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o Quando? 13 de junho de 1634 (dia de Santo António – séc. XII) (Século XVII,)”três dias
antes de embarcar ocultamente para o Reino, a procurar remédio da Salvação dos índios.”
o Em que contexto? No contexto da luta de Viera pela libertação dos índios contra a
exploração dos clonos. A reacção dos colonos foi tão negativa que ele teve de
partir clandestinamente para Lisboa pouco depois da sua pregação.
Exórdio - capítulo I - apresentação do tema que vai ser tratado no sermão, a partir do conceito
predicável (vós sois o sal da terra) e das ideias a defender e que, geralmente, termina com uma
breve oração, invocando a Virgem. Esta parte reveste-se de grande importância dado que é o
primeiro passo para captar a atenção e benevolência dos ouvintes.
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O Padre António Vieira apresenta o conceito predicável, “Vós sois o sal da Terra” e explica as
razões pelas quais a terra está tão corrupta. Ou a culpa está no sal (pregadores), ou na terra
(ouvintes). Se a culpa está no sal, é porque os pregadores não pregam a verdadeira doutrina, ou
porque dizem uma coisa e fazem outra ou porque se pregam a si e não a Cristo. Se a culpa está na
terra, é porque os ouvintes não querem receber a doutrina, ou antes imitam os pregadores e não o
que eles dizem, ou porque servem os seus apetites e não os de Cristo.
ALEGORIA DO SAL
Os pregadores, ao pregarem a mensagem Evangélica têm, na terra, a mesma função do sal, que
consiste em evitar a corrupção. Assim, é criada uma analogia entre a função regeneradora e
purificadora da mensagem Evangélica dos pregadores e a função de conservação do sal.
A estruturação do raciocínio de forma simétrica (“ou é porque o sal não salga (…) ou porque a
terra se não deixa salgar”) facilita a compreensão da mensagem por parte do auditório. O autor
vai acrescentando sucessivas hipóteses em alternativa, imprimindo ao sermão um ritmo binário
que facilita a captação da mensagem por parte de que o ouve.
A interrogação retórica serve para manter o auditório “preso” ao discurso, pois implica a
mudança de tom, ao mesmo tempo que convoca a sua reflexão sobre o tema tratado.
O pregador recorre ao exemplo de Santo António fazendo-lhe um panegírico, dado que este se
revelou persistente na vontade de pregar a palavra de Deus e conseguiu vencer a hostilidade do
auditório através de uma estratégia que o Padre António Vieira vai utilizar, para ser eficaz e que
consiste em pregar aos peixes (exemplos linha 35, (…)).
Por fim, o uso das frases exclamativas e das interjeições – «Oh maravilhas do Altíssimo!
Oh poderes do que criou o mar e a terra! – visa atingir o «coração» dos ouvintes, apelando às
suas emoções (“delectare” e “movere”)
Capítulo II (Exposição)
Exposição – referência às obrigações do sal; indicação das virtudes dos peixes;
crítica aos homens.
Preposição: até ”E onde há bons, e maus, há que louvar, e que repreender.” – apresentação
do assunto do sermão
Início da alegoria: “Suposto isto, pare que procedamos com clareza (…) ”
A partir deste capítulo todo o sermão é uma alegoria porque os peixes são metáfora dos
Homens. As suas virtudes são, por contraste, metáforas dos defeitos dos Homens e os seus
vícios são diretamente metáfora dos defeitos dos homens. O pregador fala aos peixes, mas o
alvo é o Homem.
Divisão: desde “Suposto isto” até “vossos vícios”
Louvores em geral: a partir de “Começando pois pelos vossos louvores (…) ” –
Exemplificação: “Ia Jonas pregador do mesmo Deus (…) “
Peixes Homens
LOUVOR AFRONTA
As duas qualidades de ouvinte: ouvir e não falar. Auditório ideal, pois estão muito atentos,
a acompanhar o que se está a dizer.
As duas propriedades do sal – “conservar o são e preservá-lo para que se não corrompa.”
O Sermão aos peixes (e, obviamente, aos homens) será, pois, dividido em dois pontos:
1. Louvar as qualidades;
2. Repreender os vícios.
Interrogação retórica: trata-se de uma estratégia retórica ou de uma figura de estilo que
consiste na formulação de uma frase interrogativa, dirigida a um destinatário presente ou
ausente, sem que se espere obter resposta. No «Sermão de Santo António», Vieira recorre a esta
figura de estilo para, por um lado, tornar o discurso mais vivo e, por outro, suscitar a
curiosidade do auditório em relação ao assunto que vai expor.
Quiasmo: figura de estilo que consiste na disposição de quatro elementos, agrupados dois a
dois, segundo o esquema da letra “X”, isto é, a segunda parte da construção contém os
mesmos elementos, mas pela ordem inversa de sucessão.
OS LOUVORES EM GERAL
As qualidades e as virtudes dos peixes:
o Ouvem e não falam;
o Foram os primeiros seres que Deus criou (“vós fostes os primeiros que Deus criou”);
o São melhores que os homens (“e nas provisões (...) os primeiros nomeados foram os peixes”)
o Existem em maior número (“entre todos os animais do mundo, os peixes são os mais e
os maiores”);
o Revelam obediência (“aquela obediência, com que chamados acudistes todos pela honra
de vosso Criador e Senhor”);
o Revelam respeito e devoção ao ouvirem a palavra de Deus, (“aquela ordem, quietação e
atenção com que ouvistes a palavra de Deus da boca do seu servo António. (...) Os
homens perseguindo a António (...) e no mesmo tempo os peixes (...) acudindo a sua voz,
atentos e suspensos às suas palavras, escutando com silêncio (...) o que não entendiam.”);
o Seu “retiro” e afastamento dos homens (meditação que permite a proximidade com
Deus; paz e pureza de espírito, porque se afastam dos vícios mundanos);
o Não se deixam domesticar (“só eles entre todos os animais se não domam
nem domesticam”)
“Mas esta dor é tão ordinária, que já pelo costume quase se não sente.” (ll. 3 e 4) – Padre
António Vieira afirma que o facto de os peixes não se converterem lhe causa um sofrimento a que
já se acostumou, já que os seres humanos também não se querem converter, isto é, não aceitam os
ensinamentos do pregador no sentido de se purificarem. Logo, essa dor, por ser tão sua conhecida,
já não lhe cause sofrimento.
Concluindo, o orador manifesta o seu cansaço ao ver que a sua palava não dá frutos em São
Luís do Maranhão.
2. RÉMORA: simboliza a força e o poder que a palavra do pregador tem para ser guia das
almas – pequeno no corpo, mas grande na força, pelo poder orientador e controlador.
Prende e amarra as naus, impedindo-as de avançar.
Os homens não souberam dar valor ao poder e à força da palavra (língua) de Santo António
que domou a fúria das paixões humanas (Soberba, Vingança, Cobiça, Sensualidade),
impedindo as pessoas de caírem nas mais variadas desgraças (naufrágios).
3. TORPEDO: simboliza o poder que a palavra de Deus tem de fazer tremer os pescadores
que pescam na terra tudo quanto apanham – a sua energia tem a capacidade de fazer
tremer a mão do pescador, impedindo-o de pescar.
Os homens, “pescadores em terra”, não temem a Deus porque são ambiciosos e não se
deixam converter ao caminho reto. No entanto, 22 pescadores destes tremeram ouvindo as
palavras de Santo António e converteram-se.
CONCLUSÃO: 1ª os homens pescam muito e tremem pouco; 2ª “Se eu pregara aos homens e
tivera a língua de Santo António, eu os fizera tremer.”; 3ª os peixes são o sustento dos pobres e dos
ricos; ajudam à abstinência nas quaresmas; sustentam as Cartuxas e os Buçacos (ordens religiosas
que recusavam a carne); com eles, Cristo festejou a Páscoa; ajudam a ir ao Céu; multiplicam-se
rapidamente (os que são consumidos pelos pobres).
Trocadilho: “(…) que o Peixe abriu a boca contra quem se lavava, e Santo António abria a sua contra
os que não se queriam lavar.” (l. 31) – 1º Tirar a sujidade; 2º Sentido metafórico/moral: purificar.
Tom apelativo – MOVERE (convencer): quer levar a uma tomada de consciência por parte do
auditório; quer que eles estejam receptivos à mensagem Evangélica; despertar emoções.
Comparação a Santo António: “ Se alguma rémora houve na terra, foi a língua de Santo António
(…).” - “Língua” simboliza a palavra e o seu poder regenerador.
«Oh se houvera uma Rémora na terra, que tivesse tanta força como a do mar, que menos perigos
haveria na vida, e que menos naufrágios no mundo!» (ll. 41 e 42) - Na frase transcrita, Padre
António Vieira estabelece uma relação de associação (semelhança) entre as virtudes da Rémora e
as das pregações de Santo António. De facto, o orador louva as virtudes deste “peixezinho”
pequeno, mas cuja força e poder lhe permitem prender e amarrar as naus, impedindo-as de
avançar. Posteriormente, ao extrapolar estas virtudes para o plano dos homens, o orador exprime
a necessidade de haver na terra alguém com a mesma força para guiar os homens para o bem,
evitando que estes sucumbam às mais variadas desgraças, chegando à conclusão de que a língua
de Santo António foi “rémora da terra”, pois este santo, com a pregação da doutrina, domou a
fúria das paixões humanas (a Soberba, ou seja, a Vaidade, a Vingança, a Cobiça, a Sensualidade),
evitando muitos “naufrágios”.
Padre António Vieira ao citar S. Gregório Nazianzeno recorre a um argumento de autoridade
para legitimar/reforçar o que o pregador afirma sobre Santo António.
Paralelismo anafórico Pescar simbólico: “ No mar, pescam as canas, na terra pescam as varas
(…), pescam as ginetas, pescam as bengalas, pescam os bastões e até os ceptros pescam, e pescam
mais que todos, porque pescam Cidades e Reinos inteiros.” Gradação crescente ou ascendente.
Varas juízes / ginetas militares / bengalas comerciantes / bastões nobres / ceptros reis
O Torpedo faz tremer o braço do pescador devido a uma descarga elétrica. Na terra, os juízes,
os militares, etc., “pescam” muito, usurpam/tiram proveito dos outros, mas não “tremem”, ou seja,
não manifestam qualquer arrependimento, logo não dão indícios de pretenderem converter-se.
Comparação a Santo António: “ Se eu pregara aos homens e tivera a língua de Santo António, eu
os fizera temer [arrependimento]. [EXEMPLO] Vinte e dois pescadores (…) e se emendaram.” (ll.
67 a 72). - Repetição de “tremer”.
Discurso maniqueísta (discurso que opõe dois polos; ex.: Céu vs. Inferno; bom vs. mau): “ (…)
para cima, considerando que há Céu, e para baixo, lembrando-me que há Inferno. (ll. 97 e 98)
Padre António Vieira afirma, com toda a humildade, ter aprendido com o Quatro-olhos como
orientar as suas ações sabendo que há Céu e que há Inferno, logo, com prudência, deve defender-
se dos diferentes
tipos de males
e praticar o
bem.
Capítulo IV (Repreensão em geral)
o Os peixes comem-se uns aos outros;
o Os peixes grandes comem os pequenos;
o São ignorantes e cegos, deixando-se enganar facilmente por qualquer isco.
Nos dez primeiros parágrafos, que constituem o ponto alto deste sermão, aponta-se o terrível
defeito que os peixes/homens têm de se comerem (explorarem) uns aos outros devido à sua
cobiça desmedida, o que prova a sua crueldade, a sua maldade, a sua injustiça. Também se
deixam enganar facilmente, movidos pela vaidade.
Polissemia: “(...) ainda o pobre defunto o não comeu a terra [sentido literal – pretérito perfeito
do indicativo – acção pontual e perfectiva (concluída)], e já o tem comido toda a terra [pessoas,
sociedade – pretérito perfeito do conjuntivo – aspeto interactivo (repetição da ação)].
Os Homens não se comem apenas quando estão mortos, mas também quando estão vivos.
“São piores os homens que os corvos.” – os corvos são necrófagos da mesma forma que os
Homens são implacáveis.
Capítulo V (Confirmação (cont. ) – Repreensão em particular )
Exemplos de homens: Pedro (sozinho avançou para o exército romano; se todos fraquejassem, só
ele permaneceria até à morte → só ele fraquejou; Cristo pediu-lhe que estivesse atento no horto →
encontrou-o dormindo), Golias (quarenta dias consecutivos esteve armado no campo → bastou
um pastorzinho com um cajado e uma funda para o aniquilar), Caifás («roncava de saber») e
Pilatos («roncava de poder»).
Exemplos de homens: Simão Mago (arte mágica pela qual havia de subir ao céu); S. Máximo
(começou a voar muito alto, caindo quebrou os pés → «quem tem pés para andar, e quer asas para
voar, justo é que perca as asas, e mais os pés.»)
4. POLVO: simboliza a traição, a dissimulação, o fingimento, o engano, mimetismo. Os
homens, devido à sua maldade, traem-se mutuamente, preparando armadilhas,
ciladas.
Exemplos de homens: Judas (abraçou a Cristo, mas os outros prenderam-no → o polvo abraça e
prende; com os braços fez o sinal → o polvo dos braços faz as cordas; planeou a traição às escuras,
mas executou-a às claras → o polvo planeia e executa às escuras as traições).
Em contraponto aos defeitos dos peixes criticados, Padre António Vieira sublinha as virtudes
de Santo António.
Peix Santo
es António
Roncadores: soberbos e orgulhosos, facilmente Tendo tanto saber e tanto poder, não se orgulhou disso, antes
pescados se calou. A sua voz ficou para sempre. Por ser humilde,
tornou-se célebre. (“E porque tanto calou, por isso deu tanto
brado” –
trocadilho entre “gritar” e “ser célebre”.)
Pegadores: parasitas, aduladores, pescados Pegou-se com Cristo a Deus e tornou-se imortal.
com
os grandes
Tinha duas asas: a sabedoria natural e a sabedoria
Voadores: ambiciosos e presunçosos sobrenatural, mas não as usou por ambição (humildade).
Considerado leigo e
sem ciência, tornou-se sábio para sempre.
Polvo: traidor Foi o maior exemplo de candura, de sinceridade e verdade,
em quem nunca houve mentira (“dolo, fingimento ou engano”)..
Aforismo (espécie de provérbio que termina um ensinamento): “O muito roncar antes de ocasião, é
sinal de dormir nela.” (l. 20)
Conselho: “Medi-vos, e logo vereis o quão pouco fundamento tendes de blasonar [gabar], nem
roncar.” (l. 22)
Discurso exortativo (apelativo) e Conselho: “Chegai-vos embora aos grandes; mas não de tal
maneira pegados, que vos mateis por eles, nem morrais com eles.” (ll. 91 e 92)
Quiasmo: “Não contente com ser peixe, quiseste ser ave, e já não és ave nem peixe.” (l.121)
ave peixe
Água (2º elemento) Fogo (2º elemento)
“A Natureza deu-te a água, tu não quiseste senão o ar, e eu já te vejo posto ao fogo.” (l. 122)
Aforismo (com rima e repetição): “Quem quer mais do que o que lhe convém, perde o que quer e o
que tem.” (ll. 126 e 127)
Paralelismo Anafórico: “Se está nos limos, faz-se verde; se está na areia, faz-se branco; se está
no lodo, faz-se pardo; e se está em alguma pedra, como mais ordinariamente costuma estar, faz-se
da cor da mesma pedra.” (ll. 174 a 176)
Episódio do Polvo
Divisão em partes:
Caraterização do polvo
O mimetismo é usado para enganar: o polvo faz-se da cor do local ou dos objetos onde se
instala para atacar os inocentes à traição.
A traição é o elemento comum entre Judas e o polvo: Judas apenas abraçou Cristo, outros o
prenderam; o polvo abraça e prende. Judas abraçou Cristo à luz das lanternas; o polvo escurece-se,
roubando a luz para que os outros peixes não vejam as suas cores. A traição de Judas é de grau
inferior à do polvo.
“Mas ponde os olhos em António, vosso Pregador, e vereis nele o mais puro exemplar da candura
[honestidade], da sinceridade e da verdade, onde nunca houve dolo [engano], fingimento ou
engano. E sabei que para haver tudo isto em cada um de nós bastava antigamente ser Português,
não era necessário ser Santo”. (ll.198 a 201) – As pessoas antigamente eram mais humildes,
integras, agora são o oposto.
Capítulo VI (Peroração – epílogo)
«Com esta advertência vos despido» - assim começa o último capítulo do Sermão de
Santo António que constitui a peroração, ou seja, a conclusão final.
Tópicos:
o A condição dos peixes é superior à dos outros animais
o A condição dos peixes é superior à do pregador Vieira
o Apelo aos ouvintes
o Hino de louvor final
Síntese
Três objetivos programáticos da eloquência:
o Docere: instruir o auditório, provando a veracidade das afirmações (o pregador transmite
informação, faz citações, fornece conceitos, apresenta argumentos);
Nota: A numeração das páginas está de acordo com o manual “Página Seguinte – 11ºAno”.
A. Torrado, docente do
Colégio M.B.