ABSTRACT
1. INTRODUÇÃO
Inserida num ambiente escolar nos últimos tempos algumas questões têm me surgido, a
respeito da dinâmica de funcionamento daquele espaço, uma vez que tenho me deparado
com certo desânimo manifestado tanto pelos agentes docentes como pelos escolares, que
estão na escola, mas não necessariamente são professores ou estudantes. Nesse sentido
percebo que esse ambiente acaba por produzir um clima, cujas relações, seja com o ensino
ou entre as pessoas que ali se encontram, se constituem com algumas características as
quais remetem a um estado de adoecimento.
Movida por essas vivências esse texto busca responder algumas indagações tais
como: O que é uma escola e sua função social? Qual é o objeto de atividade que norteia
seu funcionamento? Quais as instâncias envolvidas: agentes e usuários? O que podemos
entender por educação? Que saberes e práticas têm sido geradas nesse espaço? O que as
queixas escolares tentam nos dizer?
Contudo não se pode negar que o fato dessa instituição estar presente nesses
locais com tanta legitimidade isso não a torna uma instância eficaz pois esse espaço
depende do seu fazer e não somente do seu existir.
Nesse sentido não podemos deixar de relatar que o fazer desse segmento está
deixando a desejar haja vista o cenário de problemas existentes nesses locais, quer seja na
área estrutural, técnica, pedagógica, traduzidos pelo atos de violência, evasão escolar,
fracasso escolar e as queixas escolares, focalizadas essencialmente na figura da criança-
estudante, situações essas testemunhadas por seus usuários, meios de comunicação e
produção científica.
Isto posto, observa-se então que a família passou a não ser mais o único contexto
em que a criança tem oportunidade de experienciar e ampliar o seu repertório como
sujeito de aprendizagem e desenvolvimento, logo, há de se reconhecer a importância da
escola enquanto instituição social-educacional.
Enfim, são essas e outras questões que merecem ser mais exploradas e discutidas
às claras, tanto pela comunidade política, acadêmica e educacional, como pela sociedade
em geral. Vale ressaltar que nesse artigo discutirei de forma suscinta alguns dos
questionamentos mencionadas, pois há de se reconhecer a amplitude e desdobramentos
do assunto e qualquer tentativa de esgotá-lo culminará num reducionismo e
empobrecimento.
Ao longo dos séculos, a função social da escola tem estado a mercê de responder as
necessidades de cada época. Considerando que o objeto de atividade dessa instituição
criada e reconhecida pela sociedade é a educação, faz-se alguns esclarecimentos inicias
sobre esse conceito para prosseguirmos na nossa discussão.
Constituída desses princípios ideológicos nas suas bases, a escola é tomada hoje
como um local de transmissão de conhecimentos e dos valores culturais bem como um
espaço de preparo da criança para desempenhar o papel de adulto ativo nas estruturas
sociais. Assim as metas gerais da escola envolve: busca do conhecimento,
desenvolvimento das habilidades sociais, comunicação, condutas pró-sociais, relações
afetivas, formação da identidade pessoal, promoção da autonomia, entre outras
atividades. São propostas a se desenvolver por meio de seu currículo formal que consiste
da transmissão do saber científico, da educação individual ou coletiva, do grau de
estruturação do ensino, dos métodos, dos níveis de atividade, como também via currículo
informal que corresponde à: influência dos professores, dos pares, forma e a qualidade
das relações, clima sócio-afetivo da classe e da escola.
Dentro desse espaço circulam e frequentam vários agentes e usuários quais sejam: alunos,
pais, responsáveis, corpo docente, equipe pedagógica, equipe-técnica administrativa,
entre outros, que são colaboradores na arte de ensinar.
Quanto a escola ele atua tanto como um funcionário como também como um
colega. Em relação ao aluno ele é um mediador do conhecimento, estimula a
aprendizagem, direciona as atividades, estabelece o clima em sala de aula, busca manter o
controle.
Partindo do princípio que a escola pode ser considerada como uma entidade social
promotora de saúde, suscita então alguns questionamentos: Afinal, quais as implicações
das práticas educativas pomovidas na escola que afetam a saúde de seus frequentadores?
E que tipo de saúde é essa que a educação nesse espaço formal pode e deve promover?
Segundo González Rey (2004a), o conceito de saúde deve ser considerado mais
um processo do que um produto, sendo que tal processo, em seu funcionamento, se
desenvolve mediante múltiplos mecanismos alternativos, nos quais integra componentes
genéticos, congênitos, somáticos, sociais e psicológicos. Dessa forma aponta três aspectos
básicos importantes para compreensão da saúde, quais sejam: bem-estar que corresponde
a sentir-se motivado para a vida e com interesses definidos em relação às pessoas e
atividades; autocontrole, que pressupõe ter hábitos saudáveis e desenvolver atividades
concretas; e capacidade para responder aos desafios do momento de modo a desenvolver
as suas capacidades biológicas, psicológicas e sociais.
Dentro dessa perspectiva não se pode atribuir tal prática somente às instituições
de saúde, pois na medida em que o processo saúde insere a dimensão social, isso implica
reconhecer que além das demais instituições tais como: família, centros de saúde,
instituições religiosas e espaços desportivos, já que uma das instituições essencialmente
relacionada ao desenvolvimento social e promotora de saúde é a escola (GONZÁLEZ
REY, 2004a).
Corrobora com tal perspectiva Contini (2000), quando menciona que a escola, na
qualidade de uma instituição social, é um espaço vital para a promoção da saúde e que
essa possui uma relação íntima como o processo educativo. Promover saúde é antes de
tudo educar para um modo de vida diferente, em que as atividades desenvolvidas pelos
No entanto, temos presenciado muitas vezes nesse espaço um cenário que beira
ao caos, relações de atritos, violência, desrespeito, fracasso, adoecimento, atos criminosos
extremos como vandalismo, roubo, briga, depredação, extorsão dentre outros. São as
chamadas “violências simbólicas, verbais, morais, psicológicas” praticadas pelas
instâncias e agentes que lá se encontram sejam de forma direta, indireta. São atos de
violência que se manifesta via diretores com pouca versatilidade e habilidade de
mediação, professores autoritários e dotados de poucos saberes docentes, jovens
professores descrentes, professores mais velhos desanimados, conteúdos curriculares
descontextualizados, práticas disciplinares distintas, estruturas funcionais e relacionais
precárias, enfim fatos denominados como violência do ensino, ressalta Abramovay (2002).
Essa violência escolar se torna ainda mais perversa, pois a escola, enquanto
segmento de mediação social do privado para o público tem sido um veículo da violência
de classe, da exclusão, da discriminação, da negligência, da relação aversiva ao ato de
estudar disseminado entre os estudantes, resultando no fracasso escolar dos seus
Diante desse repertório de queixas, tem havido uma grande preocupação entre os
especialistas e pesquisadores da educação em razão desses problemas estarem sendo
abordados e tratados dentro de uma perspectiva da medicalização e psicologização cujo
olhar se volta eminentemente para a criança. Não se trata de advogar um discurso
contrário a essas abordagens, muito pelo contrário, trata-se das expectativas e promessas
atribuídas a essas modalidades principalmente quando se tomam crianças como vertente
central da problemática do ensino.
Contudo, se lançarmos nosso olhar e nossa escuta somente para essas instâncias
mais explícitas e vistas, corremos o risco de uma postura superficial, reducionista e
individualista dos problemas das queixas. Faz-se necessário entender e compreender o
que esse fenômeno das queixas escolares está tentando dizer-nos. Afinal uma postura de
surdez ou cegueira escamoteia as demais forças que atravessam esse campo e que de certa
forma estão produzindo esses efeitos de paralisia, de desgaste, de violência e de
adoecimento, favorecendo, dessa forma, uma brecha para a inserção de uma abordagem
assentada nos moldes da medicalização e psicologização para entender e resolver os
problemas de queixas escolares de modo que a sociedade responderá arduamente por
essa solução “fast food” no futuro.
6. ALGUMAS CONSIDERAÇÕES
Concebendo que um sistema educacional se articula dentro de uma política integrada que
envolve a esfera política, técnico-científica, administrativa e pedagógica, é notório na
atualidade o quanto essas instâncias estão deficientes, logo, centralizar as queixas
escolares atribuindo a um só agente desse espaço, ou seja, o aluno é fazer uma leitura rasa
dessa dinâmica educacional como também é uma prática de ocultamento de toda uma
infra-estrutura, que podemos diagnosticar como doente dada a sua falta de competência
de promover aquilo para qual foi proposta, a arte de ensinar e não a arte de adoecer.
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