (10/09/2018).

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 209-273, 2018


272

59 – Vista de uma das salas da exposição “1817 – Revolução republicana” no Museu


Engenho Poço Comprido, Vicência (10/09/2018).

Referências

CAVALCANTI, Amanda A. M. 2017. Cadê Mário Melo? Um historiador do


IAHGP pelas ruas do Recife. Dissertação de Mestrado. Rio de Janeiro: UNI-
RIO.
RODRIGUES, José Honório. 1959. A historiografia pernambucana na Revista
do Instituto Arqueológico. Revista do IAHGP. Vol. 49 (1954-1959), pp.
9-23.

Créditos das imagens

Academia Pernambucana de Letras – 42 e 43.


Assembleia Legislativa de Pernambuco – 22 e 32.
Câmara dos Deputados – 10.
Cerimonial do Governo do Estado – 01, 03, 04, 07, 29, 47 e 48.
Companhia Editora de Pernambuco (Cepe) – 13, 35, 36, 37, 38, 39, 40 e 41.

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 209-273, 2018


O Bicentenário da Revolução de 1817: Breve relato das comemorações 273

Faculdade de Olinda (FOCCA) – 16.


Grande Loja Maçônica de Pernambuco (GLMPE) – 26, 28 e 33.
IAHGP – 02, 05, 06, 08, 09, 11, 15, 20, 21, 23, 24, 27, 31, 34, 45, 46, 49, 50,
51, 52, 53, 54 e 56.
IHGB – 18.
IHGES – 57.
Museu da Cidade do Recife – 12, 14 e 55.
Museu Engenho Poço Comprido – 58 e 59.
Prefeitura do Recife – 44.
Prefeitura de Salvador – 17.
Secretaria de Educação de Pernambuco – 30.
Senado Federal – 19.

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 209-273, 2018


DOCUMENTOS PARA A
HISTÓRIA DO BRASIL
A MISSIVA DE JORIS ADRIAENSEN CALF
RELATANDO A CAMPANHA DO CERCO E
CONQUISTA DE PORTO CALVO EM 1637

Benjamin Nicolaas Teensma1

A documentação neerlandesa sobre o cerco e conquista de Porto


Calvo em 1637 contêm muitos detalhes pouco conhecidos dessa vitó-
ria do Conde João Maurício de Nassau sobre as forças ibero-brasilei-
ras, a qual garantiu a consolidação da conquista de todo o território
das Capitanias portuguesas no saliente nordestino e, em consequên-
cia, as posteriores anexações do Ceará, Maranhão e Sergipe, zênite
do Brasil Holandês.
Ultimamente venho traduzindo para o português documentos iné-
ditos, tais como cartas de Nassau e seus anexos, o relatório do Co-
ronel Cristóvão Artichevski,2 os panfletos que noticiaram esse feito
d’armas nos Países Baixos, e as legendas dos mapas dessa campanha,

1 Professor emérito da seção de Português do Departamento de Línguas e Culturas da


América Latina da Universidade de Leiden, Países Baixos. Doutor pela Universiteit van
Amsterdam, Países Baixos. Associado correspondente do Instituto Arqueológico, Histó-
rico e Geográfico Pernambucano. Tradutor de diversos textos referentes ao período neer-
landês no Brasil.
2 Nota de Levy Pereira, que colaborou com esse texto, e do autor: dispõe-se de três docu-
mentos com o relatório do coronel Cristóvão Artischevski, aliás Crestofle d’Artischau Arcis-
zewski, Christoff Artchoffisck, Krzysztof Arciszewski, etcétera, oficial militar muito capaz,
que serviu à República das Sete Províncias Unidas dos Países Baixos, nascido em Rogalin,
Polônia, em 1592: 1. [Manuscrito] NL-HaNA_SG 1.01.05, nº do inventário 9217: Rapport
van kolonel Christoffel Artischauw betreffende de verovering van Porto Corvo [Calvo] in Brazilië. Afschrift.
1637 januari 23 - 1637 maart 8 / Exh. St.-Gen. 8 juli 1637, redigido em neerlandês, com exceção
dos ARTICLES ACCORDÉS ENTRE LE SIEUR MIGUEL GILBERTON etc. ET SON
EXC. JEAN MAURICE CONTE DE NASSOU etc. que constam nesse relatório redigidos
em francês. NL-HaNA: Arquivo Nacional, Haia, Holanda; 2. [Panfleto impresso] [baseado
no Rapport] Auctentijck Verhael van de Belegheringhe ende veroveringhe van Porto Calvo ... [História
resumida e autêntica do cerco e captura de Porto Calvo ...], Ian van Hilten, [livreiro], Ams-
terdam, Holanda, 27/6/1637. Scheepvaartmuseum, Amsterdam, Holanda, inventarisnummer
A.0145(134); [Panfleto impresso] [baseado no Rapport] Kort em Auctentick Verhael van het beleg
en veroveren van Povaçon de Porto Calvo [Descrição resumida e autêntica do Cerco e Conquista de
Porto Calvo], Johan Blaeu, Amsterdam, 1637. Atlas van Stolk, n. ref. 1794; 4. O documento
com a carta de Nassau: NL-HaNA_1.05.01.01_52,_ nº do inventário 15: Brief (kopie) van
gouverneur-generaal Johan Maurits van Nassau, te Povoson (in Porto Calvo), aan de vergadering van de
Heren XIX. 1637 maart 8.
278 Benjamin Nicolaas Teensma

num esforço para esclarecer as incongruências neles constatadas, as-


sim como na bibliografia atualmente disponível, e trazer novas infor-
mações para embasar os trabalhos de prospecção arqueológica em
implementação na região de Porto Calvo, sob a égide do IPHAN/AL.
Destaca-se entre esses documentos a carta3 do sr. Joris Adriaensen
Calf aos Diretores da Câmara Zelandesa da WIC4, em Midelburgo,
datada de 17 de março de 1637, manuscrito do acervo do Arquivo
Nacional de Haia, cota NL-HaNa_OWIC 1.05.01.01, número do in-
ventário 52, número consecutivo 18, descrevendo os acontecimentos
como ele os viu e vivenciou, e cuja tradução é o tema deste artigo.
Não sei que função teve o autor. Pertencia a marinha e foi oficial.
Ocuparam-no em diversas tarefas de responsabilidade. Teria o posto
de capitão? Seguramente superior ao de tenente.
O texto dá material para hipóteses. Ele, pelo lado neerlandês,
acrescenta detalhes interessantes aos relatórios oficiais do Conde
João Maurício de Nassau e do Coronel Artichevski, e ao testemunho
de Cuthbert Pudsey. Sua descrição da Batalha de Comandatuba ofe-
rece passagens literárias e emocionantes.
E, para melhor entendimento dos eventos e esclarecimento de ter-
mos militares relativos à artilharia, acrescentei notas de minha autoria
e dos senhores Adler Homero Fonseca de Castro e Levy Pereira, aos
quais agradeço a colaboração.

3 NL-HaNA_1.05.01.01_52_18: Brief van Joris Adriaensen Calf, op het schip Amersvoort te Punto
Jeregua, aan de bewindhebbers van de kamer Zeeland. 1637 maart 17.
4 GWC - Geoctroyeerde Westindische Compagnie, Companhia [holandesa] das Índias Ocidentais,
fundada em 3/6/1621 e extinta em 1674, também conhecida pela sigla WIC.

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 277-286, 2018


A Missiva de Joris Adriaensen Calf relatando a campanha do cerco e conquista de Porto Calvo em 1637 279

Carta, Ponta Jaraguá, 17 de março de 1637, de Joris


Adriaensen Calf, no navio Amersvoort, aos Diretores da
Câmara Zelandesa da WIC em Midelburgo.5

[Omitidas as frases iniciais e o primeiro parágrafo por excessos de cortesias.]

Por obrigação contratual não devo deixar passar a monção da


saída dos navios para comunicar a Vossas Senhorias [V.S.] todos os
acontecimentos aqui ocorridos depois da almejada chegada do Sr.
Conde João Maurício, onde tudo corria caoticamente por manifes-
ta culpa de algumas Câmaras da Companhia. A negligência delas
em mandar-nos os materiais de que precisávamos foi razão de que
muitos projetos proveitosos para a Companhia deixaram de ser rea-
lizados. Agora, se os moradores não nos ajudam diligentemente, só
temos víveres para catorze dias, tanto para a tropa terrestre como
para a gente da marinha. Há pouquíssima coisa, e já quase totalmente
consumida, e no país já quase não havendo mais gado, de modo que
não sei como se remediará tudo isso. Que Deus nos conceda mais
êxitos como até agora nos tem concedido, porque já deslocamos
nosso inimigo dos principais lugares e fortalezas dele nesta Capitania!
Para realizá-lo, saíram por terra do Recife, no dia 5 de fevereiro,
o Conde6 e o Coronel Artichevski com a tropa a Sirinhaém, onde o
Sr. Von Schkoppe7 o estava aguardando com o resto dos militares.
Em seguida, saímos nós com trinta velas por mar à ilhota de Santo
Aleixo,8 onde ficamos sem os grandes navios — que se tinham ido
à Barra Grande — e com pouca gente,9 porque 280 homens foram
desembarcados para se juntarem ao corpo do exército.10 Mandamos

5 NL-HaNa_OWIC 1.05.01.01, número do inventário 52, número consecutivo 18.


6 João Maurício de Nassau.
7 Nota de Levy Pereira: O coronel polonês da Silésia, nascido na cidade de Lublin, Sigemun-
dt van der Schkoppe, também conhecido como Sigismund Van Schkoppe, Sigismund van
Schoppen, Sigmund Von Schkoppe, Sigismundo Von Schkoppe, Segismundo Escup, etc..
8 Nota de Levy Pereira: Ilha próxima à barra do Rio Sirinhaém.
9 Nota de Levy Pereira: [pouca gente] da marinha, marinheiros.
10 Nota de Levy Pereira: O corpo principal do exército de Nassau deslocava-se do Recife
marchando por terra. O rendez-vous das tropas marchando por terra com as vindas por mar
(infantes, artilheiros e marinheiros em armas) ocorreu no trecho da barra do rio Sirinhaém

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 277-286, 2018


280 Benjamin Nicolaas Teensma

o resto com suas armas em chalupas para navegar duma parte à ou-
tra como se tivessem intenção de tomar terra, para atrair o inimigo
eventualmente presente no Rio Una.11
No dia depois, sendo o 11 de fevereiro, seguimos com onze velas
e alguns barcos com 325 soldados e 160 Brasilianos até diante das
Ilhetas,12 onde um passo termina na costa entre Barra Grande e a
Ilha de Santo Aleixo. Aqui ficamos aguardando por ordem de Sua
Excelência13 se devíamos tomar terra com nossa gente ao sul do rio
ou não, para atacar e caçar dos seus fortes os inimigos eventualmente
presentes para impedir nosso desembarque.
No dia 13 os nossos lá chegaram à beira norte do rio, onde desem-
barcaram sua gente e acharam bom recontro com o inimigo; depois
seguiram marchando para chegar esta noite a Barra Grande. Tanto
nossas forças terrestres como marítimas realizaram pesado trabalho
de tanto marchar, e assim ficaram lá até entre os dias 16 e I7. Na-
quela noite, a uma hora, houve feroz violência dos soldados. Depois
de desembarcar mais 800 marinheiros armados — de modo que a
nossa força totalizou o número de 5.000 homens — marchamos pela
praia até além da capelinha de São Bento14 e por piores montes que
Scípio e Aníbal tinham passado, porque nesse dia andamos cinco

à Barra Grande, o que eventualmente possibilitaria o envolvimento das tropas ibero-brasi-


leiras postadas na defesa do rio Una. Essa estratégia baseava-se na comprovada experiência
com a projeção do poder marítimo em terra por parte dos neerlandeses.
11 Nota de Levy Pereira: Tropas neerlandesas haviam sido rechaçadas no Rio Una por Ma-
noel Dias de Andrada em abril de 1636, na área junto ao Engenho de Diogo Paes e à igreja
de São Gonçalo, e, por isso, a passagem por esse rio mereceu cuidadosa atenção pelos neer-
landeses no planejamento da campanha contra as tropas ibero-brasileiras (ALBUQUER-
QUE, D. C. 1654. Memórias Diárias. Madrid: por Diego Diaz de la Carrera, Impressor del
Reyno, año; fol. 220b-221a, 222b; CALADO, M. O Valeroso Lucideno, Livro Primeiro,
Capítulo III, pp. 78-79).
12 Nota de Levy Pereira: Barra do rio Ilhetas.
13 Nota de Levy Pereira: Sua Excelência, tratamento formal referindo-se ao Conde João Mau-
ricio de Nassau.
14 Nota de Levy Pereira: Essa informação de Calf demonstra que o caminho percorrido
pelas tropas neerlandesas partia do litoral junto à capelinha de São Bento, ou Mosteiro de
São Bento, hoje em ruínas, no povoado litorâneo de São Bento, Maragogi (AL). O trecho
inicial do caminho para o interior está plotado no mapa PE-C (IAHGP-Vingboons, 1640)
#40 CAPITANIA DE PHARNAMBOCQVE, iniciando-se próximo à igreja ‘St. ßԐnto’,
no litoral da ‘ߪ. St. ßԐnto’ (baía da praia de São Bento). E esse trecho não está plotado no
mapa de Marcgrave (Brasilia qua parte paret Belgis, 1647).

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 277-286, 2018


A Missiva de Joris Adriaensen Calf relatando a campanha do cerco e conquista de Porto Calvo em 1637 281

milhas num tórrido sol, até que finalmente chegamos à vista e ao


alcance dos mosquetes inimigos, que se achavam num monte muito
alto e escarpado, e com um vale profundo entre os dois; porque nós
nos achamos noutro monte. Eles nos estavam aguardando com 1.800
homens armados. As fortalezas do inimigo se achavam a uma milha
detrás desse monte.
Depois de uma noite sob chuva forte, e ditas as orações, descende-
mos o monte — tendo a vanguarda o Coronel Artichevski — para o
vale profundo, que estava inundado, pantanoso e cheio de mataria, e
com um caminho muito estreito no fundo. Eles tinham lá duas trinchei-
ras, uma atrás da outra, ocupadas por muitíssima gente; as quais foram
atacadas tão enérgica e furiosamente pelos nossos que para muitos
teria sido preferível retirarem-se. Depois de demoradas e impetuosas
escaramuças, em que parecia que a mata estava cheia de trovões e
fumaças infernais, foi Deus servido de conceder-nos a vitória.
Enquanto a batalha se desenvolvia tão furiosamente, um partido
de atiradores e Brasilianos também desceu do monte, mas, não pelo
caminho, senão rompendo pela mata. Eles atacaram o inimigo com
tanta energia, que cada um deles precisava de toda sua força para sal-
var o corpo vil na fuga, porque todos os capacitados correram para
baixo, com exceção dum major e dum capitão, que ficaram presos.
Era engraçado de observar como nessa correria se incomodaram, de
modo que não sabemos quantos deles morreram; mas os caminhos
estavam cheios de cadáveres. Achamos que devia ter havido mais de
cem vítimas entre eles. Entre os nossos, só seis ou sete, além duns
quarenta feridos, entre eles alguns severamente.
Sua Excelência, com seus coronéis, tendo passado a salvo esse
monte, dirigiu-se a oeste do forte grande15 à casa de Amador Alvares,16
de modo que o inimigo podia atirar com seus canhões muitas gra-
nadas diante e por cima dos nossos. Nós, com o Governador,17 nos

15 Forte da Povoação, erigido sobre a igreja velha.


16 Nota de Levy Pereira: A casa de Amador Alvarez situava-se nas faldas do morro em que
o Conde de Bagnuoli erigiu um reduto artilhado em seu cimo. O morro é frequentemente
citado como o morro de Amador Alvarez.
17 Nota de Levy Pereira: Embora o Conde Maurício de Nassau já ocupasse o governo dos
domínios holandeses do Brasil desde o momento de sua chegada, os soldados neerlandeses
costumavam se referir respeitosamente ao coronel Sigemundt van der Schkoppe como o

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 277-286, 2018


282 Benjamin Nicolaas Teensma

dirigimos a leste. Eu, com uma aguerrida companhia de cem ma-


rinheiros, dirigi-me com mais algumas pessoas à ilha para ocupá-
-la. Como não podíamos atravessar o rio, três ou quatro marinheiros
munidos de facões nadaram para lá, porque diante do abandonado
redutinho18 se encontrava um barco com um bote. Eles cortaram as
amarras e trouxeram essas embarcações aos nossos, que nos foram
muito benvindas para transportar nossa gente à outra banda do rio.
E assim ganhamos a ilha.
Os nossos comandantes resolveram mandar 300 homens para bai-
xo do rio; concretamente 150 soldados conduzidos pelo Capitão Day,
e 150 marinheiros pelo Capitão Jacobsens, com um outro. Enquanto
eles estavam marchando para baixo, ouvimos durante muito tem-
po um forte tiroteio, porque o inimigo tinha uma caravela com três
canhões na outra banda do rio, provida de muita gente, e com um
parapeito na margem. E porque o Conde de Bagnuoli19 e o Sr. Albu-
querque20 tinham muitos bens nela, os tripulantes enterraram-nos no
chão e abandonaram a caravela, retirando-se num barco.
Na madrugada do outro dia metemos uma ponte sobre o rio,
composta dos materiais dum barco sob construção. Ela feita, a nossa
gente saiu da ilha, com exceção do Comandante Willem, que recebeu
a ordem de ficar nela com 200 homens. O Governador aquartelou-se
ao Sul; e nós no Sudeste, na distância de 300 passos abaixo do forte
grande, tendo a vantagem de alojarmos nos declives do monte. Aqui
ocupamos também a Igreja Grande,21 que estava fortificada por uma
trincheira.

Governador, ou o velho Governador.


18 Nota de Levy Pereira e do autor: O redutinho situava-se na margem esquerda do rio
Manguaba, junto ao Varadouro (porto em terra firme) da Povoação. Ele está plotado nas
plantas e vistas do cerco e conquista de Porto Calvo – vide, por exemplo, BARLÉU, Op.
Cit., incluindo-se a planta do Cerco de Porto Calvo ― PORTUS CALVUS ― Prancha 7, fol.
ante p. 37 e a vista O cerco de Porto Calvo ― OBSIDIO ET EXPUGNATIO PORTUS CALVI
― Prancha 8, fol. ante pag. 39. Pela narrativa de Calf, os barcos poderiam estar ancorados
no varadouro, ou na margem oposta, na ilha, e, em ambas as situações, os soldados, para se
apossarem deles, teriam que nadar atravessando o rio Comandatuba e/ou o rio Manguaba.
19 Nota de Levy Pereira: O General napolitano Giovanni Vincenzo di San Felice, Conde de
Bagnuoli (Banholo, Bagnuolo, Bagnolo, Banjola, etc.).
20 Duarte de Albuquerque Coelho, Donatário da Capitania de Pernambuco.
21 Nota de Levy Pereira: Igreja nova, a atual igreja matriz da cidade de Porto Calvo (AL).

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 277-286, 2018


A Missiva de Joris Adriaensen Calf relatando a campanha do cerco e conquista de Porto Calvo em 1637 283

Na madrugada, descobrimos que o Conde de Bagnuo-


li e Duarte de Albuquerque — que se encontravam na casa
fortificada de Amador Alvares22 — tinham-se escapado du-
rante a noite. Nela tinham metido muitos explosivos, porque es-
tava cheia de pólvora; mas, graças a Deus, eles explodiram an-
tes da entrada da nossa gente. Nela encontramos quatro belas
peças de bronze,23 muito pescado e muitas pilhagens dos soldados.
Essa noite começamos a fazer aproches ao forte grande. No dia 21,
começamos a preparar nossas baterias contra eles. Duma chalupa
vinda de Camaragibe, recebemos a nova de que, entre esse rio e San-
to Antônio,24 viram marchando na praia mais de mil pessoas, muitos
carros, bois e bagagens.
No dia 27, acabada a construção da nossa [primeira] bateria, me-
temos nela três peças: duas de 16 e uma de 24 libras; e com essas
peças começamos a atirar contra eles na madrugada. Eles nos res-
ponderam com brio, e assim nos mataram com uma bala, entrada
por uma canhoneira, dois homens oriundos de Midelburgo e ferindo
gravemente outros três. Também avariaram totalmente uma peça, ao
passo que, de outra quitaram um pedaço do cano. Também morreu
nessa ocasião o Capitão Duijnkerker,25 tendo sido um valente militar.

22 Nota de Levy Pereira: Reduto no morro de Amador Alvarez. A sua situação no cimo de
um morro elevado indica ser pouco provável que tenha sido edificado sobre a casa de
Amador Alvarez.
23 Nota de Levy Pereira e do autor: 3 canhões de bronze, segundo as listas do material
bélico capturado (Ms. HaNA_OWIC 1.05.01.01, nº do inventário 52, nº consecutivo 41;
Ms. HaNA_OWIC 1.05.01.01, nº do inventário 52, nº consecutivo 72; Ms. HaNA_OWIC
1.05.01.01, nº do inventário 53, nº consecutivo 06).
24 Nota de Levy Pereira: Entre as Barras dos rios Camaragibe e Santo Antonio Grande.
25 Nota de Levy Pereira e do autor: Capitão Duijnkerker: mencionado como o capitão
João Tallebon [Ioannes Tallebomius] por G. Barleus (Op. cit., pg. 39). A Dagelijkse Notule de
28/1/1637 (Monnumenta Hyginia, UFPE) refere-se a Jan Taelboom, comandante de 64
soldados. D. A. Coelho (Op. cit., fol. 244a) o cita como Deunque Carlo, ‘capitão de grande
opinião’. As referências a João Tallebon por Barléus e na dag. not. sugerem a possibilidade
de que Dunquerque seja um apelido desse capitão. O relatório do coronel Cristóvão Artis-
chevski (op. cit.), e os panfletos amsterdameses (Op. cit.), trazem a notícia de que o Capitão
Duijnkerker foi atingido, no dia 23 de março, no início dos trabalhos de construção da
bateria Lichthart (bateria do Almirante), e não no dia 27, na bateria do Conde (bateria do
coronel Artischevski), portanto, trazendo data e local diferentes dos citados nesta missiva.
Não há divergência nesses documentos quanto à data de 27 de março, quando um canhão
dessa bateria foi atingido. No entanto, há divergência quanto aos números das baixas entre

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 277-286, 2018


284 Benjamin Nicolaas Teensma

Durante a noite, a nossa peça inativada foi substituída por um


meio cortau.26 Durante toda essa noite, estivemos ocupados com o
nosso sistema de tiro; para reforçá-lo, ordenaram [a construção de]
mais duas baterias, e nós assim ganhamos mais proteção.
No primeiro de março, já ativa a bateria do Governador, que dis-
punha de duas peças, esta acompanhou-nos no canhoneio do forte,
que já estava quase por terra. Nós continuamos, como também a
bateria do Conde, com suas três peças; na qual, através duma ca-
nhoneira, foi morto o fidalgo Karel Van Nassau27 [atingido] por um
pesado projétil de ferro. De noite, ele foi enterrado na Igreja Nova.28

os marinheiros nesse incidente: 2 mortos e 3 feridos, nesta missiva, 4 mortos no relatório


Artischevski e nos panfletos amsterdameses.
26 Na redação de Calf, een halve cartouwe. Os holandeses adotaram a palavra cartouwe / kartouw
do francês antigo courtault = canhão curto. Em espanhol e português, CORTAU. J. 1954.
Corominas: Diccionario crítico etimológico de la lengua española, vol. 1, Berna: 915; COR-
TAO: ‘máquina de guerra para batir murallas’, del fr. anticuado courtaud ‘canón de gruesso calibre y de poco
alcance’, derivado de court ‘corto’. Nota de Levy Pereira: Maurício de Nassau, na sua carta datada
de 3 de fevereiro de 1637 aos Estados Gerais, refere-se a esse tipo de canhões como demi
canons. In: NETSCHER, Pieter Marinus. 1942. Os holandeses no Brasil: notícia histórica dos
Países-Baixos e do Brasil no século XVII. [Tradução de Mário Sette]. Companhia Editora
Nacional, São Paulo, Brasil, 1942, pp. 153. Nota de Adler Homero Fonseca de Castro: Note-
se que “canhão curto” se refere à uma comparação com as colubrinas. Os canos das colubri-
nas legítimas têm 30 calibres ou mais de comprimento. E o termo demi (meio) designa isso
mesmo: metade de um canhão, e refere-se ao seu poder de fogo e calibre. Vem do costume
de se classificar os canhões como: canhão duplo, canhão [de calibre padrão], meio canhão,
quarto de canhão e oitavo de canhão (usualmente, 96, 48, 24, 12 e 6 libras). Veja UFANO,
Diego. 1613. Tratado de la Artilleria. Bruxelas, pp. 35, 36.
27 Nota de Levy Pereira e do autor: Carel [Karel] de Nassau: Carlos de Nassau [Carolus
Nassovius], sobrinho do Conde de Nassau. D. A. Coelho (Op. cit., fol. 244a) o denomina
Henrique de Nassau. P. M. Netscher (Op. cit., p. 155) o cita como Conde Carlos de Nassau,
primo do governador (referindo-se a João Maurício). A Dagelijkse Notule de 28/1/1637
(Op. cit.) relaciona o capitão Carlos de Nassau [Don cabo de Nassau, sic] como coman-
dante de uma companhia com 140 homens. G. Barleus (Op. cit., p. 39) cita que Karel, e o
Capitão Duijnkerker, ao qual ele se refere como capitão João Tallebon [Ioannes Tallebomius],
morreram na explosão de uma bombarda. Como não há notícia de que os neerlandeses
estivessem usando bombardas (morteiros) nesse cerco, supõe-se que isso signifique a ex-
plosão de uma granada de morteiro lançada do Forte da Povoação, informação que conflita
com os relatos de D. A. Coelho (Op. cit.), o da carta de Nassau (Op. cit.), o do relatório
do coronel Cristóvão Artischevski (op. cit.), e os dos panfletos amsterdameses (Op. cit.),
mortes causadas por tiro de canhão.
28 Nota de Levy Pereira: Referida anteriormente como a Igreja Grande. É conhecida como
Igreja Nova por ter sido construída depois que erigiram o Forte da Povoação no local da
igreja velha.

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 277-286, 2018


A Missiva de Joris Adriaensen Calf relatando a campanha do cerco e conquista de Porto Calvo em 1637 285

No dia 2, depois de atirar neles durante toda a manhã com ca-


nhões e mosquetes, na tarde foi mandado o corneteiro de Sua Exce-
lência a eles, oferecendo-lhes bom quartel; cuja documentação estou
mandando na totalidade a V.S.as. Depois da rendição, os inimigos
saíram do forte, e nós o ocupamos. Dentro, encontramos /// [19]29
belos e pesados canhões de bronze, quatro morteiros grandes, quatro
peças de ferro, pólvora, estanho, balas, granadas e outros materiais
em abundância, porque todo o material bélico destas capitanias es-
tava lá armazenado; e, segundo disseram, ainda teriam encontrado
seis ou sete peças enterradas.30 A guarnição se compunha de 40031
valentes e saudáveis homens, e todos foram mandados em chalupas
aos navios em Barra Grande, e em seguida, para fora do país. Depois
de deixar uma boa guarnição no forte, tratamos de consolidar a nos-
sa, por Deus concedida, vitória.
Do dia 12, depois das embarcações de Sua Excelência [levantarem
ferro], com 2.000 homens, a maioria dos nossos navios se fez à vela
com o vento soprando da terra; mas, permanecendo ao largo, porque
tivemos um vento contrário vindo do mar, com o que o navio Per-
nambuco naufragou no recife, e cujo destroço ainda lá se encontra.
Prosseguindo, entramos no dia 13 na Ponta Jaraguá, um bom an-
coradouro onde 15 meses antes também as armadas espanholas de-
sembarcaram Dom Luiz32 com suas tropas, as quais logo em seguida
foram derrotadas por Artichevski, na Mata Redonda, e cujos ossos
agora levaram consigo.

29 Nota de Levy Pereira e do autor: 19 canhões de bronze, conforme citado nas listas do
material bélico capturado (Op. cit.).
30 Nota de Levy Pereira e do autor: No Forte da Povoação foram capturados 19 canhões
de bronze, 5 canhões de ferro e 5 morteiros de bronze. No reduto do morro de Amador
Alvarez, 3 canhões de bronze encravados, e rapidamente reparados, conforme as cartas de
Nassau (Op. cit.) e as listas do material capturado (Op. cit.). E, segundo esta missiva de
Calf, havia mais 3 peças na caravela capturada no rio Manguaba. Os números apresentados
por Calf, compreensivelmente pelas circunstâncias, diferem dos apresentados nas listas.
31 Entregaram-se na rendição do Forte da Povoação 410 militares: 300 espanhóis e 110 na-
politanos.
32 Nota de Levy Pereira e do autor: O General espanhol D. Luiz de Roxas e Borja, Duque
de Granja, nobre espanhol que substituiu Matias de Albuquerque no comando das forças
ibero-brasileiras, morto, em 18 de janeiro de 1636, na Batalha da Mata Redonda, pelejando
com tropas neerlandesas comandadas pelo Coronel Cristóvão Artischevski.

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 277-286, 2018


286 Benjamin Nicolaas Teensma

Do dia 14, o Governador, com o resto da tropa tendo marchado


por terra, e nós metidos em coluna de marcha, nos dirigimos no dia
16, em dois grupos, passando pelas Lagoas33 e, por terra adentro, ao
Rio São Francisco. O Conde de Bagnuoli, depois de saber a sorte da
sua potente Fortaleza do Bom Sucesso, se retirara de lá quatro dias
antes da nossa chegada.34

33 Nota de Levy Pereira: Alagoas, referência às grandes lagoas Mundaú e Manguaba. Nesta,
na margem sul, situava-se a Povoação de Nossa Senhora da Conceição, elevada a Vila da
Lagoa do Sul, em 12 de abril de 1636, por Duarte de Albuquerque Coelho, e atual cidade
de Marechal Deodoro (AL).
34 O Sr. Joris Adriaensen Calf não marchou pessoalmente com a tropa até a Vila do Rio São
Francisco (O Penedo). O resto da carta já não trata da conquista de Porto Calvo, senão de
algumas conjecturas políticas do autor, e sobre a péssima condição dos navios holandeses.
Não achei necessário traduzir essa parte do documento. Depois da patética e tradicional
frase de despedida, o Sr. Calf termina sua missiva com as palavras: Neste dia 17 de março
de 1637, no navio Amersvoort, na Ponta Jaraguá, na minha saída para Santo Aleixo. Observa-
ção do autor e de Levy Pereira: Esse navio é bastante mencionado na documentação desse
período, ora dessa forma, ora como Amersfoort, Amers-foort, e variantes, nome da segunda
maior cidade da província de Utrecht, na Holanda. Esse navio fazia parte da frota sob
o comando do almirante Hendrik Corneliszoon Lonck* para a invasão de Pernambuco,
partindo em maio ou julho de 1629 dos Países Baixos, e singrava os mares do Brasil desde
1630. Assim, as reclamações de Calf sobre o mau estado dos navios da frota neerlandesa
em 1637 tornam-se compreensíveis. P. M. Netscher tabula alguns dados do Amersfoort na
condição em que se encontrava quando navegou na frota de Lonck: contratado pela Câ-
mara de Amsterdam, deslocava 200 lasts, sua artilharia dispunha de 8 canhões de bronze
e 18 de ferro, e sua equipagem era de 87 marinheiros (Op. cit., p. 94). Netscher, em nota
explicativa (Op. cit., nota 33, p. 264), fornece uma boa descrição de um navio do porte do
Amersfoort: (33) O “Last” para aferir a tonelagem dos navios é uma medida ainda em uso
na Holanda [em 1875] e equivale a duas toneladas. Para se ter uma ideia perfeita do aspecto
externo de um navio daquele tempo, basta dizer-se que as dimensões de um barco de 200
“lasts” eram de 125 pés renanos [= 39,23 m]** de comprimento, 29 [= 9,10 m] de largura
e 11 ½ [= 3,61 m] de profundidade até a quilha. (DE JONGE — I, p. 392, extraído de
um documento oficial de 1930). O tombadilho desses navios era muito mais alto do que
o resto do convés. * P. M. Netscher, nas EXPLICAÇÕES DOS FAC-SIMILES (Op. cit.,
antepenúltima página) informa que há a necessidade de se retificar no texto do seu livro
a grafia do sobrenome do almirante Hendrik Corneliszoon, de Loncq, para Lonck. ** 1
pé renano = 1/12 da vara renana = 1/12 roede = 0,31383 m = 31,383 cm. (PEREIRA, L.;
CINTRA. J. P. 2014. Eratosthenes Pernambucensis: A estimativa geodésica de Marcgrave
para a extensão do Brasil. In: Trabalhos apresentados - II Simpósio Brasileiro de Cartogra-
fia Histórica [Tiradentes-MG, 28-30 maio 2], Tabela 1, p. 10).

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 277-286, 2018


AS CARTAS DO CONDE MAURÍCIO DE NASSAU
COMUNICANDO A VITÓRIA NO CERCO E
CONQUISTA DE PORTO CALVO EM 1637

Benjamin Nicolaas Teensma1

Introdução

O Conde João Maurício de Nassau enviou alguns documentos


oficiais e correspondências particulares comunicando suas auspicio-
sas vitórias na marcha, cerco e conquista das Vilas do Bom Sucesso
de Porto Calvo, da Madalena e do Rio São Francisco, feitos de ar-
mas fundamentais para o sucesso de sua campanha de expulsão dos
ibero-brasileiros do solo de Pernambuco, nas palavras de Barleus,
“fundamento e caminho de um poderio mais amplo”,2 e marco do
início do período áureo do Brasil Holandês.
A historiografia sobre esse evento, e especificamente sobre essa
correspondência, dispunha, até agora, apenas da transcrição de uma
dessas cartas, redigida em francês, publicada por Netscher,3 e do que,
baseados nele, Varnhagen,4 Barleus e outros estudiosos escreveram.
Ainda, constava-se alguma incongruência entre algumas das informa-

1 Professor emérito da seção de Português do Departamento de Línguas e Culturas da


América Latina da Universidade de Leiden, Países Baixos. Doutor pela Universiteit van
Amsterdam, Países Baixos. Associado correspondente do Instituto Arqueológico, Histó-
rico e Geográfico Pernambucano. Tradutor de diversos textos referentes ao período neer-
landês no Brasil.
2 ‘Amplioris potentiæ gradus & fundamentum’; BARLEUS, Casparis. 1647. Rervm per octennivm
in Brasilia. Ex Typographeio Ioannis Blaev, Amstelodami, [Exemplar com pranchas aqua-
reladas: Biblioteca Nacional Digital – Brasil] p. 38. Na edição brasileira: HISTÓRIA DOS
FEITOS RECENTEMENTE PRATICADOS DURANTE OITO ANOS NO BRASIL
... [1647], tradução e anotações de Cláudio Brandão, Ministério da Educação, Rio de Janei-
ro, Brasil, 1940 [MCMXL], p. 39.
3 NETSCHER, Pieter Marinus. 1853. Les Hollandais au Bresil. La Haye: Belinfante Fréres,
p. 86-88. NETSCHER, Pieter Marinus. 1942. Os holandeses no Brasil: notícia histórica dos
Países-Baixos e do Brasil no século XVII. [Tradução de Mário Sette]. São Paulo: Compa-
nhia Editora Nacional, p. 154-155.
4 VARNHAGEN, Francisco Adolfo [Barão de Porto Seguro]. 1872. Historia das lutas com
os hollandezes no Brazil desde 1624 a 1654. Typographia de Castro Irmão, Lisboa, Portu-
gal, Livro Quinto, pp. 163-170.
288 Benjamin Nicolaas Teensma

ções dessas correspondências e as publicadas por Gaspar Barleus,


Duarte de Albuquerque Coelho e o Frei Manoel Calado.5
Pesquisas recentes levaram à revisita da documentação primária
sobre esse episódio, basicamente manuscritos, impressos e mapas
existentes nos arquivos neerlandeses, austríacos e brasileiros, resul-
tando na sua tradução do neerlandês e francês para o português,
levantando informações inéditas e propondo alguns ajustes, frutos da
análise da sua inter-relação.
Neste texto, abordar-se-á a tradução das missivas de João Maurí-
cio, Conde de Nassau-Siegen:
• Ao Conselho dos XIX da Companhia das Índias Ocidentais
(WIC),6 em 8 de março de 1637, redigida em neerlandês em
Porto Calvo, logo após a rendição do Tenente-General de Arti-
lharia Miguel Gilberton, comandante das tropas ibero-brasilei-
ras7 que defendiam o Forte da Povoação;
• Ao seu primo Henrique Casimiro, Conde de Nassau-Dietz,
Governador das Províncias Frísia, Groninga e Drente, nas Pro-
víncias Unidas dos Países Baixos, em 28 de abril de 1637, redi-
gida em francês em Antônio Vaz de Pernambuco, em seguida
ao seu retorno da Vila do São Francisco (O Penedo).8
Deu-se especial atenção à tradução do anexo da missiva de 8 de
março, que traz os artigos da rendição da tropa do Tenente-General
da artilharia Miguel Gilberton, comandante da guarnição do Forte
da Povoação, os quais, pela sua relevância, constam em cinco docu-
mentos: em dois manuscritos, anexos dessa carta, um redigido em
neerlandês e o outro em francês; no relatório escrito pelo Coronel
Cristóvão Artischevski, entre 27 de janeiro e 8 de março de 1637, em

5 COELHO, Duarte de Alburquerque. 1654. Memorias diarias de la gverra del Brasil. Ma-
drid: por Diego Diaz de la Carrera, Impressor del Reyno, año, pp. 240e-249e. CALADO,
Frei Manoel. 1987. O Valeroso Lucideno, [editio princeps 1648], Volume 1. Belo Horizonte:
Editora Itatiaia Ltda., Editora da Universidade de São Paulo, Brasil, pp. 80-85.
6 NL-HaNA_1.05.01.01_52,_nº do inventário 15: Brief (kopie) van gouverneur-generaal Johan Mau-
rits van Nassau, te Povoson (in Porto Calvo), aan de vergadering van de Heren XIX. 1637 maart 8.
7 Nota de Levy Pereira, que colaborou com essa tradução: Essas tropas compunham-se dos
terços espanhóis, portugueses e brasileiros (homens da terra, moradores, índios e negros),
e do napolitano.
8 Atual cidade de Penedo (AL).

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 287-301, 2018


As cartas do Conde Maurício de Nassau comunicando a vitória no cerco e conquista de
Porto Calvo em 1637 289

francês;9 e nos panfletos em língua neerlandesa, impressos publica-


dos em Amsterdam em 1637, um pelo editor Ian van Hilten, e o outro
por Johan Blaeu,10 baseados no rapport de Artischevsky e em croquis
do campo de batalha por ele desenhado.
Comentários, alguns decorrentes da comparação interdocumental,
estão inseridos no final desse artigo, em notas redigidas pelo autor,
por Levy Pereira e Onésimo Santos.

***

9 Os três manuscritos do Arquivo Nacional de Haia que relacionam os artigos das condições
da capitulação da tropa comandada por Miguel Gilberton são: 1. NL-HaNA_1.05.01.01_52,
nº do inventário _12: Akte van capitulatie (kopie) overeengekomen tussen Miguel Giberton, gouverneur
van het fort Povason te Porto Calvo, en gouverneur-generaal Johan Maurits van Nassau. 1637 maart
3; com os artigos redigidos em neerlandês; 2. NL-HaNA_1.05.01.01_52, nº do inventário
_13: Akte van capitulatie, in het Frans, overeengekomen tussen Miguel Giberton, gouverneur van het fort
Povacao te Porto Calvo, en gouverneur-generaal Johan Maurits van Nassau. 1637 maart 3; com os
artigos redigidos em francês; 3. NL-HaNA_SG 1.01.05, nº do inventário 9217: Rapport van
kolonel Christoffel Artischauw betreffende de verovering van Porto Corvo [Calvo] in Brazilië. Afschrift.
1637 januari 23 - 1637 maart 8 / Exh. St.-Gen. 8 juli 1637, redigido em neerlandês, com
exceção desses ARTICLES ACCORDÉS ENTRE LE SIEUR MIGUEL GILBERTON
etc. ET SON EXC. JEAN MAURICE CONTE DE NASSOU etc., que estão redigidos
em francês.
10 Panfleto van Hilten, Auctentijck Verhael van de Belegheringhe ende veroveringhe van Porto Calvo
... [História resumida e autêntica do cerco e captura de Porto Calvo ...], [panfleto], Ian
van Hilten, [livreiro], Amsterdam, Holanda, 27/6/1637. Scheepvaartmuseum, Amsterdam,
Holanda. Visualização do panfleto van Hilten: http://www.maritiemdigitaal.nl/index.
cfm?event=search.getdetail&id=101001434, acesso em 10/6/2016. Panfleto Blaeu: Kort
em Auctentick Verhael van het beleg en veroveren van Povaçon de Porto Calvo [Descrição resumida
e autêntica do Cerco e Conquista de Porto Calvo], [panfleto impresso por] Iohan Blaev,
Amsterdam, 1637. Atlas van Stolk, n. ref. 1794. Visualização do panfleto Blaeu: http://
collectie.atlasvanstolk.nl/data_nl.asp?startc=1&q0=55348&subj=18&bron=collform,
acesso em 10/6/2016.

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 287-301, 2018


290 Benjamin Nicolaas Teensma

Cópia da carta de João Maurício de Nassau, Povoação


de Porto Calvo, 8 de março de 1637, ao [Conselho dos]
XIX Diretores da Companhia das Índias Ocidentais, na
Holanda.11

Mui Nobres, Respeitáveis, etc. [Senhores]:

Depois da nossa saída da Holanda no dia 6 de dezembro de 1636


chegamos à Ilha de Maio no seguinte dia 31 [desse mês], onde fica-
mos durante seis dias, e seguindo a velejar chegamos com nossos
quatro navios ao Recife no Brasil no dia 23 de janeiro [de 1637] e
todos em boa saúde. Embora o Mar de Espanha estivesse muito agi-
tado, eu pessoalmente — com grande admiração minha — nunca
fiquei enjoado nele.
Após chegarmos ao Recife, e para não perder tempo no serviço
da Companhia, decidimos reunir todas nossas tropas — incluindo as
que as guarnições podiam dispensar — para entrar em campanha,
muito embora neste ano a época das chuvas tenha começado bem
cedo. Assim saímos do Recife no dia 5 de fevereiro, e chegamos a
Sirinhaém — lugar fixado para o encontro — no dia 8.
Reunimos — sem contar os que chegaram conosco e com o Se-
nhor Van Ceulen12 — aproximadamente 8.000 soldados, 800 mari-
nheiros armados, e 600 Brasilianos, e com eles começamos nossa
marcha à Povoação de Porto Calvo, onde o Conde de Bagnuoli13 se
encontrava com o grosso da sua tropa, num total de 8.000 soldados,
sem incluir os moradores [em armas]. Durante nossa marcha, chega-
mos a um rio que se chamava Una, e que devíamos passar, mas seu
passo tinha sido entrincheirado e ocupado pelo inimigo com 700

11 Haia, Arquivo Nacional, Velha Companhia das Índias Ocidentais: NL-HaNA_OWIC


1.05.01.01, número do inventário 52, número consecutivo 15.
12 Nota de Levy Pereira: Mathias [Mathijs] van Ceulen [Keulen], membro do Alto e Secreto
Conselho e governador de Pernambuco, que retornou ao Brasil acompanhando Nassau.
Na sua primeira estada no Brasil, foi nomeado diretor e Alto Conselheiro da WIC no Bra-
sil, e supervisionou a conquista da Capitania do Rio Grande, em dezembro de 1633. Por
esse sucesso, o Forte dos Reis Magos foi renomeado Castelo Ceulen [Casteel Keulen].
13 Nota de Levy Pereira: Giovanni Vincenzo di San Felice, napolitano, Conde de Bagnuoli
(Bañolo, Bagnolo, Banholo, Bagnoli, etc.), Mestre de Campo General (Maesse de Campo General)
das tropas ibero-brasileiras em Pernambuco.

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 287-301, 2018


As cartas do Conde Maurício de Nassau comunicando a vitória no cerco e conquista de
Porto Calvo em 1637 291

homens para impossibilitar-nos a passagem. No entanto, vendo que


nos dirigimos a eles, retiraram-se ao grosso da sua tropa; e assim
chegamos sem impedimento à Barra Grande, onde nossos navios,
víveres e munições se achavam.
Depois de descansarmos dois dias nesse lugar, seguimos mar-
chando no dia 18 [de fevereiro], chegando nesse mesmo dia a um
lugar distanciado a cerca de uma hora da Povoação de Porto Calvo,
onde encontramos um passo pelo qual necessariamente devíamos
passar, mas que o inimigo tinha entrincheirado com um grande fos-
so, e reforçado com uma sólida paliçada. Também tinham cortado as
grandes árvores dos dois lados [do passo], de modo que nem cachor-
ros nem gatos podiam passar por essas ladeiras. Esse passo estava
ocupado por 1.800 dos seus melhores soldados. Nessa própria noite
escaramuçamos até mui tarde com o inimigo, sem perdas de gente
nossa.
Por volta das oito horas da manhã do dia 19, dispusemos nossa
gente em ordem de batalha e seis peças de campanha no caminho,
com as quais atiramos várias salvas ao inimigo. Logo depois mar-
chamos, em nome de Deus, a eles, atacando-os ao mesmo tempo
em três lugares diferentes da sua vantajosa posição; pelo que Deus
foi servido atemorizá-los tão fortemente que, depois de atirar uma
grande salva contra nós, abandonaram sua posição. Nós os seguimos
até debaixo dos muros da sua fortaleza, matando aproximadamente
900 soldados da sua gente, entre os quais muitos oficiais — como
um Dom Pedro de Rockoborgo, e o sobrinho de Dom Luiz, Dom
Bartoloni, ajudante-general e engenheiro — e também aprisionamos
dois sargentos-mores e vários tenentes e alferes.14 Nossos Brasilianos
desempenharam-se perfeitamente da sua tarefa, matando quantos
inimigos tinham podido apanhar durante a fuga. Nossas perdas limi-
taram-se a seis mortos e 35 feridos.

14 Nota de Levy Pereira: Dom Pedro de Rockoborgo possivelmente é o alferes Pedro de la


Cruz, o único Pedro citado nas Memorias diárias como morto nessa batalha; o sobrinho de
Dom Luiz, Dom Bartolomi, relacionado como morto por Nassau, é Dom Bartolomeu de
Roxas, sobrinho de Dom Luiz de Roxas y Borgia, dado como prisioneiro nas Memórias,
onde os combatentes aprisionados pelos neerlandeses foram “los Capitanes Manuel de Sousa
i Abreu, Baltasar de Rocha Pita; i don Bartolomè de Roxas, Ayudante de Teniente de Maesse de Campo
General, que avia venido por Ingeniero; i el Ayudante Ioseph Castaño.”. (Memorias diarias de la gverra
del Brasil, Op. cit., pp. 242e-242d).

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 287-301, 2018


292 Benjamin Nicolaas Teensma

O Conde de Bagnuoli mandara fortificar os dois morros próximos


à Povoação,15 onde estava acampado com o resto da sua gente; mas
na noite em questão ele abandonou essas fortificações, retirando-
-se em grande desordem com suas tropas, e deixando três peças de
bronze nelas. Nós o mandamos perseguir por um sargento-mor com
600 soldados e três companhias de cavalaria, os quais devidamente
se ocuparam dos inimigos menos lépidos durante a fuga. O Conde
retirou-se assim às Alagoas.
Para cercar e conquistar esta fortaleza, dividimos nossa gente em
três seções. A esse fim também mandamos preparar quatro baterias
de três peças cada uma.16 E quando chegamos com nossos aproches
a mais ou menos cem passos do fosso deles, e depois que, durante
três dias, nossas baterias tinham batido energicamente suas mura-
lhas, exigimos, no dia 2 de março, que rendessem a fortaleza. Nesse
dia o Governador pediu uma trégua, que lhe foi concedida. No dia
seguinte, mandou dois reféns para parlamentar conosco, cujas con-
dições [de rendição] foram acordadas como Vossas Senhorias podeis
verificar na cópia adjunta. O inimigo saiu da fortaleza no dia 4 deste
mês, num total de 300 Espanhóis e 110 Italianos: gente em excelente
condição, à exceção dos doentes e feridos, [entre eles] oito capitães
e sete porta-bandeiras.17 O Governador é um Espanhol, de nome
Miguel Giberton, Tenente-General da artilharia, que durante largos
anos serviu na Holanda.

15 Nota de Levy Pereira: Referência aos dois redutos sobre os morros a noroeste da Vila
do Bonsucesso de Porto Calvo. O morro mais próximo da Vila era conhecido como o de
Amador Alvarez. O Terço napolitano acampava entre esses redutos.
16 Nota de Levy Pereira: Os mapas do Cerco e Conquista de Porto Calvo mostram somente
três dessas baterias com canhões grossos. Todavia, o Forte da Povoação era batido por três
baterias, e os mapas alocam uma delas, a do Almirante Lichthart, instalada próxima à Ilha
do Varadouro, local excessivamente distante, e presumivelmente ali disposta para proteção
da Ilha. F. B. FREIRE cita que os holandeses ocuparam quatro postos, plantando em cada
um uma bateria (Nova Lusitânia – História da Guerra Brasílica, Oficina de João Galrão,
Lisboa, 1675, Livro Nono, §768, pg. 401). Assim, e pelos relatos dos combates, citando
baixas na Bateria Lichthart que canhoneava o Forte, tudo indica que havia efetivamente
uma quarta bateria de canhões grossos, conforme citado nesta carta de Nassau.
17 Nota do autor e de Levy Pereira: Porta-bandeiras, (A): Vaandragers = [alferes]. Os panfletos
amsterdameses (Op. cit.) informam que, no dia 4 de março, 550 pessoas deixaram o Forte
da Povoação. Isso significa que 140 civis (mulheres, crianças e escravos) acompanhavam os
militares que se renderam.

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 287-301, 2018


As cartas do Conde Maurício de Nassau comunicando a vitória no cerco e conquista de
Porto Calvo em 1637 293

Encontramos na fortaleza 22 canhões de bronze18 — os melhores


que jamais vimos — e quatro morteiros de bronze, com 372 grana-
das grandes, vasta quantidade de alcanzias19 e grande provisão de
mechas e pólvora, porque nesta [fortaleza] todo o material [bélico de
artilharia] do inimigo nos caiu nas mãos. Agora o Conde de Bagnuoli
já não mais dispõe de um único canhão neste país. Em anexo, man-
damos a Vossas Excelências a lista pertinente de todo o material que
encontramos na fortaleza em questão.
Graças a Deus, perdemos neste cerco pouca gente, com exceção
do Capitão Duijnkerker — morto por um tiro dum canhão grosso —
e do fidalgo Carel van Nassau,20 também morto por tiro de canhão.

18 Nota do autor e de Levy Pereira: A lista do inventário do material bélico capturado no Forte
da Povoação em 1637 relaciona 19 canhões de bronze. Vide os manuscritos: 1. NL-Ha-
NA_1.05.01.01_52_41: Lijst van de artillerie en ammunitie gevonden in het fort Povocaon en in de redoute
bij Porto Calvo. 1637 maart 8 (sic); 2. NL-HaNA_1.05.01.01_52_72: Inventaris (duplicaat) van de
artillerie en ammunitie gevonden in het fort Povocaon en in de redoute bij Porto Calvo. 1637 mei 8 (sic); 3.
NL-HaNA_1.05.01.01_53_6: Inventaris van artillerie en ammunitie, op 3 maart 1637 aangetroffen in
het veroverde fort Povoacaon de Porto Calvo. [1637] (sic) relaciona 18 canhões de bronze, deduzindo
um canhão de bronze de 10 lb das listas acima citadas, que foi permitido à tropa ibérica, pelo
documento de rendição, artigo 12, retirar-se com ele.
19 Nota de Levy Pereira: Granada de mão, construída com um pequeno vaso de cerâmica
carregado com pólvora e um pavio, que era aceso para o seu lançamento.
20 Nota do autor e de Levy Pereira: Capitão Duijnkerker: mencionado como o capitão João
Tallebon [Ioannes Tallebomius] por G. Barleus (Op. cit., pg. 39), e, por D. A. Coelho (Op. cit.,
fol. 244a) como Deunque Carlo, ‘capitão de grande opinião’. J. A. Calf (Ms. NL-HaNa_
OWIC 1.05.01.01, número do inventário 52, número consecutivo 18) cita que ele morreu
quando um meio-canhão da bateria de Artischevsky, também conhecida como bateria do
Conde, foi destruído por um tiro direto. Nessa ocasião outros 2 homens foram mortos, e
outros 3 gravemente feridos. Na Dagelijkse Notule de 28 de janeiro de 1637 (Monnumenta
Hyginia, UFPE), na relação das tropas aprestadas para a campanha de expulsão dos ibe-
ro-brasileiros de Pernambuco, consta Jan Taelboon como comandante de uma companhia
com o efetivo de 64 homens, o que indica que João Tallebon deveria ser seu nome verda-
deiro, e que Duijnkerker poderia ser um apelido, talvez por ser natural da cidade francesa
de Dunquerque. Carel [Karel] de Nassau: Carlos de Nassau [Carolus Nassovius], sobrinho
do Conde de Nassau. D. A. Coelho (Op. cit., fol. 244a) o denomina Henrique de Nassau.
P. M. Netscher (Op. cit., p. 155) o cita como Conde Carlos de Nassau, primo do governa-
dor (referindo-se a João Maurício). J. A. Calf (Op. cit.) informa que o fidalgo Karel Van
Nassau morreu em 1/3/1637, atingido por uma bala de canhão que passou pela troneira
do espaldão da bateria de Artschevsky, e, na noite desse dia, foi sepultado na Igreja Nova,
atual igreja matriz da cidade de Porto Calvo-AL (AL). A Dagelijkse Notule de 28 de janeiro
de 1637 (Op. cit.) informa que o capitão Carlos de Nassau [Don cabo de Nassau, sic]
comandava uma companhia com 140 homens. G. Barleus (Op. cit., p. 39) cita que ambos
morreram na explosão de uma bombarda. Como não há notícia de que os neerlandeses

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 287-301, 2018


294 Benjamin Nicolaas Teensma

O Capitão Vanden Brande recebeu um tiro de mosquete no ombro


direito, mas não está em perigo de morte. Diariamente grande nú-
mero de moradores vem pôr-se debaixo da obediência deste Estado.
Logo após o reparo desta fortaleza e do aprovisionamento de nossa
gente de víveres e munições, marcharemos, em nome de Deus, ao
inimigo para, ajudado por Ele, afugentá-los à outra margem do Rio
São Francisco, o que Ele não deixará de generosamente conceder-
-nos. Acabamos de receber notícia de que o inimigo destruiu todas
as pontes, e atrincheirou o passo. Não deixaremos de avisar a Vossas
Excelências das demais coisas que houver.
Manifestamente constatamos que todas nossas ações aqui uni-
camente se realizaram pela graça de Deus, razão porque devemos
agradecer a Ele em máximo grau. Em cuja proteção encomendamos
a Vossas Excelências, ficando de Vossas Excelências com a maior
atenção:

Maurício de Nassau, no exército na Povoação de Porto Calvo,


neste dia, 8 de março de 1637.

[Mais abaixo estava escrito]:

Uma vez que o Coronel Artichevski volta para a Pátria e a vacatura


dele necessariamente deve ser preenchida, apreciaríamos que nosso
Capitão de Guarda, Senhor Koin — pessoa de excelentes qualida-
des — fosse beneficiado com essa função; não duvidando de que a
Companhia se aproveite notavelmente dos serviços dele. Mas antes
de nomeá-lo aguardo a resposta pertinente de Vossas Excelências.

(Cópia) ARTIGOS concluídos entre o Senhor Miguel Giberton, Go-


vernador da Fortaleza da Povoação de Porto Calvo por parte de Sua
Majestade El-Rei de Espanha, por um lado; e Sua Excelência, João
Maurício, Conde de Nassau, Catzenelbogen &c., Governador, Capitão
e Almirante-General do Estado do Brasil, por parte dos Excelentíssi-

estivessem usando bombardas (morteiros) nesse cerco, supõe-se que isso signifique a ex-
plosão de uma granada de morteiro lançada do Forte da Povoação, informação que conflita
com os relatos de D. A. Coelho, e os destas cartas de Nassau, mortes causadas por tiro de
canhão.

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 287-301, 2018


As cartas do Conde Maurício de Nassau comunicando a vitória no cerco e conquista de
Porto Calvo em 1637 295

mos Senhores Diretores da Privilegiada Companhia das Índias Oci-


dentais, por outro lado, no dia 3 de abril21 de 1637.22

[1.]23 O Governador se comprometerá a entregar a nosso poder a


Fortaleza com toda sua artilharia, munição de guerra e artigos afins,
hoje, às quatro horas.
[2.] Os Oficiais e Reformados sairão com seus porta-bandeiras;8 os
soldados com suas armas, mechas acesas, balas na boca,24 batendo
tambores e bandeiras desfraldadas; e ninguém dos nossos os moles-
tará ou desonrará de qualquer modo, e aqui se embarcarão levando
consigo 200 libras de pólvora, 200 libras de mecha e 200 libras de
balas de mosquete.
[3.] Os Oficiais e Reformados levarão consigo as vestimentas parti-
culares, bagagens, e coisas que lhes pertencem. Mas encontrando-se
neles bens pertencentes ao Conde de Bagnuoli, Duarte de Albuquer-
que ou a outro qualquer, o que quer que seja, ficarão à nossa dispo-
sição; e se alguém levar consigo qualquer dos chamados objetos que
não lhe pertençam, perderá igualmente os mesmos, e ficará preso.
[4.] Quanto aos Negros: cada um ficará com os seus, mas restituirá
aos nossos aqueles que fugiram de nós.
[5.] As Mulheres levarão seus vestidos e bagagens, sem apoderar-
se de bens alheios, sob a acima mencionada pena de serem detidas.
[6.] Os sitiados serão providos de navios e víveres necessários para
a viagem às ilhas Santo Domingo ou Espanhola.25

21 A data dos artigos da rendição impressa nos panfletos Blaeu e van Hilten é 3 de abril de
1637. A data correta é 3 de março de 1637, como consta nos manuscritos: HaNA_OWIC
1.05.01.01, nº do inventário 52, nº consecutivo 12, com esses artigos redigidos em neerlan-
dês, e HaNA_OWIC 1.05.01.01, nº do inventário 52, nº consecutivo 13, com eles redigidos
em francês. Rapport van kolonel Christoffel Artischauw betreffende de verovering van Porto Corvo
[Calvo] in Brazilië. Afschrift. 1637 januari 23 - 1637 maart 8 / Exh. St.-Gen. 8 juli 1637, do
acervo do Arquivo dos Estados Gerais [NL-HaNA_SG 1.01.05, nº do inventário 9217].
22 Haia, Arquivo Nacional, Velha Companhia das Índias Ocidentais: NL-HaNA_OWIC
1.05.01.01, núm. do inventário 52, núm. consecutivo 12.
23 Os artigos estão numerados somente nos panfletos.
24 Nota de Levy Pereira: Arma carregada, pronta para o tiro.
25 Nota do autor e Levy Pereira: O documento HaNA_OWIC 1.05.01.01, nº do inventário
52, nº consecutivo 12, cita esse mesmo destino, ilhas no Caribe, no entanto, o HaNA_
OWIC 1.05.01.01, nº do inventário 52, nº consecutivo 13 e G. Barleus (Op. cit., p. 39)

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 287-301, 2018


296 Benjamin Nicolaas Teensma

[7.] Os doentes e feridos serão levados à Ponta de Jaraguá26 e pro-


vidos de medicamentos.
[8.] No que se refere aos Religiosos, eles sairão com todas suas pro-
priedades e objetos eclesiásticos, sem apoderarem-se de bens alheios.
[9.] Os condestáveis sairão com seus instrumentos.27
[10.] Poderão levar consigo a ossada de Dom Luiz [de Rojas y Bor-
ja] para onde quer que seja.28
[11.] Os desertores do nosso lado serão perdoados, e o menciona-
do Governador livrará e entregará todos os presos nossos que tenha
em seu poder.
[12.] Ainda se conceder, ao acima-mencionado Governador,
uma peça de artilharia com suas balas apropriadas de dez livras,
e sua palamenta.29

informa que lhes foi concedido a faculdade de escolherem entre a Ilha Hispaniola, ou
outra ilha das Índias Ocidentais (Caribe) e a Ilha Terceira. Rumaram para a Ilha Terceira,
no Arquipélago dos Açores (Ilhas Flamengas).
26 Jaraguá. — (A): Garagua. — (B): Iaragoa.
27 Nota do autor, de Levy Pereira e de Onésimo Santos: Esse artigo 9 está redigido na versão
neerlandesa: De Canoniers sullen uytgaen met hare gereetschappen. [panfleto Blaeu e carta NL-Ha-
NA_1.05.01.01_52, nº do inventário _12]; De Canoniers sullen uytgaen met hare ghereedtschappen.
[panfleto v. Hilten]; Nos documentos com esse artigo redigido em francês: Les Canoniers
sortiront avec les aletages [sic], na carta NL-HaNA_1.05.01.01_52, nº do inventário _13; Les
Canoniers sortiront avec leurs ornements, no relatório NL-HaNA_SG 1.01.05, nº do inventário
9217. O consenso para a interpretação foi admitir que: Canoniers = prt. condestáveis, por
esse artigo referir-se aos chefes de artilharia da praça de guerra (Forte da Povoação), uma
cavalheiresca distinção neerlandesa à sua atuação; Ornements = prt. ornamentos é manifesta
corruptela do fr. instruments = nl. gereetschappen / ghereedtschappen = prt. instrumentos.
28 Nota de Levy Pereira: Esse artigo explicita que os restos mortais de Dom Luiz de Rojas y
Borja, Duque de Granja, foram repatriados para a Espanha pelas tropas de Miguel Gilber-
ton. Dom Luiz foi morto na batalha da Mata Redonda em 18 de janeiro de 1636, sepultado
no segundo dia após a batalha junto à casa de Frei Manoel Calado, a uma légua da Povoa-
ção, e, um mês antes dos neerlandeses cercarem Porto Calvo (possivelmente no dia 21 de
dezembro de 1636, um domingo), seus restos mortais foram desenterrados, metidos em
uma pequena caixa e solenemente transladados para a igreja nova da Povoação (Calado, O
Valeroso Lucideno, Livro Primeiro, Capitulo III, pg. 76-77; 84), onde repousaram até o dia
4 de março de 1637. Nessa ocasião, também foram repatriados os restos mortais de Dom
Bartolomeu de Roxas, sobrinho Dom Luiz de Rojas y Borja, segundo C. Pudsey (DIÁRIO
DE UMA ESTADA NO BRASIL, 1629-1640; Editora Index, Petrópolis, Rio de Janeiro,
Brasil, 2000, fol. 26v., pg. 117).
29 Nota do autor e de Onésimo Santos: No documento NL-HaNA_1.05.01.01_52, nº do
inventário _12, a redação desse artigo é “een stuck gheschuts, schietende koghels van thien ponden,
met sijne toebehooren”, ou seja, em tradução literal “uma peça de artilharia, atirando balas de

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As cartas do Conde Maurício de Nassau comunicando a vitória no cerco e conquista de
Porto Calvo em 1637 297

Todos estes artigos foram concluídos e acordados por ambos la-


dos, e confirmados com subscrições e selos. Feito como dito, e foi
subscrito:
J. M. Conde de Nassau e Sr. Miguel Giberton.

dez libras, com suas pertenças”, enquanto que nos documentos com os artigos redigidos
em francês, o NL-HaNA_1.05.01.01_52, nº do inventário _13 e o NL-HaNA_SG 1.01.05,
nº do inventário 9217, o texto desse artigo é “une piece d’Artillerie de dix livres avec son attelage”,
cuja tradução literal é “uma peça de artilharia de dez libras com seus animais de tração”.
No francês da atualidade escreve-se les attelages nessa circunstância. O consenso para sanar
essa variação nos significados foi utilizar o termo palamenta, conjunto de ferramentas ou
máquinas usadas no serviço das bocas de fogo, que inclui a carreta e todo o necessário para
o seu transporte.

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298 Benjamin Nicolaas Teensma

Carta, Antônio Vaz de Pernambuco, 28 de abril de 1637,


de João Maurício, Conde de Nassau-Siegen, a seu primo
Henrique Casimiro Conde de Nassau-Dietz, Governador
das Províncias Frísia, Groninga e Drente, nas Províncias
Unidas dos Países Baixos.
Traduzida do francês.30

Meu Caríssimo Senhor Primo:

A escassez de tempo livre, do qual precisava depois da minha


chegada a este país para meter ordem nos assuntos que dela necessi-
tavam, me desculpará, por favor, do meu largo silêncio em escrever-
-vos e obedecer às leis da civilidade a que nossos estreitos laços de
amizade me obrigaram. Mas agora que me sinto um pouco mais à
vontade não posso deixar de confessar-vos com minha acostumada
franqueza que — apesar da minha próspera viagem, e êxitos que
Deus até agora tem querido conceder-me em todas minhas empresas
— a dor da vossa ausência nunca deixou de picar-me, e, em primeiro
lugar, porque, pela grande distância que nos separa, estou privado
da consolação que as frequentes notícias vossas, sobretudo as a res-
peito da vossa boa saúde, poderiam conceder-me. De todos modos,
espero que ela tenha ficado sempre no mesmo estado em que se
encontrava quando vos disse adeus, e que, entretanto, o tempo não
a tenha diminuído, nem às outras felicidades com que a Fortuna soía
acumular-vos.
Pelo que a mim se refere, não sei como louvar bastante a Deus,
pela boa saúde e bom progresso que deu às minhas armas e à mi-
nha pessoa desde minha vinda para cá. Porque, depois da minha
chegada, são e salvo, no passado dia 23 de janeiro ao Recife de
Pernambuco, com o aplauso maravilhoso de várias pessoas de bem,
e depois de ter ampliado meu exército com 5.000 a 6.000 homens

30 ARQUIVO DA CASA REAL, HAIA, KHA 24-17. Koninklijke Verzamelingen, Archief


Hendrik Casimir I, no. 17. Nota do autor e de Levy Pereira: Netscher (Op. cit., pg. 152) cita
que há apenas três cartas do Conde de Nassau redigidas em língua francesa. Uma dessas é
a carta do Conde, redigida ‘D’Antoni Vaez du Pernambuco em Brasil ce 3 Févr. 1637’ e dirigida
aos Estados Gerais, transcrita nessa obra nas páginas 153-154, cujo original é conservado
no Arquivo do Reino, maço Ind. Occ. – 1635-1640 (sic).

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 287-301, 2018


As cartas do Conde Maurício de Nassau comunicando a vitória no cerco e conquista de
Porto Calvo em 1637 299

preparados para a campanha, no dia 5 de fevereiro fui-me em direi-


tura ao inimigo: e, logo depois de o ter achado com 1.800 homens,
ao pé de uma montanha e muito bem entrincheirado, lancei-me em
seguida sobre ele, apoderei-me da sua fortaleza, forcei-o a retirar-se
com perda de 300 homens valentes e de vários oficiais renomados e
de autoridade. Do nosso lado, só havia seis mortos e 35 feridos. Este
combate efetuou-se num lugar não muito longe do sítio onde o Con-
de de Bagnuoli, general do inimigo, se encontrava. Mas, como ele
não se atrevia a aproximar-se por causa do fogo de que não gostava,
contentou-se a observar a refrega do alto de uma montanha, como
se fosse assunto que não lhe tocava. Também, se desgostou tão pro-
fundamente deste primeiro cumprimento que então fiz aos seus, que
até deixou de aguardar-me na sua melhor fortaleza em Porto Calvo,
a qual não deixei, portanto, de cercar e conquistar com boas e van-
tajosas condições em 14 dias.31
Nela, achou-se o armazém, munições e toda a artilharia do ini-
migo, a saber, 25 peças de bronze, 4 morteiros,32 500 granadas, 500
barris de pólvora, grande quantidade de alcanzias, mecha33 e ou-
tros materiais. Dela saíram 411 militares, espanhóis na maioria, em
boa disposição e corpulentos, os quais — para impedir que fossem
mexer-se em seguida com este país — mandei às Índias Ocidentais,
onde terão todo o espaço e tempo que quiserem para divertir-se.34

31 Nota de Levy Pereira e Onésimo Santos: esse comentário do Conde João Mau-
rício demonstra seu bom humor e elevado estado de espírito com a vitória alcan-
çada em Porto Calvo. Gaspar Barleus (Op. cit., pg. 39) e Robert Southey apud P.
M. Netscher (Op. cit., pg. 155) comentaram o tratamento magnânimo dispensado
por Nassau à tropa íbero-napolitana.
32 Nota do autor e de Levy Pereira: segundo as listas do material bélico capturado em Por-
to Calvo [Ms. HaNA_OWIC 1.05.01.01, nº do inventário 52, nº consecutivo 41, e Ms.
HaNA_OWIC 1.05.01.01, nº do inventário 52, nº consecutivo 72], a artilharia capturada
no reduto do morro de Amador Alvarez e no Forte da Povoação consistia em 22 canhões
de bronze, 5 morteiros de bronze e 5 canhões de ferro.
33 Nota do autor e de Levy Pereira: Estopim, murrão. Conforme as listas do material
bélico capturado em Porto Calvo citadas anteriormente, e também na lista do Ms.
HaNA_OWIC 1.05.01.01, nº do inventário 53, nº consecutivo 06, havia nos paióis
6.034 libras de mecha, das quais 600 libras de mechas apodrecidas (inservíveis).
34 Nota de Levy Pereira e Onésimo Santos: mais uma amostra do bom humor e do estado de
espírito do Conde João Maurício. Quanto ao local de destino das tropas rendidas, ver notas
anteriores.

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 287-301, 2018


300 Benjamin Nicolaas Teensma

Todos concordam na opinião de que o Conde de Bagnuoli estava


convencido de que dita fortaleza se manteria durante pelo menos 5
ou 6 meses; mas enganou-se grandemente nesse cálculo. Por essa
razão, não quis persistir muito numa esperança tão mal fundada; e,
com a primeira notícia que recebeu da perda da sua melhor fortaleza,
retirou-se precipitadamente para o Rio São Francisco com todas suas
bagagens, para o quanto antes atravessá-lo. Decisão excelente na ver-
dade, porque sem ela, estaria obrigado a bater-se; e, como não tinha
vontade de fazer isso, evitou toda agitação, procurando unicamente
sua paz e descanso35.
No que à sua fuga se refere, ela foi tão precipitada que até se esque-
ceu de defender os passos mais difíceis a forçar que jamais se pudes-
sem encontrar. O maior impedimento que me causara foi que, depois
de passar vários rios invadeáveis, mandou destruir todas as pontes que
fizera para passá-los, as quais eu então me vi obrigado a consertar.36
Nesse intervalo, ganhou o tempo para escapar-se, que de outra forma
não teria podido realizar tão facilmente. Mesmo assim, minha vanguar-
da comportou-se tão diligentemente nesta perseguição, que ainda viu
a última chalupa deles passar o já mencionado Rio São Francisco; e
arrecadou bons lucros das Portuguesas fugitivas, em pérolas, vestidos,
ouro, prata e outras coisas. Foi então que essa miserável gente se en-
ganou tão gravemente, porque tomaram nossos Brasilianos pelos seus,

35 Nota de Levy Pereira: o Conde de Nassau nesta frase concedeu ao Conde de Bagnuoli
um disfarçado elogio a uma faceta incompreendida e tida como fraqueza e covardia por
muitos: forçado pelas circunstâncias, Bagnuoli tornou-se especialista em retiradas, mano-
bras arriscadas, dificílimas de se executar com bom êxito, recomendadas pela prudência à
arte de comandar, basicamente para sobreviver e prosseguir a luta noutra ocasião menos
desfavorável. Comentam depreciativamente as decisões de Bagnuoli nessa ocasião: Calado
(Op. cit., pg. 83), D. A. Coelho (Op. cit., Ano 1637, 18 de fevereiro, fol. 242a-242b, pg.
496-497), C. Pudsey (Op. cit., fol. 26r., pg. 115) e F. A. Varnhagen (Op. cit., Livro Quinto,
pg. 166-168).
36 Nota de Levy Pereira: as duas pontes destruídas pelas forças de Bagnuoli em retirada fo-
ram as do rio Marituba (rio Piauí, no alto curso), conforme citado por C. Pudsey (Op. cit.,
pg.119) e nas Memórias (Op. cit., pg. 249): ‘El enemigo passò el riachuelo de Piagui, con tanta peligro
(aun con no tener quien se lo impidiesse) que se le anegaron tres hombres, i dos caballos; todos le pasaron
tan de espacio, i embaraçosamente, como fue en unas balsas, que alli llaman assi, i se cõponen de vnas yerbas
como espadañas, que ligadas sirven de embarcacion, para passar rios tan angostos como este’. No mapa
de G. Marcgrave (Brasilia qua parte paret Belgis, 1647), esse rio é denominado ‘Pĩaguĩ’ e corta
o caminho ‘Gouverneurs pat’.

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 287-301, 2018


As cartas do Conde Maurício de Nassau comunicando a vitória no cerco e conquista de
Porto Calvo em 1637 301

pedindo a assistência deles contra os Flamengos.37


E assim chegamos, graças a Deus, em dois meses, a ser donos
deste belo país até o famoso Rio São Francisco, sobre o qual faço,
agora, fortificar um lugarejo chamado O Penedo, para guardar em
subjugação e obediência os habitantes do país, porque, de outra for-
ma, têm o costume de revoltar-se ao primeiro vento que lhes venha
do seu partido.
Também, deveria contar-vos qualquer coisa da agradabilíssima
constituição desta terra, da sua grande fertilidade, abundância e ra-
ridade que tem, e produz, de frutas, plantas, animais, aves e outras
criaturas. Mas, faltando-me lugar nesta folha de papel, já não posso
acrescentar mais nada, senão manifestar-vos meu sincero protesto de
querer ser em toda minha vida,
Meu Caríssimo Senhor Primo, Vosso mui Humilde Servidor, Mau-
rício, Conde de Nassau.
De Antônio Vaz, em Pernambuco, neste 28 de abril de 1637.

37 Nota de Levy Pereira e Onésimo Santos: essa passagem demostra um pouco de humor
negro por parte de João Maurício.

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 287-301, 2018


A LISTA DA ARTILHARIA E MUNIÇÃO DE GUERRA
ENCONTRADAS NOS PAIÓIS DAS FORTIFICAÇÕES
DE PORTO CALVO EM 1637

Benjamin N. Teensma.1

A carta do Conde João Maurício de Nassau, Capitão, Governador


e Almirante General nos países conquistados no Brasil, datada de 8
de março de 1637 e escrita em Porto Calvo,2 comunicava ao Conselho
dos XIX da Companhia das Índias Ocidentais (WIC) o sucesso no cer-
co e conquista dessa praça de guerra, mencionando haver em anexo
uma lista da artilharia e munição de guerra encontrada no Forte da
Povoação de Porto Calvo e no reduto construído pelo Conde de Ba-
nholo3 no morro de Amador Alvarez.
Essa lista é mencionada por vários historiadores, tais como Gaspar
Barléu, Duarte de Albuquerque Coelho, Manoel Calado, Pieter Mari-
nus Netscher, Francisco Adolfo de Varnhagen, e outros, sem maiores
detalhes, contudo, com algumas incongruências nessas menções, es-
pecialmente no que se refere ao estoque de pólvora remanescente
da batalha, registrado por alguns com exagero, o que requeria, para
esclarecer as dúvidas, um reexame dessa documentação primária.
Encontrou-se três exemplares dessa lista de 1637 no Arquivo Na-
cional de Haia, concretamente no arquivo da Velha Companhia das
Índias Ocidentais, que em holandês se chama Oude Westindische
Compagnie (OWIC). Lá esses documentos estão identificados com as
seguintes cotas4:

1 Professor emérito da seção de Português do Departamento de Línguas e Culturas da


América Latina da Universidade de Leiden, Países Baixos. Doutor pela Universiteit van
Amsterdam, Países Baixos. Associado correspondente do Instituto Arqueológico, Histó-
rico e Geográfico Pernambucano. Tradutor de diversos textos referentes ao período neer-
landês no Brasil.
2 Haia, Arquivo Nacional, Velha Companhia das Índias Ocidentais: NL-HaNA_OWIC
1.05.01.01, número do inventário 52, número consecutivo 15.
3 No de Levy Pereira, que colaborou com o artigo: Giovanni Vincenzo di San Felice, napo-
litano, Conde de Banholo (Bañolo, Bagnolo Bagnoli, e variantes), Mestre de Campo General
(Maesse de Campo General) das tropas ibero-brasileiras em Pernambuco.
4 NL-HaNA_1.05.01.01_52_41: Lijst van de artillerie en ammunitie gevonden in het fort Povo-
caon en in de redoute bij Porto Calvo. 1637 maart 8 (sic) Plaats: Porto Calvo, Op voorzijde: 11.
304 Benjamin Nicolaas Teensma

A: HaNA_OWIC 1.05.01.01, nº do inventário 52, nº consecutivo 41;


B: HaNA_OWIC 1.05.01.01, nº do inventário 52, nº consecutivo 72;
C: HaNA_OWIC 1.05.01.01, nº do inventário 53, nº consecutivo 06.5

O texto desses manuscritos está em holandês arcaico, e foram da-


tados “em Porto Calvo, 3 de março de 1637”. Pela caligrafia colhe-se
que eles foram copiados por três amanuenses diferentes. Em grandes
rasgos, o conteúdo deles é idêntico, salvo por pequenas diferenças de
rigor, devidas ao inevitável cansaço ou desinteresse dos escreventes
em questão, e as diferenças constatadas estão comentadas em notas.
Os manuscritos A e B são cópias da lista original, um inventário,
ou de uma outra de suas cópias. Essa lista relaciona detalhadamente
o material bélico encontrado, descrevendo-o e quantificando-o. No
entanto, o terceiro manuscrito, o que está individualizado com a letra
C na relação acima, acrescenta a essas informações o preço unitário,
em florins ou stuivers,6 e o valor em florins, stuivers e centavos,7 da
maioria dos itens inventariados, exceto daqueles classificados como
inservíveis. No final, explicita o valor total de todo o material bélico
capturado.8
Assim, o manuscrito C pode ser considerado um documento de-

NL-HaNA_1.05.01.01_52_72: Inventaris (duplicaat) van de artillerie en ammunitie gevonden in


het fort Povocaon en in de redoute bij Porto Calvo. 1637 mei 8 (sic). Duplicaat van 41. NL-Ha-
NA_1.05.01.01_53_6: Inventaris van artillerie en ammunitie, op 3 maart 1637 aangetroffen in het
veroverde fort Povoacaon de Porto Calvo. [1637] (sic).
5 O manuscrito C, no processo de arquivamento, foi separado do documento a que estava
anexado, e indevidamente inserido no arquivo com a documentação do ano de 1638. Os
manuscritos A e B estão corretamente arquivados junto aos documentos de 1637.
6 Stuiver = st. = moeda com valor de 5 centavos de florim. Vinte stuivers fazem 100 centavos
= 1 florim.
7 Nota de Levy Pereira: A notação de valores do item e de totalização é escrita no formato
florim//stuiver//centavo, no entanto, não há nenhum valor discriminando os centavos.
8 No manuscrito C foi omitido um canhão de bronze de calibre 10, cuja descrição nos ma-
nuscritos A e B é Canhão de bronze, com câmara cilíndrica e alma com o mesmo diâmetro,
atirando 10 libras, não montado, pesando 31 quintais e 32 libras, marcado com o escudo da
Espanha; abaixo: Don Philippo 4, Rey d’Espagne, 1634. Nota de Levy Pereira: Há 22 canhões
de bronze e 5 de ferro capturados nas duas fortificações artilhadas de Porto Calvo relacio-
nados nos manuscritos A e B – vide a tabela abaixo.

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 303-328, 2018


Lista da artilharia e munição de guerra encontradas nos paióis das fortificações de Porto Calvo em 1637 305

monstrativo do cálculo do valor do material capturado, e esse valor


possivelmente foi utilizado na partilha do butim. Esse manuscrito for-
nece valiosas informações sobre o custo do material bélico à época,
e por ele podemos saber o preço de armas, munições e ferramentas.
Por essa razão, o consideramos como o mais valioso, motivo porque
o escolhemos por pauta na descrição dos itens nesta nossa tradução
portuguesa do texto em questão. As poucas entradas que nele foram
preteridas pelo amanuense, e que se encontram nos manuscritos A e
B, foram mantidas nesta tradução com a devida advertência.
Em muitas dessas menções, figura no original holandês a curio-

Tabela 1: Quantidade de canhões capturados em Porto Calvo em 1637.


Local
Reduto no morro de
Forte da Povoação
Calibre Amador Aguiar
Bronze Ferro Bronze Ferro
24 3 - -
22 2 - -
18 1 - -
10 10 1 -
8 1 - -
6 - 2 2 -
5 1 - -
4 - 1 - -
3 1 2 - -
Total→ 19 5 3 -

Uma possível explanação para haver um canhão de bronze de calibre 10 a menos no ma-
nuscrito C, um dos canhões pertencentes às baterias do Forte da Povoação, pode estar re-
lacionada com o artigo 12 dos (*) ARTIGOS concluídos entre o Senhor Miguel Giberton,
Governador da Fortaleza da Povoação de Porto Calvo por parte de Sua Majestade El-Rei
de Espanha, por um lado; e Sua Excelência, João Maurício, Conde de Nassau, Catzenel-
bogen &c., Governador, Capitão e Almirante-General do Estado do Brasil, por parte dos
Excelentíssimos Senhores Diretores da Privilegiada Companhia das Índias Ocidentais, por
outro lado, no dia 3 de abril de 1637: ... 12. Ainda se conceder, ao acima-mencionado Go-
vernador, uma peça de artilharia com suas balas apropriadas de dez libras, e sua palamenta.
(*) Esse documento está impresso no panfleto Auctentijck Verhael van de Belegheringhe ende
veroveringhe van Porto Calvo ... [História resumida e autêntica do cerco e captura de Porto Cal-
vo ...], [tradução de Benjamin Teensma], Ian van Hilten, [livreiro], Amsterdam, Holanda,

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 303-328, 2018


306 Benjamin Nicolaas Teensma

sa sigla a ... GL cto. A sigla GL está associada à unidade monetária


gulden, o florim. E cto indubitavelmente indica o cento, 100, e está
sempre associado a preços de itens com seu peso expresso em
libras. Por exemplo, o valor das peças de artilharia de bronze tem
preço unitário a 50 GL cto, indicando que seu valor é calculado a
50 florins a cada 100 lb de seu peso.9
A conferência do cálculo da conversão dos pesos expressos no
formato quintal + arroba + libra indicou que a conversão de quintal
em arroba utilizou o fator tradicional de 1 quintal = 4 arrobas, mas o
de arroba em libras empregou o fator 1 arroba = 30 libras.10
A conferência dos valores pecuniários dos itens revelou que estes
estão impecavelmente escritos, com esses valores praticamente cor-
retos, salvo algumas diferenças nos centavos, e que os valores dos
subtotais e do total geral não foram perfeitamente copiados – notas
específicas detalham essas distrações.
A descrição do material bélico desse relatório é feita com rigor téc-
nico militar, e sua autoria ainda é desconhecida, pois os amanuenses
não escreveram o nome de quem os assinava, por não conseguirem
interpretar a assinatura, ou por outra razão.11.

27/6/1637. Scheepvaartmuseum, Amsterdam, Holanda.


9 Nota de Levy Pereira: O manuscrito C certamente tinha como finalidade estabelecer o
valor econômico do material capturado para a partilha desse butim, e outros fins corre-
latos. O seu estudo, conferindo os cálculos que nele foram feitos, objetivou explicitar a
correlação entre as anotações da coluna Preço unitário e o valor das peças de artilharia, mu-
nições, petrechos e ferramentas, e entender as razões para algumas divergências de valores
constatadas.
10 Nota de Levy Pereira: Os neerlandeses converteram os pesos dos canhões nessa lista
aplicando 1 arroba = 30 libras [neerlandesas], e 1 quintal = 4 arrobas = 120 libras [neer-
landesas]. Esse fator de conversão neerlandês de 1 arroba = 30 libras [neerlandesas] é
citado no trabalho Descoberta de ricas minas no Brasil (Oudeckinghe van Rijcke Mijnen in Brasil),
impresso em Amsterdam em 1639, apud NETSCHER, Pieter Marinus: Os holandeses no
Brasil: notícia histórica dos Países-Baixos e do Brasil no século XVII. [Tradução de Mário
Sette]. Companhia Editora Nacional, São Paulo, Brasil, 1942, nota 72, p. 276: “As caixas
de açúcar branco são de 20 arrobas e a arroba corresponde a 30 libras, valendo a libra 16 dracmas ...”.
Deve-se atentar que os ibéricos convertem 1 arroba = 32 libras [ibéricas], e o fator ibérico
de conversão de quintal em arrobas é igual ao praticado pelos neerlandeses, 1 quintal = 4
arrobas, que resulta em 1 quintal = 132 libras [ibéricas].
11 Nota de Levy Pereira: O autor do inventário em campo (manuscritos B e C) certamente
era militar especialista em artilharia, e poderia ser o próprio Coronel Cristovão Artichevski
(aliás Christoffel Artischauw; Crestofle d’Artischau Arciszewski) ou um seu subordinado.

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 303-328, 2018


Lista da artilharia e munição de guerra encontradas nos paióis das fortificações de Porto Calvo em 1637 307

Essa lista dos itens encontrados nos paióis das fortificações de


Porto Calvo está elaborada com minucioso detalhamento, e, algo
raro, também fornecendo uma estimativa de seus preços à época.
Sem sombra de dúvida, ela constitui documento extremamente va-
lioso para os estudiosos de fortificações coloniais e historiadores, e
peça fundamental para a compreensão dos eventos ocorridos em
Porto Calvo em 1637.
A sua tradução requereu a paleografia e a análise comparativa de
três documentos primários assemelhados e revelou-se bastante com-
plexa, face aos aspectos técnicos do material descrito, cujo entendi-
mento requereu a consulta a renomados historiadores e a instituições
especializadas em material bélico do século XVII, entre os quais desta-
camos o sr. Adler Homero Fonseca de Castro, cujas notas estão identi-
ficadas, o professor Francisco José Correa Martins, o arqueólogo Nico
Brinck e a Historische Collectie Korps Veldartillerie, da Holanda, aos
quais aqui registro os meus agradecimentos. Há, ainda, outras notas
explicativas e comentários escritas pelo autor e por Levy Pereira.

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 303-328, 2018


308 Tácito Luiz Cordeiro Galvão

Lista da artilharia e munição de guerra encontrada por


mim, abaixo assinado12, no forte de povoação de porto
calvo, conquistado por sua excelência [João] Maurício de
Nassau, Capitão, Governador e Almirante General nos
Países conquistados no Brasil. [Cópia]1314

1 Canhão de bronze, a 50 Fl / 100 f 2230 // - // -


com câmara cilíndrica lb
e alma com o mes-
mo diâmetro[01]14,
atirando 24 libras de
ferro, montado no
seu reparo; pesando
37 quintais e 20 libras;
marcado com o escu-
do de Portugal detrás
das alças[02]; abaixo
A.G.F. [03]
Canhão de bronze, a 50 Fl / 100 f 2183 // - // -
1 com câmara cilíndrica lb
e alma com o mesmo
diâmetro, atirando 24
libras, montado no seu
reparo; pesando 36
quintais, 1 arroba, 16
libras; marcado com
o escudo de Portugal
diante das alças [04].
1 Canhão de bronze, a 50 Fl / 100 f 2245 // - // -
com câmara cilíndrica lb
e alma com o mesmo
diâmetro, atirando
24 libras, não monta-
do num reparo [05],
pesando 37 quintais,
1 arroba e 20 libras
[06], marcado com o
escudo de Portugal
detrás das alças; abai-
xo A.G.F.

12 Os amanuenses não colocaram o nome do autor nos três manuscritos, possivelmente por não
interpretarem a sua assinatura ou esta informação não constar nos documentos copiados.
13 HaNA_OWIC 1.05.01.01, nº. do inventário 53, nº. consecutivo 6.
14 Os números entre colchetes remetem para os “Comentários ao documento” que se encon-
tram no final da transcrição.

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 339-390, 2018


Lista da artilharia e munição de guerra encontradas nos paióis das fortificações de Porto Calvo em 1637 309

1 Canhão de bronze, a 50 Fl / 100 f 2168 // - // -


com câmara cilíndrica lb
e alma com o mesmo
diâmetro, atirando 22
libras [07], montado
no seu reparo; pesan-
do 36 quintais e 16
libras; marcado com
o escudo de Portugal
diante das alças.
1 Canhão de bronze, a 50 Fl / 100 f 2123 // - // -
com câmara cilíndrica lb
e alma com o mesmo
diâmetro, atirando 22
libras, não montado
no seu reparo; pe-
sando 35 quintais, 1
arroba, 16 libras [08];
marcado como a an-
terior; faltando-lhe,
por um tiro, um dos
delfins [09].
Canhão de bronze, a 50 Fl / 100 f 2168 // - // -
1 com câmara cilíndrica lb [11]
e alma com o mesmo
diâmetro, atirando 18
libras de ferro, mon-
tado no seu reparo,
pesando 36 quintais e
16 libras [10], marca-
do com o escudo de
Portugal detrás das
alças; abaixo A.G.F.
1 Canhão de bronze,
com câmara cilíndrica
e alma com o mesmo
diâmetro, atirando 10
libras, montado no
seu reparo, pesando
31 quintais e 52 libras
[12], marcado com o
escudo da Espanha;
abaixo: D. Philippo 4
Rey d’Espagne; e mais
abaixo: El Marquês de
Leganés del Consejo
de [Es]Tado, Capitán-
General de artilharia de
Espanha [13].

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 303-328, 2018


310 Benjamin Nicolaas Teensma

1 Canhão de bronze,
com câmara cilíndrica
e alma com o mesmo
diâmetro, atirando 10
libras, não montado,
pesando 32 quintais
e 45 libras, marcado
com o escudo da Es-
panha; abaixo: Don
Philippo 4, Rey d’Espag-
ne, 1634.
1 Canhão de bronze,
com câmara cilíndrica
e alma com o mesmo
diâmetro, atirando 10
libras, não montado,
pesando 31 quintais e
32 libras [14], marca-
do como a anterior.
Subtotal / Transpor- f 18821 // 10 //
tado para a folha se-
guinte →
1 Canhão de bronze, a 50 Fl / 100 f 1560 // - // -
com câmara cilíndrica lb
e alma com o mesmo
diâmetro, atirando 10
libras, não montado,
pesando 26 quintais,
marcado com o escu-
do de Portugal, com o
Tosão [15] detrás das
alças.
1 Canhão de bronze, a 50 Fl / 100 f 2176 // - // -
com câmara cilíndrica lb
e alma com o mesmo
diâmetro, atirando 10
libras, não montado;
pesando 36 quintais, 1
arroba, 2 libras; mar-
cado com o escudo
de Portugal detrás das
alças; abaixo A.G.F.
1 Canhão de bronze, a 50 Fl / 100 f 1440 // - // -
com câmara cilíndrica lb
e alma com o mesmo
diâmetro, atirando 10
libras, não montado,
pesando 24 quintais;
marcado como a an-
terior.

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 303-328, 2018


Lista da artilharia e munição de guerra encontradas nos paióis das fortificações de Porto Calvo em 1637 311

1 Canhão de bronze, a 50 Fl / 100 f 1523 // - // -


com câmara cilíndrica lb
e alma com o mesmo
diâmetro, atirando 10
libras, não montado,
pesando 25 quintais, 1
arroba, 16 libras [16];
marcado com o es-
cudo de Portugal de-
trás das alças; abaixo
A.G.F.
1 Canhão de bronze, a 50 Fl / 100 f 1550 // - // -
com câmara cilíndrica lb
e alma com o mesmo
diâmetro, atirando 10
libras, não montado;
pesando 25 quintais,
3 arrobas, 10 libras;
marcado com o escu-
do de Portugal diante
das alças [17].
1 Canhão de bronze, a 50 Fl / 100 f 1550 // - // -
com câmara cilíndrica lb
e alma com o mesmo
diâmetro, atirando 10
libras, não montado,
pesando e marcado
igual à anterior.
1 Canhão de bron-
ze, atirando 8 libras,
montado no seu re-
paro, pesando 166 li-
bras, marcado GWC
[18]; ao redor da cula-
tra estava: Kilianus We-
gewaert me fecit, Campen
[19] 1634.
1 Canhão de bronze,
com câmara cilíndrica
e alma com o mesmo
diâmetro, atirando 5
libras, montado no
seu reparo; pesando
18 quintais e 10 libras
[20]; marcado com
um escudo com uma
Coroa Imperial por
cima.

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 303-328, 2018


312 Benjamin Nicolaas Teensma

1 Canhão de bronze
encampanado [21],
atirando 3 libras, não
montado, pesando
252 libras, marcado
GWC; ao redor da
culatra estava: Kilianus
Wegewaert me fecit, Cam-
pen 1631.
1 Morteiro de bronze
sobre seu reparo, pe-
sando 1.595 libras; o
diâmetro dele na boca
é de 13 ½ polegadas,
e na câmara de 6 ½
polegadas; marcado
detrás das orelhas
com o escudo da Es-
panha, 1633; diante
das orelhas um escu-
do com a águia real,
e abaixo dele escrito:
Claude de Rey Baron de
Balançon [22]. E ao re-
dor da culatra estava:
Johannes sothoff [23]
me fecit, Bruxelles.
Subtotal / Transpor- 30712 // //
tado para a folha se-
guinte →
1 Morteiro de bronze a 50 Fl / 100 f 660 // - // -
sobre seu reparo, pe- lb
sando 1.320 libras,
suas dimensões como
as do morteiro ante-
rior; marcado detrás
das orelhas com o
escudo da Espanha,
1631; diante das ore-
lhas um escudo com
um leão montante, e
abaixo estava: Henri
Compte de Berg [24]. Ao
redor da culatra esta-
va: Johannes Stettho-
ff me fecit, Bruxelles.
2 Morteiros de bronze, a 50 Fl / 100 f 1696 // - // -
pesando 1.696 libras lb
cada um; dimensões
como do anterior.

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 303-328, 2018


Lista da artilharia e munição de guerra encontradas nos paióis das fortificações de Porto Calvo em 1637 313

1 Morteiro de armada especulado f 300 // - // -


[25], de bronze, mar-
cado com o escudo de
Portugal. Pertencente
a ele, 2 almofarizes de
ferro com mão de pi-
lão de bronze. [26]
5 Canhões de ferro ava- - f - // - // -
riados, sem marcas,
dois atirando 6 libras
[27]; um, 4 libras;
dois, 3 libras.
1 Roqueira de ferro - f - // - // -
com câmara. [28]
46.395 libras de pólvora, das a 50 Fl / 100 f 21342 // - // -
quais 3.710 libras po- lb
dres. [29]
6.034 libras de mecha, das a 9 Fl / 100 f 489 // - // -
quais 600 libras po- lb
dres.
9.750 libras de estanho. a 9 Fl / 100 f 877 // 10 // -
lb
2 Caixas com moldes - f - // - // -
velhos.
1 Cadinho velho de - f - // - // -
cobre para fundir es-
tanho.
2 Moldes para balas de especulado f 70 // - // -
mosquete.
7 Caixas com cravos. - f - // - // -
300 Pás sem cabos. a 5 st f 75 // - // -
300 Facões. - f - // - // -
68 Escovilhões. [30] - f - // - // -
8 Latas com cornos - f - // - // -
para as mechas. [31]
200 Canos velhos de mos- - f - // - // -
quete.
88 Granadas preparadas a 10 st f 44 // - // -
para morteiros.
284 Granadas sem prepa- a 10 st f 142 // - // -
ração [32] para mor-
teiros.
80 Alcanzias sem prepa- a 10 st f 40 // - // -
ração. [33]

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 303-328, 2018


314 Benjamin Nicolaas Teensma

636 Balas de 24 libras =


15.264 libras [34]
70 Balas de 20 libras =
1.400 libras
17 Balas de 12 libras =
144 libras
596 Balas de 10 libras =
5.960 libras
495 Balas de 8 libras =
3.560 libras
516 Balas de 6 libras =
3.096 libras
20 Balas de 4 libras =
80 libras
_____ _____
2350 Balas na totalidade = a 6 Fl / 100 f 1770 // 5 // -
29.504 libras. [35] lb
1 Caixa velha com dois - f - // - // -
discos de bronze.
2 Caixinhas cada uma - f - // - // -
com dois discos de
bronze.
4 Amarras velhas de ar- - f - // - // -
mão. [36]
4 Amarras velhas para - f - // - // -
peças de artilharia.
[37]
2 Alavancas. - f - // - // -
80 Barras de ferro de 25 a 10 Fl / 100 f 200 // - // -
libras cada uma; mon- lb [38]
ta a 2.000 libras.
Subtotal / Transporta- 58416 // 5 //
do para a folha seguin-
te [39] →
1 Partido de ferro velho - f - // - // -
de reparos.
4 Caixinhas com velas - f - // - // -
amarelas de cera.
2 Discos de cera amare- - f - // - // -
la. [40]
1 Caixinha com velas de - f - // - // -
estearina, todas elas
rotas.

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 303-328, 2018


As “Notas Históricas e Curiosas” de Salvador Henrique de Albuquerque (2ª parte) 315

10 Pés-de-cabra. [41] a 3 Fl f // - // -
6 Caixinhas com discos - f - // - // -
de madeira e tubos
para morteiros. [42]

Encontradas no reduto abandonado pelo inimigo em 19 de feve-


reiro de 1637 [43]:

1 Canhão de bronze, a 50 Fl / 100 f 1476 // - // -


com câmara cilíndrica lb
e alma com o mesmo
diâmetro, atirando 10
libras, montado num
reparo avariado com
seu armão; pesando
24 quintais, 2 arro-
bas, 12 libras; marca-
do com o escudo de
Portugal detrás das
orelhas; abaixo deles
A.G.F..
2 Canhões de bronze especulado f 600 // - // -
encampanados atiran-
do 6 libras de ferro,
montados em dois re-
paros, marcados com
um escudo por cima
de um elmo; abaixo
estava: me fecit Mr.
Clauwer van Dun,
1632 [44].
750 Balas de mosquete. - f - // - // -
100 Balas de 10 libras. - f - // - // -
50 Balas de 6 libras. - f - // - // -
Total [45] → f 70522 // - // -

Feita na Povoação de Porto Calvo, neste dia 8 de março de 1637 [46].


+++++
+++
+
[A cópia desta lista não tinha o nome de quem a assinou]

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 339-390, 2018


COMENTÁRIOS AO DOCUMENTO

[01] Esse canhão foi descrito como metale stuck recht geboort,
cuja tradução literal seria canhão de bronze ‘diretamente furado’.
Optou-se pela tradução como canhão com câmara cilíndrica e
alma com o mesmo diâmetro. Há termos técnicos de artilharia
para esse tipo de canhão recht geboort: em inglês, straight bored
ou home bored; em neerlandês atual, rechtlopend, e em neerlan-
dês arcaico, recht-loopent.
Nota de Adler H. Fonseca de Castro: Diretamente furada: peça sem
câmara [sem câmara cônica ou de menor diâmetro que a alma
do cano]. A tradução seria essa, apesar de ser longe da tradução
literal. Talvez valha a pena uma nota explicando do que se trata,
pois essa observação só faz sentido em um documento holandês.
Os portugueses, ao contrário dos holandeses, não usavam drakes.
Drake é um canhão com uma pequena constrição no fundo da
alma (câmara), para diminuir a carga do canhão. Com uma carga
menor, a peça podia ter paredes mais finas e era, portanto, mais
leve. Peça diretamente furada implica que a alma tem o mesmo
diâmetro até o fundo, ao contrário dos drakes. Isso é bem visível
na relação peso da peça/peso da bala, que é de 194, um canhão de
peso normal para o calibre. Para um drake, seria a metade disso.
Nota de Levy Pereira: No processo de fabricação dos canhões, a
câmara e a alma dos canhões (o ‘furo’) eram retificadas com uma
broca após a sua retirada do molde de fundição.

[02] A tradução literal da especificação do tipo das alças deste


canhão é “orelhas”.
Nota de Adler H. Fonseca de Castro: Orelhas=golfinhos. Abaixo
surge uma dúvida: o autor usa “delfins”, que é o termo para a alça
que existe no meio do canhão (golfinho, em português). Ao usar
a palavra “orelhas”, parece que ele está se referindo a outra coisa.
Poderia ser uma das quatro argolas que eram usadas para levantar
os canhões, mas essas só eram usada em peças do século XVI.
318 Benjamin Nicolaas Teensma

[03] A.G.F. – sigla do fundidor deste canhão. Nota de Adler H.


Fonseca de Castro: A.G.F. = Antônio Gomes Feio. Antônio Gomes
Feio é um fundidor português do século XVII, tendo começado a
trabalhar por volta de 1610. O Museu Naval e Oceanográfico, Rio
de Janeiro, tem alguns canhões feitos por Antônio Gomes Feio.

[04] Nota de Adler H. Fonseca de Castro: Escudo diante das alças:


indicativo de peça feita no século XVI.

[05] Nota de Adler H. Fonseca de Castro: Não montada, isto é, sem


seu reparo (carreta), incapaz de funcionar.

[06] Nota de Levy Pereira: O peso dessa peça, em quintal/arroba/


libra, consta: no manuscrito B, 37/2/20; no manuscrito C, 37/1/-.

[07] Canhão com características anômalas. Nota de Adler H. Fonse-


ca de Castro: Canhão com o calibre fora do padrão – 22 libras. A
observação de que o brasão está colocado adiante dos golfinhos
indica que é um canhão feito no século XVI. Outra característica
notável é que as unidades de peso do projétil certamente são por-
tuguesas, pois um canhão de 24 [libras] holandês tem um calibre
muito maior do que um de calibre 24 português.

[08] Nota de Levy Pereira: O peso dessa peça, em quintal/arroba/


libra, que consta no manuscrito B, é 37/1/1.

[09] Alças com o formato de golfinhos. Nota de Adler H. Fonseca


de Castro: Delfim=golfinho. Delfim é o nome técnico desse tipo
de detalhe de peça.

[10] Nota de Adler H. Fonseca de Castro: O peso desse canhão


indica que ele é “reforçado”, ou seja, foi feito para disparar com
cargas maiores do que a normal.

[11] Nota de Levy Pereira: O preço unitário foi grafado no manus-


crito C a 70 GL cto, erro do amanuense.

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 303-328, 2018


Lista da artilharia e munição de guerra encontradas nos paióis das fortificações de Porto Calvo em 1637 319

[12] Nota de Levy Pereira: O peso dessa peça, em quintal/arroba/


libra, que consta no manuscrito B, é 32/-/52.

[13] Nota de Levy Pereira: Diego Mexía Felípez de Gusmán y Dá-


villa (circa 1580-1655), Visconde de Butarque e primeiro Marquês
de Leganés. Nomeado membro do Consejo de Estado em julho de
1626 e agraciado com o marquesado de Leganés em 10 de abril
de 1627.

[14] Nota de Levy Pereira: O peso dessa peça, que consta no ma-
nuscrito B, em quintal/arroba/libra, é 32/-/-.

[15] Nota de Adler H. Fonseca de Castro: Tosão – brasão da ordem


do Tosão de Ouro, ordem militar do Habsburgo. A sua presença
em um canhão português indica que o mesmo foi feito depois
da União das Coroas Ibéricas. Vide https://en.wikipedia.org/wiki/
Order_of_the_Golden_Fleece.

[16] Nota de Levy Pereira: O peso dessa peça, em quintal/arroba/


libra, que consta no manuscrito B, é 25/2/16.

[17] Nota de Adler H. Fonseca de Castro: À frente dos golfinhos,


indica, provavelmente, peça do século XVI.

[18] GWC = Geoctroyeerde Westindische Compagnie. Nota de Levy


Pereira: O peso dessa peça, em quintal/arroba/libra, que consta
nos manuscritos B e C, é -/-/176.

[19] Nota de Benjamin Teensma e Adler H. Fonseca de Castro:


Kilian Wegewaert, de Kampen [cidade da província holandesa de
Overyssel], fundidor de sinos e canhões. Há canhões dele feitos
de 1628 a 1640.

[20] Nota de Levy Pereira O peso dessa peça, que consta no ma-
nuscrito B, em quintal/arroba/libra, é 10/-/-.

[21] Nota de Benjamin Teensma, Adler H. Fonseca de Castro e

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 303-328, 2018


320 Benjamin Nicolaas Teensma

Levy Pereira: A palavra encampanado, no contexto, refere-se à


forma da câmara dessa peça, cônica, ou troncônica, descrita nos
documentos originais como clockweys [ou klokwijs]. Essa interpre-
tação vem da proposta do sr. Nico Brinck, especialista neerlandês
em artilharia antiga, em e-mail de 24 de outubro de 2017, dirigido
ao srs. Christopher Sellars e Vittorio Serafin, tratando da forma
interna dos canos desse tipo de canhões:
There are mainly three kinds of bores for cannon. See [Figura 1] att.
The top is the normal, straight bore, sometimes called home bored.
The bore of the cannon is everywhere the same.
Middle: drake bore. The powder chamber at the end of the bore is ta-
pered. Cannons with this kind of bore are called “drakes” and were
mainly used in the 17th century. In Dutch: draakstukken (drake-
pieces). In Dutch literature you can also find the term “klokwijs”
(clockwise) which means that the powder chamber resembles the
shape of a church bell. These guns would shoot mainly shrapnel.
Below: reduced bore for cannons shooting light projectiles like
stone balls (15th and 16th century) and grenades (19th century).
O sr. Vittorio Serafin, em tradução do artigo do sr. Nico Brinck in-
titulado Ordnance for the new Zeven Provinciën (https://indepen-
dent.academia.edu/NicoBrinck, acesso em 07/11/2017), em nota
do tradutor, associou esse tipo de canhão com câmara bell-shaped
aos denominados pelos espanhóis de canhão encampanado, ter-
mo que consta no DICCIONARIO DE LA LENGUA ESPAÑOLA, da
Real Academia Española, significando
2. adj. Dicho de una pieza de artillería: De ánima que se va estre-
chando hacia el fondo de la recámara.
E, em vários dicionários da língua portuguesa, encampanado significa
em forma de sino, campanulado, campanular, campanuláceo.
Assim, as frases nos manuscritos que descrevem os canhões com esse
tipo de câmara foram paleografadas e traduzidas da seguinte maneira:

Paleografadas (neerlandês arcaico) Traduzidas (português)


Een metael stuck clockwijs [klokwijs] schi- Um canhão de bronze encampanado,
etende drie lb. atirando três libras.
Twee metale stuckens clockwijs [klokwijs] Dois canhões de bronze encampanados,
schietende zes lb. ijser. atirando seis libras de ferro.

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 303-328, 2018


Lista da artilharia e munição de guerra encontradas nos paióis das fortificações de Porto Calvo em 1637 321

Destacamos que a transcrição paleográfica da palavra clockweys


[ou klokwijs] em neerlandês arcaico nos documentos originais apre-
sentou alguma dificuldade – vide a Tabela 2 abaixo – por estar estro-
piada ou corrompida na sua escrita pelos redatores e haver poucos
especialistas em termos técnicos neerlandeses sobre artilharia antiga
que a reconhecessem e interpretassem o seu significado. Exempli-
ficando, consultou-se as instituições holandesas especializadas em
artilharia, a De Nederlandse Kanonniers Vereniging e a Historische
Collectie Korps Veldartillerie, as quais, infelizmente, responderam que
desconheciam o significado de clockweys.

Tabela 2: Imagens e paleografia da palavra CLOCKWEIJS nos mss..


M a - Fol. Ocorrência da palavra CLOCKWEIJS Interpretação paleográfica
nus-
crito

Descrição do canhão
2 rl oc h wc ij 𐐋
de 3 lb
A
Descrição dos ca-
2 nhões de bronze de 6 rl oc h w ij 𐐋
lb

Descrição do canhão
2 hl oc h vl ij 𐐋
de 3 lb
B
Descrição dos ca-
2 hl oc h vl ij 𐐋
nhões de 6 lb

Descrição do canhão
2 CL oc k vc ij 𐐋
de 3 lb
C
Descrição dos ca-
4 CL oc k vc ij s
nhões de 6 lb

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 303-328, 2018


322 Benjamin Nicolaas Teensma

Figura 1 – Tipos de câmaras de canhões antigos, explicitados em termos técnicos


neerlandeses: rechtlopend stuk (canhão com câmara cilíndrica e alma com o mesmo
diâmetro), klokswijs stuk (canhão com câmara troncônica ou encampanada) e kamer
stuk (canhão com câmera cilíndrica com diâmetro menor do que a alma).

Fonte: e-mail de Nico Brinks de 24 de outubro de 2017 dirigido ao srs. Christopher Sellars e Vittorio
Serafin, imagem baseada em Van der Tollen, Gerrit: HET NIEUWE LICHT DER BOSSCHIET-
ERYE. Joannes Loot, Amsterdam, Netherlands, 1734, [acervo do National Dutch Military Museum],
pg. 67.

[22] Nota de Benjamin Teensma e Levy Pereira: Claude de Rye


Baron de Balançon e Henri Compte de Berg são os nomes dos
nobres que encomendaram e pagaram pela fundição desses
morteiros para uso no exército do rei da Espanha, Filipe IV (Filipe
III de Portugal).
Para Henri Compte de Berg, veja a comentário 24.
Claude de Rye de la Palud, Barão de Valanson, foi general de arti-
lharia a serviço da Espanha na província de Flandres. A grafia do
nome de Claude de Rye está estropiada e variada nos manuscritos,
como se pode comprovar na tabela abaixo.

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 303-328, 2018


Lista da artilharia e munição de guerra encontradas nos paióis das fortificações de Porto Calvo em 1637 323

Tabela 3: Imagem e paleografia das inscrições com o nome de Claude de Rye nos
manuscritos.
Ms. NL-HaNA Imagem da inscrição no documen- Paleografia
to

Claude de Reÿ Baros de


1.05.01.01_52_41
Balansons

Claude de Rey baron de


1.05.01.01_52_72
balange, om

Claude de Reye
1.05.01.01_53_6
baron de balancoz

Há no Musée de L’Armée, no L’Hôtel national des Invalides, Paris,


França, um canhão de bronze com alma de 12 cm de diâmetro,
fundido por IACOBI. PERDRY. VALENCENIS ( Jacques Perdry, de
Valenciennes, França) em 1638, que tem a inscrição CLAUDE DE
RYE BARON DE BALANÇON estampada. Vide a figura abaixo.

Figura 2: Imagem do canhão de bronze do Musée de L’Armée, em Paris, com a


inscrição CLAUDE DE RYE BARON DE BALANÇON.

Fonte: PETERSON, Mendel L.: Encyclopædia of markings & decoration on artillery. Edited by RO-
BERT P. A. STÉNUIT. Part IIA2, folha 39. Disponível em https://www.buei.bm/encyclopaedia-
-of-markings-and-decoration-on-artillery/, acesso em 10/2/2017.

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 303-328, 2018


324 Benjamin Nicolaas Teensma

[23] Nota de Adler H. Fonseca de Castro: Johannes sothoff = [Johan-


nes Stetthoff ] = Johannes Sithoff, diretor da fundição de Malines [ci-
dade da província de Antuérpia, Flandres, Bélgica], morreu em 1638.

[24] Nota de Adler H. Fonseca de Castro: Henri compte de Berg,


refere-se a Henri, conde de Berg-s’Heerenberg e marquês de Ber-
gen-op-Zoom (1573-1638). Comandou o exército espanhol em
Flandres de 1628 a 1630. No Brasil há um canhão de 6 libras fun-
dido por Johannes Sithoff em Bruxelas para o conde de Berg em
1627, pertencente à uma coleção particular.

[25] Nota de Adler H. Fonseca de Castro: Morteiros de armada


de bronze = morteiros de bronze de marinha ou, opcionalmente,
morteiros de bronze navais.

[26] Nota de Adler H. Fonseca de Castro: Almofarizes e mão de


pilão. Eram usados para preparar a pólvora, as espoletas ou outras
composições pirotécnicas.

[27] No manuscrito B, o amanuense anotou, por distração, 4 ca-


nhões de 6 lb.

[28] Essa peça está relacionada nos manuscritos A e B e omitida no C.

[29] Nota de Levy Pereira: Somando-se 46.395 lb de pólvora em


bom estado com 3.710 libras de pólvora deteriorada resultam em
50.005 lb de pólvora. A 100 lb de pólvora por barril, toda essa
pólvora estaria acondicionada em 500 barris.
Essa quantidade de pólvora, para exemplificar, é citada corretamente em:
- Kort em Auctentick Verhael van het beleg en veroveren van Po-
vaçon de Porto Calvo, [Descrição resumida e autêntica do Cerco e
Conquista de Porto Calvo], [Tradução de Benjamin Nicolaas Teens-
ma], [folheto impresso por] Iohan Blaev, Amsterdam, 1637. Atlas
van Stolk, n. ref. 1794: ‘Na fortaleza, achamos ... 400 pipas repletas
de pólvora fina espanhola, ...’.
- COELHO, Duarte de Alburquerque: Memorias diarias de la gverra
del Brasil, [por discurso de nveve años, empeçando desde el de M.

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 303-328, 2018


Lista da artilharia e munição de guerra encontradas nos paióis das fortificações de Porto Calvo em 1637 325

DC. XXX], Madrid, por Diego Diaz de la Carrera, Impressor del Rey-
no, año 1654, p. 246e: ‘entrò el enemigo en el Fuerte, en que no hallò
las haciendas que imaginava: lo mas fue la artilleria, i municiones.
Los barriles de polvora excediã de quinientos de a cien libras, … .
- NETSCHER, Pieter Marinus: Les Hollandais au Bresil, La Haye,
Belinfante Fréres, 1853, pg. 88: “Le butin consistait surtout en …
500 tonneaux de poudre.”
E incorretamente em:
- NETSCHER, Pieter Marinus: Os holandeses no Brasil (Op. cit.),
p. 155: ‘Consistiram em ... 500 toneladas* de pólvora os despojos
encontrados em Porto Calvo’.
(*) distração na tradução de tonneaux = pipas, barris).
- VARNHAGEN, Francisco Adolfo [Barão de Porto Seguro]: Historia
das lutas com os hollandezes no Brazil desde 1624 a 1654. Typo-
graphia de Castro Irmão, Lisboa, Portugal, 1872, Livro Quinto, p.
169: ‘Com a rendição do forte adquiriu o inimigo ... muitas muni-
ções, incluindo 500 toneladas de pólvora ...’.

[30] Escovilhão, brossen no original. Chamadas em espanhol


escobón: “Escoba que se pone en un palo largo para barrer y de-
shollinar”. [hollín em espanhol = fuligem em português]. Em por-
tuguês chama-se escovilhão, derivado do francês écouvillon.
No Dicionário da Linguagem de Marinha antiga e actual (2a ed., Lis-
boa, 1974) de Humberto Leitão & J. Vicente Lopes, acho na pág. 240:
Escovilhão: Haste comprida, de madeira, terminada por uma es-
cova cilíndrica, de diâmetro ligeiramente superior ao da alma da
peça, e que serve para se lhe limpar e lubrificar a dita alma. Pode
ser de cairo, piassaba, crina ou arame de aço.
Nota de Adler H. Fonseca de Castro: Em canhões se usa, até hoje,
um acessório em forma de escova cilíndrica. Na época, o nome
era “escovilhão”. É preso a uma haste que só permite afixar essa
escova, ao contrário da lanada, que era montada, às vezes, no ou-
tro lado da haste de um soquete.

[31] Nota de Adler H. Fonseca de Castro: Cornos para as mechas -


cada bateria de artilharia tinha uma vela de composição, que era
uma mecha de queima muito lenta, no caso, ficando protegida por

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 303-328, 2018


326 Benjamin Nicolaas Teensma

um chifre e que era usada para acender a mecha que ficava no


bota-fogo, junto da peça. A tradução literal ‘Cornos para mechas’
soa meio estranho, mas dá para saber do que se trata.

[32] Nota de Adler H. Fonseca de Castro: Granada sem preparação


- aqui a tradução pode ter dois sentidos, de “granada descarrega-
da” ou de “granada não escorvada”. Sem maiores informações, eu
diria que é “granada descarregada” pois manter granadas carrega-
das, sem espoletas, era ruim para as granadas.

[33] Nota de Levy Pereira: Alcanzia é uma granada de mão primi-


tiva, feita com um vaso de barro cozido repleto de uma mistura
explosiva, e ativada por estopim de queima lenta aceso imedia-
tamente antes do seu lançamento. Nota de Adler H. Fonseca de
Castro: Granadas de mão descarregadas (sem preparação).

[34] Nota de Levy Pereira: No manuscrito C o amanuense inverteu


os algarismos, escrevendo 42 ao invés de 24.

[35] As adições da quantidade de balas e do peso de todas as balas


estão corretas.Nota de Levy Pereira: Estranha-se constar na lista
balas de 12 lb, por não haver canhão desse calibre nela relacio-
nado, e nela não constar balas de calibres 22 lb, 18 lb, 5 lb e 3 lb.
Ainda que as somas dos pesos e a das quantidades de todas as
balas estejam corretas, constata-se haver incongruência entre os
valores informados e os calculados que ocorrem com as balas de
12 lb e 8 lb. Vide a tabela abaixo.

Tabela 4: Incongruências entre as quantidades de balas de 8 lb e 12 lb informados e


conferidas por cálculo.
Bala Peso total (lb) Comentário
Quant. Peso unit. (lb) Informado Calculado
A quantidade de balas deve-
ria ser 12 [= 144/12]. Possível
17 12 144 204
erro do amanuense trocando o
algarismo 2 pelo 7 na quantidade.
495 8 3.560 3.960 A quantidade de balas
deveria ser 445 [= 3.560/8].
Possível erro do amanuense
trocando o algarismo 4 pelo 9.

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 303-328, 2018


Lista da artilharia e munição de guerra encontradas nos paióis das fortificações de Porto Calvo em 1637 327

Com os acertos acima propostos, o inventário com o cálculo do peso


das balas possivelmente deveria ser relacionado da seguinte maneira:

636 balas de 24 libras = 15.264 libras

balas de libras = libras


70 20 1.400
12 balas de 12 libras = 144 libras
596 balas de 10 libras = 5.960 libras
445 balas de 8 libras = 3.560 libras
516 balas de 6 libras = 3.096 libras
20 balas de 4 libras = 80 libras
------- --------
2.295 balas na totalidade = 29.504 libras

[36] Nota de Adler H. Fonseca de Castro: Amarra de armão =


vergueiro. É um grosso cabo (corda), que se usa para prender
o canhão em algum lugar, para ele não recuar demais durante o
disparo. Como especifica “armão”, deve ser para prender o armão
ao reparo.

[37] Nota de Adler H. Fonseca de Castro: Vergueiro.

[38] O preço unitário escrito no manuscrito C é a 50 GL cto.

[39] Nota de Levy Pereira: há erro nesse subtotal 58416//5//-: o


valor em florim//stuiver//centavo deveria ser 58418//5//-. O ama-
nuense que calculou os valores escreveu o algarismo 6 ao invés
do 8, resultando em diferença de 2 florins.

[40] Relacionada somente no manuscrito A.

[41] Esse item consta nos manuscritos A e B e está omisso no C.

[42] Nota de Adler H. Fonseca de Castro: tubos parecem ser es-


poletas, que eram tubos de madeira cheios de composição incen-
diária. Discos de madeira podem ser “tacos” (discos de madeira
ou corda colocados entre a carga e o projétil, para vedar a alma).

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 303-328, 2018


328 Benjamin Nicolaas Teensma

[43] Nota de Levy Pereira: lista do material capturado no reduto do


cimo do morro de Amador Alvarez. Havia outro reduto, não artilha-
do, no topo do morro vizinho, e, entre eles, situava-se o acampamen-
to do Terço Napolitano.

[44] O peso delas não foi mencionado. Nota de Adler H. Fonseca


de Castro: Mr. Clauwer van Dun = M (meister) Claus von Dam.
Fundidor real, alemão, trabalhou em Hamburgo antes de ir para
a Dinamarca, onde ficou ativo de 1638 a 1655. O Museu Históri-
co Nacional (MHN-RJ) tem um drake feito por ele em 1631, com
inscrições em português e com um elmo em cima de um escudo.
Canhão de 6 libras certamente não é um canhão rodízio, é muito
pesado para isso. O elmo em cima de um escudo, como no caso
da peça do MHN, indica um canhão feito para um particular e não
para a Companhia das Índias ou para o Rei de Espanha/Portugal.

[45] Nota de Levy Pereira: Há erro nesse total 70522//-//-: o valor


em florim//stuiver//centavo deveria ser 60524//5//-. O amanuense
que calculou o total utilizou o subtotal com o erro de 2 florins a
menos apontado na nota 50, e escreveu 7 ao invés do algarismo 6.

[46] Somente o Documento A explicita, no final, local e data.

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 303-328, 2018


OS FOLHETOS DE CRISTÓVÃO ARTISCHEVSKY
NOTICIANDO O CERCO E A CONQUISTA DE PORTO
CALVO PELO CONDE DE NASSAU EM 1637

Benjamin Nicolaas Teensma

Em 2011 publicou-se na Holanda um imponente li-


vro intitulado Grote Atlas van de West-Indische Compagnie
(Grande Atlas da Companhia das Índias Ocidentais). 1 Nas
páginas 273 e 274 figuram, em tamanho grande, os fac-sí-
miles de dois panfletos com formosas vistas panorâmicas da
batalha encetada na marcha de aproximação e do sítio ho-
landês da Povoação de Porto Calvo, 2 baseadas em desenhos
do Coronel Cristóvão Artichevski 3 . Esses panfletos foram pu-
blicados em Amsterdam, respetivamente, por Jan van Hilten,
em 27 de junho, e Johan Blaeu, em meados do segundo
semestre desse ano, 4 e são raríssimos.

1 BROMMER, Bea; HEIJER, Henk den. 2011. Grote Atlas van de West-Indische Compagnie.
Deel I  : De Oude WIC, 1621-1674, Uitgeverij Asia Maior/Atlas Maior, Voolburg/Den
Haag, Netherlands.
2 Nota de Levy Pereira: Os neerlandeses mantiveram a denominação de Povoação, apesar de
Duarte de Albuquerque Coelho, Donatário da Capitania de Pernambuco, a ter elevado a vila em 12
de abril 1636, designando-a Vila do Bonsucesso de Porto Calvo. COELHO, Duarte de Albur-
querque. 1654. Memorias diarias de la gverra del Brasil, [por discurso de nveve años, empeçan-
do desde el de M. DC. XXX], Madrid, por Diego Diaz de la Carrera, Impressor del Reyno,
p. 225b.
3 Nota do autor e de Levy Pereira: Cristóvão Artichevski, militar nascido em Rogalin, Polônia, cujo
nome é grafado na documentação histórica de muitas formas, tais como Crestofle d’Artischau
Arciszewski, Krzysztof Arciszewski, e as impressas nos panfletos van Hilten e Blaeu.
4 Nota do autor e de Levy Pereira: (Panfleto A) — Auctentijck Verhael van de Belegheringhe ende
veroveringhe van Porto Calvo ... [História resumida e autêntica do cerco e captura de Porto
Calvo ...], [panfleto], Ian van Hilten, [livreiro], Amsterdam, Holanda, 27/6/1637. Scheep-
vaartmuseum, Amsterdam, Holanda. Visualização [e download] do panfleto van Hilten:
http://www.maritiemdigitaal.nl/index.cfm?event=search.getdetail&id=101001434, acesso em
10/6/2016. (Panfleto B) — Kort em Auctentick Verhael van het beleg en veroveren van Povaçon de
Porto Calvo [Descrição resumida e autêntica do Cerco e Conquista de Porto Calvo], [panfle-
to impresso por] Iohan Blaev, Amsterdam, 1637. Atlas van Stolk, n. ref. 1794. Visualização
[e download] do panfleto Blaeu:
http://collectie.atlasvanstolk.nl/data_nl.asp?startc=1&q0=55348&subj=18&bron=collform,
acesso em 10/6/2016.
330 Benjamin Nicolaas Teensma

Os eventos da marcha, do cerco, e da conquista de Porto Cal-


vo estão descritos nesses panfletos em textos extensos, peritos, um
relatório concreto, conciso e sistemático do referido acontecimento
histórico, redigidos em língua holandesa. Os textos são praticamente
idênticos e só os seus títulos diferem bastante, mas, as suas auto-
rias não estão informadas, e, por isso, apesar das suspeitas de que
também fossem de Artichevski, eles, em última análise, terminavam
sendo considerados de autoria anônima.5
O primeiro panfleto publicado, o de Van Hilten, trazia alguns er-
ros. Essa versão chegou às mãos de um funcionário da Companhia
das Índias Ocidentais (WIC), possivelmente João de Laet, Diretor,
historiador e arquivista da Companhia. Ele corrigiu os erros nos
topônimos e antropônimos e fez alguns poucos retoques na sintaxe.
Algumas demasias artichevskianas foram eliminadas por ele, e várias
alusões a João Maurício e à WIC acrescentadas6, e, em seguida, enca-
minhadas a Blaeu para publicação.

5 Nota do autor e de Levy Pereira: Os historiadores usualmente reconhecem que a gravura


é baseada em desenhos do coronel Artichevski, pois isso está explícito nos panfletos. No
entanto, não afirmam nada sobre a autoria do texto. Por exemplo, nota-se que Bea Brom-
mer e Henk den Heijer têm o cuidado de não citar quem é (são) o(s) autor(es) do texto
(Op. cit., pp. 272-274). Até agora, aos indícios para se suspeitar que se deveria atribuir a
ele a autoria do texto dos folhetos, além da precisão e rigor técnico do relato, da referência
explícita de que as gravuras dos folhetos baseiam-se num desenho de sua autoria, e de que
ele se encontrava nos Países Baixos em junho de 1637, somava-se a constatação de haver
idênticas variantes na ortografia do topônimo Sergipe na sua Memória, escrita em 1637 e
publicada na Kroniek Historisch Genootschap Utrecht, ano 25 (1869): 343/5, onde estão gra-
fadas as variantes Selegripe, Selgipe, Sellegipe, Sellegripe, Selregripe e Selregrippe. Nessa
Memória não há menção ao cerco/conquista de Porto Calvo, seguramente porque nessa
altura Artichevski já estava meditando a sua versão completa do acontecimento, reservada
para os panfletos que seriam publicados em Amsterdam.
6 Diferenças entre o texto dos dois panfletos: O parágrafo I falta inteiramente na versão A.
a) Os elementos textuais sublinhados nesta tradução da versão B diferem bastante dos que se encon-
tram na versão A. Eles são:
§ II. Graef Mauritz van Nassau, Generael van Brasil; met perfecte aenwijsinghe door letteren A, B, C
van alle de voornaemste plaetsen.
§ X. Den derden Meert is het Accoort ghesloten ende geteeckent op Conditiën hier onderaen volghende.
§ XI. t’Amstelredam. Ghedruckt voor Ian van Hilten, 1637.
§ XII. ARTICVLEN ende Conditiën besloten tusschen Sr. Miguel Giberton, Gouverneur van ‘t Porto
Povacaon in Porto Calvo van weghen sijn Majest. den Coninck van Hispangiën ter eene zijde, ende sijne
Excell. Graef Mauritius van Nassau, Gouverneur, Capiteyn, Admirael ende Generael van den staet in
Brasil ter andere zijde, den derden April 1637.

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 329-338, 2018


Os folhetos de Cristóvão Artischevsky noticiando o cerco e a conquista de Porto Calvo pelo
Conde de Nassau em 1637
331

O teor histórico destes textos ficou quase idêntico nas duas ver-
sões, a de Van Hilten, aqui denominada de A, e a de Blaeu, de B.
Filologicamente, a versão B é a melhor, e, por essa razão, o escolhi
para tradução, e, na qual, para efeito de clareza, foi adicionada a
numeração dos parágrafos com cifras romanas. No final, foram acres-
centadas notas demonstrativas das diferenças entre os textos originais
e alguns comentários, pelo autor (BNT), e por Levy Pereira (LP), ao
qual agradeço a colaboração.
Pesquisas recentes permitiram provar, sem sombra de dúvida, que
o texto dos dois panfletos foi escrito por Artichevski, pois encontrei
no Arquivo Reservado dos Estados Gerais, guardado no Arquivo Na-
cional, na Haia, um volume em quarto grande, encadernado em per-
gaminho, e, na capa dele, em letra grande, o título: W. Comp. Rapport
van Collonel Christoffel Artischauw 1637. Na sua primeira folha, se-
gue-se o subtítulo que diz Rapport van de veroveringe [= conquista]
van Porto Calvo, com a nota marginal: exhibitum 01 july 1637.7 E
seu texto, em neerlandês, que no volume segue em letra gótica ma-
nuscrita, é totalmente idêntico ao que foi publicado anonimamente
nos dois panfletos amsterdameses por Jan van Hilten e Johan Blaeu.
O relatório de Artichevsky, e esses panfletos, seguramente podem
ser identificados como fontes primárias consultadas por Gaspar Bar-
léu para a redação, no seu livro ‘História dos Feitos Recentemente
Praticados Durante Oito Anos no Brasil’,8 da narrativa encomiástica
do desempenho de João Maurício, Conde de Nassau, na campanha
de 1637, para vencer e expulsar as tropas e o governo ibérico do
território da Capitania de Pernambuco.

Tradução do texto do panfleto BLAEU.


i. [Título da gravura] Cerco e conquista da Povoação de Porto
Calvo pelos Nobres Senhores Diretores da Privilegiada Com-
panhia das Índias Ocidentais, sob a direção de Sua Excelência

7 Rapport van kolonel Christoffel Artischauw betreffende de verovering van Porto Corvo [Calvo] in Brazil-
ië. Afschrift. 1637 januari 23 - 1637 maart 8 / Exh. St.-Gen. 8 juli 1637, do acervo do Arquivo
dos Estados Gerais, cota NL-HaNA_SG 1.01.05, nº do inventário 9217.
8 Barléu, Gaspar. 1940. HISTÓRIA DOS FEITOS RECENTEMENTE PRATICADOS
DURANTE OITO ANOS NO BRASIL ... [1647], tradução e anotações de Cláudio Bran-
dão, Ministério da Educação, Rio de Janeiro, Brasil [MCMXL].

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 329-338, 2018


332 Benjamin Nicolaas Teensma

o Conde João Maurício de Nassau &c., Capitão e Almirante


General no Brasil, em fevereiro e março de 1637, segundo o
desenho do Nobre Senhor Coronel Cristóvão Artichevski.9
ii. [Título do texto] Breve e autêntico relato do cerco e conquista da
Povoação de Porto Calvo no Brasil sob a direção de Sua Exce-
lência o Conde João Maurício de Nassau &c.
iii. Sua Excelência o Conde [João] Maurício de Nassau, chegado
a Pernambuco em 23 de janeiro de 1637, retirou a maioria das
companhias veteranas das guarnições, substituindo-as por fres-
cas, empreendendo em seguida a viagem a Porto Calvo. Depois
da chegada das tropas a Sirinhaém, em 9 de fevereiro, e as rea-
grupar, marchou com elas em 12 de fevereiro ao inimigo, pas-
sando por Una, Barra Grande e outros locais frequentados pelo
inimigo; e, sem encontrar-se com ele, chegou aos postos dos
adversários, no dia 17 do dito mês, na distância de uma hora de
Porto Calvo. Lá, passaram a noite nos montes circundantes, sob
um forte aguaceiro.
iv. Na madrugada do 18 de fevereiro, recarregaram os mosquetes,
por estarem molhados, e prepararam as armas, e o inimigo fa-
zendo o mesmo, com muitas bravatas, no passo e nos montes
próximos que ocupava com muita gente. Durante toda a noite
ouvimos que estava cortando árvores no vale. No próprio passo
tinha duas fortes paliçadas munidas de parapeitos e banquetas,
e com sólidos abatises ao redor. Tão drasticamente tinha cortado
a mataria nos dois lados do passo, que nem um gato podia pas-
sar por eles. Lá, estava com 1.400 soldados, flanqueando muito
vantajosamente os montes e a mataria nos dois lados do passo.
v. No começo do ataque, algumas companhias de atiradores e Bra-
silianos foram mandadas transpor a mata pelos dois lados, mas
elas não foram bem-sucedidas nisso, e não chegaram a executar
o ataque. Então, o Coronel Artichevski, que tinha a vanguarda,
recebeu ordem de atacar o dito passo com suas trincheiras, cum-
prindo-a bem, e, num momento, foram arrancadas as paliçadas,
ocupadas as trincheiras e trucidados os ocupantes delas, sem

9 Artischowsky. — (A): passim Arischotsky. — (B): passim Artischowsky. — Nesta tradu-


ção passim: Artichevski.

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 329-338, 2018


Os folhetos de Cristóvão Artischevsky noticiando o cerco e a conquista de Porto Calvo pelo
Conde de Nassau em 1637
333

muito esforço e perdas, sobretudo graças à ação de duas com-


panhias de atiradores comandadas pelos capitães Bochart e Me-
ttinghs, e da guarda de Sua Excelência, que, tendo o privilégio
da vanguarda, e, nessa ocasião, marchavam na frente da unidade
do Coronel, executaram a parte principal da ordem. Logo, num
fôlego, o inimigo foi expulso dos montes e perseguido até as
muralhas das suas fortalezas, sem um só momento para se rea-
grupar; o que se indica pela letra A. Então, muitos oficiais dele,
que queriam manifestar-se virilmente, foram mortos, como nos
reportaram dois sargentos-mores presos. No dia seguinte, alguns
desertores nos contaram que o inimigo perdera 300 homens, ao
passo que, nesse encontro, a nossa gente só perdera 6 mortos e
23 feridos.
vi. Chegadas à vista das fortalezas deles, e vendo que ninguém saiu
para travar combate, nossas tropas foram enviadas a vários luga-
res, nos melhores sítios dos vales e dos montes ao redor dessas
fortalezas, para cercá-las. Entretanto, e antes da nossa chegada,
eles tinham incendiado todos os quarteis dos Castelhanos, Por-
tugueses e Brasilianos que se encontravam protegidos na Po-
voação de Porto Calvo pela artilharia grossa, inclusive a todas as
casas e cabanas dos moradores que, no ano passado de 1636,
lá se tinham estabelecido em grande número; retirando-se aos
quarteis do Conde de Bagnuoli, que, com 800 Italianos,10 ficava
apartado. Além da guarnição da fortaleza grande, cerca de 3.500
militares permaneceram na Povoação ou Vila de Porto Calvo. Os
quarteis e as casas incendiadas indicam-se por P.P.P..11 Na noite

10 (B): met 100 Italianen. — (A): met 800 Italianen. Nota de Levy Pereira: O panfleto A (van
Hilten) deve estar correto. Em 1631, Bagnuoli desembarcou na Barra Grande com 300
soldados do terço napolitano que fora do Marquês de Torrecuço (FREIRE, F. B.: Nova Lu-
sitânia – História da Guerra Brasílica, Oficina de João Galrão, Lisboa, 1675, Livro Nono,
§403, p. 210; §404, p. 211; §424, p. 222). Em 30 de novembro de 1635, desembarcaram
mais 400 napolitanos na Ponta de Jaraguá, trazidos pela esquadra de Castela de D. Lopo
de Hozes, e nessa ocasião haviam mais 190 dessa nação (italiana) que assistiam no Brasil
(FREIRE, F. B., Op. cit., §683, p. 358). O acampamento do terço Napolitano situava-se
no vale a nor-noroeste e distando cerca de 1,2 quilometro do Forte da Povoação, entre
os baluartes construídos por Bagnuoli nos cimos de dois morros, sendo o mais próximo
conhecido como o morro de Amador Alvarez.
11 As casas incendiadas indicam-se por P.P.P. — (A): De afghebrande huysen werden aenghewesen
by letter O.P.P.E.

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 329-338, 2018


334 Benjamin Nicolaas Teensma

seguinte, desapercebidamente, o Conde de Bagnuoli, Duarte de


Albuquerque e todo o exército abandonaram seu reduto B, dei-
xando nele três peças de bronze e alguma munição. Também
deixaram o reduto C e o quartel italiano D,12 abandonando nele
pilhas de bagagens e de víveres.
vii. No dia 19 de fevereiro cedo, tendo Sua Excelência saído para
melhor reconhecer a situação do terreno, um destacamento foi
mandado para reconhecer os lugares abandonados [pelo inimi-
go] durante a noite, mas, graças a Deus, pouco antes de entra-
rem nele, o reduto B explodiu, ardilosamente preparado para
esse efeito pela guarnição do forte grande, que, depois da saída
do Conde de Bagnuoli, tinha estado nele para inutilizar as três
peças abandonadas e colocar mechas acesas ao lado da pólvora,
para que explodisse no momento em que nossa gente, conforme
esperavam, estivesse dentro dele. Nossa gente, no entanto, sou-
be tirar-lhes os encravos rapidamente.
viii. Nesse dia, e no seguinte, nossos regimentos foram realocados
em outros acampamentos, desta maneira: — A OESTE, o Co-
ronel Artichevski se estabeleceu no declive do monte ao lado
da colina ou monte do forte grande, na distância de um tiro de
mosquete dele, no lugar marcado pela letra F, fora do alcance
do forte, o que permitiu o seu sítio, com a metade do seu regi-
mento a um lado, e a outra metade ao outro lado da planície,
dispondo, desse modo, da chã para instalar uma bateria. — A
LESTE, acamparam o Almirante Lichthart com a sua tropa de
marinheiros, também dividida em duas partes: metade na ilha G,
para garanti-la para nossos barcos e víveres, que subiam o rio
até o lugar marcado com H, e também para construir e defender
a ponte I; e a outra metade foi metida longe, do outro lado da
ponte, na direção do forte grande; ao sopé do monte, no sítio
marcado pela letra K, para construir e garantir uma bateria L, de
duas peças, nesse monte. — Ao SUL, acamparam o regimento
do Governador Skop, na margem do riacho N do passo grande
a Camaragibe, e a este regimento destinaram a grande igreja,
marcada M, para construir nesse lugar uma bateria, marcada O,

12 O reduto C e o quartel italiano D. — (A): haer Reduyt geteeckent met letter D.

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 329-338, 2018


Os folhetos de Cristóvão Artischevsky noticiando o cerco e a conquista de Porto Calvo pelo
Conde de Nassau em 1637
335

de duas peças, e abrir o aproche MM em direção ao Forte. — Ao


NORTE, acampou-se durante alguns dias o novo regimento de
Sua Excelência, que realocaram depois no sítio marcado Q, ao
sopé da colina ocupada por Artichevski, de modo que Sua Ex-
celência veio alojar-se no quartel do Coronel, no sítio marcado
pela letra R. — Do lado NORTE, no sítio S, no passo aonde nossa
gente tinha chegado, mantiveram sempre duas a três compa-
nhias na guarda. Depois de nossa gente estar assim acampada,
cada comandante começou a executar sua tarefa.
ix. O Coronel Artichevski abriu sua trincheira RFTV, o aproche
FWX, preparou a bateria F para três peças, e mantinha sempre
duas companhias na guarda no lugar da meia-lua Y,13 no declive
do monte, para garantir o aproche na eventualidade de o inimi-
go querer atacá-lo. — O Almirante Lichthart, que não tinha que
construir trincheiras ou aproches, iniciou o preparo da bateria L,
onde, no 23 de fevereiro, morreu o capitão Duinkerker pelo tiro
de em projétil de ferro de grande calibre. — O Governador Skop
preparou a bateria O com seu aproche PP, que não concluíram
pela dureza do solo nessa zona. — No 27 de fevereiro, o Almi-
rante com sua bateria, e, no 28, o Governador Skop com a dele,
começaram a dar fogo com suas baterias, mas, no princípio,
sem causar muito dano aos adversários. De resto, os artilheiros
deles apontavam tão corretamente que nenhuma vez suas balas
deixaram de acertar os tiros. Certa vez, com uma só bala — com
a morte de quatro marinheiros — eliminaram um meio-canhão
da bateria do Almirante. — No primeiro de março, também a
bateria do Coronel Artichevski começou seu canhoneio com três
peças, e nesse dia morreu nela o capitão Carlos de Nassau, atin-
gido por um projétil de ferro de grosso calibre.
x. No 2 de março, Sua Excelência reclamou a entrega da fortaleza,
exigência que, em seguida, os sitiados começaram a parlamen-
tar. No dia 3 de março, concluiu-se o acordo, redigido e assinado
em francês, tal qual o traduzimos quase literalmente. Mas, nesse
dia, o inimigo ainda não saiu da fortaleza, por já estar tarde; só
quatro companhias dele postaram-se diante da porta da forta-

13 No lugar da meia-lua Y. — (A): bij de halve Mane met letter X geteeckent.

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 329-338, 2018


336 Benjamin Nicolaas Teensma

leza. No dia 4 de março, todo o exército deles colocou-se em


ordem de batalha em frente da fortaleza, donde marcharam aos
barcos. Sua tropa compunha-se, no total, de aproximadamente
550 pessoas.14 Na fortaleza, achamos 20 canhões de bronze, qua-
tro morteiros grandes, várias peças de ferro,15 montões de balas
grandes e granadas de mão, perto de 2.000 alcanzias,16 400 pipas
repletas de pólvora fina espanhola, grande quantidade de balas,
e toda classe de armas brancas. Nos dias 5 e 6, foram alhanados
os aproches, trincheiras e baterias. Parte das tropas foi mandada
a Camaragibe para perseguir o inimigo, mas, este não foi encon-
trado lá, porque rapidamente se tinha dirigido ao Rio São Fran-
cisco, sem deter-se em nenhuma parte, nem em Alagoas.
xi. No dia 8, Sua Excelência, com fortes destacamentos, dirigiu-se
aos navios que estavam em Barra Grande, para de lá velejar às
Alagoas. O Coronel Artichevski, citado por Sua Majestade El-Rei
da Polônia, e vendo que já não tinha mais nada que fazer, des-
pediu-se de Sua Excelência e do exército, dirigindo-se ao Recife,
para de lá seguir à Pátria, cumprida sua comissão, e sem deixar
vestígio espanhol no país entre os Rios Grande e São Francisco.
No dia 2 de abril, embarcou-se na Paraíba, e, ainda antes dele
zarpar, chegaram cartas dizendo que Sua Excelência se achava
nesse momento no sul de Alagoas, e que nossas tropas não

14 Nota do autor e de Levy Pereira: A carta de João Maurício de Nassau, escrita na Povoação
de Porto Calvo, em 8 de março de 1637, ao [Conselho dos] XIX Diretores da Companhia
das Índias Ocidentais, na Holanda (Haia, Arquivo Nacional, Velha Companhia das Índias
Ocidentais: NL-HaNA_OWIC 1.05.01.01, número do inventário 52, número consecutivo
15) cita que 300 militares espanhóis e 110 napolitanos se renderam, assim, incluiu-se nesses
550 citados cerca de 140 civis (mulheres, crianças e escravos). Os neerlandeses devem ter
computado alguns militares portugueses como espanhóis – segundo F. B. Freire (Op. cit.,
Livro Nono, § 757, p. 396) os capitães portugueses João Rodrigues de Souza, Leonardo
de Albuquerque, André de Melo e Miguel do Rego, e, presumivelmente, alguns soldados
portugueses sob suas ordens, estavam no Forte.
15 Nota do autor e de Levy Pereira: As listas do material bélico capturado em Porto Calvo
citam 19 canhões de bronze, 5 canhões de ferro e 5 morteiros (Arquivo Nacional, Haia,
Ms. HaNA_OWIC 1.05.01.01, nº do inventário 52, nº consecutivo 41, e Ms. HaNA_OWIC
1.05.01.01, nº do inventário 52, nº consecutivo 72).
16 Nota do autor e de Levy Pereira: As listas do material bélico capturado em Porto Calvo
(Op. cit.) relacionam 80 alcanzias [= granadas de mão], 88 granadas para morteiro prepara-
das e 284 granadas para morteiro sem preparação.

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 329-338, 2018


Os folhetos de Cristóvão Artischevsky noticiando o cerco e a conquista de Porto Calvo pelo
Conde de Nassau em 1637
337

tinham encontrado nenhum inimigo neste lado do Rio São Fran-


cisco, porque ele já tinha atravessado esse rio a caminho de
Sergipe d’El-Rei.17
Em Amsterdam, por Johan Blaeu, 1637.
xii. ARTIGOS concluídos entre o Senhor Miguel Giberton, Governa-
dor da Fortaleza da Povoação de Porto Calvo por parte de Sua
Majestade El-Rei de Espanha, por um lado; e Sua Excelência,
João Maurício, Conde de Nassau, Catzenelbogen &c., Governa-
dor, Capitão e Almirante-General do Estado do Brasil, por parte
dos Excelentíssimos Senhores Diretores da Privilegiada Compa-
nhia das Índias Ocidentais, por outro lado, no dia 3 de abril18 de
1637.
1. O Governador se comprometerá a entregar a nosso poder
a Fortaleza com toda sua artilharia, munição de guerra e
artigos afins, hoje, às quatro horas.
2. Os Oficiais e Reformados sairão com suas bandeiras19; os
soldados com suas armas, mechas acesas, balas na boca,
batendo tambores e bandeiras desfraldadas; e ninguém dos
nossos os molestará ou desonrará de qualquer modo, e aqui
se embarcarão levando consigo 200 libras de pólvora, 200
libras de mecha e 200 libras de balas de mosquete.
3. Os Oficiais e Reformados levarão consigo as vestimentas
particulares, bagagens, e coisas que lhes pertencem. Mas,
encontrando-se neles bens pertencentes ao Conde de Bag-
nuoli, Duarte de Albuquerque ou a outro qualquer, o que
quer que seja, ficarão à nossa disposição; e se alguém levar
consigo qualquer dos chamados objetos que não lhe per-
tençam, perderá igualmente os mesmos, e ficará preso.
4. Quanto aos Negros: cada um ficará com os seus, mas resti-

17 Sergipe d’El-Rei. — (A): Selregrippe del Rey. — (B): Seregrippe del Rey.
18 A data dos artigos da rendição impressa nos panfletos Blaeu e van Hilten é 3 de abril de
1637. Todavia, a data correta é 3 de março de 1637, como consta nos manuscritos: HaNA_
OWIC 1.05.01.01, nº do inventário 52, nº consecutivo 12, com esses artigos redigidos em
neerlandês, e HaNA_OWIC 1.05.01.01, nº do inventário 52, nº consecutivo 13, com eles
redigidos em francês. Rapport van kolonel Christoffel Artischauw (Op. cit.), com esses artigos
redigidos em francês.
19 Bandeiras. — (A): Vaandragers = [alferes].

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 329-338, 2018


338 Benjamin Nicolaas Teensma

tuirá aos nossos aqueles que fugiram de nós.


5. As Mulheres levarão seus vestidos e bagagens, sem apode-
rar-se de bens alheios, sob a acima mencionada pena de
serem detidas.
6. Os sitiados serão providos de navios e víveres necessários
para a viagem às ilhas Santo Domingo ou Espanhola.20
7. Os doentes e feridos serão levados à Ponta de Jaraguá21 e
providos de medicamentos.
8. No que se refere aos Religiosos, eles sairão com todas suas
propriedades e objetos eclesiásticos, sem apoderarem-se de
bens alheios.
9. Os condestáveis sairão com sua palamenta.
10. Poderão levar consigo a ossada de Dom Luiz [de Rojas y
Borja] para onde quer que seja.
11. Os desertores do nosso lado serão perdoados, e o mencio-
nado Governador livrará e entregará todos os presos nossos
que tenha em seu poder.
12. Ainda se conceder, ao acima-mencionado Governador, uma
peça de artilharia com suas balas apropriadas de dez livras,
e sua palamenta.
13. Todos estes artigos foram concluídos e acordados por am-
bos lados, e confirmados com subscrições e selos. Feito
como dito, e foi subscrito:

J. M. Conde de Nassau
e Senhor Miguel Giberton.

20 Nota do autor e de Levy Pereira: O documento HaNA_OWIC 1.05.01.01, nº do in-


ventário 52, nº consecutivo 12, cita esse mesmo destino, ilhas no Caribe, no entanto, o
HaNA_OWIC 1.05.01.01, nº do inventário 52, nº consecutivo 13, traz a informação de que
o destino seria a Ilha Terceira, no Arquipélago dos Açores. Gaspar Barléu (Op. cit., pg. 39)
informa que ‘Concedeu-se aos soldados da guarnição ... a faculdade de partirem e retirarem-se de batida
para a ilha do Recife e dali para a Hispaniola e para os lugares das Índias Ocidentais que escolhessem
ou para a Ilha Terceira. ... Rumaram todos para a Ilha Terceira, que é a principal dos Açores ou Ilhas
Flamengas’.
21 Jaraguá. — (A): Garagua. — (B): Iaragoa.

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AS “NOTAS HISTÓRICAS E CURIOSAS”
DE SALVADOR HENRIQUE DE ALBUQUERQUE
2ª PARTE

Tácito Luiz Cordeiro Galvão1

Resumo: Continuação da transcrição das Notas Históricas e curiosas


referentes aos séculos 16º, 17º e 18º contendo assentos de batizados,
de casamentos, de óbitos, testamento, escrituras, cartas de sesmarias,
doações e outros escritos, que se achavam dispersos em fragmentos
quasi destruídos e ininlegíveis; os quais vão aqui copiados, para se
conservar a memória do que elas continhão. A compilação é atri-
buída ao sócio fundador Professor e Major Salvador Henrique de
Albuquerque, Secretário Perpétuo do Arqueológico. No texto a seguir
oferecemos algumas informações a respeito da vida do Major Salva-
dor Coelho de Drumond e Albuquerque, também sócio efetivo desse
Instituto. A seguir, daremos continuidade as transcrições de mais cem
documentos do códice em pauta.

Palavra-chave: Pernambuco. História. Assento eclesiástico.

The “Historical and Curious Notes” of Salvador Henrique de


Albuquerque
Part II

Abstract: Second part of the transcription of the codex entitled Histo-


rical and Curious Notes referring to the 16th, 17th and 18th centuries
containing seats of baptisms, marriages, deaths, testaments, deeds,
letters of sesmarias, donations and other writings, which were found
scattered in almost destroyed and unreadable fragments; which are
copied here, in order to preserve the memory of what they contain.
The compilation is attributed to the founding partner Professor Sal-
vador Henrique de Albuquerque, who was Perpetual Secretary of
the IAHGP. In the following text we offer some information about
the work of Albuquerque. We also offer the transcription of the first
hundred documents of the aforementioned codex.

1 Associado Benemérito e 2o Secretário do IAHGP.


340 Tácito Luiz Cordeiro Galvão

Keywords: Pernambuco. History. Ecclesiastical seat.

No volume 69 (2016) dessa revista, apresentamos o Secretário Per-


pétuo desse Instinto, o segundo desse título, Major Salvador Henri-
que de Albuquerque, professor, historiador, ilustre e esforçado sócio
fundador, que procurou elucidar a história pernambucana, reunindo
documentos originais ou cópias, a fim de que se pudesse estudar e
divulgar nossa história.
Como forma de perdurar a existência documental, mandou e
coordenou os amanuenses do Instituo o jovem Demétrio Accacio de
Albuquerque Mello e Antônio Cavalcanti de Albuquerque Pimentel,
a cópia de vários documentos históricos, e, de certa forma curiosos,
para o pouco conhecimento histórico que se tinha na época, nascen-
do assim os dois volumes das Notas Históricas e Curiosas referentes
aos séculos 16º, 17º e 18º...
Boa parte das documentações até então arrecadadas, Salvador
Henrique conseguiu através de doações de seus parentes, principal-
mente depois do falecimento do Major Salvador Coelho de Drumond
e Albuquerque, pertencentes ao falecido e doados por seu sobrinho
Luiz Ferreira Bandeira de Melo, que encaminhou ofício que fez par-
te do expediente da sessão de 5 de agosto de 1869, e na sessão do
dia 19 do mesmo mês e ano, foi lido pelo então 2º Secretário, como
veremos adiante.
Afinal, quem é esse falecido Major Salvador Coelho de Drumond
e Albuquerque, guardião de tão importante conjunto documental, ne-
cessário para a construção da história das Capitanias de Pernambuco
e anexas? Realmente não podemos deixar passar no anonimato essa
interessante figura, que durante muitos anos de sua vida, dedicou-se
a história com o intuito de provar o seu parentesco com a grande
figura da Restauração de Pernambuco, o Mestre de Campo e Gover-
nador das Armas João Fernandes Vieira, um dos quatro heróis da
história pernambucana, muito vislumbrado na época da fundação do
Instituto.
Naquela época o Major Salvador Coelho, ocupava parte de seu
tempo com genealogia, e como esmero genealogista, entrevistava
pessoas e pesquisava nas Igrejas e cartórios a fim de descobrir suas
origens. Como qualquer pesquisador e genealogistas, lia e anotava,

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 339-390, 2018


As “Notas Históricas e Curiosas” de Salvador Henrique de Albuquerque (2ª parte) 341

quando não transcrevia as documentações a ele apresentadas. Anun-


ciava nos jornais, prometendo gratificar as pessoas que lhe apresen-
tasse documentações de seu interesse. Com isso, conseguiu juntar
muitos documentos importantes de interesse histórico, principalmen-
te envolvendo figuras de sua genealogia.
Estava atento as notícias históricas advindas de outros pesquisa-
dores. Foi convidado a participar da sessão de fundação do Instituto,
mas, infelizmente, compromissos importantes não o permitiram dar
sua presença. Na sessão seguinte, de 23 de outubro de 1862, foi eleito
sócio efetivo do Instituto Arqueológico e Geográfico Pernambucano
- IAGP2, e muito suplicou a diretoria para o considerá-lo sócio funda-
dor, mas seu pedido foi indeferido.
Teve papel fundamental junto as Comissões criadas pela diretoria
do IAGP, para desvendar o local ou a casa onde faleceu o Mestre de
Campo João Fernandes Vieira, assim como o carneiro de seu sepulta-
mento, baseando-se nas documentações que tinha em seu poder. Por
tradição oral, absorvera muitas histórias, principalmente de sua tia d.
Maria do Ó e Mello, que morava na casa da Rua do Mosteiro de São
Bento, na qual Salvador Coelho também residiu, fazendo companhia
a sua tia, durante o período inicial de sua carreira militar como Ca-
dete. Entre as diversas oralidades passadas por sua tia, lhe referia por
vezes, que seu pai, dele Cadete, o Ajudante de Ordens dos governa-
dores José César de Menezes e D. Thomaz José de Mello, alugara o
referido sobrado para sua residência em Olinda.
Salvador Coelho de Drummond e Albuquerque, era natural da
freguesia de Nossa Senhora do Rosário de Goiana, nascido no dia 23
de março de 1798, gêmeo com seu irmão Antônio, sendo batizado na
capela do engenho Dois Rios da mesma freguesia de Goiana, pelo
Reverendo José Barbosa de Vasconcelos, sendo feito este assento no
dia seis de abril de 1832, tendo como padrinhos Domingos de Abreu
e dona Rita3. Era filho de Salvador Coelho Serpa de Drummond e de

2 Diário de Pernambuco, ed. nº 246 de 24 de outubro de 1862.


3 “Aos 6 de Abril de 1832, me foi entregue hum mandado do Rmo Dr. Prior Miguel José
para abrir assento de batismo de Antonio da Silva Pereira de Lacerda e Salvador Coelho de
Drumond e Albuquerque, filhos legítimos do falecido Salvador Coelho Serpa de Drumont
e de Dona Clara Cezar Bandeira de Mello, visto ter o dito justificado peranti mim terem
ambos nascidos aos vinte e três de março de mil sette centos e noventa e oito e terem sido

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 339-390, 2018


342 Tácito Luiz Cordeiro Galvão

sua mulher d. Clara Cezar Bandeira de Mello; neto, por via pater-
na, do Capitão Salvador Coelho de Drummond e Albuquerque e de
sua mulher d. Mariana Bezerra Pessoa; e, por via materna, neto do
Sargento José de Mello Cezar de Andradee de d. Helena da Cunha
Bandeira de Mello.
O Sargento José de Melo César de Andrade, por sua vez, era filho
de outro José de Melo César de Andrade, Cabo da Fortaleza de Pau
Amarelo, e de sua mulher d. Mariana Bezerra de Azevedo; neto, por via
paterna, do Capitão mor Jerônimo César de Meloe de sua mulher d. Ma-
ria Joana Cesar, esta filha bastarda do Mestre de Campo João Fernandes
Vieira, havida em d. Cosma Soares; e, por via materna, neto do lendário
Capitão mor de Igarassu Antônio da Silva Pereira e de sua mulher d.
Anna Bezerra Pessoa, ficando assim comprovado ser o Major Salvador
Coelho pentaneto do Mestre de Campo João Fernandes Vieira.
Salvador Coelho viveu sua infância na freguesia de Goiana e, pos-
teriormente, passou para a cidade de Olinda, onde viveu a maior
parte do tempo. Durante toda sua vida se dedicou a carreira militar,
e foi administrador do Morgado de Paratibe de Cima. Assentou praça
de voluntário em 17 de janeiro de 1822, e, no mês de setembro do
mesmo ano foi reconhecido cadete, e serviu no oitavo Corpo de Arti-
lharia de Posição do Recife4. Em janeiro de 1835, ainda como Cadete,
estava lotado no 4º Corpo de Artilharia de primeira linha do Recife5.
Na mesma ocasião, fazia parte da relação dos cidadãos selecionados
para jurados no 3º Distrito do Carmo, da cidade de Olinda (PE)6.
Em janeiro de 1836, na qualidade de administrador do Morgado
de Paratibe, vem a público mostrar que, apesar das providências
tomadas a respeito do desmatamento clandestino nas matas do re-
ferido Morgado, mesmo movendo questões judiciais, precisava da

batizados na Capella do Engenho Dous Rios da freguesia de Goiana, pelo Reverendo José
Barbosa de Vasconcellos, sendo padrinhos de Antonio, o Capitão Luiz Carlos Pereira e
Dona Feliciana; e de Salvador, Domingos d’Abreu e Dona Rita, de que para constar abri
este assento que assignei. O Cura João Maxado Freire” (Freguesia da Sé de Olinda, Batiza-
dos, Livro 1822-1845, p. 79).
4 Diário de Pernambuco, ed. nº 5 de 8 de janeiro de 1829, p. 19, coluna Aviso Particular.
5 Id. Ibid., ed. nº 590 de 27 de janeiro de 1835, p. 1, coluna Governo da Província – Expe-
diente do dia 19.
6 Id. Ibid., ed. nº 98 de 5 de junho de 1835, p. 2.

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 339-390, 2018


As “Notas Históricas e Curiosas” de Salvador Henrique de Albuquerque (2ª parte) 343

cooperação dos proprietários das terras vizinhas, que costumam dar


permissão para os cortes de madeiras, lenhas, fatura de carvões7...
O Morgado ou Vínculo de Paratibe de Cima, foi instituído pelos
irmãos Coronel Francisco Berenguer de Andrade e d. Luiza de An-
drade, que compraram a Capela do Pilar, que então se titulava “Ca-
pela da Conceição”, uma das do Mosteiro de São Bento de Olinda,
por escritura lavrada em 15 de março de 1703, em notas do Tabelião
Jorge da Costa Calheiros, “nesta muito nobre e sempre leal cidade de
Olinda, Capitania de Pernambuco”.
“... e logo pelo dito Reverendo Padre Dom Abbade, Prior e mais
religiosos do dito convento foi dito em minha presença, e das teste-
munhas ao deante nomeadas e assignadas, que elles são Senhores e
possuidores da capella que antigamente os Religiosos deste Mosteyro
haviam concedido, ou obrigado a Dona Izabel de Albuquerque, para
nella ser sepultada somente, e por sua morte estar livre, e para pode-
rem dispor della como tudo consta de seu testamento; e por que os
ditos Religiosos, depois da restauração desta praça reedificaram a dita
capella como sua que He, diceram elles vendedores a vendiam, como
com efeito vendido tem a dita compradora Dona Luzia de Andrada e
seo irmão o coronel Francisco Berenguer de Andrade para sempre,
para nella serem sepultados, e ter a sua sepultura para elles, seos ir-
mãos, filhos e mais descendentes de todos elles, e seus herdeiros por
preço e quantia de duzentos mil réis, para que desde logo possam
os ditos compradores uzar e tratar da tal capella como sua que He,
e reformar a sepultura e carneiro della, e por nellas campa com suas
armas no lugar mais conveniente”...8
Essa mesma capela do Pilar e depois da Conceição, foi erguida
atendendo pedido de d. Izabel de Albuquerque, mulher solteira, mo-
radora no Mosteyro de Nossa Senhora da Conceição de Olinda, filha
do falecido Capitão, por alcunha, o Torto, que doara todos os seus
bens de raiz e móveis para os religiosos do Mosteiro de São Bento de
Olinda, por escritura lavrada em 14 de fevereiro de 1608, nas notas
do tabelião Simam Varella.

7 Id. Ibid., ed. nº 10 de 14 de janeiro de 1836, p. 4, coluna Aviso Particular.


8 Revista do IAHGP, vol. XLI, 1946-1947, “O Tombo do Mosteiro de São Bento de Olin-
da”, p. 79.

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 339-390, 2018


344 Tácito Luiz Cordeiro Galvão

A referida Capela só foi concluída no início de 1611, e, por escritura


pública de compra lavrada em 17 de fevereiro de 1611, pelos religiosos
do Mosteiro de São Bento foi entregue a d. Izalel de Albuquerque,
“... huma capella colateral das grades a dentro, que a dita Dona
Izabel lhe encomendara, da qual athe hoje lhe nam tinha dado couza
alguma, senam que o Mosteyro a tinha feito por sua custa, por lhe
fazerem a vontade da dita Dona Izabel, a qual estava acabada, e se
obrigam por esta escriptura a lhe darem a dita Capella para sempre,
como de feito dam para sua sepultura e para transladarem a ella os
ossos de seu pay Hieronimo de Albuquerque e de sua may Dona
Cosma, que Deos tem,”...9
Vários foram os administradores deste vínculo, entre eles o Tenen-
te José de Mello César e d. Anna Maria do Ó e Mello, mulher que foi
do morgado Capitão mor Francisco Camello Pessoa, que falecera sem
deixar filhos, no ano de 1835. Salvador Coelho, por seu requerimento
se habilitou para a administração do vínculo uma vez que era parente
da dita falecida, vindo a tomar posse no dia 13 de maio de 1835.
Um ano depois, também vem a público alertar as pessoas para
que não façam negócios com o Sr. Elias Thomaz, principalmente com
um terreno situado no lugar do arrombado, próximo ao porto do
desembarque das madeiras, cujo terreno havia arrendado ou aforado
ao Sr. Thomaz, morador em Olinda10.
Ainda na qualidade de administrador do referido vínculo, em 19
de agosto de 1837, mais uma vez vem a público esclarecer que, to-
mou conhecimento através do Diário de Pernambuco edição nº 170
do dia 8 passado, do ofício do Presidente da Província comunicando
ao Sr. Inspetor da Tesouraria, que os Alemães da Colônia de Santa
Amélia, abandonaram a mesma, e que as casas em que moravam,
mandadas fazer as custas da Fazenda Pública, se achavam bastantes
arruinadas...como proprietário das terras onde foi erguida a Colônia,
faz ciência ao Sr. Inspetor que não as tendo por si, nem por seus pas-
sados cedidos em doação, arrendamento ou outro qualquer contrato
ao Governo, claro é que não pode pessoa alguma estabelecer domi-

9 Revista do IAHGP, vol. XLI, 1946-1947, “O Tombo do Mosteiro de São Bento de Olin-
da”, p. 77.
10 Diário de Pernambuco, ed. nº 150 de 14 de julho de 1837, p. 3, coluna Aviso Particular.

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As “Notas Históricas e Curiosas” de Salvador Henrique de Albuquerque (2ª parte) 345

cílio em ditas terras sem estar previamente movida do competente


papel de arrendamento ou de foro11.
Ainda em julho de 1839, ocupava o posto de Cadete na cidade do
Recife. Naquela ocasião foi encarregado por sua prima Anna Izabel
Pessoa da Silveira, viúva do Tenente Francisco Antônio da Silveira,
a quem muito confiava, para arrecadar fundos para ela e seus oito
filhos12...Só no dia 2 de dezembro de 1839, por Decreto, foi promo-
vido a 2º Tenente Ajudante do Forte do Buraco, e, por Decreto de 18
de julho de 1841, foi promovido ao posto de 1º Tenente de Artilharia
efetivo do Recife.
Em meados de janeiro de 1843, seu nome constava na relação dos
jurados da cidade de Olinda, ao lado do nome do Professor Salvador
Henrique de Albuquerque13.
Salvador Coelho, encaminhou requerimento ao Presidente da Pro-
víncia, por ocupar o posto de Ajudante do Forte do Buraco, pedindo
o pagamento do abono da gratificação mensal no valor de quatro mil
réis (4$000), que lhe foi suprimido, desde maio do ano de 1842, a 9
de janeiro de 184314.
Em 12 de dezembro de 1843, como administrador do Morgado,
vem a público denunciar que os escravos do Tenente Coronel Fran-
cisco de Paula Souza Leão, a beira da estrada da Mirueira, em um
lugar pertencente ao Vínculo de Paratibe que ele administra, os re-
feridos escravos derrubaram um pau de Sucupira, que há anos se
conserva15...
No final da década de 1840, houve constantes nomeações e subs-
tituições aos vários postos. Pela Ordem do dia nº 3, Salvador Coelho
foi promovido pelo Estado Maior da 2ª Classe, do posto de Tenente
para o de Capitão graduado, por Decreto de 7 de setembro de 1847.
No ano seguinte, o comandante das Armas, por ofício publicado no
Expediente de 22 de março de 1848, dá-se por inteirado de haver S.
Exc. ter nomeado ao posto de Capitão Ajudante, a fim de substituir

11 Diário de Pernambuco, ed. nº 178 de 19 de agosto de 1837, p. 2-3.


12 Id. Ibid., ed. nº 145 de 8 de julho de 1839, p. 3.
13 Id. Ibid., ed. de 27 de janeiro de 1843, ano XIX, p. 3.
14 Id. Ibid., ed. nº 166 de 3 de agosto de 1843.
15 Id. Ibid., ed. nº 268 de 12 de dezembro de 1843, p. 3.

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346 Tácito Luiz Cordeiro Galvão

o Major Sérgio Tertuliano Castelo Branco que foi comandar interi-


namente a fortaleza do Brum16... Em seguida, por portaria de 12 de
maio do ano seguinte de 1848, foi nomeado interinamente, para ocu-
par o posto de Ajudante do Diretor do Arsenal da Guerra17. Ainda
naquele ano, no dia 15 de junho, forampublicadas as aprovações das
nomeações interinas do Sr. Tenente Coronel Antônio Gomes Leal,
para Diretor do Arsenal de Guerra desta Província de Pernambuco,
e do Sr. Capitão Salvador Coelhode Drumond e Albuquerque, para
Ajudante da Diretoria do mesmo Arsenal18.
Como Capitão graduado do Estado Maior da 2ª classe, em 18 de
junho de 1850, foi nomeado pelo Imperador Pedro II para Comandar
o Forte do Brum na cidade do Recife de Pernambuco. Em seguida,
retornou para o Forte do Buraco. Por aviso do Ministério da Guerra
de 27 de julho de 1852, foi transferido daquele Forte para a Fortaleza
de Nossa Senhora dos Prazeres de Pau Amarelo, no lugar de João
Marinho Paes Barreto. Em abril de 1857, ainda ocupava o posto de
Capitão Comandante do Forte de Pau Amarelo19.
Estava atento a todas as situações tanto militares como familia-
res, principalmente como administrador do morgado de Paratibe de
Cima, que veio a prestar contos do referido morgado até o ano de
1854, não o fazendo mais por ter o processo desaparecido do Cartó-
rio do escrivão José Antônio Serpa.
Achamos a seguinte publicação:
“Os abaixo assinados, Salvador Coelho de Drumond e Albuquer-
que e José de Mello Cesar de Andrade, filhos da falecida D. Clara
Cesar Bandeira de Mello, vendo no Diário de Pernambuco nº 34 de
12 de fevereiro último o anuncio do Sr. José Cesar de Albuquerque,
encarregado da liquidação da casa de seu falecido sogro o Sr. tenente
coronel Manoel Gomes da Silva, proprietário do engenho Gramame,
previnem ao mesmo Sr. Cesar, que o dito seu sogro era devedor a
mencionada mãe dos abaixo assinados da quantia de 200$000 réis,

16 Id. Ibid., ed. nº 68 de 26 de março de 1849


17 Id. Ibid., ed. nº 109 de 15 de maio de 1848.
18 Id. Ibid., ed. nº 133 de 15 de junho de 1848, p. 2, ano 25.
19 Id. Ibid., edições nos 158, 192 e 77 de 21/06/1850, 27/08/1852 e 4/04/1857, respectiva-
mente.

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As “Notas Históricas e Curiosas” de Salvador Henrique de Albuquerque (2ª parte) 347

que houve por herança em parte da dívida que o mesmo Sr. Manoel
Gomes da Silva contrahio com a falecida D. Anna Maria do Ó Mello,
proveniente de renda da propriedade do Maranguape, como tudo
consta dos respectivos autos de inventário, e que finalmente ficam
arranjando os documentos comprobatórios desta dívida, afim de que
juntos aos autos que deve-se estar procedendo, mande o competente
Sr. juiz sejam os abaixo assinados atendidos e verifiquem assim o
pagamento da dívida de que se trata. Recife 6 de março de 1858 =
Salvador Coelho de Drumond e Albuquerque = José de Mello Cesar
de Andrade”20.
Na época da Guerra do Paraguai, Salvador Coelho fez doação de
dez mil réis (10$000) por mês, deduzido do seu salário, para auxi-
lio da Guerra, a contar de 1º de março de 1865, “enquanto durar a
guerra”21...
A partir de 1º de janeiro de 1866, Salvador Coelho passou a Co-
mandar o Forte do Buraco, conforme ordem do dia nº 178 de 28 de
dezembro de 1865. No ano seguinte, o Marechal Comandante das Ar-
mas faz público nomear o Major Barros para ocupar o Comando do
Forte do Buraco no lugar que ocupava o Major reformado Salvador
Coelho de Drumond e Albuquerque, agradecendo a este a maneira
satisfatória com que se houve no referido comando durante o tempo
que exerceu interinamente. Em seguida, o mesmo marechal deter-
mina que o Capitão reformado reverta para o Comando do Forte de
Pau Amarelo, que deixou de exercer por ter tomado interinamente
o Forte do Buraco, conforme ordem do dia, nº 215 de 15 de março
de 186622.
“Atenção – O abaixo assinado, querendo prevenir que na proprie-
dade do Vínculo denominado Paratibe de Cima e Mirueira, do qual
é consenhora a mulher do abaixo assinado, por falecimento de seu
irmão o major Salvador Coelho de Drumond e Albuquerque, alguém
se sirva de seu nome, e faculdade sua para tirar madeiras ou fabricar
carvão nas matas da dita propriedade; pelo presente faz público a

20 Id. Ibid., ed. nº 55 de 9 de março de 1858.


21 Id. Ibid., ed. nº 59 de 13 de março de 1865.
22 Id. Ibid., edições nos 299, 55 e 62 de 30/12/1865, 8/03/1866 e 16/03/1866, respectiva-
mente.

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348 Tácito Luiz Cordeiro Galvão

qualquer dos interessados na conservação das matas da mesma pro-


priedade, que não concede, como não concedeu ainda, semelhante
faculdade, pelo que podem os ditos interessados proibir a quem quer
que, sob esse falso pretexto de consentimento do abaixo assinado, se
queira utilizar de ditas matas. Assim também fazem público o abaixo
assinado e sua mulher, que estão dispostos a contratar por venda a
parte que tem em dita propriedade: quem pois, quiser negociá-la,
deve dirigir-se à esta vila, onde residem, certo do que não autorizem
a pessoa alguma para contratá-la. Vila de Igarassu, 1º de junho de
1869 = Alexandre Ferreira dos Martyres”23.
O Major Salvador Coelho de Drummond e Albuquerque faleceu
da vida presente, no dia 1º de dezembro de 1868, em sua residência,
na freguesia de São Pedro Mártir da cidade de Olinda, aos 70 anos de
idade, vítima de uma paralisia24, com seu solene testamento redigido
em 17 de maio de 1867, como segue abaixo. Teve seu inventário
iniciado no dia 15 daquele mês e ano, em cujo testamento declarou
ser solteiro e sem descendência; nomeando para seu primeiro testa-
menteiro sua sobrinha Maria das Neves Fernandes Vieira Pessoa, na
falta sua afilhada d. Luciana Joaquina de Barros, e por terceiro, sua
cunhada, Joanna Wanderley Pessoa de Mello. Foram seus herdeiros
e legatários, seus irmãos e sobrinhos, e suas últimas vontades foram
assim redigidas:
“Em nome de Deus, Amém. Saibão quanto este meu testamento
virem, que sendo no anno do Nascimento de Nosso Senhor Jesus
Cristo de mil oito centos e sessenta e sete, aos dezessete de maio
nesta cidade de Olinda, em casa de minha residência, Freguesia de
São Pedro Mártir, eu Salvador Coelho de Drumond e Albuquerque,
estando doente, porém em meu perfeito juízo e claro entendimento,
e em plena liberdade, temendo a morte, por não saber quando Deus
me quererá levar, quero fazer, como de facto faço este meo testa-
mento, para por elle dispor os bens que possuo da maneira seguinte.
Primeiramente encomendo a minha alma a Deos todo poderoso, que
que a criou e remio com o seo precioso sangue e rogo a sempre
virgem Maria Nossa Senhora, aos Anjos da minha guarda, a todos os

23 Id. Ibid., ed. nº 125 de 4 de junho de 1869.


24 Jornal do Recife, edição de 7 de dezembro de 1868.

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As “Notas Históricas e Curiosas” de Salvador Henrique de Albuquerque (2ª parte) 349

Santos da Corte do Céo, com especialidade ao Santo do meo nome,


queiram interceder agora e na hora da minha morte a Deos Padre
todo poderoso, para que queira receber a minha alma em sua gloria,
pois que sou Christão Catholico, Apostólico, Romano, e na lei de Je-
sus Christo tenho vivido e pretendo morrer. Declaro que sou natural
da cidade de Goianna, desta Província de Pernambuco, filho legítimo
do Comandante de Ordenança Salvador Coelho Serpa de Drumond e
sua mulher Dona Clara César Bandeira de Mello, já falecidos. Declaro
que sou solteiro, e que neste estado tenho vivido, e não tenho filhos
alguns. Declaro que para minhas testamenteiras nomeio em primeiro
lugar a minha sobrinha e afilhada Dona Maria das Neves Fernandes
Vieira Pessoa, filha do meu finado irmão e amigo Francissco Camello
Pessoa de Mello, em segundo lugar nomeio a minha afilhada Luciana
Joaquina de Barros, filha natural da finada Delfina Maria das Dores,
e Joaquim de Barros, outrora soldado e meu camarada em lugar no-
meio a minha cunhada e comadre Dona Joanna Wanderley Pessoa de
Mello, mai da minha primeira testamenteira, e a todas pesso e rogo
que, por serviço a Deus e a mim mercê queiram ser minhas testa-
menteiras, agentes e procuradoras da minha fazenda para o que lhes
concedo todos os poderes em direito conhecidos. Declaro que em
minha casa nasceu um menino de nome Placido Athilano Coelho de
Drumond, filho da crioula Mônica Maria da Conceição, liberta, antes
do nascimento do mesmo Placido, por carta que lhe passei e existe
em minha gaveta, sendo por isso o referido Placido e seos irmãos
livres, por terem nascidos de ventre livre; e rogo a minha primeira
testamenteira, que logo que eu falleça entregue dita carta sobre dita
Monica para que faça da sua pessoa e desse os filhos o uso que lhe
convier. Declaro que o meu funeral e bens d’alma ficará a disposição
da minha testamenteira. Declaro que deixo a minha segunda testa-
menteira Luciana Joaquina de Barros a quantia de trezentos mil reis.
Declaro que deixo a meu menino Placido acima declarado, a quan-
tia de trezentos mil réis, como legado; e deixo a sua mãe Monica a
esmola de duzentos mil réis para ajudar a criar todos os filhos dela,
inclusive o mesmo Placido. Declaro que tenho posto o dito Placido
no estudo elementar, e que, pelo amor paternal que lhe tenho, em
razão de o haver criado em meus braços como filho, quero que ele
continue a estudar a custa do remanescente da minha fazenda, e se

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350 Tácito Luiz Cordeiro Galvão

não quiser estudar, ou querendo, não provar aproveitamento, será o


remanescente dividido entre ele Placido, a minha primeira e segunda
testamenteira, visto que, neste caso os instituo por meus herdeiros:
sendo porém a divisão feita em proporção ao legado de cada um.
Declaro que em mil oito centos e trinta e cinco, tendo falecido a mi-
nha querida tia, aliás prima Dona Anna Maria do Ó e Mello, sem her-
deiros alguns forçados, habilitei-me no Juizo de Capellas desta cidade
de Olinda para suceder-lhe como de facto lhe succedi em um vínculo
de terras que ella administrava em Paratibe de Cima em cuja posse
passífica permaneci por espaço de dois anos sendo depois turbado
por ambiciosos que, por acção de força e injusto julgamento, obti-
veram posse de uma porção dessas terras, onerando-me de enormes
despesas. Declaro que, além da perturbação acima dita, tenho sofrido
outra em o sitio denominado Agoa de Curral pelo Major Joaquim de
Sá Cavalcanti de Albuquerque, cujas agressões tenho desprezado, por
serem distribuídas de fundamento. Declaro que o referido Vínculo
será dividido entre as pessoas a quem por direito competir. Declaro
que fiz a propriedade Merueira uma boa casa de madeira que parece
ser de pedra e cal, a qual deixo para a minha primeira testamenteira,
e para o menino Placido acima dito, em partes iguais. Declaro que o
Coronel Joaquim Cavalcanti de Albuquerque me é devedor de uma
letra da quantia de um conto, cento e noventa e cinco mil e quinhen-
tos réis, e juros de um e meio por cento ao mês, constantes da mesma
letra existente em meu poder. Declaro que a referida letra será co-
brada depois da minha morte, sem a diminuição de alguns juros, que
eu quisera fazer ao dito Coronel, pois que só pagando ele a letra em
minha vida, para o meu tratamento de saúde como lhe pedi, poderá
gozar das diminuições, que eu lhe que será fazer. Declaro que José
de Mello Cesar de Andrade me he devedor da quantia de oito centos
e doze mil réis, por título de hipoteca, e com juros de um e meio
por cento ao mês; e quero que esta dívida seja cobrada somente em
metade; ficando porém eu livre de restituir a parte do espolio do meo
finado irmão João Fernandes Vieira pertencente ao mesmo José de
Mello na importância de cem mil réis pouco mais ou menos. Decla-
ro que o Coronel Francisco de Paula Souza Leão me he devedor da
quantia de cem mil réis, pouco mais ou menos, resto de um arrenda-
mento que lhe fiz de minhas terras, para tirar lenhas, como princípio

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 339-390, 2018


As “Notas Históricas e Curiosas” de Salvador Henrique de Albuquerque (2ª parte) 351

de cultura. Declaro que entreguei ao Doutor José Bento da Cunha


Figueiredo pai, um recibo, para receber do dito Coronel a referida
quantia, e que o mesmo Doutor me declarou não haver recebido isto
sem mais outras explicações. Declaro que o Major Joaquim de Sá
Cavalcanti de Albuquerque também me he devedor de cem mil reis
pouco mais ou menos de resto de um arrendamento, que me fez do
sitio Água do Curral como conta do seu título de arrendamento, e se
eu não cobrar esta dívida em minha vida, bem como a do Coronel
Souza Lial, digo Souza Leão, quero que as minhas testemunhas co-
brem e dividam entre si e o menino Placido, em partes iguais. Decla-
ro que sou também credor de Caetano Telles de Menezes, da quantia
de cento e quarenta e um mil, quatro centos e oitenta e nove réis por
título de letras e juros de um e meio por cento ao mês. Declaro que
chamei o mesmo Telles á conciliação por dita letra, e que elle respon-
deu não poder pagar na occasião; e tudo que elle não pague em mi-
nha vida, quero que as minhas testemunhas cobrem para si e para o
menino Placido, em partes iguais. Declaro que sou credor do Capitão
Francisco das Chagas Cavalcanti Pessoa da quantia de duzentos mil
réis, digo, da quantia de duzentos e doze mil reis, por título de letra,
com juros de um e meio por cento. Declaro finalmente que a tempos
dei uma vaca com cria a minha primeira testamenteira, para ser sua
com toda a sua produção; e assim se fará antes e depois da minha
morte. Desta forma tenho feito o meo testamento, e rogo a justiças de
sua Majestade Imperial hajão de supprir quaisquer clausulas que aqui
deixarem de ser mencionadas, por que as leis por expressadas, como
se de cada uma fosse especial menção; pois que sou contente que
só este valha como nelle se contem; quando menos como codicillo,
e revogo qualquer outra disposição em contrário. E por me ser difícil
escrever pedi ao Bacharel Domingos Soriano Fernandes Soares, este
escrevesse, em que me assigno de meo próprio punho. Era ut supra.
= Salvador Coelho de Drumond e Albuquerque”.
O termo de aprovação foi lavrado no mesmo dia, na cidade de
Olinda, pelo escrivão Felippe do Nascimento de Faria. O termo de
apresentação foi lavrado no dia 3 de novembro de 1868, na cidade de
Olinda e o termo de aceite está datado de 5 de dezembro daquele ano,

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352 Tácito Luiz Cordeiro Galvão

lavrado na cidade de Olinda, na Rua da Senzalla de Santa Thereza25.


Na sessão ordinária de 19 de agosto de 1869, do Instituto Ar-
queológico, o 2º Secretário Major Salvador Henrique de Albuquerque
apresentou e faz a leitura da seguinte relação dos documentos ofer-
tados pelo Sr. Luiz Ferreira Bandeira de Mello, outrora pertencente a
seu finado tio o Major Salvador Coelho de Drumond e Albuquerque,
sendo recebida esta oferta com especial agrado... Acreditamos que os
documentos constantes nesta relação, sejam os mesmos doados na
sessão anterio do dia cinco. Apesar de fazerem parte do Catálogo de
Manuscritos do Instituto, infelizmente, 30 dos 54 documentos ofere-
cidos não chegaram ao nosso tempo, ou, estão misturados a outros
acervos, e não forão localizados na Coleção Instituto Arqueológico,
inicialmente organizada pelo Secretário Perpétuo Mario Melo, no pe-
ríodo de 1925-1927, e, posteriormente, reorganizada diversas vezes.
Os documentos doados foram os seguintes26:
(1) Autos cíveis entre partes, capitão João de Oliveira de Espinosa,
seus irmãos e D. Maria Cesar, viúva de João Fernandes Vieira, sobre a
reivindicação de um sobrado na Rua dos Judeus (hoje Rua da Cruz do
Recife) que Espinosa e seus irmãos pretendiam e conseguiram afinal (**).
(2) 1679 - Fragmentos de um livro de assentos de batismo da fre-
guesia de Nossa Senhora da Apresentação da capitania do Rio Gran-
de do Norte de 1679-1711 (*).
(3) 1718 - Fragmentos de uns autos em que vem o testamento do
capitão mor Jerônimo de Albuquerque Cavalcanti de Lacerda, e uma
sentença de excomunhão maior a seu filho o testamenteiro o Alcaide
mor Manoel Cavalcanti do Albuquerque e Lacerda por não ter dado
contas do dito testamento em 1718 (**).
(4) 1746 - Carta de arrematação do Passo da Barreta, de que to-
mou posse Agostinho Cardoso Moreno em 1746 (**).
(5) Inventário feito amigavelmente entre partes o sargento mor D.
Francisco de Onha e Mendonça e o capitão Arnáo de Holanda Bar-
reto, como herdeiro de sua falecida filha D. Luiza da Cunha, mulher
daquele D. Francisco (**).

25 IAHGP, Arquivo e Coleção Orlando Cavalcanti, caixa 149, inventário do Major Salvador
Coelho de Drumond e Albuquerque.
26 Diário de Pernambuco, ed. nº 177 de 6 de agosto de 1869.

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As “Notas Históricas e Curiosas” de Salvador Henrique de Albuquerque (2ª parte) 353

(6) Certidão do testamento com que faleceu o coronel João da


Cunha Pereira, senhor do engenho S. Braz do Cabo (**).
(7) 1707 - Testamento com que faleceu em 1707 o capitão João da
Cunha Pereira, feito de mão com sua mulher D. Constança Maneby (**).
(8) Certidão de vários documentos extraídos do testamento de D.
Luiza de Leão, viúva do coronel José Cardoso Moreno (**).
(9) Autos cíveis de Força Nova entre partes como autores o ca-
pitão mor Francisco Camelo Pessoa e sua mulher D. Maria do Ó e
Mello, e como réus o capitão mor Bernardo Raymundo de Sousa e
sua mulher D. Antônio Maria Pereira (**).
(10) 1715 - Testamento com que faleceu em 1715 D. Luzia de
Andrade, viúva do João de Freitas Correia e filha de Francisco Be-
renguer de Andrade e de sua mulher D. Joanna de Albuquerque (**).
(11) 1747 - Autos de apelação cível para Relação do Estado do
Brasil, sobre a posse do uma casa na Rua da Penha e chãos sitos
nesta então vila de Santo Antônio do Recife, em 1747, sendo apelante
o capitão José da Silva Mendonça e apelado o licenciado Manoel de
Lemos Ribeiro (**).
(12) 1705 - Auto de vistoria feita nas terras do engenho do Giquiá
de que eram senhores Álvaro Barbalho Uchoa e seu irmão Antônio
Borges Uchoa, moradores na freguesia da Várzea, termo de cidade de
Olinda, capitania do Pernambuco, ano de 1705 (**).
(13) 1754 - Testamento com que faleceu D. Ignez Pessoa em 1754
no engenho de Goiana, a qual era solteira e filha legitima do capitão
Bento Correia do Lima o de sua mulher D. Cosma Pessoa (**).
(14) Justificação de Manoel Feliz Vieira Cavalcanti para haver os
bens de sua prima D. Feliciana Thereza de Araújo, viúva do tenente
Antônio Carlos Magalhães Castelo Branco, falecida em Olinda sem
testamento e sem descendentes (**).
(15) 1780 - Autos da apelação cível para a Relação da Bahia em
1780; apelante Mathias Alves Ferreira e apeados Domingos Alves de
Freitas e seu irmão Francisco Alves Ferreira; sobre uma doação que
fizera a mãe dos litigantes Feliciana de Freitas Bacelar viúva (**).
(16) 1749 - Fragmentos de um livro de eleições da irmandade do
S. João Batista dos militares em Olinda, dos anos de 1749 a 1793 (*).
17) 1689 - Mandado de pagamento da Câmara do Olinda, ao seu
tesoureiro o capitão Feliciano de Mello da Silva, em julho de 1689, a

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354 Tácito Luiz Cordeiro Galvão

favor do capitão Antônio Fernandes de Matos da quantia de 220$000,


que se lhe devia pela conservação das pontes do Recife e da Boa
Vista, sendo então vereadores: João Cavalcanti de Albuquerque, Sal-
vador Correia de Lacerda, Matheus de Sá, Manoel da Fonseca Rego e
Pedro Ribeiro da Silva (*).
(18) Requerimento de Miguel José de Almeida Ferreira Braga Per-
nambuco, como testamenteiro do ajudante José Peixoto do Abreu, pe-
dindo a remoção para si do deposito de dois escravos do falecido, que
tinham sido penhorados pelo Tribunal da Mesa da Consciência (**).
(19) 1836 - Sentença cível de apelação contra o apelado Salvador
Coelho de Drumond e Albuquerque; sendo apelante a Fazenda Pú-
blica, em 1836, relativa ao vinculo das terras de Paratibe estragadas
pela Colônia de alemães que ali mandara o governo estabelecer (*).
(20) 1837 - Sobre sentença cível que no Tribunal da Relação alcan-
çou a Fazenda Pública contra o apelado embargante Salvador Coelho
de Drumond e Albuquerque, em 1837 (*).
(21) 1782 - Carta executória vinda de Lisboa por bem da Real
Fazenda e Repartição dos Contos extintos da Mesa da Consciência,
contra os herdeiros de Jacintho Coelho Alvarenga em 1782 (**).
(22) 1703 - Carta de El-Rei de Portugal ao governador de Pernam-
buco Francisco de Castro Moraes em setembro de 1703, sobre as
fortificações da Costa, especialmente a de Pau Amarelo (**).
(23) 1706 - Certidão de verias ordens regias sobre a criação do
juízo da coroa de 1706 a 1713 e uma lei de 1765, sobre o mesmo
objeto (**).
(24) 1842 - Papel de arrendamento do sítio do Fundão em terás do
vínculo de Paratibe, pelo tempo de um ano feito pelo administrador do
mesmo vínculo Salvador Coelho de Drumond e Albuquerque, em 11 de
junho de 1842, ao tenente coronel Francisco de Paula de Souza Leão (*).
(25) 1837 - Outro papel de arrendamento de outras terras do mes-
mo vínculo do Paratibe feito ao referido tenente coronel Souza Leão
em dezembro de 1837 (**).
(26) 1867 - Rascunho de um testamento que de seu próprio punho
fez o major Salvador Coelho de Drumond e Albuquerque em 10 de
maio de 1867 (**).
(27) 1768 - Genealogia da família dos Cunhas até 1768, aumentada
até 1887 por um curioso (**).

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 339-390, 2018


As “Notas Históricas e Curiosas” de Salvador Henrique de Albuquerque (2ª parte) 355

(28) 1817 - Certidão do testamento com que faleceu o Dr. Francisco


de Brito Bezerra Cavalcanti de Albuquerque, aos 5 de agosto do 1817 (**).
(29) Razões de um advogado sobre o vínculo do engenho Inhamã
instituído pelo seu proprietário o Padre Manoel Fernandes Vieira, fa-
cultando, todavia, ao seu testamenteiro o capitão mor Jerônimo Cesar
de Mello, transferir por outros bens o referido engenho (*).
(30) 1789 - Sentença cível de Força Nova do capitão mor Francis-
co Camelo Pessoa e sua mulher D. Anna Maria do Ó e Mello, contra
Francisco Xavier de Moraes e sua mulher, em 1789 (*).
(31) 1779 - Certidão dos bens que se deram a inventário por fale-
cimento do padre Luiz Cesar de Mello, passada em 1779 (**).
(32) 1750 - Cópia do contrato do corte de Pau Brasil em 1750 com
Ignacio Januário de Andrade (*).
(33) 1865 - Relatório sobre o Forte de Pau Amarelo em 1865 dado
pelo seu comandante o major Salvador Coelho de Drumond e Albu-
querque (*).
(34) Assentos genealógicos das famílias César de Mello, Bandeira
de Mello, Camelo Pessoas e outras (*).
(35) Assentos sobre Duarte Coelho Pereira, Donatário do Pernam-
buco e seus descendentes; famílias dos Cavalcantis de Albuquerque,
Albuquerque Mello e outras (**).
(36) 1787 - Autos de agravo cível de instrumento sobre parte das
terras do Maranguape sendo agravante o capitão mor Francisco Ca-
mello Pessoa e agravado o prior do Carmo de Olinda, em 1787 (**).
(37) 1705 - Certidão de duas escrituras, uma de hipoteca assinada
por D. Maria Cesar, viúva de João Fernandes Vieira; aos 20 de de-
zembro de 1686; outra de paga e entrega de terras em Maranguape,
assinada em 19 de março de 1705, pelo coronel Francisco Berenguer
de Andrade, irmão e testamenteiro de D. Maria Cesar, a favor do ca-
pitão mor Jerônimo Cesar de Mello (*).
(38) Certidão de termos de irmãos da Santa Casa de Misericórdia
de Olinda, com que justificou o capitão Salvador Coelho de Dru-
mond e Albuquerque ser trineto de João Fernandes Vieira (*).
(39) 1652 - Cópia por tabelião de três cartas de El-Rei D. João IV
escrita a João Fernandes Vieira, datadas em Lisboa a 1ª em 17 do
setembro de 1652, a 2ª em 26 de setembro de 1653 o a 3ª em 29 do
abril do 1654 (*).

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 339-390, 2018


356 Tácito Luiz Cordeiro Galvão

(40) 1686 - Escritura de dote que fizeram em 7 do setembro do


1686, o capitão mor Agostinho Cesar de Andrade, sua mulher D. Lau-
ra de Mello e seu filho Jerônimo Cesar de Mello, em favor de Pedro
Cavalcanti de Albuquerque para casar com a filha dos dois primeiros
D. Thereza de Mello e Andrade (**).
(41) 1686 - Escritura de doação assinada por D. Maria Cesar em 3
de novembro de 1686, a favor de seu irmão o tenente Manoel Dias de
Andrade, da importância que lhe restava pela compra dos engenhos Mo-
linote de Nossa Senhora da Piedade e Santo Antônio de Jaguaribe (**).
(42) 1692 - Escritura de venda e transpasso de herança que fez Miguel
Leitão de Albuquerque, em 16 de março de 1692, ao coronel Francisco
Berenguer de Andrade, em que chegam até riacho Lava Tripas (*).
(43) 1682 - Escritura de dote que fez D. Maria Cesar, viúva de João
Fernandes Vieira, ao capitão mor Jerônimo Cesar de Mello para casar
com D. Maria Joanna Cesar, filha natural do dito Vieira, em 15 de
junho de 1682 (*).
(44) 1697 - Escritura de venda que em 17 de janeiro de 1697, fez
D. Luzia do Andrade, viúva do capitão João de Freitas Correia, ao ca-
pitão mor José Cardoso Moreno, dos engenhos Tibiri de cima e Tibiri
de baixo da Paraíba (*).
(45) 1656 - Duas cartas d’El-Rei de Portugal dirigidas á Câmara
de Olinda, uma o 1º do junho de 1656, em que exige informações
sobre o estado da matriz do Salvador (catedral de Olinda) cujo vi-
gário pedia-lhe providencias para o concerto da mesma igreja por
estar quase inutilizada; outra datada em 26 do janeiro de 1755, co-
municando a mesma Câmara, ter nomeado a João Fernandes Vieira
superintendente das fortificações da Capitania de Pernambuco e das
mais do Norte (*).
(46) 1675 - Procuração bastante passada na Várzea, no dia 1º de
outubro de 1675, constituindo procurador na vila das Alagoas do
Norte e Sul a José Tavares de Araújo; e assinada de próprio punho,
por D. Thomazia Bezerra Pessoa, viúva de João Ribeiro, seu filho
padre João Ribeiro Pessoa, seu genro e capitão Nuno Camello e sua
mulher D. Ignez Pessoa, Joanna Barrosa, o capitão Braz de Araújo
Pessoa e sua irmã Luzia de Araújo Pessoa (*).
(47) 1711 - Escritura de arrendamento que fez do seu engenho
Diamante sito em Goiana no dia 5 de fevereiro de 1711, D. Feliciana

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 339-390, 2018


As “Notas Históricas e Curiosas” de Salvador Henrique de Albuquerque (2ª parte) 357

Vidal de Negreiros ao coronel Leonardo Bezerra Cavalcanti; assinada


de próprio punho pelo procurador da arrendatária Dr. Pedro Ferreira
Brandão, e como rendeiro o referido coronel (*).
(48) 1768 - Portaria do governador de Pernambuco, Conde de Villa
Flor, datada de 22 de fevereiro do 1768, nomeando a Salvador Coelho
de Drumond, para o posto de capitão do uma das companhias de
cavalos do distrito da vila de Igarassu (*).
(49) Papel de doação de um escravo feita por D. Leonardo Bezer-
ra Cavalcanti de Albuquerque, a seu neto Salvador Coelha Serpa de
Drumond Cavalcanti, o qual era filho do capitão Salvador Coelho de
Drumond e Albuquerque (**).
(50) 1747 - Carta patente, pela qual a rainha de Portugal em 11 de ou-
tubro de 1747, houve por bem confirmar Salvador Coelho de Drumond,
no posto de capitão de cavalos do distrito da Vila de Igarassu (*).
(51) 1766 - Certidão do testamento com que faleceu o capitão
Antônio da Costa Leitão Arnoso, feito em 6 de janeiro de 1766 (*).
(52) 1746 - Testamento com que faleceu D. Julianna de Drumond,
deixando por seu testamenteiro a seu filho o capitão Salvador Coelho
de Drumond datado em 26 de junho do 1746 (**).
(53) 1787 - Carta Regia de Brasão de Armas de Nobreza e Fidal-
guia, impressa em pergaminho, com o desenho colorido das mesmas
armas, concedida ao Dr. Francisco do Brito Bezerra Cavalcanti de
Albuquerque, em 8 de janeiro de 1787 (**).
(54) 1791 - Provisão Regia de 11 do maio de 1791, mandando a
requerimento de José de Mello Cesar de Andrade tombar e medir as
terras de Maranguape27 (*).

(*) doc. localizados na Coleção Instituto Arqueológico.


(**) doc. não localizados no acervo do IAHGP.

27 Jornal do Recife, ed. nº 190 de 20 de outubro de 1869, ano XI, p. 1.

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358 Tácito Luiz Cordeiro Galvão

“Cópia de Apontamentos Históricos”

“101. Em um livro de Obitos da Freguesia de N. Senhora da Luz,


a folhas sette verso, achei o seguinte assento: Aos 24 de Junho de
1703 falleceu o Capitão Manoel da Motta Silveira, e foi sepultado na
Igreja de N. S. do Carmo, fez testamento e deixou por testamenteiros
seus filhos e genros; a saber – o Capitão Christovão de Barros Rego e
o Licenciado Manoel da Motta Silveira, o Capitão João Cavalcanti de
Albuquerque e o Capitão Manoel da Rocha Lima. Deixou os legados
seguintes: a todos os sacerdotes que lhe dissessem missa de corpo
presente lhes decem a dez tustões pela Missa e que se dissessem no
tempo o Officio e logo se fez, e que se pagassem também as Missas
que nesse dia se dissessem sem por sua alma a dez tustões, e que
dessem ao seu Vigário dez mil reis por dez Missas, e as cinco chagas
e Paixão de N. Senhor Jesus Christo, e cinco a Virgem Santíssima e
que se mandassem dizer pelos Conventos dos Mendigantes cem Mis-
sas de Corpo presente que se pagassem a pataca, e que dessem seus
testamenteiros a sua parochia de N. Senhora da Luz para alguma ne-
cessidade e 30@ de assucar branco as quais entregarião ao Rdo. Paro-
cho da dita Freguesia; deixou a seu filho natural Manoel da Motta 200
arrobas de assucar branco pagos nas duas safras seguintes depois da
sua morte; deixou o seu mulato Gabriel forro, e ao molatinho José;
deixou a sua neta Archangela filha de sua filha D. Izabel dous mil
cruzados pago de sua terça todas as vezes que tomar estado; deixou
por herdeira do remanescente de sua terça a sua mulher D. Catharina
de Barros somente por sua vida; deixou no Codecillo duas capellas
de missas pelas almas dos seus defuntos; deixa que lhe casem uma
afilhada filha de Manoel de Oliveira do Caruaru, e lhe dessem uma
peça de escravo e um vestido; deixa que se case um orfan por nome
Helena de Abreu filha de Joanna Veloza e se lhe dará outro tanto;
deixa que se dê ao Rdo. Vigário Apolinário Moreira cem mil reiz para
adjutório de dotar uma sobrinha sua;deixa que forrem um dos filhos
de Domingos Correa por serem filhos de uma sua escrava Luiza com
a qual o dito se casou ao depois de haver os ditos filhos, com pro-
messa de ser forra do dito testador e elle a forrou em sua vida; deixa
aos seus testamenteiros que a todo tempo que elle quiser forrar os

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 339-390, 2018


As “Notas Históricas e Curiosas” de Salvador Henrique de Albuquerque (2ª parte) 359

outros filhos dando o seu valor, o facão; deixa a seu filho o licencia-
do Manoel da Motta 200$ rs pagos a [...] cada anno. De tudo fiz este
assento em que assignei. O Vigário Apolinário Moreira.” (p. 72/74)
“102. A folhas 38 do mesmo livro acima está o seguinte assento
da mulher do Capitão Manoel da Motta. Aos 16 do mês de fevereiro
do dito anno (1724) falleceu D. Catharina de Barros Rego com os sa-
cramentos necessários; fez testamento no qual instituiu por seus tes-
tamenteiros a seus filhos o Capitão Mor Christovão de Barros Rego,
o Coronel João Cavalcanti e o Licenciado Manoel da Motta Silveira,
o qual aceitou. Declarou por sua alma 7 capellas de Missas, duas ao
seu Vigário e as mais a elleição de seus testamenteiros, deixou mais
dissessem Missas de Corpo presente todos os Clérigos e se achem no
seu enterro; deixou mais algumas missas e obras pias a eleição dos
seus testamenteiros de que fiz este assento. O Vigário Antonio Tho-
maz Ferreira.” (p. 74)
“103. Carta de doação lançada nesta nota, a requerimento de par-
te. Saibão quanto este público instrumento de sesmaria e doação
lançada nesta nota a requerimento de parte, virem que no anno do
Nascimento de nosso Senhor Jesus Christo de 1641, aos 7 dias do mês
de Fevereiro do dito anno, nestes limites de Muçurepe, Freguesia de
Sam Lourenço, Termo da Villa de Olinda, Capitania de Pernambuco,
na Fazenda de Balthazar Gonçalves, onde eu Tabelião fui; estando
elle ali presente, me foi apresentada a carta de sesmaria e doação
adiante escripta, requerendo-me que por bem e conservação de sua
justiça, lhe deitasse nesta nota, e della lhe desse os translados que
lhe fossem necessário; a qual por estar sem ter vicio nem cousa que
duvida faça lh’a deitei o translado de verbo adverbum, que é o se-
guinte: Jerônimo de Albuquerque, Capitão Governador desta Capita-
nia de Pernambuco, pelo Sr. Duarte Coelho Capitão Governador della
por El’Rei Nosso Senhor. Faço saber a quantos esta minha Carta de
Sesmaria e doação for mostrada e o coehecimento della com direito
pertencer, em como a mim me enviou dizer pela sua petição João
Baptista, que há oito annos elle Suppe. é morador nesta Capitania, ora
pretende viver e povoar na dita Capitania e tem comprado peças de
escravos para fazer fazenda e lavoura e não tinha terra para o poder
fazer; pelo que me pedia lhe fizesse mercê de dar mil braças de terra
em quadro, ao longo da testada, dádiva de Antonio Martins Alfaiate,

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 339-390, 2018


360 Tácito Luiz Cordeiro Galvão

nos limites de Muçurepe, ao longo do rio de Capibaribe, da banda


do norte; e vista a sua petição e pedir, puz nella por meu despacho:
Passem Carta ao Suppe. de quinhentas braças de terrade testada e
seis centas de cumprido, não sendo dada na parte que pede; e sendo
dada as tomará por diante, onde não for dada até o presente, onde
melhor correr e elle quizer tomar. Aos 23 de Janeiro de 1577. Pelo
que hei por bem e me apraz de dar e doar deste dia para todo o
sempre ao dito João Baptista, para elle sua mulher e filhos e netos e
herdeiros ascendentes e descendentes, e para todas as pessoas que
após elle vierem e delles a houverem; para que logrem e possuão a
dita terra e della e em ella facão o que lhe bem vier, como cousa sua
própria, que já é deste dia para todo sempre, forra, livre e izenta, sem
o dito João Baptista nem seus herdeiros por ella em tempo algum,
e somente dizimo a Deos das cousas que a dita terra produzir. As
quaes quinhentas braças de testada e seis centas de comprido serão
cravadas a vara a as demarcarão ao longo da dádiva de Antonio Mar-
tins, em o rio de Muçurepe ao longo do rio de Capibaribe da banda
do norte, não semdo dada lha darão ao diante onde não for dada
até o presente. A qual terra que assim dou ao dito João Baptista e
todos os seus sucessores, e as pessoas que a dita terra suceder ou
vier ou delle houverem; pelo que assim me aproveo de lhe dar a dita
terra como dito é, lhe mandei passar a presente Carta, a qual mando-
-se cumpra, segundo como nella se contem. Dada em esta Villa de
Olinda sob meusignal e sello das Armas do dito Duarte Coelho, que
ante mim servem. E hoje, 4 dias do mês de Fevereiro. Vicente Jorge
Escrivão das datas da marcação, pelo Sr. Jerônimo de Albuquerque,
a fez. Anno do Nascimento de Nosso Senhor Jesus Christo de 1577 –
Jerônimo de Albuquerque. Ao sello dez Reis Manoel de Oliveira Pes-
soa. Registradas todas estas Cartas no Livro do Tombo das Sesmarias
de Sua Alteza. Fl. 8 até 12 na Villa de Olinda, hoje o 1º de outubro
de 1580. João Carvalho. E não dizia mais a dita Carta de Sesmarias e
doação a que me reporto, e tornei ao dito Balthazar Gonçalves, e as-
signou de como o recebeo sendo presentes por testemunhas Manoel
de Oliveira, Manoel Soares Rollez, Balthazar Gonçalves.” (p. 74/78)
“104. Folhas 29v de um livro de baptismo Casamento e Óbito de
Itamaracá está o seguinte assento. Aos 23 de Fevereiro de 1699 bapti-
sei e puz os Santos Óleos nesta Matriz de N. S. da Conceição da Ilha

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As “Notas Históricas e Curiosas” de Salvador Henrique de Albuquerque (2ª parte) 361

de Itamaracá, a Antonia, filha legitima do Escrivão da Fazenda Real


Francisco Botelho dos Santos e de sua mulher D. Valentina Fregue-
zes desta Freguesia; foi seu padrinho o Dr. Ouvidor e Provedor desta
Capitania José da Silva e Mello; e não teve madrinha de que fiz este
assento, e por verdade me assignei. O Vigário Antonio Borges de
Lemos.” (p. 78)
“105. Folhas 34v está o seguinte – Aos 26 de Março de 1701, nes-
ta Matriz de N. S. da Conceição da Villa de Itamaracá, com licença
minha , baptisou o PeGonçalo Paes Tavarez e poz os Santos Oleos
a Francisca, filha legitima de Francisco Botelho dos Santos e de sua
mulher D. Valentina Ma Cabral, foi padrinho João Rodriguez Romeiro,
de que fiz este assento, em que me assignei. O Vigário Antonio Bor-
ges de Lemos.” (p. 78)
“106. Outro no mesmo livro. A folhas 41. Em 1 de Janeiro de 1704,
nesta matriz de N. S. da Conceição da Villa de Itamaracá, com licen-
ça minha baptisou o Pe Felix de Oliveira Raimundo, a Leonor, filha
legitima do Escrivão da Fazenda Real Francisco Botelho dos Santos e
de sua mulher D.Valentina Maria Cabral; foi padrinho o Provedor da
Fazenda Real João Lopes Vidal, de que fiz este assento e por verdade
me assignei. O Vigário Antonio Borges de Lemos.” (p. 78)
“107. Miguel Pessoa de Vasconcellos e D. Marianna, filha do Sar-
gento Mor Miguel Pessoa de Araújo, e também D. Luzia Pessoa de
Vasconcellos: cazou com o Capitão Antonio de Carvalho Maciel, filho
do Capitão Antonio de Carvalho Maciel e de sua mulher D. Branca
da Cruz. Este cazamento está a folhas 49 de um livro de baptisados e
cazamentos da Freguesia da Luz sendo feito o mencionado cazamen-
to a 18 de Outubro de 1734:” (p. 79)
“108. Bernardo Pessoa de Araújo, filho do Sargento Mor Miguel
Pessoa de Araújo, e de sua mulher D. Maria Tellez de Vasconcelloz
cazou a 14 de maio de 1726 com Anna Vieira Soage, filha legitima do
Comissário Geral Miguel Ribeiro e Aguiar e de Mariana Teixeira Ca-
bral. Padrinhos o Capitão João Gomes de Araújo e o Pe José de Faria,
livro de cazamentos da Freguesia de Igarasçu a folhas 42v.” (p. 79)
“109. João Cavalcanti e sua irmã D. Anna Cavalcanti, solteiros,
filhos do Tenente General João Cavalcanti de Mello, moradores no
Recife forão Padrinhos de Anna, filha de José dos Santos e Souza e
sua mulher Maria da Cruz: foi isto a 14 de Janeiro de 1750, na Ca-

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362 Tácito Luiz Cordeiro Galvão

pella de Santiago Maior do Engenho Camaragibe; a folhas 107v de


um Livro de baptisados da Freguezia de San Lourenço da Matta. D.
Feliciana Barboza segunda mulher do Capitão Manoel Mendez de
Vasconsellos.” (p. 80)
“110. Assento de óbito do Capitão Mor Anto da Sva Pera. Achado
por mim em um livro da Freguesia de São Lourenço da Matta a fo-
lhas 22v. Aos 12 dias do mês de Novembro de 1748, faleceu da vida
presente o Capitão Mor Antonio da Sva Pera fregueses desta Freguesia
recebeu todos os Sacramentos e foi envolto em habito de S. Francisco
e sepultado nesta igreja Capella de N. Senhora do Bom Sucesso do
Engenhode Tanhenga por mim abaixo assignado e para constar desta
verdade fiz este assento no dia e era supra. Francisco Paes Lôlô.” (p.
80)
“111. Em 26 de Maio de 1727 cazou, Fernando Guedez da Silva,
filho de Francisco Lopes Guedes da Silva e de sua mulher D. Joanna
de Albertim, com D. Ignez de Bezerril Fragoso, filha de José Gomes
de Azevedo e de sua mulher D. Bárbara Bezerra Fragoso; Padrinhos
os Juizes Ordinários de Iguarassu Capitão João Gomes de Araújo e
Francisco Rodriguez, casou-a o Padre Leandro da Silva Dornellaz.
Livro de cazamentos da Freguezia de Iguarassú a folhas 46.” (p. 80)
“112. Livro de cazamentos da Freguesia de Itamaracá a folhas 86,
está o assento feito. A 26 de Novembro de 1757 do casamento de
João Correa da Silva, filho de Pedro Correa da Silva e de sua mulher
Clara Dias dos Santos, com Ignacia Maria de Jesus, filha do Capitão
José da Silva e de sua mulher Antonia Dias da Cunha. Padrinhos
Fernando Cabral de Guevara, e José de Barros da Fonseca.” (p. 81)
“113. O Sargento Mor Antonio Pereira da Silva e sua mulher D.
Caetana da Veiga Cabral forão Padrinhos de um menino Pedro, na
Capella de N. Senhora do Pilar de Itamaracá, filho de Margarida da
Silva mulher solteira; foi este baptizado a 22 de janeiro de 1741. Está
a folhas 28v do respectivo livro.” (p. 81)
“114. D. Clara Maria de Jesus, mulher do Capitão Francisco de Mel-
lo e Silva foi madrinha de Francisco, filho de Manoel Alves Ribeiro, e
de sua mulher D. Thereza Maria de Jesus; Foi este baptisado a 16 de
Janeiro de 1748 na Matriz da Ilha de Itamaracá e está a folhas 65v do
livro competente.” (p. 81)
“115. A 13 de Abril de 1748 foi baptizado na Capella de N. Senhora

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As “Notas Históricas e Curiosas” de Salvador Henrique de Albuquerque (2ª parte) 363

dos Prazeres da Fortaleza de Itamaracá Vicente, filho do Alferes Ig-


nacio de Mello e de sua mulher D. Rosa Maria de Farias; padrinhos o
Capitão Francisco de Mello eSilva todos moradores em Pernambuco.
Livro respectivo a folhas 70.”
“116. A 15 de Agosto de 1751 foi baptisado na Matriz de Itamaracá o
meno Luiz, filho de Antonio de Fontes Rangel e de sua mulher D. Anna
de Brito padrinhos o Alferes Domingos de Sá e Mello e D. Josepha
Bezerra mulhere de Prudente Pessoa, moradores na Freguezia de Ma-
ranguape. Este assento está no competente livro a folhas 89v.” (p. 82)
“117. Na folha 5v de um livro de baptisados da Freguesia de Igua-
rassu achei o assento seguinte. Em 7 de Julho de 1717 corridos os
banhos e não havendo impedimento, e por ordem do muito Reveren-
do Provisor, o Dr. Nicolao Paes Sargento foi recebido em matrimonio
na forma do Sag. Conc. Francisco Fernandes Vieira, filho natural do
Governador João Fernandes Vieira, e de Christina César, criola forra,
moradores no sitio ou logar chamado do Mariguára, viúvo que ficou
de Luiza da Gama, com Antonia Martins, filha de Bento Martins e
Antonia Martins, creola do gentio de Guiné, moradores que forão em
Jaguaribe, Freguesia de Iguarassú. Fez este matrimonio por ordem
minha o Pe Francisco Pereira na Capella do Rozario do Paraizo do
Engenho de Gongassari; forão testemunhas deste matrimonio o Sr. do
Engenho Nicolao Begueman e sua mulher Maria de Brito os quaes
não assignarão por morarem distante duas legoas da Parochia hoje
24 de Janeiro de 1718 fiz este assento por que neste dia se me deo a
certidão do Pe que os recebeu, de que fiz este assento dia e era acima
declarada. O Vigário Agostinho Cabral de Almeida. Segundo se vê de
um assento de baptismo feito pelo Vigário de Itamaracá Antonio Bor-
ges de Lemos a 19 de Dezembro de 1714 na Capella de N. Senhora
do Ó de Araripe de baixo consta de que estes Francisco Fernandez
Vieira e a dita Antonia Martins vivião juntos antes de se cazarem e
tinhão filhos. (p. 82)
“118. A folhas 96v de um livro de baptizados da Freguesia de
Iguarassu está o assento seguinte. Em 23 de Novembro de 1729 na
Capella de S. Gonçalo, com licença do Rdo Vigário do território, feitas
as denunciações na Matriz de S. Pedro Mártir da Cidade de Olinda
donde o contrahente é natural e morador, na Capella de N. Senho-
ra do Desterro, districto desta Freguesia de Iguarassu donde a con-

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364 Tácito Luiz Cordeiro Galvão

trahente é applicada, e nesta Matriz de Iguarassu donde a contrahen-


te é moradora, sem se descobrir impedimento, como me consta por
certidão de banhos que ficão em meu poder, com licença minha, em
presença do Rdo Pe Cosme Rodrigues Fraga, se casarão solenemente
por palavra de presente Gonçalo da Silva Pementel, natural e mora-
dor na Freguesia de S. Pedro Mártir de Olinda, filho do Capitão Luiz
da Silva Pementel e de sua mulher D. Margarida dos Santos, com D.
Jerônima Pereira da Costa, filha legitima de Manoel Pereira Bolcão,
já defunto, e de sua mulher D. Izabel da Costa do Amaral moradora
nesta freguesia de Iguarassú, e receberão logo as benças conforme os
ritos da Santa Madre Igreja; assistirão por testemunhas João Soares de
Vasconcelos, Sebastião Dias de Abreu, o Rdo Pe o Licenciado Balthazar
Cabral e outras, todos desta Freguesia em fé de se fez este termo que
assignei com as testemunhas = José de Farias Quadjutor.” (p. 83)
“119. A folhas 120v está o assento do casamento de Antonio da
Cruz Ferreira, filho legítimo do Capitão Manoel da Cruz Ferreira e
de Úrsula de Oliveira, com D. Maria Cezar filha legitima do Comissá-
rio Gonçalo Feliciano Berenger de Andrade e sua mulher D. Aurora
Francisca Texeira moradores na Freguesia de Iguarassú.” (p. 85)
“120. O Rdo. Dr. Manoel Fernandes Vieira, filho do Governador
João Fernandes Vieira tomou posse da matriz de N. S. da Conceição
da Villa de Itamaracá como Vigario Collado della no 1° de Novembro
de 1693, é o ultimo assento de sua letra que se acha em um livro de
óbitos daquella Freguesia e datado a 6 de maio de 1696 e a 27 de
janeiro do anno seguinte de 1697 tomou posse o novo Vigario An-
tonio Borges de Lemos, como tudo consta do mesmo livro e assento
respectivo o qual está no arquivo da Câmara Municipal digo Eclesias-
tica. Assento que achei no verso da folha 1 de um livro que existe de
casamento relativo da Freguesia.” (p.85)
“121. Nicacio filho de Matheos e de sua mulher Maria, naturaes
do gentio de Guiné foi por mim baptizado sem Santos Óleos nesta
Matriz da S. da Conceição, cujos Paes são escravos de D. Maria Ca-
bral filha do Capitão mor Jerônimo da Veiga Cabral; forão padrinhos
Manoel de Abreu e Maria Lopes. Esta escrava de Antonio Gonçalves
Romeiro, e aquelle escravo de D. Maria Cabral; a 1 de Agosto de 1688
assignado O Vigário Luiz de Figueiredo Miranda.” (p. 85)

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 339-390, 2018


As “Notas Históricas e Curiosas” de Salvador Henrique de Albuquerque (2ª parte) 365

“122. L de baptisados e cazamentos da Freguesia de Itamaracá a


folhas 15v está o seguinte assento. Aos 7 de Janeiro de 1709 na Capella
de N. S. do Bom Sucesso do Caraú de licença minha baptisou o Rdo
Cônego André de Barros Cavalcante a Maria, sem Santos Óleos, filha
de Antonio da Costa Leitão, o moço, e de sua mulher D. Maria Bezerra
Cavalcanti. Forão padrinhos o Coronel Leonardo Bezerra Cavalcanti
e sua mulher D. Joanna Cavalcante, de que fiz este assento e por
verdade me assignei. O Vigário Antonio Borges de Lemos. (p. 86)
“123. O Tenente Rafael Ferreira de Mello foi filho do Capitão Ra-
fael Ferreira de Mello. Cazou o dito Tenente Rafael Ferreira de Mello
a 14 de Novembro de 1688 na Matriz da Freguezia ou Qurato de N.
Senhora do Itambé sendo uma das testemunhas que assignou a este
cazamento o mesmo Capitão Rafael Ferreira de Mello pai desse o
dito, com D. Úrsula Cavalcanti de Vasconcellos, e não D. Úrsula Feio
do Amaral. Eis o assento fielmente copiado de respectivo livro da
Freguesia do Itambé: ― Em 14 de Novembro de 1688 casei em facie
da Igreja nesta Parochia de N. S. do Desterro ao Tenente Raphael Fer-
reira de Mello com Úrsula Cavalcanti de Vasconcellos, com os banhos
corridos nas partes onde tocavão; ao contrahente e a dita, assistirão
por testemunhas o Capitão Raphael Ferreira de Mello e o Alferes
Jerônimo Cavalcanti de Albuquerque D. Luisa da Gama e D. Joanna
Cavalcanti de que fiz este assento dia era ut supra. Está este assento
lançado a folhas 31 do mencionado livro.” (p. 86)
“124. “folhas 10. No livro de Itamaracá achão-se os seguintes as-
sentos: - Em 29 de Agosto de 1672 baptisei com os Santos Óleos a
Francisco, filho do Capitão Diogo Velho Cardoso e de sua mulher
Brites Mendes. Forão padrinhos Pedro Soares de Abreu e D. Suzana
Lins de Vasconcellos. O Vigário Gonçalo Cabral.” (p. 87)
“125. A folhas 12 do mesmo livro está mais este. Em 6 de junho
de 1665 baptisei a Ângela, engeitada a Diogo Velho forão padrinhos
Diogo Velho, o moço, e Izabel Gonçalves. O PeVigário Gonçalo Ca-
bral.” (p. 87)
“126. A folhas 13, mais este ― Em 17 de Junho de 1668 baptisei
com o Sto Óleo a Jacinta, filha do Capitão Diogo Velho Cardoso e de
sua mulher Brites Mendes: forão padrinhos o Capitão Diogo de Souza
de Menezes e Úrsula de Crasto. O Pe Vigário Gonçalo Cabral.” (p. 88)

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 339-390, 2018


366 Tácito Luiz Cordeiro Galvão

“127. A folhas 15 do mesmo livro acima está este assento: Em 10


de Junho de 1675 baptisei a Catharina, filha do Capitão Jorge Caval-
canti de Albuquerque e de sua mulher D. Maria Ximenes: forão pa-
drinhos Vasco Marinho Falcão e Joanna Acciolle. O Vigario Gonçalo
Cabral.” (p. 88)
“128. A folhas 27 está este outro assento – Em 25 de Novembro
de 1676 recebi ao Capitão Francisco de Abreu de Lima com D. Izabel
da Veiga: forão padrinhos o Gor André Vidal de Negreiros e o Mestre
de Campo Antonio Curado Vital e Maria Saraiva da Silva. O Vigário
Gonçalo Cabral.” (p. 88)
“129. Na parte do livro acima onde vem os assentos de baptisa-
dos acha-se o assento da 1a filha que tiverão o Capitão Francisco de
Abreu de Lima e sua mulher de que trata o assento de Cazamentos
acima.” (p. 88)
“130. A folhas 28v, Acha-se o seguinte assento. Em 3 de Dezem-
bro de 1677 baptizei a Maria, filha do Capitão Francisco de Abreu de
Lima e de sua mulher D. Izabel da Veiga, forão padrinhos o Capitão
Jerônimo da Veiga Cabral e D. Leonor Ximenes. O Vigário Gonçalo
Cabral.” (p. 89)
“131. A folhas 24 do mesmo livro achei o assento de Luiz Lopes da
Silva genro do Capitão Roque Ferreira. Ei-lo. Em 10 de Setembro de
1665 recebi a Luiz Lopes da Silva, com Maria Ferreira: forão testemu-
nhas o Capitão João Cardoso Pinheiro, o Capitão mor Pedro Lobam
Monteiro e Margarida Ferreira. O Pe Vigário Gonçalo Cabral.” (p. 89)
“132. Em um livro de baptisados casamentos da freguesia de Ita-
maracá que teve principio no anno de 1661, em duas folhas delle en-
contrei alguns assentos de Chrisma: O titulo deste assento he o que
abaixo se segue. Livro das pessoas que Chrismou desta Freguesia de
Itamaracá o Illmo Sr. Bispo D. Estevão Brioso de Figueiredo, 1° Bispo
deste Bispado no anno de 1678.
O Capitão Antonio Cavalcanti de Albuquerque, padrinho o Gor.
João Fernandes Vieira;
O Escravo Ricardo, padrinho Vasco Leitão;
O Capitão Jorge Cavalcanti de Albuquerque, padrinho o Sargento
Mor Francisco Camello Valcasar;
D. Maria Ximenes, sua mulher, padrinho o Vigario de Goianna
Gonçalo Pereira;

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 339-390, 2018


As “Notas Históricas e Curiosas” de Salvador Henrique de Albuquerque (2ª parte) 367

D. Maria filha, madrinha Izabel Barboza;


O Capitão Sebastião Leitão de Vasconcellos, padrinho o Capitão
Bartolomeu de Allandra;
D. Ignez sua mulher, padrinho o Pe. Coadjutor Domingos Coelho
Diniz;
D. Luzia filha, madrinha Maria Alvares, esta viuva D. Maria Xime-
nes (ou Xerer) deve ser a sogra do Capitão Jorge Cavalcanti acima,
mãe da 1a D. Maria Ximenez (ou Xer) mulher do Capitão Jorge Caval-
cante de Albuquerque;
D. Maria Ximenez (ou Xer) viuva de Gaspar Xer. (ou Ximenez) de
Medina Filho, Padrinho o GovernadorJoão Fernandes Vieira.
“133. Em um livro de baptisados da Freguesia de Itamaracá a folha
6 está o assento seguinte: Luiz, filho do Coronel Jorge Cavalcanti de
Albuquerque, e de sua mulher D. Maria de Barros, foi baptisado na
Capella de N. S. do Ó desta Freguesia pelo Cônego Pe João Barreto de
quem forão padrinhos o Tenente Coronel Mathias Vidal de Negreiros,
e o Sargento mor do Estado João Cavalcanti de Albuquerque em 15
de Janeiro de 1687, de que fiz este assento e por verdade assignei. O
Pe Gonçalo Cabral.” (p. 90)
“134.” (ao lado, escrito em tinta azul, se lê: “Repetição por descui-
do. Veja-se no 43, pag. 22”) “No mesmo livro a folhas 54 entre os as-
sentos de casamentos está lançado o que segue. Aos 14 dias do mes
de Junho 1691 de tarde, na Capella de N. S. do Amparo do Engenho
de Antonio Gonçalves Romeiro, termo da Freguesia e Villa de N. S.
da Conceição da Ilha de Itamaracá em presença de mim o Pe Luiz de
Figueiredo e Miranda Parocho actual sendo presentes tres testemu-
nhas Francisco Botelho dos Santos e D. Antonia Thereza Tavares de
Mello mulher de Antonio Gonçalves Romeiro, se casarão por palavras
de presente em facie eclesie justa form Sagrado Consilio Tridentino, e
logo tomarão as bençãos nupciais o Alferes Manoel da Veiga Cabral,
filho legitimo do Capitão Mor Jeronimo da Veiga Cabral e de sua mu-
lher D. Leonor Ximenes de Aragão, já defuntos, morador na Villa da
Conceição de Itamaracá, e D. Bernardina Antonia de Guevara, filha
legitima do Capitão Mor Valentim Tavares Cabral e de sua mulher D.
Anna Velez de Guevara, moradora em Araripe de baixo termo da dita
freguesia e ambos naturaes deste Bispado e fregueses. De que tudo
fiz este assento no mesmo dia que por verdade me assignei com as

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 339-390, 2018


368 Tácito Luiz Cordeiro Galvão

testemunhas que forão tres com D. Valentina Maria Cabral mulher


de Francisco Botelho dos Santos. Francisco Botelho dos Santos. D.
Valentina Maria Cabral de Guevara e D. Antonia Thereza Tavares de
Mello. O Vigario Luiz de Figueiredo e Miranda.” (p. 91)
“135. (ao lado, escrito em tinta azul, se lê: “Repetição por descui-
do. Veja-se no 35, pag. 63”) “No mesmo livro atraz fallado e a folhas
89 acha-se este outro assento. Aos 3 dias do mês de Março de 1710
na Capella do Engenho Caraú, Invocação de N. Senhora do Bom Su-
cesso, de licença minha o Pe Antonio Borges de Lemos Vigário desta
Matriz de N. Senhora da Conceição da Villa de Itamaracá, em presen-
ça do RdoPe Gaspar de Almeida Barbosa, corridos os banhos e me não
sahindo impedimento algum se casarão in facie eclesie na forma do
Sag. Cons. Trid. por marido e mulher Luiz de Oliveira Camacho, filho
legitimo de João de Oliveira Camacho e de sua mulher D. Ignacia
Pereira de Azevedo, com D. Maria de Abreu Bezerra, filha legitima de
Francisco de Brito Pereira e de sua mulher Joanna da Costa Leitão,
sendo presentes por testemunhas o Capitão Antonio da Costa Leitão
e seu filho Antonio da Costa Leitão do mesmo nome freguez que foi
o dito contrahente da Sé de Olinda, e ella dita contrahente moradora
no Caraú termo desta Freguesia de N. S. da Conceição e freguezes
desta dita Freguesia; de que fiz este assento e por verdade me assig-
nei. O Vigário Antonio Borges de Lemos.” (p. 92)
“136. A folhas 44. Aos 28 de Junho de 1704 na Capella de Sta Le-
vina de Araripe com licença minha baptisei o Pe Antonio Álvares de
Abreu a Simão, filho legitimo de Antonio da Silva Sobral e de sua mu-
lher Izabel Coelho moradores no Caraú: forão padrinhos o Capitão
Gonçalo Novo de Brito e sua mulher D. Cosma da Cunha de Andra-
da, tomou os Santos Óleos; e a dita Capella de Sta Lusia pertencente a
Freguesia de Iguarassú, de fiz este assento e por verdade me assignei.
O Vigario Antonio Borges de Lemos.” (p. 93)
“137. Livro de Cazamentos da Freguesia de Iguarassu a folhas 60 v,
está o Cazamento do Tenente Coronel Christovão Vieira de Mello com D.
Maria Dornellas, elle filho legitimo do Sargento mor Christovão Vieira de
Mello e de sua mulher D. Úrsula Leitão; e ella filha do Capitão Balthazar
Dornellas Valdevesso e de sua mulher D. Anna de Sá da Fonseca, padri-
nhos o Pe João Correia de Sá, Alexandre da Silva, o Tenente Coronel João
Leitão de Mello e outra; tudo isto em 6 de Novembro de 1730.” (p. 93)

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 339-390, 2018


As “Notas Históricas e Curiosas” de Salvador Henrique de Albuquerque (2ª parte) 369

“138. A folhas 39 de um livro da Freguesia da Luz está o casamen-


to de Francisco Dias de Figueiredo, com D. Maria Pessoa de Vascon-
cellos; elle filho legítimo de Francisco de Figueiredo da Sa e de sua
mulher Maria Borges Silveira; e ella filha legitima do Capitão João Ri-
beiro Pessoa e de sua mulher D. Maria Cabral de Vasconcellos, forão
padrinhos o Coronel João Cavalcanti de Albuquerque, e o Sargento
Mor Antonio da Motta Silveira, tudo em 14 de julho de 1727.” (94)
“139. Livro de baptisados da Freguesia da Luz. A folhas 51 está o
assento de baptisado de João, filho legitimo de Luiz da Veiga Pessoa
e de sua mulher D. Maria Dornella de Vasconcellos, forão padrinhos
o Sargento mor Miguel Pessoa de Araújo e sua filha D. Anna de Vas-
concellos – aos 16 de agosto de 1712. O Pe José Tavares de Araújo,
baptisante. O Vigário Thomaz Simões. Cumpre notar que onde se
acha lançado este assento chega com as suas datas ao mesmo assento
até 1739, e que por esquecimento do Parocho anterior não foi lança-
do no tempo e era competente como se verá melhor da seguinte de-
claração que está lançada antes do assento de que se trata.” (p. 94)
“140. Por despacho do muito Rdo Dr. Vigário Geral Antonio Pereira
de Castro lancei neste livro de baptisados o assento seguinte. Livro
de baptisados e cazamentos da Freguesia de Itamaracá está o assento
de Antonio, filho legitimo do Escrivão da Câmara Francisco de Fontes
Rangel e de sua mulher D. Ignacia Bezerra de Vasconcellos, padri-
nhos o Capitão Manoel Cardoso e Anna da Rocha mulher do Alferes
Manoel Bezerra, a 13 de setembro de 1713. A folhas 40 v.” (p. 95)
“141. No mesmo livro a folhas 56 está outro assento de baptisado
de Francisco, filho legitimo do Capitão Francisco de Fontes Rangel
e de sua mulher D. Ignacia Bezerra: padrinhos o Sargento mor Luiz
Duarte da Costa e Maria Magdalena mulher do Ajudante Lourenço
Alves de Vasconcelos.” (p. 95)
“142. A folhas 62 do mesmo livro está outro assento de baptisado
de Manoel, filho do dito Capitão Francisco de Fontes Rangel e da
referida sua mulher, padrinhos o Tenente Coronel João Gomes da
Costa, e Josepha Maria, filha do Capitão Manoel de Amorim Casares:
foi isto a 5 de março de 1721. N. B. Sobre o mesmo Francisco de Fon-
tes Rangel de que acima temos por vezes fallado achei o assento que
adiante vai; e pelo qual se vê que elle fora cazado duas vezes sendo
já Sargento Mor quando nesta ultima se recebeu.” (p. 95)

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 339-390, 2018


370 Tácito Luiz Cordeiro Galvão

“143. Aos 18 dias do mês de Dezembro de 1728 estando nesta Fre-


guesia em visita o Illmo Sr Bispo D. José Fialho por Ordem sua recebi por
palavras de presente na Igreja de N. S. do Rozário dos pretos desta Villa,
de noite, por marido e mulher o Sargento mor Francisco de Fontes Rangel,
viúvo que ficou de Ignacia Bezerra, e a Beatriz Gomes, viúva que ficou
de João Baptista, e forão despensados nos banhos. Forão testemunhas o
Rdo Dr. José da Cruz Monteiro, Cônego Magistral Eleito e o Rdo Vigário da
Villa de Iguarassu Paulo Teixeira, que ambos comigo assignarão, de que
fiz este termo. O Vigário Manoel da Costa de Carvalho.” (p. 96)
“144. Livro de casamentos da Freguesia de Iguarassu a folhas 32
v está um assento de cazamento, cujo padrinho foi Diogo Velho Car-
doso morador no Engenho Mussupe, aos 13 de outubro de 1721. A
folhas 78v do mesmo livro se vê que aos 15 de fevereiro de 1733 se
casarão José Barreto de Menezes com Anna Soares da Câmara, elle
filho do Capitão Luiz Felliz de Menezes e de D. Anna de Bezerril; e
ella filha do Tenente Francisco Dias Lima e de Maria Soares.” (p. 96)
“145. A folhas 115 do dito está o assento de cazamento do Capi-
tão Manoel Velho com Micaella Teixeira, elle filho legitimo de Diogo
Velho e de sua mulher Annacleta Soares, e ella filha do Comissário
Geral Miguel Ribeiro de Aguiar e de sua mulher Mariana Teixeira:
padrinhos o Capitão mor João Carneiro da Cunha e o dito Comissário
Geral Miguel Ribeiro.” (p. 97)
“146. Livro de baptizados da Freguesia de Tejucupapo a folhas 27
está o baptisado de Manoel, filho de Manoel Soares e de sua mulher
D. Jerônima da Veiga: padrinhos o Capitão Lourenço Gracez e Catha-
rina Soares, solteira. Foi isto ao 1o de novembro de 1734.” (p. 97)
“147. Do livro de Tejucupapo a folhas 72 v está o assento de Jor-
ge, filho de Diogo Velho. Padrinhos Damião Paes e Maria, filha do Te
Domos Monteiro.” (p. 97)
“148. Livro de Tejucupapo a folhas 82 a 9 de maio de 1748 está o
assento de Maria, filha de Luiz Velho Cardoso e de sua mulher The-
reza de Jesus. Padrinhos Manoel Pegado de Siqueira e Maria Gomes,
mulher de Francisco Ferreira Coelho.” (p. 98)
“149. No mesmo livro a folhas 108 está outro baptisado feito na
menina Thereza, filha dos mesmos Luiz Velho Cardoso e sua mulher,
padrinhos Francisco de Souza Mattos e Izabel Alves, filha da viúva
Josefa Maria. Foi isto a 13 de setembro de 1750.” (p. 98)

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As “Notas Históricas e Curiosas” de Salvador Henrique de Albuquerque (2ª parte) 371

“150. A folhas 53 v de um livro de cazamentos da Freguesia de


Itamaracá acha-se um assento de cazamento feito a 9 de novembro
de 1750 cujos nubentes forão Mathias Velho Soares, fo de Manoel
Velho Soares e de sua mulher Ângela Garcia, e D. Jerônima Maria
Cabral, filha do Tenente Coronel Francisco Botelho dos Santos e de
sua mulher D. Valentina Maria Cabral. Forão padrinhos o Pe Gaspar
da Costa Botelho e o Capitão Antonio Tavares de Macedo.” (p. 98)
“151. Livro de casamento da Ilha acima referida a folhas 80. Está o
cazamento feito a 6 de fevereiro de 1755 entre os Nubentes Manoel
de Oliveira Calheiros e D. Catharina de Sena Gondim, elle filho de
Gonçalo de Olanda Pereira e de sua mulher Angela Soares de Mello,
e ella filha do Pe. Antonio Velho Gondim e de sua mulher D. Antonia
Bandeira de Mello.” (p. 98)
“152. Outra filha do mesmo Pe. Antonio Velho Gondim chamada
D. Francisca Velha Gondim, casau a 10 do mesmo mês em que ca-
sou sua irmã, com Christiano Gonçalves Nogueira, filho de Antonio
Gonçalves Nogueira e de sua mulher Andreza de Almeida. Forão
padrinhos Damazo de Oliveira Torres e o Capitão Antonio Tavares
de Macedo.”
“N.B. Do primeiro casamento de D. Catharina forão padrinhos o mes-
mo Damaso de Oliveira Torres e Manoel da Fonseca Rego.” (p. 99)
“153. No mesmo livro a folhas 39v. está o assento de Casamento
da outra filha do sobredito Pe. Antonio Velho Gondim chamada D.
Agostinha Thereza de Jesus com Gonçalo Pereira de Hollanda, filho
de Gonçalo de Hollanda Pereira e de sua mulher Angela Soares.
Forão padrinhos Manoel de Caldas Brandão e Damaso de Oliveira
Torres, sendo o casamento no dia 20 de fevereiro de 1759.” (p. 99)
“154. Casou a 19 de Fevereiro de 1741 Felippe de Valadares Souto
Maior, filho legitimo do Capitão João Pegado com D. Quitéria Ban-
deira, filha legitima do Capitão Francisco Xavier Madeira de Mello e
de sua mulher D. Lourença Maciel de Andrada. A folhas 26 foi este
casamento feito na Matriz de S. Lourenço de Tejucupapo.” (p. 100)
“155. Livro de baptisados da Freguesia de Nossa Senhora da Apre-
sentação da Província do Rio Grande do Norte que principia em 1679
e finda em 1714. Delle transcrevi os assentos abaixo.” (p. 100)
“156. A folhas 29v. Aos 16 de Janeiro de 1690 nesta Matriz baptisei
e puz os Santos Óleos a Joanna, filha natural de Manoel Fernandes

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372 Tácito Luiz Cordeiro Galvão

de Mello e de Antonia Ferreira padrinhos o Capitão mor Agustinho


Cezar de Andrada e D. Joanna filha do Sargento mor Manoel da Silva
Vieira. Paula da Costa.” (p. 100)
“157. A folhas 108. Ao 1o de Abril de 1689 baptisei e puz os Santos
Óleos a Cosme Damião tapuas infantes escravos do Capitão Agosti-
nho Cezar, padrinhos Antonio Dias e Antonio da Fonseca. Paulo da
Costa.” (p. 100)
“158. A folhas 109. Aos 16 de Fevereiro de 1690 baptisei nesta Ma-
triz e puz os Santos Óleos a João, Tapua adulto: padrinhos o Capitão
mor Agustinho Cezar e seu filho o licenciado João de Abreu. Paulo
da Costa. N. B. O Cônego João de Abreu Barreto era filho do mesmo
Capitão mor Agostinho Cezar.” (p. 100)
“159. A folhas 11v. Em 10 de Fevereiro de 1692 baptisei nesta
matriz de N. S. de Apresentação a Jacinta, Tapuya, do Capitão mor
Agustinho Cezar de Andrada, não se sabe os pais por ser apanhado
na guerra, teria de idade oito para nove annos. Foi padrinho o dito
Capitão Agustinho Cezar. De que fiz este assento, em que me assignei
no mesmo dia. Basílio de Abreu e Andarda.” (p. 101)
“160. A folhas 111v do mesmo livro. Em o mesmo dia mez como
no assento atraz declarado, baptisei nesta matriz de N. S. da Apresen-
tação a Miguel, e a Simão Tapuas, ambos escravos de Manoel Nunes
Ferreira, terião de idade quatro para cinco annos; não se lhe sabem
os pais por serem apanhados na guerra; do 1o foi padrinho o licen-
ciado João de Abreu Barreto, e do 2o Felippe Ribeiro. De que fiz este
assento em que me assignei. Basílio de Abreu e Andrada.” (p. 101)
“161. A folhas 112. Aos 5 de Abril de 1692 baptisei nesta matriz de
N. S. da Apresentação a Sebastiana e Susana, Tapuas, a 1a do Capitão
mor Agustinho Cezar de Andrada, e a 2a do Sargento mor Manoel da
Silva Vieira; ambos erão de idade de 25 annos pouco mais ou menos:
forão padrinhos os senhores. Basílio de Abreu e Andrada.” (p. 102)
“162. A folhas 56. Aos 19 dias do mês de Agosto de 1692 a tarde
nesta Matriz da Villa de N. Senhora da Conceição deItamaracá, em pre-
sença de mim o Pe Domingos Coelho Diniz, quadjuctor desta Freguesia
sendo presentes por testemunhas o Capitão mor Manoel de Mesquita
da Silva, e o Alferes Luiz Lopes da Silva, Almoxarife da Fazenda Real, se
casarão por palavras de presente infacie eclesie na forma do Sag. Conc.
Trid. Antonio Alves viúvo e Mariana Bezerra Pereira, filha de Domingos

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As “Notas Históricas e Curiosas” de Salvador Henrique de Albuquerque (2ª parte) 373

Bezerra e de Joanna Pereira, moradores nesta Villa de Itamaracá: de


que fiz este assento no mesmo dia e por verdade me assignei com as
testemunhas abaixo. O Quadjuctor o Pe Domingos Diniz, Manoel de
Mesquita da Silva e Luiz Lopes da Silva.” (p. 102)
“163. A folha 59v. está o assento de casamento de uma neta do Ca-
pitão Mor Roque Ferreira. Ei-lo: Aos 14 dias do mês de Novembro de
1695 nesta Matriz de N. Senhora da Conceição de Itamaracá recebeu
com licença minha o Licenciado Antonio Tavares Valcaçar Rdo. Thesou-
reiro Mor da Santa Sé de Olinda, por palavras de presente na forma
do Sag. Concilio Tridentino, corridos os banhos e licença do Rdo. Juiz
dos Casamentos o Dr. Francisco Martins Pereira Rdo. Deão da Santa Sé
de Olinda; a Felippe Bandeira, com Maria Ferreira da Cruz ambos na-
turais deste Bispado e fregueses desta freguesia de Itamaracá: Felippe
Bandeira de Mello, filho legitimo do Alferes Antonio Bandeira de Mello
e de sua mulher Maria de Oliveira, e Maraia Ferreira, filha legitima de
Luiz Lopes da Silva e de sua mulher Maria Ferreira, todos fregueses
desta freguesia e naturaes deste Bispado de Pernambuco: forão Pa-
drinhos e testemunhas o Capitão Mor desta Capitania de Itamaracá
Manoel de Carvalho Fialho e o Capitão Simão da Costa todos morado-
res desta freguesia. E eu o Pe. Manoel Fernandes Vieira, Vigario desta
freguesia em testemunho da verdade fiz este termo de assento em que
me assigno com as testemunha nomeadas. O Vigario Manoel Fernan-
des Vieira, Manoel de Carvalho Fialho, Simão da Costa.” (p. 102)
“164. No livro de Óbito da Freguesia de N. S. da Conceição da
Villa de Itamaracá que tem principio no anno de 1682. A folhas 92,
acha-se lançado este assento. Aos 13 de Maio de 1683 falleceo o Ca-
pitão mor Roque Ferreira com todos os Sacramentos; fez testamento
e ficou por testamenteiro seu genro Luiz Lopes da Silva; tem satisfeito
os legados q’ delle consta.” (p. 103)
“165. A folhas 101 v está este outro assento. Aos 10 dias do mês
de Agosto de 1692 falleceu da vida presente o Capitão Pedro Alves
Carneiro, com todos os Sacramentos de idade de 78 annos pouco
mais ou menos, natural deste Bispado, filho legitimo de Pedro Alves
Carneiro e de sua mulher Apolinaria de Moraes, já defuntos, morado-
res nesta Villa de N. S. da Conceição de cujos Prezidio era Capitão de
Infantaria, cujos serviços deixou a sua mulher D. Maria Vasconcellos
Botelho, com quem foi casado infacie eclesie; deixou que se dices-

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374 Tácito Luiz Cordeiro Galvão

sem por sua alma as Missas de S. Gregorio, pelas quaes se darião


dez mil rs de esmola, mas que se dicessem 18 por diversas tenções.
Dicerão-se logo mais cinco Missas de Corpo presente; e foi sepultado
nesta Matriz de N. S. da Conceição de que tudo fiz este assento no
mesmo dia, que por verdade me assignei. Seu Testamenteiro he sua
mulher. O Vigário Luiz de Figueiredo de Miranda.” (p. 104)
“166. A folhas 85 do mesmo livro de baptisados da Freguesia de
Itamaracá, está lançado o seguinte assento: Aos 30 de Julho de 1709,
na Capella do Bom Jesus do Araripe do Meio, desta Freguesia de N.
Senhora da Conceição da Villa de Itamaracá, em minha presença o
Licenciado Antonio Borges de Lemos, Vigário da dita Matriz, corridos
os banhos sem impedimento e justificado o dito contrahente vir de
sua terra solteiro, como do mandado consta, se cazarão por palavras
de presente Manoel Nunes Pereira, morador e freguez da Freguesia
de S. Cosme e Damião de Iguarassu, filho legitimo de Domingos
Nunes Pinto e de sua mulher Anna Pereira já defuntos, moradores
na Freguesia de Sta Marta, Bispado do Porto, com Maria Soares de
Mattos, filha legitima de Manoel Velho Soares, já defunto, e de sua
mulher Ângela Garsia Soares, e tomarão logo as bençãos, sendo pre-
sentes por testemunhas o Capitão mor Francisco Pereira de Lima e o
Licenciado Manoel de Faria de Aguiar, de que fiz este assento, e por
verdade me assignei. O Vigário Antonio Borges de Lemos.” (p. 105)
“167. A folhas 6v do mesmo livro de baptisados da Villa de Itama-
racá se acha este assento. Manoel, filho do Alferes Manoel Barbosa de
Lima e de sua mulher Felippa de Amorim: foi baptisado com Santos
Óleos nesta Matriz de N. Senhora da Conceição por mim o Padre
Gonsalo Cabral, Vigário della de que forão padrinhos o Provedor da
Fazenda Real o Capitão Sebastião Lopes Grandio e Ângela de Lemos,
a moça. Em 23 de Fevereiro de 1687, de que fiz este assento e por
verdade assignei. O Pe Gonsalo Cabral.” (p. 105)
“168. Notas escriptas por Salvador Coelho de Drumond e Albu-
querque: “Antonio da Silva Pereira, Capitão Mor de Iguarassu, foi
casado com D. Anna Bezerra Pessoa, irmã do Coronel José Camello
Pessoa, 2o Administrador do morgado de San Pantaleão do Enge-
nho Monteiro. Este Antonio da Silva Pereira e sua mulher D. Anna
Bezerra Pessoa, forão pais do Capitão José Camello Pessoa, Senhor
do Engenho Tanhenga. A filha deste, de nome D. Antonia da Silva

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As “Notas Históricas e Curiosas” de Salvador Henrique de Albuquerque (2ª parte) 375

Pereira, casou em Goianna com o Coronel Jerônimo de Albuquerque


e Mello, da nobilíssima e antiga casa de Bujary. Foi este Jerônimo de
Albuquerque e Mello meu 3o avô, um dos homens mais distinctos de
Pernambuco, não só por sua posição e nomeada como por seu nasci-
mento. Era filho do Capitão de Infantaria João Dourado de Azevedo,
Governador da Fortaleza do Brum, um dos officiais que servirão com
honra e brio na guerra dos Hollandeses, e de sua mulher D. Cathari-
na Pereira, filha do Capitão Antonio da Silva, chefe da nossa Cavalla-
ria, que militou na referida guerra Hollandeza. Este Capitão Antonio
da Silva, indo para Governador de uma das províncias d’África Por-
tugueza, casou em Lisboa com D. Maria Pereira Coutinho de Távora,
da família dos Marqueses desse titulo.”
“O Capitão João Dourado de quem acima se fallou, genro do Ca-
pitão Antonio da Silva, era filho do Dr. Gaspar Fernandes Dourado
e de sua mulher D. Clara de Azevedo, filha de Matheus de Freitas
de Azevedo Alcaide Mor de Olinda. Aquelle Dr. Gaspar era irmão do
Dezembargador e Embaixador Feliciano Dourado e este Alcaide Mor
Matheus de Freitas era filho de outro do mesmo nome que também
fora Alcaide Mor de Olinda no tempo do 1o Donatário Duarte Coelho.
Ao valor e eloquencia deste Alcaide Mor, muito se deve a conserva-
ção da colônia portugueza naquelle tempo, como dizem as chronicas
que tenho lido. Drumond e Albuquerque.” (p. 106)
“169. A folhas 49 do Lo de assento de casamentos da freguesia de
Itamaracá consta o seguinte: Aos 18 dias do mês de Novembro de
1688, eu o Padre Luiz de Figueiredo e Miranda, Parocho da Matriz de
N. S. da Conceição, em três dias Santos de guarda denunciei aos con-
trahentes Luiz Velho de Menezes com D. Maria da Veiga Cabral, filha
do Capitão Mor Jerônimo da Veiga Cabral e de sua mulher D. Leonor
Ximenes de Aragão; e por não haver sahido impedimento algum ca-
nônico e elles contrahentes terem necessidade, forão recebidos com
minha licença, na Capella da Virgem dos Prazeres e São José, pelo Rdo
Capelão Domingos de Araújo Pinto do qual também receberão logo
as bênçãos nupciaes. Forão padrinhos o Capitão Sebastião Lopes
Grandio, e o Capitão Manoel Barbosa de Lima. Justa forma Sag. Conc.
Tridentino. E por verdade me assignei. Dia era ut supra. O Vigário
Luiz de Figueiredo e Miranda.” (p. 107)
“170.” (ao lado, escrito em tinta azul, se lê: “Repetição por des-

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 339-390, 2018


376 Tácito Luiz Cordeiro Galvão

cuido. Veja-se no 3, pag. 2”) “Em um livro de Óbitos da Freguesia


de Itamaracá. A folhas 96, acha-se este assento: Aos 25 dias do mês
de outubro de 1689 falleceu da vida presente Felippe Guedes Al-
coforado com todos os sacramentos necessários, e fez testamento
solene aprovado, em que deixou por legado de sua alma, 700 Missas
Ordinarias, e 3 da rainha Santa, dous officios solenemente cantados,
deixou mais de esmola, mil crusados a uma mulata donzella forra sua
filha, e 100$000 rs a um mulato forro seu filho e 100$000 rs por obra
pia a seu irmão o Alferes Affonso Guedes Alcoforado: advirto que o
mulato se chama Manoel, e a mulata Laura. O dito Felippe Guedes,
era freguez desta Freguesia, morador dentro da Ilha de Itamaracá,
natural deste Bispado, casado com D. Anna de Abreu, de idade de
setenta e tantos annos pouco mais ou menos, e foi sepultado em sua
Capella invocação de S. João Baptista, e no mesmo dia se disserão
missa de corpo presente, e um officio de corpo presente aos dous
acima nomeados; de que fiz este assento que por verdade me assig-
nei, e logo se fez o outro officio. O Vigario Luiz de Figueiredo de
Almeida.” (p. 108)
“171.” (ao lado, escrito em tinta azul, se lê: “Repetição por descui-
do. Veja-se no 4, pag. 2”) ”Outro no mesmo livro a folhas 121. Aos 28
dias do mês de julho de 1706 faleceu desta vida presente D. Anna de
Abreu viuva que ficou por morte do Capitão Felippe Guedes, mae do
Capitão João Guedes, com o sacramento da Confissão e Comunhão,
e me afirmarão não dera tempo para me darem recado para ir dar
o Sacramento da extrema unção; foi sepultada na sua Capella de S.
João do seu Engenho, e se lhe fez o Officio da obrigação de corpo
presente, e me disserão não quizera fazer testamento. De que fiz
este assento e por verdade me assignei. O Vigario Antônio Borges de
Lemos.” (p. 109)
“172.” (ao lado, escrito em tinta azul, se lê: “Repetição deste assen-
to por engano. Veja-se no 5, pag. 3”) “Assento de cazamento lançado a
folhas 62v do competente livro da Freguesia de Itamaracá. Aos 18 de
Novembro de 1698, de tarde, nesta Matriz de N. S. da Conceição da
Ilha de Itamaracá, do Bispado de Pernambuco, em minha presença o
Pe Antonio Borges de Lemos Vigario da dita matriz se casarão in facie
celesie por palavras de presente corridos os banhos na forma do Sa-
grado Concilio Tridentino e por mandado do muito Reverendo Viga-

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 339-390, 2018


As “Notas Históricas e Curiosas” de Salvador Henrique de Albuquerque (2ª parte) 377

rio Geral o Dr Francisco da Fonseca Rego; purgado o impedimento, a


D. Izabel Bandeira de Mello com Simão Aranha de Vasconcellos, filha
legitima a nubente D. Izabel Bandeira de Mello, do Alferes Antonio
Bandeira de Mello e de sua mulher D. Maria de Oliveira Maciel; e o
nubente Simão Aranha filho legitimo de Vicente Aranha de Vascon-
cellos, e de sua mulher Anna do Rego Barros, já defuntos e fregueses
que forão da Freguesia de Santos Cosme e Damião de Iguarassu, e
a dita nubente freguesa desta Freguesia de N. S. da Conceição de
Itamaracá e naturaes deste Bispado de Pernambuco, sendo presentes
por testemunhas o Almoxarife da Fazenda Real Francisco Alves de
Vasconcellose Luiz Lopes da Silva; e por verdade fiz este assento em
o mesmo dia e era acima em que me assignei com testemunhas. O
Vigario Antonio Borges de Lemos, Francisco Alves de Vasconcellos,
Luiz Lopes da Silva.” (p. 109)
“173. Em um livro de batisado da mesma Freguesia de Itamaracá,
sem se poder saber o nº da folha por estar o papel trocado e corco-
mido do tempo, nesse lugar achei lançado o seguinte assento. Izabel,
filha de Cicília de Chaves moça parda, forra, baptisei na Capella de
S. Gonsalo de Itapeçuma em 22 de Junho de 1673; forão padrinhos
Francisco Pereira da Silva e Jacinto Cardoso. O PeQuadjuctor Domin-
gos Coelho Diniz” (p. 110)
“174. A folhas 22 do mesmo livro está este outro assento. Em o 1o
de Agosto de 1680 baptisei a Ventura, filho de José Pinto de Abreu e
de Maria da Assumpção; forão padrinhos Francisco filho do Capitão
Diogo Velho e Jacinta Velha. O Vigário Gonçalo Cabral.” (p. 111)
“175. Aos 19 de Julho de 1712 falleceu da vida presente com todos
os Sacramentos o Capitão Francisco Paes Tavares, ouvidor que de
presente era; não acabou de fazer o seu testamento por morrer estan-
do o fasendo; foi sepultado nesta Matriz de N. Senhora da Conceição
e se lhe fez logo officio de corpo presente, amortalhado no habito de
San Francisco, e acompanhado com as couparias que ha na Matriz.
De que fiz este assento e por verdade me assignei. O Vigário Antonio
Borges de Lemos. Do livro de baptisados, cazamentos e óbitos da
Freguesia de Itamaracá consta que era marido de D. Luisa de Vascon-
cellos, filha de D. Izabel de Vasconcellos, viúva de Luiz de Mello, a
qual era sogra do dito Capitão Francisco Paes Tavares e falleceu em
9 de Maio de 1700.” (p. 111)

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 339-390, 2018


378 Tácito Luiz Cordeiro Galvão

“176. A folhas 83 de um livro da Freguesia de Itamaracá onde


estão lançados muitos assentos assentos de baptismos casamentos e
hobitos; achei o cazamento de um filho do Tenente Coronel Manoel
Dias de Andrade e de sua mulher D. Mariana Cavalcanti. Ei-lo – Aos
3 de Outubro de 1707 na Capella de N. Senhora do Desterro de Ita-
pirema de baixo, de licença minha em presença do RdoCônego André
de Barros Cavalcanti se casarão por palavras de presente em facie
eclesie D. Antonia Baptista de Vasconcellos, filha legitima do Tenente
Coronel Francisco Cabral Marrecos, e de sua mulher Maria Cabral de
Vasconcellos com José de Andrada Cavalcanti, filho legitimo do Te-
nente Coronel Manoel Dias de Andrada, e de sua mulher D. Mariana
já defunta sendo presentes por testemunhas o Rdo Vigário de Iguaras-
sú o Dr. Domingos Pereira Gil e o Capitão mor Jerônimo Cavalcanti
de Albuquerque e Lacerda, e foi este casamento feito de manhã e
tomarão logo as bênçãos núpciaes, de que fiz este assento e por
verdade me assignei. O Vigário Antonio Borges de Lemos.” (p. 112)
“177. A folhas 158. Aos 12 de Dezembro de 1718, falleceu da vida
presente José Perrete de Moraes Castro, Capitão de Infantaria do ter-
ço Paulista, e casado nesta Freguesia; foi sepultado nesta Matriz em
habito de N. Senhora do Carmo, e não fez testamento por morrer
quasi repentinamente, e recebeu o Sacramento da confissão somente;
de que fiz este assento em que me assignei. Antonio de Andrade de
Araújo Coadjuctor.” (p. 112)
“178. A folhas 148v, de um livro do Rio Grande do Norte está este
assento: Aos 22 dias do mês de Maio de 1712 falleceu da vida presen-
te Antonio Cabral de Vasconcellos, Ajudante de Infantaria do Terço
Paulista, natural do Rio de Janeiro e casado nesta Freguesia com D.
Mariana de Crasto, freguesa desta Freguesia de N. S. da Apresentação
e nella está sepultada, e não fez testamento por morrer depelouradas
dos tapuyas bárbaros, porem ainda recebeu o sacramento da peni-
tencia e comunhão, e foi sepultada em habito de S. Francisco. Era
Coadjuctor da Matriz em auzencia do Rdo Vigário fiz este assento em
que me assignei. Antonio de Andrada de Araújo.” (p. 113)
“179. O Capitão mor Manoel Carneiro da Cunha foi filho de Manoel
Carneiro de Mariz e neto por parte paterna do Capitão João Carneiro
de Mariz o qual sérvio na Guerra dosHollandezes, como consta de
uma escriptura de doação que o dito Capitão mor Manoel Carneiro

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 339-390, 2018


As “Notas Históricas e Curiosas” de Salvador Henrique de Albuquerque (2ª parte) 379

Cunha fez da parte que lhe cabia dos serviços que lhe pertencia seu
irmão mais velho João Carneiro da Cunha cuja escriptura foi passada
na nota do anno de 1692 pelo Tabelião Diogo Cardoso.” (p. 113)
“180. (ao lado, se lê: “Repetição por engano. Veja-se no 71, pag.
48”) O Capitão Francisco Paes Tavares e sua mulher D. Luisa de
Vasconcellos, forão os pais do Capitão João Tavares de Mello e de
D. Thereza Tavares de Mello. Este João Tavares de Mello foi cazado
com D. Thereza de Jesus e tiverão filhos. D. Thereza Tavares de Mello
acima nomeada cazou com Francisco Alves de Vasconcellos filho le-
gitimo do Capitão Francisco Alves de Vasconcellos (filho legitimo do
Capitão Francisco Alves de Vasconcellos) e de sua mulher D. Cosma
Monteiro da Silva e tiverão sucessão. Um irmão de Francisco Alves
de Vasconcellos, marido de D. Thereza Tavares de Mello foi o Capi-
tão Simão Alves de Vasconcellos, cazado com D. Joanna Rego Barros
de cujo matrimonio nasceu D. Anna Maria Correia que cazou com
seu primo Antonio Tavares de Vasconcellos filho de seu tio, irmão
de seu pai o referido Francisco Alves de Vasconcellos e sua mulher
a dita D. Thereza Tavares de Mello. Todas as pessoas acima referidas
forão naturaes e moradores das Freguesias de Itamaracá, Iguarassú
e S. Lourenço de Tejucupapo e principalmente de Itamaracá onde
quasi todos forão moradores: e isto sei pelos livros de baptisados e
cazamentos das ditas Freguesias que tive a pouco em meu poder os
quaes se achão no archivo da Câmara Eclesiástica. Nota de Salvador
Coelho de Drumond e Albuquerque.” (p. 114)
“181. Em um livro muito velho que está na Matriz do Recife achei
os assentos seguintes: Em 28 de Maio de 1656 Baptisei e puz os San-
tos Óleos a João, filho de Antonio Dias de Leão e de sua mulher Ma-
ria da Conceição. Forão padrinhos Belchior Alves e sua mulher Maria
Camello. Vigário Licenciado Manoel Dias de Carvalho.” (p. 115)
“182. Em 16 de Março de 1658, baptisei e puz os Santos Óleos
a Maria, filha de Antonio Dias de Leão e de sua mulher Maria da
Conceição. Forão Padrinhos o Capitão Amaro Lopes de Madeira e
Catharina Álvares.” (p. 115)
“183. Em 28 de Dezembro de 1659 baptisei e puz os Santos Óleos
a Lusia, filha de Antonio Dias de Leão e de sua mulher Maria da
Conceição. Forão Padrinhos Manoel Martins Vieira e Leonor Antunes.
Vigário Antonio da Silva.” (p. 115)

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 339-390, 2018


380 Tácito Luiz Cordeiro Galvão

“184. Assento de baptismo de uma filha de um dos maiores inimi-


gos que João Fernandes Vieira teve em Pernambuco. Em 5 de Janeiro
de 1659 baptisei no Colégio e puz os Santos Óleos a Catharina, filha
do Dezembargador Simão Alves de Sa Penha Deus Dará, Cavalheiro
professo da Ordem de Christo, Provedor da Fazenda Real e Juiz do
Cavalheiros, e de sua mulher D. Leonarda de Azevedo. Forão padri-
nhos seus filhos Manoel Alves de la Penha e D. Aldonça.” (p. 115)
“185. Noticia. Henrique de Leão, natural do Recife foi advogado
em Olinda, era irmão inteiro de D. Luzia de Leão, foi casado com D.
Izabel de Távora, natural de Iguarassú. Henrique de Leão era natural
da Villa nova de Paterra no Algarve e era casado com Maria da Con-
ceição, natural do Forte velho naParahiba, D. Izabel de Távora natural
de Iguarassú, como fica dito, foi filha de Gonçalo Calheiro e de sua
mulher Maria Vieira naturaes da Província do Minho: do Dr. Henri-
que de Leão e sua mulher D. Izabel de Távora nascerão D. Maria de
Távora e Sebastião de Távora Calheiros.” (p. 116)
“186. Papel de doação lançado em notas a requerimento do Alferes
José de Almeida e Goveia. Marianno de Almeida e Goveia Fidalgo Cava-
lheiro de S. M. que Deus Guarde. Entre os mais bens que possuo bem
assim são quatro moradas de casas térreas e cinco chãos sitos no beco
chamado das Miudinhas, dos quais foi Senhora e possuidora minha mãe
a Sra D. Luzia de Leão que Deus haja em sua Sta Gloria, cujas encapelou
com a obrigação de uma capella de Missas cada hum anno por sua alma
de que eu sou o primeiro administrador, e pela comissão e poder que
me concedeu a Senhora minha mãe, como consta do seu testamento,
nomeio para segundo administrador das ditas casas e chãos encapella-
dos a minha filha D. Felippa Dezederia da Assumpção, que desde logo
ficará administrando, pois por esta minha nomeação, cedo e desisto da
administração que nellas tinha, na pessoa da dita minha filha acima no-
meada, cumprindo em tudo a penção e encargo que nas ditas moradas
de casas e chãos forão impostas na forma da ultima vontade da dita
minha mãe instituidora,e que passavam as ditas casas e chãos na mesma
forma que as instituio; e por assim ser a minha vontade lhe passei o
presente por mim feito e assignado. Villa de Sto Antonio do Recife, 15 de
Janeiro de 1758. Marianno de Almeida e Goveia.” (p. 116)
“187. A folhas 17 v, de um livro de baptizados da Freguesia da
Luzestá o seguinte = Aos 3 de Abril de 1704 baptizou com licença mi-

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 339-390, 2018


As “Notas Históricas e Curiosas” de Salvador Henrique de Albuquerque (2ª parte) 381

nha o Pe. Francisco Geraldo no seu Oratório do Goitá desta Freguesia


a Maria, filha legitima de Luiz de Abreu e de sua mulher Antonia da
Costa. Forão padrinhos o Capitão João Cavalcanti d’Albuquerque e
sua mulher D. Catharina Castello Branco de que fiz este assento em
que assignei: O Vigário Apolinário Moreira.” (Livro I, fl. 117)
“188. A folhas 36. Aos 8 de Fevereiro de 1709, baptizou o Pe. Diogo
de San Francisco a Francisco, filho de Francisco Coelho da Rocha e
de sua mulher D. Joanna Cavalcanti de Albuquerque. Foram Padri-
nhos o licenciado Manoel da Motta Silveira e D. Izabel da Silveira,
tem os Santos óleos do que fiz este assento em que assignei. O Vigá-
rio Apolinário Moreira.”
“189. Livro de Óbitos. A folhas 46. Ao 1º dia do mês de Outubro
de 1749, falleceu da vida presente o Capitão José de Mello Cezar de
Andrada, marido de D. Marianna Bezerra de Azevedo freguez desta
Freguesia e do lugar das Salinas, de idade de 50 annos pouco mais ou
menos, com todos os Sacramentos foi sepultado nesta Matriz: morreu
atintestado. O Vigário João Freire” (p. 118)
“190.” (ao lado, se lê: “Inutilisado”) A 27 de Julho de 1716 matarão
a D. Thereza Josepha de Lima mulher do Capitão Gaspar Fernandes
Villar: era Senhora do Engenho Macaxeira onde foi sepultada. (em
seguida, com outra letra: “Inutilisado com o seguinte”). (p. 118)
“191. Aos 27 de julho de 1716 matarão a D. Theresa Josepha de
Lima, mulher do Capitão Gaspar Fernandes Villar: não deu logar a se
lhe administrar Sacramento algum por cahir logo morta foi sepultada
na Capella de N. Senhora dos Prazeres do seu Engenho da Macaxeira,
amortalhada no habito de San Francisco e por verdade fiz este assento
em que me assignei. O Vigario Antonio Borges de Lemos.” (p. 118)
“192. O Alferes Francisco Alves de Vasconcellos, era filho do Almo-
xarife da Fazenda Real de Itamaracá Francisco Alves de Vasconcellos e
de sua mulher Cosma Monteiro da Silva; e casou o dito Alferes a 16 de
Fevereiro de 1715 com D. Thereza Tavares de Mello, filha legitima do
Capitão Francisco Paes Tavares já defunto e de sua mulher D. Luisa de
Vasconcellos: Forão padrinhos o Capitão Marcelino Leitão de Oliveira
e Albuquerque e sua mulher D. Anna da Cruz. Livro de baptisados e
cazamentos de Itamaracá, a folhas 103v até 104.” (p. 118)
“193.” (ao lado, se lê: “Repetição pr descuido do no 1, pag. 1a”) Se-
bastião Lopes Grandio foi casado com Maria Moreira, foi Provedor da

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 339-390, 2018


382 Tácito Luiz Cordeiro Galvão

Fazenda Real de Itamaracá, uma filha deste Sebastião Lopes Grandio


camada Maria Alves Grandio, casou no dia 24 de Novembro de 1683
com Simão Gomes Grandio, filho de Manoel Gomes Grandio e de
sua mulher Joanna Rodrigues natural de Abrantes.” (p. 119)
“194.” (ao lado, se lê: “Repetição pr descuido. Veja-se no 1, pag.
1a”) A folhas 46 v está o assento seguinte: Aos 24 de Novembro de
1683 na Capella de N. S. dos Prazeres da Macaxeira desta Freguesia
de N. Senhora da Conceição em presença de mim o Pe Gonçalo Ca-
bralVigario della sendo presentes por testemunhas o Capitão Mor An-
tonio Botelho da Silva, o Capitão Diogo Velho Cardozo, Beatriz Men-
des e D. Petronilla de Souza, se casarão por palavras de presente em
facie celesie Simão Gomes Grandio, filho de Manoel Gomes Grandio
e de sua mulher Joanna Rodrigues natural de Abrantes, e Maria Alves
Grandio, filha do Provedor da Fazenda Sebastião Lopes Grandio e de
sua mulher Maria Moreira moradores nesta freguesia, de que fiz este
assento por verdade assignou. O Padre Gonçalo Cabral” (p. 119)
“195. O Alferes Domingos Monteiro de Sá falecido em 26 de Maio
de 1718 era sogro do Capitão José Alves Pragano e cunhado do
capitão Francisco Alves de Vasconcellos que foi Almoxarife da Fa-
zenda Real de Itamaracá por ter este cazado com sua irmã D. Cosma
Monteiro de Sá. Além desta filha, mulher do Capitão Pragano achei
mais um filho do mesmo Domingos Monteiro de Sá, chamado Al-
feres Domingos de Sá e Mello. N.B. O referido Francisco Alves de
Vasconcellos cunhado do Alferes Domingos Monteiro acima teve de
sua mulher D. Cosma Monteiro de Sá os filhos seguintes: O Capitão
Francisco Alves de Vasconcellos, o Capitão Simão Alves de Vascon-
cellos, o Ajudante Lourenço Alves de Vasconcelos casado com Maria
Magdalena.” (p. 120)
“196. Folha 25v. Aos 13 de Junho de 1722 na Capella de N. S. do
Pilar filial da Matriz do Corpo Santo da Villa do Recife e com licença
minha e em presença das testemunhas assignadas, recebeu o Rdo
Luiz Cezar de Mello corridos os banhos, sem impedimento a José
de Mello Cezar com D. Mariana Bezerra da Silva, ambos moradores
nesta Freguesia e deste Baptisado na forma do S. Conc. Trid. e para
constar fiz este assento em que me assignei. O Cura Antonio d’Aguiar
Pereira.” (p. 120)

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 339-390, 2018


As “Notas Históricas e Curiosas” de Salvador Henrique de Albuquerque (2ª parte) 383

“Certidão da Instituição do Capellado do Engenho S. Pantaleão no


Monteiro, auto de posse que tomou o administrador do mesmo Enge-
nho José Camello Pessoa, das terras de Ambrozio Machado, sita no mes-
mo Engenho, titulo das mesmas terras e demarcações dellas. (p. 121)”
“197. Diz o Capitão José Camello Pessoa de Lacerda que lhe é pre-
ciso que o Escrivão Almeida revendo os autos de Capellado Engenho
Monteiro lhe passe por certidão de verbo ad verbum a instituição da
referida Capella e juntamente o auto de posse, e inventário que tomou
o actual administrador Francisco Camello Valcaçar constando mais té
que anno se tem dado conta da referida Capellas seja servido mandar
passar a Certidão na forma requerida com toda a clareza e individua-
ção. Certidão. E Receberá Mercê = Passe = Locio = Manoel Caetano de
Almeida e Albuquerque Escrivão da Provedoria de bens e fazenda dos
defuntos e auzentes Capellas e resíduos da Cidade de Olinda e Villa de
Santo Antonio do Recife seus termos e Capitania de Pernambuco por
sua Alteza Real o Príncipe Regente Nosso Senhor que Deus Guarde.
Certifico que vendo os autos de Capella que instituio João Pessoa Be-
zerra, de que é administrador Francisco Camello Valcaçar nelles a fo-
lhas 396 verso, se acha a instituição por Certidão de que trata a petição
retro a qual é do theor e forma seguinte. Instituição. Instituo por minha
universal herdeira a minha Capella Invocação de Nossa Senhora das
Angustias sita em o Collegio de Olinda para o que fiz uma escriptura
com os Reverendos Padres que quero que se lhe dê inteiro e inviolável
cumprimento, e quero e ordeno que a dita Capella e sua administração
seja administrador meu sobrinho o Reverendo Padre João Ribeiro Pes-
soa e que logo depois do meu fallecimento tome posse da dita admi-
nistração e de todos os meus bens que gozará como meu coherdeiro
e administrador e faltando elle passará a dita administração a seu so-
brinho filho de sua irmã Ignez Pessoa e do Capitão Nuno Camello, e
se casar o dito seu sobrinho chamado José irá a dita administração aos
filhos mais velhos [se...vamente] e faltando este irá indo a dita adminis-
tração nos filhos que tiver a dita minha sobrinha Ignez Pessoa mais
velhos sucessivamente até se acabar esta linha e acabada ella sempre
proferindo os machos irá a administração a casa de linha de minha
irmã Maria Pessoa com as mesmas declarações de preferirem os ma-
chos, e acabados e extincta estas casas e linhas passará a casa de mi-
nha irmã D. Francisca e extinctasumas e outras passará a dita adminis-

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 339-390, 2018


384 Tácito Luiz Cordeiro Galvão

tração aos Padres da Companhia do Collegio da Cidade de Olinda com


as mesmas obrigações e encargos que neste deixo. Mando e ordeno
que as sete Capellas de Missas que deixo se digão na minha Capella
do Collegio se me digão desta forma digo nesta forma na segunda
feira pela alma de meu Pai na terça pela alma de minha Mãe e os mais
que são cinco pela minha alma e assim mais além destas missas que
deixo na Capella de N. Senhora das Angustias deixo mais três Capellas
de Missas que se digão nesta Capella de San Pantaleão o que obrigo
também os rendimentos deste Engenho a saber aos sábados uma mis-
sa a Nossa Senhora por minha tenção, outra pelas almas do fogo do
purgatório e estas missas serão perpetuas com a dita administração
mando também ao meu administrador que por que sou muito devoto
da Virgem Senhora Nossa por cuja interceção me tem feito Deus mui-
tas mercês que aos sábados e nas vésperas dos dias de festada Senho-
ra facão cantar a ladainha e a sexta por mim e por si porque se não
perca esta devoção como também as novenas de San Francisco Xavier
de que sou muito devoto para o que dará duas libras de cêra para o
altar, e mandará acender a lâmpada assim para a novena como para os
sábados como festas de N. Senhora. E também peço ao meu adminis-
trador tenha particular cuidado com a limpeza e fornecimento desta
Capella de San Pantaleão mando a meu administrador o Reverendo
Padre João Ribeiro Pessoa e os mais que sucederem na dita adminis-
tração tenha particular cuidado todos os annos fazerem o gosto de um
dia das quarenta horas do entrudo no Collegio da Cidade de Olinda
assim como eu fazia e por quanto os rendimentos deste Engenho San
Pantaleão que deixo avinculado a minha Capella de N. Senhora das
Angustias, e os mais que disponha são enserto regulando-me pelo me-
noz e conforme a experiência me tem mostrado quero despor segura-
mente por não parecerem digo não parecem minhas mandas para o
que os deixo e mando que dos rendimentos do dito Engenho pagos os
gastos úteis e necessários para se fazerem as safras o que ficar liquido
si partirá em três partes uma para o meo administrador, outra para o
fornecimento do dito Engenho, a outra parte para a minha alma e a
estribaria o meu administrador conforme ordeno abaixo. Mando em
primeiro lugar se paguem as cento e cinqüenta arrobas de assucar
branco aos Reverendos Padres da Companhia de Jesus conforme a
Escriptura que fiz com elles e também as três Capellas de Missas que

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 339-390, 2018


As “Notas Históricas e Curiosas” de Salvador Henrique de Albuquerque (2ª parte) 385

se hão de dizer nesta Capella de San Pantaleão. Mando e ordeno ao


meu administrador que os rendimentos que tocar a minh’alma casem
uma orphã de boa fama a quem darão cem arrobas de assucar, a cou-
sa que o valha e sendo de minha geração a amparem com mais que
poder conforme o rendimento e o mais que subejar repartiram com os
pobres envergonhados e principalmente pelos que forem meus paren-
tes procurando sempre saber os demais necessidades ficando a quan-
tidade ao arbítrio do meu administrador o qual dará conta de que
modo o repartio e despendes esta parte que me toca a minha alma ao
reitor do Collegio dando-lhe toda a clareza de quem os recebe e assim
peço pelo amor de Deos a os ditos Reitores do Collegio assim presen-
tes como amdouros tomar esta conta para que não haja duvida nem
falência nestas obras pias para que os instituio por meos testamentei-
ros nesta parte. Declaro que os bens que possuo e deixo avinculados
a minha Capella de Nossa Senhora das Angustias, e ao mais que orde-
no são os seguintes a saber. Este Engenho San Pantaleão com todas as
terras assim matas como cannaviaes que todos estão nos meus papeis
e assim mais peças cobres e mais fabrica que pertença ao dito Enge-
nho e se achar por meu. E não se continha mais couza alguma em dita
instituição e mais verbas contidas na mesma por translado do próprio
testamento, o que me reporto. Certifico mais que nos mesmos autos
não se aça o auto de posse que tomou o administrador Francisco Ca-
mello Valcaçar assim um auto de posse que tomou antes delle o admi-
nistrador José Camello Pessoa que é o seguinte = Auto de posse 1707,
17 de 9bro. Auto de posse anno do nascimento de Nosso Senhor Jesus
Christo de mil sete centos e sete, aos 16 dias do mês de Novembro do
dito anno, nas terras de Ambrosio Machado, sitas no Engenho de San
Pantaleão aonde eu Tabelião fui vindo com o Dr. Luiz de Valensuella
Hortes, Fidalgo da casa de Sua Magestade e seu Juiz de Fora de Per-
nambuco, Provedor dos Defuntos Auzentes Capellas e Resíduos, tudo
com alçada pelo mesmo Senhor, ahi apareceu prezente o Capitão mor
José Camello Pessoa, Senhor do dito Engenho de San Pantaleão, por
administração por ser o dito Engenho em Capellado e por elle foi re-
querido a elle Dr. Juiz de Fora, que lhe mandasse dar posse de dous
pedaços de terras de lavrar canna contíguos aos partidos e cannaviaes
do dito Engenho, dizendo que havia arrematado em praça publica
pelo Juízo do auzentes os ditos dous pedaços de terras de canna, com

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386 Tácito Luiz Cordeiro Galvão

seus pastos pertencentes a Ambrosio Machado, como constou pela


carta de arrematação que apresentou, e visto pelo Dr. Juiz de Fora seu
requerimentos mandou se lhe desse posse na forma que requeria e
logo eu Tabelião comecei a dizer em alta e intelligivel voz: se havia
alguma pessoa que tivesse duvida ou embargos, a dita posse, viesse
com elles no termo da lei, e por não haver pessoa que empedisse a dita
posse, eu Tabellião a dei ao dito empossante, pessoal, real, natural, e
corporal, depois do dito Capitão Mor José Camello Pessoa fazer as se-
remonias que o direito manda, cortando canna, plantando outra e lan-
çando terra para o ar; a qual posse lhe dei e houve por dada dos ditos
dous partidos de canna e um pedasso de terra de pasto, sendo a tudo
testemunhas prezentes o Alferes Miguel de Souza Vieira, o Alferes
Francisco de Andrade, Antonio de Souza Crespo que todos aqui assig-
narão com o Dr. Juiz de Fora e impossante. Eu Manoel Coelho Pereira
Tabellião o escrevi e assignei em público e raso, estava o signal públi-
co em testemunho de verdade Manoel Coelho Pereira e Valensuella,
José Camello Pessoa, Miguel de Souza Vieira, Antonio de Souza Cres-
po, Francisco de Andrada Lima. E logo no mesmo dia mez e anno atraz
declarados no auto de posse, foi requeridos do dito Dr. Juiz de Fora
pello dito Capitão Mor José Camello Pessoa, que elle havia tomado
posse judicial manca e pacífica sem embargo ou contradição de pessoa
alguma de todas as terras que forão de Ambrozio Machado de Carva-
lho, assim partido de cannas como terras de pastos e por que as ditas
terras confrontavão com outras do Engenho San Pantaleão de que elle
dito Capitão Mor é administrador, e com terras do Engenho da Caza
Forte de que é Senhor e possuidor o Tenente Coronel Jacinto de Freitas
da Silva e sua mulher D. Antonia da Cunha; queria dividir-se e demar-
car-se e dos cohereos para o que havia feito já citar aos ditos Tenente
Coronel e sua mulher ao Dr. Antonio Alves de Castro, como Promotor
do Resíduo e Capellas, como tudo constava pelas certidões juntas do
escrivão do Alcaide Manoel Fernandes Gomes; e pelo dito Dr. Juiz de
Fora lhe foi dito lhe apresentasse elle dito Capitão Mor os títulos por
onde se confrontava a terra que havia arrematado, para por elles lhe
fazer sua demarcação e logo pelo dito Capitão Francisco Monteiro Be-
zerra, Senhorio que havia sido do dito Engenho de San Pantaleão, e de
quem havia tomado o cognome de Monteiro, no qual inventario se
achou ser declarada pela inventariante Maria Pessoa, que com as terras

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 339-390, 2018


As “Notas Históricas e Curiosas” de Salvador Henrique de Albuquerque (2ª parte) 387

do dito Engenho se acharam místicos dous pedaços de terras que se


havião comprado a Christovão Anes Quese, Flamengo, nos quaes dous
pedaços de terras estavão três partidos de cannas a saber: um em que
lavrou João Cordeiro de Mendanha, na passagem; outro em que lavra-
va Lourenço Nunes Victoria, e depois delles Antonio Alves de Castro;
e outro em que lavrava Izabel Cardoza; e depois della o mesmo Anto-
nio Álvares; com alguns pastos mais em que seu filho João Pessoa, tem
plantado um novo partido os quaes títulos, sendo vistos pelo dito Dr.
Juiz de Fora, como delles não se achassem dar rumo, ou vento de agu-
lha, nem braças de terras para por ella se fazer a demarcação, mandou
notificar algumas testemunhas que lhe pareceo mais fidedignas, ho-
mens antigos nesta fazenda como com effeito se notificou ao Licencia-
do Gregório Pereira de Caldas, ao Alferes Miguel de Souza Vieira e ao
Alferes Francisco de Andrada Lima aos quaes deu juramento aos San-
tos Evangelhos e debaixo delle lhes encarregou que dicessem a verda-
de do que sabião e lhes fosse perguntado, e sendo com effeito pergun-
tado se sabião de algum rumo ou vento algum porque nesta Freguesia
da Várzea, onde são moradores se não custumão demarcar os partidos,
de agulha por onde as terras arrematadas fossem algum dia demarca-
das. Responderão que não sabião de rumo, ou vento algum, porque
nesta freguesia da Várzea onde elles são moradores se não custumavão
demarcar os partidos por rumos ou ventos e só se demarcão por bali-
zas de arvores, e valles, e, outrossim, lhe foi perguntado pelo Dr. Juiz
de Fora se sabião qual era o partido em que lavrou João Cordeiro de
Mendanha na passagem e o partido em que lavrou Lourenço Nunes
Victoria e depois Antonio Álvares e o partido em que lavrou Izabel
Cardoza, e depois o mesmo Antonio Álvares, e responderão que sa-
bião muito bem pelo haverem ouvido aos seus antepassados, e pes-
soas antigas, lavradores que forão do mesmo Engenho, que os partidos
em que lavrou Antonio Álvares, se começão a demarcar e dividir de
um vallo que vai do rio Capibaribe para a parte do sueste, e vai pelo
pé de um cajueiro velho e continuando pelo pé de uma murta rama-
lhada vai buscar três cajueiros grandes que estão junctos, e dahi atra-
vessando a estrada por onde se tira a canna vai buscar um cajueiro alto
e deste busca o cajueiro a que chamão caju furado, e dahi vai acabar
em um vallo que fica ao pé de duas larangeiras, juncto a Ipocira a que
chamão cariaria, e dahi voltando para a parte de baixo até meter no rio

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 339-390, 2018


388 Tácito Luiz Cordeiro Galvão

Capibaribe, e que esta era a terra de canna e pasto que lavrava Antonio
Álvares; e que o outro pedaço de terra em que lavrava João Cordeiro
de Mendonha na passagem e [camtribe], se começa a dividir e confron-
tar com a dita Ipocira, que atraz fica nomeada e corre por entre terras
pertencentes ao Engenho da casa forte, nas quaes de presente taira de
uma parte o Capitão Diogo de Miranda, e da outra parte o Capitão
Manoel Cavalcanti e João Pereira Gil, descendo por um vallo de caja-
zeiras a meter no rio Capibaribe o que ouvido pelo dito Dr. Juiz de
Fora perguntou ao dito Capitão Mor José Camello Pessoa se elle tinha
alguma duvida a confrontação das terras aqui feitas e por elle foi res-
pondido que elle não sabia ao certo por donde corria a dita terra e que
assim o havia declarado seu antecessor o Dr. Roberto Correia Ribeiro;
porem que nesta declaração que as ditas testemunhas haviam feito, e
ter elle dito Capitão mor bom conceito e opinião das ditas testemu-
nhas, queria estar pelos seus ditos o que ouvido pelo dito Dr. Juiz de
Fora houve os dous pedaços de terras por demarcadas na mesma for-
ma que pelas ditas testemunhas lhe foi declarado, visto os conherêos
com quem partem os ditos dous pedaços de terras não alegaram couza
alguma nem aparecerem para esta demarcação, sendo para Ella citados
e para conservação do direito do dito Capitão mor mandou fazer este
termo de demarcação que julgou por sua sentença enterpondo para
ellla o decreto judicial que assignou com o dito Capitão mor e testemu-
nhas sendo a tudo testemunhas prezentes o Dr. Pedro Ferreira Brandão
e Antonio de Souza Crespo, que todos aqui assignarão e eu Manoel
Coelho Pereira escrivão o escrevi Luiz de Valensuella Hortiz, Miguel de
Souza Vieira, José Camello Pessoa, Miguel de Souza Vieira, Francisco
de Andrada Lima, Gregorio Pereira de Caldas, Pedro Ferreira Brandão,
Antonio de Souza Crespo, e o mais se não continha cousa alguma em
dito Auto de posse e mais declarações coherentes ao mesmo auto de
posse, que eu fiz copias dos próprios a que me reporto. E mais se não
continha em dita certidão que eu João Francisco Reges escrivão do
crime e cível Tabelião Publico do Judicial e notas nesta cidade do Re-
cife de Pernambuco por sua Magestade Imperial o Senhor Dom Pedro
II que Deus Guarde bem e fielmente fiz copia do próprio original que
me foi apresentado pelo reconhecer verdadeiro ao qual me reporto e
o tornei a entregar a quem me o apresentou;vai na verdade sem cousa
que duvida faça, conferida e consertada comigo próprio e com o offi-

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As “Notas Históricas e Curiosas” de Salvador Henrique de Albuquerque (2ª parte) 389

cial abaixo, por mim subscripta e assignada, com os signais seguintes


de que uzo aos vinte e sete dias do mez de Abril do anno do Nasci-
mento de N. Senhor Jesus Christo de 1833. O subscrevi e assignei esta-
va o signal publico em testemunho de verdade o Tabelião publico João
Francisco Regis comigo Manoel Antonio Coelho de Oliveira.
A cópia supra da instituição do encapellado Engenho Sam Panta-
leão do Monteiro, foi extrahida da certidão que nos foi benignamente
franqueada pelo Sr. José Camello do Rego Barros, filho da Exma. Sra.
D. Maria Helena Pessoa de Mello, última administradora daquelle
vinculo. Vai por nós conferida e affirmamos ser fiel esta copia. Secre-
taria do Instituto Archeologico e Geographico Pernambucano 5 de
Outubro de 1876 = Salvador Henrique de Albuquerque, Secretário
Perpétuo = José Domingues Codiceira, 2º Secretário.” (p.132)
“198. Assento de Casamento. Em 8 de Novembro de 1699 a tarde
casarão na matriz da Taquara Manoel de Amorim Cazares, filho de
Matheus Rabello e de sua mulher D. Felippa de Amorim morador em
Igarassu, com Maria José de Lima, filha de Julião Saraiva de Moura e
de sua mulher Cosma Leitão moradores e fregueses da dita Taquara;
forão padrinhos o Capitão Antonio Carneiro de Desterro e Manoel
Leitão de Carvalho a folhas 53v.” (p. 134)
“199. Livro de batizados do Rio Grande do Norte a folhas 41v.
Aos 24 de setembro de 1693 baptisou o Pe. Manoel Dias Santiago
a Eugenio, filho de Manoel Fernandes e de sua mulher Antonia de
Brito índia. Forão padrinhos Antonio de Fontes Rangel e Luisa Nunes
Marinha. Basilio de Abreu e Andrade” (p. 134)
“200. Livro de óbitos da Freguesia de San Fr. Pedro Gonçalves do
Recife a folhas 235 verso. Aos 9 dias do mês de Abril de 1730, faleceu
nesta Freguesia da vida presente com todos os sacramentos o Dr.
Antonio de Souza Magalhães, homem solteiro de idade de 55 anos,
pouco mais ou menos, natural deste Recife, filho legítimo do licen-
ciado Jerônimo de Souza Magalhães e de sua mulher Joanna Netta,
já defuntos.
Fez testamento com um papel assignado por sua mãe, e assignado
com oito testemunhas no qual instituio por testamenteiro a seu irmão
o Padre Francisco de Souza Magalhães, e por herdeiro a Francisco
Xavier que está em Coimbra, e a Geraldo de Souza; e deixou por
legado pios a Ignacio dos Santos por alimentos: 300$000 e a D. Qui-

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390 Tácito Luiz Cordeiro Galvão

teria outros 300$000 por alimentos, além de quatro escravos que lhe
tem dado; e a uma filha de Maria de Goveia 200$000 de esmola e que
lhe mandem dizer cinco capellas de missas por sua alma, e deixou
ao dito seu irmão o Padre Francisco de Souza Magalhães 100$000 e
declarou que lhe mandassem dizer missas de corpo presente e o seu
enterro a desposição do seu testamenteiro. Deixou a N. S. dos Praze-
res 50$000 e 50$000 a Santa Quiteria.
Sepultou-se na capella dos 3os de N. S. do Carmo donde era irmão
e Prior neste presente anno, em habito da mesma Religião. Manoel
Freire d’Andrade.” (p. 134-135)

Referências

ARQUIVO da Matriz de São Pedro Mártir de Olinda, Livro de Batizados da


Freguesia da Sé de Olinda, 1822-1845, p. 79.

IAHGP, Arquivo e Coleção Orlando Cavalcanti, caixa 149, inventário do Ma-


jor Salvador Coelho de Drumond e Albuquerque.

REVISTA do IAHGP, vol. XLI, 1946-1947, “O Tombo do Mosteiro de São Ben-


to de Olinda”, p. 77-79.

http://bndigital.bn.gov.br/hemeroteca-digital/(os jornais Diário de Pernam-


buco e Jornal do Recife)

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391

Í ndice onomástico

Nome Documento Nome Documento


ABREU
Anna de 170 e 171 Salvador Coelho de 168 e
Drumond e 180
Antonio Álvares de 136 Salvador Henrique de 197

Helena de 101 ALCOFORADO


João de 158 Affonso Guedes 170
José Pinto de 174 Felippe Guedes 170
Luiz de 187 ALLANDRA, Barto- 132
lomeu de
Manoel de 121 ALMEIDA
Pedro Soares de 124 Agostinho Cabral de 117
Sebastião Dias de 118 Andreza de 152
ACCIOLLE, Joanna 127 Luiz de Figueiredo de 170
AGUIAR ALVARES
Manoel de Faria de 166 Antonio 197
Miguel Ribeiro de 108 e 145 Catharina 182
ALBERTIM, Joanna de 111 Maria 132
ALBUQUERQUE ALVES
Antonio Cavalcanti de 132 Antonio 162
Drumond e 168 Belchior 181
Jerônimo Cavalcanti de 123 Izabel 149
Jerônimo de 103 AMARAL
Joanna Cavalcanti de 188 Izabel da Costa do 118
João Cavalcanti de 101, 133, Úrsula Feio do 123
138 e 187
Jorge Cavalcante de 127, 132 AMORIM, Felippa de 167 e
e 133 198
Manoel Caetano de Al- 197 ANDRADA
meida e
Marcelino Leitão de Oli- 192 Agustinho Cezar de 156,
veira e 159 e 161
392

Nome Documento Nome Documento


Basílio de Abreu e 159, Marianna Bezerra de 189
160 e 161
Cosma da Cunha de 136 Matheus de Freitas de 168
José de Mello Cezar de 189 BANDEIRA
Lourença Maciel de 154 Felippe 163
Manoel Dias de 176 Quitéria 154
ANDRADE 199 BAPTISTA, João 103 e 143
Basilio de Abreu e 199 BARBOSA
Francisco de 197 Gaspar de Almeida 135
Gonçalo Feliciano Berenger 119 Feliciana 109
de
Manoel Dias de 176 Izabel 132
Manoel Freire de 200 BARRETO
ANTUNES, Leonor 183 João 133
ARAGÃO, Leonor Xi- 134 e João de Abreu 158 e
menes de 169 160
ARANHA, Simão 172 BARROS
ARAÚJO Anna do Rego 172
Antonio de Andrada de 177, Catharina de 101
178
Bernardo Pessoa de 108 Joanna Rego 180
João Gomes de 108 e 111 José Camello do Rego 197

José Tavares de 139 Maria de 133


Miguel Pessoa de 107 e 108 BEGUEMAN, 117
Nicolao
ASSUMPÇÃO BEZERRA 162
Felippa Dezederia da 186 Domingos 162
Maria da 174 Francisco Monteiro 197
AZEVEDO Ignacia 141 e 143
Clara de 168 João Pessoa 197
Ignacia Pereira de 135 Josepha 116
João Dourado de 168 Manoel 140
José Gomes de 111 Maria de Abreu 135
Leonarda de 184 BEZERRIL, Anna de 144
393

Nome Documento Nome Documento


BOLCÃO, Manoel Pereira 118 CALHEIROS

BOTELHO Gonçalo 185


Gaspar da Costa 150 Manoel de Oliveira 151
Maria Vasconcellos 165 Sebastião de Távora 185
BRANCO, Catharina 187 CAMACHO
Castello
BRANDÃO João de Oliveira 135
Manoel de Caldas 153 Luiz de Oliveira 135
Pedro Ferreira 197 CÂMARA, Anna 144
Soares da
BRITO CAMELLO
Anna de 116 Maria 181
Antonia de 199 Nuno 197
Gonçalo Novo de 136 CARDOSA, Izabel 197
Maria de 117 CARDOSA
CABRAL Diogo 179
Balthazar 118 Diogo Velho 124, 126,
144 e 194
Caetana da Veiga 113 Jacinto 173
Gonçalo 124, 125, Luiz Velho 148 e 149
126, 127, 128,
130, 131, 133
167, 174, 194
Jerônima Maria 150 Manoel 140
Jerônimo da Veiga 121, 130, CARNEIRO, Pedro 165
134 e 169 Alves
Manoel da Veiga 134 CARVALHO
Maria da Veiga 169 Ambrozio Machado de 197
Maria 121 Manoel da Costa de 143
Mariana Teixeira 108 Manoel Dias de 181
Valentim Tavares 134 Manoel Leitão de 198
Valentina Maria 105, 106, CASARES, Manoel 142
134 e 150 de Amorim
CALDAS, Gregório 197 CASTRO
Pereira de
394

Nome Documento Nome Documento


Antonio Alves de 197 CORREA
Antonio Pereira de 140 Anna Maria 180
Francisco de Fontes 140 Domingos 101
José Perrete de Moraes 177 Antonia da 187
CAVALCANTI Jerônima Pereira da 118
André de Barros 122 e 176 João Gomes da 142
Anna 109 Luiz Duarte da 141
Joanna 122 e 123 Paula da 156
João 102 e 109 Paulo da 157 e
158
Jorge 132 Simão da 163
José de Andrada 176 CRASTO
Leonardo Bezerra 122 Mariana de 178
Manoel 197 Úrsula de 126
Maria Bezerra 122 CRESPO, Antonio 197
de Souza
Mariana 176 CRUZ
CAZARES, Manoel de 198 Anna da 192
Amorim
CEZAR Branca da 107
Agostinho 157, Maria da 109
158 e 159
Christina 117 Maria Ferreira da 163
José de Mello 196 CUNHA
Maria 119 Antonia da 197
CHAVES, Cicília de 173 Antonia Dias da 112
CODICEIRA, José Do- 197 João Carneiro da 79 e
mingues 145
COELHO Manoel Carneiro da 179
Duarte 103 e 168
Francisco Ferreira 148 DESTERRO, Anto- 198
nio Carneiro de
Izabel 136
CONCEIÇÃO, Maria 181, DEUS DARÁ, Simão
da 182, 183 e Alves de Sá Penha
185 184
395

Nome Documento Nome Documento


DIAS, Antonio 157 Francisco Dias de 138
DINIZ Luiz de 169
Domingos 162 FONSECA
Domingos Coelho 132, 162 Anna de Sá da 137
e 173
DORNELLAS Antonio da 157
Leandro da Silva 111 José de Barros da 112
Maria 137 FRAGA, Cosme 118
Rodrigues
DOURADO FRAGOSO
Feliciano 168 Bárbara Bezerra 111
Gaspar Fernandes 168 Ignez de Bezerril 111
João 168 FRANCISCO, Diogo 188
de Sam
FALCÃO, Vasco Marinho 127 FREIRE, João 189
FARIAS FREITAS, Matheus 168
de
José de 108 e 118 GAMA, Luisa da 117 e 123

Rosa Maria de 115 GARCIA, Angela 150


FERNANDES, Manoel 199 GERALDO, Francisco 187
FERREIRA GIL
Antonia 156 Domingos Pereira 176
Antonio da Cruz 119 João Pereira 197
Antonio Thomaz 102 GOMES
Manoel da Cruz 119 Beatriz 143
Manoel Nunes 160 Manoel Fernandes 197
Margarida 131 Maria 148
Maria 131 e 163 GONÇALVES
Roque 131, 163 Balthazar 103
e 164
FIALHO Izabel 125
José 143 GONDIM
Manoel de Carvalho 163 Antonio Velho 151,
FIGUEIREDO 152 e
Estevão Brioso de 132 153
396

Nome Documento Nome Documento


Catharina de Sena 151 JORGE, Vicente 103
Francisca Velha 152 LACERDA
GOVEIA Jerônimo Cavalcanti de 176
Albuquerque e
José de Almeida e 186 José Camello Pessoa de 197
Maria de 200 LEÃO
Marianno de Almeida e 186 Antonio Dias de 181,
182 e 183
GRACEZ, Lourenço 146 Henrique de 185
GRANDIO Luzia de 185 e
186
Manoel Gomes 193 e 194 LEITÃO
Maria Alves 193 e 194 Antonio da Costa 122 e 135
Sebastião Lopes 167, Cosma 198
169, 193 e
194
Simão Gomes 193 e 194 Joanna da Costa 135
GUEDES Úrsula 137
Felippe 170 e 171 Vasco 132
João 171 LEMOS
GUEVARA Ângela de 167
Anna Velez de 134 Antonio Borges de 104, 105,
Bernardina Antonia de 134 106, 117, 120,
Fernando Cabral de 112 122, 135, 136,
Valentina Maria Cabral de 134 166, 171, 172,
HOLLANDA, Gonçalo 153 175, 176 e
Pereira de 191
HORTIZ, Luiz de 197 LIMA
Valensuella
JESUS Francisco de Abreu de 128, 129
e 130
Agostinha Thereza de 153 Francisco de Andrada 197
Clara Maria de 114 Francisco Dias 144
Companhia de 197 Francisco Pereira de 166
Ignacia Maria de 112 Thereza Maria de 114
Thereza de 148 e 180
397

Nome Documento Nome Documento


Manoel Barbosa de 167 e MARTINS
169 Antonia 117
Manoel da Rocha 101 Antonio Alfaiate 103
Maria José de 198 Bento 117
Thereza Josepha de 190 e MATTOS
191 Francisco de Souza 149
LÔLÔ, Francisco Paes 110 Maria Soares de 166
LOPES, Maria 121 MEDINA Fo, Gaspar 132
Xer (ou Ximenez) de
MACEDO, Antonio Ta- 150 e 152 MELLO
vares de
MACHADO, Ambrosio 196 e 197 Angela Soares de 151
MACIEL Antonia Bandeira de 151
Antonio de Carvalho 107 Antonia Thereza 134
Tavares de
Maria de Oliveira 172 Antonio Bandeira de 163 e
172
MADEIRA, Amaro 182 Christovão Vieira de 137
Lopes de
MAGALHÃES Domingos de Sá e 116 e 195
Antonio de Souza 200 Felippe Bandeira de 163
Francisco de Souza 200 Francisco Xavier 154
Madeira de
Jerônimo de Souza 200 Ignacio de 115
MAGDALENA, Maria 141 e 195 Izabel Bandeira de 172
MAIOR, Felippe de Jerônimo de Albuquer- 168
Valadares Souto 154 que e
MARIA, Josefa 142 e 149 João Cavalcanti de 109
MARINHA, Luiza 199 João Leitão de 137
Nunes
MARIZ João Tavares de 180
João Carneiro de 179 José da Silva e 104
Manoel Carneiro de 179 Luiz Cezar de 196
MARRECOS, Luiz de 175
Francisco Cabral 176 Manoel Fernandes de 156
398

Nome Documento Nome Documento


Maria Helena Pessoa de 197 Luiz de Figueiredo de 121, 134,
165 e 169
Rafael Ferreira de 123 MONTEIRO
Thereza Tavares de 180 e Domingos 147 e 195
192 José da Cruz 143
MENDANHA, João 197 Pedro Lobam 131
Cordeiro de MORAES, Apolinaria de 165
MENDES MOREIRA
Beatriz 194 Apolinario 101, 187
Brites 124 e 126 e 188
MENEZES Maria 193 e 194
Diogo de Souza de 126 MOTTA, Manoel da 101 e 102
José Barreto de 144 MOURA, Julião 198
Luiz Felliz de 144 Saraiva de
Luiz Velho de 169 NEGREIROS
MIRANDA André Vidal de 128
Diogo de 197 Mathias Vidal de 133
Luiz de Figueiredo de 121, 134, NETTA, Joanna 200
165 e 169
Maria Helena Pessoa de 197 NOGUEIRA
Rafael Ferreira de 123 Antonio Gonçalves 152
Thereza Tavares de 180 e Christiano Gonçalves 152
192 OLIVEIRA
MENDANHA, João 197 Manoel Antonio Coelho de 197
Cordeiro de Manoel de 101 e 103
MENDES Maria de 163
Beatriz 194 Úrsula de 119
Brites 124 e 126 PAES, Damião 147
MENEZES PEGADO, João 154
Diogo de Souza de 126 PEMENTEL
José Barreto de 144 Gonçalo da Silva 118
Luiz Felliz de 144 Luiz da Silva 118
Luiz Velho de 169 PENHA, Manoel 184
Alves de la
MIRANDA PEREIRA
Diogo de 197 Anna 166
399

Nome Documento Nome Documento


Antonia da Silva 168 José Alves 195
Antonio d’Aguiar 196 QUESE, Christovão 197
Anes
Antonio da Silva 110 e 168 RABELLO, Matheus 198
Catharina 168 RAIMUNDO, Felix 106
Francisco 117 de Oliveira
Francisco de Brito 135 RANGEL
Francisco Martins 163 Antonio de Fontes 116 e 199
Gonçalo 132 Francisco de Fontes 141, 142
Gonçalo de Hollanda 53 e 143
Gonçalo de Olanda 151 REGIS, João Fran- 197
Joanna 162 cisco
Manoel Coelho 197 REGO
Manoel Nunes 166 Catharina de Barros 102
Mariana Bezerra 162 Christovão de Barros 101 e 102
PESSOA Francisco da Fonseca 172
Anna Bezerra 168 Manoel da Fonseca 152
Ignez 197 RIBEIRO
João 197 Felippe 160
João Ribeiro 138 e 197 Manoel Alves 114
José Camello 168, Miguel 145
196 e Roberto Correia 197
197 ROCHA
Luiz da Veiga 139 Anna da 140
Manoel de Oliveira 103 Francisco Coelho da 188
Maria 197 RODRIGUES
Maria Dornellas de 139 Francisco 111
Prudente 116 Joanna 193 e 194
PINHEIRO, João 131 ROLLEZ, Manoel 103
Cardoso Soares
PINTO ROMEIRO
Domingos de Araújo 169 Antonio Gonçalves 121 e 134
Domingos Nunes 166 João Rodrigues 105
PRAGANO SÁ
Capitão 195 Cosma Monteiro de 195
400

Nome Documento Nome Documento


Domingos Monteiro de 195 Margarida da 113
João Correia de 137 Maria Saraiva da 128
SANTIAGO, Manoel 199 Mariana Bezerra da 196
Dias Pedro Correa da 112
SANTOS SILVEIRA
Clara Dias dos 112 Antonio da Motta 138
Francisco Botelho dos 104, 105, Izabel da 188
106, 134 e Manoel da Motta 101, 102
150 e 188
Ignacio dos 200 Maria Borges 138
Margarida dos 118 SIMÕES, Thomaz 139
SARGENTO, Nicolao 117 SIQUEIRA, Manoel 148
Paes Pegado de
SILVA SOAGE, Anna Vieira 108
Alexandre da 137 SOARES
Antonio Botelho da 194 Angela 153
Antonio da 168 e Angela Garsia 166
183 Annacleta 145
Antonio Pereira da 113 Catharina 146
Cosma Monteiro da 180 e Manoel 146
192 Manoel Velho 150 e 166
Fernando Guedes da 111 Maria 144
Francisco de Figueiredo da 138 Mathias Velho 150
Francisco de Mello e 114 e 115 SOBRAL, Antonio da 136
Silva
Francisco Lopes Guedes 111 SOUZA 200
da Geraldo de
Francisco Pereira da 173 José dos Santos e 109
SOUZA
Jacinto de Freitas da 197 Petronilla de 194
João Correa da 112 TAVARES
José da 112 Francisco Paes 175,
Luiz Lopes da 131, 162, 180 e 192
163, 164 Gonçalo Paes 105
e 172
Manoel de Mesquita da 162
401

Nome Documento Nome Documento


TÁVORA Miguel Pessoa de 107
Izabel de 185 Sebastião Leitão de 132
Maria de 185 João Soares de 118
Maria Pereira Coutinho 168 Lourenço Alves de 141 e 195
de Manoel Mendez de 109
TEIXEIRA Maria Tellez de 108
Aurora Francisca 119 Simão Alves de 180 e 195
Mariana 145 Simão Aranha de 172
Micaella 145 Suzana Lins de 124
Paulo 143 Úrsula Cavalcanti de 123
TORRES, Damaso de 152 e 153 Vicente Aranha de 172
Oliveira VEIGA
VALCAÇAR Izabel da 128 e 130
Antonio Tavares 163 Jerônima da 146
Francisco Camello 132 e 197 VELHA
VALDEVESSO, 137 Jacinta 174
Balthazar Dornellas Diogo 125, 145,
VALENSUELLA, Ma- 197 147 e 174
noel Coelho Pereira Manoel 145
VASCONCELLOS VELOZA, Joanna 101
Anna de 139 VICTORIA, 197
Antonia Baptista de 176 Lourenço Nunes
Antonio Cabral de 178 VIDAL, João Lopes 106
Antonio Tavares de 180 VIEIRA
Francisco Alves de 172, Francisco Fernandes 117
180, João Fernandes 117, 120,
192 e 195 132 e 184
Ignacia Bezerra de 140 Manoel da Silva 156 e
Izabel de 175 161
Luiza de 175, Manoel Fernandes 120 e 163
180 e 192
Lusia Pessoa de 107 Manoel Martins 183
Maria Cabral de 138 e 176 Maria 185
Maria Pessoa de 138 Miguel de Souza 197
402

Nome Documento
VILLAR, Gaspar 190 e 191
Fernandes
VITAL, Antonio Curado 128
XAVIER
Francisco 200
Sam Francisco 197
XIMENES
Leonor 130
Maria 127 e 132
Maria (ou Xer) 132
403

Í ndice toponímico

Nome Documento Nome Documento


Abrantes 193 e 194 de N. S. do Pilar da
Matriz do Corpo Santo
da Vila do Recife 196
Araripe 117, 134, de N. S. do Pilar de 113
136 e 166 Itamaracá
Beco das Miudinhas 186 de N. S. dos Prazeres da
(Recife) Fortaleza de Itamaracá 115
Bispado de N. S. dos Prazeres do
Engenho da Macaxeira 191 e 194
de Pernambuco 163 e de S. Gonçalo 118
172 de S. Gonsalo de 173
do Porto 166 Itapeçuma
Câmara de S. João 171
Eclesiastica 120 e 180 de S. João Baptista 170
Municipal 120 de S. Pantaleão 197
Capela de Santa Levina de 136
Araripe
da Virgem dos Prazeres 169 de Santa Lusia 136
de N. S. das Angustias 197 de Santiago Maior do 109
Engenho Camaragibe
de N. S. do Amparo do 134 do Bom Jesus do Araripe 166
Engenho do Meio
de N. S. do Bom Sucesso do 122 do Colegio 197
Caraú
de N. S. do Bom Sucesso do 110 do Engenho Caraú 135
Engenho de Tanhenga
de N. S. do Desterro 118 do Rosario do Paraizo do
Engenho de Gongassari 117
de N. S. do Desterro de 176 dos Terceiros de N. S. do 200
Itapirema de Baixo Carmo
de N. S. do Ó 133 Capitania
de N. S. do Ó de Araripe 117 de Itamaracá 163
404

Nome Documento Nome Documento


de Pernambuco 103 e 197 Flamengo 197
Caraú 122, 135 e Fortaleza
136 do Brum 168
Cavalheiros 184 Real de Itamaracá 115
Cidade Forte Velho na 185
de Olinda 118 e 197 Parahiba
do Recife de Pernambuco 197 Freguesia
Coimbra 200 da Luz 107, 138,
Colegio da Cidade de 197 139 e 187
Olinda da Taquara 198
Companhia de Igarassu 108, 111,
do Colegio da Cidade 197 117, 118, 119,
de Olinda 136, 137, 144
de Jesus 197 e 180
Convento dos 101 de Itamaracá 112, 122,
Mendigantes 132, 133, 140,
Engenho 163, 166, 169,
da Casa Forte 197 170, 172, 173,
de S. Pantaleão 197 176 e 180
de S. Pantaleão de Monteiro 197 de Maranguape 116
Macaxeira 190 de N. S. da 178
Monteiro 197 Apresentação
Mussupe 144 de N. S. da Apresenta-
S. Pantaleão do Monteiro 197 ção da Província do Rio
S. Pantaleão no Monteiro 196 Grande do Norte 155
Tanhenga 168 de N. S. da Conceição
Fazenda da Ilha de Itamaracá 134
de Baltazar Gonçalves 103 de N. S. da Conceição 164 e
dos defuntos 197 da Vila de Itamaracá 166
Provedor da, 194 de N. S. da Conceição 172
Real 104, 106, de Itamaracá
162, 167, de N. S. da Conceição 135 e 194
172, 184, de N. S. da Luz 101
192, 193 de S. Fr. Pedro 200
e 195 Gonçalves do Recife

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 395-407, 2018


405

Nome Documento Nome Documento


de S. Lourenço 103 164, 166, 167, 169,
de S. Lourenço da Matta 109 e 110 170, 172, 173, 176,
de S. Lourenço de 180 180, 192, 193 e 195
Tejucupapo Lugar das Salinas 189
de S. Pedro Mártir de 118 Matriz
Olinda da Freguesia 123
de Santa Marta 166 da Ilha de Itamaracá 114
de Santos Cosme e 166 e 172 da S. da Conceição 121
Damião de Iguarassu da Taquara 198
de Tejucupapo 146 da Vila de N. S. da 162
do Itambé 123 Conceição de Itamaracá
Goianna 131 e 168 de Igarassu 118
Guiné 117 e 121 de Itamaracá 116
Igarassu 108, 111, de N. S. da 159, 160 e
117, 118, Apresentação 161
119, 136, de N. S. da Conceição 165, 167, 169
137, 144, e 175
168, 180, de N. S. da Conceição 104 e 172
185 e 198 da Ilha de Itamaracá
Igreja de N. S. da Conceição
capela de N. S. do Bom 110 da Vila de Itamaracá 105, 106, 120
Sucesso e 135
de N. S. do Carmo 101 de N. S. da Conceição 163
de N. S. do Rozário 143 de Itamaracá
Ilha de Itamaracá 104, 114, 134, de S. Lourenço de 154
170 e 172 Tejucupapo
Instituto Archeologico 197 de S. Pedro Mártir da 118
e Geographico Cidade de Olinda
Pernambucano do Recife 181
Itamaracá 104, 105, 106, Morgado de 168
112, 113, 114, S. Pantaleão
115, 116, 120, do Engenho
122, 124, 132, Monteiro
133, 134, 135, Muçurepe 103
140, 162, 163, Nossa Senhora
406

Nome Documento Nome Documento


da Luz 101 Tejucupapo 146, 147,
das Angustias do Colegio 197 148, 154
de Olinda e 180
do Bom Sucesso 135 Vila
do Itambé 123 da Conceição de 134
Olinda 103, 118, Itamaracá
135, 163, 168, de Itamaracá 162 e 167
185 e 197 de N. S. da Conceição 165
Oratório do Goitá 187 de N. S. da Conceição
Parochia de N. S. do 123 da Ilha de Itamaracá 134
Desterro de Olinda 103
Pernambuco 103, de Santo Antonio do 186 e 197
163, 172, Recife
184 e 197 Nova de Paterra no 185
Província Algarve
d’África Portugueza 168

do Minho 185
Recife 109, 181,
185, 186, 196,
197 e 200
Rio 103 e 197
Capibaribe 103 e 197
de Janeiro 178
de Muçurepe 103
Grande do Norte 178 e
199
Santa Sé de Olinda 163
Sé de Olinda 135
Sitio ou logar do 117
Mariguára
Tapuas 157,
158, 160 e
161
Tapuya 159 e
178

Revista do IAHGP, Recife, n. 71, pp. 395-407, 2018


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SOBRENOME, Nome. Ano. Título do livro em negrito: subtítulo. Tradu-


ção. Edição. Cidade: Editora, p. ou pp.
SOBRENOME, Nome. Ano. Título do capítulo do livro entre aspas. In: Títu-
lo do livro em negrito: subtítulo. Tradução. Edição. Cidade: Editora, p. xx-yy
SOBRENOME, Nome. Ano. Título do artigo. Título do periódico em negri-
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Arte Final Capa: Fernando Alves da Silva
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