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1 MÓDULO I | TUTORIA | MEDICINA | RAYSSA OLIVEIRA SANTOS

NASCIMENTO, CRESCIMENTO E DESENVOLVIMENTO

se que um APGAR de 0-3 no 5º minuto ou pH no sangue do cordão umbilical <


avaliação do crescimento e 7.0 estavam associados à morte neonatal precoce.
maturação
A nota do primeiro minuto se correlaciona com o pH do cordão umbilical e é
um índice de depressão intraparto, não estando relacionado com resultados
a longo prazo. Por exemplo, um APGAR menor ou igual a 4 no primeiro minuto
está associado à acidose e PaCO2 alta. Por outro lado, a permanência de
O boletim APGAR é um escore de avaliação da vitalidade neonatal precoce e pontuação baixa além do 1º minuto está vinculada a consequências deletérias
foi criado pela anestesista Virgínia APGAR, em 1952, e que atribui uma em longo prazo. Um APGAR baixo no 20º minuto é altamente compatível com
pontuação de 0 a 2 a cada um dos seguintes parâmetros: respiração, um mau prognóstico neonatal (mortalidade e disfunção neurológica
frequência cardíaca, tono, resposta reflexa e cor. Sua simplicidade e permanente).
confiabilidade asseguraram sua ampla difusão na prática clínica neonatal,
garantindo uma utilização irrestrita até os dias de hoje.

Um dos objetivos do boletim APGAR é identificar o RN deprimido, que


possivelmente necessitou de manobras de reanimação. Entretanto, ele NÃO
pode ser o fator que determinará o início das manobras de reanimação, até
porque sua primeira aferição acontece apenas no primeiro minuto de vida.

Perceba que a decisão de começar a reanimação é tomada mediante a


avaliação da respiração e da frequência cardíaca ANTES deste primeiro
minuto de vida. O APGAR é uma medida de vitalidade, que deve e pode ser
calculada depois que as medidas de cuidado inicial forem tomadas. Não se
recomenda perder tempo calculando o APGAR somente para então decidir se
há ou não necessidade de reanimar o bebê. O método de Capurro é simples, fácil e difusamente empregado na prática
clínica neonatal. Entretanto, devemos ressaltar que não é um escore tão
O tempo é precioso e uma assistência adequada e rápida na sala de parto faz
fidedigno quanto aquele que o originou, mas, na maioria das vezes, presta-se
toda diferença para manutenção da vida e preservação neurológica do RN.
bem à avaliação geral do bebê a termo.
Teoricamente, um escore baixo indica a presença de asfixia neonatal; e um
escore alto (normal), sua ausência. Contudo, estudos recentes demonstraram Cada uma das características tem várias opções e cada opção, uma
que o valor do escore não traz a “verdade absoluta”, havendo uma proporção pontuação que foi determinada através de diferentes estudos. Será, ao final,
considerável de falso-positivos (APGAR baixo com ausência de asfixia a soma desses pontos o que vai determinar a idade gestacional. As
neonatal) e falso-negativos (APGAR alto com asfixia neonatal). características utilizadas desse método são:
A confecção do boletim de APGAR é derivada da avaliação de cinco
parâmetros clínicos – respiração, frequência cardíaca, cor, resposta a
estímulos e tono – sendo que cada um recebe uma pontuação variando entre
0, 1 e 2. Sendo assim, a pontuação mínima é 0 e a máxima é 10.

Rotineiramente, calculamos o APGAR no 1º e 5º minutos. Sempre que a


pontuação for menor ou igual a 6, o escore continua a ser calculado com
intervalos de cinco minutos (ex.: 10º, 15º, 20º minutos) até que se obtenha uma
nota maior ou igual a 7.

Contudo, o APGAR não tem o “poder” de determinar ou predizer o prognóstico


neurológico em longo prazo. Por exemplo, muitas crianças com paralisia
cerebral apresentaram escore APGAR normal ao nascimento, e nem todas
com APGAR baixo evoluirão com sequela neurológica. Além disso, verificou-
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1) Teste do Pezinho

O teste do pezinho baseia-se em um exame de triagem para o rastreamento


de doenças em recém-nascidos como, por exemplo: a fenilcetonúria, o
hipotireoidismo congênito, doenças falciformes e outras hemoglobinopatias,
e a fibrose cística.

A coleta do teste do pezinho deve ser feita entre o 3o e 5 o dia de vida do


neonato, preferencialmente no 3o dia. Não deve ser colhido antes de 48 horas
de vida para evitar resultado falso-negativo para fenilcetonúria, pois é
necessário que o recém-nascido (RN) tenha ingerido certa quantidade de leite
materno para que a fenilalanina se acumule no sangue.

O teste é realizado em um cartão de coleta que contém a parte de


identificação com informações que auxiliarão na análise do material e o
papel-filtro que receberá o sangue coletado.

A hiperplasia adrenal congênita é identificada pela quantificação da 17-


hidroxi-progesterona (17-OHP) nas amostras de sangue colhidas em papel-
filtro de todas as crianças.

A interpretação da deficiência de biotinidase é feita pela porcentagem de


atividade enzimática, conforme descrito:

➢ Deficiência profunda de biotinidase: atividade enzimática menor


que 10% → colher 2ª amostra.
➢ Deficiência parcial de biotinidase: atividade enzimática entre 10%
e 30% → colher 2ª amostra.
➢ Sem deficiência de biotinidase: atividade enzimática acima de
30%.
2) Teste do coraçãozinho

Este consiste na realização da oximetria de pulso entre as primeiras 24 e 48


horas de vida, ainda na maternidade. Caso seja detectada alguma alteração,
novo teste deve ser realizado após uma hora. Caso a alteração persista, é
imprescindível a realização de ecocardiograma nas 24 horas seguintes para
diagnóstico e, posterior, tratamento de cardiopatia congênita.

Deve-se realizar a aferição da oximetria de pulso em todo recém-nascido


aparentemente saudável com idade gestacional > 34 semanas antes da alta.
O local de aferição é no membro superior direito e em um dos membros
inferiores. Para a adequada aferição, é necessário que o RN esteja com as
extremidades aquecidas e o monitor evidencie uma onda de traçado
homogêneo. O teste deve ser realizado entre 24 e 48 horas de vida, antes da
alta hospitalar.

➢ Resultado normal: Saturação periférica maior ou igual a 95% em


ambas as medidas (membro superior direito e membro inferior) e
diferença menor que 3% entre as medidas do membro superior
direito e membro inferior.
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➢ Resultado anormal: Caso qualquer medida da SpO2 seja menor que 4) Teste da orelhinha
95% ou houver uma diferença igual ou maior que 3% entre as
medidas do membro superior direito e membro inferior, uma nova Este teste deve ser realizado ainda na maternidade, assim que o bebê nasce.
aferição deverá ser realizada após 1 hora. Caso o resultado se Consiste em emissões otoacústicas evocadas, ou seja, estímulos sonoros são
confirme, um ecocardiograma deverá ser realizado dentro das 24 produzidos e a resposta é captada por meio de uma sonda na orelha do RN. É
horas seguintes. um teste rápido, indolor e realizado, geralmente, enquanto o bebê dorme.

O conhecimento do desenvolvimento da área auditiva e possíveis fatores


relacionados ao transtorno na sua formação definiram a política de triagem
auditiva universal para todos os RN, orientando que seja realizado esse teste
até́ os 3 meses de vida para detecção e intervenção precoce quando
necessário.

3) Teste do olhinho

O pediatra deve estar atento para a orientação e vigilância da realização do


É recomendado na alta hospitalar realizar a triagem auditiva universal por
teste do olhinho (reflexo vermelho) em todos os recém‐nascidos. Estudos
meio das emissões otoacústicas transientes (EOAT) e pesquisa do reflexo
demonstram que a triagem visual em RN é um método que pode identificar
cócleo palpebral (RCP). Em caso de falha no primeiro teste de EOAT, o pediatra
potenciais causas de anormalidades oculares tratáveis.
que acompanha a criança deve estar atento para a recomendação da
O reflexo vermelho é o exame de rastreamento (screening) para realização da otoscopia e a curva timpanométria para verificar se a falha
anormalidades oculares, desde a córnea até́ o segmento posterior. Nesse ocorreu por alteração condutiva. Em caso de falha no primeiro teste de EOAT,
exame, pode ser detectado as opacidades dos meios transparentes do globo o pediatra que acompanha a criança deve estar atento para a recomendação
ocular. Várias doenças podem ser detectáveis: catarata congênita; da realização da otoscopia e a curva timpanométria para verificar se a falha
retinopatia da prematuridade; retinoblastoma; glaucoma congênito; ocorreu por alteração condutiva.
descolamento de retina; hemorragia vítrea.
5) Teste da linguinha
O teste do reflexo vermelho deve ser realizado:
O teste da linguinha é um exame padronizado que possibilita diagnosticar e
▪ antes da alta da maternidade; indicar o tratamento precoce das limitações dos movimentos da língua
▪ na primeira consulta de puericultura; causadas pela língua presa que podem comprometer as funções exercidas
▪ 2 meses de vida; pela língua: sugar, engolir, mastigar e falar.
▪ com 6, 9 e 12 meses de vida;
▪ após 1° ano: duas vezes por ano. O teste da linguinha deve ser realizado por um profissional da área da saúde
qualificado, como por exemplo, o fonoaudiólogo. Ele deve elevar a língua do
O pediatra deve ser treinado para o manuseio adequado do oftalmoscopio. O bebê para verificar se a língua está presa, e também observar o bebê
ambiente para a realização do exame deve ser escurecido, utilizar chorando e sugando. O exame não tem contraindicações. Recomenda-se que
oftalmoscópio ou retinoscópio seguro próximo ao olho do examinador e a avaliação do frênulo da língua seja inicialmente realizada na maternidade.
aproximadamente 40 a 50 cm de distância. A avaliação precoce é ideal para que os bebês sejam diagnosticados e
fisiopatologia da icterícia
tratados com sucesso.
O teste é considerado normal quando os dois olhos apresentam um reflexo
vermelho brilhante. Pontos pretos, assimetria ou a presença de reflexo
branco (leucocoria) indicam a necessidade de avaliação mais cuidadosa –
realizada pelo oftalmologista. Definimos icterícia como a coloração amarelada de pele e mucosas,
provocada por um aumento da fração indireta ou lipossolúvel da bilirrubina,
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geralmente quando > 7 mg/dl ou da sua fração direta, menos frequentemente. aumentando a quantidade de bilirrubina indireta que será reabsorvida na
A icterícia decorrente do aumento da fração indireta de bilirrubina confere à circulação entero-hepática. Sabe-se que 1 g de hemoglobina produz cerca de
pele uma tonalidade amarelo-brilhante ou mesmo alaranjada. 34 mg de bilirrubina.

Nas condições associadas à Hiperbilirrubinemia direta, esta confere à pele No período neonatal existem fatores bioquímicos que promovem uma maior
uma cor amarelo- esverdeada. No entanto essas diferenças são percebidas elevação da bilirrubina indireta:
somente com níveis muito elevados do pigmento. A grande complicação desta
impregnação não acontece a nível cutâneo, mas sim encefálico. Em níveis ➢ Aumento da carga de bilirrubina a ser metabolizada pelo fígado:
muito elevados, a bilirrubina indireta pode cruzar a barreira as hemácias fetais apresentam menor sobrevida e, além disso, o
hematócrito ao nascimento é alto (50-63%). Há maior risco de
hematoencefálica produzindo efeito tóxico sobre os neurônios, levando com
hemólise e infecção.
isso ao desenvolvimento de um quadro de encefalopatia bilirrubínica ou
➢ Diminuição da captação e conjugação hepáticas, por imaturidade
kernicterus.
dos sistemas enzimáticos. A enzima glicuroniltransferase pode ter
sua ação e potência reduzidas por fatores como hipóxia, infecção,
A hiperbilirrubinemia à custa da fração direta, quando presente nas primeiras
hipotireoidismo e hipotermia.
horas ou semanas de vida, indica uma desordem subjacente de extrema
➢ Competição ou bloqueio da enzima glicuroniltransferase por
gravidade, como sepse neonatal, infecções congênitas (toxoplasmose,
substâncias que necessitem de conjugação com o ácido
citomegalovirose, rubéola, sífilis, herpes, etc.), atrésia biliar, fibrose cística,
glicurônico para excreção e drogas.
galactosemia, cistos do colédoco e deficiência de alfa-1-antitripsina. ➢ Presença de defeitos genéticos que acarretem ausência de
glicuronil transferase ou sua diminuição e defeitos de captação da
1. Etiologia
bilirrubina pelo hepatócito.
O metabolismo da bilirrubina em um RN está em transição do estágio fetal, ➢ Exacerbação da circulação entero-hepática por jejum e demora na
eliminação do mecônio.
durante o qual a placenta é a principal via de eliminação da bilirrubina
2. Quadro clínico
lipossolúvel, para o estágio adulto, no qual a forma conjugada (direta)
hidrossolúvel é excretada pelos hepatócitos no sistema biliar e depois no A época de surgimento da icterícia vai depender do distúrbio patológico que
trato gastrointestinal. a originou. Mas também devemos lembrar que o aumento do nível de
bilirrubina pode ser um evento fisiológico ou decorrente de amamentação.
A bilirrubina é um produto da degradação do grupamento heme, que deriva
da hemoglobina (75%) e de outras proteínas (25%), como mioglobina, Existe uma regra (não muito precisa, mas bastante difundida na prática
citocromo, catalases e peroxidases. O heme é convertido no sistema clínica pediátrica) que relaciona os níveis de bilirrubina com a topografia da
reticuloendotelial em basicamente duas reações químicas: a primeira icterícia no RN (zonas de Kramer). Sabemos que a progressão da icterícia se
mediada pela hemeoxigenase que transforma a hemoglobina em biliverdina; faz de maneira “craniocaudal”, com nível de 5 mg/dl determinando icterícia
e a segunda é catalizada pela biliverdina redutase, produzindo a bilirrubina. notada apenas na face. Valor de 15 mg/dl está associado à tonalidade
característica alcançando a parte média do abdome, enquanto um teor de 20
O ferro liberado desta reação é reaproveitado pelo organismo e armazenado
mg/dl está associado com coloração amarelada das mãos e pés e,
em baço e fígado. A bilirrubina indireta (lipossolúvel) então parte do sistema
obviamente, de todo o corpo.
reticuloendotelial, liga-se a albumina plasmática para poder ser carreada
até o fígado; um grama de albumina tem capacidade de ligação de 8,5 mg de
bilirrubina; chegando próximo à membrana dos hepatócitos, difunde-se
através do meio lipídico, e no citoplasma volta a ligar-se a uma proteína –
ligandina – cuja função é carreá-la até o retículo endoplasmático liso; dentro
desta organela a BI é convertida à bilirrubina direta com auxílio da enzima
uridilglucoroniltransferase.

As formas de BD mono ou diglicuronídeo estão aptas a serem liberadas na


bile. Esses novos pigmentos são hidrossolúveis e suficientemente polares
para serem excretados pela bile ou filtrados pelos rins (bilirrubina direta).
Com a bile, a bilirrubina direta chega ao intestino delgado onde, no adulto e
na criança maior, será reduzida a estercobilina pela presença de bactérias
da flora local e uma pequena quantidade será desconjugada a bilirrubina
indireta (pela enzima betaglicuronidase). e reabsorvida pela circulação
entero-hepática.

No RN, a flora intestinal está ausente até mais ou menos o final da primeira
semana de vida, com estercobilina praticamente indetectável. Além disso,
nessa fase da vida, a betaglicuronidase está presente de forma ativa, 3. Diagnóstico diferencial
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Podemos compreender a icterícia neonatal sob dois pontos de vista distintos:


icterícia de significado fisiológico e icterícia de significado não fisiológico
(patológica). A hiperbilirrubinemia direta terá sempre conotação patológica. Existem duas formas de icterícia associada ao leite materno: uma forma
precoce (também conhecida como icterícia do aleitamento materno) e uma
Além disso, o período de aparecimento da icterícia também tem importância, forma tardia (ou icterícia do leite materno).
pois se correlaciona com os possíveis fatores etiológicos, como veremos
abaixo: 1) Forma precoce

▪ Ao nascimento ou nas primeiras 24h de vida (sempre patológica): Sabe-se que os RN amamentados exclusivamente no seio materno são
eritroblastose fetal, hemorragia oculta, sepse, doença de inclusão fisiologicamente mais ictéricos do que os alimentados com fórmulas nos
citomegálica, rubéola, toxoplasmose congênita, secundária a primeiros dias de vida. Isso se deve a um aumento na circulação entero-
hematomas e equimoses extensas. hepática, por uma ingesta de leite insuficiente relacionada às dificuldades do
▪ No segundo a terceiro dia: fisiológica, síndrome de Crigler-Najjar, início da amamentação e, consequentemente, pela menor quantidade de
do aleitamento materno. eliminação do mecônio.
▪ Do terceiro dia a primeira semana: sepse, doença de inclusão
citomegálica, sífilis, toxoplasmose e infecção do trato urinário. Esta forma de icterícia não patológica surge entre o 2º e o 3º dia de vida e
▪ Após a primeira semana: leite materno, sepse, atresia congênita está associada a sinais de dificuldades alimentares, como
dos ductos biliares, hepatite, galactosemia, hipotireoidismo, pega/posicionamento incorretos, perda de peso acentuada nos primeiros dias
esferocitose hereditária e deficiências enzimáticas levando à de vida. No final da primeira semana, RN alimentados exclusivamente ao seio
hemólise (G6PD); fibrose cística. materno podem apresentar nível elevado de bilirrubina.
▪ Persistência após um mês: icterícia fisiológica associada a
hipotireoidismo ou estenose pilórica, síndrome da bile espessa 2) Forma tardia
(geralmente sucede a doença hemolítica perinatal), galactosemia,
Tem um início mais tardio, e afeta 2-4% dos RN a termo. Ao redor do 4º dia,
atresia congênita dos ductos biliares, infecções congênitas, uso de
ao invés de haver a queda esperada nos níveis de bilirrubina como manda a
parenteral, síndrome de Crigler-Najjar.
história natural da icterícia fisiológica, sua concentração continua a subir até
o 14º dia de vida, podendo alcançar cifras de 20-30 mg/dl! Se o aleitamento é
continuado, estes níveis estabilizam e caem lentamente, atingindo níveis
Normalmente, o nível de bilirrubina indireta no soro do cordão umbilical normais em 4 a 12 semanas. Se o aleitamento for suspenso, os níveis caem
encontra-se entre 1 e 3 mg/dl e eleva-se a partir de então, chegando no rapidamente em 48 horas. Estes bebês apresentam-se saudáveis, com bom
segundo dia ao valor de 5 mg/dl, o que determina a icterícia. Cerca de 60% ganho ponderal, não apresentam qualquer alteração de função hepática ou
dos RN a termo e 80% dos RN pré-termo tornam-se ictéricos na primeira de hemólise.
semana de vida. Acredita-se que a icterícia fisiológica é reflexo da maior
produção de bilirrubina pela degradação de hemácias fetais, que possuem Quanto ao seu mecanismo patogênico, não se conhece muito, mas parece
uma sobrevida mais curta que as hemácias dos adultos, combinada com uma existir fatores no leite materno que interferem com o metabolismo da
limitação transitória da captação e da conjugação hepáticas, além da bilirrubina. Além disso, quando comparados com bebês alimentados com
exacerbação da circulação entero-hepática. fórmula infantil, verificamos que os amamentados ingerem betaglicuronidase
presente no leite (enzima que converte a BD em BI a nível intestinal,
O valor de bilirrubina na icterícia fisiológica atinge um pico de 5-6 mg/dl por facilitando a sua reabsorção), têm menor colonização bacteriana intestinal (o
volta do segundo ao quarto dia, podendo alcançar 12 mg/dl, caindo a seguir que diminui a conversão da BD em estercobilina) e excretam menos fezes.
para nível inferior a 2 mg/dl entre o quinto e sétimo dia de vida. Como nos
prematuros a captação e a conjugação são mais lentas, eles tornam-se mais
ictéricos (pico de bilirrubina indireta entre o quarto e o sétimo dia de vida,
podendo alcançar valores de 15 mg/dl) e permanecem mais tempo ictéricos Em neonatos com idade gestacional igual ou acima de 35 semanas de vida,
(até o meio da segunda semana de vida). No entanto, observamos alguns RN devemos considerar causas patológicas para a icterícia na presença das
a termo (6-7%) com teores acima de 12,9 mg/dl e alguns neonatos características abaixo, e com isso, solicitar exames complementares:
apresentando cifras superiores a 15 mg/dl (2 a 3%).
▪ Icterícia que surge nas primeiras 24 horas de vida;
Os fatores de risco associados a uma icterícia fisiológica mais intensa ▪ Icterícia além da parte média abdominal;
incluem: filhos de mãe diabética, raça oriental, prematuridade, altitude, ▪ Icterícia associada a sinais clínicos de anemia, sepse, dificuldade
policitemia, drogas (vit. K3), eliminação tardia de mecônio e história familiar respiratória, hepatoesplenomegalia ou qualquer outro sinal de
doença sistêmica;
de irmão que teve icterícia fisiológica.
▪ Níveis de bilirrubina que ascendem rapidamente nas curvas de
percentil da zona de baixo risco, para as zonas de risco
intermediário e alto risco;
▪ Níveis de bilirrubina que ascendem em uma velocidade superior a
0,5 mg/kg/h;
▪ Níveis de bilirrubina que não diminuem com a fototerapia;
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▪ Níveis elevados de bilirrubina direta; Na infecção congênita da rubéola, predominam manifestações de infecção
▪ Icterícia que persiste além de três semanas de vida. crônica, como morte fetal, parto prematuro e defeitos congênitos clássicos
da SRC (perda auditiva, catarata e cardiopatia congênita). Outros achados,
infecções congênitas
como meningoencefalite, pneumonia intersticial, lesões osteolíticas,
1) Toxoplasmose retinopatia, glaucoma, hepatomegalia, icterícia, petéquias, adenopatia,
anemia hemolítica e trombocitopenia, podem ser encontra‐ dos no período
O Toxoplasma gondii é um protozoário intracelular obrigatório que afeta cerca neonatal.
de 1/3 da população mundial, mais comum em países tropicais. A infecção
aguda em imunocompetentes é assintomática, mas pode atingir o feto quando
a mulher adquire na gravidez. Cerca de 40% das gestantes infectadas
• perda auditiva
transmitirão a doença para o feto se não forem tratadas adequadamente, e o
• cardiopatias congênitas
risco de transmissão aumenta com o avanço da gravidez. O grau de • catarata
comprometimento do concepto é maior no início da gestação. • microcefalia

Risco de transmissão:

• 1° trimestre – 15%: apresenta repercussões grave no concepto,


• disturbios endócrinos
óbito fetal ou neonatal, sequelas importantes;
• 2° trimestre – 25%: o recém-nascido apresentará manifestações • perda auditiva
subclínicas;
• 3° trimestre – 65%: com manifestações subclínicas e mais 3) Citomegalovírus (CMV)
raramente um quadro grave de parasitemia;
O citomegalovírus (CMV) é um vírus pertencente à família Herpesviridae que
A transmissão da toxoplasmose ocorre com a ingestão de cistos do parasita, está amplamente distribuído pelo mundo. É um vírus que permanece latente
presentes na carne animal, ou de oocistos eliminados nas fezes de gatos, que nas células do endotélio vascular, monócitos e células progenitoras mielóides
podem estar presentes em alimentos, água ou outros materiais. e, por essa característica, o citomegalovírus pode evoluir como infecção
secundária, através da reativação ou reinfeção.
Cerca de 70% das crianças acometidas são assintomáticas ao nascimento, no
entanto, tem elevadas frequências de prematuridade, retardo do crescimento O citomegalovírus pode ser transmitido através do contato com secreções
intrauterino, anormalidades liquóricas e cicatrizes de coriorretinite. infectadas, como leite materno, sêmen, secreções vaginais, saliva, urina,
sangue; ou por transmissão vertical. A transmissão vertical pode ser
O quadro pode caracterizar‐se por coriorretinite, convulsão, micro ou intrauterina (provocando infecção congênita) ou perinatal, sendo que esta
hidrocefalia, calcificações cranianas, icterícia, anemia, hiperproteinorraquia, última pode ocorrer tanto no momento intraparto, através do contato com a
febre, hipotermia, hepatoesplenomegalia, icterícia, vômitos, diarreia, secreção vaginal do canal de parto, quanto no pós-natal precoce, através do
linfoadenomegalia, pneumonite, apneia, taquipneia, diátese hemorrágica, leite materno, ou ainda, em casos mais raros, pela transfusão de
catarata, glaucoma e microftalmia. hemoderivados de doadores sorotipos CMV+.

A forma subclínica é a mais comum, com história materna, sorologia positiva


no RN, alterações leves do liquor e, posteriormente, surgimento de sequelas
oculares e neurológicas. Gestantes com infecção primária pelo CMV têm risco de 20-30% de
transmitirem essa infecção ao seu filho, enquanto gestantes com reativação
Quando o quadro clínico já aparece ao nascimento, as sequelas são mais
do CMV, têm chance de 0,5-3%. Em 90% dos casos, a infecção congênita é
frequentes e graves, com retardo mental, convulsões, espasticidade ou assintomática. Quando sintomática, pode se manifestar através de restrição
paralisia, dificuldade visual e auditiva. do crescimento intra-uterino; hepatoesplenomegalia; elevação de
transaminases; icterícia padrão colestático; petéquias; além de alterações
2) Rubéola
neurológicas, como microcefalia, calcificações intracranianas
A infecção intrauterina causada pelo vírus da rubéola pode apresentar‐se de periventriculares, coriorretinite e surdez neurossensorial.
duas formas:

• infecção congênita da rubéola: engloba todos os eventos asso‐


ciados à infecção intrauterina pelo vírus da rubéola (abortos, A infecção perinatal geralmente é assintomática na maioria dos recém-
natimortos, combinação de defeitos e também a infecção nascidos a termo, podendo apresentar manifestações mais graves em recém-
assintomática); nascidos pré-maturos com peso < 1500g ou com idade gestacional < 32
• síndrome da rubéola congênita (SRC): refere‐se à variedade de semanas. A via de transmissão mais importante é o aleitamento materno.
defeitos presentes em neonatos filhos de mães que apresentaram
infecção pelo vírus da rubéola durante a gestação (deficiência Quando sintomática, a manifestação mais comum é a síndrome sepsis-like,
auditiva, catarata, defeitos cardíacos, etc. além de pneumonite, colestase, plaquetopenia e neutropenia.
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4) Herpes Ocorre após o segundo ano de vida, com malformações ou cicatrizes da


doença precoce. As principais manifestações são: tíbia em “lâmina de sabre”,
O HSV é vírus DNA membro da família Herpesviridae. Infecta o ser humano articulações de Clutton, fronte “olímpica”, nariz “em sela”, dentes incisivos
através de inoculação oral, genital, mucosa conjuntival ou pele com solução medianos superiores deformados (dentes de Hutchinson), molares em
de continuidade. Daí infecta os nervos terminais de onde é transportado, via “amora”, rágades periorais, mandíbula curta, arco palatino elevado, ceratite
axônios, até as raízes ganglionares dorsais, onde permanece latente durante intersticial, surdez e dificuldade no aprendizado.
toda a vida do hospedeiro. No estado de latência, esses vírus não são
suscetíveis às drogas antivirais.

Na infecção transmitida por viremia materna predominam sinais de infecção


placentária, como infarto, necrose, calcificações e sinais de envolvimento
fetal grave como hidropsia. A morte do concepto geralmente ocorre. Os
sobreviventes exibem lesões de pele (vesículas, ulcerações ou cicatrizes),
lesões oculares e graves anomalias do SNC, como microcefalia e
hidranencefalia.

• Doença localizada na pele, olhos e boca: os sintomas estão


presentes nas primeiras duas semanas de vida. As lesões de pele
apresentam‐se como vesículas agrupadas sob uma base
eritematosa que podem estar localizadas ou disseminadas.
• doença do SNC: os sintomas iniciam‐se em torno da segunda ou
terceira semana de vida. As manifestações clínicas incluem:
convulsões, letargia, irritabilidade, tremores, recusa alimentar,
instabilidade térmica e fontanela anterior tensa.
• doença disseminada: As manifestações clínicas são muito
semelhantes à sepse causada por outros microrganismos e
incluem febre ou hipotermia, apneia, letargia, irritabilidade,
desconforto respiratório, distensão abdominal.

5) Sífilis

A sífilis congênita é adquirida por meio da disseminação do Treponema


pallidum da mãe para o feto, principalmente por via transplacentária. O leite
materno não transmite sífilis.

O treponema provoca um processo inflamatório, comprometendo todos os


órgãos do recém‐nascido, com lesões viscerais, ósseas, pele e mucosas, e
sistema nervoso central.

Além da prematuridade e do baixo peso ao nascimento, as principais


manifestações clínicas são hepatomegalia com ou sem esplenomegalia,
lesões cutâneas (pênfigo palmoplantar, condiloma plano), periostite, osteíte
ou osteocondrite, pseudoparalisia dos membros (pseudoparalisia de Parrot),
sofrimento respiratório com ou sem pneumonia, rinite serossanguinolenta,
icterícia, anemia e linfadenopatia generalizada.

As alterações laboratoriais mais frequentes são anemia, trombocitopenia,


leucocitose (podem ocorrer reação leucemoide, linfocitose e monocitose) ou
leucopenia e hiperbilirrubinemia.

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