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Fundamentos da espectroscopia

Ramon e no infravermelho
FUNDAÇÃO EDITORA DA UNESP
ÜSWALDO SALA
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Diretor-Presidente
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Editor-Executivo
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Conselho Editorial Acadêmico
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Maria do Rosário Longo Mortatti
Maria Encarnação Beltrão Sposito
Mario Fernando Bolognesi Fundamentos da espectroscopia
Paulo César Corrêa Borges
Roberto André Kraenkel Ramon e no infravermelho
Sérgio Vicente Motta

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Dida Bessana
2ºedição

~
editora
unesp
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Sindicato Nacional dos Editores de Livros, RJ

Sl53f
2.ed.
Prefácio à primeira edição 9
Sala, Os,valdo, 1926-
Fundamentos da espectroscopia Raman e no infravermelho / Oswaldo
Sala. - 2.ed. - São Paulo: Editora UNESP, 2008. Prefácio à segunda edição 11
Apêndices
ISBN 978-85-7139-868-9
1. Raman, Espectroscopia de. 2. Espectroscopia de infravermelho. l Introdução 13
3. Rotação molecular. 4. Espectros vibracionais. I. Título.
08-3331. CDD: 543.57
CDU: 543.424
2 Vibração de moléculas diatômicas 23
2.1 Modelo clássico 24
2.2 Modelo quântico 30
2.3 Espectro no infravermelho 34
2.4 Espectro Raman 37
2.5 Oscilador anarmônico 42

Editora afiliada: 3 Rotação de moléculas diatômicas 49


3.1 Modelo do rotor rígido 49
Asoc~"tCJón
de Edltor!al~s llnlW1"!!1tarfa< Assudttyil.u Brasileira de
de AmCTlca l.t!UI1~ l' cl COJ'!be Editoras Cn!vers.!tITT"!as 3.2 Espectro no infravermelho 51
6 Oswaldo Sala Fundamentos da espectroscopia Ramon e no infravermelho 7

3.3 Espectro Raman 54 8 Construção das matrizes para energia potencial e


3.4 Moléculas diatômicas homonucleares 58 energia cinética 161
3.5 Rotor não-rígido 69 8.1 Representação matricial da energia potencial em
3.6 Rotação de moléculas poliatômicas lineares 70 coordenadas internas 161
3. 7 Rotação-vibração 71 8.2 Energia cinética - Matriz de transformação
de coordenadas cartesianas de deslocamento para
4 Vibração de moléculas poliatômicas 81 coordenadas internas 162
8.3 Utilização dos vetores s no cálculo dos elementos da
4.1 Vibrações moleculares e coordenadas normais 82
matriz Gq 167
4.2 Simetria e grupos de ponto 88
8.4 Construção da matriz das constantes de força em
coordenadas de simetria 169
5 Operações de simetria em movimentos
8.5 Obtenção da matriz G 172
moleculares 95
5.1 Operações de simetria nas coordenadas cartesianas
9 Determinação das coordenadas normais 177
de deslocamento 95
5.2 Caráter e representações 102 9.1 Resolução da equação secular 177

5.3 Representações dos grupos de ponto 106 9.2 Cálculo de coordenadas normais 182
9.3 Distribuição da energia potencial entre as coordenadas
5.4 Estrutura das representações 108
de simetria 186

6 Regras de seleção e medidas de polarização ll9 9.4 Considerações sobre campos de força 190

6.1 Atividade no infravermelho - oscilador harmônico ll9


1O Complementos sobre análise vibracional 195
6.2 Atividade no Raman - oscilador harmônico 122
6.3 Estrutura das representações do momento de dipolo 10.1 Grupos com caracteres complexos 195
e da polarizabilidade 123 10.2 Moléculas lineares 199
6.4 RegTas para bandas de combinação e harmônicas 125 10.3 Efeito isotópico 201
6.6 Ressonância de Fermi 131
6. 7 Medidas de polarização 132 11 Rotação de moléculas poliatômicas 207
11.1 Rotação de moléculas não lineares 207
7 Construção das coordenadas de simetria 14 11.2 Rotor esférico 207
7.1 Estrutura das coordenadas internas 145 11.3 Rotor simétrico 208
7.2 Construção das coordenadas de simetria 148 11.4 Rotor assimétrico 212
--,-
8 Oswaldo Sala

12 Interação rotação-vibração 215


12.1 Moléculas lineares 215
12.2 Interação de Coriolis 221
12.3 Rotor simétrico 225 Prefácio à primeira edição
12.4 Rotor esférico 229
12.5 Rotor assimétrico 229

13 Espectro Ramon de monocristal 235


13 .1 Introdução 235
13.2 Vibrações em cristais 237
13.3 O método de correlação 241
13.4 Análise da calei ta pelo método de correlação 243
13.5 Espectros Raman do monocristal de calcita
Este livro baseia-se no Curso de Espectroscopia Molecular,
orientado 24 7
que tem sido oferecido aos estudantes de pós-graduação do Ins-
tituto de Química da Universidade de São Paulo. Optou-se por
Apêndice 1 251 tratamento semiclássico dos fenômenos, não exigindo conheci-
mentos avançados de Mecânica Quântica.
Apêndice li 255 Após uma introdução de caráter histórico, nos capítulos 2 e
3 são estudadas a vibração e a rotação de moléculas diatômicas,
detalhando-se a parte de rotação de moléculas homonucleares,
Apêndice Ili 259 com a introdução do spin nuclear, fundamental para o entendi-
mento das intensidades e espaçamentos nesses espectros.
Apêndice IV 265 O estudo vibracional de moléculas poliatômicas é iniciado a
partir dos capítulos 4 e 5, por meio da introdução das proprieda-
Apêndice V 275 des de simetria e teoria de grupo. O capítulo 6 examina as regras
de seleção e discute, com mais detalhes, métodos de medida do
fator de despolarização, devido a sua importância na espectros-
copia Raman.
O método das matrizes G e F de Wilson para análise de coor-
denadas normais é apresentado nos capítulos 7 a 9 com o deta-
lhamento de sua aplicação.
No capítulo 10 examinam-se grupos de ponto que não são
discutidos na maioria dos livros-textos e o efeito de substituição
lO Oswaldo Sala

isotópica. Nos capítulos 11e12 estuda-se tanto a rotação como a


rotação-vibração de moléculas poliatômicas.
O capítulo 13 apresenta um estudo por espectroscopia Ra-
man de monocristal orientado, em que se procura mostrar o sig-
nificado dos componentes do tensor de polarizabilidade por meio Prefácio à segunda edição
de um exemplo, no qual é aplicado o método de correlação.
Não se pretendeu escrever um livro-texto completo, mas
apresentar pontos que, em nossa experiência, julgamos básicos
para o iniciante neste campo, não dispensando, assim, a consulta
a vários livros.
Esta publicação foi possível graças às sugestões e revisões
feitas pelo Prof. Yoshiyuki Hase, do Instituto de Química da Uni-
versidade Estadual de Campinas, ao qual sou extremamente gra-
to, principalmente pelo incentivo dado.
Agradeço aos colegas Mareia L.A. Temperini e Paulo Sergio
Santos, pelo estímulo, pelas discussões e críticas, e aos estudan- Várias correções e modificações foram efetuadas em relação à
tes que nos últimos anos apontaram falhas e sugeriram modifi- primeira edição, principalmente nos capítulos 3, 8, 9 e 13, visando
cações nas anotações de aulas, particularmente a Lucia K. Noda, tornar mais claros alguns pontos importantes na espectroscopia.
Norberto S. Gonçalves e Sandra R. Mutarelli. Devido à dificuldade matemática na obtenção das equações
de movimento, foram introduzidos alguns apêndices. O primeiro
Oswaldo Sala contém detalhes sobre as equações de movimento de Lagrange e
Hamilton; o segundo e o terceiro consideram, respectivamente, a
equação de Schrõdinger para o problema vibracional e do rotor rí-
gido de moléculas diatômicas. A leitura destes apêndices, mesmo
sem se ater a detalhes no desenvolvimento matemático, facilita a
compreensão dos textos a eles relacionados.
Dada a importância atual dos efeitos de intensificação no es-
palhamento Raman, o apêndice IV contém uma introdução sobre
o efeito Raman ressonante e o efeito de intensificação por super-
fície, conhecido como efeito SERS.

Oswaldo Sala
l Introdução

Várias técnicas permitem obter informações sobre estrutu-


ra molecular, níveis de energia e ligações químicas, podendo-se
citar como exemplo: ressonância magnética nuclear, difração de
elétrons, nêutrons e raios X, efeito Mõssbauer, espectroscopia Ra-
man e no infravermelho etc. Iremos nos restringir aos espectros
vibracionais, rotacionais e de rotação-vibração, através da espec-
troscopia Raman e no infravermelho.
Começaremos estudando os espectros vibracionais e rotacio-
nais de moléculas diatômicas, cuja interpretação e formalismo ma-
temático são bem mais simples, passando em seguida para molé-
culas poliatômicas. Para uma molécula não linear, com N átomos,
há 3N-6 graus vibracionais de liberdade e as equações de movi-
mento seriam de grau 3N-6 nas freqüências vibracionais, tornan-
do a solução do problema extremamente laboriosa para moléculas
com número razoavelmente grande de átomos. A situação pode ser
contornada utilizando as propriedades de simetria da molécula
e teoria de grupo, de modo que fatorem as equações em outras
de menor grau, fáceis de serem resolvidas. Uma série de trans-
formações de coordenadas deverá ser efetuada para se chegar às
coordenadas normais, que descrevem as vibrações moleculares.
, '

1
14 Oswalda Sala Fundamentos da espectroscopia Ramon e no infravermelho 15

A espectroscopia estuda a interação da radiação eletromag- dia dos elétrons. A interação de radiação eletromagnética com o
nética com a matéria, sendo um dos seus principais objetivos a movimento vibracional dos núcleos origína o espectro vibracional
determinação dos níveis de energía de átomos ou moléculas. Os no infravermelho ou o espalhamento Raman. A maneira usual
espectros fornecem as transições (diferença de energía entre os de se observar os espectros vibracionais no infravermelho é por
níveis) e a partir destas medidas determinam-se as posições re- absorção, mas é possível observar espectros de emissão.
lativas dos níveis energéticos. No caso de moléculas, a regíão es- A radiação infravermelha foi descoberta por Herschel, em
pectral onde estas transições são observadas depende do tipo de 1800, e por volta de 1900 Coblentz obteve espectros de absorção
níveis envolvidos: eletrônicos, vibracionais ou rotacionais. N or- no infravermelho de grande número de compostos orgânicos em
malmente as transições eletrônicas estão situadas na regíão do estado sólido, líquido e vapor.
ultravioleta ou visível, as vibracionais 11a região do infraverme- Uma maneira indireta de observar os espectros vibracionais,
lho e as rotacionais na região de microondas (em moléculas com transferindo para a regíão do visível as informações que seriam
átomos leves, também no infravermelho afastado). As diferentes obtidas no infravermelho, é através do espalhamento Raman,
regíões espectrais exigem espectrómetros com elementos disper- ou seja, do espalhamento inelástico de radiação eletromagnética
sivos e detectores apropriados. Assim, cada tipo de espectrosco- monocromática que interage com as moléculas. As freqüências
pia tem uma tecnologia própria. vibracionais são determinadas pelas diferenças entre as freqüên-
Não considerando a energia devida aos movimentos transla- cias das radiações espalhadas e a da radiação incidente.
cionais, a energía total de uma molécula será a soma das energía Fisicamente os dois processos, Raman e infravermelho, são
eletrônica, vibracional e rotacional: Etot;;:: Edti +Evib +E,'Ol, sendo a diferentes. A absorção no infravermelho ocorre quando a fre-
eletrônica muito maior do que a vibracional e esta muito maior qüência da radiação, multiplicada pela constante de Planck, tem
do que a rotacional. Isto permite, numa primeira aproximação, o mesmo valor da diferença de energía entre dois estados vibra-
que estes níveis possam ser considerados separadamente, isto é, cionais, ou seja, o processo envolve uma ressonância entre a dife-
cada tipo de espectro possa ser estudado independentemente das rença de níveis de energía da molécula e a radiação eletromagné-
interações entre eles. Na realidade as transições eletrônicas en- tica. No espalhamento Raman uma radiação monocromática no
volvem uma estrutura vibracional e rotacional que pode ou não visível (na maioria dos casos), ultravioleta ou no infravermelho
estar resolvida. As transições vibracionais envolvem níveis vibra- próximo interage com a molécula e é espalhada com freqüências
cionais e rotacionais e somente os espectros rotacionais seriam ligeiramente modificadas. Esta variação de freqüência correspon-
puros, no sentido de que as transições são somente entre níveis de à diferença de energía entre dois estados vibracionais. Consi-
rotacionais de um mesmo estado vibracional e eletrônico. derando os mesmos estados vibracionais, as freqüências Raman
A separação entre os movimentos dos núcleos e dos elétrons, seriam as mesmas do espectro no infravermelho.
conhecida como aproximação de Born-Oppenheimer, resulta prin- Embora os mesmos valores de freqüências vibracionais se-
cipalmente da grande diferença entre as massas dos núcleos e jam obtidos através dos espectros Raman ou no infravermelho,
dos elétrons. Sendo o movimento dos elétrons muito mais rápido o fato de diferentes mecanismos estarem envolvidos já nos faz
do que o dos núcleos, pode-se considerar a posição dos núcleos pensar numa questão: os espectros Raman e no infravermelho
fixada durante a transição eletrônica. Do mesmo modo, durante o seriam idênticos ou haveria diferença na atividade das transições
movimento dos núcleos pode-se considerar uma distribuição mé- nestas duas técnicas?
16 Oswaldo Sala Fundamentos da espectroscopia Ramon e no infravermelho l7

Como veremos em outro capítulo, para um modo vibracio- estudo (esquema na Figura 1.1). As radiações utilizadas, 587,6,
nal ser ativo no infravermelho é necessário haver variação do 667,8 e 706,5 nm, (selecionadas com o uso de filtros primários)
momento dipolar durante essa vibração. A atividade no Raman permitiam o estudo de substâncias coloridas e fotossensíveis. Pa-
difere no sentido de que o momento de dipolo considerado é o ralelamente, foi introduzido o uso de redes de difração nos es-
induzido pela radiação eletromagnética, isto é, deve haver varia- pectrómetros Raman (esquema na Figura 1.2), permitindo me-
ção da polarizabilidade da molécula durante a vibração. O estu- lhor resolução na região espectral do vermelho, e o uso de filtros
do envolvendo medidas de intensidade das bandas é bem mais secundários que reduziam a intensidade da radiação Rayleigh,
complicado, exigindo tratamento por mecânica quântica. Contu- para observação de freqüências baixas. Com a facilidade de troca
do, para uma análise vibracional envolvendo somente valores de de redes e câmaras fotográficas os espectrógrafos eram bastante
freqüências é suficiente ter noção das propriedades de simetria e versáteis e lu1ninosos.
de teoria de grupo. Utilizando-se a teoria de grupo pode-se fazer
a previsão dos espectros quanto ao número de modos vibracionais 3000V; 0,4A
ativos no Raman e no infravermelho.
O efeito Raman foi previsto teoricamente por Smekal (1923)
Tubo com solução
e descoberto experimentalmente por Raman (1928). O efeito logo de dicromato de
despertou interesse entre os físicos, que procuraram explicar seu sódio - filtro
mecanismo. Em 1934, Placzek publicou sua obra fundamental so-
bre a teoria do efeito Raman (1934). Os trabalhos experimentais
nesta época se limitavam à obtenção e comparação de espectros
e, em alguns casos, à atribuição das freqüências aos modos vibra-
cionais. Na década de 1940 os químicos já usavam a espectrosco- amostra
pia Raman para ter informações sobre a simetria molecular e as
Figura 1.1 - Esquema da fonte de excitação com lâmpada de hélio e tubo de
ligações químicas.
amostra,
Até 1950, a técnica convencional para obtenção dos espec-
tros Raman consistia na utilização da radiação em 435,8 nm, de
Colimador
arcos de mercúrio, para excitação dos espectros, e de espectró-
grafos com prismas como elemento dispersar, com detecção foto- Filtro secundário
/

;'Vc~=1J..,4_.:'
gráfica. Uma limitação dessa técnica ocorria no estudo de subs- Rede de
difração
tâncias coloridas, que absorvessem intensamente essa radiação,
ou fotossensíveis. Outras fontes de excitação foram tentadas, Amostra
mas a única que obteve sucesso, permitindo seu uso rotineiro, foi
a desenvolvida no Laboratório de Espectroscopia Molecular da
Universidade de São Paulo, por Stammreich e colaboradores, por
volta de 1950. Essa fonte utilizava descarga em hélio, numa lâm- Figura 1.2 - Esquema do espectrógrafo com rede de difração e detecção com chapa
pada em forma helicoidal envolvendo o tubo com a amostra em fotográfica.
l8 Oswaldo Sala Fundamentos da espectroscopia Ramon e no ínfravermelho l9

A introdução do uso da radiação de lasers como fonte de exci- racterização de compostos extremamente instáveis (vida muito
tação na espectroscopia Raman, em 1962, se deve a Porto & Wood curta) tornaram-se possíveis com os novos equipamentos. Uma
(1962), que utilizaram laser pulsado de rubi. Kogelnik & Porto aplicação mais recente, que tem apresentado grande interesse
(1963) foram os primeiros a obter espectros Raman utilizando analítico e industrial, é a observação de espectros de freqüências
laser contínuo de He-Ne (632,8 nm). harmônicas dos estiramentos 0-H, C-H e N-H, na região do in-
No fim da década de 1960, o desenvolvimento dos lasers de fravermelho próximo.
Ar+ e de Kr+, associados aos espectrômetros Raman comerciais, Um avanço importante na espectroscopia vibracional ocor-
com duplo ou triplo monocromador, utilizando detecção com fo- reu com o desenvolvimento de métodos de cálculo de coordena-
tomultiplicadoras, tornaram obsoletas as técnicas anteriores. das normais, podendo-se citar o trabalho pioneiro de Dennison
Abriram-se novas possibilidades, como o estudo do efeito Raman (1931). A aplicação das propriedades de simetria e da teoria de
ressonante, efeito Raman intensificado por superficie (SERS), grupo permitiu que as atribuições de freqüências não fossem pu-
efeito Raman inverso, espalhamento Raman anti-Stokes Coe- ramente empíricas, mas tivessem base matemática. Foram fun-
rente (CARS) etc. Atualmente estão sendo bastante utilizados damentais, neste sentido, os trabalhos de Urey & Bradley (1931),
detectores multicanais (CCD, "Charge Coupled Deviser") e mi- Wilson (1934), Rosenthal & Murphy (1936) e Shimanouchi (1949),
croscópio acoplado ao espectrômetro, que permitem a obtenção entre outros.
de espectros em frações de segundo e o uso de lasers de baixa O desenvolvimento dos computadores trouxe valiosa contri-
potência. Para amostras que apresentam intensa fluorescência, buição à espectroscopia, tanto pela sua utilização direta nos ins-
como por exemplo amostras de interesse biológico, utiliza-se ex- trumentos (microcomputadores dedicados) como em cálculos. A
citação com lasers de neodímio/YAG, na região do infravermelho análise de coordenadas normais só podia ser efetuada para molé-
próximo, 1064 nm, e espectrômetros usando transformadas de culas relativamente simples e era extremamente morosa. Com os
Fourier. Contudo, quando se necessita alta resolução, os instru- computadores atuais moléculas complicadas e polímeros podem
mentos de varredura, com fotomultiplicadora, apresentam me- ser estudados normalmente com rapidez e grande refinamento.
lhor desempenho. Além do cálculo clássico, com base nas matrizes G e F de Wilson
'
Com relação à espectroscopia no infravermelho, em meados cálculos utilizando programas ab initio são extremamente valio-
da década de 1960 ocorreu grande avanço em sua tecnologia, com sos na análise dos espectros vibracionais e têm sido bastante em-
o desenvolvimento de espectrômetros interferométricos, utili- pregados nos últimos anos. A obtenção da distribuição de energia
zando transformadas de Fourier. Em contraste com os antigos potencial é bastante útil para entender as coordenadas normais ,
instrumentos dispersivos, onde os espectros eram obtidos numa mesmo quando calculadas pela mecânica quântica.
varredura relativamente lenta, os instrumentos interferométri-
cos permitem obter considerável região espectral de uma única
vez, em curto tempo. Há instrumentos cuja faixa espectral é es- Referências bibliográficas
tendida de 10 cm· 1 até o infravermelho próximo. Alguns espec-
trômetros, com transformada de Fourier, permitem a obtenção DENNISON, D. M. Rev. Mod. Phys., v.3, p.280, 1931.
tanto dos espectros no infravermelho como Raman no mesmo KOGELNIK, H., PORTO, S. P. S. J. Opt. Soe. Am., v.53, p.1446, 1963.
instrumento. Estudos de reações com cinética rápida ou a ca- PLACZEK, G. Handbuch der Radiologie VI, v.2, p.209, 1934.
20 Oswaldo Sala Fundamentos da espectroscopia Ramon e no infravermelho 21

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2 Vibração de moléculas
diatômicas

A rigor, as vibrações moleculares devem ser tratadas quanti-


camente. Contudo, para algumas propriedades físicas resultados
semelhantes podem ser obtidos tanto por método clássico como
quântico, cm particular as relacionadas com as freqüências vi-
bracionais. No caso de moléculas poliatômicas, o método clássico
desenvolvido principalmente por Wilson é uma maneira prática
de resolver o problema vibracional.
Mesmo classicamente, o tratamento de moléculas poliatômi-
cas seria bastante difícil se não fizéssemos uso das propriedades
de simetria molecular e teoria de grupo. Cada átomo possui 3
graus de liberdade (movimentos nas direções x, y ou z) e para uma
molécula com N átomos haverá 3N graus de liberdade. Como no
momento só nos interessa o estudo de movimentos vibracionais,
podemos descartar três graus de liberdade translacional, devi-
dos ao movimento em fase de todos os átomos nas direções x, y
ou z, ou seja, dos movimentos translacionais do centro de massa
da molécula. Mais três graus de liberdade podem ser eliminados
para moléculas não lineares, correspondentes aos movimentos
rotacionais da molécula. Os 3N-6 graus de liberdade restantes
correspondem a movimentos vihracionais, ou seja, poderemoses-
perar 3N-6 modos vibracionais fundamentais.
24 Oswaldo Sala Fundamentos da espectroscopia Ramon e no infravermelho 25

Se não houver modos degenerados, haverá 3N-6 freqüências dendo às ligações químicas). Consideremos uma partícula, de
fundamentais; caso contrário, o número de freqüências obser- massa m, ligada a uma parede rígida (massa infinita) por uma
vadas será menor. No caso de moléculas lineares há somente 2 mola cuja constante de força é k. Para um deslocamento peque-
graus de Jiberdade rotacional, pois considerando os núcleos como no da partícula em relação à posição de equilíbrio haverá uma
pontuais não ocorre rotação no eixo da molécula e teremos 3N-5 força de restauração que obedece à lei de Hooke, f = -kill<, onde
graus de liberdade vibracional. bx é o deslocamento sofrido e o sinal "-" indica que a força é opos-
Assim, em uma molécula relativamente simples, com cinco ta ao deslocamento inicial. Igualando esta força com a da lei de
átomos, chegaríamos a uma equação de movimento de nono Newton, temos a equação de movimento:
grau (3N-6 = 9), cujas raízes seriam relacionadas às freqüências
vibracionais. Os métodos de cálculo que iremos estudar, utilizando .. k
f = -kL'.x = mbii: ou ru<+-L'.x=O (2.1)
propriedades de simetria e teoria de grupo, permitirão fatorar m
a equação em várias de menor grau, mais simples de serem
onde L'.ii: é a derivada segunda de L'.x em relação ao tempo. Esta
resolvidas.
equação é a equação de um oscilador harmônico, cuja solução é
Iniciaremos com o caso simples de moléculas diatômicas,
do tipo:
utilizando o modelo clássico de oscilador harmónico, obtendo
as equações de movimento a partir da equação de Newton. Em bx = x 0 cos(2rrvt+tjJ) (2.2)
seguida introduziremos as equações de Lagrange, que levam ao
mesmo resultado anterior, mas que utilizam as expressões da Este tipo de solução pode ser obtido considerando a projeção
energia cinética e potencial para obter as equações de movimen- de um ponto, que descreve um movimento circular uniforme, em
to. No caso de moléculas poliatómicas, as equações de Lagrange um eixo x passando pelo centro do circulo.
tornam muito mais simples a obtenção destas equações. Em vez Substituindo bx e a sua derivada segunda na equação (2.1)
das equações de Lagrange, onde a energia cinética é expressa obtém-se:
em termos de velocidade, pode-se usar as equações de Hamilton,
onde esta energia é expressa em termos do momento. Após este 2 2 k
-4rr v x 0 cos(2nvt + $) +-x 0 cos(2rrvt +$)=O
m
procedimento clássico será examinado o modelo quântico do os-
cilador harmônico. Obtidas as expressões dos níveis de energia, que leva à equação da freqüência de oscilação da partícula:
será discutida a origem dos espectros Raman e no infravermelho.
O modelo do oscilador anarmónico encerra o capítulo. V= -1:._ (k (2.3)
2rr ~;:;-

2. l Modelo clássico A equação (2.2) é solução do sistema desde que v satisfaça


(2.3).
O modelo mais simples para o estudo das vibrações de uma Outra maneira de resolver o problema seria considerar a ener-
molécula é o de massas pontuais (correspondentes aos núcleos gia cinética, T = tm6X 2 , a energia potencial, V= f killc 2 , e definin-
atômicos) ligadas por molas com massa desprezível (correspon- do a função lagrangeana, L=T-V, utilizar a equação de Lagrange:
26 Oswaldo Sala Fundamentos da espectroscopia Ramon e no infravermelho 27

_![ a11x
dt
aL ]- aL _ 0
ª""'
(2.4)
Designando por .ó..x 1 e Ax2 as coordenadas cartesianas de des-
locamento para as massas m 1 e m 2 , respectivamente, as expres-
sões para a energia cinética e potencial ficam:
Neste caso, T é função só de /\x e V é função só de /\x e a
equação de movimento (2.4) pode ser escrita: (2.6)

_![ dT ]+ dV _ 0
dt d/\ii: di'>x
(2.5)
A equação de Lagrange deve ser escrita para cada coordena-
da, originando o sistema de equações diferenciais:

A equação de Lagrange (ou a de Hamilton) pode ser deduzida


da equação de Newton introduzindo coordenadas generalizadas. (2.7)
Esta dedução pode ser encontrada em livros-texto, por exemplo,
Eyring, Walter & Kimball (1944) ou no Apêndice I.
Efetuando as derivadas indicadas, o primeiro termo resulta
em m/\ii:, o segundo termo em kAx e a equação (2.5) fica: Derivando as (2.6) e substituindo nas (2. 7):
m 1 /\ii: 1 - k(/\x 2 - /\x 1 ) = O
.. k .. k (2.8)
m/\x + /\x =O ou /\x+-i'>x =Ü
m m 2 /\ii: 2 + k( /\x 2 - /\x 1 ) = O

que é a mesma equação obtida a partir da equação de Newton, Supondo /\x 1 = A,cos(2nvt+<Ji) e /\x 2 = A,cos(2nvt+<Ji) soluções
(2.1), levando, ao mesmo valor de freqüência da (2.3). deste sistema de equações diferenciais obtemos, substituindo /\x1
Vamos considerar agora o modelo de uma molécula diatômi- e /\x2 e as suas derivadas em (2.8):
ca, constituída por duas massas pontuais m 1 e m 2 , representando 2 2
-4n v m 1A 1 -k(A 2 -A 1 ) =O
os núcleos ligados por uma mola de constante de força k. Na mo- (2.9)
lécula, esta mola corresponderia à ligação química. -4n 2 v 2 m 2 A 2 + k ( A 2 - A 1) = O

Reagrupando segundo as amplitudes:

(-4rr 2 v2 m 1 + k )A 1 - kA 2 =O
(2.10)
-kA 1 + (-4rc 2 v 2 m 2 + k )A, = O

Interessa-nos o pequeno deslocamento dos núcleos durante Para este sistema de equações lineares homogêneas ter so-
a vibração, mais bem descritos pelas coordenadas cartesianas de lução, além da trivial A 1=A2=0, é necessário que o determinante
deslocamento. Estas representam as variações das coordenadas dos coeficientes das amplitudes seja igual a zero:
cartesianas com o movimento (.ó..x, .ó..y, .ó..z) e não devem ser confun- 2 2
-4n v m 1 + k
didas com as coordenadas cartesianas das posições de equilíbrio -k
2 2
1
=o
dos núcleos (x, y, z). l -k -4rr v m 2 +k
28 Oswalda Sala Fundamentos da espectroscopia Ramon e no Infravermelho 29

Este determinante, chamado determinante secular, leva à Como resultado obteremos equações separadas para trans-
equação: lação (coordenada de centro de massa) e para vibração (coordena-
da interna da ligação).
(4rc 2 v2 )[ 4n 2 v2m 1 m 2 - (m 1 + m,)k] =O Embora seja conveniente escrever a energia potencial em
função da coordenada interna, é mais simples escrever a energia
cujas raízes são:
cinética em função das coordenadas cartesianas de deslocamento:

v=O e v=--1:__ /k
2rcfµ
sendo µ=m 1m/(m 1+m2 ) a massa reduzida. A expressão da energia cinética deve ser transformada em
Vejamos o significado dessas raízes. Substituindo em (2.10) função da coordenada interna (ou de sua derivada em relação ao
o valor da primeira raiz, v = O, resulta: k.A 1 = kA 2 ou A 1 = A 2 , ou tempo). Sendo X a coordenada do centro de massa, vale a equação:
ainda, Ax 1 = Ax2' que é um movimento de translação.
Substituindo o valor da freqüência da segunda raiz em
(2.10):
Substituindo nesta equação t.x 2 por t.r+t.x 1 , da (2.11), obte-
[- ~ m + k]A kA = O
1 1 - 2
mos m 1i'>x 1+m,(i'>r+i'.x 1) = (m 1+m 2) óX, que fornece:

m,
--~--M

-kA +[- ~m2 +k ]A =0


1 2

Procedendo de modo análogo, obtém-se:


Somando membro a membro temos -(k/µ)(m 1A1 +m2 A2 ) = O,
ou m 1A 1 = -m2A 2 , ou A 1/A;, = -m/rnl' que corresponde a Ax/Ax2 =
-m/m,. Lembrando que as coordenadas cartesianas de desloca-
mento representam os deslocamentos em relação à posição de
Derivando õ.x 1 e õ.x 2 em relação ao tempo e substituindo na
equilíbrio de cada átomo, isto significa que as partículas se deslo-
expressão da energia cinética resulta:
cam em direções opostas e com amplitudes inversamente propor-
cionais às suas massas, ou seja, executam movimento vibracional.
Outra maneira de resolver o problema vibracional seria uti-
lizar coordenadas internas, definidas como a variação das dis- e as equações de Lagrange ficam:
tâncias de ligações químicas e dos ângulos de valência entre es-
tas ligações. Estas coordenadas são bastante convenientes para i_[~]+ oV =O
o estudo das vibrações moleculares. No caso presente, podemos dt ôM ôM
definir a coordenada interna i'.r da ligação entre os átomos 1 e 2:

(2.11)
i_[ at.X. ]+ ac.x
dt
OT av _
- 0
30 Oswaldo Sala Fundamentos da espectroscopia Ramon e no Infravermelho 31

levando ao resultado: p,2 d2


T=--·-
µM+kl'ff=O 2µ dq 2
(m 1 +m 2 )LIX=O O operador de energia potencial para o oscilador harmônico é:
ou seja, as equações ficam separadas nas coordenadas ór e óX. 1 2
A solução da primeira equação, l'ff = A 0 cos(2rcvt+~ ), leva ao V=-·kq
2
valor da freqüência do oscilador:
que atua na função de onda multiplicando-a por este valor.
Com estes operadores, a equação de Schrõdinger, H'I' =
T'I' +V'Y = E'P, fica:
A solução da segunda equação, óX = O, corresponde a um 2 2 2

movimento translacional.
_n d 'I' + kq
• • '!' = E'!'
2µ dq 2 2

ou na forma mais usual:


2.2 Modelo quântico 2
d 'I' +2µ,(E_kq')'I'=O (2.12)
Classicamente, as energias cinética e potencial fornecem,
dq 2 ti' 2 l
através das equações de Lagrange, as soluções para o modelo do Vamos considerar uma função de onda particular:
oscilador harmônico. Outra função que permite resolver o proble-
ma é a hamiltoniana, que representa a energia total do sistema: (2.13)
H=T+V A energia cinética para uma partícula pode ser escrita
em função do momento linear, p = mx: e verificar se satisfaz a equação (2.12). Derivando-a duas vezes:
1 2 2
T=-·p d 'P(q) w 2 2rn
-~~=-ar +a q r (2.14)
dq 2
2m

Na mecânica quântica o operador correspondente ao mo- Passando o segundo termo de (2.12) para o segundo mem-
mento linear, no caso unidimensional, é: bro, podemos igualá-lo com o segundo membro de (2.14):
. d
p=-zn- 2 2 2µ µkq 2
dx -a.+a. q = - - · E + -2 -
n2 tt
34
onde li= h/2rr eh é a constante de Planck (h = 6,626.10- Js). Igualando os termos que dependem de q 2 e os termos que
O operador de energia cinética, T, é obtido efetuando duas não dependem de q 2, teremos:
operações sucessivas com o operador p. Para molécula diatômica,
utilizando a coordenada interna q = ór e a massa reduzida µ, 2µ
a=-·E (2.15)
teremos: ti'
32 Oswaldo Sala Fundamentos da espectroscopia Ramon e no infravermelho 33

e Nos vários níveis, caracterizados pelo número quântico v,


a2 :::: -
!;;k
µk ou a:::: _V_f'"'_ pode-se pensar que as moléculas estejam oscilando com mesma
ti' n freqüência e as amplitudes destas oscilações, para cada valor de
v, seriam as responsáveis pelas diferentes energias dos níveis.
Substituindo este valor de a em (2.15) obtém-se o autovalor:
Uma diferença importante entre o modelo clássico e o quân-

E=~:,.~ ~~·l =~·h· 21rrl =~·hv


tico é a do estado de mais baixa energia. No modelo quântico o
(2.16)
oscilador ainda possui energia ~·hvdassico' energia vibracional do
ponto zero; classicamente, no mínimo do poço de potencial a ener-
sendo v o valor da freqüência para um oscilador clássico. Isto sig- gia é zero. O resultado quântico é coerente com o princípio da in-
nifica que se a energia tiver este valor a função de onda conside- certeza, pois no fundo do poço a posição e a energia (zero) seriam
rada em (2.13) satisfaz a equação (2.12). A equação (2.16) mostra perfeitamente determinadas, violando este princípio.
que o valor da energia para a função de onda escolhida é metade Sendo as transições vibracionais usualmente dadas em uni-
do valor clássico. Este valor representa a energia do estado fun- dade de cm·' (número de onda), os termos de energia podem ser
damental do oscilador e é denominada energia do ponto zero. Es- escritos nesta unidade:
tados de energia mais alta (excitados) podem ser obtidos multipli-
cando a função de onda considerada (2.13) por um polinômio em 1
G (cm· 1 )=-·E =- 1) =m ( v+-
V ( v+- 1) (2.18)
v hc V C 2 e 2
q, resultando para as funções de onda do oscilador harmônico:
onde "'e= v/c é o valor clássico do número de onda do oscilador,
(2.17) em cm· 1. Embora a unidade cm· 1 seja de número de onda, ainda
é costume em espectroscopia vibracional denominá-la como fre-
onde Nv é um fator de normalização e Hv (raq) são polinômios qüência, ou freqüência em cm- 1. Nesta unidade, para v:::: O temos
de Hermite (para mais detalhes veja o apêndice II). Fazendo o valor de energia E 0 = co/2, para v = 1 E 1 = f co,, para v = 2 E 2 =
X= raq, estes polinômios têm OS seguintes valores em função de ~me etc. Se ocorrer transição entre estados consecutivos (regra de
v (número quântico vibracional), por exemplo, para v de O a 5: seleção b.v = ±1), ou seja, se houver absorção ou emissão de radia-
ção as diferenças de energia serão sempre iguais a roe.
H 0 (x)=l H 1(x)=2x Na Figura 2.1 estão representadas as funções de onda do
H,CxJ=4x2 -2 H,(x)=8x3-12x oscilador harmônico (2.17) já normalizadas, segundo a equação:
H 4 (x)= 16x'-48x2 +12 H 5(x)=32x5 -160x3 + 120x

Os autovalores correspondentes serão dados por:

e os correspondentes autovalores (linhas tracejadas). O ponto em


que estas linhas cortam a curva poço é o valor máximo de ener-
A função de onda particular proposta em (2.13) corresponde gia potencial para o estado vibracional considerado, definido pelo
a H 0 (x) = 1. número quântico vibracional v. Observa-se que as funções com
34 Oswaldo Sala Fundamentos da espectroscopia Ramon e no infravermelho 35

número quântico vibraciorral v par são funções pares e as com v


ímpar são funções ímpares. (f(x) é uma função par se f(x) = f(-x); µ=µo+ (dµ.) q+ ... (2.19)
dq o
se f(x) = -fC-x), a função é ímpar.)
onde µ 0 é o vetor do momento de dipolo permanente e a derivada é
considerada na posição de equilíbrio. Para pequenos deslocamen-
V=3; 7w/2 tos em relação a esta posição, podemos desprezar os termos de
ordem mais alta. A condição de variação do momento de dipolo
com a vibração, para haver absorção no infravermelho, implica
*
em (dµ/dq) 0 O pelo menos para um dos componentes µx, µ.vouµ,
Pela mecânica quântica, a transição entre dois estados, ca-
racterizados pelas funções de onda ljlm e ljln ' é descrita pelo mo-
-q o +q
mento de transição de dipolo:

Figura 2.1- Funções de onda do oscilador harmônico. (2.20)

Obtidos os níveis de energia, precisamos determinar as con-


dições para que ocorra transição entre os estados corresponden- ou pelos componentes:
tes, isto é, obter as regras de seleção do oscilador harmônico.
(µ.Jmn = fIJf mµ xIJf ndt
2.3 Espectro no infravermelho
(>Ly)mn = fljlmµyljlndt
(~tz)mn = f'Vmµ:>:'+'nd't
Classicamente, a absorção (ou emissão) de radiação por um
sistema é devida à variação periódica de seu momento de dipolo O momento de transição pode ser interpretado como a me-
elétrico, sendo a freqüência absorvida (ou emitida) idêntica à da dida do dipolo associado com o movimento dos elétrons durante
oscilação do dipolo. Assim, se o momento de dipolo µ (ou um de a transição entre os dois estados envolvidos. Os valores dessas
seus três componentes) oscilar com a mesma freqüência de uma integrais determinam a intensidade no infravermelho, que é pro-
radiação incidente, a molécula absorverá esta radiação. porcional à probabilidade de transição 1µmn1 2 (ou a soma dos qua-
O momento de dipolo é determinado pela configuração nu- drados dos componentes). Para a transição ser permitida é neces-
clear; quando a molécula vibra o momento de dipolo pode sofrer sário que pelo menos uma das integrais acima seja diferente de
variação. Para moléculas diatômicas a única coordenada normal zero. O momento de transição é causado pela perturbação do ope-
do sistema coincide com a coordenada interna da ligação, q. Por- rador hamiltoniano pelo campo da radiação incidente, H = H 0 + H',
tanto, podemos expandir o momento de dipolo em série de Taylor onde H' é a perturbação no hamiltoniano. O campo elétrico E atua
da coordenada q para cada um dos componentesµ , µ y eµ , ou em
X 7.
no momento de dipoloµ produzindo uma variação, Eµ, que é adi-
forma condensada: cionada à energia do sistema.
36 Oswaldo Saio Fundamentos da espectroscopia Ramon e no infravermelho 37

Substituindo na expressão do momento de transição o mo- Pode-se observar, no esquema seguinte, que os níveis são
mento de dipolo em série de Taylor (2.19), teremos: igualmente espaçados por uma separação que corresponde à fre-
qüência vibracional.
(2.21)

v=4 \----~~-, G4 = 9 ro/2


A primeira integral do segundo membro é igual a zero, pela
ortogonalidade das funções de onda (a não ser quando m = n, caso
onde não ocorre transição e µmm é o valor do dipolo permanente e
não mais do momento de transição). Para o segundo termo ser di-
ferente de zero, é necessário que sejam satisfeitas as condições:

(1) (dµ/dq) 0 " O, ou seja, haja variação do momento de dipolo com


a pequena vibração na posição de equilíbrio. Figura 2.2 - Níveis de energia e transições do oscilador harmônico.

(2) f ~' mq'I' nd1 "O. Para esta integral ser diferente de zero o pro-
duto \jlmq\jln deve ser função par. Como q é função ímpar é 2.4 Espectro Ramon
necessário que o produto '+'m'+'n seja função ímpar, isto é, as
duas funções de onda devem ter diferente paridade. A regra O espectro Raman é devido ao espalhamento inelástico de
de seleção para o oscilador harmônico é fl.v = ±1, onde para uma radiação monocromática que incide em uma molécula. Em-
absorção vale o sinal "+" e para emissão o sinal "-". É im- bora como resultado a molécula passe de um estado vibracional
portante notar que a integral é no espaço e não no tempo, para outro, o fenômeno é fisicamente diferente da absorção de
assim, a dependência com cos(2rcvt+<ji) não é considerada na radiação e as regras de seleção podem ser diferentes das conside-
integral. radas no infravermelho.
No efeito Raman, a atividade está ligada à variação do mo-
Como conseqüência da primeira condição, molécula diatômi-
mento de dipolo induzido na molécula pelo campo elétrico dara-
ca homonuclear não apresenta espectro vibracional no infraver-
diação incidente. É diferente do infravermelho, onde se considera
melho, pois seu momento de dipolo continua sendo nulo durante
o momento dipolar intrínseco, ou melhor, a variação deste mo-
a vibração.
mento com a vibração.
Para molécula diatômica heteronuclear o movimento vibra-
Classicamente, o vetor do momento de dipolo induzido oscila
cional causará variação do momento de dipolo e haverá atividade
com sobreposição de freqüências e pode ser escrito P = aE, sendo
no infravermelho. A freqüência observada, em cm- 1, será:
a a polarizabilidade da molécula e E o vetor do campo elétrico da
radiação incidente. a pode ser desenvolvida em série de Taylor
em função da coordenada interna q, a única coordenada normal
do sistema em estudo:
38 Oswaldo Sala Fundamentos da espectroscopia Ramon e no infravermelho 39

a=a 0 +(::lq+·· (2.22)


No espalhamento Raman, a molécula é excitada pelo fóton
incidente, ocorrendo perturbação de todos níveis de energia, é
como se houvesse um estado intermediário de energia. Em segui-
onde os termos de ordem mais alta foram desprezados devido à da ela decai a um nível vibracional excitado, com espalhamento
pequena variação da coordenada q. de luz de menor energia a diferença entre a energia do fóton in-
Considerando a coordenada q e o campo E descritos por: cidente e a do foton espalhado é igual a energia vibracional. O
q = q 0 cos(2nvvt) e E= E 0 cos(2nv 0 t) momento de transição induzido pode ser escrito P mn = E·(aij)mn'
onde. (ai)mn são componentes do tensor de polarizabilidade.
sendo vv e v 0 , respectivamente, a freqüên.cia vibracional e dara- A relação entre os componentes do momento de dipolo indu-
diação incidente, o momento de dipolo induzido ficará: zido e os componentes do campo elétrico é dada pelas equações:

P = a 0 E 0 cos(2rcv 0 t) +(dª) q,E 0 cos(2nv 0 t) cos(2nv v t; px = axxEx + a'XYEY + axzEz


dq o py = ayxEx + o:YYEY + ayzEz (2.24)
Lembrando que cos(a)cos(b)= ![cos(a + b) + cos(a - b)J, temos: pz = azxEx + ª"-YEY + azzEz

Estas equações valem para o espalhamento Rayleigh, onde é


P = a 0 E 0 cos(2nv 0 t) +.!:.(da) %E 0 {cos[2n( v0 + vv)t]+
2 dq o considerada a polarizabilidade intrínseca. No espalhamento Ra-
+ cos[2n(v 0 - vv)t]} (2.23) man deve-se considerar, em (2.24), as derivadas dos componentes
de a em relação ao modo vibracional, a' .. = (da.Jdq)0 , que formam
O primeiro termo contém somente a freqüência da radiação " n
um tensor simétrico, isto é, a' xy = a' yx , a' xz = a' zx e a' yz = a' , conhe-
incidente e corresponde ao espalhamento Rayleigh (espalhamen- ~Y

ciclo como tensor Raman.


to elástico). No segundo termo aparecem radiações espalhadas
Na transição entre os estados vibracionais m e n devem ser
com freqüência v0 -vv (espalhamento Raman Stokes) e v0 +vv (es-
considerados os componentes (aii)mn' onde i'e j são x, y ou z. Para
palhamento Raman anti-Stokes); para este termo contribuir é
haver atividade no Raman pelo menos um dos componentes das
necessário que (da/dq) 0 ct O, ou seja, deve haver variação da po-
6 integrais do momento de transição
larizabilidade com o pequeno deslocamento da coordenada q em
torno da posição de equilíbrio.
No efeito Raman, tanto moléculas diatômicas heteronucle-
(aijlmn f
= 'l'müij 'l'ndT

ares como homonucleares apresentam atividade, pois ocorre va- deve ser diferente de zero.
riação da polarizabilidade com a vibração em ambos casos. No Considerando o desenvolvimento em série de Taylor (2.22)
espectro teremos, simetricamente em relação à linha Rayleigh, obtém-se:
uma banda do lado de freqüências mais baixas, a Stokes, e uma
do lado de freqüências mais altas, a anti-Stokes. Classicamente (a,;lmn = (a,)o f ~I m
\jf ndT +[ d:~j )) \jf mq'I' ndT

as duas deveriam ter mesma intensidade, mas observa-se que a


Stokes é mais intensa do que a anti-Stokes. Para explicar este No espalhamento Raman Stokes ou anti-Stokes, os estados
comportamento precisamos recorrer ao modelo quântico. vibracionais m e n são diferentes e a primeira integral do segun-
40 Oswaldo Sala Fundamentos do espectroscopia Ramon e no Infravermelho 41

do membro é igual a zero, pela ortogonalidade entre 'Vm e 'l'n· Para No espalhamento Raman Stokes a molécula no estado fun-
m = n o primeiro termo corresponde ao espalhamento Rayleigh. damental sofre colisão com o fóton de energia hv 0 , passa para um
Para o segundo termo ser diferente de zero, é necessário que se- estado intermediário (ou virtual), que não precisa ser um estado
jam satisfeitas as condições: estacionário da molécula, e decai em seguida para um estado vi-
(1) (da/dq)0 ;<O, ou seja, pelo menos um dos componentes do ten- bracional excitado, de energia e,; o fóton espalhado, hv 0-e,, terá
sor de polarizabilidade deve variar com a pequena vibração energia menor do que o incidente. No espalhamento Rayleigh,
em torno da posição de equilíbrio; após a interação do fóton com a molécula, esta volta ao n1esmo

(2) J'I' mq'I' ndr ;<O. Esta condição já foi discutida para a atividade nível de energia inicial e o fóton é espalhado sem modificação de
freqüência (espalhamento elástico).
no infravermelho. A regra de seleção para o oscilador harmô-
No espalhamento Raman anti-Stokes o fóton encontra a mo-
nico é llv=±l, onde o sinal "+" vale para Stokes e o sinal "-"
lécula já num estado excitado e após a interação a molécula decai
para anti-Stokes.
para o estado fundamental. Esta diferença de energia é cedida ao
A intensidade Raman depende da probabilidade de transi- fóton, que é espalhado com energia hv0 +e,. Como a população dos
ção, ou seja, do quadrado do tensor de polarizabilidade e da quar- estados excitados segue a distribuição de Boltzmann, deve-se es-
ta potência da freqüência da radiação espalhada: perar para as bandas anti-Stokes menor intensidade do que para
as Stokes. Isto se verifica experimentalmente e a relação entre as
(2.25) intensidades anti-Stokes/Stokes é dada por:

IA_(v
- - 0 +v,)' exp (-
e-,) (2.26)
sendo 10 a intensidade da radiação incidente e v é a freqüência da 18 v 0 -v, kT
radiação espalhada.
Para freqüências baixas as intensidades Stokes e anti-Stokes
Os mecanismos de espalhamento podem ser representados
são comparáveis, mas para freqüências vibracionais muito altas
pelos esquemas da Figura 2.3.

vvv
é difícil observar as bandas anti-Stokes.
O esquema da Figura 2.3 é útil para visualizar o espalha-
mento Raman, mostrando que além do estado inicial e final da
molécula também comparece o estado intermediário. Na realida-
de, deve-se pensar que após a colisão do fóton com a molécula este
·-····---
'
1
é aniquilado e a molécula sofre uma perturbação em todos seus
···;j[ -·--

: hv 0 -e"
>º: h
.S::: 1 vº+ev
estados de energia. Isto é expresso, na equação matemática para
1 'VV'-
1
1 a polarizabilidade, por um somatório sobre todos estados. Quando
1
1 o comprimento de onda da radiação excitante se situa na região
de uma banda de absorção eletrônica intensa do composto, as fun-
ções de onda cujos autovalores estão próximos ao nível interme-
Stokes Rayleigh Anti-Stokes
diário, no esquema da figura 2.3, terão contribuição preponderan-
Figura 2.3 - Esquema dos mecanismos de espalhamento. te. Como conseqüência haverá intensificação do espectro que pode
42 Oswaldo Sala Fundamentos da espectroscopia Ramon e no infravermelho 43

atingir um fator da ordem de 10'. Em moléculas poliatômicas, volvimento em série são considerados termos de maior ordem.
somente alguns modos vibracionais sofrem essa intensificação. Em geral é suficiente considerar o termo
Esses modos são aqueles para os quais o momento de t~rnsição
tem contribuição elevada. Este fenômeno é conhecido com;o efeito
Raman ressonante (para mais detalhes, ver o apêndice IV).
Isto equivale a dizer que a curva potencial não terá mais a
forma parabólica e a deformação da curva potencial gera perda
2.5 Oscilador anarmónico de simetria nas funções de onda.
A anarmonicidade mecânica, que é ligada com a função po-
Como conseqüência da regra de seleção do modelo de osci- tencial, modifica as funções de onda da equação de Schrõdinger
lador harmônico simples, t-v = ±1, para molécula diatômica he- e é responsável pela mudança das regras de seleção, sendo agora
teronuclear seria esperada apenas uma banda vibracional no es- permitidas transições com Av = ±1, ±2, ::t3, etc. Esta anarmonici-
pectro de absorção no infravermelho. Na realidade, observa-se no dade irá determinar o valor exato das freqüências harmônicas.
espectro do HCl, como exemplo, além da banda fundamental em A anarmonicidade elétrica determina a intensidade das
2886 cm· 1 o aparecimento de bandas com aproximadamente o do- bandas e ocorre quando são considerados termos de maior ordem
bro, o triplo etc. desta freqüência, embora com intensidade muito no desenvolvimento em série do momento de dipolo, para os es-
menor. Isto é explicado considerando a anarmonicidade mecânica pectros no infravermelho,
e elétrica do oscilador.
A funçâo potencial para o oscilador harmônico, em termos
da coordenada interna q, pode ser obtida pelo desenvolvimento (dµ) 1(d'µ)
µ = µ, + -
dq o
q +1 --, q 2 +·
2. dq o
em série de Taylor:
Para a intensidade da primeira harmônica é suficiente con-
V(q)=V0 + ( -dV) q+I
1 (d'V)
-- q 2 +··· siderar o termo quadrático. Para a segunda harmônica é necessá-
2 (2.27)
dq o 2. dq o rio considerar o termo cúbico:
considerando somente termos até a segunda ordem. Neste desen-
volvimento, o primeiro termo é uma constante, que com escolha
conveniente do. referencial pode ser igualada a zero; o segundo
termo, por ser a derivada na posição de mínimo da funçâo poten- Para harmônicas de ordens superiores será necessário con-
cial, também é igual a zero. O terceiro termo pode ser escrito: siderar derivadas de maior ordem no desenvolvimento em série.
O mesmo ocorre no Raman com a polarizabilidade:
!_(d VJ
2
2
=~-k
(da) 1(d aJ
2
2 (2.28) 2
2! dq oq 2 q 2
a=ao+ - q+I --, q +··
dq o 2. dq o
ou seja, a derivada segunda do potencial na posição de equilíbrio
(que mede a curvatura na posição de mínimo) é igual à constante Pela mecânica quântica, o operador de energia potencial, no
de força k. A anarmonicidade mecânica surge quando no desen- hamiltoniano, deverá conter estes novos termos do desenvolvi-
44 Oswaldo Sala Fundamentos da espectroscopia Ramon e no infravermelho 45

me11to em série. Os autovalores (em cm· 1) para molécula diatômi- senvolvida para o oscilador harmônico, que é muito mais simples,
ca não serão mais dados por deve-se calcular o valor que a freqüência do oscilador teria se ele
fosse h.armônico, ou seja, o valor da "freqüência harmônica", ro.
Gv =ro,(v+%) Este valor será maior do que o experimental, como se percebe'
pela Figura 2.4. Esta aproximação seria válida na vizinhança da
onde, w, = (l / 2rrc)Jkj"µ, mas por posição de equilíbrio, onde as curvas de potencial para os dois
modelos são semelhantes.
Gv =w,( v+%)-w,x,(v+%)' (2.29) Como exemplo, num cálculo aproximado para HCl, sendo a
freqüência fundamental e a da primeira harmônica observadas
Nesta equação wexe é a constante de anarmonicidade e we é em 2886 e 5668 cm·1, pode-se escrever:
o valor clássico da freqüência no oscilador harmônico. Devido ao
sinal - no segundo termo, os níveis de energia ficarão cada vez G 1-G0 = 2886 = ro e - 2ro ex e
mais próximos à medida que o número quântico vibracional au- G2-G0 = 5668 = 2w - 6w x
' ' '
menta. A energia no ponto zero tem o valor:
Multiplicando a primeira equação por 2 e subtraindo deste
1. 1 valor a segunda equação teremos 2coexe = 104, ou roexe = 52 cm· 1.
G o =w e ·--ro ee4
x ·-
2 Substituindo na primeira equação:
A razão de se escrever wexe para a constante de anarmonici- ro, = 2886 + 104 = 2990 cm"
dade vem da expressão usada pelos primeiros autores:
que é o valor correspondente a um oscilador harmônico.
A Figura 2.4 compara as curvas potenciais e os níveis de
energia do oscilador harmônico e do anarmônico, notando-se para
este último o aparecimento da energia de dissociação, D .
A transição entre estados com número quântico vibracional e
v e O pode ser escrita:
2
4 \-----~ G, = (9/2) ô\
G y - G O = ro e(v + -1:)- ro ee
x (v + -1:) -1: + ro ee4
x · -1: V=

2 2
- w e2
V= 3 G" = (7/2) co, r
D,
(2.30)
v=3
v=2
Considerando, em particular, a transição G 1-G0 = roe-2roexe, o v=1
primeiro termo do segundo membro corresponde à aproximação
G 0 (cm- 1) = ro/v+Vz)
v=O 1
do oscilador harmônico e a expressão completa representa o osci- G 0 (cm· 1 ) = ro.(v+V2)-ro.x~ (v+Vz)2

lador anarmônico. :Llv=_±ll ~±1,±~±_§J


O valor observado experimentalmente corresponde a um os- Figura 2.4 - Curvas potenciais e níveis de energia para o oscilador harmônico e
cilador real, anarmônico; para que se possa aplicar a teoria de- anarmõnico
46 Oswaldo Sala Fundamentos da espectroscopia Ramon e no infravermelho 47

Uma expressão simples que descreve com precisão razoável 2.2 Calcule a razão de intensidade anti-Stokes/Stokes para
a curva de energia potencial é a introduzida por Morse: as bandas Raman em 217 e 459 cm- 1 do CCl4 , nas temperaturas
V(q); DJ1-exp(-j3q)]2 4 7 °C e -23 °C, sendo a radiação excitante a 514,5 nm.

onde D é a energia de dissocia ão medida em relação ao mínimo 2.3 No espectro Raman do Cu3PS4 (excitado com a linha
da cur;a potencial e j3::::: roe 2n: 2 cµ I Deh, onde roe e De estão em 457,9 nm) foram observadas bandas do estiramento P-S em: 392,
cm- 1 eh ; 6,626-10- 27 erg·s. Esta expressão de J3 pode ser obtida 784, 1175, 1565, 1953, 2340, 2727, 3112 e 3499 cm 1, para tem-
calculando-se a derivada segunda do potencial de Morse e con- peratura de 100 K. Para temperatura de 300 K foram observa-
siderando a equação (2.28), lembrando que as derivadas são no das bandas em 391, 780, 1167 e 1550 cm- 1 • Determine os valores
ponto q; O. das freqüências harmônicas e das constantes de anarmonicidade
No exemplo do HCJ, a constante de força calculada a partir para estas duas temperaturas. Com a aproximação grosseira da
do valor da freqüência observada, 2886 cm·', é k ; 4, 78 mdinas/À; ligação P-S como sendo uma molécula diatômica, calcule a cons-
o valor da constante de força calculada com a freqüência corrigida tante de força com o valor da freqüência harmônica e represente
(co ;2990 cm- 1 ) é 5 13 mdinas/À. Quando for possível determinar em escala o diagrama dos níveis de energia para a temperatura
e '
coe (pela observação de harmônicas) o resultado será mais correto, de 300 K.
mas, devido à fraca intensidade das harmônicas, nem sempre é
possível efetuar esta correção. (Sugestão: Faça um gráfico de v(v)/v em função de v, onde v é
A constante de anarmonicidade, em geral, é maior para o número de onda e v o número quântico vibracional do estado
vibrações envolvendo átomos leves, onde a amplitude de vibra- excitado.)
ção é grande, e pequena para vibrações envolvendo átomos pe-
sados. Deve-se lembrar que a lei de Hooke, usada na derivação 2-4 As funções de onda de um oscilador harmônico são da-
das equações de movimento do oscilador harmônico, é válida na das por expressões do tipo '1-'/q); NVH,(x)exp(x2/2), onde X ; raq
condição de haver "deslocamento pequeno em relação à posição e H 0 ; 1, H 1 ; 2Fq, H 2 ; 4o:q 2 -2. Analise a transição v;l para
de equilíbrio''. Assim, para uma ligação envolvendo um átomo de v;2 em termos da paridade das representações do momento de
hidrogênio, a anarmonicidade é grande. Por exemplo, para HCl transição.
co ex e é igual a 52 cm· 1, enquanto para DCl vale 27 cm- 1; para H 2 a
constante de anarmonicidade é 118 cm· 1 e para D 2 é 64 cm·'. 2.5 Considerando a função de onda particular, para v;l, de
um oscilador harmônico, mostre que o autovalor corresponde a
3/2 do valor da freqüência clássica.
Exercícios
2.6 O espectro Raman ressonante do vapor de 12 apresenta
2.1 As freqüências vibracionais das moléculas HCl, BrCl e bandas em 213, 426, 637, 846, 1054, 1261, 1467 e 1670cm1. Com
ICl são observadas, respectivamente, em 2885, 428 e 375 cm· 1 _ Dis- estes valores determine graficamente co e e we x e . U sanda programa
cuta o efeito das massas e das constantes de força nestas freqüên- computacional (Origin, Excel ou outro) obtenha a curva potencial
cias. Calcule as freqüências vibracionais de D35 Cl, H 35 CI e H 87 Cl. de Morse para o estado eletrônico fundamental.
lf
48 Oswaldo Sala

Sugestão: O valor da energia de dissociação, usando massa em


u.m.a. - não esqueça que está calculando para uma molécula e
não para um mo! - pode ser obtido pela equação:

3_ Rotação de moléculas
Para traçar o gráfico, varie a distãncia q (À) entre -0,3 e 2,5,
diatômicas
com intervalos de 0,05 A.

Literatura recomendada

BARROW, G. M. Introduction to Molecular Spectroscopy. McGraw-Hill,


1962.
EYRING, H., WALTER, J., KIMBALL, G. E. Quantum Chemistry. John
Wiley & Sons, Inc., 1944. 3. 1 Modelo do rotor rígido
HARRIS, D. C., BERTOLUCCI, M. D. Symmetry and Spectroscopy. Do-
ver Publications, 1989. Iniciaremos o estudo de espectros rotacionais de moléculas
HERZBERG, G. Molecular Spectra and Molecular Structure- I. Diato- diatômicas considerando o modelo de duas massas pontuais m 1
m.ic Molecules. Frentice Hall, Inc., 1939. e m 2 ligadas rigidamente, de modo que não haja distensão desta
HOLLAS, J. M. Modern Spectroscopy. John Wiley & Sons, 1987. ligação com a rotação do sistema. O modelo é justificado devido
NAKAMOTO, K. Infrared and Ramon Spectra of Inorganic and Coordi- ã massa do átomo estar concentrada no núcleo, cujo raio é da or-
nation Compounds. John Wiley & Sons, 1986. dem de 10·12 cm ao passo que a distância internuclear é da ordem
de lO·' cm.
Classicamente, podemos considerar o sistema girando ao re-
dor de um eixo, passando pelo centro de massas, com velocidade
angular w = 2rcvrot.
m1 m2

Q r Q
L<E:-- r 1--:;:>! . : : - - r 2 ------~.!

A velocidade de uma partícula a uma distância r, do centro


de massas é
50 Oswaldo Sala Fundamentos da espectroscopia Ramon e no infravermelho 51

A e11ergia do sistema será dada pela energia cinética, pois (como foi feito por Bohr para o átomo de hidrogênio), com uma
não havendo variação de distância a energia potencial pode ser pequena correção. Assim,
igualada a zero: 2
í:Cmiv)ri = L(m,wr)r, =w:Lm,r1 =lw=Jn=J h
E = T =21( m1v1 2 +m2V2 ')-1
-2ill '( m1r1 2 +m2r2 2) i i i 2 1t

Utilizando a definição de momento de inércia: onde J (=O, 1, 2 ... ) é o número quântico rotacional. Esta condição
leva aos valores de energia:
2 2
E 1 I 1 (I )' n J' h J'
' = Z. w = 2! w = 2f.
2
= 811: 2! .
resulta:
Para se ter valor idêntico ao obtido com a equação de
E= 21 Ico 2 (3.1)
Schródinger,
Colocando a origem do sistema no centro de massas, vale a h2
equação: m 1r 1 :::: m 2r 2 , com r=r 1 +r21 obtendo-se r 1 = m 2 (r-r 1)/m 1 e r2
E --·JCJ+l) (3.2)
J - 8n 2 l

= m 1(r-r2 )/m 2 , ou:


basta tomar como quantização do momento angular o valor
~J(J + l)ll, em vez de Jli.
Em unidade de cm- 1 a expressão para os níveis de energia
fica:
Substituindo estes valores na expressão do momento de
inércia teremos: .1 h
F.1 (cm ) = - 2- · J(J + 1) = BJ(J + 1) (3.3)
811: e!

onde B=hl8n 2cl (cm· 1 ) é conhecido como constante rotacional. Para


onde µ:::m 1m/(m 1+ m:) é a massa reduzida do sistema. Assim, o I em g-cm 2 , B = 27,99·10·40/I; para I em u.m.a.Á2 , B = 16,855/I.
sistema equivale ao de uma massa µ girando a uma distância r Obtidos os niveis de energia, vamos considerar as transições
do eixo de rotação. entre os estados rotacionais, ou seja, obter as regras de seleção
Classicamente não há restrição quanto à velocidade angular para os espectros Raman e no infravermelho.
e qualquer energia rotacional seria possível, em contradição com
a observação experimental. Utilizando a mecânica quântica, po-
demos determinar os autovalores da equação de Schróclinger: 3.2 Espectro no infravermelho

As funções de onda rotacionais envolvem, além do número


quântico rotacional J, o número quântico M, dos componentes do
Contudo, resultado idêntico pode ser obtido aplicando-se ao momento angular na direção do eixo z (eixo da ligação), Mli, onde
modelo clássico a condição de quantização do momento angular M = J, (J-1), (J·2) .. ., -J.
52 Oswaldo Sala Fundamentos da espectroscopia Ramon e no infravermelho 53

As funções de onda normalizadas, para J até 2 (com os ângu- Para determinar as regras de seleção no infravennelho, no
los mostrados na figura abaixo), podem ser escritas: modelo do rotor rígido, temos de considerar os elementos da matriz
do momento de transição, cujos componentes podem ser escritos:

8 (Rx)JM',,J"M" f
= lf'nrµoxlf'J"M"dT
(Ry)JM',,J'M" J
= lf'nrµoylf'J">!"dT
(R,)J'M,J'M" f
= lf'.JM'µ,,lf'J"M"dT
(3.5)
<p onde µ 0x µ 0,., µ0 , são os componentes do momento de dipolo per-
manente. Para que haja atividade no infravermelho é necessário
que µ 0 seja diferente de zero, ou seja, a molécula deve possuir
J=O, M=O; 'Voo ::: ~
2,,;,. momento de dipolo permanente. Como conseqüência, moléculas
J=l, M=O; \Jlrn =tH ·cose diatômicas homonucleares não apresentam espectro rotacional
no infravermelho.
J=l, M=±l; lf' 101 = t .JI ·sen8 · exp(±icp) (3.4) Supondo a molécula como um dipolo entre placas de um con-
'Vio = ±H·(3cos 2
8-1) densador, pela aplicação de um campo elétrico ela se orientará,
J = 2, M = ±1; lf' 201 = t v'* ·sen8 cos 8 , exp(±i<p) efetuando uma rotaçâo. Para molécula homonuclear, como não
há dipolo permanente, a aplicação do campo não produzirá ne-
J = 2, M = ±2; 'V 2±2 = t v'* ·sen 8 · exp(±2icp)
2
nhllm efeito.

sendo visualizadas nos diagramas da Figura 3.1 (Veja o apêndice


III para mais detalhes).

J=O: o M=O

J=l: 8 M=O ~ M=l


Uma análise detalhada das equações (3.4) e (3.5) leva à re-
gra de seleção para o infravermelho, ilJ = ±1. Há uma regra para
ilM (=O, ±1), que só precisa ser considerada na presença de cam-

J=2: Sl.
u M=O v_
~
M=l ~ M=2
po magnético ou elétrico. Podemos agora representar os níveis de
energia rotacional e prever o espectro infravermelho, evidente-
mente para molécula diatômica heteronuclear.
Figura 3.1- Representação das funções de onda rotacionais. Na Figura 3.2 são esquematizados os níveis, as transições
permitidas e o tipo de espectro observado. As transições permi-
Na ausência de um campo os estados são 2J+l vezes degene- tidas envolvem diferenças de energia (cm· 1 ) de 2B, 4B, 6B etc. O
rados, por exemplo, para J = 2 há degenerescência das 5 funções espectro consiste de linhas igualmente espaçadas de 2B, segundo
do onda, com M =O, M = ±1 e M = ±2. a expressão:
54 Oswaldo Sala

F h l -FJ = B(J+l)(J+2)-BJ(J+l) = 2B(J+l)

J FJ
(3.6)
' Fundamentos da espectroscopia Ramon e no infravermelho

onde a. 0 é a polarizabilidade intrínseca da molécula, v, a freqüên-


cia rotacional e v0 a freqüência da radiação incidente. De P =a.E,
substituindo a e E, obtém-se:
55

4 20B
" 2B 2B 2B 2B P = a 0 E 0 cos(2rcv" t) + t ·a, E, {cos[2n( v" -2v,)t] +
3 12B 1(-41(-41(-41(-41 +cos[211(v 0 +2v,)tJ)
2 6B
1 2B
o 2B 4B 6B SB
cm-1 O primeiro termo corresponde ao espalhamento Rayleigh e
o o
os outros dois aos espalhamentos Raman Stokes e anti-Stokes,
(a) (b)
respectivamente. O espaçamento entre as linhas Raman é o do-
Figura 3.2 -Esquema dos níveis de energia (a) e do espectro no infravermelho (b). bro da freqüência rotacional.
Diferentemente do infravermelho, no Raman pode-se obser-
var espectro rotacional de moléculas diatômicas homonucleares,
3.3 Espectro Ramon pois elas apresentam momento de dipolo induzido. As regras de
seleção são obtidas das integrais do momento de transição
O momento de dipolo induzido numa molécula diatômica
será diferente se o campo elétrico estiver na direção do eixo da
molécula ou numa direção perpendicular a este eixo. A polariza-
bilidade depende da orientação da molécula em relação ao campo onde i e j são x, y ou z e m e n são números quânticos rotacionais
e uma variação da polarizabilidade deverá ser observada durante
que caracterizam as duas funções de onda. Vale a regra de sele-
a rotação da molécula. ção i\J = O, ±2, onde i\J = O corresponde à radiação Rayleigh, o
Durante uma rotação completa da molécula o dipolo induzi- sinal"+" às linhas Stokes e o sinal"-" às linhas anti-Stokes.
do sofre variação duas vezes, pois a polarizabilidade é a mesma Examinando o esquema dos níveis de energia da Figura 3.3,
para direções opostas do campo, isto é, a freqüência de variação pode-se obter diretamente as freqüências Raman e fazer a previ-
da polarizabilidade é duas vezes a freqüência rotacional: são do espectro. As transições são obtidas da expressão:
~,
~-' ~-' ~,

FJ, 2 -F.1 =B(J+2)(J +3)-BJ(J + 1) = 4B( J + ~ J (3.7)


E

ex. :
1
0------0


2

I~o
2
0------0

'"
1

I: o
1
0------0

a'
2

Em relação à linha Rayleigh, a primeira linha Raman


(transição O --> ±2) estará a uma distância 6B cm· 1 • As outras
estarão igualmente espaçadas, entre si, de 4B cm· 1 • Este espa-
Sendo: çamento é o dobro do observado entre as linhas do espectro no
infravermelho.
a= a,+ a 1 cos[2n(2v,)t] e E= E cos(2rtv,t;
0
56 Oswaldo Sala Fundamentos da espectroscopia Ramon e no infravermelho 57

J F,

4 r - - - - - 20B

4B
Stokes

4B 6B 6B
anti-Stokes

4B 4B
3 12B
1<--r--->1<----7 r----71< >< -
7
1
2 6B (a) (b)
14B lOB 6B O 6B lOB 14B
1 2B Figura 3.4 - Esquema da distribuição de intensidade de acordo com a expressão
o o cm-1
(3.8): espectro no infravermelho (a) e espectro Raman (b), a linha central corres-
pondendo ao espalhamento Rayleigh.
(a) (b)

Figura 3.3 Esquema dos níveis de energia (a) e do espectro Raman (b). Na aproximação do modelo do oscilador rígido não se consi-
dera a energia potencial, não havendo níveis de energia dentro de
um poço como no caso vibracional. A curva de energia potencial
Com relação à intensidade das linhas no espectro rotacional, é obtida em função da distãncia internuclear, que neste caso é
Raman ou no infravermelho, deve-se considerar, devido à peque- constante. Nos espectros de rotação-vibração, que serão exami-
na energia dos estados envolvidos, a contribuição da distribuição nados adiante, ocorre variação desta distãncia, estando a rotação
estatística de Boltzmann, exp(-FJhc/kT), na população dos níveis. acoplada à vibração e os níveis de energia rotacionais e vibracio-
Além disso, cada estado J é 2J + 1 vezes degenerado e contribui nais estarão situados dentro de um poço potencial. O rotor rígido
com peso estatístico 2J+l. Assim, o número de moléculas no es- é somente um modelo que permite o cálculo dos níveis de energia
tado J será: de modo simples, aproximado. Um modelo real deve considerar o
acoplamento entre os estados rotacionais e vibracionais.
BhcJ(J + l)] Consideramos, até agora, os núcleos como massas pontuais e
(3.8)
kT com este modelo fizemos uma previsão dos espectros rotacion.ais.
A concordância com os resultados experimentais, para molécu-
las diatômicas heteronucleares, foi boa. Contudo, examinando os
Em primeira aproximação a intensidade é proporcional à
espectros rotacionais Raman de moléculas homonucleares, por
expressão (3.8).
exemplo 0 2 e N 2 , observaremos discrepâncias com o previsto, em
Para valores pequenos de J predomina o peso estatístico,
relação ao espaçamento das linhas e às intensidades relativas.
enquanto para valores mais altos predomina o decaimento expo- A razão dessa discrepâncja é que o núcleo possui um mo-
nencial. Como resultado, haverá uma distribuição de intensidade mento angular intrínseco, o spin nuclear, que contribui nos es-
das bandas rotacionais do tipo indicado na Figura 3.4. Este resul- tados rotacionais da molécula através de suas funções de onda
tado é válido para moléculas heteronucleares, mas para molécu- juntamente com o momento angular da rotação da molécula. O
las homonucleares, como veremos adiante, deve-se considerar a momento angular de spin é quantizado em unidades de lt, to-
função de onda de spin nuclear. mando o valor ~ICI + 1)1!, onde o número quântico de spin nuclear,
58 Oswalda Sala Fundamentos do espectroscopia Ramon e no Infravermelho 59

I, pode ser O, 1/2, 1, 3;, ... e já engloba a contribuição de todas as que a função deve permanecer inalterada (função par). Para nú-
partículas do núcleo. cleos com spin semi-inteiro a função de onda total troca de sinal
A função de onda total, na aproximação de Born-Oppenhei- (função ímpar) com esta mudança de posição. Assim, quando se
mer, pode ser escrita: opera nas funções de onda eletrônica, rotacional, vibracional e de
spin nuclear o resultado deve ser coerente, levando a função de
'PT =\jfc '\l'v ''Vr ''Vn (3.9)
onda total à paridade correta.
os índices e, v, r, n caracterizando, respectivamente, as funções Considerando um sistema referencial fixo no espaço (coorde-
de onda eletrônica, vibracional, rotacional e de spin nuclear. O nadas X,Y e Z), o efeito da rotação de 180° (operação C 2 ) na função
princípio de Pauli para moléculas diatômicas heteronucleares de onda rotacional corresponde a uma mudança de 180º em 8 nas
é irrelevante, pois os núcleos já são distintos, e a \jln pode ser equações (3.4), ou seja, a função de onda rotacional muda de si-
desprezada. Como conseqüência, todos os níveis rotacionais são nal de acordo com (-l)J; para J par a função de onda é simétrica e
permitidos e a população segue normalmente a distribuição de para J ímpar ela é anti-simétrica.
Boltzmann. Para moléculas homonucleares isto não acontece e é Quando efetuamos a rotação (C 2 ) no referencial fixo no espa-
necessário considerar o princípio de Pauli. ço, as coordenadas dos núcleos são trocadas. Quanto às coordena-
das dos elétrons (definidas no refencial fixo na molécula, x, y e z,
e com origem em seu centro de massas), na rotação elas mudam
3.4 Moléculas diatômicas homonucleares de posição. Em outras palavras, as coordenadas dos núcleos e elé-
trons foram modificadas e temos de voltar estas últimas (coorde-
A rotação de uma molécula diatômica homonuclear troca a nadas dos elétrons) à posição origínal. Para os elétrons voltarem
posição de dois átomos idênticos e o princípio de Pauli impõe cer- à posição original pode-se realizar a seguinte seqüência de opera-
tas condições para a troca das coordenadas espaciais e de spin ções na função de onda eletrônica 'I',: efetua-se uma operação de
de elétrons e núcleos. Se os spins nucleares forem semi-inteiros inversão (indicada pela operação ie) e em seguida uma de reflexão
(férmions) esta troca acarreta mudança do sinal na função de (o) por um plano perpendicular ao eixo e, (direção vertical na
onda total, mas se eles forem inteiros (bósons) o sinal da função Figura 3.5) e contendo o eixo de ligação da molécula, portanto,
de onda total é conservado; isto afetará a população dos níveis. A perpendicular ao plano do papel. É importante notar que estas
estatística nuclear e as propriedades de simetria das funções de operações i, e cr, atuam somente na função de onda eletrônica.
onda rotacional, eletrônica e vibracíonal envolvidas na função to- Para voltar os estados dos núcleos à posição origínal efetua-se, na
tal adquirem papel fundamental na interpretação dos espectros função de onda nuclear, a operação indicada por pn, que troca os
rotacionaís destas moléculas. estados dos núcleos. O resultado destas operações foi permutar
No estudo da rotação de moléculas diatômicas homonuclea- somente a posição dos núcleos idênticos (troca da numeração dos
res, uma aproximação importante é a de Born-Oppenheimer, que mesmos). Eliminamos efeitos não desejados na rotação inicial da
permite operar separadamente cada uma das funções de onda molécula e o resultado foi simplesmente o de renomear os nú-
em (3.9). É importante considerar a paridade da função de onda cleos, trocan.do 1 por 2 e vice-versa, como mostra a Figura 3.5.
total, pois a rotação da molécula troca a posição de núcleos idên- A função de onda vibracional depende somente da distância
ticos e o princípio de Pauli impõe, para núcleos com spin inteiro, internuclear e nâo é afetada pela operação de rotação, portanto
60 Oswaldo Sola Fundamentos da espectroscopia Ramon e no infravermelho 61

não precisa ser considerada. Assim, a função de onda total fica Concluindo, a operação C2 atua na função de onda rotacio-
determinada pelo produto (C 2 \f',)(i,cr,\f',), além da contribuição nal, modificando-a de acordo com (-1)-1; as operações de inversão
da função de spin nuclear. (i) e reflexão (cr,) atuam na função de onda eletrônica e a opera-
Resumindo, em moléculas diatômicas homonucleares a tro- ção de permutação (p) atua na função de onda nuclear.
ca de posição dos núcleos idênticos equivale, na função de onda O efeito na função de onda total pode ser condensado na
total, a uma seqüência de operações de simetria: (1) rotação num notação:
eixo c,, (2) inversão, (3) reflexão por um plano contendo a ligação
e (4) permutação dos núcleos. O efeito destas operações de sime- (3.10)
tria na função de onda total, ou seja, na função de onda eletrôni-
ca, vibracional, rotacional e de spin nuclear, na aproximação de sendo P o operador que permuta os rótulos 1 e 2 dados aos núcleos.
Born-Oppenheimer, equivale à troca de posição e dos estados (a Com relação à função de onda eletrônica, 'I' ,, na operação
ou ~) dos núcleos, como pode ser visto no esquema da Figura 3.5. de reflexão ela pode ficar inalterada ou trocar de sinal. Convém,
Para facilitar a compreensão, os átomos (embora iguais) estão aqui, lembrar a notação usual para as funções de onda eletrôni-
identificados pelos números 1 e 2, a seta indica os estados de spin cas em relação à operação de reflexão por um pi ano contendo o
dos elétrons e os círculos claros e escuros indicam os estados dos eixo de ligação da molécula: índice superior"+" indica que ela é
núcleos, por exemplo u. ou ~· Em cada linha é mostrado o que simétrica e índice superior "-" que ela é anti-simétrica. Assim,
ocorre pela operação de simetria indicada. estados L+, rr+ ... não mudam na reflexão e estados L-, rr-... trocam
de sinal na reflexão. Na operação de inversão a função de onda
eletrônica pode ser simétrica ou anti-simétrica, sendo os estados
correspondentes designados pelos índices "g" ou "u", por exemplo,
Lg, Lu, ng, ITu etc.
Correspondendo à notação s, p, d, ... para os valores do nú-
mero quântico do momento angular C dos elétrons em um átomo,
para moléculas diatômicas usa-se o símbolo À para designar o
número quântico dos componentes do momento angular na linha
unindo os núcleos. Para À = O, 1, 2, ... usam-se as letras gregas
a, n, 8, .... Em correspondência ao número quântico do momento
angular resultante de vários elétrons, L, usa-se o símbolo A para
os estados resultantes dos átomos da molécula, sendo os valores
de A = O, l, 2, representados pelas letras gregas maiúsculas, ~.
0,L)., ...
A contribuição da função eletrônica para P'F, na expressão
(3.10), foi (i,cr,\jl,). Vamos examinar o que acontece quando apli-
Figura 3.5 - Esquema do efeito das operações de simetria na rotação da molécula camos esta expressão em moléculas diatômicas homonucleares,
diatõmica homonuclear. para os seguintes estados fundamentais:
't
62 Oswaldo Sala Fundamentos da espectroscopia Ramon e no infravermelho 63

L"g : por ser g não muda de sinal pela operação i e. Por ser + não tria multiplicada por (-l}J. Assim, paraJ par o sinal+ ou-é igual
muda na reflexão, portanto, iecre '+'e= o/e· ao da função de onda eletrônica para a operação de reflexão. Estes
Lu: por ser u muda de sinal pelai, e por ser - muda de sinal pela resultados estão resumidos no esquema da Figura 3.6 para os es-
operação ae; resulta que iecrc '+'e ='+'e· tados eletrônicos fundamentais indicados e para cada valor de J.
L •u : por ser u muda de sinal pela ie e por ser + não muda pela a e , J
obtendo-se iecre 't'e = - 'Vc·
s
L; : por ser g não muda de sinal pela i, e sendo - muda de sinal 4 + a a + s

pela operação cre; resulta iecre \j/6 = - '+'e· 3 a s a


+ +

2 s + a a + s
Consideramos somente os estados eletrônicos fundamentais 1 a s a
+ +
L, pois são os únicos que ocorrem nos espectros rotacionais destas o s + a a + s

moléculas. 'I'• 'I~


• 'I: )L~

A contribuição da função de onda rotacional é, como foi vis- Figura 3.6 - Esquema de níveis rotacionais de moléculas homonucleares.
to, c,'11, = (-lF\il,, o sinal depende de J ser par ou ímpar. Assim,
nos quatro exemplos dos termos eletrônicos que foram vistos, se Para a molécula de hidrogênio, cujo spin nuclear é I = l/2 (fér-
considerarmos também a contribuição rotacional o resultado será mion) e o estado eletrônico fundamental é 1 L;, pelo princípio de
simplesmente multiplicar os estados obtidos por +1 ou -1, para J Pauli a função de onda total deve trocar de sinal pela permutação
par ou ímpar, respectivamente. No primeiro exemplo, iecr,_, i.ve = C, dos núcleos, P'l' = -'!'. Sendo o spin Yz, eles estarão nos estados
o sinal será conservado para J par e haverá troca de sinal para J de spin a (1') ou B(.J, ), resultando de suas combinações estados
ímpar, na função de onda total. tripletos (spins paralelos), cuja função de onda é simétrica ('lln'),
O produto 'V, '11, corresponde a função de onda total omitindo ou estados singletos (spins antiparalelos), cuja função de onda é
a contribuição da função de onda do spin nuclear, equivale a '!'/'lln· anti-simétrica (ljf ª 11
3
):

A simetria ou anti-simetria do produto (C 2 '11,. )(i,cr, '11) é represen- a(l)a(2)


tada nos níveis rotacionais pelas letras "s" ou "a", respectivamen- '11~ = B(llPC2J
te. A simetria ou anti-simetria dos níveis rotacionais, resultante { (3.11)
a(l)B(2) + B(l)a(2)
da inversão de todas as partículas costuma ser representada nos
esquemas dos níveis de energia pelo sinal "+" ou "-", respectiva- ~':' = a(l)B(2)- B(l)a(2)

mente (esta notação + ou - não deve ser confundida com estes si- onde os números entre ( ) correspondem à numeração dos núcleos.
nais que comparecem na função de onda eletrônica). Esta inversão Para funções de onda de spin nuclear simétricas p n \~ n ' = 'V n •;
pode agora ser considerada como uma rotação de 180º seguida de para funções anti-simétricas Pn\V 11ª 8 = -\j/11 ªs. Como no 1 H 2 o spin
reflexão por um plano perpendicular ao eixo internuclear. Como nuclear é semi-inteiro (férmion), a função de onda total muda
as coordenadas dos elétrons são definidas em relação aos núcleos de sinal, P'l' = -'!'. Sendo a '11, simétrica, deve-se considerar na
(referencial na molécula), na rotação a '11, não é afetada. Na re- função de onda total a contribuição da função rotacional e de spin
flexão, para estados L' a '11, conserva o sinal e para estados L- ela nuclear, de modo que o produto da contribuição das duas funções
muda de sinal. A simetria para cada nível dependerá desta sime- troque o sinal da função total, portanto:
,,
64 Oswaldo Sala Fundamentos da espectroscopia Ramon e no infravermelho 65

• para os estados simétricos, \j/n~' só existirão estados rota- J J


cionais com J ímpar
4 ---------------------- - a 4 +s
• para os estados anti-simétricos, \l'n"rn, só existirão estados
rotacionais com J par.
3 +s 3 ---------------------- -a
Existem, portanto, dois tipos de moléculas de hidrogênio, 2 ---------------------- - a 2 +s
o orto-hidrogênio, com spins paralelos, e o para-hidrogênio, com 1 +s 1 ---------------------- -a
O ---------------------- - a
spins antiparalelos. Como é mostrado em (3.11), há três estados
1602
º +s

possíveis no primeiro caso e um no segundo. Esta abundância


Figura 3. 7 - Níveis de energia rotacionais para 0 2 e Cl2 ;
relativa, de 3:1, é responsável pelas intensidades observadas no
(--)representam níveis existentes e(----) níveis não existentes.
espectro Raman.
Para spin nuclear inteiro (bósons), pelo princípio de Pauli a
função de onda total deve ser simétrica (conserva o sinal) após Para spin nuclear diferente de zero, embora a proibição de
a permutação dos núcleos, P'l'='t'. No caso de spin nuclear I =O, a transição radiativa entre estados simétricos e anti-simétricos
permutação não afetará o sinal da autofimção de spin, a simetria continue válida, o mesmo não ocorre para transições não radia-
da função de onda total será determinada pelo produto da 'I', e da tivas, como as transições colisionais. Haverá a possibilidade de
'I',· Como conseqüência do princípio de Pauli só haverá níveis simé-
existirem níveis com J par e com J ímpar e a sua população de-
penderá do spin nuclear total da molécula.
tricos, sendo a proibição de intercombinação entre estados simétri-
A análise do espaçamento entre as linhas Raman permite
cos e anti-simétricos bastante rigorosa. Todas as moléculas de
determinar se os níveis existentes numa molécula diatômica ho-
uma espécie química com 1 = O existirão somente para niveis com
monuclear com I = O são com J par ou com J ímpar. Sem conside-
J par ou para níveis com J ímpar, dependendo do estado eletrôni-
rar o spin nuclear a separação entre a primeira linha Stokes e a
co fundamental, como é mostrado nos dois exemplos que seguem.
primeira linha anti-Stokes seria 12B e o espaçamento das linhas
Para a molécula de 16 0 2 (spin nuclear I = O, bóson), o es-
sucessivas 4B, ou seja, apresentam uma razão de 3:1. Para spin
tado eletrônico fundamental é anti-simétrico (determinado pela
nuclear I =O, se só existirem níveis com J par estes espaçamentos
contribuição dos elétrons (2pn;)2 ), sendo seu termoª~,). Como a serão respectivamente 12B e 8B, ou seja, a razão será de 3:2; se
função de onda total deve ser simétrica (bóson) a função de onda só houver níveis com J ímpar os espaçamentos serão 20B e SB,
rotacional será ímpar, ou seja, existirão somente níveis rotacio- razão de 5:2, que é o caso do O,.
nais com J ímpar. Para moléculas com átomos de spin nuclear diferente de zero
Para a molécula de 35Cl2 (I = O) a função de onda total deve existirão tanto níveis rotacionais com J par como níveis com J ím-
ser simétrica; como o estado eletrônico fundamental é sirhétrico, par, mas a população destes níveis depende do spin nuclear total da
~ ;, só existirão níveis rotacionais com J par, não ocorr~ndo os
1
molécula. O momento de spin nuclear total da molécula, T, pode ser
com J ímpar. Estes dois exemplos estão ilustrados na Figura 3.7. obtido pela regra de adição vetorial dos momentos angulares, for-
Algumas considerações adicionais devem ser feitas em rela- necendo os valores T = 21, 21-1 .. ., O. Para moléculas homonucleares
ção às distribuições estatísticas de Base-Einstein e a de Fermi- com spin nuclear I = Vz, por exemplo o hidrogênio, o momento de
Dirac, já mencionadas. spin total T será 1 ou O, conforme os spins sejam paralelos ou anti-
66 Oswoldo Saio
l Fundamentos da espectroscopia Ramon e no infravermelho 67

paralelos, respectivamente, como foi visto. Os estados com J par e ou ímpar, pois a razão de intensidades entre linhas consecutivas
J ímpar estarão populados diferentemente, devendo-se considerar no espectro será de 6:3, ou 2:1. No N 2 observa-se que são mais
a degenerescência dos estados para determinar esta população. intensas as linhas com J par, ao contrário do caso anterior, do 1H 2
Na presença de um campo magnético um nível para um dado (com 1 = 1/2), on.de as mais intensas são com J ímpar.
Té desdobrado em 2T+l níveis, correspondentes aos componentes Destes dois exemplos conclui-se que: se houver alternância de
de T na direção do campo, que são caracterizados pelo número intensidades na razão 3:1 o spin nuclear será V2; se esta razão for
quântico magnético M,,, com MT = T, T-1, T-2 ... , -T. Isto significa 2:1 o spin nuclear I será 1. Portanto, pelo espectro rotacional pode-
que o estado T é degenerado, envolvendo 2T + 1 estados, descritos se determinar o spin nuclear de molécula diatômica homonuclear.
por MT. Na ausência de campo, uma transição para um estado Obtidos os níveis de energia podemos considerar as tran-
T envolve transições para todos os 2T+l estados (embora tendo sições possíveis. Na Figura 3 .8 estão reproduzidos os espectros
a mesma energia). Dizemos que o estado T tem peso estatístico
rotacionais Raman do O2 e do N 2 •
2T + 1, que irá contribuir na intensidade. Por exemplo, para T =
A banda fraca em O cm- 1 é devida ao espalhamento Raylei-
1 e T = O, os pesos estatísticos serão respectivamente 2xl+l = 3
gh, que foi grandemente atenuado para não danificar a fotomul-
e 2x0+1 = 1. Significa que, nos espectros, as bandas envolvendo
tiplicadora.
transições entre illveis rotacionais simétricos e as entre níveis ro-
tacionais anti-simétricos apresentarão uma razão de intensidade
de 3:1. Além deste peso estatístico deve-se considerar a degene-
rescência do estado rotacional, dada pelo peso estatístico 2J+l, ou
seja, o peso estatístico total será (2T+ 1)(2J+ 1).
Se o spin nuclear for I = 1, por exemplo no nitrogênio, o spin
nuclear total poderá tomar valores T = 2, 1, O, como vemos pelo
esquema de somas vetoriais:

l=l l=l -150 -100 -50 50 100 150

-----l>
T=2

Os pesos estatísticos serão 5, 3 e 1. Como I é inteiro (bóson)


a '!'T será positiva; sendo o estado eletrônico fundamental do ni-
trogênio (simétrico), para a função de spin nuclear simétrica, os
valores de J serão pares ('!'T simétrica) e para a função de spin
anti-simétrica, os valores de J serão ímpares ('!' T anti-simétrica).
Por outro lado, as funções de onda de spin para T par (2 e O) terão
a mesma simetria (oposta à da função para T = 1). Assim, os esta-
dos envolvendo T par terão peso estatístico 5+ 1 = 6, enquanto os -150 -100 -50 o 50 100 150
envolvendo T ímpar terão peso estatístico 3. Através do espectro
é possível determinar a simetria das funções de spin para T par Figura 3.8 - Espectros rotacionais do 0 2 e do N 2•
68 Oswaldo Sala Fundamentos da espectroscopia Ramon e no Infravermelho 69

Na Tabela 3.1 estão listados os números de onda das primei- momento de transição os componentes da polarizabilidade, ª='
ras linhas destes espectros e as atribuições do lado anti-Stokes e a ... , envolvem dois índices e na operação de inversão os produtos
Q •
do lado Stokes, respectivamente. dos dois índices não trocam de sinal. O integrando permanecera
inalterado se as duas funções de onda tiverem a mesma paridade.
Resumindo, a intensidade das bandas nos espectros rotacionais
02 N2 será função da distribuição de Boltzmann, do peso estatístico
cm- 1 Atribuição cm- 1 Atribuição cm-1 Atribuição cm-1 Atribuição
2J+l e do peso estatístico devido ao spin nuclear, 2T+l.
14,3 J=3--> J=l 14,3 J=l->J=3 12,4 J=2-> J=O 12,0 J=O--> J=2 Para moléculas homonucleares isotópicas, rno 180, 1H 2 H,
25,8 J=5->J=3 26,1 J=3->J=5 19,9 J=3-> J=l 20,0 J=l->J=3 "Nl'N, ssc137Cl, uma permutação dos núcleos não corresponde
37,2 J=7--) .T=5 37,2 J=5 --) J=7 27,9 J=4-->J=2 27,9 J=2-> J=4 mais à configuração original, 11ão existindo a separação em esta-
48,6 J=9-> J=7 48,9 J=7-> J=9 35,8 J=5 __, J=3 35,8 J=3-> J=5 dos simétricos e anti-simétricos. Não será observada alternãncia
60,3 ,J=ll __, J=9 60,3 J=9 __, J=ll 43,8 J=6 __, J=4 43,8 J=4 _, J=6 de intensidades nem ausência de linhas alternadas; haverá ní-
71,7 J=l3 __, J=ll 72,1 J =11 __, J=13 51,6 J=7-; J=5 51,8 J=5 __, J=7 veis tanto com J par como com J ímpar, a população obedecendo
83,1 .)=15--> J=13 83,1 J=l3-; J=15 59,6 J=8--> J=6 59,8 J=6 __, J=8 normalmente à distribuição de Boltzmann, como para moléculas
Tabela 3.1. Número de onda (cm- 1) e atribuição das primeiras bandas anti-Stokes heteronucleares.
e Stokes nos espectros da Figura 3.8.

3.5 Rotor não-rígido


Com os dados obtidos é possível calcular a distância intera-
tôrnica para estas duas moléculas. Usando a equação (3. 7) e con-
Para o oscilador harmônico construímos um modelo de duas
siderando, corno exemplo, a banda em 37,2 cm· 1 (J=5->J=7) para
massas ligadas por uma mola sem peso. Para o rotor rígido, o mo-
o 0 2 e a banda em 27,9 cm·' (J=2->J=4) para o N,, teremos, res-
delo foi de duas massas ligadas por uma barra rígida, sem peso.
pectivamente: 37,2 = 4B(5+3/2) e 27,9 = 4B(2+3/2), que fornecem
Desde que a molécula pode vibrar ao mesmo tempo em que efetua
os valores de B destas duas moléculas. Usando I em u.m.a.A2 ,
rotações, seria mais conveniente estudar as rotações num siste-
sendo B dado por 16,855/I (início do capítulo), igualando esta ex-
ma não-rígido, com as massas ligadas por mola sem peso. Como
pressão aos valores obtidos de B e lembrando que I = µr 2 , obtêm-
conseqüência teremos de considerar a força centrífuga quando o
se os valores das distâncias de equilíbrio r(Ü 2) = 1,21 A e r(N,) =
sistema efetua rotação; como a velocidade de rotação depende do
1,09 A. A distância interatômica menor para o N 2 é coerente com
número quãntico rotacional J, a distância internuclear aumenta-
a ligação tripla nesta molécula.
rá com este valor.
As regras de seleção no Raman, obtidas das integrais do mo-
Sendo a distância entre duas massas do sistema sem qual-
mento de transição:
quer movimento r e' com a rotação esta distância passa a ter um
valor r; haverá uma força de restauração k(r-r,), que é equilibra-
da pela força centrífuga:
resultam em: termos "+"combinam com termos "+"e os"-" com
os "-", o que concorda com a regra i3.J ; : :; O, ±2. Nas integrais do
70 Oswalda Sala Fundamentos da espectroscopia Ramon e no infravermelho 71

A energia do sistema contém, agora, energia cinética e ener- Em moléculas com centro de simetria os níveis rotacio11ais
gia potencial e o resultado que se obtém é: têm alternadamente diferentes pesos estatísticos, como para mo-
2
léculas diatômicas homonucleares. Se os spins de todos os núcleos
h h' 2 2
E.r = 2 2 • J(J + l)- 2 , • J (J + 1) forem zero, como no caso do C0 2 ( 12 C tem 1 = O), os níveis anti-
4
8rr µr, 32rr kµ r, simétricos estarão ausentes. O estado eletrônico fundamental do
ou C0 2 é L;, assim, oR níveis rotacionais ímpares estarão ausentes,
ao contrário do que acontece com o 16 0 2 , onde o estado eletrônico
F" (cm- 1) = BJCJ+l) - DJ'(J+1) 2 (3.12)
fundamental é í:g e os níveis com J par estão ausentes. Isto pode
onde ser verificado no espectro Raman ou no espectro de rotação-vibra-
ção, no infravermelho, do modo de estiramento anti-simétrico do
1
fµ(k
com w = - - C0 2 , como será visto no capítulo 12. Para a molécula de 16 0C 1'0,
' 2rrc que não é centro-simétrica, todos os níveis estarão presentes.

O termo D, conhecido como constante de distorção centrí-


fuga, é muito menor do que B; por exemplo, para HCI B = 10,39
3.7 Rotação-vibração
cm· 1 e D = 0,0004 cm· 1 _ Nos valores das freqüências observadas
no infravermelho:
1,
'~
Nos espectros de rotação-vibração de moléculas diatômicas
3
F.r, 1 -FJ=2B(J + 1)-4D(J + 1) no estado gasoso, as transições rotacionais ocorrem simultanea-

ounoRaman:

FM -FJ = (4B-6D)(J +f)-8D(J +f)


3

esta correção acarreta apenas pequeno deslocamento para valo-


l
,
!;
mente com tran.sições vibracionais, dando origem a uma estrutu~
ra fina nas bandas vibracionais. Mesmo quando esta estrutura
não é resolvida, no caso .de moléculas poliatõmicas, o contorno
das bandas pode ser útil na atribuição vibracional. Os espectros
de rotação-vibração podem dar mais informações do que os de
res mais altos de J. rotação pura, pois se pode determinar não só as distâncias intera-
tômicas no estado vibracional fundamental (v = O) como também
estas distâncias para estados vibracionais excitados, v = 1, 2 ....
3.6 Rotação de moléculas poliatômicas lineares O modelo mais simples para estudar rotações-vibrações
seria utilizar as aproximações de um oscilador harmônico e de
A teoria desenvolvida para moléculas diatômicas é válida um rotor rígido, considerando os termos de energia como a soma
para moléculas poliatômicas lineares. Para moléculas triatómi- das energias do oscilador harmônico e do rotor rígido. Em cm· 1
cas lineares, com 3 átomos diferentes, XYZ, pelo valor da cons- teríamos:
tante rotacional B obtém-se o valor do momento de inércia, mas
não os valores das distâncias interatômicas XY e YZ. Para poder T,,,(cm 1
) = w,(v +~)+BJ(J + 1) (3.13)
determiná-las, deve-se obter os espectros com diferentes espécies
isotópicas. onde w, = C1/2rrc)~k/µ e B = h/8n 2cL
72 Oswaldo Sala

As regras de seleção continuam válidas; para o infraverme-


' Fundamentos da espectroscopia Ramon e no Infravermelho

Contudo, nos espectros de rotação-vibração estão envolvidos


73

lho Av = ±1 e AJ = ±1, onde os dois sinais devem ser considerados, dois estados vibracionais e o peso estatístico de ambos irá contri-
e para o Raman, Av = ±1 e AJ = O, ±2. buir para a intensidade. No lugar de 2J"+l deve-se utilizar o valor
Para os espectros de rotação-vibração, os números quânticos médio de 2J+l nos dois estados, iEC2J'+1)+(2J"+l)] = (J'+J"+l) (A
rotacionais J" e J' designam o valor de J no estado vibracional rigor, isto também é válido para espectros rotacionais).
inferior e superior, respectivamente.
Nos espectro no infravermelho, para a transição de v = O TV,
para v = +1, as duas possibilidades AJ = -1 (J" = J--> J' = J-1) e AJ
4 , ~- rn, + 20B,
I'

= +1 (J" = J--> J' = J+l) darão origem aos ramos P e R: 3 ~ W"+l2B

2 fw,+6B 1
vl' = w,(1 +~)-w,( O+~) +B(J -l)J -BJ(J + 1) 1 t(JJ,+2H 1
o '" "' 3 (J) +o 'I'

. !T
2 ' 1·
= w, -2BJ (J=l, 2 ... ) 1 1 !
(3.14)
~
1 1
4 w,+208"

vR = w,(1 +~J-w,( O+~J+B(J + l)(J +2)-BJ(J + 1)


3 ~ w, + 12R, -

= w, +2B(J + 1) (J=O, 1,. .. ) 2 tw,+6B 0

1 +w,+2B"
Nestas expressões, J representa o número quântico rota- o ~
p R ro, +O
o s
cional do estado vibracional mais baixo, neste exemplo, o estado
fundamental. O espectro seria constituído de linhas igualmente
1 1 1 1 1 1 1 1
Infravermelho
1 1 1
Ramam
1 1

espaçadas de 2B. A transição vibracional inativa (J" = O--> J' = 0), Figura 3.9 - Esquema dos níveis de energia e dos espectros de rotação-vibração
embora não seja observada, pode ser deduzida pelo espaçamento no infravermelho e Raman.
das bandas. No espectro Raman, respectivamente para AJ = -2 e
AJ = +2, teremos os ramos O e S, além do ramo Q para AJ = O. Na A intensidade das bandas pode ser escrita:
Figura 3.9 estão esquematizados os níveis de energia, as transi-
ções permitidas e o tipo de espectro observado no infravermelho
I=K(J'+J"+l)·exp[ J"(J';+l)h'] (3.15)
enoRaman. 8n IkT
Nos espectros de rotação a intensidade relativa das bandas
depende da distribuição de Boltzmann e do peso estatístico, sen- sendo K uma constante de proporcionalidade.
do proporcional a: No infravermelho o espectro previsto seria simétrico em re-
lação ao centro (onde estaria a transição proibida por AJ = O)
J"(J"+l)h']
NJ =N,(2J"+l)·exp[ e constituído de linhas igualmente espaçadas; na realidade o
8n 2 IkT
espectro mostra que o espaçamento não é constante, do lado do
'

i
74 Oswaldo Sala Fundamentos da espectroscopia Ramon e no infravermelho 75

ramo P ele aumenta com o valor de J e do lado do ramo R diminui e o ramo R, transições de J" = J (de v =O, por exemplo) para J' =
com o aumento de J. Este efeito não pode ser atribuído à distor- J+l (do nível v = 1), seria:
ção centrífuga, devido à pequena contribuição de seu termo na
energia dos níveis rotacionais, nem à anarmonicidade, pois esta vR = w,(1 + t)- m,(o+ t) + B 1 (J + l)(J + 2)-B,J(J + 1)
alteraria apenas o termo vibracional, deslocando o espectro como (3.19)
2
um todo. Deve-se levar em conta a interação entre o movimento = m, + 2B 1 + (3B 1 -B,)J + (B 1 -B,)J (J =O, 1 ... )
rotacional e vibracional, traduzida por um termo de acoplamento
envolvendo ambos os números quânticos, v e J. Neste caso não Como veremos adiante, a distância internuclear r 1 (para v =
se considera a aproximação de Born-Oppenheimer. Os níveis de 1) é maior do que a distância internuclear r 0 (para v = O), de modo
energia (cm· 1) podem der escritos: que 11 >1 0 e, conseqüentemente, B 1 < B 0 . Assim, o coeficiente de J 2 ,
nas expressões de vR e vP' torna-se negativo, causando uma dimi-
(3.16) nuição da energia das transições com o aumento de J; quando J
aumenta as linhas do ramo R se aproximam, enquanto no ramo P
onde elas se afastam, pois v sempre diminui com o aumento de J. Isto
pode ser observado nos espectros da Figura 3.10, sendo a assime-
(3.17) tria entre os ramos P e R mais acentuada nas harmônicas mais
altas do que na fundamental, pois B 2 < B 1 < B 0 e os coeficientes de
J', nas equações (3.18) e (3.19), serão mais negativos para valores
sendo a, a constante de acoplamento rotação-vibração, B" e B,
de número quântico v maior.
as constantes rotacionais para os níveis no estado vibracional v
Os espectros de rotação-vibração permitem determinar os
e na posição de equilíbrio. Substituindo B", em (3.16), pela sua
valores de B 1 e B0 (e B 2 quando se observa a segunda harmôni-
expressão (3.17):
ca). No diagrama dos níveis de energia, considerando pares de
transições que partem do mesmo nível rotacional do estado v = O
(uma do ramo R e outra do ramo P), teremos informações sobre
os espaçamentos energéticos entre níveis rotacionais no estado
O terceiro termo no segundo membro mostra o acoplamento rota- v = 1; transições que partem de níveis rotacionais diferentes em
ção-vibração, por conter o produto dos números quânticos vibra- v = O e terminam num mesmo valor de J para v = 1, darão infor-
cional (v) e rotacional (J). mações sobre os espaçamentos entre níveis rotacionais do estado
Com esta correção o ramo P, contendo as transições de J" = vibracional fundamental.
J (do nível vibracional fundamental v =O, por exemplo) para J' = No exemplo do esquema que segue, as transições de J" = 1
J-1 (do nível v = 1), ficaria: para J' = O e J" = 1 para J' = 2 fornecem a diferença de energia
entre os níveis J' = O e J' = 2 do estado vibracional v = 1, ou seja,
vp = w,(1 + t)- w,(ü +t) + B 1 (J - l)J -B,J(J + 1) 6B 1 • As transições de J" = 2 para J' = 1 e J" =O para J' = 1 deter-
(3.18) minam a diferença de energia entre os níveis J" = 2 e J" ::: O do
(J = 1, 2 ... ) estado vibracional fundamental v = O, 6B 0•
76 Oswaldo Sala Fundamentos da espectroscopia Ramon e no infravermelho 77

J' J' forma da curva em relação à do oscilador harmônico. Pode-se


pensar que num determinado nível de energia uma partícula fica
2 2
v=l " 1 v=l 1
oscilando na região entre as paredes do poço potencial. Se o os-
o o cilador for harmônico, a curva será simétrica e a posição média
será sempre igual are; se a curva potencial não for simétrica (os-
J" J" cilador anarmônico) haverá um deslocamento da posição média
tanto maior quanto mais alto for o nível de energia considerado,
2 2
v=O isto é, rc < r0 < r 1 ... Quanto maior for a anarmonicidade, maior
1 v=O 1
o o será esta diferença, como se verifica no exemplo anterior do H 2 e
Vp{J) VR(l) Yp(2) VR(O) D 2 , lembrando que para o H 2 a constante de anarmonicidade (118
cm· 1) é maior do que para D 2 (64 cm· 1).
Analiticamente, das expressões dos ramos P e R partindo de
ummesmoJ v= 3
(J = 1, 2 ... )
v= 2
obtém-se o valor de B,. Para J+2 na expressão de vP (3.18) e J na
expressão de v" (3.19) v= 1

(J =O, 1 ... ) v= O
obtém-se o valor de B 0 •
Conhecidos B 1 e B 0 , da equação (3.17) determina-se B, e a,.
Destes valores calcula-se os momentos de inércia corresponden-
Figura 3.10 - Potencial anannônico e distâncias interatômicas.
tes, 11' 10 e 16 , e as distâncias interatõmicas rl' r0 e re.
Considerando os valores das constantes para H 2 e D 2 tabe- Na Figura 3.11 estão reproduzidos os espectros de absor-
lados a seguir, observa-se que somente a distância de equilíbrio bância no infravermelho do HCl gasoso, na região da transição
r, é a mesma, diferindo de 0,002 A para r 0 (v =O) e 0,008 A para vibracional fundamental, da primeira e da segunda harmônica,
r 1 (v=l). estando os valores das freqüências tabeladas no Exercício 3.5.
B.(cm- 1) r" (À) r, (À) Observa-se na figura o desdobramento das bandas, devido ao
efeito isotópico da mistura H 35 Cl/H37 Cl.
60,809 2,993 0,742 0,750 0,770
Nata-se, neste desdobramento, que a separação aumenta
30,429 1,049 0,742 0,748 0,762
por um fator da ordem do número quântico vibracional do termo
Para explicar esta variação, vamos considerar a forma da superior, quando se passa da fundamental para as harmônicas.
função potencial do oscilador anarmônico mostrada na Figura Devido à anarmonicidade, as freqüências correspondentes às po-
3.10. A posição de equilíbrio (r,) não deve depender da anarmo- sições das transições proibidas (L'.J = 0) não correspondem exata-

1
nicidade da função, mas r0 , r 1, r2 ... vão depender da variação da mente aos fatores 2 e 3 em relação à freqüência fundamental.
78 Oswaldo Sala Fundamentos do espectroscopia Ramon e no infravermelho 79

A partir dos dados espectrais pode-se determinar a constan- Exercícios


te de anarmonicidade, as constantes rotacionais B", B 0, B 1 e B 2 e
as correspondentes distâncias interatômicas r e' r 0 , r 1 e r 2 . 3.1 Determine a distância internuclear do HCl sabendo que
Considerações semelhantes valem para os espectros Raman, em seu espectro rotacional, no infravermelho, foram observadas
levando-se em conta as regras de seleção para este efeito. bandas em 82,7, 103,4, 124,0, 144,7 e 165,4 cm· 1 .
3.2 Obtenha a expressão de J (Jm•) para o valor máximo de
(e)
população dos níveis de energia rotacionais e aplique esta expres-
são para a molécula de HCl nas temperaturas 200, 300 e 500 K.

L1illili,
(Sugestão: Derive em relação à J a expressão do número de

) Ili J
'
moléculas no estado J e iguale a zero, resolvendo a equação para J.
Considere o número inteiro mais próximo da solução. Embora para
derivar esteja considerando uma função contínua, o valor obtido,
8450 8400 8350 8300 8250 8200 8Ifi0 8100 na realidade, deve ser discreto.)
cm· 1

(b)
Í 3.3 Faça uma previsão dos espectros rotacionais, Raman e
~ infravermelho, para 1H 2 e 1H 2 H.

3.4 Pelo espectro rotacional de uma molécula diatômica obte-

~ili Uw~~
ve-se o valor do momento de inércia 0,28 (u.m.a.Á2). Para a mesma
molécula com substituição isotópica nos dois átomos este momento
é 0,562. É possível saber qual é esta molécula?
-~
"
5800 5750 57óo 5~ 5600 5550 ii5.00 5450 5400 3.5 Nos espectros de rotação-vibração mostrados na Figura
cm· 1

3.11 deste capítulo foram medidos os números de onda (cm· 1) da


(a) transição fundamental e das duas primeiras harmônicas. Estes
valores estão tabelados a seguir, separando-se os valores das li-
nhas de cada dubleto; as mais intensas (de cada dubleto) são do
H 35 Cl e as mais fracas do H"Cl. A linha tracejada corresponde à
posição da transição proibida i'.J = O.
Verifique se a hipótese de os dubletos serem devidos às espé-
,..Ll ~
- ~

-~ . .
l l ' cies isotópicas é correta. Com os valores tabelados determine: i) as
constantes rotacionais e as distâncias interatômicas, para a posição
3050 3000 2950 2900 2850 2800 27.'iO 2700 2650
cm· 1 de equilíbrio e para os diferentes níveis vibracionais envolvidos; ii)
Figura 3.11- Espectros de absorção no infraverrne1ho do HCl gasoso: os valores das freqüências vibracionais, correspondentes aos ramos
(a) transição fundamental, (b) primeira harmônica e (e) segunda Q, se eles fossem ativos no infravermelho; iii) os valores das fre-
harmônica qüências harmônicas e das anarmonicidades. Discuta os resultados.
80 Oswaldo Sala
,
Fundamental 1.n harmônica 2.a harmônica
H 35Cl Hs1c ff35CJ ff37CJ ff35CJ ff37CJ
2677,72 2675,90 5438,01 5434,30 8095,25 8089,70
2702,98 2701,20 5468,10 5464,37 8130,14 8124,6õ
2727,79
2752,03
2725,92
2750,11
5497,07
5524,95
5493,30
5521,12
8163,30
8194,76
8157,72 4 Vibração de moléculas
8189,17
2775,73 2773,79 5551,66 5547,79 8224,48 8218,83 poliatômicas
2798,91 2796,95 5577,26 5573,36 8252,48 8246,80
2821,54 2819,54 5601,71 5597,76 8278,71 8272,97
2843,60 2841,56 5624,98 5621,00 8303,18 8297,39
2865,08 2863,00 5647,05 5643,02 8325,86 8320,06
- - -- - -- --- - - - - - - - -- - - - -------------------------------------
2906,23 2904,10 5687,60 5683,52 8365,81 8359,92
2925,87 2923,71 5706,03 5701,95 8383,04 8377,16
2944,89 2942,70 5723,23 5719,12 8398,44 8392,54
2963,26 2961,04 5739,18 5735,04 8412,02 8406,08
2980,97 2978,73 5753,89 5749,73 8423,70 8417,79
2998,01 2995,75 5767,34 5763,15 8433,54 8427,60 Para aplicação da espectroscopia vibracional na química é
3014,38 3012,11 5779,49 5775,29 8441,54 8435,59 fundamental o entendimento dos movimentos na molécula para
3030,06 3027,76 5790,34 5786,13 8447,59 cada freqüência vibracional observada. Entre as várias técnicas
3045,02 3042,60 5799,92 5795,71 8451,78 empregadas, a mais simples é a análise de coordenadas normais.
3059,30 3057,00 5808,16 5804,00 8454,12 Contudo, antes de se efetuar esta análise, deve-se fazer uma
tentativa de atribuição das freqüências aos modos vibracionais.
Para isso, utiliza-se informações adicionais, como estado de pola-
Literatura recomendada rização das bandas, substituição isotópica, contorno de bandas,
comparação com moléculas semelhantes etc. Mesmo assim, o pro-
ATKINS, P. W. Molecular Quantum, Mechanics. Oxford University Press.
blema de atribuição é bastante difícil. Em alguns casos, erros na
1989.
atribuição podem ser evidenciados pela análise de coordenadas
BARROW, G. M. Introduction to Molecular Spectroscopy. McGraw-Hill.
normais, mas em outros casos podem simplesmente levar a resul-
1962.
tados errôneos, por exemplo, no cálculo de constantes de força.
HERZBERG, G. Molecular Spectra and Molecular Structure I. Diato1nic
Uma molécula pode ser pensada como um conjunto de oscila-
Molecules. Frentice-Hall, Inc. 1939.
dores acoplados; o que se faz na análise de coordenadas normais é
HOLLAS, J. M. Modem Spectroscopy. John Wiley & Sons. 1987.
desacoplar esses osciladores em "modos normais", tratados como
LEVINE, I. N. Molecular Spectroscopy. John Wiley & Sons. 1975.
osciladores harmônicos simples, descritos pelas chamadas "coor-
WOLLRAB J. E., Rotational Spectra and Molecular Structure. Academic denadas normais".
Press, 1967.
O problema, na realização da análise de coordenadas nor-
mais, é a dificuldade de resolver numericamente a equação secu-
82 Oswaldo Sala Fundamentos da espectroscopia Ramon e no infravermelho 83

lar e obter resultados fisicamente significativos. Com a finalidade N


que os momentos angulares sejam nulos, C2:m 0 (y 0 z 0 -z 0 y0 )=Ü,
de transformar o determinante da equação secular em vários de-
N N a=l
terminantes de menor ordem, mais simples de serem resolvidos, Lm[l (z 0 Xo; - xªZ 0) =O, L:ma (xaY ª -y o:Xa) =O), [corresponde aos
faremos uso das propriedades de simetria das moléculas e da teo- u=1 C"J.=1

ria de grupo. Embora o desenvolvimento de técnicas computacio- eixos de rotação girarem junto com a molécula], eliminamos os
nais tenha tornado mais fácil resolver a equação secular, o uso movimentos de translação e de rotação e podemos definir as 3N-6
da teoria de grupo e propriedades de simetria é ainda um método (ou 3N-5 para moléculas lineares) coordenadas internas. Quando
importante para analisar os espectros vibracionais. se consideram as 3N coordenadas cartesianas na equação secu-
Neste capítulo apresentamos uma parte introdutória sobre lar, 6 das raízes da equação secular, correspondentes às rotações e
a análise de coordenadas normais e teoria de grupo, que serão translações, serão nulas.
discutidas em detalhe nos capítulos seguintes. Considerando a função potencial V=V(q,, q 2 , .. .,q), próximo
à posição de equilíbrio (q,=0) podemos expandi-la numa série de
potências:
4. 1 Vibrações moleculares e coordenadas
normais
(4.1)
No capítulo 2, obtivemos a equação de movimento para uma
molécula diatômica a partir da energia cinética e da energia po-
tencial, utilizando coordenada interna. Neste caso, onde só existe
o movimento de estiramento da ligação, esta coordenada é a pró- V é independente das coordenadas e não contribui para o
0

pria coordenada normal (não há nenhum acoplamento). Obteve- problema vibracional; seu valor define simplesmente o zero da
se a expressão da freqüência vibracional, ou, num procedimento escala de energia potencial e podemos fazer V0 = O. Na posição de
inverso, conhecido o valor experimental da freqüência, calcula-se equilíbrio, sendo as coordenadas q, independentes, pela condição
a constante de força. de mínimo (aV/àq) 0 = O. Se desprezarmos os termos cúbicos e de
Para moléculas poliatômicas, o sistema vibracional pode ser ordem mais alta (aproximação de oscilador harmônico), teremos
expresso em função das coordenadas internas, qi, que caracteri- para a função potencial:
zam os deslocamentos das ligações ou dos ângulos de equilíbrio
entre ligações. O uso das coordenadas internas permite descre- (4.2)
ver a configuração das moléculas independentemente de sua po-
sição no espaço e facilitam a representação dos campos de força A derivada da energia cinética, T = Y, m, L q:,
em relação a
moleculares. Impondo, para as moléculas, a condição das equa- qi resulta em miqi' que é o momento linear Pi' associado à coor-
N N
denada interna q,:
ções do centro de massa serem nulas, C:L~muxu =O, L,muy ª =O,
N a-1 a-1
Im"zª =O), [corresponde a origem estar no centro de massa] e (4.3)
a=l
84 Oswaldo Sala
r Fundamentos da espectroscopia Ramon e no infravermelho 85

A energia cinética pode ser escrita em termos dos momentos Substituindo q, e a sua derivada segunda na equação (4.7)
lineares e a energia potencial em termos das coordenadas internas: obtém-se, para as amplitudes, um sistema de equações algébri-
cas lineares e homogêneas:
(4.4)
2
-(2rcv) A,= - LLgt/,;kAk (i = 1, 2, .. ., 3N-6)
.i k
onde os somatórios são para as 3N-6 coordenadas e os g" depen- Este sistema pode ser reescrito,
dem das massas.
Como escrevemos a energia cinética em fünção dos momen- (i = 1, 2, .. ., 3N-6) (4.9)
tos P , em vez das equações de Lagrange, utilizadas no capítulo 2,
'
empregaremos as equações de Hamilton: 2
onde À= (2rcv) e 8ik é o delta de Kronecker, que vale 1 parai= k
àH
(4.5) e O parai * k. Significa que o termo 8"À só é diferente de zero (e
q, = iJP.
, igual a À..), na i-ésima equação, quando k ;::; i, como se observa no
determinante secular para este sistema de equações:
Se as forças derivam de um potencial, o hamiltoniano será a
energia total do sistema, H = T +V As equações de Hamilton são Ig1/,;1 -À Lgljfj2 Lgljrj3
obtidas das equações de Lagrange (para mais detalhes consulte J .i .i
Eyring et al. (1944) ou o apêndice I). Efetuando as derivações das L;g,/,;1 Ig,/.i, -À L;g,f,
J J
.i .i J =Ü
( 4.4), as equações ( 4.5) ficam: Ig,/,;1 L;g,/.i, Lgs/,;s -À
(4.6)

que costuma ser representada simbolicamente por 1GF-E'A1


P ois g lJ, = gJl.. e f.\] = f.Jl , de modo que g IJ PP
1 J
= gJl PP
J 1
e f.q.q.
lJ 1 J
= f.q.q ..
Jl J ,1 = O onde E é a matriz unitária (ou identidade), com elementos
Derivando a equação de q, em relação ao tempo e substituindo P,; somente na diagonal e iguais a 1. A resolução do determinante
pelo seu valor em (4.6) teremos: secular dá as 3N-6 raízes À, que correspondem às freqüências
vibracionais, v = (1/2rr)fÀ. Sendo as equações ( 4.9) homogêneas,
ii, = - IL:g,/.ikqk (4.7)
j k
não é possível determinar os valores das amplitudes, mas somen-
te seus valores relativos.
que possui a forma da equação já vista: Para uma raiz particular Àª , substituindo esse valor nas
equações ( 4.9), podemos obter o conjunto arbitrário das ampli-
tudes A 1ª, A2ª·, ... , A(SN-SJa' que determina a forma deste a-ésimo
modo de vibração, pois fixa a relação entre os incrementas das
coordenadas internas neste modo de vibração. A solução particu-
Uma solução particular do problema seria:
lar, considerada em (4.8), deve agora ser expressa pelo conjunto
q, =A, cos(2rcvt + <ji) (4.8) de funções:
86 Oswaldo Sala Fundamentos da espectroscopia Ramon e no Infravermelho 87

qiu =Aia cos(2nv(t t + <!>cr.) (i = 1, 2, .. ., 3N-6) A solução geral da equação (4. 7) seria dada pela combinação
linear das soluções particulares:
todas sendo soluções da equação (4. 7) com mesma fase cji" e mes-
ma freqüência V u' (4.12)
Nesta expressão o índice i indica a coordenada interna e o
índice a indica o modo vibracional. Por exemplo, para uma molé- onde Qª = Q 00 cos(2nv ªt+<I>) são as coordenadas normais. A expres-
cula triatômica angulada, sendo as coordenadas internas r 1 , r 2 e são (4.12) é bastante importante, pois relaciona as coordenadas
ra e os modos normais v 1' v2 e v 3 , teremos explicitamente: internas com as coordenadas normais.
As coordenadas normais representam as vibrações funda-
qrlvl =A,, (cosv 1 t+<ji 1 ), qr:.:: v1 =Ar2 v1 (cosv1t+4>1), mentais da molécula e são caracterizadas por alguns átomos se
''
qr3yl
=A,., (cosv 1 t+cji 1 ); moverem em movimento harmônico simples com mesma freqüên.-
3 1
cia. Significa que cada átomo passa pela posição de equilíbrio (ou
qr1 v2 =A,., (cosv 2 t+cji 2 ), qr2v1 =Ar2v2 (COSV2t+~4), de máximo deslocamento) ao mesmo tempo, embora possa ter
' 2

qr3 vl
=A,, (cosv 2 t+cji 2 ); amplitude de vibração diferente dos demais. Uma grande van-
3 2
tagem no uso destas coordenadas é que as energias cinética e
ql\ v3 =Ar 1 v3 (cosv 3 t+4>.1 ), qr2 v1 =A,, (cosv 3 t+cji,),
2 3 potencial adquirem expressões muito simples, lembrando que as
qI"3V3 = A, 3 , 3 (cosv 3 t+<Pal· coordenadas já envolvem as massas:

Para a coordenada interna rl' por exemplo, ela irá oscilar (4.13)
u
segundo as três freqüências normais de vibração, mas com am- "
plitudes (A,) diferentes. O mesmo ocorre para as demais coor- Substituindo na expressão da energia potencial em coor-
denadas internas, que oscilarão com cada uma das freqüências denadas internas (4.4) os valores destas coordenadas dadas em
vibracionais mas com diferentes amplitudes. (4.12):
Aplicando o mesmo procedimento para cada uma das raízes 2 2
da equação secular, teremos um total de 3N-6 conjuntos de 3N- 2V = LLfijqiqj = LLLfijLiuLjuQa = LÀuQu
a '
6 soluções particulares das vibrações moleculares. Uma solução
mais conveniente do problema é obtida normalizando as amplitu- O valor de Àª obtido desta equação, usando as relações (4.10)
des. As amplitudes normalizadas seriam: fica:

L.lCI. =NA
u JO:
(i = 1, 2, .. ., 3N-6) (4.10)

e as soluções particulares ficariam:


que permite determinar o fator de normalização para cada raiz Àª.

(i = 1, 2, .. ., 3N-6) (4.11) Em termos das coordenadas normais a energia total

O fator de normalização Nª será determinado adiante. ( 4.14)


u u
,,
88 Oswoldo Sala Fundamentos da espectroscopia Ramon e no infravermelho 89

.e: ..le-l.rciaa1 p01a--so1ri'a1.1_as -enBTguIJ, dª~ ue-Uselrauor6s-rrainior11l'.o::i. . . . : __ gl11ar;-l~Haa -opefayaef éJCa-irkaua-a· u1Ir-e1enterr1o a'e-B1ín-l:n.rTa-,-pur
Cada coordenada normal oscila independente das demais; em ou- exemplo, uma rotação está associada a um eixo de rotação, uma
tras palavras, o tratamento feito permitiu desacoplar os oscilado- reflexão está associada a um plano de reflexão etc.
res em osciladores harmônicos independentes. No estudo das vibrações moleculares não interessam mo-
A equação de Schrõdinger em coordenadas normais fica: vimentos translacionais (no caso de vibrações em cristais eles

'°'~+-
0 \jf
L- aQ' ti'
'
2
2 E--À.Q
i l
') '"=O
2 ' ' "
,
(À, = 4n'vil
devem ser considerados), assim podemos definir as seguintes
operações de simetria e seus correspondentes elementos, que são
representados pelos mesmos símbolos:
sendo a função de onda vibracional para um modo Q,:
E Este símbolo representa a identidade, que é uma operação
onde a. = 2n:vi em que "nada acontece", a molécula permanece exatamen-
' h
te como estava. Esta operação é definida como exigência da
No caso de vibração duplamente degenerada os dois modos teoria de grupo, da qual faremos uso.
têm mesma freqüência, coª = coh e a função de onda fica: c, Rotação de 2110/p, efetuada no sentido anti-horário. Por exem-
plo, c, é uma rotação de 120°, c,2 são duas rotações c, suces-
'I'; = N ,,H,, (~Qal H,b (~Qb) · exp[- ~i (Q; + Q~ l] sivas, ou seja, uma rotação de 240º.
cr Reflexão num plano. Quando o eixo principal de rotação da
sendo a. = 2nv ª = 2rcvb
' h h molécula (eixo de rotação de maior ordem) estiver no plano,
este é denominado vertical (a), como no caso da H 2 0, onde
No estadovibracionalfundamental v" =vb =O e H,, = H,"= H 0 , um plano é o da própria molécula e o outro é perpendicular
não ocorre degenerescência. Num estado excitado vi = vª + v1 e
a ele, sendo o eixo C2 a intersecção destes dois planos. Se o
se houver excitação de um quantum vibracional poderemos ter
plano bisseta dois eixos c,, perpendiculares ao eixo princi-
vª = 1 e vb =O, ou vª =O e vb = 1 havendo, portanto, duas autofun-
pal, ele é denominado diagonal (a); se for perpendicular ao
ções degeneradas. Se a excitação for de dois quanta vibracional
eixo principal, será denominado plano horizontal (crh). Por
teremos tripla degenerescência.
convenção o eixo principal está no eixo z (vertical).
Como veremos adiante (capítulo 5) dependendo da geome-
tria da molécula podemos ter equivalência de dois eixos (x, y), i Centro de inversão (ou de simetria), é uma reflexão através
originando dupla degenerescência, ou de três eixos, tripla dege- do ponto central da molécula. Corresponde a levar cada áto-
nerescência. mo da molécula, através do centro, a uma igual distância
no outro lado, num ponto ocupado por átomo idêntico. Na
molécula de C0 2 a posição ocupada pelo átomo de carbono é
4.2 Simetria e grupos de ponto um centro de inversão.
S, Rotação imprópria ou rotação-reflexão, consiste de uma ro-
Operações de simetria são definidas como transformações tação de 2110/p em um eixo, seguida de reflexão num plano
que levam um sistema a uma configuração indistinguível da ori- perpendicular a esse eixo. Este plano não precisa existir
90 Oswaldo Sala Fundamentos da espectroscopia Ramon e no infravermelho 91

como elemento de simetria da molécula, como é o caso da


operação S 4 no CH4 •

É possível combinar operações de simetria de uma molécula 1 e2 2


de modo que pelo menos um ponto dela permaneça estacionário. 1 -..'. 1

/'...... /'......
Esta combinação constitui um "grupo de ponto" e elimina movi- 2 3 3 1
mentos de translação da molécula, que não interessam no estudo
de vibrações moleculares. (Obs. No caso de cristais consideram-se
1 C3 3 cr"v 1 c;1 3 1 cr'v 3
movimentos de translação e o grupo com que se opera é o grupo
de espaço.) )'......--->)'...... --->)'......--->)'...... 1

/'......
___, 1

/'......
2 31 23 22 1 2 3 2 1
Um conjunto de operações constitui um grupo se forem sa-
tisfeitas as seguintes condições: Figura 4.1- Operações para elementos conjugados.

1- Se A e B forem elementos do grupo o produto AB também


será elemento do grupo. Assim, se AB = C, C deve pertencer
ao grupo. Cada molécula pode ser atribuída a um grupo de ponto, con-
2- A identidade é um elemento do grupo. Se A é um elemento siderando-se os elementos de simetria que ela possui. Os grupos
do grupo, AE = EA = A. de ponto podem ser classificados em quatro tipos, como segue.
3- O inverso de uma operação do grupo é também uma opera-
(1) Grupos sem eixo de rotação:
ção do grupo. Se A é um elemento do grupo, X= A 1 pertence-
rá ao grupo, de modo que XA = A1A = E. C1 grupo de ponto cujo único elemento de simetria é a identida-
4- Vale a lei associativa da multiplicação, (AB)C = A(BC). de. É o caso de molécula não planar com 4 átomos diferen-
tes: PFClBr.
Grupos finitos são os que contêm um número finito de ele- C, além da identidade este grupo contém um plano de simetria
mentos; o número destes elementos é a ordem do grupo. rr. É o caso de 3 átomos diferentes não colineares: HOF.
Uma definição importante em grupos de ponto é a de classe C, são elementos de simetria deste grupo a identidade e o cen-
de operações de simetria. Se A, B e X são elementos do gru- tro de inversão. Exemplo: HFBrC-CHFBr em conformação
po e B=X· 1AX, A e B serão conjugados; os elementos conjugados dispersa.
formam uma classe. Como exemplo, na molécula planar de BF3
as operações c, c_,
e 2
são conjugadas, formando uma classe; o (II) Grupos com somente um eixo de rotação:
mesmo ocorre com as três operações C 2 e com as reflexões nos C, estes grupos contêm um eixo C, e a identidade. Na ausência
três planos verticais. Isto fica claro observando-se as operações de outros elementos de simetria as operações cp ' cp2 , cp3 ..• ,
mostradas na Figura 4.1, para as operações C 3 e C 32 e para os não são conjugadas, não satisfazem as condições para per-
planos a' e a''. Nesta figura, na parte superior estão indicadas tencerem a uma mesma classe. Exemplo de C 2 é a H 2 0 2 e
as posições dos planos, que é mantida fixa durante as operações de C 3 é o HC(C 6H,J 3 com os anéis benzênicos formando um
indicadas. ângulo (,,;Oº ou 90°) em relação a planos verticais.
,
92 Oswaldo Sala Fundamentos da espectroscopia Ramon e no infravermelho 93

Sp ocorrem para p = 4, 6, 8. Exemplo de S6 é o íon complexo grupo de ponto; passaremos a estudar a aplicação das operações
[Co(N0 2 ) 6 ]3- no cristal Na,[Co(N0 2 \l (esqueleto de simetria de simetria nos movimentos moleculares, ou seja, nos vetores de
Oh com os agrupamentos N0 2 formando um pequeno ângulo deslocamento dos átomos.
com os planos horizontais e orientados de modo que satisfa-
ça a simetria do eixo C,).
CP" estes grupos possuem um eixo CP e p planos verticais (cr) Exercícios
que se interceptam neste eixo. Exemplo de C 2" é a H,O e de
C3, é a NH 3 • 4.1 Determine os grupos de ponto a que pertencem as se-
cph quando além do eixo CP houver um plano de reflexâo, guintes moléculas: (i) clorobenzeno; (ii) acetonitrila; (iii) o-diclo-
(cr6 ), perpendicular a ele. Exemplo de C2h é o transplanar robenzeno; (iv) p-diclorobenzeno; (v) ciclo-octatetraeno(barca);
HClC=CHCI. (vi) ion formiato; (vii) ciclobutano.

(III) Grupos diédricos: 4.2 Determine as operações de simetria para a molécula de


DP grupos diédricos sâo caracterizados por possuírem um eixo etano na conformação eclipsada.
CP e p eixos binários (C 2 ) perpendiculares a CP e com ângulos 4.3 Faça o desenvolvimento em série de Taylor da função
iguais entre si. Exemplo de D 3 é N(CH2 CH,) 3N. Se em adiçâo potencial de uma molécula triatómica angulada, até o termo de
houver planos de simetria teremos os grupos Dph e Dpa· terceira ordem. Discuta o significado de cada termo.
Dph se houver um plano horizontal; um exemplo de D 3h é C2H 6 na
4.4 Verifique se no grupo de ponto D" as operações de sime-
conformação eclipsada.
tria indicadas abaixo, numa mesma linha, pertencem à mesma
Dpd se houver p planos diagonais,ªª' que se interceptam em CP.
classse:
Estes planos bissetam o ângulo entre dois eixos C 2 consecu-
tivos. Exemplo de D 3d é C 2H 6 na conformação dispersa. (i) S 3 1 , S 3' , S,' e S3 5
(ii) c2 , c; e e;·.
(IV) Grupos tetraédricos e octaédricos:
Estes grupos são caracterizados por possuírem mais de um
eixo de ordem maior do que dois. Literatura recomendado
T grupo tetraédrico: tem 3 eixos C, mutuamente perpendicu-
lares e 4 eixos C 3 • Se em adição houver planos de simetria cr, BARROW, G. M. Introduction to Molecular Spectroscopy. McGraw-Hill,
para cada par de eixo c, (seis planos), o grupo será designa- 1962.
do por T,, um exemplo sendo CH4 . EYRING, H., WALTER, J., KIMBALL, G. E. Quantum Chernistry. John
o grupo octaédrico: tem 3 eixos c' mutuamente perpendicula- Wiley & Sons, Inc., 1944.
res e 4 eixos C 3 • Se em adição houver um centro de simetria, HARRIS, D. C., BERTOLUCCI, M. D. Symmetry and Spectroscopy. Do-
i, o grupo será designado por Oh, um exemplo sendo SF 6 • ver Publications, 1989.
HERZBERG, G. Molecular Spectra and Molecular Structure. II. lnfra-
Definimos as operações e os elementos de simetria conside- red and Ram,an Spectra of Polyatomic Molecules. D. Van Nostrand
rando a molécula com.o estática e vimos como classificá-la num Company, Inc., 1962.
94 Oswaldo Sala

HOLLAS, J. M. Modern Spectroscopy. John Wiley & Sons, 1987.


'
NAKAMOTO, K. Infrared and Ram.an Spectra of Inorganic and Coordi-
nation Compounds. John Wiley & Sons, 1969.
PAINTER, P. C., COLEMAN, M. M., KOENIG, J. L. The 1'heory o{Vibra-
tional Spectroscopy and its Application to Polym,eric Materials. John 5 Operações de simetria em
Wiley & Sons, 1982.
STEELE, D. Theory ofVibrational Spectroscopy. W. B. Saunders, 1971.
movimentos moleculares
WILSON, E. B., DECIUS, J. C., CROSS, P. C. Molecular Vibrations. Mc-
Graw-Hill, 1955.
WOODWARD, L. A. Introduction to the Theory of Molecular Vibrations
and Vibrational Spectroscopy. Oxford, 1972.

5. 1 Operações de simetria nas coordenadas


cartesianas de deslocamento

Vamos considerar as coordenadas cartesianas de desloca-


mento dos átomos em uma molécula e aplicar as operações de
simetria do grupo ao qual ela pertence. Efetuar uma operação de
simetria corresponde a obter transformações lineares, que podem
ser representadas matematicamente por uma matriz, ligando as
coordenadas antigas às novas coordenadas. A cada operação se
associa uma matriz de transformação e estas transformações
(ou matrizes) possuem as propriedades que definem um grupo
de ponto (ver capítulo 4): (1) se duas transformações forem ele-
mentos do grupo seu produto deve pertencer ao grupo; (2) existe
uma transformação identidade; (3) o inverso de uma transforma-
ção também é um elemento do grupo; (4) vale a lei associativa
da multiplicação destas transformações. Os grupos assim obti-
dos são isomorfos com o das operações de simetria. O conjunto
de matrizes associadas às operações de um grupo constitui uma
representação do grupo. Os deslocamentos dos átomos, nas
coordenadas cartesianas de deslocamento, serão representados
96 Oswaldo Saio Fundamentos da espectroscopia Ramon e no infravermelho 97

por vetores e examinaremos as matrizes de transformação (ou plicitamente, podemos escrever para as coordenadas cartesia11as
representações) da aplicação das operações de simetria nestes de deslocamento:
vetores.
Tomemos como exemplo uma molécula do grupo de ponto o o o -1 o o Ü Ü Ü Ó.X 1

C2v, a água. Na Figura 5.1 está representado o que ocorre com o o o o -1 o o o o t>y,
os vetores das coordenadas cartesianas de deslocamento de cada
o o o o o 1 Ü Ü Ü Õ.Z1

átomo quando se aplica a operação C 2 • Embora as operações de o o


.Ó.X2 Í'.X2 o o o Ü Ü Ü .Ó.Xz
simetria sejam aplicadas nestes vetores numa configuração que .ó.y2 =C2 8y2 o -1 o o o o o o o t>y, (5.2)
pode não ser a de equilíbrio, elas são características da molécula 1'.z 2 Az 2 o o 1 o o o O O O 6.z 2
nesta posição. Na figura, os números dentro dos círculos repre-
sentam a numeração original dos átomos. Após a operação, os o o o o o o -·1 Ü Ü .Ó.X~

componentes do vetor deslocamento do átomo 1, (Ax,. Ay 1, Liz 1 ), o o o o o o o -1 o t>y,


são transformados nas novas coordenadas (-ffic2 ', -!J.y2 ', Liz/), ex- o o o o o o Ü Ü 1 Ó.Z3

pressas em função das coordenadas originais, (Ax" Ay" Az)


onde os blocos correspondem às transformações das coordenadas
Llz', Lix, Liy, Liz para cada sítio, numerado 1, 2 e 3.
e, Para a operação identidade, E, a matriz de transformação é
___ ,,,. / l>x',
t.y, ô.y'3 3 a matriz unidade, somente com valor 1 na diagonal principal.
t.z, ti..z'2 Na operação de reflexão pelo plano da molécula, cr,,, todos
t>x, l>y, t.y',
' :,-dx 2
1

ô.y\
"""'
2
:,ró.X\ os átomos permanecem na mesma posição, contribuindo para os
blocos na diagonal e a matriz de transformação para esta opera-
Figura 5.1-Aplicação da operação C2 na molécula de H 20. ção será:

o o o o o o
-1 o o
Representando por "( )" blocos com elementos diferentes de o 1 o o o o o o o
zero, por "O" blocos com elementos nulos e por 1, 2, 3 e l', 2', 3',
o o 1 o o o o o o
respectivamente, a numeração dos átomos antes e após a opera-
ção e,, teríamos uma representação simbólica desta matriz de
o o o -1 o o o o o
transformação: """ººº
yz o 1 o o o o (5.3)
o. o o o o 1 o o o
o o o o o o -1 o o
(5.1) o o o o o o o 1 o
o o o o o o o o 1

mostrando que os átomos 1 e 2 mudaram de sítio, enquanto o Para a operação de reflexão pelo plano cr" a matriz de transfor-
átomo 3 permaneceu em sua posição (elemento na diagonal). Ex- mação fica:

j
98 Oswaldo Sala
l Fundamentos da espectroscopia Ramon e no Infravermelho 99

o o o 1 o o o o o onde (a), são matrizes quadradas. Se estas matrizes (a), forem


o o o o -1 o o o o redutíveis podemos fazer novas transformações até obter matri-
o o o o o 1 o o o zes irredutíveis. Define-se uma transformação de similaridade,
1 o o o o o o o o de um elemento A pelo operador X, como o produto matricial
crxz => o -1 o o o o o o o (5.4) x- 1AX =A'. Se A, B, C ... constituem uma representação do gru-
o o 1 o o o o o o po, A', B', C'. .., obtidos através destas transformações, também
constituem uma representação. Se for possível determinar uma
o o o o o o 1 o o
transformação de similaridade que reduza simultaneamente as
o o o o o o o -1 o
matrizes A, B, C, ... para matrizes A', B', C', ... com a forma da
o o o o o o o o 1
matriz (5.5), sendo os blocos (a 1), (b 1), (c 1),. .• matrizes irredutíveis
de mesma ordem (o mesmo ocorrendo com os blocos de índice 2,
Neste exemplo as representações para as operações do gru-
3... ), a representação formada por A', B', C', ... será irredutível.
po, E, C2 , a yz e crxz , tendo como base as coorden.adas cartesianas
Como exemplo, se as matrizes:
de deslocamento, têm dimensão 3N. Algumas destas matrizes ti-
veram elementos só na diagonal e outras não, mas é o conjunto A= [ O 1/2] B = [3/4 1/4]
e
destas quatro matrizes 9 x 9, para as quatro operações do grupo 1/2 o 1/4 3/4
C 2 v, que constitui uma representação redutível. Operar com
matrizes desta ordem seria extremamente trabalhoso; matema- constituem uma representação, correspondendo a dois modos vi-
ticamente é possível, através das chamadas transformações bracionais ou a duas operações em uma determinada espécie de
de similaridade, transformar uma representação redutível em simetria, aplicando os operadores matriciais
uma mais simples, denominada representação irredutível.
A transformação de similaridade consiste na diagonalização X=[~ -~J e x·' = [ 1/2 1/2]
-1/2 1/2
das matrizes (redutíveis), reduzindo as matrizes a blocos na dia-
gonal que não podem mais ser reduzidos. Estes blocos constituem na transformação de similaridade para A e B, resultam as matrizes

B'-[o11/2º]
a representação irredutível. A transformação de similaridade
é bastante trabalhosa e não iremos efetuá-la, nos limitaremos a A'= [1/02 -1/2O] e
um exemplo simples de sua aplicação. A transformação de simi-
laridade reduz a matriz a uma forma diagonal, como no exemplo
contendo só elementos na diagonal em uma forma irredutível.
que segue, e transforma uma representação redutível em matri-
Em vez de efetuar transformações de similaridade, podemos
zes do tipo:
obter diretamente uma representação irredutível utilizando uma
base conveniente, como as coordenadas de simetria ou as coorde~
o o
nadas normais.

[T (a2)
o
o
(a,)
(5.5)
í A Figura 5.2 mostra as transformações, pela operação C2 ,
nas coordenadas de simetria para a água. Estas coordenadas dão

j uma idéia aproximada dos modos normais.

.
l 00

C,(8 1)
Oswaldo Sala

(1J(S 1) C,(S,) (l)(S,) C,(S3 ) = (-1)(83 )


' Fundamentos da espectroscopia Ramon e no infravermelho

Em coordenadas cartesianas de deslocamento (dimensão


l O1

AA s, s·, s, s·, s, S',


3N) teremos uma representação redutível com matrizes 12 x 12.
É possível escolher uma nova base de modo que se obtenha uma
representação de forma completamente reduzida, ainda em di-
mensão 3N, constituída por um certo número de representações
Figura 5.2 - Operação C2 nas coordenadas de simetria da água.
irredutíveis, como mostra a tabela a seguir (5.6). Nesta tabela
os três primeiros blocos A 1 correspo11dem aos dois modos vibra-
As coordenadas normais de vibração da água, Q" Q2 e Q3, cionais (estiramento e deformação de ângulo totalmente simétri-
que correspondem às vibrações do estiramento simétrico, defor- cos) e ao componente translacional T, O bloco A2 corresponde ao
mação de ângulo e estiramento anti-simétrico, respectivamente, componente rotacional R,. Os quatro blocos restantes, da espécie
constituem um sistema de dimensão 3N-6 e não mais 3N, das degenerada E, correspondem ao estiramento e deformação de
matrizes (5.2) a (5.4). Aplicando as operações do grupo C2, a estas ângulo desta espécie, aos componentes translacionais CTX, Ty ) e
coordenadas, as transformações correspondentes são: rotacionais (R,, R/

ECQ)-> ClJQ 1 ECQ) -> (l)Q2 ECQ)-> (l)Q 3 ~

C2 CQ,)-> (l)Q 1 C 2(Q 2 ) -> (l)Q2 A,


C,CQ,l-> (-llQ,
cr,,CQ 1 l-> (l)Q 1 cr"'(Q,) -> (l)Q, cr,/Q,l-> (-l)Q 8
A,
cr,,CQ 1J-> ClJQ 1 cr,.( Q 2 ) -> ( 1)Q 2 cr:n (Q 3)-> (l)Q 3 A,
A,
O resultado foi conservar ou mudar o sinal das coordenadas E
e pode ser tabelado como:
(5.6)
E
E c, a ,.,
"'' E
Q, 1 1 1 1
Q, 1 1 1 1 E

Q, 1 -1 -1 1

A matriz (5.6) mostra a forma completamente reduzida (em


que mostra as representações irredutíveis (em dimensão 3N-6) dimensão 3N) para a molécula de NH 3 e os símbolos em cada bloco
para a água, onde as duas primeiras linhas são da espécie A1 e a indicam cada representação irredutível (ou espécie de simetria).
última da espécie B,, como veremos adiante. Alguns blocos comparecem várias vezes e este número correspon-
Vimos, com o exemplo da molécula da água, que a base for- de a quantas vezes cada representação irredutível comparece na
mada pelas coordenadas de simetria, ou pelas coordenadas nor- representação total. Como exemplo, há três representações irredu-
mais, gera uma representação irredutível. Consideremos outro tíveis de espécie A1, uma para o estiramento, outra para a defor-
exemplo, o da molécula de NH3 , grupo de ponto C3,. mação de ângulo e a última para o componente translacional T .
z
-------,--_ - - -

l 02 Oswaldo Sala Fundamentos da espectroscopia Ramon e no infravermelho l 03

De modo geral, no caso da operação de rotação de coorde- sentam os movimentos de translação segundo os eixos x, y e z.
nadas no plano xy, por um ângulo <p, a matriz de transformação Ainda no exemplo da água, aplicando a operação C 2 em T • e em
toma a forma bem conhecida: Ty' resulta uma troca de sinal destes vetores e a aplicação em T,
deixa-o inalterado, como se observa na Figura 5.3. Nesta figura
são mostradas as posições iniciais e as resultantes das operações
(5. 7) indicadas (o sinal+ ou -indica o movimento do vetor para fora ou
para dentro do plano do papel).

z
5.2 Caráter e representações

As matrizes possuem uma propriedade importante, a inva- X


Ly E e, cru cr,,

riância da soma dos elementos na diagonal para qualquer trans-


formação de coordenadas que nela se efetue. Esta soma é deno- T, ~ ~ ~ ~ ~
minada caráter (ou traço) da matriz. Na matriz para a operação
C2 , (5.2), na representação com base nas coordenadas cartesianas T, ~ ~ ~ ~ ~
de deslocamento, o caráter é -1 (dado pelo caráter do bloco na
diagonal para o átomo 3). Para a operação de reflexão cr,, (5.3), T, À À À À À
o caráter da matriz para cada átomo é 1 e o caráter da matriz Figura 5.3 ~ Aplicação de operações de simetria nos componentes do vetor de
completa será 3 (3 blocos diagonais, um para cada átomo). Para translação.
a operação cr" (5.4), o caráter para cada átomo é 1 e o da matriz
completa também é 1, devido à contribuição apenas do átomo 3.
Para a operação E o caráter é 9. Estas operações podem ser escritas: ECT) = (l)(T) E(T)
X y
=
X '

Do mesmo modo que as matrizes associadas às operações (l)(T), ECT) = (l)(T,); C2 (T) = (-l)(T), C,(T) = (-l)(T), C2 (T,) =
de simetria constituem representações do grupo de ponto, os ca- (l)(T,) etc. As matrizes de transformação (1) e (-1) são irredutí-
racteres destas matrizes também formam representações destes veis, com caracteres 1 e -1, respectivamente.
grupos. Isso simplifica bastante o problema, podendo-se operar Com estes resultados pode-se construir uma tabela de carac-
com números no lugar de matrizes. teres para as várias operações do grupo aplicadas aos componen-
Usando como base coordenadas cartesianas de deslocamen- tes de T, indicados na última coluna:
to resulta uma matriz, ou uma representação, redutível. Se con-
siderarmos o caráter, obteremos o caráter de uma representação c,v E e, cr., ª.v~
redutível. Se pela escolha da base a representação for irredutível, 1 1 1 1 T,
teremos os caracteres de representações irredutíveis. 1 -1 1 -1 Tx
Vamos considerar uma base formada pelos vetores de des- 1 -1 -1 1 TY
locamento aplicados ao centro de massa, Tx, TY e T,., que repre-
l 04 Oswoldo Sola Fundamentos da espectroscopia Ramon e no infravermelho 105

A base formada pelos vetores Rx, R, e R,, que representam Quando ocorre degenerescência geométrica, a aplicação das
movimentos de rotação ao redor dos eixos x, y e z, respectivamen~ operações do grupo de ponto em coordenadas degeneradas deve
te, é mostrada na Figura 5.4, junto ao exemplo da aplicação da ser considerada no conjunto destas coordenadas e não nelas se-
operação C 2 em R,, C,(R) = (-l)Rx. Os caracteres resultantes da paradamente.
aplicação das operações do grupo nestes componentes de rotação Como exemplo, a operação de rotação C3 não pode ser aplica-
podem ser adicionados à tabela anterior, constituindo a Tabela da em T,, C3 (T), ou em Tf C3(T), mas na matriz coluna formada
5.1, que é a tabela de caracteres da representação irredutível por estes dois componentes:
para o grupo de ponto C2v.

R, R, R, C,(RJ

Figura 5.4 - Vetores de deslocamento para rotação

Tx :] = C 3 [Tx] = [ cos cp sencp l[Tx] [ -1/2 -J3/2][T']


c,y E c, ª~ cr" [ TY TY -sencp cos<eJ TY = --/3/2 -1/2 TY
1 1 1 1 T,
1 1 -1 -1 R, cujo caráter é -1. Se efetuássemos a operação C, 2 (= C3 1 ) o resul-
1 -1 1 -1 Tx,Ry tado seria a matriz:
1 -1 -1 1 Ty,Rx
Tabela 5.1

Até agora só consideramos o caso de não haver degeneres-


cência geométrica; esta ocorre quando a molécula possui eixo de cujo caráter é -1, como para a matriz de Cw Para a operação iden-
simetria C8 ou de maior ordem. Vamos examinar as modificações tidade a matriz:
que devem ser introduzidas quando a molécula, devido à sua geo-
metria, possui níveis de energia duplamente degenerados como
sucede com a molécula de NH3 (C,) ou de BF3 (D3h).
Se calcularmos o momento de inércia para rotações nos eixos
x e y (perpendiculares a C,) teremos, para estas moléculas, que Ix tem caráter 2. Note-se que o caráter para a identidade correspon-
= I,Y o que significa que os níveis de energia das rotações molecu- de à ordem da matriz. Como a base escolhida já resultou numa re-
lares Rx e Ry têm valores idênticos, ou seja, há dupla degeneres- presentação irredutível, este caráter para a operação identidade
cência. O mesmo ocorre com os movimentos de translação T X e Ty. indica o grau de degenerescência da representação considerada.

j
l 06 Oswaldo Sala Fundamentos da espectroscopia Ramon e no infravermelho l O7

A matriz de transformação para o plano de reflexão cr, será: Inatrizes obtidas dependiam da OTÍ8lltação destes
crv, crv' € CTv ",as
elementos de simetria em relação aos eixos cartesianos; contudo,
o caráter das 3 matrizes obtidas foi o mesmo, isto é, invariante.
Em resumo, as operações de simetria podem ser represen-

cujo caráter é O. A matriz de transformação para o plano é um < tadas por matrizes ou números (caracteres), que podem ser com-
binados pelas regras ordinárias de multiplicação. Estas matrizes
pouco mais complicada, como se observa para os três planos na
ou números também formam grupos, isomorfos com os grupos
figura que segue:
das operações de simetria. Dependendo da base escolhida, a re-
presentação obtida pode ser redutível ou irredutível. Sendo os
a, ", caracteres invariantes para qualquer transformação de coorde-
T' T, T, __________
T,
' ---- nadas, é mais conveniente utilizá-los para as representações.
T; T, T, T' -- T, Vejamos, com mais detalhe, estas representações no exem-
' plo do grupo C3,. Obtivemos os caracteres para os deslocamentos
T; translacionais (T , T ). Para T é simples verificar que todas as
" y '
matrizes de transformação são (1), ou seja, o caráter é 1. Para os
'" componentes de rotação CR,, R,) as matrizes são as mesmas de
(T,, T); para R, as matrizes para as operações E, C 3 e C 32 são (1)
Resultando para a;:
e para os 3 planos são (-1). Podemos montar a seguinte tabela de
a ·[Tx]~[cos60' sen60' IT,] [ l i 2 Fs 12IT,] caracteres:
v TY sen60º -cos60º T, ~ J3;2 -112 T,
c3v E e, e,' CTv a, IT'
cujo caráter é O, como para o plano a,. O resultado para a opera- r, 1 1 1 1 1 1 T,
ção de reflexão no plano a v" é a matriz: r, 1 1 1 -1 -1 -1 R,
r, 2 -1 -1 o o o (T.,Tv),(R"R,l
a
V
"[Tx]~[
T,
112
-Fs
-JS/ 2][T·]
12 -112 T,
Cada linha da tabela constitui uma representação deste
também com caráter O. grupo e as três representações, r 1' r 2 e r 3' pela base escolhida,
são irredutíveis. A representação para r, é obtida das matrizes
para o par de coordenadas (T,, T). Note-se que os caracteres para
5.3 Representações dos grupos de ponto as operações C 3 e C,' são os mesmos, o que também sucede para
os caracteres das três operações de reflexão. As duas operações
Obtivemos uma expressão analítica, uma matriz) para cada de rotação pertencem a uma mesma classe, o mesmo ocorrendo
operação do grupo de ponto considerado. As matrizes encontradas com as três reflexões, podendo-se reescrever a tabela anterior in-
são representações das operações de simetria e no caso dos planos dicando-se o número de operações em cada classe:
,
108 Oswaldo Sala Fundamentos da espectroscopia Ramon e no infravermelho l 09

c.1v E 2C 3 3CJV Isto pode ser verificado no exemplo para as representações


r, 1 1 1 T, do grupo C 3v:
r, 1 1 -1 R,
E e, e3'
Cav <j V cr v"
Ía 2 -1 o (T.,Tyl,(R,,Rvl
A1 1 1 1 1
<j V

1 1
A, 1 1 1 -1 -1 -1
Cada representação constitui uma espécie de simetria, sen-
[~ ~] [~~ ~] [-.!. ~!] ~l ~] [~ 5:] [_t~ ~rJ
2
do convencional designar por A as espécies simétricas em relação E 2
[
ao eixo principal e por _!l_ as espécies anti-simétricas em relação a
_J.
2 l! 2 2

este eixo. Índices "l" e "2" em A e .B. indicam simetria ou anti-si-


Para as espécies não degeneradas é fácil ver que a soma dos
metria em relação a um eixo binário perpendicular ao eixo princi-
produtos das representações de A 1 e A, (para cada operação) é
pal (grupos D,l ou a um plano vertical CJv (nos grupos C,). Índices
nula.
"g" ou "u" indicam simetria ou anti-simetria em relação ao centro
de inversão. Com.' ou" indicam-se as espécies simétricas ou anti- (1)(1)+(1)(1)+(1)(1)+(1)(-1)+(1)(-1)+(1)(-1) = o
simétricas em relação ao plano horizontal crh, por exemplo, A 1' e,
Para uma espécie não degenerada e uma degenerada, por
A 1" do grupo D3h.
exemplo, A2 e E, a soma dos produtos dos elementos da represen-
f
·; tação de A2 pelo primeiro elemento nas matrizes da representa-
l ção E fica:
5.4 Estrutura das representações
1 (1)(1)+(1)(-1/2)+( l)(-1/2)+(-1)(-1)+(-1)(1/2)+(-1)(1/2) = o
As representações irredutíveis se comportam como vetores
ortogonais, isto é, seus elementos são como componentes de veto- O mesmo sucede para qualquer componente fixado das matrizes
res ortogonais. Para espécies não degeneradas esta condição de da representação E.
ortogonalidade pode ser escrita: Para a espécie degenerada, por exemplo, podemos conside-
rar a soma, para todas operações, dos produtos dos elementos da
I/, (R). í;CRl =o (i " j) (5.8) segunda coluna:
R

i e j indicando ai-ésima e j-ésima representação irredutível e o (0)(1)+( ..J3/2)(-1/2)+(-../3/2)(-1/2)+(0)(1)+


somatório é para todas as operações R do grupo. Para espécies +c../3/2Jc-112i+c-..J3/2ic-112J =o
degeneradas (dimensão maior do que 1) teremos:
Isto vale para qualquer par correspondente das matrizes da re-
L;r,(R)mn ·Í;(R)mn =O (5.9) presentação degenerada.
R
As representações irredutíveis além de ortogonais são nor-
(i * j, ou i = j com m * m' ou n * n') malizadas, sendo:
m e n designando a linha e a coluna das matrizes onde estes ele-
mentos ocorrem. (5.10)
1 1O Oswaldo Sala Fundamentos da espectroscopia Ramon e no infravermelho 11 l

sendo g a ordem do grupo e ri é a dimensão dai-ésima represen- Multiplicando esta equação por x'''(R), onde y é uma particu-
tação irredutível. Por exemplo, na espécie E, tomando mn corres- lar espécie P, e somando para todas as operações de simetria R:
pondente ao primeiro elemento da segunda coluna:
L:x<Rlx'''(R) = L:L:nlP)x(PlCRJx'''(R)
(0)(0)+( JS/2)( JS/2)+(-JS /2)(-JS/2)+(0)(0)+( JS/2)( JS/2)+ R R P

+c-JS/2Jc-JS/2J = 5;2 Como vimos em (5.11) e (5.12), os caracteres das represen-


Do mesmo modo que as representações, os caracteres das tações irredutíveis são ortonormais; assim, no segundo membro
representações irredutíveis também se comportam como vetores o somatório para P " y é nulo e o somatório para P = y é igual a g
ortogonais (5.11) e normalizados (5.12): (ordem do grupo), resultando:

L;x, CRJ · x/Rl =o


n
(i " j) (5.11) L: xCRlx 11
· ' (R) = g · n 1Y' ou n''' = _!. L:xCRJx'Y'(R) (5.13)
g R
R

L: x,(R)
R
Xi (R) = L:[x, (RJJ'
R
= g (5.12) Em vez de efetuar o somatório para todas as operações do
grupo, podemos agrupar as operações dentro de uma mesma clas-
Vistas as propriedades importantes de ortonormalidadc das se e reescrever a (5.13) considerando o somatório para todas as
representações, iremos agora determinar quantas vezes uma classes do grupo:
dada representação irredutível comparece numa representação
redutível, como foi exemplificado em (5.6). Este procedimento n(y) =_!. '\'g. ·x·'''x (5.14)
g~ J J J
permitirá calcular, para uma determinada molécula, o número .J

de coordenadas normais em cada espécie de simetria do grupo ao onde g.J é o número de operações na classe j, X/Y' é o caráter da
qual ela pertence. representação irredutível para a classe j e representação y, Xi é o
Dada uma representação redutível inicial, 3Nx3N, é pos- caráter da representação redutível para a classe j. Os x.,' 11 se en-
sível (através das transformações de similaridade) efetuar uma contram nas tabelas de caracteres e para aplicar a (5.14) deve-se
redução completa onde as matrizes resultantes formam blocos determinar os Xi. Estes valores dependem da base utilizada para
diagonais; cada conjunto de blocos equivalentes forma uma re- a representação. Esta base pode ser formada por: componentes
presentação irredutível do grupo. Nestas transformações o cará- do momento de dipolo, da polarizabilidade, coordenadas cartesia-
ter permanece inalterado e o caráter da matriz original deve ser nas de deslocamento, coordenadas internas, coordenadas normais
igual à soma dos caracteres de todos os blocos na forma comple- etc. Conseqüentemente, teríamos as representações do momento
tamente reduzida. Sendo x(R) o caráter da matriz associada à de dipolo, da polarizabilidade, das coordenadas normais etc., que
R-ésima operação de simetria na representação redutível origi- mostram quantos componentes do momento de dipolo, da polari-
nal, x'P'(R) o caráter da matriz irredutível da operação R na espé- zabilidade ou coordenadas normais comparecem em cada espécie
cie de simetria P, e n(P) o número de vezes que esta representação de simetria. A expressão (5.14) é geral e precisamos calcular os ca-
irredutível comparece na representação redutível, teremos: racteres da representação redutível Xi para cada caso particular.
Vamos calcular o caráter da representação redutível para a
xCRJ = nmzm(R) + n(2'x'"CRJ+···= L;n'P'x'r 1(RJ base constituída pelas 3N coordenadas cartesianas de desloca-
p
ll2 Oswaldo Sala Fundamentos da espectroscopia Ramon e no infravermelho ll3

menta. As operações de simetria podem ser agrupadas em dois tes valores pelo número de átomos que n.ão mudaram de posição
tipos: operações próprias (onde só ocorrem rotações) e ope- na operação considerada, ou seja, pelo número de vezes que ma-
rações impróprias (onde há rotação-reflexão). Por exemplo, a trizes do tipo acima comparecem na diagonal. Sendo u o número
reflexão pode ser considerada uma rotação de 0° (ou 360°) seguida destes átomos imutáveis, teremos os caracteres da representação
da reflexão, ou seja, esta operação seria imprópria; o centro de redutível, X" de dimensão 3N:
inversão seria uma rotação de 180° seguida de reflexão, portanto,
u(1+2coscp) e u(-1+2coscp) (5.17)
também seria operação imprópria; a identidade seria operação
própria, rotação de 0° (ou 360°). respectivamente para as operações próprias e impróprias.
Sendo l'>x, l'>y, l'>z as coordenadas de deslocamento para um Aplicando para a molécula de água resulta a Tabela 5.2:
átomo que não muda de posição, para uma operação própria (ro-
tação no eixo z) estas coordenadas se transformam como:
e,, E e, "~ CT Y'
~x· ; ~x·coscp +l'>y·sencp A, 1 1 1 1 T,
~y· ; -~X·Sencp +~Y·COScp A, 1 1 -1 -1 R,
l'>z'; l'>z B, 1 -1 1 -1 Tx,Ry
B, 1 -1 -1 1 Ty,Rx
ou seja, com a matriz de transformação:
xj 9 -1 1 3

'T'ahe1a F:í.2
(5.15)

Pela expressão (5.14) obtém-se para cada espécie:


cujo caráter é 1+2coscp.
n<Al); X. (9-1+1+3); 3
Para uma operação imprópria a transformação para as coor-
denadas l'>x e /J.y será como na operação própria, mas a coordena-
n'A2'; y. . C9-1-1-3l ; 1
(5.18)
da l'>z troca de sinal na reflexão (plano de reflexão perpendicular nCRl); X. (9+1+1-3); 2
a z). A matriz de transformação ficará: n'""; X. (9+1-1+3J; 3
que é a estrutura para a representação redutível de dimensão
(5.16) 3N:

r,N; 3A1 + 1A2 + 2B, + 3B 2 (5.19)


cujo caráter é -1+2coscp.
Estes caracteres devem ser considerados para átomos que estando incluídas as rotações e translações.
não mudam de posição, contribuindo, portanto, na diagonal. Para Consultando a Tabela 5.2, podemos excluir as contribuições
ter o caráter da representação redutível devemos multiplicar es- para rotações e translações. Na espécie A, comparece o componen-
l 14 Oswaldo Sala Fundamentos da espectroscopia Ramon e no infravermelho ll5

te Tz, na~ o Rz, na B 1 os componentes Tx e RY e na B2 os compo- Aplicando as operações do grupo no vetor de translação, situado
nentes T e R . A estrutura da representação para os mod~f vibra- no centro de massas, ele se transformará com caráter 1+2coscp,
Y ' 1

cionais da água é obtida excluindo-se da (5.19) estas contri\Juições: para rotações próprias, e -1+2coscp para rotações impróprias, que
devem ser subtraídos das expressões (5.17).
Para o movimento de rotação devemos considerar o momen-
to angular e o efeito das operações do grupo neste vetor. Para
O significado de representações redutíveis e irredutíveis e as operações próprias a transformação é idêntica ã obtida para
em particular do "número de vezes que a representação irredutí- translação, com caráter 1+2coscp. Para as operações impróprias
vel está contida na representação redutível" fica mais claro exa- (rotação-reflexão) na operação de rotação o sentido da rotação
minando a Tabela 5.3, para a molécula de água. Nesta tabela es- continua o mesmo, mas na operação de reflexão o movimento é
tão escritos os caracteres da representação irredutível para cada refletido nele mesmo (não sofre alteração), enquanto o vetor do
uma das representações, sendo a soma destes caracteres (para momento angular sofre mudança de sentido (ver a figura). Are-
cada operação) dada na última linha, que é a representação redu- gra do sinal do momento angular em relação ao sentido de rota-
tível Xi. Na penúltima coluna, (n1), são indicadas as coordenadas ção mostra que o vetor do momento angular muda de sinal na
normais e os componentes de translação e de rotação em cada es- reflexão. A matriz de transformação será a da (5.16) multiplicada
pécie de simetria. A última coluna mostra a representação total, por -1:
n•(total), em dimensão 3N.
+I

~]
-sencp
l-coscp
sencp - cos cp
e,, 1 e, n'
1 1

o o
1 1 1 Q,
f

A, 1 1 1 Q, 3
___1::~--+----------
1 1 1 com caráter 1-2coscp.
>---- - - - - - - -- - - - - - - - -+ - - - - - - - - - - - - - - -
.1 .1
A2
r-~--
1
1 :
- - - - -- -- - - - - - - - -+ - - - - - - - - - - - - - -- - - + - - - - - - - - - - - - - - -~·- - - + - - - - -~ - - - -
Subtraindo de (5.17) o caráter para translação e rotação ob-
-1 : 1 : -1 Tx : tém-se o caráter da representação redutível na dimensão 3N-6,
B,
- - - -
-1
-- - - - - - - - - - -+ - - - - - - -
1
- - - - - - - - - - +- - - -
-1
- - - - - - - - - - -~y- l _---_2_ - - - -
- _ para as operações próprias:
-1 f -1 f 1 Q,
-1 -1 l Ty 3 u(1+2coscp)-(1+2coscp)-(1+2coscp) = (u-2)(1+2coscp) (5.20)
f----~
, ___-_1_ _~_ _ _-_1_ _~_ _ _
1_--t· - ~'-- - ! . - - - . - - - - -
X; -1 1 3 e para as operações impróprias:
Tabela 5.3 u(-1 +2coscp)-(-1 +2coscp)-(1-2coscp) = u(-1 +2coscp) (5.21)

Pode-se obter o caráter da representação redutível em di- Com estas expressões, podemos recalcular a estrutura da re-
mensão 3N-6 usando coordenadas internas em vez de coordena- presentação para a água na dimensão 3N-6. Para rotações pró-
das cartesianas de deslocamento, ou subtraindo dos resultados prias: na identidade os 3 átomos não mudam de posição eu= 3; na
para dimensão 3N os caracteres para as translações e rotações. rotação C2 , só o átomo de oxigênio permanece no mesmo lugar e
,
116 Oswaldo Sala Fundamentos da espectroscopia Ramon e no infravermelho 11 7

u= 1; assim, os valores do caráter da representação redutível ficam: r,, = [24 - 4(1+2cos72°)cos 144° -4(1+2cos144 °)cos72º J / 10 =
XE = (3-2)(1+2) = 3 e Xc = (1-2)(1-2) = 1. Para rotações impróprias:
2
=[24 + 2+ 4]/ 10 =3
na reflexão pelo plano xz o caráter será (1)(-1+2) = 1 e para o pla-
no yz será (3)(-1+2) = 3. Aplicando a expressão (5.14) obtém-se a As representações vibracionais para as configurações eis e
representação para os modos normais de vibração: r Q = 2A1 + 1B2 • trans do C 2H 2Cl2, grupo de ponto C 2v e C2 h, são semelhantes, mas,
Em outras palavras, obtivemos a previsão do número de mo- como veremos no capítulo seguinte, é possível distinguir por es-
dos normais esperados para cada espécie de simetria. pectroscopia estas configurações.
Em alguns grupos, na tabela de caracteres irredutíveis com-
parecem expressões com co-senos. Para determinar as represen- cis-C 2H 2 Cl 2 trans-C 2 H 2 Cl 2
tações desses grupos pode-se operar com as expressões literais
n(1l nCyJ
dos caracteres e somente no final substituir os co-senos pelos c,v E c, a,, (J Y' c,h E c, i (Jh
respectivos valores numéricos. Como exemplo, vamos calcular a Ai 1 1 1 1 5 Ag 1 1 1 1 5
representação dos modos normais para uma molécula piramidal, A, 1 1 -1 -1 2 Au 1 1 -1 -1 2
XY5 , simetria C5 v. B1 1 -1 1 -1 1 B, 1 -1 1 -1 1
B, 1 -1 -1 1 4 Bu 1 -1 -1 1 4
c5v E 2c, 2C-
2
5av nl'I xj 12 2 o 6 Xi 12 2 o 6
'
A, 1 1 1 1 2
A, 1 1 1 -1 o
E, 2 2cos72° 2cos144º o 2 Exercícios
E, 2 2cos144º 2cos72º o 3
12 -(1+2cos72º) -(1+2cos144º) 2 5.1 Determine para a molécula de piridina as matrizes de
X.i
transformação e seus caracteres para a operação C 2 aplicada: (i)
às coordenadas cartesianas de deslocamento dos átomos de car-
Os resultados na coluna n''' são obtidos calculando-se as re-
bono; (ii) às coordenadas internas das ligações CH.
presentações para cada espécie de simetria, como segue (lembrar
que cos72° = 0,309 e cos144° = -0.809):
5.2 A representação obtida para a molécula de água é: r =
2A 1+1B 2 . O caráter da representação redutível de dimensão 3N é
T" A, = [12 - 2(1+2COS 72°) -2(1+2COS144º) + 10] /10=
+9 para a operação identidade e -1 para a operação C 2 • Interprete
= [12-4-4(cos72°+cos144°)+10] / 10=[8-4(-0,5)+10]/10 =
estes resultados.
= 20/ 10 = 2

r A, = [12-2(1+2cos72º) - 2(1+2cos144º) - lQ j / lQ = 5.3 Calcule os momentos de inércia em relação aos eixos X, Y


= [8-4(-0,5)-101 /10 =o
e Z para a molécula de BF 3 • Comente os resultados.

lE, = [24 - 4(1+2COS72°)COS 72º - 4(1+2COS 144°) COS 144 ºJ / lQ = 5.4 Calcule para as moléculas de metano e de diclorometano
= 124+2-61/10 = 2 as representações para os modos normais.
11 8 Oswaldo Sala

Literatura recomendada

BARROW, G. M. Introduction to Molecular Spectroscopy. McGraw-Hill,


1962.
BARRIS, D. C., BERTOLUCCI, M. D. Symmetry and Spectroscopy. Do-
ver Publications, 1989.
HERZBERG, G. Molecular Spectra and Molecular Structure II. Infrared
6 Regras de seleção e medidas
and Ram,an Spectra of Polyatom,ic Molecules D. Van Nostrand Com- de polarização
pany, lnc., 1962.
HOLLAS, J. M. Modern Spectroscopy. John Wiley & Sons, 1987.
NAKAMOTO. K. Infrared and Raman Spectra of Inorganic and Coordi-
nation Compounds. John Wiley & Sons, 1986.
WILSON, E. B., DECIUS, .J. C., CROSS, P. C. Molecular Vibrations. Mc-
Graw-Gill, 1955.
WOODWARD, L. A Introduction to the Theory of Molecular Vibrations
and Vibrational Spectroscopy. Oxford, 1972. 6.1 Atividade no infravermelho - oscilador
harmônico

No capítulo 2 foi visto que a condição para haver atividade


óptica no infravermelho era que pelo menos um dos componentes
do momento de transição fosse diferente de zero. O momento de
dipolo(µ) e o de transição(µ,), este na notação usual em mecânica
quântica, já definidos para moléculas diatômicas, (2.19) e (2.20),
podem ser reescritos para moléculas poliatômicas:
120 Oswaldo Sola Fundamentos da espectroscopia Ramon e no Infravermelho l 21

onde Qk , Qi ... são as 3N-6 coordenadas normais. Modificaremos µx(k\v = ('l'v (kJlµxl'l'v (k))
esta última expressão para obter a atividade espectral no infra-
vermelho. Como as coordenadas normais são independentes, as µy(k)v'v' = ('1',·(k)lflyl~1,.(k))
(6.1)
funções de onda inicial e final, li'; e li'0 podem ser definidas por:
µ,(k)vv =(o/, (k)jµ,l'l'v (k))
3N-6
'f',(Q,,Q,, .. .,Q,N-6) = TI'l'v•(Q,)
k-1
Se uma destas integrais for diferente de zero, a vibração as-
sociada com a coordenada normal Qk será ativa no infravermelho.
3N-6 Este resultado pode ser obtido considerando as representações
'f',(Q,,Q,, .. .,QON-6)= TI 'l'v·(Qk)
keol
dos elementos que aparecem nas integrais, como será mostrado
em seguida.
sendo v" e v' os números quânticos vibracionais para o estado No modelo do oscilador harmônico só são permitidas transi-
inicial e final, respectivamente. ções com ó..v = ±1, assim, iremos considerar o caso mais comum,
Na aproximação do oscilador harmônico só o segundo termo do da transição do estado fundamental v = O para o estado v = 1.
desenvolvimento em série do momento de transição é considerado: Usando a (2.17), as funções de onda para estes dois estados são:

2
li' 0 (k) = N 0 (k) · exp(-iakQk )

(6.2)
2
Como Q, opera somente na função de onda 'l'(Qk), cada 'l'i (k) = N 1 (k) · exp(-iakQ, }2.{a';;-Qk
uma das 3N-6 integrais deste somatório pode ser escrita pelo
produto: A simetria de '!'0(k) é a mesma de um modo totalmente si-
Ili' ,Qk 'l';dQk =Ili' V (Qk) Qk li' (Qk )dQk
V nJ li' v'(Q;l'I' v' (Q;)dQ, métrico, pois é invariante para qualquer operação de simetria (a
coordenada normal Q,, como comparece com Q,2 , independe do
J*k
sinal). A li' /k) tem a mesma simetria da coordenada normal Q,,
Pela ortogonalidade das funções de onda as integrais no pro-
isto é, se transforma do mesmo modo que Q, para qualquer ope-
dutório se anulam, a menos que v'(Q 1 ) = v"(Q 1 ), v'(Q 2 ) = v"(Q 2 ),. ..
ração de simetria. Em outras palavras, a representação de '!'0(k)
v'(Q.) = v"(Q.) *(j k) etc. A primeira integral no segundo membro,
é a de uma espécie totalmente simétrica, r TS' e a representação
J J J
li' v (Q, lQ, li',· CQ,)dQ,, é diferente de zero somente se v' = v" ± 1,
de 'l',(k) é a do modo normal Qk, r". As integrais em (6.1) podem
que é a regra de seleção do oscilador harmônico, ~v = ± 1.
ser escritas em termos das representações e vamos tomar como
O momento de dipolo de transição para o modo Qk pode ser exemplo o componente x do momento de transição:
escrito:
(6.3)

onde substituímos o componente do momento de dipolo f'x pelo


ou, para seus três componentes: seu valor µx= e·x.
122 Oswaldo Sala Fundamentos da espectroscopia Ramon e no infravermelho l 23

Para a integral do momento de transição ser diferente de


zero, o produto das representações das três partes no integrando
(produto direto dos caracteres da representação irredutível) deve
A interpretação desta equação é semelhante à discutida para
pertencer à representação totalmente Simétrica, l TS' Ü produto
o infravermelho; vale a regra de seleção 1'.v = ±1, sendo ativas no
direto das representações em (6.3) é dado por:
Raman as vibrações cuja espécie de simetria seja a mesma de pelo
f=fk ·fx TTS menos um dos componentes do tensor de polarizabilidade. Para
uma transição de v = O para v = 1 ser ativa no Raman a integral
Para que ele pertença a uma representação totalmente simétrica
o produto r, ·r x deverá pertencer a esta espécie, o que só ocorre (i, j = x, y ou z)
se a representação r, for a mesma de rx (o produto direto dos ca-
deve ser diferente de zero, o que implica na rc'l',l ser idêntica
racteres da representação irredutível será dado pelos caracteres à f(a 1) , ou seja, a representação da coordenada normal Q, deve
elevados ao quadrado). Assim, a coordenada normal Q, deverá conter um dos componentes do tensor Raman.
pertencer a uma representação r x que tenha a simetria do com-
ponente translacional na direção de x, T,. O mesmo vale com re-
lação aos outros componentes. 6.3 Estrutura das representações do momento de
Resumindo, para um modo normal k ser espectroscopica-
dipolo e da polarizabilidade
mente ativo no infravermelho, a coordenada normal Qk deve per-
tencer à mesma espécie de simetria de um dos três componentes
Como foi visto, para um modo vibracional ser ativo no infra-
T , Ty , T . Significa que as espécies que na tabela de caracteres
X ~
vermelho sua coordenada normal deve pertencer à mesma espé-
contiverem pelo menos um componente translacional serão ati-
cie de simetria de um dos componentes translacionais, T , Ty ou
vas no infravermelho. X

T,. Para utilizar estes resultados precisamos determinar a estru-


tura das representações destes componentes, que é a mesma dos
componentes do momento de dipolo. Foi mostrado, no capítulo
6.2 Atividade no Ramon - oscilador harmônico
anterior, que o caráter da representação redutível para operações
próprias é 1+2cos e para operações impróprias é -1+2coscp. A es-
A atividade no Raman pode ser discutida examinando o mo-
trutura da representação será determinada calculando o número
mento de transição do dipolo induzido, ou da polarizabilidade,
de vezes que o caráter da representação irredutível comparece na
,, µ. O
de modo análogo ao que foi feito para o momento de dipplo
representação redutível i:;Cµ) destas translações. Serão ativas no
momento de transição em termos da polarizabilidade '
1 infravermelho as espécies em que este número for diferente de

a,.,= L:( ºª JJ
k ilQ, o
'I' ,Q, 'l';dQk
zero. Portanto, basta aplicar a equação já vista:
(y) 1 '\"' (y) ( )
(6.4)
n.L• =g7g.i.X.i X.i µ
pode ser escrito usando as funções de onda associadas a cada uma
das 3N-6 coordenadas normais, como foi feito para o momento de A atividade no Raman é obtida de modo análogo, conside-
transição por dipolo elétrico: rando como operadores no momento de transição os componentes
124 Oswaldo Sala Fundamentos da espectroscopia Ramon e no infravermelho 125

da polarizabilidade, no lugar dos componentes do momento de di- x e y de T) resulta na representação A2 • Portanto, o componente
polo. Em termos de representação, a , a yy , a etc. se com portam
XX XJ
da polarizabilidade que comparece na espécie A2 é o ª"".
como produtos das representações irredutíveis das coordenadas
cartesianas dos índices. B, 1 -1 1 -1 T X

A estrutura da representação para a polarizabilidade é obti- B, 1 -1 -1 1 Ty


(6.7)
da calculando-se os valores de: B,·B 2 =J\ 1 1 -1 -1 a .,

(6.5) n
c:lv E c, ª~ CTY, µ
(yl (·1)
n.
A, 1 1 1 1 1 3 T, axx,ayy,azz
onde os caracteres da representação redutível da polarizabilidade:
A, 1 1 -1 -1 o 1 ªxy

B, 1 -1 1 -1 1 1 Tx ax;:
x.(a)
J
= 2coscp(l+2coscp) para operações próprias
(6.6) B, 1 -1 -1 1 1 1 TY ay,
x/a) = 2coscp(-1+2coscp) para operações impróprias Xj(µ) 3 -1 1 1
x/aJ 6 2 2 2
são obtidos das transformações de coordenadas aplicadas aos
índices dos componentes do tensor de polarizabilidade (veja no Tabela 6.1
apêndice V a dedução dessas expressões). Serão ativas no Raman
, .
as espec1es em que nª (1) eior d''
11erente de zero. As estruturas para a representação do momento de dipolo e
As estruturas assim obtidas, para momento de dipolo e po- da polarizabilidade só têm o significado de atividade no infraver-
larizabilidade, não dependem da molécula em particular, são ca- melho ou Raman para cada espécie de simetria do grupo. Não têm
racterísticas de cada grupo de ponto. nenhuma relação com o número obtido de modos normais de vibra-
Como exemplo pode-se calcular, para o grupo de ponto C2y, a ção para cada espécie de simetria, utilizando as expressões (5.14),
estrutura da representação para o momento de dipolo, utilizando (5.20) e (5.21) do capítulo anterior. Significa somente que, se para
a (6.4). Sendo os caracteres da representação redutível x, = 3, Xc, = uma dada espécie de simetria o valor calculado de (6.4) ou (6.5)
-1ex0 =1, para os dois planos, obtém-serµ= 1A1+1B 1+1B 2 • Para for diferente de zero, a espécie será ativa no infravermelho ou no
a polarizabilidade, utilizando-se as (6.5) e (6.6) chega-se à r a = Raman, respectivamente. Se for igual a zero a espécie será inativa.
3A1+1A,+1B 1+1B 2 • Estes resultados são mostrados na Tabela 6.1.
Comparando com as tabelas obtidas no capítulo 5, temos
que a estrutura r µ= lA 1+1B 1+1B 2 corresponde à contribuição dos 6.4 Regras para bandas de combinação e
com.ponentes translacionais Tz) Tx e TY. Para saber quais com- harmônicas
ponentes da polarizabilidade comparecem em cada termo de r ª'
pode-se fazer o produto direto das representações irredutíveis Os resultados que obtivemos valem na aproximação de os-
dos componentes de translação. Por exemplo, o produto direto cilador harmônico, mas muitas vezes são observadas bandas en-
das representações de B 1 e B 2 (onde comparecem os componentes volvendo variação simultânea de dois ou mais números quânticos
126 Oswaldo Sala Fundamentos da espectroscopia Ramon e no Infravermelho l 27

vibracionais (bandas de combinação) ou a variação múltipla de Se o oscilador não for harmônico, podemos considerar nas
um mesmo número quântico vibracional (harmônicas); o oscilador integrais (6.1) a transição de um estado fundamental para um es-
não poderá mais ser considerado como harmônico. Foi visto no ca- tado excitado que envolve a excitação simultânea de dois modos
pítulo 2 que a anarmonicidade elétrica é responsável pela ativida- normais, ou seja, com a função de onda dada pelo produto de duas
de das freqüências harmônicas, enquanto que a anarmonicidade funções de estados excitados: IJ!,.(j). IJ!,.(k). Assim, o componente x
mecânica envolve os valores de energia dos níveis vibracionais. do momento de transição de vj = vk = O para vi= vk = 1 seria:
Na Figura 6.1 estão representados, como exemplo, alguns
níveis envolvendo combinação dos diferentes números quânti-
cos. Um estado vibracional pode ser caracterizado pelos números O estado fundamental do sistema pertence sempre à es-
quânticos (v 1 , v2 , v3 ... ), assim, para uma molécula com três mo- pécie totalmente simétrica (neste caso IJ!o(j) IJ!o(k)) e a regra de
dos normais de vibração podemos escrever os níveis de energia seleção implica, agora, que o produto das representações :r, ·1k
para cada série de harmônicas (v" O, O), (O, v 2 , O), (O, O, v,), a deve pertencer à mesma representação de µ,(ou T). Semelhante
primeira com espaçamento ro1' a segunda com espaçamento co 2 consideração vale para os demais componentes de µ. Resumin-
e a última com espaçamento ú)3 • Existem outras séries de níveis do, o produto dos caracteres das representações irredutíveis, dos
de energia, com dois números quânticos fixados e o outro variá- modos normais envolvidos na combinação, dará os caracteres da
vel, por exemplo, (v,, O, 1), (0, 1, v3 ), (2, O, v3), (1, v2 , 1) etc. No representação resultante e esta será ativa no infravermelho se
esquema desta figura, considerou-se o mesmo nível de energia contiver uma das representações de Tx, TY ou Tz.
do estado fundamental (v~O) para todos os modos considerados. Na combinação de um modo B 1 com um modo B 2, do grupo
de ponto e,,, efetuando o produto direto das representações irre-
dutíveis destas duas espécies de simetria, teremos o resultado
v, v, v, v, v, v, v,
mostrado em (6. 7); a representação resultante, sendo de espécie
4-- 6-- 4--· A2 , será ativa só no Raman.
A combinação de um modo normal de espécie A2 (inativa no
5-- 3-· - 8-- 4-- 3--
3-- 9--
infravermelho) com um modo de espécie B, resulta a espécie de
7-- 3---
4--- 8 6--··· 2--- 2-- simetria B 2 :
7 2-- 5-- 1---
2-· 3-- 6--- 4---- o-- 1--· A, 1 1 -1 -1
5-- 3--
2-- B1 1 -1 1 -1
2-- 4-- 1- - 0--
1-- 3-- 1--
A2B1 1 -1 -1 1 =B,
1--- 2-- o--
1
º""" a espécie B 2 sendo ativa no infravermelho e no Raman. Este resul-
V1C01 V2C02 V3C03 ro, ro, 2ro, ro1 + 003 tado mostra a importância da análise de bandas de combinação
+v 1ro 1 +V3ffi3 +V3ffi3 +v2ro2
para determinar o valor de freqüências fundamentais inativas; a
(v.,O,O) (0,v 2 ,0) (0,0,v) (v 1 ,0,1) (0,1,v) (2,0,v3) (1,vvl) freqüência inativa (A2 ) pode ser obtida da diferença entre o valor
Figura 6.1- Diagrama de níveis de energia de uma molécula triatómica. da freqüência da banda de combinaçào e o da banda de modo B 1.
128 Oswaldo Sala
l Fundamentos da espectroscopia Ramon e no infravermelho 129

Para modos harmônicos não degenerados podemos aplicar o Para duas vibrações degeneradas não se pode, simplesmen-
mesmo procedimento, considerando a forma de função de onda no te, proceder como acima. O caráter que se obtém é redutível e te-
estado excitado. As funções de onda em termos das coordenadas ríamos de determinar o número de vezes que a y-ésima represen-
normais (2.17), tação irredutível ocorre na representação redutível do produto:

~1,(Q) = Nv 0
~)
2

H,(fa°Q) · exp(-
n''' = .!:..
g
°"7 g. ·X ·'''x. (produto)
J J J
(6.9)

contém os polinômios de Hermite, H ( fa' Q), que são funções pa-


'
res para número quântico v par e funções ímpares para v ímpar. sendo os caracteres "x, (produto)" obtidos pelo produto direto.
Portanto, para modos não degenerados, os modos harmônicos Como exemplo, no grupo C,, os caracteres do produto direto E-E,
para v par são sempre totalmente simétricos, enquanto os de v para a combinação de duas bandas da espécie E, são:
ímpar pertencem à mesma espécie de simetria do modo normal
considerado. C,, E 2C, 3o-,
Na análise das harmônicas, por exemplo de um modo A2 do E 2 -1 O
grupo e,,, a primeira harmônica terá a representação da espécie E·E 4 1 o
totalmente simétrica A1 (o produto da representação irredutível
de uma espécie não degenerada por ela mesma é sempre total- Aplicando a (6.9) obtém-se para cada espécie:
mente simétrica), podendo ser observada no infravermelho. A
segunda harmônica teria a representação do produto da espécie n (Ail = i[ 1(1 x 4) + 2(1 x 1) + 3(1 x O)] = 1
A1 (do primeiro produto) por A,, resultando na representação A2 ,
n (Azl = i[1(1 x 4) + 2(1 x 1) - 3(1 x O)] = 1
inativa no infravermelho. A terceira harmônica teria novamente
a representação AI' ativa no infravermelho. n'El =i[1(2x4)-2(1x1)+3(0xü)]=l
Até agora só consideramos espécies não degeneradas, nos
produtos das representações. Para combinação de uma espécie Significa que o produto das representações das espécies de-
degenerada com uma não degenerada, ainda é possível fazer o generadas pode ser expresso como a soma de representações:
produto direto das representações. Como exemplo, no grupo C3, a
combinação de um modo A, com um modo degenerado E resulta E.E=lA 1 +1A2 +1E
no produto direto:
A, 1 1 -1 ou seja, a combinação tem atividade nas três espécies de simetria
E 2 -1 o do grupo.
Para um produto E . E . E podemos escrever, levando em
A 2E 2 -1 o consideração os resultados anteriores:
A espécie A2 é inativa no infravermelho e a combinação resultan-
te, espécie E, é ativa no infravermelho. Isso permite deduzir o (A 1 +A,+ E). E= A, . E+ A,. E+ E. E= E +E +A, +A2 +E
valor da freqüência que teria a banda A2 • = lA1 + lA, + 3E
130 Oswaldo Sala Fundamentos da espectroscopia Ramon e no infravermelho l 31

No caso do produto de uma espécie duplamente degenerada de 2 fótons, senão não haveria dependência com a distribuição de
com uma triplamente degenerada, F, como por exemplo o produto Boltzmann do estado v= 1 da vibração v 1. Há absorção de um fóton
de E por F 2 no grupo Td, a expressão (6.9) pode ser escrita: com energia correspondente à transição v2-v 1 que ocorre a partir
deste estado populado termicamente. No Raman o espalhamento
envolveria o estado inicial i.vt;u 1
e o final 'Vt~ l, além do estado
intermediário.
O fator entre [ ] corresponde ao x/produto), obtido pelo pro-
duto dos caracteres das representações irredutíveis para as espé- ..,.----,--- V = 1

"i
cies E e F 2 , como se verifica pela seguinte tabela:

Td E se, 3C 2 68, 6cr, v=l---~


v,
E 2 -1 2 o o ! v1
F, 3 o -1 -1 1
E·F2 6 o -2 o o Figura 6.2 - Esquema de banda de diferença.

Para modos harmônicos degenerados, o procedimento de cál-


culo das suas representações é muito mais complexo e não será 6.5 Ressonância de Fermi
discutido. As estruturas das representações para combinações
e harmônicas encontram-se em tabelas, por exemplo, Herzberg Normalmente as bandas de combinação ou harmônicas são
(1962), Tabelas 31 a 33, e Wilson, Decius et al. (1955), Apêndices observadas com intensidade muito menor do que a das funda-
X-6 e X-7. mentais que as originam. Contudo, algumas vezes elas aparecem
Além das bandas de combinação tipo soma de duas funda- com intensidade muito maior do que a esperada. Isto ocorre quan-
mentais, também são observadas bandas de diferença, que ocor- do a freqüência da banda de combinação ou harmônica se situa
rem quando o estado inicial não é o estado fundamental mas já muito próxima de uma freqüência fundamental permitida, que
é um estado excitado. Se a molécula estiver em um estado exci- pertença a mesma espécie de simetria da combinação ou harmô-
tado v=l de uma vibração v1 e houver uma transição para um nica em questão. Este efeito de intensificação é conhecido como
estado simplesmente excitado (v=l) de outra vibração v2 , sendo ressonãncia de Fermi. Geralmente não se pode distinguir entre a
v2>v 1, será possível observar no infravermelho, ou no Raman, combinação (ou harmônica) e a fundamental, quase coincidentes;
uma banda com o valor v2 -v 1 (Figura 6.2), chamada banda de di- elas resultam do acoplamento entre as funções de onda envolvi-
ferença. Esta banda segue a mesma regra de seleção da banda de das. Há uma perturbação dos respectivos níveis de energia, que
soma v2+v 1 • Como ela parte de um estado excitado, sua intensi- se "repelem", o nível mais baixo é deslocado para valor menor e o
dade dependerá do fator de Boltzmann deste estado, não sendo nível superior para valor maior; este deslocamento é tanto maior
observada para valores de freqüências altas; o abaixamento da quanto mais próximos os níveis estariam sem a perturbação.
temperatura da amostra causará diminuição de sua intensidade. Um exemplo típico é o observado no espectro do CC14 , onde a
Este processo não pode ser pensado como absorção simultãnea combinação dos modos v 1 (459 cm· 1) e v4 (313 cm~ 1 ) é muito próxi-
l 32 Oswaldo Sala Fundamentos da espectroscopia Ramon e no infravermelho 133

ma da fundamental v3 , dando origem a duas bandas muito inten- caso de moléculas igualmente "fixadas" ocorre em monocristais
sas no infravermelho, 768 e 797 cm·', que seriam a mistura de v 3 orientados. Medidas de polarização no infravermelho não são
com a combinação acima. Tanto v8 como a combinação pertencem muito comuns, pelo custo elevado e faixa relativamente pequena
à espécie F 2 . Esta ressonância também é observada no Raman, dos polarizadores, nesta região.
embora a intensidade não seja tão acentuada como no infraver- Nos espectros Raman pode-se obter, para amostras no esta-
melho. As duas bandas, 768 e a 797 cm·', têm praticamente a do líquido, medidas de polarização, ou do fator de despolarização
mesma intensidade. Outro exemplo é o do modo v 1 do C02 , ob- da radiação espalhada. Com estas medidas pode-se distinguir
servado no Raman como um dubleto, 1285 e 1388 cm·', devido à quais as bandas que pertencem à espécie totalmente simétrica. O
ressonância de Fermi com a primeira harmônica de v 2 (v 2 = 667 caso de espectros Raman de monocristais orientados será discu-
cni- 1, inativa no Raman). tido em outro capítulo.
Na expressão para o momento de dipolo induzido, P = aE, o
tensor de polarizabilidade pode ser desenvolvido em série:
6.6 Medidas de polarização
a=ao + L ( --
ôa) Qk (6.10)
No final do capítulo 5 obtivemos as estruturas das represen- k aQk º
tações para as configurações eis e trans do C2 H 2 Cl,, sendo mencio-
onde o primeiro termo representa o tensor da polarizabilidade
nado que sem conhecer a atividade no Raman e no infravermelho
intrínseca da molécula e no somatório comparecem os tensores
seria difícil distinguir os espectros destas duas moléculas. Com
Raman, ou seja, formados pelas derivadas da polarizabilidade em
o procedimento mostrado no presente capítulo esta distinção se
relação aos modos normais. A polarizabilidade intrínseca é a res-
torna fücil; na configuração eis os 12 modos vibracionais são ati-
ponsável pelo espalhamento elástico (Rayleigh). Iniciaremos este
vos n.o Raman, havendo coincidência com 10 vibrações ativas no
estudo de medidas do fator de despolarização considerando o es-
infravermelho. Na configuração trans as espécies simétricas em
palhamento Rayleigh, passando depois ao espalhamento Raman.
relação ao centro de simetria são ativas somente no Raman e as
Nas expressões para o momento de dipolo induzido (ver ca-
anti-simétricas são ativas somente n.o infravermelho.
pítulo 2, (2.24)), se considerarmos a radiação incidente polariza-
Informações adicionais podem ser obtidas através da técnica
da na direção x, elas se reduzem a:
de radiação polarizada. Se considerarmos uma molécula numa
posição fixada, a interação da radiação (absorção) com um modo P =a E
' = •
vibracional dependerá da orientação do momento de dipolo osci- P =a E (6.11)
y "' '
lante em relação ao campo elétrico da radiação. Supondo a radia- P =a E
~ ZX X

ção infravermelha polarizada na direção vertical e que nesta mo-


lécula haja uma ligação C=O, também na posição vertical, haverá significando que, embora o campo elétrico da radiação incidente
interação e conseqüente absorção de radiação que tenha a mesma só tenha componente x, a radiação espalhada irá conter os três
freqüência da vibração desta ligação. Se mudarmos a direção de componentes do vetor do momento de dipolo induzido. Isso cor-
polarização de 90º, isto é, com o campo elétrico oscilando no plano responde a dizer que houve despolarização da radiação e o valor
horizontal, não haverá interação e não se observa absorção. O de cada componente do dipolo induzido depende dos valores dos
134 Oswaldo Sala Fundamentos da espectroscopia Ramon e no infravermelho 135

componentes do tensor de polarizabilidade. Se ayx e a" forem nu- I11 significa que a observação é paralela à direção do campo elétrico
los, o momento de dipolo induzido se reduz ao componente x e da radiação incidente. Na Figura 6.3(b) a radiação incidente (na
a radiação espalhada será polarizada na mesma direção de po-
larização da radiação incidente; neste caso, pode-se dizer que a f. direção y) é polarizada na direção z, estando indicado o arranjo
para medir a intensidade da luz espalhada total ou polarizada na
despolarização é nula. direção z, com um polaróide analisador. A intensidade espalhada
Examinemos o caso de espalhamento Rayleigh na geome- total será:
tria indicada na Figura 6.3, onde a observação é feita a 90° da
radiação incidente. No esquema (a), com a radiação incidente na I 1
= N(ayz 2 +a Z7.2 )E 2 (6.15)
direção y e polarizada na direção x os componentes do momento
de dipolo induzido serão: onde I" indica que a observação é perpendicular à direção do cam-
po elétrico da radiação incidente. Com o polaróide (analisador)
podemos selecionar apenas o componente z de I" e estaremos ob-
z z servando o componente do momento de dipolo induzido P"' = u,,,zE 2 ,
(a) (b) sendo a intensidade correspondente:
~

E, I zJ_ =Nazz2E 2 (6.16)


,, y ,, y
"' 11-
As expressões (6.14), (6.15) e (6.16) valem para o espalha-
~ mento de uma única molécula. Num gás, ou líquido, teríamos de
"' pol. analisador considerar todas as orientações possíveis das moléculas e obter
w l,J_ as expressões de intensidade para a orientação média em relação
X X
a um referencial fixo. As transformações entre este referencial e
Figura 6.3 - Espalhamento Rayleigh, mostrando os componentes de o da molécula podem ser escritas em função dos co-senos direto-
polarização. res, cj> 1i' cj>Jf"'' onde o índice maiúsculo é X, Y, Z do sistema fixo e o
índice minúsculo é x, y, z do referencial da molécula:
Py =ayxx
E e Pz =azxx
E (6.12)

ªrJ = L,ai/l>Ii<DJj
Supondo as amplitudes E,= E,= E, as intensidades corres- i,j

pondentes medidas pelo observador serão:


Cálculo mais detalhado encontra-se em Wilson et ai. (1955),
Iy =Nayx E 2 2
e I z =Nazx E 2 2 (6.13) Apêndice IV e capítulo 3.
Uma propriedade importante do tensor de polarizabilida-
onde N é um fator de proporcionalidade, sendo a intensidade to- de é que certas combinações de seus componentes permanecem
tal dada pela soma destas intensidades: inalteradas quando se efetua uma mudança (rotação) de seus ei-
xos principais em relação a um sistema fixo de referência. Estas
L1/ = N(ayx2 + a zx2 )E 2 (6.14) combinações são denominadas invariantes do tensor, sendo duas
l 36 Oswaldo Sala Fundamentos da espectroscopia Ramon e no infravermelho l 37

destas grandezas o invariante isotrópico (ou do valor médio), a, e ao componente X do campo elétrico incidente (I11 , Figura 6.3(a))
o invariante anisotrópico, p2 , definidos por: e perpendicularmente ao componente Z deste campo (I,, Figura
6.3(b)).
U=~(axx+aY.Y+au)
(6.17) (6.20)
fll:i = ~[(axx - ayy)2 + (ayy - a,,)2 + (azz - ªxx)2 + 6(axy 2 + ªyz 2 + ª~z 2)]

Na segunda equação o termo 6(axy2 + ayz 2 + ªxz2 ) é nulo se os que pelas expressões em (6.19) se torna:
eixos do sistema de referência coincidem com os eixos principais 6p2
do elipsóide. Pn = 45a 2 +7P 2 (6.21)
As intensidades e o fator de despolarização podem ser escri-
tos em função destes invariantes; considerando as transforma- Para luz incidente plano polarizada no plano YZ (E 2 , Figura
ções mencionadas e a média para todas as orientações, as expres- 6.3(b)) o fator de despolarização será:
sões (6.14) a (6.16) ficam:

Substituindo as intensidades pelas expressões em (6.19) ob-


(6.18) tém-se:

(6.22)
p= 45a 2 +4P'

Desta expressão, válida para radiação incidente plano pola-


ou, em termos dos invariantes a e p2 definidos em (6.17): rizada, é fácil ver qual o valor máximo e o mínimo que a expres-
são (6.22) adquire no caso de espalhamento Rayleigh. O valor
2 2
I = NE 2 · p mínimo corresponde ao grau de anisotropia ser zero CP' = O), o
li 15
elipsóide reduzindo-se a uma esfera. Como conseqüência, pmm. = O.
2 2
I =NE'·45a +7p (6.19) O valor máximo corresponde ao máximo de anisotropia, quando
' 45 todos os componentes de a, com exceção de um (por exemplo, a ), ~
2 2
I = NE'. 45a +4P forem iguais a zero. Neste caso, ii = -31 ·a e 02 =a 2 , resultando o
'" 45 valor máximo do fator de despolarização:
= "'
No caso de radiação incidente não polarizada, esta pode ser
pensada como constituída por duas direções de polarização or-
togonais; o fator de despolarização será definido pela razão en-
tre as intensidades da radiação total espalhada paralelamente No caso de luz não polarizada o valor máximo de p" é 1/2.
138 Oswaldo Sala Fundamentos da espectroscopia Ramon e no Infravermelho 139

O formalismo obtido para o fator de despolarização é válido


(6.24)
tanto para o espalhamento Rayleigh como para o espalhamento
Raman, mas no desenvolvimento em série (6.10):
Para uma vibração totalmente simétrica em que:

o tensor
l l l
(:~: =(:~: =(~~: =O e

ª=
ªº = a,, a.YY
axy a,,
(l,YZ
(l l l
~~: = ( ~~: = ( ~~':
ª= a,Y a,, resulta que (13~) 2 =O e o fator de despolarização tem o valor míni-
mo p = O. Para o valor máximo, diferentemente do caso de espa-
vale para o espalhamento Rayleigh e os tensores
lhamento Rayleigh, como as derivadas (8a/8Qk\ não são necessa-
riamente todas positivas, a:;,pode ser nulo, sem que (13 1) seja zero.
Isto leva ao valor máximo do grau de despolarização Pm= = 3/4.
Somente para vibrações totalmente simétricas de moléculas
k = 1, ... , 3N-6 isotrópicas é que (l}k) 2 = O, como ocorre no exemplo clássico do
modo totalmente simétrico do CCl,. De maneira geral o fator de
despolarização de bandas totalmente simétricas será menor que
3/4. Assim, se O ,; p<3/4 a banda pertence à espécie totalmente
simétrica e se p= 3/4 a vibração considerada não é da espécie
valem para o espalhamento Raman.
totalmente simétrica.
Para o Raman as expressões para os invariantes (6.17) de-
No exemplo da configuração eis do C 2H 2 Cl2 , das 12 bandas
vem ser reescritas em termos destas derivadas. Indicando com
ativas no Raman 5 são polarizadas e devem ser atribuídas à
a~x (k) a derivada de ª= em relação ao modo normal Qk, (oa,j
espécie A 1.
ilQk)0, com a',/k) a derivada Càa,/oQ,) 0 etc. e com ak e (13~ )2 os
A m;meira mais usual de obter o fator de despolarização no
invariantes em termos destas derivadas, teremos:
Raman (embora não a mais correta) é: medir primeiro a inten-
a:; =t[a=(k)+ayy(k)+a,,(kJ] sidade das bandas com a radiação excitante polarizada na di-
reção de observação (obtendo-se I;) e, em seguida, medir estas
<0» 2
=t{ [a~(k)-aYY(k)J' +[a;,(k)-a~,(k)J' +[u.,,(k)-a~(k)J' (6.23) intensidades com o campo da radiação perpendicular à direção
+6[acy(k) 2 +a,.(k) 2 +o.,,(kl']} de observação (obtendo-se I _). Para estas medidas utiliza-se uma
lãmina de meia onda, ('IJ2), para girar o campo elétrico da radia-
O fator de despolarização para uma banda Raman corres- ção incidente, obtendo-se o fator de despolarização p =I 1/ I _. Com
pondente ao modo normal k, para luz incidente plano polarizada, este método o fator máximo para o fator de despolarização é 6/7
será dado por: (ver exercício 6.5). Para medidas experimentais mais corretas,
l 40 Oswoldo Sala
lf
! -

Fundamentos da espectroscopia Ramon e no infravermelho 141

deve-se fixar o campo da radiação incidente perpendicularmente Na Figura 6.5 são mostrados resultados de medidas do fa-
à direção de observação e utilizar um polaróide analisador, en- tor de despolarização para as bandas em 313 e 459 cm· 1 do CC14
tre a amostra e o espectrómetro. Para evitar a diferente resposta obtidos com vários arranjos experimentais. Na Figura 6.5(a) (so-
do espectrômetro para os dois estados de polarização, usa~se um mente girando o campo elétrico incidente com uma lâmina de
despolarizador ("scrambler") na frente da fenda de entrada. meio comprimento de onda) a banda em 313 cm· 1 (modo F 2) tem
Na Figura 6.4 são mostrados os espectros do CC14 , na região fator de despolarização p = 617 ~ 0,86. Pelo segundo método, com
Stokes e anti-Stokes, obtidos pelo primeiro método, para os dois despolarizador e polaróide analisador, Figura 6.5(b), o fator de
estados de polarização, notando-se a grande variação de intensi- despolarização desta banda é p = 3/4 = 0,75.
dade da banda em 459 cm· 1 (modo A 1) em relação às demais. Nes- Cuidados especiais são necessários na medida precisa do fa-
te método, o fator de despolarização medido é dado pela expres- tor de despolarização. A luz que entra no espectrómetro tem di-
são (6.21), como para luz incidente não polarizada. Nesta figura, ferentes estados de polarização e a resposta do instrumento pode
as bandas em 768 e 797 cm· 1 apresentam ressonância de Fermi. falsificar os resultados, devido à reflectividade dos espelhos e da
Em destaque são mostradas estas bandas na região anti-Stokes rede de difração não ser a mesma para luz polarizada no plano de
(para polarização perpendicular), com ganho de 20 vezes. Pró- incidência ou perpendicularmente a este. Na Figura 6.5(c) este
ximo a O cm· 1 a radiação incidente é cortada por um sistema de efeito é ilustrado efetuando-se as duas medidas por meio da mu-
segurança, para que a intensa radiação Rayleigh não danifique a dança somente de ângulo do polaróide analisador, sem utilizar o
fotomultiplicadora. despolarizador. O fator de despolarização esperado seria p= 3/4,

(a) (b) (e)


p = 0,01
p = 0,00
p = 0,01

p = 0,86 p = 0,12

r
-800 -600 -400 -200 o 200 400 600 800
rL 313 459 ;313 459 313 459

Figura 6.5 - Medidas do fator de despolarização para as bandas em 459 e 313


cm- 1 do CC14 :
Figura 6.4 - Rspectros Stokes e anti-Stokes do CC14 para as duas direções do (a) só com uso de lâmina de N2;
campo elétrico incidente. O espectro superior é para o campo elétrico da radiação (b) com uso de polaróide analisador, A, e despolarizador, D;
incidente perpendicular à observação. (e) utilizando somente polaróide analisador.
l 42 Oswoldo Sala Fundamentos da espectroscopia Ramon e no infravermelho 143

entretanto o valor experimental, no exemplo mostrado, foi 0,12. 6.5 Deduza a expressão para o fator de despolarização
Um fator de correção deveria ser introduzido dependendo da re- quando as medidas de intensidade são obtidas utilizando somen-
gião espectral em estudo (devido à variação do ãngulo de incidên- te lâmina de meia onda para mudar a direção de polarização da
cia na rede de difração), de modo que o valor experimental radiação incidente.

6.6 Calcule para as moléculas de metano e diclorometano


onde fé o fator de correção e pé o valor teórico, 3/4. Este efeito da as representações para o momento de dipolo e para a polariza-
resposta do instrumento, é evitado colocando um despolarizador bilidade. Interprete os resultados comparando com os obtidos no
em frente à fenda do espectrómetro. exercício 5.4.

Exercícios Literatura recomendada

BARROW, G. M. Introduction to Molecular Spectroscopy, McGraw-Hill,


6.1 Para uma molécula tipo XYZ 2 foram observadas 3 fre-
1962.
qüências vibracionais de estiramento, em 1730, 2900 e 2950 cm·',
COTTON, F. A. Chem.ical Applications of Group Theory, Interscience,
sendo as duas primeiras polarizadas no espectro Raman. É possí-
1971.
vel, com estes dados, saber qual é esta molécula?
BARRIS, D. C. & BERTOLUCCI, M. D. Symmetry and 8pectroscopy,
Dover Publications, 1989.
6.2 Escreva as equações para o momento de dipolo induzido
supondo que a radiação incidente é polarizada num plano situado HERZBERG, G. Molecular Spectra. and Molecular Structure li. Infra-
red and Raman Spectra of Poliatomic Molecules, D. Van Nostrand,
entre os planos XZ e XY.
1962.

6.3 Foram efetuadas duas medidas de fator de despolariza- HOLLAS, J. M. Modern 8pectroscopy, John Wiley & Sons, 1987.
ção. Na primeira, utilizando somente uma lâmina de meia onda NAKAJVIOTO, K., Infrared and Raman Sp.ectra of lnorganic and Coordi-
nation Compounds, John Wiley & Sons, 1986.
para girar o plano de polarização do laser incidente, obteve-se
para os modos vibracionais indicados entre ( ) os valores: 0,86 WILSON, E. B., DECIUS, J. C. & CROSS, P. C. Molecular Vibra.tions ,
(v 1); 0,75 (v,); 0,5 (v 3). Para a segunda medida, utilizando polarói- McGraw-Hill, 1955.
de analisador e um despolarizador em frente à fenda, mantendo WOODWARD, L. A. lntroduction to the Theory of Molecular Vibrations
constante a polarização do feixe incidente, obteve-se os valores: and Vibrational Spectroscopy, Oxford, 1972.
0,75 (v 1); 0,65 (v,) e 0,43 (v,). Como se pode interpretar estes re-
sultados?

6.4 Desenvolva em série de Taylor, até o termo de segunda


ordem, a expressão para o momento de dipolo para molécula po-
liatômica. Indique o significado de cada termo.
Z_ Construção das coordenadas
de simetria

7.1 Estrutura das coordenadas internas

Do mesmo modo que determinamos as estruturas das repre-


sentações para vibrações normais, momento de dipolo e polariza-
bilidade, podemos determinar a estrutura da representação para
as coordenadas internas. Isto é importante para mostrar o tipo
de coordenada interna que irá comparecer em cada espécie de
simetria, facilitando a construção das coordenadas de simetria.
Estas fornecem, de forma aproximada, os movimentos envolvi-
dos em cada freqüência vibracional. As coordenadas de simetria
são obtidas de combinações lineares de coordenadas internas; as
coordenadas norm.ais podem ser expressas em termos das coorde-
nadas de simetria, das coordenadas internas ou das coordenadas
cartesianas de deslocamento.
As coordenadas internas, como já foi definido, são dadas
pelas variações das distãncias internucleares entre dois átomos
ligados quimicamente e/ou fisicamente e pelas variações dos ân-
gulos entre estas ligações. Para uma molécula com N átomos
existirão 3N-6 coordenadas internas independentes. Se houver
mais do que este número, dependendo da escolha do sistema das
146 Oswaldo Sala Fundamentos da espectroscopia Ramon e no Infravermelho 14 7

coordenadas, elas não serão independentes e haverá entre elas na!), sendo seus elementos na matriz simplesmente 1. Em outras
"condições de redundância", que deverão ser determinadas. palavras, os xi(q) são determinados pelo número de coordenadas
A estrutura da representação das coordenadas internas é internas não permutadas pelas operações da classej. n~' é obtido
obtida da equação: de (7 .1) para cada conjunto de coordenadas internas equivalen-
tes. A Tabela 7.1 mostra estes valores para a molécula de NH 3 .
n'1' =.!:.gf
q
"g·.x·'J ';c(q)
]
J
1
(7.1) Neste exemplo, nQ'1' é obtido pela soma dos n~'·

onde x.(q) é o caráter da representação redutível para coordenadas E 2c, 3cr 1 n(yJ (·1) n(y)
J c,v na Q
internas equivalentes, q. Coordenadas internas equivalentes são '
Ai 1 1 1 1 1 2
coordenadas que podem ser permutadas pelas operações de sime-
tria do grupo de ponto da molécula.
A, 1 1 -1 o o o
Por exemplo, no benzeno todas as coordenadas internas cor- E 2 -1 o 1 1 2
respondentes às variações das distâncias das ligações CC, l'ff1a l'ff6 , x/r) 3 o 1
são equivalentes, o mesmo ocorrendo com as coordenadas de varia- X;(a) 3 o 1
ção de ângulo CCC, l'la 1al'la 6 • Na piridina haverá dois conjuntos de
Tabela 7.1
coordenadas internas correspondentes às variações das distâncias
CC, (l'ls 1, l'ls 2) e (l'lt,. l'lt2 ), e um conjunto de coordenadas das varia- Se houver mais de 3N-6 coordenadas internas, como na mo-
ções das distâncias CN, (l'lrl' M); para as coordenadas internas de lécula de CCl, (ou qualquer molécula tipo XY4 , do grupo Td), onde
variação de ângulo teremos quatro conjuntos de coordenadas equi- há quatro coordenadas de estiramento (i\r 1' Ar 2 , l'lr3 , Ar 4 ) e seis
valentes: l'la; (l'lp 1 e l'lP) (l'ly 1 e l'ly2 ) e 1'18, mostradas na Figura 7.1. de deformação de ângulo (Lla 12 , Lla 13 , Lla 14 , Lla 23 , Lla 24 , Llu::i4 ), num
total de dez coordenadas, em vez de nove, haverá uma condição
l'lt,
l'lr,
Lla 3
a,
"'"
l'la,
l'ltl

l'lyl
"'º l'ly,
de redundância, neste caso expressa por :l:l'lau.. = O. Esta expressão
significa que não é possível um movimento com todas as coorde-
nadas internas de deformação de ângulo aumentando simultane-
l'lr, Llr5 l'ls, l'ls, amente. Efetuando os cálculos, as representações que se obtêm
l'la, l'la, l'lP, l'lP, para o CC14 seriam as mostradas na tabela seguinte:
M, "'ª1 l'lr, l'lr1 "'ª
N
l'lr'
CI,
Figura 7.1 - Coordenadas internas equivalentes pR.ra o anel do benzeno e da ilr,
piridina.
T<l
(y)
n,. na
(y J n
Q
(y)
Li.«-~~ . . .·.:.· ..
Nestes exemplos consideramos apenas as coordenadas in- Ai 1 1' 1 ~12
A.ú.13 e
ternas dos anéis, excluindo as ligações CH, os ângulos CCH e os E o 1 1
movimentos fora do plano. F, 1 1 2 ilr,
Os caracteres x.Cq) resultam da contribuição, nas matrizes CI, CI,
de transformação das ' operações do grupo, das coordenadas in-
ternas q que não são permutadas (estando, portanto, na diago-
1
148 Oswaldo Sala
,
l
Fundamentos da espectroscopia Ramon e no infravermelho 149

!
Observa-se nesta tabela que para a espécie A 1 a soma n/1' + j internas que representa um movimento da molécula para a espé-
nª(rl é maior do que o valor de nQ(yl, ao passo que para as espécies cie de simetria considerada, y. Elas são importantes na análise
E e F 2 a soma é igual ao valor de nQ'''· Quando isto ocorre signifi- 1l de coordenadas normais, pois permitem fatorar o determinante
secular em blocos, correspondentes às várias espécies de simetria,
ca que há condições de redundância envolvidas. Neste exemplo,
t
)
como vimos, a condição é dada por Ló.a 1i = O. O asterisco (*) na pois não misturam movimentos de espécies de simetria diferentes.
tabela indica que as coordenadas equivalentes envolvidas apre- Como exemplo, para a água há dois conjuntos de coordena-
sentam condição de redundância. das internas equivalentes, o das coordenadas de estiramento .1r 1
e ó.r2 e o da deformação de ângulo ó.a. A estrutura da representa-
ção para as coordenadas internas resulta na contribuição destes
7.2 Construção das coordenadas de simetria dois conjuntos para a espécie A 1 e somente o das coordenadas de
estiramento para a espécie B,, como mostra a Tabela 7 .2, estando
Sendo R um operador genérico das operações de simetria de a molécula no plano yz.
um grupo de ponto, se multiplicarmos este operador pelo cará-
ter irredutível de uma espécie y para esta operação de simetria, C2v E e, CT X:.!< (j Y'
nc"1
'
(y)
n"
(y)
nQ
x'''(R), e somarmos para todas as operações do grupo iremos criar A, 1 1 1 1 1 1 2
um novo operador, conhecido como "operador de projeção": A, 1 1 -1 -1 o o o
(7.2)
1
'
!
B,
B,
1
1
-1
-1 -1
1 -1
1
o
1
o
o
o
1
~
f x;(r) 2 o o 2
O resultado da aplicação deste operador numa base, por ' x;CaJ 1 1 1 1
exemplo das coordenadas internas, irá conter as características
da espécie de simetria considerada (incluída nos caracteres da Tabela 7.2

representação irredutível) e as características das operações de


A coordenada de simetria de estiramento para a espécie A 1
simetria do grupo na molécula (envolvendo o tipo de coordenada
será, utilizando (7.3):
e a geometria da molécula).
A aplicação dos operadores de projeção numa coordenada
representativa de um conjunto de coordenadas internas equiva-
(7.4)
lentes, multiplicada por um fator de normalização, l/N, resulta
nas chamadas "coordenadas de simetria":

S 1''Cq)= ~Lx''iCRl·R·q, (7.3) O fator de normalização, N, é determinado considerando as


R coordenadas internas como versares e a coordenada de simetria
onde q, (geratriz) é uma coordenada interna qualquer de um con- normalizada para 1, ou seja, fazendo (4/N 2)(1 2 +l2) = 8/N2 = 1, re-
junto equivalente, por exemplo ó.r 1 ou ó.a 12 , para o CC14 . As coorde- sultando N 2 = 8 ou N = 2,/2, que dá o resultado acima. A coorde-
nadas de simetria são, portanto, uma combinação de coordenadas nada de simetria para deformação de ângulo é:
150 Oswaldo Sala Fundamentos da espectroscopia Ramon e no infravermelho l 51

(7.5)
1
E 1 A,
Para a espécie B2 a coordenada de estiramento é:
iB 2 )
(r1 ) 1 "'r2 + M 1 ) 2
-("'r )
S = -(M1 - M2 - = 1 - "'r2 =
N N
(7.6)
1 2 3 2 3
= ,,/2 (M1 - M 2)

Vamos determinar as coordenadas de simetria para a mo-


De modo prático, determina-se o fator de normalização so- lécula de CHC13 (supondo os seis ângulos iguais a 109"47'). Para
mando os quadrados dos coeficientes das coordenadas internas esta molécula há dez coordenadas internas e como 3N-6 = 9, ha-
que comparecem na coordenada de simetria, após a fatoração dos verá uma condição de redundância nas coordenadas de variação
termos comuns, e extraindo a raiz quadrada desta soma. de ângulo, que corresponde à coordenada de simetria da espécie
Para espécies degeneradas, quando mais de uma coordena- A 1 envolvendo a combinação Ll.a+"'B:
da de simetria participa da mesma espécie, um cuidado adicional
precisa ser observado. Deve-se considerar a mesma orientação na s<Ai l (a+ Bl = _}G ("'ª12 + "'ªrn + "'ª'' + "'01 + ilB, + "'B, J =O (7. 7)
construção dessas coordenadas. Isto decorre do fato que durante o
movimento a molécula sofre distorção em sua simetria. Por exem- H
plo, na molécula de BF 3 , simetria D3h, no movimento degenerado
em que duas ligações BF distendem e a outra contrai, a molécula >1~~
1
passa a ter simetria C 2v (com o eixo C 2 nesta última ligação). Isto
estabelece uma direção (orientação) preferencial na molécula du- e
rante a vibração, fazendo que os outros movimentos desta espécie
M,
devam apresentar a mesma propriedade de simetria. Para isto, é
Cl, Cl,
necessário considerar, na coordenada geratriz das outras vibra-
ções, a mesma orientação da primeira coordenada escolhida; as
vibrações deformarão a molécula nesta mesma direção.
Nas espécies não degeneradas a orientação não é necessária; C::iv E 2c, 3cr n(yJ (y)
n,. na
(y) (y)
nQ
(y)
V R n~
como mostra o esquema abaixo para a espécie A 1, não há deforma- A, 1 1 1 1 1 1* 1* 3
ção da molécula numa direção específica. Para modo degenerado A, 1 1 -1 o o o o o
não tem sentido falar em estiramento simétrico ou anti-simétrico,
E 2 -1 o o 1 1 1 3
pois, como mostra o esquema para a espécie E (onde a orientação
x;(Rl 1 1 1
foi escolhida na direção da ligação 1), uma rotação C3 muda o
átomo 1 para 2 de maneira anti-simétrica, entretanto, ao mesmo
x;(r) 3 o 1

tempo o átomo 2 muda para 3 de maneira simétrica. A rotação, x;(a) 3 o 1


portanto, não é nem simétrica nem anti-simétrica, é degenerada. X;(J') 3 o 1
152 Oswaldo Sala Fundamentos da espectroscopia Ramon e no infravermelho 153

Essa coordenada é, evidentemente, igLJal a zero, pois não é Para a coordenada geratriz Ar 1+,6,r2 teremos:
possível efetuar um movimento onde todos os ângulos envolvidos
aumentem simultaneamente. Embora igual a zero, esta coorde- S CEI (r1 +r2 )= N 3 1 3 2
l
1 [2(i'ff1 +1'.r2 )-(1'.r +1'.r )-(1'.r +1'.r ) =

nada é importante para se considerar a condição de ortogonalida- 1


de das coordenadas de simetria. = (1'.r1 + M 2 - 21'.rsJ
16
A coordenada genuína para a espécie A 1, envolvendo a va~
riação dos ângulos, pode ser obtida da combinação 1'.a-1'.p, que é O sinal da coordenada é irrelevante, representa somente
ortogonal à coordenada (7.7): uma fase do movimento, e podemos escrever:

S (E) (r1 + r2 ) = 1 (2M1 -1'.r1 - M 2 ) (7.12)


16
Considerando a coordenada 1'.r3 como geratriz:
A coordenada de simetria para o estiramento CH é:
S'F, 1(r,J= ~(2&,-1'.r, -1'.r,)
(7.9)
que é o mesmo resultado de (7.12). Para a deformação de ângulo
e para os estiramentos CCl: ClCH, usando como geratriz a coordenada .!>p 3 :
1
(7.10) s (E)
CP,)= (2'-'-P.1 - ôp 1 -11p 2 J (7.13)
16
As coordenadas de simetria têm a propriedade importante
Para a espécie degenerada, E, deve-se observar a orientação
de serem ortonormais (como foi visto no capítulo 5 para a estru-
e vamos escolhê-la gerando a primeira coordenada de simetria
tura das representações). Elas se comportam como vetores, onde
com a coordenada interna 1'.a 12 . A coordenada para o estiramento
as coordenadas internas seriam os versares. Pela própria cons-
CCl deve ser construída de modo que conserve a simetria deter-
trução, as coordenadas obtidas já estão normalizadas. Quanto à
minada por esta coordenada, havendo duas maneiras de fazer
ortogonalidade, se uma delas não for ortogonal com as demais ela
isto. Uma seria a escolha da coordenada geratriz dada pela soma
não poderá ser considerada; uma nova coordenada satisfazendo
das coordenadas ~r 1 +~r 2 ; outra seria considerar a coordenada
esta condição deve ser obtida. Como exemplo podemos verificar
~r como geratriz, pois ela possui a mesma orientação de ~a, 2 ,
3 a ortogonalidade entre a coordenada S'"'(r3) e a 8'A 11(r1); fazendo
estando num plano de simetria passando pela bissetriz deste ân-
os produtos dos coeficientes das coordenadas internas correspon-
gulo. As mesmas considerações valem para as demais coordena-
dentes e somando, obtemos:
das internas.
A coordenada de simetria gerada por 1'.a 12 é:

(7.11)
mostrando que estas duas coordenadas são ortogonais.
l
154 Oswaldo Sala Fundamentos da espectroscopia Ramon e no infravermelho l 55

As coordenadas de simetria envolvendo as deformações de Para as coordenadas de simetria de espécies degeneradas,


ângulo, em (7.7), (7.8), (7.11) e (7.13), satisfazem as condições de seria esperado que houvesse mais de uma coordenada para cada
ortogonalidade. Se tivéssemos considerado para a espécie A1 uma tipo de movimento, ou melhor, que o número delas fosse igual ao
coordenada grau de degenerescência da espécie correspondente. Realmente,
podemos determinar para a espécie E duas coordenadas de si-
metria para cada coordenada interna envolvida. Vejamos como
determinar estas coordenadas no caso de estiramento CCl da mo-
ela não seria ortogonal à coordenada de redundância (7.7), por- lécula de CHC1 3 . Tomando como coordenada geratriz Llr 1' Llr2' Llr3
tanto, não seria uma coordenada de simetria (para efetuar o e calculando as respectivas coordenadas de simetria obtém-se,
produto podemos considerar as coordenadas LIJ3 com coeficientes sem considerar o fator de normalização:
zero).
Quando as coordenadas internas não são independentes, 81 = S'E'(r1 ) = 2Llr1 -Llr2 - Llr3
ou seja, quando houver con.dições de redundância, nem sempre 8 2 = S (E) (r2 ) = 2Llr2 - Llr3 - Llr1 (7.14)
é simples determinar as coordenadas de simetria, como mostra 8 3 = S CE} (r3) = 2Llr3 - Llr1 - Llr2
o exemplo da molécula de diclorometano, CH2 Cl2 , cujo grupo de
ponto é C 2, Há duas coordenadas internas de estiramento CH Estas três coordenadas não são ortogonais, pois S, x 8 2 =
(LIR), duas de estiramento CCl (Llr), uma de deformação de ângu- -2(Llr 1)-2(Llr2 )+1(Llr3 ), sendo a soma dos coeficientes neste produto
lo HCH (Lia), uma de deformação de ângulo ClCCl (LIJ3), e quatro diferente de zero. Além disso, elas não são independentes, pois
de deformação de ângulo HCCl (Lly). O cálculo da estrutura das 8 2+83 = 2Llr 1-Llr2-Llra = 8 1. Contudo, podemos considerar a combi-
coordenadas internas (ver capítulo 9) para a espécie A, mostra nação 8 2-S, = Lir2-Llr3, ortonormal às,, que junto com a 8 1 fornece
contribuição destes cinco tipos de coordenadas, devendo existir as duas coordenadas degeneradas:
uma condição de redundância envolvendo as coordenadas de de-
S(E)a(rl) = ~ (2Lirl - Llr, - Llr3)
formação de ângulo. A coordenada de simetria redundante é:
(7.15)
S (Elb ( r2 - r:J = 1~ (~r2
)
- Ar3 )
· v2
A coordenada genuína das deformações de ângulo para esta
De modo semelhante pode-se obter as coordenadas degene-
espécie pode ser escrita:
radas para as deformações de ângulo. Para o cálculo de coorde-
SA1 (a+J3-y) = (2Lla +2 LIJ3- Lly 13 -Lly 14- Lly23 - Lly24 )JJ6 nadas normais não é necessário determinar o par de coordenadas
degeneradas, pois elas correspondem ao mesmo autovalor; qual-
onde os coeficientes foram ajustados para ela ser ortogonal à co- quer uma destas coordenadas pode ser considerada neste cálculo.
ordenada de redundância. A outra coordenada da espécie A 1 para Vejamos mais detalhadamente o efeito das operações de
deformação de ângulo seria: simetria numa vibração degenerada. Estas operações devem
mudar cada coordenada normal degenerada numa combinação
SA1 (a-J3) = (Lla-LIJ3)ifz. linear destas coordenadas, que é também solução do problema.
156 Oswaldo Sala
l Fundamentos da espectroscopia Ramon e no Infravermelho 15 7

Para uma molécula linear, por exemplo, o C0 2 , há dois modoR nido por j-k-1 (ao qual o átomo i também pertence, na sua posição
de deformação de ângulo, representados por vetores de desloca- de equilíbrio); isto está esquematizado na figura seguinte, onde
mento no plano do papel ou por vetores perpendiculares a este y, representa o ângulo de deslocamento da ligação i-j em relação
plano. Qualquer combinação linear destes dois movimentos har- ao plano da posição de equilíbrio. Podemos definir coordenadas
mônicos (no plano e fora do plano), que têm a mesma freqüência, y: e y; para cada lado do plano, com a condição de redundância
é também um modo normal. O movimento resultante, no caso de yi+ + yi-= O.

diferença de fase de 90º, será um movimento circular ao redor do


i' ·-
eixo da molécula.
O movimento descrito nas equações (7.15) pode ser exami-
t t
nado considerando a projeção dos vetores de deslocamento num k
plano horizontal. O modo E'"' pode ser representado como em (I),
na figura que segue. Aplicando a operação de simetria C 3 teremos
a figura (II). Fazendo uma combinação linear dos movimentos Outro exemplo importante é o das coordenadas internas de
descritos em (I) e (II), com um fator dois para as amplitudes de torção, ,;, , dadas pela variação do ângulo diédrico entre dois pla-
(II), resulta a figura (III), onde os módulos dos vetores foram re- nos, definidos pelos átomos 1, 2, 3 e 2, 3, 4, respectivamente, sen-
duzidos de 1/3 (fator de escala). Pela segunda equaçâo em (7.15) do o eixo de torção definido pelos átomos 2,3. Este ângulo varia
vemos que este movimento resultante corresponde ao modo E'bl. entre -ir e +n. Considera-se o valor positivo quando observando
ao longo da ligação 2-3, com o átomo 2 mais próximo, o ângulo da
projeção de 1-2 com a de 3-4 é traçado no sentido horário, confor-

/
L
/\' ,/
/, 1
' \
\
\
me o esquema:

\ ,/ \
// \, / \
,/ '\
,/ \
0_ _____________ ~
2 3
//--------------~ Vamos considerar o íon dicromato, supon.do simetria C2v'
(!) (II) (Ili) com um dos átomos de oxigênio de cada agrupamento Cr0 3 (de-
nominados de 1 e 2) no plano (yz) da molécula. Definiremos para
Além das coordenadas internas associadas aos movimentos o agrupamento 1 as coordenadas de torção Li1' 1 e Li1" 1 (o índice
de estiramento da ligação e de deformação do ângulo, existem mais superior 'indica movimento saindo do plano da molécula e " in-
dois tipos de coordenadas internas que devem ser consideradas, dica movimento oposto) e para o agrupamento 2 as coordenadas
deformações de ângulo fora do plano e deformações torsionais. .ó:r' 2 e .11""2 , sendo f..T' 1 = -L~;r" 1 e .1t'2 = -.1i:"2 , valendo as condições de
As coordenadas internas de deformação de ângulo fora do redundância Li1' 1 + Li1" 1 = O e Li1' 2 + Li1"2 = O. As coordenadas foram
plano são definidas pela variação de ângulo causada pelo peque- definidas com a observação no sentido do átomo de cromo para o
no movimento perpendicular do átomo i em relação ao plano defi- átomo de oxigênio central.
l 58 Oswaldo Sala Fundamentos da espectroscopia Ramon e no infravermelho l 59

O caráter da representação redutível para estas coordena- 7.2 Quais dos conjuntos de coordenadas que seguem, onde
das é 4 para a identidade e O para as demais operações, resultan- se desprezou o fator de normalização, poderiam ser considerados
do a representação 1A1 + 1A2 +1B 1 + lB,. como coordenadas de simetria? Justifique.
A coordenada i'.lt. 1 se transforma com as operações de sime- sl;;;:: (rl + r2 + r3 + r4) 8 2 = (r 1 + r 2 - r 3 - r 4 ) SJ = (2 a12 - ª10 - ª14)
tria como: C 2(ih) = ilt''2 = -L'.1'2 cr"(L'.1',) = L'.1'2 e cr 2,CM',) = L'.1" 1 = -M'" 84 = (r 1 -r3) 8 5 = (r, - r,) 8 6 = (a 13 + a 14 )
resultando a coordenada de simetria para a espécie A2 : 81 = (ri - r 2 + r 3 - r 4) 8 8 = (r, - r 2 - r 3 + r,) sg = (a12 + ªrn + ª14)
1 • · · , 1 , ,
s (A)
2
(1) =-(L'.1, - L'.1, - L'.1, + L'.1,) = r;:; (L'.1, - L'.1,)
7.3 Num espectro vibracional foram observadas bandas em:
2 v2
v 1 = 450; v 2 = 200; v3 = 700; v 4 = 250; 2v, = 895; 2v3 = 1393 e 3v 3 =
e para a espécie B 1: 2086 cm· 1 . O que se pode afirmar com relação às anarmonicida-
1 • • • • 1 • • des elétrica e mecãnica de cada modo?
s ) (1) = -(L'.1,
(B)
+ L'.1, + L'.1, + L'.1,J = r;:; (L'.1, + L'.1,)
2 v2
7.4 A análise vibracional de urna molécula mostrou as se-
Para as espécies A 1 e B,, S'\1(1) = 8 18 2\1) =O guintes representações:
As coordenadas para as espécies A2 e B 1 estão representadas
no esquema seguinte, a seta do lado esquerdo indicando a L'.1' 1 e a r, a xx' ayy, azz
do lado direito L'.1"2 = -M',, para A,, e tn'2 para B 1 : r, Tz, ay:y
r3 Tx, ctyz

r, Ty
+ + + r, a
+
"
1 2 1 2 Os espectros no infravermelho apresentaram bandas em:
B, 350 ms, 600 vs, 650 w e 950 vw cm" e no Raman em 180 mP, 400
wm, 550 sP, 650 m e 950 w cm· 1• Faça a atribuição das freqüên-
cias às representações cr 1' r-2, ... ) acima.
Exercícios
7.5 O espectro vibracional do 80 2 apresenta as seguintes
7.1 Pelo exame das figuras seguintes, de uma molécula bandas:
planar tipo XY,, escreva as coordenadas de simetria correspon- infravermelho (gás) Raman (líq.) Raman (gás)
dentes~ as espécies de simetria a que pertencem e atividade no 517,8 s 524,5 w(p)
Raman e no infravermelho. 606,0 w

xxxx:x
1151,4 s 1145,0 s(p) 1150,5 s
1361,0 vs 1336,0 m
1871,0 w
2305,0 w
(a) (b) (e) (d) (e) 2499,0 w
l 60 Oswoldo Saio

a) Escreva as estrut11ras possíveis e indique seus grupos de


ponto.
b) A análise vibracional pode eliminar algumas destas estru-
turas? Justifique.
c) Faça a análise vibracional para a estrutura que considere 8 Construção das matrizes para
mais correta.
energia potencial e energia
7.6 Determine as coordenadas de simetria para uma molé- cinética
cula XY4 tetraédrica.

Literatura recomendada

BARROW, G. M. Introduction to Molecular Spectroscopy. McGraw-Hill,


1962.
BARRIS, D. C., BERTOLUCCI, M. D. Symmetry and Spectroscopy. Do-
8.1 Representação matricial da energia
ver Publications, 1989.
NAKAMOTO, K. Infrared and Raman Spectra of Inorganic and Coordi- potencial em coordenadas internas
nation Com.pounds . .John Wiley & Sons, 1986.
WILSON, E. B., DECIUS, J. C., CROSS, P. C. Molecular Vibrations. Mc- O passo seguinte para se construir o determinante secular
'
Graw-Hill, 1955. já fatorado segundo as espécies de simetria do grupo, é determi-
WOODWARD, L. A. lntroduction to the Theory of Molecular Vibrations nar a matriz da energia potencial e da energia cinética. A energia
and Vibrational Spectroscopy. Oxford, 1972. potencial é mais bem visualizada quando definida em termos das
coordenadas internas, sendo as constantes de força diretamente
ligadas aos estiramentos das ligações, deformações dos ângulos
ou outros termos fisicamente significativos. Em termos das coor-
denadas internas pode-se escrever para a energia potencial:

2 v ~ IIr,8,qi (8.1)
i j

Considerando como exemplo a molécula de água, a expres-


são explícita da (8.1) fica:

' 2V ~ f(il.r
J
2
1) + f r (Llr 2 ) + f fl (Lla) + 2frr (Llr 1)(Llr 2 ) +
2 2

2f'" (Llr 1)(1\a) + 2f'"(Llr2 )(Lla)


(8.2)
162 Oswaldo Sala
l Fundamentos da espectroscopia Ramon e no infravermelho 163

É con.veniente introduzir a notação matricial, sendo a fun- Designando por Xi as coordenadas cartesianas de desloca-
ção potencial: mento Axl' Ay 1, Az 1, Ax2 , f1y2' Az 2 , Ax:v Ay 8, Az 3 etc. (X5, por exem-
plo, correspondendo a i'.y,) a energia cinética,
(8.3) 'V . 2
2T= L..m,X,

ou, na notação condensada, 2V = R'F qR, onde R é a matriz colu- pode ser expressa em notação matricial:
na das coordenadas internas, R' é sua matriz transposta (matriz
linha) e F q é a matriz das constantes de força em coordenadas
2T=X'MX (8.4)
internas. Desenvolvendo o produto de matrizes (8.3) obtém-se a
onde X é a matriz coluna das derivadas em relação ao tempo das
expressão (8.2).
coordenadas cartesianas de deslocamento, X' sua matriz trans-
Veremos adiante como transformar esta função potencial
posta e M é a matriz diagonal das massas m. de cada átomo:
em termos das coordenadas de simetria, que permitem fatorar a '
equação secular segundo as espécies de simetria.
m,

8.2 Energia cinética - Matriz de transformação de


coordenadas cartesianas de deslocamento m,
M= m,
para coordenadas internas
m,
Embora seja conveniente representar a energia potencial
em termos das coordenadas internas, é mais simples escrever a
energia cinética em termos das coordenadas cartesianas de des-
locamento. Obtida a expressão desta energia, é evidente que para
obter as equações de movimento devemos transformá-la para o cada m, comparece três vezes, devido às três coordenadas carte-
mesmo tipo de coordenada utilizada para a energia potencial. sianas de deslocamento de cada átomo na equação (8.4).
Com este objetivo, iremos determinar a matriz de transformação As coordenadas cartesianas de deslocamento estão relacio-
de coordenadas cartesianas de deslocamento para coordenadas nadas com as coordenadas internas pela relação matricial R =
internas, que é denominada matriz B. Esta permitirá obter a BX. Multiplicando ambos membros de R=BX pela matriz inversa
energia cinética em termos das coordenadas internas. No final do B'', obtém-se X= B''R. Considerando a derivada em relação ao
capítulo transformaremos a energia cinética e potencial em ter- tempo temos X= B- 1:R e X'= R'(B- 1 )'. Substituindo estes valo-
mos das coordenadas de simetria, que permitem separar a equa- res em (8.4) resulta:
ção secular em equações de menor grau (correspondentes a cada
espécie de simetria), mais simples de resolver. (8.5)
164 Oswaldo Sala Fundamentos da espectroscopia Ramon e no infravermelho 165

(8.6) Explicitamente,

podemos reescrever a (8.5): :Lg1/;1 -i. :Lg,/;, :Lg1/;n


j j j

Lgzjrjl :Lg,/;2 -i. ... Lg2.ifjn


(8.7) =0

equivalente a

Qualquer destas duas formas da equação secular, com os


elementos da matriz Gq·1 ou da matriz Gq , está em termos de coor-
O produto das matrizes em G/ (8.6) pode ser transformado denadas internas, portanto, ainda não fatorada.
Para obter a matriz G q' basta multiplicar cada matriz pela res- Escrevemos a relação R = BX, mas ainda não determina-
pectiva matriz inversa: mos a matriz de transformação B. Seus elementos dependem da
geometria da molécula. Calcularemos esta matriz tomando como
G q ·1G q =(B' 1 ) 1 M(B' 1 )·BM' 1 B 1 =E (matriz identidade)
exemplo a molécula de água. Na figura que segue, as setas em
negrito correspondem aos deslocamentos dos átomos pelas coor-
resultando G, = BM' 1B'. denadas internas (na direção da ligação para estiramentos e per-
A equação secular em termos das matrizes G; 1 e F q (em pendicular a esta para deformações de ãngulo) e as setas traceja-
coordenadas internas) pode ser escrita na forma: das representam as coordenadas cartesianas de deslocamento; as
equações que relacionam as coordenadas cartesianas de desloca-
mento de cada átomo com as coordenadas internas (a coordenada
li.a tem a contribuição dos três átomos) podem ser escritas:
ou seja:

1
fn -(g-1)11À f12 - (g-l l12 À fln -(g- \nÀ o
f,, - (g- 1 ),, À 1
f21 - (g-l l21 À f,n-(g )2nÀ

1 \ ...

Multiplicando esta equação secular pela matriz G,, obtém-se: ô.r1 = ~ 0 sen{- + Ay cos{--Ax 1senf- Lly 1 cos-}
0

.6.r2 = -Axrisen%+ 8y 0 cost+ Ax 2 senf-/j,y 2 cos-}


Aa = ~(-2L1y 0sent- Ax 1 cosf + .6.y 1sen{- + .ó.x 2 cos{- + Ay 2senf)
166 Oswaldo Sala Fundamentos da espectroscopia Ramon e no infravermelho l 67

para a coordenada de deformação de ângulo o deslocamento pro- A direção dos vetores s é a que produz maior acréscimo à
duzido em um núcleo, devido à variação de ângulo Li.a, é Ll.l = rll.a; coordenada interna R e o módulo de s é igual ao acréscimo de
assim, a coordenada Li.a= (1/r)·Ll.l. O fator 2 no primeiro termo da R devido a um deslocamento unitário do átomo a, nesta direção
terceira equação é devido à contribuição dos dois componentes no mais efetiva. Na forma matricial, R = sp.
átomo O. Considerando a expressão da energia cinética 2T = X1MX,
Para simplificar a escrita, vamos utilizar a notação S = sen(a/2) (8.5), pode-se escrever no lugar de X o vetor deslocamento p. Lem-
e C= cos(a/2). A equação matricial R = BX, que representa as brando que R = sp, ou p = s· 1R, teremos
transformações de coordenadas que acabamos de obter, fica: 1
a; :R
2T = p'Mp = :R 1 (s· 1 ) M(s· 1 ):R = :R 1 1
(8.8)
i'.x, sendo (s· 1J1M(s· 1) = Gq· 1 ou Gq = sM· 1 s 1. Esta última expressão per-
i'.y, mite determinar os elementos da matriz G q' uma vez conhecidos

ll
L\zº os vetores s. De forma explícita:
e o -S -C o o o
1
ºJ
1
gjk = Iµ asjª · skª (8.9)
~; J=
e o o o o s i'.x
-C o ,A,yl
i'.r
-~
S
·-28 /r o -C/r S/r o C/r S/r O /\.z 1
if

onde µ a é o recíproco da massa do átomo a ' µ a = l/m a' e os índices


8x 2 j e k caracterizam as coordenadas internas envolvidas. A equação
i'.y, (8.9) será utilizada para determinar os elementos da matriz da
i'.z, energia cinética.

onde a matriz no primeiro membro é a matriz R, a primeira ma-


triz do segundo membro é a matriz B e a última é a matriz X.
8.3 Utilização dos vetores s no cálculo dos
É conveniente representar esta equação introduzindo, no elementos da matriz Gq
lugar das coordenadas cartesianas de deslocamento, um vetor pª
para descrever os deslocamentos do átomo a (não confundir com Considerando como exemplo uma molécula triatómica de si-
o a da coordenada). No lugar da matriz B podemos introduzir um metria C, , , vamos calcular os elementos da matriz G q utilizando
vetor sku' que agrupa os coeficientes Bk..i associados ao átomo a de os vetores s. Iniciaremos pelo elemento grr' que corresponde ao
modo que a expressão elemento diagonal da matriz envolvendo a mesma coordenada
interna de estiramento. Este elemento da matriz pode ser desig-
nado por g'rr (o sobrescrito 2 indica que há dois átomos comuns às
duas coordenadas internas), seguindo a notação de Wilson (Wil-
son et ai., 1965, Apêndice VI), ou por g 11 (j = k = 1).
seja transformada na expressão
(1) Cálculo para g2rr (= g 11 = g 22 ), estiramento.
s,,
( )
onde o ponto indica produto escalar. o 1
168 Oswaldo Sala Fundamentos da espectroscopia Ramon e no infravermelho 169

Utilizando a expressão (8.9): a a 2 a a


(
D ecosa=coH-+-)=cos --sen 2 - e
2 2 2 2
2 a 2 a
cos -+sen -=1
(2) Cálculo para g'i "" ( = g 3) , deformação de ângulo. 2 2

o obtém-se cos ª = ,/(1 +cosa)/ 2. Portanto,


s,, s., 2

1 2 cos( 180º -i) = -cos ~ = -~(1 +cosa)/ 2), que substituído

acima fornece:
Para deslocamento unitário dos átomos temos que róc:L=l,
ou f'..a=l/r, que é o módulo do vetors, por definição. Assim, s 31 ·S:-n
g 13 = -µo- ,li =-cos 2 a =--sena
µ,
= s 32 ·S 32 = l/r 2 e s 30 ·S 30 = (2/r 2)(1-cosa). Este último valor é obtido r r
do triângulo considerado na figura, onde S 80 ·S 30 = (l/r2 )+(l/r2)-
' (4) Cálculo para interação entre dois estiramentos, g 1,, (= g 12 ).
(2/r2)cosa. Substituindo em g 33 resulta:

g33 = µos30 . S30 + µ1 S:n ' 8 :i1

= ~[2µ 0 (1- cosa)+ µ 1 + µ 2 ]


r
+ ~l2S32 . S32
1
Para a água, µ, = µ 2= µIl s,,

(3) Cálculo para interação estiramento-deformação de ân-


gulo, g'm (= g13= g,,J.
Neste caso, ls,1 1= ls 12 I =O, restando somente o primeiro ter-
mo, onde s 10 ·S 20 = cosa e o elemento de matriz fica:
s.,

Vemos pela figura que s 11 e s:n são ortogonais, isto é, 8.4 Construção da matriz das constantes de
s 11 ·S31 = O• Is12 1= O, pois não há estiramento r 1 no átomo 2. força em coordenadas de simetria
is 30 1 = ~2(1- cosa) I r 2 e ls 10 1=1. Portanto:
As coordenadas de simetria podem ser obtidas das coorde-
nadas internas, através da matriz de transformação U, S = UR,
2(1 - cosa) cos(rno" _
r2
a)2 onde S é a matriz coluna das coordenadas de simetria e U é a
matriz formada pelos coeficientes das coordenadas internas que
l 70 Oswaldo Sala Fundamentos da espectroscopia Ramon e no Infravermelho l 71

comparecem em cada coordenada de simetria. No exemplo da mo- Aplicando este resultado para a molécula de água obtém-se:
lécula de água, as coordenadas de simetria podem ser escritas:

1
8 1 = .fj,(!1r1 +t.r2 )

s, = "'ª
1
s,= .fj,(t.r,-t.r,)
(8.10)

=[
1/.fj, 1/.fj,
1/Jz -1/Jz ºJl~ ::
f,
f'"J[1/.J'
f,.,
f0
1/.fj,i,
Ü
o
o
1
-1/
Ü
l
1/.J'.fj,i,
e a matriz U seria:
Efetuando o produto da segunda pela terceira matriz,
1/.fj, 1/.fj, teremos:
V= O O (8.11)
[1/.fj, -1/.fj, 1/.fj, 1/.fj,
F = O O
[1/.fj, -1/.fj,
A matriz S = UR fica:

[1/o.J2, 1/o.J2,
ls1J
s,
s'
=
1/.fj, -1/.fj,
Efetuando-se este produto obtêm-se as (8.10).
que resulta em:

A matriz U (matriz de transformação das coordenadas in-


ternas em coordenadas de simetria) multiplicada pela matriz F, (8.13)
(das constantes de força em coordenadas internas) fornece a ma-
triz F das constantes de força em coordenadas de simetria.
Sendo S = UR, onde U é uma matriz ortogonal (a matriz é É importante notar que a matriz F resultante foi fatorada
ortogonal quando sua matriz inversa é igual à sua matriz trans- em dois blocos, um de dimensão 2x2 e outro com um único termo.
posta, U- 1 = U 1), pode-se verificar que R = U'S e R'=S'U. A função Estes blocos correspondem, respectivamente, à contribuição das
potencial pode ser escrita: espécies de simetria A, e B,. Esta é uma conseqüência direta do
uso das coordenadas de simetria.
2V = R'FqR = S'UFqu•s = S 1FS (8.12) O resultado obtido em (8.13), efetuando produto de ma-
trizes, pode ser conseguido de modo prático com o seguinte proce-
onde F = UF q U' é a matriz das constantes de força em coordena- dimento: escreve-se para cada espécie de simetria, em uma linha
das de simetria. e em uma coluna, as coordenadas internas com os coeficientes
l 72 Oswaldo Sala Fundamentos da espectroscopia Ramon e no infravermelho l 73

que comparecem nas coordenadas de simetria desta esp~cie. No De G = UGqU', considerando os resultados obtidos para os
bloco compreendido entre elas, são escritas as constantes de força elementos da matriz G q , teremos:
correspondentes, com coeficientes iguais ao produto dos coeficien-
tes das coordenadas internas correspondentes, como na tabela
abaixo:

A, v~ õ.r1 .,~ Õ.f2 b.a


+Dir1
'i2
tfr 1frr ~ fra y.,,,
Jz õ.r2 f frr tfr ':!::. fra = o
b.a _Lf _Lf
,2
fa
[Y./2
-.,,r.J. ra ,Jz ra

Somando os elementos dentro de um bloco teremos: i


Fll=fr+frr l
F12 = F21 = J2fra

F,, = (
para a molécula de água fl 1= µ 2 e:
que são os elementos da matriz F para a espécie Ai, mostrados em

j
l
(8.13). Para a espécie B 2 : µ 0 (1 +coso:) + µ, -.J2 µ 0 senu / r
G= -.J2µ 0senu/r 2[µ 0 (1-coso:)+µ,]/r 2 oo (8.14)
B, )2 ó.rl _ _Lb.r o o ~t 0 (1-cosa)+µ 1
v'2 2

.J~ ôr1 ffr -f frr


- j, M, -tfrr ffr Essa matriz G está fatorada em matrizes correspondentes às
espécies de simetria que participam da representação das coor-
resultando: denadas normais, no caso particular, A 1 e B~. Para o estiramento
anti-simétrico da água, o elemento da matriz G 33 , da espécie B 2 , é
µ 0 (1-cosa)+µ,, ou, µ 0 (1-cosa)+f'H onde µ 0 e µH são, respectivamen-
te, os inversos das maRRas dos átomos de oxigênio e hidrogênio.
8.5 Obtenção do motriz G Resumindo, obtivemos para a molécula de água as matrizes
F e G já fatoradas, correspondentes às espécies A 1 e B 2 :
Uma vez obtida a matriz G q (em coordenadas internas) po-
demos obter a matriz G (em coordenadas de simetria) através da
e
transformação G = UGqU'. De modo idêntico ao que foi feito para
obter a matriz F, no final do item anterior, pode-se obter a matriz
G sem efetuar o produto das matrizes.
B,: [F33 ] e
9 Determinação das
coordenadas normais

9. l Resolução da equação secular

No capítulo 8 a matriz G foi determinada a partir da geome-


tria da molécula (distâncias e ângulos de equilíbrio) e das massas
de seus átomos, obtendo-se uma matriz numérica. Na equação se-
cular, 1GF-E1c1 =O, os valores de À sâo conhecidos, proporcionais
às freqüências vibracionais, À = 4rr 2 c2 v 2 (para massas em u.m.a.,
constantes de força em mdinas/À e v em cm·1, À= 5,8915.10·7 v').
Resta calcular as constantes de força, ou seja, a matriz F. Contu-
do, este processo não pode ser efetuado diretamente, a não ser no
caso particular de matriz uni ou bidimensional. O que se faz é o
caminho inverso. Admite-se um conjunto de constantes de força e
calculam-se as raízes da equação secular.
Embora existam vários programas computacionais para a
análise de coordenadas normais, é útil efetuar uma vez esta aná-
lise "manualmente", para entender o procedimento do cálculo. A
maneira usual é escolher um conjunto inicial de constantes de
força, que se julgue razoável, e resolver as equações seculares
para as raízes À. Comparando estes valores com os obtidos expe-
rimentalmente, em geral não se observa boa concordância neste
178 Oswaldo Sola Fundamentos da espectroscopia Ramon e no infravermelho l 79

primeiro cálculo. Efetuam-se algumas mudanças nas constantes Como só há duas freqüências fundamentais de espécie AP
de força do conjunto inicial e torna-se a resolver as equações. não se pode determinar de modo unívoco as três constantes de
Examinando os resultados pode-se ter idéia das mudanças pro- força F 11 , F 12 e F 22 . Pode~se tentar, inicialmente, a aproximação F 12
vocadas nas raízes pelas variações feitas nas constantes de força = O. Com esta aproximação pode acontecer que o discriminante da
e, assim, experimentar um novo conjunto cujos resultados pode- equação fique negativo; se isto ocorrer, teremos de introduzir um
rão ser mais exatos. Os programas para análise de coordenadas valor diferente de zero para a constante de força F 12 , utilizando
normais efetuam um processo iterativo, geralmente empregando algum critério, por exemplo, pode-se determinar o valor de F 12 que
o método de quadrados mínimos aplicado ao conjunto de valores torne nulo o discriminante.
observados e calculados, modificando o conjunto de constantes de Se as vibrações normais obtidas usando um número mínimo
forças até ser obtida a concordância desejada. de constantes de força não forem aceitáveis (em comparação aos
Algumas vezes não se obtém convergência no processo ite- valores das freqüências observadas, ou pela distribuição de ener-
rativo e deve-se tentar um novo conjunto inicial de constantes de gia potencial, que mostre ser incorreta a atribuição aos modos vi-
força. Obtida a convergência, o conjunto de constantes de força bracionais), os valores das constantes de força devem ser alterados.
final é considerado o de melhor aproximação, mas não é um con- Isto pode ser feito por tentativa, ou transpondo valores de molécu-
junto "perfeito". Isto decorre do número de constantes de força las semelhantes, para reproduzir melhor os dados experimentais.
ser maior do que o de parâmetros conhecidos, obrigando a aproxi- Outra maneira seria utilizar a técnica de substituição iso-
mações, como supor algumas constantes iguais a zero ou com va- tópica completa, que no caso da água introduziria mais duas fre-
lor prefixado; além disso, a própria função potencial quadrática qüências fundamentais na espécie A 1, sem alterar o número de
(oscilador harmônico) é uma aproximação. constantes de força.
Como exemplo da equação secular podemos considerar a Para a espécie B 2 a equação secular é simplesmente:
molécula de água, cujas matrizes G e F foram obtidas no capítulo
anterior, obtendo-se para a espécie A 1:
ou
1' = G33 F 33

ou Com a expressão obtida no capítulo 8, G33 = µ 0 (1-cosa) + f'H' ob-


G11F11 + G12F21 -À tém-se o valor numérico de G33 e calcula-se diretamente o valor de
(9.1) F 33 , a partir da freqüência experimental.
I
G12F11 + G,,F,1
Obtidos os valores das constantes de força em coordenadas
que gera a equação de segundo grau em À: de simetria, o sistema de equações
1'2 -(G 11 F 11 +G 22 F22 +2G 12 F 12 )1'+ Fll = fr + frr

+ (G11G22 - G1,' )(F11F22 -F12 ')=O


F12 = -./2f,. (9.2)
Fz2 = fª
F33 = fr - frr
l 80 Oswaldo Sala

permite determinar os valores das constantes de força em coor-


l
i
j ou seja,
Fundamentos da espectroscopia Ramon e no Infravermelho 181

denadas internas. É comum, na literatura, dar os valores das


constantes de força em mdinas/A (1 mdina!A = N/m). Para liga-
ções covalentes, por exemplo em hidrocarbonetos, cada ordem de
if
'f
ligação corresponde aproximadamente a 7 ,5 mdina/A (7 50 N/m) e Para o íon CrO/, substituindo os pelos valores numéricos
para ligações iônicas a constante de força é da ordem de 0,1 mdi- calculado com Gih e Fhj e considerando as raízes À 3 e À4 teremos o
nas/À (10 N/m). Para compostos de coordenação, onde a ligação é exemplo numérico:
intermediária entre covalente e iônica, a constante de força tem
A.13 :A 43 =1:-0,37037
valores entre 2,5 e 0,2 mdinas/A. (9.4)
A 34 :A 44 = 0,03876:1
Uma vez determinadas as constantes de força pode-se cal-
cular as coordenadas normais, através da matriz das amplitudes
Introduzindo amplitudes normalizadas L 8 , as (9.4) podem ser
normalizadas, L ou L 8 . Para espécies onde só há uma freqüên-
escritas:
cia vibracional, a coordenada de simetria é a própria coordenada
normal. Vamos calcular a matriz L 8 para o caso de um determi- L 43 I L 33 = -0,37037
(9.5)
nante secular de segundo grau, considerando os modos v3 e v4 do L 34 I L 44 = 0,03876
íon Cr0 4 2-. Usando os valores das matrizes G e F para este íon,
Pela condição de normalização (Ver item 4.1)
G33 = 0,08815, G,. = 0,07875 e G44 = -0,03017
F,, = 5,246, F,. = 0,2404 e F 44 = 1,1721 (mdinas/À)

e supondo soluções S, = A,kcos(~t+<!>), podemos escrever as


ou
equações

(a 33 -Àk)A 3 k + a 34 A 4 k =O
ª13A8k + ( ª44 - À1 )A4k = O
onde Dividindo a primeira equação por L .332 e a segunda por L 44 2
aij = L GihF
h
hj :, resulta:
1
1 2
Haverá um sistema de equações para cada raiz Àk. A relação L 33 = À3 1[F33 +2F34 L 43 /L 3a +F44 (L 43 /L 33 J ]
entre as amplitudes é obtida da relação entre os complementos (9.6)
2
algébricos (ou cofatores) dos coeficientes das amplitudes, que for- L 44 = À4 1[F,4 +2F34 L 34 /L 44 +F:i 3 (L.14 /L 44 ) ]

mam o determinante:
que juntamente com as (9.5) e as constantes de força fornecem:
(a3,-Àk) ª·" 1
(9.3)
l
ª•.1 (a,,-Àk) Laa = 0,297; L,. = 0,258; L31 =0,010 e L 43 = -0,110
l 82 Oswaldo Sala Fundamentos da espectroscopia Ramon e no Infravermelho l 83

Estes resultados podem ser colocados em forma matricial, a O procedimento para o cálculo das coordenadas normais fica
matriz L 8 , que representa a transformação entre as coordenadas mais claro através de um exemplo. Vamos considerar a molécula
de simetria (exercício 7.6) e as coordenadas normais, S = L 8 Q de diclorometano, CH2 Cl2 , que pertence ao grupo de ponto c,, A
Q, Q. Tabela 9.1 contém o grupo de ponto e a estrutura das representa-
s, 0,297 0,010 ções para as coordenadas internas e normais, n'(Q).
s. -0,110 0,258
c~v E e, <\, cr' nr(R) i ül(r) ' '
: nr(a): n 1CB) ! nr(O) n'(Q)
Observa-se que a coordenada 8 3 contribui mais para a co- A, 1 1 1 1 1 1 1* : 1' 1' 4
ordenada normal Q 3 e a coordenada S 4 contribui mais para a co- A, 1 1 -1 -1 o o o o 1 1
ordenada normal Q4 , ou seja, a maior contribuição é dos termos
B, 1 -1 1 -1 o 1 o : o l 2
na diagonal principal. Isto confirma a descrição do modo v3 pela
B, 1 -1 -1 1 1 o o o 1 2
coordenada de simetria 8 3 e a do modo v, pela coordenada 8 4 •
Tabela 9.1 Tabela de caracteres para o grupo C2v e estrutura das representações
para as coordenadas internas e para as coordenadas normais do CH Cl •
2 2

9.2 Cálculo de coordenadas normais


As coordenadas internas estão representadas na Figura 9.1,
No capítulo 4 foram obtidas as equações de movimento, a onde os átomos 1 e 2 são os hidrogênios, 3 e 4 são os claros e 5 o
equação secular em coordenadas internas e a relação entre coor- carbono, estando os hidrogênios no plano yz e os cloros no plano xz.
denadas internas e coordenadas normais, através das amplitudes
normalizadas (equações 4.10 e 4.11). A equação (4.12) em notação --- ---------
1 ------ ------- 2
matricial seria R = LQ. Por outro lado, as coordenadas normais R, R,
estão relacionadas com as coordenadas de simetria através da
matriz das amplitudes normalizadas, L 8 , pela equação matricial
S = L 8 Q. Evidentemente, a matriz L definida para coordenadas
internas é diferente da matriz L 8 para coordenadas de simetria.
Pode-se obter a matriz de transformação de coordenadas
cartesianas de deslocamento para coordenadas normais, Lx., con-
veniente para representar, em cada átomo, vetores proporcionais
aos seus deslocamentos na coordenada normal. De S = L 8 Q, sen-
do S = UR = UBX, segue que UBX = L 8 Q. Multiplicando ambos Figura 9.1. Coordenadas internas para o CH2 Cl2 •
os membros pela matriz U', que vimos ser igual à U', obtém-se
'
BX = U'L8 Q. Multiplicando pela B-1, X= B· 1UtL8 Q. Como a trans- Há 10 coordenadas internas, sendo 4 de estiramento R R
' l' V
formação de coordenadas cartesianas de deslocamento para coor- r 1 r 2 , e 6 de deformação de ângulo, a, /3, 81' 82, o3 e o4 . Como há 3N-
denadas normais é dada por X= LxQ, obtém-se a transformação 6 = 9 graus de liberdade, haverá uma condição de redundância.
da matriz L 8 na Lx, ou seja, Lx = B"'U'Ls. Esta condição é evidenciada pela soma das representações das
l 84 Oswaldo Sala Fundamentos da espectroscopia Ramon e no Infravermelho l 85

coordenadas internas para a espécie A 1 ser maior do que a repre- Tabela 9.2. Coordenadas de simetria para o CH2 Cl2 •
sentação das coordenadas normais, nY(Q), desta espécie. Esta re- A matriz das constantes de força em coordenadas internas
dundância dá origem a uma coordenada de simetria igual a zero, F,, é mostrada na Tabela 9.3 e contém vinte e duas constantes'
a coordenada S*'A1l gerada pela soma dos três tipos de coordena- de força; sendo esta matriz simétrica, foram escritos somente os
das, L\a+L\0+Ll.8 1• Esta coordenada é importante para se verificar elementos da diagonal principal e acima dela.
a condição de ortogonalidade com as demais coordenadas de si- O número de constantes de força é maior do que o de equa-
metria. ções e não é possível calcular de forma unívoca todas as cons-
As coordenadas de simetria foram obtidas aplicando direta- tantes. Nos exemplos que serão vistos adiante utilizaremos dois
mente o operador de projeção, definido no capítulo 7, com exceção campos de força, discutindo os resultados da distribuição da ener-
da coordenada S:i, cujos coeficientes das coordenadas internas fo- gia potencial para os mesmos.
ram ajustados para satisfazer a condição de ortogonalidade com
a coordenada de redundância S*'Al'. A 8 4 foi gerada pela combina-
ção L\a-L\0. Estas coordenadas estão representadas na Tabela 9.2
e satisfazem as condições de ortonormalidade:
R,
1
R, r,
1
r, a fl
º" 1
ô" 1 o,, l 8,.

R, fR f"' fR, ffü f"" r., f • f ' f " f "


S* 1A,I = Js(Ll.a+Ll.0+Ll.8 13 +Ll.ô 14 +Ll.8 23 +Ll.ô 24 ) - "' "' "' ""
R, fR r•. f., r•• r., f "
"'
f " fRii
11
fRO~
S 1 (R)(A,J = ~(Ll.R 1 +Ll.R 2 )
"'
r, f, frr frr f .. ~ L• f " f ,;" 0
fro
- " "
82 (r)'Ay l = ~ (Ll.r, + Ll.r2) r, f, f" r,, ,,
f " f,., ' f,," f •
- "
~ 1 . a
S 3 (a,0,8) = r;;-(2L\a+2Ll.0-Ll.ô 13 -L\8 14 -Ll.ô 23 -L\õ 24 ) ( f,, f,, f,, f,, f,,
2~3 ' -
S (a-0J'A,I =_1:__(L\a-Ll.0)
~ r, foo f~Q f~ f~ô
4 -12 -
õlJ r, fMR filõr foo
0

S 5 (ôJ'A' 1 =~(Ll.8 13 -Ll.5 14 +L\8 24 -Ll.o,,,) -

8,. f, fM" fso'


S 6 (R)m,i = ~ (Ll.R 1 -L\R 2 ) -

-
ºw f, fM R

8 7 (8)'" 1 ' =~(L\ô 13 +L\6 14 -L\8 2a-Ll.li 24 ) º~1 f,

s,1r/" 2' = ~(Ll.r, -Ll.r,) Tabela 9.3. Elementos da matriz das constantes de força em coordenadas internas
para o CH2 Cl2 •
S 9 CõJ' 8
'' = ~(óô,, -1'8,, +Ll.0 2, - 1'6,.)
l 86 Oswaldo Sala
l Fundamentos da espectroscopia Ramon e no infravermelho 18 7

9.3 Distribuição da energia potencial entre as os valores da matriz Gs em coordenadas de simetria. Os cálcu-
coordenadas de simetria los aqui apresentados foram realizados utilizando o programa
computacional para cálculo de coordenadas normais, NCTP6, de
A matriz L 8 fornece uma relação entre as coordenadas de si- Yoshiyuki Hase, Instituto de Química da Universidade Estadual
metria e as coordenadas normais, podendo confirmar a atribuição de Campinas.
das freqüências vibracionais, como foi visto no item 9.1. Esta atri- Com o programa mencionado, por processo iterativo obteve-
buição pode ser examinada mais vantajosamente através da dis- se para o campo de forças de valência as seguintes constantes de
tribuição da energia potencial entre as coordenadas de simetria. força, em mdina/Á:
A distribuição da energia potencial entre as coordenadas de fR = 4,97910 ~. = 2,85189 f 0 = 0,41749
simetria é obtida considerando a expressão da energia potencial r, = o,47478 r, = 0,31494
em (9.7):
2 2
resultando para a distribuição da energia potencial entre as coor-
2V= IIF,;SkSi = LQv LLFkiLhLi, = LÀvQv (9.7) denadas de simetria:
k V k j V

Espécie A1
Nesta expressão LFkjLkvLjv = 1\,; Fk..iLkvL.iv/Àv (ou este valor Obs. 2989,00 1425,00 704,00 288,00
multiplicado por 100) indica a distribuição da energia potencial Cale. 2984,52 1425, 02 706, 77 284,94
Obs.-Calc. 4,47 -0,02 -2,77 3,06
entre as coordenada de simetria, ou seja, a contribuição relativa de
cada coordenada de simetria S" na coordenada normal Q,,. Isto per- s, 99,51 0,24 0,24 0,00
s, 0,19 1,57 66, J:i 33,11
mite que a atribuição das bandas seja mais rigorosa, pela descri- s, 0,06 90,48 18 f 4 8 16,53
ção correta dos movimentos envolvidos nas coordenadas normais. s, o, 37 8 8' 65 5, 72 30' 92
No cálculo das constantes de força pode ocorrer que os va- Espécie A,
lores obtidos reproduzam bem as freqüências observadas, mas, Obs. 1157,00
Cale. 1155, 86
ao se efetuar o cálculo da distribuição da energia potencial ve-
Obs.-Calc. -1,14
rifica-se, por exemplo, que modos de estiramento surgem como
modos de deformação de ãugulo e vice-versa. Isto significa que o s; 100,00

conjunto inicial de constantes de força conduziu a um resultado Espécie B,


errôneo; um novo conjunto de constantes de força (ou outro cam- Obs. 305S,OO 898,00
Cale. 3059,41 792,26
po de forças) deve ser experimentado. Obs.-Calc. -4,41 105,74
Como primeiro exemplo, vamos examinar o resultado do cál-
culo para o CH2 Cl2 considerando um campo de forças de valência. s, 99,)6 0,24
S, 0,24 99,76
Neste campo só comparecem as constantes de força principais,
duas de estiramento e três de deformação de ângulo, não havendo Espécie B,
Obs. 1268,00 "/42, 00
nenhuma constante de força de interação. A atribuição das ban- Cale. 1341,26 721,99
das será discutida no Capítulo 12. Obs.-Calc. -73,26 20, 01
Utilizando as distâncias internucleares: CH = 1,068 A e s, 11, 9LJ 88,06
CCl = 1,772 A e todos os ângulos com o valor 109°28', obtêm-se s, 88,06 11, 94
188 Oswaldo Sala Fundamentos da espectroscopia Ramon e no infravermelho l 89

Para as espécies B 1 e B 2 há um desvio relativamente grande Gspécie Bi


li•j Obs. 3055,0 898, o
para algumas freqüências calculadas, além da mistura das coorde- Cale. 3055,0 898,0
nadas de simetria 8 2 e S 4 , na espécie A,, para o modo em 288 cm· 1. Obs.-Calc. 0,0 0,0
Como segundo exemplo, vamos refazer estes cálculos utili~ só 99' 68 o1 32
zando um campo de força mais completo, com 10 constantes de s, 0,32 99, 68
força incluindo, além das cinco constantes de força do campo de Espécie B,
valência já consideradas, as seguintes constantes de interação: Obs. 12 68, o 742,0
Cale. 12 68' o 742,0
f RR e frr (para melhor reprodução das freqüências de estira- Obs.-Calc. O, O o,o
mento CH e CCl entre as vária espécies de simetria); s, 17,59 82,41
,,
f (interação entre os estiramentos CCl e o ângulo ClCCl); s, 82,41 17,59

f 6," (interação entre os ângulos HCCl tendo em comum a li-


Observa-se, com este campo de forças, que não há mais a
gação CH);
mistura das coordenadas de simetria S 2 e S 4 para o modo em 288
f 63" (interação entre os ângulos HCCl tendo em comum a li- cm· 1 e a reprodução dos números de onda experimentais é per-
gação CC]). feita em todas as espécies de simetria. Fica, assim, confirmada
As duas últimas são importantes para o ajuste das freqüên- a atribuição do modo vibracional em 1425 cm· 1 para a deforma-
ção de ângulo CH,, formalmente descrita como t-a e t-p em fase
cias calculadas das espécies B 1 e B 2 .
Com este novo campo foram calculadas as constantes de for- (coordenada S,), do modo em 288 cm· 1 para a deformação de ân-
gulo CCl,, formalmente descrita como t-a e t-p com fases opostas
ça (mdina/Á):
(coordenada S 4 ) e do modo em 704 cm· 1 para o estiramento CCl,
fR = 4,97890 f,.= 3,67684 f 0 = 0,40180 f, = 0,34357 f, = 0,33844 descrito pela coordenada S 2 •
fRR = 0,01768 frr =0,55950 f, 1; = 0,28009 f 85R = 0,04467 f 05' = -0,02179 Na distribuição da energia potencial para as espécies B e
1
B 21 os elementos em cada diagonal são iguais, para a espécie BP
resultando para a distribuição da energia potencial:
99,68 na diagonal principal e 0,32 na outra. Isto ocorre porque
Espécie A,
2989,00 1425,00 704,00 288,00 não foi considerada nenhuma constante de força de interação
Obs.
Cale. 2989, 00 1425,00 704,00 288,00 fora da diagonal; introduzindo as constantes fR,"e f, 8", com valor
Obs.-Calc. 0,00 0,00 0,00 o, 00
O,Ol(mdina/Á), resulta para esta espécie a distribuição de ener-
º; 99,57 0,22 0,20 0,01 gia potencial:
s, O, 28 2,18 10'/ 1 34 0,90
o
-~_j O, 05 79,15 11, 41 24, 72 99,80 0,21
e O, 28 68,70 3,24 46,01 o, 31 99,70
º•
Espécie A,
Obs. 11:i'7, o A dependência da distribuição da energia potencial com o
Cale. 1157,0 campo de força utilizado decorre da própria definição da distri-
Obs.-Calc. 0,0
buição da energia potencial, FkJLkvL. /À , onde comparecem as
JV V

S. 100,0 constantes de força F ~-


190 Oswaldo Sala Fundamentos do espectroscopia Ramon e no infravermelho 191

9.4 Considerações sobre campos de força V~ L[tK,(M;)


2 2
+K;r(M,)j+ L[tHjr 2 (6.aj) +H:r 2 (6.aJ]
(9.8)
+ 2:[tF,(6.q;) +F;q(6.qj)]+ 2:;Yi(L1~)
2 2
Nos exemplas vistos, a função potencial foi escrita conside-
rando somente as constantes de força principais ou introduzindo
onde Ki e K; são constantes de força de estiramento H. e H. são
algumas constantes de força de interação, podendo o número de
constantes de força de deformação de ângulo e F., e F:, ~ão' con~tan-
constantes ser maior do que o de freqüências observadas. Quando
tes de força repulsivas (respectivamente para termos quadráticos
todas as constantes de força são levadas em conta, o campo de
e termos lineares); o último termo leva em consideração coorde-
forças é conhecido como campo de forças de valência geral (abre-
nadas internas adicionais, como coordenadas fora do plano e de
viado na literatura como GVFF - General Valence Force Field).
torção. Na função potencial comparecem tanto termos quadrá-
Sendo as constantes de força principais, geralmente, maiores
ticos como termos lineares, porque a derivada primeira não se
do que as de interação, algumas vezes emprega-se um campo de for-
anula, devido as coordenadas envolvidas na função potencial não
ça extremam.ente simplificado, com somente as constantes de força serem independentes. No caso particular de uma molécula tria-
principais, de estiramento entre as ligações químicas e de deforma- tômica angulada esta função potencial fica:
ção de ãngulo entre estas ligações. Este tipo de campo de forças é
V~ t K, 1 (L1r1 ) + t K,. 2 (L1r2 ) + Kr 1 r 1 ( M 1 ) +
2 2
conhecido como campo de força de valência simples (SVFF - Simple
Valence Force Field). O caso intermediário, considerar apenas algu- +K, 2r 2(6.r2) + tHr1r 2(L1a) 2 + (9.9)
mas constantes de interação, é conhecido como campo de força de
valência modificado (MVFF - Modified Valence Force Field), que foi
+ 2
+H"r,r2 (L1a) + F(L1q) + F q(ilq)

o utilizado no exemplo do CH2Cl2 • com


O campo de força de valência simples não dá resultados (9.10)
muito satisfatórios, sendo utilizado somente quando se deseja a
ordem de grandeza das constantes de força principais. O GVFF ."'q pode ser obtido pelo desenvolvimento em série de Taylor;
pode ser usado convenientemente quando se dispõe de dados considerando somente os termos lineares e quadráticos:

~ ( :~ }6.r1) + ( :~ )6.r,) + ( :~ }6.a) +~( ;:1; }1r1)2+


adicionais, como nos espectros com substituições i.sotópicas, que
fornecem um conjunto maior de freqüências observadas sem in- 6.q
troduzir novas constantes de força.
Um campo de força bastante utilizado, pelo fato de ter um
número relativamente pequeno de constantes de força, é o intro-
+2-.::---,-
or2 oa
l('' )
1(8'q)(6.r,)' +-2 ~; (6.a')+ ,'';
0
or1 ur2
( 2
) (L1ri)(6.r,)+ (9.11)

duzido por Urey e Bradley (UBFF - Urey-Bradley Force Field), 2


+(,º '; )(6.r1)(6.a)+( õ'q )(L1r2)(ila)
que consiste de um campo de força de valência com constantes or1 ua 8r2 8a
de força adicionais, devidas a forças de Van der Walls entre áto-
onde as derivadas são na posição de equilíbrio. As derivadas par-
mos não ligados. Este campo foi modificado por Shimanouchi
(MUBFF - Modified Urey-Bradley Force Field) sendo a forma ciais podem ser obtidas derivando q = ~r1 2 +r2 2 -2r1r2 cosa. Como
geral do campo potencial: exemplo podemos calcular as derivadas em relação à r :
1
192 Oswaldo Sala Fundamentos da espectroscopia Ramon e no infravermelho 193

aq 1
---c=======(2r1 -2r2 cosa)=-(r1
1
r 2 cosa) urna de deformação de ãngulo, 712 cm· 1 . Determine os valores das
ar1 1 2 +r 2 -2r r cosa
2-yr q constantes de força para os estiramentos na aproximação de um
1 2 1 2
campo de força de valência.
1
ôq J= 3--(.!(r
82
õr1
'; = -!----(
or 8r ÔI\ q
1- r 2 cos a)J = .! + (r 1 - r 2 cosa )(aq-.
q 8r1
J 9.3 Com os valores das constantes de força obtidos no exer-
1 1

1 1 2 cício 9.2, calcule as freqüências vibracionais dos estiramentos da


=---
3
(r 1 -r2 cosa)
q q molécula de DCN. Qual seria o deslocamento da freqüência do
estiramento CN, no HCN, devido à presença de 18 C?
Procedendo do mesmo modo para todas as derivadas par-
ciais em (9.11) e substituindo o valor assim determinado para 9.4 Calcule as constantes de força de simetria para o estira-
Ll.q na função potencial (9.9), num processo bastante trabalhoso mento anti-simétrico das moléculas H 2 0 e D 2 0, sabendo que as
de cálculo, chega-se à função potencial; essa função, no caso de freqüências vibracionais (gás) deste modo se situam em 3756 e
molécula triatômica angulada simétrica (r 1 = r 2) fica: em 2788 cm· 1, respectivamente. Discuta o resultado.
(Sugestão: Calcule, também, as constantes de força utilizan-
V= [K + t'F' + s F j(m) 2 2 2
+ t[H - s 2F. + t F j(rLl.a) +
2

do as freqüências harmônicas, 3936 e 2882 cm· 1, respectivamente.)


+[-t'F + s 2 F ](Ll.ri)( Ll.r2 ) + ts[ F + F ]( Ll.r )( rLl.a)

onde s = r(l-cosa)/q e t = (rsena)/q. Nesta função potencial há Literatura recomendada


quatro consta11tes de força, mas somente três freqüências vibra-
cionais são observadas. Contudo, um valor bastante razoável BARROW, G. M. Introdu.ction to Molecu.lar Spectroscopy. McGraw-Hill,
para F' é obtido fazendo-se F' = -0,lF, o que reduz a três o número 1962.
de constantes de força a serem determinadas. COLTHUP, N. B., DALY, L. H., WIBERLEY, S. E. Introduction to Infra·
red and Raman Spectroscopy. Academic Press, 1990.
HOLLAS, J. M. Modem Spectroscopy. John Wiley & Sons, 1987.
Exercícios NAKAJ.\tIOTO, K. Infrared and Raman Spectra ollnorganic and Coordi-
nation Compounds. John Wiley & Sons, 1986.
9.1 Utilizando as expressões para a matriz G, no apêndice WILSON, E. B., DECIUS, J. C., CROSS, P. C. Molecular Vibrations. Mc-
VI de Wilson et al. (1955), resolva a equação secular para o es- Graw-Hill, 1955.
queleto PtCl 2 S 2 do complexo trans-PtC1 2(SEt2 ),, para as espécies WOODWARD, L. A. lntroduction to the Theory of Molecular Vibrations
ativas no Rarnan. As freqüências Raman atribuídas a este es- and Vibrational Spectroscopy. Oxford, 1972.
queleto foram observadas em 342, 327 e 159 cm· 1 e as distãncias
interatômicas são: Pt-Cl = 2,30À e Pt-S = 2,29À.

9.2 A molécula de HCN apresenta em seu espectro duas


bandas atribuídas aos modos de estiramento, 2089 e 3312 cm·1, e
l.
'

JO_ Complementos sobre análise


vibracional

l O. l Grupos com caracteres complexos

Nas tabelas de caracteres de alguns grupos de ponto apare-


cem, nas espécies de simetria duplamente degeneradas, caracte-
res complexos e= exp(2ni/n) e seus conjugados, em pares indicados
entre ( J, como nos grupos C3 , C4 , C 3h etc. Cada membro destes pa-
res deve ser considerado como uma representação separada e, nas
aplicações, os termos correspondentes de cada par devem ser adi-
cionados. Este procedimento fica claro considerando a expressão:

e = exp(icp) = coscp + isencp


ll' e a de seu complexo conjugado
ç
j e*= exp(-icp) = coscp - isencp

cuja soma e+ e*= 2coscp é um número real. Como resultado, para


representações de dimensão 2 obtêm-se caracteres que são núme-
ros reais (soma de um complexo com seu conjugado).
No capítulo 7 as coordenadas de simetria para espécies du-
plamente degeneradas foram representadas pelo par S<EJ" e S"'b.
l 96 Oswaldo Saio Fundamentos da espectroscopia Ramon e no infravermelho l 97

Isto pode ser estendido às coordenadas normais, introduzindo-se ou seja, a menos de um fator constante (exp(-ia)) cada coordena-
coordenadas normais complexas: da complexa se transformou nela mesma. Se além das operações
de rotação houvesse reflexões, por exemplo no plano yz, as trans-
Q H*=Q +t·Q y
X e (10.1) formações em (10.2) seriam:

A aplicação de uma transformação de coordenadas deve dei- e Q~ = Qxsena + QY cosa


xar a energia potencial invariante e isto ocorre se cada coordena-
da se transforma simétrica ou anti-simetricamente com relação à Se houver uma representação com elementos complexos a,
operação de simetria. Em outras palavras, para coordenadas du- b, e... , seus complexos conjugados a*, b*, e* ... seguem as mesmas
plame11te degeneradas a operação deve manter a mesma origem regras de multiplicação, se ab =c, a*b* =e* etc. Isto significa que
das coordenadas cartesianas, deixando invariante a energia po- além da representação l(a, b, c... ) existe também a representação
tencial, 1.(Q/ + Q/J. A operação de rotação definida pelas equações: r*(a*, b*, c* ... ). Estas representações não são consideradas sepa-
radamente, mas escritas juntas dentro de colchetes, mantendo-se
Q X'= Q cosa + Qy sena
X
e Q,Y'= -QX sena + Q Y cosa (10.2) o símbolo E para a representação bidimensional. A razão de não
serem designadas separadamente é que nas aplicações elas ocor-
satisfaz esta invariância, pois rem juntas, n.os seus pares conjugados.
Examinaremos dois exemplos de aplicação destes grupos,
Q' 2 + Q' y 2 = Q 2 + Q 2
X X Y com o objetivo de determinar a representação dos modos normais
de vibração:
Aplicando estas transformações nas equações (10.1): A molécula de H 3C-CC13 , com conformação intermediária
entre a eclipsada e a dispersa, pertence ao grupo de ponto e,.
(Q'ªl'), = Q~ + i Q, =Qx coso:+ QYsena -iQ,sena + i Q, cosa O número de átomos N = 8 e os caracteres das representações
= Qx (cosa - i sena) + i Q,Y (cosa - i sena) redutíveis para a identidade e para as operações de rotação são,
=(Q, + iQY)(cosa -isena) =(Q, + iQY) · exp(-i a) respectivamente, dezoito e zero. Com o procedimento já visto an-
teriormente, pode-se calcular a representação para as coordena-
das normais; resulta que o número de vibrações para a espécie E
(Q'b'"). =Q~ -iQ~ =Qxcosa+Qysena+iQ,sena-iQ,cosa
será dado pela soma dos valores determinados para cada repre-
= Qx<cos a+ i sena) - i QY (cosa+ i sena) sentação r e r*, ou seja, doze.
= (Q, -i QY)(cosa + i sena)= (Q, - i QYJ · exp( +ia)
e, Ee, e' 3
n(·iJ

resulta A 1 1 1 6

(Q'"'') =(Q, +iQY)·exp(-ia) =Q 1" 1' ·exp(-ia) E{; {: . :·}E

E
6
6
E =exp(2rc i / 3)

X; 18 o o
(Q'bl•)' =(Q, -iQy)·exp(+io:) =Qlbi• ·exp(+ia)
198 Oswoldo Sala Fundamentos da espectroscopia Ramon e no infravermelho 199

Neste número já é considerado o rompimento da degeneres- Para a espécie E":


cência, assim, a contribuição para o número de graus de liberda-
n(r) =t(15-7+2s+2c')
de nesta espécie é 12 e não 24. Isto fica claro quando se conside-
ra cada representação separadamente, embora o resultado total n(r'J=t(15-7+2c' +2c)
seja a sorna das duas representações, r + r*. sornando termo a termo obtemos a representação
No segundo exemplo, urna molécula tipo X(YZ) 3 (ligação
nCE' =t[30-14+4(c+c*l]=t[16-4]=2
XYZ angulada, corno no íon radical (NH)3C', considerando H 2
como urna única massa na posição Z) de simetria C 3h, a tabela de sendo a sorna das representações obtidas 3 + 8 + 2 + 2 = 15 = 3N-6.
caracteres, juntamente com a representação dos modos normais e Não se conta em dobro a contribuição das espécies E, pois elas já
os caracteres da representação redutível, pode ser escrita: resultam da sorna de representações unidimensionais.
c,h E e, e ' 3 cr h s, s 3
2 nc·o

l 0.2 Moléculas lineares


A' 1 1 1 1 1 1 3

E' g e
e*
f,

E
* 1
1
E
E* :*} 8
e = exp(2rri / 3)
Moléculas lineares com centro de simetria ou sem centro de
simetria pertencem, respectivamente, aos grupos de ponto Dci:oh ou
C=· Estes grupos, ao contrário dos outros, contêm infinitos ele-
A" 1 1 1 -1 -1 -1 2
mentos, pois é possível qualquer valor de ângulo de rotação ao

{~
e e* -1 -e -e*} redor do eixo da molécula. Como conseqüência a expressão (5.14),
E" 2
e* 8 -1 -e* -E n(·ii = i Lgi ·x/y!Xj' não pode ser utilizada, pois contém o fator
j
X; 15 o o 7 -2 -2 l/g, onde g (ordem do grupo) seria infinito. Neste caso, um método
simples de determinar o número de vibrações para cada espécie
O cálculo da representação para as espécies A: e A" é feito
de simetria (e que pode ser aplicado, de modo geral, a qualquer
do modo usual, sendo o resultado 3 e 2, respectivamente. Para a
molécula) é através de considerações sobre os graus de liberdade.
espécie E' o cálculo detalhado para as duas representações sepa-
Num conjunto equivalente de núcleos (núcleos que podem
radas fica: ser transportados um no outro por alguma operação de simetria
n(r) =t(15+7-2c-2c') do grupo), o deslocamento de um núcleo representativo deste con-
n(r'J=t(15+7-2c' -2c) junto determina o deslocamento de todos os núcleos do conjunto.
Se o núcleo representativo não estiver contido em nenhum ele-
sornando termo a termo, lembrando que e + e* = 2coscp obtemos a mento de simetria não haverá restrições sobre seu movimento
representação e ele possuirá três graus de liberdade. Se houver m conjuntos
n'"'' = t[30+ 14-4(c +e*)]= i[44-4(2cos 120º)] equivalentes nesta condição, haverá 3rn graus de liberdade.
Examinemos o que ocorre quando um núcleo representativo
= t[44-4C-ll] = 8 estiver em algum elemento de simetria do grupo:
200 Oswaldo Sala Fundamentos da espectroscopia Ramon e no Infravermelho 201

l - Se o núcleo estiver contido em um plano de simetria haverá A vibração Lg + corresponde ao estiramento simétrico, a Lu +
2 graus de liberdade para movimentos simétricos em relação ao estiramento anti-simétrico e a rru corresponde à deformação
a este plano e 1 grau de liberdade (perpendicular ao plano) de ângulo

2-
para movimentos anti-simétricos.
Se o núcleo estiver em um eixo de simetria o movimento
1
'
Um exemplo de molécula de simetria C"~ é HC=CCl, sendo
m 0 o número de núcleos em todos os elementos de simetria; neste
ao longo desse será simétrico e haverá 1 grau de liberdade; exemplo m 0 = 4. A expressão para teste neste grupo, é N = m 0 • O
para movimentos anti-simétricos em relação ao eixo, o nú- resulta do é:
cleo deverá mover-se perpendicularmente a ele e haverá 2
graus de liberdade.
Espécie de simetria Número de vibrações
3- Se o núcleo estiver no centro de simetria não haverá possi-
bilidade de movimento simétrico em relação a esse centro e m0 - 1 = 3
o número de graus de liberdade será zero; para movimentos o
anti-simétricos não haverá restrições e teremos 3 graus de m0 - 2 = 2
liberdade. ~,<D, ... o
Para determinar o número de vibrações) com estas conside-
rações, pode-se fazer uso de tabelas (Herzberg, 1962, tabelas 35 e As três vibrações L' correspondem aos estiramentos HC, CC
36). Para vibrações duplamente degeneradas deve-se lembrar que e CCl; as duas vibrações degeneradas, n, são as de deformações
o número de vibrações é metade do número de graus de liberdade de ângulo.
Como exemplo, vamos determinar o número de vibrações
para a molécula de C0 2 , cuja simetria é D,h" Pela tabela 36 (Her-
zberg) define-se m 0 como o número de núcleos em todos elemen- 10.3 Efeito isotópico
tos de simetria, m como o número de conjunto de núcleos no eixo
Coc• mas em nenhum outro elemento de simetria que não coincida Quando em uma molécula se efetua substituição isotópica
inteiramente com este eixo. No caso em estudo m 0 = 1, pois o áto- de um de seus átomos, a função potencial praticamente fica inal-
mo de e está em todos os eixos e planos do grupo, e moc = 1, que é terada, embora possam ser observadas variações apreciáveis nas
o conjunto formado pelos dois átomos de O. Estes valores podem freqüências vibracionais. Este efeito é bastante acentuado quan-
ser testados pela expressão N = 2m, + m 0 • do a substituição é de hidrogênio por deutério e se torna menos
drástico à medida que se aumenta a massa atômica do átomo
Espécie de simetria Número de vibrações
substituído. A substituição isotópica é um método bastante útil
L g• m = 1 na análise vibracional e é importante considerar a regra dos
Lu• mm+m 0 -l = 1 produtos.
L L ·
g' u
o A regra dos produtos é obtida da equação secular 1GF-EI-1 =O.
n, m oc - 1 =Ü Esta equação pode ser expressa:
rru mr.+ m 0 -1 = 1
L'.1g, L1u ,<!Jg' <lJu' ··· o (10.3)
202 Oswaldo Sala Fundamentos da espectroscopia Ramon e no Infravermelho 203

Efetuando substituição isotópica nesta molécula e supondo O índice superior T indica o número de componentes de
que a matriz F seja exatamente a mesma, teremos: translação (T , T,y T ) que comparecem nesta espécie de simetria,
X Z

Rx, RY e Rz representam o número de componentes de rotação na


(10.4)
t. espécie considerada e v é o número de graus de liberdade de cada
que permite escrever: conjunto de átomos equivalentes, ou seja, são os coeficientes dos
m, rnh, rnv ... nas tabelas 35 e 36 (Herzberg), citadas anteriormen-
À1À2À, ... Àn IG'I (10.5) te para o cálculo do número de vibrações de moléculas lineares.
À1 À2 À3 ... Àn lGf Corno exemplo, para o grupo C3v o número de vibrações para
Corno À é proporcional a v 2 , a equação (10.5) pode ser a espécie A 1 é dado por 3m + 2rnv + m 0 -1 (m = número de núcleos
em nenhum elemento de simetria, mv = n(1mero de conjuntos de
reescrita:
núcleos nos planos crv, mas em nenhum outro elemento de sime-
V1'v2'v3'···Vn - fiG1 (10.6)
tria, m, =número de núcleos em todos elementos de simetria).
Y1VzV3···Vn -~iar Considerando a espécie A1 da molécula de NH 3 , nesta espécie
há duas vibrações e não comparecem componentes rotacionais (Rx
Teller e Redlich mostraram que a equação
= Ry = R ' = 0). Só há um componente translacional (T = 1); para o
conjunto dos átomos N, v = 1 (coeficiente de m 0 , o átomo de N está
(10. 7)
m'1m'2m's···m'n em todos os elementos de simetria) e para o conjunto dos átomos
H, V= 2 (coeficiente de mv, os átomos de H estão nos planos CTV, ha-
(sendo ml' m 2 ••. as massas dos átomos representativos dos vários
vendo dois graus de liberdade). Portanto, a equação (10.9) se torna:
conjuntos equivalentes e m' 1 , m' 2 ... as massas com substituição
isotópica) é válida quando a espécie de simetria considerada não
contém translações ou rotações; caso contrário haveria freqüên- (10.10)
cias zero e a relação ficaria indeterminada. Urna expressão geral,
válida também nestes casos, é: onde MNH 3 = mx + 3mH e M:-;n 3 = mx + 3mD. Sendo v 1 e v 2 respectiva-
mente 3335 e 932 crn· 1, para o NH3 , e 2419 e 746 crn· 1 para o ND 3 ,
(10.8) o primeiro membro da equação vale 0,5805, enquanto o segundo
membro vale 0,5423. Os valores são aproximadamente iguais,
mas não exatamente. Deve-se lembrar que somente termos qua-
onde M e M' são, respectivamente, as massas da molécula sem
dráticos foram considerados na função potencial, aproximação do
e com substituição isotópica e I,, IY e I, são os componentes do oscilador harmônico, e na realidade o oscilador não é harmônico.
momento de inércia em relação aos eixos principais. Utilizando freqüências harmônicas o valor do primeiro membro
Uma forma mais conveniente, para a regra dos produtos, é se aproxima melhor do valor do segundo membro.
considerar separadamente cada espécie de simetria: Para a espécie degenerada, E, da mesma maneira que cada
modo vibracional duplamente degenerado corresponde a dois
)T(I' J"x(I' )Rv(I' )Rz
lJ (~:, )= \I (:,: )v(M'
1 M r: 1; 1: (10.9) graus de liberdade, o par de componentes de translação ou de
rotação deve ser contado como se fosse um único componente. As-
204 Oswaldo Sala Fundamentos da espectroscopia Ramon e no infravermelho 205

sim ) na equação (10.9) a contribuição de T X e T , nesta espécie E,


~ Literatura recomendada
é contada como um componente, T = 1, o mesmo ocorrendo com Rx
e R contribuindo com somente 1 termo. Da expressão do número
,~ COLTHUP, N. B., DALY, L. H., WIBERLEY, S. E. Introduction to Infra-
de vibrações para a espécie E, 6m + 3my + m 0 -2 (tabelas de Her- red and Rarnan Spectroscopy. Academic Press, 1970.
zberg), para o átomo de N (está em todos elementos de simetria) HARRIS, D. C., BERTOLUCCI, M. D. Symm.etry and Spectroscopy. Do-
o coeficiente de m 0 é igual a 1 e para os átomos de H (estão nos ver Publications, 1989.
Planos cry ) v = 3, coeficiente de m y . Lembrando, ainda, que no rotor HERZBERG, G., Molecular Spectra and Molecular Structure II. Infra-
simétrico I = I,y a equação (10.9) se reduz à equação (10.11):
X
red and Raman Spectra of Poliatomic Molecules, D. Van Nostrand,
1962.
(v3v4)n (10.11) NAKAJVIOTO, K. Infrared and llanian Spectra o{ Inurganic and Coordi-
(v3v4)H nation Compounds. John Wiley & Sons, 1986.
WILSON, E. B., DECIUS, J. C., CROSS, P. C. Molecular Vibrations. Mc-
Calculando os componentes do momento de inércia obtém-se Graw-Hill, 1955.
I = 1 695 u.m.a.-Á2 e r = 3,286 u.m.a.·Á 2 , que dão para o segundo WOODWARD, L. A. Introduction to the Theory of Molecular Vibrations
' ' X
membro da equação o valor 0,5347. Os valores de v3 e v 4 para o NH3 and Vibrational Spectroscopy. Oxford, 1972.
são, respectivamente, 3414 e 1627 cm· 1 e para o ND 3• 2555 e 1191
cm· 1, resultando para o primeiro membro o valor 0,5478. Melhor
concordância é obtida usando valores de freqüências harmônicas.

Exercícios

10.1 Determine a representação dos modos normais da mo-


lécula H 3 C-CC13 numa conformação parcialmente girada (grupo
de ponto C,).

10.2 Os espectros Raman das moléculas de CH4 e CD 4 apre-


sentam bandas polarizadas em 2917 e 2085 cm· 1, respectivamen-
te; são observadas bandas não polarizadas em 1534, 3019 e 1306
cm·' para o CH, e 1092, 2259 e 996 cm· 1 para o CD,. As duas úl-
timas bandas (não polarizadas) para cada um destes compostos
são observadas também no infravermelho. Aplique a regra dos
produtos para este exemplo e comente o resultado.

10.3 Determine a representação dos modos normais para a


molécula de O=C=C=C=O.
11 Rotação de moléculas
poliatômicas

t' 11. l Rotação de moléculas não lineares

No capítulo 3 estudou-se a rotação de moléculas diatômicas,


sendo mencionado que o mesmo tipo de tratamento era válido
para moléculas poliatômicas lineares. Para moléculas não line-
ares deve-se considerar os momentos principais de in.ércia (três
direções mutuamente ortogonais, passando pelo centro de massa,
em relação às quais os momentos de inércia têm valor máximo ou
mínimo), IA, I" e Ic, com IA,; IR,; I 0 • Se IA= I" = I 0 , teremos o rotor
esférico; se IA* IB= 10 o rotor é chamado simétrico e se IA* IB* Ic
o rotor é assimétrico.

11.2 Rotor esférico

Quando a molécula possui dois ou mais eixos e,, ou de maior


ordem, o elipsóide dos momentos de inércia se degenera numa
esfera. É o caso de moléculas do grupo de ponto T,, como CH4
ou CCl,, ou do grupo Oh, como SF,. Como elas não possuem mo-
208 Oswaldo Sala Fundamentos da espectroscopia Ramon e no infravermelho 209

mento de dipolo permanente, não haverá espectro rotacional no h


como o momento angular total p = ,jJ(J + 1) · - -rc, resulta:
infravermelho. No Raman, durante a rotação o momento de dipo- 2
2 2
lo induzido pelo campo elétrico da radiação excitante permanece
h ) - K 2 [ Zrc
PB 2 + Pc 2 = J(J + 1)( Zrc h)
inalterado, sempre na direção do campo; assim, (aa!oQ) 0 = O e não
se observa espectro rotacional.
Os níveis de energia são caracterizados por dois índices, J e
K; sendo que 18 = 10 , a equação (11.1) fica:
2 2
h 2 h 2
11 .3 Rotor simétrico EJK=-2-·K + --[JCJ+l)-K]
2
8rc IA 8rc IB
(11.2)
2 2 2
Consideremos uma molécu] a com um eixo de simetria C3 que h
=--·J(J+l)+
8rc 2In
( -h- - - h - -K
8rc 2 IA 8rc 2 IH
J 2

coincide com um eixo principal de inércia (IA), com.o, por exemplo,


o CC1 3H. Em um plano perpendicular a este eixo, os momentos de
ou, em unidade de cm- 1
inércia em relação a qualquer eixo neste plano são iguais, isto é, o
elipsóide de inércia é um elipsóide rotacional, com IA*In=lc. Para F.rK = BJ(J + 1) + (A-B)K 2 (11.3)
o modelo de rotor rígido a energia do sistema pode ser escrita:
onde A= h/8rc2cIA e B = h/8rc2cln são constantes rotacionais.
(11.1) Podem ocorrer dois casos:
(i) A>B (ou seja, IA< ln= Ic), denominado rotor prolato, o coefi-
ciente de K 2 será positivo e a energia, para um dado valor de
onde pA, pB e p 0 são os momentos angulares (Iw).
J, aumenta com o valor de K; um exemplo de rotor prolato é
Como existe um eixo princi pai, haverá uma direção prefe-
o clorofórmio.
rencial e o componente do momento angular, na direção deste
(ii) A< B (ou seja, IA> I" = 10 ), denominado rotor oblato, o coefi-
eixo, será quantizado e igual a K(h/2rc), com K = O, ±1, ±2 ... , ±J,
ciente de K2 será negativo, de modo que para um dado valor
ou seja, pA = Kh/2rc. Pela figura que segue temos:
de J a energia diminui quando K aumenta; um exemplo de
rotor oblato é a molécula de benzeno.
A
Na Figura 11.1 estão representados os níveis de energia para
p os rotores prolato e oblato. Pela dependência com K 2 os níveis de
, energia serão duplamente degenerados, com exceção de K = O.
• Para cada valor de J os valores de K variam de O a J. Na figura
e cada coluna corresponde a um determinado valor de K e contém
N
B somente níveis com J maior ou igual a K, pois K é a projeção de
J. Para K=l não há o nível com J=O, para K=2 não há níveis com
Pn2 + Pc 2 = N2 = p2 - PA2 J =0 e J = 1 e assim por diante.
210 Oswaldo Saio Fundamentos da espectroscopia Ramon e no infravermelho 21 l

J J Este desdobramento é extremamente pequeno, da ordem de


5- 4-- 10·' cm·t.
5-- 5- 5--5--
3 __ 5-- No Raman as regras de seleção para rotor simétrico são:
4--
4--4- 4·--4-- 5--
3- 4-- LiJ = O, ±1, ±2 e LiK = O
3- 3----2- 3--3 __
3--4--
2-- 2- 2--2-- com a restrição de LiJ = ±1 não ocorrer para K = O. A regra LiK = O
1-- 1-- 1 --1-- 2-- 3--
o-- o-- é uma conseqüência de um eixo do elipsóide de polarizabilidade
K=O K=2 K=3 K=O K=l K=2 coincidir com o eixo principal, de modo que a rotação neste eixo
Prolato Oblato não altera o momento de dipolo induzido, não havendo espalha-
Figura 11.1- Diagrama dos níveis de energia para rotor simétrico.
f mento de luz.
Por convenção, l\.J é a diferença J'-J", onde J' se refere ao es-
Obtidos os níveis de energia, podemos considerar as regras
tado superior e J" ao estado inferior. As transições com L\.J = +1 e
de seleção para fazer a previsão dos espectros. No infravermelho
+2 dão origem às linhas Stokes e as transições para l\.J = -1 ou-2
valem as regras:
originam as linhas anti-Stokes, mas tanto as linhas Stokes como
L\.K =O e l\.J =O, ±1 para K *O as anti-Stokes são denominadas de ramos R (para l\.J = ±1) ou S
(para l\.J = ±2); para distingui-las costuma-se designar as linhas
A regra LiK = Oé uma conseqüência de que no rotor simétrico do lado Stokes por PR e ºS (com forma de ramos P e O) e as do lado
0 momento de dipolo permanente se situa no eixo de simetria e
anti-Stokes por RR e 8 S (com forma de ramos R e S).
a rotação ao redor deste eixo não causa variação do momento de
As freqüências (cm· 1 ) Raman são dadas por:
dipolo nesta direção. No diagrama da Figura 11.1 as transições
ocorrem somente entre níveis de uma mesma coluna (transições
VR = F(J+l, K) - F(J, K) = 2BJ + 2B J=l,2 .. .
verticais). Em decorrência destas regras, as freqüências (cm· 1) de
absorção no infravermelho (LiJ = +1) serão dadas, como para mo- v8 = F(J+2, K) - F(J, K) = 4BJ + 6B J=0,1 .. .
léculas lineares, por
Os níveis rotacionais têm exatamente os mesmos espaça-
v = 2B(J+l) (11.4) mentos energéticos, assim, o espectro Raman seria constituído
de duas séries de linhas eqüidistantes situadas de cada lado da
sendo o espaçamento entre linhas sucessivas 2B.
linha Rayleigh (LiJ =O), uma para LiJ = +1 (ramos PR e RR) e outra
Se a distorção centrífuga for considerada, além do termo
para LiJ = +2 (ramos ºSe 8 SJ.
com a constante DJ haverá um termo com uma constante DJK'
responsável por uma pequena separação dos componentes com O esquema do espectro Raman, representado na Figura
diferentes valores de K e a expressão (11.4) ficará: 11.2, mostra separadamente a contribuição dos dois ramos e o
espectro resultante, que pela sobreposição das duas contribuições
V= 2B(J+l)- 2D,KK2 (J+l)- 4D}J+1) 3 apresentará alternância de intensidades.
212 Oswaldo Sala Fundamentos da espectroscopia Raman e no infravermelho 21 3

Stokes anti-Stokes K J K J
K

ºs J: 4 2 o o 2 4 ss ;o 3+3
1 1 1 1 1 1 1
'
I' ~ - 3
'R J: 10 5 1 5 "R \___ 3 +2
1 110 3 +I
1 1 1 1 1 1 1 1 1 1 1 1
2 30 2 ) 3
1 1 1 1 1 1 1 1 1 1 1 \

l
1 1 1 3 -1
1

3 3 -2
\
Figura 11.2 - Esquema de espectro Raman de rotor simétrico \__ o)
3 -3

l ----
r~
-
2+2
l; 2+1
11 .4 Rotor assimétrico 2 i 2 o
1i 2 ~- 2 -1 \
1 2 -2
No rotor assimétrico os três momentos de inércia são dife-
rentes, IA+:IB+:Ic, e a energia será: o 1+1
r 1
1 1 \~
1o
LJ o

oJ o -
oo ot o
No caso de rotor simétrico, os subníveis para um determina-
do J, caracterizados pelos valores K =O, ±1... ±J, eram duplamen- Oblato Rotor assimétrico Prolato
te degenerados, com exceção de J = O. No rotor assimétrico não
~· B
1 >I I < I =I
e A A B C
há mais uma direção privilegiada e a degenerescência é rompida.
Haverá 2J + 1 níveis, em vez de J + 1, mas não haverá números Figura 11.3 - Diagrama da correlação entre níveis de energia de rotores oblato,
prolato e assimétrico
quânticos perfeitos para caracterizá-los. K deixa de ser um nú-
mero quântico perfeito; em seu lugar adiciona-se ao valor de J um
Este diagrama é somente esquemático, supondo iguais os
índice T J onde t toma valores entre -J, -J+l... +J.
níveis oblato e prolato para um mesmo J, o que em geral nâo é
Os' ní~eis de energia não podem ser representados por uma
verdade. Nele não se considera A como eixo único, mas podem-se
fórmula explícita; devem ser comparados com os níveis do rotor fixar os momentos de inércia IA e Ic e fazer In variar entre IB = IA
simétrico nos casos extremos do rotor oblato e prolato, como no e IB = I 0 , de modo que o rotor oblato seria I 0 > IA= In (e não IA> IB
diagrama de energia da Figura 11.3. Lembrar que no rotor pro- = I 0 ) e o prolato seria como o usual, IA <lB=I 0 . O rotor assimétrico
lato as en.ergias aumentam com K, para um mesmo J, ao passo teria valor intermediário de IB, as linhas unindo os níveis dos dois
que no oblato as energias diminuem com o aumento de K (ver extremos, com mesmo valor de J. Os índices t são considerados
Figura 11.1). tomando-se a linha unindo os níveis mais baixos, de um mesmo
214 Oswaldo Sala

J, como sendo o nível J_,1; em seguida, unindo-se os níveis prolato


e oblato imediatamente acima, obtém-se o nível J_J+i e assim por
diante.
Para o rotor assimétrico valem as regras de seleção ôJ = O,
±1 para o infravermelho e ôJ = O, ±1, ±2 para o Raman. Os espec- 12 Interação rotação-vibração
tros são bastante com plicados, sendo difícil seu estudo.

Exercícios

11.1 Construa o esquema dos níveis de energia rotacionais,


até J = 6, de uma molécula onde as constantes rotacionais são A
= 5 cm- 1 e B = 3 cm· 1 . Como classificaria esse rotor?

11.2 Com os resultados do exercício anterior faça uma pre-


visão do espectro rotacional envolvendo esses níveis.
12.1 Moléculas lineares

Literatura recomendada No capítulo 3 foi estudada a interação rotação-vibração em


moléculas diatômicas, que envolvem um único modo vibracional ,
BARROW, G. M. Introduction to Molecular Spectroscopy. McGraw-Hill, o de estiramento da ligação. Como o momento de inércia muda
1962. ligeiramente durante uma vibração, na constante rotacional (B )
HERZBERG, G. Molecular Spectra and Molecular Structu.re II. Infi·ared comparecia o número quântico vibracional, v, deste modo. v

and Raman Spectra of Poliatornic Molecules, D. Van Nostrand, 1962. Para moléculas poliatômicas, a constante rotacional irá de-
HOLLAS, .J. M. Modern Spectroscopy. John Wiley & Sons, 1987. pender dos vários modos vibracionais existentes, ou seja, dos cor-
KROTO, H. W. Molecular Rotation Spectra. Dover Publications, Inc.,
respondentes números quânticos destes modos. Para modos não
1992.
degenerados a constante rotacional B pode ser expressa como
em (12.1):
WOLLRAB, J. E. Rulational Spectra and Molecular Structure. Academic
Press, 1967.
(12.1)

vi indicando o número quântico vibracional do modo i e o somató-


rio sendo estendido a todos os modos vibracionais.
Para um particular modo vibracional i a energia (em cm·'),
desprezando a distorção centrífuga e a anarmonicidade, será:
216 Oswaldo Sala Fundamentos da espectroscopia Ramon e no Infravermelho 21 7

espectro de rotação-vibração, às bandas denominadas paralelas


(12.2)
ou perpendiculares.
Para bandas paralelas o espectro de absorção no infraver-
sendo d o grau de degenerescência (d=l, 2 ... ). melho obedece às regras de seleção
Embora seja simples obter espectro Raman rotacional de
t.v= +1; t.J = ±1; + <-> -; s +-./.-+a
moléculas relativamente leves, como vimos para O2 e N 2 , é mais
fácil conseguir o espectro de rotação-vibração no infravermelho. Conseqüentemente, haverá os ramos P e R com ausência do
Assim, neste capítulo serão discutidas apenas as regras de sele- ramo Q, ocorrendo somente transições entre níveis de diferente
ção para os espectros de absorção no infravermelho. paridade (transições entre níveis de mesma paridade são proibi-
As propriedades de sim.etria dos níveis rotacionais devem, das), como mostra o esquema da Figura 12.1.
agora, ser consideradas para cada nível vibracional. No capítulo
3, para moléculas diatômicas foi desprezada a contribuição da J
função de onda vibracional, pois, nos espectros rotacionais puros 4----------------------- +a
somente se leva em conta o estado vibracional fundamental v =
O, totalmente simétrico.
Para moléculas poliatômicas, no estado vibracional excitado v=l
a função de onda pode não ser totalmente simétrica, como ve-
2 - ----------------- - +a
remos no exemplo do C0 2 • Para essa molécula, sendo os spins
1-+-~--~__.--s
nucleares zero, no estado eletrônico fundamental, L;, só existirão o-- ------------- --- -- +a
níveis rotacionais com J par, simétricos e positivos (ver Figura
3. 7, para o 35 Cl,). Isto vale para o estado vibracional fundamen-
tal ou para um estado excitado totalmente simétrico. Para o CO,
as vibrações fundamentais ativas no infravermelho decorrem de 4- --l-----l----l-- +s
,_1·

transições entre um estado totalmente simétrico (v =O) e estados


de espécie 2:"u ou IIu , originando as bandas em 2349 ou 667 cm·1, 3------ --------- --- -- -a
respectivamente. Para a espécie r: só haverá níveis com J ímpar, v=O i: +g
simétricos e negativos. A notação das espécies de simetria para 2--~---+--'- +s
moléculas lineares (grupos de ponto C= e D"h) segue a dos compo- 1---------------- -------a
nentes do momento angular orbital eletrônico ao longo do eixo da O +s

molécula (não devem ser confundidos com estados eletrônicos). Figura 12.1- Esquema dos níveis e transições permitidas no infravermelho para
Assim, r: designa uma espécie de simetria não degen.erada e Ilu banda paralela do co2.
uma espécie de simetria duplamente degenerada.
Se durante a vibração de uma molécula linear houver va- A Figura 12.2 mostra o espectro de rotação-vibração do modo
riação do momento de dipolo, esta pode ocorrer paralelamente v3 , estiramento anti-simétrico do C0 2 • As regras+<-> - e t.J = ±1 é
ou perpendicularmente ao eixo da molécula. Isto dá origem, no que permitem a observação do espectro.

i
21 8 Oswaldo Saio Fundamentos da espectroscopia Ramon e no infravermelho 21 9

Para bandas perpendiculares, por exemplo, o modo de defor-


mação de ângulo do co,, espécie nu, os dois componentes desse
modo degenerado causam uma rotação dos átomos ao redor do
eixo da molécula, cujo momento angular, e, é idêntico ao vetor K
do rotor simétrico. Como conseqüência, a regra de seleção de L1J,
para o infravermelho, passa a ser

L1J= o, ±1

2240 2260 2280 2300 2320 2340 2360 2380 originando o ramo Q, em 667 ,9 cm-1, mais intenso do que os ramos
cm· 1 p e R.
Figura 12.2 -Espectro de rotação-vibração para banda paralela, v.v modo de esti-
Pela presença do momento angular f, o momento angular
ramento anti-simétrico do CO~ (resolução 0,3 cm· 1). Observa-se a contribuição da
banda do 18 C0 2, centrada aproximadamente em 2280 cm· 1 . total J não pode ser menor do que o de I; portanto, para o estado
nu não existe o nível J = O. Devido à diferença no espaçamento ro-
tacional nos dois níveis vibracionais envolvidos, a banda do ramo
Verifica-se, neste espectro, a inexistência do ramo Q (em ca. Q pode apresentar um alargamento assimétrico para J alto. O
2350 cm- 1) e o aparecimento do ramo p da banda de rnco,, centra- movimento de deformação de ângulo modifica a geometria da mo-
da em ca. 2284 cm-1, estando o ramo R sobreposto parcialmente lécula, que se comportará como um rotor assimétrico com rorn-
'
ao ramo P do 12 C0 2 • O espaçamento observado entre as bandas é pimento da degenerescência de K (ou f). A Figura 12.3 mostra os
da ordem de 1,52 cm- 1 ; se todos os níveis fossem permitidos, este níveis de energia, sendo indicadas algumas transições possíveis
valor corresponderia a 2B, ou seja, B = O, 76 cm- 1. Contudo, a se- dos ramos P, Q e R, estando na Figura 12.4 o espectro de rotação-
paração entre a primeira banda do ramo P e a primeira banda do vibração da banda perpendicular do C0 2 •
ramo Ré de 2,30 cm- 1 e não 3,04 cm- 1 (4B), como seria esperado. O diagrama dos níveis de energia mostra que a separação
Considerando a alternância na existência dos níveis rotacionais, entre duas transições consecutivas, dos ramos P ou R, é 4B (su-
para os dois estados vibracionais mostrados na Figura 12.1, os pondo mesma constante rotacional para os dois estados). Sendo
resultados experimentais se tornam claros. A diferença energéti- B=0,38 cm- 1, o espaçamento entre as linhas no espectro da Figura
ca entre a primeira linha do ramo P e a primeira linha do ramo R 12.4 seria da ordem de 1,52 cm-1, como de fato se observa.
é 6B (supondo o mesmo B para v = O e v = 1) e entre linhas suces- Os níveis do estado nu são desdobrados, com espaçamento
sivas destes ramos é 4B, dando o valor B = 0,38 cm- 1 • crescente com o valor de J, devido à força de Coriolis, que aumen-
No Raman, além das regras, L'w = ±1 e L1J = O, ±2, são proi- ta com a velocidade de rotação. Contudo, o espaçamento entre os
bidas as intercombinações, + tt - e s tt a, o que é coerente com a níveis desdobrados é muito pequeno, sendo observado somente
regra para 11J. Deve-se lembrar que o modo de estiramento simé- em espectros de alta resolução. Os desdobramentos mostrados na
trico envolve transições entre estados L;. Figura 12.3 não estão em escala.
220 Oswaldo Sala Fundamentos do espectroscopia Ramon e no infravermelho 221

J No espectro da Figura 12.4, além dos ramos P, Q, e R do


s
4 +a modo v 2 , são observadas as bandas assinaladas por (a) e (b). A
banda (a), em 617,9 cm", é atribuída à transição de (0,2º,0) L+g
+a ' para (0,11,0) Ilu (o índice superior indica o valor de R) e a ban-
. L;
1

3 -8
v=l I' Ilu da (b), em 720,5 crn-1, é atribuída à transição de (0,0º,0) para
-8
1 (0,l1,0) ITu. Para mais detalhes sobre este espectro veja Herzberg
2 +a
(1962), capítulo III,3.
1

T
- - -
r- - +a
-s
Além da força de distorção centrífuga, deve-se considerar o
aparecimento da força de Coriolis, que causará desdobramento
dos níveis degenerados. Para movimentos vibracionais ao longo
4 1 +s
do eixo molecular, -€ será zero e os níveis serão como os conside-
rados na Figura 12.1; contudo, para a espécie II" as rotações no
sentido horário e anti-horário causam desdobramento dos níveis
3 ------- --------- ------------- ---- -- -a e~ ±1.
L+
g
Vejamos corno aparecem as forças de Coriolis e seu efeito nos
2 --+---,_----r-~ +s níveis de energia.
1 ------------------------------- ------- -a
O +8

p Q R
12.2 Interação de Coriolis
Figura 12.3 - Esquema dos níveis de energia e transições permitidas para a ban-
da de deformação de ângulo do co2. Quando se consideram os movimentos de rotação e vibração
de uma molécula linear, deve-se pensar no acoplamento destes
dois movimentos, isto é, ao mesmo tempo em que ela está giran-
do existem os movimentos vibracionais, ocorrendo a interação de
Corio1is.
Para um observador num referencial externo ao de um corpo
(a) (b)
em rotação, um ponto deste corpo descreve um movimento circu-
1 lar e está sujeito a uma aceleração centrípeta, ro 2r, sentida na ten-
são de uma corda que mantém a trajetória circular deste ponto.
!
1
1 Se além do movimento circular o ponto executa um movi-
mento retilíneo uniforme, com velocidade v (em relação ao refe-
640 660 680_, 700 720 740
rencial no corpo), dirigido para o centro de rotação, haverá urna
620
cm aceleração adicional conhecida corno aceleração de Coriolis.
Figura 12.4 - Espectro de rotação-vibração para banda perpendicular, Yv modo de Usando coordenadas polares, a aceleração pode ser escrita
deformação de ângulo do C02 (resolução 0,4 cm- 1). Ver texto para as bandas (a) e (b). segundo os componentes radial y,e na direção do raio vetor, e ya ,
222 Oswaldo Sala Fundamentos do espectroscopia Ramon e no infravermelho 223

perpendicular à y, Na figura que segue, na extremidade do raio A força de Coriolis, definida pelo produto vetorial 2mvNo,
vetor OP está representada a aceleração y e seus componentes onde w é a velocidade angular, é dirigida perpendicularmente à
em coordenadas cartesianas, X e y, e em coordenadas polares, Yr direção do movimento e ao eixo de rotação. Esta força leva a um
e yª' podendo-se determinar as expressões para as acelerações acoplamento adicional entre rotação e vibração (acoplamento de
centrípeta e de Coriolis. Coriolis) muito maior do que o efeito de distorção centrífuga, pois
Em coordenadas cartesianas, a aceleração tem componentes a velocidade de vibração é maior do que a de rotação.
xe y, de modo que os componentes radial e azimutal podem ser Consideremos uma molécula linear tipo XY2 (C0 2 , como
obtidos pelas equações: exemplo), sendo v 1 e v 3 os estiramentos simétrico e anti-simétri-
co e v 2 a deformação de ângulo (duplamente degenerada). Nestes
movimentos os átomos passam simultaneamente pelas posições
de equilíbrio e os vetores de deslocamento representam as veloci-
dades em qualquer instante. Pelo movimento rotacional (supon-
do sentido horário, com eixo perpendicular ao plano do papel) as
forças de Coriolis em cada átomo têm as direções indicadas pelos
vetores em negrito, na Figura 12.5.
Como resultado, a força de Coriolis atuando no modo de
estiramento v 3 tende a excitar um dos modos de deformação de
ângulo v2 , mas com a freqüência de v 3 • Da mesma maneira o mo-
vimento do modo v 2 tende a excitar o modo v3, mas com a fre-
y r =X.cosa+ Ysena qüência de v 2 • Se as freqüências dos modos vibracionais v 2 e v3
(12.3)
y ª = Ycosa +X.sena forem próximas, haverá forte acoplamento entre eles; se um for
excitado o outro também se tornará excitado. O mesmo ocorre
De x = r cosa e y = r sena, derivando duas vezes em relação entre os modos v 1 e v:<.
ao tempo:

X::::: f cosa -2:fásena - rã 2 cosa - rêisena


(12.4)
y == fsena - 2i'â. cosa - râ 2 sena + rci cosa
v, v. (CO)
Substituindo estes valores em (12.3):
~

Yr =r-ra
·2

Yr.r =2i'ã+rêi
l) J 1) v, õ (CO,)

~
No caso considerado r e ii são nulos (movimento retilíneo t ) 1' ) v, VM (CO)
uniforme e velocidade angular constante), restando os termos de
aceleração centrípeta, ra 2 (= rw 2 ), e de Coriolis, 2ra. "'
Figura 12.5 -Forças de Coriolis em uma molécula linear.
224 Oswaldo Sala Fundamentos da espectroscopia Ramon e no Infravermelho 225

Como conseqüência da força de Coriolis e do movimento os- 12.3 Rotor simétrico


cilatório, cada átomo descreverá uma elipse cuja excentricidade
dependerá da grandeza do acoplamento, criando um momento Moléculas que se comportam como rotores simétricos, seme-
angular adicional e mudança de energia. lhantemente às moléculas lineares, possuem um eixo principal
Em outras palavras, a interação de Coriolis causa acopla- e pode-se distinguir vibrações com momento de dipolo oscilando
mento dos modos v 1 ou v3 com o modo v2 , refletido no desdobramen- paralela ou perpendicularmente a este eixo, originando as ban-
to dos níveis degenerados (desdobramento tipo t). O acoplamento das paralelas e perpendiculares. Para bandas paralelas, no infra-
será tanto maior quanto mais próximas forem as freqü.ências vi- vermelho valem as regras de seleção:
bracionais. Não ocorre acoplamento entre os modos de estiramen-
to v 1 e v3 (R =O) nem entre os dois componentes de v2 •
LlK=O LlJ = O, ±1 para K *O
LlK=O LlJ = ± 1 para K= O
Devido a este desdobramento, os níveis rotacionais para o
estado excitado de simetria darão origem aos níveis +e -, indica- No Raman as regras de seleção são:
dos na Figura 12.6. Nesta figura, para uma transição partindo de
LlK = O, ±1, ±2 e LlJ = O, ±1, ±2
mesmo J do estado fundamental L'g (J par e estado + s), os ramos i
P e R envolvem níveis com J ímpar e estados - s da espécie nu, que Na Figura 12. 7 estão esquematizados, para banda paralela,
são os 11íveis inferiores no desdobramento ocorrido. No ramo Q, os níveis de energia, as transições permitidas no infravermelho
ao contrário, o J final é o mesmo do estado inicial e os estados - s (as setas indicam que as transições são entre valores de J para
são os níveis superiores no desdobramento. Este exemplo mostra um mesmo valor de K) e o tipo de espectro. Na Figura 12.8 é
somente transições partindo de J = 2 do nível L;. t mostrado como exemplo de banda paralela o espectro de transmi-
1! tância do modo v2, deformação de ângulo CH 3 do CH), cujo ramo
l Q se situa em ca. 1251 cm· 1 .
J
+a J K
3
, -s
3--

-s V=l 2-- - - . 1 l l .11'. o


rr. 2 1
1 '

:r I l
!
+a 1-- 1lll1 1 1111 " 1
1
+a
-s " 1 1 11 1111,. 2
T " 1 11 1!!1 3
, , , , , . 4
L+g
V=O 2----
2 +s K,,,,2
1-- . • 111,ll11ll11l1l11 lt 1lll!1l111,,,,., .....•
p Q R o-- K=l
R Q p
K=O
Figura 12.6-Esquema dos níveis (com desdobramento tipo e) e transições partin-
do, como exemplo, do nível J = 2. Figura 12. 7 -Transições e tipo de espectro para banda paralela de rotor simétrico.
226 Oswaldo Sala Fundamentos da espectroscopia Ramon e no infravermelho 22 7

K = 1, 2, 4, 5, 7, 8, ... a função de onda muda, pertencendo à espé-


cie degenerada E.
Os três átomos idênticos (os H) têm spin nuclear V, e pode-
se mostrar que há duas funções de onda degeneradas (espécie
E) e quatro totalmente simétricas. Assim, os níveis de espécie A,
com K= O, 3, 6, 9, ... apresentam o dobro da intensidade dos níveis
E, com K = 1, 2, 4, 5, 7, 8 etc. Para maiores detalhes consultar
Herzberg (1962), capítulo IV
O espaçamento das bandas para este modo v_ é 11,7 cm·', ao
'
passo que para o modo v6 (p(CH)) e v,(v(CH 5)) a separação é 7,7
e 9,0 cm-1, respectivamente. Este espaçamento deveria ser o mes-
1200 1220 1240 1260 1280
cm·'
mo, mas isto não ocorre devido à interação de Coriolis.
Da expressão para os níveis de energia, sem considerar a
Figura 12.8 - Espectro de rotação-vibração para a banda paralela v 2, do CI-1 31
(resolução 0,2 cm- 1). interação de Coriolis,

TvJK = w,(v + l/2) + BJ(J+l) + (A-B)K2

Para bandas perpendiculares, no infravermelho são permi- obtém-se o número de onda das linhas do ramo Q para l'<K = -1 e
tidas as transições com t.K = ±1 e t.J = O, ±1; no Raman vale o t.K = + 1 nos diferentes valores de K:
que foi mencionado para bandas paralelas. Na Figura 12.9 estão
esquematizados os níveis de energia, as transições permitidas (t.K = -1) V= OJ, + (A-B) - 2(A-B)K (K = 1, 2, 3 .. .)
no infravermelho e o tipo de espectro, notando-se que em geral (t.K = +1) V= OJ, + (A-B) + 2(A-B)K (K =O, 1, 2 ... )
este consiste dos ramos Q, sobrepostos a um fundo não resolvido
resultante da sobreposição dos demais ramos com diferentes va- O espaçamento entre as linhas seria, portanto, 2(A-B).
lores de K. A rigor, na expressão dos n.íveis de energia deve-se consi-
Na Figura 12.10 é mostrado o espectro de transmitância da derar um termo adicional, ±2AÇiK (sinal + para l>K = -1 e sinal
banda perpendicular do modo degenerado do CH,I (v5 , deforma- - para l'<K = +1), onde Çi é a constante de Coriolis para o modo i,
ção de ângulo CH,J, com atribuição de algumas linhas. Este é um que toma valores entre -1 e + 1. Considerando este termo, a sepa-
caso onde ocorre alternância de intensidade dos ramos Q (duas ração da série de ramos Q será 2[A(l-Ç)-Bl e não 2(A-B).
fracas seguidas de uma forte). Esta molécula pertence ao grupo A estrutura das bandas de rotação-vibração muitas vezes
de ponto C 3, e tem um eixo C3 • A função de onda contém o fator não é resolvida, mas a análise da envoltória pode fornecer in-
e"K', sendo cp o ângulo de rotação. Como <p vale 2n/3, a função formações úteis para a atribuição das freqüências. Detalhes des-
de onda para espécies de simetria A não são alteradas para K ta análise podem ser encontrados na literatura (por exemplo,
múltiplo de 3, ou seja, O, 3, 6, 9, .... Para K = 3n ± 1, ou seja, Gerhard & Dennison. Phys. Rev. v.43, p.197, 1933).
228 Oswaldo Sala Fundamentos da espectroscopia Ramon e no infravermelho 229

J t.K K 12,4 Rotor esférico


3- +1
111lll1, l 11111, o
No capítulo 11 foi mencionado que o rotor esférico não dá
-1
' " 1 1111 1 ' 1111 "
11 origem a espectro rotacional no infravermelho, por não possuir
+1 , " 11l i 1 1 , 111 momento de dipolo permanente. Contudo, no espectro de rotação-
vibração, como acontece para moléculas lineares, durante uma vi-
-1 " ' 1 1 11 i 1: l 11.
}2 bração pode haver variação de momento de dipolo e o espectro de ro-
+1 " 1 1 11 1 l 11 "
111: 11 "
tação-vibração será observado. Assim, para uma molécula tipoXY4 ,
)3
-1 "111 11 ' " de simetria Td, o modo de vibração totalmente simétrico continua
V=O +1
'' 1 I '' ')4 inativo no infravermelho, mas as vibrações dos modos da espécie
2-- K=2
11 I , , , '
J
1-- F, darão origem a espectros de rotação-vibração no infravermelho.
o-- K=l
K=O
<-v
Figura 12.9 - Transições e tipo de espectro para banda perpendicular de rotor 12.5 Rotor assimétrico
simétrico.
Geralmente as bandas do espectro de rotação-vibração de
um rotor assimétrico não são completamente resolvidas e somen-
te suas envoltórias podem ser estudadas.
A análise dos espectros é bastante complicada e não entra-
remos em detalhes. Há várias publicações que apresentam tipos
de contornos de acordo com certos parâmetros que podem ser fa-
cilmente calculados (por exemplo, Ueda & Shimanouchi, J. Mal.
Spectrosc. v.28, p.350, 1968). Em certos casos o rotor é aproxima-
M
1 M M damente simétrico, entre os limites prolato e oblato, e a envoltó-
~
+ +

"':l\ ~ :l\ <1 M


+
ria se torna mais simples. A análise destes contornos é útil como

:l\ "'
M n n n
li ferramenta adicional na atribuição das freqüências vibracionais.
1
li
"1 ~"1- :l\"1-
1
M
+
:l\ n
+ ~ No infravermelho é possível distinguir três tipos de envoltó·
<1 li
:l\"1- "1'-'
:l\ ~"' :l\ ~
iõ M
li
rias, denominadas A, B e C, dependendo da variação do momento

:l\"' "'"1
li de dipolo estar na direção do eixo com momento de inércia menor,
intermediário ou maior, respectivamente. Bandas do tipo A têm
1350 1400 1450 1500 1550 contorno semelhante à de ramos P, Q, R, com o ramo Q mais inten-
cm-1 so. Bandas do tipo B apresentam um desdobramento do ramo Q,
Figura 12.10-Espectro de rotação-vibração da banda perpendicular v_/e) do CH3 l
com um mínimo central, sendo geralmente difícil a observação dos
(resolução 0,2 cm· 1).
ramos P e R. Bandas do tipo C têm os três ramos, como as do tipo
A, mas com os ramos P e R não resolvidos em relação ao ramo Q.
230 Oswalda Sala Fundamentos da espectroscopia Ramon e no infravermelho 231

Na Figura 12.11 são mostrados exemplos desses três tipos


(1)
de contornos, obtidos no espectro de rotação-vibração do CH 2Cl2 ,
rotor assimétrico do grupo de ponto C,~· A banda em 2989 cm· 1 é
do tipo B (estiramento totalmente simétrico CH 2), a banda em (2)
1276 cm· 1 é do tipo A (wagging CH2 , espécie b 2 ) e a banda em 898
cm· 1 é do tipo C (rocking CH2 , espécie b,).

1
(!)-tipo B (II) - tipo A ~~~--1

29'40 296Q___ 29'so :idoo -3020-·8õ4ü-~ill60


cm-1
i
1220 1240
l
1260
cm-1
1280 l.'!00 l.'!20
200 400 600 800 1000 1200
1
Figura 12.12 - Espectros do CH2Cl2 líquido na região de 200 a 1450 cm· : (1) no
infravermelho; (2) Raman com a radiação incidente polarizada perpendicular-
mente à direção de observação e (3) idem de (2), mas com polarização paralela à
direção de observação.
1400

(III) - tipo C

(1)

e B
sso s6o s?0--880 890 gQo g]_Q--9f6-9EO 940
cm-1 A

Figura 12.11- Exemplos de contorno de bandas do CH 2Cl2: (I) tipo B, espécie a 1 ;


(II) tipo A, espécie b 2; (III) tipo C, espécie b 1 .

Na Figura 12.12 estão apresentados os espectros Raman e


no infravermelho do CH2 Cl 2 líquido, na região de 200 a 1450 cm· 1 ,
A
incluindo medida de polarização. Na Figura 12.13 são mostra- 1'
dos os espectros do vapor na região de 600 a 1500 cm· 1, estando
600 700 800 900 1000 1100 1200 1300 1400 1500
indicados os vários tipos de contorno. A Figura 12.14 mostra, na
região de 2100 a 3400 cm· 1 , os espectros Raman (líquido) com po- Figura 12.13 - Espectros no infravermelho do CH2Cl 2 vapor na região de 600 a
1500 cm- 1: (1) e (2) com quantidades diferentes de amostra. Estão indicados os
larização e os espectros nu infravermelho do vapor (com indicação tipos de contorno, A, B ou C.
dos tipos de contorno) e do líquido.
232 Oswaldo Sala Fundamentos da espectroscopia Ramon e no infravermelho 233
1.
Cll e A
I~ Exercícios
(2)

12.1 Pode-se obter um valor aproximado da constante ro-


!' tacional, B, quando no espectro ro-vibracional a estrutura não é
resolvida, observando-se somente a envoltória das bandas. Con-
siderando as intensidades máximas dos ramos P e R determina-
das pela população do estado inicial (espectro de absorção) e que
a constante B seja a mesma nos dois estados vibracionais, mostre
(3) que a separação entre os máximos destes ramos é:
2200 2400 2600 2800 3000 3200 3400

Av = ~
3
Figura 12.14 - Espectros do CH2 Cl2 na região de estiramentos CH: (1) no infra- kTB = 2,358M (cm-')
vermelho, estado vapor, estando indicados os tipos de contorno A, B ou C; (2) no hc
infravermelho, estado líquido; (3) Raman do estado líquido, com a radiação inci-
dente polarizada perpendicular e paralela à direção de observação.
[sugestão: a separação entre ramos R e P, R(J) - P(J) = F(J+l)
- F(J-1) pode ser escrita, lembrando que F=BJ(J+l), em termos
A análise destes espectros, considerando o tipo de contorno do valor de J para o máximo de intensidade (ver exercício 3.2),
e a polarização, permite obter a atribuição de bandas fundamen-
tais e de combinação, mostrada na Tabela 12.L Jm~ =~-~,obtendo-se que llv=4B(J+l/2)].
Infravermelho
Raman Tipo de contorno Atribuição 12.2 O contorno da banda de absorção do CO, em baixa re-
líquido vapor
3055 3053 solução, a 300K, mostra os dois ramos, P e R, com máximos em
vª v(CH) (b,)
2989P 2987 2998 B
2335 e 2360 cm·', respectivamente. Determine o valor aproxima-
v 1 v(CH) (a1)
2829 2853 B
do da constante rotacional e da distância internuclear.
2v, (A,)
2685 2698 A v.,+v8 (B,)
12.3 No espectro de rotação-vibração do CH3I, mostrado na Fi-
2305 2318 e v2+v1 (B,l
gura 12.10, foram medidos os seguintes valores de número de onda:
1425 p 1422 1467 B V., õ(CH.) (a,)
1268 1266 1268 A v8 w(CH) 1399,09 1411,46 1422,08 1433,86 1445,61
(b,)
1157 1157 1457,65 1470,12 1481,08 1492,83 1504,48
v5 twisting (a)
898 896 896 e V~ p(CFI~) (b,) Verifique se as atribuições indicadas na figura estão corretas.
742 757 759 A vn v(CCI) (b,)
704 p 704 v, v(CCI) (a,) ,t
288 p v 4 &(CCl 2) (a1) Literatura recomendada
P =polarizada; 8 =deformação de ângulo; w = "wagging"; p = "rocking".

Tabela 12.1- Valores de número de ondas (cm· 1) e atribuição vibracional para o BARROW, G. M. Introduction to Molecular Spectroscopy. McGraw-Hill,
CH 2Cl 2 1962.
234 Oswaldo Sala

COLTHUP, N. B., DALY, L. H., WIBERLEY, S. E. Introduction to Infra-


red and Raman Spectror;copy. Academic Press, 1990.
HERZBERG, G. Molecular Spectra and Molecular Structure. II. Infra-
red and Raman Spectra of' Polyatoniic Molecules. D. Van Nostrand
Company, lnc., 1962. 13 Espectro Ramon de
HOLLAS, J. M. Modem Spectroscopy. Jolm Wiley & Sons, 1987.
KROTO, H. W. Molecular Rotation Spectra. Dover Publications, Inc., monocristal
1992.
STEELE, D. Theory ofVíbrational Spectroscopy. W. B. Saunders, 1971.
WOLLRAB, J. E. Rotational Spectra and Molecular Structure. Academic
Press, 1967.

'f 13.1 Introdução

O espectro vibracional de substâncias no estado sólido pode


apresentar diferenças em relação ao espectro da amostra no es-
tado líquido ou gasoso, como o deslocamento de freqüências ou o
aparecimento de novas bandas, devido a perturbações pelo cam-
po cristalino. Isto pode ser devido ao desdobramento por campo
"n4-,§.,+-Ja_c-1Jó"..,\5l' Q iR.r Ll'Ci "'SflÍrti:C'i_ 1-l8,.,RÀ.a.7)"'"'í:'.\J.l'i'{'!JÚ~fil1v i;::'.f'"T\nilp1lllt:!:ü1.,'lf Ut

degenerescência pelo abaixamento da simetria), por campo de


correlação (devido à presença de mais de uma unidade molecular
numa célula unitária, com as vibrações de cada unidade em fase
ou fora de fase), ou à presença de modos externos (movimentos de
vibrações da rede cristalina).
Um fóton incidindo em um cristal pode criar ou destruir um
fonon, que é o quantum. de energia que separa os níveis de ener-
gia vibracional da rede cristalina. Por vibração da rede entende-
mos tanto os modos internos (característicos de um agrupamento
molecular) como os modos externos (movimentos tipo translação
ou rotação de íons ou de agrupamentos moleculares). Alguns au-
236 Oswaldo Sala Fundamentos da espectroscopia Ramon e no Infravermelho 23 7

tores consideram como vibração da rede somente os modos exter- A análise do espectro envolve agora o grupo de espaço (no
nos. Foi visto, no capítulo 6, que, para haver atividade no Raman, lugar do grupo de ponto) e pode ser efetuada via grupo de fator
a representação da espécie considerada deve conter pelo menos (onde são consideradas as operações de simetria do grupo de es-
um componente do tensor de polarizabilidade e, também, que as paço do cristal) ou pelo método de correlação (que utiliza essen-
vibrações das espécies totalmente simétricas podiam ser carac- cialmente as tabelas de correlação entre grupos). Utilizaremos
terizadas pelo fator de despolarização menor do que 3/4 (ou 6/7). este último, por ser muitas vezes usado na análise de espectros
Isto é válido no caso de fase líquida, onde se considera uma pola- de moléculas correlacionadas e mais simples de se utilizar.
rização média. Para monocristais, as moléculas estão orientadas
e isto permite que se obtenha espectros onde só compareçam ban-
das de uma determinada espécie de simetria, ou seja, vibrações
envolvendo os componentes da polarizabilidade nesta particular 13.2 Vibrações em cristais
espécie. É necessário que o cristal esteja orientado segundo seus
eixos ópticos (sistema referencial no cristal), e suas faces con- Em um cristal devem-se considerar os movimentos oscilató-
venientemente cortadas e polidas; as direções de polarização da rios na rede cristalina, as vibrações de cada átomo influenciando
radiação incidente e da radiação espalhada determinarão quais os movimentos dos átomos vizinhos. Devido ao arranjo periódico,
componentes do tensor estarão sendo observados. os movimentos dos modos vibracionais corresponderão a ondas de
Um arranjo regular de átomos, que pode ser repetido ao lon- deslocamentos que caminham através do cristal, constituindo as
go do cristal, constitui uma célula unitária. Quando esta célula vibrações da rede. A vibração dos átomos, com uma determinada
tem volume mínimo, ela é denominada célula primitiva. Como freqüência, origina uma onda que se propaga na rede, com com-
nem sempre a célula primitiva contém a simetria completa da í primento de onda determinado pela diferença de fase entre uma
rede cristalina, é conveniente definir uma célula unitária que célula e sua vizinha. Se o deslocamento dos átomos for paralelo à
contenha a simetria completa da rede; essas células são conheci- direção de propagação da onda, teremos as ondas longitudinais;
das como células de Bravais. se for perpendicular à direção de propagação, teremos as ondas
O principal objetivo deste capítulo é evidenciar a dependên- transversas.
cia do espectro Raman com os componentes do tensor Raman. Para haver interação entre as vibrações da rede e a radiação
Isto é de importância fundamental para uma correta atribuição eletromagnética (cujo comprimento de onda é da ordem de 105 A
das freqüências vibracionais às espécies de simetria. Uma vez no infravermelho e 5·10 3 A no visível), é necessário que as vibra-
isto obtido, o cálculo de coordenadas normais, através da deter- ções da rede tenham comprimento de onda comparável ao destas
minação da distribuição da energia potencial, permitirá a atri- radiações. Sendo a dimensão da célula unitária no cristal da or-
buição correta das freqüências aos modos normais. dem de 10 a 100 A, só haverá interação com vibrações de rede de
Infelizmente, nem sempre é simples obter monocristais com longo comprimento de onda. Estas vibrações entre células adja-
dimensões apropriadas para sua lapidação, segundo faces con- centes estarão em fase e, como podem interagir com a radiação
venientemente orientadas de acordo com os eixos ópticos. Além
disso, a orientação, o corte e o polimento do cristal são tarefas
1 eletromagnética, são conhecidas como "modos ópticos". Se todos
os átomos se moverem exatamente com a mesma fase teremos
bastante trabalhosas. um comprimento de onda infinito.
.J
238 Oswaldo Sala Fundamentos da espectroscopia Ramon e no Infravermelho 239

As vibrações da rede são descritas em termos do vetor de As vibrações onde os átomos se movimentam uns contra os
onda, k, cujo módulo é 2nlÀ, e sua direção é a mesma da propa- outros, como se fossem ligados por molas, são mais importantes
gação do movimento ondulatório na rede cristalina. A freqüên- do que as ondas acústicas, na espectroscopia vibracional de sóli-
cia e o comprimento de onda de um modo que se propaga na rede dos cristalinos.
estão relacionados pela "relação de dispersão". A representação Considerando o caso de ondas longitudinais de átomos
gráfica da freqüência deste modo em função do vetor de onda é iguais se propagando em uma rede linear infinita, teremos uma
1
denominada "curva de dispersão' • relação de dispersão como mostrada na Figura 13.1. Para 1k1 =
Se n é o número de átomos da célula unitária, haverá 3n rela, ou seja, À = 2a, a velocidade de grupo (àmlõk), proporcional a
modos normais associados com um "ramo" desta curva de dis- cos(ka/2), se anula; o que corresponde aos átomos vizinhos se mo-
persão. Três destes modos constituem os ramos acústicos. Para verem em oposição de fase. A onda será eHtacionária e não uma
comprimento de onda infinito (k = O) os modos acústicos terão onda se propagando. Para velocidade de grupo nula, a velocidade
freqüência zero, correspondendo a translações do cristal como de fase apresenta uma grande dispersão para os comprimentos
um todo. Como foi mencionado, para À grande são possíveis mo- de onda nesta região. O intervalo -rrla < k < +rr/a (primeira zona
dos ópticos, constituindo os ramos ópticos, ativos no Raman e no de Brillouin) contém todo o espectro, todos os valores de freqüên-
infravermelho. cia se encontram neste intervalo.
O menor comprimento de onda para vibração da rede é de-
finido pela dimensão da célula unitária, a, com elas vibrando
exatamente fora de fase, de modo que À = 2a, resultando para o <O

vetor de onda k = rela. A relação de fases das células adjacentes


define uma região entre -rela e +rela, conhecida como primeira
zona de Brillouin, que contém todos os valores de freqüência.
As vibrações com k = O estão no centro da primeira zona de
Brillouin.
A propagação da onda leva em conta a diferença de fase
entre modos vibracionais em células unitárias adjacent,es. Se a
t o n/2a n/a
propagação é ao longo do eixo x, pode-se escrever: ".i k
Figura 13.1- Relação de dispersão para rede linear infinita de átomos iguais.

2re X
s = A.sen[ -À--$ ]
(13.1)
Para uma rede linear formada com dois átomos diferentes
com massas M e m, separados por uma distância a, portanto,
'
onde $ = 2revt = rnt, sendo rn a freqüência angular.
com uma distância de repetição na rede de 2a, a relação de dis-
Esta equação pode ser reescrita, de forma mais geral:
persão seria como a mostrada na Figura 13.2. A primeira zona de
Brillouin é agora definida dentro do intervalo 1k1 :;; nl2a (e não
s = A.exp[i (kx-m t)] (13.2) rela), pois a rede se repete periodicamente na distância 2a.
240 Oswaldo Sola Fundamentos da espectroscopia Raman e no Infravermelho 241

l rl
A

rl r•rl r TO(A)

• 1• 1• l •l• l TO (C)

l ! o o l ! o o l o TA(B)

·1t/2a o 1'/2a l ll l l 1l 0
6 l l TA(O)
k
Figura 13.2 - Relação de dispersão para rede linear com dois átomos diferentes.
Ver texto para definição dos pontos A, B, C e O. 1

1
• rl r • 1! b
•r TO(*)

Para o ramo acústico a freqüência máxima (k = n/2a) depen-


!
9-?w 9-?<-0 .>«l 9-7 '° • '° LO

de da massa do átomo mais pesado (ponto B), enquanto para o


ramo óptico a freqüência neste valor de k depende da massa do
átomo mais leve (ponto C J. Para k = O ocorre o valor máximo da
9-7 °' 9-7 0)
9-7 °' .> °' 9-7 o; LA

Figura 13.3 - Movimentos ondulatórios numa rede infinita (T =transversal, L =


longitudinal, O =óptico, A= acústico). As letras entre ( ) correspondem aos pontos
freqüência do ramo óptico, que depende das duas massas.
indicados na Figura 13.2. (*) corresponde a k entre Oe n/2a.
Até agora consideramos apenas ondas longitudinais. Vamos
examinar o aparecimento de ondas transversais neste modelo de
rede linear com dois átomos diferentes. Na Figura 13.3 estão es- 13.3 O método de correlação
quematizados alguns movimentos ondulatórios da rede. Note-se
o movimento das massas M (•) em (o), conforme foi discutido Este método considera a simetria local de cada átomo ou
para modos ópticos e acústicos. íon e correlaciona as espécies de simetria do grupo local com as
Para uma rede multiatômica e tridimensional o número de do grupo de espaço (grupo que contém todos os elementos de si-
modos vibracionais será maior. Se o sólido contiver agrupamen- metria do cristal). Para um determinado grupo (de ponto ou de
tos moleculares, consideram-se as vibrações entre as moléculas espaço) existem geralmente vários subgrupos contendo alguns
como um todo. Isto dá origem a modos translacionais, ou a mo- dos elementos de simetria do grupo. Para cristais que contêm
vimentos tipo rotação destes agrupamentos, sendo os últimos agrupamentos moleculares, a correlação deve satisfazer a condi-
conhecidos como modos rotacionais ou de libração; estes movi- ção de que a simetria local do centro de massa da molécula seja,
mentos constituem os modos externos. O movimento vibracional ao mesmo tempo, um subgrupo do grupo de espaço do cristal e do
dos átomos dentro dos agrupamentos moleculares dá origem aos grupo de ponto da molécula livre.
modos internos. O acoplamento entre estes agrupamentos, tendo Além destas condições, o número de sítios equivalentes deve
diferentes fases e periodicidade na rede cristalina, determina a ser igual ao número de moléculas, átomos ou íons por célula unitá-
relação de dispersão, produzindo novos modos ópticos. ria. Por exemplo, para a calcita encontra-se nas tabelas a correia-
242 Oswaldo Sala Fundamentos da espectroscopia Ramon e no infravermelho 243

ção de D 3d com as simetrias locais D/2), c,pl, C3(4), C,(6) e C2 (6); a, pode ser determinado pela relação
entre ( ) é indicado o número de sítios equivalentes que têm a par-
ticular simetria local. Para o carbono, que é o centro de massas do
C0, 2·, haverá as possibilidades D, e C3" pois só há duas moléculas
por célula unitária. Como C 3i não é subgrupo do íon livre, a cor-
relação deve ser feita com D 3• Do mesm.o modo, para os oxigênios onde o somatório é para as espécies" (grupo de fator) correlacio-
(6 átomos na cela unitária) a correlação, entre Ci(6) e C,(6), deve nadas com a espécie y do grupo local.
ser com C~" pois eles não se situam em centros de inversão. Para O número de vibrações no cristal, para a espécie ,, é dado
o íon de cálcio, que se localiza no eixo 8 6 e no centro de inversão por a, = I:a,.. Os aY são os coeficientes que aparecem nas represen-
entre dois grupos C0,2-, como há dois íons por célula unitária, tações de cada sítio.
entre D,(2J e C3,(2), a correlação recai evidentemente em C,,"" 8 6 . Aplicaremos este método na análise do cristal de calcita.
Tabelas de correlação podem ser encontradas em vários li-
vros, por exemplo, Fateley et a!., 1972. Para aplicar o método são
necessárias informações cristalográficas (por exemplo, Wyckoff, 13.4 Análise da calcita pelo método de
Crystal Structures, Interscience Publishers, Inc.) e o conhecimen- correlação
to da simetria local de cada átomo e/ou do centro de gravidade de
agrupamentos poliatômicos (ver Henry & Lonsdale, International A calcita, uma das formas cristalinas do carbonato de cálcio ,
Tables for X-Ray Crystallography, The Kynoch Press). pertence ao grupo de espaço D',w isomorfo com o grupo de ponto
Veremos o método de correlação usando como exemplo o cris- D 3d' sendo a célula unitária de menor volume um romboedro com
tal de calcita, sendo conveniente definir primeiro alguns termos duas moléculas por célula unitária (Z=2). Vimos que a simetria
que serão utilizados: local do agrupamento CO 32· é D,!:!' a do íon de cálcio é S 6 e a doº;::o
átomos de oxigênio é C 2• Para o átomo de carbono, localizado no
ti = número de translações na espécie y do grupo local, ob-
centro de massa do grupo CO 2· a simetria local é tambe'm D
tido das tabelas de caracteres (número de componentes 3 ' ' ' 3·
Aplicaremos o método para cada conjunto de átomos equivalen-
Tx, TY ou T~na espécie considerada);
tes, para obter a representação do cristal.
R1 = número de rotações (Rx, RY ou R) na espécie y do grupo
Das tabelas de correlação para D3d temos:
local;
n = número de átomos (íons ou moléculas) num conjunto
equivalente; D,, s, e, D,
fY = número de graus de liberdade vibracional na espécie de
Ai, Ag A Ai
simetria y do grupo local; fY = n-t1 Ag B
A,, A,
f1R =número de graus de liberdade rotacional na espécie y;
Eg Eg A+B E
f'tR::::: Il·RY;
Aiu Au A A1
a y = contribuição da espécie y (grupo local) para a espécie "
A2n Au B A,
do grupo de fator;
Eu E u A+B E
c, = degenerescência da espécie 1 do grupo de fator;
244 Oswaldo Sala Fundamentos da espectroscopia Ramon e no infravermelho 245

Na célula de Bravais há dois átomos de cálcio equivalentes, Existem dois átomos de carbono equivalentes, n = 2, e a es-
n = 2. O grupo 8 6 tem quatro espécies de simetria, A<, E,, Au e Eu; pécie A 1 não contém componentes de translação, não sendo neces-
somente nas últimas duas comparecem componentes translacio- sário considerá-la na correlação. Neste exemplo, a representação
nais. Assim, tY;:::: O para as espécies Age Eg, que não contribuirão; e é a mesma que se obteria para o centro de massa do agrupamento
somente as espécies Au e E u devem ser consideradas na correlação C0 32·, que coincide com o átomo de carbono.
que segue:
C (ou CO,"J
Ca2 +
(S,J (D,,) (D,) (D,)
n tY fl y correlação 1: e, a,= LaY n tr fl y correlação 1: c a = Ea1
2 1 2 Au A,u 1 1+0 = 1 2 1 2 A,
' '
A,< 1 l+O = 1
(T,l
========= A2u 1 1+0 = 1 (T,)
--------------- A2u 1 1+0 = 1
2 2 4 Eu -----~ 2 0+2 = 2
2 2 4 E E 2 O+l = 1
(T,,TYJ '
[' CA. ;:::: lAlu + 1A2u + 2Eu
(T ,T)
' y
========= Eu 2 O+l = 1

r 0 = 1A2, + 1A2u + lE< + lEu


Na coluna dos a , o primeiro termo da soma se refere à con-
tribuição da espécie Àu (do grupo 8 6 ) e o segundo à da espécie Eu. A representação para os modos vibracionais do cristal (en-
Para o oxigênio, existem seis átomos equivalentes na célula volvendo modos externos e internos) será dada pela soma das
unitária, n = 6, e a correlação fica: representações obtidas:
o
(C,J (D,d)
A representação para os modos acústicos (translações da cé-
n tY fl y correlação 1: c a = I:aY
' ' lula unitária) é obtida diretamente da representação das transla-
6 1 6 A A,g 1 1+0 = 1
ções, dada na tabela de caracteres do grupo D3d:
(T,J A,u 1 1+0 = 1

Eg 2 1+2 = 3
Eu 2 1+2 = 3 A representação para os modos tipo translação é obtida so-
mando as representações das translações do íon de cálcio, do cen-
6 2 12 B A2g 1 0+2 = 2
tro de massa do C0,2 • e subtraindo a representação dos modos
(T ,T) Azll 1 0+2 = 2
' y acústicos (se o centro de massa não coincidisse com o átomo de
r Ó =lAlg +1A 1 +2A
A~g
+2A2U +3E,+3Eu
\1
carbono, teríamos de calcular sua representação):

Observa-se em E g e E u a contribuição, em a_,• das espécies A e B. rT =r0 a +r00; ,-arc = 1A1u +1A2g +1A2u + lEg +2E u
246 Oswaldo Sala Fundamentos da espectroscopia Ramon e no infravermelho 24 7

Para obter a representação dos modos internos (vibrações Um caso que pode ocorrer é a correlação do tipo E u com 2Au'
correspondentes ao íon C0 3 2- livre) precisamos obter a represen- como sucede entre D3, e o subgrupo Cr É útil examinarmos este
tação dos modos tipo rotação (libração), írnv e subtraí-la da repre- exemplo. Pelas tabelas de correlação temos:
sentação do cristal, juntamente com a r T e r ac' A representação
para rotação é obtida pela correlação: Au
Au
(D,) CD sal
n RY ft
R
y correlação 1 c1
a =La y
1

2 1 2 A, Azg 1 1+0 = 1

2 2
(R,)
4 E
-====== A,"
Eg
1

2
l+O = 1

0+1=1
Somente na espécie A" comparecem componentes de translação,

CR,,R,l Eu 2 0+1=1 n tr ft correlação a= La

r rot = 1A2g + 1A2u + lE g + lE u


--------------- 2 3 6
c,
1
1

l+O = 1
"/

1 1+0 =1
A representação para os modos internos será: 2 l+l =2
2
í int -
- í cristal
- í T
- í ac
- r rol = lA lg + lAlu + lA2g + lA.L~\1 + 2Eg
+ 2E"
E u está correlacionado com 2Au , como se houvesse duas es-
São ativas no Raman as espécies A 1g e Eg, e ativas no infra- pécies Au, cada uma correlacionada normalmente com Eu. Assim,
vermelho as espécies A2u e Eu. no lugar da degenerescência 2 para E u ela é contada duas vezes ,
Estes resultados estão resumidos na Tabela 13. L como mostra a chave. Do mesmo modo, para a deve ser conside-
'
rada a contribuição de cada A", os dois termos na soma indicando
Dsa N Tac T R n atividade as duas correlações com Au.
A,g 1 o o o 1 Uxx +ayy,au

Aiu 2 o 1 o 1
A,g 3 o 1 1 1 13.5 Espectros Ramon do monocristal de calcita
4 1 1 1 1 T,
A:.:iu
orientado
Eg 4 o 1 1 2 (a"" -aYY' axy),(axz,ay~)
E" 6 1 2 1 2 (T" T1 )
O eixo óptico da calcita está na direção da linha que une os
N =número total de modos vibracionais do cristal
vértices mais afastados do romboedro e define o eixo z do referen-
T, = número de modos acústicos
T
0

= número de modos externos tipo translação cial situado no cristal. Devido à degenerescência, os eixos x e y
R = número de modos externos tipo rotação são arbitrários, sendo os três eixos mutuamente ortogonais.
n = número de modos internos {do íon C0 32 -) Os tensores das derivadas da polarizabilidade podem ser
Tabela 13.1-Análise do cristal de calcita escritos
248 Oswaldo Sala Fundamentos da espectroscopia Ramon e no infravermelho 249

a c O OOd de deformação de ãngulo. O modo de estiramento, 1434 cm-1, não


A1,=
ªºº
OaO E, = c -a O e OOe é mostrado na figura. A banda em 1088 cm- 1 é atribuída ao modo
de estiramento simétrico A 1g.
OOb O 00 d eO

e comparados com a Tabela 13.1. y


Utilizando a notação introduzida por Porto, Giordmaine &
Damen (Phys. Rev., v.147, p.608, (1966)), por exemplo, x(yz)y, onde, y(zz)x
na ordem escrita, o primeiro símbolo indica a direção da radia-
ção incidente; entre parênteses são mostradas, respectivamente,
a polarização da radiação incidente e da espalhada (corresponde
X
ao componente ay) e o último símbolo mostra a direção de ob-
servação. Neste exemplo, a direção do feixe incidente sendo x, é z
possível obter, para um mesmo posicionamento do cristal, espec-
tros para os componentes da polarizabilidade ayz e azz' variando y
a orientação do campo elétrico incidente com uma lãmina de V2.
y(xz)x
Do mesmo modo, variando de 90º o polaróide analisador, teremos
as medidas para aY, e a"'. Para esta posição do cristal pode-se ob-
ter os espectros para os componentes a yz , a yx , a zz e a zx . Para outras
X
medidas, é necessário mudar a orientação do cristal.
z
Pelos tensores de polarizabilidade nota-se que os componen-
tes ª= e aYY comparecem tanto na espécie A 1g com.o na Eg. Assim,
y
nestas duas medidas devem aparecer as mesmas bandas, embora
com intensidades diferentes. O espectro para o componente azz y(xy)x
é decisivo para determinar as bandas de espécie A 1g, do mesmo
modo que os espectros nas orientações para as componentes xy,
xz ou yz definem as bandas de espécie Eg' 'li VI 'i/ X
Os espectros mostrados na Figura 13.4 ilustram o que foi dis- z
1088
cutido, estando o eixo óptico na direção z. São observados tanto
modos internos como externos. Para y(zz)x só é observada uma z
banda, em 1088 cm- 1 , de espécie A,,. Para y(xz)x e y(xy)x os espec-
tros mostram três bandas, 156, 283 e 714 cm- 1, que pelas razões y(xx)y
expostas são atribuídas à espécie Eg' Para z(xx)y são observadas as 714
283
quatro bandas, pois o componente ª""é comum às espécies A 1, e E, --!\__-~
Pela Tabela 13.1, são esperados na espécie E g dois modos y
1200 100
internos e dois externos. As bandas em 156 e 283 cm· 1 são atribuí- cm· 1 X

das a estes modos externos, movimentos tipo translação e tipo Figura 13.4 - Espectros Raman de monocristal de calcita nas orientações
rotação, respectivamente. A banda em 714 cm- 1 é o modo interno indicadas.
250 Oswaldo Sala

Concluindo, os espectros Raman de monocristais permitem


a atribuição correta às espécies de simetria, através dos compo-
nentes da polarizabilidade que comparecem na representação de
cada espécie. A descrição correta dos movimentos, contudo, só
pode ser obtida pela distribuição da energia potencial através da Apêndice 1
análise de coordenadas normais do cristal, embora em certos ca-
sos uma descrição aproximada possa ser óbvia.

Exercícios
13.1 Discuta os resultados mostrados na Figura 13.4, para
o espectro da calcita, em termos de medidas de polarização e da
polarizabilidade.

13.2 Determine a correlação entre as freqüências funda-


mentais do CH1 e do CH3 Cl. (Sugestão: o método de correlação
Em vanos problemas é conveniente utilizar, em vez das
pode ser empregado em vários problemas, por exemplo, na subs-
tituição de determinados átomos por outros, na molécula. Isto coordenadas cartesianas, outros tipos de coordenadas, como por
acarreta mudanças de simetria e as novas espécies de simetria exemplo, substituindo x por x = reasa, com r = (x'+y2 )V2. Em ou-
podem ser correlacionadas com as originais através das tabelas tras palavras, podemos utilizar coordenadas que tornem mais
de correlação (neste caso entre T d e C3 ) . simples a descrição da posição ou do movimento de um corpo;
pode-se incluir nestas coordenas condições de restrições de movi-
mento, como a condição do corpo se mover somente num plano, ou
Literatura recomendada
excluir movimentos, como os de rotação ou de translação.
BLAKEMORE, J. S. Solid State Physics. Saunders, 1969. Estas novas coordenadas, denominadas "coordenadas ge-
DEC!US, J. C., HEXTER, R. M. Molecular Vibrations in Crystals. neralizadas", podem ser relacionadas com as coordenadas car-
McGraw-Hill, 1977. tesianas ou outro tipo de coordenadas, como os vetores de posi-
FATELEY, W. G., DOLLISH, F. R., McDEVITT, N. T., BENTLEY, F. ção. Utilizaremos estas coordenadas para escrever as equações
F. Infrared and Raman Selection Rules for Molecular and Lattice de movimento vibracional e obter as eqnações de Lagrange e as
Vibrations: The Correlation Method. John Wiley & Sons, 1972. equações de Hamilton.
HAWTORNE, F. C. (Ed.), Reviews in Mineralogy - Spectroscopic Methods A energia cinética para uma molécula com N átomos pode
in Mineralogy and Geology. Chelsea, Book Crafters, 1988, v.18.
ser escrita em coordenadas cartesianas de deslocamento:
NAKA.M:OTO, K. Infrared and Rarnan Spectra o{ Inorganic and
Coordination Compounds. John Wiley & Sons, 1986.
SHERWOOD, P. M. A. Vibrational Spectroscopy of Solids. Cambridge T= ~2 I
i
m
'
((d~x,
dt
)' + (dAy, )' + (d~z, )')
dt dt
University Press, 1972.
252 Oswaldo Sala Fundamentos da espectroscopia Ramon e no infravermelho 253

Uma maneira conveniente de escrever esta equação é in- A energia cinética pode ser expressa em termos do momento
troduzir as coordenadas generalizadas contendo as massas dos linear, em vez da velocidade, usando ainda as coordenadas ge-
átomos (coordenadas cartesianas ponderadas): neralizadas. Vamos determinar as equações de movimento em
função das coordenadas qi e das coordenadas do momento linear,
q, = .Jffi,m:,, q2 = .Jffi,/ly 1' q3 = .Jffi,Az 1 ' Pi' associadas às coordenadas q;.
q,=~flx 2 , q,=~lly,, qe=~b..Zz, A derivada da energia cinética em relação à velocidade for-
nece o momento linear:
q7 = ~t...x,, q,=~lly,, q, = ~t...z,, etc.
d
dv (fmv2) = mv = p
de modo que a energia cinética toma a forma:
1 'Ç"'·
__ 3N
2
T - L,,q ficando a derivada da função de Lagrange em relação a q 1:
2 i=l 1

ilL =P
A energia potencial: aqi ' (AI-3)

que é o momento associado à coordenada q,. Desta equação e da


(Al-2) resulta:

(AI-4)

Diferenciando L(q 1, q,) e substituindo pelos valores em (Al-3)


Nesta expressão a constante de força contém a dimensão de e (AI-4):
(massa)" 1, devido à dimensão das coordenadas generalizadas que
definimos.
Da expressão de T e V pode-se escrever a equação de Newton
"'[ºL
dL = L,,
i
---dq,
oqi
õL) L(.
+-.-diJ =
8qi l i
Pdq + Pdq )
l 1 1 1
(AI-5)

já envolvendo a lei de Hooke (no termo àV/oq):


Considerando a igualdade
_![ªT)+ av =O (i = 1, 2, .. .,3N) (AI-1)
dt ili], àq, d(LP,q)= L(iJ,dP, +P,dq,)
i

que é a equação de Lagrange quando T é função só de q e V é


e subtraindo da mesma, membro a membro, a expressão (Al-5)
função só de q.
temos:
Introduzindo a função de Lagrange L = T-V, esta equação
pode ser escrita: d(LP,q,)-dL= L(iJ,dP, +P,dq, -P,dq, -P,dq,) ou
' ' (Al-6)
_!( oL )- aL _O (i = 1, 2, .. .,3N) dCLPA, -Ll=L(iJ,dP, -P,dq,)
dt ili], àq, (AI-2)
' '
254 Oswaldo Sala

A expressão

(AI-7)

é conhecida como hamiltoniano do sistema; de (AI-6) temos Apêndice li


dH= I(<i.,dP, -P,dq,)
i

que pela definição de derivadas parciais fornece:


ilH . aH ·
~p =qi e -=-P (AI-8)
o i aqi 1

que são as equações de movimento de Hamilton. Se as forças de-


rivam de um potencial, temos H = T+V.
As equações de movimento ficam determinadas a partir das
expressões: O objetivo deste apêndice é obter as expressões das funções
de onda e dos autovalores da equação de Schrõdinger, para o pro-
e V=~IIfijqiqj blema vibracional de moléculas diatômicas. No capítulo 2 obtive-
' J
mos para esta equação a expressão:
sendo 2 2
d ':fl
+ 2µ (E_ kq J':fl =O
. =ºH=EJT =" 1 p dq 2 n2 2
q, EJP. "P. ~g .i .i
l o 1 J ou:

que pode ser escrita na forma:


d''f'
- + (~ - a 2 q 2 )'1' =O (AII-1)
dq 2
2 E 1i 2 R
onde: ~ = _l1._ (ou E=-~) e a= /µk
2
li 2µ fi1
Vamos efetuar algumas mudanças de coordenadas, para
transformar esta equação numa equação diferencial de solução
conhecida, a equação de Hermite.
256 Oswaldo Sala Fundamentos da espectroscopia Ramon e no infravermelho 257

2
Fazendo x = f;;q, ou dx = f;;dq teremos
---2-x-u+ux ') + (13
--x') u=O
( ddxu2 du
dx a
d'!' = d'!' dx = d'!' ra e
dq dx dq dx
2 2
(AII - 4)
2
d '!' = _e!_ (d'!'
dq 2 dx dx
ra) dx = _e!_ (a d'!') = a d '!'
dq dx dx dx 2
2 d u _ 2 du x _ u) + (l)u = d u _ 2 du x
( dx 2 dx a dx 2 dx

A equação (AII-1) fica:


2
d '!' 1 d''l' + (13 Portanto, para u(x)exp(-x 2/2) ser solução da (AII-2), u(x)
--aq ) 'l'=O
2 2 2
--+-(13-a q )'l'=--.
dx 2 a dx 2 a deve satisfazer a equação (AII-4). Esta equação, conhecida como
equação de Hermite, pode ser escrita, fazendo v = CWa-1)/2:
Lembrando que aq 2 = x 2 ,

d''!'+
dx 2 a
(1- x')'l' =O CAII-2)

d2u
dx 2
du
---2x-+2vu=O
dx
(AII-5)

Considerando a equação d 2'!'/dx2 = x 2'l', ela terá solução onde v é um número inteiro.
aproximada do tipo '!' = c · exp(-x2/2), obtendo-se d 2'l'/dx2 = li'J3
c. (x2-l) exp(-x2/2) = (x2-l)'l'; para x grande pode-se desprezar o Escrevendo j3 = a(2v+l) e lembrando que E=-, resulta a

1 em (x2-l). A equação considerada tem a forma da (AII-2), assim, quantização da energia do oscilador harmônico, sendo a expres-
podemos considerar como sua solução são para os autovalores:

'!' = u(x) ·e 2 (AII-3)


li'
E= -a(2v

+ 1) = -;, ~
2
nl
l',-C2v + 1) = - -(2v + 1)
2µ fj 2 fl
Derivando esta equação:
=~
2n yµ
fk.(v+.!:.)
2
d'!' du 2 2
-=-·e -ux·e e
dx dx
onde v corresponde ao número quântico vihracional.
x' du x2 x2 x2 x2 A equação de Hermite é resolvida pelo método de série de
d 2 '!' d 2 u du x . e -2 - u. e -2 + ux2 . e
- -2= - - 2· e 2 --x·e 2 - 2
potências, com solução geral:
dx dx dx dx

Substituindo esta expressão em (AII-2):

J''()
2
d u du -- 13 2 -- onde u, (x) e u,(x) são polinômios contendo somente termos pares
---2-x-u+ux2
2 ·e 2 + --x u·e x2 =0
( dx 2 dx a ou termos ímpares, respectivamente.
258 Oswaldo Sala

Estes polinômios, conhecidos como polinômios de Hermite,


H/x), têm a expressão geral:

2 dv 2
H (x)=(-l)vex -(e-x)
v dxv
Apêndice Ili
=(
2x)v v(v -1) (2 xr_ 2 + v(v-l)(v-2)(v-3) (2 xr '-...
1! 2!

com H 0(x) = 1, H 1(x) = 2x, H 2(x) = 4x2-2 etc.


Conhecidos H 0(x) e H 1(x), pode-se obter os demais valores,
pela relação:

Resumindo, a equação de Schrõdinger foi modificada, por


transformações de coordenadas, de modo que tivesse forma idên-
tica à equação de Hermite (AII-5), sendo u(x) igual a H/x). A fun-
O operador hamiltoniano para o rotor rígido, em coordena-
ção de onda CAII-3) (sem o fator de normalização N), fica:
das cartesianas, tem a forma:

2
H=-~V'
u 2/ 2/ 2µ
As expressões H 0 (x)· e _x;,, H 1(x)· e _x 12 , H 2(x)·e _x 12 etc., mul-
tiplicadas pelos respectivos fatores de normalização dão as for-
Em coordenadas esféricas ele pode ser escrito:
mas das funções de onda representadas na figura 2.1, capítulo 2.
2
1J [ -
H=-~ i -
2
a (r , - a J+ i a (sen8 a- J
2µ r 8r or r 2sen8 il8 88
CAIII-1)
2
1 a J
+ r 2 sen2 8 o<p 2

Na aproximação do rotor rígido, r constante e o termo com


~ pode ser desprezado:

rz' i [ i a( aJ
H = - 2ft ~ sen8 88 sene 88 + sen 28 8<p 2
i a' J
260 Oswaldo Sala Fundamentos da espectroscopia Ramon e no infravermelho 261

Introduzindo o momento de inércia, I = µr 2 , a equação de A equação (AIII-5) tem solução do tipo ct>( cp) =e. e~"~" (M =
Scbrõdinger fica: inteiro), que normalizada resulta em:

_l_~(sen8 8'1') + _1_ 8 '1' + 2IE <'!> ±M(cp) =~.e±"'•


2
'í' = 0 (M = O, 1, 2, ... ) (AIII-7)
2 (AIII-2)
sen8 88 86 sen 2 8 élcp 2 /j

Lembrando, do capítulo 3, que E= Im 2/2, ou (Iw)2 = 2IE, pode-


multiplicando esta equação por sen2 6 e procurando uma solução
tipo'!'= 0(8) · ct>(cp), lembrando que mos sub shtmr 2IE por J(J + l) , na equação (AIII-6):
. . p:2

2
e -1- - él ( sen8-
80) ---0+J(J+l)0=0
M (AIII-8)
sane 88 88 sen 2 8

a solução, já normalizada, desta equação é a função associada de


Legendre:

a CAIII-2) fica: 0 (8)= 2J+l. (J-IMIJ! .p"l(cos8) (AIII-9)


J,M 2 (J + IMIJ! J
a (sene-
ct>·sen8- a0) +0·--+sen
a'<'!> 2 2IE
8--·0<'!>=0
ae õ8 acp 2 li' onde PJM1(x) é o polinômio associado de Legendre de grau J e or-
dem M:
Dividindo esta equação por 0ct>: , eJ'"112 d·"I"
pl"lccos8) = (1 - cos ---J~IM7I (cos 8 -1)' (AIII-10)
2 1
2JJ!
- -a
- (sen8-
2 .J
d(cos 8) +
sen8
- 80) +--sen
2IE 2 1 8 <'!>
8=--·-- CAIII-3)
0 e8 ae n 2
<'!> acp 2 A função de onda total do sistema fica, portanto:
Sendo o primeiro membro da (AIII-3) função só de 8 e o se- 'í' = 0.J,+Mcei ·<'l>+MCcpl = YJ,,Mce,cp):
gundo membro função só de <p, podemos igualar cada membro a
uma constante, M 2 , resultando as equações As contribuições da parte e da função de onda (polinômios
associados de Legendre) e da função <P, são mostradas para al-
- - -a
sene - (sen 8 -80) +--sen
2IE 28 = M' CAIII-4) guns valores de J e M, na tabela que segue:
0 ae ae 1i2 J= O, M= O (><)0,0 = -.,'~ ct> -
o-
1
../'2.rt

a'<'!>= -M'ct> (AIII-5) J= 1, M =O 0 1, 0 = Jf cose <'!> O -- 1


,J2n
élcp'
J = 1, M = ±1 e 1,±1 = .}tsene <'!> 1 = b- exp(±i<p)
,,,
8
Multiplicando a (A!II-4) por :
J = 2, M =O 0 2, 0 = jfC3cos 2 8-1) c'l>o =
sen 2 e 1
\12"

2 J = 2,M =±1 0.2,_l


+ = Jlfsen8
4 cose <'!> 1 = \',1,...exp(±i<p)
2Jt
-1 80) +2IE
- - ô- ( sen8- - 0 - -M
- 0 =O (AIII-6)
sen0 ae ae n2 sen2 8 J = 2, M =±2 02,±2 = 1*sen e 2 <'!> 2 = b- exp(±2icp)
y2rc
262 Oswalda Sala Fundamentos da espectroscopia Ramon e no infravermelho 263

A função YJ,M (valores mostrados nas equações (3.4) no capí- Com estes resultados pode-se mostrar que para J par as fun-
tulo 3), que representa a função de onda total, é conhecida como ções de onda serão pares. Por exemplo, para J = 2 e M = O, ±2 as
harmônica esférica, sendo dada pelo produto dos valores corres- funções contêm cos2 e, sen 2 e, ou exp(2icp), que são funções pares. A
pondentes de 8 e <!> da tabela anterior. Como exemplo: função de onda total será par, pois só envolve funções pares. Para
J = 2 e M = ±1 a função de onda contém o produto sen8·cos8 (que
'Yoo =+· v2
,,i_
v2n
=~
2,J-. é função ímpar) e o exp(icp), que também é ímpar, resultando uma
'P10 = ficosS·-'-=.1
V2 f2:; ficosS
21)--;
função de onda par.
Para J ímpar as funções de onda serão ímpares. Como exem-
'!'11 = {fsene · ~:, exp(±icp) = t/ksen8 · exp(±icp)
plo, J = 1 e M = O, a função de onda depende de cose que, como
2 2 vimos, é ímpar. Para J = 1eM=1 aparece o produto de sen8 (par)
'!'22 = {[sen 8 ·},;; exp(±2icp) = +J*sen e · exp(±2icp)
e exp(icp) (ímpar), resultando uma função de onda ímpar.
Podemos verificar as propriedades de simetria destas fun-
ções de onda. Para isto, vamos examinar primeiro a simetria das
funções cos8, sene e exp(icp), lembrando que 8 é definido no inter-
valo de O a rr e cp no intervalo de O a 2rr. Pela figura que segue,
vemos que cos (e + rr) = cos (rc - 8) = -cose, ou seja, a função cose
é ímpar. Para a função sen8, vemos que sen(8 + n) = -sen(rr - 8) =
sene, ou seja, a função sene é par.
Como exp[i(cp + rc)] = exp(icp)·exp(in) = exp(icp)(-1) = - exp(icp),
temos que a função exp(i<p) é uma função ímpar. Portanto, o
exp(2icp) = exp(icp)exp(icp), produto de duas funções ímpares, é
função par.

rr-0
Apêndice IV

A intensidade das bandas no efeito Raman é muito pequena,


assim, qualquer fenômeno que intensifique o espectro se torna
extremamente importante. Neste apêndice serão apresentados,
de forma resumida, dois processos de intensificação, o efeito Ra-
man ressonante e o efeito Raman intensificado por superfícies.

l) Efeito Ramon ressonante

No efeito Raman ordinário, a radiação excitante possui ener-


gia bem menor do que a necessária para ocorrer uma transição
eletrônica na molécula. No capítulo 2, no esquema da figura 2.3
o estado intermediário está longe do nível de energia do primei-
ro estado eletrônico excitado. Caso contrário, se a radiação exci-
tante se situar na região de uma banda eletrônica, pode ocorrer
o efeito Raman ressonante, onde alguns modos vibracionais
sofrem drástica intensificação, havendo a possibilidade do apa-
recimento de harmônicas com intensidade apreciável. Os valores
das freqüências vibracionais não sofrem alteração, pois envolvem
somente a diferença de energia entre o estado inicial e final do
estado eletrônico fundamental.
266 Oswaldo Sala Fundamentos da espectroscopia Ramon e no infravermelho 26 7

A intensidade Raman depende do quadrado do módulo espectro de absorção eletrônico deste íon mostra duas bandas,
do componente do tensor da polarizabilidade desta transição, uma bastante intensa em 522 nm, envolvendo o grupo NO,, e
1(a PG ) nm 2, onde m e n representam o estado final e inicial, res-
l
outra menos intensa, em 386 nm, envolvendo orbitais do gru-
pectivamente, e p e a são x, y ou z. Este tensor pode ser escrito: po N;. Para excitação em 363 nm observa-se intensificação de
uma banda em ca. 1470 cm· 1, característica do cromóforo N,· (não
observada com excitação em 514 nm), ao passo que para excita-
ção em 514 nm há intensificação de uma banda em ca. 1320 cm· 1 ,
onde as integrais representam os momentos de transição; ~LP e µcr característica do grupo cromóforo N0 2 (não observada com exci-
são componentes do momento de dipolo e atuam somente na par- tação em 363 nm). Para a radiação em 64 7 nm, longe da região
te eletrônica; v•m e v0 são as freqüências da transição eletrônica e de absorção (portanto fora da ressonância), observa-se o espectro
da radiação excitante, respectivamente; e 1, é um fator de amor- Raman normal, com intensidade muito pequena.
tecimento relacionado ao tempo de vida do estado Ir). O somató-
rio é sobre todos estados vibrônicos da molécula. O numerador
do primeiro termo entre colchetes corresponde, no esquema da
Figura 2.2, à passagem do estado inicial jm) ao estado interme-
diário jr), seguida da passagem deste estado intermediário para
o estado final jn). Quando v0 " v,.m• o denominador do primeiro
termo diminui e o termo aumenta, acarretando grande aumen- [1, 3-bis-(4ni trofenil)triazen o]
to de (a pcr )mn , produzindo intensificação Raman. Nesta condição (PNFTf
o segundo termo se torna desprezível em relação ao primeiro e
não precisa ser considerado. Esta intensificação, que pode ser da
ordem de 105 , depende não só do denominador, mas também do
numerador, com alguns termos no somatório podendo ter contri-
buição muito maior. Uma análise mais completa da expressão
(All-1) deve ser feita para prever quais bandas apresentam efeito
Raman ressonante. Uma publicação muito clara sobre este as-
sunto é a de Clark e Dines (R.J.K. Clark & T.J. Dines, Angew.
Chem. Int. Ed. Engl., v. 25, p. 131, 1986).
Como exemplo do efeito Raman ressonante, mostraremos
uma molécula com dois cromóforos, o íon PNFT', cujos espectros
Raman em solução básica de metanol, para as radiações excitan-
tes indicadas, são mostrados na Figura IV-1 (Rômulo A. Ando,
Dissertação de Mestrado, IQUSP, 2005). Nota-se, nos espectros
Figura IV-1 - Espectros Raman obtidos com as radiações indicadas; *banda do
Raman, a variação de intensidade com a excitação em compara-
padrão. A variação de intensidade evidencia a dependência da intensificação res-
ção à banda normalizada do padrão (1036 cm· 1 , do metanol). O sonante com o comprimento de onda da radiação, para os dois cromóforos.
268 Oswaldo Sala Fundamentos da espectroscopia Ramon e no Infravermelho 269

Na aproximação de Born-Oppenheimor, os estados vibrôni- feita se a diferença entre as freqüências vibracionais do estado
cos podem ser escritos como produtos dos estados vibracionais eletrônico fundamental e do excitado for grande, o que implica
puros e dos estados eletrônicos puros: superfícies potenciais de forma diferente ou em deslocamento
entre os poços de potencial, ao longo da coordenada Qk. Isto fica
lm) = lg)]i), ln) = lg)lf), Ir) = le)lv), claro no seguinte diagrama, onde estão representadas as curvas
de energia potencial do estado fundamental e de um estado ele-
onde lg) é o estado eletrônico fundamental, le) é um estado eletrô- trônico excitado, para quatro casos:
nico excitado, li), lf), lv) são estados vibracionais.
Na condição de ressonância, a equação (AIV-1) pode serre-
escrita desprezando o segundo termo:
V V V V
(AIV-2)
V V V V
(a) (b) (e) (d)
Albrecht (A.C. Albrecht, J. Chem. Phys., v.34, p.1476, 1961)
Diagramas de energia potencial
desenvolveu a expressão da polarizabilidade, para o espalhamen-
to Raman ressonante, numa série que pode ser escrita como a
No caso (a), no estado eletrônico excitado a molécula con-
soma de três termos: serva a mesma geometria do estado fundamental, os dois poços
potenciais são iguais e as funções de onda são ortogonais, anu-
(a pcr)"..
,g1 =A+B+C
lando a integral de recobrimento; o termo A se anula, não con-
sendo o termo A dado por: tribuindo nem para modos simétricos nem para anti-simétricos.
No caso (b) as funções de onda não são ortogonais e as integrais
de recobrimento não se anulam, tanto para modos totalmente si-
métricos como não-simétricos. Os casos (c) e (d) se aplicam aos
modos totalmente simétricos, sendo o último o mais importante.
Nesta expressão comparecem os momentos de dipolo de Para o iodo ocorre o caso (d) e, pelo fator de Franck-Condon, deve-
transição 'f"'pge
(•, )º e (µ oeg'
)º e as integrais de recobrimento.
(fator de se esperar intensificação das harmônicas comparável à do modo
Franck-Condon) ' < f g 1 ve >e< ve 1 i g >, que devem ser diferentes de fundamental.

r
zero, pelo menos para um valor de v, para o termo A contribuir O termo B, no tratamento de Albrecht, contém o acoplamen-
na polarizabilidade, Isto significa que a transição eletrônica res-
sonante deve ser permitida por dipolo elétrico, implicando uma to vibrônico h:, entre dois estados le> e Is>. hZ, =(eº ( :~ s 0 ),
banda de absorção intensa, como a de transferência de carga ou
do tipo 1I-Jt*. sendo leº) e Isº) estados eletrônicos na configuração de equilíbrio
Para as integrais de recobrimento não se anularem, as fun- do estado fundamental; a intensificação depende do grau deste
ções de onda não podem ser ortogonais. Esta condição fica satis- acoplamento, das integrais de recobrimento e da separação ii.v
"
2 70 Oswaldo Sala Fundamentos da espectroscopia Ramon e no infravermelho 2 71

entre estes estados. O termo B é em geral menor do que o termo Jeanmaire e Van Duyne mostraram que o fator de intensifi-
A, e tanto os modos totalmente simétricos como não simétricos cação observado era muito maior do que o esperado pelo simples
podem ser intensificados. aumento da área; enquanto o espectro da piridina era intensi-
O termo C de Albrecht envolve acoplamento vibrônico entre ficado por um fator de ca. 105 , a contribuição por aumento de
o estado eletrônico fundamental e um estado excitado não resso- área, avaliada eletroquimicamente, seria apenas de uma a duas
nante. Sua contribuição é pequena, pois em geral a diferença en- ordens de grandeza. Era evidente que havia outro mecanismo de
tre o estado fundamental e estados excitados é grande, tornando intensificação, mais importante do que o simples aumento da su-
mínimo o acoplamento vibrônico. perfície pela rugosidade.
A intensificação observada no efeito SERS ocorre por meca-
nismo diferente do efeito Raman ressonante, embora também as-
2) Efeito Ramon intensificado por superfície sociado à polarizabilidade. Enquanto no efeito Raman ressonan-
te a intensificação é fortemente dependente do modo vibracional
Outro efeito de intensificação Raman é o observado em mo- (apenas alguns modos apresentam drástico aumento de intensi-
léculas adsorvidas em certas superfícies, conhecido como efeito dade), no efeito SERS geralmente o espectro todo é intensificado,
SERS (Surface Enhanced Raman Scattering). Descoberto por embora com alguma dependência do modo vibracional. A razão
Fleischmann e cal. durante uma tentativa de estudar superfícies desta diferença é que no efeito Raman ressonante a polarizabili-
através da espectroscopia Raman (M. Fleischmann, P.J. Hendra, dade é devida somente à molécula, ao passo que no efeito SERS
&A.J. McQuillan, J. Chem. Soe., Chem. Com., p. 80, 1973 e Chem. deve-se considerar o sistema molécula/superfície.
Phys. Lellers, v. 26, p.123, 1974), mas seu efeito de intensificação Há dois modelos fundamentais que buscam elucidar o me-
somente foi comprovado em 1977 (D.L. Jeanmaire & R.P. Van canismo responsável pelo efeito SERS: o eletromagnético e o
Duyne, J. Electroanal. Chem., v. 84, p. 1, 1977 e M.G. Albrecht & molecular.
J.A. Creighton, J. Am. Chem. Soc.,v.99, p.5215, 1997). O modelo eletromagnético considera a intensificação do
Devido ao fato de a densidade de moléculas adsorvidas e a campo eletromagnético próximo à superfície do metal, devido à
secção de choque para espalhamento Raman serem muito peque- ressonância do campo eletromagnético da radiação excitante com
nas, em condições normais seria extremamente difícil observar o o plasma de superfície (plasma formado por elétrons livres do
espectro Raman de monocamadas. Como a intensidade Raman metal). Como a intensidade da radiação espalhada é proporcional
depende (entre outros fatores) do número de espalhadores, os pri- ao quadrado do momento de dipolo induzido, a intensificação do
meiros autores pensaram em aumentar a área superficial eletro- campo eletromagnético causa aumento da intensidade Raman.
quimicamente, pela formação de rugosidade na superfície de um Essa teoria explica intensificações a longas distâncias e o espec-
eletrodo, aplicando vários ciclos de oxidação-redução. Isto permi- tro obtido seria semelhante àquele das moléculas em solução; não
tiria a adsorção de um número maior de moléculas e aumento se esperaria substancial dependência do fator de intensificação
do sinal Raman. Efetuando estes ciclos redox em um eletrodo de com a molécula adsorvida.
prata em solução aquosa de piridina (5xl0· 2 mo!. dm 3 ) e KCl (0,1 O modelo molecular, ou modelo químico, considera as modi-
mol.dm3 ), obtiveram o espectro da piridina com apreciável au- ficações na polarizabilidade molecular, a, geradas pela interação
mento da relação sinal-ruído. da molécula adsorvida com a superfície; essa interação pode se
272 Oswaldo Sala Fundamentos da espectroscopia Ramon e no infravermelho 2 73

dar pela formação de complexos de superfície ou através de in- empregados, como por exemplo colóides de alguns metais, filmes
terações eletrostáticas. Neste caso, o contato com a superfície é metálicos depositados em ultra-alto vácuo e outros.
essencial (intensificação de curto alcance) e os espectros obtidos Piridina e seus derivados constituem um dos grupos mais
podem diferir daqueles de soluções, seja por mudanças em inten- estudados por SERS, pela favorável relação sinal/ruído; destes
sidade relativa, meia largura, deslocamentos de freqüências, ou estudos foram verificadas: a dependência da intensidade das
aparecimento de novas bandas. Grosso modo, supõe-se que um bandas Raman com o potencial aplicado ao eletrodo, com a natu-
elétron do metal é excitado por um fóton incidente criando um reza do ânion eletrolítico, com o comprimento de onda da radia-
par elétron-vacância. O elétron é transferido por efeito túnel para ção excitante, com o modo vibracional, orientação da molécula em
um nível eletrônico da molécula adsorvida, a qual tende a adqui- relação à superfície etc.
rir uma nova configuração de equilíbrio. O elétron, voltando em Como exemplo de estudo por SERS, vamos considerar o áci-
seguida ao metal, deixa a molécula adsorvida excitada vibracio- do isonicotínico em solução aquosa, adsorvido em eletrodo de co-
nalmente. O par elétron-vacância é aniquilado, dando origem ao bre em diferentes valores de pH (L.K. Nada & O. Sala, J. Mal.
espalhamento Raman. Pelo mecanismo eletromagnético, quanto Struct.,v. 4, p. 11, 1987). Este exemplo ilustra bem a competição
mais polarizável for uma molécula, maior será sua sensibilidade pela superfície entre diferentes espécies na solução eletrolítica.
ao campo elétrico intensificado pela superfície. Este ácido apresenta três espécies em equilíbrio, com pK1 = 1, 75
O efeito SERS é registrado com maior intensidade em pra- e pR, = 4,9 correspondendo à dissociação do grupo carboxílico e
ta, ouro e cobre, apesar de ter sido observado também em outros do nitrogênio do anel protonado, respectivamente.
metais, como Pt, Pd. O tipo de superfície escolhida define a região
de comprimentos de onda da radiação excitante mais eficiente o~ /OH º"-·.-.;:P º";,.-.;-º
para obtenção dos espectros, devido ao fato de que cada metal
apresenta a absorção do plasma de superfície em uma freqüência
específica.
Este efeito depende ainda da natureza do adsorbato; molé-
culas contendo átomos de enxofre e nitrogênio, por exemplo, são
particularmente promissoras na observação do efeito. A necessi-
6 6 6
H
N,
1
N,
1
H
N

dade deste requisito é clara dentro do modelo químico, quando a


(A) (B) (C)
interação direta com a superfície depende da existência de áto-
mos ou grupos de átomos que tenham afinidade química com a
superfície. Um fato surprendente é que os espectros em -0,6 V, em meio
Experimentalmente, para se observar o efeito SERS em sis- KCl (pH 3,8), em meio HC10 4 (pH 1,17) e em meio KCl + KOH
temas eletroquímicos, é essencial ativar o eletrodo de trabalho, (pH = 8,0) são idênticos e podem ser atribuídos à espécie não
aplicando ciclos de oxidação-redução. A região de potencial apli- protonada (C), que predomina em meio alcalino, adsorvida na su-
cada dependerá do tipo de eletrodo e da solução eletrolítica. perfície. Em meio HCI (pH 1,2), para potencial -0,3 V (eletrodo
Apesar do efeito SERS ter sido largamente estudado em de calomelano saturado) o espectro é atribuído à espécie (A) e
sistemas eletroquímicos, outros tipos de superfícies podem ser para potencial -0,7 V, apesar do valor do pH, o espectro corres-
2 74 Oswaldo Sala

ponde ao da espécie (C). A análise dos resultados mostra que este


ácido é adsorvido no eletrodo de cobre via: (i) formação de par
iônico (espécie (A)/ânion especificamente adsorvido); (ii) ligação
nitrogênio-cobre (espécie (C)). Este último caso é observado para
ânion não especificamente adsorvido, em qualquer valor de pH e Apêndice V
toda a faixa de potencial aplicado, ou para ânion especificamente
adsorvido, em alto valor de pH c potenciais mais negativos; em
potencial bastante negativo os íons Cl· são dessorvidos, não ha-
vendo a formação de par iônico. Em resumo, em meio ácido (HCl,
pH 1,2) a ligação nitrogênio-cobre predomina em relação à liga-
ção carboxilato-cobre. A mudança drástica da espécie (A) para (C)
em potencial mais negativo indica que o nitrogênio não protona-
do é adsorvido preferencialmente no eletrodo. Em potencial mais
negativo a espécie (A) é dessorvida e a (C) adsorvida, causando
deslocamento do equilíbrio no seio da solução até atingir um re-
cobrimento adequado do eletrodo. No capítulo 6 foi visto que, para obter a representação da
O uso combinado do efeito Raman ressonante e do efeito polarizabilidade usando a equação (6.5), é necessário conhecer
SERS resulta no efeito SERRS (Surface Enhanced Resonance os caracteres da representação redutível, obtidos das equações
Raman Scattering), o qual permite que espectros possam ser (6.6). Estes podem ser deduzidos a partir das expressões para
obtidos em concentrações da ordem de nanomolar, uma vez que transformação de coordenadas, para operações próprias e impró-
os fatores de intensificação de cada efeito se somam. Esse efeito prias, considerando que os índices nos componentes da polariza-
ocorre quando o espectro SERS é excitado por uma radiação den- bilidade obedecem a essas transformações. Assim, por exemplo, 0
tro da banda de absorção da molécula. componente a "Y é transformado em a 'Y, ,, com as coordenadas x' e y'
Recentemente Nie e Emory (Science, 275, 1102 (1997) e obtidas pelas equações de transformação:
Kneipp K., WangY., Kneipp H., Perelman, L. T. Itzan I Dasari R., x' = x coscp + y sencp
Feld M. (Phys. Rev. Lett., v.78, p.1667, 1977,) relataram o espectro y' = -x sen(jl + y coscp (AV-1)
SERS de uma única molécula, a rodamina 6G, adsorvida em colóide z'= ±z
de prata, o que corresponde a um fator de intensificação de 10rn
ou seja, a matriz de transformação é dada por:

COS(jl sen(jl Ü J
-sen(jl COS(jl Ü
[
o o ±1

onde em ± 1 o sinal + vale para operações próprias e - para ope-


rações impróprias.
2 76 Oswaldo Sala

Para os componentes da polarizabilidade temos de conside- SOBRE O LIVRO


rar os produtos das coordenadas dadas em (AVI-1):
Formato: 14 x 21 cm
2cp 2 Mancha: 25,10 x 40,4 paicas
x'x' = xx cos + yy sen cp + 2xy coscpsencp
Tipologia: NewCentury 10/14
y'y' = xx sen2 cp + yy cos'cp - 2xy coscpsencp Papel: Offset 75 g/m 2 (miolo)
z'z' = zz Cartão Supremo 250 g/m 2 (capa)
x'y' = -xx coscpsencp - xy sen2 cp + xy cos 2 cp = yy coscpsencp 1!! edição: 1996

x'z' = ± xz coscp ± yz sene..p


EQUIPE DE REALIZAÇÃO
y'z' = + xz sencp ± yz coscp
Edição de texto
Estas equações podem ser escritas na forma matricial: Alberto Bononi (Preparação de originais)
Sandra Regina Cortés (Revisão)
x'x cos 2 cp sen:!c.p o 2 cos q>sencp o o XX Editoração Eletrônica
y'y' 2
sen c.p 2
cos cp o -2 cos cpsencp o o yy Eduardo Seiji Seki (Diagramação)
z'z o o 1 o o o zz
x'y - cosc.psencp cosc.psencp o 2
cos cp - sen:<cp o o xy
x'z' o o o o ±coscp ±sencp xz
y'z' o o o o +sencp ±cosc.p yz

O caráter desta matriz para operações próprias será:

3cos 2cp + l-sen2cp + 2coscp = 4cos 2cp + 2coscp =


(AV-2)
2coscp(l +2coscp)

Para operações impróprias o caráter será:

3cos 2 cp + 1-sen'cp - 2coscp = 4cos 2 cp - 2coscp =


CAV-3)
2coscp(-l +2coscp)

As expressões (AV-2) e (AV-3) são os caracteres da represen-


tação redutível do tensor da polarizabilidade.
Impressão e Acabamento

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