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Adaptação Curricular - Marcia Regina Quevedo Kay

ADAPTAÇÃO CURRICULAR

Fundamentos da Educação de qualidade para todos e o paradigma da Educação Inclusiva

Objetivos específicos
•• Conhecer os fundamentos teóricos e metodológicos do paradigma da educação inclusiva
•• Diferenciar os conceitos de integração e inclusão
•• Identificar os desafios históricos, políticos e sociais que dificultam a efetivação das políticas
públicas educacionais inclusivas
•• Reconhecer a importância da inclusão como elemento de garantia da qualidade social da
educação para todos

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Temas abordados nesse módulo


INTRODUÇÃO................................................................................................................................................................... 3

1. EDUCAÇÃO PARA TODOS DE QUALIDADE E A INCLUSÃO EDUCACIONAL........................................... 3

1. 1  Os desafios para a efetivação da inclusão educacional....................................................................10

CONSIDERAÇÕES FINAIS............................................................................................................................................13

MAPA MENTAL DESSE MÓDULO................................................................................................................................14

REFERÊNCIAS................................................................................................................................................................14

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INTRODUÇÃO
Focalizaremos o paradigma da inclusão a partir dos fundamentos conceituais e metodológicas que
fornecem base para sua efetivação tanto no âmbito social, quanto no educacional.

Conhecer e compreender esses fundamentos é imprescindível para que os profissionais da educação


possam desenvolver práticas pedagógicas sustentadas na diversidade cultural, social e econômica
presente nos diversos contextos escolares.

As práticas pedagógicas voltadas à promoção da Educação Inclusiva devem possibilitar a flexibiliza-


ção do ensino e promover as adaptações necessárias ao atendimento das necessidades educacio-
nais especiais dos alunos a fim que todos possam ser inseridos no processo de ensino, aprendendo
com qualidade.

O processo de inclusão integra-se ao processo de democratização da sociedade brasileira, que con-


duziu à avanços e conquistas de direitos em geral e em específico o direito à educação para todos
os brasileiros.

Esse direito envolve o acesso, a permanência, a conclusão da educação básica, a aprendizagem e a


efetivação da educação de qualidade para todos sem nenhum tipo de discriminação.

1. EDUCAÇÃO PARA TODOS DE QUALIDADE E A INCLUSÃO


EDUCACIONAL
A luta pela inclusão social e educacional é mundial e foi impulsionada pelo movimento de defesa
do direito de todos à participação social e à inserção no ambiente escolar com garantia à aprendi-
zagem e sem nenhuma forma de discriminação.

O paradigma da inclusão está fundamentado na concepção de direitos humanos que articula a


igualdade e a diferença como valores indissociáveis, necessários ao enfretamento de todas as for-
mas discriminação e exclusão. (BRASIL, 2008)

No Brasil, a inclusão educacional representa um grande desafio no contexto das políticas públicas
educacionais, pois há fatores históricos, políticos e sociais que dificultam a sua efetivação.

Inicialmente, é preciso destacar que a escola brasileira, historicamente, foi privilégio de poucos e só
a partir do processo de redemocratização da sociedade é que a educação passou a ser um direito
de todos.

A Constituição Federal de 1988 afirmou a promoção do bem de todos sem nenhuma forma de discri-
minação e preconceito, ressaltando o direito à educação no artigo 205 e a “igualdade de condições
de acesso e permanência na escola” no artigo 206.

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No que tange ao atendimento de crianças e jovens com deficiência:

A educação especial se organizou tradicionalmente como atendimento educacional


especializado substitutivo ao ensino comum, evidenciando diferentes compreensões,
terminologias e modalidades que levaram a criação de instituições especializadas,
escolas especiais e classes especiais. Essa organização, fundamentada no conceito de
normalidade/anormalidade, determina formas de atendimento clínico terapêuticos
fortemente ancorados nos testes psicométricos que definem, por meio de
diagnósticos, as práticas escolares para os alunos com deficiência (BRASIL, 2008, p.6).

Esse tipo de atendimento educacional especializado teve início no período imperial com a criação
em 1854 do Instituto dos Meninos Cegos, atualmente Instituto Benjamin Constant e três anos depois,
em 1957 com a criação do Instituto dos Surdos Mudos, atualmente Instituto Nacional da Educação
dos Surdos – INES, ambos no Rio de Janeiro (BRASIL, 2008).

Em 1926 o atendimento às pessoas com deficiência mental foi iniciado com a inauguração do Insti-
tuto Pestalozzi e ampliado com a criação da primeira Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais
– APAE, em 1954.

No âmbito legal, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, Lei nº.4024/61 fundamentou o
atendimento educacional às pessoas com deficiência, destacando que fosse ofertado preferencial-
mente no sistema de ensino e em 1973 foi criado o Centro Nacional de Educação Especial (CENESP)
pelo MEC, órgão responsável pela educação especial no país, marcado pela visão de integração.

Essas iniciativas de políticas de educação especial acabaram não contribuindo com a efetivação de
uma política pública de garantia ao acesso universal de educação para todos, pois foram construí-
das com base em padrões homogêneos de ensino e de aprendizagem.

Assim, os avanços na direção da formulação das políticas públicas da educação inclusiva foram
realizados a partir dos anos de 1990, influenciadas pelos documentos internacionais como a Decla-
ração Mundial de Educação para Todos de 1990 e a Declaração de Salamanca de 1994.

Em 1999 ocorreu na Guatemala, a Convenção Interamericana para a Eliminação de Todas as Formas


de Discriminação contra as Pessoas Portadoras de Deficiência que ficou conhecida como a Conven-
ção de Guatemala.

Este evento visou disseminar a ideia da necessidade de prevenção e de eliminação de todas as for-
mas de discriminação contra as pessoas com deficiência, integrando-as de forma plena na socie-
dade, reafirmando que elas possuem os mesmos direitos e liberdades que todos os seres humanos,
incluindo o direito de não serem discriminadas por motivo de sua deficiência.

A Convenção da Guatemala adicionou aos demais documentos de afirmação dos direitos das pes-
soas com deficiência, o imperativo de prevenção e de eliminação de todas as maneiras de discri-
minação, e o Brasil como país signatário, promulgou o Decreto nº 3.956/2001 que teve um papel
essencial para a afirmação da educação para todos.

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O decreto colocou a necessidade de reinterpretação da educação especial no Brasil, apontando que


esta deve ser “compreendida no contexto da diferenciação adotada para promover a eliminação das
barreiras que impedem o acesso à escolarização” (BRASIL, 2008, p. 9).

Em 2001, com a Resolução CNE/CEB nº 2/2001 foi instituída as Diretrizes Nacionais para a Educação
Especial na Educação Básica que reafirma a educação para todos nos sistemas de ensino, incluindo
o atendimento educacional especial e a garantia das condições de uma educação de qualidade
para todos.

Nessa direção, a Resolução CNE/CP nº1/2002 estabeleceu as Diretrizes Curriculares Nacionais para
a Formação de Professores da Educação Básica, deliberando que as instituições de ensino superior
voltadas à formação de professores incluíssem na organização curricular as questões relativas à
diversidade e contemplassem os “conhecimentos sobre as especificidades dos alunos com necessi-
dades educacionais especiais” (BRASIL, 2008, p. 9).

Outros marcos legais importantes foram: a Lei nº 10.436/02 que instituiu “a Língua Brasileira de
Sinais como meio legal de comunicação e expressão ”e a obrigatoriedade da disciplina de Libras
nos cursos de licenciatura e de fonoaudiologia; a Portaria nº 2.678/02 que introduziu o Braille “em
todas as modalidades de ensino”; o Decreto nº 5.296/04 “que estabeleceu normas e critérios para a
promoção da acessibilidade às pessoas com deficiência ou com mobilidade reduzida”; o Decreto nº
5.626/05 institui “a formação e a certificação de professor, instrutor e tradutor/intérprete de Libras”
e o ensino bilingue considerando “a Língua Portuguesa como segunda língua para alunos surdos”;
dentre outros (BRASIL, 2008, p. 10).

Em 2006, a ONU aprovou a Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência que recomen-
dou aos países signatários que assegurem “um sistema de educação inclusiva em todos os níveis
de ensino” e o Brasil acatando essa orientação instituiu o Decreto nº 6.094/2007 que estabeleceu as
diretrizes do Compromisso Todos pela Educação, enfatizando “a garantia do acesso e permanência
no ensino regular e o atendimento às necessidades educacionais especiais dos alunos, fortalecendo
a inclusão educacional nas escolas públicas” (BRASIL, 2008, p. 10).

Nessa direção, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, Lei nº 9.394/96 estabeleceu em seu
artigo 2º que a educação é um direito de todos e “dever da família e do Estado, inspirada nos princí-
pios de liberdade e nos ideais de solidariedade humana” e acrescenta que as finalidades devem ser
“o pleno desenvolvimento do educando, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualifica-
ção para o trabalho” BRASIL, 1996).

A legislação em vigor traz no artigo 59 que:

os sistemas de ensino devem assegurar aos alunos currículo, métodos, recursos


e organização específicos para atender às suas necessidades; assegura a
terminalidade específica àqueles que não atingiram o nível exigido para a
conclusão do ensino fundamental, em virtude de suas deficiências e; a aceleração
de estudos aos superdotados para conclusão do programa escolar (BRASIL, 1996)

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Todas essas reflexões e iniciativas apontam para o fortalecimento de concepções e práticas que
possibilitem o processo de inclusão educacional garantindo a presença das diferenças na escola e
favorecendo a superação de todas as formas de exclusão e de segregação.

Pense comigo
O que é Inclusão e inclusão escolar?

De acordo com Silva (2009, p. 135) a exclusão, a segregação, a integração e recentemente a inclusão
“marcam um percurso, ao qual estão subjacentes concepções e práticas, relativamente às quais, no
caso da inclusão, entendida como educação inclusiva, a formação de professores é um dos fatores
fundamentais à sua implementação”.

Dessa forma, muitos significados foram atribuídos à deficiência em diferentes tempos históricos e
culturas distintas, pois

para os egípcios, ela era indiciadora e portadora de benesses e, por isso, divinizava-
se. Para os gregos e para os romanos pressagiava males futuros, os quais se
afastavam, abandonando ou atirando da Rocha Tarpeia, as crianças deficientes. Na
Idade Média, a sociedade, dominada pela religião e pelo divino, considerava que
a deficiência decorria da intervenção de forças demoníacas (SILVA, 2009, p. 136)

A exclusão das pessoas com deficiência, nesses períodos era parcial ou total e muitas vezes elas
não eram poupadas da morte ou de vivenciar a ausência total de condições de vida.

No período da Idade Média, na Europa, surgiram as primeiras ações de caridade impulsionadas pelo
sentimento de piedade dos nobres e de religiosos que fundaram hospícios e albergues voltados ao
acolhimento das pessoas com deficiência.

Entretanto permaneceram durante muito tempo os sentimentos contraditórios de piedade e de


ameaça e os deficientes foram colocados em situação de mendicância e abandonados durante o
longo período dos séculos XVII e XVIII que teve como marca a grande incidência e crescimento de
mendigos.

No que tange aos deficientes, nesse período, esses eram totalmente excluídos da sociedade e

Como forma de atrair a caridade, compravam-se nos asilos, crianças deficientes de


tenra idade, que eram barbaramente mutiladas e abandonadas à sua sorte quando,
com o avançar da idade, deixavam de ter utilidade. Relativamente aos deficientes
mentais, o abandono era total. Os que sobreviviam eram remetidos para orfanatos,
prisões ou outras instituições do Estado (SILVA, 2009, p. 137).

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Só a partir do século XIX e na primeira metade do XX é que “os deficientes foram, assim, inseridos
em instituições de caridade marcadamente assistencialista”, e por isso a institucionalização teve
forte viés assistencial e de segregação.

Nesse sentido, como assinala Correia (1997). 13), houve a criação de instituições voltadas para o
atendimento das crianças com deficiência que foram separadas e isoladas das tidas como crianças
normais.

Isto porque “há uma necessidade, óbvia e compreensível, de evidenciar empenho na resolução do
problema: começam a surgir instituições especiais, asilos, em que são colocadas muitas crianças
rotuladas e segregadas em função da sua deficiência” (CORREIA, 1997, p. 13).

A autora destaca que a preocupação com a educação veio posteriormente, impulsionada por reli-
giosos, educadores, médicos e com a participação de associações profissionais voltadas ao “desen-
volvimento científico e técnico que se foi verificando, de que os testes psicométricos de Binet e Si-
mon, cuja escala métrica da inteligência permitia avaliar os alunos que iam para escolas especiais,
são um exemplo” (idem).

Nesse sentido, foram surgindo instituições de atendimentos para os surdos, posteriormente para
cegos e por fim para deficientes mentais.

Dessa forma, na educação, a exclusão, a segregação e a integração também estiveram presentes e


de acordo com Mazzota (2003) é possível observar três fases distintas na história da educação de
pessoas com deficiência.

A primeira fase é marcada pela visão assistencialista voltada à proteção de crianças e jovens com
deficiência realizada por instituições privadas. A segunda fase, refere-se à educação especial, pos-
suindo um caráter médico-terapêutico, impulsionando as primeiras obras sobre as deficiências e o
estabelecimento das primeiras instituições especializadas no atendimento desse público.

A terceira fase, a da integração, teve dois momentos, sendo o primeiro o de intervenção em que
o aluno era o centro e o segundo de intervenção com centro na escola. No primeiro momento, os
alunos eram organizados em grupos por categorias conforme o diagnóstico, tendo o atendimento
feito em salas separadas para não criar problemas na sala regular. No segundo, o da intervenção
centrada na escola, esta passou a ter o encargo de atender as necessidades e individualidades dos
alunos com deficiência (MAZZOTA, 2003).

Nessa direção, Mantoan (2003) ressalta que a educação especial brasileira teve início no século XIX
e baseou-se no padrão de atendimento norte-americano e no europeu, fundamentados nos mode-
los assistencialistas e segregativos que possuíam base em conceitos médicos.

Assim, inicialmente as crianças com deficiência eram rotuladas e atendidas em instituições espe-
cializadas de forma segregada e isoladas das outras tidas como normais e posteriormente, com a
consolidação do conceito de normalização, a educação passou a ter um caráter de integração em

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que a escola regular passou a utilizar aspectos favoráveis do meio para trabalhar com as crianças
com deficiência.

Esse processo de normalização, base da educação especial, é o responsável por instituir o poder
de propor de forma sutil “com base em características devidamente selecionadas como positivas,
a eleição arbitrária de uma identidade “normal” como um padrão de hierarquização e de avaliação
de alunos, de pessoas” (MANTOAN, 2003, p. 20).

Dessa forma, a integração objetiva inserir o grupo ou o aluno com deficiência que foi excluído do
processo educativo anteriormente, pois ela

ocorre dentro de uma estrutura educacional que oferece ao aluno a oportunidade


de transitar no sistema escolar — da classe regular ao ensino especial — em todos
os seus tipos de atendimento: escolas especiais, classes especiais em escolas
comuns, ensino itinerante, salas de recursos, classes hospitalares, ensino domiciliar
e outros. Trata-se de uma concepção de inserção parcial, porque o sistema prevê
serviços educacionais segregados (MANTOAN, 2003, p. 15).

No entanto, em todas as formas de atendimento do processo de integração o aluno é segregado


e não há uma inserção total e radical nas salas de aula regulares e mais amplamente na escola,
pois ele oscila entre o ensino regular e a educação especial onde as condições ou deficiências são
o principal elemento de organização do processo educativo.

Nessa abordagem, há o entendimento das deficiências

como “fixadas” no indivíduo, como se fossem marcas indeléveis, as quais só nos cabe
aceitá-las, passivamente, pois pensa-se que nada poderá evoluir, além do previsto
no quadro geral das suas especificações estáticas: os níveis de comprometimento,
as categorias educacionais, os quocientes de inteligência, as predisposições para o
trabalho e outras tantas mais (MANTOAN, 2003 p. 19).

Por isso, o paradigma da inclusão defendido pela autora questiona veementemente “as políticas e
a organização da educação especial e da regular e a visão de integração”, pois “prevê a inserção
escolar de forma radical, completa e sistemática. Todos os alunos, sem exceção, devem frequentar
as salas de aula do ensino regular” (idem).

Os alunos são considerados sujeitos e não podem ser classificados ou pensados como modelos
ideais, com suas identidades fixas, pois as diferenças são reconhecidas e “estão sendo constante-
mente feitas e refeitas, já que vão diferindo, infinitamente. Elas são produzidas e não podem ser
naturalizadas, como pensamos, habitualmente” (MANTOAN, 2003, p.20).

É nessa perspectiva, que a inclusão escolar rompe com os padrões de homogeneização presentes
nas escolas e estabelece um novo paradigma na educação que não está circunscrito aos alunos
com deficiência ou que apresentam dificuldades, mas engloba todos que são vistos nas suas singu-
laridades e diferenças.

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Assim, a educação inclusiva além de acolher os alunos “independentemente de suas heterogenei-


dades (biológica, cultural, social, econômica, de níveis de aprendizagem e de níveis de desenvolvi-
mento, de interesses e motivações pessoais), também, oferece oportunidades para que aprendam e
se desenvolvam” (LOPES, 2017, p. 8).

A proposta de inclusão questiona e opõe-se radicalmente às práticas sociais que excluíram durante
séculos pessoas com deficiência, pois elas eram consideradas socialmente inúteis e incapazes e não
diferentes.

Atenção
É preciso entender a distinção entre os termos integração e inclusão,
pois apesar de aparentemente aproximarem-se são utilizados para tra-
tar de situações distintas de inserção e possuem bases teóricas e meto-
dológicas divergentes. A forma mais usual de tratar o processo de integração se refere à in-
serção de alunos com deficiência nas escolas regulares, mas também pode ser utilizada para
referir-se às classes especiais ou ainda, aos agrupamentos realizados em escolas especiais
para pessoas com deficiência. Já a inclusão requer a mudança da escola para acolher as
diferenças e necessidades de todos os alunos, considerando suas singularidades intelectuais,
culturais, sociais e físicas. Ela requer uma educação plural e democrática.

Nesse sentido, no paradigma da educação inclusiva

suprime-se a subdivisão dos sistemas escolares em modalidades de ensino


especial e de ensino regular. As escolas atendem às diferenças sem discriminar,
sem trabalhar à parte com alguns alunos, sem estabelecer regras específicas
para se planejar, para aprender, para avaliar (currículos, atividades, avaliação da
aprendizagem para alunos com deficiência e com necessidades educacionais
especiais). Pode-se, pois, imaginar o impacto da inclusão nos sistemas de ensino
ao supor a abolição completa dos serviços segregados da educação especial, dos
programas de reforço escolar, das salas de aceleração, das turmas especiais, etc.
(MANTOAN, 2003, p. 16)

Assim, muitos são os desafios postos para que a inclusão possa de fato ser consolidada nas escolas
e nos sistemas de ensino do país, pois o preconceito e a discriminação são elementos fortemente
presentes na sociedade.

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Saiba mais
Para aprofundar a discussão sobre Inclusão e integração assista a entre-
vista com Romeu Sassaki sobre Diversidade, Inclusão e Integração, aces-
sando o link http://www.youtube.com/watch?v=eWIgi2i1Nlo

1. 1  Os desafios para a efetivação da inclusão educacional


A inclusão escolar é um dos temas de grande amplitude na atualidade e envolve os professores, pais
e familiares, gestores, dentre tantos outros atores sociais que assumem posições distintas sobre a
inserção de crianças e jovens com deficiência nas escolas regulares, representando um grande de-
safio para a escola e para os sistemas de educação.

Um dos maiores desafios é superar a visão hierárquica historicamente construída sobre a diferença,
isto é, o padrão de normalidade que estigmatiza aqueles que não se enquadram aos modelos ho-
mogêneos estipulados como normais.

Esses padrões normativos instituídos socialmente, desconsideram as diferenças como elemento


constitutivo da própria condição humana, tratando-as como algo fixo e hierarquizando as questões
relativas à raça, cor, religião, e no caso das deficiências, trata-as como condição incapacitante.

Dessa forma, as diferenças foram consideradas historicamente como mecanismo de seleção e es-
tigmatização e grande parte das pessoas com deficiência acabaram ficando alijadas do processo de
escolarização regular, restringindo sua presença aos ambientes de suas residências ou no máximo
frequentando instituições específicas onde a segregação era a principal marca.

Assim, uma minoria de alunos que foram inseridos na escola regular, fruto do processo de integra-
ção, tiveram que passar por uma avaliação prévia para verificar se estavam aptos para adequarem-
-se ao contexto escolar e mesmo frequentando as salas comuns eram estigmatizados e tratados
não por seus nomes, mas pela sua deficiência como o aluno cego, o down, o surdo, etc.

Destarte, a escola brasileira acabou por ser produtora do insucesso, do fracasso e da evasão esco-
lar dos alunos que não se adequaram aos padrões homogêneos instituídos no processo de esco-
larização como o currículo, as metodologias, a organização dos espaços e tempos escolares e a
avaliação.

Nesse sentido, ela foi responsável pela marginalização de grupos rotulados por serem diferentes e
pelo fracasso e baixa autoestima daqueles que não conseguiam inserir-se ao tratamento e padrões
normativos presentes nas salas de aulas.

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Ressalta-se, que a educação inclusiva não se direciona apenas para as crianças e adolescentes com
deficiência, mas o conceito deve ser ampliado como o proposto pela Declaração de Salamanca,
que visa a inclusão de todos os alunos nas escolas regulares que serão transformadas em escolas
inclusivas, abraçando a diversidade e todo e qualquer tipo de diferença.

Nessa direção, Mantoan (2003, p. 33) enfatiza que a escola deve mudar para acolher as diferenças,
enfrentando variadas frentes de trabalho e tendo como tarefas centrais:

•• Recriar o modelo educativo escolar, tendo como eixo o ensino para todos.
•• Reorganizar pedagogicamente as escolas, abrindo espaços para que a cooperação, o
diálogo, a solidariedade, a criatividade e o espírito crítico sejam exercitados nas escolas,
por professores, administradores, funcionários e alunos, porque são habilidades mínimas
para o exercício da verdadeira cidadania.
•• Garantir aos alunos tempo e liberdade para aprender, bem como um ensino que não segrega
e que reprova a repetência.
•• Formar, aprimorar continuamente e valorizar o professor, para que tenha condições e
estímulo para ensinar a turma toda, sem exclusões e exceções.
Nesse sentido, a construção de uma escola inclusiva requer alterações nas práticas educativas de
caráter homogêneo presente na maior parte das salas de aulas, alterando-as para práticas que con-
templem as diferenças e o ensino para todos.

Os espaços educativos devem ser recriados, privilegiando o trabalho coletivo em detrimento das
tarefas individualizadas em que os alunos realizam atividades sozinhos em carteiras individuais,
pois a formação de grupos diversificados proporciona o compartilhamento de dificuldades, de res-
ponsabilidades e a capacidade de decisão, o que conduz à participação e ao aprendizado de todos.

Essa mudança estimula o reconhecimento da diversidade e das diferentes capacidades, promoven-


do a cooperação e a solidariedade, além do “convívio com as diferenças e a aprendizagem como
experiência relacional, participativa, que produz sentido para o aluno, pois contempla sua subjetivi-
dade, embora construída no coletivo das salas de aula” (MANTOAN, 2003, p. 15).

A afirmação do direito à diferença nas escolas “desconstrói, portanto, o sistema atual de significa-
ção escolar excludente, normativo, elitista, com suas medidas e seus mecanismos de produção da
identidade e da diferença” (idem).

As formas de avaliação presentes nas escolas também possuem um caráter excludente por serem
classificatórias, seletivas, baseadas em notas e provas, visando a promoção ou reprovação dos alu-
nos, exigindo na maior parte das vezes repetições, memorizações e reproduções de conhecimentos
sem significados para eles.

Dessa forma, as avaliações escolares devem priorizar uma visão diagnóstica voltada para a apren-
dizagem de todos os alunos e que considere situações problemas e competências para resolvê-las.

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A inclusão requer essas mudanças que em síntese envolvem a reorganização curricular, a revisão
das práticas pedagógicas homogeneizadoras, a mudança de metodologias que privilegiam o indi-
vidual ao invés do coletivo e as práticas avaliativas centradas na seletividade e classificação para
avaliações diagnósticas.

Para tanto, é preciso que os professores desenvolvam um olhar e uma escuta sensível sobre seus
alunos, considerando as diferenças como elemento de construção coletiva das relações entre pares
e não como instrumento de segregação e exclusão.

Nessa direção, a escola para alcançar a qualidade social da educação deverá ser capaz de:

aproximar os alunos entre si; tratar as disciplinas como meios de conhecer


melhor o mundo e as pessoas que nos rodeiam; e ter como parceiras as famílias
e a comunidade na elaboração e no cumprimento do projeto escolar. Tem-se
um ensino de qualidade a partir de condições de trabalho pedagógico que
implicam formação de redes de saberes e de relações, que se entrelaçam por
caminhos imprevisíveis para chegar ao conhecimento; existe ensino de qualidade
quando as ações educativas se pautam na solidariedade, na colaboração, no
compartilhamento do processo educativo com todos os que estão direta ou
indiretamente nele envolvidos (MANTOAN, 2003, p. 34).

Essas escolas baseadas no paradigma da inclusão, acolherão as diferenças e ofertarão o ensino


para todos, sem discriminações e sem práticas do ensino especializado, garantindo a aprendizagem
e a construção de pessoas autônomas e críticas, que valorizam a diversidade construída na convi-
vência entre alunos, professores, gestores, familiares e comunidade em geral.

Para Mantoan (2003. p.14)

A inclusão total e irrestrita é uma oportunidade que temos para reverter a situação
da maioria de nossas escolas, as quais atribuem aos alunos as deficiências que são
do próprio ensino ministrado por elas - sempre se avalia o que o aluno aprendeu,
o que ele não sabe, mas raramente se analisa “o que” e “como” a escola ensina, de
modo que os alunos não sejam penalizados pela repetência, evasão, discriminação,
exclusão, enfim.

Por isso, para que a inclusão seja uma realidade é preciso que se garanta “o acesso às salas regu-
lares (matrícula e frequência regular) e o acesso aos saberes acumulados pela humanidade a to-
dos, independentemente das dificuldades que possam apresentar durante a longa trajetória escolar”
(LOPES, 2017, p. 9).

Diante de todas essas mudanças é imprescindível que os professores e gestores revejam sua atua-
ção, incorporando novas aprendizagens, estratégias e práticas pedagógicas heterogêneas sintoni-
zadas com a diversidade social, cultural e econômica dos alunos e com os seus diferentes níveis de
aprendizagem, de desenvolvimento e de interesses.

Dentre as estratégias adotadas pelos professores, destaca-se uma rica ferramenta que se direciona
para a realização de práticas inclusivas: a adaptação curricular.

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Lopes (2017, p. 10) esclarece que a adaptação curricular “é uma das estratégias da educação inclusiva
que procura contribuir para a inclusão daqueles que apresentam dificuldades durante o processo de
ensino e aprendizagem, ou seja, daqueles que por razões diversas estão em desvantagem educacional”.

A autora acrescenta que ensinar utilizando as adaptações curriculares exige “responsabilidade da


equipe de gestão e dos professores, já que requer uma reflexão sobre o currículo oficial com seus
objetivos, habilidades, competências, conteúdos, atividades previstas, os quais deverão ser analisa-
dos antes, durante e depois das adaptações curriculares” (idem).

Assim, atividades escolares podem se tornar mais significativas aos alunos quando as adaptações
curriculares forem bem construídas, possibilitando a contextualização com os temas e conteúdos
ministrados aos outros alunos da turma.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
Constamos que a educação brasileira foi marcada por práticas excludentes e seletivas que acaba-
ram por rotular e segregar grande parte dos alunos que não se adequaram aos padrões normativos
presentes nos sistemas escolares, produzindo grandes índices de fracasso e evasão.

Durante longo período no país, crianças, jovens e adultos não conseguiram nem ter acesso à es-
colarização básica e com a universalização do ensino após os anos de 1990, uma nova questão
foi colada para as escolas, pois além do acesso e permanência é preciso garantir a efetivação da
aprendizagem de qualidade para todos os alunos, independentemente de suas condições físicas,
intelectuais, econômicas ou sociais.

Assim, o direito à educação para todos instituídos na Constituição de 1988, requer a modificação do
modelo de organização escolar, tendo como base o ensino para todos que priorize a diversidade e
a garantia do respeito às diferenças, necessidades, interesses e condições individuais de todos os
alunos presentes nas unidades escolares.

Por isso, a efetivação do direito à educação de qualidade para todos ainda representa um grande
desafio para os sistemas educativos de todo o país e o paradigma da educação inclusiva precisa
ser conhecido, discutido e incorporado por todos como elemento de garantia da qualidade social
da educação.

Dessa forma, é fundamental que se reconheça e valorize as diferenças para que se possa refletir e
implementar práticas educativas voltadas ao atendimento das necessidades dos alunos, respeitando
as variadas modalidades e ritmos de aprendizagens.

Como vimos, a inclusão escolar, não se resume ao atendimento de crianças e jovens com deficiên-
cias, mas abarca todos os alunos que possuem necessidades educativas específicas quer por fatores
culturais, sociais, intelectuais ou qualquer outro que requisite a adaptações pedagógicas.

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As adaptações consistem em estratégias da educação inclusiva visando atender as dificuldades de


aprendizagem dos alunos durante todo o processo educativo e voltam-se à reflexão sobre os obje-
tivos, conteúdos, metodologias, atividades, dentre outros aspectos presente no processo de ensino
e a aprendizagem.

Destarte, para que as adaptações de fato ocorram, é preciso reflexão por parte dos professores para
que estes alterem a sua prática, visando garantir um ensino para todos, sem nenhum tipo de exce-
ção ou exclusão.

A inclusão requer, portanto, a democratização do ensino e a garantia da igualdade de direitos e


oportunidades para todos.

Por isso, a formação de professores é fundamental e trataremos dos fundamentos, metodologia e


reflexões necessárias à formulação e prática das adaptações curriculares, visando oferecer conhe-
cimentos de como implementar na sala de aula essa estratégia.

MAPA MENTAL

REFERÊNCIAS
BRASIL, Ministério da Educação. Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação
Inclusiva. Brasília, DF: MEC, 2008.

BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Básica. Diretrizes Curriculares Nacionais da


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