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Revista Brasileira de Ensino de Fisica vol. 15, ns (1 a 4), 1993 191 Conceitos Unificadores e Ensino de Fisica (Unifying concepts and physics teaching) José André Peres Angotti Departamento de Metodotogia de Ensino, Programa de Pés-Graduagao em Educagdo cED/v “SC - 88040-900 Florianspolis, SC, Brasil ‘Trabalho apresentado na V RELAEF Resumo A categoria dual Fragmentos ¢ ‘Totalidades contemplada nos ni possibilidades para o ensino/aprendizagem de Fisica/Ciéncins Naturais dagégico indica is epistemoligico ¢ pe- relagGes com a ‘Tecnologia com énfase em Conceitos Unificadores Supradisciplinares associ- ada ao ensino tematico. Quatro desses con do conhecimento fragmentario na educa interligadas de saber sistematizado, (0s so apresentados visando a minimizagio io escolar, em diregio a unidades estruturadas e Abstract ‘The dual category Fragments and Wholeness con: sical levels, indicates possibilities for teaching/lean ing Physics/Natural Sciences and rela- ted Technology with emphasis in Unifying Concepts and ‘Thematic Teaching, Four of these Concepts are presented and proposed to minimize fragmentation in school education and conquest of structured and linked unities of systematized knowledge. A Natureza do Conceito Cientifico O conceito, sempre presente nas eis © teorias, & ‘regular transferivel’ para intimeras outras situacoes aplicaveis dessas poucas Ieis ¢ teorias. E uma das armas ‘econdmicas do pensamento cientifico, porque relacional, operative ¢ abstrato. Em Ciéncias Naturais(CN), como em todos os cam- pos de conhecimento, 0 conceito é caracterizado pela infinita transferéncia a todos os objetos, situando o que hé de comum. Em particular, no campo cientifico/ tee- nolégico, na auséncia do objeto concreto, ele (0 con- ceito) estimula e permite agdes transformadoras no ob- jeto. Moldavel tanto na linguagem comunicativa do fa- lar € escrever da lingua codificada, como na matematica na maioria das vezes, a ele se atribui uma propriedade de estrutura de grupo, parametro ou invariancia. O que propomos aqui ¢ a eleigao de alguns conceitos que, na formagao dos professores, podem se constituir ‘em balizas ou ancoras, tanto para as aquisigdes do saber ‘em CN como para minimizar excessos de fragmentagao do pensamento dos estudantes. E também dos pro- fessores, uma vez que o ensino de CN, seja de Fisica, Quimica ou Biologia, ainda se caracteriza por conjunto de fragmentos de saberes que, embora associados, niio sio assim discutidos. Resultam separados, ithados, mesmo para a maioria dos professores dessas ciéncias. Isto significa que, na pratica, ‘temos avancado’ contra «@ interdisciplinaridade ¢ contra a compleridade, Outra demanda social contemporanea, a da arti- culagio entre 0 conhecimento cientifico © os processos tecnolégicos, niioo vern sendo contemplada em escala nas priticas educativas. Neste contexto, esti muito forte 0 compromisso de trazermos para o universo cultural o conhecimento em C&T restrito a poucos. Ainda, para as grandes maio- 192 rias escolarizadas que nao prosseguem estudos ligados a CWT, 08 conceitos unificadores poderdo permitir novas entradas ¢ percepgdes, uma ver que muito mais abertos € relacionais do que os chamados ‘contetidos'. A busea ¢ identificagio dos coneeitos, que so pou- cos, amplos ¢ densos, esto norteadas pelos campos epistemolégico © pedagégico (Angotti,1991). Eley so atureza critica do conheci- T como pela natureza critica das comple- xas relagées de transmissio © transformagio do saber que se dio na esfera educacional A base tedrica que di suporte & esta proposigio esta parametrizada pela necessidade de enfrentamento da tensio entre fragmentos e totalidades do conhe- cimento sistematizado em CN (Bohm, 1992). Si te, pelas tensdes anilogas decorrentes entre Anilise © 1ese, entre Macroscépico © Microseépico, centre o Atomizado-estitico de Demécrito © o Continuo- dinimico de Herdclito. Mais ainda, pela associagio en- tre as esferas indissocidveis da matéria e da consciéncia, nao obstante os séculos de influéncin cartesiana (Bohm, 1992) Conceitos sio construtes universais da consciéncia humana sobre ‘coisas’ do universo - coisas materiais outras ‘coisas’, de cariter relativamente permanente. Pela sua génese, sio dialéticas por exceléueia, como in- dicam Horkheimer ¢ Adorno * O conceito, que se costuma definir como a untdade caracteristica do que estdé nele subsumido, yd era, desde © inicio, 0 produto do pensamento dialético, no qual cada coisa s6 é 0 que ela é, tornando-se aguile que ela ndo é." (Horkheimer ¢ Adorno, 1985: 29) A opgio pelos conceitos unificadores no ensino de CN jéidentifica de partida o enfrentamento do conflito entre 0 objeto e a construgiio que dele fazem os homen Jienlaga na dimensio critica tanto o universo das ‘coi sas externas aos homens como a capacidade de pensar ‘esse universo ¢ mesmo de refletir esse pensar. No diailogo inicial, nossos interlocutores sio os pro- fessores, em particular os de CN. Queremos discutir JA, Peres Angotti « problematizar com eles os aspectos do conhecimento que aprendemos de maneira dissociada e que ensinamos nas disciplinas dos cursos escolares. A rearticulagio desse conhecimento, a pratica de pensar 0 processo € 0 contetido da reflexio e a indissociabilidade de Ciéneia © Tecnologia sio tarefas da educagéo escolar. Com relagio as tentadoras tendéncias que muitos professores ainda defendem, sobre a prioridade a ser dada aos ‘fatos’, lembramos que jé quase consensual entre 08 epistemélogos ¢ eriticos do emprendimento ci- entifico que “toda observacao estd impregnada de teo- ria” (Hanson, 1985; Piaget & Garcia, 1988).” Numa ica sobre a relagio entre discussio mais profunda e teoria e pritica, Horkheimer afirma : Com efeito, 0 saber aplicado ¢ dispontvel estd sem- pre contido na prazis soctal; em conseguéncia disso 0 fato percebido antes mesmo da elaboragdéo tedrica cons ciente por um individuo cognoscente, 4 estd codetermi- nado pelas representagdes ¢ conceitos humanos.” (Hor- kheimer, 1983:125) Nio & mais possivel separar 0 que pertence & na- tureza inanimada daquilo que pertence A praxis so- cial, Para esse autor, podemos hoje inverter, na so- ciedade capitalista avangada, a idéin de que as ferra- nentas so prolongamentos dos érgaos humanos, pois tais utensilios foram concebides, projetados ¢ fabrica- dos enquanto extensio do homem, mas carregam na sua existéncia e disponibilidade a histéria, concepgio e teo- Fis de seus criadores e pioneiros, desde um instrumento tosco usado no passado, até um equipamento avanOado dle computagio, produto da mais recente teenologia ci- centificizada. A manipulagio muitas vezes automatica que no dia a dia fazemos de tais equipamentos nos co- na outra ponta, configurando um contacto indireto com os pioneitos “presentes” nas ferramentas. E nesse sentido que “os drydos sao também prolongamentos das ferra- mentas.” (jdem,ibidem: 126) Como nossa formagio usualmente nos impulsiona a isolar em demasia o “natural” do “artificial”, a diferen- Revista Brasileira de Ensino de Fisica vol. 13, ns (1 a 4), 1993 193, ciar com muita certeza a natureza bruta da transfor- mada, crostalizando a supasta neutralidade do obser- vador, mais um alerta é dado por Horkheimer quanto & determinagao do social sobre nosso universo: * Mesino quando se truta da cxperiéncia com obje- fos naturuis como tal, sua naturulidade € determinada pelo contraste com o mundo social, ¢ nesta medida, dele depende.” (idem, ibidem, 1983: 126) Podemos entio afirmar com bastante conviegio que: © conccito nao é a coisa, o fato néo é absolute. De forma semethante, a Ciéncia néo é a Natureza Abordagem temitica ¢ conceitual unificadora O comprometimento do ensino de CN com énfase nos conceitos se apéin no enfrentamento da tonsio en- tre Fragmentos ¢ Totalidades do conhecimento elabo- rado, construido e mn construgio, Ademais, se justifica pela necessidade de articulacao entre saberes que, pela sua origem, abordagem, separagéo rigida em disciplinas de curriculos, parecem distintos, embora mantenham tragos comuns. Sio tragos dificeis de ser identificados pelos estudantes mestno quando estimulados por docen- tes que utilizam técnicas diversificadas © metodologins nao tradicionais de ensino, A dimensio epistemoldgica que os sustenta bem como a dimensio pedagégica que Ihes permite difusio © implementagio sio, a nosso ver, de cariter distinto da dimensio ontolégica que sustenta 0 ensino de CN através de TEMAS, no sentido freiriano (Delizoicov, 1991). A leitura de Holton (1979), da permanéncia dos “themata’ enquanto um dos limites humans, auxilia a identificar, no campo pedagégico de Freire, 0 seu traco ontoldgico, relative & ‘gnose Pela etimologin (thema) da palavra , estio enqua- tistas no con- dradas as crencas e pressuposigdes de texto da descoberta, que sio mantidas no contexto da Justificagio. Obviamente, nao s6 entre os cientistas isto ocorre. No pedagégico, tanto a concepgio de Freire, do “Tema Gerador', como os temas propostos pot Snyders, sio também fortemente determinados pela dimensio ontolégica, em sintonin com as crengas, tendéncias ma- Joriti tizagio com os grupos que freqiientam as escolas, Justa- ias, contradigdes © necessidades de problema- Inente por isso, nfo sao facilmente demarcados. De seu lado, 0 conhecimento cientifico © tecnoligico ja aponta para alguns de seus temas que poderio ser significati- vos aos estudantes, oferecendo ferramentas que auxi- liam o recorte, ou seja, ele nfo dari conta de qualquer tema, Outros conhecimentos poderio e deverio ocupar- se de temas mais “externos” ao conhecimento em C&T. Exemplos temiticos com essas caracteristicas podem ser enccontrados em publicagdes no pais (Angotti e De- lizoicov, 1991 '), (GREF, 1990/91/93) no exterior, principalmente na Holanda- Un. de Ultrecht, Projeto PLON. (Lijnse, 1990; Eijkelhof, 1989; Deckker, 1986). Os Conceitos Unificadores sio complementares aos ‘Temas © carregam para o processo de ensino- aprendizagem a veia epistémica, na medida em que ideutificam os aspectos mais partilhados (em cada época) pelas comunidades de C&T, sem negli 08 aspectos conflitivos. Uma vez estabelecida a possibilidade de serem tra AS, asso- cindas ao carter unificador e epistémico dos conceitos, balhadas as contradigdes encerradas nos ‘T sempre privilegiando o conflito entre os saberes, dois problemas educacionais merecem set discutidos teori- camente, dada sua pertinéncia e presenga forte nos em- hates sobre possibilidades de methoria nos resultados da educagio escolar em ampla escala. Pi meiro, ¢ a suposta dificuldade de convivencia entre duas opgées: abordagem temiitica ¢ ‘escola unitaria’, Nao se pode abrir mao da escola unitéria ia publicagio Fisica (S.Paulo, Cortes, 1901) privilegin- nos un tema: “Produgio, Distribuigio ¢ Consumo de Energia, Elétrica” para tratamento em extenaio num primero momento © seus desdobramentos em profundidade, num segundo momento, No iitimo capitulo do Hivro: Temas de Eatudo, Bibliografia Projetos de Ensino, indicamos aos profeasores de Fisica do se- ‘undo grau uma série de Temas (da época dos gregos A atual) para ensino/aprendizagem de Cle. Os Projetos de ensino ea bibliografia extensa de textos ¢ periédicos apontam coordenadas no sentido de sensibilizar os docentes para avangar evans © ov- tras questies. Esse capitulo, que preaupie a independéncia, a iva © a critica do profesor, diferencia essa publicagio dos ticos mais adotados, que acabam apostando Da sua, dependéncia e estreiteza de opcies. 194 quando se pretende inserir culturalmente um conheci- mento ainda distante das populagées. A pluralidade dos temas, seu compromisso com o regional ¢ local parecem se opor aos requisitos da escola unitéria A escola que queremos ha de ter caracteristicas de tnitdria, o que nao significa ser tnica (Pimenta, 1991). ‘Temas que encerram grandes contradigies nao vinculados a épocas ou locais muito precisos me- recem destaque na educagio escolar; as especificidades de cada regiio estario inseridas ¢ contempladas, man- jas suas relagdes com os Temas de amplas dimensdes Temas emergentes como os recentes acidentes muclen- no pais, continuam solenemente ig- norados pelo sistema escolar, dada sua exclusio das ementas ¢ programas. Se alguma elasticidade houvesse tamente tais assuntos teriam sido an nos cursos, € sados na ocasiio, com suporte bibliogrifico construido pelos professores uma vex que nio ha informagio dis- ponivel nos livros diditicos os artigos especializados Do not nao sio produzidos imediatament lirio e do conhecimento advindo de sun formagio critica, 0s pro- fessores sito desafindos a contribuir, individu em equipe. Programas mais abertos ¢ elisticos pre cisam de algum compromisso com essas possibilida- des ¢ também com 0 conhecimento recentemente com istado; do contrario continuaremos a privilegiar a, ciéneia © tecnologia disponiveis até o século pasado, obstruindo justamente 0 conhecimento atual que tinge 6s alunos pelas vias da educagio informal, que de al- uma forma os sensibiliza enquanto atores e sujeitos de nw mundo rgulhiado em rapidas mudangas. O segundo ponto que levantamos refere-se a outra polémica, aquela dos ‘contetidos’. Os educadores no detalham 0 conceito de ‘contetido” quando 0 abordam, De maneira muito geral, entendemos conteiidos como ‘0 conhecimento que deve ser transmitido, ow aquilo que se costuma ensinar nas escolas Conteiidos podem até justificar a atomizagio do conhecimento que se processa na ‘ciéncia da escola’, mesmo numa sé disciplina, assim pouco contribuem J. A, Peres Angotti para a apreensio de unidades estruturadas © ordena- das do saber. Conteidos na interpretagio mais costumeira dos professores, estao sempre vinculados a uma forte res- trigio. Sio contidos, isto é, aprisionados em ‘garrafas de saber’. Podem se comunicar, porém nao é facil en- contrar ¢ utilizar os ‘vazos comunicantes’. Seja.cm extensdo, sejaem profundidade, alguns atin- jidades estruturadas de saber com certa ple- gem as nitude, Outros, mesmo com muita escolaridade, ndo © conseguem, pois demasiadamente voltados ora para ‘a extensio do conhecimento, ora para a especiali em um ramo do conhecimento. (Os cursos de formagio, que pressupdem o somatério de conhecimentos atomizados, 0 conjunto de iniimeros wes se caracterizam mais contetidos, muitas pela auséncia e pela lacuna do que pela presengae significado dos contetidos criticos. Particularmente, nos cursos de magistério e licenciaturas, eles nao instrumentalizam os habilitados a saltar para as dimensdes orginicas, orde- nadas e estruturadas do saber. A idéin de substituir contetidos nos cursos de formagio de professores @ tentadora, necessirin até. Entretanto, o parimetro de referéncia para a mudanOa precisa ir além dos adjetivos de ‘significativo © atual’ (Os programas curriculares propostos a partir de deman- das socinis © atualizagio sio validos, porém correm o risco de se tornar obsoletos ¢ estaiticos no futuro breve, dadas a dinamica social e a aceleragao dos processos em ©. Existira uma alternativa que possibilite mudangasas sem risco de breve obsoletismo? Em todos os saberes cientificos existem conjuntos de assuntos essenciais, anexados a outros, complemen- tates, Variveis como a area (conhecimento especifico), sécio-economia local ¢ regional (lugar, espago vivido) ¢ tempo (époea), sio relevantes para a abordagem con- Junta pelas equipes pedagégicas. Um esforgo deve ser feito para se detectar que é fundamental e 0 que é suplementar. Revista Brasileira de Ensino de Fisica vol. 15, ns (1 a 4), 1993 195, Generalidades do tipo “contevidos renovados”, “sa- ber eritico acumulado” € “temas significativos” sio be las expresses que nos deixam alertas ¢ nos direcionam, para a oposigao aos contetidos mortos © acabados da escola tradicional, inadequados & educagio das grandes maiorias, Contudo, néo apontam para o que fazer nem para o como fazer pedagégicos, pois mais centrados no que nao fazer e/ou como nao fazer. A proposta que apresentamos para discussio das bases do ensino-aprendizagem em CN defende a sergio da vertente epistémica associada A presenga sis- temitica da énfase conceitual unificadora © supradis- ciplinar na busca dos universais, muito ausentes nas discusses sobre contetidos. Ela nio elimina o debate sobre contetidos, mas acrescenta elementos que, a nosso ver, no podem ser mais negligenciados. Quatro conceitos, a saber, transformagies, regula- ridades, energia ¢ escalas, vem sendo utilizados pela nossa equipe (Pernambuco, 1988 © 1990) em varias agées pedagégicas ¢ tém servido como quadros de r feréncia nas intervengoes realizadas em varios niveis de escolaridade, niveis diversos de profundidade e critica, e também na produgio de material instrucional/diditico (Angotti, 1991), Haverd outros Conceitos Unificadores? Os pesquisa- dores dirio, Contudo, essa categoria deve ser pautada pelos minimos; niio se pode acrescentar a vontade di- versos conceitos. O potencial unificador do conjunto deve ser preservado; aumentar demais a lista significa erodir 0 esforgo contra os excessos de fragmentagio. Caracterizando quatro conceitos unificadores Inicialmente, as localizagdes definigdes pelo critério da amplitude dos quatro conceitos supradise plinares que adotamos. 1. TRANSFORMACOES; da matéria viva e/ou nao viva, no espago e no tempo. 2. REGULARIDADES; que categorizam e agrupam as transformagées mediante regras, semelhangas, ciclos abertos ou fechados, repetigées e/ou conservagées no espaco e no tempo. Regularidades neste sentido sto entendidas enquanto ‘regularidades de transformagies', Elas constituem a contrapartida das transformagdes no conhecimento, sobretudo no conhecimento cientifico, Em poucas palavras, podemos afirmar que a Ciéncia, trabalha dinamicamiente o par Transformagées © Re- gularidades (T&R). Em linguager matemitica, escre- vemos que varias ‘Transformagées (‘T) sio dependentes (ou ‘fungao’) de pelo menos uma Regularidade (R), ou R= R(T). 3. ENERGIA; conceito que incorpora os dois an- teriores com a vantagem de atingir maior abstragio, de estar acompanhado de linguagem matemitica de grande generalizagio © condensagio, para instrumen- talizar transformagées ¢ conservagées , e ainda de estar associndo & degradagao. Energia (E) & um sutil ‘ca- maledio’ do conhecimento cientifico. Transforma-se es- pacial e temporalmente, na dindmiea mutivel dos ob- Jetos, fenémenos ¢ sistemas, conserva-se na totalizagio ddas distintas formas e degrada-se porque uma de suas formas - o calor - é menos eldstica ou reversivel do que as outras. A grandeza é uma ponte segura que conecta, 0 conhecimentos especificos de C&T. Conecta também esses a outras esferas de conhecimento, as contradigdes do cotidiano permeado pelo natural, tanto fenoménico como tecnolégico. B esta grandeza que pode e deve, mais do que qualquer outra, balizar as tendéncias de ensino que priorizam hoje as relagées entre Ciéncia, ‘Tecnologia e Sociedade. Em linguagem matemitica, escrevemos B= E (T,R). 4. ESCALAS; que enquadram os eventos estuda- «los nas mais distintas dimensdes. Sejam ergométricas, macro ou microseépicas a nivel espacial, sejam de duragdes normais, instantineas ou remotas a nivel tem- poral; sejam, com auxilio dos trés conceitos anteriores, transformagées ¢ regularidades analisadas por ‘faixas de energia’ ow escalas energéticas. Escalas métricas, das quantidades extensivas, que no se restringem is ‘atlas escolares’ ‘que parecem eternos ¢ imutaveislmente pelo primeiro par (T&R), incorporadas no terceiro . énfases estiticas dos mapeamentos, dos 196 Os conceitos unificadores podem aproximar as ‘varias ciéncias’, (dos cientistas, dos curriculos, dos pro- fessores, dos alunos) preservados os niveis de formagao e cognigao. Principalmente, queremos estreitar vinculos entre ‘cientistas, professores ¢ curriculos’, para que se estabelecam didlogos com estudantes e criangas. Mais ainda, que os ‘contetidos’ sejam definidos por TEMAS significativos de amplo alcance e que os conceitos unifi- cadores sejam sistematicamente utilizados para que as transferéncias e as desejadas apreensdes ocorram, e daio conhecimento em CN possa vir a ser instrumento real de exercicio para qualqyer profissio ou atividade da cida- dania. Sobretudo, para que o nivel de cultura elaborada seja mais partilhado. A utilizagio dos quatro conceitos deve ser tra- balhada conjuntamente com os professores; podem ser também, quando necessério, abordados “separada- mente” com os alunos, em progressao e mesmo hierar- quizacéo. Por exemplo, é melhor priorizar as trans- formagées e regularidades com escalas qualitativas ou semiquantitativas quando os niveis cognitivos ainda nao permitem a interlocugio via conceito de energia. J& dissemos que além de unificadores sio SUPRA- DISCIPLINARES, ou seja, permeiam os escopos da Fisica, Quimica, Biologia, Geologia, Astronomia. As- sim, na “ciéncia dos curriculos”, podem orientar grupos de professores destas disciplinas nos segundo e terceiro grau, e da disciplina CN no primeiro. Vao na diregéo das totalidades, das estruturagdes de conhecimento ar- ticulado e dinamico, contra as fragmentagées exagera- das que nao consideram muito mais do que nomencla- turas, formulas, memorizagées. Em cotrapartida, os conceitos em destaque nio irdo atingir o conhecimento holistico por magia ou pelo somatério de superficialida- des, nao farao integragdes a ponto de descaracterizar as especificidades de cada um dos conhecimentos. Nao sao ‘teorias’, mas nelas esto presentes e delas fagem parte. Tanto das ‘velhas’ como das atuais mais aceitas. Ainda, muito provavelmente farao parte das futuras, que virdo a substituir as atuais. Sao categorias J. A. Peres Angotti que dificilmente serao descartadas no futuro e ajudarao a restruturar o conhecimento do porvir. Os conceitos nao esto presos a modelos/estruturas, como muitos outros do escopo das CN que caracterizam modelos de ‘coisas’, a exemplo do tomo, de moléculas, de células, Sao mais fluidos, nao diretamente estru- turdveis, embora participem da construgao dos modelos e teorias. Mesmo considerando as rupturas necessarias entre os saberes do senso comum e do elaborado, neste tiltimo é preciso um esforOo para se reduzir os atomicismos de cada uma das disciplinas das ementas da ‘Ciéncia dos curriculos’ e da ‘Ciéncia dos professores’. E princi- palmente neste espago que temos contribuido (Angotti, 1991, Delizoicov & Angotti, 1990 e 1991). ‘A atual tendéncia que anseia pela aprendizagem articulada e interdisciplinar ndo se dard sem a refor- mulago daquelas ‘ciéncias’. Grandes temas atuais de interesse global, como 0 ecolégico e a vertente de ensino de CN para as sociedades, nas relagdes entre Ciéncia, Tecnologia e Sociedade, néo podem ser atingidos sem substituigao das ementas atuais. Substituigo do en- sino orientado somente por objetivos pelo ensino que também contempla os processos, com priorizagaio dos conceitos supradisciplinares como os aqui propostos, vi- sando os desejaveis ganhos culturais pelos alunos em_ cada uma das disciplinas das ciéncias da natureza, bem como do seu conjunto, na medida em que tais co- nhecimentos encerram tanto suas especificidades como dominios comuns, quanto a curiosidade e forraulagéo de boas questées, os procedimentos, a busca de uni- versais e invariancias, a relagdo estreita entre teoria e experiéncia... Tais conceitos, a prazo mediato, poderdo atingir 0 status de TRANSDISCIPLINARES, uma vez que as in- vestigagdes atuais priorizam problematicas complexas que demandam fortemente a contribuigdo de especi- alistas diversos, cada um estimulado a comprender a visio do outro especialista e assim convidado a apren- der também na diferenga e nao somente no convivio Revista Brasileira de Ensino de Fisica vol. 15, n°s (1 a4), 1993 197 com seus pares. Esses procedimentos e alternativas apresentam-se também como desafios na educagdo em Ciéncias , particularmente aos professores de Fisica, Quimica e de Biologia, cada vez mais convidados para agdes comuns, seja a partir dos préprios avangos do co- nhecimento mais complexe e interdisciplinar, seja a par- tir dos seus alunos que no raro estranham o dominio constante das especificidades. Dentre as alternativas para o tratamento em equipe dos estudos tematicos apoiados nas categorias concei- tuais aqui apresentadas, uma idéia que merece ser con- templada nos cursos de segundo e mesmo terceiro graus de escolaridade é a da mudanga dos horérios, no sentido de se permitir o encontro desses professores com seus alunos em pelo menos algumas ocasides; por exemplo um encontro semanal para discussées de tematicas am- plas a partir de cada conhecimento especifico ¢ também numa perspectiva conjunta, pelo menos multidiscipli- nar. A utilizacéo dos conceitos unificadores enquanto categorias norteadoras para ensino/aprendizagem pode contribuir para que os professores iniciam e prossigam seu novo didlogo entre si e com seus alunos, Referéncias Bibliogréficas ADORNO, T. & HORKHEIMER, M. ‘Dialética do Esclarecimento’. In: Textos Escolhidos; col. Os Pensadores, $.Paulo, Abril, 1983. ANGOTTI, J.A. Fragmentos e Totalidades no Conhe- cimento Cientifico e no Ensino de Ciéncias. 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