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Serviço Social
Marcelo Braz Moraes dos Reis*
Pode-se dizer que este relativo desconhecimento não eliminou a incorporação do projeto
entre a categoria dos assistentes sociais. Ao contrário, é inegável que traços dele estão presentes
no cotidiano dos assistentes sociais que o operam nas diversas situações profissionais3.
Mas, afinal, o que é o Projeto ético-político profissional do Serviço Social? Este brevíssimo
texto apresenta os seus traços mais gerais sem a pretensão de esgotá-los. Trata-se de texto mais
informativo que dissertativo, ainda que eivado de considerações crítico-valorativas. Nele
apresentaremos as origens históricas, o processo de consolidação e o momento atual do projeto,
quando verificaremos as peculiaridades que o objetivam na realidade sócio-profissional.
*
Marcelo é Assistente Social, professor da ESS/UFRJ. Conselheiro do CFESS - Gestão 2002-2005, ex-
diretor CRESS 7a Região.
1
O IX CBAS aconteceu entre os dias 20 a 24 de Julho na cidade de Goiânia e teve como temário “Trabalho e
Projeto Ético-Político Profissional”.
2
Parte da bibliografia existente está presente nas referências consultadas para a realização deste breve texto.
3
Já há estudos no Serviço Social que procuram problematizar a incorporação histórica do projeto no coletivo
profissional. Dentre eles destacamos: as teses de doutorado de Barroco (2000), da PUC-SP e de Vasconcelos
(2000) da ESS/UFRJ e a dissertação de mestrado de Cardoso (2000), da PUC-SP. As datas das produções
demonstram o caráter recente das pesquisas sobre o projeto profissional. Vale destacar também a pesquisa
coordenada por Silva e Silva (1995) [ver bibliografia].
4
Daí a idéia de projeto. Aliás, o termo “projeto” pode dar a idéia, extremamente legítima, de que haveria uma
sistematização mais objetiva do mesmo, onde se suporia a existência de um documento único que o
expressasse. Esta certa “confusão” se explica pela precocidade do debate e pela pouca produção teórica afeita
torno de uma determinada valoração ética5 que está intimamente vinculada a determinados
projetos societários6 presentes na sociedade que se relacionam com os diversos projetos coletivos
(profissionais ou não) em disputa na mesma sociedade7.
Antes de qualquer coisa é preciso ter clareza da noção de projeto coletivo na medida em
que o referido projeto ético-político existe como tal. Os projetos coletivos se relacionam com as
diversas particularidades que envolvem os vários interesses sociais presentes numa determinada
sociedade. Remetem-se ao gênero humano uma vez que, como projeções sócio-históricas
particulares, vinculam-se aos interesses universais presentes no movimento da sociedade. Em
outras palavras, os interesses particulares de determinados grupos sociais, como o dos assistentes
sociais, não existem independentemente dos interesses mais gerais que movem a sociedade.
Questões culturais, políticas e, fundamentalmente, econômicas articulam e constituem os projetos
coletivos. Eles são impensáveis sem estes pressupostos, são infundados se não os remetemos
aos projetos coletivos de maior abrangência: os projetos societários (ou projetos de sociedade).
Quer dizer: os projetos societários estão presentes na dinâmica de qualquer projeto coletivo,
inclusive em nosso projeto ético-político.
Mas, afinal, qual nosso projeto ético-político? Como ele é? Qual sua posição diante da
ordem social?
Não há dúvidas de que o projeto ético-político do Serviço Social brasileiro está vinculado a
um projeto de transformação da sociedade. Esta vinculação se dá pela própria exigência que a
ao tema, como foi dito antes. Veremos mais adiante que a questão é mais complexa e envolve outros
elementos, inclusive variados documentos políticos e legais afins à profissão.
5
Daí o termo ético.
6
Daí o termo político, no seu sentido mais amplo.
7
Dão o termo profissional expressando a particularidade de uma categoria, no caso a dos assistentes sociais.
dimensão política da intervenção profissional8 impõe. Ao atuarmos no movimento contraditório das
classes, acabamos por imprimir uma direção social às nossas ações profissionais que favorecem a
um ou a outro projeto societário. Nas diversas e variadas ações que efetuamos como plantões de
atendimento, salas de espera, processos de supervisão e/ou planejamento de serviços sociais, das
ações mais simples às intervenções mais complexas do cotidiano profissional, nelas mesmas,
embutimos determinada direção social entrelaçada por uma valoração ética específica9.
As demandas (de classes, mescladas por várias outras mediações presentes nas relações
sociais) que se apresentam a nós, encobrem seus reais determinantes e as necessidades sociais
que portam. Tendo consciência ou não, interpretando ou não as demandas de classes e suas
necessidades sociais que chegam até nós em nosso cotidiano profissional, dirigimos nossas ações
favorecendo interesses sociais distintos e contraditórios.
Nosso projeto ético-político é bem claro e explícito quanto aos seus compromissos. Ele
“tem em seu núcleo o reconhecimento da liberdade como valor ético central – a liberdade
concebida historicamente, como possibilidade de escolher entre alternativas concretas; daí um
compromisso com a autonomia, a emancipação e a plena expansão dos indivíduos sociais.
Conseqüentemente, o projeto profissional vincula-se a um projeto societário que propõe a
construção de uma nova ordem social, sem dominação e/ou exploração de classe, etnia e gênero”.
(Netto, 1999: 104-5; grifos originais). Estes valores foram construídos historicamente, como
veremos a seguir.
BREVÍSSIMO HISTÓRICO
Desde os anos 70, mais precisamente no final daquela década, o Serviço Social brasileiro
vem construindo um projeto profissional comprometido com os interesses das classes
trabalhadoras. A chegada entre nós dos princípios e idéias do Movimento de Reconceituação
deflagrado nos diversos países latino-americanos somada à voga do processo de
redemocratização da sociedade brasileira formaram o chão histórico para a transição para um
Serviço Social renovado, através de um processo de ruptura teórica, política (inicialmente mais
político-ideológica do que teórico-filosófica) com os quadrantes do tradicionalismo que imperavam
entre nós. É sabido que, politicamente, este processo teve seu marco no III CBAS, em 1979, na
cidade de São Paulo, quando, de forma organizada, uma vanguarda profissional virou uma página
8
A dimensão política da prática profissional foi discutida por Iamamoto em Renovação e Conservadorismo
no Serviço Social (Cortez, 1992).
9
Para a compreensão da Ética no processo sócio-histórico ver o texto de Barroco (2000).
na história do Serviço Social brasileiro ao destituir a mesa de abertura composta por nomes oficiais
da ditadura, trocando-a por nomes advindos do movimento dos trabalhadores. Este congresso
ficou conhecido como o “Congresso da Virada”.
10
Ver Bonetti et alli (1996).
neoliberais que repercutem no seio da categoria sob a forma de um neoconservadorismo
profissional11.
11
Os desafios ao projeto ético-político contemporâneo são problematizados em vários estudos, dentre eles
destacamos o de Netto (1996 e 1999,op.cit.) e o de Iamamoto (1998). Vale consultar o estudo de Soares
reflexivos do fazer profissional e especulativos e prospectivos em relação a ele. Esta
dimensão investigativa da profissão tem como parâmetro a afinidade com as tendências
teórico-críticas do pensamento social. Dessa forma, não cabem no projeto ético-político
contemporâneo, posturas teóricas conservadoras, presas que estão aos pressupostos
filosóficos cujo horizonte é a manutenção da ordem.
Santos (2000) intitulado Neoconservadorismo pós-moderno e Serviço Social brasileiro, ESS/UFRJ, Rio de
Janeiro.
12
Essa abertura política não significa, em hipótese alguma, que não haja elementos de ordem imperativa na
consecução do projeto. Segundo Netto, há “componentes que, no projeto, são imperativos e aqueles que são
indicativos”. A pactualidade existente em torno do projeto profissional e do pluralismo subjacente a ele é que
indica esses componentes. “Imperativos são os componentes compulsórios, obrigatórios para todos os que
exercem a profissão (estes componentes, em geral, são objeto de regulação estatal); indicativos são aqueles
em torno dos quais não há um consenso mínimo que garanta o seu cumprimento rigoroso e idêntico por todos
os membros da categoria profissional.” (Netto, 1999: 98). São imperativos, por exemplo, os componentes da
formação acadêmica regulamentados pelo MEC e a exigência da inscrição nos conselhos para o exercício
legal da profissão. Vale dizer que, ainda segundo Netto, que estes imperativos também são passíveis de
divergências.
segundo, temos o conjunto de leis advindas do capítulo da Ordem Social da Constituição
Federal de 1988 que, embora não exclusivo da categoria, foi fruto de lutas que envolveram
os assistentes sociais13 e, por outro lado, faz parte do cotidiano profissional de tal forma
que pode funcionar como instrumento viabilizador de direitos através das políticas sociais
que executamos e/ou planejamos.
Vale ressaltar que neste conjunto de leis e resoluções atinentes à profissão e ao seu
projeto ético-político encontram-se realizados, direta ou indiretamente, valores que contornam o
projeto.
Essas dimensões articuladas entre elas compõem o corpo material do projeto ético político
profissional que, como foi dito, deve ser compreendido como uma construção coletiva que, como
tal, tem uma determinada direção social que envolve, valores, compromissos sociais e princípios
que estão em permanente discussão exatamente porque participante que é do movimento vivo e
contraditório das classes na sociedade. O sucesso do projeto depende de análises precisas das
condições subjetivas e objetivas da realidade para sua realização bem como de ações políticas
coerentes com seus compromissos e iluminadas pelas mesmas análises.
13
Referimo-nos, especialmente, à construção da LOAS (Lei Orgânica da Assistência Social).
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ABEPSS (2000), Reforma do Ensino Superior e Serviço Social. Revista TEMPORALIS, Ano I, No 1
- janeiro a junho de 2000, Brasília.
CRESS 7a R. Assistente Social: Ética e Direitos – Coletânea de Leis e Resoluções. 2a ed. Revista
e Ampliada. Rio de Janeiro, 2000.
IAMAMOTO, M.V. (1992) Renovação e Conservadorismo no Serviço Social. São Paulo: Cortez.
______(1998) O Serviço Social na Contemporaneidade. São Paulo: Cortez.
INDICAÇÕES BIBLIOGRÁFICAS
SALES, M.A. (2000), “Questão Social e defesa de direitos no horizonte da ética profissional” in
Capacitação em Serviço Social e Política Social – Módulo 2 – Brasília: Cead/CFESS/ABEPSS.