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A LEI 13.

245/16 E O CARÁTER INQUISITIVO DO INQUÉRITO


POLICIAL
THE 13,245/16 LAW AND INQUISITIVE CHARACTER OF POLICE INVESTIGATION

Sthephanie Gabrielle Dosso1


Fernanda Garcia Velasquez2

DOSSO, S. G.; VELASQUEZ, F. G. A lei 13.245/16 e o caráter


inquisitivo do inquérito policial. Akrópolis Umuarama, v. 26, n. 2,
p. 195-208, jul./dez. 2018.

DOI: 10.25110/akropolis.v26i2.7459

Resumo: Objetivou-se com este trabalho analisar o inquérito policial


com suas características e peculiaridades, procurando demonstrar as
principais mudanças e discussões oriundas da Lei 13.245/16. A priori, é
necessário observar os princípios constitucionais, com ênfase no con-
traditório e ampla defesa. Considerando-se que existe uma discussão
entre profissionais da área do direito, em que uns dizem que essa lei
gerou vantagens para investigados, e outros dizem ser apenas amplia-
ção do direito de acesso ao inquérito por parte dos profissionais. Após
uma análise minuciosa das ponderações do advento da Lei 13.245/16,
que ixnovou principalmente a questão do acesso ao inquérito por par-
Bacharelanda em Direito pela Universidade
1 te do advogado, o sigilo relativo ao inquérito e a nulidade dos atos
Paranaense – UNIPAR – Umuarama – PR. probatórios. Evidenciou-se que o advogado terá mais acesso ao in-
E-mail: Sthephaniegabrielle@hotmail.com quérito policial; que os advogados terão acesso apenas às provas e
discussões já anexadas no inquérito. Além disso, os questionamentos
2
Bacharel em Direito pela Faculdade de Di-
reito da Alta Paulista, Mestre em Direito Pro- ao investigado só far-se-ao após a desistência da assistência jurídica.
cessual e Cidadania/UNIPAR. Atualmente é Contudo, é necessário que essa lei seja mais estudada, para que haja
Diretora do Núcleo dos Institutos de Ciên- equilíbrio entre o acesso e o sigilo do inquérito, para não prejudicar
cias Humanas, Letras e Artes, de Ciências
o seu andamento, nem a utilidade das provas. Porém, é necessário
Sociais Aplicadas; e de Educação, e Profes-
sora Adjunta da Universidade Paranaense- assegurar aos investigados mais proteção ao princípio da não autoin-
UNIPAR – Umuarama – PR. criminação. Nota-se que o processo inquisitorial não sofrerá mudanças
E-mail: fernanda@prof.unipar.br significativas, nem deixará de ser inquisitivo, pois não existem, nestes
casos, os princípios do contraditório e de ampla defesa.
Palavras-chave: Processo Penal; Ampla Defesa; Contraditório; Inquéri-
to Policial; Sigilo do Inquérito.

Abstract: the objective of this work were to examine the police investi-
gation with its characteristics and peculiarities, seeking to demonstrate
the main changes and discussions from the 13,245/16 Law. A priori,
it is necessary to observe the constitutional principles, with emphasis
on the contradictory and ample defense. Considering that there is a
discussion among professionals in the area of Law, where some say
that this law has generated benefits to indicted ones, and others say
to be just expansion of the right of access to inquiry on the part of pro-
fessionals. After a thorough analysis of the weightings of the advent of
13,245/16 law, which innovated mainly the question of access to inquiry
by the lawyer, the secrecy regarding the investigation and the nullity
of the acts evidence, it was evidenced that the lawyer will have more
access to police investigation; that lawyers will have access only to
the evidence and arguments already attached in the investigation; the
questionings to the investigated will only happen after the withdrawal
Recebido em novembro de 2017 of legal aid. However, it is necessary that this law is more studied, so
Aceito em março de 2018
that there is balance between access and the secrecy of the investiga-
tion, not to harm its progress, or the usefulness of its evidence, but it is

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DOSSO, S. G.; VELASQUEZ, F. G.

necessary to ensure the investigated more protection bre o advento da Lei nº 13.245/16 e o direito do
to principle of non self imputation . In particular, to be advogado em acessar os autos já produzidos no
noted that the inquisitorial process will not suffer sig- inquérito, amparado anteriormente pela Súmula
nificant changes, or stop being inquisitive, because Vinculante nº 14 do STF.
do not exist in these cases, the principles of contra-
No decorrer do trabalho será evidencia-
diction and ample defense. For this study, it was used
as methodology the bibliographical research, with the
do que mesmo com caráter sigiloso do inquérito
use of specific material including documents, mono- policial é necessário manter a integridade e dig-
graphs, dissertations and books, the latter being the nidade do investigado. E além do mais, o adven-
main primary source. to da Lei nº 13.245/16 veio para salvaguardar o
Keywords: Ample Defense; Contradictory; Criminal que já estava previsto em nosso ordenamento
Proceedings; Police Investigation; Secrecy of the in- jurídico, trazendo assim ao advogado, a liberda-
vestigation. de para consultar os autos do inquérito e ter am-
plo acesso ao que já foi já documentado.
1 INTRODUÇÃO
2 O INQUÉRITO POLICIAL
O Brasil por ser um Estado Democrático
de Direito, possui o poder de ditar regras de con- 2.1 Conceito, finalidade e natureza jurídica
vivência para manter a paz e garantir a proteção do inquérito policial
dos bens jurídicos considerados imprescindí- O Inquérito Policial está presente des-
veis. Mas, embora esse poder seja inerente ao de a Idade Média como uma peça para averi-
Estado, ele não é absoluto e encontra limitações. guação. Assim, desde a Antiguidade procura-se
Por essa razão é que surge o Direito Processual averiguar a apuração dos delitos praticados no
Penal, um instrumento destinado à realização do convívio social. Nesse sentido leciona Adilson
poder punitivo do Estado, cujo desenvolvimento Mehmeri (1997, p. 04):
é regido por um conjunto de normas, preceitos
e princípios com intuito evitar a prática de atos Entre os antigos atenienses já se es-
arbitrários ou atentatórios contra às liberdades boçava uma espécie de inquérito para
e garantias individuais previstas na Constituição averiguar a probidade individual e fa-
Federal. miliar dos eleitos magistrados, sendo
Ao Estado é conferido variadas normas que dez desses eram os estínomos,
os quais trabalhavam como policiais.
que permitem que órgãos estatais investiguem
Tal investigação seria mais uma forma
e procurem encontrar ilícitos penais ou extra-
de sindicância, de cunho investigatório,
penais. Desse modo, surge o inquérito policial, sem qualquer esboço de contraditório.
o principal instrumento investigatório no campo (MEHMERI, 1997, p.04).
penal, cuja finalidade precípua é estruturar, fun-
damentar e dar justa causa a ação penal. A instauração do inquérito policial no Bra-
Ante ao exposto, o inquérito policial é sil deu-se com a edição da Lei º 261, em 03 de
instrumento investigatório, sigiloso, com carate- dezembro de 1841, que modificou o Código de
rísticas meramente informativas e administrati- Processo Criminal do Império. Essa modificação
vas, não encontrando respaldado nos princípios atribuiu aos chefes de polícias a competência
do contraditório e da ampla defesa, uma vez que para instaurar procedimentos de averiguação,
não julga nem mesmo acusa. Nesse diapasão, ou seja, surgiu como uma investigação prévia
vale ressaltar que desde a instauração do inqué- de fatos delituosos, que posteriormente, eram
rito policial, esse sempre foi alvo de discussões, registrados em um documento e remetidos ao
por se tratar de um instrumento polêmico, com Juiz de Direito, para a devida verificação da tipi-
o advento da Lei 13.245/16 tal situação não se ficação penal.
extirpou. Já com a edição da Lei nº 2.033 em 20
Portanto, o presente trabalho objetiva de setembro de 1871, o sistema de persecução
analisar o sigilo no inquérito policial frente ao di- penal foi dividido em duas fases, sendo a primei-
reito do investigado, uma vez que os princípios ra uma fase preliminar, e a segunda uma fase
constitucionais devem ser seguidos em prol de judiciária, e desde então, o inquérito passou a
sua dignidade. Por outro lado, procurar-se-á de- ser estruturado como uma fase preliminar.
monstrar no presente trabalho uma análise so- Com o surgimento do Decreto Lei nº

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4.824 em 22 de novembro de 19871, o inqué- ofensivo, quando as cumulações das penas não
rito policial passou a ter a seguinte definição no ultrapassem 02 (dois) anos, sendo de competên-
art. 42 da referida Lei: “O inquérito policial con- cia dos juizados Especiais Criminais, conforme
siste em todas as diligências necessárias para dispõe o artigo 69º da Lei 9.099/95; b) através
o descobrimento dos fatos criminosos, de suas de inquérito Policial, quando às penas somadas
circunstâncias e de seus autores e cúmplices, ultrapassarem a pena de 02 (dois) anos, sendo
devendo ser reduzido a instrumento escrito”. de competência do Juízo Comum.
Desde então, o inquérito vem servindo como um Posto isto, o Inquérito Policial compre-
meio de conter os abusos das autoridades poli- ende um conjunto de procedimentos que visam
ciais, pois estes, anteriormente, possuíam pode- investigar a existência de um crime, descobrir e
res excessivos. recolher as provas constante da materialidade e
Com a promulgação da Lei 3.689 em 03 autoria do delito.
de outubro de 1941, atual Código de Processo Reis Alexandre e Gonçalves Victor (2016,
Penal Brasileiro, o inquérito policial passou a ter p.63) entendem que o inquérito é um “procedi-
respaldo no artigo 4º, que traz como conceito mento investigatório instaurado em razão da
genérico e amplo que a “polícia judiciária será pratica de uma infração penal, composto por
exercida pelas autoridades policiais no território uma séria de diligências, que tem como objetivo
em suas respectivas circunscrições e terá por obter elementos de prova. ”
fim a apuração das infrações penais e de sua Para Fernando Capez (2016, p. 148), o
autoria”. inquérito policial compreende:
Nesse sentido, Aury Lopes Junior (2005,
p.135) ressalta que o “inquérito policial nasce da Conjunto de diligências realizadas pela
mera possibilidade de que exista um fato puní- polícia judiciária para a apuração de uma
vel. E, que, a própria autoria não necessita ser infração penal e de sua autoria, a fim de
reconhecida no início das investigações. ” Por- que o titular da ação penal possa ingres-
sar em juízo (CPP, art. 4º). Trata-se de
tanto, vale ressaltar que mesmo com a instaura-
procedimento persecutório de caráter
ção do inquérito policial, não pode o investigado administrativo instaurado pela autorida-
perder os direitos e as garantias fundamentais. de policial. Tem como destinatários ime-
Quanto à instauração do inquérito poli- diatos o Ministério Público, titular exclui​
cial, de acordo com o art. 5º, incisos I a II do da ação penal pública (CF, art. 129, I),
Código de Processo Penal, ele poderá se iniciar e o ofendido, titular da ação penal pri-
das seguintes maneiras: a) com o auto de prisão vada (CPP, art. 30); como destinatário
em flagrante, ou seja, de ofício, no momento ou mediato tem o juiz, que se utilizará dos
logo após a prática do ato delituoso; b) ou aten- elementos de informação nele constan-
dendo ao requerimento do Ministério Público, do tes, para o recebimento da peça inicial e
para a formação do seu convencimento
ofendido ou de qualquer pessoa que tenha legi-
quanto à necessidade de decretação de
timidade para representá-lo, assim, o inquérito
medidas cautelares.
terá início com a notícia do crime;
Quando à autoridade policial toma co-
Corroborando com os fatos acima narra-
nhecimento de um fato aparentemente ilícito,
dos, a primeira caraterística do inquérito policial
chama-se de notitia criminis. Essa notícia é leva-
é que a autoridade competente para sua instau-
da ao conhecimento da autoridade por meio do
ração é em regra a polícia judiciária, sendo o de-
Ministério Público, do ofendido ou de quem pos-
legado o referido agente para tal ato, ou seja,
sua legitimidade, conforme preleciona o art. 39
é evidente que o inquérito é um procedimento
do Código de Processo Penal, sendo conhecida
administrativo, tendo em vista que é um proce-
como delatio criminis, ou seja, a delatio criminis
dimento realizado por uma autoridade, em que
é a comunicação feita por quem tem legitimida-
busca apenas indícios, provas do possível delito
de como autoridade policial acerca da ocorrên-
e autoria.
cia de infração penal.
Posto isso, com relação à finalidade do
Após recebida a notitia criminis, a instau-
inquérito policial, Marta Saad (2004, p. 161) le-
ração do inquérito poderá se realizar de duas
ciona:
formas: a) através do termo circunstanciado,
quando se tratar de crimes de menor potencial O inquérito policial traz elementos que

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não apenas informam, mas de fato ins- delito, sendo posteriormente direcionado a auto-
truem, convencem, tais como as decla- ridade competente, possuidora de legitimidade
rações de vítimas, os depoimentos de para possível ingresso da ação penal
testemunhas, as declarações dos acu-
sados, a acareação, o reconhecimento,
2.2 A condição do investigado como sujeito
o conteúdo de determinados documen-
tos juntados aos autos, as perícias em
de garantias
geral, a identificação datiloscópica, o es- Para se falar em garantias fundamentais,
tudo da vida pregressa, a reconstituição tem que se falar em direitos fundamentais, pois
do crime. um existe em virtude do outro. Nesse contexto,
antigamente, os direitos fundamentais eram en-
Assim, o inquérito policial serve para tendidos como os direitos do homem livre e iso-
averiguar os fatos descritos na notícia-crime, lado, direitos que estes homens possuíam em
para posteriormente, ser encaminhado ao titular face do Estado, constituindo os direitos da liber-
da ação penal. Entretanto, vale ressaltar que o dade da pessoa diante do Estado burguês. Essa
Inquérito Policial tem como segunda caracterís- concepção, correspondia aos chamados direitos
tica a sua dispensa, ou seja, não é requisito in- fundamentais de primeira geração, tendo como
dispensável para o oferecimento da denúncia ou princípios a liberdade, fraternidade e igualdade.
da queixa, pois desde que o titular da ação penal Segundo Bonavides (1997, p. 517-525),
tenha em mãos os elementos imprescindíveis o posteriormente surgiram os direitos de segunda
seu oferecimento e informações necessárias, o geração, que eram os direitos culturais, sociais
inquérito passa a ser absolutamente dispensá- e econômicos, bem como os direitos coletivos. E
vel. mais tardiamente surgiram os direitos e garan-
Tendo em vista o caráter informativo, o tias da terceira geração, relativos aos direitos de
inquérito policial tem como sua terceira carate- desenvolvimento, meio ambiente, patrimônio da
rística o caráter inquisitivo, ou seja, tem como humanidade, bem como à paz e à comunicação.
procedimento as atividades persecutórias con- Isto posto, é evidente que desde a Antiguidade
centradas nas mãos de uma única autoridade, os investigados sempre foram sujeitos de direi-
a qual, prescinde, para a sua atuação, podendo tos e garantias perante o Estado, tendo em vista
e devendo agir de ofício, com discricionariedade a sua hipossuficiência, uma vez que o Estado
e realizando as atividades necessárias para os é sempre mais forte, o investigado merece um
esclarecimentos do crime e da sua autoria. tratamento justo e com equidade.
Nesse sentido, conforme menciona o ar- Vale ressaltar, que em pleno século XXI
tigo 20º do Código de Processo Penal: “A autori- tal situação não se extirpou, ao contrário, salva-
dade assegurará no inquérito o sigilo necessário guardou maiores garantias fundamentais para
à elucidação do fato ou exigido pelo interesse da os investigados, haja vista que os investigados
sociedade”. Resta claro que, por meio da leitura atualmente possuem direitos fundamentais mais
do dispositivo, a sua quarta caraterística é evi- abrangentes.
tar a publicidade das provas colhidas ou aque- Tais direitos estão previstos em nossa
las que a autoridade pretende obter prejudique Carta Magna, em seu artigo 5º e seus respecti-
a apuração do ilícito. Entretanto, tal norma não vos incisos. Desse modo, o Estado em nome da
pode ser interpretada de forma restritiva. democracia, deve além de limitar os direitos indi-
Finalmente, conforme menciona o artigo viduais, respeitar tais direitos para assim manter
9º do Código de Processo Penal, a sua última o equilíbrio entre o direito isolado de um cidadão
característica é o inquérito tem que ser escrito, e o direito à segurança da sociedade, ou seja,
ou seja, todas a peças do inquérito policial serão o Estado exerce um papel de garantias e limi-
num só processamento e reduzidas a escrito ou tações.
datilografadas e, neste caso rubricadas pela au- Para assegurar os direitos individuais,
toridade competente da lavratura do respectivo é fundamental e básico as limitações impostas
inquérito. ao poder Estatal, como por exemplo, os proce-
Percebe-se, assim, que o inquérito é um dimentos exigidos para a instauração do inqué-
procedimento administrativo, com caráter inqui- rito policial, além do mais, os direitos e garantias
sitivo, dirigido por uma autoridade, normalmente individuais tem por origem combater os abusos
policial, que busca indícios e materialidade do pelo Estado, no qual se revela ao garantir assis-

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tência de advogado em um inquérito policial. pela proibição da pena de morte e da


Tecnicamente, são direitos fundamentais tortura, e assim sucessivamente. (NUC-
os que estiverem previstos como tais na Cons- CI, 2016, p.66)
tituição Federal. Vale ressaltar que, o fato de
algum direito fundamental não ter constado na Entretanto, como aponta Vicente Greco
Constituição Federal, não exclui a possibilidade Filho (1989, p. 40) “é bem difícil distinguir um di-
da ordem jurídica reconhecê-la. reito e uma garantia.”
Nesse diapasão, note-se o constante no Como por exemplo, o direito à liberdade
art. 5.º, § 2.º, da Constituição Federal do Brasil: física é fundamental e para amparar tal direito,
“Os direitos e garantias expressos nesta Cons- surge a garantia de que ninguém será levado
tituição não excluem outros decorrentes do re- ao cárcere sem o devido processo legal. E até
gime e dos princípios por ela adotados, ou dos mesmo para dar-se um regular processo consti-
tratados internacionais em que a República Fe- tucional, surge a garantia da ampla defesa, que,
derativa do Brasil seja parte”. por sua vez, é garantida pelo contraditório, essa
Quanto aos direitos fundamentais e ga- garantia de ampla defesa também é garantida
rantias, esclarece Jorge Miranda (1988): pelo direito à prova e pela não admissão, no pro-
cesso, das provas ilícitas.
Os direitos representam só por si certos Em outro sentido, o ser humano tem di-
bens, as garantias destinam se a asse- reito a produzir, no processo criminal, quando
gurar a fruição desses bens; os direitos acusado pelo Estado, uma ampla defesa e, para
são principais, as garantias são aces- assegurar tal direito, surge a garantia instrumen-
sórias. Os direitos permitem a realiza- tal do habeas corpus, como remédio constitucio-
ção das pessoas e inserem-se direta e
nal, consagrado em nossa Carta Magna. Seguin-
imediatamente nas respectivas esferas
do essa linha de raciocínio, Canotilho (1995, p.
jurídicas, já as garantias só nelas se pro-
jetam pelo nexo que possuem com os 520) afirma: “rigorosamente, as clássicas garan-
direitos; na acepção jurídica, os direitos tias são também direitos, embora muitas vezes
declaram, as garantias estabelecem. se salientasse nelas o caráter instrumental de
(MIRANDA, 1988, p.89) proteção dos direitos. As garantias traduziam-se
quer no direito dos cidadãos a exigir dos pode-
Ainda nesse sentido, Rui Barbosa (1934, res públicos a proteção dos seus direitos”.
p.356) leciona que os direitos individuais são as- Corroborando com os conceitos apre-
pectos ou manifestações da personalidade hu- sentados, fica explícito que todos os indivíduos
mana em sua existência subjetiva ou em relação possuem direitos fundamentais, bem como são
à sociedade, enquanto garantias são as soleni- salvaguardadas as devidas garantias. Portanto,
dades que tutelam alguns desses direitos contra todos os direitos fundamentais devem ser rigoro-
os abusos do poder. samente observados pelo Estado que se preten-
Pode-se dizer então que os direitos as- da democrático e de Direito.
sentam na pessoa, independentemente do Es- Nesse diapasão, se um acusado deve
tado, ou seja, são formas de agir, enquanto as possuir todos direitos e garantias fundamentais
garantias reportam-se ao Estado em relação aos salvaguardados num processo criminal, o indi-
atos praticados pelo indivíduo. víduo que está sendo investigado em virtude de
Portanto, os direitos fundamentais são, um possível ato infracional também deve possuir
na prática, garantias fundamentais de outros di- garantias específicas. Um exemplo, o acesso do
reitos fundamentais. advogado na investigação preliminar, o direito
Para Guilherme de Souza Nucci (2016): do investigado de estar acompanhado por seu
advogado, garantias estas que servem para evi-
São direitos individuais – porque ine- tar que ocorra abusos de poderes por parte do
rentes à pessoa humana – o direito à Estado e coerção Estatal frente ao investigado.
liberdade de locomoção, garantido pelo
devido processo legal e seus corolários; 2.3 A dignidade da pessoa humana do inves-
o direito à livre manifestação do pensa- tigado
mento e o direito à honra, garantidos
A dignidade da pessoa humana é uma
pelo direito de resposta; os direitos à
qualidade inerente ao indivíduo decorrente da
vida e à integridade física, garantidos

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própria condição de ser humano. Constitui um humana é um princípio constituído por lei que
valor universal e está acima de qualquer diversi- garante e exige que todo cidadão brasileiro es-
dade sócio-cultural, não importando as diferen- teja assegurado dos seus direitos sociais e indi-
ças físicas, psicológicas, intelectuais ou mesmo viduais.
econômicas para que um indivíduo seja detentor A propósito devem ser registradas as
de igual dignidade. considerações de Carvalho, 2007, P. 549):
O princípio da dignidade da pessoa hu-
mana vem sendo assegurado desde a Declara- A dignidade da pessoa humana é o fun-
ção dos Direitos do Homem e do Cidadão, pro- damento de todo o sistema dos direitos
clamada pela Organização das Nações Unidas fundamentais, no sentido de que estes
de 1948. Com a promulgação da Constituição constituem exigências, concretizações
e desdobramentos da dignidade da
Federal, em 05 de outubro de 1988, o Brasil pas-
pessoa e que com base nesta é que
sou a salvaguardar garantias ao acusado, tais devem aqueles ser interpretados.
como os direitos sociais e individuais, o desen-
volvimento, a igualdade, o bem-estar e a justi- Portanto, os direitos fundamentais são
ça social. Desse modo, a dignidade da pessoa os direitos do homem escritos nos textos cons-
humana consagrou-se como princípio máximo, titucionais, que conotam um direito positivado e
além de ser fundamento da República introduzi- constitucionalizado, pois além de fazerem par-
do no art. 1º, III da Carta Magna: te da própria essência humana, são erigidos ao
plano internacional.
Art. 1º - A República Federativa do Bra-
Nesse sentido, afigura-se digna de re-
sil, formada pela união indissolúvel dos
Estados, dos Municípios e do Distrito gistro a manifestação de Ingo Wolfgang Sar-
Federal, constitui-se em Estado Demo- let (2008, p. 88 - 89) ao dizer que “A dignida-
crático de Direito e tem como fundamen- de da pessoa humana exige o reconhecimento
to: e proteção dos direitos fundamentais de todas
III – a dignidade da pessoa humana; as dimensões, e se não reconheçam à pessoa
humana e os direitos que lhes são inerentes,
Nesse sentido, a dignidade da pessoa estar-se-á negando-lhe a própria dignidade”.
humana é para o Direito Processo Penal um Nos dizeres de Fernando Capez (2017,
alicerce, uma vez que todos os princípios do p.18): “a dignidade da pessoa humana é o valor
Processo Penal estão legitimados ao princípio à vida humana, como pedra angular do ordena-
do regime adotado por toda a nação, ou seja, a mento jurídico, que deve nortear a atuação do
dignidade da pessoa humana. interprete e aplicador do Direito, qualquer que
O princípio, por si só, busca resguardar seja o ramo da ciência que se deva possibilitar a
a integridade do indivíduo como pessoa e é no concretização desse ideal no processo judicial”.
Processo Penal que essa proteção se concreti- Além do mais, para o Doutrinador Gui-
za. Atualmente o Estado não vem atendendo a lherme de Souza Nucci (2016, p. 76) “a dignida-
condição de ser humano ao acusado, mas vem de da pessoa humana é base sobre a qual todos
tratando-o como verdadeiro objeto do processo, os direitos e garantias individuais são erguidos e
em virtude da busca da verdade real, a pessoa sustentados. Ademais, inexistiria razão de ser a
humana se torna um objeto com prisões preven- tantos preceitos fundamentais não fosse o nítido
tivas, que visam muito mais uma antecipação de suporte prestado à dignidade humana”.
pena do que a análise do caso concreto. Ainda nos dizeres de Guilherme de Sou-
Ante o exposto, tendo em vista que a za Nucci (2016, p. 76):
dignidade da pessoa humana é o valor básico
de todos os outros direitos humanos, é impres- O Processo Penal constitui o amálgama
cindível que os direitos existenciais da dignidade do Direito Penal, pois permite a aplica-
não sejam quebrados. Não há que se falar em ção justa das normas sancionadoras.
A regulação dos conflitos sociais, por
mais ou menos dignidade, ou seja, o indivíduo
mais graves e incômodos, depende do
acusado, investigado, indiciado não perde a sua respeito aos vários direitos e garantias
dignidade, por pior que seja a sua conduta. essenciais à formação do cenário ideal
Conforme já dito, a dignidade da pessoa para a punição equilibrada e consen-

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A lei 13.245/16 e o caráter...

tânea com os pressupostos do Estado sentar procuração para o efetivo direito mencio-
Democrático de Direito, valorizando-se, nado no inciso XVI, ou, quando houver riscos e
acima de tudo, a dignidade humana. comprometimento da eficiência e eficácia das
diligências, tendo em vista, respectivamente, os
Percebe-se que, o princípio da dignidade textos acrescidos nos §10 e §11, em virtude da
da pessoa humana atinge todos, sem distinção, alteração do inciso XVI do Estatuto da OAB.
conferindo-os um complexo conjunto de direitos Além de incluir os parágrafos já mencio-
e deveres que garantem a proteção de todo e nados, verificou-se também o advento do §12,
qualquer ato contra a vida, além de salvaguardar que trouxe como redação a possibilidade de res-
a integridade física e psíquica. ponsabilização criminal e funcional do agente
que negar-se a fornecer os documentos já ane-
3 A LEI 13.245/16 E SUAS MUDANÇAS xados e concluídos no inquérito.
Nesse diapasão, o legislador acrescen-
Em 12 de janeiro de 2016, foi publicado tou também o inciso XXI, que além de trazer a
no Diário Oficial da União a promulgação da Lei presença do advogado no interrogatório do atua-
13.245/16, legislação está que além de alterar o do, ou seja, trazer a possibilidade do autuado es-
artigo 7, XVI da Lei 8.906/14 (Estatuto da Ordem tar acompanhado de advogado no momento de
dos Advogados do Brasil), acrescentou o inciso seu depoimento, trouxe também a possibilidade
XXI e os parágrafos §10, §11 e §12 da supraci- de nulidades dos atos caso seja desrespeitado
tada lei. Mas, o advento da lei não inovou drasti- os direitos assegurados pela legislação. Assim,
camente, apenas salvaguardou o que já estava as respectivas alterações trouxeram a garantia
previsto em nossas legislações, especialmente da não produção de provas ilícitas, aplicando-
no artigo 5, LXIII da Constituição Federal: -se por consequência a teoria da prova ilícita da
derivação, teoria esta que consagra como nula
Art. 5º Todos são iguais perante a lei,
as provas que forem produzidas diante uma ile-
sem distinção de qualquer natureza,
garantindo-se aos brasileiros e aos es-
galidade e todos os atos que dela se originarem.
trangeiros residentes no País a inviola- Ante o exposto, a maior divergência e
bilidade do direito à vida, à liberdade, à discussão gerada pelo advento da Lei foi em
igualdade, à segurança e à propriedade, virtude do inciso XXI do Estatuto da Ordem dos
nos termos seguintes: Advogados do Brasil, que passou a prever tal
LXIII - o preso será informado de seus nulidade dos atos probatórios se decorressem
direitos, entre os quais o de permanecer em virtude de uma ilegalidade. Mas, vale ressal-
calado, sendo-lhe assegurada a assis- tar, que as nulidades das provas produzidas no
tência da família e de advogado. inquérito só poderão ser anuladas quando trou-
xerem prejuízos para o investigado e quando
Ante ao exposto, a lei trouxe apenas a
efetivamente esse prejuízo for comprovado.
ressalva da efetiva atuação do advogado nos
Nesse sentido, pode-se dizer que essa
procedimentos investigatórios, seja da esfera
garantia trazida pela Lei foi para salvaguardar
penal, administrativa e até mesmo as investiga-
o direito do defensor, no interesse do represen-
ções realizadas pelo Ministério Público.
tado, o acesso amplo aos elementos de prova
O objetivo principal do legislador ao pro-
que já estão documentados em procedimento
mulgar a lei foi o de garantir ao cidadão, de for-
investigatório, além de garantir ao investigado o
ma ampla, princípios fundamentais e a ordem ju-
mínimo de dignidade e garantias fundamentais,
rídica, evitando consequentemente, o abuso de
onde serão demonstrados e comprovados, deta-
poder por parte das autoridades competentes.
lhadamente, em tópicos específicos.
Com a alteração no inciso XVI, o dispo-
sitivo além continuar garantindo aos defensores
3.1 A garantia da participação da defesa
o direito de acesso ao inquérito policial. Esses
Antes da edição da Lei 8.906/94 (Estatu-
passaram a acompanhar todos os procedimen-
to da OAB) trazida pela Lei 13.245/16, já havia
tos investigatórios realizados por qualquer ór-
divergências no tocante à participação do advo-
gão competente. Entretanto, o acesso continua
gado durante os interrogatórios policiais, pois na
restrito quando se tratar de procedimentos sigi-
prática, alguns Delegados não permitiam sequer
losos, momento que o advogado deverá apre-
a presença do advogado, pelo fato de ter con-

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DOSSO, S. G.; VELASQUEZ, F. G.

trovérsias sobre a existência de dispositivo legal Ainda nos dizeres de Renato Brasileiro
que desse amparo a tal pretensão. (2016, p. 135):
Entretanto, conforme já mencionado no
tópico antecedente, mesmo com o advento da Se a força normativa do referido preceito
Lei 13.245/16, que acrescentou o inciso XXI no constitucional jamais foi suficiente para
artigo 7º da Lei. 8.906/94 – Estatuto da Ordem tornar cogente a presença de advogado
dos Advogados do Brasil, que trouxe a facultada por ocasião da realização de interroga-
tórios policiais, é no mínimo estranho
presença do advogado no inquérito policial, não
que a simples reprodução desse mes-
extinguiu a discussão. Posto isso, o inciso XXI mo preceito em uma lei ordinária teria o
tem a seguinte redação: condão de passar a exigir sua presen-
ça. De mais a mais, fosse necessária a
Art. 7º São direitos do advogado: (...) presença de advogado no interrogatório
XXI - assistir a seus clientes investiga- policial, referida mudança legislativa de-
dos durante a apuração de infrações, veria ter sido introduzida no âmbito do
sob pena de nulidade absoluta do res- Código de Processo Penal, diploma nor-
pectivo interrogatório ou depoimento mativo que regulamenta o interrogatório
e, subsequentemente, de todos os ele- policial, e não no Estatuto da Ordem dos
mentos investigatórios e probatórios Advogados do Brasil.
dele decorrentes ou derivados, direta
ou indiretamente, podendo, inclusive, no
Mas, e se o advogado está presente no
curso da respectiva apuração:
a) apresentar razões e quesitos; momento do interrogatório policial? Este terá
b) (VETADO). o seu direito negado? Nesse sentido Brasilei-
ro (2016, p. 135), ensina que: “Se o advogado
Tendo em vista a introdução o referido in- estiver presente no interrogatório policial não se
ciso, o advogado passou a ter o direito de estar pode negar o direito de assistir a seu cliente, sob
presente e, inclusive, de fazer perguntas, rece- pena de evidente violação à garantia fundamen-
bendo então, amparo expresso e legal. Mas, e tal do art. 5º, LXIII, da CF.”
como seria essa presença? Ela passaria a ser Nesse caso, vale-se dizer, que presente
obrigatória a fim de garantir ao investigado maior o advogado, e negado o seu direito de assistir a
amplitude de suas garantias fundamentais? O seu cliente investigado, restará caracterizada a
inquérito passaria a ter um caráter acusatório? ilegalidade do interrogatório policial e, por con-
Nesse sentido, vale transcrever o posi- sequência, de todos os elementos informativos
cionamento do doutrinador Renato Brasileiro e probatórios dele derivados, direta ou indireta-
(2016, p. 134-135): mente, conforme a teoria dos frutos da árvore
envenenada – CPP, art. 157, §1º, objeto de es-
As mudanças legislativas produzidas tudo deste trabalho.
pela Lei n. 13.245/16 não têm o condão Ademais, se o próprio Supremo Tribunal
de afastar a natureza inquisitorial das in- Federal entende conforme súmula vinculante nº
vestigações preliminares, nem tampou- 5, que “a falta de defesa técnica por advogado no
co de tornar obrigatória a presença de processo administrativo disciplinar não ofende a
advogado durante o interrogatório poli- Constituição”, é no mínimo contraditório concluir
cial. Na verdade, preservada esta natu- que, a partir da vigência da Lei nº 13.245/16, o
reza, o que houve foi a outorga de um interrogatório policial seja considerado válido tão
viés mais garantista à investigação pre-
somente quando o investigado estiver assistido
liminar, buscando-se garantir os direitos
por profissional da advocacia.
fundamentais do investigado.
Em outras palavras, se não há necessi-
dade de um defensor no curso de um processo
Posto isso, a Lei nº 13.245/16 não intro-
administrativo disciplinar, de qual pode resulta
duziu nenhuma novidade no ordenamento jurídi-
a aplicação de sanções relativamente severas,
co pátrio, na verdade, simplesmente positivou o
tais como suspensão, exoneração, perda de fun-
que a Constituição Federal sempre assegurou,
ção, é de se estranhar a obrigatoriedade de de-
ou seja, a assistência de advogado ao preso
fensor durante a realização de um interrogatório
(CF, art. 5º, LXIII), conforme já mencionado o tó-
policial, do qual jamais será possível a aplicação
pico anterior.

202 Akrópolis, Umuarama, v. 26, n. 2, p. 195-208, jul./dez. 2018 ISSN 1982-1093


A lei 13.245/16 e o caráter...

imediata de uma sanção. A inserção do inciso deve assegurar sua manifestação efetiva e real,
XXI no art. 7º da Lei nº 8.906/94, não fez com pois, o equilíbrio entre a acusação e defesa, que
que a investigação preliminar perdesse a sua devem estar munidas de forças similares. Por-
natureza inquisitiva, ou melhor, na verdade, ga- tanto, o contraditório somente pode ser eficaz
nhou um viés garantista, ou seja, respaldado de se os ambas as partes possuírem os mesmos
dignidade e garantias fundamentais. poderes.
Nesse diapasão, Ada Pelegrine Grinover
3.2 O contraditório (1992, p.63) nos ensina que a “defesa e con-
Na concepção originária do princípio do traditório estão indissoluvelmente ligados, pois
contraditório, entendia-se que, bastasse a infor- é do contraditório que nasce o exercício da de-
mação conferida para o acusado e a sua possí- fesa”. A defesa, assim, garante o contraditório,
vel reação para que se efetivasse a aplicação mas também por este se manifesta e é garan-
do contraditório. No entanto, com as alterações tida. Isto posto, o Princípio encontra-se respal-
legislativas e com a concepção do princípio da dado na Constituição Federal, em seu artigo 5º,
isonomia, bem como com a superação da mera inciso LV, informando que “aos litigantes, em
igualdade formal e a busca de uma igualdade processo judicial ou administrativo, e aos acu-
substancial, produziu a necessidade de se igua- sados em geral são assegurados o contraditório
lar os desiguais, repercutindo assim no âmbito e ampla defesa, com os meios e recursos a ela
do princípio do contraditório. inerentes. ”
Desde então, o contraditório, deixou de Em um conceito genérico, o Princípio do
ser visto como uma mera possibilidade de parti- Contraditório é como a garantia de participação
cipação, para se transformar em uma realidade. no processo como meio de permitir a contribui-
Atualmente, há de se assegurar uma real ção das partes para a formação do convenci-
e igualitária participação dos sujeitos processu- mento do juiz, ou seja, é garantir o direito à in-
ais ao longo de todo o processo, assegurando formação de qualquer fato ou alegação contrária
a efetividade e plenitude do contraditório, tendo ao interesse das partes e o direito à reação a
como denominação contraditório efetivo e equi- ambos, vistos, assim, como garantia de partici-
librado. pação.
No entendimento de Gustavo Henrique Joaquim Canuto Mendes de Almeida
Righi Ivahy Badaró (2008, p. 1-36) houve, as- (1973, p. 82), compreende o Princípio do Con-
sim, uma dupla mudança, subjetiva e objetiva. traditório como a “ciência bilateral dos atos ou
Segundo o autor, quanto ao seu objeto, deixou termos do processo e a possibilidade de contra-
de ser o contraditório uma mera possibilidade de riá-los. ” De acordo com o autor, o núcleo fun-
participação de desiguais, passando a se esti- damental do contraditório estaria ligado “à dis-
mular a participação dos sujeitos em igualdade cussão dialética dos fatos da causa, devendo se
de condições. Subjetivamente, porque a missão assegurar a ambas as partes, e não somente à
de igualar os desiguais é atribuída ao juiz e, as- defesa, a oportunidade de fiscalização recíproca
sim, o contraditório não só permite a atuação das dos atos praticados no curso do processo. ”
partes, como impõe a participação do julgador. Isto posto, para ter o devido processo le-
Portanto, é evidente que em um primei- gal, tem que estar presente o contraditório, haja
ro momento, o contraditório limitava-se ao di- vista que é um requisito de validade do proces-
reito à informação e à possibilidade de reação, so, na medida em que a sua não observância é
e posteriormente, o contraditório passou a ser passível até de nulidade absoluta, quando em
analisado também no sentido de se assegurar prejuízo do acusado.
o respeito à paridade de tratamento, haja vista Nesse diapasão, os elementos do con-
que de nada adianta se assegurar à parte a pos- traditório são: 1) direito à informação; 2) direito
sibilidade formal de se pronunciar sobre os atos de participação. Portanto, o contraditório seria,
da parte contrária; se não lhe são outorgados os assim, a necessária informação às partes e a
meios para que tenha condições efetivas e reais possível reação a atos desfavoráveis, não po-
de contrariá-los. dendo cogitar da existência de um processo pe-
O princípio do Contraditório é a possibi- nal eficaz e justo sem que a parte adversa seja
lidade da parte contrária se manifestar em des- cientificada da existência da demanda ou dos
favor de uma acusação imputada. Tal princípio argumentos da parte contrária.

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DOSSO, S. G.; VELASQUEZ, F. G.

Daí que surge os meios de comunicação a observância do contraditório e devido proces-


dos atos processuais: citação, intimação e notifi- so legal. Portanto, junto ao princípio da ampla
cação. E ainda que o acusado não tenha interes- defesa, institui-se como a pedra fundamental de
se em oferecer reação à pretensão acusatória, o todo processo e, particularmente, do processo
próprio ordenamento jurídico impõe a obrigato- penal.
riedade de assistência técnica de um defensor,
conforme dispõe o próprio o artigo 261 do Có- 3.3 A ampla defesa
digo de Processo Penal que nenhum acusado, Consagrada também no art. 5.º, LV da
ainda que ausente ou foragido, será processado Constituição Federal, a ampla defesa traduz o
ou julgado sem defensor. dever que assiste ao Estado de facultar ao acu-
Entretanto, vale ressaltar, que prevalece sado toda a defesa possível quanto à imputação
tanto na doutrina, quanto na jurisprudência o en- que lhe foi realizada.
tendimento de que a observância do contraditó- A ampla defesa sob a ótica que privilegia
rio só é obrigatória, no processo penal, ou seja, o interesse do acusado, é vista como um direi-
na fase processual, e não na fase investigatória, to, todavia, se for analisar com enfoque ao inte-
no inquérito policial, pois este é apenas um pro- resse geral de um processo justo, é vista como
cedimento meramente informativo, tendo como garantia.
natureza administrativa. Portanto, entende-se que a ampla defe-
Seguindo a linha de raciocínio, não há sa é uma garantia conferida ao acusado por ser
contraditório no inquérito policial, porque con- considerado hipossuficiente, uma vez que o Es-
forme já mencionado o disposto no art. 5º, LV tado possui órgãos constituídos e preparados,
da Carta Magna, a observância do contraditório além de valerem-se de informações e dados de
ocorre apenas em processo judicial ou adminis- todas as fontes as quais têm acesso, conforme
trativo. Logo, considerando-se que o inquérito já dito anteriormente neste artigo.
policial é tido como um procedimento adminis- Nesse contexto, Renato Brasileiro (2016,
trativo, destinado à colheita de elementos de in- p. 129) entende que:
formação quanto à existência do crime e quanto
à autoria ou participação, não há falar em ob- Com a ampla defesa há o tratamento
servância do contraditório na fase preliminar de mais justo e gera inúmeros direitos ex-
investigações, dado que o Inquérito Policial não clusivos do réu, como é o caso de ajui-
é um processo, mas um procedimento. zamento de revisão criminal, bem como
a oportunidade de ser verificada a efici-
Nesse sentido, conforme o artigo 155,
ência da defesa pelo magistrado, que
caput do Código de Processo Penal: “O juiz pode desconstituir o advogado escolhi-
formará sua convicção pela livre apreciação da do pelo réu, fazendo-o eleger outro ou
prova produzida em contraditório judicial, não nomeando-lhe um dativo, entre outros.
podendo fundamentar sua decisão exclusiva-
mente nos elementos informativos colhidos na E, para Fernando Capez (2016, p. 89),
investigação, ressalvadas as provas cautelares, “em virtude da ampla defesa, admite-se que o
não repetíveis e antecipadas”. Ou seja, a leitura acusado seja formalmente tratado de maneira
do artigo é clara e objetiva ao dizer que o juiz desigual em relação à acusação, delineando o
não poderá se fundamentar apenas nos elemen- viés material do princípio da igualdade”. O Dou-
tos informativos colhidos durante a investigação trinário afirmar ainda, que o investigado tem
preliminar; durante o inquérito policial. como defesa “a existência de recursos privativos
Além do mais, a palavra prova só pode da defesa, a proibição da reformatio in pejus, a
ser usada para se referir aos elementos de con- regra do in dubio pro reo, a previsão de revisão
vicção produzidos, em regra, no curso do pro- criminal, privilégios estes que são reunidos no
cesso judicial, e, por consequência, com a ne- princípio do favor réu”. Portanto, é evidente que
cessária participação das partes, sob enfoque ao acusado são outorgados diversos privilégios
aos princípios do contraditório e da ampla defe- em detrimento da acusação.
sa. Assim, a prova há de ser produzida não só No momento que a Constituição Federal
com a participação do acusador e do acusado, assegura aos litigantes, em processo judicial ou
como também mediante a direta e constante su- administrativo a ampla defesa, ocorre a abran-
pervisão do órgão julgador. Respeitando assim, gência de proteções, como por exemplo a direito

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A lei 13.245/16 e o caráter...

à defesa técnica, direcionada ao procedimento de comunicar um determinado ato pro-


processual e à autodefesa, interligada na defesa cessual ao acusador, ou impedir-lhe a
material do delito. reação à determinada prova ou alega-
Ante o exposto, segundo os posiciona- ção da defesa, embora não represente
violação do direito de defesa, certamen-
mentos doutrinários, também é possível subdivi-
te violará o princípio do contraditório. O
dir a ampla defesa sob dois aspectos, o positivo contraditório manifesta-se em relação a
que se realiza na efetiva utilização dos instru- ambas as partes, já a defesa diz respei-
mentos, dos meios e modos de produção, em to apenas ao réu.
que há o esclarecimento ou confrontação de
elementos de prova quanto à materialidade da Note-se que, a ampla defesa se refere à
infração criminal e a autoria. Além do negativo, garantia que é concedida ao réu de se valer de
que consiste na não produção de elementos pro- amplos e extensos métodos para se defender da
batórios de elevado risco ou potencialidade da- imputação feita pela acusação, já o contraditó-
nosa à defesa do réu. rio existe em virtude da existência das ambas as
Por fim, a ampla defesa guarda intrínse- partes do processo.
ca relação com o direito ao contraditório, além de
também não ter sua aplicação direta no inquérito 3.4 A alteração do artigo 7º, XIV do estatuto da
policial. No que tange a ampla defesa, ela garan- Ordem dos Advogados do Brasil
te o contraditório e por ele se manifesta. Ambos
se confundem em razão de que o exercício da Como já dito anteriormente, em tópico
ampla defesa, só é possível em virtude de um específico, o advento da Lei 13.245/16 alterou o
dos elementos que compõem o contraditório, artigo 7, XIV do Estatuto da Ordem dos Advoga-
o qual é o direito à informação. Além disso, a dos do Brasil (Lei nº. 8.906/94), salvaguardando
ampla defesa se exprime por intermédio do se- o que já estava previsto em nosso ordenamen-
gundo elemento pertencente ao contraditório, a to jurídico. Com a supracitada alteração houve
reação. apenas a abrangência na possibilidade de o de-
Nesse sentido, Ada Pelegrine Grinover fensor em poder examinar os documentos colhi-
(1992), defende que a ampla defesa é sequela das durante a tramitação do inquérito.
do contraditório: Isto posto, far-se-ia necessário a trans-
crição do inciso XIV antes da Lei 13.245/16, cujo
Se por intermédio do contraditório se re-
se encontra previsto no artigo 7º do Estatuto da
conhece a absoluta igualdade entre as
OAB:
partes, por meio da ampla defesa que
tal igualdade ganhará corpo, tornando-
-se efetiva e palpável. A ampla defesa Art. 7º São direitos do advogado: (...)
consiste, portanto, na possibilidade do XIV - examinar em qualquer repartição
réu em contraditar por completo a acu- policial, mesmo sem procuração, autos
de flagrante e de inquérito, findos ou em
sação. (GRINOVER, 1992, p.63)
andamento, ainda que conclusos à au-
toridade, podendo copiar peças e tomar
Desse modo, tendo em vista a relação apontamentos; (grifo meu)
direta entre os princípios, vale demonstrar o
entendimento doutrinário de Gustavo Henrique E, após a promulgação da Lei 13.245/16,
Badaró (2009, p. 37), em que o autor leciona a o art. 7º, inciso XIV do Estatuto da OAB, passou
principal distinção entre a ampla defesa e con- ter a seguinte redação:
traditório:
Art. 7º São direitos do advogado: (...)
É evidente quando é possível violar-se o XIV - examinar, em qualquer instituição
contraditório, sem que se lesione o direi- responsável por conduzir investigação,
to de defesa. Não se pode esquecer que mesmo sem procuração, autos de fla-
o princípio do contraditório não diz res- grante e de investigações de qualquer
peito apenas à defesa ou aos direitos do natureza, findos ou em andamento, ain-
réu. O princípio deve aplicar-se em rela- da que conclusos à autoridade, podendo
ção a ambas as partes, além de também copiar peças e tomar apontamentos, em
ser observado pelo próprio juiz. Deixar
meio físico ou digital; (grifo meu)

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DOSSO, S. G.; VELASQUEZ, F. G.

mentos, tanto em meio físico como digital, sendo


Tal alteração foi necessária, pois o legis- assegurado a discricionariedade em poder tirar
lador levou em conta que na época em que o Es- fotos dos autos ou realizar qualquer outro meio
tatuto da OAB foi promulgado, em 04 de julho de físico ou digital.
1994, somente a autoridade policial conduzia as Além da alteração do artigo 7º, inciso
investigações para apuração da materialidade e XVI, ocorreu a promulgação de novos parágra-
autoria do delito. Porém, atualmente a situação fos, como já dito no decorrer deste artigo. Posto
se alterou, pois, diversos órgãos começaram a isso, o advento do §10 no artigo 7º do Estatuto
realizar tais investigações. Pode-se citar como da OAB, trouxe como informação de que “Nos
rol exemplificativo, o Ministério Público, as Co- autos sujeitos a sigilo, deve o advogado apre-
missões Parlamentares de Inquérito, a Comis- sentar procuração para o exercício dos direitos
são de Valores Mobiliários (CVM), entre outros. de que trata o inciso XIV”. Desse modo, é evi-
Dessa forma, o texto anterior contido dente que a leitura do parágrafo é autoexplica-
no inciso XIV mostrava-se desatualizado, pois tiva, uma vez que, por via de regra, o advogado
falava-se tão somente em “repartição policial” não precisa de procuração para ter acesso aos
e não em “instituição responsável”, mas com a autos de investigação. No entanto, caso os au-
mudança do inciso, os advogados passaram a tos que estejam sujeitos a sigilo, será necessária
ter o direito expresso, podendo esses examinar a procuração.
os autos dos procedimentos de investigação de Outra novidade trazida pela Lei é a vinda
qualquer natureza e em qualquer instituição. do § 11 no artigo 7º do Estatuto da OAB:
Ademais, o direito ao acesso as inves-
tigações já concluídas existia antes mesmo da § 11. No caso previsto no inciso XIV, a
alteração da Lei 8.906/94, conforme a súmula 14 autoridade competente poderá delimitar
do STF: “É direito do defensor, no interesse do o acesso do advogado aos elementos
representado, ter acesso amplo aos elementos de prova relacionados a diligências em
andamento e ainda não documentados
de prova que, já documentados em procedimen-
nos autos, quando houver risco de com-
to investigatório realizado por órgão com com- prometimento da eficiência, da eficácia
petência de polícia judiciaria, digam respeito ao ou da finalidade das diligências.
exercício do direito de defesa”.
Desse modo, antes mesmo da alteração Posto isto, o parágrafo supracitado foi in-
do art. 7º do Estatuto da OAB, o Supremo Tri- troduzido com o objetivo de garantir a eficácia
bunal Federal decidiu no Recurso Extraordinário das diligências, pois se determinadas informa-
593727/MG que “o Ministério Público dispõe de ções que ainda não foram concluídas e anexa-
competência para promover, por autoridade pró- das aos autos da investigação fossem informa-
pria, e por prazo razoável, investigações de na- das para o advogado, estas correram o risco de
tureza penal, devendo o Ministério Público res- serem frustradas. Assim, o legislador se salva-
peitar as prerrogativas dos advogados previstas guardou para que, nestas hipóteses, a autorida-
no art. 7º da Lei 8.906/94”. Isso mostra verdadei- de tenha a discricionariedade para autorizar ou
ra consonância da decisão do STF com a pro- não o acesso a essas diligências em andamento.
mulgação da Lei 13.245/16, pois antes mesmo Por fim, a Lei também acrescentou o §12
de alterar o inciso XIV, o STF já havia assegu- ao artigo 7º do Estatuto da OAB:
rado aos advogados seus direitos, mesmo em
investigação criminal fora do âmbito policial, no § 12. A inobservância aos direitos esta-
caso, realizados dentro do Ministério Público. belecidos no inciso XIV, o fornecimento
Na nova redação, o legislador deixou cla- incompleto de autos ou o fornecimento
ro que o advogado não só poderá examinar os de autos em que houve a retirada de pe-
autos de qualquer procedimento investigatório, ças já incluídas no caderno investigati-
como também poderá examinar nos autos em vo implicará responsabilização criminal
qualquer instituição responsável. e funcional por abuso de autoridade do
Já a inserção da parte final do inciso, em responsável que impedir o acesso do
advogado com o intuito de prejudicar o
que traz a informação “em meio físico ou digital”
exercício da defesa, sem prejuízo do di-
diz respeito ao direito conferido ao advogado, reito subjetivo do advogado de requerer
podendo este tirar cópias ou realizar aponta- acesso aos autos ao juiz competente.

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A lei 13.245/16 e o caráter...

Corroborando com o parágrafo acima co sobressaindo ao Privado.


mencionado, caso a mesma autoridade negue o Ademais, o direito de assistência jurídica,
direito ao advogado de acessar os autos, forne- continua sendo facultativa, ou seja, não há que
cer os autos de forma incompleta, e até mesmo se falar em obrigatoriedade ao se tratar de pre-
retirar peças que já foram concluídas ao proces- sença do advogado nas investigações criminais,
so investigatório, esta a autoridade, nestes ca- mas uma vez que o advogado esteja presente
sos, poderá sofrer responsabilização criminal e no momento do interrogatório, não há porque
funcional por abuso de autoridade, nos termos negar-se a sua entrada para acompanhamento
do art. 3º, alínea “J”, da Lei nº 4.898/65: Cons- de seu cliente e, por consequência, verifica-se
titui abuso de autoridade qualquer atentado: j) que não houve alteração ao caráter inquisitivo
aos direitos e garantias legais assegurados ao do inquérito.
exercício profissional. Nota-se que, com o advento da Lei hou-
E vale ressaltar ainda, que além da res- ve uma democratização na investigação, confe-
ponsabilização da autoridade, o advogado pode- rindo transparência aos atos praticados nesta
rá peticionar ao juiz requerendo o acesso com- fase, constituindo, assim, um avanço para a in-
pleto aos autos. vestigação criminal.
Conclui-se que mesmo após o advento
4 CONSIDERAÇÕES FINAIS da Lei nº 13.245/16 que alterou o artigo 7º da Lei
nº 8.906/94, o caráter inquisitivo do inquérito não
O inquérito policial é uma peça de infor- sofreu alterações, mas apenas salvaguardou o
mação que tem como finalidade investigar um que já estava previsto nas legislações, trazendo
possível ato ilícito. As características marcan- assim um caráter mais garantista ao investigado
tes do inquérito como a inquisitoriedade e o si- e salvaguardando o direito ao advogado.
gilo foram assuntos para diversas discussões.
Uma análise dos princípios do contraditório e a REFERÊNCIAS
ampla defesa foi feita em função do caráter in-
quisitivo do inquérito policial, já que não prevê ALMEIDA, J. C. M. Princípios fundamentais
esses princípios na fase preliminar. Entretanto, do processo penal. São Paulo: Editora Revista
sempre respeitando o controle da legalidade e dos Tribunais, 1973. p. 82.
os direitos individuais do indiciado. O sigilo nas
investigações também foi alvo de ponderações, BRASIL. Constituição (1988). Constituição da
no qual, chegou-se a conclusão de que este si- República Federativa do Brasil: promulgada
gilo não pode ser interpretado de forma restriti- em 5 de outubro de 1988. 8. ed. São Paulo:
va, como era visto anteriormente, uma vez que Revista dos Tribunais, 2003.
o advento da Lei nº 13.245/16, traz como prer-
_______, Lei nº 8.906, de 04 de julho de 1994.
rogativa do advogado o seu acesso aos autos
Dispõe sobre o Estatuto da Advocacia e a Ordem
do inquérito policial, estando ele constituído na
dos Advogados do Brasil (OAB). Diário Oficial
causa ou não. Aliás, a própria Súmula nº 14 da
da República Federativa do Brasil, Brasília.
Suprema Corte já admitia o acesso ao inquérito
policial sigiloso para o advogado devidamente
_______, Lei nº 13.245, de 12 de janeiro de 2016.
constituído na causa. Desse modo, a nova Lei
Altera o art. 7o da Lei no 8.906, de 4 de julho
nº 13.245/16 apenas ressaltou o acesso do ad-
de 1994 (Estatuto da Ordem dos Advogados do
vogado aos autos.
Brasil). Diário Oficial da República Federativa
Porém, esse acesso do advogado aos
do Brasil, Brasília.
autos continua limitado, uma vez que o defensor
só poderá ter acesso às provas e discussões já _______. VADE MECUM. Obra coletiva e autoria
anexas no inquérito, como também na situação da Editora Rideel com colaboração de Anne
em que exige procuração, que são os casos de Angher. Código de Processo Penal: 1941. 21
sigilo, ou então, os casos em que o acesso aos ed. atual. e ampl - São Paulo: Saraiva, 2015, p.
autos possa causar risco de comprometimento 407.
da eficiência das diligências em andamento ou
aquelas que ainda não foram documentadas nos BADARÓ, G. H. Correlação entre acusação e
autos. O que mostra nesse caso o Direito Públi- sentença. 2. ed. São Paulo: Editora Revista dos

ISSN 1982-1093 Akrópolis, Umuarama, v. 26, n. 2, p. 195-208, jul./dez. 2018 207


DOSSO, S. G.; VELASQUEZ, F. G.

Tribunais, 2009, p. 37. SARLET, I. W. Dignidade da Pessoa Humana


e Direitos Fundamentais na Constituição
BADARÓ, G. H.; RIGHI, I. Direito processual Federal de 1988. 6. ed. Porto Alegre: Livraria do
penal. Rio de Janeiro: Editora Elsevier, 2008. Advogado, 2008, p. 88-89.
Tomo 1. p. 1-36.
LA LEY 13.245/16 Y EL CARÁCTER INQUISITIVO
BARBOSA, R. Comentários à Constituição DEL EXPEDIENTE POLICIAL
Federal Brasileira. Org. Homero Pires. São
Paulo: Saraiva, 1934. v. 6, p. 356. Resumen: Se ha buscado con esta investigación
analizar el expediente policial con sus características
BONAVIDES, P. Curso de direito constitucional. y peculiaridades, buscando demostrar los principales
7. ed. São Paulo: Malheiros, 1997, p. 517 – 525. cambios y discusiones oriundos de la Ley 13.245/16.
A priori, es necesario observar los principios
CANOTILHO, J. J. G. Direito constitucional. 6. constitucionales, con énfasis en el contradictorio
ed. Coimbra: Almedina, 1995, p. 520. y amplia defensa. Considerándose que existe una
discusión entre profesionales del área de derecho,
donde unos dicen que esa ley generó ventajas para
CAPEZ, F. Curso de processo penal / Fernando
investigados, y otros dicen ser solamente ampliación
Capez. – 23. ed. – São Paulo: Saraiva, 2016, p.
del derecho de acceso al expediente por parte de
40-99. los profesionales. Tras un análisis minucioso de las
ponderaciones del adviento de la Ley 13.245/16,
CARVALHO, K. G. C. Direito Constitucional. que innovó principalmente la cuestión del acceso al
13. ed. Belo Horizonte: Del Rey, 2007, p. 549. expediente por parte del abogado, el sigilo relativo
al expediente y la nulidad de los actos probatorios.
GRECO FILHO, V. Tutela constitucional das Se evidenció que el abogado tendrá más acceso al
liberdades. São Paulo: Saraiva, 1989, p. 40. expediente policial, tendrán acceso solamente a las
pruebas y discusiones adjuntas en el expediente, que
LOPES JUNIOR, A. Sistemas de Investigação los cuestionamientos al investigado solo se harán
no Inquérito Policial. 3 ed. Rio de Janeiro: tras la renuncia de la asistencia jurídica. Todavía,
Lúmen Júris, 2005, p. 135-162. es necesario que esa ley sea más estudiada, para
que haya equilibrio entre el acceso y el sigilo de
LIMA, R. B. Manual de processo penal: volume expediente, para no perjudicar su andamiento, ni la
único – 4. ed. rev., ampl. e atual. – Salvador: Ed. utilidad de sus pruebas, pero es necesario asegurar
JusPodivm, 2016. a los investigados más protección al principio de
no autoincriminación. Sobre todo, se percibe que el
proceso inquisitorial no sufrirá cambios significativos,
MEHMERI, A. Inquérito Policial: Dinâmica. 1
ni dejará de ser inquisitivo, pues no existen, en estos
ed. São Paulo: Saraiva, 1997, p. 04. casos, los principios del contradictorio y de amplia
defensa. Para la realización de este estudio, se utilizó
MIRANDA, J. Manual de direito constitucional. como metodología la investigación bibliográfica
3. ed. Coimbra: Coimbra Ed. 1988. t. IV, p. 89. con la utilización de material específico entre ellos,
documentos, monografías, disertaciones y libros,
NUCCI, G. de S. Manual de processo penal e siendo este último la principal fuente primaria.
execução penal. 13. ed. rev., atual. e ampliada. Palabras clave: Amplia Defensa; Contradictorio;
– Rio de Janeiro: Forense, 2016, p. 76. Expediente Policial; Proceso Penal; Sigilo del
Expediente.
PELLEGRINI G. A.; SCARANCE F. A.; GOMES
FILHO, A. M. As nulidades no Processo Penal,
2. ed. Ed. Malheiros, São Paulo, 1992, p. 63.

REIS, A. C. A.; GONÇALVES, V. E. R.; LENZA,


P. coordenador. Direito processual penal
esquematizado. 5. ed. São Paulo: Saraiva,
2016, p. 63.

SAAD, M. O Direito de Defesa no Inquérito


Policial. v. 9. São Paulo: RT, 2004, p. 161.

208 Akrópolis, Umuarama, v. 26, n. 2, p. 195-208, jul./dez. 2018 ISSN 1982-1093

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