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HERANÇA DIGITAL
Trabalho - Direito das Sucessões

Anapaula Andrade Gaio RA 11921564


Débora Nascimento de Souza RA 11820576
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Introdução
Com as diversas mudanças acontecendo nos dias de hoje, há
consequentemente uma transformação nas relações pessoais, na tecnologia, nos
bens financeiros e no mundo digital e, portanto, mudanças gigantescas no mundo
jurídico, principalmente em relação à herança.

Pois com o avanço das redes sociais, criou-se uma nova maneira de se
expressar livremente, de se manifestar, de criar pensamentos jurídicos, aproximando
pessoas que possuem o mesmo interesse e que buscam seu direito fundamental de
liberdade de expressão. Além dessa mudança no modo de exercer o direito de
liberdade de expressão, a tecnologia também mudou o conceito do que são bens
financeiros, as formas de renda e ocasionou a imigração do banco físico para o
digital, a adoção da moeda digital, entre outras.

Com toda essa transformação, vieram junto importantes questões a serem


discutidas. Como, por exemplo, o que se cria na internet também pode ser
considerado como patrimônio? E até onde se pode chegar com esses bens digitais
deixados pelo titular após sua morte e o que podemos prever com essa herança
digital?

O que é herança digital

Esse nome é dado pelos doutrinadores do Direito Sucessório para o conjunto


de bens ou direitos utilizados, publicados ou guardados em plataformas ou
servidores virtuais, sejam elas acessadas de forma online ou não. Os ativos são
bens incorpóreos, ou seja, não há que se falar em materiais físicos.

Os itens que compõem a herança digital podem consistir em contas em


diferentes canais, materiais de mídias virtuais como textos, áudios ou vídeos, além
de acesso a senhas e serviços online, por exemplo.

O patrimônio digital pode ser composto por bens que têm ou não valor
financeiro. Isso significa que ele pode consistir em um conjunto de itens com valor
apenas simbólico ou subjetivo, como páginas ou publicações nas redes sociais,
contas de e-mails, interações com outras pessoas, produções criativas, entre outras.

Entretanto, também é possível que haja contas ou meios com valor financeiro,
bem como, assinaturas; serviços vitalícios; moedas digitais (criptomoedas); contas
que contenham um potencial valor financeiro; perfis empresariais em redes sociais
que geram retorno financeiro; crédito que pode ser usado para obter produtos ou
usufruir de serviços em alguma plataforma online; entre outras.
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Legislação Brasileira sobre o tema Herança Digital

No Brasil, mesmo com várias discussões sobre o tema, acontecimentos


famosos, e vários projetos de Lei, não há até o momento uma legislação específica
que regulamente o tema. Sendo assim, ainda estão sendo aplicadas as regras
gerais sobre herança do Código Civil e, de forma análoga, a Lei dos Direitos
Autorais e a Lei n.º 12.865/14.

No entanto, está em trâmite no Senado Federal o projeto de lei 6.468/192,


que ganhou visibilidade com a morte do apresentador Gugu Liberato e o inesperado
crescimento do número de seguidores em suas redes sociais após seu falecimento.

O referido projeto busca introduzir o parágrafo único no artigo 1.788 do


Código Civil, com a seguinte redação:

“Parágrafo único. Serão transmitidos aos herdeiros todos os


conteúdos de contas ou arquivos digitais de titularidade do autor
da herança.”

Entretanto, existem grandes críticas sobre o tema, principalmente em relação


à violação da dignidade humana e privacidade do falecido e também de terceiros
com quem aquele manteve relações em vida, devendo ser destacada a
intransmissibilidade dos direitos de personalidade.

Pois, conforme comenta a advogada e professora Patrícia Corrêa Sanches,


presidente da Comissão de Família e Tecnologia do Instituto Brasileiro de Direito de
Família. “Existem alguns projetos de lei em tramitação no Congresso que tratam da
herança digital. Por enquanto, nenhum desses projetos garante a segurança jurídica
necessária para se legislar sobre uma temática de tamanha importância e
solenidade, no Direito das Sucessões e da privacidade. (...) Direitos da
personalidade como o nome e a privacidade, por exemplo, são intransmissíveis. É
preciso ressaltar que o direito à privacidade abrange a proteção aos dados pessoais.
Gerar uma exceção quanto à transmissibilidade desses direitos cria uma
insegurança jurídica e social ab initio.”

Ainda, segundo Patrícia Corrêa Sanches, as propostas podem causar


insegurança social e um retrocesso nas garantias que vêm sendo concebidas e
construídas no tocante aos dados pessoais e à privacidade, em geral. “A proposição
legislativa deveria ser no sentido contrário: apenas se o testamento conceder o
direito de acesso, o herdeiro poderá acessar os perfis e as comunicações do(a)
falecido(a). (...) A herança digital é uma questão emergente no direito sucessório,
com muitos desdobramentos, em função da velocidade com que se criam perfis
pessoais e se monetizam bens digitais, e merece uma legislação fundamentada em
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opiniões dos juristas e especialistas em Direito das Famílias e Sucessões, evitando


que seja aprovada uma legislação que não atenda aos anseios da sociedade atual”.

Desta forma, para que eventual medida tenha aceitação entre nossos
julgadores, se faz necessário diferenciar conteúdos que envolvam a intimidade e a
vida privada do de cujus daqueles que não abarcam questões mais intrínsecas e
pessoais, para, somente assim, se iniciar um caminho acerca da atribuição da
herança digital aos herdeiros legítimos e caminharmos nessa questão.

Sucessão Testamentária

Mesmo sem legislação específica sobre a herança digital, existem algumas


medidas para evitar problemas legais quando houver necessidade de transmitir bens
e direitos digitais aos seus herdeiros.

A primeira delas é a elaboração de um testamento, pois o que pese a


discussão acerca da transmissão dos direitos digitais em caso de morte, dúvidas
não existem quando estamos diante de sucessão testamentária. Com efeito, o artigo
1.857, do Código Civil, não determina que o testamento deve ser limitado a bens
tangíveis. É possível que uma pessoa manifeste sua vontade em relação à sua
herança digital, independentemente se ela é reconhecida pelo ordenamento jurídico.
“Art. 1.857. Toda pessoa capaz pode dispor, por testamento, da
totalidade dos seus bens, ou de parte deles, para depois de sua
morte.
(...) § 2º São válidas as disposições testamentárias de caráter
não patrimonial, ainda que o testador somente a elas se tenha
limitado.”

Por esta razão, entende-se que a vontade do titular do direito digital, mais
precisamente a negativa, é o elemento essencial para a transmissão aos seus
sucessores, de modo que este é quem detém condições e interesse de indicar quais
bens digitais serão transmitidos, visando proteger sua privacidade e a de terceiros.

E outra prática é a criação de um planejamento sucessório, documento que


traz um conjunto de estratégias que dispõe como serão gerenciados os bens
digitais.

Além disso, vale lembrar que determinadas redes sociais disponibilizam um


tipo de testamento digital informal, no qual é possível fazer algumas disposições por
intermédio de configurações fornecidas pelas próprias ferramentas. O Facebook, por
exemplo, oferece duas opções: manter a conta ativa ou excluí-la. A primeira
transforma o perfil da pessoa em um memorial. Isso faz com que a linha do tempo
do falecido receba homenagens e todos os seus posts anteriores possam ser
visualizados. Para isso, é preciso, no entanto, que alguém faça a manutenção e o
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acompanhamento do que acontece na página. Essa pessoa, no caso, seria


escolhida de maneira antecipada pelo próprio falecido, no momento de optar pelo
destino da conta no aplicativo. Já a segunda opção permite a exclusão do conteúdo
por um representante que comprove a morte do usuário.

O Twitter, por sua vez, autoriza que os familiares baixem todos os tweets
públicos e solicitem a exclusão do perfil. Já o Instagram autoriza a exclusão da
conta, ou, então, a transformação do conteúdo em um memorial, mediante o
preenchimento de formulário online. Basta apenas que a pessoa interessada
comprove ser membro da família.

Conclusão

Diante do exposto, podemos concluir que a discussão sobre a herança digital


está se tornando cada dia mais comum. E, embora recente, os primeiros casos de
herança digital já começam a chegar ao Judiciário brasileiro e familiares recorrem à
Justiça para requerer a quebra do sigilo de determinada conta online pessoal.

Em Minas Gerais, o juiz Manoel Jorge de Matos Junior, da Vara Única da


Comarca de Pompeu, entendeu ser improcedente o pedido da autora em obter o
acesso aos dados pessoais da filha falecida na internet. Ele baseou seu argumento
no art. 5º, inciso XII, da Constituição Federal, que trata sobre o sigilo da
correspondência e das comunicações telegráficas, de dados e das comunicações
telefônicas. Por outro lado,em um caso transcorrido em Mato Grosso do Sul, a juíza
Vânia de Paula Arantes, sentenciou que a decisão da empresa em manter ativa a
conta de um usuário falecido ataca diretamente o direito à dignidade da pessoa
humana das pessoas próximas.

Portanto, vê-se que essa nova realidade desafia o direito sucessório. Sendo
assim, na falta de uma legislação específica, o mais recomendado, como vimos, é
fazer um testamento. Apesar de não ser popular na cultura brasileira, nesse caso,
ele é fundamental para que o proprietário dos bens digitais manifeste sua vontade
quanto ao destino que deseja dar aos mencionados, havendo então um meio de
preservar o que se queria com menor risco de lesionar direitos da personalidade do
de cujus.

Mas só isso não adianta. É imprescindível que o Poder Judiciário brasileiro


forneça segurança jurídica quanto à destinação dos bens digitais. Por isso,
concluímos que as novas formas de patrimônio e herança exigem um
posicionamento e uma resposta do ordenamento jurídico brasileiro. Somente uma
legislação específica pode regulamentar o instituto e dar fim às dúvidas que
envolvem o risco de violação ao direito à e à proteção da privacidade da pessoa
falecida.
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Referências

● Assessoria de Comunicação do IBDFAM (com informações da Agência


Câmara de Notícias). Disponível em:
https://ibdfam.org.br/noticias/8765/Heran%C3%A7a+digital+%C3%A9+tema+
de+projeto+de+lei+que+trata+do+destino+de+perfis+em+redes+sociais+ap%
C3%B3s+a+morte. Acesso em 20 de set. de 2021.

● Carolina Mattioti Martino Mango e Celso Garla Filho. Disponível em:


https://www.migalhas.com.br/depeso/329849/a-aceitacao-da-heranca-digital-n
o-brasil-e-no-mundo. Acesso em 20 de set. de 2021.

● Content Team Direito Profissional. Disponível em:


https://www.direitoprofissional.com/heranca-digital/. Acesso em 20 de set. de
2021.

● Equipe SAJ ADV. Herança digital e direito sucessório: tudo o que você precisa
saber. Disponível em: https://blog.sajadv.com.br/heranca-digital/. Acesso em
21 de set. de 2021, às 14:00.

● COSTA, Vanuza Pires da; MACIEL, Camilla Menezes. Herança digital: a


eminente necessidade de regulamentação no ordenamento jurídico brasileiro.
Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 26, n. 6529, 17 maio
de 2021. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/90345. Acesso em: 21 set.
2021.

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