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Esta é uma obra de ficção. Nomes, personagens, lugares e acontecimentos descritos são
produtos da imaginação da autora. Qualquer semelhança com nomes, datas e
acontecimentos reais é mera coincidência.
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Amava a forma como me olhava, como sorria, o som da sua voz. Via a
forma como ele me dava espaço, como não tomava decisões por mim, como
me deixava ser a mulher livre que um eu dia fui.
Era possível um homem ser tão bom quanto ele?
Existiam mais pessoas assim no mundo?
O que eu deveria fazer?
Sentia-me confusa. Eram tantas emoções invadindo o mais profundo do
meu ser, que mal podia compreendê-las. No entanto, não tive tempo para
pensar muito sobre aquele assunto. Monica e Fernanda apareceram mudando
a música para um pop bem agitado e me puxaram para o meio delas.
Minha gargalhada foi ofuscada com o som alto, dançando entre elas e
esquecendo todas as preocupações anteriores. A cada canção eu me sentia
mais livre, era como se minha alma saísse para dançar. Voando sem limites a
cada batida.
Descobri que dançar não exigia experiência, somente liberdade.
E eu era, completamente, livre.
Capítulo Vinte e Seis
Benjamin
Nem se um raio me atingisse naquele momento eu poderia desviar meus
olhos dela. A forma que se movia, desinibida e totalmente desimpedida, era
hipnotizante. Sedutoramente livre. Se eu soubesse que a música faria isto
para Valentina, já teria feito uma boate em seu apartamento há muito tempo.
Nada a afligia enquanto se balançava a cada batida. Seu sorriso era
enorme e brilhava de uma forma que me mantinha hipnotizado.
— Está com cara de bobo.
— Iaiá — resmunguei.
— Bobo apaixonado. — Se corrigiu.
Bufei sabendo que não a enganava.
— Não diga besteiras — respondi.
Ela riu conseguindo minha atenção.
— Não vou embora enquanto não for sincero comigo.
— Você deveria ser uma avó doce e suave que assa biscoitos — acusei.
— Parece chato. — Riu.
— Eu não acharia chato ter biscoitos frescos todos os domingos, quando
fosse lá para almoçar.
— E por acaso eu tenho cara de vovozinha que faz quitutes?
— Ninguém poderia acusá-la disto. — Brinquei.
Ela ergueu as sobrancelhas como se dissesse “Foi o que eu quis dizer”.
— Está apaixonado? — perguntou direta no assunto.
— Mais do que gostaria assumir — respondi com sinceridade.
— Por quê?
Seus olhos brilhavam com curiosidade e esperteza.
Voltei a buscar Valentina pelo salão e a encontrei no mesmo lugar, rindo e
se divertindo com minha família.
— Não sei se deveria.
— E por que não? — estreitou os olhos. — Acredita que ela esteja
fragilizada demais para se envolver em um relacionamento depois de tudo o
que passou?
— Algo do tipo. — Dei de ombros.
Uma dor aguda puxou em minha barriga.
— Ai! — protestei.
Iaiá tinha acabado de me beliscar e me olhava como se dissesse que faria
de novo se eu abrisse a boca para reclamar.
— Posso saber o motivo da agressão? — perguntei franzindo a testa.
— Não seja um idiota. — Apontou. — Vou fazer muito pior se continuar
com essa besteira — jurou. — Está vendo aquela mulher ali? — questionou
apontando para Tina. — É a representação do que uma mulher deveria ser
depois de todo aquele inferno, ela continua de pé e lutando por si mesma. Por
mais machucada que esteve não deixou que aquele babaca a derrubasse para
sempre. Ela se levantou e continua firme mesmo com todos seus ferimentos,
está se curando, corpo e mente. — Estreitou os olhos para mim. — Não ouse
dizer o que ela merece, é direito dela negar estar com você assim como
também é a única que deve fazer a escolha. Diga a ela como se sente, mas
não me venha com essa besteira de Valentina estar frágil ou ser cedo demais
para um novo relacionamento. — Apertou o dedo indicador no meu peito. —
A decisão é dela, não sua.
— Delicada como sempre — zombei. —, mas muito sábia.
— Essa sou eu. — Sorriu. — Suave e inteligente.
Beijei seu rosto segurando o riso.
— Obrigado.
Agradeci, mesmo sem ter pedido sua opinião. Esmeralda não nasceu para
suavizar as bordas, ela sempre vai direto ao ponto e por isto tinha uma
personalidade incrível.
— Disponha! — deu uma piscadela. — Agora vá dançar com aquela moça
linda, forte e terrivelmente sensual naquele vestido.
— Iaiá! — a repreendi. — Sabe que não preciso ser lembrado disto.
— Oh meu bem, eu sei. — Riu como se tivesse mais a dizer, mas ficou
calada só para me deixar curioso.
Antes que eu pudesse insistir naquela conversa, ela se afastou ao ver
alguém passando e pegando o pobre coitado desprevenido. Enlaçou seu braço
ao do convidado e o forçou a ouvi-la.
— Delicada, sei bem — murmurei.
Balancei a cabeça e ignorei Iaiá, busquei por Valentina na pista de dança,
mas não a encontrei. Senti um arrepio atravessar minha coluna quando fiquei
tenso. Meu coração chegou a pular no peito. Encontrei Alex com o olhar e ele
me indicou o caminho do toalete feminino com um aceno discreto de cabeça.
Coloquei-me em movimento, passando pelas pessoas e ignorando aquelas
que tentavam conversar comigo. Eu não tinha tempo e nem paciência para
conversas sociais, naquele instante tudo o que precisava era colocar meus
olhos sobre ela.
Encontrei Ciro na porta do banheiro, o que me dava a certeza de que ela
estava lá dentro sozinha. Relaxei os ombros por um segundo, até que Tina
saiu. Seu rosto estava tão pálido que me assustou.
— Valentina?
Ela suspirou ao me olhar.
— Ben, eu preciso ir embora.
— O que aconteceu? — perguntei.
— Preciso sair daqui — disse baixo. — Por favor.
— Claro.
Segurei sua mão sem hesitar por sua reação, entrelaçando meus dedos aos
dela preocupado em como suava frio.
Indiquei a Ciro que preparasse nosso carro. Ele ergueu o celular e chamou
por Alex, mas eu sabia que meu segurança estava somente há alguns passos
de mim.
Havia uma saída por ali e não precisaríamos voltar todo o caminho pela
festa e sermos abordados pelos convidados. Chegamos ao carro em menos de
três minutos e eu indiquei a Aslan onde deveria parar. Ficamos em silêncio
por todo o caminho, ela parecia perdida demais em pensamentos para querer
compartilhá-los.
Segurei um suspiro, precisava saber o que estava acontecendo. Queria
ajudá-la, mas primeiro, Valentina teria que confiar em mim para me contar.
Sentia-me extremamente preocupado com a palidez de seu rosto. Ela apertava
as pontas dos dedos distraidamente e eu sabia que fazia isto quando estava
nervosa.
— Tina? — chamei baixinho.
Ela nem mesmo me olhou, encarava o vazio fora da janela sem parecer me
ouvir.
— Querida — insisti suavemente. —, o que aconteceu?
O suspiro estremecido dela me deixou gelado de aflição. No entanto, não
tive nenhuma resposta e pareceu que não teria tão cedo pela forma que ela
ficou tensa quando o carro parou na frente de uma lanchonete, como eu havia
pedido ao segurança.
— Por que paramos aqui? — perguntou ela e sua voz tinha uma nota de
pânico.
— Alex, nos dê um minuto — pedi.
Tanto Alex quanto Aslan, saíram do carro em poucos segundos.
Lentamente soltei meu cinto de segurança e me virei no banco, ficando de
frente para ela.
— Tina, por favor, diga-me o que aconteceu.
Ela engoliu em seco e lágrimas brilharam em suas pálpebras.
— Quando fui ao banheiro recebi uma ligação — disse com a voz trêmula.
Forcei-me a ficar quieto quando ela se calou por tempo demais, que Deus
me perdoe, mas eu queria sacudi-la para que falasse mais rápido. Aquele
suspense estava me matando.
— Quem te ligou? — perguntei suavemente.
Lágrimas caíram em sua bochecha.
E novamente precisei me forçar a ficar quieto. Queria me aproximar e
beijar cada uma de suas lágrimas com todo o carinho possível. No entanto,
me mantive sem tocá-la, sentia que Valentina precisava daquele espaço.
— Ellen — sussurrou. — Axel conseguiu liberdade.
Tentei não ficar pálido como ela, realmente não esperava por aquela
notícia tão inesperada. Foi dito que ele permaneceria em prisão por no
mínimo sessenta dias.
— Responderá em liberdade — murmurou fraca. — Ele vai me matar.
— Ele não vai te matar — jurei. — Tenho certeza de que colocaram uma
tornozeleira nele, que irá te informar quando chegar muito perto. E você tem
Ciro e Aslan. — Segurei sua mão. — Tem a mim — garanti.
— Ah, Ben, estou tão apavorada — choramingou.
— Eu sei e te entendo, tem todo direito de se sentir assim.
As leis tratavam a violência doméstica como se fosse uma banalidade,
algo que não merecesse tanta atenção. O que era muito revoltante. Como
podiam ter liberado um homem que espancou e estuprou uma mulher? Esse
maldito merecia prisão perpetua ou pena de morte. Talvez ainda fosse pouco.
Deveria ser um crime tratado com severidade, mas tudo o que as mulheres
ganham é o descaso e isto resultava nos crescentes números de feminicídio.
— Não chore — pedi segurando sua mão. — Vai ficar tudo bem, você está
segura.
— Como podem não punirem aquele monstro por todo o mal que me
causou? — perguntou em um tom que quebrou meu coração. — Ele quase
me matou — sussurrou derrotada. — Bateu-me tanto e ainda... — se calou
como se não pudesse pronunciar o que pensou.
Mas eu sabia, Axel havia a violentado. E a humilhação que via em seus
ombros caídos me fazia querer encontrar esse homem e forçá-lo a receber
algo que não consentiu. Eu estava com raiva, por isto pensava essas
brutalidades. Admitir esse sentimento me fez respirar fundo e acalmar a fúria
crescente em meu peito.
Valentina não precisava de mais violência, muito menos ver essa emoção
feia brilhando em meus olhos. Ela precisava de um amigo e eu estava aqui
por ela, e não iria a nenhum outro lugar. Ficaria ao seu lado até que se
sentisse melhor.
— Você confia em mim? — perguntei tentando não hesitar.
Eu não queria pressioná-la concordar em um momento que ela estava tão
assustada. Não era justa minha pergunta, mas precisava fazê-la.
— Sabe que sim — respondeu parecendo cansada.
— Então venha comigo, vamos comer um lanche e eu vou te contar um
pouquinho mais sobre mim.
Ela hesitou olhando para fora, os três seguranças rodeavam o carro
esperando pacientemente nossa decisão.
— Tudo bem. — Acenou concordando, mas ainda não parecia muito certa
do que queria.
Saímos do veículo e eu voltei a entrelaçar meus dedos aos dela. Era uma
forma de dar-lhe apoio, mas eu sabia que no mais profundo da minha mente,
era uma oportunidade para tocá-la.
Fomos recebidos pelo sorriso gentil da senhora atrás do balcão, que
mesmo no início da madrugada tinha bom humor para receber novos clientes.
Levei Valentina até a mesa que eu mesmo gostava de me sentar quando
frequentava o local e puxei uma cadeira para ela.
Mantive meu rosto o mais neutro possível, era visível o terror nos olhos
dela. Percebi a forma como olhava ao redor com medo de estar sendo seguida
e notei que não queria soltar minha mão.
Para deixá-la mais calma fiz sinal para Alex entrar com os irmãos Ciro e
Aslan e ocuparem as mesas ao nosso redor. Tina relaxou por uma pequena
fração ao ver os homens perto e eu comemorei aquela vitória, por menor que
fosse.
— Está com fome? — perguntei a ela.
— Não. — Negou com a cabeça.
— Eu estou faminto, aqueles petiscos não ajudaram em nada.
Ela balançou a cabeça distraidamente e olhou ao redor procurando por
alguma ameaça. Ignorei sua reação chamando a gentil senhora que sempre
me atendia, pedi que me trouxesse um lanche completo. O mesmo de sempre.
Sorriu com gentileza e prometeu entregar em alguns minutos.
— Sempre venho aqui — contei.
Tina me encarou por um momento com a testa franzida.
— Aqui?
— Sim.
— Sem querer julgar, mas já fazendo isto, essa lanchonete parece muito
simples para um CEO tão importante como você.
Fiquei satisfeito por seu comentário.
— Eu sou uma pessoa simples. — Dou de ombros. — Esmeralda sempre
diz que as melhores coisas estão na simplicidade.
— Ela está certa.
— Eu não diria isto a ela. — Brinquei.
Um sorriso dançou em seus bonitos lábios por um minuto antes de se
fechar. Percebi que minha distração estava funcionando, porém, não tinha um
efeito duradouro. Não a julgava. Entendia que estava aterrorizada por dentro
e não era fácil esquecer.
— Conheci essa lanchonete quando tinha quatorze anos — contei. — E
estava tão aterrorizado quanto você agora, mas como pode imaginar, por
motivos diferentes.
Os bonitos olhos dela se arregalaram mostrando-se surpresa com minha
confissão.
— Eu não gostava muito de ser seguido por seguranças. — Dei de
ombros. — Meu pai estava crescendo nos negócios e atraindo uma
quantidade boa de inimigos ao ganhar os contratos de importação e
exportação. — Expliquei. — Era a hora de proteger a família, eu e mamãe
éramos tudo o que ele tinha. Nossa segurança se tornou prioridade e de
brinde eu ganhei um encosto chamado Alex. — Brinquei sabendo que ele
ouvia.
Seu bufo de indignação não demorou a chegar.
— Acho que ele não concorda com você — comentou Tina com um olhar
cheio de curiosidade.
— Nunca vi uma sombra tão persistente quanto ele. — Ri descontraído. —
E sou realmente grato a isto. Um dia na escola eu passei a perna nele e saí
com meus amigos sem a sua proteção, deparamos com algumas garotas no
caminho e resolvemos encontrar uma cachoeira. — Dei uma pausa quando a
senhorinha retornou com o meu pedido.
Agradeci e joguei algumas batatas na boca.
— Parece que foi uma tarde divertida — disse Tina.
— Deveria ter sido. — Acenei. — Mas em algum momento entre um
mergulho e outro me vi sozinho e realmente não me preocupei. Já tínhamos
ido naquela cachoeira algumas vezes e sabia que meus amigos estavam
aprontando ao redor. — Dei uma mordida no hambúrguer e mastiguei sem
pressa.
Aquele era um assunto que eu não falava com frequência. Tinha ficado no
passado e eu gostava que permanecesse assim.
— O que aconteceu? — perguntou ela com suavidade.
Seus olhos já não tinham mais aquele terror de antes, pareciam solidários e
levemente curiosos.
— Quando saí para me secar, dei de cara com um homem robusto e
desconhecido. — Esfreguei a nuca. — Ele tinha sido enviado para me
sequestrar para exigir que meu pai rompesse um grande contrato da época.
Seu concorrente estava furioso por ter perdido aquela oportunidade e achou
que seria melhor o persuadir. — Sorri amargamente. — O que ele não
esperava era que eu iria aceitar ser levado de boa vontade.
— Você não brigou com um bandido. — Gemeu ela.
— Como se minha vida dependesse disto e realmente dependia — afirmei.
— Lutei, gritei e me esforcei ao máximo. Apanhei como um maldito cão de
rua, mas não me rendi. O homem percebeu que acabaria chamando atenção e
tentou me afogar, era melhor concluir o serviço me matando do que voltar
para a pessoa que o contratou de mãos vazias.
— Deus, que horror Benjamin.
Sorri de lado.
— Pois é. — Dei de ombros. — Alex chegou bem a tempo de me ajudar e
me salvou por muito pouco. Ele quase me matou e para piorar tudo, me deu
dias terríveis. Fiquei com traumas psicológicos, ataques de pânico
acarretados por um medo que me deixava frio.
— Eu sinto muito, a sensação não é muito boa — disse ela triste.
— Não sinta, superei isto e hoje não saio sem minha sombra. — Brinquei,
mas não rimos. — Em uma das muitas noites sem dormir, sai do quarto e fui
até o jardim para tomar um ar. Alex estava lá e me trouxe aqui, disse que se
um homem não pode dormir, deveria ter pelo menos um lanche muito bom.
— Acredito que ele estava certo.
— Eu não diria isto em voz alta. — Ri.
Alex bufou novamente, mas não fez nenhum comentário. Ele não era um
falador, mas tinha uma lealdade imensa.
— Mas posso dizer que vim aqui muitas vezes — confessei. — Ainda
venho.
— E isto te ajudou?
— Me deu uns bons quilos. — Brinquei. — E me distraiu. — Acenei. —
Mostrou-me que não é porque eu sofri um trauma que deveria parar de viver.
Tirou-me da zona de conforto que minha casa se tornou, por causa do medo
de ser alvo novamente, e me devolveu a liberdade que aquele homem tentou
me tirar. — Segurei sua mão por cima da mesa. — Você é livre linda, e muito
bem protegida, ele pode até tentar, mas não vai conseguir. Vamos lutar,
brigar e fazer o que for possível e impossível para que ninguém nunca mais a
prenda.
— Obrigada — sussurrou emocionada.
— Me agradeça depois de comer um lanche desse. — Provoquei. —
Tenho certeza de que se sentirá melhor.
Ela riu concordando e limpou as lágrimas que desceram por sua bochecha.
— Você está certo. — Roubou meu hambúrguer.
— Ei! — protestei.
Tina deu uma grande mordida e fechou os olhos saboreando com prazer.
Meu protesto se perdeu na satisfação de vê-la se erguendo novamente,
mesmo que ainda o medo estivesse dentro do mais profundo do seu ser, ela
não se renderia.
Capítulo Vinte e Sete
Valentina
O olhei com uma pontada de indecisão, estávamos parados na frente da
minha porta e eu não queria que ele fosse embora. Tão bonito, pensei quase
que hipnotizada, mas não era isto que me fazia desejar mais de sua presença.
— Você está bem? — perguntou Ben.
— Sim.
Ele me olhou com um pouco mais de atenção, estava claramente me
analisando e parecia não se importar com sua falta de descrição.
— Por que não parece sincera?
Balancei levemente a cabeça pensando no que responder.
— Eu estou bem — reafirmei.
— Mas?
— Não gostaria que fosse embora.
— Ainda não fui, estou bem aqui. — Deu um passo à frente ficando bem
perto de mim. — Fale comigo — pediu.
— Entre! — acenei para a porta.
— Você tem certeza?
— Sim.
Ele sorriu de lado, segurou minha mão e me guiou para dentro do
apartamento.
— O que quer fazer? — perguntou assim que fechou a porta.
— Eu não sei. — Gaguejei um pouco. — Somente relaxar.
— Tudo bem. — Levou as mãos a gravata borboleta que usava e a desfez
com habilidade. — Só posso relaxar sem isto me sufocando.
Ri concordando e me sentei na poltrona. Me inclinei para abrir a sandália e
me surpreendi quando Benjamin se colocou em um joelho na minha frente.
— Eu faço questão — disse em um tom tranquilo. — Juro que não
entendo como vocês, mulheres, conseguem se equilibrar nestas coisas.
Mordi o lábio inferior, me segurando para não estremecer com o toque
suave de seus dedos.
— Parece tortura. — Riu baixinho distraído em sua tarefa. — Mas devo
confessar que é extremamente sensual.
— Você gosta — afirmei.
Ele ergueu o olhar, prendendo-me naqueles castanhos encantadores e
sorriu.
— Mais do que fico confortável em dizer.
— Bobo.
Rimos juntos.
Ele colocou as sandálias de lado e massageou meu pé direito. Suspirei alto
enquanto sentia uma mistura de prazer e satisfação com o toque firme de seus
dedos.
— Você é bom — murmurei.
— Eu sei.
— É arrogante também. — Ri.
— Estou ciente — afirmou sem tirar os olhos dos meus. — Diga-me o que
precisa?
— E por acaso você faria qualquer coisa que eu pedisse?
— Não mesmo. — Gargalhou. — Sou um homem criado por mulheres,
Tina. Nunca prometo nada sem antes saber do que se trata.
— Esperto. — Brinquei.
— Só calejado demais para cair neste truque — retrucou com um sorriso
traquina. — Me fale, linda, do que você precisa e eu vou decidir se posso
ajudar.
Rindo, segurei seu rosto deslizando meus dedos por seus cabelos
castanhos. Seu sorriso diminuiu, mas não ficou tenso pelo meu toque. Muito
pelo contrário, pareceu relaxado.
— Um beijo, um banho e uma boa noite de sono — sussurrei.
Eu sabia que a tensão sexual estava levemente aumentando, no entanto,
ambos tínhamos a noção de que eu não estava pronta para o ato em si.
— Isto eu posso fazer — murmurou encarando meus lábios.
Ergueu-se um pouco mais, me segurou pela nuca e levou sua boa até a
minha. De início, suave, calmo e totalmente sensual, porém, em instantes
mudou-se para um beijo quente com seu corpo se inclinando sobre o meu. Eu
estava me agarrando a ele e ele a mim. Minhas mãos empurravam suas
roupas até conseguir sua camisa aberta.
Sua pele quente foi muito bem-vinda assim como o frescor tocando a
minha. Dos seus lábios molhados descendo por minha garganta, passando por
meu ombro e alcançando meu seio.
— Você me faz perder o controle, Tina — sussurrou e mordiscou minha
pele.
— Benjamin. — Suspirei.
Ele se afastou.
— Santa merda! — caiu sentado no chão. — Tina... — gemeu parecendo
fora de controle.
— Oi.
— Você vai me matar. — Acusou.
— Eu?
— Não faça essa cara de inocente — se apoiou nos braços enquanto
respirava com dificuldade.
Gargalhei e encostei-me à poltrona, sabia que estava toda encurvada e
deselegante, não me importava, sentia-me relaxada além de deliciosamente
excitada.
— Frio? — perguntei para ele.
— O que? — pareceu confuso.
— O banho. — O lembrei.
— Ah! — riu. — Em temperatura abaixo de zero seria bom. — Brincou.
— Ainda mais depois de vê-la rir desse jeito, tão espontâneo.
— Mesmo que eu tenha rido de você?
— Principalmente por isto. — Garantiu.
Meu peito doeu com a batida forte do meu coração. Era pra ser somente
atração, mas eu estava em queda livre, me apaixonando rápido demais para
compreender.
Acompanhei seus movimentos enquanto voltava a se erguer, ficando sobre
um joelho como um príncipe encantado pronto para se declarar. O maldito
era um príncipe! Será que ele era o meu encantado? Logo eu, uma cinderela
atrapalhada, machucada, que tentava sobreviver e... sem nenhum sapato
perdido. Este pensamento me fez ri.
— Do que está rindo?
Mordi o lábio.
— Nada que pretendo compartilhar.
— Que malvada, vai me deixar curioso?
— Sim.
Ele fez uma careta e eu sabia que ele pretendia continuar a me questionar
até que conseguisse suas respostas.
— Você precisa ir. — Mudei o assunto.
— Por quê? — o beicinho que ele fez me divertiu.
— Preciso de um banho.
— Sou bom em esfregar costas. — Rebateu me causando uma pontada de
ciúmes desconhecida.
— Não tenho dúvidas.
— Mas por hoje já teve emoções suficientes. — Sorriu com gentileza.
— Sim. — Suspirei.
— Tudo bem. — Levou uma mecha de cabelos para trás de minha orelha.
— Posso dar uma sugestão melhor do que eu indo embora agora?
— Sim.
— Vá tomar um banho, relaxe e vista algo confortável. — Sugeriu. —
Quando voltar, estarei aqui, com refrigerante, pipoca e um bom filme para
assistirmos.
— Pipoca? — provoquei.
— Alex vai dar um jeito. — Riu dando de ombros. — Eu não colocaria
fogo na sua cozinha. — Fingiu estar ofendido.
— Precisava ter certeza.
Rimos juntos.
— Pode ser assim? — honestidade brilhou em seus olhos ao perguntar
minha decisão.
— Sim. — Acenei.
— Bom! — selou nossos lábios rapidamente e se levantou. — Mova-se
mulher.
Revirei os olhos antes de ir para o quarto, quero dizer, depois de conseguir
me livrar dos tentadores braços dele. Assim que me coloquei de pé, Ben me
agarrou e voltei a me beijar, com mais intensidade do que antes.
Cada vez que o tocava, toda amargura e dor dentro de mim se apagava.
Levando-me a mergulhar profundamente em intensos sentimentos que tinha
medo de desvendar, mas que se afloravam perfurando qualquer angústia.
Eu estava apavorada e ao mesmo tempo animada. Queria correr para longe
para me proteger, ficar em um lugar onde nada poderia me machucar. No
entanto, ali eu estava nos braços dele pronta para me entregar. Para esquecer
tudo, esquecer o que mesmo? Não me lembrava, não naquele momento, pois
a única coisa que conseguia pensar era em como gostaria de beijá-lo todos os
dias da minha vida.
Isto me motivou a voltar o mais rápido possível para a sala, tomei um
banho rápido e vesti roupas confortáveis. Ao retornar, estava tudo como
prometido. Um filme pausado na TV, um gigante balde de pipoca rodeada
por copos de refrigerante.
No entanto, o que não estava no roteiro, era o bonito homem dormindo
sentado no meu sofá. Benjamin estava com a camisa branca desabotoada até
metade e os punhos abertos. Ele também se livrou do cinto, dos sapatos e
meias.
Ri baixinho e me aproximei.
— Ben?
Ele não me respondeu.
Toquei levemente seu ombro e fiquei hipnotizada com o movimento
sonolento de suas pálpebras.
— Desculpe! — bocejou.
— Shh. — Ofereci a mão.
Ele me encarou um pouco confuso, porém, aceitou meu convite silencioso
e se levantou. O guiei para o meu quarto, puxei as cobertas e indiquei que
deveria se deitar. Benjamin tentou protestar, mas lhe dei um olhar duro de
que não aceitaria uma resposta negativa. Ele estava sempre cuidando de mim,
garantindo minha segurança, me convidando para refeições e muitas outras
coisas. Agora era a minha vez de retribuir, nem que fosse um pouquinho.
Deitamos de frente um para o outro. Estávamos cansados, foi um longo
dia.
— Boa noite, Ben — sussurrei.
Ele fechou os olhos e sorriu de lado.
— Boa noite, linda e valente, Tina.
Capítulo Vinte e Oito
Valentina
Ele estava me sufocando, aquele monstro iria me matar. Sentia que seus
dedos apertavam meu pescoço, mas eu não conseguia mover o resto do
corpo. O que estava de errado? Por que eu não me defendia? Queria implorar
que me soltasse, que pelo amor de Deus me deixasse em paz, no entanto,
minha voz tinha desaparecido.
Não conseguia reagir. Tinha um grito preso na minha garganta e eu estava
completamente apavorada. Queria chorar, me enrolar em uma bola e fica lá
até que ele fosse embora.
Estávamos de volta ao meu antigo apartamento, Axel me imobilizava
contra o chão frio e... ria enquanto me machucava. Estava se divertindo ao
me dominar daquela forma tão vil.
Precisava respirar... eu só queria respirar livremente. POR FAVOR, gritei
em pensamentos. Necessitava de ar livre. Chorei silenciosamente, eu deveria
ser livre.
“Se você não for minha, não vai ser de mais ninguém” sua voz soou bem
perto do meu ouvido. Ele estava furioso e iria me matar. Não sei como, mas
em um pequeno instante vi o brilho de uma arma de fogo em sua mão. O que
realmente me aterrorizou era que não estava apontada para mim e sim para
algo, ou melhor, alguém na porta.
Benjamin, o reconheci imediatamente.
Seu rosto estava endurecido, ameaçador, mas não era direcionado para
mim e sim para o meu monstro. Ele deu dois passos à frente, pronto para me
salvar, e um som alto explodiu, ferindo meus tímpanos. Em câmera lenta vi
aquela bala atravessar a pequena sala...
— NÃO! — gritei apavorada e me sentei na cama.
Mal tive tempo de perceber que era um sonho, quero dizer, um pesadelo.
— Tina — disse Benjamin segurando os meus ombros, parecia tão
assustado quanto eu. — Foi um pesadelo, você está bem. — O agarrei em um
abraço apertado.
— Ele vai me matar — choraminguei. — Ele vai... matar... você...
— Isto não vai acontecer. — Jurou. — Você está segura.
Engoli o enorme nó formado em minha garganta, era a única coisa que
conseguia fazer. Meu corpo tremia e lágrimas silenciosas desciam por minha
bochecha sem pausa.
Benjamin continuou sussurrando palavras em meu ouvido, mas de alguma
forma eu não conseguia escutar. Minha mente estava nublada de medo e
respirar pareceu mais difícil do que no sonho.
Em algum momento, percebi que Benjamin não sabia o que fazer e me
carregou para a varanda do meu quarto, me colocando na poltrona. O ar
gelado do início da manhã foi bem-vindo, mas ainda não conseguia reagir.
Respirava tão alto, tão forte, que comecei a engasgar com o ar.
Parecia tão difícil e mesmo tendo os pulmões cheios de oxigênio, eu
estava me afogando.
— Se acalme, por favor — pediu Ben.
Acenei concordando, mas sabia que estava mentindo. Aquele pesadelo era
uma mistura de lembranças e medos que me deixou gelada.
— Tina?
Não respondi, não poderia. O abracei um pouco mais forte, com medo de
que algo ruim acontecesse, não só comigo, mas com ele.
Meu encantado príncipe Benjamin.
— Vou chamar Ítalo. — Anunciou.
Eu não protestei, talvez o psiquiatra conseguisse me tirar daquela concha
em que eu estava me escondendo. No entanto, soltar Ben foi uma das coisas
mais difíceis que fiz nos últimos tempos.
Abracei meus joelhos e escondi o rosto, queria me controlar. Encontrar
minha voz, resgatar minha coragem, mas tudo o que conseguia fazer era
tremer e derramar as lágrimas silenciosas que corriam como rios pelas
minhas bochechas.
Não sei quanto tempo passou, mas Ben voltou e se sentou ao meu lado me
envolvendo em um abraço, o que me fez erguer o olhar. Fiquei agradecida
por ele ficar em silêncio e não insistir em uma conversa. Não era o que eu
precisava, apesar de que não tinha muita certeza do que realmente
necessitava.
Embora, o silêncio fosse muito bem-vindo.
Ficamos ali, vendo o sol nascer entre os prédios lentamente.
— “Nunca houve uma noite, ou um problema que pudesse derrotar o
nascer do sol” — citou Benjamin. — Bern Willins disse com grande
sabedoria pelo o que parece. — Me encarou. — Eu não sei com o que sonhou
Tina, mas seja o que for você vai superar. É mais forte do que parece.
Delicadamente limpou a mancha de lágrimas no meu rosto e se afastou ao
perceber que Ítalo já estava ali. Deu-nos privacidade necessária ao voltar para
o quarto.
— Soube que acordou cedo — disse Ítalo. — Sorte sua que eu também
não dormi muito bem essa noite. — Encostou-se ao parapeito de vidro me
fazendo observar suas roupas de ginásticas. — Tem noites que os demônios
vêm nos visitar. — Suspirou.
Se eu não estivesse tão em choque com minhas lembranças, suas palavras
despertariam minha curiosidade.
Ítalo se virou e se sentou no chão, tinha um olhar vazio e bolsas escuras
abaixo dos olhos.
— Vejo que está travada de medo. — Observou. — O pesadelo foi algo
terrível, não é mesmo?
Acenei concordando e meus olhos se encheram de lágrimas novamente.
Estremeci ao respirar fundo, meu peito doía como se ainda pudesse sentir o
peso do corpo de Axel sobre mim.
— Sei como é. — Sorriu de lado. — Sou um psiquiatra com teto de vidro,
tenho meus traumas, meus medos e noites tão ruins como a de hoje. —
Suspirou. — Comecei a ler frases inteiras quando tinha três anos, dominava
matemática aos cinco e me apaixonei pela ciência antes dos dez. Uma mente
brilhante! — exclamou sem emoção. — O único problema era ser criado por
um casal de vigaristas, eles me usaram por anos, forçando-me a trabalhar para
eles a cada habilidade nova que descobriam em seu filho caçula. Quando me
revoltava era uma surra de cinto até que resolvesse obedecê-los novamente.
— Relaxou contra o vidro. — Eu fui uma criança que queria conhecer tudo,
uma vez desmontei o cortador de grama para conhecer como funcionava e o
montei no mesmo dia. Era fascinante a descoberta, o conhecimento, e me
enfurecia não poder desfrutar daquilo para deixar meus pais mais ricos a cada
dia. — Bufou indignado.
— Você só queria ser livre — digo roucamente.
— Ah, sim, liberdade foi algo muito ansiado por mim e não demorei
muito para buscá-la, mas as memórias dos espancamentos nunca se
apagaram.
— Como-o você as supera? — sussurrei.
— Não existe um jeito de esquecer, Tina — disse com suavidade. — O
passado não pode ser mudado, mas devemos aprender a conviver com ele. É
difícil, quase que impossível de suportar, porém vamos sobrevivendo.
Ficamos em silêncio ao perceber que aparentemente nós dois estávamos
precisando de ajuda. Mas o olhar esperto dele voltou a aparecer, deixando
aquele vazio de lado e sendo o mesmo Ítalo de sempre.
— Enfim, já tive meu momento de paciente. — Sorriu com certa
amargura. — Agora é sua vez.
— Não combinei uma troca.
— Eu sei, mas sou seu médico e amigo. — Seu olhar suavizou. — E você
precisa de ajuda, Valentina, estou aqui para isso.
— Pelo jeito não sou a única — resmunguei.
— Já assumi que meu teto é de vidro. — Retrucou com certa impaciência.
— Me conte sobre seu sonho — pediu, mas eu fiquei calada. — Benjamin me
contou que você disse que Axel iria matar ambos.
Estremeci e desviei o olhar, meu sangue chegava a congelar ao pensar que
Axel poderia machucar Benjamin. Sentia que não me importava com o que
ele faria da minha vida, mas entrava em pânico ao imaginar que ele poderia
ferir alguém tão especial para mim como Ben.
— Converse comigo — pediu Ítalo. — Não sei se estou bom de deduções
hoje.
Bufei.
— Duvido muito — murmurei.
— Eu também. — Sorriu agora com sinceridade. — Confie em mim,
Valentina.
Eu confiava só que era tão difícil fazer as palavras saírem. Cheguei abrir a
boca, mas gaguejei e voltei a fechá-la.
— Como foi a festa ontem? — mudou o assunto.
— Boa.
— Só boa? Tenho certeza de que esse comentário feriria os sentimentos
das dominantes mulheres Daslow.
Suspirei.
— Foi perfeita.
— Até quando?
— Quando Ellen ligou para me informar que Axe-el está solto. — Engoli
em seco.
— Como se sentiu?
— Apavorada — sussurrei. — Ele vai me matar, Ítalo.
— Ele pode tentar. — Retrucou. — Mas estamos atentos para cuidar de
você.
— Eu estava tão bem ontem à noite, eu e Ben... — me calei, incapaz de
contar tudo para aquele bisbilhoteiro.
Ítalo se animou na mesma hora, havia curiosidade e perspicaz brilhando
em seus olhos.
— O que vocês andaram fazendo?
— Esse não é o ponto. — Retruquei.
— Se beijaram — afirmou estreitando os olhos. — Mais do que isto?
— Ítalo! — gemi frustrada.
Ele riu.
— Ficaram nus! — aplaudiu.
Outro gemido de frustração escapou pelos meus lábios.
— Esse não é o motivo da sua visita. — O lembrei.
— Isto a fez mais interessante — retrucou.
— Vá embora! — apontei para a porta.
Ele riu baixinho e cruzou os braços.
— Vou tentar me comportar se você conversar comigo. — Prometeu.
— Estamos conversando. — Pontuei.
— Eu sei. — Acenou. — Quero te ajudar, e o ponto é que você não parece
mais tão travada como quando cheguei aqui.
Era uma grande verdade, a confiança que depositei nele dava liberdade
suficiente para conseguir me distrair.
— Sonhei com a última vez que Axel me agrediu — confessei sentindo o
nó voltar a minha garganta.
— Ainda é recente. — Mencionou. — É normal reviver essas lembranças.
— Não é só isto — murmurei. — Acreditava que me lembrava de tudo o
que tinha acontecido naquela noite... — me calei tomando coragem. — Mas
recordei de algumas coisas. — Engasguei. — Eu não conseguia respirar... Ele
iria me matar.
— Como pode ter tanta certeza?
— Ele sussurrou em meu ouvido que se eu não fosse dele, não seria de
mais ninguém — cobri o rosto com as mãos. — Axel me bateu tanto naquela
noite, com a intenção de me matar — choraminguei. — Eu não sou idiota, sei
que ele faria isto em algum momento. Principalmente com a evolução da
violência, mas ao recordar tive a certeza de que ele saiu da minha casa
acreditando que tinha me matado.
Ítalo não disse nada por um momento, ficou me encarando perdido em
pensamentos.
— Sua mente a protegeu destas lembranças, bloqueando-as até certo
momento — explicou com suavidade. — Até que Axel se tornou uma ameaça
novamente. — Esticou as pernas. — É uma reação normal do corpo, quero
dizer, da mente. Antes de falarmos mais sobre o assunto, eu quero te explicar
o que exatamente é isto e o que podemos fazer, tudo bem?
— Sim.
— É conhecido como Bloqueio Emocional, é quando o inconsciente
camufla memórias de dor para evitar o sofrimento. A situação dolorosa não
deixa de exigir, mas ela pode se manifestar de forma inconsciente, que muitas
vezes reflete de forma negativa sem que nem mesmo perceba. Entendeu?
— Sim. — Suspirei. — Você acredita que isto pode estar acontecendo
desde quando a violência começou? — questionei um pouco trêmula.
— É uma possibilidade. — Balançou a cabeça em afirmação. — Mas só
vamos descobrir isto revivendo todas essas memórias.
Estremeci, não queria nem pensar naquela alternativa.
— Se você me perguntar se eu recomendo que faça isto? Eu vou dizer que
sim — afirmou Ítalo. — O Bloqueio Emocional tem efeitos, emoções
reprimidas não são bem aceitas pelo organismo, pode afetar sua saúde em
vários aspectos e torna sua vida um verdadeiro fracasso.
— Me apavoro só de pensar em reviver tudo — murmurei.
— Eu sei, é aterrorizante reviver traumas.
— Você reviveu os seus?
— Cada um deles, a diferença é que nossas mentes não funcionam da
mesma forma. — Sorriu de lado. — Tenho memória fotográfica e um QI
elevado, meu cérebro brilhante não gosta de esquecer as coisas.
Ri baixinho.
— Não parece uma vantagem.
— E não é. — Seu olhar ficou frio. — Não quando se quer esquecer. —
Esfregou a nuca. — Mas esse não é o ponto. A verdade é que o bloqueio de
memórias não é saudável, devemos desvendar; aceitar e tratar. Não vai ser
fácil, mas faz parte da cura.
— Eu entendo — sussurrei apavorada. — Vamos fazer isto.
— Não hoje, querida — disse suavemente. — Minha recomendação
médica para você é que curta o dia, relaxe, tome uma ou duas taças de vinho
com meu amigo Benjamin. — Sorriu. — Se possível nus.
— Ítalo! — exclamei.
— É sério. — Riu. — Eu poderia te dar medicação, mas quero esperar
mais um pouco para chegarmos a isto — disse sério. — Você é uma mulher
forte Tina, lembre-se disto.
Acenei concordando e por mais uma hora conversamos sobre aquele
terrível pesadelo. No final da nossa sessão na varanda, me sentia mais calma,
um pouco mais segura e surpreendentemente mais forte.
Ítalo foi embora e rapidamente Benjamin veio ao meu encontro. Seus
braços me envolveram com imenso carinho, beijou meu pescoço e sussurrou
em meu ouvido:
— Juro que vou estar mais atento, vou me manter seguro. — Prometeu. —
Não se preocupe com isto — pediu. — Vai dar tudo certo.
Quis chorar, mas não o fiz, confiei que ele se cuidaria e fiquei muito
agradecida por sua promessa.
Capítulo Vinte e Nove
Benjamin
Meu humor não era um dos melhores, depois de dias do pesadelo de
Valentina eu continuava com raiva. Furioso para ser mais exato. Bravo com
as leis fracas, com Axel e com todas as injustiças do mundo.
Se é que fosse possível.
Para piorar, eu queria matar Ryan. Era quarta-feira, dia de futevôlei com
meus amigos e eu não queria estar ali. Nem deveria ter ido, principalmente
depois de Ryan chutar uma bola no meu peito.
— Seu...
— Olhe a boca, mamãe Daslow não aprovaria seu filhinho ser boca suja.
— Me provocou.
— Eu vou socar sua cara. — Ameacei.
— Acredito que deveria — disse Ítalo. — Talvez o deixe menos idiota.
— Nosso amigo está tão putinho. — Provocou Leo. — Deveríamos ter ido
pra academia chutar a bunda dele.
— Cale a boca e joga a bola. — Bufei.
— Rato de academia — resmungou Ítalo.
Leo revirou os olhos.
— Você está mais resmungão que o normal. — Observou.
— Grande percepção. — Zombou Ítalo.
Ryan gargalhou.
— Eu quase o ouvi dizendo: para um homem de cérebro normal. —
Brincou. — Pobres humanos.
Rimos concordando que era algo que Ítalo realmente diria. Embora, no
fundo eu soubesse o motivo da acidez exacerbada dele. No dia em que esteve
no apartamento de Valentina, para ajudá-la depois do pesadelo, acabei
ouvindo tudo o que conversavam. Fiquei compassando como um animal
selvagem dentro do quarto e só me acalmei, quero dizer, congelei quando os
ouvi.
Agora me sinto envergonhado e realmente arrependido, eu estaria me
sentindo muito melhor sem todas as confissões daquela manhã. Como diria
Iaiá: Bem feito, ninguém mandou se meter aonde não foi chamado.
Meu bom Deus, a raiva era um sentimento terrível. E era tudo o que eu
conseguia sentir por causa do monstro chamado Axel. Ele havia machucado
uma mulher inocente, que tem um coração tão bom. Era difícil aceitar. Ainda
mais depois de ver o terror em seus olhos quando acordou.
Eu estava furioso, mas agora não somente com aquele verme, o
sentimento também era destinado para os pais de Ítalo. Um belo par de
covardes. Como poderiam espancar uma criança com uma mente tão
brilhante como a dele? Um menino louco para conhecer o mundo e desvendar
coisas que eu nem mesmo poderia imaginar.
— Porra, Ben! — Leo exclamou avisando-me a tempo da bola que vinha
na direção do meu rosto.
— Ryan! — digo puto. — Eu vou te afogar no mar. — Ameacei.
— Eu não tenho culpa se você está com a cabeça nas nuvens — retrucou
rindo.
— Filho de uma cadela — chutei a bola mirando o estômago dele, mas o
maldito desviou com agilidade.
— Sabe que ele tem razão, não é mesmo? — questionou Ítalo baixinho. —
Você não parece bem.
— Não é nada.
— Bom. — Sorriu. — Assim você aprende a não ouvir atrás da porta
como uma empregada fofoqueira. — Me acusou.
Bufei, virei em meus pés e desisti de jogar. Eles protestaram, mas foram
facilmente ignorados. Sentia-me sem uma gota de paciência para continuar
com aquelas provocações.
— Deixe-me — ordenei a Ítalo quando percebi que me seguia.
— Você precisa de um psiquiatra — disse escondendo o riso.
A vontade de socar meus amigos se tornou um pouco maior e eu poderia
muito bem começar por Ítalo.
— Está com raiva por tudo que ouviu. — Deduziu o idiota. — E você é o
único culpado por isto.
— Ítalo, não me provoque — reclamei.
— É a verdade — retrucou. — Agora precisa aprender a lidar com o que
está sentindo.
— Com o que eu estou sentindo? — digo pasmo. — Eu não preciso de
nada! Cresci em uma família amorosa e não tive ninguém abusando de mim.
Quando tentaram me matar, logo alguém me protegeu e ajudou-me a superar.
Mas quando me lembro de tudo o que ouvi, a única coisa que quero fazer é
bater nas pessoas. — Bufei. — E como é possível que depois de tudo o que
ele fez a ela, ainda seja solto? Por que as leis são tão relapsas com as
mulheres? Por que não a protegem? Para que tantos advogados e juízes se
eles não servem para nada!
— Eu entendo e compartilho de suas frustrações, mas é o que é. — Deu de
ombros.
— É um absurdo tudo isto. — Bufei alto.
— Concordo — cruzou os braços e parou antes que a água molhasse seus
pés.
Minha frustração pareceu aumentar com a condescendência dele.
Precisava de certa distância para esfriar meu temperamento. Um mergulho
seria muito bem-vindo e era o que eu realmente faria.
— Ben?
— O que é Ítalo? — digo exasperado.
— A raiva que está sentindo é normal, eu mesmo ainda tenho dificuldades
em controlar essa reação com os relatos que escuto. — O encarei. — Mas
aprendi que o importante, não é o que estou sentindo ou o que quero fazer.
Como por exemplo, bater nas pessoas. — Ele chutou a areia descontraído. —
O que realmente importa é como vamos ajudar quem realmente precisa.
Ergui uma sobrancelha interrogativa, até parecia que meu amigo estava
ficando sentimental.
— Sem baboseira sentimentalista para o meu lado. — Avisou com
impaciência.
— Sou profissional e é minha função ajudar Valentina — disse sério. —
Você é algo a mais para ela, que eu não poderia explicar sem ofender, sabe
que não acredito em amor, mas se é o que acreditam existir entre vocês —
deu de ombros. —, então é o que ela realmente precisa, sentir seu amor.
— O apocalipse deve estar bem próximo. — Brinquei.
— O coração é apenas um músculo, seu idiota — retrucou.
— Ainda vou vê-lo se apaixonando. — Ri.
— O inferno irá congelar neste dia — afirmou. — E eu me vestiria de
mulher e atravessaria uma avenida inteira.
— Vou me lembrar disto.
— Nunca vai acontecer. O amor foi criado para fins publicitários. —
Gesticulou impaciente. — A única coisa que acredito é na necessidade de
reprodução dos seres vivos — afirmou com arrogância. — Nascem, crescem,
se reproduzem e morrem.
— Esqueceu-se de dizer sobre as nuances do amor. — Debochei.
— Vá logo dá seu mergulho antes que eu o afogue. — Foi embora bravo.
Gargalhei e caminhei para dentro do mar, minha raiva já tinha se esfriado,
porém, mesmo assim mergulhei na primeira onda que me atingiu. A água fria
foi muito bem-vinda, menos o sal ardendo em meus olhos, no entanto, fazia
parte.
O mar estava agitado, assim como eu. Sentia-me inquieto, sem saber o que
fazer para ajudar Valentina. Como poderia curar tantas feridas? Eu tinha
tantas perguntas sem respostas que me deixava com a terrível sensação de
estar perdido.
Bati os braços mais forte sobre a água, gastando toda aquela energia
acumulada, até que parei por completo. Flutuando naquela imensidão azul e
entre todas as minhas inseguranças me veio uma única certeza, eu estava a
amando profundamente.
Para Ítalo o amor poderia ser uma jogada de marketing criada há anos,
mas para mim era algo intenso, fortemente enraizado e que merecia toda a
atenção. Apaixonar-me por Valentina foi fácil, ela era encantadora, agora eu
deveria garantir que esse sentimento fosse mútuo.
Determinação encheu meu peito, precisava ir de encontro a ela e beijá-la.
Sentir seu cheiro e envolvê-la em meus braços. Nadei para areia e acenei para
meus amigos que por hoje chega.
— Ele está um chato — reclamou Leo. — Eu jogava mais um pouco.
— Eu também. — Acenou Ryan. — Ficaria aqui o dia todo, não aguento
mais usar ternos.
— Não o use, então — disse Ítalo.
— Sou o CEO de uma empresa de aviação — respondeu mal-humorado.
— Por isto mesmo, deveria fazer o que quiser, não o que esperam de você
— retrucou.
Ryan não rendeu o assunto, somente bufou e me seguiu para dentro do
bar. Pedi uma rodada de cerveja e me joguei em uma cadeira ignorando a
conversa fiada entre eles. O garçom, Robertinho, veio animado com uma
bandeja cheia de garrafas e as distribuiu em nossa mesa enquanto falava
sobre o último jogo de futebol.
Devo confessar que não prestei muita atenção, minha mente ainda estava
flutuando em relação ao que fazer com Valentina e em como eu queria beijá-
la.
— Não ligue para Benjamin, ele está apaixonado — informou Leo ao
garçom.
— O amor é uma maravilha — disse Robertinho.
Ítalo bufou indignado com aquela afirmação e tomou um longo gole de
sua cerveja. Voltei a ignorá-los enquanto zombavam de mim por me
apaixonar. Claro que eles descobriram isto primeiro do que eu. Eram meus
amigos e me conheciam desde sempre. Nada passava despercebido por eles.
De repente senti um arrepio na nuca e fiquei tenso. Com os olhos procurei
por Alex e o encontrei em um ponto estratégico me encarando. Não tinha
nada de errado na sua expressão, mas eu sentia que alguma coisa havia
mudado.
Meu segurança deu um passo à frente tentando entender o que se passava
em minha mente, acenei que não era necessário sua aproximação.
— Ben? — chamou Ítalo.
Levantei o ignorando.
— Vou ao banheiro — informei já saindo sem esperar por uma resposta.
Passei por algumas mesas e antes de chegar ao corredor do banheiro uma
figura de boné entrou na minha frente.
— Fiquei me perguntando quanto tempo você ia demorar a aparecer —
digo ao homem. — Axel.
Fúria brilhou nos olhos dele.
— Senhor? — Alex, meu segurança chamou.
Não dei atenção a ele, mesmo sabendo que deveria correr para fora e
deixar que fizesse seu trabalho de me proteger.
— Você a roubou de mim. — Acusou o verme.
Foi impossível segurar a zombaria que apareceu no meu rosto.
— Eu? — ironizei. — Você foi o único a jogá-la fora como se fosse um
maldito lixo.
— Se afaste dela. — Mandou em um tom de ameaça.
— Ou o que? — dei um passo à frente.
— Benjamin, não — ordenou Leo, fazendo-me ciente de que todos
estavam ao meu redor.
Ignorei meu amigo e enfrentei aquele pedaço de escória do mundo.
— Ao contrário de Valentina, eu sou bom com os punhos e vou usá-los
em você se não sair do meu caminho. — Ameacei.
Eu não sei explicar bem, mas no momento seguinte estava trocando socos
com Axel. A satisfação de bater naquele merda era extremamente prazerosa.
O acertei bem no nariz fazendo sangue jorrar em seu rosto, mas isto não o
parou, afinal, o monstro que ele mostrava a Valentina estava à borda cheio de
ciúmes e possessão.
Veio para cima de mim, porém, eu estava pronto e com raiva. Recebi
alguns golpes, jogamos cadeiras e mesas no chão, garrafas e copos se
quebraram. Ele estava em fúria e eu me sentia vingado a cada vez que o
acertava.
Parecia tão pouco somente bater nele, a satisfação estava longe de me
alcançar e de alguma forma percebi o quão perigoso era aquela raiva. Me dei
conta de que estava em cima dele o acertando e parei quando me puxaram
para longe.
— Você ficou louco! — gritou Leo. — Por mais que ele mereça, é
agressão com agravantes.
Novamente o ignorei.
— Fique longe dela. — Ordenei em um tom frio. — E pare de me seguir.
Axel sentou cuspindo sangue no chão e riu como um psicopata.
— Isto ainda não acabou — afirmou ele.
Senti um arrepio atravessar minha pele, pois havia uma promessa muito
mais profunda na voz daquele homem e eu temia por Valentina.
Alex pegou o verme pela camisa e o colocou de pé como se ele não
pesasse nada.
— Não sou bom em aceitar ameaças — disse Alex. — Pode acreditar que
está em alguma vantagem criando essa situação, mas será o único que
acabara atrás das grades ou morto.
O maldito nem mesmo piscou com aquela ameaça, somente sorriu de lado
e se forçou a soltar das mãos firmes do meu segurança.
Olhou para o lado e vimos dois policiais militares que vieram correndo
assim que ouviu o tumulto.
— Senhor policial. — Acenou ele fazendo uma cara de pavor encenada.
— Esse louco me atacou. — Apontou pra mim.
Capítulo Trinta
Valentina
Fiquei encarando Benjamin sem saber como me sentir, mal podia acreditar
que ele tinha um olho roxo e vários outros machucados causados por uma
briga com Axel.
Parecia que meu pesadelo estava se tornando realidade. Se enfrentaram
uma vez, o que significava que aconteceria de novo. Axel não era de desistir,
ainda mais depois de ser humilhado.
— Você foi preso? — rosnei sentindo uma raiva incomum crescer dentro
do meu peito.
— Tina... — ele tinha um irritante tom de mediador.
— Não me venha com essa. — Retruquei brava. — Que merda aconteceu?
— Ele estava me seguindo...
— E do nada acabaram atracados como selvagens!
— Tina... — hesitou. — Ele veio me enfrentar e eu perdi a razão...
— Com violência — cruzei os braços.
Ele se levantou do meu sofá fazendo uma careta, tinha chegado há meia
hora e me contado o que aconteceu na praia. Primeiro eu fiquei apavorada em
vê-lo machucado para só então, ficar brava.
— Sinto muito! — tentou se aproximar, mas eu me afastei.
— Você prometeu. — Acusei.
— O que? — pareceu genuinamente confuso.
— Você prometeu que se manteria seguro. — O lembrei. — E vem me ver
todo machucado.
Seu rosto perdeu a cor e seus olhos arregalaram.
— Me desculpe — disse suavemente. — Eu não tinha me esquecido da
promessa, só que estava com raiva da ousadia dele. — Passou a mão que não
estava machucada nos cabelos. — Queria me vingar por tudo o que ele fez a
você — confessou.
— E como resultado acabou preso por lesão corporal — cruzei os braços.
— E solto com a influência de Leo — completou.
— Deus!!! — esfreguei o rosto. — Como chegamos a isto?
— Perdi a cabeça — confessou ele.
— Esse é o problema Benjamin. — Sentei na poltrona. — Cheguei a uma
fase da minha vida que violência é a última coisa que faria.
— Ele a machucou! — exclamou chocado. — Tentou te matar, pelo amor
de Deus!
— Não preciso ser lembrada disto — retruquei no mesmo tom exaltado.
— Eu mesma bateria nele até a morte para me vingar, mas aonde isto me
levaria? — questionei. — Diga-me, sente-se bem depois da briga? Está
satisfeito? Sua raiva passou? Os acontecimentos do meu passado foram
apagados?
Ele demorou a responder, sua expressão endureceu.
— Não.
— Sabe por quê? — perguntei. — Pode ser satisfatório socar a cara
daquele homem, mas nada vai mudar o que ele me fez. Não vai apagar os
inúmeros machucados que ele me infligiu e nem reverter às vezes que me
violou. — Engoli em seco. — Essa briga somente adicionou mais uma página
de violência nesta história.
— Tina...
— Eu não acabei Benjamin. — O interrompi. — Confiava que você não
agiria desta forma, mesmo que com boas intenções, no caso de me vingar,
acabou agindo como Axel. — Seu rosto ficou mais pálido. — Resolveu com
os punhos algo que estamos trabalhando duramente para usar a lei.
— A lei é muito fraca — resmungou.
— Eu sei — respondi cansada. — Agora eu só sinto medo do que pode vir
acontecer. Estou preocupada de que Axel queira se vingar de você e ele não
vai usar a lei para isto, pode até te processar, mas assim como no meu sonho.
— Engoli em seco. — Vai te matar.
— Vou ficar bem. — Jurou.
— Não diga isto. — Suspirei. — Não pode me prometer algo assim. Não
controlamos o futuro e nem as ações daquele maldito.
Cobri o rosto com as mãos, meu coração estava aflito, cheio de medo do
que poderia vir a acontecer. Conhecia Axel, ele poderia ter se saído bem com
a chegada do policial, mas ele não iria esquecer que Benjamin o enfrentou
por minha causa.
— Tina?
Não fui capaz de respondê-lo.
Minha garganta pareceu fechar com a tensão que começou a se espalhar
por meu corpo. Era pavor, eu sabia disto, mas não tinha certeza de como lidar
com aquele sentimento.
— Querida?
Ele se ajoelhou na minha frente e delicadamente descobriu meu rosto.
— Não chore. — Sussurrou.
— Estou com medo — confessei.
Seus dedos deslizaram por meu rosto limpando o rastro da lágrima
teimosa que escapou.
— Me perdoe — disse baixinho. — E não chore.
— Esse homem me aterrorizou por meses e continuará fazendo.
— Vamos dar um jeito. — Prometeu.
— Ele vai nos matar.
— Ninguém vai te machucar — disse ferozmente.
— E quanto a você? — encarei seu olho roxo.
— Vou ficar bem — afirmou.
— Sabe que isto não me tranquiliza.
— Eu sei e peço mil desculpas. — Beijou minha testa. — Sei que além de
preocupá-la, eu a magoei. Não foi minha intenção, confie em mim.
Suspirei.
Queria dizer que não confiava, no entanto, seria uma mentira, apesar de
sua briga eu sabia que ele não estava mal-intencionado. Admito que me deu
um frio na barriga com aquele pensamento, afinal, provei ser péssima para
julgar caráter. Axel demonstrava ser um príncipe e se revelou um verdadeiro
monstro.
Encarando-o nos olhos soube que jamais poderia compará-los ou pior,
igualá-los. Benjamin tinha uma bondade em seu coração que eu nunca
poderia duvidar.
— Eu devo me desculpar também — digo.
— Por quê? — gemeu e se sentou ao meu lado segurando as costelas.
Juro que no fundo eu quis apertar seus machucados, somente para que
aprenda a nunca mais se meter um uma briga.
— Um pouco de gelo? — ofereci.
— Seria ótimo. — Sorriu de lado.
Antes de me levantar retribui o carinho ao deslizar minha mão por seu
rosto.
— Desculpe dizer que agiu como ele. — Engoli em seco. — Estava brava
e nunca poderia igualá-los. Desculpe-me, você não merecia ter ouvido isto.
— Tudo bem, Tina, eu entendo. — Sorriu envergonhado. — Agi com
violência, mesmo que acreditando ser uma boa causa, entendo que não
resolvemos problemas com os punhos.
— Parece que você teve sua lição. — Brinquei.
— Sim e por mais que eu quisesse bater nele até a morte por tudo o que
fez a você, vou me controlar. — Beijou minha bochecha. — Chega de
violência.
— Chega de violência! — repeti.
O beijei rapidamente e me levantei, mal dei dois passos e parei ao ouvir o
toque suave da campainha. Franzi a testa confusa, com os meses morando ali
poucas pessoas bateram na minha porta. Sem contar que Aslan ou Ciro eram
grandes muros do lado de fora.
Abri a porta e dei de cara com a parte feminina da família Daslow, aquelas
mulheres dominantes que enlouqueciam Benjamin.
— Esmeralda. — Aceitei seu abraço ainda surpresa com a presença delas.
— Sabemos que aquele selvagem está aqui — disse ela.
Mordi os lábios segurando o riso.
— Como você está querida? — perguntou Emília.
— Bem — retribui seu beijo. —, entrem! — indiquei o caminho.
Uma por uma, Fernanda, Ilda, Joana e Mônica, passaram por mim
abraçando e beijando até seguirem apressadas para a sala. Fechei a porta e
ouvi o bufo indignado de Benjamin.
— Não agora! — protestou ele.
— Agora sim! — retrucou todas elas irritadíssimas.
Ou melhor, menos Mônica, ela era a única que ria no momento.
— Como você pode entrar em uma briga? — questionou Emília.
— E como deixou acertar seu olho? — Esmeralda perguntou indignada.
— Ela te ensinou bem como desviar de um soco. — Mônica provocou
apontando para a mãe.
— Não o incentive. — Repreendeu Ilma. — Brigando em bares — disse
horrorizada.
— Como selvagens — resmungou Fernanda.
— Devia pensar no seu nome antes de sair aos socos por aí. — Apontou
Joana.
— Já acabaram? — questionou ele sem cruzar os braços, mas eu sabia que
se ele não estivesse com dor teria o feito com toda arrogância possível.
Prendi o riso e continuei observando aquela cena.
— Não — retrucou Emília.
Ela se aproximou e apertou o roxo manchando seu olho.
— Aí!!! — protestou. — Mãe!
— Bem feito — respondeu ela. — Era pra doer mesmo, não te criei em
um ringue de lutas.
— Que exagero. — Bufou Mônica. — Foi só um briga. — Deu de
ombros. — Mas me diga, aonde mesmo que está doendo?
— Não vou contar. — Retrucou ele.
— Vamos descobrir. — Prometeu Esmeralda.
Eu não entendi o que estava acontecendo até que todas elas o agarraram.
Benjamin resmungou e protestou, mas as mulheres Daslow não estavam
dispostas a desistir. Tenho certeza de que elas apertaram todos seus
machucados enquanto falavam ao mesmo tempo.
Sabia que não deveria rir, mas foi impossível segurar. Ele tentou se
esquivar e proteger os ferimentos, o que não teve muito efeito. Elas não
deram trégua, abraçaram, beliscaram e acho que até o morderam.
— Chega! — esbravejou Benjamin.
Todas as mulheres na sala congelaram.
— Isto já foi longe demais — disse firme e acredito que até bateu o pé no
chão. — Sei que ficaram preocupadas, zangadas e agora estão se divertindo
as minhas custas, mas não tem a menor graça.
— Pra mim tem — murmurou Mônica.
Ele a olhou duramente.
— Entrei em uma briga que me senti satisfeito no momento e apesar de
gostar, tudo o que causei foi preocupação. — Assumiu com uma autoridade
que nunca o vi usando com sua família. — Agora quero todas para fora, eu
tenho assuntos importantes para tratar com Valentina.
Esmeralda foi a primeira a reagir dando um tapa no braço dele.
— Vou embora porque quero — respondeu com petulância. — E obrigada
por bater a merda fora daquele idiota.
— Iaiá, você é impossível — disse ele.
Parecia bravo, mas beijou a avó com carinho antes de voltar a indicar que
elas deveriam sair.
Rindo, agradeci a todas pela inesperada “visita” e elas se foram lideradas
por Esmeralda. Fechei a porta com a sensação de que um baita furação havia
acabado de passar por ali. Encostei-me à madeira e encarei o homem que
mudou minha vida somente por espalhar gentileza.
— Você parece mal-humorado. — Observei.
— Estou — respondeu incomodado. — Elas não têm limites.
— Gosto delas. — Dei de ombros.
— Quem não gosta? — retrucou me fazendo rir. — Bando de enxeridas.
Ele se aproximou, ficando bem na minha frente e seus braços apoiados
acima da minha cabeça.
— Obrigada — sussurrei.
— Pelo que? — questionou encarando meus lábios.
— Por dar uma surra naquele monstro — respondi tão baixo que nem sei
se ele ouviu. — Me protegeu.
Mas confirmou estar atento quando seus olhos encontraram os meus, havia
uma pouco de confusão na profundeza encantadora de seu olhar castanho.
— Primeiro eu fiquei com medo — confessei. — Isto me deixou brava e
apavorada ao mesmo tempo. — Meus olhos lacrimejaram e eu fui forte
suficiente para manter essas lágrimas teimosas presas. — Ainda estou com
medo do que ele pode vir a fazer.
— Mas? — ergueu uma sobrancelha.
— Estou agradecida por ter quebrado a cara daquele homem.
— Não me agradeça — pediu. — Foi um prazer.
Ri baixinho.
— Eu não tenho dúvidas. — Garanti.
— Bom — acenou. —, antes desta confusão toda, eu só queria vir te
encontrar e te beijar até ficar sem fôlego.
Meu coração bateu descompassado no peito com sua confissão, apesar de
odiar seu olho roxo eu o achava um homem lindo e eu estava apaixonada.
Não por sua forma exterior, mas sim pela beleza que havia em seu interior.
— Beija-me. — Exigi.
Capítulo Trinta e Um
Benjamin
Seus lábios eram suaves contra a dureza dos meus, precisava ser mais
delicado com ela, eu sabia disto. No entanto, por mais que me esforçasse não
conseguia me controlar. Sentia-me impaciente e com uma terrível
necessidade de dominá-la. Valentina ficaria horrorizada com o rumo dos
meus pensamentos, porém, as imagens em minha mente eram tão sensuais
que não conseguia encontrar minha consciência.
Segurava-a na porta, pressionando meu corpo um pouco mais contra o
dela. Suas curvas, tão tentadoras e sedutoras, encaixavam com perfeição e
estavam se tornando a cada dia mais irresistível.
A beijei com mais fervor e ela correspondeu com a mesma intensidade. O
desejo era como o centro de um vulcão pronto para explodir, impossível de
conter. Eu nem mesmo me lembrava da última vez que estive tão louco
daquela forma. Acredito que a mistura de sentimentos, como amor por
Valentina e raiva por Axel, tenha me levado para fora dos eixos.
Existia um sentimento forte de proteção em meu peito, mas não nego que
vinha de uma gigante necessidade de tomá-la para mim como um maldito
bárbaro. Claro que eu compreendia que Tina não precisava de outro louco em
sua vida, porém, a possessividade em minhas veias era difícil de ignorar.
A única coisa que eu não esperava era que todo aquele fogo morresse com
o único toque dela em minhas costelas. Cheguei a estremecer, pois na briga
acabei batendo o lado contra a quina de uma mesa. Na hora eu nem me
importei, mas assim que minha bunda foi colocada dentro de um hospital por
insistência de Ítalo, o médico que me examinou não teve dúvidas ao dizer que
iria doer como um inferno aquele machucado.
— Ben?
— Desculpe — resmunguei.
— O que aconteceu? — perguntou em um tom cheio de inseguranças que
partiu meu coração.
— Lembra-se daquele gelo que me ofereceu antes? — tentei aliviar a
situação.
— Sim! — arregalou os olhos. — Toquei em algum lugar dolorido?
Acenei com a cabeça e levantei minha camisa sem poder controlar a careta
que fiz ao perceber que não gostaria que ela visse. Embora, de alguma forma
senti que era importante para Tina ter esse tipo de confiança íntima entre nós.
— Deus! — exclamou horrorizada com a mancha roxa em meu lado. —
Como isto aconteceu?
salvação.
Epílogo
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Conheça outros livros da autora
Sinopse
O quão real é o amor para você?
Já amou alguém em que pode afirmar com todas as letras que aquele
sentimento era real?
Vitor e Sofia se encontram por acaso, talvez por obra do destino. Destino
este, que os mostrou que estavam destinados a amar. O casal mostra todo o
romantismo possível para um relacionamento verdadeiro, autêntico.
Sem muito drama e com uma grande parcela de humor, traz uma delicada
história de amor e cumplicidade.
Sinopse
Já chegou ao ponto de desistir de encontrar sua outra metade? A acreditar
que não existisse uma pessoa que se encaixasse perfeitamente a você e
simplesmente desistiu?
Guilherme e Letícia desistiram, mas não esperavam que fossem marcados
pelo destino para amar.
Mesmo sobre circunstâncias difíceis, os mais puros e belos sentimentos
floresceram. E tudo o que eles precisavam fazer era aceitar aquele amor
inesperado, aquela oportunidade de ter um amor para recomeçar.
Sinopse
Dono de um restaurante/bar e independente, Connor levava uma vida pacata e tranquila
até uma bela mulher aparecer em seu mundo. Ele nunca havia se apaixonado, mas
descobrirá que quando menos se espera, o amor bate em sua porta e o arrebata como um
caminhão desgovernado prestes a atropelar.
Disposto a seguir seu coração, ele vive um dia de cada vez ao lado de Nikky, uma bela
descendente japonesa que é dona do mais lindo par de olhos que já viu. Juntos eles
descobrem seus sentimentos e vivem um grande amor.
Doce sentimento é um romance adulto leve, sem inimigos vingativos ou cenas de ação.
Não há muitas brigas ou confusões, é um livro onde os personagens encontram o amor,
amor à primeira vista, e tudo se passa na visão de Connor. Os personagens se mostram
adultos suficientes para enfrentarem seus sentimentos e deixar as coisas acontecerem.
Sinopse
Nada mais seria da mesma forma depois que Adônis Albertini colocou
seus olhos sobre a pequena ruiva, que agora era sua prisioneira. Ele não
saberia explicar o que sentiu quando seus olhos encontraram os dela. A única
certeza que tinha, era que nunca poderia machuca-la. Quando pela primeira
vez em sua vida experimentou um sentimento chamado, compaixão.
O medo e a fragilidade que exibia de forma tão crua o atraiu. Era como se
seu demônio interior estivesse hipnotizado pela beleza natural e pura que ela
ostentava. Giulia. Sua nova e única protegida.
Quem a machucasse enfrentaria o pior dele.
Adônis sempre teria inimigos, mas sua única preocupação era se render
aos sentimentos que pela primeira vez experimentava.
E o maior deles era o amor.
Sinopse
Seu sorriso e o ar de despreocupado eram sua marca de perigo.
Apolo acredita que não nasceu para amar, para ter família. A fera que o
habitava estava sempre a superfície, fazendo-o cruel e vil. Acreditava que
nunca iria se apaixonar, que morreria sozinho e sem ninguém para ama-lo.
Pretendia seguir com esses planos por toda a vida, pois não desejava
submeter terceiros no mundo em que dominava.
No entanto, a vida estava pronta para prova-lo o contrário. Que todos
tinham a oportunidade de serem amados. O único problema era conseguir
manter esses sentimento acima de qualquer diferença.
Depois de um erro.
Um pequeno erro.
Apolo se viu perdido e descontrolado.
Seu maior medo tinha se tornado realidade e não existia a menor
possibilidade de fugir. Ele tentou, mas não era homem de correr de
problemas.
O único jeito era ficar e enfrentar aquilo que mais temia.
Sinopse
Ele, um homem marcado pelo passado. Acredita que seu coração não
tenha mais espaço para amar. Talvez, nem mesmo queira se apaixonar.
Estava amargurado, congelado pela dor que se negava compartilhar.
O que Abner não imaginava, era que suas vontades não tinha voz. O amor
bateu na sua porta e em troca, ele pisou e maltratou a dona desse sentimento.
Agora, era o momento de cicatrizar o passado e correr em busca do seu
futuro.
No entanto, será que Carolina irá perdoá-lo?
Ele merece seu amor?
Talvez sim, talvez não.
Venha conhecer o desenrolar desta história.
Sinopse
Já imaginou que, talvez, seu amor verdadeiro esteja prestes a ser
atropelado por você?
É melhor não, né?
Elliot não esperava que sua vida de playboy rico e mulherengo fosse
terminar quando colocasse os olhos em cima de Charlotte. Literalmente em
cima, depois de quase matá-la com seu carro. Ela o enfrentou, gritou e ainda
não aceitou sua ajuda.
Não teve jeito, foi amor por acidente.
Ele estava pronto para fazer o que fosse preciso para que Charlotte o
aceitasse, nem que fosse apenas um encontro. E então, trabalharia para que
continuassem se encontrando até que aquele sentimento sufocante em seu
peito acabasse de vez ou aumentasse.
O que Elliot não esperava era ter um concorrente insignificante, mas
determinado a ter Charlotte.
Sua Charlotte.
Não! Isso ele não permitirá.