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INTEGRAÇÃO E INCLUSÃO: similitudes e diferenças

Sônia Bertoni

A escola não pode tudo, mas pode mais. Pode acolher as diferenças. É
possível fazer uma pedagogia que não tenha medo da estranheza, do
diferente, do outro. A aprendizagem é destoante e heterogênea.
Aprendemos coisas diferentes daquelas que nos ensinam, em tempos
distintos, (...) mas a aprendizagem ocorre, sempre. Precisamos de uma
pedagogia que seja uma nova forma de se relacionar com o
conhecimento, com os alunos, com seus pais, com a comunidade, com
os fracassos (com o fim deles), e que produza outros tipos humanos,
menos dóceis e disciplinados.

(ABRAMOWICZ, 1997).

Sabemos que a literatura sobre os temas integração e inclusão é extensa,


tanto por ser alvo de discussões atuais na educação especial e educação de um
modo geral como por apresentar diversas formas de compreensão e aplicação dos
termos. Nosso intuito não é responder a todas as questões que envolvem essas
temáticas, mas apresentar uma síntese dos temas integração e inclusão enquanto
ideologias1 que têm norteado as políticas públicas da educação e/ou educação
especial.
Podemos dizer que historicamente, algumas ideologias têm norteado os
rumos da Educação Especial, e podemos destacar três momentos distintos: o da
1 Ideologia é um conjunto lógico, sistemático e coerente de representações (idéias e valores) e de normas ou regras (de conduta) que indicam e
prescrevem aos membros da sociedade o que devem pensar e como devem pensar o que devem valorizar o que devem sentir e como devem sentir, o
que devem fazer e como devem fazer. Ela é, portanto, um corpo explicativo (representações) e prático (normas, regras, preceitos) de caráter prescritivo,
normativo, regulador, cuja função é dar aos membros de uma sociedade dividida em classes uma explicação racional para as diferenças sociais,
políticas e culturais, sem jamais atribuir tais diferenças à divisão da sociedade em classes, a partir das divisões na esfera da produção (CHAUÍ, 1980,
p.113).
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normalização, o da integração e o da inclusão. A inclusão, todavia, não é


específico da Educação Especial.
Segundo Sousa (2002) a normalização iniciou-se na Dinamarca, em 1950,
tendo sido contemplado na legislação desse país em 1959. Baseia-se na idéia de
que indivíduos com deficiência têm direito de usufruir de condições de vida o mais
normais possível, o mais similares às condições das outras pessoas. Não se trata
de normalizar as pessoas, mas sim o contexto em que se desenvolvem. Segundo
Carmo (1998) esse princípio dissemina a idéia da possibilidade de igualar o
desigual.
Num segundo momento, em 1970, surgiu uma outra fase, quando passou-
se a valorizar a integração. A terceira fase apareceu em 1975, demarcada pela
ideologia da inclusão, que visa integrar não só pessoas com deficiência, mas
todos os alunos anteriormente excluídos, nas escolas regulares.
A integração e a inclusão têm sido, atualmente, o eixo das discussões em
congressos, seminários, eventos e publicações na área da educação especial e
educação por estudiosos e pesquisadores, tanto em nível nacional quanto
internacional.
Procuramos fazer uma análise de parte da literatura que trata sobre esses
temas e identificamos alguns pontos de similitude e de diferença entre eles.
Quanto à origem, verificamos que a integração surgiu em 1970 como um
movimento que visava acabar com a segregação, favorecendo a interação entre
alunos com deficiência e alunos considerados “normais”. Esse movimento, que
teve início nos países escandinavos, se solidificou nos Estados Unidos e se
expandiu, posteriormente, por toda a Europa. O princípio da inclusão, por sua vez,
teve início nos Estados Unidos, também nos anos 70, mais especificamente em
1975, e demarcou a chamada escola inclusiva, com a Lei Pública 94.142
(MRECH, 1998).
Em relação aos termos integração e inclusão, constatamos que apresentam
significados semelhantes no dicionário da língua portuguesa. A integração é
definida como uma ação ou política que visa integrar em um grupo as minorias
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raciais, religiosas, sociais, e o ato de integrar implica juntar-se, tornando-se parte


integrante; reunir-se, incorporar-se. Incluir figura como inserir e introduzir e
inclusão, como o ato ou efeito de incluir. Assim, as definições dos dois termos
contidas no dicionário não apresentam diferenças significativas. Ambas remetem à
idéia de inserção e junção.
Contudo, verificamos, a partir da revisão de literatura, que, apesar de não
existir uma única definição a respeito do que vêm a ser integração e inclusão,
alguns aspectos são elucidativos de seus significados mais atuais, quais sejam:

1) Ambos são ideologias que têm direcionado as políticas educacionais. A


integração influenciou a educação especial e a inclusão a educação de
uma forma geral;
2) O termo inclusão não é específico da educação especial o da
integração, sim;
3) O da integração apresenta como pressuposto ideológico que todos
somos iguais e por isso podemos estar juntos. Na inclusão o princípio
básico é que todos somos diferentes e devemos conviver com as
diferenças;
4) No que diz respeito à perspectiva da escola e da educação,
constatamos que, para a integração, o que se pretende é inserir o aluno
no sistema de ensino, o que pode ocorrer em classes regulares, com
apoio especial (por exemplo: salas de recurso ou de apoio; professor
itinerante, etc.). A proposta da inclusão não se restringe a pessoas com
deficiência. A perspectiva é que todas as pessoas tenham garantidos os
direitos de acesso à permanência na educação escolar.
No paradigma que determina a inclusão escolar, a educação especial terá
outra significação, deixará de ser especial e de atender um segmento da
população, para ser uma educação que promova um ensino de especial qualidade
a qualquer pessoa que quiser dela usufruir.
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A integração, no nosso entendimento, não conseguiu sustentar a inserção


da pessoa com deficiência na escola e nos diferentes espaços sociais de forma
concreta, respeitando e aceitando, na essência, as diferenças e a diversidade
humanas. Não conseguiu, portanto, efetivar um ensino de qualidade à pessoa com
deficiência e suas práticas determinaram um falso movimento social. O mesmo
está ocorrendo com a inclusão, uma vez que as ações práticas nessa direção não
estão sendo implantadas com bases sólidas, com mudanças estruturais na
organização da escola, buscando uma nova visão de homem, mundo e sociedade.
Portanto, tanto os princípios que orientam a integração, quanto os que
orientam a inclusão são limitados. O primeiro por advogar a igualdade entre os
homens, o que ao nosso ver não se sustenta nem teoricamente, nem na realidade
social concreta. O segundo, por sustentar-se no discurso da diferença entre os
homens e advogar, abstratamente, a igualdade de direitos e oportunidades.
Entendemos que as transformações necessárias para que a inclusão
aconteça implicam mudanças radicais em nossa forma de organização social.
Essas mudanças, por sua vez, estão relacionadas com uma nova visão de homem,
mundo e sociedade, em que o respeito às diferenças ultrapasse o discurso e as
políticas governamentais e se materialize em nossas diferentes formas de
produção e relações sociais.
Acreditamos que a inclusão escolar é, sem dúvida, um dos maiores desafios
que teremos que enfrentar no século XXI.

Referências Bibliográficas

CARMO, A. A. do. Educação comum e especial: Discursos diferentes e uma


mesma prática excludente. In: MARQUEZINE, M. C. et al. Perspectivas
Multidisciplinares em Educação Especial. Londrina: UEL, 1998, p.391 – 398.
1998.

CHAUÍ, M. O que é ideologia. São Paulo: Brasilience, 1980. (Col. Primeiros


Passos).
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MRECH, L. M. O que é Educação Inclusiva?. Revista Integração. Brasília:


MEC/SEESP, n. 20, p. 37 – 40, 1998.

SOUSA, S. B. Inclusão escolar e o portador de deficiência nas aulas de


Educação Física das redes Municipal e Estadual de Uberlândia/MG. 2002. 136
f. Dissertação (Mestrado em Educação)–Universidade Federal de Uberlândia,
Uberlândia, 2002.

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