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RESUMO
Utilizando a perspectiva da Visão Baseada em Recursos (Resources-Based View – RBV) e do
Lean Accounting, foram estabelecidos neste artigo parâmetros para um dimensionamento
enxuto dos Sistemas de Controle Gerencial (SCG), considerando que as duas abordagens de
gestão envolvem a escolha de indicadores que devem partir do mapeamento físico-contábil
dos recursos estratégicos da organização. São apresentados os principais autores e
contribuições da RBV para a Contabilidade Gerencial e introduzidas as vertentes do Lean
Accounting para fins de complementação entre as abordagens. Para tanto, são utilizadas as
premissas empíricas da visão do Lean Accounting como meio de aplicação da RBV em
processos de otimização dos SCG, visando torná-los mais enxutos. Através da pesquisa
bibliográfica e reflexão dialética, com base na literatura existente, as teorias foram testadas.
Conclui-se que RBV e o Lean Accounting possuem similaridades no que se refere ao
dimensionamento do design do SCG, sendo que os objetivos estratégicos da RBV podem ser
potencializados quando as empresas adotam a filosofia Lean para gerenciar os recursos
estratégicos da organização.
1. Introdução
Empresas que utilizam as mesmas estratégias geralmente podem apresentar grande
variação em seu desempenho organizacional (FOSS, 1997). Essa realidade não ocorre
estritamente devido à escolha das estratégias, mas em função das diferenças individuais da
organização, que são seus recursos. Neste sentido, a organização é vista como um processo
seqüencial de atividades que criam valor, dentro de um contexto amplo de cadeia de valor:
fornecedores, clientes, parceiros, entre outros (ANDERSON e DEKKER, 2009).
Algumas atividades nomeadas como "cadeia de valor primária" contribuem para a
criação física do produto ou serviço. Exemplos: logística de entrada, operações, logística de
saída, marketing e vendas, serviços etc. Outras atividades de apoio agregam valor por si
próprias ou através de relações importantes com as atividades primárias: contratos de
desenvolvimento de tecnologia, gestão de recursos humanos, administração geral, entre
outras. Estas atividades estão constantemente interagindo com recursos organizacionais que
são avaliados pelos Sistemas de Controle Gerencial (DEKKER, 2003).
Os Sistemas de Controle Gerencial (SCG) desempenham um papel relevante na
construção e manutenção de sistemas de informação que contemplam as principais variáveis
das cadeias de valor (BORINELLI e ROCHA, 2006). Ao estabelecer os parâmetros de
medição de desempenho e interação, os Sistemas de Controle Gerencial podem influenciar ou
não o potencial do resultado esperado da utilização dos recursos. Henri (2006) assinala que os
resultados fornecidos pelo fluxo estratégico dos SCG são ambíguos e contraditórios devido à:
(I) ausência de um quadro teórico fundamentado na utilização de recurso; e, à (II) pouca
atenção dedicada à tensão dinâmica resultante dos diferentes usos ou funções dos SCG.
Assim, o autor realizou uma pesquisa empírica procurando demonstrar como a utilização dos
SCG pelos diretores pode agir na otimização dos recursos organizacionais, levando-os a
escolhas estratégicas. Os resultados demonstraram que embora existam alguns indícios desta
relação, uma lacuna sobre os motivos da possível influência dos SCG nos recursos
gerenciados ainda resiste.
Assim, a definição exata dos motivos da influência no desempenho dos recursos
organizacionais não é conhecida, e este é um tema pouco estudado na Contabilidade
Gerencial, principalmente na vertente do dimensionamento. Ou seja, a escolha de artefatos
adequados pode não ser suficiente para aperfeiçoar os recursos organizacionais, que podem
estar sendo afetados tanto pela escolha inadequada dos recursos quanto pelo gerenciamento
informacional inadequado, que se traduz em desperdícios de critérios de avaliação e
mensuração, que podem trazer influências negativas aos Sistemas de Controle Gerencial,
tanto do ponto de vista da informação, quanto do ponto de vista de utilização da informação
pelos usuários do SCG.
O dimensionamento tratado neste estudo tem como característica, distinta de outras
metodologias como o Balanced Scorecard (que utiliza indicadores financeiros, de clientes,
internos e de aprendizagem e crescimento), não delimitar ao gestor quais perspectivas da
gestão devem ser priorizadas no SCG, mas propor aos gestores a identificação dos seus
recursos chave, que demonstrem maior potencial de contribuição ao resultado global da
companhia. Sem desprezar outros recursos menos relevantes estrategicamente, mas
contextualizando-os como subjacentes aos resultados produzidos pelos recursos principais, os
SCG podem ser mais enxutos, o que na filosofia gerencial se traduz em objetivos estratégicos
mais realistas e viáveis (MASKEL e BAGGALEY, 2003).
Como teoria própria para priorizar a identificação e o gerenciamento dos recursos
internos da organização, que são fontes de vantagem competitiva, identificou-se a Visão
Baseada em Recursos (Resource Based View – RBV). Notadamente, o desempenho
organizacional, gerenciado pelo SCG, dependerá da adequada exploração das capacidades dos
recursos que são valiosos, raros, difíceis de imitar e insubstituíveis na organização
(BARNEY, 1991).
O estudo de limitações e potencialidades dos SCG desdobra-se em uma grande
variedade de artefatos que poderiam nos remeter à aplicação de diversas teorias relacionadas
como Gestão Estratégica de Custos, Balanced Scorecard, Teoria Institucional, Teoria de
Contingências e Gerenciamento de Riscos, entre outras. Neste estudo, no entanto, o foco é o
fluxo de informações dos SCG que captam dados e permitem gerenciamento dos recursos
estratégicos identificados a partir da RBV e do Lean Accounting, cujo desempenho é baseado
em indicadores contidos nos Sistemas de Avaliação de Desempenho (SAD) de mensuração
econômica.
O objetivo deste trabalho é conhecer as contribuições da RBV e do Lean Accounting
para a contabilidade gerencial, mais especificamente no que se refere ao dimensionamento
dos Sistemas de Controle Gerencial. Neste contexto, o artigo propõe o estabelecimento das
relações entre a contribuição da Visão Baseada em Recursos e do Lean Accouting à atividade
de delineamento de práticas estratégicas da organização, definidas pelo monitoramento e
orientação para o comportamento dos indivíduos a partir do estabelecimento dos recursos
estratégicos mensurados e potencializados. Assim, assume-se como limitação desta pesquisa a
restrição da analise crítica dos autores aos aspectos de aplicação ao design do SCG, tanto para
a RBV quanto para a perspectiva do Lean Accounting.
É importante destacar que o dimensionamento a ser explorado neste estudo refere-se à
especificação do projeto institucional dos Sistemas de Controle Gerencial, como observando
por Anderson (2007). O autor demonstrou como exemplo que a otimização dos objetivos dos
sistemas de custos deve compreender a cadeia de valor e todos os recursos relevantes para
garantir a sustentabilidade da lucratividade. Para tanto, ao desenvolver um modelo
relacionando sistemas de custos com estratégia e avaliação de desempenho, observou a
necessidade de delimitação da escala (adequação dos sistemas às necessidades informacionais
dos seus usuários), escopo (abrangência dos sistemas aos processos, produtos, riscos e valores
dos investidores), ligações estratégicas (áreas, empresas, agentes que de alguma forma
forneçam condições de diferenciação à empresa) e, finalmente, o modelo de governança da
empresa. Mas assim como outros pesquisadores, não propôs uma maneira para estabelecer
estas variáveis, demonstrando assim como o Sistema Estratégico de Custos, por exemplo,
poderia estar adequadamente dimensionado para alcançar com mais segurança seus objetivos
estratégicos.
Assim, o artigo procura responder à seguinte questão de pesquisa: Qual a contribuição
que o Lean Accounting pode fornecer para o dimensionamento adequado dos Sistemas de
Controle Gerencial sob a ótica da RBV? Desta forma, busca-se a identificação de cada uma
das extensões que devem ser consideradas na parametrização de um SCG no que tange aos
recursos estratégicos, sejam eles tangíveis ou intangíveis.
O artigo está estruturado na forma de ensaio, cuja base metodológica é a revisão
bibliográfica e a reflexão dialética. Após a descrição da Visão Baseada em Recursos e a Lean
Accounting, é descrita uma tentativa de integração entre as duas teorias, tendo como propósito
demonstrar como é possível viabilizar o dimensionamento enxuto de um SCG a partir da
contribuição da RBV. Finalmente, são apresentadas as considerações finais e as sugestões
para futuras pesquisas.
2. Lean Accounting
O senso comum alega que a alavancagem dos resultados em organizações que
implementam melhorias na gestão logística e de produção baseadas na Filosofia Lean por si
só compreende uma melhoria dos SCG. No entanto, pesquisas empíricas revelam
constantemente as disparidades que precisam ser minimizadas para que a empresa apresente
os melhores resultados pós-implementação dos modelos de Manufatura Enxuta,
compreendendo um conjunto de práticas de produção e de planejamento e controle gerencial.
A Manufatura Enxuta, precursora da Filosofia Enxuta de gestão empresarial, pode ser
considerada como uma sinergia de modernas práticas de produção integradas, comumente
classificadas nos sistemas de Just-in-Time (JIT), Gestão da Qualidade Total (GQT),
Manutenção Produtiva Total (MPT) e uma coleção de modelos para gerenciamento de
recursos humanos e práticas de gestão, incluindo modelos de trabalho em equipe e delegação
de autoridade a empregados (WOMACK e JONES, 1996).
Neste sentido, os conceitos da Filosofia Enxuta tem provocado mudanças
significativas nas empresas, mudanças estas que precisam ser acompanhadas pelos SCG,
muitas vezes desenvolvidos sobre pressupostos ultrapassados da produção em massa, que
defendem que as otimizações locais isoladas conduzem à otimização global da empresa.
Diante destas mudanças, constata-se que muitas vezes os SCG não são corretamente
dimensionados, ou seja, as métricas definidas, processos de uso da informação e tomada de
decisão não estão corretamente alinhados com os objetivos estratégicos da organização
Assim, ao implementar a filosofia enxuta nas organizações, além de lidar com
processos de produção e desenvolvimento de produtos, os gestores precisam adaptar os
sistemas tradicionais de contabilidade que muitas vezes são anti-enxutos, pois se apresentam
grandes, complexos e com inúmeros indicadores redundantes que requerem grandes
quantidades de mão de obra para levantamento e análise. Logo, o conceito do Lean
Accounting surgiu como uma proposta de adequação dos sistemas de informações contábeis,
com mais precisão e menos retrabalho de informações. O Conceito do Lean Accounting foi
desenvolvido visando apoiar a cultura enxuta, motivando o investimento nas pessoas,
fornecendo informações que sejam relevantes e factíveis, e habilitando a melhoria contínua
em todos os níveis da organização.
Nesta visão, o SCG é percebido como o produto de vários processos de trabalho de
controle e de medição, que precisa continuadamente ser lapidado para que desperdícios de
informação sejam eliminados. Algumas ferramentas utilizadas nesta metodologia são os
Mapas de Fluxo de Valor, Kaizen e PDCA, entre outros.
Ao valorizar a qualidade das informações financeiras e não-financeiras, através da
identificação da cadeia de valor da organização, o Lean Accounting focaliza a medição e
compreensão do valor criado para clientes e usa esta informação para melhorar o
relacionamento com estes, além de influenciar o design de produto e os preços.
Para tanto, nos sistemas de mensuração é comum se utilizar controles de processos
visuais e métodos de custos mais focados em processos e em custos diretos, como o ABC.
Outras ferramentas como o Target Costing também são bem aceitas e refletem bem a visão do
Lean Accounting integrado com a estratégia empresarial, ou seja, como a empresa cria valor
para o cliente e o que deve ser feito para se criar mais valor.
Como conseqüência, os métodos tradicionais da Contabilidade Gerencial muitas vezes
são vistos como o principal entrave para o incremento da produtividade das empresas.
Contudo, a Contabilidade Gerencial é parte integrante do sistema de planejamento e controle
de qualquer operação e assim deve permanecer. Conseqüentemente, as organizações que estão
implementando modernos processos de trabalho baseados em produtividade e redução de
custos anseiam por uma nova abordagem para os sistemas de custeio e contabilidade no apoio
aos processos de manufatura (CUNNINGHAM e FIUME, 2003). Neste sentido, alguns
trabalhos sobre a filosofia da empresa enxuta tem dados importantes contribuições, como os
trabalhos de Mondem (1992), Maskell e Baggaley (2003) e Kennedy e Widener (2008).
Um perfil da Contabilidade Gerencial que suporta a excelência industrial foi
investigado por Mondem (1992), através da análise de estudos de caso em uma série de
setores industriais, permitindo ao pesquisador desenvolver um perfil das empresas que
alinham, com êxito, sistemas de contabilidade com princípios da Manufatura Enxuta.
Mondem (1992) verificou que as empresas que adaptaram sua gestão contábil e
sistemas de apoio à produtividade industrial demonstram as seguintes características:
a) Integração das culturas empresariais e de manufatura;
b) Reconhecimento dos processos de manufatura e logística na definição dos
princípios de mensuração contábil;
c) Ênfase na melhoria contínua dos Sistemas de Contabilidade Gerencial, adequando-
os à atualização constante dos sistemas de produção e serviços;
d) Esforço para eliminação de desperdícios no processamento da informação, e;
e) Priorização do uso da informação contábil para redução de custos.
Recursos Exemplo
Financeiros Capacidade de captação e endividamento.
Físico Fábricas modernas, Localização favorável.
Tecnológicos Patentes, Processos inovadores.
Organizacionais Planejamento estratégico, Sistemas.
Humanos Experiência, Know-How.
Inovação Conhecimentos técnicos e científicos.
Reputação Marcas, Relacionamento com Clientes e Fornecedores.
Capacidades Organizacionais Atendimento ao cliente, Sistemas Logísticos.
Planejamento
Planejamento Execução
Execução Controle
Controle
5. Considerações Finais
Utilizando a perspectiva da Visão Baseada em Recursos (Resources-Based View –
RBV), foram estabelecidos os parâmetros de exceção para um dimensionamento adequado dos
Sistemas de Controle Gerencial (SCG), sob a ótica do Lean Accounting, como propõe este
artigo.
Durante o texto, foram apresentados os principais autores da RBV, ressaltando a
importância da correta identificação dos recursos, tanto para reforçar a estratégia da empresa
como para dar suporte à Contabilidade Gerencial, entre outras funções. Deste ponto de vista,
buscou-se a idéia do Lean Accounting para fins de comparação entre as abordagens, ou seja, a
filosofia Lean pode ser um meio de aplicação da RBV em processos de otimização dos SCG,
visando torná-los mais enxutos.
O SCG, por sua vez, permeia toda a rotina administrativa e estratégica da organização,
interagindo como ponto de apoio para os processos de tomada de decisão e o cumprimento da
estratégia da empresa. O dimensionamento adequado do SCG é o que tangencia mais de perto
a necessidade dos gestores, sendo para isso fundamental o estudo mais aprofundado do
assunto com vistas a ampliar o conhecimento e melhorar os artefatos que possam contribuir
para refinamento deste processo.
Destas análises, percebe-se que RBV e Lean Accounting são visões similares, sendo
que os objetivos estratégicos da RBV podem ser potencializados quando as empresas adotam
o Lean Accounting para gerenciar os recursos estratégicos da organização, boa parte deles
expressos nos indicadores de performance fornecidos via SCG. O quadro a seguir sintetiza as
conclusões sobre as duas abordagens e sua interação.
Durante estas análises percebeu-se que assuntos como associação entre o desempenho
e a RBV e a abordagem das capacidades dinâmicas, principalmente relacionados ao SCG,
ainda foram pouco explorados, sendo aqui sugeridos como inspiração para futuras pesquisas.
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