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MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO

SECRETARIA DE EDUCAÇÃO TECNOLÓGICA


INSTITUTO FEDERAL DE EDUCAÇÃO, CIÊNCIA E TECNOLOGIA DO
ESPÍRITO SANTO – Campus Santa Teresa
AGRONOMIA - Manejo de Bacias Hidrográficas

MANEJO DE BACIAS HIDROGRÁFICAS


Prof. Paola Alfonsa Vieira Lo Monaco

IFES – SANTA TERESA

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HIDROLOGIA E MANEJO DE BACIAS HIDROGRÁFICAS

1. Introdução

1.1 Conceito: é a ciência que trata da água na terra, sua ocorrência, circulação e
distribuição, suas propriedades físicas e químicas e sua reação com o meio
ambiente, incluindo sua relação com as formas vivas.

1.2 Algumas áreas da hidrologia:

- Hidrometeorologia: é a parte da ciência que trata da água na atmosfera.


- Limonologia: refere-se ao estudo dos lagos e reservatórios.
- Potamologia: trata do estudo dos arroios e rios.
- Glaciologia: é a área da ciência relacionada com a neve e o gelo na
natureza.
- Hidrogeologia: é o campo científico que trata das águas subterrâneas.

1.3 Aplicações da Hidrologia

Em seguida são enumerados alguns exemplos nos quais a hidrologia exerce


grande influência na Engenharia:
a) Escolha de fontes de abastecimento de água para uso doméstico ou industrial;
b) Projeto e construção de obras hidráulicas:
b.1) Fixação das dimensões hidráulicas de obras de arte, tais como pontes,
bueiros etc.;
b.2) Projetos de barragens: localização e escolha do tipo de barragem, de
fundação e de extravasor; dimensionamento;
b.3) Estabelecimento do método de construção;
c) Drenagem:
c.1) Estudo das características do lençol freático;
c.2) Exame das condições de alimentação e de escoamento natural do lençol:
precipitações, bacia de contribuição e nível d’água nos cursos d’água.
d) Irrigação:
d.1) Problema de escolha do manancial;
d.2) Estudo de evaporação e infiltração.
e) Regularização de cursos d’água e controle de inundações:
e.1) Estudo das variações de vazão; previsão de vazões máximas;
e.2) Exame das oscilações de nível e das áreas de inundação.
f) Controle da Poluição: análise da capacidade de recebimento de corpos
receptores dos efluentes de sistemas de esgoto: vazões mínimas de cursos
d’água, capacidade de reaeração e velocidade de escoamento.
g) Controle da erosão:

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g.1) Análise de intensidade e freqüência das precipitações máximas,
determinação de coeficiente de escoamento superficial;
g.2) Estudo da ação erosiva das águas e da proteção por meio de vegetação e
outros recursos.
h) Navegação: obtenção de dados e estudos sobre construção e manutenção de
canais nageváveis;
i) Aproveitamento hidrelétrico:
i.1) Previsão de vazões máximas, mínimas e médias dos cursos d’água para o
estudo econômico e o dimensionamento das instalações de aproveitamento;
i.2) Verificação da necessidade de reservatório de acumulação; determinação
dos elementos necessários ao projeto e construção do mesmo: bacias
hidrográficas, volumes armazenáveis, perdas por evaporação e infiltração.
j) Operação de sistemas hidráulicos complexos;
k) Recreação e preservação do meio ambiente; e
l) Preservação e desenvolvimento da vida aquática.

1.3 Distribuição dos recursos hídricos no planeta

- De todo volume de água no planeta: cerca de 97% é água salgada e 3%


água doce.
- Dos 3% de água doce existente no planeta: 0,3% é água doce aproveitável
e 2,7% água doce sem aproveitamento (água presente como neve, gelo ou
lençol subterrâneo abaixo de 800 m de profundidade).
- Dos 0,3%, cerca de 0,01% é proveniente de fontes de superfície (rios e
lagos) e 0,29% de fontes subterrâneas (poços rasos e nascentes).

2. CICLO HIDROLÓGICO

2.1 Introdução

O ciclo hidrológico é o fenômeno global de circulação fechada da água entre a


superfície terrestre e a atmosfera, impulsionado fundamentalmente pela energia solar
associada à gravidade e à rotação terrestre. A superfície terrestre abrange os
continentes e os oceanos, participando do ciclo hidrológico a camada porosa que
recobre os continentes (solos, rochas) e o reservatório formado pelos oceanos. Parte
do ciclo hidrológico é constituída pela circulação da água na própria superfície
terrestre, isto é: a circulação de água no interior e na superfície dos solos e rochas,
nos oceanos e nos seres vivos.
A atmosfera também possui uma diversidade de condições físicas importante.
Entretanto, a maioria dos fenômenos meteorológicos acontece na fina camada inferior
da atmosfera com 8 a 16 km de espessura, chamada de troposfera, onde está contida
a quase totalidade da umidade atmosférica, cerca de 90%. Logo acima da troposfera
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está situada a estratosfera, com espessura entre 40 e 70 km, cuja importância reside
no fato de conter a camada de ozônio que é reguladora da radiação solar que atinge a
superfície terrestre, principal fonte de energia do ciclo hidrológico. A água que
circula no interior da atmosfera constitui-se numa fase do ciclo hidrológico. Este
processo é devido às correntes aéreas, deslocando-se tanto no estado de vapor como
também nos estados líquido e sólido. A umidade no estado de vapor é invisível, sendo
as nuvens um conjunto de aerossóis visíveis de microgotículas de água, mais umidade,
e, dependendo da região e estação do ano, partículas de gelo.
O intercâmbio entre as circulações da superfície terrestre e da atmosfera,
fechando o ciclo hidrológico, ocorre em dois sentidos: a) no sentido superfície-
atmosfera, onde o fluxo de água ocorre fundamentalmente na forma de vapor, como
decorrência dos fenômenos de evaporação e de transpiração, este último um fenômeno
biológico; b) no sentido atmosfera-superfície, onde a transferência de água ocorre em
qualquer estado físico, sendo mais significativas, em termos mundiais, as precipitações
de chuva e neve.
O ciclo hidrológico só é fechado em nível global. Os volumes evaporados em um
determinado local do planeta não precipitam necessariamente no mesmo local, porque
há movimentos contínuos, com dinâmicas diferentes, na atmosfera, e também na
superfície terrestre. Da precipitação que ocorre nos continentes, por exemplo,
somente parte é aí evaporada, com o restante escoando para os oceanos. À medida que
se considere áreas menores de drenagem, fica mais caracterizado o ciclo hidrológico
como um ciclo aberto ao nível local.
Entre os fatores que contribuem para que haja uma grande variabilidade nas
manifestações do ciclo hidrológico, nos diferentes pontos do globo terrestre, pode-se
enumerar: a desuniformidade com que a energia solar atinge os diversos locais, o
diferente comportamento térmico dos continentes em relação aos oceanos, a
quantidade de vapor de água, CO2 e ozônio na atmosfera, a variabilidade espacial de
solos e coberturas vegetais, e a influência da rotação e inclinação do eixo terrestre na
circulação atmosférica, sendo esta última a razão da existência das estações do ano.

2.2 Descrição geral do ciclo hidrológico

Pode-se começar a descrever o ciclo hidrológico a partir do vapor de água


presente na atmosfera que, sob determinadas condições meteorológicas, condensa-se,
formando microgotículas de água que se mantêm suspensas no ar devido à turbulência
natural. O agrupamento das microgotículas, que são visíveis com o vapor de água, que é
invisível, mais eventuais partículas de poeira e gelo, formam um aerossol que é
chamado de nuvem ou de nevoeiro, quando o aerossol forma-se junto ao solo. Através
da dinâmica das massas de ar, acontece a principal transferência de água da
atmosfera para a superfície terrestre que é a precipitação.
A precipitação, na sua forma mais comum que é a chuva, ocorre quando
complexos fenômenos de aglutinação e crescimento das microgotículas, em nuvens com

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presença significativa de umidade (vapor de água) e núcleos de condensação (poeira ou
gelo), formam uma grande quantidade de gotas com tamanho e peso suficientes para
que a força da gravidade supere a turbulência normal ou movimentos ascendentes do
meio atmosférico. Quando o vapor de água transforma-se diretamente em cristais de
gelo e estes atingem tamanho e peso suficientes, a precipitação pode ocorrer na
forma de neve ou granizo.
No trajeto em direção à superfície terrestre a precipitação já sofre
evaporação. Em algumas regiões esta evaporação pode ser significativa, existindo
casos em que a precipitação é totalmente vaporizada. Caindo sobre um solo com
cobertura vegetal, parte do volume precipitado sofre interceptação em folhas e
caules, de onde evapora. Excedendo a capacidade de armazenar água na superfície dos
vegetais, ou por ação dos ventos, a água interceptada pode-se reprecipitar para o solo.
A interceptação é um fenômeno que ocorre tanto com a chuva como com a neve.
A água que atinge o solo segue diversos caminhos. Como o solo é um meio
poroso, há infiltração de toda precipitação que chega ao solo, enquanto a superfície do
solo não se satura. A partir do momento da saturação superficial, à medida que o solo
vai sendo saturado a maiores profundidades, a infiltração decresce até uma taxa
residual, com o excesso não infiltrado da precipitação gerando escoamento superficial.
A infiltração e a percolação no interior do solo são comandadas pelas tensões
capilares nos poros e pela gravidade. A umidade do solo realimentada pela infiltração é
aproveitada em parte pelos vegetais, que a absorvem pelas raízes e a devolvem, quase
toda, à atmosfera por transpiração, na forma de vapor de água. O que os vegetais não
aproveitam, percola para o lençol freático que normalmente contribui para o
escoamento de base dos rios.
O escoamento superficial é impulsionado pela gravidade para as cotas mais
baixas, vencendo principalmente o atrito com a superfície do solo. O escoamento
superficial manifesta-se inicialmente na forma de pequenos filetes de água que se
moldam ao microrrelevo do solo. A erosão de partículas de solo pelos filetes em seus
trajetos, aliada à topografia preexistente, molda, por sua vez, uma microrrede de
drenagem efêmera que converge para a rede de cursos de água mais estável, formada
por arroios e rios. A presença de vegetação na superfície do solo contribui para
obstaculizar o escoamento superficial, favorecendo a infiltração em percurso. A
vegetação também reduz a energia cinética de impacto das gotas de chuva no solo,
minimizando a erosão.
Com raras exceções, a água escoada pela rede de drenagem mais estável
destina-se ao oceano. Nos oceanos a circulação das águas é regida por uma complexa
combinação de fenômenos físicos e meteorológicos, destacando-se a rotação
terrestre, os ventos de superfície, variação espacial e temporal da energia solar
absorvida e as marés.
Em qualquer tempo e local por onde circula a água na superfície terrestre, seja
nos continentes ou nos oceanos, há evaporação para a atmosfera, fenômeno que fecha
o ciclo hidrológico ora descrito. Naturalmente, por cobrir a maior parte da superfície
terrestre, cerca de 70%, a contribuição maior é a dos oceanos. Entretanto o interesse
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maior, por estar intimamente ligada a maioria das atividades humanas, reside na água
doce dos continentes, onde é importante o conhecimento da evaporação dos
mananciais superficiais líquidos e dos solos, assim como da transpiração vegetal. A
evapotranspiração, que é a soma da evaporação e da transpiração, depende da radiação
solar, das tensões de vapor do ar e dos ventos. Na Figura 1 pode-se visualizar um
corte esquemático do continente com as diversas fases do ciclo hidrológico.
Em certas regiões da Terra o ciclo hidrológico manifesta-se de forma
bastante peculiar. Por exemplo, nas calotas polares ocorre pouca precipitação e a
evaporação é direta das geleiras. Nos grandes desertos também são raras as
precipitações, havendo água permanentemente disponível somente a grande
profundidade, sem trocas significativas com a atmosfera, tendo sido estocada
provavelmente em tempos remotos.
A energia calorífica do Sol, fundamental ao ciclo hidrológico, somente é
aproveitada devido ao efeito estufa natural causado pelo vapor de água e CO2, que
impede a perda total do calor emitido pela Terra originado pela radiação solar (ondas
curtas) recebida. Assim a atmosfera mantém-se aquecida, possibilitando a evaporação
e transpiração naturais. Como cerca da metade do CO2 natural é absorvido no
processo de fotossíntese das algas nos oceanos, verifica-se que é bastante
importante a interação entre oceanos e atmosfera para a estabilidade do clima e do
ciclo hidrológico.

Figura 1. Ciclo hidrológico

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3. BACIAS HIDROGRÁFICAS

3.1 DEFINIÇÃO: é uma área definida topograficamente, drenada por um curso d’água
ou um sistema conectado de cursos d’água tal que toda vazão efluente seja
descarregada através de uma simples bacia.

De acordo com ROCHAS (1991): Bacia hidrográfica (Figura 2) é a área que


drena as águas da chuva por ravinas, canais e tributários, para um curso d’água
principal, com vazão efluente convergindo para uma única saída e desaguando
diretamente no mar ou em um grande lago. Já Sub – bacia hidrográfica é o mesmo
conceito de bacia hidrográfica, acrescido do enfoque de que o deságüe se dá
diretamente em outro rio.
Muitos autores preferem fazer a divisão em sub-bacias, uma para cada afluente
do curso principal, e qualificá-las por tamanho de áreas. Para Faustino (1996), por
exemplo, sub-bacias possuem áreas maiores que 100 km 2. Para Martins et al. (2005),
são áreas entre 20 mil e 30 mil hectares.

Figura 2. Bacia hidrográfica.

3.2 DIVISORES

A Bacia Hidrográfica é necessariamente contornada por um divisor, assim


designado por ser a linha de separação que divide as precipitações que caem em
bacias vizinhas e que encaminha o escoamento superficial resultante para um ou
outro sistema fluvial. O divisor une os pontos de máxima cota entre bacias, o que
não impede que no interior de uma bacia existam picos isolados com cota superior a
qualquer ponto do divisor.
Os terrenos de uma bacia são delimitados por dois tipos de divisores de água:
um divisor topográfico ou superficial e um divisor freático ou subterrâneo. O
divisor topográfico, como seu próprio nome indica, é condicionado pela topografia;
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ele fixa a área da qual provém o deflúvio superficial da bacia. O divisor de águas
freático é, em geral, determinado pela estrutura geológica dos terrenos, sendo
muitas vezes influenciado pela topografia. O divisor freático estabelece, portanto,
os limites dos reservatórios de água subterrânea de onde é derivado o deflúvio
básico da bacia.
As áreas, demarcadas por esses divisores, dificilmente coincidem exatamente.
Devido à dificuldade de se determinar precisamente o divisor freático, uma fez que
ele não é fixo, mudando de posição com as flutuações do lençol, costuma-se
considerar que a área da bacia de drenagem é aquela determinada pelo divisor
topográfico. Assim, a água de precipitação que atinge os terrenos de uma bacia de
drenagem, infiltrando-se e escoando subterraneamente, quando atravessa o divisor
topográfico da bacia constitui uma fuga ou vazamento de água da bacia onde
ocorreu a precipitação.
Na Figura 3 apresenta-se esquematicamente um corte transversal através de 3
bacias adjacentes hipotéticas. Nela mostra-se a posição relativa dos divisores
topográfico e freático. Nota-se que, quanto mais alto estiver o nível do lençol
freático, tanto mais próximos entre si estarão os divisores. Com o rebaixamento do
lençol subterrâneo, durante a estiagem, o divisor freático distancia-se do
topográfico.

Figura 3. Divisores topográfico e freático.

3.3 CLASSIFICAÇÃO DOS CURSOS D’ÁGUA

De grande importância no estudo das Bacias Hidrográficas é o conhecimento do


sistema de drenagem, ou seja, que tipo de curso d’água está drenando a região.
Os estudos hidrológicos a serem realizados na bacia onde se deseja construir a
barragem, por exemplo, compreendem, basicamente, a caracterização e a definição do
regime fluviométrico do rio, com determinação da vazão normal e, quando possível, da
vazão de enchente ou de cheia.
Os cursos d’água são classificados em perenes, intermitentes e efêmeros.

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3.3.1 Perenes

Os cursos perenes são abastecidos, durante todo o ano, pelos lençóis d’água
subterrâneos, por meio das fontes ou nascentes. Nos rios ou nos riachos perenes, a
tendência do nível do lençol freático é manter-se sempre acima do nível do
escoamento fluvial, mesmo durante as secas mais severas (Figura 4A).

3.3.2 Intermitentes

Nos cursos intermitentes, as fontes, ou nascentes, são insuficientes para


manter o curso d’água durante todo o ano. Neste caso, ocorrem, em geral, grandes
vazões durante as estações chuvosas e cessamento do escoamento fluvial nas
estações secas. O nível do lençol freático permanece acima do nível do escoamento
fluvial na estação chuvosa e, abaixo deste, nas estações secas (Figura 4B).

3.3.3 Efêmeros

Os cursos d’água efêmeros apresentam escoamento superficial apenas


durante ou imediatamente após as precipitações. Cessado o escoamento superficial,
proporcionado pela precipitação, cessa-se também o escoamento no curso d’água. O
lençol freático, quando existente, mantém-se sempre abaixo do leito do rio (Figura
4C). A vazão de enchente, que ocorre durante ou logo após as fortes chuvas, é de
grande interesse no caso de construção de barragens, principalmente se tais obras
são executadas nas seções de drenagem de pequenas bacias. Como chuvas de grande
intensidade tendem a cair em pequenas áreas, a ocorrência de elevados picos de cheia
nas seções de drenagem de pequenas bacias hidrográficas é maior.

Figura 4. Croqui de seções de cursos de água: A) perene, B) intermitente e C)


efêmero.

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3.4 CARACTERÍSTICAS FÍSICAS DE UMA BACIA HIDROGRÁFICA

As características físicas de uma bacia são elementos de grande importância


em seu comportamento hidrológico. De fato, existe uma estreita correspondência
entre o regime hidrológico e estes elementos, sendo portanto de grande utilidade
prática o conhecimento destes elementos, pois, ao estabelecerem-se relações e
comparações entre eles e dados hidrológicos conhecidos, pode-se determinar
indiretamente os valores hidrológicos em seções ou locais de interesse nos quais
faltem dados ou em regiões onde por causa de fatores de ordem física ou econômica,
não seja possível a instalação de estações hidrométricas.

3.4.1 Área de drenagem

A área de drenagem de uma bacia é a área plana (projeção horizontal) inclusa


entre seus divisores topográficos. A área de uma bacia é o elemento básico para o
cálculo das outras características físicas.
A área de drenagem da bacia hidrográfica pode ser determinada com auxílio de
mapas, restituições aerofotogramétricas, fotografias aéreas da região ou
levantamentos topográficos. A delimitação da área será possível após serem traçadas
as linhas de divisores de águas das bacias hidrográficas, podendo ser, posteriormente,
calculada a área de drenagem no local de aproveitamento em estudo, por planimetria
ou usando o Sistema de Informações Geográficas.

3.4.2 Forma da bacia

A forma superficial da bacia hidrográfica é importante devido ao tempo de


concentração, definido como o tempo, a partir do início da precipitação, necessário
para que toda a bacia contribua na seção em estudo ou, em outras palavras, tempo que
a água leva para percorrer do ponto mais remoto da bacia até o ponto de deságüe da
mesma.
As bacias hidrográficas, quando representadas em um plano, são geralmente
periformes (Figura 5) (forma de pêra ou leque); entretanto, dependendo da interação
do clima e da geologia, outras formas podem existir.

Figura 5. Bacia periforme.


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A forma da bacia pode influenciar alguns processos e o seu comportamento
hidrológico. Mantendo-se as outras variáveis constantes, o deflúvio resultante de
determinada precipitação não se concentra tão rapidamente em uma bacia longa e
estreita como em uma de forma mais circular. Além disso, dificilmente precipitações
de grande intensidade podem atingir, integralmente, toda uma bacia longa e estreita,
ao passo que, em bacias mais arredondadas, isso pode acontecer com mais freqüência.
Com base nessas considerações, pode-se afirmar que bacias com forma mais circular
têm maiores chances de sofrer inundações que bacias longas e estreitas.
Existem vários índices utilizados para determinar a forma das bacias,
procurando relacioná-las com formas geométricas conhecidas; assim o coeficiente de
compacidade a relaciona com um círculo e o fator de forma com um retângulo.

a) Coeficiente de compacidade

Coeficiente de compacidade (Kc) é a relação entre o perímetro da bacia e a


circunferência de um círculo de área igual à da bacia.
Α
A =  r2  r= (1)
π
P
Kc = (2)
2πr

Substituindo (1) em (2), tem-se


P
Kc = 0,28 , onde P e A são respectivamente perímetro em km e área de bacia em
A

km2.

Este coeficiente é um número adimensional que varia com a forma da bacia,


independentemente do seu tamanho; quanto mais irregular for a bacia, tanto maior
será o coeficiente de compacidade. Um coeficiente mínimo igual a unidade
corresponderia a uma bacia circular. Se os outros fatores forem iguais, a tendência
para maiores enchentes é tanto mais acentuada quanto mais próximo da unidade for o
valor desse coeficiente.
De um modo geral:
1 < Kc < 1,25  bacia sujeita a enchentes.
1,25 < Kc < 1,50  bacia medianamente sujeita a enchentes.
Kc > 1,5  bacia não sujeita a enchentes.

b) Fator de forma

Fator de forma – Kf – é a relação entre a largura média o comprimento axial da


bacia. Mede-se o comprimento da bacia (L) quando se segue o curso d’água mais longo

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desde a desembocadura até a cabeceira mais distante na bacia. A largura média (L) é
obtida quando se divide a área pelo comprimento da bacia.
L
Kf =
L
A A
Mas, L = , logo Kf = 2
L L

O fator de forma constitui outro índice indicativo da maior ou menor tendência


para enchentes de uma bacia. Uma bacia com um fator de forma baixo (Figura 6A –
Bacia A) é menos sujeita a enchentes que outra de mesmo tamanho, porém, com maior
fator de forma (Figura 6B – Bacia B). Isso se deve ao fato de que numa bacia estreita
e longa, com fator de forma abaixo, há menos possibilidade de ocorrência de chuvas
intensas cobrindo simultaneamente toda sua extensão; e também, numa tal bacia, a
contribuição dos tributários atinge o curso d’água principal em vários pontos ao longo
do mesmo, afastando-se, portanto, da condição ideal da bacia circular discutida no
item anterior, na qual a concentração de todo o deflúvio da bacia se dá num único
ponto.
De modo geral:
0,75< Kf < 1,00  bacia sujeita a enchentes.
0,50< Kf < 0,75  bacia medianamente sujeita a enchentes.
Kf < 0,50  bacia não sujeita a enchentes.

Figura 6. Bacia com fator de forma (A) baixo e (B) alto.


.
3.4.3 Sistema de drenagem

O sistema de drenagem de uma bacia é constituído pelo rio principal e seus


tributários; o estudo das ramificações e do desenvolvimento do sistema é importante,
pois ele indica a maior ou menor velocidade com que a água deixa a bacia hidrográfica.

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a) Ordem dos cursos d’água

A ordem dos rios é uma classificação que reflete o grau de ramificação ou


bifurcação dentro de uma bacia. Utilizando um mapa da bacia bem detalhado no qual
fossem incluídos todos os canais – quer sejam perentes, intermitentes ou efêmeros e
seguindo o critério introduzido por Horton, modificado por Strahler, os rios são
classificados da forma como é apresentada na Figura 7.
São consideradas de primeira ordem as correntes formadoras, ou seja, os
pequenos canais, que não tenham tributários; quando dois canais de primeira ordem se
unem é formado um segmento de segunda ordem; a junção de dois rios de segunda
ordem dá lugar à formação de um rio de terceira ordem e, assim, sucessivamente: dois
rios de ordem n dão lugar a um rio de ordem n + 1.
Assim, a ordem do rio principal mostra a extensão da ramificação na bacia.

Figura 7. Ordem dos rios de uma bacia.

b) Densidade de drenagem

Uma boa indicação do grau de desenvolvimento de um sistema de drenagem é


dada pelo índice chamado densidade de drenagem (Dd). Este índice é expresso pela
relação entre o comprimento total dos cursos d’água (sejam eles efêmeros,
intermitentes ou perenes) de uma bacia e a sua área total. Representando o
comprimento total dos cursos d’água na bacia por L e a área de drenagem por A, a
densidade de drenagem será dada pela expressão:
L
Dd =
A

O valor obtido é muito dependente do material utilizado, ou seja, fotografia


aérea ou carta topográfica. Podem variar de 0,93 km/km2 a 2,09 km/km2, quando se
utiliza cartas topográficas, e 5 a 13 quando se utiliza fotografias aéreas. Pode-se
classificar uma bacia, com base neste índice, da seguinte forma:

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De um modo geral:
Bacias com drenagem pobre : Dd < 0,5 km/km2
Bacias com drenagem regular : 0,5 < Dd < 1,5 km/km2
Bacias com drenagem boa : 1,5 < Dd < 2,5 km/km2
Bacias com drenagem muito boa : 2,5 < Dd < 3,5 km/km2
Bacias excepcionalmente bem drenadas : Dd > 3,5 km/km2

3.4.4 Características do relevo de uma bacia

O relevo de uma bacia hidrográfica tem grande influência sobre os fatores


meteorológicos e hidrológicos, pois a velocidade do escoamento superficial é
determinada pela declividade do terreno, enquanto que a temperatura, a precipitação,
a evaporação etc, são funções da altitude da bacia. É de grande importância, portanto,
a determinação de curvas características do relevo de uma bacia hidrográfica.

a) Declividade da bacia

A declividade dos terrenos de uma bacia controla em boa parte a velocidade


com que se dá o escoamento superficial, afetando portanto o tempo que leva a água
da chuva para concentrar-se nos leitos fluviais que constituem a rede de drenagem
das bacias.
A declividade média do rio também pode ser determinada com auxílio de mapas.
Utilizando um curvímetro, pode-se determinar o comprimento do curso d’água e, com
base na diferença de cotas entre o ponto mais alto do rio e o ponto em estudo,
calcula-se a sua declividade média.
Exemplo:

1 2 3 4 5 6
Número
Declividade em Porcentagem Porcentagem Declividade Col. 2 x Col.
de
m/m do total acumulada média do Int. 5
ocorrência
0,0000 – 0,0049 249 69,55 100,00 0,00245 0,6100
0,0050 – 0,0099 69 19,27 30,45 0,00745 0,5141
0,010 – 0,0149 13 3,63 11,18 0,01245 0,1618
0,0150 – 0,0199 7 1,96 7,55 0,01745 0,1222
0,0200 – 0,0249 0 0,00 5,59 0,02245 0,0000
0,0250 – 0,0299 15 4,19 5,59 0,02745 0,4118
0,0300 – 0,0349 0 0,00 1,40 0,03245 0,0000
0,0350 – 0,0399 0 0,00 1,40 0,03745 0,0000
0,0400 – 0,0449 0 0,00 1,40 0,04245 0,0000
0,0450 – 0,0499 5 1,40 1,40 0,04745 0,2373

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TOTAL 358 100,0 2,0572
Declividade média: 2,0572/358 = 0,00575 m/m

3.5 VAZÃO EM CURSOS D´ÁGUA

3.5.1 Introdução

Chama-se vazão ou descarga, numa determinada seção, ao volume de líquido que a


atravessa na unidade de tempo (Figura 8).

Figura 8. Seção transversal de uma massa líquido em escoamento.

Por definição, portanto,

V
Q= (equação 1)
t

em que:

Q é a vazão, m3 s-1, L s-1, m3 h-1, L h-1


V, volume de fluido, m3 e L
t, tempo, s, min, h.

mas V = A x L, então:

AxL
Q= ou Q = A x v (equação 2 – equação da continuidade)
t
em que:

A = área da seção transversal de escoamento, m2.


L = comprimento do volume gerado pelo escoamento, m.
v = velocidade de escoamento, m s-1.

3.5.2 Métodos de medição de vazão

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a) MÉTODO DIRETO

Também chamado de medição direta. É o processo mais simples, mas aplicável


somente a pequenos cursos d´água (0,5 a 15 L s-1). É o método padrão, utilizado para
aferir os equipamentos e processos de medição de vazão.
O método consiste em determinar o tempo necessário para que o curso d´água
encha um recipiente de volume conhecido. A vazão é determinada dividindo-se o
volume do recipiente pelo tempo médio gasto para enchê-lo.
Para que toda a água aflua no recipiente, é necessário fazer um dique, num
trecho adequado do rio, a fim de que o recipiente possa entrar livremente à jusante
do dique e captar toda a água do manancial (Figura 9). A afluência da água no
recipiente é facilitada pelo uso de calhas (telha, tubo, bambu, etc). Após a
estabilização da vazão, mede-se, com máximo rigor, o tempo gasto para enchimento do
recipiente. Deve-se fazer no mínimo 3 repetições do tempo, utilizando-se a média para
determinar a vazão.

Figura 9. Esquema da construção do dique, da colocação da calha e do recipiente para


medição direta da vazão.

A vazão é determinada pela equação 1.

Observações:

1. O dique deve ser bem construído para evitar infiltrações.


2. Escolher um recipiente que permita medir a vazão em um tempo
relativamente grande.
3. Para vazões maiores, pode-se utilizar o artifício de divisão da corrente
líquida em duas ou mais calhas, medindo-se a vazão individual destas. A vazão
do manancial será a soma das vazões de todas as calhas.
4. Deve-se esperar a estabilidade do fluxo, de modo que toda vazão do riacho
aflua pela bica.

b) MÉTODO DO FLUTUADOR

15
Este método é menos preciso que os métodos direto e do vertedor, sendo
normalmente usado em cursos d´agua maiores, onde é impraticável a medição direta, e
difícil a instalação de um vertedor.
Os flutuadores são dispositivos com características tais que lhes permitam
adquirir a mesma velocidade da água em que flutuam.
Dentre os três tipos de flutuadores usados, o mais simples é o superficial, que
mede a velocidade da superfície da corrente líquida. Ele pode ser uma pequena bola ou
um outro objeto de densidade menor que a da água. A inconveniência apresentada por
este tipo de flutuador é devida ao fato de seu deslocamento ser muito influenciado
pelo vento, pelas correntes secundárias e pelas ondas.
A vazão, usando-se o flutuador, será determinada pela equação da
continuidade:

Q=Axv

i. Determinação da velocidade média

- Escolher um trecho mais reto (Figura 10) e uniforme possível do curso d´água e
medir um intervalo de no mínimo 10 m.
- Fazer uma limpeza nas margens e no fundo do trecho escolhido e no início, ponto A, e
no fim deste, ponto B, colocar uma vara transversal à corrente, ou qualquer objeto,
para observar com melhor clareza, a passagem do flutuador.
- Soltar o flutuador a ± 5 metros à montante do ponto A.
- Marcar o tempo gasto pelo flutuador ao percorrer de A à B. Fazer 5 repetições e
determinar o tempo médio.
- De posse do espaço (comprimento do trecho) e do tempo médio, calcular a velocidade
de deslocamento do flutuador.

16
Figura 10. Trecho do curso d’água.
A velocidade determinada não é a média, porque a velocidade superficial, onde o
flutuador se desloca, é diferente da velocidade média. Para obtermos a velocidade
média, aplicamos fatores de correção na velocidade superficial determinada em
função da natureza das paredes.

Fatores de correção

- Canais com paredes lisas, ex: cimento.


vm = (0,85 a 0,95)v

- Canais com paredes pouco lisas, ex: canais de terra, para irrigação.
vm = (0,75 a 0,85)v

- Canais com paredes irregulares e/ou com vegetação nas paredes


vm = (0,65 a 0,75)v

Em que:
vm é a velocidade média;
v é a velocidade superficial

Determinação da seção média

É feita determinando-se a área de 3 seções (Figura 11) no trecho considerado:


uma no início, outra no fim e uma outra intermediária. Tira-se a média das áreas,
obtendo-se a área média das seções.

17
Figura 11. Seção do curso d’água.

Para se determinar a área de uma seção transversal de um curso d’água, como a da


Figura, pode-se usar o seguinte método:
- Dividir a seção transversal do curso d’água em sub-seções de larguras iguais,
preferencialmente.
- Determinar a profundidade nas extremidades das sub-seções.
- Calcular a área das sub-seções, baseando na forma geométrica mais próxima
(triângulo, retângulo, trapézio, etc).
- A área da seção transversal será a soma das áreas das sub-seções.

Exemplo 1. Determinar a vazão que escoa em curso d´água natural, cuja velocidade de
deslocamento foi determinada pelo método do flutuador. Num trecho de 15 m de
extensão fez-se 5 repetições do tempo de deslocamento do flutuador e estes foram:
68, 72, 73, 70 e 67 s. A largura da seção inicial medida foi 1,20 m e para determinar a
sua área, ela foi dividida em 5 sub-seções de largura igual a 24 cm, e as profundidades
medidas de margem à margem foram: 0, 12, 39, 48, 45 e 6 cm. Na seção intermediária
determinou-se os valores: largura 1,30 m, sub-seções de 26 cm e profundidades de 0,
14, 48, 48, 27 e 0 cm. Na seção final, largura 1,20 m, sub-seções de 24 cm e
profundidades de 0, 22, 35, 36, 33 e 0 cm.
Cálculo da velocidade média do curso d´água:

tm = (68 + 72 + 73 + 70 + 67)/5
tm = 70 s

v = 15/70
v = 0,214 m s-1

vm = 0,70 v
vm = 0,70 x 0,214
vm = 0,15 m s-1

Cálculo da seção transversal média

Determinação da área da seção inicial:

18
( B  b) (0  0,12)
ai =  h  a1 =  0,24 = 0,0144 m2
2 2
(0,12  0,39)
a2 =  0,24 = 0,0612 m2
2
(0,39  0,48)
a3 =  0,24 = 0,1044 m2
2
(0,48  0,45)
a4 =  0,24 = 0,1116 m2
2
(0,45  0,06)
a5 =  0,24 = 0,0612 m2
2

A1 = a1 + a2 + a3 + a4 + a5
A1 = 0,0144 + 0,0612 + 0,1044 + 0,1116 + 0,0612
A1 = 0,3528 m2

Faz-se o mesmo procedimento para a seção intermediária e final:


A2 = 0,3288 m2
A3 = 0,3024 m2
A = (0,3528 + 0,3288 + 0,3024)/3 = 0,328 m2

Q = 0,328 x 0,15
Q = 0,0492 m3 s-1 ou 49,2 L s-1

4) CHUVA

4.1 Introdução

Nas regiões tropicais, a chuva, ou precipitação pluvial, é a forma principal pela


qual a água retorna da atmosfera para a superfície terrestre após os processos de
evaporação e condensação, complementando, assim, o ciclo hidrológico. A quantidade e
a distribuição de chuvas que ocorrem anualmente em uma região determinam o tipo de
vegetação natural e também o tipo de exploração agrícola possível.

4.2 Condensação na atmosfera

Para que haja condensação do vapor dágua na atmosfera é necessário a


presença de núcleos de condensação, em torno dos quais são formadas as gotículas que
constituirão as nuvens. Os núcleos de condensação são partículas higroscópicas, entre
as quais o NaCl, de origem marítima, é o mais abundante, visto que dois terços da
superfície terrestre é coberta por oceanos. Além da presença de núcleos de
condensação, o vapor dágua na atmosfera condensa-se quando as condições tendem à
saturação, o que pode ocorrer de duas maneiras: a) pelo aumento da pressão de vapor

19
dágua devido à evaporação e à transpiração e b) por resfriamento do ar. Na realidade
esses dois processos podem ocorrer simultaneamente, mas na natureza, o segundo é
bastante efetivo em promover a formação de orvalho e de nuvens. No caso dessas
últimas, a formação ocorre quando parcelas de ar úmido sobem e se resfriam
adiabaticamente, devido à expansão interna causada pela diminuição da pressão
atmosférica.

4.3 Formação da chuva

O processo de condensação por si só não é capaz de promover a precipitação,


pois são formadas gotículas muito pequenas, denominadas de elementos de nuvem, que
permanecem em suspensão sustentada pela força de flutuação térmica. Para que haja
precipitação, deve haver a formação de gotas maiores (elementos de precipitação), e
isto ocorre por coalescência das pequenas gotas, de forma que a ação da gravidade
supere a força de sustentação promovendo a precipitação. A coalescência é o
resultado de diferenças de temperatura, tamanho, cargas elétricas, e de movimentos
turbulentos dentro da nuvem. Quanto mais intensa for a movimentação dentro da
nuvem, maior será a probabilidade de choque entre as gotas, resultando em gotas
sempre maiores.

4.4 Tipos de chuva

Os tipos de chuvas se caracterizam pela sua origem. Assim, existem chuvas


geradas por passagem de frentes, por convecção local, e por efeitos orográficoas
(montanhas).

a) Chuvas frontais

São originárias de nuvens formadas a partir do encontro de massas de ar frio e


quente. A massa quente e úmida (mais leve) tende a se elevar, resfriando-se
adiabaticamente, isto, sem troca de calor com o meio adjacente (Figura 12). Nesse
processo forçado de subida da massa úmida ocorre a condensação. As chuvas frontais
caracterizam-se por: intensidade moderada a fraca, longa duração (dias), e sem
horário predominante para sua ocorrência.

20
Figura 12. Chuvas frontais

b) Chuvas convectivas

Originam-se de nuvens formadas a partir de correntes convectivas (térmicas)


que se resfriam adiabaticamente ao se elevarem, resultando em nuvens de grande
desenvolvimento vertical (cumuliformes), como pode ser visto na Figura 13. As chuvas
convectivas se caracterizam por forte intensidade, mas curta duração, podem ocorrer
descargas elétricas, trovoadas, ventos fortes e granizo, predominando no período da
tarde e à noite, quando a força gravitacional supera a força de sustentação térmica.

Figura 13. Chuvas convectivas.

As chuvas convectivas, também conhecidas como chuvas de verão , por terem


maior intensidade, apresentam grande potencial de danos, especialmente no aspecto
de conservação do solo, visto que muitas vezes sua intensidade supera a velocidade de
infiltração da água no solo. Isto gera escoamento superficial (enxurrada), que
ganhando momento (quantidade de movimento), poderá causar erosão do solo, desde
que outros fatores como cobertura do solo, umidade, e declividade também
contribuam para isso.

c) Chuvas orográficas

21
As chuvas orográficas (Figura 14) ocorrem em regiões montanhosas, onde o
relevo força a subida da massa de ar úmido. Essa subida forçada é equivalente ao
processo de convecção livre, resultando nos mesmos fenômenos atmosféricos. Devido
aos ventos, o ar sobe pela encosta resfriando-se adiabaticamente, com condensação e
formação de nuvens tanto cumuliformes como estratiformes. Nessa situação, um lado
da montanha, geralmente, é mais chuvoso que o outro resultando na chamada Sombra
de Chuva.

Figura 14. Chuvas orográficas


4.5 Medida de chuva

Um índice de medida de chuva é a altura pluviométrica, que é a altura de água


precipitada, expressa em milímetros (mm). Essa altura pluviométrica (h) é definida
como sendo o volume precipitado por unidade de área horizontal do terreno, ou seja:

h = 1 litro de água/1 m2 de terreno = 1000 cm3/10000 cm2 = 0,1 cm = 1 mm

Outro índice de expressão da chuva é a sua intensidade (i), definida como a


altura pluviométrica por unidade de tempo:

I = mm/hora

Podendo “i” ser expresso também em mm/min. Esse índice tem aplicação em
dimensionamento de sistemas de drenagem e conservação do solo, tanto para a
agricultura como construção civil.
O equipamento básico de medição da chuva é o pluviômetro (Figura 15), que é
constituído de uma área de captação (> 100 cm2) e de um resevatório onde a água da
chuva é armazenada até o momento da leitura. Se o pluviômetro tiver um sistema de
registro contínuo da quantidade e da hora de ocorrência das chuvas, então ele é
denominado de pluviógrafo.

22
Figura 15. Pluviômetro.

5.INFILTRAÇÃO DA ÁGUA NO SOLO

5.1 Introdução

A infiltração é o processo pelo qual a água atravessa a superfície do solo. A


modelagem deste processo é de grande importância prática, pois a taxa de infiltração
da água no solo é um dos fatores que mais influencia o escoamento superficial,
responsável por processos indesejáveis, como a erosão e as inundações. A infiltração
determina o balanço de água na zona radicular e, por isso, o conhecimento deste
processo e suas relações com as propriedades do solo é de fundamental importância
para o eficiente manejo do solo e da água. O conhecimento do processo de infiltração
também fornece subsídios para o dimensionamento de reservatórios, estruturas de
controle de erosão e de inundação, canais e sistemas de irrigação e drenagem.

5.2 Fatores que Intervêm na Infiltração

A infiltração é um processo que depende, em maior ou menor grau, de diversos


fatores, os quais são descritos subseqüentemente.

a) Características do Solo

23
A textura e a estrutura são características que influenciam expressivamente a
movimentação da água no solo, uma vez que determinam a quantidade de macroporos
presentes em seu perfil, os quais são de extrema importância na condutividade
hidráulica do solo. Também interferem expressivamente na infiltração a forma dos
poros e a sua continuidade.
Solos de textura grossa, ou seja, arenosos, possuem maior quantidade de
macroporos que os de textura fina (argilosos) e, conseqüentemente, apresentam
maiores condutividade hidráulica e taxa de infiltração. Já os solos argilosos bem
estruturados, ou com estrutura estável, podem mostrar maiores taxas de infiltração
do que os com estrutura instável, que sofrem dispersão quando umedecidos ou
submetidos a algum agente desagregador. A estabilidade dos agregados é
determinada pelos chamados agentes cimentantes, que são representados
principalmente pela matéria orgânica e pelos óxidos de Fe e AI. Dessa forma, à
medida que aumentam estes compostos solo, maior é a possibilidade de ele apresentar
estrutura mais estável.
Solos mais intemperizados são caracterizados pela presença predominante de
óxidos de Fe e Al em relação às argilas silicatadas. Assim, em diversos trabalhos
realizados em solos formados sob condições de clima tropical, como é freqüente no
cerrado brasileiro, tem sido demonstrado que mesmo em solos com altos teores de
argila podem-se ter elevadas taxas de infiltração, o que é justificado pelo alto grau de
desenvolvimento da estrutura destes. Portanto, para as condições brasileiras, a
estrutura do solo pode exercer influência muito mais expressiva na taxa de infiltração
do que a textura.
Rawls et al. (1996) apresentam valores indicativos da taxa de infiltração para
solos de diferentes classes texturais sob condições de cultivo e pastagem (Quadro 1).

Quadro 1 - Taxas de infiltração estável para solos de diferentes classes texturais

Taxa de infiltração estável (mm h-1)


Textura do solo
Cultivo Patagem
Areia franca 38,1 – 94,0 38,1 – 111,8
Franco-arenoso 17,8 – 30,5 30,5 – 38,1
Franco 10,2 – 27,9 25,4 – 63,5
Franco-siltoso 5,1 – 48,3 10,2 – 91,4
Franco-argiloso 10,2 – 25,4 15,2 – 25,4
Franco-argilo-siltoso 7,6 – 33,0 7,6 – 33,0
Argila 5,1 27,9
Fonte: North Central Regional Committee 40, citado por Rawls et al. (1996)

b) Tipo de Cobertura do Solo

24
A natureza da superfície é fator determinante no processo de infiltração.
Áreas urbanizadas apresentam menores taxas de infiltração que áreas agrícolas, por
terem altas percentagens de impermeabilização da superfície do solo, o que limita a
sua capacidade de infiltração. Além disso, o sistema radicular das plantas cria
caminhos preferenciais que favorecem o movimento da água, tal como pode ser visto
na Figura 16.
Tem-se ressaltado em várias pesquisas a importância de práticas como a
manutenção de cobertura vegetal para a conservação do solo. A cobertura vegetal é
responsável pelo aumento da macroporosidade da camada superficial e protege os
agregados do impacto direto das gotas de chuva e, conseqüentemente, é capaz de
manter altas taxas de infiltração e diminuir consideravelmente as perdas de água e
solo. Duley (1939) verificou que solos descobertos apresentaram reduções da taxa de
infiltração de até 85% em relação àqueles protegidos por palha. Silva e Kato (1998),
avaliando a taxa de infiltração estável (ou taxa de infiltração básica) em solos de
cenado (Latossolo Vermelho-Amarelo argiloso), usando simulador de chuvas (com
intensidade de aplicação de aproximadamente 90 mm/h), encontraram valor para os
solos sem cobertura igual a 61,3 mm/h, enquanto para os solos com cobertura morta
este valor foi de 76,3 mm h’. Os autores atribuíram esta diferença à formação de
encrostamento superficial nos solos desprovidos de cobertura vegetal.

Figura 16. Sistema radicular das plantas criando caminhos preferenciais que
favorecem o movimento da água.

25
Oliveira (2000) avaliou a taxa de infiltração da água em um solo com
diferentes tipos de cobertura utilizando um simulador de chuva com intensidade de
aplicação de 70 mm/h (Quadro 2). Ao analisar os dados do Quadro 2 fica evidente
que os maiores valores foram observados para as condições com cobertura vegetal,
com destaque para as parcelas com mucuna e vegetação espontânea. O autor atribuiu
esse comportamento às características do sistema radicular da mucuna e da
vegetação espontânea predominante (caruru-de-porco). Durante o crescimento das
raízes, criaram-se canais que favoreceram o movimento da água no perfil. O autor
ressalta também que o número de plantas nas unidades experimentais com vegetação
espontânea era consideravelmente superior ao daquelas com mucuna. Em conseqüência,
pode ter existido maior quantidade de canais biológicos, responsáveis pela grande
taxa de infiltração neste tratamento.

Quadro 2 - Taxa de infiltração estável de acordo com o tipo de cobertura do solo

Cobertura Taxa de infiltração estável (mm/h)


Sem cobertura 27,5
Vegetação espontânea 47,6
Mucuna 45,7
Milho 32,5
Fonte: Oliveira (2000)

c) Tipo de Preparo e Manejo do Solo

Em geral, quando se prepara o solo, a capacidade de infiltração tende a


aumentar, em razão da quebra da estrutura da camada superficial. No entanto, se as
condições de preparo e manejo forem inadequadas, sua capacidade de infiltração
poderá tomar-se inferior à de um solo sem preparo, principalmente se a cobertura
vegetal for removida. Uma vez formado o selamento superficial e, em muitos casos,
este é estabelecido muito rapidamente após as primeiras precipitações, a taxa de
infiltração da água no solo é consideravelmente reduzida (Pruski et al., 1997a).
Silva e Kato (1997) avaliaram a infiltração em um Latossolo Vermelho-Amarelo
argiloso sujeito a três condições diferentes de manejo: sistema de cultivo tradicional,
plantio direto e cerrado virgem e verificaram que os parâmetros físicos-hídricos que
mais influenciam a infiltração (macroporosidade e condutividade hidráulica) foram
bem maiores no local onde prevalecia a cobertura natural do cerrado virgem. No
Quadro 3 é apresentada a média dos resultados encontrados pelos autores.

26
Quadro 3 – Valores médios das principais características físico-hídricas dos solos
relacionadas à infiltração
Densidade Porosidade (cm3/cm3)
Condutividade
Tipo de cobertura do solo
Total Micro Macro hidráulica
(g/cm3)
Cerrado virgem 0,66 0,69 0,30 0,39 26,7
Plantio direto 0,92 0,60 0,40 0,20 1,3
Manejo 0,84 0,63 0,39 0,24 8,2
convencional

Alves e Cabeda (1999) avaliaram a infiltração em um Pdzólico Vermelho-escuro


sob preparo convencional e plantio direto, usando chuvas simuladas com intensidades
médias constantes de 63,0 e 87,0 mm/h, e verificaram que a taxa de infiltração
estável foi maior no plantio direto que no convencional e no plantio direto não houve
diferença na taxa de infiltração para as duas intensidades. No entanto, para o preparo
convencional, a taxa foi menor sob chuva de maior intensidade (Quadro 4).
O tráfego intenso de máquinas sobre a superfície do solo, principalmente
quando se utiliza o sistema convencional de preparo, produz uma camada compactada
que reduz a capacidade de infiltração da água no solo. Solos situados em áreas de
pastoreio também sofrem intensa compactação, ocasionada pelas patas dos animais
(Pruski et al., 1997).

Quadro 4 – Taxas de infiltração estável para preparo convencional e plantio direto


sob duas intensidades de precipitação

Intensidade de precipitação Taxa de infiltração estável (mm/h)


(mm/h) Convencional Plantio direto
63 27,5 46,6
87 17,3 47,2

d) Encrostamento Superficial

O encrostamento superficial causado pelo impacto das gotas de chuva é de


ocorrência comum, particularmente em solos intensivamente cultivados, como
mencionado anteriormente. A superfície do solo apresenta-se compacta e, embora a
espessura da camada de encrostamento superficial possa ser pequena, seu efeito
sobre as propriedades físicas do solo influencia, acentuadamente, as condições de
infiltração.
A seqüência de eventos envolvidos no processo de formação do
encrostamento superficial é apresentada em muitos trabalhos e, resumidamente,
pode-se descrevê-la da seguinte forma: quebra dos agregados de solo pelo impacto
das gotas de chuva; movimento das partículas finas e dispersas ao longo de poucos
centímetros abaixo da superfície e sua deposição nos poros do solo; compactação da
27
camada superficial do solo pelo impacto da gotas d’água, produzindo uma camada
delgada de solo expressiva mente adensada; e deposição do material fino em
suspensão, com a conseqüente orientação das partículas de argila.
A ocorrência de encrostamento no solo não depende somente das
características de sua superfície, como textura, estrutura e presença de cobertura
vegetal, mas também das características da chuva. Dentre estas, as mais utilizadas
para caracterizar o encrostamento são a intensidade da chuva, o diâmetro médio e a
velocidade final da gota.

5.3 Métodos de Determinação da Infiltração

a) Infiltrômetro de Anel

Consiste de dois anéis que são posicionados de forma concêntrica no solo


(Figura 17). O interno deve apresentar diâmetro da ordem de 300 mm e o externo,
diâmetro de 600 mm, com altura de aproximadamente 300 mm. Os anéis, cujas bordas
devem ser bizeladas, são cravados verticalmente no solo, deixando-se uma borda livre
ligeiramente superior a 150 mm. O anel externo tem como finalidade reduzir o efeito
da dispersão lateral da água infiltrada do anel interno. Assim, a água do anel interno
infiltra no perfil do solo em uma direção predominantemente vertical, o que evita
superestimativa da taxa de infiltração.

Figura 17. Disposição dos anéis para a determinação da TIE no solo.

Durante a realização do ensaio deve-se manter uma lâmina de 30 a 50 mm no


cilindro interno, sendo a altura da lâmina d’água medida com uma régua colocada
verticalmente dentro do anel interno. No anel externo, a lâmina d’água deve ser
mantida apenas para assegurar que o processo de infiltração não sofra interrupção e,
conseqüentemente, ocorra dispersão lateral da água infiltrada a partir do anel interno.
O ensaio deve ser realizado até que a taxa de infiltração, observada no anel interno,
torne-se aproximadamente constante com o tempo. Normalmente, a taxa de
infiltração é considerada constante quando o valor da leitura da lâmina infiltrada no
anel interno se repete pelo menos três vezes. Os dados obtidos em um ensaio
realizado com infiltrômetro de anel podem ser tabulados conforme no Quadro 5.

28
Quadro 5 – Exemplo de planilha para coleta de dados de testes com infiltrômetro de
anel.
Tempo acumulado Régua (cm) Infiltração acumulada
Hora
(min) Leitura Diferença (cm)
13:00 0 5 - -
13:04 4 3,5/5 1,5 1,5
13:09 9 3,8/5 1,2 2,7
13:14 14 4,0/5 1,0 3,7
13:19 19 3,9/5 1,1 4,8
13:24 24 4,2/5 0,8 5,6
13:29 29 4,0/5 1,0 6,6
13:34 34 4,0/5 1,0 7,6
13:39 39 4,0/5 1,0 8,6
13:44 44 4,2/5 0,8 9,4
13:54 54 3,4/5 1,6 11,0
14:04 64 3,1/5 1,9 12,9
14:14 74 3,5/5 1,5 14,4
14:24 84 3,2/5 1,8 16,2
14:34 94 3,4/5 1,6 17,8
14:44 104 3,4/5 1,6 19,4
14:54 114 3,5/5 1,5 20,9
15:04 124 3,4/5 1,6 22,5
15:14 134 3,5/5 1,5 24,0
15:24 144 3,5/5 1,5 25,5
15:34 154 3,7/5 1,3 26,8
15:44 164 3,4/5 1,6 28,4
15:54 174 3,4/5 1,6 30,0
16:04 184 3,4/5 1,6 31,6
16:14 194 3,4/5 1,6 33,2
16:24 204 3,4/5 1,6 34,8

b) Simuladores de Chuva

Os simuladores de chuva são equipamentos nos quais a água é aplicada por


aspersão com uma intensidade de aplicação superior à capacidade de infiltração do
solo, exceto para um curto intervalo de tempo, logo após o início da precipitação. A
área de aplicação de água é delimitada por placas metálicas, sendo a taxa de
infiltração obtida pela diferença entre a intensidade de precipitação e a taxa de
escoamento superficial resultante (Pruski et al., 1997a).
Os dados obtidos em ensaio realizado com simulador de chuvas podem ser
tabulados conforme mostrado no Quadro 6, no qual são apresentadas as informações
relativas a um teste feito em um Latossolo-Roxo distrófico (Pruski et al.. 1997b). A
29
parcela sobre a qual foi aplicada a chuva simulada era de 90 cm de comprimento e 90
cm de largura, enquanto a caixa de coleta do escoamento superficial tinha 100 cm de
comprimento, 70 cm de largura e 30 cm de altura. A cada intervalo de cinco minutos
eram feitas leituras da altura de água dentro da caixa de coleta. O simulador de
chuvas operou com intensidade de precipitação (Ip) constante de 67,5 mm/h. Os
simuladores de chuva foram desenvolvidos para simular condições típicas de chuvas
naturais, como velocidade de impacto e distribuição do tamanho das gotas da chuva,
intensidade de precipitação, ângulo de impacto das gotas e capacidade de reproduzir a
intensidade e a duração das chuvas intensas (Meyer, citado por Rawls et al., 1996).

Quadro 6 – Exemplo de planilha para coleta de dados de testes com simulador de


chuvas
T (min) t (min) HES (mm) VolES (cm3) TES (mm/h) Ti (mm/h)
5 5 1,2 840 12,4 55,1
10 5 1,9 1330 19,7 47,8
15 5 2,2 1540 22,8 44,7
20 5 2,5 1750 25,9 41,6
25 5 2,6 1820 27,0 40,5
30 5 2,8 1960 29,0 38,5
35 5 2,9 2030 30,1 37,4
40 5 3,0 2100 31,1 36,4
45 5 3,1 2170 32,1 35,5
50 5 3,1 2170 32,1 35,4
55 5 3,2 2240 33,2 34,3
60 5 3,3 2310 34,2 33,3
65 5 3,3 2310 34,2 33,3
70 5 3,4 2380 35,3 32,2
75 5 3,4 2380 35,3 32,2
80 5 3,4 2380 35,3 32,2

5.4 Comparação dos métodos de determinação da infiltração

O infiltrômetro de anel superestima a taxa de infiltração em relação ao


simulador de chuvas devido ao encrostamento da superfície do solo sob chuva
simulada, enquanto no infiltrômetro de anel isso não ocorre, uma vez que não existe o
impacto das gotas de precipitação contra a superfície do solo. Outro fator que
contribui para que as taxas de infiltração obtidas com infiltrômetro de anel sejam
maiores que as conseguidas com o simulador de chuvas é que no infiltrômetro de anel
existe uma lâmina de água sobre a superfície do solo, que proporciona maior potencial
para se conseguir a infiltração.

30
6.ESCOAMENTO SUPERFICIAL

6.1 Introdução

O escoamento superficial corresponde ao segmento do ciclo hidrológico


relacionado ao deslocamento das águas sobre a superfície do solo. O conhecimento
deste segmento é de fundamental importância para o projeto de obras de engenharia,
pois a maioria dos estudos hidrológicos está ligada ao aproveitamento da água
superficial e à proteção contra os fenômenos provocados pelo seu deslocamento.

6.2.Fatores que intervêm no escoamento superficial

Todos os fatores que influenciam a taxa de infiltração da água no solo


interferem, também, no escoamento superficial resultante.

a) Agroclimáticos
O escoamento superficial tende a crescer com o aumento da intensidade e a
duração da precipitação e da área abrangida pela precipitação, a qual constitui a
principal forma de entrada de água no ciclo hidrológico.
A cobertura e os tipos de uso do solo, além de seus efeitos sobre as condições
de infiltração da água no solo, exercem importante influência na interceptação da
água advinda da precipitação. Quanto maior a porcentagem de cobertura vegetal e
rugosidade da superfície do solo, menor o escoamento superficial.
A evapotranspiração também representa importante fator para retirada de
água do solo. Portanto, quanto maior a evapotranspiração, menor será a umidade do
solo quando da ocorrência de precipitação e, conseqüentemente, maior será a taxa de
infiltração e menor o escoamento superficial.

b) Fisiográficos

Quanto maior a área e a declividade da bacia, maior deverá ser a vazão máxima
de escoamento superficial que ocorrerá na seção de deságüe da bacia e quanto mais a
forma da bacia aproximar-se do formato circular, mais rápida deverá ser a
concentração do escoamento superficial e, conseqüentemente, maior deverá ser a sua
vazão máxima.
Quanto às condições de superfície, dentre os fatores que mais influenciam o
escoamento superficial, podem-se citar:
• tipo de solo: interfere diretamente na taxa de infiltração da água no solo e na
capacidade de retenção de água sobre sua superfície;
• topografia: além de influenciar a velocidade de escoamento da água sobre o solo,
interfere também na capacidade de armazenamento de água sobre este, sendo as
31
áreas mais declivosas geralmente com menor capacidade de armazenamento
superficial do que as mais planas;
• rede de drenagem: rede de drenagem muito densa e ramificada permite a rápida
concentração do escoamento superficial, favorecendo, conseqüentemente, a
ocorrência de elevadas vazões sobre a superfície do solo; e
• obras hidráulicas presentes na bacia: enquanto as obras destinadas à drenagem
ocasionam aumento da velocidade de escoamento da água na bacia, as obras destinadas
à contenção do escoamento superficial resultam em redução da vazão máxima em uma
bacia.

6.3 Práticas conservacionistas de controle da erosão hídrica

Reduzindo-se a erosão, os cursos d’água, lagos e represas ficam mais protegidos


contra o rápido assoreamento. Mantendo-se os sedimentos fora da água, evita-se o
incremento de nutrientes nela, reduzindo-se os efeitos indesejáveis do
desenvolvimento excessivo de algas e outros vegetais, Os poluentes presos às
partículas de solo devem ser mantidos fora da água pela conservação do solo na gleba.
O controle das fontes de poluição d’água é, portanto, também concernente à
conservação do solo.
As práticas conservacionistas dividem-se edáficas, vegetativas e mecânicas,
conforme modificações utilizadas nos sistemas de cultivo, na vegetação, ou se recorra
à construção de estruturas de terra para a contenção do escoamento superficial,
respectivamente.

6.3.1 PRÁTICAS DE CARÁTER EDÁFICO

As práticas de caráter edáfico são aquelas em que se procura adequar o sistema


de cultivo de modo a manter ou melhorar a fertilidade do solo e, consequentemente,
manter sua superfície com maior cobertura. Dentre elas podem-se citar: controle das
queimadas, adubação adequada (verde, química e orgânica) e calagem do solo.

a) Controle das queimadas

O fogo é ainda muito utilizado por agricultores e pecuaristas na limpeza de


áreas recém-desbravadas (Figura 18), por constituir um procedimento de fácil
emprego para cumprir esta finalidade. Além de eliminar o trabalho e as dificuldades
de enterrio dos resíduos das culturas, reduz a incidência de pragas e doenças que
atacam as culturas; entretanto, muitos prejuízos advêm do seu uso, tendo em vista o
fato de que a queima da matéria orgânica e a volatilização do nitrogênio acarretam
diminuição da fertilidade do solo e a conseqüente degradação das áreas cultivadas.
Após a queima dos resíduos vegetais na superfície do solo, o desenvolvimento
32
vegetativo é mais intenso, uma vez que as cinzas que contêm elementos nutritivos em
estado altamente solúvel propiciam o rápido crescimento dos vegetais. As áreas
submetidas a queimadas sucessivas, entretanto, vão ficando cada vez mais pobres, em
conseqüência da queima da matéria orgânica, fundamental ao solo.

Figura 18. Uso de queimadas na limpeza de áreas recém-desbravadas.

b) Adubação verde

Consiste na incorporação de plantas especialmente cultivadas para este fim ou


de restos de plantas forrageiras e ervas ao solo, constituindo uma das formas mais
baratas e acessíveis de repor a matéria orgânica, proporcionando melhoria das suas
condições físicas e estimulando os processos físicos, químicos e biológicos. Com o
emprego de métodos de cultivo reduzido, como o plantio direto, os restos de plantas
são deixados sobre a superfície, sendo paulatinamente incorporados ao solo por via
biológica, trazendo resultados ainda mais favoráveis.
Uma área protegida pela cobertura vegetal apresenta diversas vantagens em
relação à outra descoberta. Dentre essas, destacam-se: dificulta o desencadeamento
do processo erosivo, por reduzir o impacto direto da chuva sobre o solo, diminuindo as
perdas de solo e nutrientes; favorece a infiltração da água no solo; atua como isolante
térmico, atenuando a ocorrência de grandes amplitudes térmicas no solo; apresenta
efeito supressor e, ou alelopático sobre diversas plantas invasoras; favorece, quando
na forma de cobertura morta, a manutenção da umidade no solo, reduzindo as perdas
por evaporação; cria condições ambientais que favorecem o aumento das atividades
microbianas no solo; e contribui para o aumento da meso e macrofauna do solo
(minhocas, insetos, etc).
Muitas plantas utilizadas na adubação verde (Figura 19) são aproveitadas como
fonte forrageira para os animais, como produtoras de néctar e pólen para abelhas,

33
além de ser empregadas na alimentação humana. Essas plantas têm também a
capacidade de reciclar nutrientes distribuídos no perfil do solo, tornando-os
disponíveis às culturas posteriores. As leguminosas são ainda responsáveis pelo
aproveitamento do nitrogênio atmosférico pela simbiose (bactéria/raízes das
legminosas).

Figura 19. Adubação verde.

c) Adubação química

A adubação química do solo é necessária para repor regularmente os nutrientes


retirados pelas culturas, de forma a manter um nível adequado desses elementos
nutritivos essenciais, uma vez que quando ocorre a queda da fertilidade do solo há
duplo prejuízo, decorrente da queda do rendimento da cultura e da redução do nível
de proteção do solo pela cobertura vegetal.

d) Adubação orgânica

A adubação orgânica (Figura 20) desempenha importante função na melhoria das


condições do solo para o desenvolvimento das culturas e, consequentemente, para a
redução das perdas de solo e água. O esterco, além de oferecer matéria orgânica já
em estado de decomposição e os elementos nutritivos ao solo, tem a vantagem de
fornecer também compostos orgânicos, favorecendo o desenvolvimento das culturas.

34
Figura 20. Adubação orgânica.
e) Calagem

A acidez excessiva do solo prejudica o desenvolvimento da maioria das plantas,


diminuindo a sua produção. Nos solos ácidos, o crescimento dos microrganismos é
reduzido, principalmente das bactérias fixadoras do nitrogênio do ar. A acidez
também prejudica a absorção de fósforo pelas plantas.
A correção da acidez é feita com a aplicação de calcário ao solo na operação
conhecida como calagem (Figura 21). O cálcio neutraliza a acidez, proporcionando
melhores condições para o desenvolvimento das plantas, melhorando a cobertura do
solo.

Figura 21. Aplicação de calagem.

6.3.2 PRÁTICAS DE CARÁTER VEGETATIVO

As práticas de caráter vegetativo são aquelas que se valem da vegetação para


proteger o solo contra a ação direta da precipitação e, consequentemente, para
minimizar o processo erosivo.
Enquanto as práticas edáficas visam, fundamentalmente, melhorar a fertilidade
do solo, o que irá propiciar maior produção de biomassa e, consequentemente, maior
cobertura de superfície, as práticas vegetativas valem-se dessa cobertura vegetal

35
para minimizar as perdas solo. O uso das práticas vegetativas baseia-se, portanto, na
busca da manutenção da superfície do solo coberta.

a) Florestamento e reflorestamento

Solos com baixa fertilidade e alta susceptibilidade à erosão devem ser


ocupados com vegetação densa e permanente (Figura 22), como é o caso das florestas,
recomendadas principalmente nas seguintes condições: na ocupação de solos das
classes VI, VII e VIII; para utilização e recuperação de solos desgastados ou
extremamente erodidos; e para a proteção de mananciais e cursos de água. A
cobertura florestal constitui ótimo empreendimento econômico na utilização de solos
com restrições para o cultivo de culturas anuais, uma vez que permite o
aproveitamento racional da madeira, celulose, papel, lenha, carvão, etc. Como regra
geral devem ser reflorestadas, para fins de conservação, as áreas sem aptidão
agrícola ou pecuária e as áreas definidas pela legislação (Código florestal). O artigo 2º
do Código Florestal determina as áreas onde a vegetação natural é considerada
permanente:
a) As faixas marginais de qualquer curso d’água natural perene e intermitente,
excluídos os efêmeros, desde a borda da calha do leito regular, em largura mínima
de: (Incluído pela Lei nº 12.727, de 2012).
1) 30 (trinta) metros, para os cursos d’água de menos de 10 (dez) metros de largura;
2) 50 (cinquenta) metros, para os cursos d’água que tenham de 10 (dez) a 50
(cinquenta) metros de largura;
3) 100 (cem) metros, para os cursos d’água que tenham de 50 (cinquenta) a 200
(duzentos) metros de largura;
4) 200 (duzentos) metros, para os cursos d’água que tenham de 200 (duzentos) a 600
(seiscentos) metros de largura;
5) 500 (quinhentos) metros, para os cursos d’água que tenham largura superior a 600
(seiscentos) metros;

a) Ao redor das lagoas, lagos ou reservatórios de águas naturais ou artificiais;


b) Nas nascentes, mesmo nos chamados “olhos d’água”, seja qual for a sua
situação topográfica;
c) No topo de morros, montes, montanhas e serras;
d) Nas encostas ou parte destas com declividade superior a 45 graus,
equivalente a 100% na linha de maior declive;
e) Nas restingas, como fixadoras de dunas ou estabilizadoras de mangues;
f) Nas bordas dos tabuleiros ou chapadas;
g) Em altitude superior a 1.800 (mil e oitocentos) metros, nos campos naturais
ou artificiais, nas florestas nativas e nas vegetações campestres, e
h) Nas áreas metropolitanas definidas em lei (Lei 6535/78).”

36
Figura 22. Reflorestamento.
No caso das matas ciliares (Figura 23), utilizadas nas margens dos rios, o
principal efeito em relação à erosão hídrica está no fato de essas apresentarem
rugosidade hidráulica elevada, reduzir a velocidade do escoamento, o que diminui a
capacidade de transporte de sedimentos e, consequentemente, favorece a deposição
de sedimentos que estejam sendo transportados pelo escoamento superficial.

Figura 23. Mata ciliar na margem de um rio.

b) Pastejo rotacionado

As pastagens fornecem boa proteção ao solo contra a erosão. O manejo


inadequado delas, entretanto, pode prejudicar o cumprimento dessa função, uma vez
que o pisoteio intensivo pode torná-la escassa. Constitui boa alternativa para evitar
essa ocorrência o uso do sistema de rotação de pastoreio (Figura 24). Para isso, a área
destinada ao pastoreio é dividida em piquetes, para onde o gado é conduzido conforme
planejamento preestabelecido. Assim, fazendo-se com que não seja excessivamente
37
consumida e pisoteada pelos animais, a pastagem terá plenas condições de se
recompor antes de ser submetida a novo pastoreio. O ressemeio periódico da área
constitui prática recomendável para manter a pastagem com densidade de cobertura
capaz de assegurar suporte razoável para o gado e garantir boa proteção do solo
contra a erosão.
Considerando a grande difusão de seu uso atualmente, especial atenção merece a
integração lavoura-pecuária, que consiste em conciliar a pecuária bovina com a
produção de grãos na mesma área. Esse tipo de prática representa importante avanço
para a sustentabilidade na agropecuária, permitindo o uso mais intensivo da
propriedade e a redução dos custos de produção, o que possibilita, consequentemente,
o aumento da produtividade e o do lucro do produtor rural.

Figura 24. Área com rotação de pastoreio.

c) Manutenção da superfície do solo coberta

A utilização das chamadas “plantas de cobertura” (Figura 25) visa manter o solo
coberto durante o período chuvoso, a fim de reduzir os efeitos da erosão e melhorar
as suas condições físicas e químicas. As plantas de cobertura, além de reduzirem os
efeitos da erosão, proporcionam eficiente proteção da matéria orgânica do solo
contra a ação direta dos raios solares, uma vez que, nas regiões tropicais, quando o
solo descoberto é submetido à ação direta do sol e da chuva, ocorre decomposição
muito rápida da matéria orgânica, acarretando queda na produtividade. As plantas de
cobertura possibilitam boa proteção do solo, reduzindo o efeito prejudicial dos
fatores meteorológicos.

38
Figura 25. “Ervilhaca peluda” como planta de cobertura.

Outro benefício que essas plantas apresentam no controle do processo erosivo é


a produção de matéria orgânica para a incorporação ao solo (adubação verde). No caso
das culturas anuais, as plantas de cobertura são cultivadas nos períodos
compreendidos entre os ciclos das culturas, substituindo-as assim que são colhidas.
No caso de culturas perenes, as plantas de cobertura são cultivadas para cobrir o solo
nos espaços compreendidos entre as culturas. O cultivo de plantas de cobertura pode
ser contra-indicado quando o risco de disseminação de pragas ou doenças que atacam a
cultura principal for grande.

d) Cultivo em contorno

O preparo do solo, o plantio e a realização de todos os trabalhos acompanhando


as curvas em nível (Figura 26) constituem práticas indispensáveis para a conservação
do solo, devendo ser sempre associadas às demais práticas, quaisquer que sejam as
condições do terreno. O cultivo em contorno somente pode ser usado como prática
isolada de controle da erosão em terrenos com declividade de até 3% e pequeno
comprimento de rampa.
Em áreas terraceadas, o preparo, plantio e cultivo do solo em nível reduzem a
erosão nas faixas compreendidas entre terraços, uma vez que o aumento da
rugosidade superficial decorrente dos sulcos deixados pela semeadora ou pelo
cultivador, perpendicularmente ao declive, forma obstáculos pra o escoamento
superficial, reduzindo a sua velocidade e, consequentemente, a capacidade de
transporte de sedimentos. Os sulcos formados pelas rodas do trator, nos quais a
compactação é mais acentuada e a velocidade de infiltração da água no solo é menor,
são menos suscetíveis à erosão quando posicionados perpendicularmente ao declive.
Quando o solo é preparado e cultivado no sentido do declive, a água que não infiltra
concentra-se nos sulcos formados pelas rodas do trator ou pelos próprios
implementos, favorecendo a erosão.
39
Nesse método, cada linha de plantas atua como pequena barreira retardando o
livre escoamento das águas pluviais e favorecendo a sua infiltração.
Vários estudos demonstram que o plantio em contorno pode reduzir em até 50%
as perdas de solo e diminuir também as perdas de água por escoamento superficial,
além de elevar a produção.

Figura 26. Cultivo em contorno.

Para se instalar o plantio em contorno como prática conservacionista isolada,


são demarcadas no terreno curvas de nível, espaçadas horizontalmente de 40 a 50 m;
o plantio é executado dispondo-se as linhas de plantas paralelamente àquelas curvas
de nível, denominadas niveladas básicas.

e) Cultivo em faixas

Consiste em dispor as culturas em faixas de largura variável, de tal forma que, a


cada ano, se alternem, em determinada área, plantas com cobertura densa e outras
que ofereçam menor proteção ao solo. As faixas devem ser dispostas em nível.
As faixas de crescimento denso amortecem a velocidade da enxurrada que escoa
das faixas adjacentes, provocando a deposição do solo que vinha sendo
transportado.
Essa prática, quando utilizada isoladamente, é recomendada a terrenos com
declives de cerca de 3 a 5%, dependendo da suscetibilidade do solo à erosão, do
regime de chuvas e do tipo de cultura.
Em áreas com declives maiores que os citados, deve-se intercalar, entre as
faixas das culturas, faixas de retenção vegetativa ou mesmo terraços, de acordo com
as condições locais.
A adoção deste tipo de prática geralmente permite maior conservação da
matéria orgânica no solo, devendo ser escolhidas preferencialmente rotações que
incluam a combinação de culturas de raízes profundas e raízes fasciculadas.

f) Cordões de vegetação permanente, barreiras vivas ou faixas de retenção


40
Essa prática consiste na formação de faixas de vegetação de alta densidade,
dispostas em nível e em espaços regulares sobre o terreno (Figura 27). As faixas de
retenção são responsáveis pela redução da velocidade de escoamento superficial e,
consequentemente, da capacidade de transporte de sedimentos. Com isso, formam-se,
junto às faixas de retenção, pequenos diques naturais decorrentes da deposição e do
acúmulo de sedimentos.
As plantas utilizadas na formação das faixas de retenção devem apresentar as
seguintes características principais: ciclo vegetativo longo; grande densidade de
raízes; desenvolvimento rápido da parte aérea; não serem invasoras e também que se
prestem a algum aproveitamento. As mais indicadas são a cana-de-açúcar, o capim-
napier, a erva-cidreira, etc. Em determinadas ocasiões, a faixa de retenção pode ser
formada utilizando-se da vegetação natural do terreno.

Figura 27. Faixas de retenção vegetativa

g) Ceifa de plantas daninhas

Uma das maneiras mais eficientes de controlar a erosão nas culturas perenes é
substituir as capinas pela ceifa das plantas daninhas, contando-as a uma pequena
altura da superfície do solo. Com o emprego desta prática, fica intacto o sistema
radicular das plantas daninhas e das plantas perenes, permanecendo sobre a
superfície do solo uma pequena vegetação protetora, constituída dos caules das
plantas cortadas. As plantas daninhas devem ser continuamente controladas com o uso
de roçadoras mecânicas, para que não haja prejuízo da cultura de interesse por causa
da concorrência imposta pelo restante da cobertura vegetal, uma vez que a ceifa não
destrói completamente as plantas daninhas. A freqüência dessa operação deve ser
maior do que a das capinas, pois os pequenos caules das plantas daninhas deixados
sobre o solo brotam mais rapidamente que quando o controle é feito por meio de
capinas. As plantas daninhas podem também ser controladas por meio de herbicidas.

41
Dentre as vantagens associadas ao uso da ceifa do mato, quanto à realização de
capinas, para o controle da erosão, podem ser citadas: a não mobilização da camada
superficial do solo; e a manutenção de parte da cobertura do solo que reduz o efeito
da desagregação decorrente da energia cinética da chuva e a incidência direta da
radiação solar sobre a superfície do solo, tornando, consequentemente, o processo de
decomposição da matéria orgânica mais lento.

h) Alternância de capinas

Consiste em fazer as capinas alternando as faixas de mobilização do solo,


deixando sempre uma ou duas faixas com cobertura vegetal logo abaixo daquelas
recém-capinadas. A terra transportada das faixas capinadas será retida pelas faixas
com cobertura vegetal que ficam imediatamente abaixo, e que promovem o
retardamento do escoamento superficial. Em cada faixa o número de capinas deve ser
o mesmo do sistema usual.
Em outras palavras, essa prática consiste em capinar, alternadamente, no
sentido transversal ao declive, as ruas de uma cultura, ou seja, uma rua sim outra não,
mantendo-se com vegetação a metade da área que estaria descoberta se fossem
capinadas ao mesmo tempo todas as ruas; numa segunda etapa, são capinadas as ruas
que não foram capinadas anteriormente.

i) Cobertura morta

A cobertura morta, também conhecida por “mulch” (Figura 28), é uma técnica
que consiste em distribuir sobre a superfície do solo uma camada de palhas ou outros
resíduos vegetais, que são distribuídos entre as linhas das culturas ou apenas até a
projeção da copa das plantas, dependendo da disponibilidade de material. Como
exemplos de cobertura morta, podem-se citar as palhas de capim, de arroz, de café,
sabugos de milho, etc. Em determinadas ocasiões, as próprias plantas daninhas podem
ser utilizadas como cobertura morta pela aplicação de herbicidas de contato, como
ocorre nas lavouras permanentes, sobretudo no caso do café.
A cobertura morta, com palha ou resíduos vegetais, protege o solo contra o
impacto das gotas da chuva, diminui o escoamento superficial e incorpora nele a
matéria orgânica que aumenta a sua resistência ao processo erosivo. No caso da
erosão eólica, protege-o contra a ação direta dos ventos e dificulta o transporte das
partículas.
Além de ser uma eficiente prática para a conservação do solo e da água,
contribui para amenizar a temperatura do solo, controla plantas daninhas, serve
também como adubo orgânico pela decomposição do material utilizado em cobertura,
além de contribuir para o aumento da produção das lavouras.

42
Figura 28. Cobertura morta

f) Rotação de culturas

Consiste em alternar, em seqüência definida numa gleba, culturas com


exigências diferentes e sistemas radiculares diferentes. Baseia-se, portanto, em não
se repetir durante muito tempo uma mesma cultura num mesmo local.
Basicamente os fundamentos que regem a rotação de culturas, visam cultivos
alternados de culturas, com exigências diferentes de fertilidade e tipos diferentes
de raízes, alternância de culturas susceptíveis a doenças e pragas e cultivares
resistentes, culturas que esgotam o solo e culturas que melhoram a sua fertilidade ou
protejam-no e culturas com diferentes necessidades de mão de obra, máquinas e
equipamentos, água, tipo de preparo do solo, etc, em épocas diferentes do ano.
Além de contribuir para manter ou restaurar a fertilidade do solo, ajuda
também no controle de pragas, doenças e plantas daninhas em áreas anteriormente
ocupadas por apenas uma cultura. Recomendações específicas a planos de rotação de
culturas irão depender das particularidades de cada região, como: condições
climáticas, aspectos de mercado, tipo de exploração agropecuária, conveniências do
agricultor, etc.
Para tanto, as tabelas abaixo apresentam alguns exemplos de rotação de
cultura.
Primeiro Ano Segundo Ano
Verão Inverno Verão Inverno
Soja Tremoço Milho Trigo

Estação Primeiro ano Segundo ano Terceiro ano


Verão Milho Soja Soja
Inverno Aveia preta Trigo Tremoço

43
6.3.3. PRÁTICAS DE CARÁTER MECÂNICO

As práticas de caráter mecânico são aquelas em que se utilizam estruturas


artificiais, visando à interceptação e condução do escoamento superficial, sendo a
mais importante o terraceamento de terras agrícolas. Nas práticas mecânicas, o
principal efeito consiste na interceptação do escoamento superficial, diminuindo a
energia associada a este, o que reduz tanto a capacidade de desprendimento de
partículas como a capacidade de transporte daquelas partículas já desprendidas.
Assim, os terraços e as barraginhas e as bacias de acumulação não atuam diretamente
nas causas do processo erosivo, mas no sentido de segmentar a distância percorrida
pelo escoamento superficial, visando reduzir a energia associada a esse. São práticas
que agem em fases mais avançadas do processo erosivo, à medida que vão atuar no
controle da energia associada ao escoamento superficial.
Essas práticas devem ser utilizadas como complementares às práticas edáficas e
vegetativas, que, por atuarem em fases mais iniciais do processo erosivo, são mais
efetivas no controle da erosão.

a) Construção de terraços

As águas que caem nas terras de cultivo são captadas pelos terraços. Os
terraços poderão desaguar numa via de drenagem natural, caso exista. Quando isso
não é possível, deverá ser construído um canal escoadouro vegetado. O terraço é o
conjunto formado pela combinação de um canal com um camalhão ou dique de terra
(Figura 29), construído com intervalos apropriados, no sentido transversal ao declive
do terreno, destinado a conter as enxurradas, forçando a infiltração da água pelo solo
ou a drenagem lenta e segura do excesso d’água. O terraceamento é uma prática
eficiente para o controle da erosão, desde que seja criteriosamente planejado,
executado e mantido.

44
Figura 29. Terraceamento: canal com camalhão.

A eficiência de um sistema de terraceamento depende também da combinação


de outras práticas complementares, como plantio em nível, rotação de culturas,
controle de queimadas e manutenção de cobertura morta na superfície do solo. O
custo de construção e manutenção de um sistema de terraceamento é relativamente
alto. Por essa razão, antes da adoção dessa tecnologia deve-se fazer um estudo
criterioso das condições locais, como clima, solo, sistema de cultivo, culturas a serem
implantadas, relevo do terreno e equipamento disponível, para que se tenham
segurança e eficiência no controle da erosão. O rompimento de um terraço pode levar
à destruição dos demais que estiverem a jusante, com grandes prejuízos à área
cultivada.

b) Contenção de voçorocas

Obras de interceptação do fluxo de sedimentos que escoa por ravinas abertas


na paisagem causadas pela concentração, em um só ponto, de águas superficiais com
grande volume e velocidade, aliadas à baixa capacidade de resistência de alguns solos.

c) Construção de pequenas barragens (barraginhas)

Confecção de pequenas estruturas de acúmulo de água localizadas em pontos


estrategicamente selecionados dentro da bacia de drenagem (Figura 30). Estas
represas terão finalidade várias tais como: retenção de água em época de chuvas,
controle de vazão de pico de chuvas, piscicultura, consumo humano ou animal,
recreação e embelezamento.

45
Figura 30. Barraginha construída no semi-árido brasileiro.

c) Construção de bacias de acumulação de água e retenção de sedimentos

Locação e construção de pequenas bacias, lateralmente e ao longo de estradas


em declive. Tais bacias são ligadas ao sistema de drenagem do leito viário e têm a
função de captar as enxurradas, acumulando-as por algum tempo, de modo a propiciar
a infiltração lenta destas águas no solo, diminuindo os efeitos da erosão e melhorando
a recarga dos aqüíferos subterrâneos.
As bacias de acumulação são estruturas construídas nos terrenos em forma de
bacias, com a finalidade de armazenar, por algum tempo, e infiltrar águas de chuvas.
São feitas com trator de esteiras, retroescavadeira ou pá carregadeira e até
manualmente.
Essas bacias recebem a água de enxurradas, o que evita o carreamento de solos.
Com isso diminui a erosão, evitando o assoreamento dos rios e promovendo a recarga
dos lençóis que irão abastecer as nascentes de água.
As bacias retangulares variam de 3x6m a 6xl0m, profundidade 0,8 m até 2m.
Podem ter forma arredondada, variando de 3m diâmetro a 15m. Precisam ser
dimensionadas de modo a comportar o volume de água captado.
Podem ter formas arredondadas, meia-lua, retangular, quadradas, indefinidas. O
importante é evitar o escoamento das águas por meio das enxurradas na superfície do
solo, o que causaria erosão laminar e outros.

7. NASCENTES

46
7.1INTRODUÇÃO

Entende-se por nascente o afloramento do lençol subterrâneo, que vai dar


origem a uma fonte de água de acúmulo (represa), ou cursos d’água (regatos, ribeirões
e rios). Em virtude de seu valor inestimável dentro de uma propriedade agrícola, deve
ser tratada com cuidado todo especial.
A nascente ideal é aquela que fornece água de boa qualidade, abundante e
contínua, localizada próxima do local de uso e de cota topográfica elevada,
possibilitando sua distribuição por gravidade, sem gasto de energia.
É bom ressaltar que, além da quantidade de água produzida pela nascente, é
desejável que tenha boa distribuição no tempo, ou seja, a variação da vazão situe-se
dentro de um mínimo adequado ao longo do ano. Esse fato implica que a bacia não deve
funcionar como um recipiente impermeável, escoando em curto intervalo de tempo
toda a água recebida durante uma precipitação pluvial. Ao contrário, a bacia deve
absorver boa parte dessa água através do solo, armazená-la em seu lençol subterrâneo
e cedê-la, aos poucos, aos cursos d’água através das nascentes, inclusive mantendo a
vazão, sobretudo durante os períodos de seca. Isso é fundamental tanto para o uso
econômico e social da água - bebedouros, irrigação e abastecimento público, como para
a manutenção do regime hídrico do corpo d’água principal, garantindo a disponibilidade
de água no período do ano em que mais se precisa dela.
Assim, o manejo de bacias hidrográficas deve contemplar a preservação e
melhoria da água quanto à quantidade e qualidade, além de seus interferentes em uma
unidade geomorfológica da paisagem como forma mais adequada de manipulação
sistêmica dos recursos de uma região.
As nascentes, cursos d’água e represas, embora distintos entre si por várias
particularidades quanto às estratégias de preservação, apresentam como pontos
básicos comuns o controle da erosão do solo por meio de estruturas físicas e
barreiras vegetais de contenção, minimização de contaminação química e biológica e
ações mitigadoras de perdas de água por evaporação e consumo pelas plantas.
Quanto à qualidade, deve-se atentar que, além da contaminação com produtos
químicos, a poluição da água resultante de toda e qualquer ação que acarrete aumento
de partículas minerais no solo, da matéria orgânica e dos coliformes totais pode
comprometer a saúde dos usuários – homem ou animais domésticos.
Os fluxos de base que sustentam as nascentes, provenientes dos lençóis
subterrâneos, têm grande importância não só temporal, mas também espacial, pois são
capazes de possibilitar que todos os usuários de água da bacia, inclusive os das
cabeceiras, tenham água durante as estiagens.
Por fim, deve-se estar ciente de que a adequada conservação de uma nascente
envolve diferentes áreas do conhecimento, tais como hidrologia, conservação do solo,
reflorestamento, etc. Objetiva-se, nesse trabalho, apresentar cada um dos
interferentes principais, de modo sistemático e integrado.

47
Não se pretende explicar aqui todos os mecanismos responsáveis pelas
nascentes, já que se trata de um assunto bastante complexo, envolvendo estudos de
geologia, geomorfologia, hidrologia, solos e vegetação. Pretende-se apenas fornecer
informações básicas para um trabalho de conservação.

7.2 PANORAMA ATUAL DAS NASCENTES

Em geral, quando analisamos o panorama atual das nascentes de cabeceira


chegamos a algumas conclusões indesejáveis, como:
- O número de nascentes de uma mesma bacia está diminuindo;
- A vazão que brota de cada nascente está diminuindo ao longo do tempo;
- As nascentes estão sendo soterradas e contaminadas por defensivos agrícolas,
e
- as nascentes estão mudando de lugar, aproximando-se cada vez mais, das
partes mais baixas.
Isto vem acontecendo, principalmente, por causa das diversas formas de
degradação que vêm ocorrendo no meio ambiente.

7.2.1Principais causas da degradação de nascentes

As principais causas da degradação que vem ocorrendo nas bacias de cabeceira


sãos as seguintes:

a) Corte intensivo das florestas nativas

O desmatamento ocorre, basicamente, em função da busca por maiores


produções por meio da expansão das áreas produtivas. Com esses objetivos, muitos
produtores implantam suas lavouras nas encostas e nos topos, e, para isso, retiram as
florestas desses locais.
As árvores cumprem a função de amortecer o impacto das gotas das chuvas,
evitando a compactação da camada superficial, e facilitando assim a infiltração de
água no solo. As florestas, também, fornecem matéria orgânica ao solo, produzida
pelas folhas e galhos que caem e se decompoõem sobre o mesmo, melhorando suas
características físicas.
Quando uma floresta é cortada, o solo fica exposto ao sol e desprotegido contra
os impactos das gotas de chuvas. Nessas condições, grande parte da camada
superficial do solo, será arrastada pelas enxurradas para as partes mais baixas,
deixando o solo, desses locais, mais pobre e compactado. Em consequência, ocorrerá
perda de nutrientes, diminuição da infiltração de água, aumento da intensidade das
enxurradas, podendo ocasionar voçorocas, que são grandes valas, que se formam ao
longo das encostas. Além disso, o material arrastado das partes mais altas será
depositado no leito dos cursos d’água, causando assoreamento.

48
b) Queimadas

Após o desmatamento, quase semrpe, faz-se uma queimada para eliminar restos
de florestas (cipós, tocos, galhos e restos das copas das árvores). As queimadas são
extremamente nocivas aos solos, pois elas destroem a matéria orgânica da camada
superficial do solo, eliminam os microrganismos benéficos do solo e dificultam a
infiltração da água da chuva, dada a facilidade com que ocorre o escoamento
superficial. Além disso, no momento das queimadas, o fogo pode sair de controle e
colcocar em risco outras áreas próximas.

c) Pastoreio intensivo

A criação extensiva de animais em áreas de cabeceiras é uma das formas mais


graves de agressão aos mananciais. Isso, porque, na maioria das vezes, as áreas das
bacias de cabeceira são subdivididas em pequenas propriedades, nas quais as partes
utilizadas como pasto, recebem um número excessivo de animais. Essa superlotação
dos pastos, principalmente com bovinos e equídeos, resulta na formação de um elevado
número de trilhas nas encostas, com aspecto de arquibancada. O pisoteio constante de
animais, nessas trilhas, provoca um alto grau de compactação do solo, de forma que
impede a infiltração da água da chuva. E, não ocorrendo a infiltração da água, as
trilhas contribuem para o seu espalhamento na área, originando pequenos caminhos de
erosão, que são as ravinas. Ao longo do tempo, ocorre a degradação generalizada da
pastagem nas encostas.

d) Mal planejamento na contrução de estradas

A maioria das estradas construídas nas áreas de encosta não passou por um
planejamento adequado, visando a proteção das nascentes. Cortes para a construção
de estradas são realizados em locais indevidos do terreno, deixando o solo exposto
aos processos de erosão, causados pelas chuvas. Além disso, o solo solto, será
arrastado para os leitos dos rios, causando o seu assoreamento.

e) Loteamento em locais impróprios

A degradação das áreas de encosta, não ocorre apenas no meio rural, mas
também nas grandes cidades. O crescimento desordenado, sem um planejamento
adequado, faz com que nas periferias, se aglomerem um grande número de pessoas.
Desses aglomerados, a compactação do solo, a erosão e o assoreamento dos cursos
d’água. Além disso, a falta de estrutura adequada de saneamento básico, faz com que,
nessas áreas, surjam fontes de poluição ambiental, que irão causar a contaminação dos
mananciais.

f) Reflorestamento
49
Essa é uma opção que nem sempre surte o efeito desejado, quando o objetivo é a
recuperação e a conservação das nascentes. Um exemplo que pode ser citado é o das
nascentes da comunidade rural do Paraíso (Viçosa-MG). Nos anos 60, elas eram
responsáveis pelo abastecimento de água da cidade de Viçosa-MG. As nascentes nessa
região secaram com a substituição de pastagens pelo aumento progressivo da
regeneração natural de florestas secundárias. A prática tem mostrado que, em muitos
casos, o reflorestamento causa o efeito contrário desejado. Isso acontece,
basicamente, devido à ocupação das árvores nas partes baixas e na meia encosta que
se dá de uma forma intensiva e sem controle, aumentando a evapotranspiração no
local. O fenômeno é mais nítido com as espécies freatóficas situadas nas partes
baixas, nas proximidades das nascentes. As freatófitas possuem sistema radicular
adaptado para consumir grande quantidade de água, mesmo das camadas mais
profundas do solo, inclusive do lençol freático. Na ocasião das chuvas, essas árvores
desempenham o papel desejado, que é o de proporcionar maior taxa de infiltração de
água no solo. Porém, na época de seca, as raízes dessas árvores, estando em contato
com o lençol freático, absorvem boa parte da água, lançando-a em seguida na
atmosfera, na forma de vapor, pelo processo de transpiração. E, assim, na época de
seca, o volume do lençol freático será consideravelmente reduzido, fazendo com que a
vazão da nascente associada a ele também diminua, ou até mesmo deixe de existir.
Outra causa na redução da vazão das nascentes é a presença nas proximidades
de outras freatófitas de menor porte e mais densas, entre as quais, a taboa, a
mariazinha (lírio de brejo), o gravatá e o junco, são as mais comuns. Como, nessas
áreas, o lençol freático está a baixa profundidade, o sistema radicular desse tipo de
vegetação fica em contato direto com a água, atuando de forma significativa na sua
retirada.

Importante: deve-se ter em mente que o reflorestamento mal planejado reduz o


volume de água das nascentes, quando: a) a evapotranspiração for maior do que a
precipitação anual, com evidências em alguns meses na estação seca; b) em solos
profundos, a intensa regeneração das árvores provocar efeitos significativos na
interceptação da chuva pelas copas e na absorção de água pelas raízes, impedindo
maior disponibilidade para a percolação profunda e c) as espécies freatófitas
(lenhosas ou herbáceas) extraírem água do lençol e da franja capilar em grande
quantidade. Entretanto, é indispensável a presença de árvores nos topos de morros, se
entendendo até 1/3 das encostas, para recuperação e conservação de nascentes.

g) Outras fontes de contaminação

Outras causas da degradação de bacias de cabeceiras são as diversas fontes de


contaminação dos mananciais. As principais fontes são: - despejos contínuos de lixos
próximos dos leitos dos rios, - lançamento de esgotos nos cursos d’água e poluição
química (defensivos agrícolas).
50
7.3 LEGISLAÇÃO APLICADA ÀS NASCENTES

De acordo com o artigo 4º da Lei 12.651/2012, considera-se área de


preservação permanente (APP), em áreas rurais ou urbanas, as áreas no entorno
das nascentes e dos olhos d’água perenes, qualquer que seja sua situação
topográfica, no raio mínimo de 50 (cinquenta) metros.
Nos casos de áreas rurais consolidadas em Áreas de Preservação
Permanente no entorno de nascentes e olhos d’água perenes, será admitida a
manutenção de atividades agrossilvipastoris, de ecoturismo ou de turismo rural,
sendo obrigat ória a recomposição do raio mínimo de 15 (quinze) metros.
(Incluído pela Lei nº 12.727, de 2012).
Definição de ÁREA RURAL CONSOLIDADA: área de imóvel rural com ocupação
antrópica preexistente a 22 de julho de 2008, com edificações, benfeitorias ou
atividades agrossilvopastoris, admitida, neste último caso, a adoção do regime de
pousio.

7.4 CLASSIFICAÇÃO QUANTO À ORIGEM

As nascentes, quanto às origens, podem ser formadas por lençóis freáticos


(apenas depositados sobre as camadas impermeáveis) quanto artesianos (confinados
entre duas camadas impermeáveis), podendo surgir por contatos das camadas
impermeáveis com a superfície, por afloramento dos lençóis em depressões do
terreno, por falhas geológicas ou por canais cársticos. Na origem da maioria dos
nossos córregos estão nascentes de contato ou de depresssão, proveniente de lençóis
freáticos. As de contato, como normalmente surgem no sopé de morros, são
conhecidas como nascentes de encosta (Figura 31). As nascentes de encosta surgem
em decorrência da inclinação da camada impermeável ser menor que a da encosta.
Neste tipo de nascente, o fluxo de água ocorre em um único local do terreno. Já
as nascentes de depressão podem se manifestar em pontos de borbulhamento bem
51
definidos, chamados de olhos d’água; ou então, por pequenos vazamentos superficiais
espalhados por uma área que se apresenta encharcada (brejo) e vai acumulando água
em poças até dar início a fluxos contínuos, sendo conhecidas como nascentes difusas
(Figura 31).

Figura 31. Nascentes de encosta e difusa.

As provenientes de lençóis artesianos podem ser de contato, ocorrendo


normalmente em regiões montanhosas, com fortes declives entre áreas próximas, o
que facilita o afloramento das camadas impermeáveis, responsáveis pelo confinamento
dos lençóis (Figura 32).

Figura 32. Nascentes de contato.

Podem, também, ser provenientes de canais e galerias formadas em rochas


cársticas (rochas carbonatadas) e que podem ser alimentados pela água de chuva
(Figura 33).

52
Figura 33. Nascentes de rochas cársticas.

7.5. CLASSIFICAÇÃO DAS NASCENTES QUANTO À VAZÃO

Podemos classificar as nascentes dos cursos d’água pela persistência de seus


fluxos, em: perenes, intermitentes ou efêmeras (também chamadas de temporárias).
Nascentes perenes se manifestam essencialmente durante o ano todo, mas com
vazões variando ao longo do mesmo. Em épocas muito secas e em locais onde o leito do
curso d’água seja formado de material muito poroso, o seu ponto de afloramento pode
ficar muito difuso.
Nascentes intermitentes fluem durante a estação chuvosa, mas secam durante
parte do ano (estação seca). Os fluxos podem perdurar de poucos semanas até meses.
Em anos muito chuvosos, podem dar a impressão de serem perenes.
Nascentes temporárias ou efêmeras ocorrem somente em resposta direta à
precipitação. São mais freqüentes nas regiões áridas e semi-áridas, mas ocorrem em
todos os tipos de clima.
Quanto às vazões produzidas pelas nascentes, elas são muito variáveis, desde
aquelas com cerca de um litro por minuto até outras com milhares de litros por minuto
(Quadro 1), tudo dependendo do tamanho e da riqueza dos lençóis responsáveis por
elas. Mas o que importa, nesse aspecto, é que mesmo aquelas com menos de um litro
por minuto acabam sendo responsáveis pelo primeiro córrego de um grande rio. E os
rios somente serão perenes, correndo ao longo de todo ano, se sustentados por
nascentes também perenes.

Quadro 1. Classificação das nascentes em função dos valores de vazão.


Classe ou Magnitude Vazão (L min-1)
1 >170.000
2 17.000 – 170.000
3 1.700 – 17.000
4 380 – 1.700
53
5 38 -380
6 4 - 38
7 0,6 - 4
8 < 0,6
Fonte: Valente e Gomes (2005).

Como há, atualmente, uma grande preocupação com a queda de vazão dos rios nas
épocas de secas, vale lembrar que esse comportamento tem início na diminuição da
quantidade de água de chuva que penetra no solo, produzindo lençóis fracos e
nascentes de baixa ou nenhuma vazão na estiagem. Salvar rios, portanto, é salvar
primeiro sua nascente e como estas nascentes são produtos de suas bacias, elas
precisam ser adequadamente manejadas para fins de produção de água, além de
outros bens.

7.6 CLASSIFICAÇÃO DAS NASCENTES QUANTO AO SEU ESTADO DE


CONSERVAÇÃO

As nascentes podem ser classificadas de acordo com a sua conservação, em:


preservada, perturbada e degradada. As nascentes são consideradas como
PRESERVADAS quando apresentam todos os quadrantes com total cobertura vegetal
e ausência de fatores de perturbação; PERTURBADAS, aquelas que apresentam pelo
menos 1 dos quadrantes com cobertura vegetal parcial, e ou com presença de fatores
de perturbação e, DEGRADADAS: aquelas onde em pelo menos um dos quadrantes a
cobertura vegetal está totalmente ausente.

7.7 PRESERVAÇÃO DE NASCENTES

As nascentes, quaisquer que seja sua localização, são consideradas, de acordo


com a Lei Federal n° 12.651 de 2012, áreas de preservação permanente (APPs),
estando estabelecido que na área compreendida num raio de 50 metros de cada
nascente é Área de Preservação Permanente (APP). No entanto, esta exigência não é
obedecida e grande parte das nascentes está em avançado estado de degradação.
Muitas delas estão rodeadas por atividades agropecuárias, recebendo grande aporte
de pesticidas e fertilizantes, ficando predispostas ao pisoteio de animais e, ou, ao
assoreamento, decorrente do uso e manejo inadequado do solo. Como conseqüência,
muitas nascentes vêm diminuindo consideravelmente a sua vazão ou até secando, além
de ter a qualidade de sua água deteriorada.
Para recuperar e preservar as nascentes, algumas precauções e modificações
são proporcionar isolamento da área de captação e distribuição adequada dos
diferentes usos do solo.
54
7.7.1 Isolamento da área de captação e recomposição na área de APP

a) Isolamento

A área adjacente à nascente (APP) deve ser toda cercada (Figura 34) a fim de
evitar a penetração de animais, homens, veículos, etc. Todas as medidas devem ser
tomadas para favorecer seu isolamento, tais como proibir a pesca e a caça, evitando-
se a contaminação do terreno ou diretamente da água por indivíduos inescrupulosos.
Quando da realização de alguma obra ou serviço temporário, deve-se construir fossas
secas a 30 m, no mínimo, mantendo-se uma vigilância constante para não haver poluição
da área circundante à nascente.

Figura 34. Nascente cercada.

Primeiramente, a área deverá ser aceirada, afim de protegê-la da ocorrência do


fogo, além de facilitar a abertura de covas para estacas.
A cerca deverá ser composta de 4 fios de arame farpado (250 a 350 kgf, de
2,0 a 2,2 mm – Galvanização tipo A), estacas de eucalipto tratado (de 2,5 metros em
2,5 metros, chapeado, com 2,20 m de comprimento e diâmetro de 9 a 12 cm) e
grampos para fixação do arame (19 x 11), Galvanização tipo A.
Para quantificar a necessidade de estacas, segue exemplo de cálculo:
- Considerando um raio de 50 metros de preservação, o comprimento da
circunferência é dado por:
C = 2r = 2 x 3,14 x 50 = 314 metros

55
Este comprimento, dividido por 2,5 metros, que é o espaçamento entre estacas,
resultará num total de 127 estacas por nascente.

b) Recomposição Florestal

Primeiramente, deve-se avaliar a possibilidade de regeneração da cobertura


florestal presente na área e a presença de fragmento por perto.
A Recuperação natural é adotada em áreas pouco perturbadas e desenvolve-
se sem a intervenção humana, ou seja, por meio da germinação natural de sementes e
por brotamento espontâneo de tocos e raízes, portanto, sendo esses dois processos
naturais os responsáveis pela renovação da vegetação. É o método mais econômico
para restauração de ambientes degradados, já que usa-se menos mão-de-obra e
insumos em comparação com as outras técnicas de recuperação, podendo dessa forma
reduzir de forma significativa o custo na recuperação de áreas perturbadas,
principalmente áreas de médio e grande porte.

7.7.2 Distribuição adequada dos diferentes usos do solo

A posição de uma nascente na propriedade pode determinar a melhor


distribuição das diferentes atividades e também da infra-estrutura do sistema
produtivo. A área imediatamente circundante à nascente, em um raio de 50 m, é Área
de Preservação Permanente e, como tal, não deve estar sujeita a qualquer tipo de uso.
Caso seja cultivada, a nascente ficará sujeita ao soterramento e as atividades
agrícolas de preparo do solo, adubação, plantio, cultivo, colheita e transporte dos
produtos podem provocar contaminação física, biológica e química da água.
Áreas de pastagem e os animais devem estar afastados, ao máximo, da
nascente, pois, mesmo que os animais não tenham livre acesso à água, seus dejetos
podem, durante a ocorrência de chuvas, ser carreados e poluir a água. Além disso,
permitindo-se o acesso dos animais (Figura 35-A), o pisoteio proporciona a
compactação do solo, turvando a água e podendo provocar o soterramento da
nascente.

56
Figura 35. Distribuição espacial das culturas e estruturas rurais nas situações errada
(A) e corrigida (B) visando-se a proteção da nascente.
Fonte: Adaptado de Silveira (1984), citado por CALHEIROS et al. (2004).

No desenho B da Figura 35 está apresentada a distribuição correta das


atividades na propriedade agrícola, afastando a área de pastagem da nascente e
providenciando a instalação de bebedouros para os animais. Com isso, se consegue
afastá-los da área de nascente. Em relação à exploração agrícola, deve-se posicionar a
cultura, na qual se utiliza a maior quantidade de produtos químicos, o mais afastado
possível da nascente, a fim de evitar que nas épocas das chuvas esses poluentes
venham a contaminar suas águas.
Na Figura 36 está apresentada, esquematicamente, a distribuição adequada da
cobertura vegetal e uso do solo, em áreas ou microbacias hidrográficas contendo uma
nascente.

57
Figura 36. Distribuição esquemática adequada das diferentes coberturas vegetais e
usos em relação à nascente.
Fonte: Calheiros et al. (2004).

De acordo com Castro e Lopes (2001), a distribuição da vegetação no entorno das


nascentes pode ser das mais variadas. Para efeito apenas de entendimento, parte-se
do pressuposto de que a área de drenagem da nescente, no caso a de encosta, tenha a
forma de um triângulo, onde a sua extremidade superior (base) seja o divisor
topográfico (espigão) e a extremidade inferior ou vértice do triângulo, o local do
aparecimento da nascente, tal como esquematizado na Figura 37.

58
Figura 37. Esquema da área de drenagem de uma nascente de encosta, subdividida nos
setores A, B e C, com as proposições do tipo de vegetação em cada setor e suas
respectivas funções.
A partir da Figura 37, pode-se então imaginar uma série de alternativas de
tipos de vegetação e conseqüente distribuição dentro de cada setor e entre setores
(Figura 38).

Figura 38. Proposição de alternativas quanto a ocupação de tipos de vegetação nos


compartimentos dos setores da área de drenagem de uma nascente.

Os esquemas apresentados tanto na Figura 37 quanto na Figura 38 foram


elaborados de uma situação hipotética onde a bacia hidrográfica da nascente recebe
um suprimento uniforme de chuva, durante todo o ano e maior que a quantidade
evapotranspirada, em condições de provocar excessos de água para fazer aparecer a
nascente.

7.7.3 Redistribuição das estradas rurais

A maioria das estradas rurais não teve o seu traçado planejado adequadamente,
de forma a se procurar resguardar a integridade das nascentes locais. É costume
planejar o traçado escolhendo-se as áreas de relevo mais favorável, o que nem sempre
é o mais adequado. Existe a possibilidade, com a realização de cortes, expor
horizontes do solo com ausência ou fraca estrutura, o que pode proporcionar
desbarrancamentos que podem soterrar nascentes. Além disso, estradas podem expor
nascentes ao acesso de homens, animais e trânsito de máquinas.

7.7.4 Conservação da bacia de contribuição/recarga da nascente

59
Como a nascente é o afloramento ou manifestação do lençol freático na
superfície do solo, cuja vazão é dependente da capacidade de infiltração do solo, na
denominada Área de Contribuição, na bacia hidrográfica e não apenas na área
circundante da nascente (Área de Preservação Permanente). Assim, toda a área de
bacia hidrográfica merece atenção, no que se refere à preservação do solo, e todas as
técnicas de conservação, objetivando tanto o combate à erosão como a melhoria nas
características físicas do solo, notadamente aquelas relativas à capacidade de
infiltração da água da chuva ou da irrigação, vão determinar maior disponibilidade de
água na nascente, em quantidade e estabilidade, ao longo do ano, incluindo a época
mais secas.
Para a recuperação e conservação das nascentes recomenda-se a manutenção de
matas nos topos dos morros e das seções convexas, estendendo-se até 1/3 das
encostas.

7.8 RECUPERAÇÃO DE NASCENTES

O processo de recuperação e conservação de nascentes consiste, basicamente,


em três fundamentos, quais sejam: proteção da superfície do solo, criação de
condições favoráveis à infiltração da água no solo e controle da taxa de
evapotranspiração. A seguir, serão apresentados os principais casos e a melhor
maneira de se proceder na recuperação e conservação de nascentes.

7.8.1 Nascente que apresenta redução diurna na vazão.

É comum observar a incidência de plantas freatófitas (taboa, mariazinha, etc.)


nos brejos, que são locais em que predominam as nascentes difusas e, portanto,
apresentam solos encharcados. Nessas áreas, o lençol freático se encontra bem
próximo da superfície do terreno, facilitando a extração direta da água pelas raízes
das freatófitas. Nascentes, nestes locais, tendem a apresentar uma redução
substancial na vazão durante o dia e retomando a vazão normal durante a noite.
Nesses casos, o restabelecimento diurno da vazão, pode ser obtido através da
erradicação das freatófitas. A eliminação das freatófitas reduz consideravelmente a
taxa de evapotranspiração, mantendo estável o volume de água dos reservatórios
subterrâneos e, consequentemente, evitando a carência de água na época em que o
produtor mais precisa.
Outra intervenção a ser realizada nos locais que predominam as nascentes
difusas é a construção de um sistema de drenagem, denominado “espinha de peixe”,
formado por vários drenos pequenos, que são construídos no sentido da declividade do
terreno. Assim, estes pequenos drenos facilitam o escoamento da água para um dreno
coletor, que deve ser construído na parte central da área da bacia de drenagem. Com
isso, haverá rápido escoamento da água do local, diminuindo a disponibilidade de água
e, assim, a evapotranspiração das plantas, no local.
60
Entretanto, alguns aspectos devem considerados em relação à erradicação de
freatófitas e a implantação do sistema de drenagem em áreas de nascentes. O
ecossistema formado pelas freatófitas (taboa, mariazinha, etc.), que é um sistema
alagado natural, é refúgio de animais (sapos, peixes), além de ser de grande
importância para a qualidade de água. Sedimentos, material orgânico, elementos
químicos tóxicos, nutrientes, agentes patogênicos porventura presentes na água são
removidos com grande eficiência nesses sistemas. Assim, apesar de ter um ganho em
termos de quantidade de água, pode se ter uma perda em termos de qualidade de
água.

7.8.2 Nascentes que apresentam considerável redução da vazão durante a


estação seca

Este fenômeno é mais comum em nascentes cujas encostas da área de drenagem


e os topos dos morros não possuem florestas. Além disso, pode haver também a
presença de plantas freatófitas nas proximidades dos cursos d'água.
As providências a serem tomadas neste caso é o reflorestamento dos topos dos
morros e das seções convexas, a bateção do pasto das seções côncavas e a eliminação
de toda a vegetação freatófita existente nas proximidades da nascente.
Neste caso, o reflorestamento dos topos dos morros e das seções convexas,
deve se iniciar a partir do topo da encosta e se prolongar até um terço da mesma.
Este procedimento permitirá que a água acumulada, no lençol freático, não seja
absorvida, durante a estação seca, pelas raízes das plantas freatófitas e, assim, a
vazão da nascente será restabelecida.

7.8.3. Nascentes que secaram totalmente

Neste caso, se for comprovado que a floresta é a principal responsável pela


extinção das nascentes, deve-se proceder ao corte da mesma, deixando apenas um
terço, a partir do topo das encostas e nas partes convexas.
Após o corte parcial da floresta, o solo da área desmatada deverá receber
tratamentos especiais, visando à conservação do solo. Cada forma de ocupação da área
sem floresta determinará quais os melhores procedimentos para a conservação do solo
das mesmas.
Deve-se ter muita atenção, quando as áreas de encosta forem ocupadas com
pastagens, para que não ocorra uma compactação excessiva do solo, pois, na verdade, o
que leva uma nascente a secar não é o desmatamento, mas a diminuição da capacidade
do solo em infiltrar a água da chuva através da superfície do solo.
Para se reduzir o grau de compactação do solo e os processos erosivos em áreas
com pastagens, será necessário que se proceda a sua estabilização, para que,
posteriormente, se possam adotar técnicas de conservação. A ocupação dessas áreas

61
com vegetação rasteira vai ocasionar, na camada superficial do solo sua melhor
fixação, além de maior acúmulo de matéria orgânica, facilitando a penetração da água
da chuva. Assim, a água da chuva que ficou armazenada no solo, irá percolar até a
primeira camada impermeável e alcançará a depressão na qual aparece a nascente.
A substituição da mata por pastagens nas áreas de encosta requer
um planejamento adequado, de forma que exista um equilíbrio entre a
quantidade de animais e a capacidade suporte da pastagem. Uma alternativa
que resulte no melhor aproveitamento do pasto e na menor compactação do
solo é o pastejo rotacionado, ou seja, a subdivisão da área em piquetes.
Quando se deseja aproveitar as áreas de encosta, onde havia floresta,
com cultivos agrícolas, as técnicas de conservação do solo adotadas deverão
ser capazes de evitar a formação de erosão e a compactação do solo.
Um outro cuidado que se deve ter durante o procedimento de
recuperação de uma nascente é o isolamento da sua área de contribuição
dinâmica. Essa medida não permite o pisoteio de animais, evitando a
compactação da área e, também, os riscos de contaminação biológica do
lençol freático. Uma vez que o lençol freático encontra-se próximo da superfície do
solo, não se deve implantar, nas proximidades dessa área, vegetação com grande
capacidade de retirada de água.
O solo é um dos componentes do ecossistema interligado ao solo, à vegetação, ao
clima e à água. Portanto, as variações dos demais componentes refletem no seu
comportamento. Dessa forma, as técnicas de conservação do solo envolvem medidas
de aproveitamento da água da chuva, evitando perdas excessivas através do
escoamento superficial, favorecendo a infiltração e mantendo o abastecimento dos
reservatórios subterrâneos e, assim, garantindo o suprimento de água para a
agricultura, criações e comunidades.
A conservação do solo e da água está inter-relacionada e, quase sempre, a
conservação de ambos é realizada ao mesmo tempo. A conservação de um reflete
favoravelmente na conservação do outro.

8.ÁGUAS SUBTERRÂNEAS

8.1 Introdução

A maior parte da água doce disponível na Terra encontra-se no subsolo, sendo


que metade dessa água encontra-se a profundidades que excedem um quilômetro. À
medida que aprofunda-se no solo, sob a camada inicial de solo úmido, a camada
seguinte encontrada é a zona de aeração ou insaturada, onde as partículas de solo
estão cobertas com um filme de água, mas existe ar entre as partículas. À maior
profundidade, está a zona saturada, em que a água deslocou todo o ar. O nome dado à
água doce na zona saturada é lençol de água subterrâneo; ele constitui 0,6% do
62
suprimento total de água. A principal fonte das águas subterrâneas são as chuvas que
caem sobre a superfície, uma pequena parte das quais infiltra-se até atingir a zona
saturada.

8.2 Vantangens das águas subterrâneas em relação às águas superficiais

Aponta-se as seguintes vantagens das águas subterrâneas em relação às águas


superficiais:

 Pelo fato de ocorrerem no subsolo sob uma zona de material rochoso não-
saturado ou camadas rochosas pouco permeáveis, as águas subterrâneas
encontram-se relativamente melhor protegidas contra agentes potenciais ou
efetivos de poluição.
 Quando captadas de forma adequada, na sua utilização, geralmente, não se tem
custos de clarificação, tratamento ou purificação; os processos de filtração e
biogeoquímicos de depuração do subsolo proporcionam um alto nível de
purificação e potabilidade das águas subterrâneas.
 O custo de sua captação e distribuição é muito mais barato. A captação pode
ser próxima da área consumidora, o que torna mais barato o processo de
distribuição;
 Permitem um planejamento modular na oferta de água à população, isto é, mais
poços podem ser perfurados à medida que aumente a necessidade, dispensando
grandes investimentos de capital de uma única vez.
 Os prazos de execução das obras de captação são relativamente curtos, da
ordem de dias até alguns meses.
 Os investimentos em geral são relativamente pequenos, variando entre dezenas
a centenas de milhares de reais.
 Os aqüíferos não sofrem processos de assoreamento, nem perdem grandes
volumes de água por evaporação.

Obviamente que a água subterrânea, apesar de muito importante, não é


suficiente para abastecer grandes centros populacionais, situados em áreas de
aqüíferos pobres, como é o caso do Rio de Janeiro. No entanto, é um complemento
importante à água superficial. Poucos sabem, mas, mesmo na cidade do Rio de Janeiro,
há muitas indústrias que só usam água subterrânea.
Nas duas últimas décadas houve um grande crescimento do uso deste recurso
no Brasil, mas estamos longe dos níveis de uso e gerenciamento alcançados pelos
países da Europa e os Estados Unidos.

8.3 Ocorrência de água subterrânea

63
A água da chuva pode ter vários destinos após atingir a superfície da Terra.
Inicialmente uma parte se infiltra. Quando o solo atinge seu ponto de saturação,
ficando encharcado, a água passa a escoar sobre a superfície em direção aos vales.
Dependendo da temperatura ambiente, uma parte da chuva volta à atmosfera na
forma de vapor. Em países frios, ou em grandes altitudes, a água se acumula na
superfície na forma de neve ou gelo, ali podendo ficar por muito tempo. A parcela da
água que se infiltra vai dar origem à água subterrânea.

8.4 Importância das águas subterrâneas

 No Brasil, em geral, as águas subterrâneas abastecem rios e lagos. Por isso,


mesmo na época seca, a maioria dos nossos rios é perene;
 Os usos múltiplos das águas subterrâneas são crescentes: abastecimento,
irrigação, calefação, balneoterapia, engarrafamento de águas minerais e
potáveis de mesa e outros;
 Os aqüíferos, ao reterem as águas das chuvas, desempenham papel fundamental
no controle das cheias;
 As águas subterrâneas têm grande alcance social pois os poços, quando bem
construídos e protegidos, garantem a saúde da população.

8.5 O caminho subterrâneo da água

O conceito de ciclo hidrológico está ligado ao movimento e à circulação de água


nos seus diferentes estados físicos, entre os oceanos, as calotas de gelo, as águas
superficiais, as águas subterrâneas e a atmosfera. Este movimento permanente deve-
se ao Sol, que fornece a energia para elevar a água da superfície terrestre para a
atmosfera (evaporação), e à gravidade, que faz com que a água condensada caia
(precipitação) e que, uma vez na superfície, circule através de linhas de água que se
reúnem em rios até atingir os oceanos (escoamento superficial) ou se infiltre nos
solos e nas rochas, através dos seus poros, fissuras e fraturas (escoamento
subterrâneo). Na Figura 39 estão apresentados dois esquemas de solos com poros e
fraturas de formações rochosas.

64
Figura 39. Poros e fraturas de formações rochosas.

Nem toda a água precipitada alcança a superfície terrestre, já que uma parte,
na sua queda, volta a evaporar-se.
A água que se infiltra no solo é sujeita a evaporação direta para a atmosfera e é
retida pela vegetação, que através da transpiração, a devolve à atmosfera. Este
processo chamado evapotranspiração ocorre no topo da zona não saturada, ou seja, na
zona onde os espaços entre as partículas de solo contêm tanto ar como água.
A água que continua a infiltrar-se e atinge a zona saturada das rochas, entra na
circulação subterrânea e contribui para um aumento da água armazenada (recarga dos
aquíferos). Conforme pode ser visto na Figura 40, na zona saturada (aquífero), os
poros ou fraturas das formações rochosas estão completamente preenchidos por água
(saturados). O topo da zona saturada corresponde ao nível freático.

Figura 40. Corte esquemático do solo, com as zonas não-saturada e saturada.


A água subterrânea pode ressurgir à superfície (nascentes) e alimentar as
linhas de água ou ser descarregada diretamente no oceano.
65
8.6 Zonas de ocorrência da água no solo de um aqüífero freático

8.6.1 Zona de aeração: é a parte do solo que está parcialmente preenchida por água.
Nesta zona a água ocorre na forma de películas aderidas aos grãos do solo. Solos de
textura mais fina tendem a ter mais umidade do que os mais grosseiros, pois há mais
superfícies de grãos onde a água pode ficar retida por adesão.
Na zona de aeração podemos distinguir três regiões, como pode ser visto na
Figura 41:
- Zona de umidade do solo: é a parte mais superficial, onde a perda de água
para a atmosfera é intensa. Em alguns casos é muito grande a quantidade de
sais que se precipitam na superfície do solo após a evaporação desta água,
dando origem a solos salinizados.
- Franja de capilaridade: é a região mais próxima ao nível d’água do lençol
freático, onde a umidade é maior devido à presença da zona saturada logo
abaixo.
Zona intermediária: região compreendida entre as duas anteriores e com
umidade menor do que na franja capilar e maior do que na zona superficial do solo.
Como já foi dito, a capilaridade é maior em terrenos cuja granulometria é muito fina.
Em áreas onde o nível freático está próximo da superfície, a zona intermediária
pode não existir, pois a franja capilar atinge a superfície do solo. São brejos e
alagadiços, onde há uma intensa evaporação da água subterrânea.

Figura 41. Zonas de ocorrência da água no solo de um aqüífero freático.

8.6.2 Zona de Saturação


66
É a região abaixo nível freático onde os poros ou fraturas da rocha estão
totalmente preenchidos por água. Observa-se que em um poço escavado num aqüífero
deste tipo, a água o estará preenchendo até o nível freático (Figura 41).
Em aqüíferos freáticos o nível da água varia segundo a quantidade de chuva. Em
épocas de chuva, o nível freático sobe e em épocas em que chove pouco, o nível
freático desce. Um poço perfurado no verão poderá ficar seco caso sua penetração na
zona saturada for menor do que esta variação do nível d’água.

8.7 Classificação dos aqüíferos segundo a pressão da água

a) Aqüíferos Livres ou Freáticos

A pressão da água na superfície da zona saturada está em equilíbrio com a


pressão atmosférica, com a qual se comunica livremente. Na Figura 42 está
esquematizado um aqüífero deste tipo. São os aqüíferos mais comuns e mais
explorados pela população. São também os que apresentam maiores problemas de
contaminação.

b) Aqüíferos Artesianos

Nestes aqüíferos a camada saturada está confinada entre duas camadas


impermeáveis ou semipermeáveis, de forma que a pressão da água no topo da zona
saturada é maior do que a pressão atmosférica naquele ponto, o que faz com que a
água suba no poço para além da zona aqüífera. Se a pressão for suficientemente forte
a água poderá jorrar espontaneamente pela boca do poço. Neste caso diz-se que
temos um poço jorrante.
Há muitas possibilidades geológicas em que a situação de confinamento pode
ocorrer. Na Figura 42 pode-se visualizar o modelo mais clássico, mais comum e mais
importante.

67
Figura 42. Esquema de um poço freático e artesiano.

8.8 Classificação segundo a geologia do material saturado

a) Aqüíferos Porosos

Ocorrem em rochas sedimentares consolidadas, sedimentos inconsolidados e


solos arenosos. Constituem os mais importantes aqüíferos, pelo grande volume de água
que armazenam, e por sua ocorrência em grandes áreas. Estes aqüíferos ocorrem nas
bacias sedimentares e em todas as várzeas onde se acumularam sedimentos arenosos.
Uma particularidade deste tipo de aqüífero é sua porosidade quase sempre
homogeneamente distribuída, permitindo que a água flua para qualquer direção, em
função tão somente dos diferenciais de pressão hidrostática ali existentes. Poços
perfurados nestes aqüíferos podem fornecer até 500 m 3/hora de água de boa
qualidade.

b) Aqüíferos fraturados ou fissurados

Ocorrem em rochas ígneas e metamórficas. A capacidade destas rochas em


acumularem água está relacionada à quantidade de fraturas, suas aberturas e
intercomunicação. Poços perfurados nestas rochas fornecem poucos metros cúbicos
de água por hora. A possibilidade de se ter um poço produtivo dependerá, tão
somente, de o mesmo interceptar fraturas capazes de conduzir a água. Há caso em
que, de dois poços situados a pouca distância um do outro, somente um venha a
fornecer água, sendo o outro seco. Para minimizar o fracasso da perfuração nestes
terrenos, faz-se necessário que a locação do poço seja bem estudada por profissional
competente. Nestes aqüíferos a água só pode fluir onde houver fraturas, que, quase
sempre, tendem a ter orientações preferenciais. Um caso particular de aqüífero
fraturado é representado pelos derrames de rochas ígneas vulcânicas basálticas, das

68
grandes bacias sedimentares brasileiras. Estas rochas, apesar de ígneas, são capazes
de fornecer volumes de água até dez vezes maiores do que a maioria das rochas
ígneas e metamórficas.

c) Aqüíferos cársticos

São os aqüíferos formados em rochas carbonáticas. Constituem um tipo peculiar


de aqüífero fraturado, onde as fraturas, devido à dissolução do carbonato pela água,
podem atingir aberturas muito grandes, criando, neste caso, verdadeiros rios
subterrâneos. É comum em regiões com grutas calcárias, ocorrendo em várias partes
do Brasil.
Na Figura 43, estão esquematizados os três tipos de aqüíferos segundo a
geologia do material saturado.

Figura 43. Circulação de água nos meios porosos, fraturados e cársticos.

8.9 POLUIÇAO DE ÁGUAS SUBTERRÂNEAS

A água é um excelente solvente e pode conter inúmeras substâncias dissolvidas.


Ao longo do seu percurso a água vai interagindo com o solo e formações geológicas,
dissolvendo e incorporando substâncias. Por esta razão a água subterrânea é mais
mineralizada (tem mais minerais) que a água de superfície.
Apesar do solo e da zona não saturada apresentarem excelentes mecanismos de
filtragem podendo reter inúmeras partículas e bactérias patogênicas, existem
substâncias e gases dissolvidos que dificilmente deixarão a água subterrânea podendo
ser responsáveis pela sua poluição.
Uma água está poluída quando a sua composição foi alterada de tal maneira que
a torna imprópria para um determinado fim.

69
A deterioração da qualidade da água subterrânea pode ser provocada de
maneira direta ou indireta, por atividades humanas ou por processos naturais, sendo
mais frequente a ação combinada de ambos os fatores (Figura 44).
Inúmeras atividades do homem introduzem ao meio ambiente substâncias ou
características físicas que ali não existiam antes, ou que existiam em quantidades
diferentes. A este processo chamamos de poluição. Assim, como as atividades
desenvolvidas pela humanidade são muito variáveis, também são as formas e níveis de
poluição.
Estas mudanças de características do meio físico poderão refletir de formas
diferentes sobre a biota local, podendo ser prejudicial a algumas espécies e não a
outras. De qualquer forma, considerando as interdependências das várias espécies,
estas modificações levam sempre a desequilíbrios ecológicos. Resta saber quão intenso
é este desequilíbrio e se é possível ser assimilado sem conseqüências catastróficas.

Figura 44. Poluição da água subterrânea com diferentes origens.

De um modo geral, os depósitos de água subterrânea são bem mais resistentes


aos processos poluidores dos que os de água superficial, pois a camada de solo
sobrejacente atua como filtro físico e químico. A facilidade de um poluente atingir a
água subterrânea dependerá dos seguintes fatores:

a) Tipo de aqüífero

70
Os aqüíferos freáticos são mais vulneráveis do que os confinados ou
semiconfinados.

b) Profundidade do nível estático: (espessura da zona de aeração)

Como esta zona atua como um reator físico-químico, sua espessura tem papel
importante. Espessuras maiores permitirão maior tempo de filtragem, além do que
aumentarão o tempo de exposição do poluente aos agentes oxidantes e adsorventes
presentes na zona de aeração.

c) Permeabilidade da zona de aeração e do aqüífero.

A permeabilidade da zona de aeração é fundamental quando se pensa em


poluição. Uma zona de aeração impermeável ou pouco permeável é uma barreira à
penetração de poluentes no aqüífero. Aqüíferos extensos podem estar parcialmente
recobertos por camadas impermeáveis em algumas áreas enquanto em outras acontece
o inverso. Estas áreas de maior permeabilidade atuam como zona de recarga e têm
uma importância fundamental em seu gerenciamento.
Por outro lado, alta permeabilidade (transmissividade) permitem uma rápida
difusão da poluição. O avanço da mancha poluidora poderá ser acelerado pela
exploração do aqüífero, na medida que aumenta a velocidade do fluxo subterrâneo em
direção às áreas onde está havendo a retirada de água. No caso de aqüíferos
litorâneos, a superexploração poderá levar à ruptura do frágil equilíbrio existente
entre água doce e água salgada, produzindo o que se convencionou chamar de intrusão
de água salgada.
Na Figura 45 estão esquematizados materiais com alta e baixa permeabilidade.

71
Figura 45. Permeabilidade em diferentes materiais.

d) Conteúdo de matéria orgânica existente sobre o solo

A matéria orgânica tem grande capacidade de adsorver uma gama variada de


metais pesados e moléculas orgânicas. Estudos no Estado do Paraná, onde está muito
difundida a técnica do plantio direto, têm mostrado que o aumento do teor de matéria
orgânica no solo tem sido responsável por uma razoável diminuição do impacto
ambiental da agricultura. Segundo os técnicos estaduais, isto tem modificado o
próprio aspecto da água da represa de Itaipu.

e)Tipo dos óxidos e minerais de argila existentes no solo.

Sabe-se que estes compostos, por suas cargas químicas superficiais, têm grande
capacidade de reter uma série de elementos e compostos.
A mobilidade dos íons nitrato é muito dependente do balanço de cargas. Solos
com balanço positivo de cargas suportam mais nitrato. Neste particular, é de se notar
que nos solos tropicais, cujos minerais predominantes são óxidos de ferro e alumínio e
a caulinita, que possuem significativas quantidade de cargas positivas, permitem
interação do tipo íon-íon (interação forte) com uma gama variada de produtos que
devem sua atividade pesticida a grupos moleculares iônicos e polares.
Um poluente após atingir o solo, poderá passar por uma série reações químicas,
bioquímicas, fotoquímicas e inter-relações físicas com os constituintes do solo antes
de atingir a água subterrânea. Estas reações poderão neutralizar, modificar ou

72
retardar a ação poluente. Em muitas situações a biotransformação e a decomposição
ambiental dos compostos fitossanitários pode conduzir à formação de produtos com
uma ação tóxica aguda mais intensa ou, então, possuidores de efeitos injuriosos não
caracterizados nas moléculas precursoras. Exemplos: Dimetoato, um organofosforado,
degrada-se em dimetoxon, cerca de 75 a 100 vezes mais tóxico. O malation produz,
por decomposição, o 0,0,0-trimetilfosforotioato, que apresenta uma ação direta
extremamente injuriosa no sistema nervoso central e nos pulmões, provocando
hipotermia e queda no ritmo respiratório.
A poluição capaz de atingir as águas subterrâneas pode ter origem variada.
Considerando que os aqüíferos são corpos tridimensionais, em geral extensos e
profundos, diferentemente portanto, dos cursos d’água, a forma da fonte poluidora
tem importância fundamental nos estudos de impacto ambiental:

- Fontes pontuais de poluição: são as que atingem o aqüífero através de um


ponto. Exemplos: sumidouros de esgotos domésticos, comuns em comunidades
rurais, lixões, vazamentos de depósitos de produtos químicos, vazamentos de
dutos transportadores de esgotos domésticos ou produtos químicos.
- Fontes lineares de poluição: são as provocadas pela infiltração de águas
superficiais de rios e canais contaminados. A possibilidade desta poluição
ocorrer dependerá do sentido de fluxo hidráulico existente entre o curso
d’água e o aqüífero subjacente. É necessário enfatizar que, ao longo de um
mesmo curso, há lugares onde o fluxo ocorre do aqüífero para o talvegue e
outros onde se passa o inverso, isto é, as águas do rio se infiltram em direção
ao aqüífero.
- Fontes difusas de poluição: são as que contaminam áreas extensas.
Normalmente são poluentes transportados por correntes aéreas, chuva e pela
atividade agrícola. Em aglomerados urbanos, onde não haja rede de esgoto
sanitário, as fossas sépticas e sumidouros estão de tal forma regularmente
espaçadas que o conjunto acaba por ser uma fonte difusa de poluição. A
poluição proveniente das fontes difusas se caracterizam por ser de baixa
concentração e atingir grande áreas.

As causas fundamentais da poluição de águas subterrâneas ocasionadas pela


atividade humana podem agrupar-se em quatro grupos dependendo da atividade
humana que as originou e que seguidamente estão descritas.

1) Poluição urbana e doméstica

É provocada pela descarga de efluentes domésticos não tratados na rede


hidrográfica, fossas sépticas e lixões.
Os efluentes domésticos contém sais minerais, matéria orgânica, restos de
compostos não biodegradáveis, vírus e microrganismos fecais.

73
O chorume dos lixões (Figura 46), resultantes da decomposição dos materiais
orgânicos, são altamente redutores e enriquecidos em amônio, ferro ferroso,
manganês e zinco, além de apresentarem valores elevados da dureza, concentração de
cloreto, sulfato, bicarbonato, sódio, potássio, cálcio e magnésio. A decomposição da
matéria orgânica no lixão origina a produção de gases como o dióxido de carbono e o
metano.

Figura 46. Poluição do lençol freático provocada pelo chorume de lixão.

Este tipo de poluição ao atingir o aquífero origina o aparecimento de cor, sabor


e odor desagradáveis.

2) Poluição Agrícola

Este tipo de poluição, consequência das práticas agrícolas, é a mais generalizada


e importante na deterioração da água subterrânea (Figura 47). A diferença entre este
tipo de poluição e outros é o fato de apresentar um caráter difuso, sendo responsável
pela poluição a partir da superfície de extensas áreas, ao passo que os outros tipos
correspondem a focos pontuais de poluição.
Os contaminantes potencialmente mais significativos neste campo são os
fertilizantes e pesticidas. Outros contaminantes de menor significado mas por vezes
muito importantes são os associados às atividades pecuárias, sendo a sua poluição
semelhante à doméstica.
Os fertilizantes inorgânicos como o sulfato de amônio, nitrato de amônio e
carbonato de amônio e os orgânicos, como a uréia, são os responsáveis pelo incremento
de nitrato, nitrito e amônio nas águas subterrâneas. Isto deve-se ao fato da
quantidade de fertilizantes aplicada ser superior à quantidade necessária para o
desenvolvimento das plantas.
O incremento de sulfatos, cloretos e fósforo nas águas subterrâneas é um
problema menos importante que o dos compostos nitrogenados e está relacionado com

74
a aplicação de fertilizantes como o sulfato de amônio, cloreto de potássio, carbonato
de potássio e compostos de fósforo.

Figura 47. Agricultura: fonte difusa de poluição para águas subterrâneas.

Dentro dos pesticidas e produtos fitossanitários, os pesticidas organoclorados


como o DDT são os mais perigosos devido à sua persistência e elevada toxicidade.
Resumindo, os principais problemas de poluição por atividades agrícolas são:
 A utilização inadequada de fertilizantes nitrogenados e fosforados em zonas de
irrigação com solos permeáveis e aquíferos livres, traduzindo em aumentos
consideráveis de nitratos no aquífero;
 Lançamento indiscriminado de resíduos animais sobre o solo em zonas
vulneráveis;
 Utilização incorreta ou exagerada de pesticidas em solos muito permeáveis com
escassa capacidade de adsorção.

3.Poluição Industrial

A poluição industrial apresenta um caráter tipicamente pontual e está


relacionada com a eliminação de resíduos de produção através da atmosfera, do solo,
das águas superficiais e subterrâneas e de derrames durante o seu armazenamento e
transporte (Figura 48).

75
Figura 48. Lançamentos de efluentes industriais.

As principais indústrias poluentes são as indústrias alimentares, metalúrgicas,


petroquímicas, nucleares, farmacêuticas, eletroquímicas, de fabricação de pesticidas
e inseticidas etc.

4.Intrusão salina

A intrusão salina é um fenômeno que ocorre em regiões costeiras onde os


aquíferos estão em contato com a água do mar. Este fenômeno pode acentuar-se e ser
acelerado, com consequências graves, quando, nas proximidades da linha de costa, a
extração de grandes volumes de água doce subterrânea provoca o avanço da água
salgada no interior do aquífero e a consequente salinização da água dos poços ou dos
furos que nele captem água, como pode ser visto pela Figura 49.

76
Figura 49. Intrusão salina

Água Subterrânea e o Meio Ambiente

As águas subterrâneas e as superficiais são partes integrantes do ciclo


hidrológico e do meio ambiente. Freqüentemente, as áreas de descarga da água
subterrânea localizam-se em brejos, lagos ou rios, alimentando seus níveis de base e
ecossistemas aquáticos. Os corpos d'água superficiais muitas vezes variam
sazonalmente: durante a estação chuvosa, a água flui dos corpos d'água superficiais
para a água subterrânea, enquanto na estiagem a direção do fluxo se inverte.
Problemas ambientais com as águas subterrâneas são comuns, variando quanto ao
tipo e grau de gravidade. Podem ser agrupados em duas principais categorias: os
causados por contaminação e aqueles causados por superexplotação.

 Poluição

A poluição das águas subterrâneas é geralmente difícil de detectar, de


monitoramento dispendioso e muito prolongado. Na maioria das vezes, a contaminação
só é descoberta no momento em que substâncias nocivas aparecem nos reservatórios
de água potável, quando a poluição já se espalhou sobre uma grande área. A
despoluição da água subterrânea é particularmente demorada e cara, através de
sofisticadas tecnologias. Os Estados Unidos possuem um fundo estimado de 20 a 100
bilhões de dólares para ações nesse setor.

77
Hoje torna-se evidente que as fontes de poluição da água subterrânea são muito
mais disseminadas e relacionadas a uma variedade muito maior de atividades. A
poluição em áreas não industrializadas pode ser atribuída a origens diversas tais como
fertilizantes, pesticidas, fossas sépticas, drenagens urbanas e poluição do ar e das
águas de superfície. O único método eficaz de controle desse tipo de poluição é o
manejo integrado dos usos do solo e da água.

 Superexplotação

A água subterrânea sempre foi vista como uma fonte inesgotável de


abastecimento. Embora seja um recurso renovável, poucos aqüíferos podem
suportar enormes e indefinidas taxas de extração, na maior parte do mundo. Para
assegurar suprimentos de água subterrânea para as gerações futuras, a filosofia
do desenvolvimento sustentável preconiza que a extração de água de um aqüífero
nunca deve exceder sua recarga.
Quando a extração de água subterrânea ultrapassa a recarga natural, por
longos períodos, os aqüíferos sofrem depleção e o lençol freático começa a baixar.
Nessa situação, os seguintes problemas são ocasionados:
 poços rasos, usados para abastecimentos locais e irrigações, secam;
 poços de produção deverão ser perfurados a profundidades cada vez maiores,
necessitando de mais energia para bombeamento;
 aqüíferos litorâneos podem sofrer contaminação por intrusão da água do mar; e
 “tombamentos” de terrenos.

Alguns desses problemas podem ser controlados ou revertidos pela redução


das extrações, mas, a contaminação pela água do mar persiste por muitos anos,
enquanto os “tombamentos” de terrenos costumam ser irreversíveis. A solução mais
eficaz e menos onerosa é o estabelecimento de um programa de proteção das águas
subterrâneas.

Riscos de Longo Prazo

A poluição e a superexplotação de água subterrânea podem ter sérias


conseqüências:
 racionamentos de água - a contaminação ou perda de reservas de água
subterrânea pode levar a drásticos racionamentos e medidas emergenciais;
 ameaça à saúde - contaminação de reservas de água potável coloca a saúde
pública em risco pela exposição a uma série de organismos patogênicos e
substâncias cancerígenas e tóxicas, entre outras;
 danos aos ecossistemas - devido à interação entre águas subterrâneas e águas
superficiais, certos ecossistemas aquáticos podem sofrer graves danos. Por
exemplo: (a) o florescimento de algas ou outros efeitos de eutrofização causados
pela descarga de águas subterrâneas ricas em nutrientes em lagoas: (b) aporte de
78
metais pesados e compostos orgânicos na cadeia alimentar, atingindo níveis tóxicos;
e (c) rebaixamento do espelho d'água de lagoas, desaparecimento de brejos
causados pela redução do fluxo de base de rios, devido à superexplotação de água
subterrânea;
 danos à estrutura das casas - a subsidência (“tombamento”) de terrenos pode
danificar as fundações de prédios;
 prejuízos financeiros: a depleção de um aqüífero pode levar à perda de
produtividade agrícola ou industrial.

9. EVAPOTRANSPIRAÇAO

9.1 Definições

a) Evaporação (E): é o processo pelo qual um líquido passa para o estado gasoso.
A evaporação de água na atmosfera ocorre de oceanos, lagos, rios, do solo, e
da vegetação úmida (evaporação de orvalho e da chuva interceptada)
b) Transpiraçao (T): é a perda na forma de vapor pelas plantas,
predominantemente através das folhas, embora em plantas lenhosas possa
também ocorrer pequena perda pelas lenticelas da casca do tronco. Nas
folhas, a evaporação ocorre a partir das paredes celulares em direção aos
espaços intercelulares de ar, ocorrendo então difusão, através dos
estômatos, para a atmosfera. O estômato atua como regulador fundamental
da taxa de transpiração, juntamente com a camada de ar adjacente à folha.
Um caminho alternativo aos estômatos é a cutícula foliar, mas em boas
condições de disponibilidade hídrica, a via preferencial é a estomática.
c) Evapotranspiraçao (ET): é o processo simultâneo de transferência de água
para a atmosfera por evaporação da água do solo e por transpiraçaqo das
plantas.

10. BIBLIOGRAFIA COMPLEMENTAR RECOMENDADA

PEREIRA, A. R.; ANGELOCCI, L. R.; SENTELHAS, P. C. Agrometeorologia –


fundamentos e aplicações práticas. Guaíba: Agropecuária, 2002. 478p.

BERTONI, J.; LOMBARDI NETO, F. Conservação do solo. São Paulo: Ícone, 5ª ed.,
2005. 355p.

BRANDAO, V. S.; PRUSKI, F. F.; SILVA, D. D. Infiltração da água no solo. Viçosa:


UFV, 2003. 98p.

CALHEIROS, R.O. 3. Piracicaba: Comitê das Bacias Hidrográficas dos Rios PCJ. CTRN,
2004. 40p.
79
CASTRO, P.S.; LOPES, J.D.S. Recuperação e conservação de nascentes. Viçosa: CPT,
2001. 84p.

MARTINS, S. V. Recuperação de áreas degradadas: ações de preservação


permanente, voçorocas, taludes rodoviários e de mineração. Viçosa: Editora
Aprenda Fácil, 1ª Ed., 2009. 270p.

MATOS, A. T.; LO MONACO, P.A.V. Uso e manejo racional da água no meio rural. In:
Demétrius David da Silva. (Org.). Conservação de solo e da água, aspectos
hidrológicos, ecohidrologia e usos múltiplos da água. 1ed.Viçosa: CRRH/UFV, 2010, v. 1,
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PRUSKI, F. F. Conservação de solo e água – práticas mecânicas para o controle de


erosão hídrica. Viçosa: UFV, 2009. 279p.

PRUSKI, F. F.; BRANDAO, V. S.; SILVA, D. D. Escoamento superficial. Viçosa: UFV,


2003. 88p.

TUCCI, C. E. M. Hidrologia – Ciência e aplicação. Porto Alegre: Editora da


UFRGS/ABRH, 3ª ed., 2002. 943p.

VALENTE, O. F.; GOMES, M. A. Conservação de nascentes – Hidrologia e manejo de


bacias hidrográficas de cabeceiras. Viçosa: MG, Aprenda Fácil, 2005. 210p.

80

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