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Copyright © 2020 THAÍS PUSSENTI

Está é uma obra de ficção. Nomes, personagens, lugares e acontecimentos descritos são
produtos de imaginação do autor. Qualquer semelhança com nomes, datas e acontecimentos reais
é mera coincidência

Revisão: Naiara Bacelar-NBLITERÁRIO


Capa: CN Design
Edição: Naiara Bacelar -NBLITERÁRIO
Diagramação digital: Naiara Bacelar - NBLITERÁRIO

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Copyright © 2020 THAÍS PUSSENTI


Flora Collins poderia ser como qualquer garota de sua idade e aproveitar cada segundo
dos tempos tão únicos da universidade. No auge de seus dezenove anos, ela poderia aproveitar
sua juventude, cometendo os erros que todos diziam serem essenciais para se recordar na velhice.
Entretanto, para o seu desprazer, não era isso que lhe acontecia.

Criada em um lar controlador, ela estava cansada de ser a garota de recado que sempre
tinha que finalizar as brigas e tentar agir civilizadamente quando os dois adultos só queriam
brigar, magoando todos ao redor e principalmente ela. Ser aceita em uma das melhores
faculdades da Califórnia parecia um sonho e pensou que sua vida mudaria d’água para o vinho
com uma possível mudança para um lugar longe de suas origens. Mas isso foram apenas ilusões
tolas e sua vida tediosa e nada saudável parecia ser tudo o que ela teria nos próximos anos.

Se conformar parecia o certo.

Até Ele.

Dono de olhos intensos verdes e uma má atitude, Oliver é tudo o que qualquer garota
gostaria de ter e o pesadelo de toda sogra. Ele está longe de ser perfeito, mas ele era único em
sua maneira e se apaixonar nunca pareceu tão certo. Entretanto, finais felizes não existem na
realidade e com obstáculos inusitados, Flora iria descobrir algo surpreendente.

Sua força.
Ao meu pai, que descansa em paz
FLORA COLLINS

Papai e mamãe estavam brigando novamente. Não é uma novidade para mim ou os
vizinhos, mas o meu corpo não havia se adaptado ainda e reagia da pior forma possível em uma
crise desesperadora que fazia meu coração bater com agressividade, minha visão escurecer e
meus pulmões parecerem sem oxigênio o suficiente para respirar.

O começo não era tão perturbador, acontecia gradativamente e se iniciava com meu
batimento cardíaco se acelerando e um arrepio irritante que descia por todo o meu corpo, me
fazendo estremecer. Quando isso acontecia, eu logo me mexia e saia para qualquer lugar em
buscar de ar e fazia o que aprendi ser um excelente remédio. Correr. A corrida me ajudou
bastante em afastar o que me atingia e me tirar de casa por tempo o suficiente para não ter que
presenciar as brigas desgastantes de sempre.

E era o que eu estava fazendo neste exato momento, correndo para bem longe de toda a
confusão que eu era obrigada a presenciar desde muito nova. Antes eu interrompia as brigas
tentando acalmar o caos entre os dois adultos, mas com o tempo diminui as interrupções, pois
estava me prejudicando. Além das brigas envolverem os mesmos assuntos estúpidos, me deixava
tão nervosa, que sempre tinha crises após as interrupções e parar parecia ser a única solução.

Estava enganada.

Em uma noite como qualquer outra, coloquei uma música no último volume do meu fone
e no intervalo de uma música para outra, escutei gritos. Ao descer encontrei meu pai
encostando– se ao balcão da cozinha segurando o ombro enquanto minha mãe andava de um
lado para o outro buscando suas chaves do carro.

Ela acidentalmente havia esfaqueando meu pai.


Ao ser questionada no hospital sobre o que aconteceu pelo médico responsável por
atender meu pai, minha mãe disse que foi um acidente doméstico e meu pai confirmou a história
ao policial.

Eles eram doentes.

E me deixaram doente.

E eles ao menos percebem isso.

Após o acidente pensei que tudo mudaria, mas tudo continuou o mesmo de sempre e
minhas crises se tornaram mais violentas ao ponto de pensar que eu iria enlouquecer. Na noite
seguinte, sentindo o início da mesma sensação esmagadora, fugi de casa e percebi que correr
para longe era o melhor para minha sanidade.

Apressei o passo até sentir os músculos das pernas protestarem e corri o mais rápido que
minhas pernas suportavam. Está era a segunda vez que fugia de casa e deixava que eles se
resolvessem no mesmo dia. As brigas estavam se tornando cada vez mais intensas e temia pelo
pior. Eles tinham que se libertar e aceitar o divórcio de uma vez, ficando o mais longe possível
um do outro, mas são egoístas demais para aceitar que qualquer um dos dois possa ser feliz com
outra pessoa. Era doentio.

Ajoelhei–me quando meus joelhos falharam e abaixei–me apoiando minhas mãos nos
mesmo, respirando forte e tão eminentemente que não sabia ao certo como aguentava aquilo.
Tombei para a parede mais próxima e me encostei, tentando respirar normalmente e ir de volta
para o meu inferno pessoal.

Encosto minha cabeça na parede e respiro fundo, abrindo os meus olhos e percebendo
pela primeira vez em que lugar eu me encontrava e principalmente, como tudo estava tão escuro.
Certamente não era uma coisa tão inteligente seguir sua intuição e esquecer o resto do mundo,
pois situações como essas podem acontecer e te colocar em coisas que realmente colocassem sua
vida em risco.

Ergui–me e abracei meu corpo, sentindo um frio repentino e um ódio por eu mesma por
não ter usado uma blusa de mangas compridas ou ter pegado um moletom antes de sair. Estalei
os ombros e ajeitei minha postura, começando a andar devagar, pois minhas pernas não estavam
aguentando quase nada e gritavam por um relaxante muscular e um longo tempo de descanso.
Olhando para o chão não pude evitar ser pega duplamente de surpresa pelo puxão que
recebi e gritar de dor com o bater das minhas costas na parede de cimento. Meus braços
automaticamente foram de encontro com o homem que me agarrou sem me dar chance alguma
de ao menos tenta fugir.

Afastando minhas pernas com as suas, ele se colocou em meu meio, me prendendo contra
parede enquanto segurava meus braços com força em cima de minha cabeça com uma única
mão. Como se passasse em câmera lenta, eu gritei e implorei para que ele me soltasse, mas ele
apenas ria e dizia coisas grotescas que o barulho do meu sangue e batimento cardíacos tão altos
me impedia de escutar. Lágrimas caiam pelo meu rosto e eu sentia que poderia desmaiar á
qualquer segundo, não melhorando em nada quando sua boca nojenta desceu sobre a minha
tentando enfiar sua língua dentro dela.

Eu não á abri e continuaria sem o fazer, mas sua mão apertou meu seio tão fortemente,
que foi impossível não gritar de dor e implorar para que algo o impedisse de completar o que
tinha em mente.

Não poderia conviver com aquilo.

Não conseguiria.

Quando sua boca desceu pelo meu pescoço, barulho de tecido sendo rasgado soou e senti
sua mão chegando aos meus seios, soltei o grito mais alto de misericórdia que consegui e como
recompensa, aquele homem foi tirado de cima de mim e jogado do outro lado. Escorreguei na
parede, arranhado minhas costas e puxei minhas pernas para mim, abraçando–as e assistindo em
estado de choque um homem bater com brutalidade naquele ao qual queria me violentar.

Sua mão descia diversas vezes e não vi nenhuma vez o outro conseguir revidar. Meu
defensor era forte e esguio e o outro apesar de ser mais forte que eu, era um fracote comparado
ao meu salvador. A surra continuou e o homem que me ajudou só se afastou quando percebeu
que o outro cara estava apagado. Levantando–se é chutando a barriga dele até sentir que eu
possivelmente estava vingada.

O homem passou as mãos sobre o cabelo e se virou, olhando para mim com atenção e
vindo em minha direção tão lentamente como se iria para conferir um animal selvagem ferido.
Ajoelhou– se próximo de mim e quando sobraram apenas poucos centímetros de distância entre
nós dois, ele olhou dentro dos meus olhos, dando–me a oportunidade de ver um pouco da cor
mais linda que já vi nos olhos de alguém.
Duas bolhas verdes como esmeraldas, aparentando curiosidade.

Algo dentro de seus olhos não me fez sentir medo algum e aceitei de bom grado sua mão
estendida em minha direção.

– Sou Oliver Bennett e não estou aqui para te machucar. – sua voz era como melodia
sobre meus ouvidos. – Apenas para te levar para casa em segurança.

Balancei minha cabeça e em uma ação inesperada joguei–me sobre ele, apertando–o
junto á mim como se ele fosse minha tábua de salvação e ganhando dele o abraço que tanto
precisava naquele momento.

– Obrigada.

Sussurrei e aceitei de bom grado a escuridão que meu corpo tanto desejava.
OLIVER BENNETT

Desde muito pequeno percebi que nós somos os responsáveis pelo nosso destino. A vida
não te dá à opção de ser fraco. Não. Ela te derruba no chão tantas vezes, que ser forte não se
torna uma opção, mas sim uma questão de sobrevivência. Sentar e chorar por coisas que você
não pode mudar é perda de tempo. As coisas acontecem como tem que acontecer e na maioria
das vezes são nossas escolhas que dirão quem realmente somos e o que iremos colher.

Nascido em uma família que carrega no sangue um amor incondicional pela adrenalina,
cresci assistindo as consequências pelas escolhas que meu pai realizou por essa paixão incomum
e vi sua queda quando minha mãe nos abandonou e nunca mais olhou para trás. Meu pai sendo
um homem de bom coração, nunca se recuperou completamente do abandono, mas com dois
filhos pequenos ele não tinha outra opção a não ser se reerguer.

Essa paixão incomum pela adrenalina, que pertence aos Bennett em várias de nossas
gerações, foi responsável pela morte de vários homens da minha família e certamente será o
responsável por muitos outros, mas como todos dizem e eu assino embaixo: Que se exploda
tudo, se eu estiver dentro de um carro, estarei feliz!

Aprender a dirigir é uma das primeiras coisas que os homens da minha família aprendem
nesta vida e conforme crescemos aprendemos tudo ao respeito dos carros, sabendo o que
devemos e não devemos fazer com nossas máquinas. Nossa tendência é sempre melhorar e são
raros os que não se tornavam os melhores no volante e os donos das corridas ilegais que
participassem. Pergunte para quem for, se entramos em uma corrida é para vencer.

Entretanto o poder que isso traz pode cegar um pouco e muitas burrices são realizadas
com sucesso. Acho que isso é algo para que se possa valorizar todas as conquistas que
conseguimos e prestar atenção no que realmente importa. Mas muitos não percebem isso e
acabam morrendo precocemente, cegos pelo brilho do poder.

Andando ao redor do bairro pobre e esquecido pela sociedade, lugar ao qual vivi os
primeiros anos da minha vida com muito sacrifício e tive a dor de ver minha mãe ir embora, sem
nunca olhar para trás, abandonando todos nós pelas escolhas erradas de meu pai. Não posso
evitar pensar sobre isso, o inicio complicado de minha vida.

Ninguém nasce sabendo. Isso é um fato incontestável e os negócios da rua podem ser
perigosos quando realizados sem uma malícia necessária e antes de pegarmos ela e ver como
tudo funciona, nos somos ferrados por nossa ganancia e inocência. O poder é conquistado rápido,
mas manter ele é complicado e até ter a malícia necessária entramos em uma estrada longa de
vários altos e baixos. Mas quando as conquistamos ninguém pode nos atingir e somos
implacáveis em nossos contra ataques.

Bondade? É algo raro de se encontrar neste mundo e deixo isso exclusivamente para os
ricos que nunca tiveram que passar pela tão temida fome, que faz até o mais santo dos santos se
entregarem ao pecado sem pensar duas vezes.

Encaro ao redor encontrando luzes iluminando certos pontos, não fazendo muito para
clarear a escuridão da noite. O frio estava forte para essa época do ano e as ruas estavam úmidas,
com cheiro de urina forte e sem ninguém circulando ao redor. Isso demostrava que os toques de
recolher ainda existiam e que os poucos moradores eram sábios e o respeitavam, trancando–se
em suas casas com portas de papel e tentando enganar a si mesmos que estão seguros, quando
todos sabem que isso não pode ser encontrado neste lugar.

Quando alguém está na mira, eles não esperam pacientemente pela saída de quem querem
a cabeça e eles vão atrás e passam por cima de qualquer um para derramar o sangue do vacilam
da vez e ninguém pode impedir e se tentar, morre na hora, sem ter tempo sequer de piscar.

Paro do outro lado da rua e encaro ao redor, encontrando o prédio ao qual morei
completamente derrubado, como meu irmão havia avisado. Entretanto, eu era teimoso e
precisava ver com os meus próprios olhos todos os restos do lugar de merda em que morei,
assistindo e escutando todo o tipo de coisas que ninguém gostaria de presenciar. Principalmente
uma criança.

Tiro um cigarro do bolso e acendo, dando uma longa tragada antes de caminhar com
passos rápidos em direção ao meu grande amigo. Não o colocaria aqui dentro para chamar a
atenção desnecessária e atrair viciados loucos para cima de mim. Tendo uma arma ou não, não
estava com vontade de ver meu amigo personalizado e instrumento de trabalho com uma marca
de mão que fosse.

Minha estreia pelas ruas da Califórnia seria na próxima noite e não poderia ser nada além
de inesquecível e para isso nenhum aranhão poderia acontecer.

Trago o meu cigarro enquanto caminho, mas paro ao perceber certo movimento do outro
lado da rua, algo como gritos e choro feminino. Observo por um segundo e penso se devo ou não
ir impedir que o possível estrupo aconteça e resolvo que sim, ajudaria quem diabos fossem.
Talvez seja só uma viciada, mas ninguém merecia esse tipo de coisa e eu não estaria deixando
que acontecesse.

Atravesso a rua e vejo pela luz fraca do poste um homem grande imprensar uma garota
contra a parede, enquanto ela chora em desespero. Sem pensar muito, tiro o homem de cima dela
e o jogo no chão, socando diversas vezes o rosto do homem até que ele desmaie e fique apagado
junto com os ratos, algo que ainda era bom demais para ele.

Ainda com a adrenalina circulando meu sangue, passo minha mão sobre meus cabelos e a
encaro, caminhando lentamente em sua direção e ajoelho em sua frente devagar, tentando não
assustar ela mais do que ela já estava e assisto o pânico em seus olhos castanhos e em uma
tentativa de amenizar a situação me apresento para ela.

– Sou Oliver Bennett e não estou aqui para te machucar. – tentei ser o mais dócil
possível, o que não era muito fácil para mim. – Apenas para te levar para casa em segurança.

Com lágrimas molhando o seu rosto, ela concorda com um aceno.

– Obrigada. – Ela diz em um tom fraco e angelical, que por sua voz de choro, me deixa
desarmado.

Engulo em seco e aproximo– me mais dela e de repente seus braços me agarram e seu
perfume de frutas vermelhas me faz respirar mais profundamente até perceber que o desespero
venceu sua luta e que ela estava desmaiada em meus braços.

O que diabos eu faria agora?


– O que diabos é isso Oliver? – meu irmão Olavo questionou quando entrei em casa com
a garota em meus braços.

Infelizmente a bela adormecida havia apagado de vez, deixando-me sem outra opção a
não ser trazer ela para minha casa.

Ignorando o meu irmão e ando rapidamente em direção as escadas, indo direto para o
meu quarto. Entretanto, no meio do caminho meu pai aparece e pergunta a mesma coisa que meu
irmão, como um disco arranhando.

– Longa historia. – respondo e prossigo, subindo de dois em dois degraus. - Depois conto
com detalhes.

– Depois o cacete. – meu pai bradou. – Você vai contar está merda agora!

Paro em frente à porta de meu quarto e olho para o homem que quase me mata com o
olhar e certamente tem os melhores pensamentos ao meu respeito agora.

– Ela estava sendo atacada e eu a ajudei, depois de me agradecer, desmaiou. – resumo.

–Oliver... – meu pai esbravejou.

– Acredite se quiser. – afirmo aborrecido. – Não darei mais detalhes sobre isso.

Entro no quarto e deixo–a na minha cama, ajeitando-a de uma forma que não fique com
dores no dia seguinte. Viro e vejo meu pai e irmão olharem para mim como se eu tivesse duas
cabeças. Respiro fortemente e bato a porta do quarto em seus rostos, não dando uma merda para
o que eles pensem ou querem saber.

A menina havia acabado de ser atacada, não estaria bancando o babaca com ela e
fazendo-a acordar para despacha-la. Apesar de já ter feito isso diversas vezes, com mais tipos de
garotas que consigo imaginar, nem uma delas estava em uma situação como está e
provavelmente nenhuma outra garota estaria tendo.
Não sou um herói para salvar todas as donzelas do mundo. Coisas como essa só
aconteceriam uma vez em um milhão de vezes e eu gostava de fazer minhas coisas bem feitas.

Tiro meu sapato e ligo o abajur, olhando para o seu modo angelical e suave de dormir.
Cabelos castanhos presos em um rabo de cavalo e pele bem cuidada, algo que deixava bem claro
que ela não pertencia mesmo a aquele lugar.

Respiro fundo e tiro os seus sapatos de corrida, cobrindo-a e deixando–a dormir o sono
dos justos. Apago o abajur e vou direto para o banheiro, tomar um banho e tirar o suor seco que
grudou em meus cabelos e costas. Em meus dedos sangue seco estavam aparentes, mas pouco
importei, o homem ao qual bati mereceu cada pancada e isso que realmente valia no momento.

FLORA

Um som forte me despertar, fazendo–me virar na cama e aconchegar em algo grande e


quente. Resmungo de contentamento quando sinto um cheiro forte e muito agradável entrar em
meu olfato e um braço forte me puxar para mais perto, algo que me deixa momentaneamente
muito confortável, mas que me faz arregalar os olhos quando escuto uma voz masculina gritar
perto de minha cabeça com irritação e eu congelo no mesmo lugar.

– Já vou porra.

– Você não é surdo, filho da puta. – outra voz masculina berra. – Levanta dessa merda
logo.

O congelamento passa e eu pulo para trás quando ele se mexe e algo cutuca minha
barriga. Seus braços tentam me segurar, mas estou com muita adrenalina dentro de mim para
deixar que isso aconteça tão facilmente, o que resulta em um chute certeiro em certas partes dele
e eu cair direto ao chão. Certos praguejamentos saem de sua boca e meu quadril lateja
fortemente, fazendo–me tremer de dor pela pontada que sinto ao me levantar.

– Quem é você? – grito histericamente. – E o que diabos eu estou fazendo aqui?


Irritado e confuso, ele está em pé em minha frente, sacodindo os meus ombros. De
repente, ele aparenta está muito desperto para o meu gosto.

– Se acalme porra. – esbraveja se aproximando de mim.

– solte–me. – grito tentado bater nele.

Bufando ele o faz, fazendo–me cair com tudo em cima da cama. Minha cabeça e os meus
dentes batem no processo.

– Você é uma vadia louca. – informa com revolta. – Essa é uma das únicas opções que
não cogitei pensar que você seguiria ao acordar.

–Oliver, o que está acontecendo aí? – a mesma voz de segundos atrás grita na porta
novamente, raivosa.

– Um mal entendido que eu já vou resolver.

– Acho bom! Não acho que você queira que eu entre aí. – Ele avisa. – O negócio não vai
ficar bom para você se isso acontecer.

Escuto tudo confusa e então imagens da noite passada invadem minha mente,
esclarecendo o que me trouxe aqui e fazendo–me sentir uma vontade súbita de vomitar e chorar,
tudo ao mesmo tempo, mas eu não deixo que elas levem o melhor de mim e me sento, respirando
fundo e atraindo a atenção dele para mim.

Olhando de forma estranha em minha direção, ele descruza os braços do peito e desvia o
olhar pegando uma garrafa de água dentro de um frigobar e me oferece, que ainda temerosa,
aceito e o observo se sentar ao meu lado.

– Obrigada. – agradeço depois de segundos em silêncio, atraindo seus olhos para mim. –
Por ter me salvado e evitando que aquilo acontecesse.

Ele da de ombros e sorri com os lábios.


– Eu diria que você é bipolar, mas acho que qualquer pessoa que passasse pelo que você
passou e acordasse desse jeito teria essa mesma reação. – ele constata e continua. – Só eu mesmo
para não pensar no lógico.

Continuamos nos encarando e eu desvio o olhar.

– Levei um baita susto. – confesso.

– Eu acho que percebi. – ironicamente responde e limpa sua garganta. – Não sei o que
você foi fazer naquela parte da cidade e não sou do tipo que dou conselhos para ninguém e não
vou mudar isso. Não é necessário que te lembre do que quase te aconteceu lá e te diga o que seria
de você agora se eu não tivesse aparecido.

Respiro fundo e encaro o chão.

– Eu não vou voltar mais lá. – interrompo. – Acredite ou não, acho que já aprendi minha
lição.

– Isso é bom. – responde se levantando. – Espero que não se importe em esperar. Preciso
tirar a água do joelho e vestir uma roupa decente para te levar para sua casa. Acredito que seus
pais devem estar preocupados com você.

Arregalo os olhos e ele tem a confirmação que necessita, se virando e indo em direção a
uma porta no canto de seu quarto. Encaro sua bunda bem preenchida em sua cueca boxer
vermelha e só consigo tirar os olhos quando ele fecha a porta.

Taco–me na cama e encaro o teto, pensando se meus pais já descobriram que não dormi
em casa. É muito provável que minha mãe já tenha descoberto e se ela o fez, tenho pena de meus
ouvidos, pois essa é a segunda coisa favorita dela, colocar uma marcação cerada sobre mim.

É, acho que estou ferrada.


Levanto–me sentando sobre a cama quando sinto que estou prestes a adormecer
novamente. Na cama de um estranho. Meu corpo ainda não estava disposto o suficiente e
necessitava de umas boas horas de sono. Ontem eu me esforcei demais com toda aquela corrida e
agora meu corpo estava cobrando o seu preço.

Respiro audivelmente e estalo o pescoço, assim como meus braços e todos os ossos de
meu corpo, levantando quando é necessário para alcançar certos membros. Aproveito que já
estou de pé e resolvo olhar ao redor, forçando toda dor e queimação dos músculos a ir embora
enquanto descubro um pouco mais sobre o meu salvador não tão misterioso assim.

Solto meu cabelo e o prendo novamente, tentando domar minhas madeixas espessas
escuras. Ao redor tudo o que se vê são caixas e mais caixas espalhadas para todos os lados e uma
mesa solitária no canto da parede. Em cima dela há um biscoito recheado de morango abaixo da
metade e um notebook preto; alguns vídeos games e livros estão espalhados na superfície.

Do outro lado do quarto e próximo de uma porta um celular carrega em cima de uma
caixa, que está lotada dos mesmos biscoitos, com vários sabores, sendo o mais repetido o de
morango, pela cor dos pacotes. Tirando sua cama espaçosa, tudo está completamente em
desordem e em seu closet, que está aberto têm três malas no chão, sendo duas abertas com
roupas espalhadas ao redor e tendo todos os cabides vazios.

Ou meu salvador se mudou recentemente ou ele não era uma das pessoas mais
organizados do mundo.

O quarto é espaçoso e as paredes são todas pintadas de branco, com pouquíssimos moveis
ao redor. Quando fosse arrumado e decorado, ficaria ótimo. Caminho em direção a uma das
janelas, mas antes que consiga abrir a cortina, escuto ele perguntar pegando-me desprevenida.
– Já acabou sua vistoria?

Sinto minhas bochechas corarem com a vergonha de ser pega no flagra. Agradeço
mentalmente por todas as luzes estarem desligadas e viro–me dando de ombros, como se não
tivesse importância.

– Ótimo! Estou morrendo de fome. – ele confessa se virando em direção á porta e a


abrindo. – Espero que não se importe de esperar que eu tome um café. Não sou muito fácil de
lidar quando estou com fome e você não parece ser cercada por muita paciência.

Sua voz continua sendo escutada e eu juro que tento prestar atenção no que ele diz, mas
ele está tão bonito e cheiroso que se torna difícil tomar conhecimento de qualquer coisa. Passo
pela porta e balanço minha cabeça como se entendesse algo, mas estando bem longe disso.
Espero que ele não tenha perguntando nada ou feito uma afirmação vergonhosa.

Assim que caminhamos pelo corredor tiro meus olhos para longe dele. Ser pega secando
o cara que te salvou como se nunca tivesse visto um homem em sua frente era humilhante
demais para qualquer mulher. Entretanto, ele era maravilhoso demais para se olhar e parecia que
tinha algo que me deixava hipnotizada, tirando de mim o lado racional e lógico e colocando uma
louca que não podia ter seus olhos para si.

Achando–me patética demais, concentro–me nas vozes que escuto quando desço os
degraus das escadas.

– Quem mora aqui com você?

Seus olhos verdes me encaram, deixando–me tímida de repente. Céus! O que diabos está
acontecendo comigo? Estou agindo como uma virgem. Por sorte nunca vou vê-lo novamente,
seria mil vezes mais humilhante se ele fosse alguém que tivesse que conviver.

– Meu pai Otto e meu irmão Olavo. – ele responde tranquilamente quando entramos na
cozinha.

Um homem com uma aparência um pouco envelhecida e alguns cabelos grisalhos na


cabeleira espessa de cabelos quase pretos, está lendo o jornal enquanto toma uma xicara de seu
café. Assim que percebe nossa chegada, olha para cima com os mesmos olhos de seu filho e me
deixa maravilhada com a genética da família.

– Bom dia. – ele nos saúda colocando seu jornal em cima da mesa. – Sou Otto Bennett,
você é...?

Otto Bennett, um nome um pouco diferente para um homem tão bonito. Encosto-me ao
balcão da cozinha e respondo odiando como minha aparência deve estar.

– Flora Collins.

– Seu nome combina muito com você.

– Não é a primeira vez que dizem isso. – ainda mais tímida do que antes, respondo.

– Vai querer alguma coisa? – Oliver pergunta me encarando de forma estranha.

– Não obrigada.

Só ir embora e parar de agir como uma tola. Penso.

– Você que sabe. – responde se sentando no banco do balcão e eu faço o mesmo,


assistindo ele abrir um pacote de torradas e passar requeijão sobre elas.

O silêncio prevalece e eu fico quieta na minha, esperando que ele termine de comer para
me levar embora. Sinto os olhos de seu pai sobre mim, como se estivesse me investigando com o
olhar e lutando dentro de si mesmo sobre certas questões.

– Como você está? – ele pergunta arrastando os meus olhos e os de Oliver para cima dele.
– Com o acontecimento da noite passada.

Sua pergunta lembra-me um pouco do que aconteceu e eu engulo em seco, espantando as


imagens e tudo o que senti naquele momento. Nem era tão importante assim no final das contas.
Nada aconteceu e eu estou bem. Isso que importava.
– Estou ótima. – com sinceridade, respondo.

– Isso é algo bom. – ele diz se levantando. – Se me der licença, preciso resolver certas
coisas. Foi um prazer conhecer você, Flora. Espero vê-la em breve.

– Igualmente. – sorrio.

Assim que ele sai, olho para Oliver que engole sua terceira torrada. Ele toma um longo
gole de seu café e pega mais uma, passando o requeijão por cima e com uma mordida come
quase tudo. Com uma segunda mordida, ele se levanta guardando as coisas de seu café da
manhã.

– Vamos? – pergunta em pé em minha frente e eu levanto, sentindo–me mais baixa do


que sou ao seu lado.

– Quanto você tem de altura? – sem pensar, já me escuto perguntar.

Ele ri e pega as chaves de seu carro, andando lentamente até sua porta e a destrancando.

– 1,92 cm. – vendo minha surpresa, ele acrescenta. –Todos da família de meu pai têm por
volta disso.

– Nem sabia que existia a possibilidade de crescer tanto.

Escuto-o ri ao meu lado e o sigo para o lado de fora, ficando mais surpresa do que já
estive em muito tempo quando constato que este é o bairro ao qual cresci e certamente, este é o
vizinho misterioso que mamãe estava falando ontem de manhã.

– Acho que você não precisa me levar para casa. – corto o que diabos que ele esteja
falando.

– Hm... Por quê?

– Porque eu moro na casa ao lado da sua.


OLIVER

Encaro a garota em minha frente com surpresa. A novidade estranhamente me agrada e


me deixa espantado com a coincidência que nos atingiu. Eu fui de um desconhecido ao qual ela
era grata, há um vizinho que a salvou e que com a convivência, mostraria ser o contrário de um
cavaleiro reluzente.

– Acho que esse foi o encontro mais estranho entre vizinhos existido. – ela diz quando
percebe que não tenho nada a dizer. – Mesmo assim, sou grata por ter aparecido e me tirado
daquela enrascada. Não sei o que teria sido de mim se você não tivesse aparecido.

Mas eu sei o que teria sido dela e não seria nada agradável. Só de pensar em seu rosto
bonito completamente pálido e coberto por sangue com os seus olhos castanhos bonitos
arregalados e sem vida, sinto o sangue correr mais rápido por minhas veias e minhas mãos se
apertarem ao meu lado com irritação pela situação nada agradável que criei em minha mente.

E que por sorte, só estava em meus pensamentos.

– O pior teria acontecido. – minha voz soa rude até mesmo para os meus ouvidos. – Mas
não há com o que se preocupar. Nada daquilo irá acontecer com você novamente! E não precisa
me agradecer. Não costumo fazer muitas coisas certas, mas fiz o certo e não me arrependo disso.

Ela me encara pensativa e balança sua cabeça em concordância.

– Obrigada mesmo assim, Oliver. – Ela agradece com sinceridade. – E me desculpe por
ser uma vaca está manhã. Realmente não costumo agir daquela forma com as pessoas.

Encaro–a sorrindo enquanto concordo, estranhando a forma como meu corpo se sente
assistindo seu sorriso leve de dentes brancos e a covinha marcante em seu queixo, deixando–a
mais meiga do que já é.
– Acredito em você.

Ela fica em silêncio, envergonhada e sem saber ao certo o que dizer.

– Você sabe onde fica minha casa. – se virando ela aponta com a cabeça. – Sou sua
vizinha agora, então se precisar de algo já sabe onde me procurar. Foi um prazer conhecer você e
seu pai, espero vê-los em breve. Minha mãe deve estar enlouquecendo com o meu sumiço.

– Promessa anotada. – aviso. – Espero que não seja do tipo que descumpre com sua
palavra, porque certamente eu não sou. Agora vá para casa, anjo. Não queremos que sua mãe
mate você.

– Engraçadinho.

Ela diz se virando e indo embora, deixando–me com uma emoção letárgica dentro de
meu peito. Vejo seu rabo de cavalo balançar de um lado para o outro a cada passo que ela dá em
direção a sua casa e só entro para minha casa quando a vejo acenar para mim com um leve
sorriso, fazendo–me retornar no mesmo segundo.

Bato á porta no mesmo momento que meu velho desce as escadas com o seu celular no
ouvido e um papel e uma caneta em mãos.

– Tudo certo para essa noite? – pergunto fazendo- o me encarar.

– Sim. – responde com um sorriso gigante e olhos brilhantes. Só a promessa do dinheiro


em nossas mãos para fazer o velho agir como uma criança. – Se prepare, se tudo der certo você
conseguirá uma tremenda bolada está noite e ainda entrará com tudo nas listas dos principais
organizadores da Califórnia.

– Não se preocupe Otto. – aviso. – Quando entro em uma corrida só há uma opção para
sair dela e está é aquela que enche nossos bolsos de dinheiro.

– Isso é o que eu gosto de escutar.

Desvio de seu alcance e subo as escadas, ignorando o que ele diz. Meu pai era inteligente
e possuía uma cede eminente por dinheiro e o que ele não conseguia entender, era que eu
também sofria desse mal. E ser um dos principais campeãs dessas ruas, era uma coisa que eu
queria mais do que deixava transparecer e tudo o que eu queria, eu corria atrás até conseguir.

Exatamente tudo.

FLORA

Bato á porta e encosto-me a ela, sentindo um sorriso estúpido em meus lábios. Meus
pensamentos vão e voltam para a coincidência que aconteceu comigo e a loucura disso tudo me
atinge. Entretanto, o mundo real chama e com ele, vem á tona os berros sem sentido de minha
mãe.

– A margarida resolveu aparecer. – ela afirma cruzando os braços sobre seus seios. –
Lembrou que tem casa, né garota. Depois de quase matar sua mãe do coração e fazer á vontade
de seu pai de visitar casa por casa de todas as suas amigas, quase se torna realidade.

Meu sonho evapora de meu corpo e a encaro com pavor visível. E o pior não é nem pelo
modo como ela está falando, mas sim pela menção de meu pai sem dizer nada ofensivo na
mesma frase. Desgrudo da porta e a encaro tentando entender o que ela acabou de dizer, pois
parece surreal para mim, mas surreal do que o quase estupro e o encontro com o meu novo
vizinho quente.

– Você e papai conversaram sem brigar?

– Fica á noite toda fora e em meio a um esporo é isso que te surpreende? – questiona com
raiva.

Respiro fundo e caminho até as escadas, parando em um degrau e encarando-a.

– Fui para casa da Jesy. Estava precisando de um tempo sem ter suas vozes brigando
como trilha sonora. – minto ao invés de contar á verdade. Certamente já me humilhei o suficiente
hoje de manhã para deixar minhas fraquezas visíveis. – Espero que compreenda, mas se não o
fizer, não me importarei.

O rosto de minha mãe se torna tão vermelho que acho ser impossível de ser real. Engulo
em seco e com um frio subindo na boca de meu estômago, subo todos os degraus correndo com
medo do que ela seria capaz de fazer naquele estado. Conforme fui crescendo, nunca fui uma
garota que respondia seus pais, mentia ou criava brigas, pelo contrário, sempre fui aquela que
separava todos e implorava por paz, então é surpreendente para eu ter conseguido fazer tudo isso
com ela.

– Flora Marie Collins. – Ela esbraveja subindo atrás de mim. –Quem pensa que é para
falar assim comigo?

– Uma filha que está cheia de viver em meio ao inferno.

Assim que as palavras saem por minha garganta, seus passos congelam e eu continuo
andando, fechando minha porta com chave enquanto escuto minha mãe chorar e colocar a culpa
do meu comportamento em meu pai. Respiro fundo e vou direto para o meu guarda–roupa,
pegando uma roupa confortável e indo direto para o meu banheiro, tomar um banho e tirar de
cima de mim tudo aquilo que parecia está entranhado em minha pele.

Meu banho é longo e completo e eu aprecio cada segundo, aproveitando para hidratar
meu cabelo e depilar todas as minhas áreas com pelos crescentes e sinto meus dedos como
ameixas quando saiu. Após me secar, tenho um cuidado excessivo em cada centímetro de minha
pele, passando o hidratante e óleo e visto a roupa que separei antes de entrar no chuveiro. Uma
blusa do meu antigo namorado que parecia um vestido em meu corpo.

Tiro minha toalha do cabelo e o penteio, deixando secar naturalmente já ciente que teria
que escova-lo mesmo contra minha vontade e acabo deixando isso para depois quando vejo que
já passa de uma da tarde.

Abro minha porta e fico parada no corredor, tentando escutar algum barulho, mas só
escuto o silêncio e constato que pela hora e o silêncio ao redor, ela já tenha ido para alguma
reunião em sua igreja. Desço as escadas indo direto para a cozinha, procurando por comida e ao
não achar nada, resolvo improvisar em um macarrão à bolonhesa, receita exclusiva de minha vó.

Como gostando do resultado, junto com um suco de laranja que estava pronto na
geladeira. Lavo a louça que sujei e tampo o restante, deixando que esfrie para que guarde na
geladeira, para que assim que meus pais chegassem, esquentassem e comessem.

Subo direto para escovar os dentes e pego o celular, deitando na cama e resolvendo ligar
para Jesy quando vejo que ela me ligou dez vezes de ontem para hoje. Coloco no viva voz e
espero que ela atenda, algo que não demora muito a acontecer.
– Agora você lembra que eu existo. – Ela resmunga assim que atende. – Depois de ter te
ligado umas duzentas vezes seguidas você retorna. Horas depois. Se fosse algo que eu precisasse
para viver, morreria na hora.

– Não seja dramática, Jesy – corto o barato dela. – Não uso muito meu celular, você sabe
e mesmo se usasse, não atendi antes porque não tive oportunidade. Se você não percebeu ainda,
faço certas coisas ao longo do meu dia e não fico em casa o tempo todo.

– Corte o papo vadia. E me deixe te contar o que estou querendo falar desde ontem á
noite. Creio que você irá gosta, pois eu gostei bastante e se não o fizer, vai ser uma boa amiga e
fingir, como eu faço quase toda semana nas corridas que te acompanho.

– Quê? Eu pensei que você gostasse! Não acredito que mentiu para mim! – finjo que
estou com raiva pela verdade que já sei há algum tempo e a escuto bufar.

– Já mandei o papo. – Ela não cai e revela. – Adivinha quem conseguiu convencer certa
pessoa a nós levar junto com ele para uma das festinhas?

– Serio que ele deixou? – pergunto resmungando.

Seu tio Tito não era alguém fácil de convencer e agia de forma duvidosa em certas
ocasiões. Era de fato meio estranho e já o peguei olhando para mim diversas vezes. Logicamente
não comentei isso com ninguém, Jesy era inteligente o suficiente para perceber e nunca me
deixava sozinha com ele. Então eu apenas fingia que não percebia, assim como ela.

– Sim. – Ela confirma como se eu estivesse falando algo ridículo. – Nem precisei insistir
muito para isso, na verdade. Acho que ele e papai estão meio brigados e ele está usando isso para
se vingar. Enfim, a ideia parece totalmente ridícula e infantil, mas estaria mentido se dissesse que
não estou animada para hoje á noite.

– Não me espantaria se fosse isso mesmo que ele está fazendo. Entretanto, estou meio
para baixo e preciso tomar uma bebida para esquecer certas coisas. Só irei fazer uma escova em
meus cabelos e já estou indo para aí.

– Venha para cá agora, eu faço seu cabelo com muito gosto. Separe algo legal que te
deixe gata e seja confortável. Nós mulheres já sofremos demais para aturar roupas sufocantes.

– Certo. – confirmo me segurando para não rir. Jesy era incrível e totalmente o oposto do
que a pintavam por aí. – Não demorarei a chegar aí. Espero que esteja com os ouvidos dispostos
a ouvir muito, porque hoje eu estou precisando desabafar.

– Igualmente para você, irmãzinha.

– Acredite, o meu vence desta vez.

– Se você diz. – em meio aos risos, ela se despede. – Até daqui a pouco, querida.

– Até.

Assim que a ligação é finalizada, coloco meu celular para carregar e vou direto para o
meu closet, levando um tempo até separar minhas roupas e todo o necessário para me arrumar.
Após está com tudo separado, envio uma mensagem para minha mãe e pai, avisando que iria
dormir na casa de Jesy e saiu de casa em seguida.
Como pensei, o lugar ao qual a grande festa acontecia era nada além de um amontoado de
pessoas um pouco suspeitas. Estava longe com as janelas do carro fechadas, mas ainda sim
escutava as fortes batidas e a risada juvenil dos jovens presentes e alcoolizados. Homens bem
vestidos estavam encostados em carros extravagantes ostentando roupas de marca e relógios
caros, estes estavam cercados de garotas com roupas curtas, mesmo não sendo tão atraentes ou
ao menos medianos.

O dinheiro fazia milagres.

Conforme o nosso carro passava ao lado dessas pessoas, comecei a sentir uma vontade
súbita de voltar para casa. Poderia apostar que boa noite cinderelas aconteceria com algumas
garotas presentes e eu não gostaria de ser uma dessas vitimas.

Tito olhava tudo com orgulho, pela obra de arte que ele ajudou a organizar e Jesy
encarava tudo de forma abobada, feliz pelo tio ter trago ela na grande festa que seria um dos
assuntos em destaque durante semanas. Ela nunca havia vindo e todos os jovens desta cidade
frequentavam isso aqui com entusiasmo, falando sobre como foi bom durante semanas e
semanas, e nos estávamos aqui, em meio às drogas e bebidas.

Eu não era santa e como qualquer garota da minha idade já havia bebido algumas vezes e
até mesmo experimentado um baseado. Amava certas festas e tinha certeza de que se não tivesse
visto no noticiário várias notícias ruins envolvendo esse tipo de coisa, iria me divertir só de ver
todos ao redor.

–Chegamos meninas. – Tito informa quando estaciona o carro em meio a um amontoado


de carros extravagantes. – Espero que curtam velocidade, porque hoje isso aqui vai tremer.
– Estamos em um racha? – Jesy e eu perguntamos, ela animadamente e eu com
incredibilidade.

– Sim, meninas. – afirma orgulhoso. – Um grande mestre das corridas se mudou


recentemente e fará sua estreia essa noite. Ele é conhecido no submundo como o rei das pistas
clandestinas e suas corridas nunca dão prejuízo aos organizadores, mas sim muito dinheiro.

Seus olhos brilham como estrelas e suas palavras saem com orgulho, encarando–me
como se eu fosse me interessar por isso. Do mesmo modo que fez quando quase esfregou o seu
relógio caro em meu rosto e não deixou de mostrar durante o caminho como o seu carro zerado
era veloz.

Ele sempre fazia isso quando estava perto de nos duas e eu gostaria muito que isso fosse
apenas um divertimento a parte para sua sobrinha, mas eu via em seus olhos as promessas que
ele fazia enquanto se amostrava para mim nada sutilmente. Ele pensava que eu era como as tolas
que o cercavam, caindo com tudo pelo dinheiro, mas eu estava longe disso e nada disso enchia os
meus olhos.

– E eu aposto que você foi um dos muitos que colocaram uma grande quantidade em
aposta. – Jesy afirma. – Pois isso logicamente acontece aqui, não?

– Sim, minha sobrinha. – afirma encarando-a pelo retrovisor. – Isso é uma das partes
mais importantes destes eventos e uma das coisas enchem meu bolso de dinheiro cada vez mais.
Fontes dizem que o garoto ama adrenalina e tem sede pela vitória, então eu sem dúvidas já tenho
um bom dinheiro para gastar.

– Que bom, titio. Espero que não se esqueça desta sua sobrinha aqui. – meigamente
apontou para si.

– Não há como o fazer, não é mesmo. – afirma brincalhão e depois manda. – As duas
podem sair agora e lembre–se, não aceitem bebidas de ninguém. Vocês não precisam pagar por
elas, eu mesmo falarei com um amigo para colocar as duas na área vip.

Minha melhor amiga vibra e eu apenas sorrio sem graça quando ele olha para mim,
saindo segundos depois junto com Jesy. Assim que descemos, o ar refrescante da noite nos
cumprimenta, batendo em meus braços desnudos. Tito aciona o alarme de seu carro e sem tocar
uma palavra sequer andamos até nos infiltrar na multidão enlouquecida de jovens, seguindo-o até
ele nos coloca em sua frente e Jesy ficar atrás de mim, diminuindo todas as chances possíveis
dele tocar em mim enquanto ele nos leva para um grupo de homens que conversam com
entusiasmo.

– Rapazes. – Ele os chama e questiona. – Nenhum problema até agora?

– Não. – um loiro afirma olhando para Jesy e eu. – Até o momento está tudo em perfeita
ordem, mas e estás moças? Não vai apresentar para os amigos?

– Não. – ele diz cortante. – Elas não são para os bicos de vocês.

Assim que as palavras saem, um deles comenta algo que não consigo escutar e começam
a gargalhar. Encaro Jesy e a vejo secar o loiro, quase o comendo com os olhos e cutuco suas
costelas chamando sua atenção para sairmos daqui de uma vez. Ela me encara rapidamente e
avisa ao tio em seguida.

– Tito, nós iremos andar por aí.

– Tenha juízo. – Ele diz apenas, encarando-me de uma forma ameaçadora e assim que
nós nos viramos para sair, ele ameaça– Cuidado com quem tocam em vocês, não queremos criar
uma cena, não é mesmo?

Sendo sua pergunta retorica, Jesy apenas revira os olhos e o pede para relaxar, dando
tchau para todos ao redor e me puxando para longe em seguida. Um calafrio de medo passa pelo
meu corpo e sinto que preciso me afastar deste homem o mais rápido possível. O olhar que ele
me lançou segundos atrás, é de posse, como se eu fosse sua. E se ele estava me olhando daquela
forma, não demorará nada até que ele consiga o que quer e ele certamente não á daqueles que
pedem permissão.

Repulsa me bate, mas não deixo isso transparecer e mudo o caminho indo até as bebidas,
mas Jesy me para rapidamente.

– Sua louca para que lugar está indo?

– Pegar uma bebida e você?


Encarando-me de cima abaixo ela desvia o olhar para o lado, fazendo–me ter a mesma
reação e ver o loiro que estava conversando com o seu tio segundos atrás e eu olho para ela
mostrando desagrado, fazendo-a revirar os olhos.

– Pegue sua bebida e se divirta, porque eu farei o mesmo.

Sem esperar que eu diga algo, ela se vira e me deixa sozinha caminhando decidida até o
loiro problemático. Resolvo deixar isso para lá e vou até o local das bebidas e entro na fila, para
pegar uma bebida lacrada. Nem louca estaria aceitando uma aberta, não quando as pessoas ao
redor gritavam confusão.

Viro–me para olhar para o lado e percebo que a fila acabou tendo só um homem de
jaqueta de couro e calças jeans escuras pegando sua bebida. Aproximo–me para pegar algo para
beber quando ele se levanta e quando consigo enfim pegar minha latinha, ela quase cai da minha
mão.

Olhos verdes confusos e irritados me encaram com descrença e um perfume único entra
em meu olfato.

Oliver.

Encaro os seus olhos e recuo quando se torna de mais, pegando minha latinha e me
erguendo. Ajeito minha postura e ele faz o mesmo, encarando–me de cima abaixo e chegando
perto de mim questiona de forma ameaçadora:

– O que você está fazendo aqui?

OLIVER

Quando estava quase me sufocado por toda atenção que os organizadores estavam
colocando em cima de mim, sai em busca de ar e nunca pensei que ao fazer isso poderia ver
Flora, minha vizinha e a primeira mulher que só dormiu na minha cama por aqui.
Este lugar não era para garotas dóceis como ela. O seu lugar não era aqui, cercado de
tubarões loucos para ter essa doçura até destruir tudo e transformar em fodidos espinhos e a
dispensar, orgulhosos de seu trabalho. Respiro fundo e olho para ela, não gostando nada do
caminho que meus pensamentos estão trilhando.

Mas quando a encaro só posso ver seu corpo perfeito moldado por um vestido vinho de
gola alta, que realça seus seios e sua cintura fina. O vestido era solto de sua cintura para baixo e
terminava no meio de suas coxas, deixando todo o resto amostra para imaginação e suas pernas
incríveis com um salto simples pretos que não ajudam a diminuir em nada os pensamentos
pecaminosos, que não só eu, mas muitos outros homens teriam, porque Flora era deslumbrante
de mais para passar despercebida.

– O que eu estou fazendo aqui? – Ela questiona me tirando de meus pensamentos. –Bem,
eu acho que isso não é da sua conta.

Sua resposta mal humorada me faz rir.

– Bem, sendo aquele que te tirou de uma enrascada noite passada, eu acho que você está
fodidamente equivocada. – Ela fica desconfortável, como se não quisesse acreditar em minhas
palavras. –Mas sério, o que você está fazendo aqui?

Respirando fundo, parecendo buscar paciência, ela me encara.

– O que fazemos neste tipo de lugar?

– A maioria das garotas, que estão longe de ser como você, está aqui para procurar sexo
com estranhos e tentar os segurar com isso e o resto querem somente se entorpecer e ver uma
corrida. Talvez agindo por rebeldia para chamar atenção dos pais, sem se importar com as
consequências de confiar em estranhos. – resumo. – E você certamente não se encaixa em
nenhuma dessas opções.

– Você não me conhece. – Ela afirma emburrada. – Talvez eu seja exatamente como o
resto.

– Não, porra. – nego me aproximando dela. – Você é totalmente o oposto disso tudo.

Ela engole em seco e olha dentro dos meus olhos, dando passos para trás e esbarrando em
pessoas que a xingam em resposta, fazendo sua boca se abrir em indignação, provando-me que
ela realmente não é uma garota dos rachas. Engulo uma risada e olho para trás, vendo várias
pessoas com tédio querendo pegar bebidas. Agarro sua mão e a arrasto comigo sem que ela possa
protestar, ainda insultada pelos palavrões que foi xingada.

Poucos minutos depois e algumas pessoas querendo a todo custo falar comigo, consigo
guiar ela até uma as tendas fechadas ao qual meu pessoal está e ela entra contrariada, querendo
muito dar uma volta e fugir para longe de mim.

– Olha só, você não pode... – Ela começa a dizer puta da vida, sem olha ao redor e
perceber as pessoas atrás dela. Entretanto, isso muda quando meu pai a interrompe.

– Precisava demorar tanto garoto? – seu tom irritado se transforma em doce quando ele
encara a garota ao meu lado, fazendo-me bufar. – Olá, Flora.

A figura raivosa e bonita muda drasticamente para envergonhada, percebendo todos ao


seu redor que a encaravam com curiosidade e divertimento.

– Sr. Bennett. –ela acena. – Não sabia que estava aqui.

– Digo o mesmo sobre você, menina. – meu pai afirma e olha para mim. – Espero que
esteja preparado, pois já vieram procurar você para colocar você em seu lugar.

Encaro o meu pai e afirmo.

–Relaxa velho. Eu nasci pronto!

Sua mão bate em meu ombro e ele aperta firmemente, olhando seriamente para mim.

– Sem brincadeiras. De o seu melhor e lembre–se que naquela pista quem vence é o
predador. Não seja a caça.

Eu sabia do que ele estava falando e conhecia isso melhor do que ninguém e acho que
nunca esqueceria. O mundo era dos predadores e de forma alguma estaria abaixando minha
cabeça, para qualquer um que fosse.
– Não precisa me dizer isso. – digo sem brincadeiras. – Sei disso melhor do que ninguém.

– Eu sei, te eduquei bem. Entretanto, é sempre bom te lembrar.

Aceno olhando para meu irmão e depois meu tio paterno e seus dois filhos. Eles acenam
em minha direção em boa sorte e voltam a conversar, ignorando totalmente a presença de Flora
ou nossa conversa.

– É... Sobre o que vocês estão falando? – Ela pergunta confusa.

– Vou ganhar essa corrida. – digo apenas e ela arregala os olhos. – E você vai ficar aqui,
com o meu pai, pois isso me evitará preocupações desnecessárias e tirará o seu pescoço da
confusão que vai se tornar lá embaixo.

Sua boca se abre, mas meu pai segura seu ombro.

– Ele tem razão, Flora. – me olha de relance. – Fique com a gente. O Local que veremos
é mil vezes menos perigoso do que tudo lá embaixo.

As palavras do meu pai a fazem acenar em concordância e eu fico calmo, tendo a atenção
do meu irmão de longe e um olhar confuso do meu pai, que logo passa quando ajeito minha
postura e coloco minha mão na cabeça, em sentido como um soltado. Todos se levantam e fazem
o mesmo.

– Que o nome Bennett seja honrado. – dissemos em uníssono. – E que essa seja mais uma
corrida de sucesso.

Abaixamos nossas mãos e eu saiu sem dizer nada, preservando o ritual de sempre. O
responsável por me guiar até o meu carro chega segundos depois e sem palavras apertamos
nossas mãos e caminhamos até o meu grande companheiro.

Meu carro.
FLORA

Encaro suas costas em silêncio, sentindo um furacão passar em minha mente. Oliver
Bennett era um corredor ilegal! Não o conhecia o suficiente e senti revolta quando ele me trouxe
até aqui como se mandasse em minha vida, mas o fato de descobrir o que ele faz me deixa com
os nervos a flor da pele.

Só é necessário um segundo de distração para tudo terminar.

Engulo em seco com esse pensamento. Não o conheço, mas o que ele fez por mim noite
passada foi mais do que muitos que conheço há anos fizeram e tudo o que menos quero nessa
vida é que sua vida acabe tão precocemente.

– Você está bem, querida? – o pai de Oliver pergunta me tirando dos meus pensamentos.

– Sim. – afirmo e olho para ele, percebendo agora que estava encarando o pano branco
em minha frente. – Está tudo ótimo.

– Não vai nos apresentar a moça? – uma voz perguntou ao fundo, fazendo-me olhar para
trás e sentir o meu rosto queimar de vergonha por ver quatro homens encarando nos dois. O que
falou era um de certa idade, mais velho um pouco do que o pai de Oliver e compartilhando os
traços e ele olhar brilhante de esmeraldas. Ele era tão alto como o possível irmão e aparentava
ser mais retraído. – Estou esperando, Otto.

– Flora, este é o meu irmão mais velho, Owen. – ele nos apresenta com tedio. – Owen,
está é Flora, minha vizinha.

Agarrando minha mão ele diz ao mesmo tempo em que outra voz diz:

– É um prazer conhecer alguém tão bonito.


– Vizinha?

– Sim, meu filho. É aquela que te falei. – Otto diz, encarando um homem mais novo
muito parecido com ele.

– Aquela que estava lá em casa essa manhã?

– Sim.

Sinto–me corar mais ainda e espero que isso não fique tão visível. O homem entra em
minha visão e é tão parecido com Oliver como nunca poderia imaginar. Um pouco mais baixo e
mais forte do que o irmão, mas tirando isso, ele pode ser confundido com o irmão de longe.

– Sou Olavo. – ele diz apenas, me olhando dos pés a cabeça. – Irmão caçula do seu...
Amigo.

– Bem, aqueles dois ali atrás são meus filhos. – Owen diz ignorando o sobrinho. – Oziel e
Oséias.

Eles me encaram e vejo os mesmo olhos e possivelmente a mesma altura. Cabelos loiros
escuros tiravam um pouco da aparência quase idêntica do resto dos homens. Além de
obviamente todos dividirem a primeira letra do nome, eles dividiam a mesma genética
abençoada.

Entretanto, ao contrário do resto, os dois eram gêmeos mesmo.

– Olá. – digo e afirmo. – Vocês são muito parecidos.

– É o que dizem. – dizem ao mesmo tempo.

–Acabaram de me falar que em menos de dois minutos darão a partida. – um dos gêmeos
diz quebrando o silêncio. – Vamos para nossos lugares ou ficaremos aqui esperando pela vitória
de Oliver?

– Vamos para nossos lugares. – o pai de Oliver diz como se fosse loucura recusar ver seu
filho correr.

E meu coração se aperta em nervosismo.

Todos olham ao redor e pegam o celular, saindo tão rapidamente como possível e eu luto
com os meus pés, sendo guiada até a saída pela mão de Otto em minhas costas. Eu não queria ver
isso antes e agora que sei quem está atrás de um dos volantes, quero menos ainda.

Se arrependimento matasse, eu cairia morta agora mesmo nesse chão. Por que não fiquei
em minha casa? Aposto que papai compraria pizza essa noite e que passaríamos a noite
assistindo filmes de terror. Era uma das nossas coisas favoritas de fazer juntos e sempre o
fazíamos quando não tínhamos nada para fazer.

Jogo esses pensamentos para o lado e ando até o meio de todos, até que ficamos em uma
parte diferente do resto do pessoal.

Essa deve ser a área vip.

Paramos em frente a uma grade, perto de cinco carros potentes e bonitos e possivelmente
muito caros. Eu poderia não saber a marca ou até mesmo quantos quilômetros eles rodavam, mas
sabia apreciar algo bonito quando via e não posso negar que me surpreendeu.

Duas garotas bonitas, vestidas com roupas nenhum pouco comportadas param cada uma
de um lado dos últimos carros enquanto um narrador anuncia algumas palavras tão rapidamente
que eu sequer poderia entender, deu o que parecia ser a partida, elas abaixaram suas mãos e os
carros ganharam vida no asfalto, fazendo seus cabelos voarem e todos nós comermos poeira.

O pessoal ao redor começou a correr, tentando ver se conseguia alcançar o suficiente para
ver os carros em ação, algo muito imprestável de se fazer, pois como eles pensavam que
conseguiriam alcançar maquinas tão velozes?

– A corrida acaba entre cinco a dez minutos. – o pai de Oliver diz. – Isso tudo vai
depender de como são as pistas do percurso. Pelo que vimos por alto não é tanta coisa, mas ainda
não temos uma noção se terá armadilhas no meio do caminho.

– Armadilhas?
– Sim, para dificultar a vida dos corredores. – ele afirma e completa. – Não precisa se
preocupar, eles não são loucos de colocar a vida dos corredores em jogo e Oliver sabe o que faz.
Acredite ou não, mas o garoto ama uma adrenalina e quando mais difícil é, mas orgulhoso ele se
sente.

Orgulho esse que pode levar ele para debaixo da terra.

– Só resta esperar então.

Assim que termino de dizer, ele vira para Owen e assistem todo o percurso que eles
fazem por um tablet. Pelos sorrisos e os elogios, certamente tudo deve está saindo como o
planejado e é o que me apego, doida para que tudo acabe de uma vez.

Conforme os minutos passam eles xingam quando ficam nervosos com algo ou quando
estão orgulhosos e em tudo isso eles me chamam para ver e eu sempre recuso, sentindo o meu
pulso bater cada vez mais rápido só por suas reações e aumentar quase cada segundo, parecendo
que vai explodir quando eles começam a berrar.

– Vai, vai, vai.

E então, eles gritam.

–O filho da puta ganhou!!!

E eu não posso evitar respirar com alívio.

Oliver estava bem!


OLIVER

– E lá vem o grande vencedor!!!

Uma voz berrou no meio da multidão e todos se viraram em minha direção com
empolgação. Paro o carro e sorrio orgulhoso de mim mesmo. Eu consegui! Dirigir era uma das
coisas que mais amava e sendo um filho da puta orgulhoso e competitivo, não poderia negar o
quanto amava o crescimento de minha moral a cada corrida ganha. Eu era bom no que fazia!

Olho para o lado e sorrio ao ver o carro que quase me ganhou. Ele parece sentir o meu
olhar sarcástico e me encara com ódio mortal, mostrando–me todo o seu desprezo por ter
perdido. Se eu fosse uma barata, ele me esmagaria com seu sapato, mas eu não era isso, não, eu
era seu novo inimigo declarado, aquele que lhe tirou o título de campeão.

Seu carro acelera e eu olho para frente, saindo do carro com a adrenalina ainda fruindo
livremente em minha corrente sanguínea. Umas dez garotas me cercam, mas finjo que elas não
existem e vou em direção ao meu pai, que conversa com alguns organizadores das corridas e até
mesmo um dos sócios.

Ele estava criando sua teia.

Meu primo Oziel vem em minha direção, batendo três tapas fortes no meu ombro e me
guiando para o meio daquilo tudo com um grande sorriso no rosto, fazendo os homens olharem
em minha direção e vir me parabenizar.
– E aqui está o grande homem. – um homem de cabelos raspados falou vindo em minha
direção. – Parabéns, Oliver. Você merece o grande título que tem.

Aperto sua mão que é estendida em minha direção e escuto com atenção um loiro dizer:

– Com certeza. – concordou – Em meus trinta e dois anos nunca presenciei nada parecido
com isso. Você tem futuro garoto e não só nestas pistas, mas sim naquelas profissionais. Com
um pouco de investimento, você irá voar. Terá de fato um futuro grandioso.

Suas palavras fazem meu pai olhar orgulhoso e um pouco temeroso em minha direção. E
eu engulo o mal estar que quer me bater ao escutar essas palavras. Futuro. Uma palavra tão
simples, mas ao mesmo tempo tão pesada, que me deixa incerto sobretudo.

Dou de ombros e jogo esses pensamentos para trás.

– Estou feliz no lugar que estou. Dirigir é o que gosto de fazer, mas não é o meu desejo
ser profissional.

– Corte a merda, cara. – o de cabelos raspado diz. – Não acredito que você vai ser tolo a
esse ponto.

Meu sangue esquenta e sinto uma vontade súbita de pular no pescoço do homem. É um
inconveniente de primeira, posso dizer ao olhar para o seu rosto. Tudo o que ele vê ao olhar para
mim são cifrões e o mesmo acontece com o seu amigo. Não preciso perguntar para saber qual é o
tipo de investimento e quem o fará.

– Meu irmão é um filho da mãe. – meu irmão Olavo interrompe. – Um filho da mãe
carreta e de bem com a vida que leva.

–Bobagem...

– E não nego. – meu irmão bufa. – Agora se nos dão licença, gostaria de falar com o meu
irmão em particular.
– Tudo bem. – e afirma. – Mas essa conversa não terminou. Vejo um futuro para você
garoto e não vou deixar você estragar ele assim. Entretanto, hoje é dia de festa e comemoração.
Pronto para beber todas e brincar com certas gatinhas?

– Do jeito que ele aparenta ser, Tito. – o loiro diz olhando para o amigo com deboche–
Ele certamente está.

– Erro grave. – interrompo. – Tudo o que desejo nesse momento é dormir. Fazer isso só
tinha graça no começo, agora é tão tedioso como passar uma noite de sexta em casa.

– A idade chegou cedo para você. – Tito diz e olha para o lado, fazendo–me olhar para
mesma direção e perceber que o olhar que ele enviava com tanto desejo e fome era em Flora.
Limpo minha garganta e ele volta sua atenção para mim. – Mas para mim não e nem vou
permitir que chegue! Tenha uma boa noite, Oliver e pense no que eu te disse.

Assim que termina de dizer, o seu amigo que não sei o nome aperta minha mão e
acompanha ele, que caminha na direção de Flora e outra garota muito bonita loira. Flora encara
Tito com apreensão e meu primeiro extinto é ir até lá.

Esse cara vai ser um problema na vida de Flora. Estou sentindo.

– Cara chato da porra. – Olavo diz olhando para ambos se afastando.

– Concordo. – bufo uma risada.

–Chato e um dos principais organizadores que nos dão oportunidade de ganhar dinheiro
fácil. – com seriamente meu pai afirma. – Então, se fosse vocês, calariam a boca e parariam de
cuspi no prato que comem.

– Você sabe muito bem o quanto eu quero que Oliver continue neste caminho, não sabe?
– pergunta desgostoso. –Que se foda esse cara, não me importo com nada disso mesmo.

– Mas o seu irmão se importa... – e ele interrompe.

– Lógico, é a única distração que ele tem de seus problemas e você sabe muito bem
disso...
– Estou fazendo o que posso. Não aja como se isso não me afetasse também.

Olho para ambos e reviro os olhos sabendo o que vem por aí. Era sempre a mesma merda
de assunto.

–Tão legal saber que vocês fingem que não estou do lado. – ironizo. – Agora se me dão
licença, vou ir embora.

– Oliver...

Ignoro o seu chamado e vou em direção de uma Flora desconfortável, que está a um bom
tempo tentando fingir seu desinteresse gritante por Tito. Tito por outro lado ignora isso e insiste
só se retirando para atender o celular e é algo que Flora aprecia. No mesmo segundo que chego
lá, sua amiga sai com o homem loiro, deixando-a sozinha.

–Agora você pode respirar novamente.

– Ficou tão obvio? – ela agarra meu antebraço com os olhos arregalados e eu dou de
ombros. – Que merda!

Sua mão voa para sua boca e eu tranco o maxilar tentando não rir, deixando-a
envergonhada.

– Isso foi um palavrão?

– Tecnicamente não.

– Foi sim, anjo. – afirmo.

– Que seja. – afirma fingindo não dar importância. – Eu preciso ir embora. Você tem
algum numero de taxi anotado?

Encaro-a e ergo uma sobrancelha. Por que diabos teria um número de táxi se sou novo
por aqui e tenho carro?

– É... Não. – e sorrio. – Mas pode agradecer a qualquer coisa que acredite. Eu estou indo
para casa neste exato segundo.

– Sério? Agora que a festa vai começar e você é o grande cara da noite. Se tiver se
retirando só porque eu quero ir embora, não há necessidade, eu me viro.

– Não, relaxa. Esse tipo de coisa só é bom quando se está no clima e hoje eu não estou
para isso. Você quer falar com sua amiga ou com outro alguém que já está indo?

Ela olha ao redor e nega com a cabeça.

– Não, minha amiga deve está ocupada.

– Então podemos ir.

Agarro sua mão quando ela dá de ombros e a puxo em direção ao meu carro. Algumas
pessoas ao redor fazem sinais maliciosos quando abro a porta para ela e ela entra. Circulo o carro
e entro, levando nós dois para longe.

FLORA

Assim que entramos no seu carro luxuoso e veloz, ele não demora em nada a nos tirar de
lá, acelerando o motor e fazendo o carro gritar até que todas as pessoas saíssem de nosso
caminho e olhassem admiradas em nossa direção. Seguro no encosto do banco enquanto Oliver
sair deixando um rastro de poeira e olho de relance para Oliver, que sorri orgulhoso.

– Você gosta disso. Não?


– Amo. – afirma sem desviar os olhos da rua. – Eu cresci em meio aos carros e motos.
Meu pai era mecânico e um admirador de corridas. Gastava o que não tinha nos bolsos para ver
elas e mesmo que isso não fosse o certo para um homem de família, meu irmão e eu possuímos o
mesmo vício. Sendo eu mais do que ele.

Sua explicação me surpreende, mas apesar de mostrar um lado totalmente obscuro de sua
infância, estranhamente me alegra saber mais sobre ele.

– Você teve uma boa infância?

– Se eu tive uma boa infância? – olhou de relance para mim e bufou uma risada. – Passei
longe disso. Os primeiros anos da minha vida eu morei em um lugar com paredes tão frágeis
como papelão. Senti fome e frio e mesmo que meu pai tenha tentado mudar nossa vida com suas
malandragens, até que ele pegasse a malícia de tudo isso, meu irmão e eu sofremos muito.

Ele dizia tudo com tanta naturalidade, como se não houvesse importância, que me deixou
um pouco chocada.

– E sua mãe? Não a vi quando dormi na sua casa.

– Eles se separam quando Olavo e eu éramos pequenos. Deixou–nos com nosso pai e foi
viver sua vida, sem nunca olhar para trás. – sem rancor ou sentimentalismo ele continuou. – E
não venha dizer que sente muito, pois se eu fosse ela também teria feito isso.

– Você tem contato com ela?

– Eu disse que a entendo não que havia perdoado ela pelo o que ela fez.

Engulo em seco e olho para ele, que aparenta está relaxado enquanto dirige, mas ao
mesmo tempo cansado como se houvesse corrido uma maratona. Estranho isso e olho para
frente, inquieta. Até que volto minha atenção para ele novamente e o questiono.

– Você diz isso para todo mundo que acabou de conhecer?

Olhando-me com divertimento, ele nega mostrando leves covinhas ao não conseguir
esconder o sorriso.
– Não. Só para as garotas que eu salvo do perigo.

– E você faz muito isso? Banca o herói para as donzelas?

– Não. – afirma de forma obvia. – Meus atos heroicos só acontecem uma vez por ano. É o
máximo que consigo fazer, para tentar uma chance no paraíso ou seja lá que diabos chamam isso.

Gargalho de suas expressões faceias e ele para por um segundo me encarando.

– Falando sério. – ele limpa a garganta. – Gosto de ser sincero com quem eu gosto e
percebi que meio que fui com o seu rosto de menininha. Por isso falei tudo para você, porque não
faz sentindo manter só para mim o que não tem importância alguma.

Por essa eu não esperava.

– Sem traumas quando criança? – levanto uma sobrancelha o questionando no mesmo


tom que o seu. – Você sabe, como marcas de cigarro e surras violentas?

Sua expressão divertida some e ele fica sério. Aparentando estar um pouco pensativo e eu
abro minha boca, sentindo-me envergonhada e preocupada de tê-lo ofendido de alguma maneira.

– Não sou o Christian Grey, Flora. Isso aqui não é ficção, mas sim a vida real e nela
coisas ferradas acontecem a todo o momento, umas mais ferradas que as outras em momentos
que não esperamos. Entretanto, nada como isso aconteceu comigo. – e completou como se fosse
obvio. –Meu pai é malandro, não covarde.

– Então você também é malandro?

Ele da de ombros sem olhar em minha direção, mas vi quando um sorriso queria soltar
para fora de seus lábios bonitos.

– Não sei. –nega com bom humor. – Isso só o tempo te mostrará.


Nego veemente e jogo minha cabeça para trás, gargalhando com vontade e ele revira os
olhos e age como se eu não estivesse rindo de sabe–se Deus o que, mas em menos de dez
minutos conversando, percebi que Oliver Bennett deveria ser estudado por certos médicos, pois
certamente, ele não era desse mundo.

Ninguém normal poderia ser considerado gostoso e engraçado só por respirar.

E me fazer tão confortável de uma forma tão simples.

O máximo de tempo que ficamos quietos dentro daquele carro foi exatos trinta segundos.
Oliver gosta de falar e implicar, de uma forma adorável e irritante. Não sabia se esse era o seu
jeito de ser naturalmente ou se ele tinha fumado algo, mas certamente isso não importava, não
quando eu nunca ri tanto em tão pouco tempo.

Cinco minutos de muitas brincadeiras depois, ele olhou para mim e perguntou:

– Qual é a melhor pizzaria daqui?

Minha barriga ronca e eu ignoro respondendo.

– Tem uma perto do nosso bairro que é muito boa. – e completo. – Só não sei se está
aberta.

– É fim de semana, anjo. – ele afirma. – E moramos na Califórnia, se não percebeu. É


logico que deve estar aberto.

– Nossa. Você parece morar aqui há mais tempo que eu. Por que perguntou, gênio?

Ele me imita e eu dou um tapa no seu braço, no automático e ao invés de parar de vez ou
ficar irritado, ele começa a rir de mim.
Deus, ele é irritante.

Automaticamente cruzo meus braços e olho para frente, ignorando sua existência e me
arrependendo de ter aceitado sua carona. Ao ver isso, ele bufa e revira os olhos, começando a
cantarolar uma música que toca no rádio, do One Direction e parar em frente à pizzaria que eu
falei, estando aberta e aparentemente cheia.

Ele me encara como se falasse eu não te disse e abre a porta do carro, saindo e abrindo
segundos depois a minha. Ele oferece sua mão e me olha com um rosto de cachorrinho que caiu
da mudança e eu apenas reviro os olhos, aceitando sua mão e gritando quando ele me puxa para
um abraço apertado.

Seu cheiro e o conforto dos seus braços me fazem derreter dentro deles e uma sensação
estranha se apoderar dentro de mim, criando uma eletricidade estranha e ao mesmo tempo
gostosa que me faz querer ficar ali para sempre, envolvendo–me em seu calor e fazendo–me
retribuir o abraço.

Ele não aparentava sentir a mesma coisa e quando menos esperei, ele quebrou o
momento.

– Para quem estava tão irritada comigo, você está apreciando demais o meu abraço. – seu
divertimento era obvio e eu tirei os meus braços dos seus ombros, sentindo–me envergonhada. –
Calma, anjo. Pode apreciar, é de graça e não arranca pedaço.

– Idiota. – o afasto. – Vamos comer que eu estou faminta.

Escuto–o bufar enquanto fecha á porta do carro e reclama andando atrás de mim, que já
estou perto da entrada.

– Quem disse que você vai comer comigo? – perguntou fazendo–me virar em sua direção
e arquear uma sobrancelha. – Talvez eu só tenha parado aqui para pegar um panfleto e comer
tudo isso na minha casa. – ressaltando em seguida. – Sozinho.

– Você não seria tão imprestável neste ponto, Oli. – afirmo como se ele fosse uma criança
e uma careta de desgosto invade seu rosto. – E não faça essa cara para o meu apelido, é adorável.

– É broxante. – ele nega me encarando e completa ao ver minha cara de deboche. – Você
não vai parar de dizer, então apenas, por favor, não me chame assim na frente de ninguém. Não
quero ser zoado.

Reviro os olhos e abro á porta da pizzaria, entrando com Oliver em minhas costas, que
me segue até a mesa que eu escolhi, só saindo de trás de mim para afastar uma cadeira para mim
sentar.

As mesas eram de madeira maciça sem toalhas e as cadeiras pretas e separadas,


espalhadas ao redor. Paredes em tons suaves de laranja com listras do mesmo tom forte,
deixando o ambiente engraçado. Nos cantos havia umas mesas e cadeiras diferentes, com
cadeiras estilo sofá laranja e mesas pretas com pequenos lustres em cima, sendo uma dessas a de
minha escolha.

Assim que paro de olhar ao redor, Oliver chama um garçom que não demora nada a vir
nos atender. Sendo um jovem na puberdade com cachinhos rebeldes e espinhas pelo seu rosto.
Vestia uma calça jeans e uma blusa preta simples com o logotipo da pizzaria em laranja, que era
cor que prevalecia no simples e espalhafatoso estabelecimento.

– Boa noite. – ele diz mostrando o seu aparelho azul. – Vocês já sabem o que vão pedir?

E após está pergunta nós pedimos uma pizza dividida com quatro dos nossos sabores
preferidos e uma pizza pequena de chocolate com confetes coloridos. Enquanto esperávamos
pelo pedido, perguntamos várias coisas um sobre o outro e tiramos muitas fotos, tantas que perdi
a conta. Oliver era tão diferente de tudo que conhecia, que nem vi a hora passar e o pedido
chegar.

Como imaginei a pizza ao qual devoramos estava maravilhosa, quer dizer, eu comi, pois
Oliver não parecia estar com muita fome e não conseguiu sequer comer um pedacinho de cada,
comendo apenas umas três pequenas fatias.

Assim que terminamos de comer, era três da madrugada e só estávamos indo embora
porque estava na hora da pizzaria fechar, se não, ficaríamos lá o tempo todo. Resolvemos pedir
para embalar os restos e quando estava em nossas mãos, fomos em direção ao carro em um
silêncio confortável. Oliver parecia estar prestes a desmaiar de sono e eu me ofereci para dirigir,
mas ele negou e com o coração na mão fomos para casa.

O caminho foi rápido e assim que paramos em frente a minha casa encaramos o nada
durante alguns segundos, tendo nós dois se virando no mesmo momento e olhando um para o
outro. Os seus olhos verdes cintilantes e quentes, me faziam sentir estranha e um pouco nervosa
e ao o ver desviando o olhar dos meus olhos para minha boca engulo em seco e percebo um
pedido secreto, que eu respondo com ações, chegando o meu rosto mais perto do seu. Ao sentir
sua respiração tão perto dos meus lábios eu fecho os olhos sentindo como se borboletas
invadissem meu estômago, me aproximando mais dele.

E quando quase posso sentir seus lábios tocando os meus, uma batida alta e forte soa no
meu lado do carro, quebrando o encanto e me fazendo pular de susto duplo ao ver quem se
tratava.

Minha mãe.
OLIVER

Assusto–me com uma pancada raivosa na janela do carro e abro os meus olhos,
encontrando uma mulher olhando com ódio para dentro do carro. Puxo Flora para mais perto de
mim, tentando afastar ela do perigo que possivelmente está louca representava.

O que diabos ela queria?

Ela bate novamente, espancando o meu vidro e eu tremo de nervoso pelo barulho
estridente. Flora olha para o lado de fora com pavor e eu resolvo agir, soltando-a e o meu cinto
de segurança. Tento abrir minha porta, mas no mesmo segundo a garota ao meu lado agarra
minha mão me impedindo.

– Não sai. – ela súplica.

– Eu preciso ver o que está acontecendo. – explico. – Não posso deixar essa louca tentar
fazer uma de suas loucuras para agir.

Ela abaixa os olhos, envergonhada e morde os lábios, encarando o chão.

– Ela não vai fazer nada. – afirma sussurrando.


– Por que afirma isso? Como pode ter tanta certeza? – ela engole em seco e tão
envergonhada como nunca vi antes, me encara pesarosa. – Você conhece essa mulher, Flora?

– É a minha mãe, Oliver.

Continuo encarando-a por alguns segundos, sem dizer nada e nem conseguir entender o
maldito motivo que faria uma mãe agir desta forma. Será que Flora é menor de idade e saiu sem
avisar? Estou próximo dos vinte e dois anos, se uma mãe raivosa quiser me denunciar por sair
com uma menor de idade, isso não será nada bonito. Estarei ferrado na certa.

– Quantos anos você tem, Flora?

– Dezenove. – ela sussurra no ápice do constrangimento.

Alívio me bate mesmo que eu não tenha feito nada demais com ela.

– Acho melhor você ir, sua mãe não parece está muito satisfeita e isso pode complicar
para o seu lado. – falo e vejo magoa em seu rosto. – A noite foi muito boa e me divertir como há
bastante tempo não fazia. Espero que outras como essa aconteçam muitas vezes, mas para isso
você precisa sair dessa e sua mãe não parece ser muito compreensiva.

Ela revira os olhos e encara o nada.

– Você tem razão. – e olha dentro dos meus olhos. – Até mais tarde vizinho.

Assim que as palavras saem por sua boca, ela beija minha bochecha e sorri timidamente,
tirando o cinto e abrindo á porta. A senhora que está no lado de fora, olha atentamente para
dentro do carro, encarando–me mortalmente e desviando o mesmo olhar para sua filha, quando
minha porta é fechada.

Continuo encarando ambas e vejo Flora andar apressadamente em direção a sua casa.
Desvio o olhar e manobro o meu carro, procurando o controle da garagem e abrindo–a para
guardar meu carro. Assim que termino, pego a caixa de pizza e fecho minha porta, sentindo toda
exaustão do dia e o enjoo voltar com tudo.

Sua presença me fez esquecer tudo isso.


Abro a porta da garagem e fecho a mesma subindo a pequena escada. Guardo a caixa
com os restos da pizza dentro da geladeira e pego uma garrafa de água gelada. A casa está escura
e silenciosa, mostrando–me que apesar de tudo meu pai e irmão ainda se divertiam como
antigamente.

Algo que eu fodidamente não podia fazer.

Não como antes.

Bebo um gole pequeno de água gelada e jogo os pensamentos estúpidos para o lado,
andando até o meu quarto no segundo andar. Um banho e uma noite de sono fariam tudo melhor,
ou bem, pelo menos aliviariam um pouco do mal estar.

FLORA

– Flora o seu despertador tocou três vezes. – minha mãe diz escancarando a porta do meu
quarto. – Você não vai conseguir me enrolar desta vez! Dormiu de madrugada porque quis!
Agora levante e vai se arrumar!

Com um bater forte de minha porta extremamente desnecessário, ela se cala descendo as
escadas. Viro de barriga para cima e me sento puxando o celular da mesinha de cabeceira e
querendo chorar automaticamente quando vejo a hora.

08:17 AM. De um domingo.

Coloco o celular para carregar e fecho os meus olhos por um segundo, respirando fundo.
Fico assim por algum tempo até criar coragem para me levantar e me arrumar, enquanto deixo
minha mente correr. Minha mãe, assim como minha avó fez com ela, me criou dentro da igreja,
incluindo–me em tudo o que estava disponível para estarmos juntos a grande família.

Ela sempre me incentivou a fazer tudo o que acontecia, fazendo–me feliz com o seu
contentamento ao me encontrar cada vez mais em conjunto com a igreja. Eu fazia parte do grupo
jovem e me tornei até uma das líderes do grupo jovem de nossa igreja. E apesar de amar e me
sentir animada sobre isso, comecei a me distanciar gradativamente no decorrer do tempo. Minha
mãe ficou furiosa com tudo isso, ela amava controle e dentro da igreja ela poderia manter seu
domínio sobre mim mais facilmente, o que mudou conforme eu me afastei.

Quando entrei em minha transição de descoberta na adolescência, se queria ou não ficar


lá e varias outras coisas em que passamos por essa fase, tive várias brigas com minha mãe e só
consegui aliviar isso com um combinado; ir para a igreja com ela todos os domingos.

Isso não era uma tortura, tão pouco algo que eu fazia por obrigação. Eu gostava de ir aos
cultos, mas estaria mentindo se dissesse que não preferia está dormindo.

Ontem a noite tinha tudo para ser perfeito, mas no ultimo segundo minha mãe estragou
tudo. Se vergonha e raiva pudessem matar, teria caído no chão no mesmo segundo. Nunca me
senti tão mortificado quanto ontem ao ter Oliver me mandando entrar como uma criancinha
arteira que não queria obedecer a sua mãe.

Corri para dentro e deixei-a falando sozinha, se iria me tratar como uma criança agiria
como uma criança e ficaria na greve de silêncio, que eu certamente não iria conseguir ir muito
longe.

Jogando esses pensamentos para o lado, termino meu banho e cuido da minha pele,
escovando os meus dentes. Vou direto para o meu closet e depois de vestir minhas roupas
intimas, escolho um macacão longo de alcinha vinho, combinando com meus vans de cor neutra.
Passo um pouco de maquiagem e tranço meu cabelo em uma trança lateral.

– Flora. – gritou minha mãe da escada.

Reviro os meus olhos e passo um pouco de perfume, pegando o meu celular e corro
escada abaixo até está de frente para minha mãe, que olha de cima abaixo e questiona se virando.

– Tinha outra roupa melhor, não?

Ignora sua pergunta e vou à cozinha rapidamente, pegando uma maçã da fruteira e
mordendo ela depois de passar em minha roupa, como se isso fosse tirar as bactérias que
possivelmente estão sobre ela. Meu pai abaixa o jornal e eu engulo minha maçã, beijando o seu
rosto.
– Bom dia papai. – digo ao mesmo tempo em que minha mãe grita.

– Flora.

Meu pai olha para direção de sua voz e eu também, tendo minha atenção voltando para o
meu pai, que diz docemente ao beijar minha testa.

– Que Deus lhe de paciência, minha flor.

Respiro fundo e me ergo, confirmando suas palavras com um aceno, pois certamente o
dia seria tão longo como possível e cercado de muitas piadinhas acidas para o meu lado.

Pelo menos ela daria uma folga ao meu pai. Penso.

Todo o mal que vem para o bem é tolerável. Afinal não é isso que costumam dizer por aí?
Talvez seja um ditado verdadeiro, ou não. De qualquer forma, espero que alguém diga algo
importante para ela na igreja, isso sempre a deixa nublada de outros pensamentos e intrigada
sobre o porquê disto está acontecendo.

Assim que abro o carro de mamãe, vejo Oliver só de shorts de dormir na porta de sua
casa, atendendo um homem qualquer com os cabelos ainda para o alto e uma cara de cansado,
que não diminuía um terço de sua beleza.

Mamãe buzina, fazendo–me acordar para vida e Oliver olhar em minha direção, fazendo–
me desviar o olhar tão rápido como o possível. Entro no carro e fecho a porta, passando o cinto
em minha volta e mordendo minha maçã verde com rapidez.

Mamãe acelera o carro e eu evito olhar em qualquer direção. Completamente mortificada.

Seria esse o domingo da vergonha?


As luzes se acendem ao mesmo tempo em que um coro de amém é dito pelos fies. As
pessoas começam a sair de seus lugares e vozes misturadas são escutadas das pessoas que
resolveram conversar ao mesmo tempo. Saiu da fileira e mamãe me segue conversando com
Laura e sua filha Luiza. As duas parecem não caber em si mesmas de tanto para falar, o oposto
de mim e Luiza, que apesar de termos crescido juntas na igreja e na escola, éramos como
desconhecidas.

Somos totalmente o oposto uma da outra. Ela fazia o tipo garota de família, não que eu
fosse diferente, mas o modo ao qual ela se vestia e agia, era como se não soubesse nenhuma
maldade existente no mundo e isso me surpreendia muito, pois isso não poderia ser bom para um
adulto. Ou seria? Enfim, não era da minha conta.

– Como Flora está bonita. – Laura diz me medindo dos pés a cabeça e eu sorrio
envergonhada e confusa, pois vejo-a praticamente todos os dias. – Vejo que a cada semana se
transforma mais em uma bela mulher.

– Verdade. – minha mãe afirma orgulhosa. – Nossas filhas estão deixando de serem
crianças. Em breve serão elas tendo seus filhos.

– E ainda não consigo pensar nisto. – Laura diz com certo lamentar. – Parece que foi
ontem que vi essas duas meninas nascendo e hoje as vejo assim, lindas e belas, prontas para se
casarem e construírem sua própria família.

O sorriso simpático que tinha nos lábios desceu com tudo ao ouvir o resto de suas
palavras. Eu tenho dezenove anos, como posso está pronta para casar quando quase não conheço
o mundo? Sua linha de raciocínio não faz sentido.

– Espero esse dia ansiosamente. – escuto minha mãe dizer. –Entretanto, não é o momento
certo para isso, não? Temos pessoas para encontrar para o almoço.

Minha testa franze e eu logo escondo este pequeno sinal de confusão, encarando Luiza
que olha para as duas com certo tédio mascarado. Ela já estava sabendo disso? Por que eu não
havia sido avisada sobre isso? É eu deveria ter ido dormir na casa de Jesy mesmo, evitaria certa
falsidade de minha parte.

– Sim, os homens são impacientes. – a amiga de minha mãe afirma. – Se demorarmos


mais um pouco, irão querer ligar para nós e até mesmo vir nos buscar.
Evito revirar os olhos quando ela olha para mim e sua filha fazendo graça do que diz,
como se essa afirmação fosse engraçada. Sorrio levemente enquanto minha mãe gargalha
andando até a saída de forma lenta, completando a afirmação de sua amiga, que ria das palavras
ditas, parecendo duas malucas rindo em meio ao falatório das pessoas que andavam ao nosso
redor.

Muito pouco sono para muitas emoções. Constato mentalmente.

OLIVER

Assim que eu á vi entrar no restaurante de comidas típicas Brasileiras, que meu pai nada
gentilmente me forçou a vir, fiquei grato pela primeira vez no dia por ter sido arrastado de casa.
Ela estava tão bonita como um raio de sol, que me fez esquecer todos os meus pensamentos
preocupantes de forma imediata.

Meu irmão estava animado conversando com os meus primos e meu pai estava
concentrado lendo o cardápio, estando todos ocupados demais para ver como eu parecia patético
por não conseguir tirar os olhos dela.

Isso era novo para mim.

Eu tenho mil e um motivos para ficar tão longe como o possível, estando com os
problemas que tenho atualmente, tudo o que eu traria seria sofrimento para sua vida e melancolia
para os seus dias. Entretanto, mesmo que seja errado tudo isso, pois eu sei que é eu ainda estou
vivo e não posso deixar de viver por causa de certas complicações.

Uma vontade sobre humana de gargalhar me atinge. Que pensamentos patéticos o meu,
certamente Olavo conseguiu mudar um pouco de minha mente fodida com seus milhares de
discursos idiotas.

Nunca irei dizer isso em voz alta.

Flora se senta em uma mesa grande, estando nela dois homens em seus quarenta e poucos
anos e um possivelmente na mesma idade que eu. Ela cumprimenta todos docemente e vejo que
é sincera de princípio, mas quando se senta e todos começam a falar, uma tristeza bate nela e
tudo o que ela sente é vontade de abandonar aquela cena.

Ela não era a única.

Encaro o meu pai e o vejo me encarando seriamente. Ele sabia bem quais eram os meus
pensamentos e muito mais. Sendo a negatividade em pessoa, ele sabia bem como isso acabaria e
apesar de não gostar nada disso, ele não falaria nada, nem mesmo me impediria.

Viver meus dias da melhor forma possível é o que todos da minha família estavam me
incentivando e ele não estaria me tirando à primeira coisa que demostrei interesse em meses.

– Você já sabe o que vai querer? – perguntei e ele abaixou o olhar para o cardápio. –
Sempre tão indeciso Otto.

– Cale a boca moleque. – ranzinzamente ele diz jogando o cardápio em cima de mim. – É
logico que já escolhi, assim como todos, exceto você.

Pego o cardápio e olho as opções, sentindo meu estômago dar um nó só pelos nomes. Eu
não sentia fome, era raro ter apetite nos últimos dias, mas eu tinha que comer algo e resolvi optar
por um dos meus pratos favoritos.

– Macarrão com almôndegas.

– Certo. – meu pai me olha e questiona. – Vai querer algum suco?

– Não. – nego e completo. – Somente uma água é o suficiente.

Ele acena e chama o garçom com a mão, tendo ele vindo em nossa direção tão rápido
como o necessário. Todos olham em sua direção e meu pai diz tudo de uma vez.

– Serão três pratos de lasanha, um escondidinho de carne moída e dois pratos de


macarrão com almôndegas. –ele olhou ao redor e viu todos voltando para os seus assuntos. –Para
beber, queremos duas garrafas d´água e um Pepsi de dois litros.
– Isso é tudo?

– Sim. – meu pai confirma e o garçom acena indo providenciar nossas coisas.

Meu pai se joga na cadeira, relaxado e arqueia uma sobrancelha, se questionando o que
diabos eu tinha em mente e eu fazia o mesmo, ficando bons segundos nisto até que eu desvio o
olhar e reviro os meus olhos.

Não seria melhor se ele perguntasse logo o que ele quer saber?

Olho para o lado e vejo de relance Flora se levantando da cadeira, volto o olhar para o
meu pai e vejo de longe Flora seguir em direção aos banheiros. Sem pensar muito, sigo minha
intuição e me levanto, avisando.

– Eu já volto.

Meu pai bufa e ri incrédulo conforme começo a andar, sabendo perfeitamente para que
lugar eu estava indo. Entretanto, eu não me importava, não era para ser um segredo mesmo, não
quando eu estava motivado.

Tenho vários segredos sujos.

Mas o meu repentino interesse por Flora não seria um desses.

FLORA

Cinco minutos depois de ter chegado ao restaurante e a vontade de ir embora já estava se


tornada demais para aguentar. Tudo de mim clamava para sair correndo deste lugar. Almoçar
com Laura e sua família são uma das coisas mais frustrantes e desgastante existida, sendo uma
das coisas favoritas de minha mãe, pois as duas são amigas de infância.
Elas se amavam e eram tão unidas como suas possíveis vidas permitiam e houve um
tempo que eu já amei tudo isso e todas as oportunidades de ficar perto dela. Chamava-a de tia
Laura e tudo, mas depois que completei certa idade, todos os encontros familiares serviam
apenas para juntar eu e seu filho mais velho, Louis.

Ele era bonito e engraçado quando não estava preso nas assas de sua mãe, mas quando
estava perto dela, se tornava um fantoche em suas mãos e isso quebrava todas as suas boas
qualidades.

E se houve chance de ficarmos juntos um dia, elas eram tão fortes como a chance de
existir trinta e um dias em fevereiro.

– Já escolheu o que vai comer minha flor? – papai pergunta docemente olhando para mim
e eu sorrio de volta, perguntando.

– O que você pediu?

–Arroz, feijão, bife e batatas fritas. – e completa como um segredo. – Tenho que
aproveitar que aqui eles não servem o bife de asfalto que sua mãe faz.

Sorrio achando graça de suas palavras e balanço minha cabeça lentamente. Meu pai era a
melhor coisa da minha vida; o raio de sol de meus dias chuvosos e o conforto nos tenebrosos. Ele
era carinhoso e o oposto de minha mãe. Eu nunca conseguiria compreender como alguém tão
gentil se encantou logo por alguém como ela.

Ela não é de todo ruim, mas também não era uma pessoa bondosa ou daquelas que fazem
algo sem esperar algo em troca. Às vezes parecia que ela tinha uma pedra no lugar do coração,
principalmente quando colocava algo na cabeça. É assustador.

Entretanto, sou grata por sua existência, pois ela é minha mãe e ninguém nunca cuidaria
de mim como ela cuida.

Mesmo que às vezes ela seja tenebrosa, ela é minha mãe, e sei que me ama da sua
maneira, mas ama.

– Vou querer o mesmo que você. – afirmo voltando a realidade.


– Suco de laranja?

– Sim. – confirmo e olho ao redor da mesa, percebendo o olhar de Louis em minha


direção e voltando a encarar meu pai. – Papai, irei ao banheiro. Quando o garçom vir você já
sabe o que pedir.

Ele apenas acena e aperta meu braço levemente, ficando sério de repente. Levanto da
mesa e dou o celular na mão do meu pai, indo sem precisar dizer nada ao resto do pessoal na
mesa. Estando todos ocupados conversando uns com os outros, não era como se eles fossem
perceber minha saída.

Ando pelo restaurante calmamente, entrando no banheiro e indo fazer minhas


necessidades no mesmo. Assim que termino, lavo minhas mãos com o sabão cheiroso e encaro
meu reflexo no espelho, percebendo que o laço que prendia o final da minha trança estava perto
de soltar e o tiro, apertando novamente no lugar e indo em direção à saída.

Entretanto, alguém me puxa para dentro assim que coloco os meus pés no lado de fora do
banheiro do restaurante, tampando minha boca para não escapar nenhum grito meu e me
prendendo na parede.

Meu coração acelera e pavor me atingir, mas ao abrir meus olhos e ver os olhos verdes de
Oliver, o medo da lugar a confusão.

– O que você está fazendo aqui? – questiono.

– O que eu deveria ter feito essa madrugada. – suas palavras saem cercado de decisão e
sua boca desce sobre a minha.

O primeiro toque dos seus lábios juntos ao meu é suave e doce, apreciativo para ambos
em uma descoberta. Meu estômago se agita e minha pele arrepia. Minhas mãos vão para o seu
rosto e meus olhos se fecham quando ele enfia sua língua dentro de minha boca. Sigo seus
movimentos com lentidão, apreciando cada segundo desde a suavidade inicial a brutalidade
quente e possessiva que se arrasta no lugar.

Suas mãos estão em meus braços, apertando meus ombros como se precisasse se segurar
em algo e eu não posso julgar por isso, pois o que me mantem em pé é minhas costas pressionada
na parede.

Sinto meus lábios inchados quando ele afasta sua boca da minha ofegante.

Foi de longe o melhor beijo da minha vida.

Ele se eleva sobre mim, ficando reto e me encarando até que crie coragem e abra os meus
olhos encarando os seus quentes e famintos. Quase sem piscar, sinto seus dedos se mexerem em
meus ombros, deixando–me arrepiada.

Não era nada demais, mas aparentava ser o ápice da intimidade.

Desvio o olhar de seus olhos quando suas mãos começam a se movimentar pelos meus
braços e encaro sua boca, assistindo um sorriso ladino se formar quando ele está prestes me
beijar de novo. Fecho os meus olhos e fico na ponta dos pés, querendo mais do que urgentemente
sentir seus lábios nos meus, porém não tivemos sorte desta vez.

– O que está acontecendo aqui? – Laura questiona impressionada.

Arregalo os meus olhos e me afasto de forma brusca de Oliver, que me segura pelos
ombros impedindo que eu vá para longe, encarando a mulher com um olhar nada amigável
enquanto pergunta de forma petulante.

– O que a Sra. acha?

Ela ignora totalmente ele, encarando–me enquanto balança sua cabeça de um lado para o
outro, enviando o olhar mais desapontado que já vi e virando–se para sair, mas antes olhou
novamente em nossa direção e falou.

– Eu pensei que você era melhor do que isso, Flora. – e saiu.

Engulo em seco e continuo olhando para porta sem piscar.

– É impressionante como existe pessoas para aparecer nos momentos mais inoportunos. –
ele diz bufando e olhando para mim de forma brincalhona, perdendo todo o humor quando ele vê
minha expressão. – Você não vai se importar com o que ela disse, vai?

Desvio o olhar e encaro o chão, me sentindo patética pelo modo incrédulo que ele diz
essas palavras.

Ele não sabia de nada para me julgar.

– Eu vou voltar para minha mesa. – anúncio me afastando e ele segura meu braço.

– Não de importância para o que ela diz. Ninguém sabe o que se passa com você além de
você mesma.

– Eu sei disso. – falo encarando-o e dizendo bruscamente. – Mas parece que você não.

Assim que termino de dizer, saiu do banheiro feminino e vou direto para minha mesa,
sendo grata quando percebo que Laura não disse nada do que viu no banheiro e está fingindo que
nada demais aconteceu, por agora. Minha mãe saberia o que aconteceu no banheiro e isso não
demoraria a cair em minhas costas.

E pelo olhar que Laura me enviava, não demoraria muito para isso acontecer.
Eu estraguei todos os planos da melhor amiga da minha mãe.

E sabe o que me aconteceu até agora?

Nada.

Certamente Laura não é fofoqueira como eu pensei que fosse. Ou só está esperando o
melhor momento para abrir a boca e complicar minha vida, pois se minha mãe souber que estava
beijando um homem no banheiro feminino, ela me chamaria de todos os nomes existidos e
nenhum parecido com santa.

Então eu esperava que fosse a primeira opção.

Suspirando, entro na cozinha e jogo minha bolsa sobre um banquinho, pegando uma
caneca e a enchendo de café. Ainda sentia como se estivesse dormindo em pé e o meu dia seria
tão longo hoje, que não poderia me dar o luxo de ficar sem o meu combustível.

Uma colher de açúcar no café e um misto quente de queijo e presunto no prato, sento-me
a mesa e começo a comer, não engolindo sequer minha primeira mordida quando meu pai entra
na cozinha com uma expressão para poucos amigos.

Ele olha de relance em minha direção e joga o jornal na mesa, pegando uma caneca e a
enchendo de café sem dizer uma palavra.
Acho que certo alguém não teve uma boa noite de sono.

Ainda quieto ele se senta em minha frente e abre o seu jornal, colocando em frente ao seu
rosto e se concentrando em sua leitura. Não muito tempo depois minha mãe invadi a cozinha
como um furacão e arranca o jornal das mãos dele, tentando rasgar e ao não conseguir, taca no
chão e pisoteia o mesmo.

Meu pai quase bufa e quase posso ver uma fumaça sair pelos seus ouvidos; meus olhos se
arregalam e minhas mãos tremem com a caneca perto de minha boca.

– O que diabos você tem na cabeça Eloisa. – ele esbraveja com suas veias quase saltando
do pescoço.

– Eu que deveria fazer essa pergunta, pois certamente está maluco se acha que pode virar
as costas e me deixar falando sozinha. – ela grita em seu ouvido, tão vermelha como uma
pimenta e meu pai respira fundo, como se buscasse controle para não fazer uma besteira. – Nós
precisamos conversar...

– Não. – ele berra me assustando e fazendo o café entornar um pouco sobre a mesa,
derramando um pouco na minha mão e isso trás sua atenção para mim, voltando a encarar minha
mãe e afirmando sem deixar espaço para discursão. – Não irei deixar fazer isso com ela. Nem em
um milhão de anos. Entendeu?

Suas palavras firmes e o modo ao qual ele a encara a deixa sem palavras e perto de
chorar. Ela não diz nada e ele desvia o olhar e avisa conforme sai da cozinha.

– Vou escovar os dentes e estou de saída. Se aprese se quiser uma carona, Flora.

Aceno e me levanto, colocando a caneca dentro da pia e lavando minhas mãos. Minha
mãe encara o nada por alguns segundos, mas assim que consegue se recuperar do susto, afirma
sombriamente.

– Veremos se eu não vou conseguir. – e sai, fazendo–me olhar assustada para trás.

O que diabos aconteceu está manhã?


E o mais importante, o que minha mãe quer fazer comigo? Porque não tenho dúvida
alguma que a mulher que meu pai falou sou eu.

Preocupação me bate e encaro o nada sentindo um pavor crescer dentro de mim. Engulo
em seco, secando minhas mãos e deixando essas perguntas que certamente não teriam resposta
de lado. Minha mãe não era maluca de inventar algo doido que me machucasse ou causasse
desconforto. Ela me amava e quem ama cuida. Não?

Entretanto, algo dentro de mim dizia que neste caso era preciso ter medo.

Quando se tratava dela sempre era.

Saiu da cozinha com minha bolsa em mãos e olho para cima, escutando ambos ainda
brigando no andar de cima. Pego minha chave em cima da mesinha e abro a porta de casa, uma
vizinha me encara com pesar nos olhos quando fecho á porta e meu rosto fica vermelho de
vergonha, mesmo assim, coloco um leve sorrio no rosto e a cumprimento.

–Bom dia Sra. García.

Ela encara o chão e sorri em minha direção, mostrando todas as rugas de seu rosto.
Quando pequena ela cuidava de mim, e por isso a considerava uma tia, que apesar de
inconveniente, conseguia ser doce e gentil quando queria.

E uma excelente conselheira também.

– Um excelente dia menina. Espero que esteja levando uma sombrinha, deu chuva para
está tarde.

– Tenho uma no meu armário da universidade. – dou de ombros. – É sempre bom ser
precavida.

– Realmente. – ela concorda. – Boas aulas, Flora.

Sorrio e começo a caminhar, indo em direção ao ponto de ônibus, que para o meu
desgosto não era tão perto assim de minha casa. Entretanto, eu tinha tempo. Gostava de chegar
aos lugares cedo e isso me fazia está sempre adiantada no tempo.

Assim que chego ao ponto em frente a minha universidade o sino toca, fazendo–me
aliviada por não ter chegada atrasada. Olho para os dois lados e atravesso a rua. Assim que entro
no portão da universidade, vejo um aglomerado de pessoas e uma conversação não muito normal
para uma segunda de manhã, mas não dou muita importância e continuo andando.

No meio do caminho, olho para trás quando escuto a voz de Jesy, que me encara com
uma animação mais exagerada do que o normal.

–Amiga, preciso te contar umas coisinhas. – ela informa dando saltinhos de felicidade e
eu aceno minha cabeça, não sentindo curiosidade alguma e abro o meu armário, caçando os
livros de matemática para a primeira de muitas aulas ao longo do dia. – Nossa que felicidade
contagiante a sua.

– Esse é o meu normal de todo dia. – a encaro como se ela estivesse louca. – Você que
tomou excesso de açúcar e está saltando como um canguru.

Seus olhos se arregalam e ela olha ao redor, envergonhada.

– Você está exagerando. Né?

– Não sei. – Dou de ombros. – Talvez sim, talvez não. Nunca saberemos.

– Chata.

– Sou. – rebato com humor e o sino toca. – tenha uma boa aula e não durma novamente
no meio da explicação.

–Certo, mamãe. – revira os olhos, andando até sua sala.


Fecho meu armário e ajeito minhas coisas, me virando na direção oposta da dela,
tentando não encostar nos diversos alunos que passam por mim e quase acertando uns que o
fazem propositalmente.

Odeio esse horário.

Assim que chego à sala, vejo o professor tão temido de matemática, que apesar de sorrir
amigavelmente para todos que entram em sua sala, era o verdadeiro terror de todas as turmas que
precisavam dessa aula e eu estava inclusa nesta lista.

–Bom dia, professor. – falo ao passar por ele.

– Bom dia Srta. Collins. – e questiona. –Está pronta para fazer cálculos?

Sento–me na cadeira de sempre e dou de ombros como se não soubesse o que responder
além do lógico e óbvio não que eu tinha em mente. Ele sorri balançando seus cachos loiros e
anda até estar no centro de toda sala, observando todos os alunos entrarem e indo fechar a porta
para que nenhum atrasado possa entrar.

Assim como eu, ele apreciava a pontualidade. Uma das coisas que tínhamos em comum.
A outra? Bem, você irá descobrir em breve.

Ou não.

Respiro de alívio quando termino a última conta dos infinitos deveres de cálculo que o
professor passou na aula. Eu tinha feito apenas metade da folha, mas como tinha pessoas que
sequer fizeram um terço do que eu fiz, não deixarei esse fato me entristecer. Olho para página
uma última vez e começo a guardar minhas coisas.

Para minha felicidade, o intervalo de vinte minutos para o almoço já havia chegado à
metade do tempo e eu teria que escolher algo simples e rápido para comer no refeitório, algo que
estava se tornando rotina.

Matemática não é a melhor matéria do universo e eu não faço parte da minoria que gosta
dela, mas ela era necessária independente da minha escolha de carreira e apesar de não saber o
que eu gostaria de seguir, iria aproveitar todas as oportunidades de melhorar meu pouco
entendimento sobre a mesma.

O meu professor, irônico e um pouco jovem para está aqui, apreciava dar aulas e tirar
todas as dúvidas possíveis. E ao está no meu segundo semestre, sei o quanto isso é difícil de
encontrar por aqui.

Levanto–me de minha cadeira e olho ao redor, vendo se esqueci de guardar alguma coisa
e ao perceber que não, sigo meu caminho apressadamente, tentando andar rápido para além de
comer alguma coisa, ter tempo de ir ao banheiro, pois minha próxima aula era de historia e está,
com toda certeza era uma das minhas favoritas, assim como filosofia e sociologia.

O corredor está vazio e quase sem ninguém ao redor, então meus passos apressados não
são atrapalhados por ninguém. Quando chego à porta do refeitório, controlo minha respiração,
respirando normalmente ao entrar no mesmo e percebendo os diversos alunos comendo e
conversando.

Ignoro isso e aceno para minha amiga, que revira os olhos por novamente ser a atrasada
da vez. Desvio o olhar e começo a andar até a fila do lanche, desviando de certas pessoas que
atravessam meu caminho e dando uma voltar maior que o necessário.

Um grupo de três caras fortes vem em minha direção, ignorando totalmente minha
existência e empurrando–me grosseiramente para o lado. Prendo um palavrão e escuto um grito
feminino, fazendo–me encarar envergonhada Meredith, que me olha mortalmente com sua mão
na cabeça.

Odiava andar com bolsas.

– Desculpe. – tensa, digo envergonhada e ela me encara, revirando os olhas e ignorando


minha existência.

Novidade. Penso bufando e continuando a ir em direção do meu lanche.


Estava faminta.

Entretanto, certo alguém segura meu braço, fazendo–me congelar o sangue


momentaneamente. Será que o meu pedido de desculpas não foi aceito? Engulo em seco odiando
o pensamento e tremendo como uma franguinha por dentro.

Sou terrível em brigas e ela é faixa preta em Caratê. Se ela me pega, estou literalmente na
merda.

Engulo em seco e olho na direção em que a pessoa que me segura se encontra, relaxando
automaticamente quando encontro os olhos cor de esmeraldas de certo moreno. Ele me olha
arqueando uma sobrancelha, sorrindo com deboche. Desvio o olhar e vejo seus primos e o seu
irmão me encarando, assim como três outros colegas de turma distantes e duas de suas
namoradas, eu acho.

Os populares. Você pensa que ao entrar na faculdade irá se livrar de grupos de classes
sociais e toda a baboseira que tem por trás disto e percebe que infelizmente isso não é algo que
se encerra, existe tão fortemente como no colegial, com uma força maior do que existia antes.

Minhas bochechas estão quentes e eu passo a língua nos lábios voltando a encarar Oliver
quando percebo certas pessoas nos encarando.

–Minha Flora, não sabia que você estudava aqui também. – ele diz quando eu não digo
nada, soando territorial demais para os meus ouvidos. – Sente–se com a gente, acho que você já
conhece todos por aqui. Não?

– Sim, é lógico. Tirando você e a sua família, estudei o colegial com todos. – digo
sentindo–me uma idiota. – E eu já tenho um lugar para me sentar. Entretanto, muito obrigada
pelo convite.

Sua testa cria vínculos e ele corta todo o humor, sentindo–se possivelmente magoado
com minha negação e isso me deixa me sentindo péssima, mas não iria deixar de sentar com os
meus amigos para sentar na mesma mesa de quem era cruel comigo de forma desnecessária na
escola.

– Entendo. – ele diz de forma seca. – Faça como preferir.


Idiota. Penso querendo revirar os olhos quando ele desvia o olhar.

Bato minha bolsa em seu braço, querendo bater na sua cabeça com ela até ele parar de
agir como um garotinho mimado e ele me olha.

– Preciso pegar meu lanche. – informo. – Segure para mim, por favor.

Ele me olha sem expressão e pega minha bolsa, deixando ao seu lado enquanto me viro e
vou direto para os balcões de comida, ignorando os olhos em minhas costas. Sinto seus colegas
zoarem ele e o escuto mandar todos calarem a boca. Passo a mão pelo meu braço e pego uma
bandeja, pegando um sanduiche com suco de caixinha e uma maçã.

Sorrio para moça da cantina e ela anota meu nome na conta, para minha mãe acertar tudo
no final do mês.

– Bom apetite, Flora. – Ela me diz, olhando fixamente para trás.

Aceno minha cabeça constrangida ao ver em que direção ela olha e vou direto para lá,
colocando minha bandeja em cima da mesa e sentando–me ao lado de Oliver, que conversa com
todos ao seu redor. Ignoro isso e pego o sanduiche com um guardanapo, mordendo um pedaço e
quase engasgando quando uma mão quente e máscula é colocada no meu joelho, esfregando
suavemente a área.

Olho de relance para ele, atônica e o vejo da mesma forma. Reviro os olhos e volto a
mastigar meu lanche, ignorando totalmente qualquer conversa que role ao redor.

Carros e seus motores com toda certeza não era o meu assunto predileto.

Mas mesmo se eles fossem a mão de Oliver sobre minha perna estava deixando–me em
uma combustão que a simples tarefa de comer se tornava complicada. Imagina se precisasse
interagir com todos? Certamente seria uma pagação de mico sem fim.

E eu tinha a plena certeza de que se quisesse ou falasse algo, não seria ignorada.

Assim que o sinal toca, Oliver gargalha fortemente de algo que um dos seus primos diz e
eu o encaro pateticamente espantada com sua beleza. Ele aperta meu joelho e me olha, com os
seus olhos sorrindo.

– Você poderia me esperar na saída? – ele pergunta.

– Pode ser. – sorrio docemente e pego minha maçã, me levantando. – Preciso ir. Até logo
Oliver e pessoal do Oliver.

E me viro, sendo surpreendida por Oliver, que puxa levemente minha mão e me beija
lentamente, sem urgência alguma. Fico surpresa e demoro a reagir, beijando–o de volta e
querendo mais quando o beijo é finalizado.

Por que tinha que acabar tão rápido?

– Até minha Flora. –sua voz me acorda, estando mais rouca que o normal.

Envergonhada aceno, virando–me como uma tonta e apressando o passo para ir para
minha aula. Escuto vozes cochichando e sei que se trata de mim, mas não consigo me importar
menos com isso, não com as perguntas que estão em minha mente.

O que havia sido isso?

E o mais importante, o que diabos estava acontecendo entre nós?


OLIVER

Meu irmão e primos me encaram com suas sobrancelhas arqueadas e o olhar debochado
que já estava acostumado. Desvio o olhar da porta ao qual Flora saiu e encaro ambos, contando
os segundos para as piadinhas começarem.

Entretanto, não são eles que começam.

– Se apaixonou, Romeo? – perguntou uma das garotas que estava sentado ao lado de
Peter, que me encarava também, atraindo risadinhas ao redor.

– Se não tiver, está perto. Olha como ele a encarou. Parecia que iria devorar a coitadinha.
– continuou Lucca.

– Meu priminho de quatro por uma garota. Eu pensei que ia morrer e não veria isso
acontecer. – Oziel colocou mais gasolina na fogueira.

–Engraçados vocês. – rio com ironia. – E exagerados, por que não viram palhaços ao
invés de jogadores profissionais? Ganhariam bastante dinheiro.

Peter da de ombro, mordendo uma maçã. Ele é um cara legal, caladão e extrovertido. E
assim como Lucca e Noah faziam parte do time de jogadores da universidade e estavam fazendo
suas jogadas certeiras para ser um dos grandes. Nunca fui um fã descontrolado ou ansioso por
qualquer tipo de modalidade esportivo e tirando coisas ligadas aos carros, assistia por assistir,
mas segundo meu primo Oziel, os caras tinham talento para dar e vender.

– Gosto de usar meus dons para oportuna meus amigos. – Noah fala convencido.

– Eu não acredito no que acabou de acontecer aqui. – uma garota de pele escura que
também está como acompanhante dos amigos de meus primos diz incrédula. – Um tipo como
você interessado nela.

Toda diversão que estava ao redor da mesa evapora, deixando meu irmão e eu sérios.

– Um tipo como eu? – questiono.

– Sim. Bonito e charmoso, interessante sem fazer esforço algum e popular. – ela explica.
– Você poderia ter qualquer garota ao seu redor sem esforço algum e com toda certeza merece
mais do que a sonsa que ama fazer papel de vítima da Flora.

– Sonsa? – pergunto arqueando uma sobrancelha

Ela acena confirmando e abre a boca para falar mais alguma coisa, mas Lucca já viu
como estou e começa tentando limpar a bagunça de sua amiga.

– Ignore Alana, ela não sabe o que diz. – diz fazendo a garota revirar os olhos. – Flora é
quieta, na sua e inteligente, muito diferente de minha irmã, que acha que status e beleza são tudo
na vida. Possivelmente está tonta está interessada em você e está tentando mudar seu modo de
pensar sobre sua menina.

– Entendo. – digo me levantando. – Mas é perda de tempo. O que conheço de Flora é o


suficiente para saber que ela não é nada do que sua irmã quer pintar. – encaro–a. – Você
certamente é bonita, mas seu queixo empinado e postura de dona do universo são patéticos. Vê
se acorda para vida e não cruze meu caminho. Não sou obrigado a ouvir o que não quero e
certamente tudo o que diz, faz parte disto.

Pego minhas coisas e a vejo me encarar incrédula, escuto alguém chamar meu nome, mas
ignoro. Saindo do refeitório e procurando minha próxima aula, que eu já deveria estar presente
há um bom tempo.
Arquitetura, sexto semestre. Trocar de universidade nesta altura do campeonato poderia
ser um problema, mas foi necessário e eu não iria parar até que a vida fizesse isso por mim.
Sempre foi um dos meus sonhos ter meu diploma em mãos e eu não iria parar com ele quando
estou tão perto de conquistar.

Menos de dois minutos depois, paro em frente à sala que corresponde o papel, batendo na
porta e tendo um homem em seus quarenta e poucos anos me encarando com seriedade.

– Pois não?

– Sou Oliver Bennett. – apresento–me. – Aluno novo e me perdi no meio do caminho.

Ele me olha atentamente e aperta minha mão, dando espaço para entrar na sala com todos
concentrando em seus respectivos trabalhos.

– Escolha uma cadeira, que eu vou te dizer á página que estamos.

Aceno levemente com a cabeça e procuro um lugar com os olhos, indo em direção de um
no fundão. Além de ver tudo o que aconteceria aqui, ficarei longe de olhares curiosos e com vista
para o lado de fora da janela, tendo árvores para espantar os momentos de tédio, que acredito não
serem poucos.

Nunca são.

FLORA

O sinal bate e eu mais do que rapidamente me levanto, quase correndo para fora da sala,
realizando o meu desejo desde que voltei do intervalo. Minha saída rápida faz o pessoal da turma
gargalharem e isso me faz engolir em seco.

Sabe o que acontece quando os que não gostam de destaque são jogados no centro de
tudo? Eles ganham uma atenção extremamente desnecessária e desconfortável. Eu não nasci para
estar no centro das atenções, de nenhuma forma e as pessoas que me conhecem desde o colegial
sabem disso e elas estão usando isso para me perturbar.

Zoação ou bullying. Pensa que isso acaba na faculdade? Pobre iludido você.

Você pensa que as pessoas vão crescer ao dar esse passo, criar maturidade e focar nos
seus trabalhos, para ser o melhor profissional possível. Entretanto, são poucos que seguem dessa
forma. Mais da maioria só quer agir como jovens, evitando responsabilidade de todas as formas
que podem.

Ridículo.

Segurando um suspiro, abro meu armário e guardo os meus livros e cadernos, deixando
apenas o bloco de anotações que costumo escrever o que não entendo, para estudar quando tiver
vontade. Assim que fecho dou de cara com Jesy, que está com os braços cruzados sobre o peito e
uma sobrancelha arqueada.

– Você não acha que precisa me falar algo?

– Deixe–me adivinhar, você escutou sobre o beijo no refeitório? – com desanimo, jogo
outra pergunta para ela.

– Teve beijo? – pergunta em choque. – Eu só estava falando sobre você me trocar pela
mesa dos populares, mas a coisa foi mais profunda do que pareceu. Você está namorando um
daqueles idiotas?

Engulo em seco e nego com minha cabeça, fazendo uma cara de nojo.

Nem nos meus piores pesadelos.

– Não, lógico que. – respondo ofendida. – Não estou namorando ninguém e nem tenho
isso em mente. Você lembra–se do que te disse do meu vizinho novo?

– Aquele que te salvou...

– Esse mesmo. – a interrompo. – Foi ele que me beijou.


– Quê? – chocada ela segura meu braço. – Mas e o cara que você foi embora depois da
corrida? O bonitão estrela que meu tio foi de puxa saco para ódio mortal. Meu tio não parou um
segundo de falar como aquilo era um erro de sua parte e que você deveria se dá ao valor ao invés
de ser mais um tiro no cinto de um playboy e outras mil baboseiras.

Arqueio minha sobrancelha e encaro–a com deboche.

Sei bem qual o valor que Tito quer que eu tenha. Isso é discurso de orgulho ferido.

– É o mesmo. – digo simplesmente. – Não dormimos juntos, se é o que quer saber e não
sei o que vai dar tudo isso. Não parei para pensar nos prós e contras, mas ele é uma companhia
agradável, sendo bom para ouvir e conversar.

– Você não sabe o que vai acontecer, mas eu sim. Ele quer te levar para a cama dele.

– Talvez. – encaro o relógio no meu pulso e encaro–a dizendo. – Até o momento aprecio
sua conversa e seus beijos só é um agradável bônus.

Um sorriso malicioso cresce em meus lábios e ela me olha com espanto. Qual foi? O cara
é muito bonito e gostoso, tipos como esses não aparecem a todo o momento. E não é como se eu
não fosse gostar se rolasse isso. Tive dois namorados antes e já conhecia em pratica o que era
sexo. Mais um ou outro me fazendo praticar não iria ser grande coisa.

– Não estou te reconhecendo. – abismada ela nega com um sorriso ladino. – Sério que
essa é você falando?

– É e não é grande coisa. – e me disperso. – Preciso ir. Se quiser conversar, me ligue ou


me mande mensagens.

– Certo, vou fazer isso. – me puxa para um abraço. – Só tenha juízo, Flora. Gosto muito
de você para te ver machucada.

– Eu sempre tenho. – sorrio, saindo de seu abraço e começando a andar.


Os corredores estavam lotados, fazendo–me trombar com certos apresados, que estavam
ocupados de mais conversando com seus amigos e querendo chegar logo à saída, para se
importar em não esbarrar nas pessoas.

Reviro os olhos mentalmente com a mesmice de sempre e solto um suspiro de alivio


quando saiu da universidade, assistindo com alegria o tempo fresco e levemente ensolarado, que
eu tanto amava.

Essa com toda certeza era a melhor época do ano.

Sorrio com o pensamento e ando em direção da saída, resolvendo que caminharia até
minha casa. Não era tão longe daqui e não seria uma caminhada exaustiva, não com o tempo de
hoje. Olho para os lados e atravesso a rua, pegando o meu fone quando estou do outro lado da
calçada e levando um susto quando um carro vermelho para ao meu lado.

O carro de Oliver.

Ele buzina e sorri em minha direção, com os dentes brancos e perfeitos e um olhar arteiro
no rosto.

– Esqueceu–se do meu pedido na hora do almoço? – ele questiona.

Ah, o pedido de esperar ele depois da aula. Todo o estresse das ultimas aulas me fizeram
esquecer. Minhas bochechas coram de vergonha e chego perto do carro, que ele destranca para
mim e eu entro, fechando a porta do mesmo e colocando o cinto no automático, só depois
olhando para ele e me explicando enquanto ele não faz nada além de piscar.

– Sei que parece desculpa, mas esqueci de verdade.

Ele acena e olha para frente, dirigindo de uma forma que pensei que motoristas que
dirigem em corridas como as que ele corre, não dirigiriam.

– Sou humano e sei que às vezes esquecemos certas coisas. – ele me tira de meus
pensamentos. – Mas com uma simples mensagem posso refrescar sua mente, então, por favor,
Srta. me dê o seu número.
– Claro, Sr. – afirmo segurando uma risada. – Quando o senhor estacionar, eu darei sem
demora alguma.

– Esperarei ansiosamente. – continuou. –E só não pego antes, pois gosto da minha


carteira sem multas e do meu carro do jeito que é para correr o risco de bater e acontecer algo
com ele e você.

– Temos um motorista de corridas ilegais consciente.

– Não acho que esse seja o termo certo, mas para deixar claro dirigir é terapia,
independente se for de forma acelerada ou seguindo o fluxo das estradas. – ele explica com
divertimento. – Meu pai me ensinou a dirigir desde muito novo e com isso veio diversas outras
regras que eu tive que passar a seguir.

– Tipo quais?

– Não chamar atenção para si. Parece bobo, mas meu pai disse que no dia que eu pegasse
uma multa ou fosse parado pela polícia, ele nunca me deixaria dirigir um carro novamente. Hoje
em dia, eu sei que ele não pode arrancar o meu carro de mim, mas conforme fui crescendo, fui
levando isso ao pé da letra e criei certos hábitos.

– Uma boa coisa. Fazendo isso fez com que você não se transformasse em um babaca na
estrada.

–Verdade. – ele afirma. – Já existem muitos espalhados por aí.

Ao dizer isso, ele fica quieto e eu faço o mesmo, percebendo que ele está concentrando
na estrada e desvio o olhar para o lado de fora da janela, apreciando as ruas que passam
rapidamente pelas minhas vistas.

Entretanto, algo me deixa alerta.

O caminho era totalmente diferente do normal.

– Para que lugar está me levando? – questiono agitada, olhando para ele, que me encara
por alguns segundos, confuso por minha expressão afobada. – Oliver...
– Relaxa. – ele começa se concentrando na estrada. – Tenho que ir a um almoço de
negócios. Não era o que eu tinha em mente quando pedi para você me esperar, mas tive que
mudar meus planos e confesso, não quero passar por aquela reunião sozinho. É muito chato e
estressante.

Solto a respiração que eu estava guardando e olho para frente.

– Que negócios? É sobre suas corridas ilegais?

Minhas perguntas o deixam rígido ao meu lado, com uma careta de desagrado.

– Não são ilegais. – afirma. – Elas não são 100% legais, mas também não é como faz
parecer. Muitas são colocadas debaixo dos panos. Entretanto, muitas outras são reconhecidas e
tem até publicidade.

Fico surpresa com sua afirmação e pergunto confusa

– Se você tem patrocinadores em corridas legais, por que corre nas perigosas, que pode
ser pego e ter todo o futuro grandioso jogado no lixo?

Sua expressão se torna sombria e seu rosto se mostra confuso, preso em uma leve
confusão de pensamentos, daqueles que ele não gostaria de pensar. E arrependimento me bate
quando percebo o qual fundo minhas perguntas o atingiram.

– As corridas legais não dão tanto dinheiro quanto as outras. – diz de forma cortante. – E
eu preciso dele; minha família precisa dele. Temos muito hoje em dia, mas não tínhamos nada
um dia e não quero que isso aconteça novamente. Preciso deixar o suficiente para que não falte
nada, durante um bom tempo, se algo acontecer.

Um arrepio me bate e olho para frente, dando um leve aceno de cabeça e concentrando–
me na estrada. Algo em suas palavras que traz um aperto no coração, um pressentimento nenhum
pouco agradável, que com toda certeza não é bem-vindo e me faz sentir agoniada.

– Nada de ruim vai acontecer. – afirmo para acalmar mais a mim do que ele. – Você tem
muitos anos pela frente ainda, Oli. E eu não sei se vou estar aqui com você, mas sei que será um
daqueles homens grandes e realizados.

Ele apenas acena, dando um leve sorriso ladino e aperta minha perna, fazendo–me
prender a respiração e arrepios subir por minha coluna. Um silêncio se estala dentro do carro e
até estarmos lá, ninguém fala nada.
Quando o carro enfim chega ao lugar desejado, me espanto ao ler o nome do
estabelecimento e olho para o outro lado da rua, procurando outro restaurante ao redor. Ao ver
que nenhum outro existia no quarteirão, olho para as minhas roupas e balanço minha cabeça.
Com toda certeza não estava pronta para entrar no restaurante mais chique e popular de toda
Califórnia.

– Nem pensar que eu entro num lugar como esse com essas roupas. – solto de forma
incrédula.

Oliver desvia o olhar do celular, encarando–me de forma curiosa e confusa, demorando


alguns segundos e balançando sua cabeça quando não viu nada de mais.

– O que tem de errado com suas roupas?

– Você ainda pergunta? – questiono. – Não tem nada de errado para ir a uma lanchonete
ou na universidade, mas quando se trata do restaurante mais chique e popular da Califórnia eu
pareço uma mendiga.

Ele me encara durante longos segundos, seriamente e do nada, joga sua cabeça para trás,
gargalhando como se estivesse de frente para um palhaço.

Louco. É isso o que Oliver Bennett é.


Sua risada era extremamente bonita e um tanto como contagiante, mas no momento tudo
o que ela conseguia fazer por mim era me sentir cada vez mais constrangida e raivosa.

– Pare de rir. – exclamo irritada. – Isso não tem graça.

Cruzo os braços como uma criança e ele para aos poucos, começando a me encarar de
forma dócil e um tanto divertida.

– Minha Flora. – começa. – Você está linda.

Bufo revirando os olhos. Vans e um vestido preto com estampa de flores e uma traça
lateral não era bom o suficiente para o lugar que ele queria me levar. Certamente atrairia atenção
desnecessária das ricaças de plantão e eu odiava a ideia de ser considerada a piada da vez, por
qualquer motivo.

– Estou falando serio. – ele tenta novamente. – Você é bonita naturalmente, ficando linda
com qualquer tipo de coisa. Não estamos vestidos para um lugar como esse, mas mesmo se
estivéssemos vestidos como manda o figurino, como você acha que as pessoas olhariam para
nós? Certamente da mesma forma que vão olhar agora. Sem importância alguma.

Abro minha boca, mas ele me interrompe.

–Nenhuma palavra a mais. – ele ordena autoritário, continuando de forma suave. –Pare de
bobeiras e me ajude nessa. Não é grande coisa e você sabe disso. E ainda é de tarde, deve está
praticamente vazio.

Suas palavras fazem sentido e eu respiro pesadamente, tirando o cinto sem dizer nada e
ganhado um sorriso ladino muito bonito de sua parte, que consegue contra minha vontade, fazer
minha barriga sacodir, fazendo–me ter que usar todas as minhas forças para ignorar a tentação de
sentar e assistir.

Homens assim não deveriam existir.

Ele não diz nada e faz o mesmo, deixando o carro no meio fio e agarrando minha mão
quando chega à calçada. Paro alguns segundos olhando a faixada com um grande letreiro em
dourado, em uma letra chique e sofisticada. Ao redor era todo coberto por paredes de vidro
fosco, que nos impedia de ver o que tinha por dentro.
Sempre tive curiosidade de conhecer este lugar e acho que agora será este momento.

Oliver puxa minha mão e eu o acompanho, entrando no restaurante quando ele abre a
porta para mim. Em minha primeira olhada, vejo um balcão vazia que possivelmente deve ter
uma recepcionista ou algo como isso para receber os clientes. Muito dourado e cristais estavam
espalhados ao redor, sendo as peças que prevaleciam no estabelecimento.

As paredes eram uma mistura atraente de salmão, decoradas sutilmente com dourado e
certas partes transparentes pelo vidro, que combinando com os lustres de cristais nos lugares
certos, faziam uma incrível e cativante combinação, cumprindo tudo o que prometia com a
faixada atraente.

Luxo, como era nomeado, exalava uma riqueza e requinto que muitos outros restaurantes
sentiam inveja e que certas pessoas dariam a alma para poder entrar e eu, estava pisando dentro
dele, vestindo nada atraentes vans.

Nem em meus sonhos mais loucos poderia me imaginar numa cena como essa.

A mão de Oliver ainda segura a minha, me puxando enquanto eu olho ao redor como uma
tola e engulo em seco quando dou de cara com outra coisa inimaginável, ou melhor, pessoa.

Tito.

Assim que seus olhos cruzam com os meus, sua cor some e ressurge em um tom
vermelho vibrante. Sua mandíbula trava e seus olhos assumem um brilho assassino, mas
ninguém mais pode perceber essa mudança de humor repentina, pois ele não era o foco do
assunto, Oliver era e eles estavam ocupados de mais prestando atenção em nossa chegada para
reparar no tio de minha amiga.

– Olha só quem chegou! – Otto, o pai de Oliver diz com falsa animação, olhando
mortalmente para o filho e perguntando de forma debochada. – Ficou preso no trânsito?

– Não, apenas me atrasei na aula. – afirma ignorando o deboche. – E peço desculpas por
isso.
– Que nada, rapaz. – um senhor de cabelos grisalhos e um sorriso simpático fala. –
Atrasos ligados a estudos sempre são motivos compreensivos. Sinal de que é dedicado no que faz
e não gosta de deixar nada pela metade.

– E não gosto mesmo. – afirma de forma brincalhona e questiona oferecendo sua mão. –
Sr.?

– Kane Martins. – diz apertando sua mão.

–Esqueci–me de fazer as apresentações. – Otto diz sem importância. – Como ele já se


apresentou, vou apresentar o resto. Richard Gomery e o outro é Tito, que você já viu no último
sábado. – Ele diz apontando com a cabeça enquanto Oliver apertava a mão de todos. –Senhores
este é meu filho Oliver e sua adorável... Flora Collins.

Dou um aceno de cabeça envergonhada e Oliver arrasta uma cadeira para mim sentar ao
lado de seu pai, se sentando do meu outro lado e tendo que acabar ao lado de Tito, algo que
aposto não ter sido coincidência.

– Seu nome combina com você. – Richard um loiro de meia idade diz quando todos nós
já estamos em nossos lugares. – Doce e agradável, como a senhorita deve ser. É um homem de
sorte, Oliver. Não a deixe escapar.

– Ele não faria uma burrada desta. Não é mesmo? – questionou Kane brincalhão.

– De forma alguma. – Oliver diz me encarando de forma intensa. – Só um tolo trocaria


uma joia rara por uma lata enferrujada.

Suas palavras fazem borboletas voarem alto em meu estômago e minhas bochechas
corarem com a forma intensa e poderosa de seus olhos, me impossibilitando de sequer piscar. Ele
puxa minha mão e a beija, como se não tivesse ninguém ao redor e assim ficaríamos, se Tito não
jogasse um balde de agua fria com suas risadas.

– Me desculpe acabar com os pombinhos, mas um rapaz de vinte e um anos, que quase
não conheceu a vida, dizer isso é cômico demais.

Sem expressão, Oliver abaixa nossas mãos ainda segurando a minha e o encara de uma
forma muito estranha, quase sinistra, com um brilho poderoso nos olhos e sei que em segundos
começaria uma briga, pois ele estava prestes a abrir a boca, porém Kane o fez antes dele.

– Não é não. Conheci minha esposa com dezenove anos e apesar da idade jovem, não
demoramos a nos casar. Tínhamos um sentimento tão forte, que contra todos os descrentes nos
casamos. Nosso casamento tinha tudo para dar errado, mas o amor nos manteve juntos e ainda
nos mantem até hoje. Amo ela como a primeira vez que a vi e não a trocaria por qualquer
fortuna. – desviando o olhar para nós dois, afirma. – E eu não sei o que vocês são ou há quanto
tempo estão juntos, mas aposto que em breve descobriram pessoalmente tudo o que vivi.

Seus olhos não desviam de nós dois e eu me sinto arrepiar dos pés a cabeça com o que ele
diz e não de uma forma boa. Oliver era bonito e simpático como nenhum outro rapaz foi comigo,
mas ele nos estava pintando para todos como algo que nós não somos e talvez nunca fossemos
ser.

Era cedo de mais para dizer essas coisas. Não? Minha mente grita em vermelho que sim,
mandando vários sinais de alerta e berrando uma pergunta.

Por que ele está fazendo isso?

– Vocês já escolheram o que vão pedir?

Um garçom alto e magro de uma forma musculosa chama minha atenção. Seu cabelo é
raspado e um sorrido treinado em seus dentes extremamente brancos nós cumprimenta e
negamos quase ao mesmo tempo, fazendo–o acenar e nos oferecer o cardápio.

– Aqui estão os cardápios, assim que se decidirem, por favor, me chame. – ele diz sem
vacilar o sorriso e abaixa a cabeça saindo. – Com licença.

Sem dizer nada, encaro o cardápio calada, ficando impressionada com o preço. Todos ao
redor não demostram espanto algum com o valor absurdo e se concentram em suas escolhas,
fazendo o silêncio reinar e eu me espantar pela naturalidade de todos em aceitar pagar tão caro
em um prato de comida.
OLIVER

Depois que o garçom voltou para recolher nossos pedidos e teve que aguardar um pouco,
pois Flora ainda não estava pronta. O jeito ao qual ela encarava o cardápio era fofo e
incrivelmente atraente e eu não era o único a perceber isso.

Tito um homem em seus trinta e poucos anos e um malandro nato, percebia isso pela
forma como ele admirava sem vergonha nenhuma na cara, Flora, mesmo eu estando ao lado dela,
o futuro homem dela. E porra, mesmo que eu não soubesse o que sentia por ela ou o que iria
acontecer com nós dois, Flora era minha, eu a queria ao meu lado, sendo como minha amiga ou
namorada, eu não me importaria, eu só queria isso, tão louco como isso parecesse.

Ao longo de minha vida nunca senti necessidade de ter alguém além do meu pai e irmão,
e tão confuso como pareça, era o que eu queria e eu não estava em um momento bom para
recusar minhas poucas vontades.

– Já sabe o que quer comer? – pergunto perto de seu ouvido e ela se afasta, levando um
leve susto que me faz ri.– Te assustei?

– Não. – ela responde envergonhada. –Para os dois.

–Sei.– respondo lentamente. – Eu vou pedir um macarrão à bolonhesa. Sei que tem várias
outras coisas interessantes, mas não sei pronunciar o nome e meu estômago gritou quando viu
isso.

Ela me encara, prendendo os lábios juntos e acena, fechando o cardápio e colocando em


cima da mesa.

– Vou querer isso também e um suco de laranja.

Assim que ela termina de dizer o garçom que aparenta está entediado caminho com o
bloco de notas vindo anotar nosso pedido, querendo nos matar para pararmos de sermos
enrolados. Ignoro isso e falo o meu pedido e de Flora, assim como todos confirmam os seus
pedidos e ele vai providenciar tudo, pensando possivelmente que o dia mal começou e que casos
como esse aconteceriam até o fim do expediente.

– Oliver.
Meu pai chama e eu olho em sua direção assistindo com irritação o que eu já percebi
desde que cheguei aqui. Tito encarando Flora, que fingia que ele não existia. Todos percebiam
isto e eu engoli em seco, apertando minhas mãos no meu jeans.

Se esse homem não fosse uns dos principais responsáveis por minhas novas corridas, eu
certamente já teria enfeitado sua cara de socos pelo seu abuso descarado. Minha maior vontade
neste momento e pegar Flora e sai tão rápido daqui quanto possível, mas fazer isso significa
perder diversas oportunidades de dinheiro e este seria muito necessário em poucos meses.

Não para mim, mas para o meu pai e Olavo. Preciso deixar eles em boas condições, se
tudo dê errado.

Engulo meu orgulho e aperto a mão de Flora, que aparenta está mais envergonhada do
que nunca, fazendo uma massagem suave em sua mão. Kane volta a fazer perguntas e mais
perguntas sobre o que eu estudava e quais eram minhas ambições ao qual eu tentava responder
de forma simples e curta, sem deixar espaço algum para mais questionamentos, que para o meu
desprazer apareciam mais e mais.

E isso certamente não era algo que eu gostaria de responder, pois o que dizia eram planos
feitos antes da realidade cruel bater com força em meu rosto e me mostrar que isso era para ser
esquecido, que não passaria de um sonho de um jovem tolo e ingênuo. Sonhos são apenas
sonhos, feito exclusivamente para te fazer dormir mais quando o seu corpo já teve o suficiente,
mesmo assim você quer dormir mais um pouco, porque a preguiça fala mais alto.

E atualmente, nem mesmo assim eu conseguia tê-los.

Sono sem sonhos, totalmente em brancos como o meu futuro.

O garçom volta pela quarta vez, fazendo o velho se calar e olhar com entusiasmo para o
seu prato escolhido, que possivelmente ele estava contando os segundos para chegar e saciar sua
fome, assim como todos ao redor.

Bem, todos menos eu.

Não sentia fome, pois essa havia sido matada pelo assunto de segundos atrás. Entretanto,
eu podia sentir o olhar do meu pai e de Flora em cima de mim. Um confuso e outro como um
aviso singelo para ao menos tentar.

Uma verdadeira merda.


FLORA

Hoje é sexta–feira e eu estou presa dentro de casa fazendo maratonas de série em uma
tentativa de evitar o tédio. Depois de ter tido uma semana exaustiva na faculdade e mil e uma
tarefas necessárias para fazer ao longo da semana, enfim ela chegou e com ela, veio o tédio.

E não que eu não goste de ficar dentro de casa, eu amo, mas em excesso é chato e está
quente, tão quente que eu mataria por um banho de piscina e olha um fato interessante, eu tenho
uma piscina gigantesca no quintal, que para o meu desprazer está suja.

E sim, seria fácil me erguer do sofá e limpar, só que isso me faria ver Oliver ou algum de
seus familiares e eu meio que estou evitando isso. E eu sei que isso não é legal de minha parte,
ou algo que eu goste de fazer ou mesmo ache que é a coisa mais madura do universo, mas eu
preciso de um tempo para pensar sobre algumas coisas e colocar outras no lugar e tê-lo presente
em meus dias, não me permiti fazer isso, pois não sou uma daquelas pessoas que sabe lidar com
mais de uma coisa ao mesmo tempo.

E além deste pequeno detalhe, tem o fato de sentir que tudo está indo muito rápido e isso
me deixa incomodada. Gosto de Oliver de uma forma que demorou semanas para gostar de
muitos de meus amigos e até namorados. E isso me incomoda, porque não é o momento.

E parece, mas não é bobagem.

Tenho dezenove anos e por decisões de meus pais, eu não trabalho. Meu trabalho é cuidar
de todas as tarefas de casa e em troca eles atendem minhas necessidades. E apesar de já ser maior
de idade, minha mãe me trata como uma criança, me fiscalizando sobre tudo e sempre arrumando
um modo de eliminar da minha vida tudo o que não a agrada e eu a conheço o suficiente para ter
certeza de que ela não aprovaria Oliver ou sua família.

Eles não aparentam ser nenhum pouco tradicional e não estou falando apenas de o pai ser
muito mais novo do que a maioria dos pais ao redor e de ser solteiro, mas sim dos carros zerados
e roupas de grife que eles usam ser ter um emprego legítimo, que eu sabia ser por suas corridas.
Entretanto, minha mãe não e ela continuaria sem saber, se eu continuasse longe deles e não a
deixasse ficar motivada a descobrir o que não deve.

E eu tenho certeza que se isso continuar, minha mãe vai virar do avesso para que isso não
demore a terminar e isso com toda certeza não será bom para ninguém, principalmente para mim.

Com o terminar de mais um episódio de Revenge, resolvo me levantar e ir limpar minha


piscina. Como já estou com um short e um top de andar em casa, vou direto pegar as coisas
necessárias para limpeza antes que a coragem vá embora.

A piscina fica na parte traseira da casa e é bastante grande para uma casa com apenas três
pessoas. Ser for para ser sincera, limpar ela não é uma das minhas tarefas favoritas, mas o
pensamento de ficar amanhã o dia todo me refrescando joga qualquer má disposição para longe.

Com tudo necessário para limpeza, coloco minha playlist animada para tocar e começo o
trabalho pesado.

Com o corpo todo dolorido, observo a mangueira esguichar água dentro da piscina. Um
pouco mais de quinze músicas e quase duas horas depois e agora a piscina estava limpa e
enchendo. Sorrio com satisfação e meu estômago ronca alto, me acordando para vida e me
fazendo agir de forma rápida ao guardar todas as coisas que usei e ir tomar um banho demorado,
daqueles bem tomados que não deixa nada além de sua pele enrugado e suas vistas embasadas.

Já poderia imaginar a sensação, mas depois que tudo estava em seu devido lugar e eu já
estava na metade da escada á campainha toca, fazendo-me gemer de desgosto e descer os
degraus, indo diretamente atender quem quer que fosse o inconveniente e me deixando
completamente sem reação quando vejo quem está ali.

Oliver.

Por essa eu não esperava.

OLIVER

– Ela ainda está te evitando? – pergunta meu irmão me tirando a atenção do noticiário.

– O quê? De quem está falando?

– Quem Oliver? – ele questiona de forma sarcástica. – Nossa vizinha gata que você não
tirou o nome da boca desde o começo desta semana.

– Ah, Flora? Ela não está me evitando. – minto de forma descarada.

Flora e eu estávamos bem e do nada não estávamos mais. Fiquei confuso com isso, mas
no exato segundo que o velho Kane começou a dizer sua história de vida e dando a entender que
seria parecido com a nossa, ela mudou, ficando cada segundo mais perdida naquela mesa
enquanto nós falávamos sem parar de negócios. Achei que pela forma ao qual ela me conheceu
aquilo não seria nada demais, mas pelo visto, estava enganado.

Deveria ter tentado concertar a situação, mas não pensei que chegasse a este ponto, de ser
evitado. Nunca havia acontecido isso comigo antes, assim como mentir para o meu irmão e sua
sobrancelha arqueada e sorriso debochado comprovam isso.

– Ela não está? Jura que você quer jogar isso logo para mim? Sério Oliver? Logo você, o
fodão e macho alfa. – minha testa enruga e meu sangue se agita. Eu sabia bem o que ele estava
tentando fazer. – Você era mais do que isso, grande homem. Entretanto, é o que dizem, nossa
essência vai mudando conforme nós crescemos e nos tornamos isso...
Termina apontando em minha direção e eu desligo a televisão, ignorando mais uma das
inúmeras notícias de assassinato que passam por ali e me levanto, tacando o controle no sofá.
Normalmente gosto de assistir ao noticiário, mas certo alguém não me deixa fazer isso nem na
porra da minha própria casa.

– O que você quer, cacete? – brando irritado. – Porque eu sinceramente acho que você
não seria imprestável o suficiente para entrar aqui e perturbar minha paz á toa. Então digo o que
quer e me deixe em paz.

Ele sorri se levantando com as mãos para cima, com o seu maldito sorriso idiota na boca.
E eu aperto minhas mãos uma na outra, tentando deter a vontade de quebrar seu nariz.

– E desde quando eu preciso de um motivo para perturbar seus dias? – questiona e eu dou
um passo à frente, fazendo–o dar um para trás e balançar as mãos em nossa frente. – Calma,
touro. Fique amigável! Não gostaria de quebrar sua mandíbula perfeitinha.

Dou mais um passo a frente e vejo seu sorriso crescer. Idiota masoquista! Ele adorava me
fazer perder o controle, não se importando em levar um belo de um soco no meio do rosto no
processo.

– Você quer apanhar? – questiono com minha voz grave pela raiva.

– Você sabe o que eu quero. – afirma. – Vá falar com ela.

E tudo volta novamente para Flora. Bufo e encaro-o, que sorri convencido, como se eu
me importasse se alguém quisesse falar comigo ou não. Bem, eu até o faço, mas acho que é o
melhor neste caso.

–Quem disse que eu quero falar com ela? – sorrindo sarcasticamente questiono.

– Sua irritação ao longo da semana como uma mocinha na primeira menarca. –


presunçosamente responde.

Qual é o objetivo de se ter irmãos mesmo? Ah, sim, nenhum, só atazanar e irritar a vida
dos irmãos mais velhos.
E são nestes momentos que eu gostaria de ser filho único.

– E vai continuar me atazanando se eu não for. – adivinho.

– Sim. – como se não fosse nada e ordena. – Para de agir como uma mocinha e vá falar
com sua garota, porra.

Exalo e o encaro, quase sem piscar. Se eu não ceder, ele irá ficar me perturbando e
possivelmente começar uma briga feia entre nós dois, que faria ambos arrependidos na manhã
seguinte e possivelmente, me deixando desconfortável ou não, iria doer mais em sua consciência
do que na minha.

A vida era uma merda.

Dou de ombros, cansado de tudo aquilo e subo as escadas, indo trocar de roupa e
agradecendo, mentalmente, por ter Olavo aqui comigo. Se a camisinha não desse o perdido em
papai pela segunda vez, ele não teria nascido e meus dias seriam tediosos.

Entretanto, essas coisas eram aquelas que eu nunca diria em voz alta. Meu irmão era um
excelente companheiro para vida, mas um bastardo ao mesmo tempo, um que não iria perder
oportunidade de atentar o resto de minha vida com coisas como essa.

Olho no espelho e coloco uma bermuda, passando a mão pelo cabelo e calçando os meus
chinelos. Hoje o dia estava quente e abafado e roupas sobre minha pele me irritavam. Como não
estava bem para ir para aula, fiquei de cueca boxer o dia todo e acho que apesar de achar que
Flora gostaria muito de ver desse jeito, seus vizinhos não compartilhavam da mesma opinião.

E eu aposto que eles não gostariam nada que eu estivesse sem camisa pelas ruas,
principalmente o pai com quatro meninas ao lado da minha casa. Mas ele iria ter que engolir o
desagrado, pois não estaria colocando uma camisa de forma alguma. Desço as escadas e olho ao
redor, percebendo ser de noite, uma bonita noite de verão. Ótima para se tomar um sorvete.

E é pensando nisto que vou até a porta de Flora, batendo na madeira e espero sentindo
desconforto por está fazendo isso. Algo tão estupido que nunca diria isso a ninguém, me faria ser
zoado eternamente se o fizesse.

Olho ao redor ansioso e volto minha atenção para porta quando ela é aberta por Flora,
que está com os cabelos presos no alto da cabeça, pele suada e corada e veste nada além de um
short e top molhados. Ela estava uma bagunça quente e adorável com os olhos esbugalhados
totalmente surpresa com minha presença.

Tal constatação é um balde de água fria nos meus pensamentos indecentes.

– Como vai vizinha? – sorrio mostrando os dentes.

– Bem. – ela sai do transe aparentando está desconfortável enquanto puxa o seu short
para baixo. – E você? Como vai e por que está aqui?
]
Ela tenta soar indiferente e isso não é agradável. Engulo em seco e a encaro, não
deixando meu aparente bom humor ir embora.

– A mesma coisa de sempre. – dou de ombros e ela acena, continuando a me encarar. –


Eu estava em casa, sem fazer nada de grandioso e percebi que hoje está uma excelente noite para
passear e tomar um sorvete por aí e me perguntei por que não?

– É um bom plano. – ela diz desconfortável. – Entretanto, não entendo como eu entro
nele.

– Simples. – afirmo. – Você vai comigo.

Seus olhos se arregalam levemente e ela me encara, quase sem piscar, me questionando,
pausadamente.

– E eu vou com você?

– Sim.

– Olha Oliver, eu realmente fico lisonjeada com o seu convite, mas eu não posso aceitar.
– diz tudo sem nenhuma pausa e continua. – Pois eu tenho que...

– Me de um motivo. – interrompo. – Um que não seja uma desculpa barata. Gosto de


sinceridade, Flora e você têm sido tudo ultimamente, menos sincera comigo. Nós nos
conhecemos há pouco tempo, mas pensei que você me considerava mais do que isso.

Ela engole em seco, olhando em minha direção como se eu tivesse acabado de empurrar
ela e eu sinto que em sua mente ela tenta de todas as formas arrumar uma desculpa ou motivo
para não aceitar meu convite.

– Eu não tenho. – ela da de ombros. – Eu só não gostei do rumo que as coisas estavam
indo. Muito rápido e eu resolvi que seria melhor cortar tudo pela raiz.

– Sem me perguntar antes ou me avisar? Tirar um tempo de seu dia para falar sobre isso
seria esforço de mais para você?

– Oliver, não é assim. – ela tenta e eu a corto de forma brusca, afastando sua mão para
longe de mim.

– Não. Tudo o que escutei foram medos bobos de uma adolescente insegura, que me fez
de idiota sem pensar duas vezes. Obrigado, Flora, por te me feito de palhaço, eu realmente
aprecio que brinquem deste modo comigo.

Assim que termino de dizer, sinto o sangue pulsar em minhas veias e me viro em
disparada, indo diretamente para minha casa com passadas rápidas e ignorando a voz de Flora
atrás de mim, gritando o meu nome.

Eu realmente poderia esperar tudo nesta altura do campeonato, menos ser feito de bobo
quando sinto pela primeira vez em meus vinte e um anos algo maior do que tesão por uma
mulher.

É, acho que tem certas coisas que não mudam.

Tipo a vida te foder sem piedade quando menos espera.

FLORA
Tentei chamar Oliver várias vezes e em todas fui ignorada. Não conseguia entender como
tudo acabou desta forma, mas com toda certeza eu não deveria está sentido isso, essa agonia que
parece sufocar por vê-lo me da às costas. Sei que desde o principio queria isso, mas agora tudo o
que gostaria é de poder voltar atrás e fazer tudo diferente.

Meu distanciamento não foi nada maduro, muito menos correto. Brinquei com toda boa
vontade dele e o fiz de bobo, quando ele claramente só queria está perto de mim e mesmo que o
conheça em tão pouco tempo, sei que isso não aconteceu muitas vezes em sua vida e posso
apostar que fui a primeira que fez isso com ele.

E com toda certeza não me sinto feliz sobre isso.

Exalo em voz alta e entro em casa, trancando a porta e vou tomar meu banho. Evito
pensar demais, pois fazer isso só traria mais e mais problemas e arrependimento e acho que já
sinto o suficiente disso por hoje.

O meu banho é rápido e longo e aproveito para lavar meu cabelo, dando mais trabalho
para mim e me deixando ocupada por um tempo. Assim que termino de fazer todo o necessário,
saiu do meu quarto e atendo o meu telefone que toca sem parar, encontrando diversas ligações
perdidas do meu pai.

– Alô? – pergunto sentando–me na cama com o celular no viva voz.

– Minha Flor, já estava quase ligando para polícia. – ele diz rapidamente. – Por que não
me atendeu antes? Estou te ligando desde cinco horas da tarde.

– Estava limpando a piscina. – explico. – Aconteceu algo? Nem você ou mamãe


apareceram por aqui até agora. Normalmente vocês saem cedo nas sextas.

Preocupação começa me bater conforme falo, fazendo-me lembrar deste pequeno grande
detalhe. Como poderia esquecer isso?

– Com a gente nada. – afirma respirando audivelmente. – Mas não posso dizer o mesmo
de Joaquin. Ele sofreu um acidente está tarde e não está nada bem. Sua tia está desesperada e eu
e sua mãe estamos aqui com ela no hospital, esperando notícias. Talvez eu vá para casa buscar
algumas roupas para mim e sua mãe. Dependendo da situação, um de nós terá que ficar com ela
no hospital e o outro com as crianças na casa dela.

– Entendi. – digo apenas chocada. –Me deixe informada sobre a situação, por favor.

–Deixarei querida. – ele respira. – Beijos.

– Beijo. – e desliga.

Tia Louise é irmã mais velha de minha mãe e perdeu seu marido há pouquíssimo tempo,
menos de cinco meses e seus filhos e ela ainda estavam se acostumando com a ideia e como todo
o adolescente confuso, Joaquin estava fazendo isso da única maneira que podia, se rebelando e
deixando titia de cabelos em pé. Espero que ele saia desta e que isso só traga para si
ensinamentos. Odiaria ter que enterrar meu primo e dizer as suas duas irmãzinhas que seu irmão
foi encontrar com o seu pai no céu.

Laís e Taís não mereciam perder duas pessoas queridas em tão pouco tempo, muito
menos tia Louise.

Jogando o celular em cima da cama, levanto e começo a me secar, passando os meus


cremes e colocando um short jeans, uma blusa de mangas curtas branca com um desenho simples
do Mickey em preto e um vans branco. Passo perfume e penteio meu cabelo todo para trás,
deixando–o solto e molhado em minhas costas.

Ficará como uma palha, mas não irei escovar ele. Não estou com vontade de fazer isso.

Pego minhas coisas e desço as escadas, olhando tudo ao redor para ver se está tudo certo
e caminho até a casa do lado da rua, batendo na porta daquele ao qual acabei de deixar nervoso.

A vida é uma caixinha de surpresas.

Não demoram muito a me atender e eu me sinto um pouco mais aliviada ao não encontrar
ele ainda, mas sim Olavo, que me encara de uma forma confusa e surpresa, deixando bem ciente
que não me esperava me encontrar por aqui.

Não é o único.
Ele não diz nada e simplesmente abre mais á porta, apontando para as escadas.

– Ele está no quarto dele. – afirma. – Vá até lá e resolvo a merda que você fez. Já
considero você minha cunhada e odiaria está enganado. – e entro, parando bruscamente quando
ele agarra meu braço e continua de forma firme. – Ele é um pouco dramático e parece ser
invencível, mas em questões de sentimentos, é tão inocente como uma criança. Resolva isso de
uma vez; acertando tudo ou dando um ponto final, tanto faz, só não enrole ele.

Ele fecha á porta e passa por mim, deixando–me de boca aberta com sua seriedade
enquanto se joga no sofá. Respiro fundo e subo as escadas, parando temerosa na porta do quarto
de Oliver e batendo nela três vezes seguidas.

Espero um pouco e bato novamente, não tendo respostas. Tomo coragem e entro sem sua
permissão. Seu quarto está tão bagunçado como da última vez, tendo roupas e tênis espalhados
pelo chão e copo em cima de uma mesinha, que está cercado de papeis e canetas. Sua cama não
estava arrumada e mesmo que isso me de um leve nervoso, sorrio por constatar o qual
bagunceiro ele é.

Olho ao redor e chego perto da cabeceira de sua cama, pegando um quadro com a mão e
quase o deixando cair quando ele pergunta bem atrás de mim, quase se colando ao meu corpo.

– O que você está fazendo aqui?


OLIVER

Depois de sentar sobre minha cama e ficar quieto até o nervosismo passar, levantei-me e
fui tomar um banho gelado. Não sei quanto tempo passou, mas me sentia mais calmo e pronto
para finalizar o dia. Ainda estava descrente de como agi nos últimos momentos, mas o que mais
me surpreendeu foi à forma como consegui me acalmar.

Normalmente eu só conseguia socando coisas ou dirigindo em alta velocidade.

Fecho o chuveiro e pego a toalha, secando-me de forma rápida e enrolando a mesma na


cintura. Jogo meus cabelos para trás com os dedos e abro á porta do banheiro, entrando na minha
zona pessoal e parando bruscamente no meio do caminho.

O que diabos ela está fazendo aqui?

De costas e olhando para algo em minha cabeceira, está Flora, com o seu cabelo jogado
em suas costas, molhando sua blusa branca. Vejo um short curto jeans, mostrando suas pernas
macias e sinto o meu pau dar sinal de vida quando ela se abaixa empinando sua bunda. Engulo
em seco e me liberto do transe da confusão, caminhando de forma silenciosa até está atrás dela e
perguntar perto de seu ouvido.

– O que você está fazendo aqui?


Ela se assusta e deixa cair o porta-retrato no chão, saltando levemente e ficando de frente
para mim. Seu rosto está sem maquiagem alguma e seu olhar estava tão amedrontado e confuso,
que me deixou sem reação.

– Eu não sei. – confessa confusa.

Sinto minha testa franzir e ela desvia o olhar, não aguentando olhar dentro dos meus
olhos. Ela se abaixa para colher os cacos dos vidros do meu antigo porta retrato, que meu irmão
havia me dado de presente. Fiquei sem jeito em recusar e tive que colocar em algum lugar,
quando ele me cobrou recentemente por ele. Entretanto, ele não me fazia bem, de diversas
formas, pois me fazia pensar e ter esperanças e isso era algo que eu não gostaria no momento.

Jogo esses pensamentos para escanteio e presto atenção em Flora que está praticamente
de quatro em minha frente.

Maldição.

Ela parece ser terrivelmente suculenta nesta posição e sangue corre diretamente para o
meu pau. Posso sentir a toalha se esticando em minha frente e desvio o olhar a deixando recolher
os cacos em paz e indo colocar uma bermuda folgada para dormir. Entretanto, mudo de ideia
quando escuto um leve gemido e um barulho leve de vidro caindo no chão.

Corro em sua direção e a levanto, pegando-a de surpresa e encaro sua mão ferida,
segurando-a.

– Não é grande coisa. – afirma tentando puxar e eu seguro, mandando um olhar em sua
direção. – É serio, não é grande coisa.

– Estou vendo. – o corte aconteceu no centro de sua palma e apesar do sangue que saia,
poderia ver que não seriam necessário pontos. – Acho que não vai precisar de pontos. Mas
vamos lavar para ter certeza.

Ela arregala os olhos e respira fundo, me seguindo até o banheiro. Ligo a torneira e deixo
a água cair, enfiando sua mão debaixo do jato e olho o seu rosto, assistindo ela aperta os lábios
juntos e fechar os olhos apertados.

– Está doendo tanto assim? – pergunto brincalhão, mas sentindo um incomodo. Que
merda é essa?

– Não. – ela afirma olhando para mim e depois para baixo. –É só que queima um pouco.

Aceno e tiro sua mão debaixo da água, olhando direito para o corte e confirmando o que
eu já sabia. Sem pontos para ela. Solto sua mão e pego papel higiênico, dando para ela e indo
atrás do meu kit de primeiros socorros. Pego um spray antisséptico e puxo a mão que ela secou,
espirando o remédio e rindo levemente de sua careta.

– Você adora rir da desgraça alheia. – resmunga.

– Talvez. – dou de ombros. – Não precisa de um curativo, é só um corte. – e aponto para


ela o vidro. – Use isso e verá que em breve ficará como nova.

Seus olhos encaram os meus sem desviar, fazendo-me desviar entre sua boca e seus
lindos olhos castanhos. Ela não usava nenhuma maquiagem e sua pele ressaltava o seu saudável
brilho natural e a tentação de sues lábios carnudos me fazia engolir em seco e criar vontades
indecentes pela sua aparente inocência. Inocência essa que parecia cair por toda ela, de uma
forma que me fazia desejar corrompe-la e marca cada centímetro de sua pele e alma, em todas as
formas que um homem poderia marcar uma mulher.

– Na minha casa tem remédio. – ela diz, sendo novamente a primeira a desviar.

– Eu sei que sim. – afirmo abrindo sua outra mão e colocando o remédio lá. – Mas fique
com esse, ele é excelente para machucados. Parece curar mais rápido.

Terminando de dizer, passo por ela e caminho até o meu closet, ligando as luzes no
processo. Abro o mesmo e pego uma boxer, colocando-a por cima da toalha e depois uma
bermuda por cima. Jogo a toalha de qualquer forma em cima da cama e sem dizer nada, me
abaixo catando todo o vidro e jogando os cacos junto com o resto do porta retrato dentro da
lixeira, tirando apenas a foto e a guardando sem olhar dentro da gaveta.

Pelo menos consegui o que eu queria, me livrar desta moldura ridícula.

Levanto quando está tudo visivelmente limpo e volto para o banheiro, lavando minhas
mãos enquanto sinto o olhar de Flora arder em minhas costas. Seco minhas mãos na toalha de
mão e encaro–a, que parece completamente perdida.
Bem, não é só ela.

Quando voltei para casa depois da resposta inusitada que ela me deu, levei isso como um
aviso do destino para ficar longe e gostando ou não iria fazer isso, mesmo que derrubasse
completamente meu desejo de descobrir o que ela tinha de diferente das outras mulheres, pois
para mim era difícil entender como alguém tão simples e tão diferente das garotas que fico me
fez sentir isso, essa vontade incontrolável de ficar perto e fazer o meu melhor para ficar com ela.

E eu posso ter mil e um sonhos e abrir mão de todos, mas esse eu não queria abrir mão; o
de um dia, entender o diferencial de Flora, aquilo que a fazia tão diferente de todas aos meus
olhos.

Entretanto, até que esse dia chegue e se um dia ele chegar, terei um longo caminho pela
frente.

– O que você está fazendo aqui, Flora? – volto a questionar.

Ela da de ombros e respira fundo.

– Eu não sei. – afirma apoiada na parece e olhando para o chão. – Depois que você saiu
me senti mal e fui tentar agir como se não fosse nada, mesmo que meu coração dissesse o
contrário. Mas uma ligação me deixou agoniada e quando eu fui perceber, eu estava aqui, na sua
porta e invadindo sua casa.

– O que dizia o seu telefonema?

– Meu primo. – ela diz confusa. – Ele sofreu um acidente e está em um estado não tão
agradável no hospital. O seu nome é Joaquin e tem minha idade. Ele sempre foi um bom menino,
divertido e de bem com a vida. Sonhava em ser veterinário, mas com a morte de seu pai, ficou
atordoado e fez coisas erradas, entrando em um caminho que o levou para uma cama de hospital.

Seu olhar estava longe e eu engoli em seco, indo até ela quando percebia que lágrimas
estavam prestes a cair por seus olhos e a puxei para os meus braços, pressionando-a contra mim,
tendo os seus braços me apertando forte em minhas costas. Quando sinto as primeiras lágrimas
suas em minha pele, sento na cama e a puxo para o meu colo.
Seu cheiro de frutas vermelhas é inebriante, mas não consigo sentir nada além de um
aperto por vê-la nesta situação. O tempo parece passar de forma lenta e não sei dizer com
exatidão quanto ao certo, mas sei que demorou muito até ela se acalmar.

– Quem era aquela na foto com vocês? – fico rígido e ela afasta sua cabeça do meu
ombro, olhando para o meu rosto enquanto ainda continua no meu colo. – Era sua mãe?

– É, é a minha mãe.

–Pela forma que você havia falado, pensei que não queria saber nada dela, mas ainda sim,
você tem uma foto exposta perto de sua cama.

– Foi um presente do meu irmão. Ele gosta de lembrar-se dela e sonha em achar ela de
novo, tentar uma reaproximação.

– E você não?

– Não. – nego sentindo–me perto de explodir. Odiava falar sobre isso. – Eu sou dois anos
mais velho que ele, vivi mais tempo ao redor dela antes dela fugir e apesar de entender
perfeitamente o lado dela, sei que ela não gostaria de nos ver. – e olhando dentro de seus olhos,
completo. – Nós somos o passado vergonhoso dela, Flora.

Ela fica sem palavras e diz depois de segundos em silêncio.

– Eu estava enganada e acredito que você esteja.

– Sobre o quê?

– Muitas coisas. – sem desviar o olhar. – Mas a que eu estou falando é visível; você não
parece em nada com o seu pai, é a cara dela e tenho certeza que ela adoraria ver o belo homem
que se tornou e deve se perguntar como você está hoje em dia.

Olho para ela, sem dizer nada e a beijo, não por concordar com suas palavras, mas sim
para fazê-la parar de falar sobre isso. O beijo é rápido e marcante, deixando–me com uma fodida
vontade de quero mais, que não cedo e a pergunto, jogando á vontade de lado, pois se não
parasse iriamos para um lado que não quero neste momento, não quando ela está tão sensível.
– Você gostaria de ver um filme comigo?

– Eu adoraria. – sorrindo docemente, ela afirma.

FLORA

Em um colchão com roupas de cama confortáveis, me encontro em um estágio letárgico


entre o sono e a consciência, sendo totalmente impulsionados pela preguiça e alimentados pelo
quarto escuro. Atrás de mim consigo sentir um corpo forte e quente, com um braço pesando
apertando minha cintura. Não sabendo separar muito a realidade da inconsciência, penso que isso
se trata de um sonho bobo. Entretanto, quando meu celular começa a tocar e eu tento sair da
cama para levantar, a realidade vem á tona.

Eu dormi com alguém.

O desespero me desperta e meus olhos se abrem com espanto, fazendo-me olhar de um


lado para o outro com pavor e ao reconheço o local, sinto um pouco de alívio instantaneamente e
me lembro de ontem à noite. De como Oliver e eu demoramos a escolher o filme e deitamos na
cama com as luzes apagadas para assistir confortavelmente, acabando por cair no sono antes que
o filme acabasse.

Meu celular toca novamente e tento tirar o braço de Oliver de cima de mim, ganhando
um olhar confuso seu. Ele olha ao redor com o rosto amassado de sono e relaxa ao perceber do
que se trata, me soltando e puxando meu travesseiro para ele.

Levanto e pego o meu celular, atendendo no último instante.

– Alô? – pergunto sem saber de quem se trata e Oliver apoia a cabeça no travesseiro me
encara.

– Estava dormindo?– pergunta e depois completa. –Pelo visto sim, desculpe por isso,
minha flor.

– Tudo bem, papai. – digo em voz alta, mas para Oliver do que para mim. – Já era hora
de levantar.

– Bem, como é fim de semana nada te obriga a acordar cedo e entendo por que dormiu
um pouco mais. Peço desculpas por ter te acordado, mas seu primo está na mesma e eu tenho um
compromisso que não posso faltar. Sua mãe está indo diretamente para o hospital para ficar com
sua tia. Estou quase saindo daqui para passar em casa rapidamente e me arrumar, mas como
estou bem atrasado, gostaria de saber se você poderia buscar as meninas, para distraí-las de toda
essa confusa.

– Posso sim. – afirmo. – Qualquer coisa você me deixa lá e eu volto de Uber.

Oliver se senta na cama e diz um “eu te levo” mudo.

– Acho que da para fazermos isso. – meu pai afirma. – Se não, você vai e volta de Uber.

–Ah, certo. Mas acho que uma pessoa pode me levar e buscar. Vou ver direitinho com ela
e qualquer coisa eu faço isso.

– Pessoa? – pergunta desconfiado.

– Um amigo, pai. – desvio o olhar de Oliver.

– Amigo, sei. – diz com a mesma desconfiança e depois diz. – Vou entrar no carro agora!
Vejo-te daqui a pouco.

– Ok, beijos, pai.

– Beijos, minha flor. – e desliga.

08:33 Am.
Não é tão cedo assim, mas não deixa de ser trágico para um fim de semana. Bloqueio o
celular e bocejo alto, jogando o mesmo na cama e puxando meus cabelos para um coque
enquanto Oliver me olha atentamente com uma cara de sono, que mesmo tendo acabado de
acordar, não o deixa feio, mas sim como um ator em um filme ou série de televisão.

Enquanto eu devo está maravilhosa com remela e baba no rosto.

Nada demais.

– Aonde vamos? – perguntou com a voz rouca.

– Na casa da minha tia, pegar minhas duas priminhas. – começo. – Terei que distrai-las e
evitar que elas percebam algo.

– Tarefa difícil.

–Que eu espero conseguir cumprir. – afirmo e pergunto. – Você tem algo para fazer hoje?

– Acho que não. Mas preciso consultar minha agenda. – termina de forma debochada. –
Não, não tenho nada ou não tinha. O que tem em mente?

Ele se senta e encaro o seu peitoral, fazendo uma careta involuntária quando a ideia fica
clara em minha mente. Com toda certeza, ele deve ter coisas melhores para fazer. Entretanto,
essa preocupação parece boba quando ele joga a coberta longe e eu percebo algo.

– Você emagreceu. – afirmo e ele da de ombros, sem importância, dizendo apenas.

– Sai da academia. – e questiona. – O que vamos fazer hoje?

– Tenho que cuidar das meninas, distrai-las e ontem á noite limpei a piscina. Pensei que
poderíamos passar o dia lá. Assim você me ajudaria a entreter elas e aproveitaria o sábado
ensolarado.

– É uma boa ideia. – acena. – Tem churrasqueira lá?


– Tem sim. Meu pai ama um churrasco.

–Meu irmão também. Importa–se se ele for? Assim nós fazemos o churrasco enquanto as
belas damas se divertem na piscina.

– Sem problemas. – sorrio. –Eu acho que tem algumas coisas lá, pois papai vive fazendo.
E se o seu pai quiser ir, ele pode também.

– Não, ele saiu ontem. Não vai voltar tão cedo. É só a gente mesmo. E não se preocupe
com as coisas, além de eu mesmo ter dado a ideia, Olavo está com vontade de comer isso e
estava marcando de ir a uma churrascaria.

– Depois vemos isso então. – ao ver a hora digo. – Preciso me arrumar para pegas as
meninas.

Ele acena em meio a um bocejo e levanta da cama, mostrando nada além de uma boxer
em seu corpo magro e sarado.

–Vou te levar até lá embaixo e ir tomar um banho rápido.

– Ok.

E saímos, encontrando a casa silenciosa e escura, um sinal claro de que Olavo estava
dormindo. Não falamos mais nada e quando estou prestes a sair porta á fora, ele segura minha
mão e me beija rapidamente, deixando–me atordoada e confusa, quando me solta.

– Quando estiver pronto, te chamo.

Apenas aceno e saiu mais do que depressa de sua casa, indo até a minha, para me arrumar
para ir buscar as meninas. Antes, mando uma mensagem rapidamente para Jesy, chamando-a
para cá e mandando–a trazer sorvete, depois vou até a piscina, ficando contente por ela está
praticamente cheia.
O caminho até a casa de minha tia é rápido e é cercado por um silêncio agradável, sendo
preenchido pelas músicas do rádio e o cantarolar suave e desafinado de Oliver, que me trazia
tanto conforto e um sentimento bom dentro de mim.

Tão bom que quando enfim chegamos, gostaria que não tivesse sido tão rápido.

– Você quer vir comigo? – questiono.

– Você vai demorar?

– Acho que não.

– Eu vou te esperar aqui então. – afirma. –Se caso demorar, vou te ligar.

– Certo. Farei o possível para não demorar. – digo e saiu, batendo á porta e sentindo os
olhos dele em minhas costas.

Aperto a campainha e sem demorar uma amiga da minha tia me atende, com um rosto
cansado e os olhos inchados, mas ainda sim sorrindo levemente para mim. Engulo em seco e
sorrio também, entrando e sentido o frio da casa e um aperto se estalar no meu coração.

Joaquin, por favor, seja forte e volte para casa!


OLIVER

Assim que deixo Flora e as gêmeas em casa, entro rapidamente na minha casa e vou
direto para o quarto do meu irmão. Bato três vezes na porta e ele não demora muito a vir me
atender, com uma cara amassada de sono e a revolta explícita em seu rosto.

– O que você quer? – raivosamente me questiona.

– A piscina da casa de Flora está cheia e nós estamos indo ao mercado comprar algumas
coisas para o churrasco.

– Estamos?

– Sim. – afirmo. – Você tem cinco minutos para se arrumar ou ficará sozinho sem fazer
nada por aqui. Pelo resto do dia. – e dou as costas. – Não demore o relógio não para e minha
paciência tem limites, você sabe.

Ao descer as escadas o escuto reclamar e sua porta bater com força. Vou à cozinha e bebo
um pouco de água, puxando o meu celular do bolso e olhando minhas mensagens, ignorando a
maioria e indo diretamente para as de meu pai.

Como estão as coisas por aí? Já estão acordados? Não se esqueça do remédio!
Você me ouviu. Né, Oliver?

Tudo está bem por aqui, não á necessidade para se preocupar. E sim, para as duas
perguntas.– respondo.

Fico feliz em saber disso.

Sei que sim. – Respondo.

E bloqueio o celular, bebendo mais um pouco d’agua e escutando as pisadas duras de


Olavo descendo as escadas, quebrando o silêncio de forma brusca. Ele vai direto para a geladeira
e fecha a mesma, catando uma tangerina da fruteira.

Levanto e guardo a água, pegando as chaves e colocando-as dentro do bolso, indo para o
lado de fora.

– Não vai pegar roupa? – ele pergunta me seguindo.

– Não. Já coloquei dentro do carro está manhã.

– Madrugou? – questiona com malícia.

– Talvez sim, talvez não. Isso não é mesmo da sua conta.

– É, acho que isso foi um não. – afirma. – Mas pelo ritmo da coisa, não demorará muito a
acontecer.

Ignoro–o e entro no carro, esperando-o entrar e colocar o cinto de segurança. No


caminho, conversamos sobre diversas coisas sem sentindo, como sua professora gostosa de
matemática e as aulas tediosas de física. Os assuntos não demoravam muito a ser interrompidas
por ele reclamando de está de pé a está hora da manhã de um sábado.
Não demora muito do mercado para casa de Flora e com tudo em mãos, esperamos até
Flora nos atender com a parte de cima de um biquíni vinho, um short jeans e um rabo de cavalo
preso no alto de sua cabeça. Engulo em seco e entro com as sacolas, com o meu irmão andando
atrás de mim e Flora fecha á porta, entrando em minha frente para segui-la.

Sua bunda balança em cada movimento, sendo impossível desviar o olhar. E Olavo me da
um tapa na nuca, deixando-me ciente de sua presença e me fazendo andar quase colado em Flora,
para tirar qualquer chance de ele ter a mesma visão. Ele percebe isso e bufa uma risada.

Passamos pela sala e olho de relance assistindo as duas meninas loirinhas sentadas no
tapete assistindo desenho.

– Chegaram cedo. – Flora diz. – Pensei que demorariam mais um pouco.

– O mercado não estava tão cheio. – diz meu irmão e completa desgostoso. – É sábado,
então deveriam todos estar dormindo, coisa que eu gostaria de está fazendo.

Assim que ele termina de dizer, entramos em uma cozinha arejada e grande, tão arrumada
e limpa, que parece nunca ter sido usada. Coloco as duas bolsas em cima da mesa e Olavo
também.

– Pare de agir como uma menininha e supere está merda.

– Oliver! – Flora chama minha atenção, colocando as mãos no balcão e me encarando


com um olhar mortal. – Não xingue! As meninas têm seis anos de idade, são novas demais e
curiosas sobretudo. Não quero que elas aprendam palavrões por causa de sua língua solta.

– É Oliver. – zomba meu irmão, atraindo o olhar de Flora para ele. – Que coisa mais feia.

– Cala boca. – Flora manda e eu mordo o interior da minha bochecha segurando o riso,
pela cara de tacho que ele faz. – Isso vale para você também. Ou pensa que não sei que xinga
mais do que um marinheiro bêbado.
Ele fica chocado e desvia o olhar para o chão, sussurrando.

– Para uma gatinha ela arranhão de mais.

– O que disse? – ela vira para ele segurando uma faca, o fazendo recuar para trás de mim,
ficando tão branco como cera.

– Nada. – sussurra.

– Ah, sim. – ela sorri pegando uma laranja e começando a descascar. – Pensei ter
escutado algo. Você quer uma?

– Não, obrigado. – ele diz ainda olhando para ela com desconfiança e avisa saindo de
mansinho. – Vou pegar meu celular em casa. Na pressa, acabei esquecendo. – e completa quando
eu olho para ele. – Não vou demorar.

– Certo. – aceno ainda olhando para ele, deixando bem claro que se necessário o buscaria
em casa e ele revira os olhos.

– Já volto. – afirma.

Vejo–o voltando pelo caminho de entrada e segundos depois bater a porta. Olho
novamente para Flora e ela chupa um pedaço de laranja, deixando escorrer um pouco pelos
lábios e gemendo levemente.

Engulo em seco e desvio o olhar, pensando em qualquer situação menos na que eu acabei
de assistir.

– Você quer uma?– ela pergunta, chamando minha atenção.

– Não, obrigado.

– Elas estão muito boas. – afirma dando de ombros. – Nem estava com vontade de comer,
mas como tive que descascar e picar para as meninas, me deu vontade. Dai resolvi comer uma.

– Elas parecem ser quietas.

– E são. Elas só chamam quando querem comer ou precisam de algo. Adoro cuidar delas,
pois se tiver um filme da Barbie e a barriga delas estiver cheia de comida, é como se elas nem
estivessem aqui.

– A maioria das crianças não são assim. Pelo o que dizem, é quando quietas de mais que
devemos nos preocupar.

– Eu já escutei muito isso. Mas como eu fui quietinha e nenhum pouco bagunceira
quando pequena, vou acreditar que elas são só na delas mesmo e não é como se eu não ficasse
dando uma olhada de vez enquanto.

Assim que termina de dizer vai lavar as mãos e alguns talheres e pratos que sujou e eu
aproveito essa brecha para tirar as coisas das sacolas. Tirando primeiro os refrigerantes e o
sorvete e ela logo aparece em minha frente, pegando os refrigerantes e colocando no frízer e me
encara de forma estranha quando olha para o sorvete.

– Está calor. Um sorvete vai bem. – dou de ombros.

– Eu sei que sim, mas já mandei Jesy trazer.

– É sorvete e está quente. Olavo come que nem um trator, você vai ver que esses dois
potes que trouxemos e o de sua amiga irão sumir em meio tempo.

– Dois. – afirma e respira fundo. –Tudo bem, se caso sobrar vocês levam de volta.

Resolvo ficar quieto enquanto ela termina de guardar, voltando depois para me ajudar a
tirar as coisas das sacolas. As carnes eu levo para pia e tiro do saco, sentindo Flora se mexer de
um lado para outro e resmungar.

– Tão exagerado. Não usaremos metade dessas coisas.– e segundos depois afirma mais
alto quando a campainha toca. – Vou abrir! Já volto!
Aceno e ela sai rapidamente, escutando segundos depois gritos femininos e muitas
risadas, que me fazem bufar uma risada.

O dia seria longo.

FLORA

O dia foi longo.

E extremamente divertido.

Oliver e Olavo são com toda certeza a dupla de irmãos mais cômica existida. Não houve
um minuto sequer com os dois no mesmo lugar, sem que houvesse patadas e muita zoação
envolvida. Era visível o amor que ambos sentiam um pelo outro, tendo tanta espontaneidade
envolvida, que dava para ver que esse era o normal de cada dia.

Fui um dos focos de Olavo para irritar seu irmão e mesmo nos momentos que Oliver
parecia extremamente irritado, Olavo apaziguava tudo com piadas que faziam o nervosinho
revirar os olhos e Jesy e eu rimos como duas loucas varridas.

Os irmãos ficaram loucos pelas gêmeas e não havia nada que elas precisassem pedir mais
que uma vez, para eles atenderem correndo. Laís escorregou e caiu de bunda no chão, chorando
mais pelo susto do que por qualquer coisa e ambos entraram em desespero, brigando para pegar
ela no colo e acalmar a menina, que já estava calma e só fazendo draminha. Ela estava adorando
a situação, estado feliz por cada segundo que ganhou atenção dos dois e manhosa, assim como
Taís, que começou a chorar só para ficar ao lado dos dois.

Coração de manteiga, é o que ambos são.

Agora, eu estava deitada na cama, cansada e tendo a mente trabalhando em colocar ideias
e mais ideias negativas sobre o estado de Joaquin. E se não bastasse isso, tinha o fato de ter uma
culpa querendo crescer dentro de mim, por ter me divertida e rido quando minha tia estava
chorando pelo meu primo enfermo.

Eu era uma pessoa ruim por isso?

Viro–me na cama e olho para o canto da parede, agarrando uma almofada e a apertando
com firmeza. Eu já estava de banho tomado e as duas meninas estavam dormindo no quarto de
hospedes ao lado. Meu corpo e mente precisavam de descanso e nada estava me impedindo de
dormir.

Bem, nada exceto Oliver que estava na sala assistindo um filme na televisão.

Fecho os olhos e jogo os pensamentos sobre a situação de Joaquin para o lado, ele sairia
dessa. É forte e teimoso como ninguém e duvido que ele deixe a morte ganhar. Ele lutaria antes
disso, de certeza.

Pego o meu celular e entro nas mensagens, perguntando para minha mãe:

Alguma novidade?

– Atrapalho. – Oliver pergunta tirando minha atenção do celular.

– Nunca. – respondo sorrindo e me sento na cama, o assistindo na soleira da porta,


olhando em minha direção com um sorrido ladino e um pote de sorvete em suas mãos. – O que
você está esperando para entrar?

– Seu convite. – diz de forma sarcástica e entra no quarto, fazendo–me enrugar a testa ao
perceber que ele não se encaixava em nada aqui.

Meu quarto era um quarto de garota, com paredes pintadas de lilás, móveis brancos e
cortinas floridas, que combinavam com a colcha da minha cama. O quarto era pequeno, pois o
tinha desde que me conheço por gente e ele me fazia perceber isso sem esforço, com sua altura e
largura e a masculinidade que exalava.

– O que você tanto pensa?


Assim que ele pergunta, me afasto e deixo um espaço para ele se sentar ao meu lado em
minha cama de solteiro.

– Que eu terei que ficar um bom tempo sem tomar sorvete, caso o contrário, ficarei
parecida com uma bola.

– Sério que era isso em que pensava? – aceno. – Pura lorota. Temos que aproveitar a vida
enquanto estamos vivos. Seja comendo algo ou passeando por aí. Lembre-se que tem muita gente
que não pode fazer isso, pois está preso em uma cama de hospital.

Automaticamente penso em Joaquin e pego uma das duas colheres em sua mão.

– Precisava mesmo jogar a realidade no meu rosto? – mal humorada enfio uma colher no
sorvete de morango e enfio na boca.

– Precisava. – afirma obscuro. – E farei isso sempre que achar necessário.

– Que maravilha.

– É. – sorrindo ladinamente, ele afirma.

Pego mais uma colher e ele faz o mesmo, comendo com vontade. Não sabia ao certo se
antes ele não comia tanto assim perto de mim para manter aparência, mas hoje eu o vi comer
bastante, de uma forma que me deixou impressionada. Não por ele ter comido tudo aquilo, mas
sim porque eu nunca tinha visto ninguém comer daquela forma antes.

– Você ama sorvete de morango. – afirmo.

– Desde que comi pela primeira vez. – diz sorrindo como uma criança boba. – Algumas
pessoas acham enjoativo, mas é o meu sabor favorito não só de sorvete, mas de bolo, biscoito,
suco e iogurte.

– De tudo então.

– Basicamente.
Pego mais uma colher e enfio na boca, entornando um pouco ao lado de fora dos meus
lábios, coloco a mão no queixo, tentando impedir que caísse na minha roupa e passo a língua ao
redor de meus lábios.

O sorvete não chega a cair em minha roupa ou mesmo mão, mas eu ainda podia senti
minha boca suja e quando tentei me levantar, Oliver agarrou meu braço e disse:

– Deixa que eu te ajudo. – e sem que eu pudesse dizer uma palavra, seus lábios descem
em meu queixo.

Sou pega desprevenida e arregalo os olhos levemente, sentindo uma energia se criar em
meu corpo e minhas mãos agarram seus bíceps. Ele vai subindo e tira todo o rastro do sorvete,
indo direto para os meus lábios e os tomando como se fossem seus, fazendo–me gemer e fechar
os meus olhos de prazer.

Um arrepio desce por minha espinha e sinto minha calcinha úmida conforme ele segura
meus cabelos, com certa firmeza e beija minha boca com desejo e loucura, querendo mais e mais
pegar tudo de mim e ainda não sendo o suficiente. Sua barba de um dia acaricia minha pele, me
deixando louca.

Mole de desejo subo minhas mãos em sua nuca e deito na cama, o puxando para cima de
mim e enlaçando minhas pernas ao redor de seus quadris. Seus lábios descem pelo meu pescoço,
arranhando meu pescoço com sua barba e me fazendo ofegar. Puxo seus cabelos trazendo sua
boca até a minha e ele sussurra.

– Meu anjo sabe o que quer. – com a voz rouca de desejo.

Aperto minhas pernas em seu quadril, aproximando–o de mim e sinto sua dureza no
centro de minha intimidade.

– Você quer ser fodida por mim, meu anjo?

Olho em seu rosto, encarando dentro de seus olhos verdes, que estão cercados de desejo e
o puxo para mais um beijo, descendo minhas mãos por suas costas e enfiando-as por baixo de
sua camisa. Acaricio a pele exposta com minhas unhas, deixando–o arrepiado e o fazendo me
agarrar mais para si.
Suas mãos fortes sobem por minha lateral e eu puxo o tecido de sua camisa, subindo-o
até a metade do caminho e parado bruscamente quando escuto uma voz doce e infantil chamar
meu nome.

– Flora, tia Flora.

Arregalo os olhos e Oliver faz o mesmo, pulando de cima de mim e indo correndo para o
banheiro enquanto eu, com o rosto corado e toda amassada, não tenho outra opção a não ser
pegar ela no colo quando ela sobe na cama e me abraça.

Quanto será que ela viu?

Entretanto, isso é a última das minhas preocupações quando sinto suas lágrimas em
minha pele e ela sussurra tremulamente.

– Eu sonhei que o Quin estava morando no céu com o meu papai. – e soluça me
implorando. – É mentira, não é?

– É sim, meu amor. – a afasto e prometo. – Seu irmão em breve estará bom. Ele está
doente agora, mas muito em breve ele vai estar aqui, perto de você.

– Ele está doente? – aceno olhando para os seus olhos desesperados.

– Sim, mas ele vai ficar bem.

– Você me promete? – diz olhando para baixo e apontando o seu dedinho para mim. –
Pode prometer?

Engolindo em seco, mostro meu dedo para ela, que o prende com o seu e me abraça.
Lágrimas querem descer pelo meu rosto e eu as engulo, pedindo secretamente a Deus que não
me fizesse quebrar está promessa.

Eu esmagaria o coração de Taís se o fizesse.


Em um piscar de olhos a semana havia começado e de uma forma lenta e agoniante, ela
foi se arrastando até o dia de hoje, sexta–feira. Como meu primo ainda estava no hospital, não
me restou outra opção a não ser me organizar para conseguir dar toda atenção necessária para as
meninas e ainda sim conseguir dar conta das minhas coisas e apesar de ter sido cansativo, tudo
deu certo, graças ao Oliver e a Sra. Garcia.

A minha maravilhosa e prestativa vizinha fez questão de bater na minha porta domingo
de tarde, se oferecendo para ficar com as meninas enquanto eu estudava de manhã. No começo
pensei em não aceitar, mas depois percebi que aquilo foi uma ajuda enviada de Deus, pois desde
que acordará naquela manhã estava tentando descobrir o que faria com elas.

Com as meninas passando as manhãs na casa dela e tendo Oliver vindo todas às tardes
ficar com a gente na minha casa, minha rotina foi seguida normalmente. Tendo êxito em deixar
as meninas se sentirem confortáveis e até mesmo felizes apesar dos atuais acontecimentos.

Ao contrário de Taís, Laís não tinha sequer uma ideia do que estava acontecendo e estava
amando a temporada na casa de dona Garcia e na minha. Entretanto, ela deixava bem claro sua
preferencia toda vez que eu ia buscar elas e ela se despedia de seu amiguinho felino, bolinha,
olhando para mim com um bico maior do que uma tromba.

Dona Garcia se ofereceu para trazer o gato para minha casa, mas papai é alérgico e o
bichinho possivelmente não ia ficar só em uma área da casa, soltando pelos e mais pelos ao redor
e fazendo a alergia dele atacar.

E bem, ele não ficava muito simpático quando não estava se sentindo bem.
– Tio Oliver. – escuto Laís chamando baixinho, tirando minha atenção do filme.

– Sim princesa? – ele responde tão rápido quanto possível, me fazendo rir levemente.

– Você gosta da tia Flora? – sua pergunta me faz arregalar os olhos em espanto e abro a
boca para responder, mas fecho quando escuto a resposta de Oliver.

– Sim, gosto muito dela.

E eu de você. Respondo mentalmente, sorrindo como uma boba.

– Se você gosta dela e ela gosta de você, por que não se casam?

Ele joga a cabeça para trás e ri com vontade, fechando os olhos no processo e a puxando
para um abraço. Meu queixo está no chão e vergonha me inunda e não posso agradecer o
suficiente por esta deitada de costas para televisão, parecendo está dormindo com Taís agarrada a
mim.

Essa menininha

– Princesa. – ele começa depois de um tempo. – Casamento é uma coisa muito


importante, algo que não devemos brincar nunca, pois ele não é algo que podemos desmanchar
com certa facilidade e ele só pode ser realizado com duas pessoas que se amam muito e que
sabem que esse é o momento certo para ambos. Além disso, existe algumas etapas antes de
chegar nele e sua tia Flora e eu ainda estamos no comecinho.

– Vocês são namorados? – pergunta afobada.

– Quase isso. – afirma ele. – Acho que preciso conhecer os pais dela antes de me
considerar isso.

Sua resposta assim como toda conversa me faz engolir em seco e quase pulo do sofá
quando o meu celular toca, me tirando da bolha que me encontrava com a conversa nada
agradável dos dois.
Tiro os braços de Taís de mim e coloco uma almofada para ela abraçar, indo sem olhar
para Oliver até o canto da sala e tirando o celular do carregador com rapidez. Aceito a chamada
de minha mãe e ando em direção à cozinha.

– Oi?

–Flora, tenho uma noticia muito boa para te dá. – ela diz com a voz soando animada. –
Seu primo vai para casa amanhã.

– Jura? – pergunto com surpresa. – Que notícia boa! Pelo estado que o papai me falou
ontem, pensei que demoraria um pouco mais.

Meu pai era o único que estava me dado notícias sobre o que estava acontecendo sobre o
estado do meu primo. Eu gostava de pensar que o resto estava muito ocupado e preocupado para
avisar, mas segundo o que meu pai havia me falado, o acidente não foi inofensivo e deixaria
algumas sequelas.

Joaquin havia quebrado sua perna direta em diversos lugares, tendo que colocar ferros em
alguns destes. O lado direito foi o mais prejudicado e não só por sua perna, mas também pela
rachadura no osso do quadril e nas costelas quebradas, que perfuraram um dos seus pulmões,
deixando a situação bastante complicada.

– Ele deve ter exagerado. – diz bruscamente. –Não vou mentir e dizer que o acidente não
foi grave, mas do jeito que seu pai é, fez parecer algo maior do que realmente é. Seu primo vai
precisar de um bom tempo em cima de uma cama para se recuperar e espero que isso sirva para
ele pensar em suas ações, mas o pior já passou e isso que importa.

– Até está bem novamente, tempo é o que não vai faltar para isso.

– Sim. – afirma e continua. – Arrume as coisas das meninas, gostaria que elas estivessem
em casa para dar boas vindas ao irmão. Ele não tem falado e tenho certeza que isso irá alegra–lo.
Joaquin ama essas meninas.

– Assim que saber a hora, avise-me, que irei o mais cedo possível para lá.
– Certo. Está combinado então. – e se despede. – Fique com Deus e tenha juízo!

– Isso eu sempre tenho. – brinco e escuto ela bufar, desligando o celular.

Encaro o aparelho na minha mão e me viro, dando de cara com Oliver, que tem os braços
cruzados em frente ao peitoral magro e forte. Posso ver as ondulações dos músculos por sua
camisa e as engrenagens de seu cérebro trabalhando pela expressão seria que ele ostenta em seu
rosto bonito.

– Você está aí há muito tempo? – questiono andando até a geladeira e pegando uma
garrafa d’água. – Quer uma?

– Sim para ambas as perguntas. – desencosta da parede, parando no lado oposto que eu
estou do balcão. – Vim atrás de você quando levantou quase caindo.

– Está exagerando. – nego indignada.

– Talvez. – da de ombros zombeteiro. – Alguma novidade do seu primo?

– Ele vai ter alta amanhã. – e continuo. – Minha mãe ligou avisando.

–Bom, isso é realmente bom.

– Sim. Pensei que ele ficaria um bom tempo lá, pela gravidade que aparentou ter, mas ele
em breve irá para casa e terá tempo o suficiente para colocar sua mente no lugar. – digo
pensativa e dou de ombros. – Algumas pessoas têm sorte.

– E outras só conhecem o azar. – distante e pensativo, ele afirma de forma obscura. –


Bem, estou com fome. Que tal uma pizza?

Sua sugestão não me parece ser algo que ele realmente esteja com vontade e nego
veemente com minha cabeça. Paro de olhar para ele e sem dizer nada, tiro pão do armário e
pergunto com humor, arranco um sorriso bonito que alcança seus olhos verdes.

– Que tal uns hambúrgueres caseiros?


OLIVER

– E novamente eu te acordo cedo em um sábado de manhã. – Flora diz abrindo a porta da


sua casa e dando espaço para eu entrar. – Acho que preciso te agradecer de alguma forma.

Fecho a porta atrás de mim e puxo sua mão, pegando-a desprevenida e fazendo–a bater
em meu peitoral. Seus olhos arregalam e uma respiração entrecortada sai pelos lábios carnudos
ao mesmo tempo em que seus olhos descem para os meus, se fechando quando desço minha boca
sobre a dela.

Minha pele se arrepia e meu pau acorda para vida enquanto sinto com prazer a textura
suave de seus lábios contra os meus. Minhas mãos passeiam por suas costas e suas mãos agarram
meus bíceps cravando suas unhas enquanto sua língua luta sedenta por mais assim como a
minha, com urgência e paixão, de forma possessiva e com fome. Seus gemidos suaves de prazer
e o aperto de suas unhas em meus braços me deixam louco, querendo cada vez mais.

É uma tortura ter que finalizar o beijo e a deixar partir, assistindo a vermelhidão se
arrastar por sua pele pálida, seus lábios inchados e seus olhos brilhando de excitação, mostrando
visivelmente o qual molhada e receptiva ela estaria para mim, fazendo minha imaginação voar ao
imaginar ela nua com suas pernas abertas e sua boceta sedenta para receber minha boca ou meu
pau, ambos fodendo–a de tal forma que ela perderia sua mente.

– Eu vou...vou ver se está tudo arrumado para irmos. – sua voz sai ofegante e ela não olha
diretamente para mim, subindo rapidamente para o segundo andar.

Não consigo evitar sorrir com sua timidez e balançar minha cabeça enquanto vejo-a
desaparecer nas escadas. Desvio o olhar e olho ao redor enquanto ando até a sala. A casa de
Flora e seus pais grita aconchego e destacava o ambiente familiar. A casa era cercada de tons
neutros com quadros nas paredes e retratos da família ao redor.

Uma família normal e feliz.

Fotos de Flora era o que mais estava espalhado ao redor, desde a parede da escada a
estante da sala. A sala não possuía muitos moveis, tendo um bom espaço para circular e não
deixar uma visão sobrecarregada. Uma sala confortável com um sofá grande e duas poltronas
pequenas cinzas ao lado; um tapete com uma mesinha pequena no centro e a estante em frente
com tons semelhantes.

Ainda na parte debaixo, o local possuía um banheiro e uma cozinha completa e a mesa de
jantar estava na varando do lado de fora, tendo duas pequenas cadeiras de ferro com almofada,
que ficavam ao lado da porta que separava a área de serviço da sala de jantar improvisada.

Uma porta de vidro separava a piscina e a churrasqueira no quintal, deixando a casa


luxuosa e não tão visível o pequeno espaço que era perfeitamente dividido. É impossível que eu
não compare minha casa da dela, sendo maior em um tamanho que não era aproveitado e tendo
um conforto totalmente desorganizado.

Bufo e sorrio balançando minha cabeça. Que diabos eu estou fazendo? Importando-me
com decoração e organização quando ao menos sei manter meu quarto em ordem?

Uma movimentação no andar de cima me tira dos meus devaneios e vejo Flora descendo
com várias bolsas, fazendo–me encontrar ela no meio do caminho e pegar todas para colocar no
andar debaixo.

– Falta só mais uma e vamos embora. – afirma subindo correndo e me dando uma visão
rápida de sua calcinha preta embaixo do seu vestido florido.

Merda! Não acredito que estou agindo como um adolescente que nunca viu uma boceta
de verdade na vida.

Eu não me reconheço.

É o que penso quando coloco as bolsas no porta-malas do carro e vejo Flora fechando a
porta e vindo com as gêmeas saltitantes ao seu redor. Ela chega até mim com um sorriso doce e
entrega uma mochila, dando–me um beijo no pescoço e sussurrando no meu ouvido.

– Pare de me olhar dessa forma. – ela manda com um sorrido na voz e afirma. – Está
parecendo um tarado.

–É só parar de me tentar, que eu paro de te olhar como um tarado. – digo de forma firme
e ela me olha sem entender nada.

– Mais eu não estou fazendo nada. – da de ombros com confusão indo abrir as portas
traseiras da minha Honda Civic prateada. Não era tão boa como minha Ferrari, mas tinha um
modelo bonito, sendo um bom carro para família e não atraindo tantos olhares para cima de nós,
como a Ferrari e a BMW.

Fecho o porta-malas e as meninas vêm saltitantes até nós, vindo me abraçar e depois
sendo colocadas por sua prima na parte de trás do carro.

Assim que Flora entra, dou partida no carro e a vejo falar com animação com suas
priminhas, que não escondem a animação de estarem indo para casa e ver sua mãe e seu irmão.
Flora não conversou com elas ainda e só saberiam um pouco do que aconteceu quando
chegassem lá e a mãe de Flora contasse para elas os últimos acontecimentos.

Segundo Flora, sua mãe saberia dizer as palavras exatas.

– Tio Oli, minha mamãe vai adorar te conhecer. – diz Laís.

– Vai mesmo. – concorda Taís.

Duvido muito que elas estejam certas. Penso.

– Claro que vai. – com um sorrido ladino afirmo. – Afinal, como ela não gostaria de um
cara tão fantástico como eu? Sua prima tem que ficar de olho, se não é capaz dela me querer para
ela.

– Cuidado com o tombo, iludido. – Flora diz sem rodeios.

– Eu? Iludido? – pergunto. – Não! Sou é muito maravilhoso e você uma sortuda por está
comigo.

– Se você diz. – revira os olhos e debocha sorrindo. – Quem sou eu para dizer o contrário.

As meninas olham atentamente para a gente e eu reviro os olhos estacionando o carro no


meio fio, ficando nervoso. Pela insistência de Flora, não consegui dizer não e acabei tendo que
aceitar ficar com ela aqui e ver Joaquin. Não acho que ele vá querer conhecer alguém agora e
duvido muito que sua família também queira, mas o olhar de cachorrinho da Flora e a forma
esperançosa que ela me pediu me fez dizer nada além do sim.

E bem, agora teria que agir normalmente e não deixar o nervosismo óbvio que sentia por
está prestes a conhecer as pessoas mais importantes de Flora em uma única sala, visível.

É, isso não parecia algo muito agradável.

FLORA

Assim que chegamos mamãe já estava lá, ajudando a amiga de minha tia a arrumar a sala
para receber Joaquin. As meninas quando viram os balões e a fachada gritaram em animação,
nos primeiros segundos, porque depois que elas olharam ao redor e não encontraram sua mãe ou
irmão, perceberam que algo havia acontecido e logo começaram a chorar.

Oliver entrou no mesmo segundo. Eu estava abaixada tentando acalmar as meninas junto
com minha mãe, mas senti seu olhar sobre mim. Apesar da situação tensa, não demorou muito
para minha mãe perceber sua presença e questionar em meio à choradeira das duas meninas.

– O que o vizinho está fazendo aqui, Flora?

Abro minha boca para responder, mas a fecho quando uma das gêmeas consegue tirar o
olhar matador que minha mãe me envia, fazendo–a se levantar enquanto me informa autoritária.

– Essa conversa só começou. – e manda. – Ajude–a arrumar as coisas!

Respiro fundo e levanto-me, indo falar com a amiga da minha tia, que conversa
animadamente com Oliver e demostra desagrado quando interrompo a conversa dos dois.
– Vejo que já se conheceram. – afirmo.

– Sim, eu vim falar com este adorável rapaz. Ele não parecia estar muito à vontade com o
olhar de sua mãe em cima dele.

Não era o único.

– Ah, sim. – digo e o encaro envergonhada Oliver. – Sinto muito por ela, ela não gosta
muito de surpresas e eu me esqueci de falar sobre você.

– Está explicado. – a loira diz. – Bem, vou deixar vocês conversando. Preciso finalizar
um bolo, que preparei para a chegada de Quin. É o favorito dele e espero que isso o deixe feliz.

Sua esperança e receio eram visíveis em suas palavras e me fazem ter uma certeza,
Joaquin precisará muito de nossa atenção, se está tão mal emocionalmente como aparenta.

– Eu também. – suspiro. – Você precisa de ajuda?

– Não, não. – rapidamente responde. – Está tudo sobre controle.

Tento dizer algo, mas ela me corta se despedindo e indo para cozinha. Volto minha
atenção para Oliver e o vejo me encarando fixamente, quase sem piscar, completamente perdido
em seus pensamentos.

– Você tem certeza de que é uma boa ideia que eu fique? – ele questiona saindo do transe
e me encarando. – Se não for, não vou ficar chateado em ter que ir embora. É um momento
familiar, Flora. Acho que tudo o que sua família menos quer no momento é me conhecer.

Encaro-o quase sem piscar e penso sobre suas palavras. Ele foi o único que esteve
comigo todo esse tempo, me ajudando com as meninas enquanto eu cuidava delas sozinha, quase
não vendo os meus pais dentro de casa. Ele viu minha preocupação e me ajudou a não deixar a
peteca cair quando as meninas tentavam descobri o que havia de errado.

Ele agiu melhor do que muitos familiares e merecia está aqui e conhecer a todos.
– Tenho certeza. – afirmo. – Você nunca me atrapalha e tenho certeza que ninguém vai
destratar você. É importante para mim e independente se gostarem ou não de você, eles vão te
tratar bem, por mim.

Escutando minhas palavras, ele da de ombros.

– Se é assim que quer. – sorri. – Eu fico.

Dou um beijo em seus lábios de forma rápida e o solto rapidamente, olhando para o chão
quando escuto um celular tocando e me lembro de guardar as roupas e brinquedos das meninas.

–Oli, juro que vou te recompensar. – prometo e ele arqueia uma sobrancelha. – Me ajuda
a carregar as bolsas até o andar de cima?

– O que você não me pede sorrindo que não faço chorando? – ele questiona depois de me
encarar por longos segundos. – Espero que essa recompensa seja boa.

Suas palavras soam com malícia e um sorriso matador de calcinha se acende em seu rosto
bonito, deixando seus olhos verdes brilhosos e escuros de desejo. Engulo em seco e abaixo o
olhar sentindo o meu rosto quente e minha calcinha molhada e escuto sua risada máscula e
profunda enquanto o mesmo se junto a mim, pegando todas as bolsas e me seguindo até o andar
de cima.

Assim que Oliver e eu arrumamos tudo das meninas, resolvemos descer, pois segundo a
movimentação no andar debaixo, eles já haviam chegado. Agarro a mão de Oliver e paramos no
topo da escada quando vejo Joaquin sentando em uma cadeira de rodas com um par de óculos
escuros nos olhos, machucados no rosto e boa parte do corpo e gesso na perna e no braço direito.
As suas irmãzinhas, estavam perto dele e receosas sobre o que fazer, acabando por ele estender a
mão para uma delas e ela ir até ele.

Lágrimas queriam cair, mas as engoli, puxando Oliver para descer comigo e atraindo
olhares em nossa direção. Paro em um canto e vejo os irmãos interagirem e a mãe no meio,
controlando as emoções e tentando não fazer as meninas se desesperarem. Sem que eu perceba,
meu pai chega ao nosso lado, atraindo minha atenção.

– Esse é o seu tal amigo? – questiona meu pai encarando nossas mãos juntas.

Abro minha boca para responder, mas a fecho quando Oliver diz primeiro que eu,
deixando–me sem palavras e de queixo no chão.

– Sou Oliver Bennett. – se apresenta. – Seu vizinho e futuro genro.

OLIVER

Assim que desci as escadas com Flora, percebi alguns pares de olhos nos encarando e
principalmente, um de certo senhor que poderia apostar ser o pai dela. Sua mãe claramente havia
detestado minha presença e nem sequer disfarçou, seu pai por outro lado encarava tudo com
curiosidade.

Assim que descemos os degraus da escada, Flora caminhou para um canto qualquer,
tendo sua atenção concentrada na cena das irmãs vendo o irmão depois de uma semana sem
saber notícias dele e ela não viu quando o seu pai veio sutilmente até nós, tentando nos decifrar
com os olhos.

Bom, ele não era o único.

Com um olhar que nos observava como um falcão, ele faz sua presença ser notada e ao
nos questionar sobre mim, não demoro a responder deixando pai e filha chocados e de olhos
levemente arregalados, sendo o pai o primeiro a sair do choque inicial.

– E o que falta para o senhor cara de pau se tornar o meu atual genro?

– Sua permissão.

Minha resposta faz Flora ficar cada vez mais chocada e nos encarar como se eu fosse de
outro mundo. Seu pai me estuda com o olhar e apenas balança sua cabeça, como se tentasse
entender o que diabos eu tinha na cabeça para ser tão direto.

– Eu... eu vou tentar falar com o Quin. – Flora diz gaguejando, estando extremamente
envergonhada. – Se me dão licença.

E sai, nos deixando sozinhos em um silêncio estranho.

– Sou James Collins. – ele fala apontando sua mão em minha direção e dando um aperto
firme que correspondo. – E acho que precisamos ter uma conversa. – completando. – Em
particular.

– Como o senhor quiser. – sem desviar o olhar.

– Ótimo. Siga–me até o lado de fora. – manda. – Esse não é um assunto para
testemunhas.

Com as mãos no bolso ele olha ao redor e vai andando até a entrada. Olho de relance para
as pessoas na sala e vejo quase todas concentradas em Joaquin, dando uma atenção que ele não
estava gostando. Entretanto, tinha uma senhora, que não tirava os olhos de mim e me encarava
como o pior ser humano existente, com repulsa visível em seus olhos castanhos.

E eu não poderia culpa–lá, não quando eu estaria fazendo o mesmo se estivesse no lugar
dela.

Não era a pior pessoa do mundo, mas também não era a melhor e sabia que ela poderia
perceber isto.

Paro de encara–lá e olho de relance para Flora, que está falando com o primo,
emocionada e me viro andando na direção ao qual James saiu, encontrando-o encarando sua
frente, sem um ponto específico e eu paro ao seu lado, fazendo o mesmo.

– Pensei que não viria. – afirma.

– Não fui educado para fugir de assuntos importantes. – dou de ombros.


– Então Flora é importante para você? – questiona encarando–me sem brincadeiras.

– É. – respondo sem pensar. – Flora é importante para mim.

–O quanto ela é? – ele pergunta. – O quanto minha filha é importante para você? E quero
que seja sincero, eu aprecio mais uma verdade cruel do que uma mentira adocicada e acredite, eu
saberei identificar se é verdadeiro ou não, em suas palavras.

– Não gosto de mentiras. – afirmo com seriamente. – Não vou mentir e dizer que já amo
Flora e que não viveria sem ela. Mas posso afirmar para o senhor, que apesar do pouco tempo,
sinto que nós podemos funcionar, independente do tempo. Não sei se vamos acabar hoje, amanhã
ou daqui a alguns anos, só sei que independente do que aconteça, quero que ela seja feliz e farei
o possível e o impossível para que isso aconteça.

– Bom. – diz apenas. – Não mando na vida de Flora, eu só peço que ela faça certas coisas
ou dou conselhos, mas não mando na vida dela, ela faz o que ela quer. Então, não adianta muito
que eu de permissão ou não a você, o que vale é o querer dela.

– Então isso é um tanto faz?

– Não. –nega. –Poucos homens fazem isso, Oliver. Vem até o pai para pedir a permissão
de namorar sua filha e eu aprecio isso, assim como aprecio sua sinceridade. Particularmente,
entre os dois últimos namorados de minha filha, você é o que vejo mais firmeza. – e continua. –
Só que como falei o que vale é à palavra dela, não minha.

– Entendo. – aceno odiando escutar sobre namorados e Flora na mesma frase.

– Ela aparece gostar de você. – da de ombros. – Conheço minha filha suficiente para
dizer isso e ainda tem você aqui, em um momento familiar. Flora não traria qualquer um para
esse momento, principalmente tendo a mãe dela aqui.

Encaro-o e ele apenas encara o nada.

– Eu percebi isso.
– Que bom. – ele diz. – Só fique atento sobre o rumo que vocês vão tomar e como vão
levar isso. Minha esposa consegue ser meio pirada quando se trata da nossa filha e até mesmo
controladora. Aceitar o que vocês tenham vai ser difícil para ela.

– Acho que posso lidar com isso.

– Bom. – afirma e me olha. – Espero mesmo que sim. – e olha novamente para frente,
começando a se virar. – Vou lá dentro falar com o pessoal. Foi um prazer conhecer você, Oliver.
Espero que seja tão confiante em suas ações como aparenta ser com suas palavras. Pode ser
necessário em algum momento.

– Igualmente, senhor.

Falo sem saber se ele escutou e fico olhando o nada, vendo um garotinho andar de
bicicleta com as rodinhas enquanto sua mãe o observa de perto, vigiando para que não se
machuque. Isso prende minha atenção de tal forma, que só saiu do transe quando escuto meu
celular tocar no bolso e ler as seguintes mensagens.

Tudo certo para essa noite?

Sim. Por que pergunta? – questiono.

Você sabe bem. Qualquer coisa me avisa, meu campeão tem que está preparado em
todos os sentidos para ganhar.

Não há motivos para perguntar sobre isso, você sabe bem que se não for para ganhar eu
nem saiu de casa.

Palavras, palavras.

No meu caso não fica só nas palavras.

Eu sei, fui eu que te criei.

Resolvendo não responder e guardo o celular no mesmo bolso, olhada para frente e vendo
a jovem mãe consolar o garotinho que chora por ter caído. Ele nem sabe e talvez demore a
perceber, mas ele é um sortudo por ter ela ao seu lado, uma sorte que nem todos podem
compartilhar.

Uma sorte que eu não tive.

Deixando os pensamentos deprimentes de lado, volto para dentro da casa, percebendo


que Joaquin parecia um pouco alegre. Conheço os familiares educados de Flora, que não saiu do
meu lado um segundo sequer, nem mesmo quando Joaquin e eu entramos em uma conversa que
parecia entedia–lá.

E isso parecia tão certo, que desejava ter isso pelo resto dos meus dias. Sua presença ao
meu lado.
FLORA

Olho de um lado para o outro no corredor, colocando só minha cabeça para


fora da porta. Ao perceber que o quarto dos meus pais está silencioso e com a porta
fechada, saiu encostando á minha e andando de uma forma silenciosa, com os sapatos
na mão.

Depois que conseguimos fazer minha tia prometer que iria ligar se precisasse
de qualquer coisa, partimos para casa. Eu no carro de Oliver e os meus pais no carro
de meu pai. Enquanto ele dirigia em direção ao nosso bairro, pensativo e um pouco
aéreo, ele pediu para que eu acompanhasse–o em uma festa que ele teria que ir e eu
prontamente aceitei.

De princípio, comecei a pensar que não seria certo sair e me divertir com o
meu primo estando em uma cama e depressivo, mas isso logo passou. Ele está vivo e
se recuperando, não seria justo parar minha vida por causa de seus erros.

Termino de descer as escadas de forma rápida e silenciosa, meus pais estavam


exaustos e logo dormiram, mas eu não sabia qual seria a reação da minha mãe a me
ver fugir para noite como um gato.

Tranco a porta guardando as chaves na bolsinha e calço os meus tênis brancos,


andando com cuidado até o carro de Oliver, para não cair de cara no chão pelo cadarço
desamarrado. A porta se abre e entro na luxuosa e confortável Ferrari, fechando a
porta e olhando para Oliver, que me encara com um sorriso ladino.
– Estava pensando que não viria mais.

– Eu tive que sair escondida. – encaro o chão do carro envergonhada. – Minha


mãe está em casa e não está com um humor muito bom. Se me visse saindo ia fazer
uma cena desnecessária, que iria me fazer sentir mal e não querer sair.

Ele me olha piscando e não diz nada, apontando para o cinto de segurança.
Desvio o olhar e me abaixo amarrando os meus tênis ainda sentindo seus olhos sobre
mim. Depois que amarro os cadarços, subo colocando o cinto de segurança,
escutando–o dizer antes de dar partida.

– A propósito, você está linda. – sorrio. – Não entendo muito de roupas, mas
adorei o vestido que está usando. Mesmo tendo certeza que ele ficaria mil vezes
melhor no chão do meu quarto, com você nua, ele não deixa de ser bom de olhar.

Encaro–o envergonhada e engulo em seco, desviando os olhos do seu sorriso


sem vergonha e do brilho sedutor de seus olhos verdes. Escuto sua risada de longe e
olho pela janela, olhando as luzes coloridas dos carros passando com rapidez ao redor.

E sorrio ainda pensando nas suas palavras. Meu vestido nem era grande coisa,
só um pouco chamativo. Batia no meio das coxas e ia até meu cotovelo, sendo sem
decote algum; é justo e tem tons de degrade entre roxo, lilás, rosa e prata em
lantejoulas. Comprei em uma promoção de uma marca famosa e nunca o tinha usado,
por causa das lantejoulas, que o fazia muito chamativo.

Confesso que só o usei por estar sem outra opção, pensando até mesmo em
desistir de sair, mas Oliver fez tanto por mim, que um pedido simples como esse não
poderia ser negado. Então o coloquei mesmo assim, fazendo uma maquiagem suave e
deixando meus cabelos soltos, tendo combinando com um tênis branco simples,
tentando não chamar mais atenção do que o vestido faria.

Um locutor cita o nome de uma rádio famosa e em seguida as horas, fazendo–


me olhar espantada para Oliver e sorrir ao perceber que música começou a tocar.
Power das Little Mix, ao qual tento cantar de forma imediata.

Calma lá, não, você não se curvou, curvou,


Não sou o tipo de garota que te segue por aí,
Só porque você tem um belo, belo, opa, pacote,
Não quer dizer que eu vou deixar você sair por cima, meu bem.

– Belo pacote? – questiona malicioso e revirou os olhos. – Que letra poética.

Oh, eu sou uma máquina quando faço isso,


Eu pego fogo, igual gasolina, quando faço isso,
Só porque você tem um belo, belo, opa, pacote,
Não quer dizer que eu vou deixar você sair por cima, meu bem.

– Música é mais para se divertir, se quer ler algo poética, vá ler um poema. – respondo e
deboche marca seu rosto. – É uma música imponderada, é puxado para o feminismo, mas não
diminui gênero nenhum. Deixa-me em paz!

O homem é você, mas eu tenho, eu tenho, eu tenho o poder,


Você faz chover, mas eu faço, eu faço, eu faço cair os céus,
Você deve saber que sou eu quem está no controle,
Eu deixo você controlar comigo, contanto que você não esqueça.

Quem tem o poder?


Eu tenho, eu tenho o poder,
Eu tenho, eu tenho o poder,
Eu tenho, eu tenho o poder,
Pare!

– Acho que certo alguém tem certo favoritismo declarado. – diz debochado e
continua malicioso. – E tem razão, até que a música não é ruim. Fala explicitamente
sobre pau, boceta e sexo. Eu não sei se o meu pau pode ser considerado bonito, mas
tenho certeza que sua boceta é e eu irei adorar ver você fazer cair os céus.

Mortificada. É como estou, engulo em seco e tento agir naturalmente,


entretanto ele não estava facilitando minha vida.
Minha vez,
Eu faço parecer fácil,
Tictic, boom, como gasolina,
Sim, eles me chamam de Lamborghini,
Porque eu sei o quanto eu valho,
De zero pra cem
M–m–meu corpo os fazem gaguejar,
Ligo o meu motor, aperto o botão,
Porque eu vou chegar lá primeiro.

– Você não sabe ainda, mas está música foi feita para nós dois.

– Cala boca. – mando–o e ele sorri.

– Estou falando sério meu anjo. – comenta com falsa seriedade. – Você será a
melhor maquina que vou dirigir.

– Ridículo.

Aumento o som e o faço sorrir com vontade, pegando o recado no ar e ficando


calado. Escuto minha música parecendo perceber as insinuações mais do que antes e
me sinto envergonhada por isso, aumentando ainda mais quando me lembro das
insinuações de Oliver. De fato, escutar essa música nunca será a mesma coisa.

{***} Não se engane, eu te prendi,


Nos braços de um animal,
Te faço pensar que eu sou toda inocente,
Mas espera só até eu te levar para casa,
Se você não sabe meu bem, você deveria saber,
Sou eu quem está no controle,
Motocicleta, Motocicleta, Motocicleta, Motocicleta,
Moto, moto, moto, moto, moto, moto, moto, moto, moto, moto, uh. {***}
– Estou doido para ver se essa parte é verdadeira. – afirma. – Tanto que você
não faz ideia.

Engulo em seco e sinto minha calcinha molhar com sua insinuação. Fico
calada na minha e continuo a cantarolar como se ele não tivesse dito nada, quando na
verdade, escutei tudo, tendo um efeito um tanto alarmante na minha libido.

Eu estava excitada, enquanto escutava Little Mix.

Seria cômico se não fosse trágico.

Depois de passarmos uns dez minutos por uma rua escura e deserta, enfim chegamos ao
que um dia foi uma fábrica de roupas de banho muito popular e lembrada até hoje pela maneira
trágica que foi fechada.

O dono era um francês muito educado e gentil, que trabalhava com punhos de ferro e
fazia dela sua vida, colendo cada vez mais os frutos. Seu irmão mais velho e imaturo trabalhava
em um cargo inferior, pois seu pai o conhecia bem e sabia que logo ele iria acabar com todo o
patrimônio se fosse deixado em suas mãos.

Ele era um ser infeliz com um vício pela bebida e em um dos porres, com a inveja em
alta, resolveu que se aquilo não poderia ser seu, não seria de mais ninguém, colocando fogo em
todo o local. O mesmo depois de ver que nada mais poderia ser salvo, foi para sua casa e de
forma cínica, acordou cedo e foi trabalhar, como se nada tivesse acontecido.

E ao chegar lá, teve uma surpresa terrível, descobrindo que não só destruiu o patrimônio
de sua família, mas matou seu irmão e a noiva grávida dele. Câmeras o haviam gravado fazendo
aquela atrocidade e foi preso, não demorando mais do que um mês para cometer suicídio.

Ninguém sabe se foi por arrependimento ou egoísmo. E tudo o que sei, é que esse lugar
me dá calafrios.

– Não tinha lugar melhor não? – questionei conforme o carro foi passando pelas pessoas.
– Essa localização não é muito conhecida por festas darem certo.

–Mais da maioria costuma ser bem produtivas. – da de ombros estacionando e me


encarando. – Não pretendo ficar muito tempo aqui, só vim mesmo conseguir um dinheiro e fazer
um tempo, que você dirá se será longo ou curto.

– Você vai correr hoje?

– Vou. – afirma me encarando. – Preciso do dinheiro e essa é uma das melhores festas
para isso. Não teremos risco da polícia aparece de surpresa e aqui é deserto e espaçoso o
suficiente para não acontecer acidentes.

Assim que termina de dizer, tira o cinto de segurança e sai do carro, fechando sua porta e
dando a volta.

– Não gosto disso. – sussurro para mim mesma. – Não gosto nadinha disso.

Tiro o cinto de segurança e Oliver abre a porta do carro, sorrindo enquanto conversa com
um homem alto e esguio, com cabelo platinado e sorriso bonito. Saiu do carro e Oliver aciona o
alarme, me apresentando para o seu amigo.

– Este é Benjamin, um amigo de longa data do meu pai. – passa o braço pela minha
cintura. – Benjamin, está é minha garota, Flora.

– Olha só, que sortudo é você. –ele afirma sorrindo de uma forma que alcança seus olhos
azuis. – Prazer senhorita paciência, porque é necessária muita para aturar este garoto.

– De verdade. – aparece Otto, dando um tapa nas costas de Benjamin e encarando seu
filho seriamente. – Ainda bem que chegou garoto. Já está quase chegando a hora, se demorasse
mais um tempo não poderia participar.

– Eu estava esperando Flora. – deu de ombros.

Otto olha para ele e balança a cabeça, olhando para mim e sorrindo de uma forma doce,
sendo o oposto do modo que encarava seu filho. Sorrio de volta, meio constrangida por Oliver ter
colocado a culpa em mim de forma tão descarada.
– Olá, Flora. – começa. – Está linda, como sempre. – e olha para o seu amigo. – Já viu
que filho da puta sortudo é meu filho, Ben?

– Sim, ele realmente é. – afirma de uma forma que me deixa envergonhada. – Irá levar
ela como mascote?

Sinto meu cenho franzir e olho para Oliver que parece está viajando em seus
pensamentos. O pensamento não parece agrada–ló, deixando bem claro isso em suas palavras,
mesmo que ele as diga sem importância.

– Se ela quiser. – deu de ombros.

– O que seria um mascote?

– É um acompanhante que se senta ao lado do motorista na corrida. – Benjamin explica.

– Isso não é perigoso?

Risadas de algumas pessoas são escutadas ao longe, mas as ignoro e encaro os três
homens a minha frente.

– Dependendo do motorista, é. – Otto afirma querendo rir. – Mas tem que ter em mente
que até dormindo temos a possibilidade de nunca mais acordar. E modéstia a parte, meu filho
aprendeu com o melhor e sabe perfeitamente o que está prestes a fazer.

Encaro Oliver, que arqueia uma sobrancelha questionando–me e desafiando–me a aceitar


o que estão propondo e engolindo em seco, dou minha resposta.

– Parece divertido. – começo. – Vou confiar nas habilidades dele.

O sorriso convencido que Oliver tinha sobre si, foi embora e ele olhou preocupado para
mim, como se eu estivesse louca enquanto os dois homens ao redor comemoravam. Por que
minha escolha não o agradou?
OLIVER

Eu não deveria tê-la desafiado ou deixando meu pai chegar perto dela com o seu amigo
sacana. Com toda fodida certeza Flora não iria aceitar essa loucura se eu não tivesse feito isso,
mas em minha defesa eu pensei que ela não aceitaria a provocação e iria recusar.

É, acho que para quem acha que tem certeza de tudo, eu não tenho dado muitas bolas
dentro. Principalmente sobre Flora, que se provou ser uma caixinha de surpresas e não brincou
quando aceitou a proposta de ser minha mascote.

Com o cinto de segurança afivelado, ela estava do meu lado dentro da minha Ferrari
vermelha.

Não era minha situação favorita. Não nesse momento.

– Está pronta para adrenalina? – questiono.

– Como nada antes. – ela responde decidida.

Sua aparente certeza acertava meu orgulho aumentando meu ego e diminuindo minha
preocupação. Tudo daria certo, eu era um excelente motorista, um dos melhores da nova geração
dessas ruas, essa certeza crescia em cada corrida e tudo acabaria bem. Flora confiava em mim e
eu faria de tudo para que ela não se arrependesse disso.
Não apenas hoje, mas enquanto eu vivesse.

– Então segure firme, pois hoje o solo vai tremer.

FLORA

Seus olhos verdes possuíam um brilho diferente e um sorriso orgulhoso e uma certeza,
que só uma pessoa com muito confiança sobre si, poderia dizer, estava presente nas palavras de
Oliver. O sorriso sumiu quando uma buzina foi escutada, mas os olhos permaneciam brilhantes
quando ele se virou para frente com seriedade e confiança, tão concentrando que quase não
piscava.

Desvio os olhos de seu rosto e encaro nossa frente, engolindo em seco e encostando meu
corpo no acento do carro. Uma garota ruiva estava em nossa frente com um short jeans
minúsculo, um sutiã de couro vermelho e uma bota com um salto gigante. Seus cabelos eram
longos e ondulados e um sorriso atraente e empolgante estava em seus lábios enquanto ela
abaixou a plaquinha e outra buzina foi anunciada, fazendo o carro dar um tranco e um barulho de
pneus queimando o asfalto soar.

Meu corpo vai mais para trás e eu fecho os meus olhos sentindo o meu coração acelerado
e meu corpo se arrepiar. Tateio o teto do carro e seguro no apoio, escutando o motor zunir e a
força fazer meu corpo acompanhar cada mudança brusca que o carro faz.

Respiro fundo e abro os meus olhos, sentindo a adrenalina atacar todo o meu ser e me
fazer tremer e vibrar de contentamento. Em nossa frente vejo o escuro ser clareado pelos faróis,
em uma estrada com o asfalto liso e apenas mato pelos lados. O carro vibra em cada guinada,
fazendo o pneu cantar e o motor gritar, pela potência que o motorista, que dirigia com maestria,
exigia.

Um carro azul consegue passar a frente de Oliver e este pragueja, aumentando mais ainda
a velocidade, fazendo–me gritar em cada inclinada e ganharmos por um triz a corrida, parando
lentamente o carro e deixando–me com um gostinho de quero mais.
Solto uma respiração e jogo minha cabeça para trás, tirando o cinto com minhas partes
intimas em chamas e meu corpo tremendo.

Mãos másculas grudam em meus cabelos puxando–me e eu abro os meus olhos,


encarando os olhos verdes escuros de excitação e os fechando ao sentir os lábios de Oliver sobre
os meus, de uma forma brusca e possessiva, exigindo passagem e me devorando. Sua barba de
dois dias arranha meu rosto e suas mãos seguram meu cabelo dando puxões, que vão direto para
minha intimidade, fazendo-me gemer mais forte enquanto acompanho seu beijo com o mesmo
desejo e aperto minhas pernas juntas.

Minhas mãos apertam seus bíceps e uma vontade de subir no seu colo cresce, uma que
não posso ceder, pois umas batidas nos acordam do transe, indo cada um para o seu lado
ofegantes e com tesão acumulado. Nossa respiração é audível e Oliver me encara de uma forma
faminta por alguns segundos, virando o rosto contra sua vontade e saindo do carro.

Olho pelo espelho retrovisor e passo as mãos no cabelo, tentando doma-los e desborrando
o batom quase inexistente. Espero uns segundos e respiro fundo, saindo do carro e indo para um
canto enquanto Oliver é cercado por algumas pessoas, que o parabeniza. Dois minutos depois
Otto vem até mim e pergunta:

– O que achou da experiência?

Encaro o seu rosto e vejo curiosidade, uma que me deixa pensativa.

– Surpreendente e excitante. – afirmo. – Acho que essas são duas palavras que posso
definir.

– Sabia que iria gostar. – diz depois de um tempo, escondendo certa malicia que cercou
seu rosto. Com toda certeza não era isso que ele diria e olha para sua frente. – Olha lá quem está
vindo.

E eu o vejo, Oliver com um sorriso convencido vir até nós dois e enlaçar minha cintura,
me apertando contra o seu corpo e beijando meu pescoço.

– Obrigação feita com sucesso. – afirma brincalhão e questiona seu pai com ironia. – Está
feliz, mestre?
–Sempre é boa uma vitória, meu filho amado. – usa o mesmo tom do filho e fica sério em
seguida. – Vamos logo interagir um pouco com essas pessoas. Estão achando você antipático e
convencido por nunca ficar um segundo sequer depois das corridas. –continuando quando vê
Oliver querer argumentar – e isso é ruim para os negócios.

Palavras certas, que fazem ele me encarar e bufar aborrecido.

–Quanto tempo é necessário ficar aqui? – ele pergunta com desgosto, sem tirar os olhos
de mim. – Tenho planos para hoje à noite.

– Sei que tem. – diz com certa malicia. – Fique uma hora e será o suficiente para marcar
presença.

– Espero que só aconteça isso dessa vez. – volta sua atenção para o seu pai.

– Eu também. – afirma Otto, olhando ao redor e acenando quanto alguém o chama. – Vou
conversar com um amigo, circulem e sejam acessíveis. Não precisa ser tão obvio assim o
desgosto de estarem presentes aqui.

Oliver bufa e beija o topo de minha cabeça, encarando meu rosto.

– Desculpe por isso. – revira os olhos. – Meu pai às vezes é um saco. Quer caminhar ou
procurar um lugar privado para aproveitar um ao outro?

O sorriso malicioso de Oliver me faz corar e arrepiar e dou de ombros como se não
tivesse importância em qual das opções seguir, algo que o faz sorrir com vontade e balançar sua
cabeça enquanto me empurra devagar em direção ao que sobrou da grande fábrica queimada, que
eles estavam usando para fazer a festa de comemoração.

Esperava que a estrutura estivesse forte o suficiente para não desabar. Ela era algo que de
dia, não era nada legal de se olhar, passando vibrações horríveis. De noite, não importava
quantas luzes coloridas fosse espalhada, a visão não era melhor e nem atrativa o suficiente para
ser o local de uma festa.

Caminhando no meio das pessoas com Oliver me guiando, vejo as pessoas olhando para
nós dois como algo enervante e espantoso ou até mesmo engraçado. Finjo que a vontade de
revirar os olhos não existe e ando até que chegamos a um canto ao qual Olavo está conversando
com seus amigos da universidade.

– Excelente corrida hoje, camarada. – um dos brutamontes que está com sua namorada
nos braços, cumprimenta. – Me rendeu um bom dinheiro em uma aposta.

–De nada. – Oliver diz apertando seu braço ao meu redor e olhando o seu irmão. – Pensei
que não viria, irmãozinho.

– Decidi de última hora. – deu de ombros e olhou em minha direção. – Vejo que trouxe
minha cunhadinha. É um prazer ver você, pequena Flora.

–Porque não traria meu amuleto da sorte. –revira os olhos para o irmão e ele gargalha.

– Vocês estão namorando? – pergunta a mesma garota antipática que me desprezou na


mesa do refeitório umas semanas atrás. –É serio isso?

– Talvez sim, talvez não, não é da sua conta. – Oliver da de ombros e olha para qualquer
rosto menos o seu, ignorando totalmente sua existência. – Matem minha curiosidade pessoal e
me digam o que tanto riam antes de chegarmos aqui?

Depois dessa pergunta, Olavo respondeu e em meio a patadas e muito papo dos dois
irmãos, um clima gostoso e atrativo se fez presente, entrando em diversos assuntos interessantes
que prenderam atenção de todos.

Ao invés de uma hora, já havia se passado duas e já estava próxima da uma da manhã.
Oliver estava se divertindo e as duas cervejas que tomei haviam me deixado cansada e risonha,
fazendo–me parar antes que passasse a vergonha de cair pelo mínimo de bebida alcoólica
ingerida.

Oliver só bebia água, pegou ela sem cogitar outra bebida e isso me fez pensar o motivo
dele odiar festas e aparentemente bebidas quando ele vivia neste meio. Não era para ser
diferente? Mas para ele parecia ser o certo, conversar e dirigir pareciam ser suas paixões e ele
não precisava de algo ou outra substância para ficar feliz.

Bocejo pela segunda vez e coloco minha mão no rosto, chamando a atenção de Oliver
para mim.

– Vejo que está cansada. –e questiona. – Quer ir embora?

Não preciso de uma confirmação verbal para ele saber a resposta, meu rosto me entrega.
Ele desvia o olhar para o conhecido ao qual ele me apresentou, mas não consegui guardar seu
nome. Um pouco acima do peso e sempre com um sorriso no rosto. É uma pessoa agradável, mas
o sono não me fez apreciar sua presença.

Era uma pena.

–Estou indo embora, Will. – diz Oliver e o homem não esconde o desgosto. – De um
abraço em sua mãe. Preciso levar minha garota para casa.

– Ah, sim. – da um sorriso sem graça. – Dou sim. Leve–a embora, ela parece cansada.

– E estou mesmo. – afirmo, fazendo–o rir.

– Boa viagem para o casal. – ele diz. – E uma excelente noite de sono.

– Obrigada. – respondo e Oliver e eu começamos a caminhar para a saída. – Não vai se


despedir do seu pai e irmão?

– Meu pai não está preocupado se estou ou não mais aqui e meu irmão está se enfiando
dentro de uma garota qualquer para se preocupar com aviso de recolhimento. – suas palavras me
fazem arregalar os olhos levemente e ele sorri. – O que foi...

Sua pergunta é cortada por uma voz masculina, grogue e estrondosa.

– É uma maldita sorte que não vou perder. – diz gargalhando como um lunático. – O
playboy que se acha o maioral aqui. Será que você aguenta umas porradas ou vai correndo para o
rabo de saia do seu papai? Seu filho da puta!

Paramos de andar no mesmo segundo e Oliver respira fundo. Meu coração erra uma
batida de nervoso e agarro a mão de Oliver automaticamente, tentando impedir o mesmo de se
virar e aceitar qualquer provocação de terceiros.

A música para e algumas pessoas se afastam encarando a cena.

– Não sou seu parente para ser filho da puta, Austin. – Oliver afirma pacificamente e algo
me dizia que isso não era uma coisa boa. –Estou longe de ser um playboy, assim como estou
longe de aceitar provocações de quem não tem maturidade para saber perder.

O homem moreno, forte e baixo gargalha novamente, achando graça das palavras do
moreno ao meu lado. O homem, que se chama Austin, para bruscamente olhando de forma
metódica para Oliver e diz as palavras certas para tirar todo alto controle que Oliver tinha sobre
si.

–Errado. O único que teve a mãe abandonando–o por um homem que pudesse sustentar
seu vicio, é você e o seu irmãozinho. – Oliver empalidece. – Ela sempre amou mais um pouco de
pó do que seus próprios filhos. Acho que ela sempre soube diferenciar merda de...

Oliver não se aguenta e interrompe Austin correndo para cima dele.

– Oliver. – grito tentando agarra–lo.

Entretanto, meus esforços são em vão e quanto vejo, os dois estão no chão, com Oliver
dando socos no seu oponente, que deixa de estar surpreso e gira com facilidade, ficando por cima
de Oliver e atingindo–o no rosto.

Desesperada, fico sem reação de principio, até que vejo Oliver ganhar um soco na direção
das costelas, que o faz grita de dor. Trémula e com lágrimas querendo descer de nervoso e medo,
olho ao redor vendo as pessoas assistirem e vibrando e procuro por um rosto conhecido, até que
encontro Will, o amigo que estava conversando com Oliver há pouco tempo.

Corro até ele, que está em um canto conversando com alguns amigos, sem dar a mínima
para briga e ele me olha com as sobrancelhas arqueadas.
– O que aconteceu, Flora? – ele questiona. – Cadê Oliver?

– Está brigando! – afirmo. – Você precisa me ajudar a separar eles.

Ele me olha como se tivesse quatro olhos e estivesse louca.

– Eu não posso fazer isso.

– Por que não?

– Oliver me mataria. – e pergunta. – Você não conhece seu namorado?

– Ele está levando a pior. – afirmo e ele fica surpreso. – Você precisa me ajudar! Eu me
entendo com ele depois.

Palavras certas que o fazem olhar ao redor e ir com os seus amigos até a briga,
atravessando todas as pessoas e conseguindo separar ambos, com Oliver ainda se debatendo para
bater no outro, mesmo que ambos estivessem com sangue espalhando pelo rosto e possíveis
outras partes feridas pelo corpo. A briga foi acirrada e todos os dois foram atingidos com fúria.

– Seu fracote. – grita Austin. – Muito papo e pouca ação! Sabia que não era nada sem seu
pai e irmão.

Oliver não diz nada e tenta se saltar, se debatendo e quando consegue, caminha até a
direção do outro, mas eu me enfio em sua frente e o abraço pela cintura, escutando seu coração
bater forte e sua respiração acelerada.

– Oliver, não! Vamos embora, por favor! Você já o machucou o suficiente, assim como
ele a você. – e completo quando sua atenção volta até mim. – Tudo o que vai conseguir com isso
são mais machucados, porque não será só ele que irá se machucar.

Seus olhos raivosos me encaram e ele olha novamente para Austin, ignorando suas
provocações e puxando o meu braço para longe dali, com grandes e pesadas pisadas.
Ele ainda estava com raiva.

– Oliver. – grita Will. – Não vá fazer nenhuma merda.

Oliver para no mesmo segundo e como um bicho selvagem, encara o amigo, querendo
pular em seu pescoço.

– Vou direto para casa. – rosna e se vira, andando sem parar até o carro e ignorando seu
amigo que grita com nervoso.

– Você está nervoso de mais! Não é bom dirigir assim!

Oliver abre a porta do passageiro e assim que entro bate a porta com força, entrando do
seu lado e apertando o volante com uma força que faz seus dedos ficarem branco e travando seu
maxilar, começa a dirigir sem olhar em minha direção, com seus nervos apurados da briga
recente.

Olho para frente e secretamente oro para que o seu nervosismo não afete seu modo de
dirigir e nos enfie em algum poste.
Para nossa sorte, Oliver conseguiu chegar até nosso bairro, estacionando no meio fio. O
silêncio nos acompanhou por todo o trajeto, deixando ambos em nossas bolhas pessoais, com mil
e uma perguntas cercando meus pensamentos e sendo a principal de todas:

O que teria acontecido se Will não tivesse separado os dois?

– Me desculpe por isso. – Oliver sussurra rouco, me olhando de canto de olho, sério e
arrependido. – Eu não queria que terminássemos nossa noite assim, fugindo de uma festa que
ambos não queríamos estar.

– Não existe um lugar que eu não queira está com você ao meu lado. – afirmo e ele vira o
seu rosto machucado em minha direção, com sangue vazando dos seus lábios, nariz e supercílio.
Ergo minha mão e toco em seu queixo, fazendo–o fechar os olhos. – Eu só não quero que você se
enfie nesse tipo de coisa. Odeio ver você machucado e não foi nada agradável ver ele te batendo
sem poder fazer nada.

Ele abre os olhos e me olha com os seus olhos em um tom de verde escuro.

–Eu me descontrolei e não fui o único a apanhar. – afirmou desgostoso.

– Não me importo com quem apanhou mais ou menos. Você está com o rosto todo
machucado... – afirmo passando o dedo em seu lábio e peço. –Eu não me importo com suas
corridas, mas, por favor, não entre mais em brigas. Se eu não pedisse a Will para me ajudar...
Não sei o que seria de você!
– Não era minha intenção te fazer passar por isso e por isso te peço desculpas. Fui
provocado e perdi o controle. – ele diz e puxa minha mão, cruzando nossos dedos perto de seus
lábios e olhando dentro dos meus olhos. – Prometo que nunca mais farei isso, em sua frente.

Finjo não perceber suas últimas palavras e respiro fundo.

– Ótimo. – afirmo e continuo. – Não sei se conseguiria ficar com alguém brigão.

– Não vai acontecer mais. – afirma me encarando com seriedade. – Eu prometi e cumpro
minhas promessas.

Terminando de dizer isso, ele solta minha mão e desafivela o cinto, tira a chave da
ignição e sai do carro. Faço o mesmo com o meu cinto de segurança e minha porta é aberta. Pego
minhas coisas e saiu do carro, escutando o barulho do alarme ser acionado. Sua mão é estendida
em minha direção e eu a agarro, perguntando conforme andamos.

– Você não vai guardar o seu carro?

Sem me olhar e enfiando a chave na fechadura, ele diz.

– Não. – e abre a porta, segurando para eu entrar e acaba se explicando. – Estou


precisando muito tomar um banho e deitar para perder meu tempo com isso.

E assim que ele tranca a porta, o vejo segurar um dos seus lados com força, tentando
aliviar a dor para subir as escadas.

– Você não acha melhor irmos para um hospital? Você parece ter machucado feio suas
costelas! – e ele bufa uma risada amarga. – Isso pode ser perigoso, Oli!

– Não são as costelas. – diz sumindo para o segundo andar.

Bufo e olho ao redor, encontrando tudo escuro e vazio e acabo por ir até ele, andando em
direção ao seu quarto enquanto percebo que claramente não há ninguém em casa. Entro no
quarto e ligo a luz, escuto o barulho da torneira e me encosto-me à soleira da porta fechada,
olhando a bagunça das roupas de cama.

O barulho do chuveiro é escutado e tiro o meu tênis, colocando minhas coisas em cima da
mesinha e ando até aquela zona, que parece nunca ter sido arrumada antes. Faço um coque nos
cabelos e pego roupa por roupa, dobrando todas até não sobrar nenhuma, coloco em cima de uma
cadeira; jogo os travesseiros no chão e arrumo o lençol, firmando bem suas partes laterais no
colchão e arrumo os travesseiros na cama, acabando por me sentar nela e olhar para o nada, até
que Oliver aparece só de toalha, indo direto para o closet.

Levanto e ando até o banheiro, ligando a luz e ignorando o vapor quente enquanto me
abaixo e procuro pelo kit de primeiros socorros. Quando acho, desligo o interruptor e vejo Oliver
encostado na parede, com os olhos fechados e segurando o seu lado atingido na briga.

– Está doendo tanto assim? – ele acena. – Não quer mesmo ir ao hospital?

Seus olhos se arregalam em espanto e ele nega com veemência.

– Vou tomar um remédio e logo estarei pronto para outra. – tenta fazer piada. – Verá
amanhã.

Respiro fundo e olho o lugar que sua mão tanto protege, tentando ver o estrago, mas ele
não permite e desencostada da parede, indo até sua cama e se senta devagar com os olhos
fechados. Entro no meio de suas pernas e abro a caixinha de primeiros socorros.

– Vou passar um antibacteriano nas feridas, para não inflamar. – ele engole em seco e
acena. Pego o vidro do remédio e abro, segurando o seu queixo. – Vai arder!

Assim que informo aplico o remédio pelos machucados do rosto e ele tranca a mandíbula
para não solta um gemido. Passo nos três machucados e vejo se tem mais algum, fecho o vidro e
começo a assoprar os pequenos machucados, fazendo–o rir e depois se calar, conforme beijo seu
rosto perto das pequenas feridas.

Sua testa franze e ele abre os olhos verdes confusos e cercado de emoções. Ele engole em
seco e afirma.

– Nunca imaginei que alguém faria algo como isso por mim. – e me agradece, de uma
forma que traz lágrimas aos meus olhos. – Obrigado!
– Você não precisa me agradecer por cuidar de você!. – sussurro tremulamente olhando
dentro dos seus olhos incríveis. – Sempre que puder farei isso com o maior prazer!

Assim que termino de dizer, agarro sua cabeça e beijo sua testa, soltando ele e sendo
surpreendida por seus braços em minha volta, em um abraço forte e desajeitado, que me deixa
momentaneamente surpresa, mas que me faz retribuir da mesma forma, sentindo suas lágrimas
molharem minha roupa enquanto ele chora desesperadamente.

Será o abandono de sua mãe que causou tal desespero?

Algo me dizia que não é apenas isso.

OLIVER

Abraço Flora tão apertado quanto posso e deixo o desespero acumulado dos últimos dois
anos me invadir, fazendo o que não tinha feito nenhuma vez durante todo esse tempo,
independente de qual difícil é ou da aflição que sentia diariamente. Chorar. Estava chorando de
uma forma forte e desesperada, como não me lembro de ter feito antes.

Puxo o seu corpo para cima do meu e deito–a na cama, aconchegando o meu rosto sem
nunca olhar para sua face bonita e confusa. Veria pena ali e eu odiava a ideia de ser digno disso.

O que eu fiz de tão grave para ser recompensado com isso? Era o que sempre me
perguntava ao suposto cara lá de cima. Preferia acreditar que ele não existia, do que lidar com o
fato de que alguém pudesse ser tão ruim com um filho seu.

E enquanto chorava me questionei do motivo dele colocar alguém para me fazer me


apaixonar, em um momento tão inoportuno e crítico, quando o meu único objetivo era conseguir
deixar minha família bem de vida quando a hora chegasse.

Eu amava Flora, sentia isso, mas eu não iria durar muito, independente das oportunidades
que meu pai e irmão achavam que apareceriam até o último segundo. Muitas pessoas estavam na
mesma situação que eu, morrer era o mais provável de acontecer.

Eu deveria contar tudo para Flora e a afastar de mim. Aposto que seu sofrimento seria
menor, pois sei que o que sente ainda não é amor, mas sou tão ferrado que não consigo fazer
isso, não tenho forças o suficiente. Preciso dela para manter a compostura, irei desabar e fazer
meu irmão e pai sofrer se mostrar o desespero que sinto.

O egoísmo em mim falava mais alto que a razão.

Acho que devo te agradecer por mais essa desgraça. Não?

FLORA

Oliver não demorou muito tempo a pegar no sono. Com os carinhos que fiz em seu
cabelo e o silêncio ensurdecedor do quarto, seu choro se acalmou e ele pegou no sono, dormindo
de forma serena, soltando leves soluços que o faziam parecer um garoto indefesso.

Com muito esforço consegui sair de seu aperto e coloquei um travesseiro por baixo de
sua cabeça, cobrindo-o. Ajeitei o clima do quarto pelo medidor e desliguei a luz, sentando
encostada na cabeceira da cama e zelando pelo seu sono, quando tudo o que deveria fazer era
dormir, algo que a preocupação não deixava.

Para alguém agir daquela forma, ceder ao desespero depois de tanto segurar, pois aquele
choro era um reprimido, daqueles que soltamos quando não aguentamos mais. Entretanto, o que
causou isso? Não acredito que o abandono de sua mãe quando criança foi o principal motivo,
tenho certeza que foi um dos motivos, mas não o principal.

Seria problemas com seu pai ou irmão? Oliver os amava e o afetaria muito se algo
acontecesse, mas ainda assim, não acho que seja isso. É algo mais serio que isso e meu coração
se aperta enquanto acaricio seu rosto.

Seja o que for, espero que tudo passe. Odiaria vê-lo sofrer.
Sentindo meus olhos lacrimejarem, pego um travesseiro e engatinho até suas costas, puxo
as cobertas para nos cobrir e o abraço com cuidado para não tocar no lado machucado pela briga
que ocorreu essa noite. Seu perfume e o barulho da sua respiração me acalmam e não demoro
muito a pegar no sono.

Quando acordo, não vejo sinal algum de Oliver e me sento na cama, atordoada. As
janelas estão fechadas e o escuro prevalece no quarto, mas o calor que o vestido me proporciona,
me da à certeza que já é quase tarde e ela desce queimado por minha garganta.

Se minha mãe chegar antes de mim, ela me mata.

Levanto da cama em um pulo e corro em direção ao celular, tendo certeza que o horário
que aparecia ali não era uma mentira. Taco meu cabelo para frente e faço um coque, pegando
minhas coisas e o tênis nas mãos, abro á porta e desço correndo as escadas, trombando em um
Olavo ainda sonolento.

– Vai tirar alguém da forca? – pergunta mal humorado.

– Não, mas vou parar em uma se não chegar logo em casa. – afirmo descendo as escadas
e abro á porta, vendo Otto aparecer na soleira da porta da cozinha, carrancudo e aparentemente
preocupado, com os braços cruzados. – Bom dia.

– Excelente tarde. – escuto–o dizer com sarcasmo antes de fechar á porta.

O sol está quente e corro olhando para a rua, vendo se há algum carro vindo pela estrada
do bairro residencial. Pego as chaves com desespero e ignoro o coração batendo mais rápido em
busca de oxigênio, entro com rapidez e não paro até chegar ao meu quarto e fechar á porta.

Jogo o tênis no canto e me sento na cama, jogando as coisas de minhas mãos em cima
dela. Fico lá até minha respiração se acalmar e quando ela da trégua, levanto indo tomar um
banho e jogar o suor que acumulei de ontem para hoje fora.

Sentindo–me mais relaxada, saiu do banheiro, bem mais disposta do que antes e quase
caiu para trás quando vejo minha mãe sentada na cama, encarando–me como se pudesse me
fuzilar com o olhar. Engulo em seco e continuo olhando para ela.

– Lembrou que tem casa? – ela pergunta sem mostrar nenhuma expressão. – Pensei que
tinha esquecido!

– Mãe... – tento falar.

–Pensei que tinha acertado em sua educação. – Ela sorri de forma irônica. – Mas vejo que
errei feio, tudo o que fiz foi fazer isso. – aponta em minha direção. – Uma safada que abre as
pernas para o primeiro homem que aparece na sua frente.

– Mãe. – exclamo ofendida e magoada.

Ela se levanta da cama e diz com sarcasmo, andando em minha direção e ficando com o
rosto perto de mim.

– A verdade dói. Né? – questiona. – Se imagine em meu lugar, sabendo que criei você
para ser honrada e uma mulher de família, para quando acabar, terminar sendo isso. – seus olhos
estavam brilhantes e enfurecidos. – Nunca tive tanta vergonha como hoje. Tendo que saber pela
vizinha, que você estava na casa do vizinho.

– Nós não fizemos isso. – sussurro como uma explicação.

– Ainda. – afirma desgostosa, se afastando de mim e ainda me encarando. – Você matou


todos os meus planos, Flora. Tudo que tinha planejado para você foi destruído. – e respira fundo,
tentando não derramar as lágrimas. – Espero que esteja feliz por isso.

– Mãe... – chamo ao vê-la se afastar.

– Só não engravide. – avisa com asco. – Não sei do que sou capaz de fazer se você virar
mãe solteira.

Assim que termina de dizer, fecha á porta e eu continuo parado no mesmo lugar. Que
planos ela tinha e quem me dedurou? São as perguntas que rodam minha mente, mas nenhuma é
tão preocupante quando o saber que a partir de hoje, minha relação com minha mãe iria mudar.

E eu sabia que isso não era algo bom.


Não para mim, pelo menos.
OLIVER

Desvio o olhar do envelope e encaro o homem em minha frente, que quase não pisca
esperando uma reação nossa. O envelope grande que ele trouxe estava no centro da mesa e meu
pai estava estático, encarando-o como se fosse um bicho de sete cabeças, que iria pular nele a
qualquer segundo. Com um coçar da garganta de Bruno, ele sai do transe.

Pego o copo d’água e bebo enquanto meu pai volta a conversar com o homem, que havia
jogando uma bomba em nossas mãos, uma que tiraria as esperanças do meu velho ou daria um
motivo para ele conseguir dormir despreocupado novamente.

Eu acreditava fielmente na primeira opção.

– Com o nome que vocês me deram e a foto, eu consegui achar tudo o que vocês me
pediram. – ele começa a explicação. – Atualmente ela vive em um dos bairros de renovo, é
casaca com um advogado e tem três filhos. Pelo que achei no sistema, ela é bastante saudável e
parece está feliz com a vida que tem.

Meu pai escuta tudo calado, não mostrando nenhuma reação e eu fazia o mesmo, pois foi
assim que ele nos educou para ser, uma versão bastante ferrada de nunca demostrar emoção,
agindo como se não tivesse acontecendo nada ou doesse como um filho da puta. E acreditem,
essas palavras queimaram como brasa quente nele, assim como fizerem de uma forma agoniante
e estranha em mim.

Uma merda.
– Bom. – meu pai afirma limpando sua garganta, depois de passar alguns longos
segundos encarando o homem sem dizer nada. – É bom saber que ela conseguiu deixar o vício e
reconstruir sua vida.

Bufo uma risada incrédula e pego o envelope, abrindo-o. Suas palavras eram patéticas,
apesar de verdadeiras. Parecia um discurso de consolação para si mesmo, com esperanças que
soavam patéticas aos meus ouvidos.

Será que ele ainda não se tocou? Ela seguiu em frente e deixou o passado que tanto sentia
vergonha de lado e isso envolvia seus filhos. Para ela, Olavo e eu já estávamos mortos, ela não
tinha motivos suficiente para salvar quem já estava enterrado em seus pensamentos.

– É... – o detetive diz sem saber o que dizer. – Acho que eu fiz tudo o que combinamos.
Ou estou equivocado?

– Não, não. – afirma meu pai. – Você fez tudo o que era para ser feito. Seu trabalho está
completo e o pagamento por isso está aqui. – meu pai aponta um pequeno envelope um pouco
proeminente. – Se quiser pode contar para ver se está tudo certo.

– Não há necessidade. Sei que vocês não iriam enganar logo a mim.

Solto outra risada e balanço a cabeça. Ser quem é ou não, não era o motivo de não
enganarmos ele, mas sim o fato de não queremos enganar quem podemos precisar, porque senão,
Otto enganaria ele na cara dura e ele nem perceberia.

–É, tem razão. – meu pai diz sorrindo, achando graça de suas palavras. – Obrigado pelo
trabalho.

– Obrigado você pela preferência. – e olhando de relance para mim, afirma de forma
sincera. – Boa sorte, rapaz.

– Obrigado.

E sai, para bem longe, deixando meu pai e eu na mesa. Ainda encaro o envelope e o rasgo
de forma devagar em minhas mãos ou apenas fingia rasgar, pois ele já estava aberto e tudo o que
restava era puxar o arquivo e agir como meu pai me ensinou, sem se importar. Entretanto, ao cair
da primeira foto do pacote, sinto que dessa vez não vou conseguir seguir tão fielmente isso.

Coloco os papeis em cima da mesa e olho dentro do envelope, vendo várias fotografias,
que aposto ser como essa, mostrando sua família perfeita e limpa, tendo amor e felicidade como
um dos principais pilares familiares. Pareciam ser perfeitos e longe de ser como era quando eu
era só um menino querendo atenção dela.

Coloco a foto dentro do pacote e vejo meu pai lendo um dos papeis. Seu cenho estava
franzido e ele parecia está lendo algo importante. Bufando, pego o cardápio e dou uma olhada
nas opções de comida, que só me fazem sentir enjoado.

Droga de doença.

– O lugar que ela mora não é longe daqui. – diz depois de um tempo e eu jogo o cardápio
na mesa, olhando em sua direção. – Não demora nem uma hora se formos de carro para lá. – e
olha no relógio. – Ainda é cedo, se fomos agora, iremos chegar lá...

– Não quero ver ela. – interrompo. – Ou falar com ela. Ela tem a vida perfeita,
atualmente, não vai arriscar perder isso e estragar sua saúde para me dar um rim.

– Ela é sua mãe, Oliver. – afirma como se isso fosse o suficiente. – Ela te amava muito,
apesar de...

– Preferir as drogas a seus filhos? – questiono. – Acorda pai! Ela se casou de novo, tem
uma casa descente e uma vida limpa, com cercas bonitas e possivelmente um marido que ama
futebol e a trata como uma rainha. – e me levanto. – Esquece essa ideia doida. Ela abandonou
Olavo e eu e nunca olhou para trás. Você acha mesmo que ela se arriscaria para salvar a minha
vida?

Meu sangue corre rápido e meu coração acelera, enquanto aperto com força meus
punhos. Sinto olhos em mim e sei que estou criando uma cena, mas meu pai precisa entender.

– Oliver. – grunhi como um aviso. – Sente–se é seja sensato.

– Eu sou sensato. – afirmo com agressividade. – Você que não é. Junte dois mais dois e
verá que estou certo.
Em um rompante ele se levanta e afirma em um tom, que não permite argumentação.

– Nós viemos aqui para falar com ela e nós vamos falar com ela.

Nego com veemência balançando minha cabeça e revelo, quase como um sussurro,
assistindo sua raiva e dor ao escutar cada palavra.

– Vocês vieram aqui para isso, eu vim para conseguir dinheiro e deixar ambos em
condições descentes. Quando chega sua hora, não há nada o que fazer para impedi-la, você
mesmo me ensinou isso. E a minha está chegando!

– Um cacete que está chegando. – esbraveja ficando cara a cara comigo. – Eu prefiro
morrer a enterrar um dos meus filhos. Vocês são meus e farei qualquer coisa para que a ordem
natural da vida seja feita, com os filhos enterrando os pais e não o contrário.

Assim que termina sua afirmação, se vira e pega os dados do detetive, andando até a
porta e a deixando bater com violência. Fico olhando tudo isso sem dizer nada, parado como um
paspalho no meio da lanchonete; servindo como um palhaço em um circo para os clientes e
quando consigo me mexer, caminho sem olhar para trás e ajo no piloto automático, dirigindo até
o local que sei que quem pode me ajudar a esquecer desse pesadelo que minha mente está
tentando criar está.

FLORA

Olho concentrada para folha de exercícios de matemática em minha frente e luto contra
vontade de jogar ela em qualquer lugar, pegar minhas coisas e ir embora. Não era obrigatório
está em aula, todos tinham a opção de sair a qualquer minuto, mas era prejudicial e como as
coisas estão atualmente na minha vida, pelo menos nos estudos tenho que continuar firme.

Bem, para começo de conversa, minha mãe está me evitando e meu pai vendo isso,
acabou por questiona-la, o que resultou em uma briga feia, que me fez colocar a música no
último volume e fingir não perceber nada. E ainda havia Oliver, o desalmado que não atendia
minhas ligações, muito menos respondia minhas mensagens.
Esse homem me confundia tanto.

Bufo e olho para frente, encontrando os olhos do professor em mim, analisando-me como
um código ao qual procurava pelo resultado.

– Está tudo bem Srta. Collins? – questionou encarando–me com seriedade.

– Sim. – sorrio levemente. – Só não dormi um pouco direito, nada de mais.

– Entendo. – afirma desconfiado ao mesmo tempo em que o sinal bate. – Seja o que for,
pode ir para casa e tentar aliviar a situação. É nova de mais para ter preocupações a cercado. –
continua de forma brincalhona. – Isso faz vi á tona os cabelos brancos.

– Descansarei quando estiver em casa. – afirmo ainda dando um sorriso triste.

– Faça isso. – e continua ao olhar para um aluno que o chama. – O trabalho me chama.
Tenha uma boa tarde.

– Igualmente.

Assim que termino de falar, olho para as páginas de deveres, respirando de forma audível
e começo a guardar todo o material. Assim que o faço, levanto–me e ando em direção à saída,
junto com mais dois colegas. O corredor está lotado de pessoas, sendo difícil para passar por
todas elas e acabo-me amarotando toda no processo.

Ainda bem que não tenho lugar algum para ir.

Alguém pisa no meu pé e uso isso como combustível para sair empurrando umas pessoas
até a saída, ignorando os xingamentos e olhando para o céu com felicidade por está enfim ao
lado de fora. Sendo empurrada por alguém, começo a andar olhando de um lado para o outro,
procurando por Jesy e ao não a encontrar, vou indo em direção ao portão grande e caminho até o
ponto de ônibus.

Ela iria reclamar que não esperei por ela, mas era segunda–feira e era um dos dias mais
chatos e cheios, ela teria que me desculpar.

Paro na calçada quando chego ao ponto de ônibus e olho em ambos os lados da rua para
atravessar, sendo surpreendida por um dos carros de Oliver – que não me recordo o nome, mas
sei que é dele–, parando ao meu lado.

Sua janela é aberta e encaro–o com uma cara de pouquíssimos amigos, que tento não
abaixar ao olhar seus olhos verdes opacos. Em seus lábios há um sorriso que não chega aos olhos
e o seu rosto está roxo em algumas partes.

– Está a fim de andar por aí?

Continuo encarando e mudo o peso do corpo de uma perna para outra, pensando sobre
isso e me aproximo do carro, entrando no mesmo e logo afivelo o cinto, perguntando.

–Em que lugar você estava ontem?

– No hospital. – dá de ombros e me olha com um meio sorrindo, voltando sua atenção


para estrada e ignorando totalmente meus olhos arregalados. Abro a boca para fazer perguntas,
mas ele me corta – E antes que pergunte, está tudo bem, só tomei um soro e fui liberado.

Engulo em seco e respiro aliviada, soltando o ar que nem sabia que estava preso.

– Isso é bom. – afirmo e pergunto. – Ainda sente dor?

– Melhorou bastante depois que fui medicado. – deu de ombros sem importância.

E depois disso, ficou quieto, algo que levei como sinal para não fazer as mil e uma
perguntas que queriam sair da minha boca. Entretanto, não consegui levar isso adiante por muito
tempo, pois o silêncio se mostrou ensurdecedor.

–Oly, para que lugar você está nos levando?

Olhando em minha direção rapidamente, ele volta a olhar para frente e limpa a garganta,
estando mais relaxado do que estava antes, mas ainda sim triste.
– Eu não sei ao certo. – afirma e confessa. – Quando era pequeno costuma ir a um lugar,
para espairecer e esquecer um pouco da realidade que me cercava. Não sei se ele existe ainda,
mas irei lar mesmo assim, se ele ainda estiver intacto, verá que não será uma viagem perdida.

– E se não estiver?

– Iremos estacionar em um lugar calmo e talvez conversar. – da de ombros. – Eu não sei


o que estou fazendo, na realidade, só preciso dirigir um pouco e diminuir algo que está querendo
crescer. E estranhamente, ter você por perto me acalma.

Sinto meu coração disparar e não digo mais nada, observando em silêncio as ruas que
passamos pela janela. Assisto as pessoas caminhando e os carros passando ao nosso lado.
Observo todo o caminho, até que tudo some e só restam árvores e ruas de terras para observar.

E então, tudo para de ser mover e o carro para de repente, fazendo–me olhar ao redor e
engolir em seco ao só ver mais mato. Encaro Oliver que tira o cinto e puxa uma arma de debaixo
do banco. Prendo minha respiração e encaro aquilo sentindo medo. Este lugar estranho e este
objetivo mortal me faz ter as piores ideias.

Será que ele planeja me estuprar e me matar, jogando–me em uma cova distante que
nunca será achada?

– Eu tenho autorização para isso. – explica aparentando está ofendido. – Não te trouxe
aqui para te matar, Flora. Nunca matei ninguém na minha vida e não vou começar logo por você.
Isso é só para se caso eu precisar. Não sei o que iremos encontrar por aqui.

Raivoso e chateado, ele sai do carro e bate a porta com um pouco de força, fazendo–me
fazer o mesmo e o encontrar procurando algo no porta–malas. Ando até estar ao seu lado e ele
fecha o mesmo, tirando de lá de dentro uma manta.

– Tudo parece está à mesma coisa, só que em uma versão mais detonada. – pensa em voz
alta. – Vamos ir andando.

E dizendo isso, ele começa a andar em uma direção cercada pelo mato, uma que eu nunca
cogitaria entrar. Entretanto, eu estava com Oliver e ele me fazia sentir corajosa. Ou bem, só uma
tola que se acha sabichona.
Respiro de forma audível e ando atrás dele, tentando afastar o pensamento de bichos que
tinha plena certeza que havia por ali. Fico o máximo possível atrás dele, enquanto subimos a
trilha. Só encaro as costas dele e o chão, nunca olhando para os lados. O caminho era longo e eu
já estava ofegante quando ele vira em minha direção e me informa.

– Chegamos.

Ele sorri com sinceridade e se afasta, saindo de minha frente e me mostrando uma das
vistas mais lindas que já vi.

Poderíamos ver tudo daqui.

Casas, mansões, ruas, lojas e a movimentação das ruas. Tudo parecia tão pequeno, como
pequenas formiguinhas se movimentando. Sorrio andando adiante encantada e observo a vista,
que deve ser infinitamente mais apreciativa ao anoitecer.

– Uma vista e tanta. – afirma se colocando ao meu lado e eu o encaro. – Fico feliz que o
tempo não tenha desfeito ela. Ele é bom em destruir as melhores coisas e essa foi à única parte
boa de minha moradia aqui.

– Não sabia que você era daqui, da Califórnia. – e continuo. – Pensei que sua mudança
fosse sua primeira vez por esses lados.

– Não. – ri pelo nariz. – Nasci e morei aqui até meus dez anos, depois meu pai conseguiu
ganhar alguma coisa e nos tirou da imundice em que vivíamos. Um lugar terrível para se morar e
longe de ser o sonho de consumo de qualquer ser humano.

– Sua infância foi tão ruim assim? – pergunto–o e ele acena. – Você não tem nenhum
ponto positivo dela?

Ele desvia o olhar e não responde durante alguns segundos, fazendo–me crer que ele não
iria responder e o silêncio preenche o espaço, ficando no ar durante um bom tempo e só sendo
quebrado por ele.

– Minha mãe foi expulsa de casa quando minha avó descobriu sua gravidez. Ela foi
criada pelo padrasto e ele não aceitava ter que criar mais uma boca. Ela tinha dezesseis e meu pai
pouco mais de dezessete. Sem escolha, eles tiveram que ficar com o meu avô, que bebia muito e
jogava constantemente tudo na cara do meu pai, que teve que sair da escola para trabalhar e
arrumar dinheiro para minha mãe e eu. – seu olhar se torna distante. –Quando eu nasci meu pai
não viu meu nascimento, pois estava trabalhando, ele fazia tudo o que podia e se matava de
trabalhar para dar uma vida melhor para minha mãe e eu e isso foi sua desgraça.

Seu tom não demostrava emoções e ele se virou com a manta em mãos e a forrou no
chão, sentando–se nela e eu logo o acompanhei, sentando ao seu lado e o tendo puxando–me
para apoiar minhas costas em seu peitoral.

–Meu pai se envolveu em um monte de jogadas, quase todas ilegais. Ele queria crescer na
vida e nos tirar daquela pobreza e acabou se envolvendo com as piores pessoas. – da uma pausa
fazendo uma careta. – Meu pai diz que vivemos bem durante os meus dois primeiros anos, mas
com minha mãe engravidando de Olavo, as coisas complicaram e tudo voltou a ser como era
antes, uma confusão com ele se matando para tirar sua família de lá.

– Foi por isso que sua mãe abandonou vocês?

– Por parte. Chegou uma época ao qual meu pai só se prejudicava, apostando e perdendo.
Quase não tínhamos o suficiente para comermos, quem dirá pagar pelos vícios do meu pai. Ela
não aguentou tudo isso e sendo nova, preferiu as drogas e depois a saída, sem nunca olhar para
trás.

Suas palavras saem com tanta calma e indiferença, que posso sentir que esse assunto faz
tudo, menos bem para ser lembrado. Oliver deita, colocando sua mão embaixo de sua cabeça e
encarando o céu, pensativo. Aproveito que seu peitoral está amplo e relaxado e o abraço
apoiando minha cabeça nele, colocando minha mão embaixo do meu queixo e encarando o seu
rosto.

E a visão me agrada tanto, que acabo pegando no sono sem perceber, só o fazendo
quando sinto ser posta em uma superfície confortável e acordando de uma forma assustada,
encontrando Oliver me encarando com um meio sorriso.

– Desculpe. – sussurro.

– Pelo o quê?
– Por dormir. – afirmo e ele me encara, quase sem piscar, sem nunca perder o contato
visual. –Você queria alguém para conversar e eu apenas peguei no sono, deixando de ser o
ouvido que precisava.

– Não é preciso palavras quando sua presença é como um antídoto.

Sorrio abobada e ele encara os meus lábios, desviando para os meus olhos e eu o encaro
de volta, apreciando os olhos verdes repletos de sentimentos aos quais sempre me tiravam o
fôlego. Aprecio sua aproximação até que seus lábios macios estão sobre os meus, degustando
minha boca de uma forma suave, que me faz gemer e fechar meus olhos em puro êxtase,
sentindo sua barba por fazer arranhar minha pele, aumentando o meu desejo.

Enlaço seu pescoço com os meus braços e o puxo para mais perto enquanto correspondo
o beijo com a mesma intensidade. Suas mãos apoiam o seu peso enquanto o mesmo quase deita
sobre mim. Envolvo minhas pernas em seus quadris e passo as mãos por suas costas enquanto ele
distribuiu beijos com sua barba de dois dias pelo meu pescoço, fazendo-me ofegar.

Sua ereção descansa em minha intimidade e eu gemo sentindo–me pulsar. Puxo-o para
mais um beijo quando ele chupa meu pescoço, fazendo-me apertar mais minhas pernas contra
ele, estando cada vez mais ofegante. Nosso beijo não é nada delicado, cercado de mordidas que
deixaram meus lábios inchados e minha pele irritada pelo esfregar de sua barba contra minha
pele. O oxigênio nos faz falta, mas não ficamos muito tempo sem nos beijar, sem dizer nada
além de aproveitar os lábios um do outro e o contato de nossos corpos.

Oliver se afastar depois de mais um beijo, deixando-me desejosa e eu agarro seu cabelo
querendo mais da sensação inebriante e da excitação que seu contato me proporciona.

– Flora. – com a voz ofegante e rouca de deseja ele me chama. – Se não quiser que eu te
coma aqui mesmo, me solte! Eu não irei me controlar se você me beijar desta forma novamente e
não pararei até que ambos estejamos saciados.

Encaro os seus olhos verdes escuros e inebriados de desejo e então, peço.

– Faça–o.

Com esse simples pedido, ele sorri de forma maliciosa e me beija novamente, não
demorando muito desta vez, mais com a brutalidade e a sedução para me deixar cada vez mais
louca. Ele afasta de mim e sinto abrir minha calça jeans, saindo de cima de mim, para segundos
depois tirar meus sapatos e puxar minha calça junto de minha calcinha, fazendo–me arregalar os
olhos de vergonha e surpresa. Sustentando–me pelos cotovelos, o vejo sorrir de forma maliciosa
enquanto abre o cinto e entra novamente no carro, batendo a porta atrás de si e abrindo minhas
pernas para se acomodar no meio delas.

Seus lábios encontram os meus e escuto um envelope de alumínio ser rasgado. Passo
minhas mãos por suas costas, por baixo de sua camisa e ofego quando ele passa a cabeça de seu
membro por toda minha intimidade, circulando o clitóris e entrando em mim centímetro por
centímetro, fazendo–me sentir esticada e cheia, criando um prazer doloroso até está todo dentro
de mim.

Ele cruza minhas pernas atrás de si e puxa minha camiseta e o sutiã ao mesmo tempo em
que entra e sai de mim lentamente. Quando estou completamente nua, ele agarra meus seios com
suas mãos fortes e os aperta, aumentando a velocidade gradativamente de suas estocadas, até que
possa sentir seus testículos batendo em minha bunda e a única coisa que eu possa fazer e gemer
jogando a cabeça para trás. Minhas unhas arranham suas costas e seus lábios sempre encontram
os meus enquanto ele continua entrando e saindo de mim, de uma forma carnal e única, que me
faz gozar forte, deixando–me com as vistas escuras.

Ao ver que gozei, Oliver solta um gemido másculo e com rapidez se senta no banco,
segurando minhas nádegas e me abaixando com rapidez. Sinto uma penetração mais profunda,
conseguindo atingir lugares nunca sentidos antes. Pela sensibilidade um orgasmo se constrói
novamente com uma dor ao fundo e o ajudo com os movimentos, até ter ele e eu gozando juntos
e engolindo os gemidos um do outro em um beijo faminto, que me faz cair exausta em cima dele.
Seus braços me envolvem e acariciam minhas costas, tendo ele respirando tão ofegante quanto
eu e eu quase não escuto quando ele questiona.

– Quer ser minha namorada?

– O quê? – pergunto com o coração acelerado, afastando–me e olhando para o seu rosto
quase sem piscar.

– Você quer namorar comigo?

Pisco algumas vezes sentindo–me ansiosa demais para dizer qualquer coisa e vejo toda
confiança que ele estava sentindo se esvaziando cada vez mais. Uma decepção tão forte fica
visível e ele desvia o olhar, engolindo de uma forma que faz seu pomo de adão soltar. O meu
silêncio o faz abrir a boca, como se fosse dizer algo, mas eu a tampo com uma mão antes que ele
diga qualquer coisa
–Eu preciso mesmo responder isso? – questiono como se fosse o lógico. – Eu gosto de
você, Oly. Como nunca gostei de ninguém e nada me faria mais feliz do que ser sua namorada.
Quando paramos em frente de nossas casas, já passa das onze da noite. Minhas pernas
ainda estavam bambas e eu estava dolorida. Essa noite havia percebido que Oliver cumpre com
suas palavras, tendo feito tudo até que ambos estivéssemos muito mais que satisfeitos e foi bom,
tão bom que não via a hora de repetir.

–Um dólar por seus pensamentos.

– Só isso? – e completo sorrindo como uma boba. – Acho que meus pensamentos valem
mais do que isso, namorado.

Ele retribui o sorriso e me beija rapidamente.

– Com toda certeza, namorada. Mas infelizmente não temos tempo para uma proposta
mais apropriada. – ele afirma sorrindo. – Já está tarde e manhã você tem que acordar cedo e
tenho certeza que tem algo que precisa fazer antes de dormir.

– Pior que tenho. – bufo olhando para fora da janela e depois voltando meu olhar para
ele. – Tenha bons sonhos, Oly, porque eu tenho a plena certeza que eu terei.

Assim que termino de dizer, saiu do carro fugindo de suas mãos que já estavam quase em
cima de mim. Gargalho com isso e fecho á porta, mandando um beijo para ele pela janela, que
apenas nega com a cabeça e bufa sorrindo. Viro–me e ando para casa, quase correndo enquanto
tento controlar minha crise de riso. Destranco a porta e a tranco de novo, correndo até chegar ao
meu quarto e gelando ao ouvir meu pai perguntar da sala.
– Estava com Oliver? Espero que tenha tido uma tarde boa. – sua voz sai cansada e eu
olho para ele, confusa e preocupada. – Sua mãe vai passar á noite na casa da sua tia ou sei lá com
quem, não quero saber.

Suas palavras saem frias e distantes, e sinto meu estômago gelar ao ver suas malas ao
lado e sua expressão derrotada. Ele estava saindo de casa? Automaticamente sinto meus olhos
lacrimejarem e começo a descer as escadas.

– Vocês estão se separando?

– Acho que sim. – da de ombros. – Tentei muito não chegar neste ponto, mas ano após
ano sua mãe tem estado mais e mais controladora e exigente, parecendo que nunca faço o
suficiente. Sei que não é tudo culpa dela e eu tentei mudar isso, por você e por nós dois. Só que
não consegui e percebi que nunca vou, não quando pareço o único que está tentando. – e
continua, parecendo está quebrado. – Não posso lutar uma guerra sozinho, minha Flor. Sinto
muito por isso.

Quando vejo, corro até meu pai e o abraço com firmeza, como se meu mundo dependesse
disso e soluço em seu peitoral, sentindo seus braços me apertarem. Minha mente sabe que é o
certo a se fazer, mas meu coração não pode evitar ser partido ao meio.

–Eu não sei como vai ser daqui para frente, mas iremos nos ver sempre e meu telefone
sempre estará disponível. – e se afasta limpando as lágrimas do meu rosto. – Chame se precisar
de algo e estarei lá, independente do lugar.

– Eu sei que sim. – afirmo em meio aos soluços. – Assim como sei que é o melhor a se
fazer para ambos. Só que, é difícil ver você partir...

– Ei, eu não vou sair da sua vida, Flora. – afirma com veemência. – Você é minha filha,
independente do que aconteça, você nunca deixará de ser isso!

O abraço novamente, continuando a chorar e deixando aquela situação mais difícil do que
já é para ele, que não para de falar palavras de conforto e me abraçar forte. Um tempo que
aparenta ser curto demais e que infelizmente termina, quando aparento está mais calma e ele me
afasta.

A calmaria se vai, mas o pesar nos olhos do meu pai é o suficiente para eu segurar as
lágrimas que queriam cair sem parar.
–Eu preciso ir. Irei ficar em um hotel perto daqui, mas está ficando tarde. – e respira
fundo, confessando. – É difícil deixar você para trás, mesmo que sua criação e princípios já
estejam feitos, mas é necessário e eu espero que você esteja ciente disto.

– Eu estou. – afirmo com um sorriso triste. – Deixe–me leva–ló ao carro. É tarde e apesar
de querer que fique não vou te pedir isso.

Ele apenas respira fundo e anda até suas malas arrastando as duas sem dizer nada.
Destranco á porta e o levo com o coração apertado até o carro, lutando para não desabar quando
ele entra no mesmo e parte para longe e cada vez mais longe, até seu carro está longe de minhas
vistas e eu me virar, indo direto para dentro de casa.

Eu odiava despedidas.

Agindo meio no automático, viro–me e vou desligar as luzes que estão acessas, tendo o
meu coração apertado e as lágrimas caindo sem cerimonia ao ver a bagunça na sala e cozinha.
Seja o destino estando do meu lado ou não, foi bom passar à tarde longe, pelo menos, não estaria
em casa para ver o momento que o estrago havia sido feito.

E que estrago.

Restos de copos e pratos estão espalhados pelo chão e a televisão da sala detonada. Fora
os objetos de decoração e outras coisas que estavam caídas ao redor, de uma forma que não sei
como eles não se machucaram. Respiro fundo e deixo aquilo para trás, subindo até o meu quarto
e tacando–me na cama.

Foi melhor assim.

Ao ser acordada na manhã seguinte pelo despertador, desligo–o e fico deitada na cama,
sentindo minha cabeça latejar de mais para ter forças para me levantar e agir como se nada
tivesse acontecido. E então, pela primeira vez em muito tempo, volto a dormir ignorando tudo ao
redor e torcendo para que quando acordar, me sinta melhor.
Ou pelo menos, disposta o suficiente para encarar minha nova situação.

OLIVER

Desço as escadas e vou direto para cozinha. Normalmente não tenho tempo para o café da
manhã e sempre pego alguma coisa para comer no meio do caminho, mas hoje amanheci
disposto o suficiente para levantar mais cedo e tomar café como uma pessoa normal. Ou bem,
com a normalidade que se pode ter a esse horário estúpido.

Assim que passo pela soleira da cozinha, encontro meu pai lendo o jornal e meu irmão
sentado devorando um sanduiche e o colocando no prato assim que me vê, pronto para suas
gracinhas de sempre.

– Isso é uma miragem ou a bela adormecida acordou cedo? – questionou Olavo com falso
espanto e encarou nosso pai. – Velho, o senhor está vendo o que estou vendo ou eu estou pronto
para ser internado em um hospício?

– Muito engraçado você. – ironizo. – Se não calar a boca você vai está prontinho para ser
internado em um hospital.

– Bom dia, Oliver. – meu pai me cumprimenta colocando o jornal em cima da mesa e
pegando sua caneca de café, ignorando totalmente o que estávamos falando. – Vejo que acordou
disposto hoje. Acho que nossa conversa não o incomodou o suficiente, como pareceu.

Desvio o olhar dele e tenho o meu bom humor indo embora. Assim que cheguei, meu pai
estava esperando por mim e não me deixou subir até conversarmos sobre a mulher que me deu a
vida e sobre os motivos que ele tinha para acreditar que ela iria nos ajudar. Bem, gastou saliva á
toa e uma completa perda de tempo que não voltaria mais. Eu já tinha um ponto que derrubava
toda aquela ladainha, na verdade, dois; o nosso abandono e os três filhos dela no novo
casamento.

Entretanto, meu pai não queria acreditar no obvio e isso me fez sair irritadiço e o deixar
falando sozinho.
Uma grande merda, eu sei.

– Ela o fez, você pode ter certeza. – afirmo e continuo, virando–me para ele com a caneca
e um prato em mãos. – De tal forma, que já tenho o assunto como finalizado.

– Oliver... – escuto Olavo me chamar. – Não se pode desistir de algo por causa de
suposições. Ela é nossa mãe...

– Irmão, você não era grande o suficiente para entender o que acontecia. – viro–me para
ele, interrompendo e começando com desgosto. – Entendo seus motivos, juro que entendo. Mas,
uma mulher que abandona seus filhos, sem pensar duas vezes na situação ao qual vivíamos, não
é digna de ser chamada de mãe.

Levanto–me, perdendo o apetite e encaro o olhar pensativo de meu pai e o irritado de


Olavo. Ele nunca iria se convencer de que éramos o segredinho sujo dela.

– Oliver. – meu pai começa e me encara com seriamente. – Sei que sofre com isso, mas é
hora de perdoar. Ela não era ela mesma.

– Eu já á perdoei há muito tempo, e o que sinto por ela é apenas desgosto. Amava minha
mãe, mesmo que a doença dela a fizesse ser um lixo. Entretanto, não a quero perto de mim. Ou
fingir que esqueci o que eu tive que passar com a perda dela. – pego minha mochila do chão. –
Até hoje penso como seriamos se ela não tivesse ido, acho que não seriamos quem somos hoje e
continuaríamos na mesmice e isso é o suficiente para não imaginar os enormes e se... Sei que é
difícil para ambos minha situação, mas esse assunto não me faz bem e hoje são raras as vezes
que me sito bem de verdade, então, por favor, parem de falar sobre isso.

Assim que termino de falar o que estava preso na garganta, saiu da cozinha e ando até a
garagem, ligando para Flora e tendo minha ligação caindo direto na caixa postal. Guardo o
celular no bolso da calça e abro o portão da garagem pelo botão automático, destravando o carro.
Tento aliviar minha mente do estresse que tive a pouco e matar a tentação de cabular aula e andar
sem rumo por aí.

Tendo a última, falhando miseravelmente quando comecei a dirigir e me vi indo para o


lado oposto da universidade.
FLORA

Quando acordo é perto da uma da tarde e com muito custo levanto indo tomar um banho
daqueles, que me faz sentir mil vezes melhor. Não sinto fome, mas mesmo assim vou ao andar
debaixo, procurando por comida e acabando deixando essa ideia de lado, quando a zona que
encontro me incomoda ao ponto de pegar uma vassoura e começar a arrumar tudo, desde á área
de serviço á sala, tentando entender como uma discussão entre duas pessoas pode ser capaz de
quebrar tanta coisa.

Ao ter terminado com parte da bagunça, dou uma pausa e vou preparar um sanduiche,
pois a fome que era inexistente acordou forte. Estou suada e doida por um banho, mas esse não
adiantaria de nada se terei que terminar de arrumar essa bagunça, que nem havia sido feita por
mim.

Mordo o sanduiche e tomo o suco de laranja, sentindo com prazer minha fome ser
saciada. O silêncio é uma boa companhia hoje e como sendo grata por ele, ou bem, comia, pois
escuto a porta bater e segundos depois minha mãe entrar na cozinha.

Ela me encara e encara ao redor, parecendo não ter pregado os olhos um segundo na noite
passada e ter chorado muito. Ela estava arrasada e meu coração se apertou por constatar isso.

– Seu pai quer o divórcio. – afirma com pesar, se aproximando de mim. – Ele nos deixou.

– Eu sei, conversei com ele ontem. – comecei com um tom suave, quase sussurrando e
continuei. – Eu sei que dói, mas é melhor para ambos, mamãe.

– É o que ele diz. – afirma com o olhar vago. – Mas eu não acredito. Abandonar sua
família e os problemas não os faz sumir, só os deixa amontoado em um canto até que não tenha
outra escapatória a não se confrontar e arrumar uma solução.

– Acho que essa foi a melhor solução.

– Não. – ela nega com veemência. –Essa foi à opção mais fácil, que o fracote do seu pai
arranjou. Mas, ele vai ver que não vai ser a mais fácil. – e decidida afirma. – Eu não vou deixar
ser, não quando ainda preciso tanto dele.

– Mãe...

E me encarando, afirma.

– Tudo será como antes, Flora. Exatamente tudo. – e continua como uma lunática. – Seu
pai voltará para mim e você verá o que realmente vale á pena. E então, seremos uma família
novamente, uma família feliz, como éramos antes de tudo isso acontecer.

Assim que ela termina de dizer, se vira sorrindo, de uma forma que me faz pensar que ela
já tinha um plano trilhado em sua mente, um que certamente não seria agradável e que me fazia
arrepiar dos pés à cabeça.

O que ela estava aprontando?


Com um livro de História no colo, pego um morango no pote de vidro e mastigo a fruta
azedinha, sentindo o frescor e o sabor inigualável da minha fruta favorita. Estávamos entrando
no mês de novembro, sendo essencial saber o que eu gostaria de fazer pelo resto da vida, mesmo
assim, eu ainda não tinha a menor ideia do que queria fazer.

Respiro fundo e fecho o livro, tendo essa certeza sendo tão azeda ao ponto de fazer
qualquer coisa impossível de se engolir. Jogo o mesmo sobre á cama e pego o pote de vidro com
os morangos, colocando os dois últimos na boca e descendo até o andar debaixo.

É por volta de seis da noite e as luzes estão apagadas, os cômodos frios e silenciosos.
Passo por eles até chegar à cozinha e ligar a luz, indo até a pia e lavando o que acabei de sujar.
Olho para o relógio e percebo que minha mãe está atrasada novamente, assim como havia se
tornando rotina neste último mês que meu pai havia saído de casa.

Eu não sabia o que ela estava fazendo nas duas horas a mais que passava fora de casa, e
nunca tive coragem para perguntar. Ela ainda parecia esta triste e de certa forma tentando se
aproximar de mim, mas ainda assim eu estava um pouco receosa. Sua tranquilidade dolorosa e
seus horários a mais na rua eram motivos de preocupação.

Evitando pensar nisso, pisco e paro de olhar para parede, ao qual nem percebi está
encarando e abro a geladeira, tendo em mente um suco natural de morango refrescante e uma das
pizzas congeladas que tem no frízer para o jantar. Ao constata que há frutas suficientes, fecho á
geladeira e tiro uma pizza mista, para descongelar um pouco e a coloco em cima da pia,
desligando a luz. Ando com rapidez até o meu quarto e pulo na cama, sentindo o conforto do
meu colchão de forma imediata.
Fecho os olhos por alguns segundos apreciando o conforto e desbloqueio o meu celular e
abro as mensagens, encontrando mensagens recentes de minha mãe e Oliver. Cliquei nas de
minha mãe, mas Oliver mandou outra e acabei por clicar sem querer na dele.

Anjo,
Sábado é aniversário do Olavo.
Meu pai alugou uma casa na praia.
Quer ir com a gente?

Leio as mensagens e sorrio pensando em como isso seria bom. Ultimamente não estava
saindo muito e Oliver estava sempre cansado e sem energia, como se tivesse corrido mil
maratonas. Seu apetite estava descontrolado, tendo certos dias que quase não conseguia comer
nada e em outros que comia tudo o que via pela frente. Ele estava acontecendo para nossa vida
sexual, certos momentos ele estava fervente como brasa e louco para me ter de qualquer forma e
em outros, só queria dormir.

Isso de fato me preocupava.

Eu sentia que tinha algo errado, mas sempre que mostrava preocupação ou questionava
sobre algo, ele dizia que era apenas indisposição e uma leve anemia que já estava sendo tratada.
É enervante e preocupante.

Vou sim J

Assim que respondo, tendo em mente que preciso comprar algo com rapidez para meu
cunhado, vou às mensagens de minha mãe.

Flora, vou demorar um pouco mais está noite, pois terei que adiantar os negócios por
aqui. Descobri que terei que fazer uma viagem de última hora, resolver uns assuntos chatos, que
prenderão meu fim de semana por completo.
Tenho que ir amanhã de manhã e só volto segunda.

Sorrio com a coincidência e mando uma carinha sem reação, voltando para a conversa de
Oly e sorrindo mais ainda ao ler suas mensagens.

Chame aquela sua amiga maluquinha e estejam ambas prontas amanhã às seis da tarde.
Vocês vão comigo. – afirma e completa.
E por favor, nada de Taylor Swift.
Nenhuma música – questiono.
Nenhuma música!

Sorrio e mando uma carinha de revirando os olhos para ele, que me manda de volta outra
igual junto com uma com coração nos olhos, fazendo–me mandar outro de volta e ir discar o
número de Jesy, que cai na caixa postal. Copio a mensagem de Oliver e mando para ela,
completando.

Topa?

E me levanto, pegando o livro de História e voltando a ler a matéria ao qual havia parado,
ficando assim até minha mãe chegar e eu descer para esquentar nossa pizza e fazer nosso suco.

Depois que minhas aulas terminam, invento uma desculpa para Oly e arrasto Jesy comigo
até o shopping mais próximo, querendo sua ajuda para comprar algo para Olavo e ficando
frustrada ao olhar em diversas direções e não achar algo que sequer fosse parecido com a
personalidade de Olavo.

E ao constatar que esse lance de presente perfeito era totalmente desproporcional para
quem já tinha quase tudo, resolvo por uma camisa qualquer. Entretanto, no último segundo, isso
muda ao olhar em direção a uma vitrine em um dos últimos andares. Não era algo caro e sabia
que ele iria adorar, pois além de Oly ter me falado, eu já percebi seu interesse por tudo ligado a
está coisa.

E com um sorriso animado e quase correndo, vou lá e compro, voltando quase saltitante
para minha casa, para terminar de arrumar minhas coisas.
OLIVER

Com os braços apoiados no balcão da cozinha, vejo um vídeo de um dos meus canais
favoritos sobre carros. Nesta plataforma tinha de tudo, desde o conteúdo mais idiota ou mais
chocante. Era para todo o tipo de gente e eu tinha alguns canais prediletos que sempre assistia
quando podia, como hoje.

Os fones estavam nos meus ouvidos e um copo de leite e um pacote de biscoito de


morangos estava ao meu lado. Já era tarde, passando da hora do almoço e meu estômago não
estava interessado em outra coisa a não ser isso, então eu comia sem culpa, pois essa merda era
rara de acontecer hoje em dia.

– Que vida boa. – meu pai chega invadindo á cozinha e debochando. –Virou bebê de
novo? Para aproveitar seus biscoitos com leitinho e assistir seus vídeos favoritos? Aposto que
depois vai tirar uma soneca gostosa e enrolar para não dormir de noite? Seja o que for não corra
para o meu colo se tiver pesadelos.

Tiro o fone e encaro–o.

– Você é tão engraçado. – bufo em uma afirmativa irônica e me levanto. –E eu nunca


corri para você quando tinha pesadelos.

– É verdade, quem fazia isso era Olavo. – e continua dando de ombros. – Você só se
enfiava debaixo das cobertas e ficava até o amanhecer apavorado e quase mijando em suas
próprias calças.

– Eu nunca mijei na cama. – dei de ombros, afirmando de forma defensiva e completando


em seguida. – Não depois dos cinco anos, pelo menos.

Saiu da cozinha e deixo o meu pai gargalhando sozinho, com meu celular e fones em
mãos. E lembro–me que deixe o copo em cima do balcão junto com a colher. Assim que ele visse
essas coisas ali, ele iria reclamar. Limpe o que você sujar. É uma das principais regras para uma
boa convivência.

E eu sempre dava perdido. Algo não tão bom para se orgulhar.

Coloco o celular para carregar e ando até o closet, pegando minha mochila, mas paro
bruscamente quando sinto uma pontada forte no abdômen. Minha mão vai automaticamente para
a fonte da dor e eu seguro forte, fecho os meus olhos e aperto os dentes, prendo a respiração e
deixo meu corpo bater na parede mais próxima.

Meu coração dispara e eu respiro pela boca, querendo me enfiar em mim mesmo pela dor
cortante que sinto. Abro os olhos vendo tudo se movimentar de forma embasada e me arrasto até
chegar na cama e deito de qualquer jeito de bruços e fico assim até que a dor aliviasse e a ânsia
de vomito parecesse ser mais forte do que qualquer tipo de dor.

Uma grande e fodida merda, toda essa situação.

Depois que vômito todo o meu estômago e a energia que parecia sentir escapa do meu
corpo, arrasto–me até encostar na parede atrás de mim. Jogo a cabeça para trás e encaro o teto
quando uma certeza me faz sentir derrotado e angustiado.

Eu estava piorando.

– Oliver Bennett. – escuto a voz irritada e firme de meu pai entrar em meus ouvidos. –
Será que você nunca aprende moleque? – e então ao me vê, sentando no chão frio com a mão
apetando a lateral e um cheiro forte de vômito, seu tom muda para desespero. – O que
aconteceu?

Dou de ombros e ele corre em minha direção, vindo me ajudar a levantar e envelhecendo
uns dez anos no processo. Dispenso sua ajuda e o empurro de leve, fazendo–o olhar para mim
estressado.

– Deixe–me te ajudar. – em meio aos dentes, ordena.

– Não preciso de ajuda. – afirmo engolindo em seco e encarando ele de forma firme. – Eu
só comi o que não devia. Nada demais aconteceu!

– Como assim nada demais aconteceu, porra! – ele grita nervoso. – Não é a primeira vez
que te vejo assim neste mês ou que sei que está passando mal! O que pensa que está fazendo
escondendo isso de sua família?

Encaro–o sem piscar e dou de ombros novamente. Toda vez que essa merda fodida
acontecia, meu pai e irmão eram os mais atingidos. Eles ficavam nervosos e agitados e muito
preocupados, via isso refletindo em seus olhos por dias e amava demais esses dois filhos da puta
para ficar preocupando-os dessa forma. Isso me destruía.

– Não é nada demais. – e completo. – Na minha situação.

– Eu não estou escutando essa porra. – sorrindo incrédulo. – Eu não estou!

– Eu vou tomar um banho e logo ficarei bom novamente. – ignorando o que ele fala, me
levanto e encosto na parede, recusando suas mãos quando está vindo me firmar. – Deixei–me
sozinho e vá arrumar suas coisas. Eu não quero estragar o aniversário de Olavo por causa dessa
merda do mal.

– Você não está bem para essa merda...

– E nunca vou está. – o corto. – Talvez esse seja o último aniversário que passo...

– Cala boca. – berra e depois ordena. – Tome seu banho e durmo um pouco, mas nunca,
nunca diga que algo será sua última vez. Você tem vinte e um anos. Está longe de ter suas
últimas vezes, ainda está aproveitando suas primeiras vezes.

E me encara, soltando-me e saindo com passadas fortes do meu quarto, quase estourando
sua artéria de tanto nervosismo.

Se continuar neste ritmo, morrerá antes de mim. Sorrio com amargura do pensamento
macabro.

No horário combinado, desço as escadas me sentindo muito melhor do que estava


algumas horas atrás e encontro meu irmão com os olhos brilhando de emoção pela forma que
decidimos comemorar seu aniversário esse ano. Nos últimos dois anos ele vem nutrindo essa
vontade de ir para uma praia deserta e se divertir com os mais próximos, entretanto, por motivos
maiores relacionados á minha saúde, nunca conseguíamos.
Meu pai me olha com um olhar preocupado e irritadiço e finjo não perceber, abraçando
meu irmão de lado.

– Olha só como o filho da puta está feliz. – falo de forma zombeteira. – Está parecendo
pinto no lixo.

– Sai Oliver. – ele grunhir revirando os olhos e me empurrando para longe. – Me deixa
em paz seu cuzão.

– Deixo, deixo sim, mas só porque vou buscar minha garota e não porque você manda
seu filhote de cascateira. – e caminho até á saída, vendo meu pai sorrir revirando os olhos e
Olavo imitando minhas palavras e meu modo de andar de uma forma debochada. – Isso meu
filho, imita teu ídolo mesmo, quem sabe você seja tão magnifico como ele um dia.

Antes de fechar á porta, ganho um dedo para o alto de meu irmão, que me faz sorrir.
Atravesso a rua e aperto á campainha, esperando por Flora, que pula em meus braços e me dá um
dos seus beijos doces e únicos, que me fazem cada vez mais apaixonado por ela.

Minhas mãos a apertam pela cintura e minha língua adentra sua boca, beijando–a com
fome, querendo mais do sabor inigualável e único, que me deixava louco e completamente
excitado. Suas mãozinhas passam pelo meu cabelo e corto o beijo contra minha vontade, por
causa de um limpar de garganta e ao olhar na direção, encontro uma garota pequena, de cabelos
dourados e olhos azuis, sendo conhecida por Jesy, melhor amiga da minha garota.

– Será que vocês não vão querer um quarto?

E ah, a irritação em pessoa.

– Oi para você também, Jéssica. – e ela me olha ofendida, bufando e andando de volta
para dentro de casa. – Vá pegar suas coisas, meu anjo.

Beijo os seus lábios e coloco ela no chão, vendo–a ir à mesma direção que a amiga, tendo
ambas voltando segundos depois com duas malas grandes em mãos.

Elas achavam que estavam indo para aonde. Caribe?


Reviro os olhos com o pensamento e pego as malas, ganhando um sorriso doce das duas,
que me acompanham até está do outro lado da rua. Me junto ao meu pai e coloco as malas no
porta–malas do meu carro.

E meu coroa me pega completamente desprevenido ao afirma.

– Irei dirigindo hoje. – e completa com olhos sérios. – E se não estiver bem o suficiente
na volta, irei conduzir até deixar todos em casa.

Tento dizer algo, mas quando o vejo já está longe e Flora está ao meu lado, confusa.
FLORA

Eu estou animada, é tudo o que sei. Estou indo para uma praia particular com meu
namorado e minha melhor amiga. Em carros diferentes, vi rostos estranhos e outros não tão
estranhos assim, mas isso não importava. Esse fim de semana seria bom, pois Oliver estava do
meu lado e sei que ele sempre vai está, evitando qualquer desconfortável por eu está perto de
pessoas que não conhece. A presença de Jesy me fazia crer fielmente nisso.

O caminho até uma das grandes mansões a beira mar havia sido longo, mas divertido. De
princípio estranhei por Oly não ser o motorista. Oliver amava dirigir, eu sabia disso, e foi
estranho ver Otto conduzir o carro. Oliver não parecia ter gostado muito, mas isso não durou
muito. Ele estava no banco de trás comigo e minha melhor amiga, que por boa parte do caminho,
não perdia uma oportunidade de zoar, fazendo meu sogro e seu irmão Owen rir.

A outra parte do caminho foi cercada por músicas, conversas minhas e de Jesy, Owen
mexendo no celular e Otto e Oliver tão quietos, que pareciam está vivendo em mundos
completamente diferentes, até que chegamos ao nosso destino.

– Chegamos. – anunciou Otto. – Já podem sair se quiser.

Tirei meu cinto, assim como todos e sai do carro logo após Oliver, pegando sua mão
quando ela é estendida em minha direção. Ele encarou seu pai de forma estranha. O cheiro único
de mar e um vento frio gelado no meu rosto atraíram minha atenção e encaro o céu pouco
estrelado, com uma lua cheia que clareava o escuro da noite fria. Desvio o olhar do céu quando
Oliver bate a porta do carro e anda até o porta–malas, que acaba de ser aberto pelo seu tio.
Observo ele pegar nossas malas, desviando o olhar dele quando Jesy para ao meu lado,
cruzando os braços e comentando.

– A genética dessa família é tão abençoada. – e bufa, como se lamentasse. –Deveria ser
pecado tanta beleza em um parentesco só.

Bufo uma risada e ela suspira melancolicamente.

Eu mereço.

Não comento nada e ambas encaramos a cena em nossa frente. Oliver conversando com
seu tio e sorrindo com todos os dentes amostra enquanto pega uma mala e depois outra,
demorando um pouco para puxar a segunda, pois o tio não parava de puxar assunto e fazer Oliver
rir. Sua risada é tão linda e marcante e ele é tão bonito, que tenho certeza que estou quase
babando.

E a cotovelada seguida por uma risada estrondosa, me fez ter certeza disso. Dou outra
cotovelada em Jesy, que revira os olhos e bufa em meio a um sorriso, que faz Oly andar em
nossa direção desconfiado.

– Posso saber o motivo da risada das moças?

Jesy sorri com malícia e me encara de relance, dizendo apenas.

– Nada que mereça ser contado.

– Certo. – Oliver afirma confuso e muda de assunto. – Vamos subir e escolher os nossos
quartos, antes que eles peguem os melhores.

Tentei pegar umas das malas, para ajudar Oliver, mas este pegou a mala de minhas mãos
e andou em minha frente, sendo seguido não só por mim, mas por Jesy e seu pai. Um carro
estaciona assim que botamos o pé na entrada, mas não ficamos esperando para ver de quem se
tratava. Jesy acende todas as luzes e eu encaro o ambiente com poucos moveis, em cores neutras,
mas em lugares estratégicos, para deixar o ambiente confortável e acessível para as festas.
Ou assim parecia.

Sem tempo para apreciar a decoração, sigo até as escadas e logo chegamos ao corredor
gigantesco dos quartos, com pelo menos uns vinte quartos com portas personalizadas em um tom
de branco acinzentado. Obras de arte e tapetes com cortinas estavam espalhados de forma
simples e bonita, nos espaços pequenos.

– Quanto foi o aluguel deste lugar? – vejo–me questionando.

– Um valor aí. – da de ombros abrindo a porta do nosso quarto. – Nada que mereça ser
citado.

Fico quieta ao ver o nosso quarto. O mesmo jogo de cores neutras do resto da casa e
peças semelhantes de arte enfeitavam ao redor; uma cama gigante com lençóis aparentemente
bem confortáveis estava no centro do quarto e cortinas espessas tampavam as janelas. Tapetes
espalhados pelo chão e alguns outros móveis estavam bem distribuídos no espaço mediano.

Oliver coloca nossas malas no chão e bate nossa porta, abraçando-me por trás e beija meu
pescoço com sua barba por fazer, fazendo-me prender a respiração e fecha os olhos, derretendo
em seus braços. Ele mordisca os lugares exatos e eu me viro, passando meus braços pelos seus
ombros e o puxando até ter seus lábios nos meus.

Gememos mutualmente, com um beijo só de lábios, pois assim que eu iria adentrar minha
língua em sua boca, ele me empurra pelos ombros e beija minha testa. No começo, não sei bem o
motivo e o olho incrédula, tentando beija–ló, mas quando ele me afasta de novo, escuto passos
no corredor e altas risadas.

Bufo e ele ri pelo nariz, se abaixando com os olhos verdes escuros de desejo e me cheira,
voltando a torturar no meu pescoço com seus lábios.

– Eles vão entrar aqui e nos chamar. – sussurra roucamente. – E se eu fizer o que quero
fazer com você, eles não nos deixaram em paz o fim de semana todo. Isso não é algo que me
envergonhe e incomode, pelo contrário, gosto que saibam que é minha. – e se afasta, olhando
dentro dos meus olhos. – Mas tenho certeza que se sentirá desconfortável.

Ele estava certo, e como estava, mas sua boca e o desejo que nutria desde que coloquei
meus olhos nele, quando ele foi me buscar, estavam me deixando louca. Excitada era pouco,
mesmo assim, respiro fundo e me afasto, tentando fugir da visão de menino mal que tanto me
atraia.

Avanço olhando para a janela e escuto nossa porta abrindo bruscamente, por um Olavo
que quase saltita de animação.

– Fala ai meu casal favorito! Vim chamar os pombinhos para jantar. – e se explica. -
Queremos pedir pizza. – continuando em seguida. – Na verdade, não sei bem se vamos pedir
pizza, mas vim logo aqui para não correr o risco de pegar vocês trepando.

– Olavo. – repreende Oliver.

– Estou errado por um acaso?

– Vai se ferrar, Olavo.

– Também te amo, irmão.

Bufo e reviro os olhos, sentindo meu rosto quente. Ando até minha bolsa e pego o
celular, encontrando algumas chamadas não atendidas. Sabia que ambos olhavam para mim, me
esperando e me viro, mostrando o celular.

– Preciso falar com o meu pai. – dou de ombros. – Desçam que daqui á pouco encontro
vocês lá embaixo.

– De boa. – Olavo fala.

– Você não quer que eu te espere?

– Não, prefiro falar sozinha. – e completo, sorrindo levemente. – Prometo não demorar.

– Assim espero.

Ele me dá um selinho, que acaba causando algumas provocações do seu irmão. Oliver se
afastar e esbarra propositalmente no mesmo, quase o derrubando no chão e fazendo o mais novo
soltar uns palavrões e eu rir pelo nariz.

Eles são, definitivamente, duas crianças crescidas.

Assim que eles estão longe de estarem perto dos meus olhos, desbloqueio o celular e sou
recebida por uma ligação de meu pai, que logo aceito e coloco no ouvido.

– Oi?

– Minha flor. – papai me cumprimenta em um tom doce. – como foi à viagem de carro.
Chegaram todos bem?

Sorrio por sua pergunta preocupada.

– Sim. – afirmo. – Eu vim em um carro com o pai de Oly dirigindo e além de mim, Jesy,
Oly e o tio de Oly, Owen.

– Ah, a família O foi junto também? Pensei que era algo só para adolescentes que se
acham adulto.

– Não. – bufo uma risada. – São umas dez pessoas e a maioria é parente.

– Entendi. Espero que se divirta e tenha juízo.

– Vou ter sim.

– E não se esqueça de me ligar se precisar. Independente da hora, irei correndo te buscar.

– Eu sei pai.

– Que bom.

– Beijos.
– Beijos minha flor. – e desliga.

Sorrindo jogo o celular na cama e passo as mãos pelas roupas, indo até o pessoal na sala.

O jantar passa rapidamente, cercado de conversas e muitas risadas. Conheci a filha mais
velha de Owen, que ostentava uma barriga de seis meses e esbanjava felicidade ao lado do
marido. Olivia e Jason, ambos não queriam saber o sexo do bebê e estavam fazendo uma aposta,
sobre o sexo do bebê, entrei no bolão e fiquei do lado da mãe, que apostava em uma menina e
Jesy também o fez, somando assim quatro votos contra vários do marido.

– Se eu estiver certa e for uma menina, irei colocar o nome da minha falecida mãe. – Ela
diz depois de falarmos o quanto queríamos que os rapazes estivessem errados. – Ela morreu há
três anos, em um assalto.

– E qual era o nome dela?

– Maitê. – responde com emoção, segurando a barriga com as mãos. – Ela amava seu
nome, pois era de sua avó e agora será o nome da minha filha.

– Independente do lugar que ela esteja, ela vai amar sua homenagem. – afirmo colocando
minha mão em seu joelho e olhando dentro dos seus olhos. Ela apenas acena e respira fundo,
sorrindo levemente. – Pode ter certeza disso.

– Eu tenho.

Um silêncio cai entre nós e Jesy muda radicalmente de assunto, em um que traz muitas
gargalhadas para todas nós enquanto os homens conversam em outro canto. Ela falava dos
vídeos que assistia sobre esse assunto no Youtube e de como parecia traumatizante gerar outro
ser humano. Particularmente, não achei um assunto muito bom para se falar com uma grávida,
mas como Olivia chorava de tanto ri, não interrompi ou tentei mudar.
– Você é tão engraçada. – afirma Olivia em meio a gargalhadas e acalma suas risadas,
revelando. – Minha mãe era uma obstetra. Acredite, não há nada do que diga que pode me
surpreender sobre o assunto.

– Eu não posso acreditar. – Com indignação, Jesy afirma.

– Nem eu.

– E muito menos. – uma voz masculina conhecida diz. – Querida, você já deveria está na
cama.

Jason.

– Vocês veem? É só gerar um bebê que eles voltam a te tratar como criança. – de forma
aborrecida e dramática, ela fala enquanto se levanta. – Mas dessa vez, vou escutar o homem.
Estou sem um pingo de energia.

Seu marido sorri com sua resposta, segurando o braço de sua amada e se despedir de
todos.

– Eles são um casal tão bonito.

E de fato, Jesy não estava mentindo. O tom dourado de Jason e o porte de surfista, junto
de seus cabelos loiros e olhos azuis cristalinos, dão uma mistura diferente, mas arrasadora com
os cabelos pretos como a noite e os olhos verdes como esmeraldas de Olivia.

– Verdade. – digo e vejo Oliver se levantando do outro lado e dando um aceno de cabeça
em direção ao lado de fora. – Bem, Oliver me chama. Vejo-te amanhã.

– Não acredito que vai trocar a companhia de sua melhor amiga por sexo.

– Não seja dramática. – revirando os olhos e me levantando, afirmo. –Um dia você vai
me trocar para ficar com um cara também.

– É verdade. – da de ombros.
Sorrio e ando na direção de Oliver, que me abraça pela cintura e cheira meu pescoço,
pegando um cobertor em um canto e andando até a entrada da mansão gigantesca. Atrás de nós
escuto risadinhas maliciosas, mas finjo não perceber e continuo andando, até o frio da noite e a
presença de Oliver é a única coisa ao qual importa.

Quando estamos no lado de fora, Oliver e eu andamos pela longa varanda e paramos
quando chegamos perto de um banco pendurado ao teto. Ele se senta no mesmo e eu logo o sigo,
sentando–me ao seu lado. Tiro os sapatos e jogo minhas pernas por entre as suas, tendo a manta
cobrindo nossa parte inferior e os braços de Oly me puxando até está praticamente colada em seu
corpo.

Seu cheiro único e o calor de seus braços nublam minha mente. Um beijo castro é dado
em minha testa e eu apoio minha cabeça em seu ombro, olhando para nossa frente e assistindo a
vista magnifica d’água do mar batendo nas pedras, em uma distância considerável. Seus dedos
acariciam meu braço e ele parece está pensativo, em seu próprio mundo.

O silêncio é um companheiro percebível, sendo quebrado pelos sons da natureza. A vista


é tão linda e relaxante e eu estou tão confortável, que se não fosse pela inquietude de Oliver ao
meu lado, já teria pegado no sono.

– O que tanto passa em sua mente? – pergunto sussurrando em seu ouvido e ele parece
acordar de um transe, um pouco confuso. Ele engole em seco e da de ombros, ainda pensativo. –
Não quer falar sobre isso?

– Não. – e completa. – Não é tão importante assim.

– Me diga e eu direi se é ou não.

– Não é. – ele afirma e completa, descendo sua mão pelo meu braço. –É pensamentos
masoquistas, que não valem á pena serem ditos.

– Então não pense.

Ele sorri e pisca, tendo certa melancolia em suas íris e desvia o olhar para nossa frente.
Querendo animar ele, beijo seu pescoço e vou subindo por sua mandíbula forte, com uma barba
por fazer e ele respira afetado, fechando os olhos e apreciando quando encosto meus lábios nos
seus. O beijo de forma lenta e ele aproveita cada instante, gemendo de uma forma máscula e
toma a iniciativa, de sua forma bruta e única de me beijar.

Minhas mãos agarram sua nuca e ele passa as suas pelos meus cabelos, agarrando os fios
e os puxando até dar uma pressão no casco cabeludo. Aprecio cada segundo, não só desses, mas
de todos os que ele me da, conforme á noite vai passando e o cansaço se torna parte de nós, de tal
forma, que acabamos dormindo em meio aos beijos e palavras de carinho, sem sequer nos
darmos conta.
E não havia outra forma de acordar ao amanhecer, a não ser pela presença inconveniente
do Olavo.

– Olha que bonitinho. – com a voz afeminada. – O casal dez dormiu um nos braços do
outro enquanto tinham como testemunha o luar e o mar. – dramaticamente suspira. – Isso parece
até mesmo à porra de uma cena de filme de romance.

Tento abrir meus olhos, mas pisco colocando a mão em frente da luz solar. Entretanto,
mesmo assim, ainda posso ver Olavo com o celular estendido em nossa direção.

–Vai se foder, Olavo. – Oliver branda, tirando os braços de minha volta e bocejando
enquanto se espreguiça.

– Que bela forma de dar feliz aniversário ao seu irmão – rebate de forma sarcástica e
Oliver fica encarando-o. – Já sei, já sei. Você é um idiota mal–humorado de manhã, que quer que
eu me foda por ter acordado vocês.

Oliver continua em silêncio e eu encaro ambos sem dizer nada, olhando para o chão e me
levanto sentindo a lombar reclamar.

Dormir sentada é ruim como parece.

Passo as mãos pelos cabelos e os amarro no alto da cabeça, andando até o meu quarto
com Oliver atrás de mim. Olivia e o seu marido olham de forma engraçada para nós dois, quando
cruzamos o corredor e eu apenas ignoro, indo direto para o banheiro e escutando um baque alto e
um gemido dolorido, que me faz olhar para trás e revirar os olhos ao ver Oliver jogado na cama
de barriga para baixo.

Fecho á porta e faço xixi, encarando o chão. Depois de um tempo, crio coragem e
levantando–me, entrando novamente no quarto e encontrando Oliver na mesma posição de antes,
roncando. Passo direto e pego minha bolsa de produtos de higiene, entrando novamente no
banheiro e só saindo de lá quando meu corpo está completamente lavado e meus dentes
escovados.

Procuro dentro da bolsa por uma roupa e pego um dos biquínis, uma regata e uma
bermuda jeans simples. Ainda era cedo e o tempo atual não era um dos melhores para banhos de
praia, mas isso poderia mudar e mesmo se não mudasse, eu poderia sentir vontade de entrar na
água. Visto minhas roupas e calço minhas rasteirinhas, deixando o cabelo solto para secar e dou
bato duas vezes na bunda de Oliver, que resmunga palavras incoerentes.

– Estou indo tomar café. – aviso. – Levante e vá tomar seu banho, que eu te esperarei lá
embaixo.

Ele diz algo, que não consigo entender e eu beijo sua bochecha e ando até o andar
debaixo, encontrando apenas Otto, que olha atentamente para a tela do tablet na mão direita
enquanto segura uma caneca fumegante com a esquerda.

– Bom dia. – cumprimento, andando até os armários e pegando um copo.

– Dia. – responde quando me sento em um banco ao seu lado. – Oliver está dormindo?

– Sim. – afirmo. – Ele deitou na cama e apagou.

– É um preguiçoso. – bufa.

No balcão, há um bolo e algumas geleias, pães, torradas, queijo, presunto e uma jará de
suco, que ao experimentar, vejo que é de goiaba. Pego um dos pães e coloco uma fatia de queijo
e outra de presunto, mordendo e logo percebendo que estava morrendo de fome.

Quando estava quase terminando de comer meu pão, Oliver aparece com os cabelos
molhados e uma cara de poucos amigos.
– Bom dia para você também, filhão. – Otto diz quando Oliver senta ao meu lado sem
dizer uma palavra, pegando o meu copo vazio para si e o enchendo de suco. – Como foi passar á
noite no relento? Pela sua cara, não parece ter sido muito agradável.

– Não foi um dos piores lugares. – afirma dando de ombros e cortando um pedaço
generoso do bolo. – Cadê o resto do pessoal?

– Todos já foram para praia. – diz. – Como não vou, só falta vocês para se divertir.

– Por que não vai? – pergunto curiosa.

– Não está tão quente para entrar na água. – ele diz apenas. – Tenho sinusite, não posso
confiar muito na sorte.

– Entendo.

– E vai ficar fazendo o que o dia todo? – perguntou Oliver. – Olhando para as paredes?

– Não sei, mas tenho certeza que algo logo aparecerá para ser feito. Ou acha que a
comida e o bolo de aniversário de seu irmão chegarão voando?

Oliver dá de ombros e continua comendo. Como eu já estava satisfeita, esperei por ele até
o mesmo comer o necessário e iniciei uma conversa com Otto, que logo se retirou quando o seu
celular tocou. Senti meu cenho franzir, mas deixei quieto e continuei esperando por meu
namorado, aproveitando para guardar as comidas e te–ló acabado de comer assim que as louças
estavam dentro da pia.

Lembrei que não tinha trago protetor solar ou toalhas e fui rapidamente até o nosso
quarto, pegando isso e encontrando Oliver conversando com o seu pai, que parecia nervoso.
Ambos mudaram de assunto de forma radical quando apareci.

E ao nos despedimos dele e caminharmos até o restante do pessoal, me vejo questionar.

– O que vocês estavam conversando de tão importante, que não poderia ser dito em
minha frente?

Entretanto, como esperado, Oliver despista.

– Negócios. Nada de importante.

E eu logicamente não caio neste papinho, mas como chegamos perto do pessoal, não
houve outra opção a não ser deixar o assunto morrer, por enquanto.

OLIVER

Assim que encontramos meu irmão e primos, respiro com alivio e sinto um peso sair de
minhas costas. Estava cada vez mais difícil esconder a verdade de Flora e eu já estava
percebendo, que em breve, teria que contar–lhe toda verdade. Estou enrolando o máximo que
posso, mas ela me questiona quase todos os dias, assim como a insistência que meu pai deposita
diariamente para jogar as cartas na mesa e revelar tudo.

Tão fácil falar, difícil é fazer.

Apesar de estar doente e sentir meus sentimentos a flor da pele e meu corpo cada vez
mais fraco, nada me irritava como essa insistência. Minha vida não estava sendo boa atualmente.
Sentia dores e fraqueza constate, tanto emocional quanto física, parecendo que a qualquer
segundo eu iria morrer. Nenhum dia era bom e quando era o próximo parecia cobrar juros e me
derrubava quase por completo.

Essas e outras coisas eu aguentava sozinho, sendo forte e sempre sorrindo, para que
ninguém caísse ao meu redor. Odiava ser digno de pena e é isso o que traria, se deixasse que
soubesse como realmente me sinto. Entretanto, parecia que dessa vez, só isso não seria o
suficiente, não quando o meu corpo me boicotava. Estava cada vez mais magro e pálido.

Uma merda.

– Parabéns irmãozinho. – o puxo para um abraço e bato em suas costas, sendo abraçado
de volta de uma forma estranha. –É dezenove ou noventa e um, que você está completando?

– Engraçadinho. – ele se separa, sorrindo.

– Parabéns. – coloco a mão em seu ombro, sentindo um aperto no peito. – Tenho certeza
que esse é só mais um de muitos outros que virão. Desejo muita saúde e juízo, hoje e sempre.

– Obrigado, irmão. – engole em seco, olhando dentro dos meus olhos e sorrindo. –E não
se preocupe com juízo, esse eu tenho de sobra.

– Duvido muito. – bufo uma risada.

Os gêmeos e Flora riem e ela entra em minha frente e puxa o meu irmão para baixo,
abraçando o mesmo, que demora a retribuir com os olhos arregalados. Ela diz algumas coisas
para ele e ele parece prestar atenção em tudo, terminando por somente abraça–lá de volta e
agradecer, quando os dois se afastam e Flora anda até mim, ela beija minha mandíbula e sorri ao
ver minha careta espontânea de ciúmes.

Meus primos não perdem isso e começam a me zoar, fazendo Flora revirar os olhos e eu
bufar uma risada tentando esconder a irritação. Não muito tempo depois, Olivia se junta ao
bonde, ostentando sua barriga redonda e bonita de grávida. Em seu calcanhar, vem Jason, que
chama todos para irem para água, sendo este o momento perfeito para Flora e eu darmos um
perdido no pessoal e andarmos sem uma direção específica, só apreciando o tempo fresco e a
areia da praia em nossos pés.

Sendo momentos como esses os melhores dos meus dias.

Não consigo evitar olhar para ela e constatar o quanto ela é bonita, sendo apenas ela
mesma. Sorrindo e olhando ao redor com alegria, apreciando o momento tão simples. Suas
covinhas quase pulavam para fora com o leve sorriso que enfeitava seus lábios rosados naturais.
Flora não tinha olhos azuis ou cabelos loiros, ela era baixa e tinha cabelos e olhos castanhos, mas
era perfeitamente imperfeita aos meus olhos, sendo uma das coisas mais preciosas que já conheci
na vida e ela era minha.

Só minha.

E eu era um cara sortudo, só por isso.


– Por que tanto me olha? – questiona brincalhona.

– Porque você é a obra de arte mais bonita que eu já vi desfilar por aí. – afirmo e ela olha
para baixo envergonhada, fazendo–me gargalhar com repentina timidez.

– Você é tão mentiroso. – ela balança á cabeça enquanto ainda sorri e fica seria ao
perceber meus olhos sobre ela. –Por que você está me encarando dessa forma?

E eu continuo observando-a sem quase piscar, assistindo sua confusão interna ser
expressa em seu rosto. Engulo em seco e percebo que nós dois estamos parados encarando um ao
outro e de supetão, puxo ela para os meus braços e a giro, fazendo–a gritar e areia voar ao redor.

– Oliver.

Sorrio com sua indignação e corro para dentro d’agua, atraindo mais gritos seus e alguns
tapas no meu ombro. Sorrio com vontade e tranco a mandíbula, não parando por um segundo até
estarmos os dois encharcados e necessitando subir para superfície e ficar bem longe da água
torturante.

Com forme afundei, tive que solta–lá e ao subir a superfície batendo os dentes, percebi a
ideia idiota que foi isso. Ondas leves balançam ao nosso redor e ao girar á procura de Flora,
percebo que ela não se encontra em nenhum lugar ao meu redor e automaticamente afundo,
procurando por ela e sinto o desesperando crescer quando ao não a vejo em lugar nenhum.

Subo á superfície e respiro fundo, indo mais para baixo desta vez, nadando á procura dela
até meus pulmões doerem pela falta de oxigênio e meus olhos parecerem que estão com areia.
Recusando–me á subir e tendo a adrenalina presente, procuro por ela até o ponto de quase
desmaiar e em uma última virada, depois de ver somente a água clara e quase transparente, vejo
seu cabelo boiando ao redor e a puxo pelo braço, nadando com um braço só até a superfície e
respirando tão forte, que dói o peito e as vistas escurecem.

Com agilidade e rapidez, tiro ela da água e a coloco deitada na areia. Sua pele está pálida
e fria e seus lábios roxos e eu logo começo a fazer respiração boca–a–boca e massagem cardíaca,
me sentindo o pior filho da puta do universo, por quase matá-la afogada.

Algo dentro de mim se aperta e eu me sinto sortudo, apesar de ser o filho da puta da pior
espécie, quando ela cospe toda água para fora dos pulmões e respira de forma rápida, abrindo os
olhos castanhos avermelhados e começando a chorar.

Eu havia acabado de causar um dos piores susto de sua vida.

Levanto–a do chão e a puxo para o meu colo, confortando-a e pedindo sem parar para
que ela me desculpe. O tempo passa e ela continua chorando e eu continuo pedindo desculpa,
sentindo–me horrível e jurando nunca mais fazer esse tipo de brincadeira idiota novamente. Mas
isso logo muda, quando em um rompante, ela se levanta de forma brusca me empurrando.

– Você é louco ou o quê? – ela questiona soluçando. – Em que lugar sua cabeça estava
para fazer isso?

– Desculpe–me, eu pensei que você sabia nadar. – começo falando em um tom culpado. –
Juro que se soubesse que isso aconteceria, não teria feito... – e irritado, continuo. – E droga, você
já nadou diversas vezes em minha frente. Como eu ia saber que essa porra ia acontecer?

– Eu sei nadar em piscina, Oliver, porque elas têm fundo. – afirma chorando. – Nunca
aprendi a nadar cem por cento.

– Sinto muito.

– Eu também.

E sai andando apresada, quase correndo para longe de mim, deixando–me nervoso e
culpado pelo o que acabei de fazer.

Eu quase matei a mulher que eu amo.

FLORA

Ando rapidamente, querendo o mais rápido possível está bem longe de Oliver e acalmar
um pouco do desespero que quase me domina. A menos de dez minutos atrás, quase morri
afogada e essa constatação e tudo o que senti naquele momento, ainda esta fresco em minha
memória.

Quando cruzo á porta da grande mansão, que eu só havia visto em filmes, escorrego e
quase caiu, fazendo um barulho estrondoso que chama a atenção de Otto.

– Quem é o maluco que... Flora? – escuto dizer meu nome preocupado e questionar
alarmado. – O que aconteceu?

Encaro–o e dou de ombros, começando a chorar e correndo até o meu quarto. Assim que
chego lá, bato á porta e tiro minhas roupas, enfiando–me nas cobertas completamente nua e me
cubro até a cabeça, esperando que assim o meu desespero passe.

Com o passar do tempo ficam apenas os soluços e esses quase sessam conforme o sono
pesa e eu quase caiu no sono. Um barulho na porta me acorda e eu não preciso olhar para trás
para saber de quem se trata. Uma longa respiração é escutada, seguidas por barulhos de farfalhar.
Continuo quieta e imóvel, mas ao ter o colchão afundando e seus braços me puxando para o seu
peito, arrepio–me toda.

– Desculpe–me. – sussurra arrependido.

Respiro fundo e o abraço de novo, tendo suas mãos alisando minhas costas e me
aquietando o suficiente para enfim adormecer.
Um barulho alto me acorda, fazendo–me estranhar o ambiente. Olho ao redor do quarto,
procurando por vestígios do lugar ao qual me encontro e lembro–me quase de forma imediata
dos últimos acontecimentos. O quarto está escuro da noite precoce e encaro o teto, bocejando. As
mãos de Oliver me apertam para mais perto de si e escuto ele bocejar, percebendo que ele está
muito mais acordado do que eu.

Fico em silêncio encarando o nada, criando coragem para levantar quando todo o que
meu corpo queria era que eu dormisse até amanhã seguinte. A famosa preguiça que só não
ganhava da fome, quando resolvia dar as caras.

Oliver fica em silêncio e apenas respira, pressionando mais seus braços em mim, como se
quisesse me impedir de fugir dele.

– Sinto muito pelo que aconteceu. – sussurra beijando o topo de minha cabeça e viro o
meu rosto até está de frente para ele, com minha boca á centímetros da sua e os seus olhos verdes
cercados de sinceridade e arrependimento olhando dentro dos meus. – Eu realmente sinto.

E me beija docemente. Iniciando de uma forma suave e indo direto para a urgência de
sempre. Minhas mãos agarram os seus bíceps e ele segura minha cabeça, trazendo–me cada vez
mais para perto de si e impossibilitando–me de me afastar. De uma forma rápida e precisa, ele
me solta se afastando de mim e me faz cair com a cabeça no travesseiro, não dando chance
alguma de focar em qualquer coisa, a não ser seu peso sobre mim e os seus lábios com a barba
por fazer em meu pescoço.

Arrepio–me dos pés a cabeça e sinto a excitação crescer em meu baixo ventre. Minhas
mãos sobem para suas costas, apertando levemente com as pontas dos meus dedos sua carne e
alcanço seus cabelos curtos e sedosos conforme ele desce beijando cada parte de mim que
alcança, de forma lenta e torturante até que chega ao seu objetivo.

Minha intimidade.

Agarrando minhas coxas com suas mãos grandes, ele planta um beijo em ambas as coxas,
deixando–me ansiosa e excitada ao sentir um beijo castro em minha vagina, seguido por um
circular de sua língua em meu clitóris, que me faz arquear meu quadril e o faz rir com satisfação.
Abro a boca para reclamar e me calo de forma imediata ao ter sua língua entrando em mim,
acariciando minhas paredes e me fazendo revirar os olhos.

Beijando meus grandes lábios, ele demora o seu tempo degustando–me e me deixando
cada vez mais louca e descontrolada, com o esfregar áspero de sua barba e a lentidão tortuosa ao
qual ele criava o prazer, que de forma vergonhosa, derretia–me e me fazia gritar ao atingir o
extasse de uma forma rápida.

Meus olhos fecham e eu respiro de forma rápida, apreciando o momento. Seus lábios com
o meu gosto me beijam de uma forma bruta. Abro os olhos e vejo o sorriso orgulhoso que está
em sua face, abrindo a boca ao te–ló se enfiando dentro de mim e começar a nós dar o prazer que
ambos tanto necessitávamos.

Saiu do banheiro enrolada em uma toalha com os cabelos encharcados pingando em


minhas costas. Passo por Oliver que olha atentamente para tela do celular com fones em seus
ouvidos e arrasto minha mala para perto da cama, abrindo–a e pegando um dos meus macacões
frescos e bonitos. Este era preto com algumas estamparias de flores vermelhas e amarrava no
pescoço, deixando minhas costas quase nuas, pego uma calcinha na bolsa e vou em direção ao
banheiro.

Passo o hidratante e o repelente e todo o resto necessário. Penteio o cabelo e tiro o


máximo da água dele, passando um pouco de creme em seguida e o deixo secar naturalmente, já
que não havia lembrando-me de trazer o secador, esperava que isso fosse necessário. Não estava
de todo ruim, só esperava que não ficasse desastroso com o passar do tempo.
Resolvo passar uma maquiagem simples para tirar qualquer marca de imperfeição e um
batom de cor quase natural. Assim que termino, meu estômago ronca e eu ando até o quarto,
jogando–me na cama ao lado de Oliver, que tira os olhos rapidamente do celular e olha para
mim, para voltar segundos depois a olhar para a telinha pequena em suas mãos.

– O que você está assistindo? – pergunto olhando para tela e vejo que a aba do Youtube
está aberta. – Ou estava?

Fechando tudo, ele bloqueia o celular e tira o fone, olhando–me envergonhado e dando de
ombros sem jeito. – Estava assistindo um vídeo sobre carros, nada tão importante assim. Você já
está pronta para descer ou quer ficar fazendo vários nadas por aqui?

Mil e uma coisas passam em minha mente com sua proposta simples, mas com vários
sentidos diferentes. Era de fato tentadora, mas ao ter meu estômago roncando novamente, meu
cérebro idiota percebe sua atual necessidade.

– Eu adoraria fazer vários nadas com você. – começo passando minha mão por cima de
sua camisa e vou descendo. – Mas estou com fome. Muita fome e não é de você.

Oly pega minha mão e a leva aos seus lábios, encarando–me com certa aflição e em
seguida sorri com adoração, afirmando em um tom divertido.

– Então vamos alimentar você, meu anjo.

Solta o meu braço e se levanta, guardando os fones na mesinha de cabeceira e se


espreguiçando. Levanto–me da cama e calço os meus chinelos, andando em direção de meu
namorado, que me olha enquanto me espera com a porta do nosso quarto aberto. Seguro sua mão
e juntos descemos em silêncio.

Ao entrarmos na cozinha, um bilhete está sobre o balcão e após ler, Oliver tira o pano de
cima dois pratos com sanduiches feitos estão ali. Ele amassa o papel rindo sem humor e revira os
olhos enquanto anda até a geladeira e pega uma jará com um resto de suco e uma garrafa de
água. Aproveito e pego dois copos, indo lavar minhas mãos e dando lugar ao Oliver quando
termino. Caminho até o balcão e me sento, esperando Oliver fazer o mesmo, para comermos e
quando ele o faz, não demora muito a não ter nenhuma comida sobre os pratos e ambos estarmos
satisfeitos e risonhos, resolvendo ir procurar o resto do pessoal e nos divertir no final daquela
tarde, pois já estávamos há muitas horas longe de todos.
E confesso, estávamos indo mais por causa de mim do que por ele, que preferia está
deitado. Assim que encontramos o pessoal, sorrisos maliciosos e acusadores são disparados em
nossa direção. Não por muito tempo, pois alguns segundos depois eles estão fazendo suas coisas
e ignorando nossa existência. Jesy me vê de longe e acena para mim e faço o mesmo, dando um
beijo na mandíbula de Oliver e indo até ela, que está do lado de Olivia.

Assim que chego perto delas, sento–me ao lado de ambas. – O que fizeram de
interessante nesta tarde? – questiono.

– Nada tão interessante como o que você provavelmente fez. – responde Jesy maliciosa
fazendo–me revirar os olhos.

– Nós nadamos, comemos e agora estamos fingindo que eu preciso muito da presença de
Jesy ao meu lado, pois você sabe, é muito deprimente ser a única que não deixam ajudar nas
tarefas pesadas. – com deboche e falso ressentimento, Olivia diz enquanto acaricia sua barriga
com carinho, desviando o olhar em seguida para os homens.

– É, acho que eu vou ter que perder toda aquela diversão e ficar aqui com vocês. –
lamento de forma forçada.

Minhas palavras fazem Jesy ri uma e Olivia suspirar com falsa tristeza.

OLIVER

Flora corre para longe de mim ao avistar minha prima Olivia e sua amiga Jéssica, ou
como preferia ser chamada, Jesy. Observo com tédio a interação delas, assistindo suas caras e
bocas que me deixavam confuso. Mulheres são tão estranhas! Constato ando até os meus
familiares, que conversam e riam de uma forma bruta que não parecia ser muito melhor do que
as mulheres.

Não, os seres humanos são estranhos.

Eles estavam cortando madeira e as arrumando em um amontoado, para que pegasse fogo
com mais facilidade quando acendessem a fogueira. Sentar perto do fogo e observar madeiras
queimar, não parecia atrativo e acho que se eles ficassem sóbrios também concordariam comigo.
Em minha curta vida e nos meus dias rebeldes de adolescente impulsivo, desfrutei de muitas
bebidas e substâncias consideradas ilegais e sabia com perfeição como o uso delas poderia deixar
qualquer coisa tediosa parecendo ser a melhor do mundo.

No mundo das corridas ilegais e das festas que se seguiam depois de todas as minhas
vitórias, bebida, mulheres e drogas eram colocadas em minha frente em abundância. Sendo tudo
novo para mim, bebia, transava e experimentava muitas coisas. Por sorte, meu único vício
adquirido foi os dos cigarros e com uma facilidade impressionante consegui abrir mão de tudo,
menos dos cigarros, sendo esses uma luta trabalhosa para me libertar e um dos meus calcanhares
de Aquiles até hoje.

Ainda sentia vontade do relaxamento da nicotina, mas era necessário mais esse sacrífico.

Jason, meu tio e seus filhos, cortavam as lenhas e meu pai e irmão, estavam sentados
observando todos em silêncio, com latinhas de cerveja em suas mãos. Senti–a me indisposto e
com uma dor chata pelo esforço causado de ontem para hoje. Certos momentos do meu dia, não
poderiam evitar me comparar com um idoso, um idoso com dores no rim e uma disposição
idêntica ao de um bicho preguiça.

O idoso de vinte e um anos.

O pensamento me faz querer ri de amargura e me sento ao lado de meu irmão, que me


olha com os olhos tristonhos.

– O que foi? A crise da idade está chegando? – questiono de forma debochada e encaro o
meu pai. – Pensei que essas coisas só aconteciam quando chegávamos na meio idade, como o
caso do nosso coroa aí.

– Tão engraçadinho você. – imita uma risada. – Para sua informação, eu ainda sou um
nota dez comparo a esses garotinhos por aí. Se tiverem herdado minha sorte, serão tão sortudos
quanto eu.

– Nem ao menos quarenta anos você tem. – diz Olavo. –Espere chegar aos cinquenta, aí
veremos se teremos sorte na genética ou não.

– Trinta e nove é um pulo para cinquenta. – Otto da de ombros e bebe um gole de sua
cerveja.
–São só onze anos de diferença. – Olavo diz e ironiza. – Nem é grande coisa.

Eu observava os dois e sorrio da interação única de minha família. Eu amava tanto esses
filhos da mãe, que nem percebia direito o assunto que os dois estavam falando, mas esse não
demorou a vir á tona e me senti mal pelas coisas que inundaram minha mente.

Eu não iria sequer chega aos vinte e cinco, quem dirá aos cinquenta.

– Por que não quis chamar os seus amigos da faculdade? – perguntei mudando de
assunto.

– Amigos? – bufou. – Aquela trupe de interesseiros? Dispenso!

Meu pai e eu não perdemos o rancor e o ódio que estavam refletindo em suas palavras.
Encaramos um ao outro e desviamos o olhar, querendo logo questionar e quando iriamos fazer
isso, eis que os gêmeos se sentam ao nosso redor e começam as reclamações que estavam
demorando a calhar, seguindo por meu tio, que mandou logo os dois calarem a boca e iniciou
uma conversa com o meu pai, que não era nenhum pouco atrativo aos meus ouvidos.

Eu esperava tudo desse fim de semana, menos agir como uma árvore.

É, acho que na minha atual situação, tenho que se grato por ainda está respirando e
podendo está ao redor das pessoas, sem ajuda de algum tubo ou profissional do lado. Aposto
fielmente que essa situação irá mudar em breve e aí sim, terei mil e um fodidos motivos para
reclamar.

Volto minha atenção para o assunto e começo a interagir, até dá a hora de todos irem
tomar seus banhos, não demorando muito para retornar e acender as chamas da fogueira e
começar novamente com mais uma roda de conversas, só que agora com comidas envolvendo e
eu já havia comentado que meu estômago não está muito seguro? Pois é, ele não está!

Flora não demorou muito para se sentar ao meu lado e com ela, pude me sentir um pouco
melhor, sendo isso algo que eu não entendia, poderia está um lixo, mas se ela estivesse por perto,
tudo ficaria bem ou pelo menos, o meu emocional idiota acreditava nisso.
Uma baboseira sem fim, mas no momento, eu apreciava essa baboseira.

E isso que importava.

FLORA

Sentada ao lado de Oliver pelas últimas horas antes da tão aguardada hora do parabéns,
não posso evitar em constatar sua mudança drástica. Ele claramente não estava se sentindo bem,
isso era visível; estava aéreo e com os pensamentos distantes, mesmo assim continuou firme e
forte preso em seus pensamentos e na árdua tarefa de fingir que estava tudo bem.

Entretanto, nada estava bem.

Eu sentia isso, em cada momento que estava ao lado dele. Oliver não era mais o mesmo
ao qual me salvou na primeira noite, sua mente e corpo estão diferentes, tendo uma mudança
preocupante a cada dia que passa. Com pelo menos 6kg a menos, olheiras ao redor dos olhos,
uma palidez que não o abandonava e suas saídas quase semanais misteriosas, levavam–me a
acreditar que ele estava doente, uma doença mais grave do que uma anemia.

Queria está enganada, mas os sinais estavam ali e eu precisava descobrir.

Os dois irmãos conversavam, com sentimentalismo enquanto o bolo era distribuído. Não
conseguia tirar os olhos daquela cena, que para mim era angustiante. O brilho dos olhos e o
sorriso triste que Olavo dava para as palavras que o irmão dizia, pareciam ser uma cena de
despedida idêntica ao de filmes e series. O pensamento faz meu coração doer e desvio o olhar
para Otto, que está parado em minha frente.

–Não vai comer o bolo? – ele pergunta, estendendo um prato em minha direção e eu
engulo em seco e aceito o mesmo. Otto se senta ao meu lado e continua. – É o favorito dos meus
garotos.

– Parece bom. – respondo ainda sem jeito e encaro o seu rosto sério, quase inexpressivo.
– Você não vai comer?
– Depois. – da de ombros. – Estou sem fome no momento.

Não era o único.

Trago o garfo com um pequeno pedaço e mastigo, sentindo o gosto de chocolate e


morango explodindo na boca. Muito gostoso, mas ainda sim difícil de engolir. Estava angustiada
demais para conseguir comer algo e o engolir acabou sendo forçado. Coloco o garfo no prato e
encaro Otto, tendo ele olhando quase sem piscar para os seus filhos e aparentando ter mais idade
do que tem quando a preocupação se torna tão transparente.

– É bom mesmo. – puxo assunto e ele me olha, piscando com rapidez e logo questiono. –
Acho que esse não foi bem o motivo que o trouxe até aqui, estou errada?

–Não. – afirma. – Você está certa.

– E posso saber o motivo? – pergunto. – Não que eu esteja incomodada, mas sou curiosa
e estas pausas só me fazem criar teorias atrás de teorias, que possivelmente não tem nada a ver
com o real assunto.

– A curiosidade. – com um tom pensador. – Sempre tão presente nos jovens. – e respira
fundo, encarando–me. – Sabe Flora, nos mais de vinte anos de vida de Oliver, eu nunca o vi
desse jeito por nenhuma garota e confesso que quando você apareceu na nossa casa, pensei ser
apenas mais uma na infinita lista que meu jovem garoto contraditório possuí.

Olho para ele com o cenho franzido e espero que ele continue.

– Com uma força que nem eu mesmo possuo, Oliver, sempre quis ser como eu, falar
como eu e agir como eu. Só que ele nunca percebeu que ele sempre seria melhor do que eu. –
engole em seco. – Veja bem, não quero parecer clichê, mesmo que eu pareça, quando digo isso,
mas meus filhos foram os erros mais certos que já fiz nessa vida, as melhores coisas que já
possui. Olavo se parece muito comigo quando era jovem e Oliver? Sempre foi o oposto, mesmo
que tentasse seguir pelo mesmo caminho.

Continuo olhando para ele da mesma forma, sem entender.


–Seguir o caminho de seu criador e ignorar dentro de si os seus instintos por medo. – e
olha dentro dos meus olhos. – Oliver sempre teve medo de mostrar o qual carente e sensível ele
é. É forte como nunca pensei ver alguém ser, mas sensível de uma forma difícil demais para eu
lidar. Não sei se foi pela pouca idade que tive que criar sozinho dois garotos ou a falta de uma
mãe, só sei que fiz o que pude e ainda faço isso.

– Tenho certeza que fez seu melhor.

– Não fiz. – constata olhando para os dois rapazes e vendo Oliver se despedir com
rapidez, correndo para dentro da casa. – Nem metade.

Algo deve ter acontecido, é a primeira coisa que vem em minha mente e na de Otto
também, que parece está pronto para explodir. Engulo em seco e seguro a vontade de me levantar
e correr até Oliver.

– Eles são educados e nunca fariam mal á ninguém. Certamente, isso só prova que
mesmo de sua maneira torta, fez um bom trabalho cuidado dos dois.

– Talvez você tenha razão ou talvez não tenha. – diz e se levanta com impaciência. –
Você parece ser uma boa garota, Flora. Assim como parece gostar de Oliver, espero que não seja
um pré–julgamento precipitado de minha parte, eu realmente espero.

Confusa é apelido para o que suas palavras me deixam, mas não será ele que irá me
esclarecer nada disso, será Oliver e neste exato momento.
Cinco minutos depois que tomei minha decisão, estava andando até o meu quarto, com
rapidez. Era para ter ido atrás dele antes, mas Jesy se pós em meu caminho e quase não consegui
enrolar ela e partir para o meu objetivo. Minha sorte foi Olivia te–lá chamado, se não, estaria lá
até agora.

Ela conseguia ser persistente quando queria.

Algo que infelizmente eu nunca aprendi a ser.

Termino de subir a escada ofegante e logo invado o quarto, não encontrando nenhum
sinal de Oliver dentro do quarto escuro. Estranho e olho ao redor, acabando por escutar um
gemido no banheiro. Sigo até lá preocupada e a imagem que vejo me corta o coração. Oliver
estava sentado no chão com as costas encostadas na parede e cabeça tombada para trás, com as
luzes do banheiro desligadas.

Tão frágil.

Engulo em seco e fico estática por um tempo, com os pés quase colados no chão, sem
conseguir me mexer. Ele parecia precisar de cuidados, como um bebê e essa constatação não
fazia nada além de deixar meu coração partido. Sem reação, não consigo desviar o olhar e vejo o
exato momento que seu rosto cai para o lado e me encara, com descontentamento.

– Você não deveria está aqui. – ele sussurra emburrado e eu ando em sua direção, ou
tento, pois de uma forma bruta, Oliver ordena. – Não! Não chega perto! Sai daqui, Flora!
–Oly...

– Sai.

Seu berro me assusta e eu ando para trás, quase correndo para fora e acabando caindo de
bunda no chão. Á porta do banheiro bate com força e eu fico estática no mesmo lugar,
observando a pintura da porta enquanto a madrugada adentra sem conseguir me mexer. Lágrimas
querem descer, mas parece que meu cérebro não entendeu ainda o que se passa e se nega
veemente a isso. Em certo momento da noite, acabo pegando no sono e só acordo com Oliver
abaixando perto do meu rosto. O quarto está escuro, me impossibilitando de ver alguma coisa.

Minhas costas reclamam e eu me sinto tão cansada, que quando ele me ajuda a levantar
do chão, não consigo outra coisa a não ser cair na cama e dormir direto. Ou bem, assim era até
que um movimento bruto me acorde e eu me sento na cama, um pouco atordoada. E então, eu o
encontro sentado na beira da cama, com os cotovelos apoiados nos joelhos e as mãos segurando
o rosto enquanto encara o chão.

Engolindo em seco e rastejo até ele, tocando seu ombro, sentindo–o frio e rígido.

– Volte a dormir, Flora. – ele manda em um sussurro raivoso. – Não diga nada e só me
deixe em paz.

– Você não...

– Não, eu não quero ajuda ou preciso de algo. – ele me corta. – Volte a dormir que eu
logo irei fazer isso também.

– Oliver...

– Só durma, Flora!

Ele praticamente implora e eu resolvo fazer o que ele me pede. Ou bem, fingir, pois tanto
ele quanto eu sabíamos perfeitamente que eu não conseguiria dormir sabendo que ele não está
bem.
Está noite minhas suspeitas, se tornou realidade, uma realidade que eu nunca gostaria de
viver e que, fazia-me sentir falta da ignorância de antes.

Depois de uma noite praticamente em claro, sento–me na cama e escuto de longe o


barulho do chuveiro. Respiro fundo e olho ao redor, encontrando seu lado da cama intacto.

Encaro o nada e respiro fundo, levantando–me da cama e abrindo a janela para olhar para
o lado de fora. O amanhecer precoce faz meus olhos lacrimejarem, mas não desvio o olhar,
observando ao redor até meus olhos se acostumarem e a visão da água batendo nas rochas e a
imensidão de areia não seja mais o suficiente para prender minha atenção.

Solto a cortina e viro–me para trás, sendo pega desprevenida por Oliver que está se
sentando na cama só de toalha, ajeitando os travesseiros atrás de si. Em silêncio, ele se acomoda
na cama e liga a televisão, quebrando o silêncio do quarto e virando–se em minha direção como
se sentisse meus olhos sobre si.

Seu rosto está pálido, destacando os círculos pretos ao redor dos olhos, que não era
apenas de cansaço.

– Você está se sentindo melhor? – questiono andando com passos contidos até encostar
os joelhos na beira da cama.

– Comparando a está madrugada. – Deu de ombros sorrindo sem mostrar dentes.– Vou
tirar o dia para descansar. Estou exausto e com o estômago um pouco sensível para movimentos
bruscos, se arrume e vá se divertir com o resto do pessoal.

Tenho vontade de rir. Diversão. Como ele pode pensar que eu poderia me divertir
sabendo que ele não está bem?

– Eu não estou com vontade de ficar com eles. – afirmo. – Quero ficar com você!

Ele me encara durante alguns segundos e pergunta inexpressivo.


– Você tem certeza? – e continua. – Se for por causa de mim, não tem necessidade. Vou
dormir e você vai perder toda diversão da mesma forma que perdeu ontem, por causa de mim. –
e não me deixa dizer nada, quando faço menção de fazê-lo. – E pelo que me lembro, te chamei
para isso e não para ficar na cama comigo porque fui guloso e comi mais do que eu deveria.

Bufo e digo. – Está gastando saliva á toa. – dando como definitivo. –Eu vou ficar com
você e ponto final.

– Flora.

Ignoro seu chamado e me tranco no banheiro, encostando–me na porta e encarando o


chão como se ele estivesse aqui, da mesma forma de antes. Tão frágil. Com certos pensamentos
dolorosos criando vida, desvio o olhar do chão e vou agir com minha vida, deixando toda
preocupação de lado.

Não muito tempo depois, saiu do banheiro enrolada na toalha e vejo Oly coberto até o
abdômen, piscando de forma lenta enquanto olha para televisão, em um daqueles programas de
carro que ele tanto adora.

Fingindo que eu não estava lá, ele permaneceu quieto por todo o momento que me vesti e
não mudou em nada no decorrer do tempo que me sentei e esperei pacientemente por seu olhar
em mim ou apenas algo que mostrasse que ele sabia que eu estava ali e que se importava.

Mas tudo o que eu ganhava, era o seu silêncio.


Ele de fato me queria longe daqui.

Reviro os olhos com essa constatação e me arrasto até a beira da cama. Coloco meus
chinelos e o encaro encontrando-o preso em seu mundinho particular.

– Estou indo comer algo. Gostaria que eu lhe trouxesse algo?

Ando até está de costas para televisão e de frente para ele, esperando por uma resposta
que nunca vem. Respiro fundo para ter paciência e saiu da frente, abaixando–me para pegar a
sacola com o presente de Olavo e saiu sem uma palavra que fosse de Oliver.
Antes de fechar á porta, olho de relance e o vejo deitado de olhos fechados, respirando
fundo, como se tivesse pedindo forças e pego o exato segundo que seus olhos verdes se abrem,
mostrando toda magnitude e confusão que existia dentro desse homem. Encaro por alguns
segundos e com uma força sobre–humana, desvio o olhar e bato á porta, andando até o andar
debaixo.

Como esperado ninguém está por ali, o que facilita minha ida até a cozinha com calma,
sem precisar usar de falsidade para mascarar tudo que sinto e conversar com alguém. Respiro
fundo e abro a geladeira, pegando o necessário para montar um sanduiche e um daqueles sucos
de caixinhas de uva. Sento–me no banco da bancada e como com lentidão, pensativa demais para
me concentrar só no gosto da comida.

Levo o copo á boca e tomo mais um longo gole do suco, sendo surpreendido por Olavo,
que invade á cozinha com os cabelos úmidos e um calção de banho e sem dizer nada, senta–se
em minha frente e me encara com seriedade.

– Bom dia. – e questiona. –Oliver não desceu com você?

Encaro–o e coloco o sanduiche no prato, engolindo o pedaço do pão recheado e apoio


minhas mãos na bancada de mármore frio.

– Ele está descansando. – resolvo dizer apenas, evitando dizer o que de fato aconteceu.
Acho que Oliver não gostaria de preocupar seus familiares.

– Descansando? – pergunta encarando–me de forma pensativa e um pouco desanimada. –


Você o viu passando mal ou teve ele reclamando de uma indisposição ou fadiga visível?

– Ele teve uma noite mal dormida. – revelo meia verdade e dou de ombros. – Está com
sono e quer dormir. Nada que precise de nossa preocupação. – e resolvo questionar. – Por que
pergunta isso? Oliver estava reclamando de algo?

Minhas palavras o fazem desviar o olhar para longe e volta em seguida, com um sorriso
pequeno que não alcança os olhos.

– Não. – afirma. – Eu só perguntei por que ele não parecia muito bem ontem á noite.

É, pelo visto não fui a única a perceber isso.


– Além de não ter dormido direto, ele não aparentou está sentindo nada. – digo para
tranquiliza–lo. – Vá se divertir com o pessoal, eu vou ficar com ele.

Minha afirmação o faz olhar dentro dos meus olhos e respirar de uma forma audível. Ele
desvia os olhos dos meus sem graça e passa pelo cabelo olhando de relance para a sacola de
esportes que coloquei em cima da bancada.

– Isso é para mim? – ele pergunta meio envergonhado.

– Sim. – e explico levantando–me e pegando as sacolas em mãos. – Sei que seu


aniversário foi ontem, mas eu acabei me esquecendo de te dar o presente e só lembrei por está
manhã. – ele aceita a sacola desconfortável e me encara, sem saber o que fazer, olhando dentro
da sacola. – Oliver me contou sobre sua paixão por lutas e essas coisas e achei que essas luvas
seriam uma boa escolha para lhe presentear.

Ele não diz nada e continua da mesma forma ao tirar as luvas vermelhas de couro de
dentro das sacolas. Observei de perto, esperando por uma reação sua e percebi que ele estava
meio desconcertado, ficando mudo durante uns longos segundos.

–Olha, se errei na escolha, tenho a nota fiscal. – começo chamando sua atenção. –Posso
te dar para que escolha algo ou...

– Eu gostei. – ele me interrompe, mostrando os olhos um pouco sentimentais. – Gostei


bastante... É só que eu nunca ganhei nada de ninguém, ninguém sem ter o mesmo sangue que
eu... Obrigado!

Sem demoras andei os passos que nos separavam e o abracei, deixando–o surpreso e sem
reação.

– Não precisa agradecer. – afirmo e me afasto. – Se pudesse te daria algo de maior valor,
mas sabe, ainda sou só uma estudante.

– Entendo. – sorri de uma forma engraçada. – Eu acho que você acertou na escolha,
mesmo que não tenha sido um dos mais caros, pode ter certeza que foi um dos melhores.
– Eu tento. – dou de ombros e ele sorri balançando á cabeça. – Vou terminar de tomar
meu café.

Ele segue meu dedo e percebe que eu estava comendo.

– Você está comendo. – afirma o obvio e aponta para si. – Será que tem algo sobrando
para está magnífica pessoa?

– Claro que sim.

Depois de conversar por um longo tempo com Olavo, ele resolve voltar para o resto do
pessoal, oferecendo ficar com Oliver para eu pegar um pouco de sol, mas nego e logo vou para
junto de Oliver. Junto comigo, levo alguns biscoitinhos de água e sal e um chá, que providenciei
quando Olavo já estava bem longe de minhas vistas. Abri á porta do quarto com lentidão e me
deparei com Oliver encarando o teto, desviando os olhos para mim com rapidez, quando me
aproximei dele.

– Sei que seu estômago não está muito legal, mesmo assim eu trouxe uns biscoitos e um
chá. Uma coisa leve para você comer. – informo. – Porque de certeza você deve estar faminto.

Ele me olha por alguns segundos e aceita a bandeja quando eu ofereço a ele, me enviando
em troca um sorriso agradecido. Sento–me na cama ao seu lado e o vejo comer em silêncio,
desviando minha atenção para televisão e só depois de um tempo, um pouco longo, tive o prazer
de ouvir a voz dele novamente, fazendo comentários de pouquinho em pouquinho até estarmos
ambos conversando e sorrindo como se no começo daquele dia, ele não estivesse me evitando,
por negar–me a ficar longe dele.
Seis da manhã de uma segunda–feira. É o que minha mente lembra com indignação
quando saiu pela grande porta da mansão alugada e sou recompensada pelo vento frio no rosto e
a beleza d’água batendo nas rochas. O sol ainda não chegou ao seu ponto no céu e o amanhecer
precoce é algo bonito e relaxante para se observar.

Respiro fundo e sorrio apreciado o ar puro, sendo tão diferente para quem mora em uma
parte distante dos mares e vegetação. Abro os olhos ao escutar passos atrás de mim e desço os
últimos degraus da entrada, olhando para trás e encontro minha amiga com um coque feito de
qualquer forma no alto da cabeça e um óculos de sol grande demais para o seu rosto.

– Noite de sono ruim?

– A noite não foi ruim, foi péssima. – ela afirma desgostosa. – Mas infelizmente o fato de
acordar cedo ganha de lavada no quesito irritação.

–Huh. – ela arqueia uma sobrancelha e me olha de forma estranha. – Você poderá dormir
no carro.

–Duvido muito. – é o que ela responde, se afastando.

Dou uma volta e encaro a mansão, tendo rapidamente tudo o que aconteceu atingindo–me
de uma forma brusca. Esse fim de semana foi de o melhor da minha vida para um dos piores.

Aqui adormeci observando as estrelas no braço daquele que faz meu coração bater tão
forte. No dia seguinte, quase morri afogada em uma brincadeira idiota e ganhei como um pedido
de desculpas um dos melhores sexos da minha vida, não sendo o suficiente para amenizar o mal
está que senti por passar por aquele susto ou ao ver Oliver passar tanto mal e agir em seguida
como se não fosse absolutamente nada. Como se eu fosse um incomodo.

Respiro fundo e desvio o olhar para ele, tendo ele conversando de uma forma
aparentemente desagradável com o seu pai, em um assunto que não parece agradar nenhum dos
dois.

Otto parece perceber que encaro os dois e me olha de forma dura, tendo Oly segui o seu
olhar e volta no mesmo instante há encarar seu pai, arrancando de suas mãos as chaves do carro e
andando com passadas duras até o seu carro.

Seu pai o encara de longe e desvia o olhar, respirando fundo em busca de paciência. Uma
curiosidade me bate para descobrir o que foi falado para ter uma cena como aquela, mas ela logo
se vai quando a constatação de que independente do assunto tratado, nada seria dito para mim.

Se eu não descobrisse logo o que Oliver escondia de mim, nós dois não iriamos muito
longe.

– Flora. – meu nome é gritado e vejo Oliver acenar com um sorriso, tendo Jesy ao seu
lado com uma expressão de desgosto com suas mãos tampando os ouvidos. – Vem!

Observo–o por alguns segundos e pisco de forma lenta começando a andar em sua
direção. Com um passo de cada vez, vejo a diferença entre ontem e hoje. Indo de irritado e
visivelmente doente para um homem com uma felicidade espantosa para se ter no começo do
amanhecer.

E isso me faz questionar, seria essa cena verdadeira ou só um teatro orquestrado para me
fazer esquecer os acontecimentos de ontem?

Bem, seja o que for, não me faria esquecer nada do que houve. As imagens foram muito
marcantes para serem apagadas com tanta facilidade.
Uma música de um cantor famoso toca no rádio, criando um ambiente confortável; Jesy
cantarola no banco de trás olhando pela janela e assistindo as casas bonitas e caras de seu bairro
chique, alheia a todo o resto e desvia o olhar do lado de fora para encarar nos dois, quando o
carro estaciona em frente a sua calçada.

– Está entregue. – afirma Oliver fazendo–a olhar para ele e ele me encarar dizendo com
amargura. – E sã e salva, como prometi.

– Obrigada pela carona. –Jesy agradece e completa. – E por me chamar para aproveitar o
fim de semana. De certeza foi muito divertido, apesar de quase não ter visto minha amiga.

Ignorei suas palavras e ele riu com amargura.

– Não me culpe por isso, eu não pedi que ela se privasse de nada.

O encaro irritada.

– E eu por um acaso falei que você fez isso?

Minha pergunta faz com que ele me encare e de uma forma nada sutil, trocamos farpas
um para o outro por longos segundos, pelo olhar, segundos estes que durariam muito mais se
Jesy não interrompesse.

– É, acho melhor eu me retirar de cena, pois de fato não quero presenciar uma briga entre
os dois.

Desvio o olhar e solto a respiração, tirando o cinto de segurança e saindo ao mesmo


tempo em que Jesy. Ajudo–a com as malas e ela olha de relance para Oliver, que está dentro do
carro mexendo nas estações de rádios locais.

– Desculpe por não ter te dado atenção. – quebro o silêncio e ela sorri.

– Não precisa se desculpar por isso. – dá de ombros e me abraça. – Ligue–me quando


chegar em casa, se você e Oliver não se matarem antes.
Tento dizer algo, mas um cheiro de perfume masculino misturado com bebida embrulha
meu estômago, seguido por braços fortes invadindo nosso abraço e nos apertando de uma forma
desconfortável.

Tito.

– Minhas garotinhas. – em um tom divertido ele nos cumprimenta, ignorando o fato de


estarmos empurrando-o para longe. Ele nos aperta mais por alguns segundos, beijando as
bochechas de Jesy e o canto da minha boca quando se afasta. Olho com repulsa, mesmo assim
ele não tira os olhos de mim. – Flora, minha baixinha Flora. Esqueceu que eu existo?

O brilho raivoso e possessivo de seus olhos me arrepia de uma forma desagradável.

– Claro que não.

– Pois parece, nunca mais apareceu. – lamenta falsamente e sorri de forma zombeteira ao
olhar para trás de mim. – Aquele garoto que anda para cima e para baixo com você parece que
quer me fulminar com o olhar.

Desvio minha atenção para ele e vejo Oliver de cara feio, com os braços cruzados no
abdômen e a mandíbula trincada. Ele estava se controlando para não brigar. Tentando evitar uma
briga entre os dois homens, encaro Tito e digo.

– Eu preciso ir, ele tem compromissos a serem cumpridos.

– Ah, claro. – com um tom indecifrável. – Se for só por isso mesmo, não precisa se
preocupar, eu mesmo te levo depois.

– Não há necessidade, tenho coisas para fazer em casa. – sorrio dando de ombros. – Até
mais tarde Jesy.

– Até Flora.

E me viro, sendo puxada por Tito, que me abraça e sussurra deixando-me enojada.
– Te vejo em breve, minha garotinha.

Engulo em seco me afastando e viro–me em direção a Oliver que está afastado do carro,
como se estivesse vindo fazer algo, mas para de forma brusca. Jesy se despede de mim
novamente, alheio a tudo o que está para acontecer. Mas não me viro para olhar para ela e
continuo andando até está dentro do carro, com Oliver ao meu lado e nos dois indo para nossas
respectivas casas.

OLIVER

O nervosismo parece me devorar lentamente enquanto dou tudo de mim para dirigir com
toda minha atenção e levar Flora para casa em segurança. Tarefa cumprida manobro o carro e
dirijo pela estrada contado os segundos enquanto ainda estou tentando lidar com o desconforto e
o incomodo que ter Flora me visto passando mal havia me causado. Humilhado e derrotado são
duas palavras perfeitas para descrever aquele momento. Sei que deveria está grato por isso, mas
não consigo.

Além de me sentir como um inútil, por ter que controlar todos os meus impulsos, sinto–
me um fracasso como ser humano, por permitir que eu envolvesse alguém que nunca conheceu o
verdadeiro significado de sofrimento em uma situação como essa, que as probabilidades
apontavam para o fracasso eminente que seria o fim da minha existência.

Eu já li e sei perfeitamente como são as mortes por insuficiência dos órgãos e garanto que
não é nada agradável de presenciar. Enerva–me ter em mente que ficarei como aquelas pessoas,
vivendo até que os meus órgãos parem de funcionar e as maquinas não sejam mais o suficiente
para me manter vivo.

Mas não é tão ruim como o sofrimento desnecessário que farei Flora passar. Perder
alguém importante sempre é doloroso, deixando questões que não podem ter resposta na maioria
das vezes e um desespero que parece te engolir vivo, nos melhores dias.

Eu faria aquelas ao qual amo passar por isso.


E egoísta de minha parte acrescentar mais alguém na lista do sofrimento. Alguém ao qual
jurei a mim mesmo ser honesto acima de qualquer situação e que sei, mas do que qualquer coisa,
que preciso contar de uma vez o que tanto gosto de fingir não existir.

Minha insuficiência renal crônica.

Entretanto, antes de fazer isso, eu preciso resolver um assunto pendente e tirar essa carga
que ficou preso em mim desde o dia ao qual eu senti na pele o verdadeiro peso do abandono; o
peso de perceber que eu não valia nada para quem eu considerava ser meu tudo.

Minha mãe.

Mulher que me deu a vida e nunca me tratou como eu gostaria de ser tratado. Ao invés
disso, escolheu um caminho errado e deixo–me nas mãos de homens inexperientes que não
sabiam o verdadeiro significado da palavra carinho e afeto. Nova e perdida são as certas para
descreve–lá. Com duas crianças novas no colo e escolhendo de escape as drogas para tentar
diminuir o desprezo por aquela vida medíocre, escolheu como alvo os mais fracos para se
rebelar.

Seus filhos.

Ainda posso lembrar–me da dor que senti, quando percebi que ela tinha nos abandonado
e que meus pensamentos ingênuos de um dia ser como aquelas famílias de comercial de
margarinas, com a mãe sorrindo para o filho com amor e dedicação. De fato doeu, perceber que o
desejo que sempre nutri, nunca iria ser suprido.

E então, por pura sobrevivência, usei o descaso do meu pai pelo assunto e me empenhei
em ser como ele; falar como ele e pensar como ele. Otto Bennett tinha uma forma impactante de
pensar sobre o mundo, é de fato uma pena que todo o esforço que utilizei para ser exatamente
como ele, não serviu de nada.

Fui crescendo e deixando de ser o menino carente e me tornei um adulto tão carente
quanto aquele garoto.

Carente, incompreensível e forçado.

Ninguém nunca pode negar ser quem realmente é.


E neste fim de semana, ao ver meu irmão implorar para perdoa–lá e vir pedir para que ela
me ajudasse, deixou–me pensando se não seria melhor eu fazer isso, perdoar ela por não suprir
com minhas necessidades ingênuas e seguir em frente, tendo ela salvando minha vida ou esperar
no hospital por algum milagre divino que diminuísse a lista gigante e me de mais alguns anos
para viver.

Esperança era uma merda.

Bufo uma risada e ainda aéreo, resolvo ir ao endereço que estava memorizado em minha
mente. Minhas mãos suam e meu coração acelera. Estou vivo e sentimental como uma garota.
Realmente uma merda ficar doente e precisar engolir remédios e seguir um estilo de vida para
que sua próxima respiração não seja sua última.

Flora me acalma, mas me frustra também e nesse momento, tudo o que menos preciso é
ter que lembrar–me da cena desta manhã. Aquele homem a quer, perceptível de longe e não me
senti nada além de humilhado por não seguir meu instinto e mostrar quem era aquele que a
possuía, de corpo e alma.

Jogo esses pensamentos para escanteio e aumento a velocidade, sentindo dentro de mim
meu sangue se agitar e o corpo arrepiar pela sensação poderosa e única que o motor queimando o
asfalto e levantando poeira me proporcionavam.

Liberdade. Era o que eu sentia quando dirigia. Meu destino estava em minhas mãos.
Morrer ou viver, eu jogava minhas cartas ao ar e deixava as ruas me guiarem pelos caminhos
mais impróprios, sem me preocupar com nada além do volante deslizando em minhas mãos.

Uma pena que dessa vez o destino me levou até uma casa com cercas brancas e um
gramado bem cortado. O lar da mulher que me deu a vida. A casa aparentava ser como aquelas
de filmes para família. Com telhados combinando com a cor das paredes e toda aquela faixada de
casa dos sonhos com uma família feliz e um marido bem sucedido, que assiste futebol aos
domingos e gostam de jantares postos nas mesas incrementados com conversas nada
interessantes sobre os acontecimentos do dia.

Ando com lentidão pelo caminho de pedras e encaro à porta, apertando a companhia.
Evito pensar muito sobre isso e espero com certa impaciência até que alguém abra e não sei ao
certo o que sinto quando um garotinho de no máximo oito anos me atende.
Ele tem olhos como os dela, um tom único que eu nunca esqueci; mas estes estão repletos
por inocência e confusão, que me paralisa quase por completo.

– Oi? – o garotinho arqueia uma sobrancelha.

– Peter. – uma voz irritada soa como um aviso. – Já falei para não atender a porta sem...

Ela para de forma súbita, arregalando os olhos de surpresa e engole em seco. Seus olhos
mostram espanto e sua boca se abre, como se não acreditasse que seu passado batesse em sua
porta no horário do almoço.

É, se eu fosse ela também estaria assim.

Atônicos, nós nos encaramos e apesar de ela só ter me visto quando era apenas um
menino, eu sei perfeitamente que ela me reconhece.

Entretanto, permaneço alerta e a espera de qualquer reação sua. Neste momento, tudo é
possível.

– Mamãe. – o menino puxa sua roupa chamando sua atenção. – Quem é esse?

– Ele é... – aérea, ela começa e completa não me impressionando. – Um filho de uma
amiga distante da mamãe.

O menino olha entre nós dois e da um passo a frente, apontando sua mão para mim, que
eu prontamente aperto de volta.

– Sou Peter. – se apresenta. – E espero ser tão alto como você um dia.

– Oliver. – sorrio ao dizer, estando ciente que ele nunca saberia quem eu era de verdade.
– E você vai crescer quando chegar o momento certo.

– Assim espero.
– Filho. –Scarlett chama. – Pode esperar lá dentro? Mamãe precisa conversar com o
rapaz.

O garoto olha entre nós dois e da de ombros.

– Tchau Oliver. – se despede dando as costas.

E ficamos nos dois sozinhos, sem saber o que dizer. Ela está incrédula e olha de relance
para dentro, fechando à porta e encarando–me sem saber o que fazer ou como reagir. Diria que
estava perto de surtar.

Seu olhar examinava todo o meu ser, como um raio x, vendo tudo como eu aparentava
mostrar e se enchendo de suposições, sendo impulsionada por uma, que valeu como um tapa na
cara.

–Olha, eu reconstruí minha vida. Fiz uma família ao qual tenho orgulho e possuo uma
boa renda familiar. Mas isso não significa que irei te dar algum dinheiro. Estive nessa vida antes
e te dou conselho, saia dela antes que ela te devore.

– O que? Não sou um drogado e não quero a porcaria do seu dinheiro. – afirmo com
veemência e constato. – Eu sempre estive certo, nunca deveria ter escutado eles dois. Desculpe
pelo incomodo e esquece que um dia eu existi.

Não espero que ela diga qualquer coisa, só me viro puto da vida e extremamente
humilhado. Meu nome é chamado por ela, mas ignoro estando com uma vergonha absurda, por
saber como isso seria e mesmo assim vir pelos apelos de meu pai e irmão.

Uma péssima ideia, mas será só mais uma que irei contornar e seguir em frente. Vir aqui
foi um erro, mas pelo menos, ninguém poderá dizer que não tentei. Porque eu tentei. Eu fiz o que
me foi pedido e só eu sei o quanto doeu.

FLORA
De banho tomado, deito na cama e sinto as cobertas macias me envolverem como um
abraço, fazendo–me perceber que sucumbi ao sono só quando me desperto pelo barulho da porta
de entrada sendo aberta. Desperto-me com rapidez e sento–me na cama, procurando o celular
para olhar as horas.

13:34 PM.

Solto na cama e encaro o nada por um tempo. Espreguiço-me lentamente e ando até as
escadas, parando de forma brusca ao ver uma estranha ao lado de minha mãe. A garota é ruiva e
é tão pálida e magra que parece está doente. Além disso, há uma tristeza em seus olhos verdes,
um sofrimento, que me faz sentir mal.

– Mãe. – chamo–a e ela me olha de forma seria, trazendo a atenção da menina triste para
mim. – Quem é essa?

Minha pergunta sai sem que eu possa segura–lá e minha mãe me encara, deixando-me
desconfiada.

– Flora, nós precisamos conversar.


A frase simples teve o efeito desejado sobre mim e agora, sentada no sofá da sala, estava
tão ansiosa que apertava minhas mãos juntas, encarando a menina ruiva que aparentava
desconforto. Não sabia se era pelo modo como a encarava ou se era pelo motivo de sua visita
indesejada. Queria perguntar de uma vez o que é tão necessário conversar com essa estranha e
principalmente o que ela fazia aqui com minha mãe. Mas sabia que ela não iria dizer nada sem
minha mãe por perto.

Minha mãe foi buscar água, mas acabou por trazer suco em nosso conjunto para visitas.
Com um sorriso incomum, minha mãe deposita a bandeja em nossa mesa de centro e enche os
copos com suco, entregando um para menina, que sorri timidamente.

– Obrigada.

Com um aceno e um sorriso educado ela desvia a atenção da garota e aponta o copo para
mim, que prontamente recuso.

– Estou bem, obrigada.

–Tome, querida. – com um olhar piedoso e uma voz dócil, ela insiste. – É suco de
maracujá, acalmará um pouco dos seus nervos.

– Não quero. – nego novamente e ela respira fundo, ainda me olhando. – O que acalmará
meus nervos será você me explicando quem é essa garota e o real motivo para ela estar aqui.
A menina encara o chão sem graça e minha mãe me manda um olhar.

– Modos Flora, modos.

–Modos? Você fica três dias fora de casa, falando que é a trabalho e quando volta é com
uma menina que eu nunca vi na vida com um papo de que precisamos conversar. – levanto–me
perdendo a paciência. – Quer conversar? Então fale logo de uma vez e pare de ficar me
enrolando.

Olhando para mim, ela questiona. – Parou com o show?

Respiro fundo e só a encaro, sentando–me no sofá novamente. Minha mãe se senta ao


meu lado e pega um dos copos, tomando um gole do suco. Ela encara a menina e iniciando uma
apresentação, que para mim, servia apenas como mais um pouco de enrolação.

– Flora, está menina ao qual você não mostrou um pingo de educação desde que
conheceu é a Malaia. – seguro a respiração para evitar interromper com alguma resposta
realmente inadequada. –Malaia, está é a minha filha Flora.

– Então é ela a vítima da vez? – com um tom baixo, ela questiona e minha testa franzi.

Vítima da vez?

– Sim. – minha mãe afirmou e olhou de relance para mim, continuando com um ar
sofrido. – É ela!

– Vítima da vez? – questiono confusa. – Do que vocês estão falando? Por que eu seria
uma vítima? – e olhando com um olhar acusador para minha mãe, questiono. – Mãe, o que você
fez este fim de semana?

Sem culpa, vergonha ou arrependimento, ela confessa.

– Busquei saber sobre o verdadeiro Oliver Bennett. – encaro–a indignada. – Sabia que o
que aquele rapaz mostrava não era a verdade e fui atrás dela.
– E deixe–me adivinhar. – em um tom alto e sarcástico. – O que descobriu tem a ver com
essa garota?

– Sim.

Seu tom sem emoção me faz levantar e olhar para dentro dos olhos dela.

– Pois perdeu o seu tempo. – e continuo. - Eu conheço Oliver e não me importo com o
que descobriu ou queira me dizer para me envenenar. Todos têm um passado e trazer essa
estranha foi perda de tempo e dinheiro.

Ambas me olham com pena, o que de fato me irritou bastante. Viro-me querendo ir para
qualquer lugar, menos ficar no mesmo lugar que minha mãe ardilosa.

– Para que lugar pensa que vai? – minha mãe pergunta.

– Para qualquer lugar que você não esteja.

E quando chego à porta, ela solta de uma vez.

– Oliver está doente. – seguro a maçaneta. – Foi o que eu descobri.

Quero rir dela, foi tão longe para descobrir o óbvio.

– Eu sei.

– Sabe? – perguntou esperançosa. – Então talvez você não tenha sido contaminada.

Meu coração se aperta. Engulo em seco e me viro apoiando–me na porta. Do que diabos
ela estava falando?

– Do que você está falando?


Pânico aparece em seu rosto e ela engole em seco atordoada.

– Oliver é soropositivo, querida.

– O quê? – solto o peso do meu corpo na porta. – Você está brincando comigo.

Isso era um absurdo. Se Oliver tivesse uma doença como essa, ele teria me informado.
Conheço–o suficiente para acreditar fielmente nisso. Ele não está com essa doença. Está
enfermo, mas não é por isso. Não pode ser.

– Queria está, querida. – minha mãe diz com tristeza. –Malaia veio comigo porque foi ela
que passou a doença para ele. Ela fez umas escolhas erradas na vida, que acabaram por ter esse
resultado drástico.

– Eu sinto por ela. – afirmo olhando para minha mãe e encarando a mulher atrás dela. –
Sinto por você, de verdade. Mas não acredito no que diz. Oliver está doente sim, não nego isso,
mas tenho certeza que o que ele tem, não é isso.

A ruiva chora e passa a mão no rosto e eu sinto vontade de chorar por ela e por Oliver
está cada vez mais debilitado pelos seus problemas de saúde. Lembro-me dos seus sintomas, mas
não quero pensar nisso.

– É bonita a forma como acredita nele, realmente. – Malaia afirma com voz de choro. – É
visível como gosta dele e como está com medo, mas não tenho motivos para mentir para você. –
meus olhos ardem e eu solto uma respiração dolorida. – No começo do ano, eu descobri a doença
e procurei por Oliver, assim como outros garotos ao qual fiquei, informado sobre a possibilidade
de eles terem pegado essa doença terrível de mim.

Oliver sempre usava camisinha, ele sempre disse isso para mim e usamos até hoje. Ele
não daria esse molhe. Tenho certeza!

– Ele não foi um dos infectados. – afirmo ganhando um olhar de pena dela.

– Flora. – minha mãe grunhiu. – Não minta para si mesma.

– Não estou mentindo. – afirmei. – Oliver diria para mim se isso fosse verdade.
– Você é uma tola que caiu de amores por um corredor ilegal de rachas. – ela grita. –
Você acha que foi à primeira? Não passa da garota da vez, que aposto eu que viverá como uma
das opções disponíveis quando ele partir para outro lugar.

– A senhora só está fazendo intriga. – afirmo encarando-a e percebendo o que eu já sabia


desde que me conhecia por gente. – Você é tóxica! Sempre viveu em uma bolha se achando
melhor do que todos ao seu redor. Agora eu percebo o quanto meu pai é sortudo por ter se
livrado de você.

Meu rosto vira para o lado com tanta força que bato na parede. Minha mão
automaticamente toca o local atingido e o sinto úmido e gosmento. Sangue. Meu rosto queima
conforme volto a encarar minha mãe e a vejo me olhar com horror.

Você não pode retirar o que disse, assim como você não pode mudar algo que já foi feito.

– Ao invés de ficar se empenhado em destruir a felicidade alheia, deveria usar essa


energia para corrigir seus erros e zelar pelos seus. – afirmo com amargura descendo a mão até a
maçaneta. – Eu te amei um dia, mas eu não sei se o faço nesse momento.

– Flora...

– Sou sua filha, mas isso não significa que não posso te deixar de lado. – continuo e
aponto a cabeça para Malaia. – Aproveite a companhia dela, porque a minha você não vai
aproveitar enquanto não mudar sua maneira de agir.

E saiu batendo a porta atrás de mim. Deixo-a sozinha, completamente sem reação. As
lágrimas molham meu rosto e dói muito respirar, mesmo assim não olho para trás e apresso o
meu passo para longe, estando atordoada demais para não conseguir evitar esbarrar em alguém
no processo.

Envergonhada, tento me afastar e pedir desculpas, mas uma voz conhecida me impede de
dizer qualquer coisa.

– O que aconteceu com você?


Otto.

E minha mãe aparece gritando atrás de mim.

– Flora, entre agora!

Meu sogro a encara e olha para o meu rosto, colocando uma chave separada em minhas
mãos e mandando.

– Entre e fique no quarto de Oliver. Seja o que for que aconteceu, tentarei fazer sua mãe
ficar mais calma.

– Obrigada.

E corro, fazendo o que ele mandou. Minhas mãos tremem, mas abro à porta e olho para
trás, percebendo o pai de Oliver e Malaia tentando acalmar minha mãe, que parecia desesperada.

Minha mãe que nunca me bateu e quando o fez, foi logo no rosto.

Entro dentro da casa e deixo todo o resto no lado de fora. Ao contrário do silêncio que
pensei que escutaria, sou recompensada pelo barulho de um narrador narrando uma luta livre e
por um Olavo que sai da cozinha só de calça com uma tigela na mão.

Com preocupação, ele me encara e eu logo pergunto.

– O que Oliver tem?– e imploro. – Me diga? Por favor!

– Flora... – seu olhar denuncia que ele iria dizer algo para me enrolar.

– Não, não e não. Não venha me dizer meu nome e achar que com palavras doces e
sensatas irá conseguir me driblar e me fazer esquecer este assunto. – encaro ele com seriamente.
– Estou cansada de deixar isso acontecer!

– Porra. – ele xinga. – Você não entende que esse assunto não me pertence? Se essa
merda só dependesse de mim, você saberia desde o início.

Ele estava sendo sincero, mas eu também estava.

– Mas não depende e eu estou de saco cheio de ser a tonta que não pode escutar certos
assuntos. – com rancor afirmo e sussurro. – Estou cheia de ficar no escuro sobre isso. Sei que ele
não está bem, mas sou tratada como uma criança e mantida no escuro sobretudo. Por favor,
Olavo. Conte-me a verdade!

– Ele não vai gostar se eu te falar. Será como um tiro na nossa confiança.

– Será um muito maior se eu sair por aquela porta e virar as costas para todos vocês.

Minhas palavras o fazem engolir em seco. Não era agradável para eu pensar em
abandonar Oliver neste momento sozinho enquanto sofria. Mas também não era ficar da forma
que estou agora, com ele omitindo coisas de mim. Estava decidida em ir morar com o meu pai e
se Olavo não me contasse, não voltaria aqui tão cedo.

Ele continua me encarando e coloca sua tigela em cima da mesa de centro uma mesinha.

– Vamos nos sentar. – travo os meus pés e ele me olha. – O assunto é longo e não é um
que você irá gostar de conversar em pé.

OLIVER

Quando sai da casa daquela mulher, dirigi por um tempo, para colocar minha cabeça no
lugar e parei em um posto para abastecer. Estava cansado demais para dirigir e apesar de ter
dirigido por horas, ainda sim não conseguia entender como fui tão tolo ao procurar Scarlatt e
acho que ficaria um bom tempo até entender isso, mas eu tinha certeza que um dia isso ia passar.
Afinal, tudo passava. Não?

Com o cansaço sendo mais forte que essas questões, dirigi até em casa com rapidez,
estando exausto demais para pensar em outra coisa a não ser deitar e dormir durante um bom
tempo.

Entretanto, eu não deveria pensar que seria está fácil.

Nada é fácil na minha vida fodida, por que começaria agora?

Assim que estacionei, encontrei meu pai conversando calorosamente com a mãe de Flora
e uma menina conhecida, porém estranha estava ao lado, sem saber o que fazer. Havia esquecido
seu nome, mas nunca iria esquecer o terror que ela me fez passar ao pensar que poderia está
AIDS. Por sorte, só tinha essa merda que estava me comendo vivo e o susto só serviu para me
fazer ficar mais atento.

Não que isso foi muito útil, pois fiquei meses sem transar com ninguém antes de Flora.
Percebi com o tempo que fazer sexo não era mais uma coisa tão necessária como antes.

Ela me encara com espantado como se tivesse visto um fantasma e eu desvio os olhos
sem importância. Aciono o alarme do carro e vou para dentro de casa. Ver aquela garota já
deveria ter sido um sinal e a porta aberta já deveria confirmar que algo estava errado, mas eu não
percebi isso de imediato e assim que entrei, escutei a seguinte pergunta.

– Como faço para saber se sou compatível?

De princípio travei, ficando completamente surpreso. Não sabia se era por Flora, alguém
que não tem laços sanguíneos e me conhece há poucos meses estava se oferecendo para ser
minha doadora. Ou por ela está descobrindo por outra pessoa que não era eu.

Algo dentro de mim se agita, mas não deixo se estender quando percebo que a segunda
questão não era tão importante como a primeira. Flora estava cogitando doar seu rim para mim.
E de certeza, não iria de forma alguma permitir algo assim, permitir que ela colocasse sua vida
em risco por causa de mim.

Um homem ao qual ela acabou de conhecer.


FLORA

E de fato foi. Alguns minutos, mas que pareceram horas.

Insuficiência renal crônica.

Eu nunca havia escutado sobre o assunto, assim como nunca escutei sobre transplante de
órgãos. Como sabia se você era compatível ou não? Essa era a pergunta que inundou minha
mente quando ele deu o assunto por finalizado.

Assim como um pensar forte no coração.

Oliver morreria se não conseguisse um rim.

Um órgão.

– Como faço para saber se sou compatível?

Minha pergunta trás a atenção de Olavo para mim e seus olhos possuem um brilho
esperançosa, que dá lugar a temor quando a voz de Oliver é escutada.

– Você não faz. – afirmou. – Não permito que você faça isso.

Com as mesmas roupas desta manhã e aparentado está cansado, Oliver parece que passou
o dia todo segurando o peso do mundo nos ombros e me pergunto se ele não fazia mesmo isso,
afinal, como seria a mente de uma pessoa ciente que, havia uma possibilidade de sua morte está
perto de acontecer?

– Você é louco?
– Não. – Oliver respondeu em um tom cortante. – Não sou louco. Seria se colocasse a
vida de Flora em risco por causa de uma operação fodida que nem sei se terá resultados.

– Salvará sua vida. – seu irmão argumentou.

– Ou acabará comigo morto em uma mesa de cirurgia e Flora sendo dependente de


remédios pelo resto da vida.

Oliver afirma e me encara e então eu percebo que estou chorando enquanto encaro–o e
sinto tanto medo que quase não posso respirar. Oliver pode morrer, não, Oliver vai morrer se não
conseguir a ajuda que precisa.

Eu não podia ficar sem ele.

Eu não queria.

– Oliver... – chamei seu nome.

– Não Flora. – negou com um tom de aviso. – Não me olhe dessa forma, não você e não
agora.

Um soluço me corta e ele fecha os olhos passando as mãos no cabelo.

– Está vendo por que não queria contar? – perguntou olhando para o alto – A única
pessoa ao qual me importo além da minha família vai me olhar com esse olhar. Pena. Eu
abomino este olhar. – e da às costas. – Grande merda! Grande fodida merda!

Seu irmão o segue ao perceber que ele caminha em direção à porta e eu fico no mesmo
lugar, como uma pamonha sem me mexer enquanto minha mente cria mil e uma imagens de
como seria se Oliver não conseguisse ajuda.

Era insuportável de mais.

Um barulho alto me faz acordar e vejo Olavo pegar com rapidez uma chave e sair
correndo para fora de casa. Passo minhas mãos pelo rosto e forço minhas pernas a correr até a
saída, vendo de longe Olavo dirigir uma moto com a roupa que eu o encontrei.

E sem precisar pensar muito, Otto aparece ao meu lado e esclarece o que eu já sabia.

– Ele foi atrás de Oliver.

OLIVER

Vendo vermelho desbloqueio o alarme e adentro ao meu carro rapidamente, sabendo


perfeitamente que meu irmão estava me seguindo. Com os berros que ele dava ficava difícil não
perceber, mesmo para alguém que estava com os nervos aflorados.

Flora sabia e foi lhe dito pela boca do traidor do meu irmão.

– Oliver, você não está em condições de dirigir!

Ignorando-o, aciono a ignição e dou partida, fazendo–o comer poeira por alguns
segundos antes de correr para dentro e pegar a chave para vir atrás de mim.

Não seria a primeira vez que isso acontece.

Bufo uma risada amarga e acelero mais, dirigindo no automático até que minha mente dá
trégua e meu sangue esfria um pouco, deixando–me pensar com clareza e o meu corpo reclamar
de cansaço pelas longas horas sentado. Viro uma curva pavimentada ao ver o sinal vermelho e
respiro fundo tendo um pensamento que me quebra vindo com tudo em minha mente.

Flora deve está arrasada.

Balanço minha cabeça e bato no volante com raiva. A vida era uma cadela!

Respiro fundo e volto a dirigir com carros buzinando atrás de mim. E sou pego de
surpresa quando um carro bate com tudo na lateral do meu carro, me empurrando para o outro
lado da pista que está em movimento. Fico atordoado, mas vejo o exato momento que outro carro
me atinge com força total, parecendo está esperando por isso. Meu carro gira algumas vezes e o
cinto de segurança me aperta de forma agoniante, levando–me direto para a escuridão.
FLORA

Apreensiva, estou sentada no sofá da sala de Oliver. O pai dele está andando de um lado
para o outro, visivelmente preocupado com seus filhos e na espreita para que a qualquer sinal
estranho na minha casa, ele corresse e impedisse que minha mãe fizesse alguma loucura.

Eu deveria ser aquela que está preocupada com isto, mas estava confusa demais com os
últimos acontecimentos para me por em uma situação dessas. Ser aquela que ameniza o fogo e é
a única a se queimar. Não tenho forças para isso, no momento.

O número do meu pai foi pedido por Otto, o homem cujo dois filhos estavam na rua
fazendo sabe–se o que é mesmo assim agia como se nada estivesse acontecendo, algo que eu não
conseguia esconder. Com isso percebi que era de família segurar o mundo nas costas sem nunca
fraquejar.

– Seu pai chegou. – ele avisou encarando a janela. – E Oliver e Olavo logo também o
farão.

– Assim espero. – afirmo apreensiva e um pouco duvidosa.

Passo minha blusa de dormir pelo rosto e estremeço quando o tecido encosta no pequeno
corte que minha mãe fez ao me bater. Uma de suas unhas ou anéis me arranhou, essa é a única
explicação que posso ter.
– Ela pegou seu rosto de jeito. – Otto diz pegando–me de surpresa. – Estava exaltada e
quase fez o mesmo comigo.

Constrangimento me atinge e eu logo deixo sair olhando para cima para encarar seu
rosto.

– Sinto muito.

– Não sinta. – ele diz seriamente. – Você não deve se desculpar pelos erros que não são
seus. Os culpados que devem fazer isso e me desculpe querida, pessoas como sua mãe não fazem
isso.

Ele estava certo. É o que penso ao desviar o olhar e encarar o chão. Minha mãe não se
desculpa por esse tipo de coisa, ela só o faz quando realmente necessita. Uma pessoa egoísta que
olha para as pessoas procurando por oportunidade para beneficiar a si mesma.

Ela fez isso com Malaia, trazendo-a para uma casa estranha, tentando me deixar contra
Oliver. E quando não teve o resultado desejado, mostrou quem realmente é. É duro pensar no
que minha mãe fez, parece irreal de mais para se imaginar, mas aconteceu. Minha mãe preferiu
me fazer acreditar que eu poderia está com uma doença sexual transmissível e incurável só para
acabar com o meu relacionamento com Oliver.

Sorrio com amargura. Meu Oliver que saiu como um louco de casa quando escutou eu me
oferecendo para salva–lo.

– Minha mãe disse que ia sair um fim de semana a trabalho. – me pego dizendo. – E
quando voltou trouxe aquela garota, para me fazer acreditar que ela tinha passado DST para
Oliver.

Um silêncio se estala e ele respira de forma audível, soltando um sorriso sem humor.

– Não é de se surpreender. – afirmou.

– Não? – perguntei. – Pensei que seria, até para mim é inacreditável.

– Você não conhece nada do mundo, Flora. – afirmou me olhando com seriedade. – Eu já
vi tanta coisa, que me fez questionar como era possível e sabe em qual conclusão eu cheguei?

Neguei com um aceno de cabeça.

– O ser humano é capaz de tudo para conseguir o que quer.

Seu tom foi de arrepiar e ele sequer piscou ao se levantar e em silêncio, olhou o celular
no bolso e andou com passadas rápidas para longe, me deixando sozinha alguns segundos antes
de voltar com uma caixinha de primeiros socorros.

Meio hesitante, ele diminuiu os passos quando estava perto de mim e os aumentou
quando eu respondi sua pergunta silenciosa com um aceno de cabeça, se sentando ao meu lado.

– Vamos limpar o estrago que a unha dela fez. – informou pegando com agilidade um
algodão e o molhando em um álcool. – Você tem tolerância à dor?

– Acho que sou forte o suficiente para aguentar o arder do álcool. – sorrindo sem mostrar
dentes, respondo.

– Bem, é sempre bom perguntar.

Puxo o cabelo para longe do rosto e ele limpa o corte, que como previa ardeu, mas é
suportável. Depois expirou um remédio e colocou um curativo, encarando–me por alguns
segundos, com o mesmo silêncio que ele estava ao limpar meu rosto.

E pensativo desviou o olhar, ficando meio aéreo.

– Você descobriu? – perguntou e completou. – Foi por isso que Oliver fugiu como um
louco?

Encarei–o e pisquei.

– Eu fiz Olavo me contar e Oliver chegou quando perguntei o que é necessário para saber
se sou compatível.
– Você faria isso por ele? – perguntou com surpresa. – Se desse positivo. Você iria doar
um órgão seu para meu filho?

– Eu amo Oliver.

E piscando com lentidão, ele me encara sem dizer nada. Pensando, algo que eu fazia
também, mas não assustada como fiquei quando descobrir isso. Amar alguém era estranho,
porque você não percebe o exato momento que acontece, você só o faz quando menos espera.

Bem, foi assim comigo.

– Amor às vezes não é suficiente. – Otto diz. – É necessário muito mais que isso.
Confiança. Se isso não existir, não existe amor que dure aos baques fortes da vida.

Fico realmente sem saber o que dizer, refletindo sobre o que foi dito por ele. Era
perceptível que havia rancor por trás de suas palavras, o que me levou a pensar que ele também
amou um dia, mas se decepcionou profundamente.

E sem pensar, questionei.

– Você amou muito a mãe de Oliver?

– Amei. – bufou uma risada rancorosa. – Amei de mais e me ferrei. Quando se é jovem
pensamos que será para sempre. A inocência faz imaginar coisas, fantasiar um feliz para sempre
que acaba caindo por terra quando temos momentos reais, que precisamos lutar de frente contra o
problema.

E continuou depois que me vi em silêncio por um longo tempo. Perdida em pensamentos


confusos.

– Não estou te desencorajando ou querendo dizer que o que sente por Oliver não é real. –
com sinceridade. – Eu acredito que é, mas não aconteceu no melhor momento. Oliver está no
pior momento da doença e temos que ter em mente, que ao passar desse estágio, se ele se
recupera, ele viverá uma vida controlada.
– Uma doença autoimune. – pensei em voz alta.

– Sim. Acredito que seja por genética, pois o pai da mãe de Oliver teve também. – e
completou. – Mas ele não teve essa opção, ao invés do transplante e não durou muito. As veias
não suportaram.

– Oliver sabe disso?

– Não. – com um cansaço visível. – Ninguém sabe. Assim como ninguém sabe que eu
procurei a mãe de Oliver está tarde e ela desejou boa sorte. A vadia cruel desejou boa sorte e
deixou o filho por conta própria.

Encarei o nada sem piscar. A mãe do Oliver não se importava se ele iria morrer ou não. E
eu senti muito, como se tivessem apertando meu coração. Oly era maravilhoso e não merecia um
ser como esse como sua mãe.

– Não deixe que Oly saiba sobre isso. – implorei. – Isso machucaria muito ele.

– Conheço o meu filho, Flora. – afirmou. – E nunca faria nada que o pudesse machucar.

O silêncio voltou à tona e lágrimas vieram aos meus olhos quando pensei na gravidade da
situação.

– Não existe ninguém compatível?

– Olivia tem o mesmo tipo sanguíneo. – deu de ombros.

– Ela está grávida.

– Sim. – levantou e como se não fosse grande coisa, afirmou. – Não se preocupe com
isso! Daremos um jeito. Só seja forte e não deixe tão visível quanto te afeta. Acredite, Oliver já
sofre o suficiente para querer lidar com piedade.

Encarei–o abismada com sua frieza e a vi se derreter um pouco quando o celular tocou e
ele atendeu, ficando alerta de imediato e me deixando da mesma forma.
– Fique calmo e respire. – ordenou ao telefone. – Olavo, se controle, porra!

E começando a andar de um lado para o outro, parou bruscamente como se tivesse levado
uma pancada muito forte na cabeça.

– Estou indo para aí agora.

Desligou o telefone, encarou o nada e respirou fundo e com apenas um olhar seu em
minha direção eu soube que algo de ruim havia acontecido.

– Oliver sofreu um acidente de carro.

Tudo se passou em câmera lenta até chegarmos ao hospital. O clima ao redor era tão
pesado quanto à última frase dita, sendo está às únicas palavras que foram faladas, por qualquer
um dos dois, desde então. Otto correu para o segundo anda e eu fiquei a espreita, enquanto
tentava compreender a seriedade daquela frase. Meu coração se apertava e eu sabia que na
situação atual de Oliver, qualquer tipo de acidente, independente da gravidade, era arriscado.

Ainda assim, me recusei a chorar e segui Otto até seu carro, que seguiu em uma
velocidade não recomendada para aquela pista até o hospital. Medo se agitou em meu interior
quando cheguei ao hospital e quase transbordou em lágrimas quando vi Olavo sentando em um
canto, tão angustiado que diria está perto de explodir.

Ele se levantou da cadeira com rapidez e andou os poucos passos que faltavam até está
em nossa frente.

– Pai. – com um tom cercado de angustia. – Tentaram matar o Oliver!

Ando um passo para trás com suas palavras, surpresa por elas. Oliver era uma pessoa
incrível, como era possível alguém querer mata–ló?
– Conte–me o que aconteceu! – Otto logo ordenou.

– Oliver estava dirigindo em alta velocidade, mas ainda sim com cuidado o suficiente
para parar nos sinais e não atropelar ninguém. Eu estava quase o alcançando, em uma distância
curta. Assim que o sinal abrisse, eu usaria a velocidade necessária e chegaria ao seu lado. A cena
já estava feita na minha cabeça e eu iria bota–lá em ação. – deu uma pausa como se estivesse
assistindo–a novamente em sua frente. – Quando um fodido veio do nada e bateu com tudo na
lateral do carro dele.

Otto escuta em silêncio e fica pensativo. E com preocupação, eu pergunto a única coisa
que consigo pensar ao escutar tudo aquilo.

– Ele está bem?

– Não sei. – se virou em minha direção, percebendo que não só seu pai estava ali. – Tudo
o que vi nele foram arranhões e sangue vazando do nariz. Por sorte ele estava de cinto e o lado
pegado pelo impacto não era o dele. Eles o levaram direto para examinar e não falaram nada de
mais sobre Oliver. Acreditam que ele bateu a cabeça com o impacto do carro, mas não podem
afirmar e muito menos dizer às consequências que isso trará.

O acidente poderia ter sido mil vezes pior! Isso era claro. Seja quem fosse que tentou
contra vida de Oliver, não teve êxito, por incompetência ou querer. Ninguém poderia dizer ao
certo, mas o que todos nós sabíamos era que o acidente não causaria sequelas. Não tanto quanto
a sua doença poderia fazer.

Otto parecia pensativo. Estava rígido e claramente com sua mente trabalhando a mil por
segundo; Olavo parecia está perto de explodir, preocupação e medo exalavam dele e eu? Bem,
parecia que haviam colocado algodão em minha mente, nublando os meus pensamentos e me
fazendo pensar com certa lentidão.

Soltando uma longa respiração e encarando tudo ao meu redor do longo corredor frio,
tendo apenas branco para todos os lados e cadeiras verdes nada confortáveis nos cercando,
sentei–me ao lado de Olavo em silêncio. Olhei de relance para cima e vi Otto encostado em uma
parede olhando para o nada. Não poderia saber o que ele tanto pensava, mas sabia que isso tudo
não era nada fácil de passar.

Desviei o olhar e encarei um lugar aleatório, encostando minhas costas na cadeira


desconfortável. Não sei quanto tempo fiquei daquela forma, mas um pigarreia masculino de um
homem todo de branco e visivelmente exausto, trouxe minha atenção novamente, assim como a
de Olavo e Otto.

– Vocês devem ser os familiares de Oliver Bennett. – iniciou e se apresentou. – Sou Juan
Blanco, clínico geral e um dos responsáveis em atender a emergência.

– Otto Bennett. – apertou a mão do médico. – Sou o pai de Oliver.

Surpresa passa aos olhos do médico, mas ele logo concerta, iniciando com o assunto que
todos nós esperávamos com ansiedade.

– Oliver chegou desacordado e com hematomas e ferimentos ao redor de seu rosto. O que
nos leva a crer que ele bateu sua cabeça na hora do acidente. – deu uma pausa. – O mandamos
para uma ressonância magnética, para vermos se essa pancada que o fez apagar causou alguma
hemorragia ou algum ferimento grave que fosse necessária uma cirurgia.

– E então? – perguntei.

– Tudo está em perfeito estado, no momento. As lesões cerebrais demoram em torno de


quarenta e oito horas para se mostrar nos exames, mas Oliver não aparenta nenhum ferimento
grave em sua cabeça. Tudo leva a crê que o apagão de Oliver foi dado pela exaustão.

– Doutor. – começou Otto. – Não sei se foi informado, mas Oliver tem uma insuficiência
renal crônica.

– Estou ciente disto. – afirmou com veemência. – Assim que Oliver chegou, um exame
em seu corpo foi feito e percebemos uma certa proeminência em seu abdômen. O sangue de
Oliver está neste exato momento sendo examinado e assim que vim para cá, Oliver estava sendo
encaminhado para um raio–X do abdômen completo e outro para as veias dos rins.

– Então o acidente não causou nada preocupante em Oliver? – Olavo pergunta.

– Exato. – e completou. – Se não fosse por causa da doença de Oliver, assim que
acordasse iria libera–ló para casa, mas pela aparência desnutrida do paciente e o fato dos últimos
exames terem sido feitos há dois meses, resolvemos fazer todos novamente, para termos noção
da gravidade da doença em questão.
– Esse é o tempo ideal para os intervalos dos exames.

– Não para pacientes com a gravidade do problema de seu filho. – em um tom cortante,
que logo foi contido. – No registro médico geral de Oliver o médico responsável colocou o nome
dele como emergência na lista infinita de pacientes que necessitam de um rim. Esse deve ser o
caminho que vocês escolheram, mas se não tiver ninguém compatível e disposto a doar um rim
para ele...

– Você não precisa completar isso. – Otto o cortou e olhou mortalmente, aproximando–se
com lentidão do médico. – Já sei perfeitamente desta merda. Agora ao invés de ficar criticando
as escolhas de meu filho sem saber seus motivos, por que não vai fazer o seu trabalho de uma
vez?

– É o que vou fazer. – empalidecido ele engoliu em seco. – Tenha uma boa noite!

E vai embora quase correndo, deixando todos nós em um silêncio mortal. Derrotada,
sento–me nas cadeiras e percebo que estou chorando. Nunca me imaginei em uma situação como
essa, chorando em meio ao corredor de um hospital, pois o homem que amo tem grandes chances
de morrer.

Que bela virada me ocorreu nesses últimos meses.

Um braço forte me puxa para os seus braços e meio sem jeito me abraça quando eu
aceito, me consolando enquanto eu choro como uma tola. Eu não deveria está fazendo isso,
deveria ser forte e ajudar esses dois homens a passar por isso sem desabar, mas mesmo sabendo
disso não consigo evitar e continuo chorando nos braços do Bennett errado.

– Flora.

Escuto chamarem meu nome e vejo meu pai andar com rapidez em minha direção e me
abraçar, da forma que tanto precisava que ele fizesse. Aceito de bom grado, mesmo que o abraço
quase traga á tona às lagrimas que consegui parar a alguns minutos atrás.

Seu costumeiro cheiro de hortelã me faz sentir em casa e com desprazer quebro o abraço
e sorrio ao encara–lo.

– Estou feliz que está aqui. Mas você não deveria te–lá deixado sozinha.

– Ela já é grandinha o suficiente para cuidar de si mesma. – ele diz com um sorriso que
não alcança os olhos. – No momento você precisa mais de mim do que ela.

Tenho serias dúvidas sobre isso, mas preferi não deixar isso vir à tona e apertei sua mão
balançando a cabeça.

– Eu estou bem. – afirmei. – Fisicamente, eu estou melhor do que nunca.

– Mas não mentalmente.

– É. – dou de ombros e sorrio tristemente. – Mas vou ficar.

Quando esse pesadelo acabar. Completei mentalmente, ainda sorrindo para o meu pai.
Ele massageava minhas mãos e me encarava sem dizer nada. Uns segundos cercados daquele
silêncio arrasador se passaram e meu pai reparou que Olavo e Otto estavam ao nosso lado.

Maneios de cabeça foram trocados como cumprimento e eu soltei suas mãos, cruzado os
braços em frente aos seios e encostando minhas costas na parede.

Uma exalação foi escutada e eu vi de relance meu pai se levantando e indo falar com
Otto, que estava ainda em pé encostado na parede.

– Você acredita em milagres, Flora? – perguntou Olavo atraindo minha atenção para ele.

Fiquei em silêncio por um longo tempo, pensando sobre sua pergunta e respondendo a
única coisa que poderia responder.

– Não sei. Nunca vi um em frente aos meus olhos.

– Eu também não. – afirmou. – Mas sabe, se minha mãe resolvesse ajudar Oliver, eu teria
isso como um milagre.

Melancolia era perceptível em seu tom e eu não resolvi comentar nada sobre isso, ficando
em silêncio por um longo minuto, até que um médico diferente do de antes apareceu em nossa
frente.

Moreno, alto e com um sorriso educado, o médico disse em alto e bom som o nome de
Oliver, atraindo nossa atenção.

– Sou o pai dele. – disse Otto. – Quais são os resultados dos exames?

O sorriso do médico some e com um aceno suave despensa apresentações e inicia a


explicação.

– Bem, o paciente veio parar em nossas mãos por acidente, algo preocupante, mas que se
não ocorresse, não saberíamos o atual estado da doença dele. – e deu uma pausa. – Estudei um
pouco sobre o caso no histórico médico dele e tentei entender o que o levou direto para essa
escolha.

– Doutor, você poderia dizer uma vez o que os resultados mostram. – Olavo interrompe.

– Ah, claro. Eu gosto de tentar entender as escolhas de pacientes como esse. – se explica.
– Bem, os resultados mostram que o tempo ao qual o médico deu para Oliver, diminuiu bastante.

– Quanto? – perguntou Otto.

– Não sabemos ao certo, mas creio que um mês.

O peso se estalou ao nosso redor, atingindo todos como socos.

– Entendi. – Otto disse agindo com seriedade. – O que temos que fazer agora?

Sua pergunta pega o médico desprevenido, por ter o pai recebendo a notícia de que seu
filho tinha um mês de vida e não mostrar sinal algum de impacto sobre essa descoberta.
– Transferir Oliver com rapidez para um hospital que seja inteiramente sobre doenças
crônicas. Lá eles irão saber fazer o necessário para atender todas as necessidades de Oliver até
que ele seja encaminhado para o transplante. – e continuou. – Infelizmente é tarde de mais para
tentar outro método.

– Sim, vamos então.

O médico acenou e olhou ao redor.

– Algum de vocês já fez o exame de compatibilidade?

– Eu não. – respondi.

– Gostaria de fazer? – perguntou.

– Sim. – respondi. – Eu gostaria.

– Ótimo. – ele sorriu. – Vou deixar você na sala apropriada e levar o Sr.Bennett para
cuidar da papelada.

Apenas maneei minha cabeça e ele fez Otto, começando a seguir o médico quando este
começou a andar, deixando meu pai e Olavo para trás.

O médico andou pelo longo corredor e parou uma senhora gordinha que se pôs em nossa
frente.

– Olga, ela está querendo descobrir se é compatível com Oliver Bennett, o paciente do
quarto 204. – explicou. – Poderia levar ela para a sala de coletagem?

– Claro. – afirmou.

– Ótimo. – e olhou para mim sorrindo. – Você está em excelentes mãos, senhorita.
E se pôs a andar, parando ao ver que Otto parou e me puxou para um abraçou. Estranho
no começo, mas eu logo envolvo meus braços ao redor dele e o abraço de volta, soltando quando
este olhou nos meus olhos e disse.

– Obrigado! – agradeceu. - Não importa o que de neste resultado, eu nunca irei me


esquecer disso.

Sem palavras. É como me encontrava, mas ele não parecia querer escutar nada, pois logo
se pôs a andar com rapidez junto ao médico.

–Vamos, querida? – a enfermeira perguntou sorrindo. – É como tirar sangue, não dói
nada!

Respiro fundo e sorrio, seguindo até a salinha de coletagem e desejando intensamente que
o resultado desse positivo e eu pudesse salvar meu Oly.

Complicado tirar sangue quando se está nervosa, mas a enfermeira era tão simpática. Ela
conversou comigo e explicou que seria como um teste de paternidade, que o resultado não
demoraria nada a sair. Sua mão era tão leve que quando percebi já estava levantando e saindo da
salinha, dando de cara com o meu pai encostado na parede e me impressionando ao perguntar.

– Sou o próximo?

– Creio que sim. – a enfermeira sorriu ao responder e olhou para mim. – Te vejo daqui
algumas horas.

Estava chocada, sem conseguir assimilar nada do que acontecia. Entretanto, meu pai não
precisava que eu falasse qualquer coisa, o que eu sentia com aquele gesto inexplicável já se
mostrava o suficiente em meus olhos.

– Te encontro na lanchonete. – foi o que ele disse ao passar por mim e fechar à porta.

Ainda tocada por seu gesto, caminho de forma automática até Olavo e este sorri deixando
visível seu cansaço.

– Vamos comer algo?

Com desanimo dou de ombros e seguimos pelos longos corredores até chegarmos à
lanchonete do hospital, que era exatamente como o esperado. Cores neutras, mesas e cadeiras de
ferro e um balcão transparente com comidas nada atraentes.

Nós sentamos ali e ficamos em um silêncio melancólico, que se estende por um longo
tempo até que Otto e meu pai se juntam com a gente, quase ao mesmo tempo. Ambos estão
cansados, mas fingem que nada está acontecendo.

É estressante, tudo aquilo, mas era o jeito mais fácil de passar por aquela situação.

Eu sabia perfeitamente disto e os homens ao redor também.

– Já escolheram o que vão pedir? – meu pai perguntou e eu neguei. – Mas vai escolher e
pedir. Ficar sem comer não vai adiantar nada.

Seu tom era terno e seu olhar piedoso. Papai estava aqui por mim, porque eu estava
sofrendo por um namorado, que ele não sabia se seria o certo para mim, mas ainda sim estava
aqui, apoiando–me e disposto a doar um órgão para salvar a vida dele, um desconhecido, por
mim.

Meu pai me amava muito a esse ponto. O que me levava a crer que os anos passados ao
lado de minha mãe, também haviam sido por causa de mim.

Ou estaria enganada? Seria possível alguém abri mão de sua felicidade para manter um
casamento infeliz por causa de um filho? Eu sabia que havia casos que sim, mas não era atraente
pensar que meu pai foi capaz disso.

Nenhum pouco.

– Flora?
–Um suco de laranja e um sanduíche parecem bom. – respondi no automático.

E ele sorriu com alegria, pegando o pedido de todos e indo até o balcão. Vi suas costas de
longe, em suas roupas escuras amarrotadas e o cabelo um pouco cumprido na parte de trás.
Precisava de um corte, mas acho que esse seria sua última preocupação no momento.

E a minha também.

Negativo.

É o resultado que dá no meu e no de meu pai. Tinha tanta esperança de que daria
positivo, de que nosso sangue fosse igual, em algum dos dois, que não passou pela minha cabeça
que era possível isso acontecer. Algo como desespero grita para se libertar, mas eu não permito e
faço a única coisa que consigo pensar neste momento, que preenche todos os pensamentos ao ver
Oliver ainda apagado, sendo colocado em uma ambulância e encaminhado para outro hospital.

Obrigo Olavo a me levar até sua mãe.


São cinco da tarde agora e o sol está quase se pondo, meus olhos ardem e o desconforto
de nossas almas reflete no silêncio dentro do carro. Estávamos parados do outro lado da rua,
olhando para casa com cercas brancas e tão bonita que faria inveja a muitas donas de casa;
espaçosa e com um grande quintal, com um parquinho para crianças e uma perfeição digna de
uma família de comercial de margarina.

Olho por mais alguns segundos, quase sem piscar, tentando me controlar. Entretanto, não
demoro muito a perceber que isso nunca aconteceria e abro à porta do carro sem olhar para trás.
Meu pai não disse nada sobre minha decisão e Olavo estava tão desesperado e angustiado, que
não iria se opor a nada que ajudasse seu irmão.

Eu não sabia se eu conseguiria ajuda vindo aqui. Tinha esperança de que deixaria um
peso na consciência dela que a fizesse fazer algo, mas eu precisava tirar essa carga de mim,
colocar para fora o que estava entalado. Vir aqui não salvará Oliver, mas me fará tirar um peso
enorme das costas ao dizer o que penso desse ser humano asqueroso.

Ela não merecia o filho que teve; nenhum dos dois e espero que a vida a faça pagar pelo
abandono precoce de ambos os meninos.

Oliver estaria melhor sem ela, se não fosse esse pesadelo. Este é um fato inquestionável.

Assim que piso no caminho de pedras até à porta e subo os degraus sem pressa alguma,
lembro-me de Oliver em cima de uma maca inconsciente, sendo arrastado até a ambulância, e
tendo como única opção para sair dessa um transplante ao qual não tínhamos o órgão necessário.
Meus olhos ardem mais fortemente, mas a raiva corre em minhas veias com mais intensidade e é
ela que me dá forças para dar três socos na porta perfeitamente esculpida e esperar com
impaciência, sentido meu coração bater disparadamente pela mulher que não demora a abrir a
porta.

Sua beleza e saúde são as primeiras coisas que notei. Bochechas coradas e um ar de
felicidade emoldurado por cabelos perfeitamente arrumados e as roupas escolhidas com maestria.
Entretanto, constatar isso não doeu em nada, não quando eu vi os mesmos olhos que encarei
incontáveis vezes.

Os dela eram mais puxados para o castanho, sendo o contrário aos do seu filho, que era
um tom mais forte e acolhedor, mudando de tom de verde em cada mudança de humor. Não
poderia dizer se a cor dos dela mudavam, mas mesmo assim, o tom castanho claro me fazia
lembrar Oliver de uma maneira absurda. Sendo talvez o formato ou os cílios longos e as
sobrancelhas pretas e bem desenhadas, que emolduravam o rosto nenhum pouco castigado de
uma forma invejável por muitas.

Ela era bonita e aparentava uma juventude que só pessoas de bem com a vida poderia ter.

O fato de ela saber sobre Oliver não afetou em nada em sua vida.

– Boa tarde? – ela saldou como uma pergunta enquanto me observava da cabeça aos pés,
e sorrindo de uma forma falsa ao dizer. – Desculpe, mas não posso ajudar com qual seja sua
necessidade. Existe uma igreja no final da rua, eles oferecem sextas básicas por lá, roupas e essas
coisas. Tenho certeza que podem te ajudar.

Encaro–a quase sem piscar, chocada por suas palavras. Minhas roupas amassadas e as
olheiras em meu rosto não causavam uma boa impressão, mas quem é que se importava com
aparência em uma situação como essa?

– Se me der licença, preciso entrar. – e puxa a porta dando por definitivo minha visita
precoce. Acordando do transe, coloco o pé na frente e seguro a porta, fazendo–a me olhar com
impaciência quando atrapalho seus planos.

– Eu preciso falar com você. – Afirmei, fazendo–a arregala os olhos e me encarar


assustada. –Acredite, você é a última pessoa que eu gostaria de está falando.

– Eu já disse que não posso ajudar você!


– Eu não estou aqui para pedir sua ajuda. – afirmei encarando com raiva. – Como
poderia, se nem mesmo te interessa salvar seu próprio filho.

Com entendimento, ela soltou a porta, engolindo em seco e se tornando um tom mais
pálido do que seu tom natural. Por um segundo pensei que sua reação fosse diferente. Cogitei
que me pergunta – se do que estava falando e que mudaria o rumo que tudo estava
encaminhando para ir. Entretanto, todo espanto inicial deu lugar a um aborrecimento visível em
seus olhos, que como reação me empurrou para trás e como um furacão, veio até mim, deixando
a porta bonita bater com força contra o trinco.

– Você não sabe de nada! – entre dentes grunhiu.

– Não sei de nada? – perguntei com sarcasmo. – E você por um acaso sabe?

– Sei. – suspirou e desviou o olhar. – Já vi isso antes e não posso fazer nada para ajudar.

– Com o seu pai?

– Isso não vem ao caso. – me cortou e encarou – me. – Não sei o que é dele, assim como
não sei as coisas mais simples e básicas que deveria saber. Amei-o um dia, o adorei e dei todo o
amor que eu poderia dar naquele momento. – respirou fundo, como se buscasse paciência. – Eu
era inocente e despreparada, fiz coisas que me arrependo até hoje.

– E por que está me contando isso? – questionei com antipatia. – Quer que eu sinta pena
de você? Ou quem sabe algum tipo de compreensão pelo o que está fazendo? Pois saiba que está
perdendo seu tempo, eu nunca conseguirei entender ou compreender nada do que você está
fazendo.

– Não. – afirmou. – Nada que diga irá conseguiu faze–lá compreender meu lado. Eu sei
disso.

– E o lado de Oliver? Você já tentou compreender?

Minhas palavras a fazem ficar em silêncio, quase sem piscar.


– Olha, já fiz muita coisa errada. – reafirmou. – Só dei dor de cabeça para minha família,
cai de amores e engravidei cedo. Estava despreparada para tudo aquilo e não lidei muito bem
com nada do que aconteceu. – parou de falar e olhou ao redor. – Deus me deu uma nova chance,
com um bom homem e três filhos, que dessa vez não posso decepcionar.

– Não, não toque no nome de Deus nessa situação. – com um tom cortante. – Deus não
fez você abandonar seus filhos e cair de cara nas drogas, assim como não é ele que está tirando
uma das únicas chances de Oliver sobreviver.

– Talvez não foi ele. – em um tom duro. – Mas a vida é cruel e certas vezes, precisamos
fazer escolhas agridoces. Você é nova demais para entender isso agora, mas um dia você vai
passar por isso e vai me entender.

Encarei-a por longos segundos, não querendo compreender o que ela dizia. Ela estava
escolhendo sua nova família e deixando o passado vergonhoso de lado e infelizmente, Oliver
fazia parte disso, de um passado vergonhoso que ela odiava relembrar.

Entretanto, como ela poderia deixar de lembrar-se de seus próprios filhos, dos dois lindos
garotinhos de olhos verdes que só queriam seu amor e que infelizmente não o tinham por
escolhas, que não posso julgar serem certas ou erradas da mesma. Tudo o que poderia saber, é
que está mulher não iria nos ajudar e ter vindo aqui, foi uma completa perda de tempo.

Um tempo que eu poderia está gastando com o meu Oly.

O pensamento faz meu coração apertar de forma dolorosa. Meus pés estão travados e
mesmo que eu saiba que com ela não vou conseguir nada, parte de mim não pode suportar a
ideia. O pensamento de ficar sem meu Oliver é extremamente doloroso.

Iremos achar outra forma.

– Espero que não se arrependa de sua escolha. – disse ao desviar os meus olhos
lacrimejantes dela e encarar o nada. – Pois de certeza, qualquer pessoa com um coração se
culparia pelo resto de seus dias.

Ao terminar de dizer, não espero que ela diga nada ou olho para ver sua reação ao escutar
minhas palavras, apenas forço minhas pernas para o mais longe possível e ando até o carro, sem
realmente saber o que estou fazendo. O clique da porta do carro é escutado, mas o som de outro
carro estacionando próximo de mim traz minha atenção para aquela direção e me vejo
novamente encarando a casa daquela que deu a vida a Oliver e que sem a menor piedade estava
tirando dele a única chance de ter um novo amanhã.

Alto e com um terno amassado do dia, um homem moreno de cabelos raspados sai do
carro, andando até o banco de trás e libertando três crianças com idades parecidas, que caminham
com rapidez até a mãe, que os abraça com amor.

Ela iria negar doar um pedaço de si para qualquer um dos três? É a pergunta que vem em
minha mente, mas que preferia não ter uma resposta.

Filho é filho. Não? Se nega para um, pode negar para o outro e eu não desejava que
nenhum daqueles pequenos ficasse doentes. Eles não tinham culpa, o egoísmo dela sim e esse
seria pago em vida. Está era a única certeza que poderia ter nesse momento. Pensando nisto,
entro de uma vez no carro e em um silêncio arrepiante, meu pai dirige até minha casa.

OLIVER

Um quarto privado foi uma das únicas exigências que meu pai fez e que o plano ao qual
pago desde que ganhei dinheiro suficiente para tal luxo, permitiu. Ainda sim, os barulhos das
máquinas e as roupas que não cobriam nada, não facilitavam em nada em alcançar meu objetivo
de fingir que nada grave estava acontecendo.

Eu iria morrer. Descobri isso desde o dia que o médico me deu as opções e eu, quase
sufocando por dentro, escolhi a que parecia mais fácil.

O transplante.

Sabia que essa era a mais arriscada e que estava escolhendo a morte. Entretanto, entre ter
que passar por seções quase diárias de sangue, destruindo minhas veias e vitalidade aos poucos e
a opção de ter remédios e uma dieta balanceada – que segui ao pé da letra em 90% do tempo – e
viver com normalidade até esse momento chegar. Eu escolhi viver. E eu vivi.

Senti raiva, tristeza, felicidade, paixão e fiz tudo o que sentia vontade. Está em um
hospital é assustador, não vou mentir que estou morrendo de medo e que não queria sair dessa,
mas se por um acaso não sair, pelo menos vivi até o último momento e não escolhi definhar
desde o primeiro minuto que as cartas foram jogadas na mesa.

– Está acordado. – a voz do meu pai soa em meus ouvidos, tirando–me dos meus
pensamentos sombrios.

– Estou. – respondo não querendo transparecer o quanto estou destruído. Ele não me
criou para ser assim, então porque seria nos meus últimos momentos de vida. – Está aqui há
muito tempo?

– Não o suficiente para você enjoar da minha presença. – no tom casual e duro de
sempre, que me faz olhar para ele e confessar com divertimento.

– Acho que esse momento nunca vai chegar. – e pergunto ao ver como seus olhos se
tornaram mais brilhantes. – Cadê meu irmão?

E ela.

– Seu irmão levou Flora para casa. – disse um pouco perdido. – Ela ficou esperando com
a gente desde que descobriu e só foi em casa quando você foi encaminhado para cá.

– Não deveria ter a deixado ficar. – e completei. – Ela não precisa me ver passando por
isso.

– Diga isso para ela você mesmo, pois eu certamente não serei o sogro bastardo que irá
estragar esses momentos de vocês dois.

– Não sei que momentos um moribundo pode proporcionar. – com um divertimento


forçado.

– Você está muito rabugento. – ele afirma se levantando e andando até um balcão de
madeira. – Acho que deve está com sede.

Exalo em voz alta começando a ficar estressado. Já não me bastava está em uma cama de
hospital, tendo que aturar esse barulho infernal e esse cheiro de antisséptico. E ainda havia o
desconforto físico no abdômen e das intravenosas que me causaram feridas nos braços do
enfermeiro de mão pesada enquanto furava e perdia a veia. Fodido e mal pago e sabia que era só
o começo.

Assim como também sabia que a versão que Flora conheceu, não existiria por muito
tempo.

E eu não queria que ela se lembrasse de mim nessa situação.

– Pai, não deixa Flora me ver assim. – implorei quando peguei a garrafa de suas mãos. –
Não quero que essas sejam suas últimas lembranças de mim. Acabado em cima de uma cama.

– Oliver, você vai sair dessa. – afirmou.

– Não tenho tanta certeza.

– Pois eu tenho por nós dois. – em um tom que não pedia argumentação. – Eu te respeito
e farei tudo que me pede, mas não afaste Flora de você. Ela te ama e isso só a machucaria.

Penso em suas palavras com atenção e apenas dou de ombros.

– Faça o que achar melhor.

– De qualquer forma, eu faria mesmo.

Reviro os olhos e bebo a água. Três batidas soam na porta do quarto e um médico
nomeado Amadeo entra com um sorriso no rosto e uma prancheta, deixando–me um tanto
temeroso e meu pai esperançoso.

FLORA

Assim que o carro estaciona no meio fio, tiro o cinto e abro à porta. Tudo o que eu
gostaria naquele momento era dormir e acordar desse pesadelo. Entretanto, o mundo real era
cruel e meu pai tinha que jogar outro balde de água fria em mim, lembrando de certo alguém que
eu não queria lembrar no momento.

Minha mãe.

– Eu conversei com ela e sua tia também. – papai começou. – Ela entendeu o que ela fez
e está arrependida.

– Seria bom se fosse verdade – e completei sem paciência. – Mas não acredito nisso.
Minha mãe só participa de jogos que a fazem vencedora. E toda essa situação, dela uma
perdedora e de certa forma, toda sua família.

– Sua mãe é uma pessoa complicada.

– Não, ela é egoísta e manipuladora. – olhando dentro dos seus olhos castanhos tão
cansados como os meus. – É diferente.

– Talvez você tenha razão. Ou talvez não. – e pediu. – Tenha paciência com ela. Será
bom para as duas.

Exalei em voz alta e acenei, saindo do carro e olhando os dois lados do asfalto, não vendo
seu carro ou nada que mostrasse que ela estivesse em casa. De certa forma isso trouxe alívio o
suficiente para eu pegar as chaves de dentro do cestinho de pregadores na parte de trás da casa e
entrar dentro da mesma pela porta traseira. O lar ao qual cresci e vivi cercada de mimos e brigas
das pessoas que me deram a vida.

Sempre me senti privilegiada por ter um teto sobre minha cabeça, comida no prato e
todos os meus mimos atendidos. Minha mãe era especialista nisso, em me enfeitar e dar os
melhores brinquedos que o salário do meu pai não permitia. Eles eram bons, mas era apenas uma
felicidade temporária que só meu pai poderia suprir. O que não me dava de brinquedos, dava de
afeto, algo que não teria se não fosse meu pai.

Deixando isso para lá, bocejo e ando até as escadas, subindo diretamente para o meu
quarto. Assim que abro à porta, minha cama parece extremamente mais atraente do que um
banho, mas ao lembrar-se das infinitas bactérias que um hospital tem, coloco meu celular para
carregar e vou direto para o chuveiro.
O ar frio me deixa arrepiada, mas a água morna quando bate em minha pele me deixa tão
relaxada, que faço tudo o que é necessário, levando meu tempo para aproveitar o banho que tanto
precisava e ficaria muito mais tempo sobre o jato, se minha mente não começasse a viajar para
certos pensamentos melancólicos que quase me fizeram ceder as tão temidas lágrimas.

Desligo o chuveiro e enrolo uma toalha no cabelo e outra em volta de meu corpo. Passo
em frente ao espelho embaçado e sinto minha coluna arrepiar ao colocar os pés ao lado de fora
do banheiro. Coincidência ou não, meu celular vibra e ando até ele tirando–o da tomada e lendo
as mensagens de Olavo.

Oliver não pode receber mais visitas hoje.

Só amanhã de 10:00 às 12:00.

Vou sair de casa as 9:30

Não se atrase!

Desanimada, bloqueio a tela e olho ao redor, assistindo o anoitecer precoce e


desanimador. Ando até minha poltrona e pego minha camisola, vestindo–a sobre à toalha e me
jogando sobre à cama como se estivesse sem energia para continuar de pé.

OLIVER

– Avisou para eles não virem? – perguntei tentando deixar o nervosismo de lado.

– Sim. – meu pai responde. – Não se preocupe, eles não vão ver você assim.

Não respondo nada e continuo de olhos fechados, odiando cada segundo que meu sangue
é tirado e passado por tubos naquela máquina branca com um barulho ensurdecedor que estava
prestes a me fazer perder o pouco de juízo que eu possuía.
Eu sabia que aquele médico não traria boas notícias, mas não pensei que me passaria logo
isso para ser feito.

Hemodiálise, mais conhecida como meu pior pesadelo.


FLORA

Ao longe escuto um barulho chato, que me faz virar na cama e encarar o teto. Não sei ao
certo que horas são, mas pelo escuro que aparece ao lado de fora da janela aberta sei que é
madrugada. O toque soa por uma última vez e renasce novamente trazendo uma sensação ruim.
Minha mente lenta acorda de forma súbita ao lembrar-se dos últimos acontecimentos e com
medo levanto da cama encontrando–me muito desperta para hora impropria.

Meu coração parece que vai sair pela boca ao chegar perto do celular e não consigo
controlar a sensação de alivio que me bate ao ver o nome de Jesy na tela.

Nunca senti tanta felicidade em atender um telefonema dela.

– Oi?

– É verdade que o Oliver está internado? – ela pergunta com agitação em um tom um
tanto anasalado.

Ela estava chorando?

– Sim. – respondo com uma respiração audível. – Oliver foi hospitalizado depois de um
pequeno acidente.
– Pequeno? – questionou. – Então não é por esse motivo?

– Não. Infelizmente não.

Assim que termino de dizer, um silêncio pesado nos cerca, por um longo período até que
ela se sinta à vontade para continuar e me surpreender.

– Me desculpa?

– Te desculpar? – perguntei confusa. – O que você fez de errado para pedir desculpas?

Do outro lado da linha a única coisa que escuto é a respiração dela. Uma ideia passa em
minha cabeça, mas ela parece absurda demais para ser real. Ou era o que minha mente achava, já
que quando ela saiu de minha boca, assustadoramente, percebi que ela era incrivelmente real.

– Você por um acaso bateu no carro de Oliver? – e continuei. – Porque este é o único
motivo para você está desta forma.

– Flora...

– O que você fez Jéssica?

– Não fui eu que bati no carro dele! – e continuou em meio às lágrimas. – Foi meu tio.

Surpresa me inunda e eu fico muda quando não deveria. Tito já mostrou suas garras para
mim diversas vezes, mas nunca imaginei que iria escutar algo como isso. Ele dirige desde os dez
anos de idade e de forma alguma isso aconteceria sem ser de proposito.

Ele é mais insano do que pensei.

– Ele me chamou para sair com ele. Estávamos bem, escutando música e conversando
quando de repente ele viu o carro de Oliver. Não importou o sinal vermelho ou minha tentativa
de impedir, ele acelerou e bateu com tudo no carro dele. – e fungou. – A intenção dele era matar
o Oliver, Flora.

– Eu preciso desligar.

– Flora...

E eu desliguei o celular, com tantas emoções circulando no peito, que parecia que ia
explodir. Queria poder ligar para Oliver agora e conversa até me sentir normal outra vez, mas ao
não ter essa opção, levanto–me da cama e ando para a única coisa que pode me ajudar agora,
meus tênis de corrida.

Correr sempre foi libertador e eu precisava deste tipo de liberdade agora ou vou acabar
enlouquecendo.

O tempo ainda estava escuro quando coloquei meus pés para fora de casa e senti o ar
gelado beijar meu rosto, mas isto não se tornou algo significativo quando eu coloquei meus fones
de ouvido e comecei a caminhar até está aquecida o suficiente para correr ao redor em busca de
algum conforto.

As paisagens e os locais pareciam borrões conforme batia meus pés no chão duro
asfaltado, em um impacto que vibrava todo o meu corpo. Suor escorria e o meu batimento
cardíaco acelerava, parecendo que meu coração iria sair pela boca. Quando minhas pernas
pareciam que iriam fraquejar e o cansaço parecia insuportável, encostei–me na parede mais
próxima e apoie meu peso com minhas mãos nos joelhos trêmulos.

O dia já havia amanhecido e quando levantei minha cabeça me vi no lugar ao qual


encontrei Oliver pela primeira vez. Imprudente e irresponsável era o que eu era quando me
lembrei de como o conheci e da promessa que fiz a ele. O ar parecia está longe de ser o suficiente
para os meus pulmões, mas a urgência que me atingiu para sair dali e os relatos de Oliver sobre
seu crescimento naquele local, foi o combustível necessário para começar a refazer meu caminho
de volta.

Desta vez, percebi o quanto andei desgovernada pelos bairros vizinhos. Minhas pernas
queimavam como brasa, mas ainda sim não parecia o suficiente. Minhas pernas clamavam por
descanso e meu corpo por água, o que foi a motivação necessária para chegar logo em casa.

Entretanto, ao olhar para a entrada, vi que talvez ter vindo para casa não tenha sido minha
melhor escolha.
Minha mãe havia chegado a nossa casa.

Respirando fundo, olho ao redor e ando até o inevitável lugar que tenho que está.
Abaixo–me pegando as chaves do lugar ao qual deixei escondido e destranco á porta, avistando
minha mãe sentada no sofá e se levantando do mesmo com rapidez ao me vê chegar.

– Flora. – em um tom beirando ao desespero. – Minha filha, onde você estava?

Tudo o que ela fez volta com força em minha mente e grito ao vê–lá se aproximar.

– Não se aproxime de mim!

Como um passe de mágica ela para com os olhos arregalados.

– Flora. – começa. – Eu, eu sei que errei, mas você não pode fazer isso comigo.

– Não, á única que fez isso com você foi você mesma. – com lágrimas na garganta. –
Você com seu jeito autoritário e esse desejo absurdo por controle. Armou contra Oliver e foi uma
das partes que o levou a se acidentar.

– Você não pode está falando serio!

– Estou, estou sim. Sempre te respeitei e deixei você fazer o que acreditava ser certo. –
engulo em seco. – Aprendi isso com o meu pai e fingi que não me importava ou machucava suas
brigas e o jeito frio que tratava sua família.

– Filha...

– Isso, use a palavra de cinco letras ao qual você nunca soube o verdadeiro significado.
Sempre tratou meu pai como capacho e a mim como uma propriedade. E agora veja só como nós
estamos. Meu pai te abandonou e eu só consigo sentir nojo pelo que fez comigo.

– Não fala isso, por favor. – implora, com lagrimas nos olhos tentando se aproximar de
mim.

– Não chega perto de mim! – caminho para trás. – No momento eu não suporto olhar para
você. E eu não digo isso com orgulho. Você é minha mãe! Deveria ser minha amiga e a pessoa
mais importante da minha vida. Por que resolveu agir como minha inimiga?

– Eu só queria o melhor para você!

– Eu pareço que estou no meu melhor momento? – questiono. – Estou com tanta coisa na
cabeça e tanto medo em meu DNA, que não sei até quando vou suportar.

– Eu sei que sente dor e se eu pudesse...

– Não diga o que você não faria. – interrompo–a. - Estou cansada de suas mentiras. De
todas elas e se você não buscar melhorar, vou fazer como o meu pai e te abandonar.

Minhas palavras a deixam em choque com os olhos arregalados e a boca aberta.


Entretanto, não consigo sentir nada enquanto as lágrimas descem pelo meu rosto e subo as
escadas até o meu quarto, deixando–a para trás com a indiferença que ela mesma plantou em
mim com o passar dos anos e que não faz nada além de doer mais em todo o meu ser.

Porque de certa forma, eu nunca precisei tanto dela, como preciso agora.

OLIVER

Com uma noite sem pregar os olhos, o barulho das máquinas parece mais intenso aos
meus ouvidos conforme o tempo passa e meu corpo parece mais sobrecarregado, sendo quase
impossível me levantar sozinho. Não sabia como isso parecia está se agravando tanto, mas o
olhar acusatório do médico ao ver que eu não comi nada do que foi mandado para o quarto,
talvez signifique algo.

– Posso saber o motivo do senhor não querer comer? – ele questiona.


Encaro–o e respiro fundo.

– O cheiro me enoja e quando tento comer, não desce. – explico e afirmo. – A comida é
horrível!

O médico me olha de cima abaixo e exala, dizendo algo que me surpreende.

– Olha Oliver, eu já estive na mesma situação que você, há alguns anos. Já estive em uma
cama passando por hemodiálise e desanimado sobre a possibilidade de alguém me ajudar. –
pausou encarando–me. – O desânimo é normal. E é clichê e totalmente antiético dizer, você tem
que ter fé e confiar em algo, para que possa aguentar isso até o final, porque não será fácil. Você
precisa ficar forte e não desistir, essa opção não existe. Eu fui perseverante e estou aqui, você
precisa ser também e enquanto houver meios para te ajudarmos aqui, nós o faremos.

Fé, eu preciso ter fé. Uma vontade de gargalhar de amarguro me atinge. Não existe
nenhuma força suprema zelando por mim, pois se houvesse, eu não estaria passando por toda
essa merda. Entretanto, ainda sim, penso no que ele diz em completo silêncio e observo o médico
se levantar e andar até a porta, estranhando quando ele se vira e me encara.

– E ah, tente comer de qualquer forma, pois se não tentar, irei ser obrigado a colocar uma
sonda no seu nariz.

E com um olhar divertido ele sai. Sim, divertido. O médico filho da puta estava rindo de
mim, mas precisamente da minha cara de aterrorizado.

Médico filho da puta.

FLORA

Eu não sabia como havia perdido a hora, mas infelizmente eu o fiz. Acho que não foi de
fato inteligente ligar para o meu pai assim que entrei no quarto e contar para ele sobre o que
havia acabado de acontecer. Entretanto, nos últimos meses percebi que desabafar com alguém
que você confie e ame era terapêutico e menos doloroso do que guardar tudo para si mesma.

E nos últimos dias percebi que meu pai era um ótimo ouvinte quando queria. Escutou
sem interromper e só o fez quando havia dito tudo o que precisava colocar para fora. Meu pai
não era psicólogo, então não disse nada que realmente fosse de grande ajuda, mesmo assim, de
certa forma, diminuiu a confusão que eu estava sentindo.

Assim que finalizei a ligação, li as mensagens de meu cunhado e o liberei para ir à frente,
pois ainda precisava tomar um banho e me arrumar. Sem nenhuma tentativa de persuasão, ele
seguiu seu caminho e foi ver o irmão.

O que de fato foi algo bom, pois ao chegar ao hospital e caminhar até o quarto ao qual
Oliver estava, vi não só os dois irmãos conversando, mas o pai também. Oliver mexia em um
prato de comida, pálido e com olheiras profundas, que partiram meu coração. O sorriso que tinha
em seus lábios era curto comparado aos de seu irmão que estava em pé em sua frente e ao de seu
pai que estava sentado observando com emoção seus dois filhos.

– Bom dia. – falei anunciando minha presença e atraindo os olhos de todos para mim,
bem, quase todos, menos os de Oliver.

Fechei á porta e adentrei dentro do lugar caminhando até chegar ao lado de Olavo e
encarar Oliver, que não sorria mais e só encarava a comida sem sequer piscar, evitando–me
descaradamente. A euforia que senti por vê–ló foi embora dando lugar a humilhante sensação de
desprezo.

– Até que enfim a bela adormecida deu as caras. – zombou Olavo alguns segundos
depois. – Pensei que não viria mais.

–Eu estava resolvendo um assunto com meu pai e não vi a hora passar. – expliquei
metade da verdade, sem dar detalhes. – Mas enfim, o que todos estavam conversando antes de eu
entrar?

– Estávamos zoando o bebê chorão por está lamentando e recusando se alimentar. –


Olavo logo dedura e seu irmão o olha mortalmente. – Não me olhe assim, pois você está sim pior
que um bebê chorão e um fodido mimado.

– Bebê chorão e fodido mimado? – Oliver repetiu encarando-o e sorriu com deboche,
bufando e desviando o olhar para o prato novamente com a voz anasalada, afirmando com pesar.
– É, acho que eu sou isso mesmo.

Um silêncio se instala e eu vejo quando ele pega a colher e enfia com nojo a comida na
boca, empurrando o prato para longe em seguida.

– Chega dessa merda.

– Toma o suco, pelo menos. – pediu o pai.

– Não, eu vou vomitar se eu tomar. – e pegou o guardanapo limpando á boca. – O horário


de visita já está acabando?

– Não, ainda falta um bom tempo. – Olavo afirmou e alfinetou perguntando. – Está
querendo se livrar da gente?

Oliver olhou para o irmão e negou.

– Não, eu só estou cansado.– completando. – Não consegui dormir essa noite.

– Você tem que dormir, Oliver. – Otto se levanta. – Precisa descansar, para ficar forte.

– Fácil falar. – riu amargurado e respirou fundo, olhando para mim. – Você deveria está
na escola, vai perder o semestre se faltar tanto.

– Isso não é tão importante agora.

– É sim. – afirmou e olhou para o irmão. – Você também, cara. Eu realmente aprecio a
visita de vocês. São minha família e apesar de não dizer com frequência, amo vocês, todos vocês.
Mas eu não quero que deixem de viver suas vidas só por causa de mim. Já basta eu estou
perdendo meus dias preso aqui.

– Oliver, não se preocupe com isso. – Otto disse. – Nenhum sacrifico que fizermos será o
suficiente para você.
– Muito altruístas suas palavras, pai. – e olhou para ele. – Eu sei que vocês gostam de
mim e sofrem por eu está aqui. Mas olha não me agrada ver vocês deixando de fazer suas coisas
para ficar aqui comigo. Flora e Olavo deveriam está estudando ao invés de aqui.

– Oliver, não se preocupa com isso.

– Me preocupo sim. – me cortou. – A partir de amanhã vocês só virão no fim de semana.


Meu pai não costuma ter muitas coisas para fazer neste horário, então tudo bem, mas o resto vai
fazer suas coisas com normalidade e não se fala mais isso.

Todos ficamos até Otto afirmar.

– Se é assim que quer. – deu de ombros.

– Sim, é isso que quero. – afirmou sem espaço para dizer mais nada. – Agora, vamos
falar de algo realmente importante.

– O quê?

– O que diabos aconteceu com minha Ferrari vermelha?

Quando o horário de visita acaba, todos nós seguimos o nosso caminho para nossas casas.
Olavo e Otto foram de carro, então voltei com eles. Em meu pensamento pensei que novamente
iriamos voltar para casa sem dizer nada, mas meu sogro me surpreendeu ao começar a dizer.

– Ontem fiquei até mais tarde, pois era necessário que alguém ajudasse ele a se instalar. –
olhou pelo retrovisor entre nós dois. – Quando estava indo embora escutei uma conversa entre
dois enfermeiros e me aproximei, porque achei interessante e já havia escutado sobre isso antes.

– Entendo. – e perguntei curiosa. – Sobre o que exatamente eles estavam falando?

– Eu não sei se vocês já ouviram falar, mas existe um esquema, que não é muito
conhecido, porém não é ilegal. Ou bem, eles disseram que não é. – e completou, tão calmo como
começou. – Naquele hospital existem muitas pessoas passando pelo mesmo problema que o
Oliver e parentes que estão dispostos a ajudar eles, mas não podem porque não são compatíveis.

– Você quer tentar ajudar essas pessoas?

– E em troca elas nos ajudam. – estacionou no meio fio e se virou para trás. – Eu procurei
algumas coisas na internet e conversei com o diretor geral do hospital, ele me deu alguns nomes
e disse que se acharmos alguém compatível e em troca fomos compatíveis e tivemos toda
burocracia acertada, a cirurgia será realizada.

Minha boca fica entre aberta em surpresa e meus olhos lacrimejam de emoção. Nós
podemos salvar Oliver! Fico tão feliz que mal consigo raciocinar

– E isso realmente pode dar certo? – perguntou Olavo.

– Isso nós não podemos ter certeza. – afirmou. – Entretanto, devemos tentar, porque eu
me recuso a ver meu filho morrer.

– Vamos fazer isso. – eu disse. – Eu ainda estou disposta a ajudar Oliver, independente
do que aconteça.

Otto me encara e Olavo também.

– Você já sabe minha resposta. – meu cunhado diz dando de ombros.

– Eu farei qualquer coisa pelo meu garoto – disse meu sogro em um tom que me arrepiou.
– Qualquer coisa que for necessário.

E se virou, ligando o carro e o dirigindo para o que eu já sabia ser o endereço da primeira
família que iriamos tentar conversar e que eu esperava como uma louca que topasse esse acordo
doido.
Conforme nós nos aproximávamos da casa da nossa primeira tentativa, conversamos mais
sobre o caso e foi interessante descobrir que a pessoa em questão, estava precisando de um rim
também. No caso dela, ela nasceu com uma má formação que fez seus rins pararem aos poucos,
mas ao contrário de Oliver, desde o começo ela iniciou um tratamento e com isso estava vivendo
normalmente em casa com sua família.

Assim que estacionamos, um frio se estala na minha barriga e olho para os homens dentro
do carro, que me encaram também, compartilhando da mesma esperança por longos segundos.
Otto foi o primeiro a desviar o olhar e soltou o cinto, saindo do carro. Em seguido foi Olavo e
por último eu, respirando fundo no processo e tentando não colocar tanta expectativa.

Sempre havia duas opções, uma que nós beneficiaríamos e outra que destruiria nossas
esperanças. Uma delas aconteceria ao longo do dia. Assim que estamos fora do carro, Otto se
vira e afirma.

– Eu acho melhor eu ir sozinho. Eles vão estranhar se aparecermos os três lá.


Dependendo da resposta, eu chamo vocês.

Não falo nada e apenas aceno, encostando-se ao carro ao lado de Olavo, que continua
serio com os braços cruzados no peito e pensativo, deixando seus traços duros mais marcantes e
até mesmo assustadores.

– O que está te incomodando tanto? – perguntei a ele, atraindo sua atenção para mim.

– Não. – negou e então, pensou. – Quer dizer, nada. São só ideias negativas que nossa
mente fábrica. Não valem á pena ser ditas em voz alta ou serem levadas a serio.

– Eu entendo.

– Eu sei. – afirmou e revelou. – Eu vi você saindo hoje de manhã cedo. Estranhei e te


segui.

O encaro surpresa e eu logo questiono.

– Por que fez isso?

– Você é importante para o meu irmão, é minha cunhada. Eu acho que é meu dever
cuidar de você enquanto Oliver não pode. – deu de ombros. – Ele precisa de você tanto quanto
precisa da gente e não aguentaria lutar se você não estivesse do lado dele.

Olho para o chão e exalo em voz alta, sentida o peso de suas palavras e não sabendo ao
certo se agradecia ou o abraçava. Olavo era tão querido e machucado como o irmão, mas ainda
assim se mantinha firme e forte para sustentar as barreiras ao seu redor.

– Ele perguntou de você quando a gente chegou. É difícil para ele está nessa situação,
Oliver era muito imperativo antes de descobrir a doença e teve seu modo de vida mudado
drasticamente. – e revelou com o olhar perdido. – Ele deve está achando que este é o seu final.

Encaro-o e ele me olha inexpressivo, mas com os olhos verdes amedrontados.

– Ele vai sair dessa. – afirmei com veemência. – Eu tenho fé que sim.

Com minhas últimas palavras, ele desvia o olhar com um humor ácido.

– É, é bom ter algum de nós com isso por aqui. – e bufou. – Não somos conhecidos por
termos cresças nessa família.

Eu tento dizer algo, mas ao olhar para frente, vejo uma mulher negra e gordinha de calças
jeans e blusa branca e um garoto por volta dos dezoitos anos com um short esportivo, olhando
desconfiado para Otto e nós dois.
Se um homem como Otto viesse dizer que precisa conversar comigo, eu também ficaria
desconfiada.

A mulher desviou os olhos dele para nós dois e disse algo que o fez olhar em nossa
direção e nos chamou com um sinal de mão, algo que a gente fez sem sequer olhar para o rosto
um do outro. A moça olhou para o seu filho e pediu algo que o deixou visivelmente irritado, mas
que mesmo assim pareceu atender, pois se virou e entrou.

– Este é o meu filho Olavo. – apontou para ele. – E a namorada de Oliver, Flora.

– Você tem o mesmo nome que minha filha. – ela disse olhando para mim com um
sorriso triste. – É a caçulinha da casa, tem cinco anos e nos enche de alegria.

– Crianças costumam nos proporcionar isso. – afirmo lembrando–me de Laís e Taís.

– Sim. – disse apenas. – Vocês poderiam me seguir até a parte de trás? Gostaria que
nossa conversa acabasse antes de Ella chegar.

– Ah, claro. – Otto afirmou e a mulher entrou.

Andamos por uma varanda de madeira, contornando a casa e ao passar por uma janela,
vejo o mesmo menino espremendo limões na cozinha e desvio os olhos ao ver que chegamos à
parte de trás de um quintal espaçoso com uma árvore com um balanço, uma mesa de piquenique
e uma piscina de plástico redonda com boias coloridas boiando.

A mulher aponta para mesa e nós nos sentamos. Um vento quente nos atinge balançando
meus cabelos e fazendo–me encarar o céu. Eu não havia reparando em o qual bonito o tempo
estava hoje, mas como esse é a última coisa que tenho que me interessar agora, presto atenção no
pessoal ao redor da mesa.

– Como falei para o Sr. Bennett, me chamo Amélia Jonhson. – ela iniciou. – Eu aceitei
falar com vocês porque ele me disse que tem algo que possa ajudar minha filha e eu não estou
em um momento que possa recusar qualquer tipo de ajuda.

– Nós também não estamos. – ele afirmou e começou a contar a situação ao qual Oli se
encontra. – Meu filho descobriu que estava doente e que seus rins parariam de funcionar alguns
meses atrás. Ele optou por esperar o transplante e se medicar, fazendo dieta e mudando seu modo
de vida. Mas assim como estávamos cientes, isso não adiantou muito e nos descobrimos dois
dias atrás que era necessário iniciar com hemodiálise. O tratamento não é tão eficaz porque não
foi iniciado de princípio e a situação dele se agravou muito. – e pausou, como se fosse difícil
continuar. – Oliver não vai aguentar por muito tempo e a única chance de ele sair de lá é com um
transplante.

– Ella queria fazer isso, iniciar o tratamento com o remédio, mas o pai dela e eu
pesquisamos e achamos melhor iniciar com hemodiálise. Isso foi há dois anos e acreditamos que
com um tempo acharíamos um doador, mas não foi isso que aconteceu. O tempo está passando e
as veias dela não vão aguentar para sempre. – e com lágrimas brilhando nos olhos. – Minha filha
não tem uma vida normal e não sei quanto tempo vai aguentar se não acharmos um doador.

Um silêncio se instala na mesa, melancólico e angustiador. Ventos fortes quebram o


silêncio, representando com perfeição nossa dor.

– Mãe. – chamou o garoto chegando perto. – O suco que pediu.

–Obrigada, querido. – ela agradeceu.

Ele colocou a jará no centro da mesa e se sentou ao lado da mãe.

– Gostariam de uma limonada? – ela perguntou. – É a especialidade de Liam.

Eu aceitei e Otto também, mas Olavo apenas continuou na sua, sem expressar nenhuma
palavra e negando com apenas um aceno.

– Você disse que tinha algo que nos ajudaria. – Liam disse. – Como?

Otto engoliu em seco, e olhou para baixo, perguntando em seguida.

– Vocês estariam dispostos a uma troca? – e completou ao ver que ninguém estava
entendendo. – Na minha família, temos cinco pessoas que estão dispostos a doar para meu filho,
mas infelizmente ninguém é compatível. Eu aposto que na sua também tem. Não sei o termo
certo, mas pelas pesquisas que fiz, não é ilegal.
– Você quer doar para minha filha o rim? – perguntou chocada. – Eu já ouvi relatos nos
corredores, mas pensei ser mentira.

– E em troca, os familiares que toparam ajudar sua filha, nos ajudam. – afirmou Otto.

– Claro, eu entendi. – engoliu em seco e olhou para Liam, que encarava Otto
desconfiado. – Mas como saber se isso é confiável. Somos estranhos e eu não conheço vocês.
Como não saber se isso é um golpe?

– E roubar o quê?

– Não sei. – disse ela.

– Se topar, iremos à busca de advogados. Tem toda uma burocracia para ser feita.
Ajudamos sua filha e você ajuda meu filho. – ele a encarou. – Se nenhum dos dois lados for
compatível, seguiremos em frente estando no mesmo lugar, mas se eles forem, daremos uma
nova oportunidade para nossas crianças.

A mulher olha esperançosa para Otto e eu faço o mesmo, esperando uma resposta dela
com os nervos à flor da pele. Ela desvia o olhar e encara seu filho, que apesar de desconfiado
está esperançoso e eu acho que é isso que a faz tomar uma decisão.

– Tudo bem, eu aceito. – e apertou a mão do filho. – Irei ver se sou compatível e verei se
as pessoas que queriam ajudar minha filha também estão dispostas a fazer isso. O que é
necessário para esse procedimento?

E nas próximas meia hora, conversamos sobre o que era necessário ser feito e como ser
feito. Falamos sobre tramas legais e outras burocracias que eram necessárias. De principio era só
necessário fazer o exame e depois se esse desse positivo, outros exames seriam feitos e processos
seriam iniciados com documentos assinados por juiz, para no final, ambos se ajudarem dentro da
lei.

Era ótimo na teoria, veríamos se seria bom na prática.


Tenho que manter a calma antes da tempestade
Eu não quero menos, eu não quero mais
Preciso fechar as janelas e as portas
Para me manter segura, para me manter aquecida

Sim, estou lutando por minha vida


Não posso separar o mar, não posso alcançar a praia
E minha voz se torna minha motivação
Eu não vou deixar isso me puxar para o mar

Head AboveWater – Avril Lavigne

OLIVER

Encaro o teto branco com a luz acessa que ardem minhas vistas e me faz enxergar várias
luzes coloridas. Tento fazer o impossível, não pensar. É difícil, muito, mais do que pensei que
seria e não consigo evitar os pensamentos que me assombram e eles me desanimam e me fazem
sentir claustrofóbico.

Estou preso em um lugar ao qual portas e janelas estão fechadas e o ar condicionado é


congelante; máquinas estão ligadas em meu peito, fazendo um barulho que atrapalha minha
audição e me impossibilitam de escutar o barulho da televisão.

Tento encarar o teto e tentar imaginar qualquer outra coisa a não ser minha realidade, mas
fica difícil quando a merda da minha existência parece mais atraente para os meus neurônios. De
certeza fiquei meio estranho quando descobri o meu problema de saúde, tentei não me angustiar
e tratar isso como se não fosse importante.

Todo mundo morre um dia. Uns aos nascerem outros na velhice e os mais sortudos com
doenças que vem nos momentos mais inoportunos. Eu não gostei dessa minha sorte, mas era o
meu futuro. Não sairia do hospital com vida, era uma certeza que eu tinha e que me deixava
sufocado quando aparecia.
O que poderia fazer? Viver era complicado.

Desvio minha atenção para televisão quando o comercial que passa no meio do filme
acaba. Era do Gelo três é estranhamente um dos meus filmes favoritos, a série toda. Assisti todos
com o meu pai e irmão no cinema. Nós tínhamos costumes estranhos e nos tratávamos de formas
esquisitas, mas adorávamos fazer certas coisas juntos. Meu pai era mais nosso amigo do que pai
e acho que isso foi um jeito muito bom de nos criar.

Para um pai solteiro no começo da juventude, ele não fez um trabalho ruim.

Eu tenho que me lembrar de dizer isso para ele. Assim como eu tenho que lembrar de
dizer que eu o amo muito e que ele é o exemplo que eu gostaria de ser quando crescesse, forte,
valente e com um controle invejável. Três caraterísticas que eu admiro muito e parece que Olavo
as herdou. Meu irmão mais novo, que possui tantas qualidades e é mais responsável do que eu;
muito inteligente e com uma direita invejável. Queria poder vê–lo se transformar no advogado
que tanto sonha ser; ter seus filhos, se assim desejar e ser um homem de sucesso, que tenho
certeza que ele vai ser. Assim como tenho certeza de que ele irá achar uma mulher tão incrível
como ele para ajuda– lo a suprir o que nossa mãe deixou aberto.

Eu não a odeio, nem quero o seu mal e acho que até perdoo ela – não que eu ache que ela
vai se importar –. Não vai me ajudar em nada nesse momento guardar ódio ou desavenças. Quero
ir em paz. Antes de ir tenho que pedir para o meu tio e primos ficarem ao lado do meu pai e
irmão, eles vão sofrer muito, assim como Flora.

Conheço– a tão pouco, mas sei que ela é o amor da minha vida. Queria me casar com ela
e ser o homem que ela precisasse que eu seja. Gostaria de ter uma família com ela, um cachorro e
um casal de crianças. Iria pegar meu carro nos fins de semanas e feriados e dirigir sem um lugar
em mente, tornando–me um dos arquitetos mais brilhantes que essa cidade já viu.

Posso imaginar isso em mente, é agridoce e bom para passar o tempo, apesar de doloroso.
Eu sei o que eu gostaria de ser é o que dizer para as pessoas que eu amo, sei o futuro que eu
gostaria de ter, mas não sei o que fazer para tampar o vazio que eu tenho no peito.

Parece que tem algo faltando.

Seria essa a culpa de me privar ser quem deveria ter sido?


Acho que tenho tempo de sobra para descobrir isso.

É por volta das dez da noite quando sou acordado por um barulho. Não é alto, mas acaba
me despertando do sono que acabei caindo por exaustão. Eu não tinha uma noção exata de
quanto tempo estava no hospital, mas parecia muito tempo. Os dias que eram pequenos se
tornaram grandes e exaustivos, parecendo durar muito mais do que vinte e quatro horas.

A luz é acesa e Ingrid, a enfermeira loira de vinte e cinco anos com um sorriso bonito
aparece na minha frente, mostrando os dentes brancos e brilhantes. Ela é doce e sempre tenta me
animar, mas com o seu turno sendo de noite, ela sempre me encontrava no meu pior momento.

– Boa noite, Oliver. – ela me cumprimenta ignorando meu mau humor perceptível. –
Como estamos?

– Exausto. – resmungo.

– Vim trocar seu soro. – ela diz se aproximando de mim pegando meu braço. – Não
consegue dormir ainda?

– Não. – afirmo. – Os barulhos me deixam louco e só durmo quando o cansaço vence.

Ela tira o soro do meu braço e agilmente troca por outro, colocando no apoiador. Depois
de fazer isso ela pega sua prancheta e anota as informações que aparecem na máquina ligada ao
meu corpo e desvia o olhar para as máquinas de remédio.

Pisco tentando limpar minha visão e bocejo.

– Está tudo pronto. – e perguntou. – Quer um pouco d’água?

Penso por alguns segundos e confirmo com um aceno. Ela não diz nada, apenas leva sua
prancheta e sai pela porta, deixando– a aberta por algum tempo e vejo outra porta como a que eu
estava cansado de ver e um corredor branco e aparentemente gélido.
Assim que volta, levanto– me um pouco e bebo de forma lenta para não sentir enjoo,
devolvendo o copo para ela.

– Obrigado.

Outro aceno é dado e ela me encara por algum tempo, causando– me estranhamento.

– Pensou no que eu disse a você?

Sinto vontade de gargalhar de sua pergunta. É logico que pensei, aqui não existe a opção
de não pensar. Gostaria que existisse, porque minha mente quer me destruir e eu me recuso a me
deixar cair. Vou morrer, mas vou morrer lutando e não me lamentando.

– Sim.

– E então? – ela questionou. – Entregou sua vida nas mãos do criador?

– Não.

Minha resposta à deixa desmotivada, mesmo assim ela continua.

– Você foi descrente sua vida toda. E eu sei que esse tipo de coisa não muda de um dia
para o outro, mas você precisa se conectar com alguma força espiritual. – e pausa, – Você está
crente que vai morrer, eu já percebi isso. Mas nada é posto na nossa vida sem ter um proposito...
Milagres acontecem, Oliver! A todo o momento, só temos que acreditar.

Ela termina de dizer e fica me olhando, assim como eu continuo encarando-a, mostrando
meu cansaço. E só.

– Tudo bem, tudo bem. Você não quer escutar isso. – ela respira fundo e continua me
olhando. –É a última vez que direi isso há você.

– Tudo bem.
– Esperança tem que ser a última coisa que morre. Você me lembra de meu irmão, tem a
mesma idade que ele e a chance de uma vida tão longa. Não se deixe abater! Você tem tanto pela
frente. Não deixe o seu pessimismo te vendar os olhos e te fazer desistir tão fácil.

Fico pensativo, para o meu desgosto e isso parece agrada–la.

– Tenho que sair agora, mas lembre– se, nada acontece sem ter um motivo para que isso
aconteça.

E ela se vira, não esperando que eu diga nada. Fiquei cansado das questões que
apareceram ontem de tarde e que pioraram ao tê–la conversando comigo ontem de noite. Não
sabia ao certo porque queria me fazer ter esperança, isso só acabaria com o meu emocional e me
deixaria frustrado.

Entretanto, ainda sim, eles queriam que eu saísse dessa bolha que me protege.

Será que eles não entendem que preciso ficar abaixo da superfície para não me afogar?

FLORA

Nos próximos três dias que se seguiram, todos esperamos com ansiedade os resultados.
Cinco pessoas de cada lado estavam testando para salvar a vida de Ella e Oliver. Estávamos na
torcida para que desse positivo em ambas as partes, porque não sabíamos mais para que lado
correr em busca de ajuda.

Das quatro famílias que o diretor deu os nomes para Otto, está era a única que a paciente
tem o mesmo tipo sanguíneo de Oliver. Estamos fazendo dessa forma para pularmos uma das
etapas e iniciar para as principais, como compatibilidade nos tecidos internos e outras coisas
importantes.

Seguindo com o pedido de Oliver, tanto Olavo como eu não fomos o visitar. Não
estávamos nada satisfeitos com esse pedido, mas seguimos seu desejo. Otto nos dava notícias e
dizia que Oliver estava levando aquilo tudo muito bem. Não sabia se podia acreditar, mas não me
restava outra opção. Como hoje era sábado, poderia ir ver ele e eu sentia a ansiedade querendo
me dominar, não só por isso, mas porque sairia hoje os resultados.

Quase não consegui pregar os olhos está noite e levantei assim que começou a
amanhecer, ansiosa para chegar a hora e acabei roendo minhas unhas para tentar me acalmar.
Quando Olavo me ligou, quase corri para o andar debaixo, só não o fiz porque minha mãe me fez
travas às pernas ao vê–la de pé em frente a minha porta, com a mão estendida prestes a bater na
madeira.

– Você está indo ver Oliver? – ela questionou, olhando para mim com seriamente e me
pegando desprevenida.

Por que ela estava querendo saber?

– Sim. – respondi, puxando á porta atrás de mim.

Olhei para ela por mais alguns segundos e a vi um pouco nervosa, parecendo está em
uma briga interna. O celular vibrou no meu bolso e percebi que o que quer que ela queira,
poderia esperar até mais tarde.

E comecei a andar, até que senti seus dedos longos e finos apertarem meu braço com
delicadeza.

– Posso ir com você?

Olho para ela surpresa e questiono não querendo acreditar no que escuto.

– O quê?

– Posso ir ver Oliver? – perguntou novamente. – Gostaria de pedir desculpas para ele.
Conversei com o seu pai e o pastor e percebi que o que fiz foi muito serio e gostaria de ir pedir
desculpas para ele.

Olho para ela sem acreditar e desvio o olhar, com minha razão dizendo para manda– la
voltar a dormir. Mesmo assim, eu não queria fazer isso. Não sei ao certo se o principal motivo
foi por ela nunca ter pedido algo assim ou por que queria que ela estivesse do meu lado, eu não
sei ao certo, talvez seja a culpa falando alto ou uma forma de amenizar a sua atual situação, só
sei que segui meu extinto.

– Eu não acho que isso seja uma boa ideia. – afirmo soltando sua mão do meu braço.

– Filha...

– Estou atrasada. – corto– a. – Tchau mãe.

Desço as escadas com rapidez e saiu porta fora, indo me encontrar com Olavo que me
espera do outro lado da rua, dentro do carro.
Eu chego ao hospital dez minutos depois que inicia o horário de visitas, infelizmente o
trânsito não havia nos ajudado a chegar antes, como Olavo, Otto e eu queríamos, para assim
descobrir se os resultados dos exames haviam saído. Estava ansiosa para saber, mas a saudade do
meu namorado era maior do que qualquer outra coisa e escolhi ir ao seu encontro primeiro.

Deixei Olavo e Otto irem ver os resultados e fui direto para o andar de Oliver, andando
com certa rapidez e parando apenas para lavar minhas mãos, como era exigido que fizéssemos.
Terminei de lavar as mesmas e sequei com três folhas de papel, jogando dentro do lixo e
adentrando aos corredores com minis quartos completamente isolados e extremamente
congelantes.

– Bom dia. – cumprimento a enfermeira, quando passo em frente a ela.

– Bom dia. – e pergunta. – Qual o paciente que você quer ver?

– Oliver Bennett.

Ela acena e anota algo no papel, liberando minha entrada. Ando mais um pouco e bato
duas vezes na porta, anunciando minha entrada. Sem esperar por uma resposta, abro á porta e
encontro os olhos de Oliver encarando a mesma, curioso em saber quem estava entrando e meu
estômago vibra quando vejo os olhos opacos ganharem vida e um sorriso de dentes brancos se
iniciar, mostrando sua felicidade.
Com as pernas bambas fecho a porta e sinto uma angustia grande no peito. O sorriso e os
brilhantes olhos verdes eram um deleite e tanto, mas mesmo que eu quisesse, não diminuíam o
impacto que era ver ele pálido e com os olhos fundos, que denunciavam seu cansaço e mal está.

Tentando deixar isso de lado, ando até sua cama e agarro sua mão sorrindo, para não
deixar que ele perceba o quanto isso me afeta. Ele já tem coisas demais na mente para deixar que
minhas emoções estraguem nosso momento. Sendo o oposto daquele dia, sua mão puxa a minha
e a agasalha entre as suas, fazendo– me sentir completa pelo contato simples.

Ele as aperta, aparecendo apreciar tanto quanto eu e me encara quando pergunto.

– Como você está?

– Feliz por você está aqui. – responde com sinceridade, olhando para o meu rosto. – Tão
feliz que nada mais importa.

– Se eu soubesse teria vindo antes. – afirmo sentindo os olhos se enxerem de lágrimas.

– E ganhar faltas para aumentar seu tempo de estudo? – perguntou. – Isso não me
deixaria feliz. Assim como sua presença é boa aqui, os pensamentos de que não estou
atrapalhando sua vida são melhores ainda.

– Você nunca atrapalharia minha vida. – afirmo. – Sua presença só acrescenta felicidade
em meus dias.

Ele me encara, mostrando os olhos verdes ficando lacrimejados e desviando os olhos ao


dizer.

– A sua também. – e continuou. – Mas sou egoísta e quero me casar com você quando
finalizar seus estudos, então, estou dispensando tudo que atrapalhe meus planos.

Fico sem saber o que dizer, completamente sem fala e ele continua olhando para o nada,
até que puxa minhas mãos para o seu rosto e as beija com ternura, levando–me as lágrimas de
forma intensa.

– Estarei ansiosa para esse dia.


– Eu sei que vai. – ele afirma com a voz trêmula. – Não imaginei nada diferente disso.

Ele inicia uma massagem em meus dedos, apreciando cada um e os beijando. Olho para o
teto tentando me acalmar. Eu o amava tanto que doía e não me imagina viver sem ele. Sei que
conseguiria sobreviver sem sua presença, mas não queria que isso acontecesse, não quando
pensar nisso doía tanto.

Eu ainda acreditava em milagres, de uma forma tão profunda que tornava tudo
suportável.

E queria acreditar que Oliver também o fazia. Suas palavras eram agridoces, mas o tempo
ao qual passamos juntos me fez ver o quanto ele era descrente e nesse momento eu não quero
que ele seja assim. Eu preciso que ele seja forte e confie, pois assim, não irá desistir quando tudo
parece ser impossível e de certa forma, me fará ser forte.

E foi por esses e outros motivos que me vi dizendo.

–Milagres acontecem. – e continuei, de forma tão confiante como podia. – E você


sobreviverá para deixar de ser descrente.

Minhas palavras o fazem descer minhas mãos até seu colo, ainda as apertando.

– Eu não sei se milagres realmente acontecem. – afirmou e me olhou. – Ou se realmente


existe alguém zelando por nós. Acho que ninguém pode ter certeza disso, mesmo assim, eu já
entreguei meu destino nas mãos dele ou sei lá o que seja e seja o que for que acontecer, vai ser
porque é necessário que aconteça. E ninguém vai poder fazer nada para mudar isso.

OLIVER

Flora me encara sem reação e não sei se isso é uma coisa boa ou não. Entretanto, eu não
sei de mais nada. Esses poucos dias aqui parecem está me deixando louco. A televisão aqui não é
suficiente para prender minha atenção e os profissionais que querem me ajudar só falam de algo
que eu nunca acreditei.

Não posso mudar meu jeito de pensar de uma hora para outra, mas eu quero continuar
vivo. É o que eu mais quero. Dizem que milagres acontecem, então talvez seja bom não perder as
esperanças de um todo. Não sei se foi uma boa ideia, me deixar criar essa esperança, só sei que
quase todos os profissionais que entram aqui falam sobre isso. Ter esperança e não deixar de
acreditar que eu possa conseguir.

É idiota, o universo e tudo nele. As pessoas acreditam fielmente que o mundo foi criado
por um criador nomeado de Deus ou sei lá o quê. Sempre acreditei que o mundo se iniciou da
mesma forma que os outros planetas e que tudo foi se encaixando em seu devido lugar conforme
o tempo, criando vegetação e vida.

Nunca perguntei nada sobre isso ou questionei. Meu pai não se apegava a religião e meu
irmão e eu aprendemos a fazer o mesmo. Mas na televisão aberta só se fala disso e tem esses
profissionais, que não deveriam dizer essas coisas para os pacientes. Era antiético, mas enfim,
nossa mente era uma merda quando se incomodava com algo.

E eu comecei a me incomodar em aceitar o obvio. Iria morrer? Não tenho tanta certeza.
As pessoas dizem que tudo acontece por alguma razão e que se tiver que acontecer vai acontecer.
Cheguei à conclusão que vou aceitar isso. Em minha perspectiva é difícil acreditar que exista um
soberano zelando por nós, ou santos que querem nossa devoção ou sei lá o quê. É mais fácil
acreditar que exista uma energia viva, que não é a principal responsável, mas um dos motivos
que nos guia nos momentos difíceis.

Talvez esse seja um jeito péssimo de ver as coisas, mas é o único que parece se encaixar
com os meus ideais. Não sei se poderia ser considerado um pecado, mas vou torcer para essa
energia está ao meu favor e deixar a esperança brilhar.

Certa, isso soou meio afeminado.

Entretanto, quem se importa?

Eu já tinha dado minha vida como acabada, por que não deixar a esperança fazer sua
parte? Se não funcionar, não vou perder nada e se funcionar, bem, vou continuar lutando para
sempre ficar bem.

– Ai que bonitinho. – a voz de Olavo nos tira da bolha ao qual se enfiamos. – Será que
estou atrapalhando?

– Não. – Flora fala. –Não está não.

– A felicidade irradiante na cara desse filho da puta me diz o contrario. – meu irmão
debocha e suspira. – O que o casalzinho tanto conversa?

– Sobre milagres e essas coisas que vocês acham desnecessários. – resumo encarando o
rosto de meu irmão, que se mostra abatido, apesar da cara de deboche que ele tenta segurar. – O
que aconteceu? Uma das suas namoradas descobriu sobre a outra e estragou sua moto?

Pergunto de forma divertida lembrando– se das três namoradas que meu irmão possui.

– Não. – negou rapidamente e ficou um tempo calado, deixando–me com um


pressentimento estranho. – Eu só, estava sentindo sua falta.

Parecendo como um soco no peito, eu engulo em seco e encaro– o.

– Agora você percebe que eu faço falta, né? – pergunto brincalhão.

– Eu sempre soube que você faria.

Com essa resposta, a porta se abre e meu pai entra visivelmente abatido e sorri ao me ver.
Fico sem entender, mas algo em mim grita que algo está muito errado e sinto medo.
Normalmente seria corajoso e questionaria até descobrir, mas tudo o que sinto é uma vontade
imensa de chorar. Seria possível que tudo piorasse?

–Oliver. – meu pai me chama e pergunta. – Como você passou a noite?

– Bem. – digo apenas, tentando controlar as lágrimas e mudo de assunto. – Vocês podem
me informar como está minha Ferrari?

É, de fato foi um jeito muito tosco de mudar de assunto


Mas, novamente, quem se importa?

FLORA

Encaro o chão branco e perfeitamente encerado e choro como uma criança. Os olhares
que Otto e Olavo trocaram dentro do quarto de Oliver foi o suficiente para descobrir que a nossa
última chance não funcionou. Meu coração está despedaçado e não consigo controlar a dor que
sinto.

Não posso perder ele.

Os braços de Olavo me puxam para ele e encosto minha cabeça em seu ombro, deixando
as lágrimas lavarem minha dor.

Por que as coisas tinham que ser assim?

– Os exames não deram positivos. – ele diz tão triste quanto eu. – Os tecidos internos são
diferentes e o organismo dele irá rejeitar. Ainda temos algumas semanas para tentar conseguir
algum doador.

Fico em silêncio e só choro.

– Oseias é compatível com Ella. – continuou. –Nossa proposta não foi em vão e tenho
certeza que se persentimos, conseguiremos vitória também. Ainda existem outras famílias e...

– Me leva para casa? – o interrompo.

– Não podemos desistir, Flora. – ele implora. – Nos precisamos ser fortes por ele.

Ele tinha razão, eu sabia, mas no momento eu só queria chorar até que essa dor passasse.
– Eu sei. – afirmo. – Mas só quero ir para casa agora.

E sem mais nada a dizer, ele se levanta e me leva junto, apertando– me junto a si em uma
tentativa de me confortar quando ele mesmo estava destruído. Todos nós estávamos. Não
queríamos está assim, mas tudo parecia está conspirando para o pior e eu me recusava a deixar
Oliver ir embora.

Eu poderia viver sem ele, mas eu não queria.

Olavo me prende junto a si por todo o caminho e não me solta até que eu esteja em casa.
Eu enxergo tudo por borrões e nada importa ao redor, mas sabia que não era apenas eu e ele que
estávamos ali, assim como sabia que não fiquei só quando ele foi embora e continuei chorando
como uma criança no meu quarto.

Por que tudo tinha que ser tão doloroso?

– Ela está acordando. – escutei meu pai dizer.

Entretanto, não abri os olhos. Não queria levantar e ter que aguentar a confusão de
emoções que meu mundo havia se tornado. Ter a melhor coisa que aconteceu em sua vida
morrendo por falta de ajuda, era doloroso demais, tanto que não poderia mais ficar dessa forma.

Eu não tinha emocional para isso.

– Flora, minha flor, vamos levantar. – meu pai continuou. – Você precisa ser forte. Seja
valente como você sempre foi... Ele precisa tanto de você!

– Não, eu nunca fui valente. – eu nego ainda de olhos fechados. – Tenho aguentado em
silêncio o quanto estou machucada. – e obro os olhos encontrando os olhos castanhos confusos
de meu pai. – Sofro de ataques de pânico há anos.

Seus olhos se arregalam e ele engole em seco, não pensando muito antes de dizer.
– É por causa das brigas?

Apenas aceno e choro, sentindo a cama afundar e os braços finos e delicados de minha
mãe me apertar contra si.

– Me perdoe por isso. – ela pede em um sussurro. – Eu não sabia o quanto estava te
destruindo. Pensei que só era eu aquela que estava destruída.

– Do que você está falando? – questiono tentando olhar para o seu rosto.

–Eu sou dessa forma, Flora, porque foi à única forma que encontrei de ser para não deixar
que o meu passado me destruísse. – afirmou envergonhada. – Meu padrasto me violentava, filha.
Sexualmente, fisicamente e mentalmente. Minha mãe não acreditava em mim e as surras,
segundo ela, eram porque eu merecia. Lidar com isso era difícil e fiz isso da única forma que
consegui, controlando tudo o que podia. Desde sempre foi assim e ao ter você e seu pai
disponíveis, vocês viraram meu principal foco.

Fico encarando-a de olhos arregalados e sem acreditar. Não desvio o olhar para canto
nenhum e só a puxo mais para mim.

Por essa eu nunca poderia imaginar.

Minha mãe foi estuprada?

– Perdoe– me. – ela pede e sinto as lágrimas molharem minha blusa.

– Não há o que perdoar. Eu já perdoe tudo o que havia para ser perdoado há muito tempo.

O outro lado da cama afunda e sinto os braços do meu pai nos envolver, fazendo– me
sentir protegida entre os dois pela primeira em muito tempo.

– Eu amo você, Flora. – ela declara. –E eu amo você também, James.


– Não é o momento...

– É sim. – ela o interrompe. – Fiz coisas erradas, mas vou consertar tudo, com todos que
magoei. – e continua com uma firmeza arrepiante. – Eu prometo.

E ao longo daquele dia, passamos o dia juntos, compartilhando em silêncio toda dor que
acumulamos durante anos e secretamente, remendando todas as feridas, que nem sabíamos que
possuíamos.

OLIVER

Com o resto do sábado passando de forma lenta e uma madrugada difícil, estou exausto
no horário de visitas de domingo, de tal forma, que penso seriamente em cancelar as visitas do
dia. A dor que sentia em meu abdômen parecia só aumentar ao longo dos dias, para completar
algumas das minhas veias estouraram, pelo uso continuo de medicamentos e da hemodiálise.

Sábado não havia sido um dia bom e domingo parecia está se arrastando para ser pior
ainda. Meu estômago estava enjoado e o médico sacana havia ameaçado novamente colocar a
sonda no meu nariz, mas não me importei, sei que ele está tentando me ajudar, mas não sinto
vontade de fazer nada a não ser dormir e acordar quando esse pesadelo ao qual vivo for
finalizado.

Mexo –me na cama e mudo de posição do colchão de bolas de massagem, tentando


descansar nem que seja por um segundo. Mas acabo desistindo quando alguém bate três vezes na
porta e entra. Aborrecido olho para mesma e pisco achando que minha visão está me traindo.

O que diabos ela estava fazendo aqui?

Com um vestido preto e um rosto livre de maquiagem, Eloisa Collins anda até parar em
minha frente, parecendo está sentida com o que vê.

Não precisava de sua pena.


– Oliver. – ela me cumprimenta.

– O que veio fazer aqui? – questiono cortando qualquer rumo afetivo que ela queira criar.
– Pelo que lembro você não gosta de mim. – e continuo com desprezo encarando seu rosto pálido
e sentido. – Se veio apreciar minha desgraça, saia pela mesma porta que entrou. Não preciso
desse tipo de coisa nesse momento. Minha mente já está me dando o suficiente.

– Não sou esse tipo de pessoa. – afirma encarando –me. – Estou envergonhada pelo que
fiz a você. E eu nunca tripudiaria sobre o seu sofrimento, não quando ele afeta minha filha. Posso
não achar que você é o homem certo para minha menina, mas nunca iria desejar sua morte.

Escuto o que ela diz e pisco, percebendo o quanto parece sincera. Mas na minha pouca
vida desagradável, muitas pessoas também deram flores antes de jogarem pedras e o fato de está
sobre uma cama não diminui minha inteligência.

– Tenho minhas dúvidas. – afirmo e continuo. – O que você veio fazer aqui?

Ela fica em silêncio durante um tempo antes de continuar.

– Eu não sei. – confessa. – Acho que pedir desculpas.

– Pelo o quê? Você não me colocou nessa cama, a vida me colocou.

– Eu sei que não tenho culpa por você está aqui. – ela afirmou. – O que armei para acabar
com o romance da minha filha e seu, pode ter influenciado sua vinda para aqui, mas não foi o
principal motivo. Errei muito fazendo isso e pelo incrível que pareço, estou torcendo para você
sair dessa.

Olho para ela e penso por um tempo, respirando fundo. Este lugar não era o certo para
discursões e palavras de ódio.

– Se fosse para culpar alguém, culparia minha mãe. – revelo, pegando –a desprevenida. –
Fui atrás dela procurando sua ajuda e apoio e ganhei seu desprezo. Doeu de tal forma, que fiquei
desolado. Eu precisava da Flora e eu apenas cheguei e vi seus olhos cercados de pena. – respiro
fundo e afirmo. – Apesar de parecer não sou digno de pena.
– Ninguém é.

– Se está querendo o meu perdão, não vou te dar, porque não tenho nada o que perdoar.
Você só quer o melhor para sua filha, de sua forma torta, você deve ama –la.

– Amo muito. – afirmou me interrompendo. – Faria qualquer coisa por ela.

– Fico feliz em escutar isso. – afirmo colocando minha mão no abdômen ao sentir uma
forte pontada. – Se não se importa, você pode se retirar? Não estou me sentindo bem.

– Quer que eu chame a enfermeira? – pergunta preocupada.

– Não, só quero ficar só.

Seus olhos castanhos não escondem sua preocupação e ela apenas acena, encarando –me
com uma certeza que refletia em suas palavras.

– Você vai sair dessa, Oliver. – e continuou. – Eu sinto que sim.

– Isso ninguém pode ter certeza. – disse apenas. – Cuide de Flora, que eu já estarei feliz.

E então ela sai e uma enfermeira entra em seguida, olhando –me com espanto e
preocupação quando uma máquina começa a apitar sem parar e uma pontada forte me faz arquear
em uma dor insuportável, que acaba se tornando demais e me levando direto para a
inconsciência.
FLORA

Perdi à hora está manhã e isso desce amargo por minha garganta. Estranhamente meu
celular não despertou e meus pais não me acordaram como prometeram fazer. Eles queriam ir
ver Oliver e mostrar seu apoio. Com toda neblina do dia anterior parecendo ainda está presente
em minha mente, não sei ao certo o que pensar sobre minha mãe. Ou a mudança que sua
confissão proporcionou.

Saber sobre o seu passado explicou muita coisa, mas ainda não é o suficiente para
esquecer tudo ou mudar por completo sua personalidade. Contar para a gente foi o primeiro
passo, agora outros precisavam ser dados, para quem sabe vivermos bem, juntos, pois senão, não
teremos a mudança que tanto precisamos.

Pego o celular e o desbloqueio, tendo apenas uma mensagem de Olavo me perguntando


se eu iria hoje. Como não respondi, ele deve ter tido sua resposta. Subitamente me lembro da
forma drástica que falei com ele ontem e do modo desesperado que implorou para que eu não
desistisse de seu irmão.

Eu nunca iria desistir de Oliver e tentaria o que fosse possível para salvar ele. Precisava
dizer isso para Olavo, mas não era hora, eles ainda estão na visita.

Bloqueio o celular e o deixo em cima da cama, levantando com certo desanimo e um


aperto estranho no coração, algo como angústia. Deve ser o medo pela situação de Oliver. Espero
que eu consiga aguentar tudo, o desconforto e as dúvidas não podem me vencer de forma
alguma.
Sem muito que fazer, tomo um banho rápido, evitando deixar minha mente me envenenar
e desço direto para a cozinha, procurando o meu pai no processo. Não o vejo em lugar nenhum e
pego uma pera na fruteira, não por sentir fome, mas por não querer ficar doente.

Dou uma olhada na hora e descido que é o momento certo para ligar para Olavo, então
volto para o quarto e pego o meu celular, ligando para ele. Sento na cama e entre mordidas na
fruta, aguardo que ele atenda a ligação, mas para minha surpresa cai na caixa postal. Disco
novamente e dessa vez nem chama.

Seu celular deve está descarregado.

Disco o número de Otto e o mesmo acontece. Ele não atende. Fico aflita e reparo na hora
novamente, percebendo que já se passaram dez minutos. Uma vontade de ir direto para o hospital
me invade, mas dispenso –a ao respirar fundo e pensar racionalmente. O resultado saiu ontem,
então eles devem ter ido até outra família.

Deve ser isso.

A campainha toca, tirando –me de meus pensamentos e desço quase correndo, abrindo á
porta com algum tipo de esperança que vai embora ao ver Jesy.

O que ela quer aqui?

– Flora. – ela diz meu nome com um sorriso triste e confessa. – Estou com saudades.

Encaro-a com estranhamento e dou espaço para ela entrar, algo que ela faz sem relutar,
puxando-me para um abraço forte, que mesmo estranhando eu devolvo.

O que aconteceu para ela está tão carinhosa?

– Oi para você também.

– Desculpe por te deixar confusa. – ela diz se afastando de mim visivelmente


constrangida. – Sei que nossa última conversa não foi muito agradável. Bem, ela foi tudo menos
agradável, mas eu estava passando por perto e você é minha melhor amiga... Se quiser eu posso
ir embora.

O fato de seu tio ter tentando matar Oliver virou uma das minhas últimas preocupações.
Contei para Otto e ele disse que iria tomar as providências. Foi extremamente grave, mas no
momento, temos problemas maiores.

– Não, pode ficar.

Ela relaxa e eu desvio o olhar, sentindo o clima pesar em cada célula do meu corpo.

– Quer uma água? Ou um suco?

– Não. – ela nega.

– Bom, mas eu quero. – afirmei. – Se quiser fique na sala, eu vou para cozinha.

– Eu vou com você.

Não digo nada e ando até a cozinha. Não me lembro ao certo quando foi a última vez que
tive uma refeição decente neste cômodo e isso era um fato um tanto estranho. Afinal, está é a
minha casa e deveria ser diferente.

Abro a geladeira e pego uma garrafa d’agua, andando até os armários e agarrando o
primeiro suco em pó que vejo. Com a jará e a açúcar na pia, engulo as lágrimas que querem
descer. A angustia que sinto só cresce, tentando derrubar as barreiras que eu com muito esforço
renovei.

– Flora. – Jesy me chama. – Você está bem?

Engulo em seco e olho para trás, apoiando-me no balcão da cozinha.

– Eu não sei. – afirmei. – Estou me sentindo angustiada.


A declaração faz ela me olhar com olhos dóceis.

– Tendo em conta os últimos acontecimentos, acho que é algo normal.

– Não, é uma coisa diferente. – nego. – Parece que tenho uma bolha na garganta e um
aperto prestes a me sufocar. – ela me olha sem saber o que dizer e explico. – Oliver não
conseguiu um doador ainda e a situação dele é complicada.

– Flora...

– Olavo e Otto não atendem ao celular. – continuo. – Acho que é isso que está me
deixando angustiada.

– Flora. – ela me chama novamente, mostrando-me seus olhos com lágrimas contidas. –
Existem varias coisas que impossibilitam uma pessoa de não atender uma ligação. Não fique
pensando asneiras, isso não irá te ajudar em nada.

– Eu sei. – e continuo. – Só é difícil.

Ela me olha e respira fundo, levantando e andando em minha direção.

– Vamos, Flora. – ela me chamou, puxando-me pelo braço. – Vamos procurar algum
filme para distrair sua mente e tirar esses pensamentos destrutivos de você.

– Eu não...

– Você quer sim. – me interrompeu. – Vamos assistir um filme e tentar esquecer os


problemas. Mais tarde vou com você até a casa dos Bennett e você vai ver como tudo vai está em
perfeito estado e essa angustia só vai ser algo da sua cabeça.

Sem conseguir argumentar, levanto-me e a sigo, querendo acreditar em suas palavras.


Era por volta das cinco quando acordo com Jesy em cima de mim. Não sabia ao certo
como peguei no sono, mas quando acordei escutei um barulho no andar debaixo e achei melhor
descer para ver o que se tratava e não me surpreendi ao ver meu pai sentando no sofá,
visivelmente preocupado.

– Pai. – chamei.

E ele me encarou, não precisando de palavras para explicar que algo estava errado.

– É com o Oliver?

– Flora. – ele me chamou e me olhou como se estivesse me averiguando. – Oliver passou


muito mal essa manhã.

Meu coração se aperta no peito e lágrimas começam a cair.

– Ele, ele...

– Não. – negou se levantando e vindo em minha direção. – Não, ainda.

Seus braços me envolvem e eu os aperto contra mim, me agarrando a ele como se ele
fosse minha tábua de salvação e sentindo meu coração se partir em diversos pedaços e minhas
pernas tremerem sem força alguma.

Ele tentou se afastar de mim, mas eu não deixei.

– Eu não posso aguentar.

– Mas você precisa. – ele afirmou com a voz tremula. – Ele foi entubado, pois estava
sentindo muito dor e forçando certos órgãos. Não se angustie antes do tempo, ele ainda está vivo
e nós temos que ter esperança, porque enquanto ele estiver vivo, não podemos desistir.

Continuo o aperto junto á mim e ele continua.


– Conseguimos mais um doador. – revelou. – Os exames estão sendo feitos com
emergência, então precisamos ter fé que tudo dará certo.

Com essas palavras eu me afastei dele e o encarei, o abraçando de novo quando outra
onda de lágrimas vem á tona.

Enquanto há vida, há esperança.

E o que dizem, não?


Encaro o céu apreciando o amanhecer precoce. É por volta das cinco e meia da manhã e o
céu ainda está nublado, recebendo aos poucos o brilho do amanhecer. Como em todo final de
janeiro, o vento é frio, quase congelante. Aperto o coberto mais contra o meu corpo, tentando me
aquecer e aprecio mais os raios solares que estão por nascer. O canto dos animais ao redor deixa
tudo tão bonito e me faz sorrir, mas isso não era algo surpreendente, pois no último mês tudo me
faz fazer isso.

Eu estava feliz.

Os últimos meses foram difíceis, quase perdi alguém importante e vi o renascer de outro.
Senti– me angustiada e prepotente, querendo fazer algo para mudar aquela situação e não tendo
nada em mãos para isso. Não foi fácil, nenhum pouco, tudo parecia conspirar para o pior e por
um bom tempo, acreditei que tudo estava perdido.

Entretanto, pela graça divina, estava enganada e vi pelos meus olhos a ajuda vir de
alguém inesperado.

Minha mãe.

Não soube reagi quando ela me revelou que iria doar seu rim para Oliver, eu nem sabia
que ela tinha feito o exame e senti tanto alivio e medo, ela estava colocando sua vida em risco
por alguém que até pouco tempo atrás, ela queria distância. Mas a vida é uma caixinha de
surpresas e pela primeira vez na vida, vi minha mãe ajudando alguém sem receber nada em troca.

Os motivos não eram importantes, nada era mais importante do que a vida do Oliver e a
nova vida que minha mãe dizia querer viver.

Ninguém muda de uma hora para outra, é necessário trabalhar nisso, mas apesar de está
ciente, não pude evitar me sentir privilegiada e orgulhosa por minha mãe fazer aquilo, salvar a
vida do homem que eu amava e que ela já havia mostrado o quanto não gostava.

Águas passadas.

Minha mãe colocou sua vida em risco para salvar Oliver e eu nunca vou esquecer isso.
Assim como eu nunca conseguirei esquecer o motivo que a fez ser daquela forma a vida toda.

Como o esperado, meu pai voltou para casa, bem, na casa temporária ao qual o Bennett
alugou para receber Oliver e ela. Com fácil acesso e perto do hospital, duas enfermeiras estavam
disponíveis vinte e quatro horas por dia no primeiro mês. Meu pai e eu ficamos ao lado dos dois
e ajudamos na recuperação. Uma bem difícil, devo dizer. Não podendo se levantar ou fazer nada
por si mesmo, vi tudo de perto, todo o sofrimento que aqueles dois adultos passaram ao voltar a
serem dois bebês novamente.

Minha mãe teve certas mudanças, perdeu peso e ficou fraca, mas Oliver foi ao extremo.
Emagreceu, perdeu cabelo e quase morreu na mesa de cirurgia. As duas semanas antes também
foram críticas, ninguém dava nada por ele, mas como sempre, nada é impossível para Deus.

Ele sobreviveu.

E eu sorri mais ainda ao lembrar isso.

Oliver estava vivo e isso que importava.

Hoje é 25 de janeiro de 2018, exatos dois meses da cirurgia e o aniversário de vinte e dois
anos de Oliver.

E eu não fui a única a acordar tão cedo. Foi o que constatei ao entrar na cozinha e ver
Otto e Olavo, conversando da forma simpática e adorável que só eles sabiam fazer. Meu pai
estava sentado na cadeira da grande mesa e tomava seu café, olhando para pai e filho que agiam
como dois irmãos.

–Eu já falei que não. – negou Olavo. – Oliver não foi liberado para dirigir e não vai ser
tão cedo. Dar um carro novo para ele só vai deixa– lo ansioso para ficar bom longo.

–Acabei de chegar, mas concordo. – falo assim que entro e me sento na cadeira, roubando
uma banana da fruteira.

–Vocês não estão entendendo. – Otto diz de sua forma dócil e nada ignorante. – O seguro
que pagamos nos proporciona opções e nestas opções tem a de trocar por um modelo mais
moderno por um pequeno valor.

–Pequeno valor milionário. – Olavo acusa.

–Quando te dei sua moto você não reclamou do valor gasto.

Ele deu de ombros e pegou seu café, como se fosse insignificante e não tivesse
importância alguma.

–Algum de vocês buscou o bolo? – perguntei e ambos olharam para mim.

–São seis da manhã. – Olavo afirma.

–E eu com isso?

–Nenhuma loja descente de bolo está aberta há essa hora. – afirmou ele, como se fosse
obvio.

–Encomenda existe por uma razão.

–Chega os dois. – Otto intervém. – Tem biscoito de morango no armário. Abre um


pacote, joga numa vasilha e coloca uma vela. E pronto, deixará a criança feliz da vida.
Olho para ele que mostra o pacote e do de ombros, levantando da cadeira. Oliver era
fanático por biscoito de morango e fazia quase três meses que não comia um, de fato ele iria ficar
tão feliz como uma criança em uma manhã de natal.

–Vou me arrumar e daqui a pouco irei fazer isso.

E saiu, sem esperar que eles digam algo, andando pelos corredores da casa de campo até
que entro no meu quarto. Uma grande cama de casal estava no centro e apenas outras móveis
essências estavam ao redor, não só aqui, mas espalhados por todos os cômodos da casa, sendo
um dos fatores principais quando escolhemos está casa para alugar.

Olho dentro do meu guarda– roupa e escolho meu macacão vinho. Pego uma jaqueta de
couro preto falso e um vans da mesma cor e os coloco sobre a cama. Procuro pela minha bolsa de
sempre e a coloca em um canto junto com o presente de Oliver, só para não esquecer e vou tomar
meu banho, para assim iniciar o grande dia.

OLIVER

Eu não sei que horas são, mas gostaria de dizer que não dormi o suficiente. Ultimamente
sinto um cansaço inexplicável, que acredito fielmente ser preguiça ou sono acumulado. Com a
cirurgia e a recuperação, aprendi o suficiente para não reclamar de nada nunca mais. Morri e
renasci, essa é a explicação mais simples que posso dar.

Não gosto de lembrar daqueles momentos, apesar de estarem marcados em minha pele
como ferro e brasa. O que passei não desejo a ninguém e estou sem sombra de duvidas grato por
ter saído dessa e nada do que faça vai ser o suficiente para agradecer essa nova oportunidade que
a vida me deu.

Eu sobrevivi e lutaria o resto da vida para acordar todos os dias e viver cada dia como se
fosse o último.

Ainda sim, gostaria de dormir mais um pouco, mas minha família não acha o mesmo, não
quando a luz é acessa e a tão conhecida música de aniversário começa a ser cantada. Ainda
piscando e sonolento, sento– me na cama e olho para todos eles.
Meu pai, meu irmão, meu sogro, a mulher que salvou minha vida e a mulher da minha
vida.

Minha família.

–Parabéns para você, parabéns para você, Oliver. – andando até mim eles cantam em uma
única voz. – Parabéns para você.

E eles finalizam com Flora sentando ao meu lado e mostrando para mim uma tigela com
uma vela azul acessa; muito chantilly e biscoitos de morango ao redor. Sorrio e assopro a vela,
ganhando assobios e muitas palmas, assim como um beijo estalado de Flora na bochecha.

–Parabéns. – ela sussurra no meu ouvido e eu sinto meus olhos lacrimejarem.

–Obrigado. – agradeço para ela e para todos os outros. – Obrigado por lembrarem.

–Como iríamos esquecer o seu envelhecimento? – questionou Olavo. – Vinte e Dois são
um pulo para os quarenta. Daqui a pouco os cabelos brancos vão crescer e você vai ter que se
contentar com os remédios da cor dessa vela.

–Garoto, vai à merda. – Otto reclama indignado.

–Vou fingir que não escutei isso. – meu pai diz ao mesmo tempo.

–Fingimos que acreditamos. – Olavo continua, ganhado um tapa na nuca do pai. – Ai,
porra!

– Parem de xingar! – Flora grita.

–Vou lavar a boca de vocês com sabão. – minha sogra afirma.

Flora chega mais perto de mim e envolve seu braço ao meu redor e eu, sem rodeios, a
puxo para o meu lado, apoiando meu rosto no seu ombro e cheirando seu perfume de flores
vermelhas que é como um lembrete eterno de está em casa.

–Eu já disse que amo você? – perguntei e a senti se arrepiar.

–Não hoje. – ela responde.

–Eu te amo. – e me afasto, olhando dentro dos seus olhos amorosos e cheios de
sentimentos. – Muito.

–Que cena mais romântica. – com uma voz melosa irritante Olavo debocha. – Estou até
emocionado.

–Deixa seu irmão em paz. – meu pai manda e avisa. – E ah, já está mais do que na hora
de você levantar e se arrumar, preguiçoso. Você tem consulta marcada para hoje.

Exalo uma respiração audível e enfio o dedo no chantilly, roubando um biscoito de


morango açucarado. É tão bom que até fecho os olhos e jogo a cabeça para trás, gemendo como
um idiota. Como eu senti falta disso.

–Depois dessa cena patética eu estou até me retirando de cena. – Olavo informa.

–Já vai tarde. – eu digo mal humorado.

A gente quase morre e não pode nem comer em paz.

–Também estou indo. – James diz. – Até mais tarde, Oliver.

–Vou aproveitar a carona. – Flora afirma me surpreendendo e me deixando com uma cara
patética. – Não me olha assim. Coma seu biscoito e vá à sua consulta, mas tarde eu estarei
disponível para dar atenção e o que mais você desejar.

–Isso é uma promessa? – perguntei com uma voz patética.

Eu virei uma menininha nesses meses, só pode ser.


–Sim. – afirma risonha e beija minha bochecha, colocando a vasilha na minha mão e
saindo junto com o seu pai.

Minha sogra me encara com um sorriso pequeno nos lábios finos e apenas dou de
ombros, enfiando o dedo na vasilha e enfiando na boca em seguida. Ela sorri e balança sua
cabeça, continuando a me encarar.

– Estou te esperando lá fora. – ela diz andando até a porta. – Chamem se precisar da
ajuda.

– Nós não precisaremos. – meu pai diz e completa com emoção na voz, encarando-me. –
Oliver nunca mais precisará de ninguém para cuidar do corpo dele.

Engulo em seco e não digo nada, pois se o fizer irei chorar sem parar.

Tempos difíceis nunca são esquecidos.

E eu realmente me tornei uma pessoa sentimental.

FLORA

– Você realmente não precisa de ajuda? – perguntou meu pai quando chegamos em frente
a nossa casa.

– Não. – afirmei. – Olavo já deve está em casa e Jesy vai chegar em breve. Acho que
posso me virar sozinha até lá.

– Se é assim, tudo bem. – meu pai diz dando de ombros. – Bom trabalho minha Flor.
Vejo-te mais tarde.
– Igualmente, papai.

Ele sorri e eu me afasto do carro, observando a traseira dele sumir pela rua e eu me viro
encarando minha casa e respiro fundo, sentindo meu celular vibrar no bolso e o pegando para
atender, enquanto pensava no que faria primeiro.

– Oi.

– Flora. – a voz de Olivia soou empolgada. – Já está em casa?

– Sim. Acabei de chegar.

– Certo, estamos indo para aí. – ela afirmou e continuou, perguntando. – Como está meu
primo?

– Carente e sentimental como sempre. – com um riso em minha voz e escutei sua
gargalhada.

– Muito diferente do Oliver de antigamente. – ela afirmou quando parou de rir e não pude
concordar. Oliver sempre foi assim, só que ele optava não por mostrar isso para as pessoas ao
seu redor e de certeza, para si mesmo. –Estamos saindo de casa agora.

– Certo. – e continuei. – Te vejo daqui a pouco.

– Ok, beijos.

Desliguei, colocando o celular no bolso. Desviei o olhar da minha casa e atravessei a rua
indo até a casa dos Bennett. No processo procuro minhas chaves na bolsa, as guardando
novamente dentro da mesma ao perceber que á porta estava aberta. Entro dentro de casa e
encontro as luzes da cozinha acessa. Ando até os sofás e jogo minha bolsa no sofá junto com a
outra bolsa com os diversos tipos de decorações de festas que comprei de última hora.

Vou até a cozinha e encontro as bebidas no balcão. Eram muitas para a quantidade de
pessoas que estavam por vir, mas como estávamos falando dos Bennett, não era de se espantar.
Otto e Olavo queriam fazer uma grande festa e comemorar pela vitória que haviam recebido em
grande estilo, mas Oliver não estava bom o suficiente para isso.

Ele havia acabado de sair de uma operação, que o salvou da morte. Havia coisas que ele
sequer podia comer e remédios brabos que tinham efeitos colaterais terríveis. Sua perda de peso,
cabelo e o excesso de sono mostravam isso e apesar de querer comemorar muito sua vitória, não
acho que a melhor opção seja fazer uma festa enorme, com várias coisas que ele não pode comer
ou comemorar como se deve.

– Antes que me pergunte, eu já confirmei nossa encomenda. – Olavo diz ao entrar pela
porta dos fundos. – E já limpei o quintal. Então, mostre educação e me agradeça.

– Agradecer o quê? Fazer sua obrigação? – com deboche afirmei e ganhei um olhar
mortal dele, que bufou desviando a atenção de mim.

– Você está muito saidinha para o meu gosto. – resmungou e eu o abracei quando passou
por mim.

– E você me ama.

– Talvez. – e se soltou. – Vamos ao trabalho, pequena Flor.

Bufei uma risada quando ele estava se afastando e o estapeei quando sua mão voou no
meu cabelo, espalhando-o para todos os lados e bagunçado os fios que demorei um tempo
considerável para alinha–los.

– Idiota. – resmunguei.

– Cuidado com o sabão da sua mãe. – ele alfinetou. – Ela não parece que leva tudo na
brincadeira.

– Idiota não é um palavrão. – me defendi. – É uma nomeação que se aplica perfeitamente


a você.

Ele para no meio do caminho e arqueia uma sobrancelha, colocando a mão


dramaticamente no peito, como se tivesse acabado de ser terrivelmente machucado. Ao mesmo
tempo em que faz isso, a campainha toca e ele revira os olhos, voltando a sua postura normal e se
virando, para receber Jesy e reclamar com tristeza.

– Mais uma para encher o saco.

OLIVER

Estacionar em frente ao hospital, se tornou meu pior pesadelo durante os últimos anos.
Ter em mente que sua vida estava em risco era perturbador, de tal forma que não consigo
compreender como consegui viver os últimos anos com aquela pressão martelando sem parar na
cabeça.

Você vai morrer. Era o que minha mente gritava me impossibilitando de dormir e pensar
com clareza, em quase todas as noites.

Entretanto, em especial hoje, me sinto corajoso e feliz por ter conseguindo passar por
tudo isso sem enlouquecer, pois só eu sei como foi angustiante ter meus pensamentos me
matando aos poucos.

Desço do carro assim que meu pai estaciona, sentindo o vento frio atingir meu rosto e
irritar meu nariz. Janeiro era um dos meses mais frios e secretamente, um dos meus favoritos. O
alarme acionou atrás de mim e olhei para traz, seguindo meu pai quando este começou a andar
até a faixada do grande prédio, que minha consulta estava marcada.

No dia do meu aniversário.

Queria rir ao constatar isso. Era até cômico como as coisas aconteciam.

Entretanto, sentia –me grato.

A sala dele se encontra no quarto andar, então mesmo que odiasse elevadores, não
poderia chegar lá sem ser por essa opção. Assim que entro, encosto meu corpo na parede e
seguro com força o apoio. De longe escuto o meu pai rir e bufo acabando por perceber meu
reflexo no espelho, e desvio o olhar ao saber o que veria ali.

Nunca tive baixa autoestima, mas nos últimos dias olhar para o espelho não era minha
coisa favorita. Raspei meu cabelo, porque este estava caindo. Havia perdido muito peso, de tal
forma que juntando com minha palidez e grandes círculos negros ao redor dos olhos, deixava-me
parecendo um fodido morto vivo.

E eu estava sendo gentil.

Em breve isso mudaria.

O elevador abre no andar escolhido e meu pai espera que eu passe em sua frente, para me
seguir.

– Medroso. – sussurrou e eu fingi que não ouvi, sentando –me nas cadeiras de espera
enquanto ele caminhava até a recepcionista.

Entediado, peguei meu celular e percebi que ele estava descarregado. Irritadiço, guardo o
mesmo no bolso e encaro as costas do meu pai, até que ele se vira e esbarra em um garotinho que
corre disparado.

Rio colocando minha mão sobre o local da cirurgia, mas por costume do que qualquer
coisa e meu pai me envia um olhar matador.

– Joshua. – uma loira grita agarrando o menino pelo braço e dizendo ao olhar para ele. –
Desculpe por isso, ele caiu muitas vezes quando era um bebê.

– Sem problemas, eu sei como é. – meu pai sorriu e olhou para mim. – Tenho um bebê
até hoje.

E a mulher olhou para o meu pai, balançando a cabeça e sorrindo. Encarei ambos
mostrando o quanto estava achando engraçado toda àquela situação e meu pai me ignorou,
sorrindo para mulher de forma galante. Sabendo perfeitamente do que se tratava, desviei os olhos
para outro lugar e esperei até que o médico chamasse meu nome.
Era quase uma da tarde quando sai do consultório do médico. Fiquei trancado na sala por
quase uma hora, tendo ele examinando a cicatrização da cirurgia, fazendo perguntas como eu me
sentia e explicado tudo o que ele já havia explicado antes de ir para casa.

Passou encaminhamento para outros médicos, novos exames e expressou sua felicidade
por me ver completando mais um ano de vida.

Agora, eu estava faminto e com sono, sendo tudo o que eu mais desejava era comer e
dormir até de noite, entretanto, o meu pai me informou que precisava buscar algo na nossa casa e
aproveitou que passaríamos em frente para entrar e pegar algo.

– Você me espera aqui ou vem comigo? – ele questionou encarando –me.

– Vai demorar? – perguntei.

– Acho que vou sim. – ele afirmou.

– Então eu vou aproveitar e cair na minha cama. – eu disse e ele bufou uma risada.

– Preguiçoso.

Ignorei suas palavras e sai do carro, abri a porta do meu lado e olhei com certa emoção
para minha casa.

É, como coisas simples se tornam significativas.

Um bocejo corta minha boca e começo a andar, empurrando a porta quando o meu pai
reluta em abrir. Quando faço essa simples ação, ganho em troca uma reação completamente
inesperada e fico sem saber ao certo como reagir.
– Surpresa. – gritou o pessoal.

Meu tio, primos, a família de Flora e meu irmão. Todos estavam assoprando apitos e
apertando buzinas. Meu pai me empurra e confetes são jogados em minha cabeça, caindo dois
pesos em minhas pernas. Laís e Taís, as menininhas idênticas me encaravam com os sorrisos
mais doces do mundo. Elas se penduram e quase caiu, sendo amparado pelo meu pai.

– Cuidado crianças. – meu pai pediu.

– Meninas. – e minha sogra gritou ao mesmo tempo. – O soltem!

Observei engolindo em seco, ambas se afastarem emburradas e engoli as lágrimas que


queriam descer sem parar.

– Você achou que iria ficar só naquele simples comemoração? – meu pai questionou e eu
olhei para ele. – Não precisa chorar.

E eu o abracei, com tudo de mim. Deixando as lágrimas saírem quando senti seus braços
em volta de mim, apertando-me como se não quisesse me soltar nunca mais.

– Obrigado por nunca ter me deixado. – agradeci em seu ouvido. – Acho que nunca vou
mostrar o tamanho da gratidão que sinto por tudo o que você fez por nós.

– Não precisa me mostrar. – e continuou. – Somos uma família e sempre vou está aqui
por você.

– E eu também. – disse Olavo abraçando nos dois. – Amo vocês idiotas.

Ambos me abraçaram sem querer me soltar e eu aproveitei cada segundo, sorrindo ao


escutar o berro de um dos gêmeos.

– Abraço em grupo.
E então, braços e mais braços me apertaram e eu fiquei no meio de toda aquela gente,
apreciando o sabor da gratidão que iniciou em meu paladar. Uma emoção tão grande cresceu no
peito, que eu sorria e chorava de tamanha emoção.

O abraço em conjunto durou apenas alguns segundos, mas pelo o incrível que pareça,
conseguiu afastar todo o cansaço deixando apenas a gratidão de ser tão querido por todos.

Minha família.

Pelo resto da tarde, conversei com todos e fui mimado como nunca fui antes. Tanto pelos
meus parentes, quanto pela minha futura esposa. Tive naquele dia a melhor comemoração de
aniversário que já tive antes e não tenho vergonha em dizer que chorei. Pois assim como chorei,
sorri e me diverti com todos que me amam.

E ainda ganhei o melhor presente que poderia ganhar.

O nascimento de Maitê.
Eu dedico esse livro ao meu guerreiro, Carlos. Assim que o enredo deste livro veio em
minha mente, em alguns aspectos eu só imaginava meu pai. Ele retirou um rins aos vinte e
poucos anos e quando ninguém dava nada por ele, ele sobreviveu, lutou contra todas as
dificuldades e teve uma vida honrada.

Meu pai foi meu herói e o ser humano mais perfeitamente imperfeito que eu já conheci.
Quando escrevi esse livro, nunca imaginei que eu o perderia meses depois, deixando meu
coração partido e cercado por lembranças de sua bondade e força, que sempre estarão presentes
em meu coração. Este livro é para você, papai. Obrigada por fazer tantos sacrifícios por mim.
Filhos são ingratos e me perdoe por não dizer o quanto você era importante para mim. Você era
o meu mundo e Você e mamãe estão vivos em meu coração e ficarão vivos até meu último
suspiro.

Muito obrigada por tudo!

Então, caro leitor, espero que você que leu até aqui, tenha gostado ou se identificado com
algo. Escrever sempre foi muito importante para mim e escrevi este livro com minhas melhores
intensões e de certa forma estou orgulhosa deste trabalho, mas esse orgulho eu responsabilizo
completamente aos meus leitores do Wattpad. É piegas, mas sem os comentários, votos e
incansáveis perdidos para que eu continuasse, eu nunca teria terminado este livro.

Muito obrigada!

Antes dos leitos e qualquer pessoa, agradeço a Deus, que nos últimos dias tem me
ajudando tanto e sido meu tudo. Obrigada por me permitir escrever este livro, pois sei que tudo é
sobre tua vontade e se não fosse isso, eu nunca teria iniciado este projeto.
E para aqueles que terminaram de ler nesse exato momento, agradeço por vocês me
darem essa chance e espero que tenha gostado de no nosso casal. Um forte abraço e até breve!
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Lutando Contra Paixão -Irmãos Bennett livro 2
2021

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