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THE CORE OF AN UNQUALIFIED CASE FOR JUDICIAL REVIEW

PARTE I – A PREMISSA CONSEQUENCIALISTA DE WALDRON


Waldron interpreta Dworkin, Raz e Rawls equivocadamente, como se esses
defensores do JR se baseassem em argumentos consequencialistas. Como
todos os argumentos do Waldron em “The core case against judicial review” se
baseiam nessa premissa, toda a tese dele é falha.
Waldron retira suas interpretações de Dworkin do livro “Freedom’s Law”,
enquanto a versão final dos argumentos de Dworkin a favor do JR está no
“Law’s Empire”.

PARTE II – ARGUMENTOS CLÁSSICOS A FAVOR DO JUDICIAL REVIEW


Defensores da prática tentam conciliar a democracia com o JR argumentando
que a autoridade dos juízes para proteger direitos declarando leis inválidas é
necessária para realizar: 1) o ideal de autogoverno que motiva a teoria
democrática; 2) a legitimidade das instituições políticas; e 3) os elementos
constitutivos de uma forma democrática de governo. Esses argumentos
sugerem que, ao limitar o poder da maioria, direitos constitucionalmente
protegidos estabelecem as condições necessárias para um autogoverno
democrático legítimo.

1) O IDEAL DE AUTOGOVERNO
Defensores do JR e da crítica majoritária discordam fundamentalmente quanto
às qualidades definidoras de uma democracia. Para estes, a satisfação das
pretensões da maioria é condição necessária e suficiente da democracia.
Aqueles, por sua vez, defendem uma concepção diferente, chamada de
“concepção constitucional”, segundo a qual a qualidade definidora de uma
democracia não é a fidelidade incondicional às preferências da maioria, mas
sim a participação conjunta e igualitária dos cidadãos no processo de
autogoverno. Segundo essa visão, a democracia é realizada quando cada um
dos membros da sociedade possui garantido o direito de participar, em termos
iguais, no processo de autogoverno. A democracia, ainda de acordo com a
essa visão, é uma forma atrativa de governo porque possibilita uma forma de
vida na qual se pode dizer genuinamente que as pessoas governam a si
mesmas. Só podemos dizer genuinamente que as pessoas participam como
iguais no processo de autogoverno quando os interesses de cada um são
tratados com igual consideração e respeito. A satisfação dessa condição
requer que o Estado limite a influência de certos tipos de preferências no
processo de escolha social. Particularmente, preferências inconsistentes com o
compromisso democrático fundamental com a igualdade política jamais devem
exercer uma influência decisiva sobre as decisões coletivas. Essa exigência
expressa uma condição constitutiva que define a relação adequada entre
preferências e tomada de decisão democrática. Direitos constitucionais são
projetados para implementar essa exigência, filtrando os resultados das
escolhas sociais e garantindo o exercício legítimo do poder político, o qual deve
demonstrar igual consideração e respeito por cada cidadão. Portanto, quando
os tribunais aplicam os direitos constitucionais, eles cumprem uma função
essencial para assegurar as condições necessárias de um autogoverno
democrático.

2) A LEGITIMIDADE DAS INSTITUIÇÕES POLÍTICAS


Em uma democracia, o exercício do poder político deriva sua autoridade da
vontade da maioria. No entanto, nem todo exercício do poder autorizado pela
maioria é legítimo. Um poder soberano que faça valer uma legislação que viole
as condições de legitimidade política, ainda que essa legislação seja apoiada
pela maioria, abre mão de sua própria legitimidade. Assim, a não ser que o
poder da maioria seja limitado de modo tal que as políticas por ele autorizadas
sejam legítimas, não se pode confiar que os exercícios do poder pela maioria
constituam atos legítimos de autogoverno.
Se aceitarmos que um processo político comprometido em tratar todos os
cidadãos com igual consideração deve rejeitar a entrada de preferências
inconsistentes com a igualdade política no processo de escolha social, então,
da mesma forma, instituições políticas legítimas devem restringir a influência
dessas preferências como determinantes da escolha social. Além disso, se
aceitarmos que direitos constitucionais são o mecanismo político que protege
de forma mais eficiente os cidadãos dos efeitos dessas preferências, então
devemos concluir que, quando os tribunais aplicam direitos constitucionais,
eles cumprem uma função necessária para a preservação de uma democracia
saudável.
3) PRÉ-COMPROMISSO E OS ELEMENTOS CONSTITUTIVOS DA
DEMOCRACIA
Um terceiro argumento a favor do JR foca no papel dos tribunais em
implementar garantias básicas com as quais os membros de uma sociedade
política legítima se comprometem quando da sua fundação. Um pré-
compromisso consiste na decisão de restringir a futura liberdade de escolha de
modo a colher benefícios resultantes dessa auto-restrição. Uma vez que o
“entrincheiramento” de direitos envolve uma decisão coletiva de uma sociedade
de restringir a futura liberdade de escolha, a decisão de entrincheirar direitos
pode ser vista como uma forma de pré-compromisso com regras que são
condições necessárias para a realização de instituições democráticas.
Entretanto, a analogia entre o entrincheiramento de direitos por uma sociedade
e um pré-compromisso intencional entre um indivíduo é imperfeita. Por isso, é
necessário distinguir entre restrições auto-vinculativas e incidentais. Auto-
vinculação envolve a adoção intencional de uma restrição ao conjunto de
decisões do indivíduo. Restrições incidentais envolvem limitações no conjunto
de decisões que podem ter sido adotadas por razões outras que não a auto-
vinculação, mas que ainda assim produzem os benefícios da auto-vinculação.
Somente a noção de restrição incidental é relevante para a análise do
entrincheiramento de direitos por uma sociedade. A aplicação da noção de
auto-vinculação como justificativa para o JR é inapropriada, visto que: 1) a
sociedade não é um indivíduo; 2) não há um método confiável para determinar
se os ratificadores dos direitos entrincheirados são motivados pelo desejo de
se auto- vincular de modo a realizar benefícios resultantes; e 3) a ratificação
por uma geração não poderia pré-comprometer as gerações futuras. Não
obstante, direitos entrincheirados geram benefícios do mesmo tipo associado à
auto-vinculação. Cartas de Direitos (Bills of Rights) contendo proteções
adequadas de liberdade de expressão, reunião, religião e consciência, entre
outros, limitam o conjunto de decisão da maioria de uma maneira que
estabelece as condições necessárias para o governo democrático. Uma vez
que o JR executa um papel importante em implementar esses direitos, o JR
necessariamente cumpre um papel essencial em assegurar as condições
necessárias para um autogoverno democrático saudável.

PARTE III – A CRÍTICA DE WALDRON AOS ARGUMENTOS CLÁSSICOS


EM FAVOR DO JR
A crítica de Waldron à concepção constitucionalista e à sua justificação do JR
se baseia nos seguintes argumentos: segundo Waldron, os defensores
constitucionalistas do JR: 1) prestam atenção insuficiente ao direito de ter a sua
voz ouvida na resolução de controvérsias em uma democracia; 2) atribuem a
autoridade para resolver questões fundamentais a respeito do significado e da
extensão dos direitos a um ramo não democrático do governo; 3) não levam
suficientemente em consideração o comprometimento de boa-fé com os
direitos cuja existência deve ser presumida em sociedades democráticas; 4)
subestimam o significado das objeções pluralistas ao argumento de que
direitos entrincheirados são uma condição necessária de legitimidade; e 5)
modelam o entrincheiramento de direitos imprecisamente como uma forma de
pré-compromisso.

1) CRÍTICA I: JR FALHA EM MOSTRAR RESPEITO PELAS PESSOAS


O núcleo do argumento de Waldron é que a alegação de que o
entrincheiramento de direitos é inconsistente com o respeito pelas pessoas,
privando-as do poder de tomar decisões que são centralmente importantes
para os seus direitos e interesses ao interferir com as funções adequadas de
um governo representativo. Segundo Waldron, o respeito pelas pessoas requer
a aderência estrita ao princípio da regra da maioria e, sendo o
entrincheiramento de direitos necessariamente inconsistente com esse
princípio, ele é inconsistente com o respeito pelas pessoas.
O problema é que Waldron simplesmente estipula, em vez de argumentar, uma
explicação do que o respeito pelas pessoas exige. Essa explicação dispensa
sem comentar as óbvias objeções a essa premissa. Proponentes da concepção
constitucional da democracia argumental que a adesão estrita ao princípio de
governo pela maioria – não limitado pelo JR – falha em mostrar respeito
adequado pelas pessoas, arriscando inadmissivelmente privar as pessoas do
poder adequado de influenciar as decisões políticas que afetem seus
interesses. Para defender a sua visão de que o JR restringe inadmissivelmente
a maioria, Waldron deve defender a sua suposição central de que o respeito
pelas pessoas requer estrita adesão à regra da maioria, não obstante as
objeções levantadas pelos constitucionalistas.
Waldron aborda essas objeções no seu argumento a favor de uma solução
baseada em direitos para o problema do desacordo a respeito da natureza e
extensão adequadas das garantias de direitos. Para Waldron, uma vez que as
pessoas discordam sobre as respostas adequadas a várias questões centrais
envolvendo direitos, essas visões conflitantes precisam ser solucionadas
através de algum processo político. A questão fundamental ao estabelecer um
processo desses diz respeito a quem deve ter a autoridade para resolver
questões envolvendo a natureza e a extensão dos direitos. Para Waldron, a
resposta mais persuasiva para essa pergunta é: a maioria, no exercício do seu
direito de participação política. Uma vez que a teoria dos direitos requer que as
pessoas sejam vistas como seres pensantes dotados da habilidade de
deliberar moralmente, essa teoria necessariamente pressupõe que as pessoas
são competentes para exercer a autoridade de resolver controvérsias a
respeito de direitos. Portanto, uma solução apropriada para o problema do
desacordo a respeito de direitos é permitir que aquelas pessoas competentes
exerçam a sua autoridade coletiva.
Ocorre que, enquanto os teóricos de direitos necessariamente pressupõem que
os sujeitos de direitos possuem o potencial para exercer o julgamento moral, o
argumento de Waldron se baseia na suposição de que os teóricos de direitos
devem pressupor o emprego responsável desse potencial, e essa suposição
vai muito além do que “os direitos como tais implicam”. Rousseau, por
exemplo, que o próprio Waldron cita como teórico importante da legislação
participativa, argumenta que cidadãos competentes para deliberar moralmente
não obstante utilizariam a sua autoridade legislativa injustamente a não sei que
o poder da maioria fosse limitado institucionalmente.
O argumento de Waldron se baseia em uma concepção idealizada da condição
humana. Se os homens fossem os anjos que Waldron parece supor, nenhum
governo seria necessário (Madison). Como o governo é necessário, a
concepção idealizada do povo e dos órgãos legislativos vai além das
qualidades que “os direitos como tais implicam”, e, portanto, o argumento de
Waldron falha em justificar a sua solução baseada em direitos para o problema
de resolver controvérsias a respeito de direitos. Assim, Waldron falha também
em defender seu ponto central – o de que o respeito pelas pessoas requer a
adesão estrita à regra da maioria – contra as objeções levantadas pela
concepção constitucional. Logo, uma vez que os argumentos de que o JR
envolve uma falta de respeito pelas pessoas e retira indevidamente das
pessoas o poder de tomar decisões que afetem seus direitos e interesses
dependem desse ponto, ambos esses argumentos necessariamente falham.

2) CRÍTICA II: JR ENFRAQUECE O CARÁTER DEMOCRÁTICO DAS


INSTITUIÇÕES
Waldron pressupõe que a resolução pelos tribunais de questões envolvendo
direitos é inerentemente menos democrática do que a resolução pelo
legislativo. Assim, os defensores do JR, ao atribuir a autoridade para resolver
essas controvérsias a uma instituição não eleita e que não presta contas à
população (os tribunais), enfraquecem o caráter democrático das instituições.
No entanto, a tradição política liberal apoia a visão de que freios ao poder da
maioria – como o JR – são elementos centrais e essenciais de uma cultura
política democrática. Em particular, defensores da concepção constitucional
argumentam que os cidadãos não podem estar seguros em seus direitos de
participar em termos iguais na sociedade civil a não ser que haja mecanismos
que restrinjam o poder da maioria. Uma vez que não é plausível que a maioria
possa supervisionar a aplicação dos direitos cujo propósito é restringir o poder
da própria maioria, instituições especializadas devem executar essa função. Os
tribunais, com a sua expertise em interpretar as implicações práticas da
tradição jurídica, são a instituição adequada pra supervisionar a proteção de
direitos em uma democracia saudável.
Waldron responde a esse argumento simplesmente negando que a maioria não
possa supervisionar a proteção dos direitos dos cidadãos. Para ele, atribuir à
maioria a autoridade para tomar decisões a respeito da natureza e extensão do
poder político da própria maioria não é um procedimento circular. Uma vez que
algum agente político deve ter o poder para resolver essas questões, parece
mais adequado atribuir esse poder às pessoas cujos interesses estão em jogo.
Ocorre que, ao contrário do que Waldron pressupõe, o problema do desacordo
razoável a respeito de direitos em uma democracia não pode ser resolvido
simplesmente determinando qual é a autoridade que terá o poder de resolver
essas questões. Se limites vinculantes ao poder da maioria são uma
precondição necessária de uma democracia saudável, como defende a
concepção constitucional, então atribuir a autoridade de resolver questões
relativas a direitos a essa mesma maioria é uma solução inadequada. Direitos
não podem operar como restrições ao poder da maioria se essa mesma
maioria também possui o poder de determinar o significado e o alcance da
aplicação desses direitos. Ao contrário do que Waldron afirma, o problema não
é apenas que a maioria se torne juiz em causa própria, mas que os direitos
constitucionais não mais limitem o poder dessa maioria.
Ainda, o argumento de Waldron pressupõe que o pedigree democrático do
legislativo é superior ao do judiciário. No entanto, o governo representativo é,
em si mesmo, incompletamente democrático. Os Federalistas argumentaram
que o governo representativo é desejável precisamente porque os
representantes escolhidos não irão representar literalmente as visões dos seus
constituintes. De fato, James Madison argumentou que as eleições levam à
seleção de pessoas diferentes e superiores aos seus constituintes, e que esses
representantes irão utilizar o seu julgamento superior para avançar os
interesses da comunidade.
Se o governo representativo é apenas incompletamente democrático, então o
pedigree democrático do legislativo não é necessariamente superior ao dos
tribunais, os quais protegem direitos que estabelecem as condições
necessárias para o autogoverno democrático. Portanto, Waldron falha em
oferecer uma defesa adequada da sua alegação de que a atribuição da
autoridade para resolver questões relativas ao significado dos direitos aos
tribunais enfraquece o caráter democrático das instituições.

3) JR PRESSUPÕE QUE OS CIDADÃOS NÃO PODEM GOVERNAR A SI


MESMOS DE BOA FÉ
Waldron argumenta que a teoria democrática deveria trabalhar a partir do
pressuposto de que a vasta maioria dos cidadãos está sinceramente
comprometido com o respeito pelos direitos dos demais. Se esse pressuposto
estiver correto, então sociedades democráticas não necessitam nem da
proteção constitucional de direitos, nem da instituição do JR, visto que é
possível confiar que a maioria agirá com base em seu comprometimento de
boa fé com o respeito pelos direitos. No entanto, uma teoria dos direitos que
parta desse pressuposto possui pouco valor prático, uma vez que a evidência
histórica não fornece nenhum apoio para o mesmo.
A insistência de Waldron nessa ideia está fundamentada em dois argumentos.
O primeiro é o de que teorias de direitos baseadas no pressuposto de que
pessoas possuem uma dignidade e uma autonomia que justificam o
entrincheiramento de direitos não podem presumir, de modo consistente, que
os cidadãos participantes do processo democrático irão agir primariamente
com base em motivos predatórios. No entanto, teorias de direitos
entrincheirados não estão necessariamente fundamentadas em preocupações
a respeito de motivos predatórios. Uma preocupação a respeito da influência
das paixões no julgamento político sem dúvida exerceu um papel histórico mais
importante para motivar o entrincheiramento de direitos nas instituições
políticas. Portanto, a crítica de Waldron reflete uma compreensão imperfeita
das preocupações que motivam comunidades políticas democráticas a
entrincheirar direitos em suas constituições.
Ainda, o argumento de que preocupações a respeito de comportamento
predatório são inconsistentes com os pressupostos necessários da teoria dos
direitos falha ao atribuir pressupostos demasiado exigentes a essas teorias.
Uma teoria dos direitos requer apenas o pressuposto modesto de que as
pessoas possuem o potencial para exercer o julgamento moral responsável,
não que eles agirão de forma confiável e responsável ao empregar esse
julgamento. Portanto, é perfeitamente consistente que as teorias dos direitos se
protejam contra os efeitos das motivações predatórias na legislação.
A segunda justificativa de Waldron para insistir que os teóricos dos direitos
deveriam presumir que as disputas a respeito de direitos procedem de um
desacordo de boa fé sobre princípios reflete o seu desejo de apresentar uma
imagem idealizada das legislaturas para contrastar com as imagens que ele vê
como igualmente idealizadas do judiciário apresentadas pelos defensores do
JR. No entanto, Waldron interpreta equivocadamente a visão de Dworkin dos
tribunais como “fóruns de princípio”, tomando como descritiva uma visão que é
normativa (Dworkin não quer dizer que os tribunais já agem como fóruns de
princípio, mas que deveriam agir dessa forma).
Portanto, uma vez que o pressuposto de Waldron de que o conflito político
geralmente reflete um compromisso de boa fé é altamente implausível, seu
argumento de que os cidadãos de democracias deveriam se basear nesse
pressuposto ao projetar suas instituições – eliminando, assim, a necessidade
do JR para proteger direitos individuais – é fundamentalmente e fatalmente
falha.

4) CRÍTICA IV: O ENTRINCHEIRAMENTO DE DIREITOS NÃO É UMA


CONDIÇÃO NECESSÁRIA DE UM GOVERNO LEGÍTIMO
Waldron argumenta que o entrincheiramento de direitos não pode, em si
mesmo, ser uma condição necessária de um governo legítimo, uma vez que
pessoas razoáveis irão discordar a respeito da natureza das condições
necessárias da legitimidade democrática. Para Waldron, nenhuma teoria
política pode gerar uma base plausível para o entrincheiramento de direitos
individuais em face de tal desacordo.
Entretanto, se o fato de as pessoas discordarem enfraquece a autoridade de
qualquer alegação a respeito das condições necessárias de legitimidade, então
o desacordo igualmente enfraquece a autoridade de qualquer instituição
participativa. Waldron não pode, de forma consistente, apelar para o fato do
desacordo para enfraquecer alegações a respeito das condições necessárias
de legitimidade política a não ser que ele também aceite o fato de que o
argumento do desacordo igualmente enfraquece o seu próprio caso a favor da
autoridade da participação democrática. O argumento de Waldron parece
enfraquecer as alegações de legitimidade de todas as teorias das instituições
democráticas, inclusive a dele mesmo.
Waldron pressupõe ter evitado esse resultado porque o seu argumento a favor
de uma solução baseada em direito para o problema do desacordo político
fornece apoio independente para a autoridade das instituições majoritárias. Se,
como discutido acima, esse argumento é falho, então Waldron só pode
defender a autoridade das instituições participativas com base em argumentos
substantivos que também enfrentarão a desacordos significativos. Portanto,
Waldron não pode, de forma consistente, argumentar contra a noção de que o
entrincheiramento de direitos é uma condição necessária da legitimidade
democrática sem abandonar também o seu compromisso com a visão de que a
maioria deveria ter a autoridade de resolver questões envolvendo a natureza e
a extensão dos direitos individuais. Dado que Waldron mantém o seu
compromisso com essa visão, a sua objeção ao entrincheiramento de direitos
como uma condição necessária da legitimidade democrática falha.

5) CRÍTICA V: O PRÉ-COMPROMISSO MODELO O


ENTRINCHEIRAMENTO DE DIREITOS DE FORMA IMPERFEITA
Waldron argumenta que a noção de pré-compromisso modela imperfeitamente
o entrincheiramento de direitos, na medida em que, em um caso verdadeiro de
pré-compromisso, o agente sabe precisamente o tipo de ação que ele quer
evitar, ao passo em que, em um corpo político, as opiniões diferem quanto ao
tipo de legislação que os direitos deveriam impedir, diferenças essas que, para
Waldron, refletem um desacordo razoável quanto à natureza e extensão das
garantias de direitos que a sociedade deveria reconhecer. Sob essas
condições, o entrincheiramento de direitos reflete, para Waldron, não um pré-
compromisso consensual, mas a ascendência artificialmente sustentada de
uma visão na comunidade política sobre as outras.
No entanto, a teoria democrática modela o entrincheiramento de direitos como
uma forma de restrição incidental, a qual não necessariamente envolve uma
auto-vinculação intencional, mas não obstante produz benefícios equivalentes
aos da auto-vinculação. O argumento de Waldron quanto à ascendência
artificialmente sustentada de uma visão sobre as outras pressupõe que as
teorias do pré-compromisso sejam normativas, o que é errado. As teorias a
respeito do pré-compromisso são descritivas e não normativas, e oferecem
uma explicação para o funcionamento e os benefícios de uma determinada
prática social, em vez de uma justificativa para a sua autoridade.
No Core of the Case, Waldron alega que as teorias sobre o pré-compromisso
foram totalmente desacreditadas pela literatura. No entanto, as citações que
ele faz não comprovam essa alegação. Uma vez que Waldron não é capaz de
provar que as teorias do pré-compromisso modelam imperfeitamente o
entrincheiramento de direitos ou que elas foram desacreditadas na literatura, as
suas objeções à explicação feita pelo modelo do pré-compromisso a respeito
do entrincheiramento de direitos necessariamente falham.
Portanto, a crítica de Waldron do JR falha em estabelecer que essa prática: a)
não presta a devida atenção ao direito de ter sua voz ouvida; (b) transfere
poder para uma instituição não democrática; c) não leva devidamente em conta
o compromisso de boa fé dos cidadãos democráticos em respeitar os direitos;
(d) subestima o significado das objeções pluralistas ao argumento de que
direitos entrincheirados são uma condição necessária de legitimidade; ou (e)
modela imprecisamente o entrincheiramento de direitos como uma forma de
pré-compromisso. A crítica de Waldron ao JR se mantém ou cai com a sua
crítica à proteção constitucional dos direitos. Esta seção demonstrou que sua
crítica à proteção constitucional dos direitos não é convincente e, portanto, sua
crítica à revisão judicial também falha.

PARTE IV – O NÚCLEO DE UM CASO NÃO QUALIFICADO EM PROL DO


JR: A CONCEPÇÃO CONSTITUCIONALISTA
Está implícito na própria visão de Waldron de que a regulação da relação entre
preferências e as escolhas políticas da comunidade é uma condição
constitutiva da democracia (“ninguém pensa que qualquer grupo de pessoas
tem o direito de impor a sua decisão aos outros simplesmente porque há mais
indivíduos a favor da decisão do que contra ela”). Ao oferecer um relato dos
arranjos institucionais necessários para regular a relação entre preferências e
escolha social, então, a visão constitucionalista é mais responsiva aos desafios
teóricos levantados pelo fato do pluralismo do que a interpretação oferecida
pelos majoritários.
Essa parte do artigo fornecerá um relato dos direitos constitucionalmente
entrincheirados como características institucionais de uma cultura política
democrática que regulam a relação entre preferências e as escolhas políticas
da comunidade. Particularmente, irá argumentar que direitos
constitucionalmente protegidos definem a classe de preferências que podem
influenciar apropriadamente a escolha social e restringir a influência política de
preferências que pessoas sujeitas ao poder coercitivo do estado poderiam
razoavelmente rejeitar como a base de uma decisão política. Se essa análise
for convincente, então a aplicação desses direitos por meio do JR é uma
prática que é essencial para a democracia.

1) A CLASSE DE PREFERÊNCIAS RELEVANTE PARA A ESCOLHA


DEMOCRÁTICA
Uma teoria democrática aceitável requer, como um elemento central, um relato
das características institucionais – filtros de preferências – que regulam o papel
das preferências na tomada de decisão social e assim definem e regulam a
relação entre preferências e exercícios legítimos de poder político. Um relato
desse tipo deve examinar as formas factíveis de filtros de preferência e
identificar aquela que é mais consistente com os compromissos e as
preocupações democráticas. Filtros de preferências podem filtrar entradas
(inputs) ou saídas (outputs) do processo de escolha social:
a) Filtros de entrada: excluem completamente certos tipos de ou classes de
preferências do processo político. Ex.: excluir da escolha social todas as
preferências que privem outros cidadãos de liberdades básicas.
Nulificam inteiramente a influência dessas preferências, fornecendo a
proteção mais abrangente para os compromissos democráticos. Tem o
defeito de excluir uma grande quantidade de informações sobre
preferências do processo de escolha social;
b) Filtros de saída: limitam apenas os efeitos políticos de certas
preferências. Esse tipo de filtro simplesmente remove certas opções
políticas da consideração social, independentemente do grau de apoio
baseado em preferências que essa opção possa ter. Ao contrário dos
filtros de entrada, permitem que todas as informações sobre
preferências contem.
Se a teoria democrática busca facilitar instituições políticas inclusivas, nas
quais a habilidade de participar seja restringida apenas quando necessário
para assegurar a participação livre e igualitária por todas, então os filtros de
saída são mais consistentes com os objetivos da teoria democrática do que os
filtros de entrada. Direitos entrincheirados, que impedem a maioria de traduzir
certas preferências em legislação inconsistente com os compromissos
fundamentais da democracia, funcionam como filtros de saída e, portanto,
correspondem à interpretação de filtragem de preferências que é mais
consistente com os objetivos da teoria democrática.

2) FILTRANDO PREFERÊNCIAS

VER: PACTO DE MAYFLOWER (pré-compromisso na fundação de uma


sociedade).

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