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Mercosul: História, formulação e integração regional

Omar Vasconcellos Jacob Junior


Mestrando
Universidade Nova de Lisboa
Mestrado em Ciências Políticas e Relações Internacionais
Faculdade de Ciências Sociais e Humanas
Universidade Nova de Lisboa, Portugal
omarjacob@gmail.com
2

RESUMO

Nos últimos vinte anos o saldo da balança comercial do Mercosul, bloco econômico sul-
americano liderado pelo Brasil, teve um superávit expressivo. Em 1990 tinha um saldo
comercial de 18 bilhões de dólares. Em 2009, o resultado dobrou e superou de 36
bilhões de dólares. Para além dos quesitos políticos e econômicos o Mercosul
representou um avanço no papel negociador para seus Estados-parte. A integração
regional conferiu um peso nas negociações internacionais bem maior do que se os
países tivessem que se representar individualmente. É importante destacar que a
associação dos quatro membros, e depois de outros países associados, garantiu um papel
securitário o que conferiu ao grupo o compromisso com os processos democráticos bem
como com os princípios da não-agressão e da paz como instrumentos indissociáveis ao
desenvolvimento. Entretanto o otimismo deve dar lugar aos desafios que se colocam a
terceira década do mercado comum, sobretudo quanto ao seu papel na composição da
Unasul.

Palavras Chave: Integração Regional, América Latina, Mercosul, Unasul.

ABSTRACT
Over the past twenty years the trade balance of Mercosur, the South American trade
bloc led by Brazil, had an impressive surplus. In 1990 it had a trade surplus of 18 billion
dollars. In 2009, net income doubled and surpassed 36 billion dollars. Apart from
political and economic questions Mercosur represented a breakthrough in its negotiating
role for states parties. Regional integration given a weight in international negotiations
far greater than if countries were to be represented individually. Also, the combination
of the four state members, and other associated countries, ensured the security role that
gave the group a commitment to democratic processes, instituions and with the
principles of non-aggression and peace as inseparable from the development tools. Yet
optimism must give space to the challenges facing the third decade of the common
market, particularly concerning its role in the formation of Unasur.

Key-Words: Regional Integration, Latin America, Mercosur, Unasur.


3

Sumário

Introdução .................................................................................................................................... 4
Contexto Global......................................................................................................................... 5
O Integracionismo na América Latina ....................................................................................... 5
O Mercado Comum do Sul ........................................................................................................... 8
Estrutura .................................................................................................................................... 8
Conselho do Mercado Comum ......................................................................................... 9
Grupo do Mercado Comum............................................................................................ 10
Comissão de Comércio do Mercosul .............................................................................. 10
Parlamento do Mercosul ................................................................................................ 10
Foro-Consultivo Econômico Social ................................................................................. 11
Secretaria do Mercosul .................................................................................................. 11
Tribunal Permanente de Revisão ................................................................................... 11
Tribunal Administrativo Trabalhista ............................................................................... 11
Centro Mercosul de Promoção do Estado de Direito .................................................... 12
Primeira década do Mercosul: 1991 a 2000 ........................................................................... 12
Segunda década do Mercosul: 2001 a 2010 ........................................................................... 13
Um Balanço do Mercosul em suas duas primeiras décadas ..................................................... 17
Bibliografia .................................................................................................................................. 20
4

1. Introdução
1.1 Contexto global
A organização político-econômica dos séculos XX e XXI tem exigido as nações
cada vez mais empenho seja para superar as constantes crises financeiras, seja para
projetar-se nos mercados mundiais.

“O progressivo aumento dos membros da comunidade internacional e a variedade de


interesses políticos, econômicos e sociais que ele trouxe levaram os Estados a criar
formas associativas em áreas geopolíticas, espontaneamente definidas pela afinidade de
interesses e problemas com o fim de alcançar seus objetivos comuns, mais facilmente
asseqüíveis num contexto homogêneo, baseado em razões políticas, econômicas,
sociais, geográficas ou mesmo étnicas e religiosas.” (BOBBIO, MALTEUCI,
PASQUINO, 2009, p. 855)

Neste cenário as organizações regionais surgem como instrumento essencial,


especialmente para nações que ainda lutam para conquistar seu espaço político na arena
global. Por integração regional entende-se: “um processo dinâmico de intensificação em
profundidade e abrangência das relações entre atores levando à criação de novas
formas de governança político-instituicionais de escopo regional” (HERZ, HOFFMAN,
2007, p. 168).

Os movimentos de integração regional tiveram dois momentos de maior


intensidade em todo o mundo. O primeiro período realizou-se no pós-segunda guerra
mundial. Foi então que se observa o surgimento de várias instituições em todos os
continentes. Na Europa, são criadas a Organização Européia de Cooperação Econômica
(OCDE), a Comunidade Européia do Carvão e do Aço (CECA); nas Américas surgem:
a Organização dos Estados Americanos (OEA), a Associação Latino Americana de
Livre-Comércio (ALALC); na Ásia se estabelecem a Organização do Tratado do
Sudeste Asiático (SEATO) e a Associação das Nações do Sudeste Asiático (ASEAN);
na África são criadas a Organização das Nações Africanas (OUA) e a Comunidade
Econômica dos Estados da África Ocidental (ECOWAS); no Oriente Médio surge a
Liga dos Estados Árabes e a Organização dos Países Exportadores de Petróleo (OPEP)
são alguns exemplos. 1

Esta primeira onda de regionalismo, por todos os continentes, ficou conhecida


como regionalismo fechado. Nesta modalidade os países promovem o protecionismo no
1
HERZ, Mónica; HOFFMAN, Andrea Ribeiro, Organizações Internacionais, História e prática,
Rio de Janeiro, Elsevier Editora Ltda, 2004
5

nível regional que vai de encontro com o regime de comércio defendido pela
Organização Mundial do Comércio (OMC). Neste período acreditava-se que os países
menos desenvolvidos não tinham condições de competir em igualdade com as nações
desenvolvidas.2

Na década de 1970 as crises do terceiro mundo e a crise econômica global


desaceleraram o processo de integracionismo. Países como os Estados Unidos e a
Inglaterra se engajaram neste período para quebrar o paradigma protecionista que
norteava os mercados mundiais. Na segunda metade da década de 1980 a economia
mundial volta a ganhar fôlego e surge uma nova onda de regionalismo em todo o globo,
também impulsionados pelo fim da guerra fria e pelo colapso da União das Repúblicas
Socialistas Soviéticas (URSS).3

Boa parte das organizações regionais existentes foram revigoradas e outras


ganharam uma nova roupagem. Foi o caso da União Européia, oficializada em 1992.
Entretanto novas entidades também surgiram, como o Acordo de Livre-Comércio da
América do Norte (NAFTA), o Mercado Comum do Sul (Mercosul) e a União Africana
(AU). Desta vez o mote das organizações e movimentos regionais não é o
protecionismo.4 Ao contrário do regionalismo fechado, o chamado regionalismo aberto
“é visto como uma etapa intermediária para a liberalização econômica multilateral e não
como um fim em si mesmo. É portanto, complementar ao regime de comércio
promovido pelo GATT/OMC” (HERZ, HOFFMAN, 2007, p. 175).

Neste período o principal objetivo destas organizações era de uma melhor


inserção no contexto da globalização econômica. Além de passarem a liberalizar os
processo intra-regionais, os blocos também passaram a associar-se em liberalização
extra-regional. Um exemplo são os acordos econômicos entre a União Européia e o
Mercosul. Neste contexto, os Estados Unidos foram os principais promotores do novo
regionalismo.5

2
Ibidem
3
Ibidem
4
Ibidem
5
Ibidem
6

1.2 O integracionismo na América Latina

A primeira idéia integracionista na América Latina já registrada deve-se a Simón


Bolívar. O líder político sul-americano do século XVIII expressou na Carta da Jamaica,
um texto de referência do programa bolivariano de emancipação da América, o desejo
de criar três federações no continente e conectar México e América Central; uma ao
norte e outra ao sul da América do Sul.6

Bolívar reiterou sua intenção no primeiro Congresso Americano, realizado no


Panamá em 1826. Nesta altura a sugestão era uma estratégia para garantir a
independência das recém-formadas nações sul-americanas tanto contra o retorno do
domínio espanhol, quanto do expansionismo norte-americano que em 1823 declarou a
Doutrina Monroe. Entretanto a idéia não foi levada adiante principalmente por que os
Estados nacionais da América Latina ainda estavam em formação, além do que o Brasil,
que teve um processo de independência completamente diferenciado dos demais
vizinhos, não aderiu à proposta.7

O processo de formação das nações sul-americanas e suas ideologias econômicas


pode explicar as dificuldades em uma associação regional neste período. Segundo
Senhoras (2009), desde o momento de suas independências no século XIX, os países
sul-americanos teriam suas economias voltadas para o ciclo internacional de comércio e
seus financiamentos, tanto privados, quanto públicos, eram prioritariamente externos. O
economista e cientista político também diz que “todos os grandes ciclos de
endividamento e colapso financeiro [na região] terminaram em episódios de crises
cambiais, moratórias e um endividamento ainda maior devido ao padrão de inserção
internacional” (Senhoras, 2009, pp. 34). O autor também elaborou um quadro onde
explicita os ciclos de endividamento na região:

6
BOLÍVAR, Simón. Carta de Jamaica. Barcelona, Linkgua ediciones S.L.: 2007.
7
HERZ, Mónica; HOFFMAN, Andrea Ribeiro, Organizações Internacionais, História e prática,
Rio de Janeiro, Elsevier Editora Ltda, 2004
7

Figura 1 - Ciclos de Endividamento na América do Sul (Senhoras, 2009, p. 34)

Na década de 1940, antes da guerra européia ter se convertido em um conflito


mundial, surgiu uma primeira tentativa de união aduaneira entre Brasil e Argentina. O
então projeto foi descontinuado em função dos itinerários político-militar diversos e
também por conta da baixa intercomplementaridade industrial e do caráter de seus
acordos internacionais terminaram por inviabilizar o tratado. Na década de 1950 o
governo de Juan Domingo Perón renovou os votos do pacto, incluindo desta vez o Chile
no acordo conhecido como “pacto ABC”. A iniciativa mais uma vez não logrou êxito
graças as disparidades de orientação diplomática entre os governos dos três países. 8

Concomitantemente e, sob o legado da doutrina do pan-americanismo criado


pelos Congressos Americanos, além da forte influência norte-americana, foi criada em
1948 a Organização dos Estados Americanos (OEA) e pouco mais de uma década
depois a Associação Latino-Americana de Livre-Comércio (ALALC) em 1960. Foi a
ALALC e sua ideologia de que a integração deveria ser implementada inicialmente na
esfera econômica que efetivaram o novo conceito na região, nos moldes funcionalistas
em que também era galgada a futura União Européia. No mesmo período a organização
da Comissão Econômica para a América Latina (CEPAL) criada pelo Conselho
Econômico e Social (ECOSOC) da ONU pregava a substituição das importações e a

8
ALMEIDA, Paulo R. de. Mercosul em sua primeira década (1991-2001): uma avaliação
política a partir do Brasil. Buenos Aires: INTAL-ITD-STA, 2002.
8

integração regional como estratégia para o desenvolvimento econômico dos países mais
atrasados.9

Muito embora os países do cone-sul da América do Sul tenham participado da


ALALC, os signatários não fizeram dela sua prioridade o que resultou no fracasso da
instituição e de sua substituta, a Associação Latino-Americana para o Desenvolvimento
de Integração (ALADI), que substituiu a ALALC em 1980.10 O avanço dos processos
democráticos tanto na Argentina, quanto no Brasil e o sucesso do processo da
comunidade européia incitaram os dois países a retomarem o projeto integracionista,
também graças aos processos de redemocratização que ocorria nas duas nações. Os dois
Estados sempre aparecem em destaque no cenário econômico regional por que “sempre
realizaram a maior parte das transações comerciais operadas ao abrigo dos acordos
preferenciais da ALALC” (Almeida, 2002, p. 3).

Foram os presidentes recém-eleitos Raul Alfonsín (Argentina) e Tancredo Neves


no Brasil que recuperaram o antigo desejo de construir uma união no cone sul da
América do Sul. Apesar da morte de Tancredo Neves em abril de 1985, seu sucesso,
José Sarney, deu continuidade ao projeto de integração bilateral. Uma série de acordos e
tratados entre os dos atores ganhou lugar nos anos seguintes até que em 1990 o acordo
conhecido como Declaração de Buenos Aires criou o „Grupo Mercado Comum‟ que
ficou encarregado de criar um projeto concreto para implementar um mercado comum.11

Ao mesmo tempo no hemisfério norte o comércio entre Estados Unidos e Canadá


passa por um novo ciclo, graças ao acordo de livre-comércio formulado entre os dois
Estados e que, posteriormente com a inclusão do México, daria origem ao NAFTA. Na
Europa o Ato Único Europeu, em 1986 criou a perspectiva do surgimento uma muralha
comercial na região. Somado a estes acontecimentos, e a dificuldade das negociações
sobre os subsídios agrícolas na Rodada Uruguai no GATT (que posteriormente se
converteria na OMC) teriam papel fundamental na formação do Mercosul. Apesar,
então, dos primeiros passos terem sido tomados bilateralmente, posteriormente Paraguai

9
HERZ, Mónica; HOFFMAN, Andrea Ribeiro, Organizações Internacionais, História e prática,
Rio de Janeiro, Elsevier Editora Ltda, 2004
10
ALMEIDA, Paulo R. de. Mercosul em sua primeira década (1991-2001): uma avaliação
política a partir do Brasil. Buenos Aires: INTAL-ITD-STA, 2002.
11
HERZ, Mónica; HOFFMAN, Andrea Ribeiro, Organizações Internacionais, História e prática,
Rio de Janeiro, Elsevier Editora Ltda, 2004
9

12
e Uruguai aderiram ao projeto. Durante seis meses, entre 1990 e 1991, os quatro
países negociaram os termos da futura associação até que em 26 de março de 1991 foi
assinado o termo plurilateral de integração, também conhecido como Tratado de
Assunção. Nele ficou estabelecida a reciprocidade entre os signatários bem como sua
igualdade de direitos e obrigações, a despeito da diferença de peso político e comercial
de seus membros. O novo bloco, nesta altura, tinha como nome oficial “Tratado para a
constituição de um mercado comum” entre Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai.13

2. Mercado Comum do Sul (MERCOSUL)

2.1 Estrutura

O Tratado de Assunção, assinado em março de 1991, tinha como caráter


fundamental estabelecer o Mercado Comum do Sul que, portanto tinha nome oficial de
um tratado. Os principais objetivos eram:

 Estabelecer uma tarifa externa comum (TEC);


 Eliminar os direitos alfandegários e restrições não tarifárias à circulação de
mercadorias;
 Coordenar políticas macro-econômicas e setoriais para os países membros;
 Harmonizar as legislações para fortalecer o processo de integração14

Para atingir tais resultados o Tratado de Assunção instituiu:

 “Um Regime Geral de Origem, um sistema de controvérsias e Cláusulas


de Salvaguarda;
 Um programa de liberalização comercial progressivo, com o intuito de se
obter tarifa zero para todo o comércio intrabloco, até 31 de dezembro de
1994;
 A coordenação das políticas macroeconômicas da região;

12
ALMEIDA, Paulo R. de. Idem
13
ALMEIDA, Paulo R. de. Mercosul em sua primeira década (1991-2001): uma avaliação
política a partir do Brasil. Buenos Aires: INTAL-ITD-STA, 2002.
14
PAMPLONA, João Batista, FONSECA, Juliana Fernanda Alves da. Avanços e recuos do
Mercosul: um balanço recente de seus objetivos e resultados. CADERNOS PROLAM/USP. São
Paulo, Ano 7, Volume 2, p. 7-23: 2008.
10

 Listas de exceções aos produtos sensíveis da economia de cada país ao


programa de liberalização comercial;
 A adoção de acordos setoriais;
 Uma TEC com o objetivo de aumentar a competitividade dos países-
membros por meio de políticas comerciais e investimentos conjuntos.”
(PAMPLONA, FONSECA, 2008, p. 9-10)

Além disto, os quatro países também optaram pelo caráter intergovernamental15 (o


que exige unanimidade na tomada de decisões) ao invés de uma institucionalidade
supranacional e mantiveram aberta a possibilidade de novos países membros da ALADI
aderirem ao bloco em formação. Um aspecto fundamental do documento original do
acordo foi o compromisso de estabelecer efetivamente o Mercado Comum do Sul até 31
de dezembro de 1994.

Apesar dos interesses políticos da integração regional, o Tratado de Assunção só


assegurou compromissos econômicos. Para além destas questões, como ressalta Herz,
Hoffmann (2004) as nações-parte do tratado foram gradativamente dando importância
ao caráter democrático de seus membros. Este fato ganhou relevância graças a
instabilidade política no Paraguai, que em abril de 1996 sofreu uma tentativa de golpe
militar, e levou os demais membros a buscarem garantias para institucionalizar o
compromisso democrático. Foi então através do protocolo de Ushuaia em julho de
1998, incorporado ao Tratado de Assunção, que ficou garantido a plena adesão aos
princípios e as instituições democráticas, estados de direito e ao respeito aos direitos
humanos e as liberdades fundamentais.

Uma série de outros protocolos marcaram o ajustamento do Mercosul,


notadamente o Protocolo de Brasília (1991), que dirimiu controvérsias, o Protocolo de
Ouro Preto (1994) que desenhou sua estrutura institucional e estabeleceu sua
personalidade jurídica e o Protocolo de Olivos que criou a Corte Permanente de Solução
de Controvérsias.16

15
Modelo também adotado na União Européia e que destina-se a satisfazer as necessidades
criadas pela associação através da colaboração e associação. Se levadas a cabo este modelo
pode levar os Estados constituintes a avançar para um novo grau de complexidade de relações
(EVANS, NEWNHAM, 1998).
16
HERZ, Mónica; HOFFMAN, Andrea Ribeiro, Organizações Internacionais, História e prática,
Rio de Janeiro, Elsevier Editora Ltda, 2004
11

Os principais órgãos do Mercosul são o Conselho do Mercado Comum (CMC), o


Grupo do Mercado Comum (GMC), a Comissão de Comércio do Mercosul (CCM),
Parlamento do Mercosul (PM), o Foro Consultivo Econômico-Social (FCES), a
Secretaria do Mercosul (SM), o Tribunal Permanente de Revisão do Mercosul (TPR), o
Tribunal Administrativo-Trabalhista do Mercosul (TAL) e o Centro Mercosul de
Promoção do Estado de Direito (CMPED).

2.1.1 Conselho do Mercado Comum (CMC)

Este é o principal órgão e tem poderes legislativos sobre o bloco. Entretanto suas
decisões precisam ser ratificadas pelos parlamentos dos Estados-membro. O conselho
detém a personalidade jurídica do Mercosul e pode estabelecer negociações com ou
países ou associações extra-bloco. É composto por ministros das relações exteriores e de
economia dos estados-parte que alternam a presidência a cada seis meses, num esquema
denominado pro tempore. Seu funcionamento é articulado entre a Reunião de Ministros,
Foro de Consulta e Concertação Política, Reunião de Altas Autoridades na Área de
Direitos Humanos, Comissão de Coordenação de Ministros de Assuntos Sociais do
Mercosul, Comissão de Representantes Permanentes do Mercosul e de vários grupos de
trabalho, alto-nível e ad-hoc.17

2.1.2 Grupo do Mercado Comum (GMC)

Tem poder executivo, mais iniciativa legislativa já que prepara a agenda do


Conselho. É composto pelos ministros de relações exteriores e de economia, além dos
presidentes dos Bancos Centrais dos Estados-parte e emite resoluções, por consenso, em
caráter recomendatório. Trabalha a partir do resultado de uma série de subgrupos de
militar, reuniões especializadas, grupos ad-hoc, observatórios, instituto, e comitês. As
áreas temáticas abordadas pelo Grupo são: comunicações, aspectos institucionais,
regulamentos técnicos e avaliações da conformidade, assuntos financeiros, transportes,
meio ambiente, indústria, agricultura, energia e mineração, assuntos laborais, emprego e

17
PORTAL OFICIAL DO MERCOSUL, Estrutura Institucional, disponível em
<http://www.mercosur.int/t_generic.jsp?contentid=493&site=1&channel=secretaria&seccion=2>
Acesso em 22/12/10.
12

segurança social, saúde, investimentos, comércio eletrônico e acompanhamento da


conjuntura econômica e comercial.18

2.1.3 Comissão de Comércio do Mercosul (CCM)

A principal função da Comissão de Comércio é divulgar e monitorar a aplicação


da política comercial comum e recebe “... inclusive reclamações do [sic] Estados-parte a
esse respeito e [pode] emitir diretrizes, de caráter obrigatório, ou propostas, ambas por
consenso.” (HERZ, HOFFMAN, 2007. pp 206). É composto por comitês técnicos de
tarifas, nomenclaturas e classificação de mercadorias; assuntos aduaneiros; normais e
disciplinas comerciais; políticas públicas que distorcem a competitividade; defesa da
concorrência; estatística de comércio exterior do Mercosul; defesa do consumidor e
também pelo comitê de defesa comercial e salvaguardas. 19

2.1.4 Parlamento do Mercosul (PM)

Foi constituído em 6 de dezembro de 2006 em substituição à Comissão


Parlamentar Conjunta. Tem entre seus objetivos principais velar pela preservação do
regime democrático entre os Estados-parte; propor projetos de normas do bloco para
consideração do Conselho do Mercado Comum; Elaborar estudos e anteprojetos de
normas nacionais; elaborar, aprovar e monitorar o orçamento do Mercosul, além de
aprovar e modificar seu Regulamento Interno. É formado por dez comissões
permanentes que atuam em várias áreas, onde atuam parlamentares que estejam
cumprindo seus mandatos em seus Estados-parte.20

2.1.5 Foro Consultivo Econômico-Social (FCES)

Foi criado como órgão de representação da sociedade civil. A idéia é que o Foro
funcionasse como um representante de trabalhadores, empresários e consumidores. Tem
a competência de acompanhar, analisar e avaliar as implicações econômicas e sociais
derivadas das políticas destinadas ao processo de integração, bem como de suas diversas
fases de implementação tanto em níveis setoriais, regionais e nacionais. Também tem a

18
HERZ, Mónica; HOFFMAN, Andrea Ribeiro, Organizações Internacionais, História e prática,
Rio de Janeiro, Elsevier Editora Ltda, 2004.
19
PORTAL OFICIAL DO MERCOSUL, ibidem.
20
PARLAMENTO DO MERCOSUL, Sobre o parlamento. Disponível em
<http://www.parlamentodelmercosur.org/innovaportal/v/4300/1/secretaria/Sobre_o_Parlamento.
html?seccion=2> Acessado em 22/12/2010.
13

possibilidade de recomendar normas e políticas econômicas e sociais em matéria de


integração.21

2.1.6 Secretaria do Mercosul (SM)

Até 2002 teve como funções principais o arquivo de documentos oficiais do bloco
e o apoio ao Grupo do Mercado Comum (GCM), bem como a publicação das normas
aprovadas pelos órgãos decisórios. Tem também a atribuição de informar regularmente
os Estados-parte sobre a incorporação das normas aprovadas e de outras tarefas
solicitadas pelos outros órgãos do Mercosul. A Secretaria está localizada em
Montevidéu, no Uruguai, e tem um diretor de caráter administrativo, eleito pelo GMC
para um mandato de dois anos, sem possibilidade de reeleição, além de um corpo de 40
funcionários (até 2010).22

2.1.7 Tribunal Permanente de Revisão do Mercosul (TPR)

O Tribunal foi criado em 2004 através do protocolo de Olivos como estratégia


para mediar os conflitos no bloco. O sistema incorporou metodologias já utilizadas
desde 1993, com a incorporação do Protocolo de Brasília ao Tratado de Assunção. O
tribunal é composto pelas três etapas já existentes: negociação direta, conciliação e
arbitragem, além de incorporar o tribunal permanente de revisão. O tribunal é composto
de três a cinco árbitros, escolhidos a partir de uma lista disponível na SM e elaborada
em conjunto pelos Estados-parte. Apesar dos avanços com o protocolo de Olivos, a
principal crítica é a de que o tribunal manteve caráter arbitral e não com juízes
permanentes.23

2.1.8 Tribunal Administrativo-Trabalhista do Mercosul (TAL)

O Grupo Mercado Comum (GMC) estabeleceu através de uma resolução em 2003


a criação deste tribunal para solucionar as reclamações administrativo-trabalhistas dos
funcionários da Secretaria do Mercosul, bem como das pessoas contratadas para
execução de tarefas vinculadas ao bloco. O TAL é formado por quatro membros

21
HERZ, Mónica; HOFFMAN, Andrea Ribeiro, Organizações Internacionais, História e prática,
Rio de Janeiro, Elsevier Editora Ltda, 2004.
22
PORTAL OFICIAL DO MERCOSUL, A Secretaria do Mercosul. Disponível em <
http://www.mercosur.org.uy/show?contentid=46&channel=secretaria> Acesso em 22/12/10.
23
HERZ, Mónica; HOFFMAN, Andrea Ribeiro. Ibidem.
14

titulares e quatro suplentes indicados pelo GMC por um período de até dois anos,
renováveis por igual período. O tribunal atua essencialmente na sede da SM. 24

2.1.9 Centro Mercosul de Promoção do Estado de Direito (CMPED)

Também criado pelo GMC, através do decreto 24/04, instituiu o Centro Mercosul
de Promoção do Estado de Direito com o objetivo de analisar o desenvolvimento de
cada Estado-parte, a governabilidade democrática e aos aspectos de integração regional,
nomeadamente com relação ao Mercosul. Para tanto realiza trabalhos de pesquisa,
conferências, seminários, foros, publicações, bem como reuniões entre acadêmicos,
representantes governamentais e da sociedade civil. Também tem a missão de oferecer
cursos de capacitação, programas de intercâmbio, assim como ofertar bolsas de estudo e
de abrigar uma biblioteca física e virtual especializada. Sua sede tem lugar no Tribunal
Permanente de Revisão (TPR) na cidade de Assunção, no Paraguai.25

A estrutura funcional do Mercosul vem sofrendo alterações e acréscimos desde a


sua instituição oficial (com o Protoloco de Olivos em 1994) seja por meio de cimeiras
entre seus Estado-parte, seja por meio de decretos e resoluções do Grupo do Mercado
Comum.

2.2 Primeira década do Mercosul: 1991 a 2000

O professor e diplomata Paulo Roberto de Almeida (2002) pontua que os


primeiros dez anos após a assinatura do Tratado de Assunção foram pontuados por
diferentes momentos de avanços e retrocessos. No período compreendido entre 1991 e
1994, estabelecido na carta magna do bloco, os quatro países membro deveriam
constituir um mercado comum e que deveria ser caracterizado, como já mencionado,
pela livre circulação de bens, serviços e fatores produtivos, pela coordenação de
políticas macroeconômicas, assim como o compromisso dos Estados-parte de
harmonizar suas legislações nas áreas pertinentes. Entretanto, estes objetivos não foram
atingidos na sua totalidade até o prazo estipulado pelo Tratado de Assunção, ou seja, 31
de dezembro de 1994. Quanto à livre circulação de bens, serviços e fatores produtivos

24
MERCOSUL. Solução de Controvérsias no Mercosul. Disponível em <
http://www.mercosur.int/innovaportal/types/file/downloadfilecontent.jsp?contentid=681&site=1&c
hannel=secretaria> Acesso em 22/12/10.
25
MERCOSUL. CMC/DEC. N°24/04: Criação do Centro Mercosul de Promoção do Estado de
Direito.
15

intra-bloco as metas foram atingidas parcialmente, por que vários produtos foram
incluídos em uma lista de exceções.26

Mesmo com estes entraves o comércio regional deu seus primeiros sinais de
avanço. Como é possível observar na Tabela 1, o comércio intra-bloco nos primeiros
quatro anos foram de crescimento expressivo. O volume negociado saltou de U$ 10.032
milhões em 1991 para U$ 23.671 milhões em 1994, o que representa um crescimento
aproximado de 132%. A média de crescimento do volume negociado foi de 30% ao ano
neste período.27 Em janeiro de 1995 foi implementada Tarifa Externa Comum (TEC)
que marcou a passagem do Mercosul de uma área de livre-comércio para o de uma
união aduaneira.

Entretanto, assim como o regime tarifário para o comércio intra-bloco tem


exceções e por isso, segundo HERZ e HOFFMANN (2004) é considerado uma união
aduaneira imperfeita.28 ALMEIDA (2002) pontua, contudo, que nesta altura uma parte
expressiva do comércio intra-regional era composto por produtos do setor
automobilístico (automóveis e peças) que permaneceram à margem da zona de livre-
comércio nos primeiros onze anos do bloco. No período posterior a 1995 foi
estabelecido um programa para o acabamento dos objetivos do Tratado de Assunção,
denominado “Mercosul 2000”. No mesmo ano a União Européia assinou um acordo
com o grupo estabelecendo perspectivas para uma futura área de livre comércio inter-
regional.

26
ALMEIDA, Paulo R. de. Mercosul em sua primeira década (1991-2001): uma avaliação política a partir
do Brasil. Buenos Aires, INTAL-ITD-STA: 2002.
27
PAMPLONA, João Batista, FONSECA, Juliana Fernanda Alves da. Avanços e recuos do Mercosul: um
balanço recente de seus objetivos e resultados. CADERNOS PROLAM/USP. São Paulo, Ano 7, Volume 2,
p. 7-23: 2008.
28
Na união aduaneira perfeita as barreiras comercias estão totalmente eliminadas entre os países
membros, bem como suas políticas comerciais harmonizadas em relação a terceiros o que é diferente
do que acontece com o Mercosul, que conta com uma lista de exceções para estes casos.
16

TABELA 1 - Desempenho Comercial do Mercosul (em US$ milhões) - 1990 a


1995

1990 1991 Var. % 1992 Var. % 1993 Var. %

Comércio Intra-
7.834 10.032 28,05% 14.477 44,31% 19.081 32%
Zona

Comércio Extra-
Zona
65.833 68.026 3,33% 74.437 9,42% 80.863 9%

Comércio Total 73.667 78.058 5,96% 88.914 13,91% 99.944 12%

1994 Var. % 1995 Var. %


Comércio Intra-
23.671 24% 28.372 20%
Zona
Comércio Extra-
96.526 19% 117.895 22%
Zona

Comércio Total 120.197 20% 146.267 22%


Tabela 1 - Desempenho Comercial do Mercosul (em U$ milhões) – 1990 a 1995. Elaboração própria com base
no CEI (2010), citando INDEC, SECEX, Secretaria Administrativa do Mercosul, Banco Central do Uruguai e
Banco Central do Paraguai.

Entre 1997 e 1998 uma crise financeira atingiu os chamados Tigres Asiáticos
(Hong-Kong, Coréia do Sul, Singapura e Taiwan) impactou diretamente sobre os
avanços do Mercosul. Em decorrência do choque de competitividade no mercado
externo tanto sobre Brasil como Argentina, a TEC terminou por ser revista em uma
reunião do CMC.29 Os anos seguintes foram tensos na seara política, em especial devido
as declarações do então ministro da economia argentina, Domingo Felipe Cavallo, no
sentido de fazer o Mercosul retroceder a um status de zona de livre-comércio.

A estes fatos soma-se a crise financeira também vivida pelo Brasil, quando da
desvalorização de sua moeda, em janeiro de 1999. É possível observar uma
desaceleração do crescimento do comércio intra-bloco entre 1997 e 1999 na Tabela 2.
Entre 1995 e 1997 as negociações regionais cresciam 20% ao ano até que entre 1998 e
1999 o comércio não estagnou como diminui consideravelmente. “O Mercosul passou a
viver, a partir de 1999, uma “crise de identidade” que influiu gravemente no seu modo
de funcionamento e nas relações entre os países membros, sobretudo entre seus dois
principais sócios” (ALMEIDA, 2002, p. 25).

É importante ressaltar que neste período, mais precisamente na reunião do CMC


de Buenos Aires, em 1996 e 1997, foram assinados os acordos de Associação do Chile e
29
ALMEIDA, Paulo R. de. Mercosul em sua primeira década (1991-2001): uma avaliação política a partir
do Brasil. Buenos Aires, INTAL-ITD-STA: 2002.
17

da Bolívia, respectivamente, ao Mercosul. Os acordos de livre-comércio estabeleceram


que em 10 anos as duas nações passariam a fazer parte de uma área de livre-comércio
com o Mercosul, sem contudo participar da união aduaneira ou do mercado comum em
formação, com status de país associado.

Paralelamente, em 1998 ficou estabelecido um acordo de liberalização do


comércio entre os países do Mercosul e da Comunidade Andina, que reforçou o
conceito de regionalização da política externa do bloco e relançou a idéia bolivariana de
construir uma zona de livre comércio na América do Sul. Considerando este quadro, em
15 de dezembro de 2000 Bolívia e Chile assinaram a Declaração Presidencial sobre a
Convergência Macroeconômica, através do qual formalizaram metas e mecanismos de
convergência, num contexto de relançamento do próprio Mercosul.30

TABELA 2 - Desempenho Comercial do Mercosul (em US$ milhões) - 1996 a 2000

1996 Var. % 1997 Var. % 1998 Var. %


Comércio Intra-
Zona
34.149 20,36% 41.241 20,77% 41.443 0%
Comércio Extra-
124.131 5,29% 139.817 12,64% 136.948 -2%
Zona
Comércio Total 158.280 8,21% 181.058 14,39% 178.391 -1%

1999 Var. % 2000 Var. %


Comércio Intra-
Zona
31.247 -25% 35.137 12%
Comércio Extra-
124.100 -9% 136.083 10%
Zona
Comércio Total 155.347 -13% 171.220 10%
Tabela 2 - Desempenho Comercial do Mercosul (em U$ milhões) – 1996 a 2000. Elaboração própria com base
no CEI (2010), citando INDEC, SECEX, Secretaria Administrativa do Mercosul, Banco Central do Uruguai e
Banco Central do Paraguai.

2.3 Segunda década do Mercosul: 2001 a 2010


Em julho de 2001 o CMC criou um “grupo de alto nível” para examinar a
dispersão dos objetivos do bloco, bem como os problemas relativos a TEC. O grupo,
denominado Grupo de Reflexão Prospectiva, era formado por acadêmicos, empresários
e membros do governo dos Estados-parte elaborou um conjunto de sugestões que foram

30
PAMPLONA, João Batista, FONSECA, Juliana Fernanda Alves da. Avanços e recuos do Mercosul: um
balanço recente de seus objetivos e resultados. CADERNOS PROLAM/USP. São Paulo, Ano 7, Volume 2,
p. 7-23: 2008.
18

apresentadas na 26 ª reunião do Conselho do Mercado Comum e na Conferência de


Cúpula de Chefes de Estado, ambas realizadas em Brasília em dezembro do mesmo
ano.31 O relatório sugeria consolidação da união aduaneira, aprimoramento da estrutura
institucional do Mercosul, incorporação dar normas ao direito interno, a integração
fronteiriça, coordenação de políticas macroeconômicas, fortalecimentos dos laços
comerciais com mercados emergentes e a conclusão de um acordo de livre-comércio
com a Comunidade Andina32.

Em 2002 e 2003 Luis Inácio Lula da Silva e Nestor Kirchner assumiram a


presidência do Brasil e da Argentina, respectivamente. Ambos tiveram como meta
prioritária no plano da política externa, fortificar a integração regional, nomeadamente
os esforços para manutenção e avanço do Mercosul. A partir da nova concepção é
possível observar uma melhora expressiva do volume de negócios intra-bloco, como
demonstra a Tabela 3 a partir de 2003. Entre 2001 e 2005 o comércio saiu de US$
30.483 milhões para US$ 42.435 milhões, um crescimento de cerca de 40%.

TABELA 3 - Desempenho Comercial do Mercosul (em US$ milhões) - 2001 a


2005

2001 Var. % 2002 Var. % 2003 Var. %


Comércio Intra-
30.483 -13% 20.594 -32,44% 25.783 25%
Zona
Comércio Extra-
138.347 2% 127.991 -7,49% 146.459 14%
Zona

Comércio Total 168.830 -1% 148.585 -11,99% 172.242 16%

2004 Var. % 2005 Var. %


Comércio Intra-
34.913 35% 42.435 22%
Zona
Comércio Extra-
191.662 31% 230.712 20%
Zona
Comércio Total 226.576 32% 273.147 21%
Tabela 3 - Desempenho Comercial do Mercosul (em U$ milhões) – 2001 a 2005. Elaboração própria com base
no CEI (2010), citando INDEC, SECEX, Secretaria Administrativa do Mercosul, Banco Central do Uruguai e
Banco Central do Paraguai.

31
HERZ, Mónica; HOFFMAN, Andrea Ribeiro, Organizações Internacionais, História e prática,
Rio de Janeiro, Elsevier Editora Ltda, 2004.
32
A Comunidade Andina das Nações (ou Comunidad Andina de Naciones, CAN) é um bloco
econômico da América do Sul, paralelo ao Mercosul, dos quais fazem parte Bolívia, Colômbia,
Equador e Peru. Chile e Venezuela deixaram o bloco respectivamente em 1977 e 2006.
19

“O período que se iniciou no primeiro semestre de 2003 abriu, segundo INTAL (2004, p. 65),
„uma janela de oportunidade para a agenda interna do Mercosul‟. A convergência das políticas
cambiais, a retomada do crescimento econômico na região e a posse de presidentes claramente
favoráveis ao Mercosul deram origem a um clima propício aos entendimentos entre os países-
membros.” (PAMPLONA, FONSECA, 2008, p. 20)

No decorrer dos anos seguintes a maior parte dos temas da agenda central do
Mercosul avançou, como a coordenação das políticas macroeconômicas, a TEC (ainda
que de forma tímida graças as constantes prorrogações da lista de exceções), sem contar
com a instituição do Banco do Sul, fundado em 9 de dezembro de 2007. A nova
instituição tem por finalidade financiar projetos de desenvolvimento regional, como
alternativa às instituições já existentes.33 O retorno do crescimento intra-bloco, em
expansão até 2008, sofre, no entanto, um forte impacto de mais uma crise financeira
mundial. Desta vez a crise partiu do sistema bancário norte-americano e se alastrou por
todo o mundo, favorecendo a retração dos mercados e a diminuição acentuada no
comércio do Mercosul que sofreu um decréscimo de 23% no comércio regional e de
25% nos negócios extra-bloco, como é possível observar na Tabela 4.

Em 2006 a Venezuela também demonstrou interesse participar do bloco com


status de país associado, tal qual Bolívia e Chile. Sua inclusão, no entanto depende da
aprovação dos congressos nacionais dos Estados-parte originais.

TABELA 4 - Desempenho Comercial do Mercosul (em US$ milhões) - 2006 a


2009

2006 Var. % 2007 Var. % 2008 Var. %


Comércio Intra-
Zona
51.314 20,92% 65.159 26,98% 83.994 29%
Comércio Extra-
Zona
274.491 18,98% 335.295 22,15% 442.574 32%
Comércio Total 325.805 19,28% 400.454 22,91% 526.567 31%

2009 Var. %
Comércio Intra-
64.668 -23%
Zona
Comércio Extra-
332.449 -25%
Zona
Comércio Total 397.117 -25%
Tabela 4 - Desempenho Comercial do Mercosul (em U$ milhões) – 2006 a 2009. Elaboração própria com base
no CEI (2010), citando INDEC, SECEX, Secretaria Administrativa do Mercosul, Banco Central do Uruguai e
Banco Central do Paraguai.

33
PAMPLONA, João Batista, FONSECA, Juliana Fernanda Alves da. Avanços e recuos do Mercosul: um
balanço recente de seus objetivos e resultados. CADERNOS PROLAM/USP. São Paulo, Ano 7, Volume 2,
p. 7-23: 2008.
20

3. Um balanço do Mercosul em suas duas primeiras décadas


Em 2011 o Mercosul completa 20 anos. Na revisão da literatura sobre o bloco é
possível aferir acerca de quatro papéis: o econômico, o negociador, o securitário e o
geopolítico. O Mercado Comum do Sul foi originalmente concebido como instrumento
de desenvolvimento econômico de Brasil, Argentina, Uruguai e Paraguai e, portanto,
apesar dos reveses derivados das crises financeiras e políticas, intra e extra bloco teve
avanços inequívocos nesse sentido. Entre 1991 e 1998 o comércio regional
quadruplicou o que representa claramente um sinal positivo da parceria entre os quatro
associados. A Tabela 5 demonstra que Mercosul detém um PIB expressivo entre os
principais blocos econômicos reconhecidos pela OMC, com uma estimativa de US$
2.686 bilhões, atrás apenas União Européia e do Tratado Norte-Americano de Livre
Comércio, associações que compreendem as nações mais ricas e desenvolvidas
econômico e politicamente.

Tabela 5 - Intercâmbio Comercial do Mercosul (em milhões de dólares)

Destino/Origen 1990 2009

Export. Intra MERCOSUR 4.228 32.713


Export. hacia Resto del Mundo 42.191 184.526
Export. Totales 46.419 217.240
Import. Intra MERCOSUR 3.606 31.955
Import. desde Resto del Mundo 23.642 147.923
Import. Totales 27.248 179.878
Saldo Com. con R. del Mundo 18.548 36.603
Tabela 5 – Intercâmbio Comercial do Mercosul. Fonte: CEI com base em INDEC, SECEX, Banco Central de
Paraguai, Banco Central do Uruguai e FMI

Nos últimos vinte anos o saldo da balança comercial do Mercosul teve um


superávit expressivo. Em 1990 o saldo comercial era de 18 bilhões de dólares. Em 2009,
20 anos depois, o resultado dobrou e superou os 36 milhões de dólares, como demonstra
a Tabela 5.
21

TABELA 6 - Comparação entre os principais blocos de integração


(População: milhões; valores: bilhões de US$, dados de 2009)
População PIB Exportações Importações
EU 498 16 379 2 179 2216
NAFTA 425 17 100 1602 2177
ASEAN 583 1 522 814 725
MERCOSUL* 240 2 686 217 186
ANDEAN
99 437 78 74
COMMUNITY

Tabela 6 – Comparação entre os principais blocos de integração em 2009. Elaboração própria com base nos
dados disponibilizados nos sites oficiais da OMC, NAFTA, Comunidade Andina. *Os dados referentes ao
Mercosul datam de 2008 e tem como base um levantamento realizado pelo IPEA a partir de informações do
FMI.

No entanto os impasses políticos e as discrepâncias de peso econômico entre seus


membros tem gerado constantes problemas na condução e avanço de suas conquistas:

“...as negociações entre o Uruguai e os Estados Unidos da América para um acordo


de preferências comerciais bilaterais, o conflito entre o Uruguai e a Argentina com
relação a construção de duas plantas de celulose na fronteira desses países e a
decisão do governo boliviano que nacionalizou os ativos da empresa Petróleo
Brasileiro S.A, nos mostram que, na verdade, o balanço do período, ainda que
positivo, revela que o processo de integração regional segue tendo desafios a
superar” (PAMPLONA, FONSECA, 2008, p. 20)

A ponderação dos pesquisadores brasileiros, elaborada em 2008, permanece em


voga. Ela exemplifica as disparidades que são ainda mais evidentes no setor econômico:
o Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas (IPEA) do governo brasileiro
demonstrou que em 2008 o Brasil era responsável por 75,4% do PIB do bloco, enquanto
que Argentina, Paraguai e Uruguai tinham respectivamente 21,8%, 1,1% e 1,6%. 34

É importante destacar que a associação dos quatro membros, e depois de outros


países associados, garantiu um papel „securitário‟ o que conferiu ao grupo o
compromisso com os processos democráticos bem como com os princípios da não-
agressão e da paz como instrumentos indissociáveis ao desenvolvimento.

A estruturação intergovernamental adotada desde sua fundação, pelo Tratado de


Assunção, deixa o Mercosul aos sabores e dissabores de seus governantes. O exemplo
da instabilidade política no Paraguai na década de 1990 e a falta de priorização dos

34
IPEA. Mercosul: assimetrias estruturais em debate. Disponível em
<http://www.ipea.gov.br/sites/000/2/boletim_internacional/100208_boletim_internacional01_apresen
tacao02.pdf> Acesso em 24/12/10.
22

governos Fernando Collor de Melo e Carlos Menem, do Brasil e Argentina


respectivamente, colocam em risco o avanço do processo integracionista regional.

Ao mesmo tempo é também inegável o papel geopolítico que o bloco vem


assumindo, especialmente nos últimos 10 anos. Para além dos quesitos políticos e
econômicos o Mercosul representou um avanço no papel negociador para seus Estados-
parte. A integração regional conferiu um peso mais significativo nas negociações
internacionais, bem maior do que se os países tivessem que se representar
individualmente.

Entretanto o otimismo deve dar lugar aos desafios que se colocam a terceira
década do mercado comum, sobretudo quanto a eliminação das exceções à TEC e,
principalmente quanto o seu papel decisivo na composição da UNASUL (anteriormente
designada Comunidade Sul-Americana de Nações, CSN) como zona de livre-comércio
e que deve unir tanto Mercosul quanto a Comunidade Andina em um acordo maior com
representatividade sobre toda a América do Sul. Nove Estados já ratificaram a
Declaração de Cuzco (2004) entre eles Argentina, Bolívia, Equador, Guiana, Peru,
Venezuela, Chile, Suriname e Uruguai. Uma de suas principais iniciativas é a criação de
uma área de mercado comum regional a partir da eliminação das tarifas para produtos
35
considerados não sensíveis até 2014 e para os produtos sensíveis até 2019.
Considerando as dificuldades e obstáculos para os mesmos fins dentro do Mercosul, a
nova meta dos países componentes da Unasul, incluindo os Estados-parte do Mercosul,
representa o mais novo desafio do continente para a segunda década do século XXI.

35
UNASUR. Sobre a Unasur. Disponível em: < http://www.pptunasur.com>. Acesso em: 24/12/2010.
23

4. Bibliografia

 HERZ, Mónica; HOFFMAN, Andrea Ribeiro, Organizações Internacionais,


História e prática, Rio de Janeiro, Elsevier Editora Ltda, 2004.

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 STURARO, George Wilson dos Santos. Mercosul aos 20 anos: a evolução dos
papéis do bloco e a inserção internacional do Brasil. Disponível em:
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 BOBBIO, Norberto; MALTEUCI, Nicola; PASQUINO, Gianfranco; Dicionário


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24

 PARLAMENTO DO MERCOSUL, Sobre o parlamento. Disponível em:


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 PORTAL OFICIAL DO MERCOSUL, A Secretaria do Mercosul. Disponível


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 MERCOSUL. Solução de Controvérsias no Mercosul. Disponível em: <


http://www.mercosur.int/innovaportal/types/file/downloadfilecontent.jsp?content
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Acesso em 24/12/2010.

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