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A C onsc
onsciiênci
ênciaa
H i st
stóri
órica
ca Af
A f r icana
Babacar Mbaye
Doudou Diop
Dieng
(Org.)
Victor Kajibanga
(Coordenador da Colecção
Colecção Reler África)
Outubro de 2014
Nenhuma parte desta publicação pode ser transmitida ou reproduzida por qualquer
meio ou forma sem a autorização prévia dos editores. Todos os direitos desta edição
reservados por
EDIÇÕES MULEMBA
Faculdade de Ciências Sociais da
Universidade Agostinho Neto
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LUANDA - ANGOLA
emulemba@fcs.uan.ao
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H iAst
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Mba
baye
ye Di
Dioo p
Doudou Dieng
(Org.)
jZiü- edições pedago
Anta
sidadeDiop:
Diop: Na
Nations
de Rouen.tions nègres et culture - 5 e 6 de Abril de 2 0 0 5 na Univer-
índice
Discurso de abe
abertura
rtura do colóquio 15
pelo Presidente da A
A.. S. E. R.
Prefácio: Falsifi
Falsificação
cação da história 19
I.
A África e o Ocidente 23.83
A Guer
Guerra
ra do Biafra: desinformação e manipulação dos média? 47 .58
Análise de quatro diários importantes:
importantes: Le M onde, Le Figaro.
La Croix e
Croix e L'Humanité
L'Humanité
Momar Mbaye
Introdução 4 7
7
1. As cau sas 4 8
1 . 1 . As c a u s a s p a s s a d a s e i me d i a t a s 4 8
1 . 2 . As c a u s a s e s t r a t é g i c a s e e c o n ó m i c a s 4 9
1.3. As cau sas religiosas 5 0
2. H orro res e respo nsab ilidade s 51
2.1. O ho rro r absoluto 5 1
2.2. A respo nsab ilidade das gran des po tênc ias e das opiniões públicas 5 2
2.3. As resp onsa bilidad es dos líderes african os e de Lagos 5 3
3. Solu ções e pap el da Fr an ça 53
3 . 1 . As s o l u ç õ e s 5 4
3.1.1. Soc orrer o corajoso povo biafrense 5 4
3.1.2. Rep ensar a federaçã o 55
3.2 . Par is e o conflito 5 5
3.2.1 . Um a política louvável 5 5
3 . 2 . 2 . Um a a c u s a ç ã o i n d e v i d a 5 6
Conclusão 5 7
7
Fran cês/Lín gu
guas
as Africanas
Africanas:: colonização
colonização linguí
linguíst
stic
icaa 59 .83
ontem e hoj e, aqui e ali
ali
Bernard Zongo
Introdução 5 9
9
1. Linguística african ista e ideologia glotofágica 6 0
1.1. Períod o colonial: a che gad a às colónias 61
ou a linguística "pragmática"
1.2. Períod o m od ern o: triunfo do form alism o e m issão civilizadora a par tir 6 4
de 1945
Cheikh
Cheikh Anta Diop
Diop:: o homem e a obra 87.110
Cheikh M'Backé Diop
Introdução 8 7
7
1 . O c o n t e x t o h i s t ó r i c o e i d e o l ó g i c o n o i n í ci
ci o d o s é c u l o X X 8 7
2. A resistên cia africana e a res tau raç ão da cons ciênc ia histórica 9 2
2
Estado
Esta do das investigações
investigações acerca das sem elhanças entre a arte m . 124
Egípcia Antiga
Antiga e a da África Negra
N egra
Babacar Mbaye Diop
Introdução m
1. O estilo africa no e a ess ên cia da art e egípcia 1 1 1
2. Alguns exem plos de sem elh anç a ent re objectos africanos e objectos 1 1 4
egípcios
3. Será esta sem elh an ça identitária ou um a simp les analogia? 1 2 0
Conclusão 1 4 0
0
Egiptoo Antigo
Egipt Antigo e Áfri
África
ca Negra: alguns factores
factore s novos que 143.157
esclarecem as suas relações
Aboubacry M oussa L am
Introdução 1 4 3
3
1. O deb ate 1 4 3
2. A am ostr a 1 4 6
3. Novos facto res 149
3 .1 . A s p a rte s d o co rp o 149
3 .3 . A a3g.2ricu
. A ltu
á g uraa 11 55 01
3 .4 . P ig m e u e a n ã o 1 5 2
3.5.. O hi popótamo
3.5 popótamo e o cavalo 1 5 4
4. Esclarec imen to das tradições 1 5 5
Conclusão 1 5 6
6
2 . P o s i c i o n a m e n t o d o c o n c e i t o : d ú v i d a e i n te
t e l ig
i g i b iill i ddaa d e m e t o d o l ó g i c a s 1 6 3
III.
o contribu to da com unid ade n egra e do Egi pto
Egipto 165.214
para a civilização
1 . A Á f r iicc a , b e r ç o d a h u m a n i d a d e 1 7 0
2. A África, be rç o da esc rita 1 7 2
3. A África inventa o zer o 1 7 3
4. A m ultipli cação e a divisão egípcias 1 7 5
5. A sob reviv ênci a das tra diç ões erud ita e criativa afric ana s 1 7 6
6. Ap êndi ce: A m ultipli cação e a divisão egípcias 1 8 1
6 .1 . A m u ltip lica çã o e g íp ci ciaa 1 8 1
6.2. A divisão egípcia 1 8 2
6.3. A dem onstraçã o 1 8 2
"origem"" da ci
"origem civili
vilização:
zação: a necessidade do trágico no se
seio
io da
divindade
Cheikh MoctarBâ
Introdução 1 8 5
5
1 . O q u e ju stifica a re v o lta d e O g o ? 1 8 5
2. A ne ces sid ad e do "ro ub o do fogo" 1 8 7
3 . A C i v i l iizz a ç ã o c o m o c o n s e q ü ê n c i a d o " t r á g i c o " 1 9 0
Ref erên cias Bibliográficas 1 9 3
O Egipt
Egiptoo na obra de Platão 19 5.2 14
T héophi
héophile
le O be
benga
nga
1. Plat ão est ud ou no Egipto 1 9 7
2. O Egipto na ob ra de Platão 2 0 0
3. Platão egipcian iza as pala vras ao invés de as gre ciza r 2 0 1
4. O que re pr es en ta o Egipto pa ra Platã o? 2 0 2
4.1. O Egipto é o país da ma is Alta Antigüidade 2 0 3
4.2. O Egipto é o berç o da escri ta e das ciências 204
4.3. O Egipto enq uanto mo delo de orga nizaç ão artístic a e intelectual 205
4 .4 . O E g ip ttoo e n q u a n to d e te n to r d a m e lh o r p e d a g o g ia p a r a e n sin a r a s 2 0 8
matemáticas às crianças
5 . P l u t a r c o , c o n c i l i a d o r d a t e o l o g i a d o s E g í p c i o s c o m a f i lo
l o s o f iiaa d e 2 1 0
Platão
Resumos 21 5.22 0
D isc
scur
urso
so de ab
abertu
ertura
ra do col
colóqui
óquioo
pelo Presidente da A. S. E. R.
Senhor Presidente da Universidade,
Senhora le Doyen da Faculdade de Letras e Ciências Humanas,
Caros intervenientes,
Senhoras e Senhores, Caros convidados,
Assim, enco ntra m o-n os h oje reunidos para cele bra r o SO.^ aniversá rio
Assim,
do surgimento da grande obra de Cheikh Anta Diop: Diop: Nations nègres et
Culture. Inicialmente, este trabalho, publicado em 1954 e que demonstra
Culture.
a origem africana da civilização do Egipto antigo, estava destinado a
ser defendido na Sorbo nn e, com vista à ob tenç ão do do utora m ento em
letras, mas nenhum júri pôde ser constituído. Com 50 anos de distân-
cia, torna-se evidente que os temas desenvolvidos neste livro são actu-
almente discutidos enquanto verdades científicas. Para Cheikh Anta
Diop,
poGostari
Gostaria,a, igualm
r um lado igualm ente, de m anifes
à Un iversidade de Routar
en ae maoinha
CROUS
CROUSm aisda
profund
Alta Naorm
gratidão,
grati dão,
and ia,
que financiaram inteiramente este colóquio, por outro lado, à Facul-
dade de Letras e das Ciências
Ci ências Humanas, que não poupou esfo rços com
vista ao suc esso desta m anifestação , e, por último,
últ imo, a todos aq ue les que
contribuíram de algum modo para transformar este projecto num êxi-
to tão significativo.
Ent ret ant o, enqu ant o aguardam os os deb a t es que,
que , cert am ent e, serão
de elevado nível científico, permitam-me que diga simplesmente,
"Aksilèn d jam"^. Dieureungèn dieuP.
Rouen, 5 de Abril de 2 0 0 5
Sambaa K an
Samb andji
dji , P r e s i d e n t e d a A S E R
Bachelard
Prefácio:
Falsificação da história
A era do continente "sem história" terminou desde a pubUcação, em
1 9 5 4 , d e
e Nations nègres et culture.
culture. Ao recu sar a leitura
leit ura hege liana da
história humana, Cheikh Anta Diop, o historiador africano mais con-
siderado^ do século XX, dedicou-se ao restabelecimento, nesta obra,
d a consciência histórica africana. Tra ta-se, po r um lado, de "ad qu irir
histórica africana.
uma consciência cada vez mais aguda da profundidade histórica do
mu ndo tal com o o vi vive
veu"
u",, e, po r outro lado e correla tivam en te, de "ad-
quirir uma consciência que participe na história, que faça história"^.
A acreditar nos Ocidentais, o Egipto faz parte do Oriente. Ora, segun-
do Cheikh Anta Diop, foi através de uma falsificação da história que
aqueles conseguiram classificar o Egipto no Oriente, e afirmar que o
prim eiro rep res en ta um a ciden te geográfico em África. Áfri ca. O Egipto
Egipto não é
o Oriente, é a África.
Todas as testemunhas oculares do Egipto antigo afirmam convicta-
mente que os Egípcios eram Negros. Heródoto, que visitou o Egipto no
século V a.C., indica-nos que os antigos Egípcios "têm a pele negra e o
cabelo crespo"^ Diodoro da Sicília escreve: escreve: " O s Etíopes afirmam que
os Egípcios são um a das suas colôn ias qu e foi foi levada para o Egipto
Egi pto po r
Osíris"''. Estrabão, na sua
sua Géographie,
Géographie, indica-nos tam bé m que os Egíp- Egí p-
cios,
ci os, os Etíopes e os Cólquidas
Cólquidas pe rten cem à m esm a raça^
Todos este s teste m uh os nã o pod eriam s er falsf alsos,
os, tendo em con ta que
se trata de testemunhos oculares. Porém, como explicar o facto de os
antigos Egípcios terem sido Negros? Eis a justificação: após a desseca-
ção do Saara, cerca de 7000 a.C., os últimos Negros que ali habitavam
teriam abandonado aquele local para emigrar em direcção ao Alto Nilo,
exceptuando, talvez, alguns ilhéus perdidos no meio do continente.
quer por terem emigrado em direcção ao sul, quer por se terem dirigi-
do para o norte. Esta civilização dita egípcia actualmente desenvolver-
-se-á durante muito tempo neste berço primitivo. Com o declínio do
Egipto, os Negros tiveram novamente oportunidade de se expandir
progressivamente no interior do continente, de formar núcleos que
se t ornariam post eriorm ent e em cent ros de civ ilização cont inent al
[cf. Cheikh Anta Diop, 1954]. Todas as lendas e tradições, recolhidas
em África, fazem provir os Negros do Leste, do lado do vale do Nilo. É,
de ste mo do, que na África ociden tal, as lenda s dogon, iorubá
i orubá , as fazem
provir do Leste; as dos Fang trazem-nas do Nordeste; no século XVlll,
os Fang ainda não tinham alcançado a costa Atlântica; as dos Bakouba
afirmam sere m prov enien tes do Norte: é o caso dos Tútsis do Ruanda-
-Burundi (cf.
(cf. Ibid.').
Ibid.'). Os estudos etnográficos permitem-nos ficar mais
esclarecidos. Com efeito, a toponímia, a análise dos nomes totémicos
de clãs usados pelos Africanos, associada a uma análise lingüística
apropriada, permitiu a Cheikh Anta Diop demonstrar o parentesco
en tre as línguas
l ínguas do Egipto antigo e as línguas
l ínguas n egr o-a frican as. O au-
tor desenvolve, também, outros argumentos históricos, sociológicos,
geográficos, etc., que tendem a demonstrar as origens egípcias da civi-
lização africana.
Não nos parece exagerado insistir sobre o contributo do Egipto à
Grécia. O próp rio H eródoto, depois de nos info rm ar ace rca do facto
de os antigos Egípcios serem Negros, demonstra através de uma "rara
honest idade (sab endo nós que o m esm o era Grego], que a Grécia
adoptou do Egipto todos os elementos da civilização, até mesmo o cul-
to dos Deuses, e que é o Egipto que representa o berço da civilização"
(Cheikh An ta Diop). O Egipto pe rm an ec erá , de facto,
f acto, du ran te toda a
antigüidade , o lugar par a o qual os povos me dite rrâ nic os se de sloca rão
em peregrinação para se saciar nas fontes de conhecimentos cientí-
ficos, religiosos, morais, sociais, etc. Os grandes eruditos Gregos, tais
com o Platão,
Platão, Aristóteles,
Aristóteles, Pitágoras,
Pitágoras, Tales,
Tales, Sólon,
Sólon, Arquim edes, Er at ós ten es ,
foram instruir-se ao próprio Egipto (ver Théophile Obenga, pp. 212-
-2 3 0 da pre sen te obra). O regre sso ao Egipto
Egipto antigo permitiria assim à
África descobrir cada vez mais o parentesco íntimo de todos os seus
habitantes com o vale do Nilo. É através desta constatação dinâmica
que todos os Africanos alcançarão a convicção profunda de que estes
templos, estas pirâmides, estas esculturas, estas m atem áticas, esta m e-
dicina, toda esta ciência, toda esta arte do Egipto antigo, são, de facto,
obra dos seus antepassados, e que, por isso, têm o direito e o dever de
se identificar totalmente com estas, do mesmo modo que os Europeus
se identificaram com a cultura greco-latina.
7 B a b a c a r Mb aye Diop e Dou dou Dieng A Con sciên cia Histórica Africa na
I.
A Á fr
fric
icaa e o O ciden
ci dente
te
A rup turao da
africana: con
consciência
sciência
principal históri
histórica
obstáculo ca
para
o renascimento africano
Bwemba Bong^
Introdução
o factor dominante da realidade internacional consiste no facto de,
neutralizada por uma agressão ocidental multimilenar, a África Negra
entrar no IIF milênio num estado de fracasso sem precedentes na
História conhecida da Humanidade, sinal prenunciador da iminência
do caos. Com efeito, o povo negro permanece sempre exposto à lógica
mortífera do Ocidente, tal como a França o demonstrou no Ruanda,
em 1994, e mais r ecentemente, em Novembr o de 2004, na Costa do
M a r f im
im , c o m a i n t e r v e n ç ã o d a s u a p r e t e n s a c o o p e r a ç ã o f r a n c o -
-afr icana.
Para alêm disso, por forma a evitar ir de mal a pior, o nosso povo
deve apoderar-se deste instrumento de luta necessário que ê a consciên-
cia histórica.
enascinnento africano .
A rup tura da cons ciência h istórica africana: o p rincip al obstác ulo p ara o rrenascinnento Bwemba Bong 25
Estabeleceram sobrenoseleseus
tivo de oprimi-los (o povo judeu)
fardos; chefes de trabalho
e edificaram cidades forçado,
com
comoo lug com
areso deobjec-
lugares ar-
mazenagem a Faraó, a saber, Pitom e Ram sés. M as, quanto mais os oprimiam,
tanto ma
mais
is se mu
multipl
ltiplicavam
icavam e tanto ma mais
is se espalhavam , ainda que sentissem
um pavor mómórbido
rbido por causa dos fil filhos
hos de Israel. Por conseguinte, os Egípcios
fizeram osfilhos ddee Israel trabalhar como escravos sob a tirania. E tornaram
tornaram-lhes
-lhes a
vida am
amarga
arga com dura es escravidão
cravidão no pilão em argila e em tijol tijolos,
os, e com toda
forma de servi
servidão
dão nos campos, onde eram usados como eescravos scravos dominados
pela tirania.^
2. Êx odo
odo,, cap. 1, v. 11 a 14.
Babacar Mba ye Diop e Dou dou Dieng A Con sciên cia Histórica Afric ana
Qu
queinze anos mais tarde,fificaram
o acompanhavam Bona
Bonaparte
caramparte dirigia umimpressi
igualmente a expedição
onadosao eEgipto.
impressionados Osndidos.
surpree sábios
surpreendidos.
Concluíram,
Con cluíram, tal como os Gregos ttinham inham feit
feitoo mil anos antes, que um umaa raça
negra estava na origem ddaa civili
civilização
zação egípcia.
Esta redescoberta do Egipto antigo pelos Europ Europeus,
eus, bem como a revelação da
forte ascendência
ascend ência negro-africana de um umaa civili
civilização
zação à qual a Europ
Europaa tanto
devia, causaram uma espécie
espécie de mal-est
mal-estar;
ar; a mesma sobrevi
sobrevinha
nha no mom ento
mais
ma is inoportuno e am
ameaçava
eaçava dinamdinamitar
itar o mito da inferiori
inferioridade
dade inata dos
Negros,
Neg ros, necessária para a boa consciência cristã de um a Europ Europaa que devia
a sua prosperidade à exploração massiva dos escravos negros. A África era
sistematicamente despovoada. Os seus impérios tinham sido destruídos, a sua
história enterrada,
enterrada, o seu desenvolvim
desenvolvimento,
ento, paralelo ao de outras civili
civilizações
zações
do mundo,
mu ndo, subitamente
subitamen te travado. Apen
Apenas
as alguns elementos antigos ou inaces-
síveis perma
permaneceram
neceram intactos, para mais tarde dar origem a falsos testemunh
testemunhos,
os,
a partir ddos
os quais se deliberou acerca da dimensão
dimen são e da complexidade
comp lexidade da sua
evolução.^
O s Ocidentais
Ocidentai s não ignoram o fact
factoo de a con sciênc ia histórica desem -
penhar um papel importante na libertação e elevação mental de um
A África
África não faz parte do mundo mun do hist
históric
órico,
o, não manifesta
manifesta nem movimento,
nem desenvolvimento, e aquilo que ali aconteceu, isto é, no norte, res resulta
ulta do
mundo
mun do asasiát
iático
ico e europeu.
europeu..... Aquilo que apreendemos, em suma, pelo nom nomee de
África, é um mu mundo
ndo a-históri
a-históricoco não desenvolvido, inteiramente prisioneiro do
espíritoo natural e cujo lugar ainda se encontra no limiar da história univer-
espírit
sal*
E, no entanto, escreve Edem Kodjo,foi aqui, em África, que a história começou começou..
Longee de se tratar de um
Long umaa firmação gratuita, esta asserção representa um a
realidade científ
científica
ica inegável que se constata ao sulcar o mu mundo
ndo em busca dos
vestígios das civilizações
civilizações primeiras.^
A rup tura da consc iência histórica africana: o p rincip al obstác ulo p ara o renascinnento africano . Bwemba Bong
Bong 27
Anta Diop,negra
Diop,
a origem que ffoi
oi um
do dose prim
povo eiro s invesdotigad
da civilização oresfaraónico,
Egipto a pô r em evidên cia
... quan
quandodo Cheikh An
Anta
ta Diop, hom
homem
em de erudição enciclopédica, publicou a
sua famosa obra N ations nègres et culture, este foi atacado por todos os
lados, ridicularizado, vilipendiado, porque a sua visão da história ouousava
sava de-
safiar o esquem
esquemaa dogm ático traçado, entre outros, por Hegel e GobGobineau,
ineau, e
que torna o homem negro naquele que nunca contri contribuiu
buiu para o patri
património
mónio
da human
humanidade.
idade. Cheikh Anta Diop foi atacado não somente por hist historiador
oriadores
es
competentes,
com petentes, ma
mass também por pequen
pequenos
os escritores e jornalistas europeus in-
capazes de ler Heród
Heródotooto ou Diodoro da Sicília no texto, mamass que se arrogavam
o direito de rejeit
rejeitar
ar desdenhosam ente as crónicas egípci
egípcias
as destes historiadores
conscienciosos, ... levando o preconceito racista e a má fé ao ponto de recu recu--
sar o irrecusável, a saber, os traços negróides da Esfinge, por exem exemplo,
plo, ou o
carácter egípcio de tais figuras negras... ququee a ciência da falsif
falsificação
icação e da ma
ma--
nipulação não podia ainda assim classif
classificar
icar com
comoo falsas. F ace à avalanche de
escárnios, insultos, hum ilhações desenfreadas contra o investigador senegalês,
quantos
quan tos intelectuais africanos tiveram a coragem de o defender? Em nnom omee
da história "científi
"científica"
ca" dos seus mestres, algun
algunss chegaram a segui-los para
denun ciar as "teses simplistas" de Cheikh An Anta
ta Diop.^
28 Babacar Mbay e Diop e Doud ou Dieng A Con sciên cia Histórica Afric ana
Os Neg
Negros
ros não foram frustrados da sua História, porque estes nun
nunca
ca tiveram
História, nem ssentiram
entiram a necessidade de ter uma...
um a... Os Negros só descobri-
ram o mu ndo enquan to escravos... Esta estranha passividade faz co comm que a
História da África Negra até ao século XIX seja não somen
somente
te colonialist
colonialista,
a, mas
ma s
ainda epidérmica.'^
A rup tura da cons ciência histórica africana: o p rincip al obstáculo p ara o renascinnento africano . Bwemba Bong
Bong 29
O nosso renascimen
renascimento
to africano insiste signific
significativamen
ativamente
te no modo
mo do de apre-
sentar a história. Deve escrever-se a nossa história
história enquan
enquantoto a história da
nossa sociedade, não enquan to história de aventureiros europeus. A socie-
dade africana
a fricana deve ser considerada como um reflexo
reflexo de si própria, e os con-
tactos com os Europeus
Europ eus só devem constar sob o ângu ângulo
lo da experiência dos
Africanos,
Afric anos, mesmo que ttenham
enham sido uma experiência
experiência mais importante do que
todas as outras. Por outras palavras, os contactos com os Europ Europeus
eus devem
ser narrados e julgados sob o ponto de vista da harm harmonia
onia e do progresso
desta sociedade. Qu Quando
ando a história é exposta desta maneira, esta pode deixar
de issertrágico
mais
ma um
umaa narrativa...
e do triunfo para
triunfo final seda transformar no quadro
nossa sociedade. Então, do dram
dramaa da
a história cadaÁfrica
vez
poderá guiar e inspirar a acção dos Africanos. A história africana pode, deste
modo,
mo do, dar a conhecer a ideologia que deve dirigir e inspirar a reconstrução
africana.^^
30 Babacar Mb aye Diop e Doud ou Dieng A Con sciên cia Histórica African a
serve a vida. Por outro lado, o olhar retrospectivo do Africano deve
diferenciar-se da atitude do vendedor de antiguidades. Com efeito, se
este lança um olhar sobre o passado longínquo, que se torna subita-
mente próximo e vivo, é para dele extrair lições do declínio da brilhante
civilização que os seus antepassados construíram. Não é através deste
regresso ao passado que o mesmo poderá desvendar as taras da sua
sociedade, os erros cometidos pelos seus antepassados; aqueles que
estavam demasiado confiantes neste facto não souberam proteger-se
dosEmperigos
suma, exteriores.
a atitude histórica é compatível com um ponto de vista
crítico: deve vasculhar as suas raízes, revelar as fragilidades que estão
n a b a s e ddaa s o c i e d a d e ttrr a d i c i o n a l , n ã o d e m o n s t r a r c o m p l a c ê n c i a
perante um certo imobilismo latente desta sociedade. Se o Africano
tem conhecimento de que a tradição representa, por natureza, uma
fonte de verdade e uma norma de afirmação, o mesmo não deve igno-
rar que esta pode ser uma constante de inércia. Deste modo, deverá
desconfiar daqueles para quem unicamente a tradição ou o passado
possuem legitimidade, aqueles para quem a simples evocação deste
sistem a de referên cia constitui um a ocasião pa ra discurso s adulatórios.
A rup tura da consciência histórica africana: o p rincip al obstá culo p ara o renascinnento africano . Bwemba Bong 31
As civili
civilizações
zações são certamente mo
mortais,
rtais, m
mas
as a sua mo
morte
rte tem causas e no qu
quee
concerne às civili
civilizações
zações passadas da África, devem
devemos
os estudar os mo
motivos
tivos do
seu desm
desmoronam
oronam ento por forma a melhor preparar os jovens Africanos relati-
vamente
vam ente ao dom
domínio
ínio do seu destino. No que diz respeito aos Estados africanos
da An
Antiguidade
tiguidade e aos impérios med medievais,
ievais, factores internos e causas externas
convergiram para precipitar o seu declínio, e, posteriormente, o seu desapa-
recimento. D e entre os inúm eros factores internos figuram a organização in-
terna da sociedade, o sistema educativo e de transm transmissão
issão dos conhecim
conhecimentos
entos
e as dificuldades de admadministração
inistração do territ
território.^^
ório.^^
32 Babacar Mbay e Diop e Dou dou Dieng A Con sciên cia Histórica Afric ana
A rup tura da consciência h istórica africana: o p rincip al obstá culo p ara o rrenascinnento
enascinnento africano . Bwemba Bong 33
E quan
quando
do o rum
rumor
or das suas revelações chegou aos ouvidos dos seus colegas,
W a Kam issoko recebeu a visita dos representantes ma
mais
is ilustres da função de
griot do M andé. Estes ordenaram que se calasse. Aqu
Aquele
ele desobedeceu.^^
Viria a falecer pouco tempo mais tarde, vítima da Lei do silêncio que
proscreve qualquer colaboração dos sábios africanos da sua sociedade,
com base num mal-entendido repousando sobre a distância entre os
depositários dos conhecimentos ancestrais e os novos quadros forma-
dos na escola dos Brancos; nomeadamente no que concerne à concep-
ção do tem po . C
Com
om efei
efeito,
to, se para os Africanos form ado s na esco la oci-
dental, tempo é dinheiro, e estes têm geralmente pressa em distinguir
dissertação, obtend o o m áxim o de inform ações possí
a dissertação, possível
vel em tem po
recorde; para os sábios africanos, sendo a confiança a força motriz
de qualquer relação, uma tal agitação para penetrar nos segredos do
conhecimento representa uma grande contrariedade. Tal como afirma
Hampatá Bâ, só a confiança "fornece aquilo que nem a astúcia, nem a
força das armas vos pode proporcionar e aquele que não tem tempo a
perder, nada tem a fazer em África." Certamente, mas a perda de um
erudito da espécie de Kamissoko representa uma grande perda para o
nosso Povo; sobretudo se este não teve tempo de transmitir os conheci-
mentos necessários para a libertação da África e do povo negro.
34 Babacar Mbay e Diop e Doud ou Dieng A Con sciên cia Histórica Afric ana
função que consiste em ser o lugar prim eiro de tran sm issão do con heci-
mento; que o excesso de gosto pelo segredo constitui sempre a consa-
gração da ignorância, bem como um grave perigo para um povo.
Outra das fragilidades da África Negra consiste no respeito demasi-
ado grande
respeito pelapela
vidavida e pela
rep rese nta natureza.
orça,Sob
um a fforça um em
, tendo determinado
con ta que prisma,
o m esm o
demonstra que o homem e a natureza são apenas um; que no univer-
so, cada objecto representa uma actualização da "palavra divina". Para
além disso, ao rejeitar a fragmentação dualista do mundo, porque o
homem está integrado no universo e porque o corpo não é a sombra
do espírito, a concepção africana da vida estabelece uma intimidade
entre a consciência e o mundo, entre a Natureza e Deus.
O pens am ento afr iicano
cano ofer ece assi
assim
m um mo nismo pr otecto r e um
humanismo divino. Por outro lado, o valor encontra-se carregado de
uma dimensão religiosa; está impregnado de sacralidade. A própria
vidaa é sagrada, um a vez que a m es m a é um dom de Deus; esta nã o pod e
vid
ser, nem suprimida, nem tomada pelo homem. As banalidades das
religiões monoteístas ocidentais acerca do amor pelo próximo, como
imagem de si mesmo, só podem, assim, conduzir a grandes gargalha-
das naqueles que estão impregnados pela filosofia africana da vida,
filosofia segundo a qual o estrangeiro de passagem num país está sem-
pre na sua casa, ainda que em terra desconhecida, uma vez que este
pode ser a manifestação de um antepassado ou de um deus chegado
A rup tura da consciên cia histórica africana: o p rincip al obstác ulo p ara o renascinnento africano . Bwemba Bong 35
36 Babacar Mba ye Diop e Doud ou Dieng A Con sciên cia Histórica Afric ana
conta, sou EU, sendo outrém um estrangeiro, este não possui qualquer
direito. Desde os Gregos, antepassados dos Ocidentais, a Natureza era
aquilo
facto deque a ciênciaumcontemplava.
constituir modelo e umaAlisatisfação
se decobria uma da
estética ordem, pelo
inteligên-
cia. É este o motivo pelo qual a arte, incapaz de imitar a originalidade
da natureza, tinha por objectivo reproduzi-la de modo servil, procu-
rando pelo menos arremedá-la. Durante a mesma época, os homens
das ciências dedicavam-se à tarefa de conhecer os seus princípios, não
em laboratórios, mas através da reflexão acerca da essência das coisas.
Só os artesãos, os escravos e todos aqueles que aceitavam dedicar-se
a actividades consideradas vis e indignas de um homem livre é que
se dedicavam à técnica. Com efeito, do Vil- ao XVI^ século, mesmo se
os artesãos e os engenheiros ocidentais permanecem, apesar de tudo,
no exterior desta grande corrente intelectual posta em prática pelas
potências árabes, as universidades europeias ensinam o pensamento
científico e filosófico árabe, ele próprio inspirado em larga medida no
Egipto faraônico. Em 1632, Galileu, ao solicitar aos engenheiros que
des cob rissem o verdad eiro sistem a do mu ndo, atribui-lhes dignidade:
digni dade:
O engenheiro conqu
conquista
ista a dignidade do sábio, porque a arte de fabricar
trans-
formou -se no protótipo da ciência. O que com
formou-se comporta
porta um nova definição do
conhecim ento, que já não ê contem
conhecimento, contemplação,
plação, ma
mass utilização, um a nova atitude
do homem face à Natureza. Este deixa de observá-
observá-lala como um umaa cri
criança
ança
observa a sua mã
mãe,
e, enqua
enquanto
nto um mo
modelo;
delo; pret
pretende
ende conquistá-la, tornar-se
seu senhor e detentor.^"
O hom
homem
em vai acostum
acostumar-se
ar-se aos sacrilégios de Prom eteu e de ícaro; já não
teme ser fulminad
fulminadoo pelos deu deuses.
ses. Descartes, Galileu, Gassan
Gassandi,
di, e todos os seus
discípulos men
menores
ores consideram doravan
doravante te evidente que, conhecer éfabricar, e
que a Natureza nada mais faz a não ser real realizar
izar em grande aquilo que apenas
podem os reunir em detalhe e à nossa escal escala,
a, graças ao engenh
engenhoo dos nossos
técnicos.... Não somen
técnicos.. somentete já não se receia a ira divina devido a este rapto da
Natureza, m as acredi
acredita-s
ta-see também que Deus nos deu a missão de trabal trabalhar
har
à sua iimagem
magem , de constr
construir
uir o mumundo
ndo no nosso pe pensamento,
nsamento, tal como ele o
criou ao oferecer-l
oferecer-lhe
he as suas lei leis.
s. O físi
físico
co da Idade M édia voltava-se para Deu Deuss
descobrindo as suas intenções, as finalidades da Na Natureza,
tureza, o físi
físico
co mecan
mecanista
ista
volta-se para Deus penetrando o próprio segredo do engenh
engenheiro
eiro divino.
20. Lenoble, Robert, Histoire de l'Idée de nature; Ed. Albin
Albin Michel
Michel,, 19 6 9 , p.
p. 31 2.
A rup tura da consc iência histórica africana: o p rincip al obstáculo p ara o renascinnento africano . Bwemba Bong
Bong 37
38 Babacar Mba ye Diop e Doud ou Dieng A Con sciên cia Histórica Afric ana
Em suma,
africana que,existe aqui o a confronto
decifrando Natureza de duas atitudes
enquanto a marcareligiosas:
de Deus, uma,
vive
em simbiose com esta; a outra, ocidental que, considerando que o de-
ver do homem que pretende ser fiel a Deus, consiste na escravização
da natureza pelo homem. Cada uma destas atitudes tem o seu reverso:
hoje, no Ocidente, perante os estragos causados pela Ciência e pelos
seus derivados,
der ivados, proc ura-se v oltar a uma reconc iliação do Hom em com
a sua Natureza:
Deve então cconceber-se
onceber-se a esfera antropo-sociológica, não somensomente
te na sua
especificidade
especificidade irredutível,
irredutível, não somente
somen te na sua dimen
dimensão
são biológica, ma
mass tam-
bém na sua dimen
dimensão
são fís
física
ica e cósmica... Deve então reencontrar-se a Nature-
za para enencontrar
contrar a nossa Natureza, tal como tinham sentido os româ românticos,
nticos,
autênticos guardiãos da complexidade
comp lexidade duran
durante
te o século da grande simplifi-
cação... A Na
Natureza
tureza da NaNatureza
tureza está na Natureza.
Na tureza. O nosso desvio, relativa-
mente à Natureza, é animado pela Natureza da Natureza.^'^
mente. Ora,vital,
seu espaço este uma
aperecebe-se doravante
vez que este último que ele próprio
participa na vidadiminuiu
universal.o
Por outras palavras, depois de ter fundamentado a sua sabedoria na
lógica da exclusão, a saber que,
que, se eu tivesse razã
razão,
o, estaríeis
estaríeis errado, a
vida sobre a mo
morte,
rte, preto ou branco, bem ou mal,mal, acontece por vezes,
ao hom em ocidental, pe rce be r que a realidade é ho je mais comp lexa.
A África, envolvida com a sua sobrevivência, deve poder meditar nas lições da
História. Deve poder abordar a hora da reflexão e, indo para lá da sua visão
filosófica,
fil
e osófica,
os meios tãodo rica pelomento
seu hum
renascimento
renasci anismo
anism
através odee uma
através pela sua harm
harmonia,
abordagemonia,renovada
conceber doas fact
vi
vias
aso
facto
A rup tura da consciên cia histórica africana: o p rincip al obstác ulo p ara o renascinnento africano . Bwemba Bong
Bong 39
um, de origem
pressão exercidaasiático,
sobre oteve
paíslugar
negrosob
foi a nomeadamente
VIF dinastia. Porém, a pior
a das hordes
Hicsos, bá rb ar os de origem a siática. O sac erd ote egípcio, M anetho n,
refere:
40 Babacar Mba ye Diop e Doud ou Dieng A Con sciên cia Histórica Afric ana
Sob o reinado de Timaios, a ira divina assol
assolou
ou o Egipto; sesem
m se saber porquê;
contra qualquer expectativa, hom ens de umumaa raça desconhecida, provenientes
do Oriente, ousaram invadir o país, apoderaram -se dele sem com
combate,
bate, tomaram
chefes como prisioneiros, iincendiaram
ncendiaram as aldeias selvatic
selvaticam
amente,
ente, saquearam os
templos dos deuses e ma
maltrat
ltrataram
aram duram ente os habitantes, degolaram uns e
reduziram outros a escravos com as suas mu mulheres
lheres e crianças.
Foi deste modo que, dur ante per to de dois séculos, de 1780 a
1 5 8 0 a.
a.C.
C.,, o Egipto
Egipto foi
foi sub m etido ao do m ínio ob scu ran tista dos Hicsos. A
libertaçã o do país só chega rá em 15 8 0, do Sul Sul,, da reale za de Tebas, p elo
rei Ka m ósis e o seu su ce sso r Am ósis 1, 1, que travaram um a v erda deira
guerra de libertação para conseguir expulsar estas hordas estrangei-
ras do Egipto. Edouard Schure, que se dedica a esta época, escreve:
Cerca do ano 2000 a.C., o Egipto atravessa a crise mais temível qque
ue um povo
possa atravessar: a da invasão estrangeira e de umumaa semi-conqu
semi-conquista.
ista..... Con
Con--
duzida pelos reis
reis pastores cham
chamados
ados Hicsos, esta invasão estendeu-se sobre
ocorromp
Delta ida,
e o Médio
corrompida, Egipto. jónica,
a languidez Os reis cismáticos traziam com eles um
umaharém,
o luxo da Ásia, os costumes do a civil
civilização
ização
um a
idolatriaa grosseira. A existência nacional
idolatri n acional do Egipto estava comp
comprometida,
rometida, a
sua intelect
intelectualidade
ualidade em perigo, a sua missão universal am ameaçada.^'^
eaçada.^'^
A rup tura da consc iência histórica afri cana: o p rincip al obstáculo p ara o renascinnento africano .
africana: Bwemba Bong
Bong 41
arma da de mercenários
armada mercená rios livres ou semi-servis com
comandado
andadoss pelos seus chefes na-
cionais; só o alto coma
comando
ndo e alguns destacamen
destacamentos
tos de arqueiros perma
permanecerão
necerão
egicpios.... O processo atingirá o seu ponto culm
egicpios.. culminante
inante sob os usurpad
usurpadores
ores
líbios da XX VI- dinastia, ma mais
is precisamente sob Psam Psamético.
ético. É então que
os elementos nacionais de um a das guarnições
guarn ições da armada
arma da egípcia acanto-
nada em Daphne, em M océa e na Il Ilha
ha deAbu
deAbu recusar
recusaram
am obedece
obedecerr ao rei e s-
trangeiro e partiram para oferecer os seus serviços ao rei de Cu Cuche,
che, do Sudã
Sudãoo
Nu biano; trata-se da expedição dosAu
dosAutomolos
tomolos de que fala Heródoto..P
Heródo to..P
ao
do Centro da África,
povoamento actualaodaOeste, ao cujos
África, Sul, egrandes
que vãoImpérios
constituir(Gana,
uma parte
Mali,
Songhai, Monomotapa, etc.) vão, por sua vez, sofrer estas invasões
estrangeiras para finalmente se desmoronar, nomeadamente sob os
ataques dos Almorávidas. Em 1706, Gana, a capital, desintegrar-se-á:
42 Babacar Mb aye Diop e Doud ou Dieng A Con sciên cia Histórica Afric ana
A rup tura da cons ciência histórica africana: o p rincip al obstácu lo p ara o renascinnento africano . Bwemba Bong 43
4 Babacar Mbay e Diop e Dou dou Dieng A Con sciên cia Histórica Afric ana
A gu erra do Bi
Biaf
afrr a: desinform ação e
manipulação dos média? Análise de
quatro diários importantes: Le Monde,
Le Figaro, La Croix e L'Humanité
Momar M ha
hayy e^
Introdução
Sete anos após a sua independência, a Nigéria entrou numa fase de
evolução política de rara violência. Em menos de seis meses, atraves-
sou dois golpes de estado sangrentos e caiu, em 1967, numa terrível
guerra civil. A tragédia fez, em dois anos e meio, mais de dois milhões
de m ortos. Provocou tam bém um a viva
vi va indignação interna cional e mo-
bilizou os méd ia do m und o inteiro. A im pre ns a fran ces a não esteve,
bilizou
portanto, isenta na cobertura de um acontecimento de tão grande im-
portância.
Para além disso, era fácil considerar-se devidamente informado a
partir do m om en to em qu e se mergulhava na im pren sa daquela época.
Só que estas certe zas foram ab aladas po r duas pub licações. Rém y Bou-
tet, na terrível guerra do Biafra
tet, Biafra (1 99 2] , est
estigmatiz
igmatizava
ava uma manipula-
ção dos média do hexágono através de agentes pro-biafrenses. Tal as-
serção foi con firm ad a num a obra ainda m ais rec en te. De fact
facto,o, Step han
Smith e Antoine Glaser retomaram, em 2005, na sua obra obra Pourquoi la
France a perduque
rice Robert, l'Afrique?,
l'Afrique?,
afirmava os ter
propósitos do antigo
influenciado chefe do
os média SDCE, Mau-
franceses para
despertar um sentimento de compaixão e de proximidade com o povo
biafrense junto da opinião pública. Para quem se interessa pela im-
prensa do hexágono nas suas relações com o continente negro, tais
revelações não podiam, evidentemente, provocar indiferença. Decidi-
mos então, por forma a adquirir uma visão clara, olhar atentamente
para o tratamento desta guerra nos quatro periódicos nacionais de
tendên cia e de obed iência diversa
diversas.
s. Procu rarem os, deste modo , analisa r
A g uerr a do Biafra: des infor ma ção e manip ulaçã o dos média ? Análise de q uatro diários imp ortantes ... . Momar Mbaye A7
1. As causas
Os diários e semanários franceses que cobriram o conflito biafrense
não ignoram um factor pri
primo
mo rdial
rdial.. O Estado africano, cujas op eraç ões
são o palco, é muito pouco conhecido pelos seus leitores. Por muito
que seja uma das mais povoadas e mais ricas do continente africano,
a Nigéria não dispõe, de todo, da celebridade da Costa do Marfim. A
sua pertença ao mundo anglófono é uma das suas razões. Por outro
lado, referir acontecimentos que ali se sucedem requere, por parte da
maioria dos jornalistas, muita pedagogia; daí a profusão dos artigos
que se empenharam em explicar os motivos do conflito. As causas con-
sideradas são, como é evidente, variadas consoante se considere um
ou outro jornal.
48 Babacar Mb aye Diop e Doud ou Dieng A Con sciên cia Histórica Afric ana
Biafra: desin form ação e ma nip ula ção dos média? Análise de q uatro diários imp ortan tes... .
A g uerra do Biafra: Momar Mbaye A7
50 Babacar Mbay e Diop e Doud ou Dieng A Con sciên cia Histórica Afr ican a
2. Horrores e responsabilidades
Com mais de dois milhões de vítimas, esta guerra foi mais mortífera
do que a do Vietname e claramente mais sangrenta do que a do Próxi-
mo-Oriente. Foi um horror indescritível que a imprensa, no entanto, se
esforçou por colorir.
... o
o capacidade norm al deste conjunto hospitalar é de vinte e quatro cama
camas,
s,
e existem actualmen
actualmente
te oitocentos pacientes auferidos, entre os quais alguns
estão imobilizados há três meses... urinas, excremen
excrementos,
tos, pus, med
medicamentos,
icamentos,
compõem odores mefít mefíticos
icos que lembram o de um estáestábulo
bulo sobreaquec
sobreaquecido.
ido.
M
umasocidental
existe algo de mais amarg
dificilmenteamargoo e m ais
suportaria... E violento
ma
mais nestespode
is adiante, odores,
aindaqueler-se:
o olfacto de
existem
velhos que expiram, porque é necessário salvar os ma mais
is jovens. Indivíduos
extremam ente feridos no rosto, para os quais não se dispõe de nenhu nenhuma ma pró-
tese; tal com
comoo estes três soldados com os m axilares inferiores triturados, onde
umaa cabaça ocupa o lugar do queixo... hom
um homens
ens estilhaçados sem olhos, sem
nariz, sem pernas, mulheres que vão morrer porque já não há plasma nem
sangue para fazer transfusões.
transfusões. (L
(Lee Mond
Monde, e, 7/ 05/ 19 69)
E o artigo produzido três dia mais tarde sobre a grande miséria das
populações civis é do mesmo nível. Coloca em evidência uma enorme
penúria alimentar, para além da falta de medicamentos. Esta situação
provoca um aumento exponencial da taxa de mortalidade no Biafra.
Este jornal não foi o único a enfatizar a extrema pobreza das popu-
lações biafrenses; o órgão católico também não, de resto. Para além
destes textos, este diário distingue-se sobretudo pela imagem. Deste
modo, na manchete de 14/02/1969, obser vam-se cr ianças com uma
magreza indescritível a vir recolher a alimentação distribuída por
organizações humanitárias. Segundo a mesma ordem de ideias, um
gr
do ande
Biafra,título
aco mem
Biafra, panpr
haimeir
umaa insuportável
página de 13/01/1970:
13/01/1970: o final
foto de criança dram
dramático
m acilenta ático
com
o seguinte comentário: "no olhar desta criança, toda a miséria dos
famintos". Esta propensão para mostrar o horror mais absoluto par-
ticipa em dois princípios: em primeiro lugar o de designar os vários
A g u e r r a d o Bi
Biafra
afra desinform
desinformação
ação e man ipulação d o s m é d i a ? A n á l i s e d e q u a t rroo d i á r iioo s i m p o r t a n t e s . . . . Momar Mbaye A7
responsáveis por esta hecatombe; depois, despertar as consciências
amolecidas do Ocidente.
3. Soluções e papel da Fr an ça
Durante todo o conflito e até à sua finalização, os jornalistas não
deixaram de esboçar soluções para a sua resolução. Estas foram, de
um modo geral, a favor do povo biafrense. Todavia, uma vez a derrota
consumada, foi um apelo à indulgência e à responsabilidade que foi
frequentemente dirigido ao governo federal.
A g uerra do Biafra: desin form ação e man ip ulaçã o dos méd ia? Análise de q uatro diári os imp ortantes... .
diários Momar Mbaye A7
3.1. As soluções
54 Babacar Mba ye Diop e Doud ou Dieng A Con sciên cia Histórica Afric ana
Nigéria,
da voz da Philippe
razão. Decraene
O autor (cf. Le
(cf. Le M onde
preconiza onde,, 23/11/1967]
uma partilha deapela ao privilégio
esforços nos dois
camp os. O Biafra de deve,
ve, segundo lhe parece, renun ciar ao sepa ratism o
e favorecer a pro m oçã o de um hom em m eno s m arcad o pela revolta, revolta, tal
como o Dr. Okpara, antigo primeiro-ministro de Estado do sudeste. Do
lado governamental, muita paciência deve ser posta em prática para
integrar os secessionistas. Em suma, as etnias minoritárias deveriam
ter mais representação para evitar a tripolarização étnica, vector das
realidades pronunciadas.
N o La Croix
Croix d e 15/01/1970, Antoine Weng er retorna à problemátic a
da unidade. Este considera que é necessário operar uma reformula-
ção da estrutura tradicional, uma vez que o país, tal como está, ainda
contém os germes intrínsecos do conflito. A sua observação dirige-se
também aos Africanos que consideravam que a guerra era apenas re-
sultado de manipulações imperialistas. Segundo a mesma ordem de
ideias, Jacques Madole, num artigo intitulado:
intitulado: para os vencidos,
vencidos, con-
traria o velho hábito ddaa história que tend e frequ en tem ente a con den ar
os vencidos. Este pretende que o sacrifício dos Igbos possa abrir os
olhos à c omunid ad e humana e fazer c om que as c aus as d a revolta
sejam apagadas definitivamente.
E o j o r n a l i s ta co ns i d e r a qu e a F r a nça , qu e d i s p õ e d e u m a r e p u ta çã o
e x c e p c i o n a l n o m u n d o i n t e i r o , s e d i s t i n g u i u p e l a j u s t i ç a d a s u a
a c t u a ç ã o , aliás, altamente apreciada no Biafra. Este ângulo de análise
é p a r ti l ha d o p o r F hi l i p p e D e cr a e ne no
no Le Monde
Monde d e 1 3 / 0 9 / 1 9 6 8 . E s t e
dd ea mo
r onsBtri aaf, r anop sr eo uv édmo cu
s i me
mpnto , qunte
l e s me e a dde e te
p rremi napçã
o cu o ef sr a nce
a çõ s a niptá
hu ma a rrai aasj ue-
diplomáticas. Isto porque, perante o mártir do Biafra, Paris não
p o d i a p e r ma ne ce r i ns e ns í v e l . Pa r a a l é m d i s s o , a d e te r mi na çã o d o s
insurgentes é prova real do seu apego à liberdade e ao direito à auto-
d e t e r m i na çã o qu e Pa r i s nã o p o d e r i a ne g l iigg e nci a rr.. O j o r na l i s ta a f a s ta
prontamente as acusações errôneas de Lagos relativamente à defesa
d e a l g u ns iintente r e s s e s f r a nce s e s . O m e s m o d e m o ns tr a , p o r f o r m a a f u n-
d a me nta r o s e u p r o p ó s i to , a e x tr e ma f r a g i l i d a d e d o s i nv e s ti me nto s
franceses na Nigéria.
56 Babacar Mba ye Diop e Dou dou Dieng A Con sciên cia Histórica Africa na
Conclusão
No final desta análise, muitos factores são de salientar no que con-
cerne à cobertura dos acontecimentos nigerianos pelos diários tidos
em consideração. A larga implicação do
do Le Monde
Monde e d o La Croix
Croix cor-
responde àquilo que deve ser salientado em primeiro lugar A multi-
plicidade de artigos consagrados ao acontecimento e a diversidade
de jornalistas que se dedicaram ao problema tornam públicas a sua
verdadeira preocupação. O O Le M onde
onde cum pre o seu papel de diário de
referência pela diversidade das suas temáticas e o seu objectivo de dar
cobertura ao mundo inteiro. Jornal de obediência religiosa, profunda-
mente agarrada às questões humanitárias, o o La Croix
Croix não podia, por
força de alguns vestígios religiosos aplicáveis ao conflito, permanecer
indiferente ao drama. Quanto aos dois jornais de opinião que são o
Figaro e l'Hum anité,
anité, este s foram sem dúvi dúvida
da influenc iados pelas suas
respectivas ideologias. Fundamentalmente ancorada por detrás da
União Soviética e abertamente anticapitalista, o o l'Humanité
l'Humanité adoptou
frequentemente uma perspectiva de análise bastante interessante. Por
motivos quase similares, o o Le Figaro,
Figaro, porta -es tand arte d a band eira
do conservadorismo francês, apoio decisivo do governo federal, nem
sem pre ffoi
oi de um a sincerida
si ncerida de irrepreensível.
Para além disso, podemos também concluir a presente reflexão, a
propósito de uma eventual manipulação da imprensa francesa por
agentes pro-biafrenses, afirmar que os jornais mantiveram mais ou
m en os a sua llinha
inha editorial tradicional. M esm o que, de um u m m od o g eral,
o destino desastroso do Biafra tenha sido partilhado, não podemos
A guerra d o Bi afra: d es i n form aç ão e m ani pu laç ão d os m éd i a? A náli s e d e quatro d i ári os i m porta ntes ... . Momar Mbaye A7
Referências Bibliográficas
Os Jornais:
La Croix-, 0 6 / 0 8 / 1 9 6 8 ; 1 0 / 0 9 / 1 9 6 8 ; 1 1 / 0 9 / 1 9 6 8 ; 1 2 / 0 9 / 1 9 6 8 ; 1 9 / 0 9 / 1 9 6 8 ;
13/0 1/19 70; 15/0 1/1970.
LeFigaro-, 1 8 / 1 1 / 1 9 6 7 ; 0 9 / 0 9 / 1 9 6 8 ; 1 3 / 0 1 / 1 9 7 0 ; 1 4 / 0 1 / 1 9 7 0 ; 1 5 / 0 1 / 1 9 7 0 .
L'Humanité-. 1 6 / 0 8 / 1 9 6 8 ; 1 3 / 0 1 / 1 9 7 0 ; 1 4 / 0 1 / 1 9 7 0 ; 1 6 / 0 1 / 1 9 7 0 .
L e M onde:
onde: 1 8 / 1 1 / 1 9 6 7 ; 1 0 / 0 6 / 1 9 6 8 ; 0 7 / 0 7 / 1 9 6 8 ; 0 2 / 0 8 / 1 9 6 8 ; 1 9 / 0 8 / 1 9 6 8 ;
21/0 8/19 68; 19/09/1 968 ; 08/05/196 9; 09 /05/19 69; 13/0 1/19 70; 16/0 1/1970 ;
20/01/1970; 14 /11 ^9 70 .
As obras:
B o u t e t , R . ( 1 9 9 2 ] . " L ' e f f r o y a b l e g u e r r e d u B i a f r a " i n R evue A fri qu
quee conte
contempomporairai ne
ne-,-, vol.
n.2 14, Paris.
G l a s e r , A . e S m i t h , S . ( 2 0 0 5 ) . C omment
omment la Fr ance a pe perdu
rdu l'A fr i que.
que. P a r i s : e d . C a l m a n n -
-Lévy.
S i t b o n , M . ( 1 9 9 8 ) . "L e B i a f r a o u b l i é " i n U n génoci
génoci de sur la conscienceconscience-,-, P a r i s , p p . 4 0 - 4 8 .
V e r s c h a v e , F - X . ( 1 9 9 9 ) . L a Fr ance A fr i que. que. L e plus long s candale candale de la républi
républi que.
que. P a r i s :
ed. Stock.
58 Babacar Mba ye Diop e Doud ou Dieng A Con sciên cia Histórica African a
Fran
Fr an cês/líng
cê s/líng u as afric
afr icanas:
anas: colonizaç
col onizaçãoão
lingu
li nguísísti
tica
ca o n tem e hoje,
hoje, aqui
aqui e al
a li
Bernard Zongo'
Introdução
o título da com un icaçã o p od e suscitar,
susci tar, a alguns, um ce rto travo a vi
vin-
n-
gança ou sugerir, a outros, um eco de "dejà-entendu" devido à evidên-
cia deste termo historicamente situado e consensualmente conotado:
"colonização". Porém, é forçoso reconhecer-se, com Cheikh Anta Diop,
que a restauração da consciência histórica do homem negro, na sua
dimensão linguística no que nos concerne, constitui uma luta perma-
nente de tal modo os esforços são numerosos e persistentes, de de tal
modo as instâncias de dominação jamais incorrem em falta de imagi-
nação para preservar o seu estatuto. E é precisamente a ligação que
necessitaremos estabelecer, entre a ideologia reivindicativa e reabilita-
dora do egiptólogo africano e o objectivo dos propósitos que terei em
consideração.
O m eu colega Cheikh M'Ba cké Dio Dio p ^ relem bra va o ntem , justa -
mente, o mod o c omo os ps eud o-c ientí fic os ou ps eud o-humanis tas
(Voltaire, Hegel, Gobineau, Bruhl, Hume], desde cedo, mas particu-
larmente no século XIX, se aplicaram a legitimar, no plano moral e
filosófico, a inferioridade intelectual decretada do Negro, e travestiram
os dados científicos para colocá-los ao serviço de uma ideologia de
s ubmis s ão/d ominaç ão d o neg ro; atrever-me-ia a d izer d o homem
negro, mas para tal era necessário que o seu estatuto fosse reconhe-
cido.
ci do. O âm bito d a linguística não esc ap ou a este trab alho de alien ação ,
d e rejeiç ão, d e neg aç ão c onc eptualizad a por ling uis tas e outros
ped ag og os d a es c ola afric anis ta franc es a, apoiad a e inc entivad a por
F ranc ês /lí nguas afri c anas : c oloni zaç ão li nguí s ti c a ont em e h oje, aqui e ali . BernardZongo 59
54 Babacar Mb aye Diop e Dou dou Dieng A Co nsciê ncia Histór ica Africa na
Po r um q uestã o de clar
clareza
eza da anál
análise,
ise, passa rei a descrev er o pr oce sso
de glotofagia das línguas africanas pelo(s) francês/Franceses, adop-
tando um ponto de vista diacrónico, por forma a interrogar as balizas
mais significativas da história linguística africanista. Deste modo, é
possível distinguir quatro grandes períodos: 1] o período colonial e a
linguística "pragmática", segundo a expressão de Vincke (1988); 2) o
período moderno (a partir de 1945) ou o triunfo do formalismo e da
missão civilizadora; 3) os anos 60 ou a sociolinguística e as suas torpe-
zas; 4) por
por último, a partir dos
dos anos 70 ou a diversão das instituições
francófonas.
No decorrer de todos estes períodos, as marcas da colonização lin-
guística surgirão sob diversas formas: a denominação linguística e a
redução das línguas africanas, a orientação temática da investigação
e as produções editoriais ocupadas pelos investigadores franceses, a
exclusão dos Africanos da investigação e das instâncias institucionais
de decisão, o esta tuto e o cor pu s das línguas africana s, a he ge m on ia do
francês nas esferas da vida pública e a exclusão das línguas africanas
como ferramentas de educação e de desenvolvimento.
F ranc ês /lí nguas afri c anas : c oloni zaç ão li nguí s ti c a ontem e hoje
oje
h quiie
qu ali . BernardZongo 55
d e L a b o u r e t ( 1 9 3 4 : : description
description du man
manding).
ding). Ac res c en tar-s e-ão outros
nomes: Tastevin, Abiven, Bazin, Delaforge, Senghor, Tauxier, Cheron,
Griaule, Leiris, Alex and re, Froger, Vieill Vieillard.
ard. A África Central, ainda qu e
abordada tardiamente, também conheceu o seu batalhão de linguis-
tas e d e es c reved o res : G aud ef efroy
roy D em om by nes
nes [vocabulaires et notes
sur les langues oubanguiennes, nilo-sahari nilo-sahariennes
ennes tchadiques), Bruel
et tchadiques),
(1910: langue des Pygmées de la Sanga), Calloc'h (1911: (1911: vocabulaires
et esquisses gram grammaticales
maticales du ngbaka, du gbanzili, du mozombomozo mbo et du
gbea], T i s se
gbea], s e r a n d ( 1 9 3 1 : : dictionnaires
dictionnaires des langues banda, grammaire
gram maire
du banda "com "comum um",", dictionnaire sango vvéhiculair e), E b o u é ( 1 9 3 3 : v o -
éhiculaire),
cabulaires de langues ou oubanguiennes).
banguiennes). Na África Equ atorial, ret er em os
essencialmente os trabalhos de Eboué, de Gaudefroy-Combines, de
Lebeuf e de Mouchet. Porquê enumerar tantos nomes? Todos estes es-
critores partilham um objectivo comum: colocar os seus trabalhos ao
serviço da doutrina ideológica da época, isto é, a dominação e a explo-
ração. E é ao exam inar o seu estatuto que d esco brim os a ffinali inalidade
dade dos
trabalhos descritivos das línguas africanas.
Podemos distinguir duas categorias de escrevedores. Primeira-
mente, os missionários e os administradores. Apesar de desprovidos
de formação linguística no que concerne à maior parte de entre eles,
estes realizaram contudo numerosas obras sobre as línguas africanas,
tal como vimos. As intenções eram evidentes e não necessitam de ser
mais explicitadas. A evangelização das populações devia passar por
um a aprendizag em e pelo dom ínio íni o dos "dialectos" locais.
locai s. A este respei-
to, estou aturdido (no sentido etimológico de ser atingido pelo trovão)
com o discurso de alguns intelectuais franco-borgonheses que pare-
cem prestar homenagem às capacidades inauditas destes pais brancos
que podiam aprender as línguas africanas em alguns meses, enquanto
que estes "blacks", depois de tantos anos em França apenas falam de-
sarticuladamente o francês. Estes intelectuais poderiam interrogar-se
sob re o ní
nível
vel de com petê ncia alcançado po r esta aprendizagem acele rad a
das línguas africanas, e melhor acerca das intenções desta iniciativa.
Relembramos, no que concerne aos mais antigos de entre nós, as mis-
sas pronunciadas em línguas africanas pelos padres brancos e os es-
forços sobre-humanos consentidos pelos fiéis aficanos, não sem uma
certa indulgência, para ouvir a mensagem evangélica.
A adm inistração coloni
colonial,
al, por sua vez
vez,, precisava de con he cer m elho r
os meios d e c omunic aç ão d as populaç ões para um maior rend imento
das explorações.
o objectivo E quando
n ão era, a escola
longe disso, for mfrancesa foi instalada
ar as elites na per spe nas
ctivacolónias,
de um a
hipotética autogestão ulterior, mas sim implementar uma reserva de
ond e sairi
sairiam
am coo rtes de intérpretes. As descriçõ es linguíst
linguísticas
icas ta m bé m nã o
62 Babacar Mba ye Diop e Doud ou Dieng A Con sciên cia Histórica Africa na
F ranc ê s /lí nguas afri c anas : c oloni za ç ão li nguí s ti c a on tem e h oje, aqui e ali . BernardZongo 65
66 Babacar Mba ye Diop e Dou dou Dieng A Con sciência Histórica African a
ocabo
mesmo, tal como
"análises relembra ao
contrastivas" Kazadi (1991:
serviço 158): tratava-se
da "necessidade de de levar ae
explicar
de corrigir os "erros" através da especificação das dificuldades encon-
tradas pelo locutor de língua diferente, em situação de aprendizagem".
Os temas de investigação definidos, bem como as publicações que as
sustentam e propagam, confirmam esta orientação:
- Os tem as : an álises contras tivas francês/língu as africanas, situa-
ções de uso das línguas, expansão das línguas, políticas e práticas
linguísticas, dificuldades de aprendizagem da língua-alvo, etc.
- publicações. Calvet, 1964,
1964, Le français parlé, étude phonétique, in-
terférences
terfé rences du phonétisme wolofi
wolofi Th iriet, 1 9 6 4 , .4 travers quelques ca-
peuls) Thiriet, 1965,
hiers d'orthographes d'élèves peuls) 1965, Le français écrit de
quelques élèves Bambara/Mali]
Bambara/Mali] Cal Calvet
vet e Dum ont, 19 67 , Interférences
sénégalais. Uma pub lic
du wolof dans le français des élèves sénégalais. licação
ação em-
blemática que ilustra a submissão das línguas africanas às regras e à
omnipotência do francês é, indubitavelmente, o livro de Jean-Pierre
Mak outa-Mbouk ou:
ou: Le français en Afrique noire.
F ranc ê s /lí nguas afri c anas : c oloni z aç ão li nguí s ti c a ontem e h oje, aqui e ali . BernardZongo 67
68 Babacar Mba ye Diop e Doud ou Dieng A Con sciên cia Histórica Africa na
a sua
s ua impo tência face a um a máqu ina criada para dom inar ainda m ais. ais .
Note-se que a francofonia carrega os germes da sua ambição domi-
nad ora e glotofá gica desd e a sua criação po r O nésim e Reclu s
[1837-1916, nas c id o em O rthez, no s eio d e uma famí lia protes tante
de Béarn, cujo pai
p ai era pa sto r). Reclus forja
f orja o term o po r volta de 1 88 0 ,
no âmbito da sua reflexão acerca do destino colonial francês e afirma
de modo emblemático: logo que uma língua tenha "coagulado" um
povo, todos os elementos "raciais" desse povo subordinam-se a esta
língua. Foi neste sentido que se afirmou que a língua faz o povo povo [língua
gentemfacít-Redus,
gentemfacít-Redus, 1 9 17 ). As instituições francófonas, m as tam bé m
aqueles que são designados de "pais fundadores" [Bourguiba, Diori,
mas sobretudo Senghor, o homem da "commonwealth à francesa") da
francofonia adoptarão esta ideologia do francês "língua universal" para
alguns, "língua
mos apenas nas do pensamento
instituições: lógico"ACCT,
AUPELF, para outros. Porém, insistire-
CILF [Conselho interna-
cional da língua francesa), UREF. Segundo Maurice Étienne Beutler
[Secretário geral da AUPELF) e o Professor Michel Guillou [Delegado
geral da UREF) em 1988, estas instituições respondem à "importância
cada vez ma is cres cen te da procu ra geral em m atéria de c on hec im ento
do francês, do estudo das suas normas locais em contexto multilin-
guístico, de abordagens e aplicações pedagógicas necessárias para o
seu ensino". Resta saber de onde provém esta procura
Duas posições glotopolíticas antagonistas confrontam-se nestas
instituições:
instit uições: por uum
m la
lado,
do, a preo cup ação com um en raizam ento melhor,
com uma maior difusão do francês em África, apoiada pelos decisores
e linguistas do Norte; por outro lado, a preocupação em colocar no
centro das investigações as línguas africanas, simultaneamente en-
quanto ferramentas para o desenvolvimento económico e educativo
apoiado, como é evidente, pelos linguistas africanos, quando estes
eram convidados a tomar parte nas reuniões internacionais. Os segun-
dos,, desprovido s de meios ec on óm icos e po der de decisão,
dos deci são, tiveram
tiver am de
obedecer aos primeiros. Esta dominação é visível a vários níveis.
deA língua
AUPELF - Asso-ciação
francesa das universidades
foi criada parcial ousob
em 1961, em Montreal, inteinstigação
iram ente
de activistas quebequenses, com o objectivo de desenvolver o relacio-
nam ento e a inform ação en tre aass universidades francófonas, prom over
o diálogo das culturas e os estudos franceses, a pedagogia universi-
tária e a educação permanente.
Veremos que as acções levadas a cabo sob o patronato da AUPELF
se afastam dos objectivos mencionados, e não têm outra finalidade
que não seja estudar os meios para uma melhor dominação dos países
francófonos do Sul.
F ranc ê s /lí nguas afri c anas : c oloni za ç ão li nguí s ti c a on tem e h oje, aqui e ali . Bernard
Bernard Zong
Zongo 69
lo :,:, Babacar Mba ye Diop e Doud ou Dieng A Con sciên cia Histórica Africa na
Laurent Duponchel:
Suzanne Duponchel: Dictionnairedes duparticularités
Lafage: D ictionnaires
Lafage: français de Côte d'Ivoire
d'Ivoire
lexicales du ( 1français
975).
au Togo et au Dahomey
Dahomey ( 1 9 7 5 ) .
Jean-Pierra Caprile:
Caprile: Premier inventaire des particularités
particularités lexicales
lexicales du
français parlé au Tchad
Tchad ( 1 9 7 8 ) .
Jacques Blondé, Pierre Dumont, Dominique Gontier: Gontier: Particularités
lexicales
lexical es du français au Sénégal
Sénégal ( 1 9 7 9 ) .
Ambroise Queffelec:
Queffelec: Dictionnaire des particularités
particularités du Niger
Niger ( 1 9 7 8 ) .
- Se seguirmos os autores de
de L'Inventaire
L'Inv entaire des particularités lexicales
d'Afrique noire,
noire, esta obra teria por objectivo contribuir para apre-
ender melhor "os problemas de plurilinguismo e de contacto entre
as línguas". Porém, ninguém levantou a questão da utilidade destas
investigações para os principais interessados, os Africanos, nem do
ponto de vista educativo, e muito menos económico. Na verdade,
as investigações levadas a cabo no âmbito da IFA respondiam a um
fenómeno de moda, a um contexto científico dominante: a análise
dos dialectos regionais em França, uma iniciativa lançada por Pierre
Guiraud aquando da reunião da AUPELF em Montreal, em 1967. Este
tinha sugerido a ideia de criar um "centro de investigações para o
es tud o d os d ialec tos franc es es (em F ranç a e no ex terior d es ta)" ,
durante o colóquio de Nice, em 1968, no seio do Centro de estudos
d as relaç ões interétnic as (trans formad o no ID E RIC, em 1978). O s
Africanos acabarão por reforçar a sua posição relativamente a todos
estes projectos, que, afinal, lhes diziam respeito directamente.
- O po nto de vista dos linguistas african os.
F ranc ê s /lí nguas afri c anas : c oloni za ç ão li nguí s ti c a ont em e h oje, aqui e ali . Bernard Zongo 71
...
... não dispondo de meios própri
próprios,
os, a instância desejada pelos linguistas
linguistas
africanos
africanos terá visto a sua acção bloqueada pelas reticências da AC CT em
lo ::,, Babacar Mbay e Diop e Doud ou Dieng A Con sciên cia Histórica Africa na
endossar aquilo
desconfiança destaqueúltima,
esta considerava nhacomo
que não titinha um
umaadecriação
deixado da AUPELF,
ver ali uma
um e pela
a certa ameaça.
os particularismos
mente integ rar o extraídos
o Trésor général nodecontexto
la langue africano
française. devem
française. simples-
Le Dictionaire
Bordas du français vivant vivant procedeu desta forma ao integrar belgicis-
mos, helvetismos e outros canadianismos. Por que motivo é que os
africanismos seriam objecto de um inventário particular?
Porém, taltal como se esperava, os Africanos podiam continu ar a pr ote star ;
não so m en te o IIFF A pub licou o seu seu Inventaire
Inven taire des particularités
particu larités lexicales
d'Afrique noire,
noire, com o, em 1 9 9 1 , o pr oje cto IF IF A atingia o seu ob jectivo
derradeiro com a publicação do do Dictionnaire u niversel francophone.
U m Dictionnaire universel francophone,
francophone, destina do , tal com o é indica do
na introdução, aos "alunos francófonos da África Negra", enquanto
ferramenta linguística e enciclopédica "cultural e pedagogicamente
adaptado às suas necessidades".
Esta política de glotofagia e de colonização levada a cabo em África
e na universidade francesa, terá repercussões na política linguística
francesa das línguas minoritárias em França.
2. Políti
Política
ca linguísti
linguística
ca fra n ce sa e língu
lí ngu as m inori-
tárias: ideologia do paradoxo
A políti
política
ca linguísti
l inguística
ca francesa p eran te as línguas
lí nguas min oritárias prese n-
tes no território francês constitui a continuidade do desprezo sempre
alii .
F ranc ê s /lí nguas afri c anas : c oloni z aç ão li nguí s ti c a ontem e h oje, aqui e al Bernard Zongo 73
u mSegundo
a p o p u l aas çã oestimativas
to ta l d e ci nqdou eINSEE, a França,
n ta e ci nco mi l h õ eem
s d e1990, contava
ha b i ta nte s . Prcom
a ti -
ca me nte nã o e x i s te m d a d o s co mp l e to s e d e ta l ha d o s a ce r ca d a s l í ng u a s
e s tr a ng e i r a s u ti l i z a d a s e m F r a nça , b e m co mo a ce r ca d a s ca r a cte r í s ti -
ca s d a s co mu ni d a d e s l o cu to r a s d e s ta s l í ng u a s . A s ú ni ca s i nf o r ma çõ e s
d e qu e p o d e m o s d i s p o r s ã o a qu e l a s qu e s ã o ffoo r ne ci d a s - d e m o d o p a r -
cial - pelos centros de alfabetização. Na sua remessa de Fevereiro de
2 0 0 2
2 [online),
[online), a revista
revista Population etSociét
etSociétés,
és, e s t u d a n d o A d i n â m i c a
das línguas em França ao longo do século XX", estabelece uma lista
no mínimo parcelar das "línguas de imigração". De facto, apenas são
citadas - no que concerne às línguas africanas - o fula, o wolof, o serer,
as línguas bantus, às quais se acresce uma categoria globalizante: "outras
línguas de África". Podemos atrever-nos, por forma a coincidir em
certa medida com a realidade, a afirmar que existem, no mínimo, tan-
ta s l í ng u a s qu a nto na ci o na l i d a d e s ; me s mo s a b e nd o , p a r a a l é m d i s s o ,
qu e ne m to d o s o s l o cu to r e s a r a b ó f o no s , p o r e x e mp l o , f a l a m o me s mo
á r a b e . S e g u nd o H e r e d i a - D e p r e z ( 1 9 9 4 ) , a s p r i nci p a i s l í ng u a s ma te r -
nas faladas pelos imigrantes são: os árabes dialectais, o português, o
espanhol, o italiano, os berberes, o bambara, o sarakolé, o turco e o
servo-croata (P. 41). Como é que, do ponto de vista político, a França
gere a sua diversidade, para não dizer o seu multilinguismo?
l o:
o: , Babacar Mba ye Diop e Doud ou Dieng A Con sciên cia Histórica Africa na
2 . 1 . 2 . A p o l í t i c a llii n g u í s t i c a f r a n c e s a
l o:
o: , Babaca r Mba ye Diop e Doud ou Dieng A Con sciên cia Histórica Africa na
colectiva
étnica que,denão
tipo "minoritário".
so m Este
ent e é privada tipolquer
de qua caracteriza uma
po der de comunidade
decisão
decis ão acerc a
do seu próp rio futuro,
futuro, com o ainda se vê limitada pela com unidad e dom i-
nante no sentido de restringir o uso da sua língua a alguns domínios
(família, religião, relações entre pares, etc.), excluindo domínios im-
po rtan tes com o a econo m ia, a adm inistração, e a edu cação (ver o trata-
mento reservado ao bilinguismo por alguns professores: Varro, 1997).
Relativamente aos estrangeiros que vêm para França e que se
reconstituem em comunidades - falamos nomeadamente de lares
sene gales es, m alianos, portug ueses, turcos, de ba irros ch ineses, etc.
etc . -,
se aprenderem o francês - os operários, por exemplo - é antes de mais
por motivos puramente funcionais, para não dizer profissionais.
É também o que Noy au s ubhnha (1976: 45):
Erainstituições
das o caso em públicas.
1976, é o Um
casodos
ainda
dois hoje
póloscom
do odispositivo
acréscimo do
do FAS41
apoio
na "sua nova organização das formações linguísticas financiadas",
implementad a a partir d e 1995 e relembrad a por Pellé-Guetta (1997:
147) é clara:
F ranc ê s /lí nguas afri c anas : c olon i zaç ão li nguí s ti c a ontem e h oje, aqui e ali . Bernard Zongo
Zong 77
d etec tad os , rotulad os c omo " es trang eiros " , c ertamente muito mais
pela sua língua, ou pelo modo como estes se expressam em francês, do
que pela cor da sua pele, e isto, por qualquer pessoa em contacto com
os traba lhad ores imigrados ou com a sua s ua ffamíl
amília
ia,, no âm bito do trab alho,
da escola, ou por simples convivência num bairro, no autocarro, de
férias, ou em qualquer outro lugar Por conseguinte, um tal ambiente
afigura-se como um lugar de manifestação ideal de alguns aspectos
[utilização sistemática da língua étnica] da vitalidade etnolinguística
das diferentes comunidades linguísticas.
Mas este contexto ideal de liberdade de expressão das identidades
linguísticas não parece convir aos políticos franceses. Foi deste modo
que s e c heg ou ã amálg ama entre alg umas populaç ões c ons id erad as
indesejáveis [os imigrantes africanos] e as suas línguas, consideradas
como geradoras de patologias, e por conseguinte de delinquência: é a
con cep ção à francesa do bili
bilinguism
nguism o - pelo me no s no que conc ern e os
poderes públicos.
l o:
o: , Babacar Mba ye Diop e Dou dou Dieng A Con sciên cia Histórica Africa na
F ranc ê s /lí nguas afri c anas : c olon i zaç ão li nguí s ti c a on tem e h oje, aqui e ali . Bernard
Bernard Zong
Zongo 79
l o:
o: , Babacar Mba ye Diop e Doud ou Dieng A Con sciên cia Histórica Africa na
[..
[...].] as mães parti
participarão
ciparão e comp
comprometer-se-ão.
rometer-se-ão. M as se estas sentirem,
sentirem, em
certos casos, reticências
reticências por parte dos pais, que exigem frequentemente a lin-
guagem patoá do país em casa, aquelas serão dissuadidas de fazê-lo. fazê-lo. Será
então necessári
n ecessárioo emp
empreender
reender outro tipo de acções visando o pai por forma a
incitá-lo nesta direcção.
F ranc ê s /lí nguas afri c anas : c oloni z aç ão li nguí s ti c a ontem e h oje, aqui e ali . Bernard
Bernard Zong
Zongo 75
aceitariam que as lí
línguas africanas? línguas
nguas regionais sobrev ivessem sob re as cinzas das
l o:
o: , Babacar Mba ye Diop e Doud ou Dieng A Con sciên cia Histó rica Afric an a
Referências Bibliográficas
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Diki-Kidiri M.; et al. ( ( s / d ) . ) " L a n g u e s e n d a n g e r e n A f r i q u e n o i r e " , i n L es lang ue
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ancophone
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né
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ntroducti on à la li ngui sti qu
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P opualti on et Soci étés ( 2 0 0 2 ) . ""LL a d y n a m i q u e d e s l a n g u e s e n F r a n c e a u f i l d u X X e
siècle", online.
R e c l u s 0 . ( 1 9 1 7 ) . U n gr and desti
desti n commence
commence,, L a R e n a i s s a n c e d u L i v r ee..
S a i l H . N . ( 1 9 9 6 ) . E ffi caci
caci té et équité
quit é de l'ensei
l'ensei gnement
gnement supéri
supéri eur. Q ue
uels
ls étudi ants
ré
réussisse
ussissent
nt à l'U niv ersi té de D akar? T e s e d e d o u t o r a m e n t o .
T h o m a s , ) . M . C . e B é h a g e l , A . ( 1 9 8 0 ) . L a li ngui sti qu
quee afri cani
cani ste françai
françai se (e (enn Fr ance ance
et en A fr i que)
que) - L e poi nt de la questi questi on en 1980 1980,, S o c i é t é d ' é t u d e s l i n g u i s t i q u e s e t
anth ropo logiqu es de Fra nce - n.- 11 - núm ero especial.
II
As origens egípcias
da civilização africana
Cheiikh A nta Di
Che Dioo p: o h om em e a obra
ob ra
C h ei k h M 'B ack é D i op'
Introdução
Pro pom o-no s, aqui,
aqui , forn ece r um a visão geral da obr a de Che
Cheii kh Anta
Diop. Depois de ter relembrado o contexto histórico e ideológico no
qual Cheikh Anta Diop levou a cabo as suas investigações, levantamos
alguns dos traços essenciais da sua obra histórica. De seguida, abor-
daremos a continuação desta obra, no âmbito da história e da egipto-
logia, para concluir na importância crucial dos trabalhos do intelectual
no processo de recuperação da África e de edificação de uma civiliza-
ção planetária.
hometne a obra .
Cheikh Anta Diop ; o hometn Cheikh MBa
MBacké Diop 87
bem como os Estados-Unidos. Este encontro culminou na assinatura
d e Acto de Berli
B erlim,
m, qu e levou à "partilha de África" en tre seis po tên cias
europeias, a Inglaterra, a França, a Bélgica, a Alemanha, Portugal e a
Espanha^. Em vésperas da 1.® Guerra Mundial, a quase totalidade da
África é constituída por colônias governadas pelos Europeus.
Esta situação resulta dos acontecimentos que se desenrolaram no
mundo desde o século XVI, marcados pelo mercantilismo europeu e
a superioridade técnica e militar crescente da Europa. Esta impõe, ao
mesmo tempo que a sua dominação, as suas idéias acerca da humani-
dade, a sua origem e a sua evolução. Paralelamente, e juntando-se ao
que é praticado pelos Árabes, na África subsaariana, o tráfico de es-
cravos Negros é concebido, institucionalizado e racionalmente orga-
nizado pelos Europeus. Conseqüências: a desagregação dos Estados e
da sociedade em todos os sectores da vida, a diminuição da população
atingindo vários milhares de habitantes^ a destruição humana mais
massiva e mais prolongada que o mundo jamais tenha conhecido.
O pavoroso Código Negro, promulgado por Luís XIV em 1685 (a res-
peito do sequal
M s , não Montesquieu
pronuncia] (1689-1755],
regulamenta o autor nas
a escravatura de De
de Vesprit e na
Antilhas des
Guiana^ No momento em que a Europa empreende, no século XIX, a
conquista do interior da África, esta já se encontra extremamente
fragilizada pelos múltiplos efeitos destruidores directos e indirectos
do sistem a de tráfico de ser es hu m an os neg ros que se desenvolveu du-
rante quatro séculos.
A dominação colonial, que assume nas suas duas fases sucessivas, a
conquista militar do continente africano e a exploração/pilhagem dos
seus recursos mineiros e agrícolas, é eminentemente mortífera, e de
igual modo marcada por atrocidades, por genocídios massivos®. Entre
1860 e 1930, algumas estimativ as demonstram que o v olume rema-
nescente da população da África subsaariana ainda diminuiu de um
3. H i stoir e G énérale
nérale de l'A fri qu
quee, Vol. V U , U A frí que sous i a domi
domi nati on coloniale,
coloniale, 188
1880-1935
0-1935,, Paris,
UNESCO/NEA, 1987.
4. Cf. J. E. Inikori in Histoire Générale de l'Afrique, "La Traite négrière du XV^ au XIX^ siècle".
Études et Documents 2, Paris, UNESCO, 1979, 1985, pp. 64-97 e H i stoi re G éné nérale
rale de l'A fri que
que,,
vol. VII; L. M. Diop-Maes, A fri que noir e: D émographie, sol et H i stoi re, Paris, Présence Africaine/
Khepera, 1995. 0 autor estabelece que a população da África subsaariana no século XVl situava-
-se na Louis
5. Cf. ordemSala-Molins,
dos 600 milhões de Noire
Le Code habitantes.
ou le calvaire de Canaan, Paris, Presses Universitaires de
France, 1987.
6. ]. E. Inikori in H i stoi re G éné
nérale
rale de l'A fri que
que,, "La Traite n égr ière du XVXV® au XIX
XIX^^ siècle", Étud es et
Documents 2, Paris, UNESCO, 1979,1985, pp. 64-97 e H i stoi re G éné nérale
rale de l'A fri que
que,, vol. VII; L. M.
Diop-Maes, A fri que noir e: D émographie, sol et H i stoi re re,, Paris, Présence Africaine/Khepera, 1995;
A, Hochschild, Le L es fantômes du roi L éopold - U n holocauste oubli é, Paris, Belfond, 1998: Rosa
Amélia Plumelle-Uribe, L a fféroci éroci té blanche - D es non- blancs aux non-ar yens, g énocides nocides occ occultés
ultés
de 1492 à nos our ours,s, Paris, Albin Michel, 2001.
l oo:: , B a b a c a r M b a y e D i o p e D o u d o u D i e n g A Co nsc iênc ia Histórica Africa na
...... o ocupante
ocupan te instala a sua domdominação,
inação, afirma massivam ente a sua superiori-
dade. O grupo socialsocial,, subjugado m ilitar
ilitar e econom
economicamente,
icamente, é desum
desumanizado
anizado
através de um método polidimensional. Exploração, torturas, razias, racismo,
liquidações colectivas, opres opressão
são racional encontram-se
encon tram-se ligados a níveis dife-
rentes para, lit literalmente,
eralmente, tornar o autóctone num objecto entre as mãos da
nação ocupante.
ocupan te. Este homhomem
em objecto, sem meios
m eios de existi
existir,
r, sem razão de ser,
é destruído no mais profundo da sua substância...'^.
tam a inferioridade
[1694-1778), Cuvi erintelectual
(1769-1832), do Go Negro.
bi neauEstes têm por nome:
(1816-1882) e L évyVoltaire
-B ruhl
(1857-1939) em França, Hume (1711-1776) na Inglaterra, Kant
( 1 7 2 4 - 1 8 0 4 ) e H e ge
g e l ( 1 7 7 0 - 1 8 3 1 ) n a A l e m a n h a ".
".
Estes a firma m que o Negro Negr o não possui a capa cidad e de raciocinar,raciocinar, de
criar.
cri ar. A iniciat
ini ciativa
iva de se organiza r em e ntidad es so ciopo líticas líti cas estrutu -
radas, policiadas, em Estados só pode ter uma origem exterior". É
deste modo que a grande cidade do Zimbabwe, de sco be rta no Sul do
rio Zambeze, não é certamente a obra dos próprios autóctones africa-
nos e se torn a a do rei Salomã o no país de Ofirl Webber Ndoro, profes-
sor
dadededomuseografia e de gestão
Zimbabwe, precisa do patrimônio
que esta negação dascultural da Universi-
realizações africanas
do Zimbabwe perdurou na Rodésia até uma época recente, apesar dos
resultados incontestáveis da investigação arqueológica^^:
L10.
es Cf
de T. eObenga,
derni
rni rs rempa Crthe
rempart heik
s ikde
h Al'A
ntafr i Dcanisme,
iop, V oln
olne Sphinx, Paris,
ey eett lePrésence
Revue Présence
Africaine, Africaine/Khepera,
n.s 157, l.s semestre 1998,1996;
pp.
47 a 65.
11. Inclusive Léo Frobenius que descreveu as civilizações africanas, nomeadamente a do povo
lorubá do Benim, desenvolve, na sua obra Mythologie de lAtlantide, a tese da sua origem grega
(Paris, Payot, 1949, pp. 10-34, por exemplo}.
12. Ndoro, Webber, "Zimbabwe, cité africaine", in Pour la Science, n.^
n.^ 24 3, Janeiro de 199 8,
pp. 74-79.
l o:
o: , Babaca r Mba ye Diop e Dou dou Dieng A Con sciên cia Histórica Africa na
... quando,
quando , tendo ido visitar a Esfinge, o seu aspecaspecto
to me forneceu a palavra
do enigma. Ao observar esta cabeça caracteristicamente
caracteristicamente negra eem m todos os
seus traços, lembrava-m e desta passagem notável de Heródoto, na qual este
afirma: No que me concerne, considero que os Cólquidas são um a colónia dos
Egípcios, porque, tal como eles, possuem uma tez negra e os cabelos crespos, o
que signifi
significa
ca que os antigos Egípcios
E gípcios eram vverdadeiros
erdadeiros Negros da espécie de
todos os naturais da África [...
[...]] Que
Qu e tema de meditação [...]
[...] pensar-se que esta
raça de homens negros, hoje nosso escravo e objecto do nosso desprezo é este
mesmo a quem devemos as nossas artes, as nossas ciências, até mesmo o uso
da palavra; imaginar, enfim, que foi no meio destes povos que se dizem mais
amigos da liberdade e da hum anidade, que se sancionou a mais bárbara das
escravaturas e levantado a questão de saber se, de facto, os homens homen s negros
possuem um a inteli
inteligência
gência da mesm a espécie que a dos homens
hom ens brancosi
Est as linhas de Volney de nada serv irão; a v isão de um a África
a-histórica [sem história, sem passado) e atemporal [fora do tempo,
imutável), cujos habitantes, os Negros, nunca foram responsáveis, por
definição, pela menor invenção, por um único factor da civilização, im-
põe-se dorav ant e enquant o corrent e de pensam ent o dom inant e nos
discursos, nos textos e enraiza-se profundamente nas consciências.
Tais são a ideologia, a imagem da África, a falsificação histórica que
serãodedoravante
tal, transmitidas,
geração em geração, no ensinadas pela intelectualidade
seio das instituições ociden-
mais oficiais, das
mais modestas às mais prestigiadas, da escola à universidade; estas
serão amplamente veiculadas através de todos os meios de expressão:
16. Figeac, Champollion, Égypte ancienne; Paris, ed. Didot, Didot, 18 39 , pp. 2 6 -2 7 ; citado por CheCheililíh
íh
Diopp em Nations nègres et Culture, 4.^ edição, 1979, p. 69.
Anta Dio
17. Volney, M. C. P., V oyag e en Sy ri e et en Ég y pte pe
pendant
ndant le
less anné
annéees 178
1783,17
3,1784
84 & 178 1785;
5; vol. I, Par is,
1787, pp. 74-77.
hometn e a obra .
Cheikh Anta Diop ; ohometn Cheikh MB
MBac
acké
ké Diop 91
A resistência
resistência dos Negros à ocupação francesa do Haiti, a partir da segunda
metade do século XVI até à guerra levada a cabo por Toussaint
T oussaint Louverture,
de 1790 a 1803, que permitiu ao Haiti ver-se livre
livre do regime colonial através
das armas.
Pes s oas s imples , alg umas pers onalid ad es c omo Cond orc et^^ (1743-
-1 7 94 ), as s oc iaç ões e ag rup am entos variad os na E uropa e nos E s tad os
Unidos da América ergueram-se contra as exacções de que os Negros
eram v ítiítim
m as. Mas estes nun ca estiveram à altura de se opor verdad ei-
ramente aos governos, exércitos, milícias, redes, empresas comerciais
e industriais, bancos, associações diversas de objectivos falsamente
18. Pascal Blanchard, Éric Deroo, Gilles Manceron, L e P aris N oir , Paris, Harzan, 2001.
19. Nicolas Bancel, Pascal Blanchard, Gilles Boetsch, Éric Deroo, Sandrine Lemaire (obra colec-
tiva). Zoos hum
humai
ai ns, de la Vénus hotte
hottentote
ntote auc rereali
ali ty show s, Paris, éditions La découverte, 2002.
20. Robin D. G. Kelly, Earl Lewis, A history of A frica
fricann A me
meriri can
ans,
s, Oxford, Nova lorq ue, Oxford Uni-
versity Press, 2000, p. 199-201, Molefi Kete Asante, H istori cal Atlas ooff A fri can A me meriri can
ans,s, Nova
lorque, Macmillan Publishing Company, 1991, p. 71.
21. Lara, Oruno D., "La Traite négrière du XVe au XlXe siècle", in H i stoi re G éné nérale
rale de l'A fri que que,,
Études et Documents 2, Paris, UNESCO, 1979, 1985, pp. 111-124 e H i stoi re G éné nérale
rale de l'A fri qu quee,
vol VIL
22. Badinter, Élisabeth e Badinter, Robert, C ondorce
ondorcet- t- U n i ntellec
ntellectue
tuell en poli ti que
que-,-, Paris,
Paris, Fayard,
1998, pp. 171-175.
l o:
o: , Babacar Mba ye Diop e Dou dou Dieng A Con sciên cia Histó rica Afric ana
ciaundo
m do conceito ideológico
não Branco, de missão
de
represent civil
civilizadora
izadora entda
am a charneira re Eu ropaperíodos
dois face ao
consecutivos de uma economia mundial dominada pelas potências
ocidentais que balançam na era industrial. Ao sistema do comércio
transatlântico de Negros reduzidos à escravatura [comércio desig-
nado de "triangular" - Europa, África, América), substitui-se a domi-
nação colonial da África, a apropriação do seu solo, do seu subsolo,
do seu espaço marítimo e, mais tarde, aéreo pela Europa. Para além
disso, a abolição oficial da escravatura não foi, de modo algum, acom-
panhada de uma revisão institucional das teorias racistas, mas pelo
contrário, estas foram sabiamente ajustadas, reforçadas por argumen-
t os apresent ados com o cient ificam ent e fundados: ilust ram -no a t eo-
ria do poligenism o desenv olv ida pelo nat uralist a de origem suíça
Louis Agassiz [1807-1873], discípulo de Cuvier, e o médico ameri-
cano Sam uel George M ort on, b em com o a ob ra ra Types ofMankind
ofMankind dos
Americanos Josiah Nott e George Gliddon, publicada em 1854".
A const at ação de Aim ê Césaire em
em Discours sur le coloniali
colonialisme
sme é
inequívoca: "E afirmo que da colonização à civilização a distância é
infinita; que de todas as expedições coloniais acumuladas, de todos
C h e i k h A n t a D i o p ; o h o m e t n e a o b r a . C
Che
heiikh MBacké Diop
Diop 9
3. ADiop
Anta obra histórica e egiptológica de Cheikh
É de ste mo do q ue Cheikh An ta Diop
Diop se dedica, desde os seus estu do s
secundários em Dakar e em St. Louis no Senegal, a munir-se de uma
formação mutlidisciplinar em ciências humanas e em ciências exactas,
alim ent ada por leit uras ext rem am ent e num erosas e v ariadas.
Se o autor adquire um domínio notável da cultura europeia, este não
deixa de estar profundamente enraizado na sua própria cultura. O seu
perfeito conh ecim ento do wolof, a sua língua
língua m aterna , revelar-se-á um a
das principais chaves que lhe abrirá as portas da civilização faraônica.
Por outro lado, o ensino corânico familiariza-o com o mundo árabe
e m uçulm ano. A part ir do
doss conhecim ent os acum ulados e assim ilados
acerca das culturas africana, árabe e muçulmano e europeia, Cheikh
Anta Diop elabora contribuições primordiais em diferentes domínios.
No m om en to em que Cheikh
Chei kh Anta Diop
Dio p em pre en de as suas p rime iras
investigações históricas (anos 40), a África Negra não constitui
constitui "um
campo histórico inteligível",
inteligível", para reto m ar a exp ressão do historiad or
britân ico Arnold Toyn bee. É sintom ático q ue ainda em inícios dos a nos
60, no número de Outubro de 1959 do do Correio
Correio da UNESCO,
UNESCO, o hi sto -
riador anglo-saxão Basile Davidson introduza o seu assunto acerca da
Découverte
Décou verte de l'Afrique
l'Afrique com a questão: "Será o Negro um homem sem
passado?".
25.
1 9 9 Obenga,
6 , p. 359.Théophile, C he
heii k h A nta D i op, olneey eett le Sphinx; Paris, Présence Africaine/Khepera,
op, V oln
lo :,
:, B a b a c a r M b a y e D i o p e D o u d o u D i e n g A Con sciên cia Histórica Africa na
-derecusar qualquer
um m odo geral, correlação
ou fenó tipo)entre
e as acapacida
cor da pele (a aparência
des intelectua is; física
- recusar qualquer hierarquia racial: as diferentes raças humanas
possuem as mesmas aptidões intelectuais;
- recusar as caricaturas raciais e considerar as grandes famílias hu-
manas, Negros, Brancos, Amarelos, na sua respectiva variedade de
tipos físicos;
- afirmar a origem m on oge nética africana da espécie hum ana: a hu-
manidade é una na sua diversidade^^
lo :,:, Babacar Mba ye Diop e Dou dou Dieng A Con sciên cia Histórica Africa na
34. Diop, Cheikh Anta, "Histoire primitive de 1'Humanité: Évolution du monde noir", Bulletin de
l'IFAN, T.
T. XX
XXIIV, série B, n^ 3- 4 ,1 9 6 2 , p. 44 9 .
C h e i k h A n t a D i o p : o h o m e m e a o b r a . Cheikh MB
Chei MBacké
acké Di
Diop
op loi
d o homo sapie
sapiens
ns negro africano, atravé s de um pro ces so de diferen-
ciação dos fenótipos relacionados com as diferentes condições geo-
climáticas, processo este que a ciência esclarecerá um dia.
rente diversidade:
apresentam o queaptidões
as mesmas significaintelectuais.
que todas as populações humanas
Os restantes temas tratados relativos a este eixo de investigação são
os seguintes:
- o processo de semitização, isto é, o pro cess o de form ação dos povos
semitas, analisado enquanto fenômeno de contacto e de mestiçagem
entre populaç ões melan od e rm es e leuc od erm es em reg re g ião próx ima-
-orientaF®.
35. Barriel, Véronique - "L'origine génétique de l'iiomme moderne", in D ossi er P our la Science Science,, L es
origines de l'humanité; Janeiro de 1999, pp. 92-98.
36. Diop, Cheikh Anta, "L'Apparition de l'Homo sapiens", in B ulleti ulleti n de
de l'I
l'I FAN; T. XXXI I , série B, n.-
3,1970, pp. 623-641.
37. Diop, Cheikh Anta, op. ci
ci t.
38. Diop, Cheikh Anta - A ntéri
ntéri ori té desc
desc i vi li sati ons nè
nègr
gr es - mythe ou véri té his tori qu
quee?, op. cit .,
lo :,:, Babacar Mba ye Diop e Doud ou Dieng A Con sciên cia Histórica Afric ana
- o surgim
surgimento
ento dos Berberes, qu e Cheikh An ta Diop iden tifica com
os descendentes dos Povos do Mar que chegaram massivamente a
África
Áfri ca cerca de 1 2 0 0 Os docu m entos egípcios
egípci os referem batalhas
contra estes povos provenientes do Norte sob os reinados dos faraós
Merneptah e Ramsés III.
- as movimentações de populaçõe
populaçõess no per ím etro m editerrâ nico e nas
terras interiores da Europa consequentes à formidável explosão da
ilha de Santorini nas Cidades [Mar Mediterrâneo), cerca de 1420 an-
tes da nossa era. Chei
Cheikh
kh Anta Diop
Diop estabelec e tam bé m apro xim açõe s
esclarecedoras
bem entre esta e explosão
como das mitologias e algumas passagens da Bíblia,
lendas gregas''^.
- a identifi
identificação
cação das grandes correntes m igratórias e a formação das
etnias africanas. O auto r introduz o seu estudo iintitulado
ntitulado "Pou r un e
méthodologie de Tétude des migrations'"^^ nos termos seguintes:
p . 1 8 9 - 1 9 3 . P arenté généti
généti que de l' égy pti en pharaoni que et de dess lang ue
uess négro-af
négr o-af r i cai ne
ness (Dakar,
IFAN-NEA, 1977, pp. XXXIX-XXXVII.
39. Diop, Ciieikii Anta, "La formation du rameau berbère", in H i stoi re gé géné
nérale
rale de l'A fri qu quee, É tudes
tudes
et Documents, Libya Antiqua, Colóquio organizado pela UNESCO de 16 a 18 de Janeiro de 1984,
Paris, Unesco, pp. 77-81.
40. Diop, Ciieikh Anta, Ci vi lisation ou Barbarie
Barbarie-,-, Paris, Présence Africaine, 1981, pp. 208-209.
41. Diop, Ciieikh Anta - "Pour une méthodologie de l'étude des migrations", in H i stoi re gé géné
nérale
rale
de l'A fr i que:
que: É tudes
tudes et D ocuments
ocuments 6, "Ethnonymes et topony mes afric africains"
ains" (19 78 ), UNESUNESCO CO,, 1 98 4,
p. 9 7- 1 21 , e num a primeira ve rsão sob o ttítul ítulo:
o: "Introduction à l'étude des migrations en Afr Afrique
ique
entrale et ocidentale - Identification du berceau nilotique du peuple sénégalais", in Bulletin de
l'IFAN, série B, T. XXXV, n.a 4,1973, pp. 769-792.
C h e i k h A n t a D i o p : o h o m e m e a o b r a . Cheikh MB
MBacké
acké Di
Diop
op loi
originária de leste.
originária leste. No entanto, estes teriam sofrido o choque destas últimas
vagas, o que terá provocado movimentos
mov imentos secundários de população, de leste
para oeste, ao longo da costa atlântica,
atlântica, tal como parecem comprovar
comprov ar a uni-
dade cultural desta região, a diferença de tipos físicos
físicos e de nomes
nom es clânicos
comparados
comp arados aos do Sahel, no norte.
no rte.
— As relações entre a África Negra e as Am éricas antes de Cristóvão Colombo
Colom bo
(1492]«.
b. O
todos O os par
paaspectos:
r ente
ntesco
sco oEpovoamento
gi pto an
antiti go/
go/Á
doÁ Vale
fri a. Este
fr i ca doN eNilo,
gr a. é analisado
a génese sob
da civiliza-
ção egitpo-nubiana, o parentesco linguístico e cultural, as estruturas
sociopolíticas, etc.
Não se trata aqui de expor toda a argumentação técnica multidisci-
plinar desenvolvida por Cheikh Anta Diop a fim de demonstrar que
o Egipto faraónico é negro-africano, tanto no plano cultural, como no
p l a no é tni co . C o nv é m s i mp l e s me nte r e l e mb r a r , d e mo d o mu i to s u -
cinto, a natureza desta argumentação declinada, aqui, segundo quatro
r e g i s to s : cultural, sociológico, antrop
antropológico
ológico e histórico.
D a a r te , o nd e s ã o a p r e e nd i d a s s i mu l ta ne a me nte a s e s cu l tu r a s d o s
artistas do Egipto faraônico, do Benim, da Nigéria, do país Massai, etc.
M anifestamen
anifestamente,
te, de facto, os Coiquídios são de raça Egípcia; mas alguns Egíp-
cios disseram-me que, no que lhes dizia respeito, os Coiquídios eram descen-
dentes dos soldados de Sesóstris. Eu mesm o tinha conjecturado isto, de acordo
com
belos dois indícios:
crespos em primeiro
(na verdade, lugar,prova
isto não o factonada,
de terem
um a veza pele
que negra
existeme osainda
ca-
outros povos nesta situação); depois, e com mais significância,
significância, pelo facto de,
únicos entre os hom ens, os Coiquídios, os Egípcios e os Etíopes praticarem a
circuncisão
circuncisão desde a sua origem^^
C h e i k h A n t a D i o p : o h o m e m e a o b r a . Cheikh MB
MBacké
acké Diop loi
o estudo da Bíblia, d a s tr a d i çõ e s j u d a i ca e m u çu l ma na qu e co n s e r -
v a m a me mó r i a d a d e s ce nd ê nci a d e C ha m, a nte p a s s a d o b í b l i co d o s
Negros: em particular Kush [Cuxe) e Misraím (o Egip to).
A iconografia ( e s cu l tu r a s e p i ntu r a s ) a b u nd a nte qu e co b r e to d o s o s
per íod os da pré -histó ria e da histór ia egípcias.
A antropologia física física e a biologia molecular
mo lecular,, co m o e s tu d o d e m e d i çõ e s
o s te o l ó g i ca s d e e s qu e l e to s , o e s tu d o d o s g r u p o s s a ng ü í ne o s e d a p i g -
m e nt a çã o d a p e l e d a s m ú m i a s ( a m e l a ni na , co r p o qu í mi co r e s p o n s á v e l
pela cor da pele, conserva-se no tempo e não deve ser confundida com
o s p r o d u to s d e m u m i f i ca çã o co m o o b e tu m e ) ..... r e v e l a m o p a r e n te s co
dos antigos Egípcios com as populações negro-africanas, etc.
O s a r g u m e n t o s d e o r d e m h i s t ó r i c a q u e f u n d a m e n t a m a a n t e r i o -
ridade do Alto Egipto em relação ao Baixo Egipto: a origem da civili-
zação egípcia que falta investigar em África, em direcção ao Sul, e não
a o N o r te , no s p a í s e s d o Pr ó x i mo - Or i e nte a s i á ti co . E s ta a r g u me nta çã o
b a s e i a - s e : no estudo dos textos hieroglíficos
hieroglíficos egípcios, qu e m ostra, po r
exemplo, que o Egípcio se orientava em relação ao Sul, ou seja, a di-
recção da terra de origem dos seus antepassados que tinham, ao longo
do s tem po s, volta do a sub ir o cu rso do Ni Nilo
lo "divi
"divinizado".
nizado". EE,, com efeito,
para o Egípcio, o sol erguia-se sobre a sua esquerda e punha-se à sua
direita.
A tradição histórica histórica referida,
referida, po r exem plo , p or D iodo ro da Sicíli Sicíliaa
(cerca de 90-20 a.C.):
levada
inícipara
o, umo Egipto
no início, por que
mar, mas Osíris.
Estestendo
o Nilo, pretendem até que
arrastado mu este
muito lipaís
ito limo era
era Etiópia,
mo da apenas,
tinha acabado por preenchê-lo, form ando uma um a parte do continente..
continente..
A geofísica
geofísica e a s datações de am os tra s geológicas, com o auxílio de
m é t o d o s f ííss i c o - q u í m i c o s c o m o a d o C a r b o n o 1 4 , p o d e m p e r m i t i r
estabelecer em que época é que a emergência do Delta do Nilo se pro-
duziu, bem como confirmar ou anular as informações recolhidas a este
respeito por Heródoto e Diodoro da Sicília junto dos Egípcios e dos
Etíopes.
A arqueologia, com as esc av aç õe s levad as a ca bo no Alto Egipto e no
Sudão, que colocam em evidência a origem meridional da civilização
egípcia.
l oo:: , Babaca r Mba ye Diop e Doud ou Dieng A Con sciên cia Histó rica Afric ana
c. A i nve
nv est
stii g açã
açãoo ac
aceer ca da ev olução das soci edade
dades.
s. Vários desen-
volvimentos imp ortan tes são consagrado s à gén ese das form as antigas
de organização social encontradas nas áreas geográficas meridional
(África) e setentrional (Europa), à emergência do Estado, à formação
e à orga nização dos Estad os african os ap ós a qued a do Egipto,
Egipto, à carac-
terização das estruturas políticas e sociais africanas e europeias antes
do período colonial, bem como à sua respectiva evolução, aos modos
de produção, às condições socio-históricas e culturais que presidiram
a Renascença europeia.
C h e ik
i k h A n ta
t a D iioo p . o h o m e m e a o b r a . Cheikh MB
MBacké
acké Di
Diop
op 103
"U m am
"Um amplo
plo acord
acordoo ffoi
oi estabel
estabelecido
ecido entre os participantes." Os elementos
apresentados pelos professores Diop e Ob Obenga
enga foram considerados extrema
extrema--
m ente construtivos (...)
(...) D e modo
mo do ma
mais
is alargado, o professor Saun
Sauneron
eron salien-
tou o interesse do método proposto pelo professor O benga depois do professor
D iop. Estand
Estandoo o Egipto colocado num ponto de convergên
convergência
cia de influências
externas, é norm al qu
quee alguns emp empréstimos
réstimos tenham sido feit
feitos
os a línguas es-
trangeiras; ma
mass trata-se de algum
algumas
as centenas de raízes semíticas em relação
a vários milhares de palavras. O egípcio não pode ser isolado do seu contexto
lo:, Babaca r Mba ye Diop e Doud ou Dieng A Con sciên cia Histórica Afric ana
O professor Vercou
Vercoutter
tter decl
declarou
arou que, segund
segundoo ele, o Egipto era af
africano
ricano na sua
escrita, na sua cultura e na sua ma
maneira
neira de pensar O professor Leclant re-
conheceu esta mesm a carac
caracterí
terísti
stica
ca afri
africana
cana no temperamento e na man
maneir
eiraa
de pensar dos Egípcios.
Este coló
colóquio
quio pode ser conside
considerado
rado como umumaa virage
viragemm que permiti
permitiuu à egipt
egipto-
o-
logia reconciliar-se
reconciliar-se com a África e reencontrar a sua fecundidade. [...]
[...] O diálo-
go científ
científico
ico nnoo plano internacional está instaurado e podem os esperar que
o m esmo nnão
ão seja rom
rompido.
pido. Na sequência dos debates, alguns participantes
não deixaram de expressar a sua vontade no sentido de reorientar os seus
trabalhos voltados para a África, bem como de intensifi
intensificar
car a sua colaboração
com os investigadores africanos.
4 8 . L e Solei
Solei l, n a 1 1 2 8 J a n e i r o d e 1 9 7 4 .
49. Cf. H i stoi re gé géné
nérale
rale de l'A fri qu quee, op. cit., pp. 39-72.
C h e i k h A n t a D i o p : o h o m e m e a o b r a . Cheikh MB
MBacké
acké Di
Diop
op loi
4. A con
continuaçã
tinuaçã o da ob ra histórica e egiptológic
egipt ológicaa
No âmbito da egiptologia, por exemplo, uma comunidade de egitpólo-
gos africanos existe doravante. Esta constituiu-se segundo as etapas
abaixo identificadas.
l oo::, Babacar Mba ye Diop e Dou dou Dieng A Con sciê ncia Histórica Africa na
C h e i k h A n t a D i o p : o h o m e m e a o b r a . Cheikh MB
MBacké
acké Di
Diop
op loi
51
51.. A ntéri
ntéri ori té de
dess civ i li sati ons nègr
nègr es - mythe ou véri té hist ori qu
quee?, op. cit., p. 12.
52. Lam, A. M., D e l' ori gi ne égy
égy pcienne
pcienne des P euls: Paris, Présence Africaine/Khepera, 1993, B. Sail,
des Pe
L es raci ne
ness éthi opiennes
opiennes de l'É gy pte ancienne
ancienne;; Par
Parisis,, LH arma ttan/Khe pera, 19 99 .
l o:
o: , Babaca r Mba ye Diop e Doud ou Dieng A Con sciên cia Histórica African a
5. O R en ascim en to da Áfric
Áfricaa e a edificação
edifi cação de
uma civilização planetária
Os Africanos do continente e a diáspora encontram-se, doravante,
edificados sobre o período da sua história, que precede os quatro
séculos do tráfico esclavagista atlântico e de ocupação colonial, até
às épocas mais recuadas. A obra de Cheikh Anta Diop mostra a ne-
cessidade, para a África, de um regresso ao Egipto antigo em todos os
domínios: o das ciências, da arte, da literatura, do direito... A diligên-
cia histórica, longe de ser concebida como um olhar virado para si ou
como uma simples deleitação do passado, permite a Cheikh Anta Diop
definir o âmbito de reflexão apropriado para colocar, em termos ra-
cionais e operatórios, o conjunto dos problemas culturais, educativos,
institucionais, políticos, económicos, científicos, técnicos, industriais,
etc., com os quais os Africanos se confrontam actualmente e para pro-
por soluções.
Cheikh Anta Diop trata todas as principais questões levantadas pela
edificação de uma África moderna: domínio dos sistemas educativo,
cívico
cívi co e político, com a intro du ção e utilização das língua
língua s nacio na is a to-
dos os nívei
níveiss da vida pública; o equ ipam ento en erg ético do co ntine nte;
o desenvolvimento da investigação fundamental; a representação das
mulheres nas instituições políticas; a segurança; a construção de um
Estado federal democrático, etc. A criação, por Cheikh Anta Diop, do
laboratório de datação através do radiocarbono, que o mesmo dirige
até ao seu desap arec im ento , é signif
significat
icativo
ivo de tod a a im po rtân cia aco r-
dada
Diop ao "enraizamento
apresenta-se, das como
assim, ciências em África".
o próprio A obra
pedestal de de
umCheikh Anta
verdadeiro
renascimento da África. Segundo o autor, a humanidade deve romper
definitivamente com o racismo, os genocídios e as diferentes formas
de escravatura. A finalidade consiste no triunfo da civilização sobre a
barbárie. Cheikh Anta Diop anseia pela era que veria todas as nações
do mundo unir as suas mãos "para construir a civilização planetária
ao invés de permanecer na barbárie" [Civili
[Civilisation
sation ou Barbarie, 1 9 8 1 ) .
C h e i k h A n t a D i o p : o h o m e m e a o b r a . Cheikh MB
Chei MBacké
acké Di
Diop
op loi
lo :,:, Babacar Mba ye Diop e Dou dou Dieng A Con sciê ncia Histórica Africa na
Introdução
Pode parecer surpreendente falar em semelhança entre a arte do
Egipto antigo e a da África Negra. Porém, são inúmeros os investi-
gadores egiptólogos que consideram que todos os aspectos da vida
cultural da África Negra remetem para o Egipto antigo. Segundo eles,
muitos dos traços da civilização egípcia antiga não podem, de facto, ser
compreendidos caso se desconheçam as características das culturas
da África Negra\ A ar te africa na e a ar te egípcia nã o estão , deste m odo ,
tão longe uma da outra quanto se poderia crer; e, em muitos casos, tra-
ta-se de
d e duas com po nen tes de um a mes m a reali
realidade
dade artística original
que o tempo e a história fragmentaram em duas entidades.
Na presente análise, examinaremos em primeiro lugar o estilo afri-
cano na sua relação com a arte egípcia; passaremos, de seguida, a uma
breve revisão do
d o estado das iinvestigações
nvestigações acer ca das sem elhan ças en-
tre as duas formaspor
demonstraremos, de arte. E para
fim, que estaacabar com qualquer
semelhança poderiamalentendido,
de facto ser
uma identidade. Por outras palavras, a existência de um mesmo es-
quema aqui e ali no mesmo contexto pode supor uma origem única.
igual mo
modo,
do, num estil
estiloo áspero, severo, reflecti
reflectido,
do, directo egrave? (p. 20-21J.
Quando Henri Matisse descobre uma máscara africana em Paris, esta
lembra-lhe, afirma o autor, "uma cabeça de pórfiro vermelho das anti-
guidades egípcias do Louvre". Segundo o escultor Jacques Lipchitz, é a
arte egípcia que revela a arte africana^
E m N ations nègres et Cu
Culture,
lture, Cheikh An ta Diop indica que dep ois de
ter reproduzido uma série de monumentos representando as diferentes
camadas sociais da população egípcia, incluindo sobretudo os faraós,
intercala tipos de raça negra para que a proximidade ou a diferença
étnica se torn e m ais deslum brante. O autor repara, curiosam ente, ao
aproximar esta série de figuras, que a arte egípcia é frequentemente
mais africana que a própria arte africana. Nos monumentos, os Egíp-
cios representaram-se com penteados artificiais idênticos às que se
ostentam por todo o lado na África Negra, e acerca das quais falare-
m os aqua ndo da sua análise das cen as da Paleta de N arm er (c f Nations
nègres et Culture, p. 134).
Nas suas Réflexions sur l'art funéraire Kota^
Kota^,, Gérard Delorme, referin-
do-se à origem da arte Kota, demonstra que para encontrar objectos
que evoquem, de perto ou de longe, "estas formas", "est a estili
estilização".
zação".
lo :,:, Babacar Mba ye Diop e Dou dou Dieng A Con sciên cia Histórica Africa na
da arte Kota, seria necessário remontar até ao Egipto antigo para reen-
contrar representações que oferecessem alguns "ares de família". Sem
acreditar totalmente nas teses de Cheikh Anta Diop, aquele confirma
o importante contributo dos povos negros para a civilização egípcia
antiga e não deixa de evidenciar as semelhanças bastante claras entre
certas figuras kota e as representações de cabeças de faraós: com os
seus penteados laterais amplamente desenvolvidos. Torna-se tentador
encontrar um ar "faraônico" nestes objectos.
Exceptuando as semelhanças de aspecto morfológico entre as figu-
ras de relicário
também kotaoutra
para uma e as analogia,
cabeças faraônicas,
aquela queGérard Delorme
consiste apontaa
em cobrir
representação do defunto com um revestimento metálico: o ouro nas
estátuas e nos sarcófagos dos faraós, o cobre sobre as representações
dos gran des d ignitários dos cl
clãs
ãs kota. Em am bo s os casos, o m etal obli
obli--
tera completamente a cor inicial do sujeito e atribui-lhe uma aparência
irreal. Esta convergência dos modos de expressão, a saber, o revesti-
mento com um metal brilhante, transformando assim a sua aparência
real, sobre um qualquer suporte, é simultaneamente pouco freqüente
e estranha. Outros investigadores, tais como R. R Briault, apontaram
igualmente
antigo". Serão para a "similitude
estas evidente entre
analogias puramente a arteSegundo
fortuitas? Bantu e Raponda-
o Egipto
-Walker, mesmo se, a priori, nada pa rece ap rox im ar estas duas civil ci viliza
iza--
ções, apa ren tem en te afastadas em simultâneo no tem po e no espaço, e
se não existe, actualmente, nenhum esboço de provas relativamente a
estas re lações , m esm o longínq uas, ent re os Kota e a civilização
civilização egípci
egípcia,a,
a questão mereceria ser aprofundada.
Marg aret Trowell, na s ua obra Classical african scuipture ( 1 9 6 4 ) ,
estabeleceu paralelos entre as esculturas africana e egípcia, para
de m on stra r as relaç ões en tre a arte do Egi
Egipto
pto antigo e a da África Negra^
Sabemos também que os diferentes reis-divindades da África ociden-
tal e oriental têm a sua origem no Egipto antigo^. Segundo a mesma
ordem de idéias. Paul Bohannan (1964) exprime-se do modo seguinte:
Só é possível com
compreender
preender bem a religi
religião
ão egípcia referi
referindo
ndo a religi
religião
ão afri-
cana; muitos
m uitos outros aspectos da história e da políti
política
ca egípcias sãsãoo esclareci-
dos pela etnologia africana. O utrora, era cuidadosam ente lembrad lembradoo que to-
das estas estruturas sociais e culturais tinham sido inventadas no Egipto, de
onde se tinham expand
expandido
ido pelo resto da África. Sabem os hoje que se tratava
de um a simplifi
simplificação:
cação: o Egipto era fundam entalmen
entalmentete um umaa cultura africana,
m odifi
odificada
cada por contributos da cultura asiática'^.
te e g i p ci a anti g a e a da Áf r i ca ne g r a .
E stado das i nv e sti g a çõ e s ace r c a das se m e l ha nça s e ntr e a ar te Babacar Mbaye Diop
Babacar Diop iii
A a r t e d o E g i p ttoo p r é - d i n á s t i c o a p r e s e n t a p r i n c i p a l m e n t e c a r a c -
terísticas africanas. A dos períodos seguintes
7. WiJlet, Frank, LArt afrícain [1971]: trad, do inglês p or Cath erine Ter-Sarkissian, nova edição,
1994, p. 110.
8./bid., p. 11 2.
9. Descoberta em 1898 pelo arqueólogo J. E. Quibell, a paleta de Narmer provém do templo de
Hieracômpolis, uma antiga cidade do Alto-Egipto que foi a capital dos primeiros faraós.
Os egiptólogos concordam em datá-la por volta de 3150 antes da nossa era e é atribuída ao rei
pré-dinástico Narmer. É conservada pelo museu do Cairo.
lo :,:, Babacar Mb aye Diop e Dou dou Dieng A Con sciên cia Histórica Africa na
fuga, como a vítima que vai ser imolada, possuem cabelos artificiais,
por camadas, tal como ainda se observa na África Negra; um penteado
d e s ta na tu r e z a , o s te nta d o p e l a s mu l he r e s j o v e ns d e s i g na v a - s e djmbi
nos Wolofs do Senegal; ligeiramente modificado, e usado por mulheres
ca s a d a s , e s te tr a ns f o r ma - s e no djéré, qu e d e s a p a r e ce u no S e ne g a l no
início do século XX. Nos homens, o Islão levou ao desaparecimento
deste costum e rrecentemecentem ente. Já só se enco ntram p enteados sem elha ntes
nos Serer, não islamizados até à circuncisão, e nos Fulas: uma das for-
ma s e s p e ci a i s d e s te s p e nte a d o s ne s ta s p o p u l a çõ e s é cha ma d a Ndjum-
bal. No Egipto antigo, o Rei protodinástico Tera Neter usa os cabelos
penteados com tranças. Este tipo de arranjo entrançado é, mais tarde,
observado em numerosas populações Egipto-núbias (escribas, faraós,
artesãos...]. Maspero indica-nos a propósito do faraó Sekenenré que:
" l a r v a s d e ne cr ó f o r o s d e i x a r a m ce nte na s d e cascos nas tran ças e nas
d o b r a s d o s b r a ço s " " . E s te e s ti l o d e p e nte a d o e ntr a nça d o e x i s te e m
todo o resto da África Negra depois da Antigüidade Egipto-núbia, quer
em populações Oeste-africanas como os Fulas, os Mandigas, os Dogons,
os Wolofs os Akans, os lorubás, os Mangbetues os Fangs da África Cen-
tral. Existe também nas populações do Leste, como nos Massais até aos
no s s o s d i a s , ta nto no s ho me ns co mo na s mu l he r e s .
m e l h ounicamente
vado é i n c o n t e s t áaov e rei",
l . N osegundo a , "o vermelho
s B a m b a rDominique era outrora
Zahan^^. reser-
Nos Dogons,
u m o b j e cto p a r ti cu l a r d o H o g o n qu e e x p r i me a o r i g e m d o s e u p o d e r
é o boné vermelho.
Em matéria de coroa, tal como se verifica, o simbolismo das cores
entre o Egipto antigo e a África Negra é o mesmo.
c ) A c a b e c e i r a e g í p c i a e o a p o i o d e c a b e ç a a f r i c a n o : o e x p l o r a d o r
fran cês FF.. Cail
Cailliliaud,
aud, falando da sua viag em ao Sudão , de scr ev e em 1 8 2 6
u ma ca b e ce i r a s u d a ne s a qu e s e a s s e me l ha e x a cta me nte à qu e l a s qu e
este tinha "visto por baixo da cab eça das m úm ias nos túm ulos de Te bas,
b e m co mo na s p i ntu r a s d e s te s me s mo s tú mu l o s " " . Pa r a C a i l l i a u d , nã o
existe lugar para dúvidas: estes objectos, que os Sudaneses do início
Cf. "Les cou leurs ch ez les Bam bara du Soudan Français", N otes
11. Cf. otes A fri cai
cai ne
nes,
s, n.^" 3,1951.
12. Citado por A. Moussa Lam in Afri que-H ue-H istoir e, n.^
n.^ 9, p. 53 .
13. Cf. H i stoi re uni
uni verselle
verselle de l'art ; vol. III, p. 55.
lo :,:, Babacar Mba ye Diop e Dou dou Dieng A Co nsciê ncia Histórica Africa na
d ) O m r d o s E g í p c iioo s o u a e n x a d a d o s A f r i c a n o s : O m r é um utensí-
lio agrícola que se apresenta sob duas formas: um modelo grande, com
u m ca b o s u f i ci e nte me nte co mp r i d o p a r a s e r ma ni p u l a d o na p o s i çã o
em pé e um modelo pequeno, cujo cabo curto supõe uma certa cur-
vatura do utilizador. Moussa Lam, no seu artigo acerca deste objecto
( r e v i s t a Ankh n.- 2 , 1 9 9 3 , p p . 1 9 - 2 7 ) , m o s tr a qu e u te ns ííH
H o s a ná l o -
g o s , s i mu l ta ne a me nte na s s u a s f o r ma s e no s s e u s mo d o s d e u ti l i z a -
ção, se encontram nos Haal Pulaar da região do rio do Senegal e nos
Mandigues de Casamança. Nos Haal Pulaar, existe, afirma o autor, o
njinndaangu e o jaio qu e s e a s s e m e l ha m r e s p e cti v a m e nte , s a llvv o r a r o s
pormenores, às duas versões do mr egípcio. Nos Mandingas, também
e x i s te m d o i s m o d e l o s : u m g r a nd e e u m p e q u e no , qu e s ã o m a ni p u l a d o s
E stado das i nv e sti g açõ e s ace r c a das se me l han ças e n tr e a ar te e g i p ci a anti g a e a da Áf r i ca ne g r a . Babacar
Babacar Mbaye Diop iii
na s me s ma s co nd i çõ e s e qu e p o s s u e m a s me s ma s f u nçõ e s qu e a s d u a s
formas do mr egípcio.
e ) B a s t õ e s , m a ç a s e c e p t r o s d o E g i p t o e d a Á f r i c a : Num estudo
consagrado aos "Bastões, maças e ceptros do Egipto e da África Negra",
T o d o s e s te s d e ta l he s d e mo ns tr a m qu e o a s p e cto g e r a l d o s b a s tõ e s
era o mesmo para os dos Egípcios e dos Africanos.
- j 4s maças: C o n he ce - s e p e r f e i ta m e n te a m a ça e g íípp ci a,
a , d e ca b e ça
piriforme com a qual o faraó massacra ritualmente os seus inimigos.
J . M a e s e s ta b e l e ce u i nú me r a s s e me l ha nça s e ntr e , p o r e x e mp l o , o nps
egípcio e o yatagan das po pu laç õe s da ba cia do Zaire. Este afirma,
de facto, que o Museu do Congo possui cerca de uma centena de ob-
j e cto s qu e p o d e m s e r cl a s s i f i ca d o s na ca te g o r i a d o s qu e b r a - ca b e ça s .
M o u31
n." s s aatribuído
L a m p r e ci
pors a J.quMaes
e o s esex e parecem
mp l a r e s n.-
mais2 7com
e , e am maça
me nopiriforme
r grau, o
dos antigos Egípcios. A maça dos Bihe, s e m co nte s ta çã o , é e x tr e ma -
me nte p a r e ci d a co m a f a mo s a a r ma d e p a r a d a d a s me mó r i a s e g í p -
cias e não existe qualquer ambigüidade a este nível. No Egipto, de
igual modo, a implicação deste tipo de maça nas acções guerreiras
não deixa margem para dúvidas. As semelhanças são, portanto, reais;
são-no também no que diz respeito aos ceptros de autoridade.
areconhece
duvida
duvidar. Moussa
r. A Lam,
ap ro xim aç ãoumm ais
detalhe que su
decisiva pode
rge levar os mais
do Hogon dos cépticos
Do gon s
do Mali
Mali.. O ba stão com cab o desta per son ag em que, tal com o o faraó
egípcio, era simultaneamente chefe religioso e político, é muito próxi-
mo do heka egípcio. Tal com o a extr em ida de do m od elo egí
egípcio,
pcio, o do
báculo do Hogon possui uma curvatura para o exterior.
g ) se
bém I n sencontram
t r u m e n t o snad eÁfrica a , tais como
m ú s i cCentral as harpas egípcias que tam-
(no Gabão}.
A no ssa an álise das relaçõ es e ntr e a arte afric ana e a arte egípc ia ter-
mina aqui. Não nos é possível expor detalhadamente todos os objec-
tos semelhantes. As similitudes entre as duas formas de arte já foram
reveladas, e de modo mais desenvolvido, por vozes mais proeminentes
d o qu e a no s s a . A cr e s ce nta r e mo s a p e na s qu e a r e l a çã o e ntr e a a r te
l o:
o: , Babacar Mba ye Diop e Dou dou Dieng A Con sciên cia Histórica African a
em sabercabeceira,
ou uma traçar a linha de demarcação
e aquilo que não o é.entre aquilo quedaé arte,
O historiador uma de
trança
boa
fé e não sendo ideologicamente motivado, que afirma que as tranças
em forma de camadas, na África Negra actual, são as mesmas tranças
que foram apontadas na cabeça do rei Narmer, não ignora o que é uma
trança, isto é, onde começa e onde acaba este gênero de tranças. Isto
porque, como é que o mesmo poderia identificar um gênero de trança,
caso este não soubesse reconhecer o termo geral que ocupa o lugar
central em qualquer julgamento de identidade?
Na medida em que este sabe o que é uma cabeceira, torna-se imedi-
atamente capaz de designar a priorí um princípio de diferen ciação a
propósito das cabe ceiras: sabe não som en te diferenciar um a c abec eira
da outra, mas também uma trança de outra. Portanto, se o historia-
dor sustenta que o apoio de cabeça dos Africanos é o mesmo objecto
que o da cabeceira egípcia, é porque a existência desta cabeceira deve
ser uma "existência continuada". Saber o que é uma cabeceira, é saber,
em princípio, em virtude de que factor qualquer cabeceira pode per-
manecer idêntica a si própria: "um julgamento de identidade, e con-
sequentemente um enunciado de identificação, a propósito de uma
coisa não exige nada m ais, nada m en os, do que o dom ínio com pleto do
conceito dessa coisa"". Evidentemente, a identidade revela essencial-
mente duas coisas: ou a unicidade atribuída a vários objectos primei-
ram ente apreendidos, criados ou o u nom ead os de m aneira diferente (tra-
ta-se da identidade num érica), ou a particu laridad e de vários ob ject os
possuírem as mesmas propriedades, salvo a de serem confundidos no
espaço ou no tempo (trata-se da identidade dita específi
específica
ca ou qualita-
tiva).
A identidad e aplicada a um ob jecto ou a um se r que é "um e o m es m o"
é conhecida como identidade numérica. Quando se trata de indivíduos,
fala-se
de umaem identidade
certa pessoal.
permanência do Oser,
indivíduo
física e é socialmente
este ou aquele, por força
identificável.
Mas esta identidade concreta pod e dar lugar a um a aná lise abstracta;
uma análise que coloca em evidência uma identidade específica ou
qualitativa entre duas realidades. Ganhando em complexidade, o con-
ceito de identid ade e nc on tra en tão o seu verd ade iro pe so filosófi
fi losófico,
co, na
medida em que a perda de uma certa univocidade imediata o trans-
porta para linguagens mais elaboradas da analogia. Ora, a iden tidad e
não é uma analogia.
E stad o das i nv e sti g açõ e s ace r ca das se me l han ças e ntr e a ar te e g i p ci a anti g a e a da Áf r i ca ne g r a . Babacar Mbaye Diop
Babacar iii
lo :,:, Babacar Mba ye Diop e Doud ou Dieng A Con sciên cia Histórica Africa na
Referências Bibliográficas
B o n h e m e , M . A . & F o r g e a u , A . ( 1 9 8 8 ] . P haraon. L es se
secre
crets
ts du pouvoi r. P a r i s : A r m a n d
Colin.
P . ( 1 9 6 4 ] . C lassi cal
B o h a n n a n , P. cal afr i can
can sculpture
sculpture-,-, L o n d r e s , 2.- ed.
D i o p , C . A . ( 1 9 5 4 ) . N ati ons nè
nègr
gr es et culture. P a r i s ; P r é s e n c e A f r i c a iinn e . R e e d i ç ã o e m
l iv
i v ro
ro d e b o l s o e m 1 9 7 9 , 1 9 9 9 .
D i o p , C . A . ( 1 9 7 5 ] , L 'anti qu
quii té afri cai
cai ne par
par l'i mage.
mage.
D elo rm e, G O T A ",", i n A rts d'Afri que
G.. ( 2 0 0 2 ) . " R é f l e x i o n s s u r l ' a r t f u n é r a i r e K OT N oire,
oire,
n . 2 1 2 2 , p p . 1 4 - 4 2 [ 2 9 páginas],
M a r t i , M.
M . P. ( 1 9 6 4 ) . L e roi -di eu du B énin. P a r i s : B e r g e r - L e v r a u l t .
T r o w e l l , M . ( 1 9 6 4 ] . C lassi cal
cal afri can
can sculpture
sculpture-,-, L o n d r e s , 2 . - e d .
W i l l e t , F . ( 1 9 9 4 ] . L 'art afri cai
cai n (1971),
(1971), trad, do inglês po r Ca the rine Ter-Sark issian,
nova edição.
Z a h a n , D . ( 1 9 5 1 ] . " L e s c o u l e u r s c h e z llee s B a m b a r a d u S o u d a n F r a n ç a i s " , i n Notes
Africaines, n . - 3 , p p . 5 2 - 5 6 .
l oo:: , Babaca r Mba ye Diop e Doud ou Dieng A Con sciên cia Histó rica Afric ana
Introdução
A história é uma ciência e uma disciphna. Esta não se caracteriza
pelo seu objecto, método e campo de estudos ou de investigações. A
confusão entre estas duas categorias está, provavelmente, na origem
da falsa definição que reduz a História ao estudo do passado. Esta
definição parece-nos falsa porque o passado, enquanto noção, consiste
num julgamento de valor. Partamos da dicotomia clássica que dis-
tingue a história "em si" e a história "por si .
A história "em si" rem ete pa ra o con jun to das vias e m eios atravé s dos
quais uma sociedade assegurou, através do tempo, a sua produção e
repro du ção sociais. A história "por si" refere -se, po r sua vez, ao estud o
das fases e dos modos através dos quais uma sociedade assegurou as
m esm as através do tem po . Desta disti
distinção
nção resu lta que tod a a socied ade
possui uma história "em si". A questão de poder estudar esta história,
de torná-la numa história "por si", coloca um pro blem a de meios, de
técnicas de investigação, de mentalidade. Segundo esta perspectiva,
a história é uma ciência recente e distingue-se, em vários aspectos,
da narrativa que pode ser assimilada à forma primitiva do discurso
histórico. A outra questão que se coloca, então, consiste em saber se se
deve falar de história africana ou de história das sociedades africanas.
Preferimos falar em história das sociedades africanas, na m edida em
que a expressão história africana nos par ece corr esp on der ao estudo
das especificidades das sociedades africanas. Ora, do mesmo modo,
como não existe química africana, não poderia existir uma história
E s t a d o d a s i n v e s t g a ç õ e s a c e r c a d a a n t i g u i d a d e a f r ic
ic a n a . Babacar Sal 1 25
1. Generalidades e problemática
Poderei surpreender alguns, desde o início do nosso presente en-
contro, ao afirmar que continuamos sem saber de onde provém o
termo África. De entre as hipóteses introduzidas no primeiro volume
d e VH ist
istoire
oire général
généralee de VA fri
frique^,
que^, editado sob a égide da UNESCO,
nen hu m a é ob jecto de acordo e ntre os HistHistoriadores.
oriadores. É contudo aceite
2. A do cum entação
A história, afirmava Mare Bloch, é a ciência dos vestígios. Actual-
mente, uma página da história antiga das sociedades africanas começa
E s t a d o d a s i n v e s t g a ç õ e s a c e r c a d a a n t i g u i d a d e a f r ic
ic a n a . Babacar Sal 127
na Núbia-Sudão,
Núbia-Sudão, esta região que os au tore s gregos antigos designavam
de Etiópia.
Etiópia. Foi ne ste local que Diodoro situou o surg im ento do ho m em .
É neste local que paleontólogos e geneticistas, apesar das suas di-
vergências, situam os lares de emergência dos hominídeos mais an-
tigos. Foi neste lugar que se comprovaram, segundo as escavações do
instituto de estudos orientais da universidade de Chicago, os lares de
constituição das formas primitivas do Estado''. Durante muito tempo,
estudada enquanto apêndice do campo arqueológico egípcio, a Núbia-
-Sudão campo.
mesmo acabou Trata-se
por ser integrada
apenas dee umconsiderada como àquilo
justo regresso a matriz
que,deste
se-
gundo os sábio s gregos, reto m an do um a trad ição dos antigo s Egípcios,
representava a terra onde os deuses tinham reinado antes de confiar
o poder aos homens e subir aos céus. Prova deste estado de coisas, os
con gre sso s de Nubiologi
Nubiologia,
a, de investiga ções d as especificidades, foram -
-se atenuando, tendo o último colóquio sido o de Chantilly em 1975.
Um breve olhar em torno dos recursos da história das sociedades afri-
canas na Antiguidade estabeleceria a tipologia seguinte:
África
pertinemnte
ed iterrâ nica ver
para entre e nilótica.
o povoaAmen
sua to,
util
utilização
ização pod
naquela e reve
época, dalar-se
das m uito
s costas oci-
dental e oriental da África®. A desconstrução destes discursos revela,
em parte, o seu funda m ento egípci
egípcio.
o. Estes texto s egípcios, segun do u m
rece nse am en to anti
antigo,
go, foram editados por K K.. Sethe. Estes constituem a
incontornável série dos Urkunden^.
4. Cf. William, B., "The Qostul incense burner and the case for a nubian origin of ancient egyptian
kingship", in Egypt in A frica;
frica; ed. Celenko, Th., Indianapolis museum of art, 1996, pp. 95-97; Id.,
"Forebears of Menes in Nubia", in /. N . E. S., S., 1987; Scott Macleod, "The Nile's other Kingdom", in
Time, Setembro de 1997.
5. Cf. L es sources
sources gr ecq
cque
uess de l'hi stoi re né
négr
gr o-afr i caine de H omère
omère j usqu'à St Strabon;
rabon; 1 9 7 2 .
6. Cf. Berthelot, A., V A fr i que centr
centr ale et occidentale; ce qu'en ont connu les anci ens; 1 9 2 6 .
7. Cf. U rk unden
unden des A lten R ei ches;
ches; O bers
bers etzung zu de denn H eftem 1-4 de der U rk unden
unden I V , 1 9 1 4 e 1 9 8 4 ;
U rk unde
unden derder ägy ptis che
chen A ltertums,
ltertums, I V , U rk unde
unden derder 18
18.. D ynasti e, Leipzig, 1930; Urkunden der
ägypti sche
schen A lte
ltertums,
rtums, V U , U rk unde
undem des
des M i ttleren
ttleren R ei che
ches, 1 9 3 5 .
l oo:: , Babacar Mba ye Diop e Doudo u Dieng A Co nsciê ncia Histó rica Africa na
E s t a d o d a s i n v e s t g a ç õ e s a c e r c a d a a n t i g u i d a d e a f r ic
ic a n a . Babacar Sal 1 29
é p o c a s p r é - d i ná s ti ca s e d i ná s ti ca s , o s qu a d r o s r u p e s tr e s co ns ti tu e m
v e r d a d e i r o s livros de imagens, vestígios daquilo que foram as vias e os
meios, as fases e os modos através dos quais várias populações garan-
tiram as ba ses da sua pro du ção e rep rod uç ão sociais. O m es m o será
dizer que em matéria de antiguidade em África, as regiões nilóticas,
subm editerrân ica e saariana, são pri privil
vilegia
egiadas.
das. Indicámo s an ter iorm en te
que não se tratava de uma especificidade, já que a mesma constatação
vale para a Europa e para a Ásia. Á situação já era a mesma na Ánti-
guidade, uma vez que a escola grega clássica de estudos africanos só
levou a cabo análises e descrições nestas regiões.
A l g u ns hi s to r i a d o r e s a f r i ca ni s ta s p r o cu r a r a m e a i nd a p r o cu r a m r e -
duzir as passagens dos textos gregos antigos relativos à África a lendas
e mitos. Salientemos que esta atitude não tem qualquer consistência,
na me d i d a e m qu e s ã o a s me s ma s f o nte s qu e s e r v e m d e f u nd a me n-
tos à reconstituição das civilizações da Europa antiga. Tudo isto para
dizer que aquilo que Heródoto apresenta acerca da África não passa
de mitos e lendas, aquilo que a mesma fonte afirma acerca da Grécia
são também mitos e lendas. Ora, os Africanistas em causa não deixam
d e ti r a r e s ta co ncl u s ã o . Pa r a a l é m d i s s o , o e s tu d o d a hi s tó r i a d a s
s o ci e d a d e s a f r i ca na s na a nti g u i d a d e r e co r r e d e mo d o p e r ti ne nte a o s
resultados da paleobotânica e da paleoclimatologia. Quanto à antropo-
logia, muitas vezes agitada para negar as análises de inúmeros histo-
riadores, africanos em particular, esta necessita em primeiro lugar de
um mínimo de concordância acerca dos seus critérios de classificação.
Remetemos para a entrevista de Jean Coppans no jornal de vulgariza-
ç ã o Histoire, n .^ 2 9 3 , d e D e z e m b r o d e 2 0 0 4 .
3. Panorama
Voltemos a repetir Quando se fala da Antigüidade em África, os es-
píritos voltam-se em primeiro lugar para o Vale do Nilo. Aqui, foram
con stituído s os Estado s egíegípcio,
pcio, cuc hita e aksu m ita. O Egipto repr e-
senta o conjunto das terras situadas no norte da primeira catarata e
que o Nil
Nil o iinund
nund a com as suas cheias. A sua em erg ên cia n o fi
final
nal do qu ar to
m ilênio resultou de três revoluçõ es. O Egipto, pou co antes de - 3 0 0 0 :
1 ) a u ni f i ca çã o te r r i to r i a l e p o l í ti ca . Is to tr a d u z i u - s e p o r u m e n-
g e nho s o s i s te ma hi d r á u l i co co ns tr u í d o co m d i qu e s d e p r o te cçã o , ca -
nais de irrigação e bacias de retenção das águas. Este sistema, para
além de pe rm itir o dom ínio do ri rio,
o, oferec ia às po pu laçõ es esta bele ci-
das na planície aluvial, a possibilidade de proceder a uma utilização
racional e judiciosa das potencialidades de que o Nilo era vector
l o:
o: , Babacar Mb aye Diop e Dou dou Dieng A Con sciên cia Histó rica Africa na
de escavações
As Hieracômpolis. Aqui, Dreyer
de Günter nesta data, surgem os
no cemitério primeiros
U de Abidos, hieróglifos.
do túmulo
U-j em particular, revelaram a existência, na época, de uma socie-
dade hierarquizada, cheia de desigualdades, que conhecia o arma-
zenamento, traduzido pela presença de vasos com fundo pontiagudo
com ou sem elementos de preensão. Esta pressão demográfica terá
provocado o desenvolvimento da cultura dos cereais e o comércio de
longa distância em direcção à Núbia e às costas siro-palestinianas. Foi
deste modo que se constituiu um grupo social que se pode caracteri-
zar como aristocracia, cujas riquezas encontramos nos túmulos. Os
homens que estiveram
de uma tradição na base destas
cujos vestígios mudanças
mais antigos eram os herdeiros
são comprovados numa
área que se estende dos Grandes Lagos ao Quênia actual. Trata-se da
civilização dos pescadores de Gam ble'
ble'ss cave, d e Early-Khartoum e de
Es-shaheinab. As paleta s pintad as em form a de peixe, os ha rpõ es far- f ar-
pados, as goivas e as cabeças de maça encontrados no Egipto, em par-
ticular no Faium, foram inventados nas cat-fi
cat-fish
sh caves do Sud ão. Aqui,
E s t a d o d a s i n v e s t g a ç õ e s a c e r c a d a a n t i g u i d a d e a f r ic
ic a n a . Bab
Babacar S al i 131
12. Cf. Gabriel Camps, Le Less cici vi li sati ons préhist
préhist ori qu
quees de l'A fri qu
quee du N ord et
et du Sahara, 1 9 7 4 .
13 . Cf
Cf.. As e sc av aç õe s de F. W en do rf da SSIIVIU de Dallas.
14. Cf. Cornevin M., L 'ar chéolog
chéolog i e afr i cai ne à la lumi èr e des des dé
découvert
couvertees récentes,
récentes, 1 9 9 3 .
l oo:: , Babacar Mba ye Diop e Dou dou Dieng A Co nsciê ncia Histó rica Africa na
15. Cf. Derchain Ph., "Ménès, le roi quelqu'un", in R de 18,1966, pp. 31-36.
16. Cf. Gustave Lefebvre, R omans et et contes
contes égy pti ens de l' époque
poque pharaoni que
que,, 1976.
17. Leclant, J., " P erA fricae siti entia, témoignages des sources classiques sur les pistes menant à
l 'oasis d'Ammon", in B. I . F. A. 0.
18. Leclant, J., "Les "empires" et l'impérialisme de l'Égypte pharaonique", in Duverger M., Le con-
cept d'empire, 1980.
E s t a d o d a s i n v e s t g a ç õ e s a c e r c a d a a n t i g u i d a d e a f r i c a n a . Babacar Sa i 133
l o:
o: , Babaca r Mba ye Diop e Doud ou Dieng A Con sciên cia Histórica Africa na
E s t a d o d a s i n v e s t g a ç õ e s a c e r c a d a a n t i g u i d a d e a f r i c a n a . Bab
Babacar S al i 135
24. Cf. Quezell P. e Martinez G., "Le dernier inter-pluvial au Sahara central", in Li byca, 6-7, 1958;
Servant M., Séque
Séquencencess continentales
continentales et var i ati ons cli mati ques.
ques. E voluti
vol uti on du
du bassi n du T chad au
Cénozoïque supérieur, 0. R. S. T. 0. M ./Pa ris VI, VI, 1 9 8 3 .
25. Hugot, J., Préhistoire de l'Afrique, 1 9 7 0 .
26. Cf. Huard, R e Leclant, J., L a culture des des chasseurs
chasseurs du N i l et do Sahara, 1 9 8 2 .
27. Cf Roset J. P., "Céramique et Néolithisation en Afrique saharienne", in Guilaine J. editor, les
premiers paysans du monde. Naissance des agricultures; Par Paris
is,, Errance, 20 00 , pp.
pp. 26 1- 29 0.
28. Cf. entre outros autores, H. Breuii, H. Lhote, R. Mauny, etc.
29 . Cf
Cf.. Bel
Bell,
l, B.
B.,, "The da rk ag es in ancie nt h istor
istory.
y. I: the firste dark age in Egypt"
Egypt",, in A / A ., 7 5 , 1 9 7 1 ,
pp. 1-26.
lo :,:, Babacar Mbaye Diop e Doud ou Dieng A Con sciên cia Histórica African a
l oo:: , Babaca r Mba ye Diop e Dou dou Dieng A Co nsc iênc ia Histórica Africa na
o Acentro
pistadeconhecida
um poderoso
por reino
Sikkat que foi o antepassado
el-Meheila condu zia de Kush.a, prove-
a Kerm
niente de Meroé através da planície de Boutana via Napata, atra vé s
de Bayuda. Era também o terminal da pista do wadi el-Melek o u wadi
el-Milk, que lligigava
ava o cora ção da planície de Dong ola com and ad a p or
Kerma, a Darfur e a Cordofão, e ainda mais além, na curva do Niger.
Terá sido através desta pista que vigna unguiculat
unguiculataa e rici
ricinus
nus comm u-
n is terão transitado para chegar ao Egipto via Núbia. Na biografia de
Herkouf,, na qual se relata um a gu erra en tre o sobe ran o de Yam e popu -
Herkouf
lações do Saara, o soberano yamita afirma que, indo combater estas
populaç ões c hamad as témékhou, tev e de se dirigir até ao horiz on te
ocidental do céu. Quereria este dizer até ao Darfur-Cordofão ou até
ao coração da África ocidental, terra de domesticação dos produtos
sup racitad os? A esta questão , não existe, actu alm ente , qualqu er re s-
posta textual ou arqueológica. Dos oásis de Dakhleh e de Khargeh, às
latitudes do alto Egipto, a cerca de 400 km do Vale do Nilo, algumas
pistas partiam também em direcção ao Darfur e à curva do Niger. No
Saara subnúbio, alguns ramaldes destacados destas pistas dirigiam-
-se em direcção ao vale. Ali, onde se encontra o local de Selima, que
representava um nó das vias terrestres indo ou voltando dos oásis do
S aara s ubeg í pc io po r Bir tarfawi/ Birsahara e a depressão do tchade.
Deste modo, é possível ter uma idéia, devido à cobiça egípcia, das
populações da África subnilótica, bem como do seu gênero de vida
na Antigüidade.
Mais uma vista de olhos em direcção ao oeste. Tratando-se do Saa-
ra, sabemos através das fontes gregas que houve tempos em que este
fervilhava com vida. Que reconstituição poderemos tentar para com-
preender tais propósitos? Aqui, é a arte rupestre e os resultados da
paleoclimatologia que servem de base. Tudo parece ter começado no
final do árido do Tardiglaciar.
32 . Cf
Cf.. Blench R.
R.,, "Conne ctions betw een Egypt and su bsah aran Afri Africa:
ca: the evidence of cultivated
cultivated
plants", in Davies W. V., E gypt and
and A fri ca:
ca: N ub
ubii a from P re
rehistory
history to I slam, 1993, pp. 54-56.
E s t a d o d a s i n v e s t g a ç õ e s a c e r c a d a a n t i g u i d a d e a f r ic
ic a n a . Babacar Sal 139
Conclusão
Por muito grandes que tenham sido os passos efectuados no estudo
e na compreensão da evolução das sociedades africanas no segmento
temporal designado por Antiguidade, estes são ainda insuficientes.
Primeiramente, pelo facto de imensas regiões ainda serem terra
incognita. Os histo riad ore s african os especializad os na antiguidad e
constituem apenasos um
cia não somente frágilemcenáculo.
isolam, As suasunscondições
certa medida, de existên-
dos outros, mas fa-
zem também com que se encontrem ausentes de alguns encontros. Em
Africa, as políticas de investigação são quase inexistentes, sobretudo
l oo:: , Babaca r Mba ye Diop e Doud ou Dieng A Con sciênc ia Histórica Afric ana
E s t a d o d a s i n v e s t g a ç õ e s a c e r c a d a a n t i g u i d a d e a f r i c a n a . Bab
Babacar S al i 141
Bab
Babacar S al i
Introdução
As relações entre o Egipto antigo e a África Negra foram e continu-
am a serocidental
tologia um importante tema Ade primeira
e de Dakar. debate nodedicou-se
seio das escolas
antes dedemais
egip-a
isolar a civilização egípcia antes de aceitar, por fim, voltar a colocá-la
no seu contexto africano; a segunda sempre defendeu a tese de uma
profunda unidade cultural e racial entre o Egipto e a África Negra.
Alguns factores novos, resultantes das investigações levadas a cabo
por eg iptólog os neg ro-afric anos (c ontinente e d iás pora] permitem
hoje confirmar a existência da unidade egipto-africana, cujo berço
mais fecundo é de facto o Egipto antigo. Este berço foi deslocado
apenas com o enfraquecimento e com a queda do poder faraônico,
dando assim origem a vagas migratórias em direcção ao interior do
c ontinente.
No pre s en te tex to, ap res e nta m os alg umas d as nos s as d ec ob ertas
pessoais, entre as quais a exploração permite dar novos passos na di-
recção indicada, desde 1954, pelo grande Africano Cheikh Anta Diop.
1. 0 debate
Tal como relembrámos na introdução, as relações entre o Egipto
antigo e a África Negra fazem parte destas questões de egiptologia
mais entusiasticamente discutidas: um dos pais da egiptologia, Gaston
Mas pero (1846-1916], não hes itou em abs olver os antig os E g í pc ios e
1. Professor de história, egiptólogo, universidade Cheikh Anta Diop de Dakar.
2 . H i stoi re ancienne
ancienne des
des peuple
peupless de l'O ri ent, Paris, Hacliette, 1912, pp. 16-17; Les momies royales de
Deir el-Bahart, Mémoires de la Mission Archéologique Française, I, 4, Paris, E. Leroux, 1889; ver
tam bém Lam A. M. M.,, L'affaire des momies royales, Paris, Présence Afri Africaine
caine,, 2 00 0 .
3. Lalouette, C., L'ar t et
et la vi e dans
dans l'É gy pte pharaonique
pharaonique;; Paris, Fayard, 19 92 , pp. 13 -1 4.
4. J. Leclant escreveu bastante acerca das relações entre o Egipto e o resto da África, porém,
dois textos poderiam resumir o seu ponto de vista: "Afrika", Lexií i on de derr Ä gyptologie,
gyptologie, I, 1, 1972 e
"Egypte phara oniqu e et Af Afri que",, I nsti tut de Fr ance
rique" ance, n . s 1 0 , 1 9 8 0 .
lo ::,, Babacar Mba ye Diop e Dou dou Dieng A Con sciên cia Histórica Africa na
que poderiam
do Saara, resumir-se negras
as populações do seguinte modo: depois
retrocederam da desertificação
maioritariamente para
o Vale do Nilo, onde viveram até à queda do poder faraónico, período
durante o qual começaram a dispersar através de vagas migratórias
sucessivas no interior do continente®. É este o motivo pelo qual o au-
tor de Na
Nations
tions nègres et culture afirm a existir um a profund a unidade
cultural entre Egípcios antigos e Negro-Africanos. Certamente, Cheikh
Anta Diop utiliza uma argumentação variada por forma a sustentar o
seu ponto de vista; porém, citaremos em particular as tradições que
o autor convoca para demonstrar que as populações negro-africanas
nunca
a utor,esqueceram as ente,
suas aorigens
tribuía nilóticas; esteméagistral
todo o redigi
sentido
o autor , indu bitavelm ao seu artigo do que
redigido em
1973, e intitulado "Introduction ã Tétude des migrations en Afrique
centrale et occidentale: identification du berceau nilotique du peuple
sénégalais"^.
Instala-se, deste modo, o debate em torno das relações entre Egíp-
cios antigos e Negro-Africanos. A contribuição que se vai seguir
dedicar-se-á a demonstrar que a tese defendida pelos Ocidentais é
dificilmente conciliável com os dados que pudemos recolher ao longo
dos primeiros anos de investigação. Partimos de um léxico comparado
entre o egípcio antigo e as línguas negro-africanas do Oeste da Afri-
ca: fula (essencialmente), wolof, serer, soninquê, bambara, dogon; a
constatação que se impõe é que as similitudes verificadas, bem como
as suas múltiplas implicações, confirmam inteiramente a perspectiva
defendida po r Chei
Cheikh
kh Anta Diop e chegam até a pôr em ca usa algum as
leituras e interpretações da língua egípcia que quase dois séculos de
egiptologia ocidental tinham acabado por impor, Uma perspectiva
desta natureza confirma justamente a pertinência de um dos pontos
de consenso do colóquio do Cairo de 1974, que concluía que o semítico
não dava
para conta
a Africa do egípcio
Negra para a antigo e que era,
compreensão portanto, legítimo
e vocalização voltar-se
desta língua.
E g i p t o a n t i g o e Á f r i c a n e g r a : a l g u n s f a c t o r e s n o v o s q u e e s c l a r e c e m a s s u a s r e l a ç õ e s . A. Moussa
Moussa Lam 143
2. A a m os tra
A amostra que escolhemos diz respeito a termos relativos às partes
do corpo, à água, à agricultura, ao anão, ao pigmeu, ao hipopótamo e
ao cavalo. Utilizámos, essencialmente, o An Egyptian Hieroglyphi
Hieroglyphicc Dic-
tionnary, de E. A. W. Bud ge para a pa rte egípcia; par a a pa rte african a,
salvo indicação contrária, a língua escolhida foi o fula/fulfulde. Eis os
diferentes quadros:
AS PARTES D
DO
O CORPO
EGÍPCIO ANTIGO LÍNGUAS AFRICANAS
irt: olho; irt bint. 0 o l h o m a u -yiitere: olh o [fula)
C o pt a : ei at; ei
ei ep boone:
boone: - yiiretee (irt): aquilo com 0 qual se
iC ^ 0 o lh o m a u vê, isto é, 0 ol ho
-yiyata-. aqu ilo que vê
-yiitere bonnde-. 0 o lh o m a u
•Ç» hn fac
face,e, ro sto - hoore: cabeça (fula); opõe-se a
1 C o pt a : x o t e ppe r e : c a lc a n h a r
- xoox: c a r o ç o ( d e u m f r u t o ) e m w o lo f
- xoox-. cabeça em serer; nestas duas
línguas, 0 x p r o n u n c i a - s e c o m o 0
f r a n c ê s k h
\\ h r y . que está po r cim a - huuri-. q ue cobre, que está p o r cim a
<rr>i. i (fula)
- seebde: ser intelige nte (fula);
1 í^ pa la v r a po r pa la v r a : s e r po n t i a g u d o
l o:
o: , Baba car Mb aye Diop e Dou dou Dieng A Co nsciê ncia Histó rica Africa na
UltZZc H s A m w . leite
- kosam-, leite (fu la); de haos--. o r d e n h a r
leite
« n ó H s A m w/H s A - . leite
PI H s A w : leitefs]
- kose/koce: leites [fula]
0 0 0 Nnww
w/nwwmw\ á g u a s d o N o u n - Nomma-, á g u a , m a s i g u a lm e n t e o s
primeiros seres humanos engendrados
Ç) nww /nww mw: idem
idem por Amma (deus supremo dos
Do go ns ) e a sua mu lher
- muno: g ê n i o s d o r i o ( s o n i n q u ê )
(m fò
' ^ ^j) nww /nww mw: idem
idem - munu: gê nio do rio [f
[fula]
ula]
Mf^ffXi», / l
il krty. gruta de
onde sai o Nilo
- 0 rio de K orotoumou
orotoumou,, que seria o Nil o
segu ndo as tradições do s [Man deu s?];
<r> \\® t e m o d o , K orotoumou
d e s te orotoumou p o d e r i a d e r i v a r
de *qrty m w
A G R IC U L T U R A
EGÍPCIO ANTIGO LÍNGUAS AFRICANAS
rmn-. m e i a - v a r a [ o u pertica] - leemnu; a r pe n t á v e l; r e c o lo c a ç ã o d o
(2,5 m) meio-aruro braço na posição da arpentagem
- remnu: cultivável [aqu i em maté ria
de superfície]
^ ^ A j 0 rmnyt: e x plo r a ç ã o - remnata; aqu ilo que fa
fazz cultivar
- leeman: a r p e n t a g e m e m b e n e f íc
íc i o d e
- laman: s e n h o r d a s t e r r a s n o s S e r e r e
n o s W o lo f d o S e n e g a l
- lamini: t e r r i tó
tó r i o d e s u c e s s ã o n o s
Mandingas
^ Datf. Es t a d o , d o m í n i o , - jattv. t e r r a o c u p a d a p o r t e m p o p r o -
^ pr o pr i e d a d e f u n d i á r i a lon gad o, feudo, A co m bi na çã o de 9íHt
e @ não deixa qualquer dú vida acerca
acerca
do grau de artificialização do meio
mr . e n x a d a - rem--. cultivar
mr . a m a r r a r e m c o n j u n t o , - A g r a n d e e n x a d a d e s i g n a --ss e tonngu;
5 entravar a m a r r a r , e n t r a v a r ; a s s i m , 0 n o m e
r e m e t e pa r a 0 m o d o d e f a b r i c o d o
objecto
\ s - denkii: c o m pa c t a d o , a t a r r a c a d o ; r e -
l e m b r a 0 a m á r i c o denk\ a n ã o , p i g m e u
- tunngune-. a n ã o [ w o l o f ]
dAg/dAg Hr?-. a n ã o , pi g m e u ; - duuguuro: atar rac ado [fula]
^ ^ ^ a 2.- leitura é s u g e r i d a p e l o
fula duuuguuro
lo :,:, Babacar Mb aye Diop e Dou dou Dieng A Co nsciê ncia Histó rica Africa na
- gabv. h i p o p ó t a m o s ( p l u r a l )
t f Q '' '
^ «d
3.2. A água
o símbolo hieroglífico que designa a água está presente nos Dogons
e p o s s u i o me s mo s e nti d o e o me s mo s i mb o l i s mo . N ã o e s qu e ça mo s
aágua
qu i qu e A mma
[título da ,grande
o d e u sobra
s u p rde e moMareei
d o s DGriaule)
o g o ns , r eep rpossui
e s e nta igualmente
o deus da
o mesmo avatar que o deus Amon dos Egípcios, a saber, o carneiro.
Porém, este não é o aspecto que mais nos interessa de momento.
Aquilo qu e no s in ter ess a aqui é a qu estã o de sa be r se o grup o ^ é
unicamente determinante, tal como consideram os egiptólogos ociden-
ta i s , o u s e e r a p o r v e z e s llii d o . O n o m e hi e r o g l í f i co d a ci d a d e p a l e s -
tiniana de Yenoam® já mostra que, neste caso preciso, o grupo era de
facto lido. A de sign açã o do leite em pulaar, kosam, deixa sup or qu e nas
duas grafias egípcias correspondentes o grupo era lido.
A ter ce ira grafi
grafiaa que rep res en ta um plural e que co rre sp on de ao ful fulaa
kose/kocce (plural) rem ete -n os para a hip óte se de que caso ten ha sido
o plural a ser visad o pelo escriba, o gru po ~ po de ria ser um sim ples
d e te r mi na nte , o u me s mo d e s a p a r e ce r e m p r o v e i to d a s ma r ca s d o p l u -
ral. No cas o da segu nd a graf grafia,
ia, o grup o ~ , ao m es m o tem po que era
lido, serviria igualmente de determinante. Segundo o nosso conheci-
mento, tal eventualidade não foi prevista pelos especialistas da escrita
egípcia.
l oo:: , Babaca r Mba ye Diop e Doud ou Dieng A Con sciên cia Histórica Afric ana
3.3. A agricultura
A agricultura con siste num a acti
actividade
vidade extr em am ent e imp ortan te
nas sociedades humanas, sobretudo antes da revolução industrial.
A ocupação do espaço agrário e a sua gestão representavam grandes
desafios para estas sociedades. Segundo as tabelas, ao que parece, os
9.
10.Ver Luft, U.,que
É aquilo in Stud
Studii a A egypti
demonstra a, XIV, pp. 4de
umaaca,
acintervenção 0 6 Cissé Y
-4 0 7 . Y.. T.
Cissé T. in^lcte s du colloqu
colloquee de B amako. H i stoi re
et tradition orale, fundação SCOA, 1975, p. 34.
l oo:: , Babacar Mb aye Diop e Dou dou Dieng A Con sciên cia Histó rica Afric ana
E g i p to anti g o e Áf r i ca negra: la ç õ e s . A.
n egra:a l g u n s f a c t o r e s n o v o s q u e e s c l a r e c e m a s s u a s r e la Moussa
Moussa Lam 143
Conclusão
Os pouco s factos
f actos aqui apr esen tado s dem ons tram que não é de mo do
algum necessário lançar-se numa argumentação complexa para de-
sempatar os protagonistas do debate em torno das relações egipto-
-africanas. No plano estritamente científico, as tradições africanas,
pela sua relação decisiva, permitem actualmente encerrar o debate e
classificar melhor a civilização egípcia; porém, não somos ingênuos ao
"Afrocentricidade":
polêmica em torno de um conceito
Doudou D i eng^
id a d e : p o l ê m i c a e m t o r n o d e u m c o n c e i t o .
A f r o c e n t r i c id Doudou Dieng
Dieng 159
Por últi
último
mo , a fil
filosofia
osofia africana mo de rna e co nte m po rân ea enc arn ada ,
nomeadamente, por várias correntes de pensamento; mas, nesta breve
chamada de atenção que nos propusemos elaborar, e no que concerne
ao nosso tema de reflexão acerca da afrocentricidade, é importante ter
em conta as fontes, se não mesmo a tradição do pensamento africano,
ou seja, da filosofia egípcia faraônica a partir dos seus próprios textos.
Para além dos textos, o autor da filosofia faraônica apresenta uma ini-
ciativa original no sentido em que nos encontramos doravante perante
uma filosofia não-conformista à lógica de Aristóteles ou de Heidegger
que, note-se, tinha deixado de afirmar que a filosofia é grega pelo facto
de falar grego.
Com Obenga, encontramo-nos face às fontes de uma filosofia rela-
tiva ao período faraônico que mostra de que modo os antigos Egípcios
eram
constaorganizados
na cosmogonia na sua
commaneira
que nosdedeparamos
pensar. A de referência
seguida conceptual
um pouco
por toda a parte em África, nomeadamente nos luba do Zaire, e que
demonstra de que modo é que o ser veio à vida a partir do nome
inicial, o nun. É este o motivo pelo qual Hegba refere que quando se
fala de filosofia, é necessário ter em conta toda a história da filosofia
africana, desde que esta história não tenha início com o filósofo afri-
cano Guillaume Amo, e menos ainda com a filosofia bantu de Tempels
e tod
tod o o de ba te qu e se seguiu. É ne ces sár io, d e igual m odo , ir pa ra a lém
do milagre grego, do qual Hegel, entre outros, se tornou o porta-voz
recorrendo, tal como
ção da história, Deveafirma claramente
recuar-se até ao Cheikh
período Anta Diop, àbem
faraônico, falsifica-
como
ao conjunto dos egiptólogos de boa fé que nos ajudam a decifrar a lin-
guagem metódica dos hieróglifos. É por isso que tudo aquilo que foi
escrito neste sentido acerca da filosofia africana deve ser tomado em
consideração. Um pensamento africano através dos textos, aqui está a
única base da nossa investigação filosófica. Seria intelectual e moral-
mente d es ones to ig norá-los refug iand o-s e no pens amento mod erno,
álibi de gentes complexadas que reproduzem, à sua maneira, o ma-
niqueísmo levy-bruhliano do pensamento pré-lógico e do pensamento
lógico. Isto não faz sentido. Porque tal como refere Cheikh Anta Diop,
no capítulo 7 de N ations nègres et culture, os Etío pes em prim eiro lugar
lugar,,
os Egípcios depois, segundo o testemunho de vários anciãos, criaram
e elevaram a um grau extraordinário de desenvolvimento todos os
elem ento s da ci
civil
viliza
ização,
ção, enqu anto que os outros povos estavam
est avam m er-
gulhados na barbárie.
l oo:: , Babaca r Mba ye Diop e Doud ou Dieng A Con sciên cia Histórica Afric ana
A f r o c e n t r i c i d a d e : p o l ê m i c a e m t o r n o d e u m c o n c e i t o . Doudou Dieng
Dieng 161
anecessária parauirrecon
poder constr
construir reconcili
um ciliar
ar asde civil
corpo civilizações
ciê izaçõeshum
ciências
ncias africanas
humanas com a história,
anas modernas, de m odoa
para renovar
cultura africana.
africana. Long
Longee de se tratar de um a deleit
deleitação
ação do passado, um olhar
em direcção ao Egipto antigo representa a melhor ma maneira
neira de conceber e de
construir o nosso futuro cultural (p. 12).
Segundo o Pr. Cheikh Anta Diop, reconstituir a nossa relação com o
passado é justamente simplificar esta relação, isto é, deixar-nos con-
vencer de uma vez por todas que a África não foi apenas este conti-
nente sem "história" que só terá sido capaz de se integrar na história
universal a reboque de terceiros. Este é o sentido do desafio da consciên-
cia histórica que coloca a problemática da formulação do nosso tema
acerca da afrocentricidade.
lo :,:, Babaca r Mba ye Diop e Doudo u Dieng A Con sciên cia Histórica Africa na
lógica da continuidade
empírica de Cheikh
de algumas destas tesesAnta
maisDiop, de estabelecer
preciosas a verdade
que valorizam as
experiências científicas e tecnológicas africanas. Para lá de qualquer
polémica proveniente tanto dos intelectuais africanos "de serviço",
quanto dos Africanistas eurocentristas do ocidente, trata-se de apre-
sentar a história africana tal como ela sempre foi, ou seja, de modo
positivo, científico e objectivo.
O objectivo consiste em pôr termo àquilo que o Pr Mamoussé Diagne
chama "a esteira dos outros" para construir um corpus escolar africa-
no no qual o Egipto antigo, devido àquilo que produziu durante vários
m ilénios , ser ia o po nto de re fer ên cia cultural, e já nã o a Gré cia antiga.
Trata-se de lutar contra o esqu ecime nto, porq ue
A f r o c e n t r i c i d a d e : p o l ê m i c a e m t o r n o d e u m c o n c e i t o . Doudou Dieng
Doudou Dieng 163
A his tór ia da África já não se situa, po rtan to, ao nível das tribo s; esta
é con tinental. Tem os qu ase von tade de dizer que, finalme nte, a histór ia
do pe ns am en to african o é um a histór ia lógica dos neg ros africano s qu e
deve ser apreend ida à escala mundial na m odern idade conceptual.
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déee d'une phi
phi losophie nénégrgr o-afri caine.
caine. Y a o u n d é : Éd i t i o n s C L E.
T o w a , M . ( 1 9 7 1 ) . E ssai sur la problé
problémati
mati que phi losophi que dans l'A fr i que actue
actuelle.
lle.
Y a o u n d é : Éd i t i o n s C L E.
lo ::,, Babacar Mbaye Diop e Doud ou Dieng A Con sciên cia Histórica Africa na
III.
o contributo
da comunidade negra e do
Egipto para a civilização
... D urante mu
muito
ito tempo
tempo,, inúm
inúmeros
eros com
compatriotas
patriotas acreditaram poder fazer
a economia de um conheci
conhecimento
mento aprofundado da soci sociedade
edade afri
africana
cana e da
África sob todos os seus aspectos: passado, línguas, etnias, potencial energé-
tico, m atérias primas, etc. Para além disso, as conclusões às quais se chega são
frequentemente
fre quentemente de um umaa banali
banalidade
dade lamentável
lamentável,, quando as mesm as não estão
pura e simplesm
simplesmente
ente erradas.^
Introdução
i ntro duç ão da sua obr a Les fondements
Na citação p révia, retirad a da intro
économ iques et culturels d'un état fédéral d'Afrique noire, é corn conhe-
cimento de causa que Cheikh Anta Diop nos convida a aprofundar o
nosso conhecimento das sociedades africanas sob todos os seus as-
pectos, a fim de alcançar conclusões justas e pertinentes. Com efeito,
qualquer pessoa imprudente, pode ser desfavoravelmente atraiçoada
acerca destes temas, em particular no que concerne as ciências e téc-
nicas na África Negra.
A este resp eito, na introdu ção do seu artigo "L'observa tion de l'étoile
Sirius pa r les Dogons", pu blicad o nos 1 0 / 1 1 da rev ista Ankh,
o astrofísico Jean-marc Bonnet-Bidaud do serviço de astrofísica do
comissariado para a energia atómica (CEA] de Saclay chama a nossa
atenção nos seguintes termos:
*. Doutor em ciências.
1. Diop, Clieilíh Anta, L es fondeme
fondements
nts économi ques
ques et cultur els d'un état fédé
fédér al d'A fr i que noi r e;
Paris,
Pari s, Prése nce A fr
fricai
icaine,
ne, 1 97 4, p. 5.
2. Missão
tuída "Étude du Bonnet-Bidaud,
por Jean-Marc système de pensée et des connaissances
os etnólogos astronomiques
Germaine Dieterlen e Jean des Dogons"
Rouch, consti-
o realizador
Jérôme Blumberg, os informadores dogons Diamguno Dolo, Anagali Dolo, Pangalé Dolo e Ibrahim
Guindo.
l oo:: , Babaca r Mba ye Diop e Doud ou Dieng A Con sciên cia Histórica African a
Mengès,
4. Paris, 1990,
Henshilwood, C. S. ep.t ai,
304.Journal
Journal of A rchaeologi
rchaeologi cal Sci ence, nce, 2001, 28, 421.
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71, 1 9 8 7 ,
n.°M58, 294.
6. De Heinzelin, J., Scientific American, 1 9 6 2 , 2 0 6 , 1 0 5 .
1. A Áfr
Áfrii ca,
ca , b erço da hu m anid ade
Em primeiro lugar, a África é particular neste planeta, pelo facto de
ser o contin ente de ori
origem
gem do hom em . Encon tram os al
alii todas as espé-
cies humanas que a terra pôde produzir. Desde as espécies mais anti-
gas que ousam os apena s cham ar de hum anas, às espéc ies hom inídeas,
em particular Toumai, encontrado no Tchade e datado de seis a sete
milhões de anos^.
A descoberta de Toumai é da maior importância para a paleontolo-
gia humana, tendo em conta que com este crâneo fóssil, começamos a
aproximar-nos do antepassado comum aos grandes macacos. Desde
estas espécies antigas até aos homens de hoje, é possível seguir, sem
interrupção, a evolução do homem e dos seus antepassados em África
e em mais nenhum outro lado no mundo. Fala-se no homem, no gênero
homo, quando se pode associar umas destas espécies ao fabrico das
ferramentas. Isto quer dizer que nos apercebemos perfeitamente que
a inteligên
i nteligên cia é funcional. O prim eiro h om em , hom
homoo habilis, nasce u em
África. O primeiro homem a sair de África, é o homo erect erectus,
us, há cerca
de um milhão e quinhentos mil anos. É necessário saber que durante
7. Cf. Michel Brunei, Franck Guy, David Pilbeam, Hassane Taisso Mackaye, Andossa Likius, Djim-
doumalbaye Ahounta etal, ( 2 0 0 2 } , N ature ature,, 418, pp. 145-151. Patrick Vignaud, Philippe Duringer,
Hassane Taisso Mackaye, Andossa Likius et al, ( 2 0 0 2 } , Nature, 418, pp. 152-155. Link para a
fotograf
fot ografia ia do crâneo de Toumai (Bernard W ood, 20 02 , Nature 4 1 8 , p p . 1 3 3 - 1 3 5 } .
h t t p :/: / / w w w . n a t u r e . c o m / n a t u r e //jj o u r n a l / v 4 1 8 //nn 6 8 9 4 / f i g _ ttaa b / 4 1 8 1 3 3 a _ F l . h ttm
m l ..
lo :,:, Babaca r Mba ye Diop e Doud ou Dieng A Con sciên cia Histórica Afric ana
de
do cor
que está baseada Deste
em África. no facto de oainda
modo, dia ser
quemenos luminoso através
a pigmentação na Europada
me lanina rep resen te um a prote cção efi
eficaz
caz em
e m Áf
Áfri
rica,
ca, contra o pod ero-
so fluxo dos raios ultravioletas, a despigmentação será sobretudo fa-
vorável na Europa para facilitar a síntese da vitamina D necessária ao
desenvolvim ento das cricrianças
anças (a vitamina D de sem pen ha um a função
essencial na regulamentação do metabolismo do cálcio e do fósforo;
aquela é derivada do colesterol sob a acção da luz solar. Com efeito,
sabemos que as crianças africanas nascidas na Europa têm por vezes
problemas de raquitismo (falta de calcificação ao nível das zonas de
crescimento dos ossos e que provoca malformações ósseas] quando
8. Cf.
Cf. Ian McDougall
McDougall,, F ranc is H. Bro wn e John John G. Fleagl
Fleagle,
e, Strat
Stratigraphic
igraphic placem ent and age of m ode rn
humans from Kibish, Ethiopia, 2005, N ature ature 433, pp. 733-736.
h t t p : / / m a . p r e h i s t o i r e . f r e e . f r / o m o _ l . h t m . .
2. A África,
África, b er ço da es crit a
Acerca destes assuntos, tal como de tantos outros, os manuais esco-
lares estão frequ ente m ente m uito
uit o atrasad os em relação aos resultados
já alcançados pelos investigadores. Deste modo, a escrita nasceu de
facto em África^. Trata-se de uma invenção africana do neolítico. Desde
a publicação dos resultados das escavações levadas a cabo em Abidos,
no túmulo do rei Escorpião, por Günter Dreyer e pela sua equipa^", sa-
bemos agora que há aproximadamente seis mil e quatrocentos anos a
escrita hieroglífica já estava constituída e era utilizada pelos Egípcios
com as mesmas regras e os mesmos valores de ideograma, de fono-
gram a ou de determinativo que conh ecem os ho je. Ora,Or a, os docu m entos
mesopotâmicos mais antigos que remontam a menos de cinco mil e
quatrocentos mil anos, e que são frequentemente exibidos enquanto
prova da origem da escrita, são apenas extractos numéricos, ou seja,
meras anotações de números.
9. Cf.
Cf. T. Obenga, ""Afr
Afric
ica,
a, the crad dle o f writing, 19 99 -2 00 0 ,4 fi /i/ i, n.o^ 8 / 9 , pp. 8 6 -9 5 .
10. Dreyer, Günter, "Recent Discoveries at Abydos Cemetery U", in Edwin C. M. van den Brinlc (edi-
tor], The Nile Delta in Transition: 4th-3rd miilenium B.C., The Israel Exploration Society, tel Aviv,
1992, pp. 293-299.
http://wviiw.dainst.org/index_51_en.html.
l oo:: , Babacar Mba ye Diop e Dou dou Dieng A Con sciên cia Histórica Africa na
es ta orig em no
estritamente afric ana d eve-s
terreno e também
científico. ao fac to
Com efeito, d e permanec
afirmar ermos
que os gregos
inventaram as ciências constitui uma asserção que é na realidade falsa
já que obriga à invocação de um "milagre grego". Mas, se no lugar da
Grécia falarmos da África, não existe de todo a necessidade de invocar
qualquer milagre, tendo em conta que a longa duração da pré-história
ã proto-história permite então uma progressão lenta e gradual.
Assim, durante um tempo tão prolongado, o Africano teve tempo para
encontrar ou realizar coisas favoráveis à melhoria das suas condições
de existência. Na Europa, o tempo que separa a pré-história da proto-
-história é omuito
postula-se maisgrego.
milagre reduzido. Portanto,
No entanto, esteface
nãoa é esta falta de
um dado tempo,
científico.
Os gregos, por exemplo, não inventaram a sua escrita. Esta foi-lhes
trazida completamente elaborada pelos fenícios, cananeus da Bíblia e
cortesãos dos antigos Egípcios.
Os nomes de letras gergas, alpha, beta e gamma são apenas reminis-
cências respectivamente de aleph, beth e gimmel da escrita fenícia. Em
con trapar tida, a escr ita dos antigo s Egípcios é um a iinven
nven ção au tócto ne
e autónoma e, enquanto tal, possui uma longa história. Deste modo,
entre a invenção dos hieróglifos e a do hierático [hieróglifos simplifi-
cados utilizados para os textos matemáticos em papiro], decorreram
cerca de mil anos. Do mesmo modo, decorreram aproximadamente
outros mil anos entre a invenção do hierático e a do demótico [escrita
cursiva].
3. A Á frica
fr ica inven ta o zer o
Outra das verdades a restabelecer diz respeito ao zero [a palavra
francesa
do árabe deriva
sifr quedosignifica
italiano "o
dovazio"].
século XV, zefiro, napoescola
Aprendi r seu turn o derivado
derique
francesa vadoo
zero (valor e número] consiste numa invenção indiana introduzida na
Europa via Espanha pelos Árabes, por volta do século oitavo da nossa
era; os outros povos não conheciam o número zero. Esta invenção
devia ostentar a marca do gênio, tendo em conta que se trata de uma
doTodavia, se perguntarmos
zero {shunya em sâns crito,aossignifi
índios a quando
significando
cando nya "oremonta
vazio"), aa invenção
data não
irá para além do quinto século antes da nossa era. Com efeito, o zero
é uma invenção africana conhecida no Egipto antigo sob a designa-
ção de neferou (literalm en te "a bele za" ou ainda "a au sên cia de al algum
gum a
coisa") desde, pelo menos, o segundo milénio antes da nossa era. Não
somente os antigos Egípcios possuíam um símbolo para o zero, tal
como surge claramente no papiro Boulaq a propósito de contas de um
templo", mas também conheciam o zero sob todas as formas da sua
utilização para além do uso do símbolo (o hieróglifo néfèr, o m e s m o
que surge nos nomes Néfèrtari ou Néfèrtiti) para anotá-lo". Em arqui-
tectura, orientavam-se através de inscrições com o nível zero (èm tèp
èn néféroú), o nível acim a do zero {hèr néférou) e o nível aba ixo (khèr
néféroú).
Num levantamento do muro da pirâmide de Menkauré antigo Im-
pério, 2 6 0 0 antes da era cristã) apre senta do por G.G. Reisn er em 1 9 3 1 " ,
lê-se o quinto e o sexto nível abaixo do zero, respectivamente cinco
côvados reais abaixo de zero [méhé sérésou khèr néférou).
Sendo o côvado real [méhé) a un idad e de m edida , as m ed ida s
prec ed entes têm por valores res pec tivos menos 5 (ou s eja, -5 em
ano tação s imb ólica) e m eno s sei
seiss (ou seja, -6, em ano tação simbó lica).
O zero, pen sad o de sta form
f orm a com o nínível
vel de referên cia, dá d irecta m ent e
acesso ao cálculo algé brico com os nú m ero s positivos e nega tivos. Por
conseguinte, mesmo a invenção dos números relativos é atribuível
aos antigos Egípcios. Com efeito, quando se atribui uma determinada
quantidade acima de zero, esta corresponde àquilo que se designa de
11. Lumpkin, B.B.,, "Mathem atics U sed iinn Egyptian Co nstruction and Bookkeeping", iinn The M athemati-
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vard University Press, 1931, pp. 76-77. Lumpkin, B., "Mathematics Used in Egyptian Construction
and Bookkeeping", in The M athematical
athematical I ntelli
ntelli genc
genceer, vol
vol.. 24, nn®
® 2, 20 02 , 20 -2 5. Be atrice Lumpkin,
and African-American Contributions to Mathematics,
Mathematics, http://wvvwi.pps.kl2.or.us./depts-c/mc-me/
be-af-ma-pdf.
lo :,:, Babaca r Mba ye Diop e Doudo u Dieng A Con sciên cia Histórica Afric ana
valor absoluto nas aulas de m atem áticas elem entare s, enqu anto que
simbolicamente, se substitui as expressões "acima de zero" e "abaixo
de zero" respectivamente pelo sinal mais [anotado +) e pelo sinal me-
nos [ano tado Do po nto de vista pedag ógico, tend o em con ta este s
dados históricos, somos levados a reavaliar os métodos de modo a fa-
cilitar
cili tar o ensin o das m atem ática s às crianças. De facto,
facto, po dem os pe ns ar
que todos os primeiros trabalhos que o homem fez são baseados em
métodos cuja explicação é a mais simples. Assim, a melhor forma que
encontrei para explicar a uma criança de cinco anos como resolver,
por ex empl
emplo,
o, a operaç ão + 2 - 3 c ons is te em d iizer-
zer-lhe
lhe que,
que , partind
parti nd o
do rés-de-chã o, subi dois and ares e voltei a de sce r três. A crianç a com -
preende este modo de formulação à egípcia e pode mesmo concluir
que me encontro no primeiro subsolo. A partir daqui, a resposta em
anotação algébrica que é, portanto, -1, pode ser clara e simplesmente
explicada à criança de cinco anos sem abstracção inútil a este nível,
para um primeiro contacto com a álgebra.
4. A m ultiplicação e a divi
divisão
são egípcias
A multiplicação e a divisão egípcias são fundadas na duplicação e
na adição. Neste sentido, o calculador pode fazer a economia do conhe-
cim ento das tabu ada s de m ultiplicação. O m étod o po sto em p rática
bas eia-se num te ore m a simp les ddee dem onstrar. D Dee um a man eira geral
geral,,
as matemátic as eg í pc ias não s ão empí ric as , c ontrariamente ao que
alguns gostam de afirmar - quer sejam egiptólogos que não possuem
uma formação sólida em matemática, quer sejam matemáticos que
não sabem ler os hieróglifos ou o hierático.
A quan do re m on ta a utili
utilização
zação de stas du plicaçõe s? O estud o do osso
de Ish an g o " ap resen ta um a resp osta clara a esta questão. O local de
Ishango, próx imo das fontes mais merid iona is do Ni Nill o, en con tra- se nas
margens do rio Semliki, a cerca de quinze quilômetros a sul do equa-
dor. Para além disso, está provado que a população de pescadores do
alto Vale do Nilo é originária da região dos grandes lagos africanos^^
Trata-se de uma confirmação de Heródoto de Halicarnasso, quando
este indica queautóctone]
da população os Egípcios são apen(aasEtiópia
de Etíopes um a colônia (isto gregos
dos antigos é, um a designa
fra cção
o Sudão actual] que Osíris dirigiu para o Egipto, seguindo o curso do
Nilo. Ademais, facto notável que não se deve, certamente, ao acaso,
tendo em conta aquilo que foi dito anteriormente, o número "1" forma
a ponta de um harpão e o hieróglifo do harpão, intervém na escrita de
"um" em egípcio antigo. Por último, a decifração do osso de Ishango
m os tra que a Áfric
Áfricaa está na origem da invençã o das arte s m atem ática s.
Esta hera nça do pass ado an tigo da Áfric
Áfricaa equatorial n o Egipto,
Egipto, A ristó tele s
vem confirmá-lo
enquanto quando
berço das refere "também o Egipto foi considerado
artes matemáticas".
l oo:: , Babacar Mb aye Diop e Dou dou Dieng A Con sciên cia Histó rica Africa na
21. Sertima, Ivan Van (editor), Blacks in Science ancient and modem; Transaction Boolis, New
Brunswick e Londres, 1991. Antoine, Yves, I nvente
nventeurs
urs et savants
savants noi rs; L'Harmattan, Paris, 2004.
22. Zaslavsky, Claudia, U A fr i que compte'
compte' N ombres,
ombres, formes et dé
démarches
marches danas la culture afri caine;
Éditions du hoix, Argenteuil, 1995, cap. 12, pp. 137-151 e cap. 25, pp. 273-279.
lo ::,, Babaca r Mba ye Diop e Doud ou Dieng A Con sciên cia Histórica Afric ana
l o:
o: , Baba car Mba ye Diop e Dou dou Dieng A Con sciên cia Histórica Africa na
6. A pêndice:
pên dice: A m ultiplicação e a divisão
divisão egípcias
A duplicação está na base da multiplicação e da divisão egípcias. Ora,
tal como observámos anteriormente, o atestado mais antigo do uso
da duplicação para as necessidades do cálculo remonta à prática das
matemáticas revelada pelos ossos de Ishango.
45. http://chora.virtualave.net/lema4.htm,
http://chora.virtualave.net/lema4.htm,
http://www.akilul
http: //www.akilulemm
emm a.com/11632.
a.com/11632.html?*sessi
html?*session*id*key*=session*i
on*id*key*=session*id*val*
d*val*
o Smultiplicador
e co ns i d e r a r me oms eof emultiplicando,
ctu a r o p r o d u to P = m. M , e m qu e M r e p r e s e nta
a) Decompõe-se o multiplicando seguindo as suas potências de 2, ou
seja:
l oo:: , Baba car Mba ye Diop e Doud ou Dieng A Con sciên cia Histórica African a
C h ei k h M octa
tarr B â'
Introdução
o ho m em sem pre colocou a qu estão de sab er qual a origem da cicivi
vill i-
zação e de que mo do se f oi pro gressiv am ente diferenciando dos o utros
seres.
marcada Partindo da idéi
idéiaa quedaexiste
pelo predomínio um a fase
f asepropomo-nos
divindade, cosm ogó nicaaqui
da existência
verificar
de que modo ê que os Dogons conseguem justificar a origem da civili-
zação a través da ttragédia.
ragédia. A análise da cosm ogo nia Dogon revela a pre-
sença do trágico no seio da divindade. Deste modo, trata-se de partir de
um a abord agem da situação cosm ogón ica, na qual a revolta de d e Og
Ogoo teve
lugar,
ugar, a fi
fimm d e analisa r o sen tido trágico da idéia de "roub o" e ac ab ar po r
con ceb er a justifi
justificação
cação da em ergê ncia trág ica da civi
civili
lização.
zação.
1. 0 que jjustifi
ustifica
ca a revo lta ddee Ogo
Ogo??
Durante o desenvolvimento do processo cosmogónico Dogon, trata-se
da criação dos "antepassados Nommo" por Amma, bem como da atri-
buição de uma tarefa a cada um deles que coincidem com a expressão
do trágico como ruptura ou rebelião divina. O Deus criador Amma
criou quatro gêmeos: o "Nommo die" (Grande Nommo com assento
junto de Amma), o "Nommo Titiyane" (segundo Nommo mensageiro ou
adjunto do primeiro, guardião dos seus princípios espirituais e execu-
tor das suas obras), o "Nommo" (Nommo do lago que descerá ã terra
em conseqüência do sacrifício de que foi vítima), e o "Nommo ana-
gonno ou Ogo" (quarto Nommo).
1. Doutor em filosof
filosofia,
ia, Universidade de Rennes 1, UPRES 12 70 , Filo
Filosofia
sofia das Norm as.
C o n t r i b u t o d a s c o s m o g o n i a s d o g o n p a r a p r o b l e m á t i c a d a o r i g e m d a c i v i llii z a ç ã o . Ci
Ci^^eikh Moctar Bà 185
criação
diatamenteda sua
s toda
ua gêm ea, Og
a obra Ogo
deo revolta-se
Amma; daícoontra o cri
adventocriado
ado
do rtrágico
e pe rtuenquanto
rba ime-
ruptura e separação, querela no seio da divindade.
Ogo revolta-se contra Amma. A sua angústia e a sua ansiedade
fazem com que não possa esperar a duração de "60 períodos" previs-
tos por Amma para a criação dos gêmeos dos dos nomm o anagonno.
anagonno. Por
conseguinte, salientam Griaule e Dieterlen, "considerando-se priva-
do, este "irritava" Amma mostrando-se irrequieto"^. Todavia, Amma,
tem como que um pressentimento desta situação de rev olta que pre-
tende evitar e procura reconfortar Ogo dizendo-lhe "que receberia a
sua gêmea no momento do seu nascimento, da sua retirada do seio"l
Poré m , isto não é rec eb ido d e m od o favor
favorável,
ável, po rqu e ""Ogo
Ogo não acre di-
tara nele", exigindo a sua gêmea imediatamente. A revolta tornou-se
então inevitável na medida em que "Ogo começou a procurar, sem
esperar pelas realizações de Amma""*. Entrega-se a actos que pertur-
bam A m m a e m edita no sentido
s entido de en con trar aquilo que lhe fal falta
ta,, bem
como satisfazer o ciúme perante os seus irmãos. É deste modo que
Ogo tenta surpreender Amma na sua busca, procurando apoderar-se
da sua obra. Segundo os co-autores de de Renard Pâle,
Pâle, "insatisfeito, Ogo,
transtornando todas as regras, actuou com a intenção de surpreender
os segredos do universo em formação"^. A atitude de Ogo representa
um acto de desordem cosmogónica. Este abala a gestação da ordem
do mundo desviando-se para outro caminho, distinto daquele que era
previsto por Am ma, relativam
rel ativam ente às saídas das suas criaturas Nom mo.
Em busca da sua gêmea,
conseguiu apanhar com a sua boca; depois, fugiu seguindo a linha de sangue
do sacrifício."^
C o n t r i b u t o d a s c o s m o g o n i a s d o g o n p a rraa a p r o b l e m á t i c a d a o r i g e m d a c i v i llii z a ç ã o . Ci
Ci^^eikh Moctar Bà 187
a sua
s ua afl
aflição.
ição. Tend o com eça do po r pro cu rar o segred o da criação , te n-
tativ a esta que Amma contorna alterando a posição dos elementos,
aquele acaba por arrancar uma parte da placenta que Amma trans-
forma em sol. A atitude de Ogo não fica impune na continuação do
processo cosmogónico. Assim, em resultado do roubo de Ogo, Amma
introduz a a mortalidade
mortalidade com o con seq üê ncia do acto trágico. Griaul
Gri aulee e
Dieterlen sublinham que
que este
téria último nasce.
de placenta O Deus
do nommo Amma criouAoo pôr
ressuscitado. homem a partir
termo da ma-
à androginia
inicial, este acto consagra a separação definitiva entre os sexos mascu-
lino
lino e feminino. Este novo m om ento é aqu ele que acom pan ha a descida
dos seres criados p or Am ma à terra. Tendo este último
últi mo tran sform ado o
resto da placenta em sol escaldante, Ogo, impossibilitado de se aproxi-
m ar dele, decide m ais uma vez en gan ar Am ma. Porém , o seu acto é ime-
diatamente punido pelo nommo titiyane que, avisado pela sua gêmea,
procede à sua circuncisão arrancando-lhe o prepúcio. Uma conseqüên-
cia fundamental do roubo e da circuncisão, enquanto punição, consiste
em ter permitido a descida definitiva dos seres à terra. Assim, termina
o momento da existência nos céus ou a existência divina marcada pela
terceira e última descida de Ogo. Este, fixando-se definitivamente na
terra, acaba com os seus périplos celestes e transforma-se em Raposa.
O roub o repre senta, portanto, o estádio
est ádio últ
último
imo de um proces so ao m es-
mo temp o que a condição do advento de outro m om ento .
l o:
o: , Babacar Mb aye Diop e Doud ou Dieng A Con sciên cia Histó rica Afr ican a
C o n t r i b u t o d a s c o s m o g o n i a s d o g o n p a r a a p r o b l e m á t i c a d a o r i g e m d a c i v i llii z a ç ã o . Ci
Ci^^ei
eikh
kh Moctar Bà 189
3. A Civ
Civii l i za
zaçã
çãoo co m o co nse qu ên cia do "trágico"
C on tr a r i a me n te a u ma te se de f e n di da por R oge r Ba sti de e m m Le sacré
sauvage, qu e co ns iste em fazer da civilização
sauvage, civil ização um dom nos Africanos Africanos
n e ste s te r mos; "a ci v i l i z a çã o n ã o é , por ta n to, con si de r a da pe l os oci -
dentais tal como ela é, por exemplo, pelos Africanos, como um dom dos
de u se s, ma s, pe l o con tr á r i o, como a con qu i sta dos h ome n s e n qu a n to
revoltados contra os deuses"", consideramos que esta é fruto de todo
u m pr oce sso ma r ca do por u ma sé r i e de di a l é cti ca s e de oposi çõe s
c o m p l e m e n t a r e s . A s s iim
m, trata-se de um a constante das cosm ogo nias o
facto de a civilização ser resultado de uma luta ou de uma rebelião no
se i o da di v i n da de e n ca r n a da , por e xe mpl o, n a cosmogon i a gr e ga por
P r om e te u , e n a D ogon po r Og Ogo,
o, e m a i s pr e c i sa m e n te o Fe r r e i r o M ít ítii co
qu e , r ou b a n d o o f ogo, to r n a o a cto de f in i n i ttii v o. E n e s te e n qu a d r a m e n to
preciso, damo-nos conta de que não existe, de todo, a mão de um deus
e ste n d i da a os h om e n s pa r a l h e s da r a ci v ili l iz
i z a çã o. É ta m b é m , se gu n do
n os pa r e ce , a l go te n de n ci oso a pr e e n de r a r e l a çã o do Af r i ca n o com a
divin dad e de m od o relig io sa m en te ex exíígu
guoo ^®
^®.. O ad ven to da civilização
e f e ctu a - se n o â mb i to de u m a a cti v i da de do h o m e m e n ã o de v i do a u m a
of e r ta di v i n a . P or con se gu i n te , tr a ta - se de soci e da de s qu e n ã o pode m
se r con si de r a da s como "a r ca i ca s" se ti v e r mos e m con ta a ch a ma da de
atenção de Jean Cazeneuve relativa ao uso desta palavra. Este, ao pro-
curar outro critério que não a escrita - ou mais funcional do que esta
- na distinção das ccivi ivili
lizações
zações históricas, pro põ e um regres so ao "sen tido
l o:
o: , Babaca r Mb aye Diop e Dou dou Dieng A Co nsc iênc ia Histó rica Africa na
...... poderíamos
poderíam os então definir as sociedades arcaicas como aquelas que não es-
tão integradas na história de mod modoo prom
prometeico,
eteico, para retomar uma
um a expressão
d e M. Gurvitch,
Gu rvitch, isto é, aquelas que não possuem a "consciência de intervenção
activa e eficaz da liberdade hum ana"^"ana"^ "
C o n t r i b u t o d a s c o s m o g o n i a s d o g o n p a rraa a p r o b l e m á t i c a d a o r i g e m d a c i v i llii z a ç ã o . Ci
Ci^
^eikh Moctar Bà 191
Thibaut afirma mais adiante que "é evidente, aliás, que o maior mito
do fogo diz respeito a um ladrão de fogo da natureza dos deuses, um
Titã, isto é, um ser imortal que só se apodera dele para oferecê-lo aos
homens que dele necessitam para viver".
Relem brem os que o hom em, não detendo qua lquer pri pr i vil
vi l égi
égioo sob re os
outros seres, neste momento da cosmogonia, não pode senão regozi-
jar-se. Isto porque, sem que outro ser tivesse tido o desejo de trans-
gredir a ordem divina, submetendo-se a qualquer tipo de punição, o
homem não poderia usufruir de meios que lhe permitissem aceder
àquilo que, outrora, fazia parte do privilégio dos deuses. A possessão
do fo
fogo
go efectua-se se m pre num sacrilégio ou o u num a act
actividade
ividade heróica.
O ladrão de fofogo
go só pode per ten cer à raça dos deuse s que poss uem
o privilégio de se aproximarem dele. Neste sentido, será necessário
referir que são os deuses que se "traem" a si próprios pela honra e pelo
interesse dos homens?
Os maiores mitos do fogo dizem respeito a um ladrão que possuiu,
ele próprio, o estatuto de imortal, mas que inaugura a imortalidade
enq ua nto co nse qü ên cia do seu act
acto,
o, e com o sinal
si nal de diferenciação fun fun--
damental do homem e dos deuses. Note-se também que não se trata
de um a tran sgre ssã o pelo orgul
orgulho
ho ou pelo pode r - a inda que à pa rtida
seja o cenário que se apresenta - que consiste na finalidade do acto.
Trata-se, sobretudo, de uma passagem obrigatória, um gesto libertador
que assegura um progresso indispensáv el, bem como uma separação
im inen te dos ho m en s e dos deuses com o intuito
intui to de favorecer a existên-
cia
ci a dos prim eiros na terra; sem este acon tecim ento , a hu m anid ade não
tem origem ten do em con ta que a sep araç ão é ne ces sária para a criação
do mundo dos homens, onde este se torna autônomo e encontra uma
certa consciência existencial inscrita no tempo. Isto não pode suceder
sem incomodar os deuses, que outrora eram únicos numa plenitude
existen cial. Nos Dogon s, oo nomm o titiyane
titiyane ocu pa -se da san ção infli
i nfligida
gida
à figura do trágico. Todavia, as punições aplicadas aos humanos e ao
l o:
o: , Babacar Mb aye Diop e Doud ou Dieng A Co nsciê ncia Histó rica Afri can a
Definitivamente,
formação do mundopodemos afirmar
é constatada nasque a constância
cosmogonias do trágico
Dogons. na
Todavia,
deve salientar-se que o trágico se concretiza com frequência numa
dualidade, mas possuindo simultaneamente a característica de ser o
princípio de separação e de união dos seres. E estas duas funções, o
trágico desempenha-as em função do momento em que surge e das
figuras que utiliza para a sua expressão, de modo a impor-se como
necessário à cosmogonia, quer para pôr termo a um momento, quer
com o intuito de manter um estado de coisas, ou até mesmo para es-
tabelecer uma qualquer ordem divina. Foi deste modo que os Dogons
implementaram uma reflexão acerca da da origem trágica da Civiliza-
ção, respondendo ao mesmo tempo à questão de saber de que modos
ção,
obtivemos este bem por excelência e este sinal de diferenciação do
Homem com os outros seres.
Referências Bibliográficas
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d'eau,
au, E nt r e t iens a v ec O g o t em m êli . Pa r is: F a y a r d .
C o n t r i b u t o d a s c o s m o g o n i a s d o g o n p a r a a p r o b l e m á t i c a d a o r i g e m d a c i v i llii z a ç ã o . Ci^
Ci ^eikh
eikh Moctar Bà 19 3
índia, no Egipto.
No que concerneNenhum erudito
às relações grego
entre defendeu
a Grécia e o oEgipto
contrário.
no plano da
filosofia e das ciências (geometria, astronomia), o papel civilizador do
Vale do Nilo foi preponderante com os Pré-socráticos.
1. Tales de Mileto, o fundador da
da escola jónica,
jónica, estud ou no Egipt
Egipto,o, sob a
direcção d os sacerdotes, o s seus únicos instru tores ao llongo ongo da sua vida;
vida;
2. Sólon de Atenas, o legislador ateniense, foi aluno do velho sacer-
dote Sonquis de Sais;
3. Pitágoras de Samos, o fundador da da escol
escolaa deSamos
deSamos (esc ola Itálica),
Itáli ca),
passou perto de 22 anos no Egipto para prosseguir os seus estudos,
em Mênfis, em Tebas, e sobretudo em Heliópolis junto do sacerdote
egípcio Oinouphis (Enuphis, Ounouphis);
4. Xenófanes de Cólofon, o fundador da da escola da Eleia
Eleia po r volta de
535 antes da nossa era, foi para o Egipto onde apelou aos aos Egípcios
para que não prest asse m cult
cultoo a um a multidão de divi divindades;
ndades; expri-
miu de igual modo a sua surpresa ao ver os os Egípcios
Egípcios ba ter no peito
ao longo das cerimônias religiosas públicas, em particular durante
as festas em honra de Osíris;
5. Anaxágoras de Clazómenas visitou igualmente o Egipto, Egipto, na espe-
rança de aprender Junto deles (dos sacerdotes egípcios) a teologia e
umaa ciência da natureza mais exacta;
um
na obra de Platão .
o E g ip to na Théophle
Théophle Oben
Obengga 19 5
l o:
o: , Baba car Mb aye Diop e Doud ou Dieng A Con sciê ncia Histór ica Afr ican a
2. Laércio, D., Plato
P laton-,
n-, liv. III, 6.
o E g ip to na obra de Platão . Théophle
Théophle Obenga 195
doro de Siracusa
continha inúmerosescreveu,
detalhesacerca da doutrina
biográficos de Platão,
extraídos uma fonte.
da melhor obra que
As
informações que emanam deste discípulo directo de Platão não são,
portanto, posteriores em vários séculos à morte do Mestre, e os his-
toriadores têm razão em considerá-las como informações da melhor
qualidade.
Luciano Canfora escreveu a propósito do testemunho directo de
Hermódoro: "Não existe qualquer motivo para duvidar da informação
deste singular discípulo siracusano de Platão, capaz de divulgar pela
sua própria iniciativa, textos do mestre"^
Este factor capital representado pela viagem de Platão ao Egipto,
para junto dos sacerdotes deste país baseia-se, por conseguinte, em
documentos contemporâneos de Platão, emanando dos seus próprios
discípulos directos, que estabeleceram deste modo a sólida tradição
da jornada de estudo do filósofo grego ao Egipto. Diodoro da Sicilia,
Cícero
Cíc ero,, etc.
etc . , retom am ape nas e sta tradição esta be lecida du rante a vida
de Platão pelos seus discípulos.
No que concerne a Euclides - não se trata, como é evidente, do
m atem ático que vi viveu
veu por volta de 30 0 an tes da no ssa era, m as si
simm de
Euclides de Mégara [450 - 380 antes da nossa era) -, discípulo de
Parménides e de Sócrates, fundador da escola erística [arte da contro-
vérsia) de Mégara, cidade grega, istmo de Corinto, próspero nos sécu-
los Vil e VI antes da nossa era.
Cirene, antiga cidade grega da África do Norte, fundada pelos Dóri-
cos em 630 antes da nossa era, era a capital da Cirenaica [região do
nordeste da Líbia): esta cidade foi, na época da sua prosperidade, até
300 antes da nossa era, um grande centro intelectual e artístico.
artístico. A es-
cola filosófica
filosófica cirenaica
cirenaica foi funda da no século IV
IV an tes da no ssa era por
Aristipo de Cirene, antigo discípulo de Sócrates.
Filolau
Filol au de Croton a [cidad e de Itália,
Itália, res idê nc ia de Pitág oras), céle br e
pitagórico, viveu por volta de 470 antes da nossa era: Platão teve de
3. Canfora, L., H i stoi re de ta ti tté
ttératur
ratur e gr ecque
cque d'H omè
omère
re à A ri stote
stote;; Paris, Éditions Desjonquères,
1994, pp. 552-553; edição original italiana, Roma - Bari, 1986, Col. La Mesure des Choses, dirigida
por Pierre Béhar
l o:
o: , Babaca r Mba ye Diop e Dou dou Dieng A Con sciên cia Histó rica Afric ana
o E g ip to na obra de Platão .
na Théophle
Théophle Obenga 195
que
didesvisitou
(cercao deEgipto
470 -pouco depoisdadenossa
400 antes 449 antes
era], da
de nossa era, de(cerca
Aristófanes Tucí-
de 445 - 386 antes da nossa era] que parodia algumas descrições de
Heródoto acerca do Egipto em Os Pássaros Pássaros ( c o m é d i a r e p r e s e n t a d a
em 414 antes da nossa era], e que forja igualmente em y4s y4s Tesmofo-
riantes a Helena
riantes Helena de Euripides ap rese nta da em 41 2, e cujas aventura s
se situam no Egitpo; podemos também pensar no no Busiris
Busiris de Isôcrates
(436 - 338 antes da nossa era], elaborada por volta de 385 a.C.: nesta
obra, Isôcrates faz o louvor ao Egipto, isto é ao país, "colocado no lugar
l oo:: , Babacar Mba ye Diop e Dou dou Dieng A Con sciên cia Histór ica Africa na
4. Platão, Timée, 21 e.
5. Ver de igual modo Heródoto, II, 94. Por último, Diodoro da Sicília, I, 34: E les les (os E gí pc
pcii os) reco
recor-
r-
rem, para mante
manterr a luz ddas as suas lâmpada
lâmpadas,
s, a um li cor gor duroso extr aí do de uma pplanta
lanta de desi
si gnada
por eles de kiki, em ve
vezz de óleo.
l o:
o: , Babaca r Mba ye Diop e Doud ou Dieng A Con sciên cia Histórica Afr ican a
No Egipto,
memória tudoé, era
humana por escrito em templos
conseguinte, desde
longa na a antigüidade.
margem A
do Nilo sal-
vador E é com razão que Platão considera o Egipto como a reserva
arqueológica de um discurso completo acerca da História universal.
Encontrando-se ao abrigo dos cataclismos que destroem periodica-
mente o gênero humano [o fogo, a água, etc.), o Egipto transformou-se
no berço da civilização, e a escrita é de uso particularmente antigo.
Precisamente, relativamente às "coisas do passado", um sacerdote
bastante idoso de Sais viria a dizer a Sólon, cuja memória histórica
remontav a tão pouco no tempo:
tempo: Sólon, Sólon, vós, Gregos,
Greg os, sois sempre
semp re
crianças (aei, paídés, este); vvelho, Gregoo não o é® o que significa que
elho, um Greg
os Gregos,
Gregos , m antido s joven s na sua alma, não possu em qu alqu er conh e-
cimento encoberto pelo tempo.
Em contrapartida, o Egipto conservou um número considerável de
informações acerca das coisas do passado de todos os povos:
Assim , tudo aquilo que aconteceu, prossegue o velho sacerdote egípcio, quer
convosco (os Greg
Gregos),
os), aqui ou em qualquer outro lugar, que tenhamos tido
conhecimento
conhecim ento por ouvir dizer, se, por uuma
ma ou outra razão, se trata
trata de algu-
ma s coisas belas, grandiosas ou que apresentam qualquer outra diferença,
mas
tudo isto foi, desde a Antigüidade,
An tigüidade, aqui colocado por escrito e conservado nos
templos''.
5. Platão, Timée, 22 b.
7. Platão, I bid., 23 a.
4.2 . O Egipt
Egiptoo é o be rço da esc rita e das ciências
Em Fedra, Sócrates explica precisamente a Fedra que o verdadeiro
(tò aléthês,
aléthês, "a verd ade ") são os Antigos que o con he cem . O verd adeiro
descobre-se questionando as tradições constituídas da antigüidade.
E Sócrates manifesta-se pronto para encontrar qualquer coisa de ver-
dadeiro que ouviu dos antigos
antigos [tõn protérõn).
protérõn). Imp aciente, Fedra pede,
então, a Sócrates que lhe conte aquilo que declara ter ouv ido dos
Antigos: Sócrates:
Bem Ouvi [éJ[éJ<ousa)
<ousa) que, do lado de Náucratis
Náucratis no Egipto, exist
existee uma das
d as an-
tigas divindades daquele lugar, aquela cujo emblema
emb lema sagrado é um pássaro
que aqueles designam, sabe-lo bem, o ibis; o nome desta divindade é Theuth.
Foi ele que, portanto, em primeiro lugar (prõton), descobriu
d escobriu a ciência do
núm ero (arithmón), o cálculo (logismòn), a geometria
geom etria (geõmetríanj, a astro-
astro-
nom ia (astronomian) e ainda o tric-t
tric-trac
rac (petteías), os dados [kubeias), e, por
último sobretudo, a escrita (grámm ataf.
Sócrates assegura ter ouvido dos Antigos (que conhecem a verdade)
esta narrativa que pertence à tradição grega constituída. Sócrates
apresenta deste modo a Fedra uma tradição grega da antigüidade.
Qualquer tradição, grega ou outra, vale o que vale. Esta, grega, reto-
mada por Sócrates para contá-la a Fedra, consiste no facto de o deus
egípcio Theuth, cujo emblema sagrado é o pássaro ibis, é o inventor
do número, do cálculo, da geometria, do tric-trac, dos dados (e outros
jogo s de socieda de), da escrit
escrita.
a. A tradição gre
grega,
ga, ex trem am en te antiga,
ã qual Sócrates se refere, não atribui estas descobertas aos deuses da
Caldeia, muito menos aos do próprio país grego.
O ibis é efectivamente o pássaro sagrado do Egipto, de corpo branco,
com um a cab eça e um a cauda negras. O deus iim m aterial Th ot (Th eu t)
encarnava-se nele. Precisamente, no Egipto, este Thot, deus lunar em
forma de ibis, reinava sobre a escrita, a separação das linguagens, a
analística, as leis, os escribas e os mágicos, o cálculo (a geometria),
o calendário (a astronomia). Thot reinava qualquer operação intelec-
tual, enquanto inventor da civilização escrita.
O The uth p latônico junta -se ao Th ot egípci
egípcioo no essencial. Este d eus
deu ao Egitpo ma is saber, m ais m em ória , m ais ciência. Para além disso.
8. Platão, Fe
F edra, 274 c-d.
l oo:: , Babaca r Mba ye Diop e Dou dou Dieng A Con sciên cia Histórica Afric ana
é o grande
antigos mestre odas
tornaram deustécnicas,
egípcioherói cultural edecivihzador.
no benfeitor Os Gregos
toda a humanidade.
O prim eiro, des cobr iu, pa ra os ho m en s, a ciência do nú m ero, o cál cálculo,
culo,
a geometria, a astronomia, os jogos de sociedade, a escrita. Theut, que
e n c o n t r a m o s e m Filebo
m Filebo [1 8 b], é ob via m en te o Th ot egípci
egípcio,
o, o inve ntor
divinizado das artes, das ciências, das leis, da escrita. Isto, Sócrates ou-
viu-o dos antigos Gregos; e reproduz facilmente a Fedra uma tradição
oral [akoé)
oral [akoé) da antigüidade grega: "Estou próxim o de con tar uma
tradição que retenho dos antigos: antigos: akoén ge échõ légein tõn protérõn"
(Fedra, 274 c],
Para os Gregos anteriores ao nascimento de Sócrates, não existia
qualquer dúvida possível: o Egipto era efectivamente, aos seus olhos,
o berço das ciências e das técnicas. Sócrates não está de todo trauma-
tizado ao divulgar esta antiga tradição grega a Fedra. Torna-se eviden-
te que Platão nã o é o inve nto r deste "Mito de Teuth": trata -se, com est e
"mito", de uma tradição grega muito antiga. Tradição viva retomada
por Sócrates para Fedra, e, por último, escrita por Platão.
- Clínias:
Clínias: O Egipto? Qu
Qual
al é então, segund
segundoo a lei, a legislação acerca
deste ponto?
O Ateniense:
-Con Ateniense:
sidero, há já Só mu
Considero, o enun
enunciado
ito ciado
muito temp o, ma
tempo, maravilhar-vos-á
ddeeravilhar-vos-á
facto (pálai gàr [thãuma kai que
dêpote), akõusai).
eles
aprenderam esta verdade que agora formulamos (tá nún): a saber
que são as belas figuras e as belas m elodias [kalà mèn m èn schem
schemata,
ata, kalà
dè, mélé) que a juventude das cidades deve praticar; eles (Egípcios)
fixaram-lhes a determinação
determinaçã o e a natureza, mais ma is tarde, expuseram os
modelos
mod elos nos templos; estes modelos,
mod elos, não era perm permitido
itido aos pintores,
nem a ninguém que tives tivesse
se produzi
produzido do formas ou que quer que fosse
deste gênero, afastar-se delas para inovar ou ainda imagin imaginarar outras
que diferissem daquilo que as regras nnacionais acionais (tà pátria) tinham es-
tabelecido; e ainda agora isto lhes é proibido, quer nesta ma matéria
téria (das
representações figurativas), querem qualquer arte mu musical
sical (oudè nún
éksestin, oúte en toútois en mou mousiké
siké sumpásê^.
sum pásê^.
9. Platão, Lois, IL Cf. Pier re-M axim e Schuhl, P laton eett l'ar t de son temps
IL 6 5 6 d. Cf. temps (arts plastique
plastiques),
s), Paris,
PUF, edição de 1952, p. XV: P latão (...) mostr a-se parti dári o de uma arte hie
hieráti
ráti ca,
ca, i mutáve
mutávell como
como
aquela
aquela que tin
tinha
ha admir ado nas ob obras
ras dos te
templos
mplos no V ale do N i lo.
10. Platão, L eis, II, 656 e - 657 a.
l oo:: , Babacar Mb aye Diop e Doud ou Dieng A Con sciên cia Histó rica Afr ican a
e o tradicionalismo
necessário. da arte
Neste ponto, egípcia, arte
a egiptologia comprometida
moderna e áulica,
não se encontra se
mais
avançada do que no tempo de Platão:
pãsan (tas
festas m en heortas),
orchésin, encom
pantaendar
encomendarde melé); regulamentar
antecipadam
antecipadamente,
ente, paraem todo
primeiro
o ano lugar as
(eis ton
eniauton), quais as festas que deveremos celebrar, em que épocas, em honra
de que deuses ou filhos
filhos de deuses; depois, que hino deverá ser cantado ao
sacrificar
sacrificar aos deuses e através de que danças honrarem
honraremos
os tal sacrif
sacrifício;
ício; regu-
lamentação que será confiada a alguns, porém, um umaa vez concretizada, todos
os cidadãos, tendo sacrificado
sacrificado em comu
comum m às M oiras e a todas as outras divin-
dades terão de consagrar, através de libações, cada hino a um dos deuses ou
demônios sucessivamente^^.
4.5. O Egipt
Egiptoo enqu anto d eten tor da m elho r p edago gia
para ensinar as matemáticas às crianças
Isôcrates, em Busiris, o br a el ab o rad a p o r vo l t a d e 3 8 5 ant es d a no ssa
era, ensi na-no s que o s jo vens no E g i p t o se o c up am d o "est ud o d o s
astr os, do cálculo e da g e o m e tr ia "" . No enta nto, é Platão, nas Leis, o bra
c o m p o st a ent re 370 e 347 ant es d a no ssa era, que m ani fest a m ai o r
i nt eresse p el a p ed ag o g i a eg íp c i a d as m at em át i c as.
O método é primordial para o filósofo. A ignorância, afirma, mesmo
total e profunda, em qualquer matéria que seja, não é nem perigosa,
nem t ão g ra nd em en t e funest a: "B em m ai s l am ent ável , p el o c o nt rá ri o , é