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AO(À) EXCELENTÍSSIMO(A) SENHOR(A) DOUTOR(A) DESEMBARGADOR

PRESIDENTE DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO CEARÁ

PROCESSO DE REFERÊNCIA “Nº...”


AUTOR: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO CEARÁ
RÉU: SÁVIO “PRENOMES…”

REVISÃO CRIMINAL

SÁVIO “PRENOMES…”, “nacionalidade…”, “estado civil…”, “profissão…”, inscrito


no “RG…” e no “CPF…”, usuário do “endereço eletrônico…”, residente e domiciliado
em “Logradouro…”, “nº…”, “Bairro…”, “Cidade…”/“UF…”, “CEP…”, por meio de seu
advogado, “NOME E PRENOMES…”, inscrito na OAB/“UF…” de “nº…”, vem à
presença de Vossa Excelência, promover REVISÃO CRIMINAL da ação epigrafada,
com fundamento no art. 621, II, do Código de Processo Penal, a qual foi movida pelo
MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO CEARÁ, pelos motivos de fatos e de
direito aduzidos a seguir, para requerer ao final.
1 DA EXPOSIÇÃO DOS FATOS

Na ação de origem ficou assentado mediante a instrução processual que,


no dia 3 de março de 2018, a ofendida, Maria Luisa “Prenomes…”, conversava na
rua com amigas da escola, quando passou pelo local o acusado, na época jovem de
20 anos, que ficou interessado em conhecê-la em razão da beleza e desenvoltura ao
contar piadas. Um mês após se conhecerem e iniciarem um relacionamento, Sávio e
Maria passaram a ter relações sexuais, apesar de Maria ter informado ao namorado
que nascera em 20 de agosto de 2005. Ao tomar conhecimento dos fatos, o
Ministério Público denunciou Sávio pela prática do crime do Art. 217-A do Código
Penal.
Após a instrução e juntada da carteira de identidade de Maria, na qual
constava seu nascimento em 20 de agosto de 2005, Sávio foi condenado a 8 anos
de reclusão no regime fechado, nos termos da denúncia, pelo juízo da 4ª Vara
Criminal de Fortaleza, tendo ocorrido o trânsito em julgado, em 25 de fevereiro de
2020, pois não houve apelação de nenhuma das partes.
Durante a pandemia do coronavírus, os pais de Maria procuram os
familiares de Sávio e narram que se sentiam mal pelo ocorrido, porque sempre
consideraram o condenado um bom namorado para a filha. Afirmaram, ainda, que
autorizavam o namoro, porque, na verdade, consideravam sua filha uma jovem, já
que ela nasceu 20 de janeiro de 2004, mas somente foi registrada no ano seguinte,
pois moravam no interior e queriam criar os filhos sem vínculos com a modernidade
do capitalismo selvagem imperialista. Precisando de trabalho diante da seca
nordestina, precisaram vir à capital e regularizar os documentos.
Diante de tais informações, em posse de fotografias no interior que
comprovam que Maria, de fato, nasceu em 20 de janeiro de 2004 e da retificação no
registro civil, os familiares de Sávio procuram você na condição de advogado(a),
para redigir o que for cabível judicialmente.

2 DOS FUNDAMENTOS JURÍDICOS

De início, ressalta-se que a revisão se justifica pelo fato de que a punição


não é um fim em si mesma, antes deve passar pela proteção aos direitos humanos e
não por uma sede de propiciação por um suposto crime cometido, conforme o que
desenvolve Luís Greco:

Quem se reporta a direitos humanos para defender uma obrigação absoluta


de punir está, em verdade, preocupado não mais com direitos de pessoas
concretas que cumpre proteger, e sim mostrando-se disposto a sacrificar
esses direitos e essas pessoas em nome de uma suposta ideia de direitos
humanos desvinculada de seus reais titulares. O direito internacional e o
direito penal dos direitos humanos têm de ser, antes de qualquer outra
coisa, direitos de proteção de seres humanos concretos.1

Em seguimento, ressalta-se que a revisão aqui manejada encaixa-se no


inciso II do art. 621 do Código Adjetivo, porquanto se estava diante, no decurso da
marcha da ação referenciada, de certidão de nascimento ideologicamente falsa.
Observe-se:

Art. 621. A revisão dos processos findos será admitida:


II - quando a sentença condenatória se fundar em depoimentos, exames ou
documentos comprovadamente falsos;

Veja-se também o tipo penal no qual se enquadrou o impetrante:

Art. 217-A. Ter conjunção carnal ou praticar outro ato libidinoso com menor
de 14 (catorze) anos:
Pena – reclusão, de 8 (oito) a 15 (quinze) anos.

A falsidade de caráter ideológico do registro civil é comprovada, como já


enunciado, por fotografias da família da ofendida na época verdadeira do seu
nascimento e pela própria retificação do registro civil, procedida após providências
dos genitores da vítima. Desse modo, não tendo a “vítima” menos de 14 (catorze)
naos de idade, não há tipicidade na conduta, já que as relações sexuais foram
consentidas.
A prova anterior que se tinha, na qual se reputava a “ofendida” como
menor de catorze anos, serviu de base essencial para a condenação, por isso,
pertinente é a revisão. Sobre a importância da prova falsa para a decisão, Norberto
Avena e Renato Brasileiro frisam:

Para que se perfaça a hipótese em exame, não basta a existência de


depoimento, exame ou documento falso nos autos. É preciso, pois, que tais

1 GRECO, Luís. Por que inexistem deveres absolutos de punir. In: CORDEIRO, Nefi; PACELLI,
Eugênio; REIS JÚNIOR, Sebastião dos.Direito penal e processual penal contemporâneos. São
Paulo: Atlas, 2019, p. 19. E-book
elementos tenham sido o alicerce ou, pelo menos, uma das bases principais
da sentença impugnada. Tanto que utilizada no texto legal a expressão “se
fundar”, sugerindo a necessidade de que a prova falsa tenha sido relevante
na formação do convencimento do juiz.2

Perceba-se que a simples existência de prova falsa nos autos do processo


não dará ensejo à revisão criminal. Para além disso, é necessário que a
decisão esteja fundamentada nesta prova falsa, isto é, que a prova
reconhecida falsa tenha influído decisivamente na conclusão.3

Não é novidade na jurisprudência a revisão criminal por retificação do


registro de nascimento, sendo assentada também a possibilidade de revisão no caso
de acusação de crime de estupro de vulnerável quando se está dentro do cabimento
legal pertinente:

REVISÃO CRIMINAL. ROUBO MAJORADO E CORRUPÇÃO DE


MENORES. ALEGAÇÃO DE QUE O REVISIONANDO ERA MENOR À
ÉPOCA DOS FATOS. ACOLHIMENTO. ERRO NO REGISTRO CIVIL.
CERTIDÃO DE NASCIMENTO ALTERADA POR SENTENÇA DE
RETIFICAÇÃO DE ASSENTO DE NASCIMENTO. INIMPUTABILIDADE DO
RÉU. INCOMPETÊNCIA DO JUÍZO COMUM PARA O PROCESSAMENTO
DA DEMANDA. ARTS. 288 DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL, 27 DO
CÓDIGO PENAL E 104 DO ESTATUTO DA CRIANÇA E DO
ADOLESCENTE. NULIDADE DA AÇÃO PENAL ORIGINÁRIA. ART. 564,
INCISO II DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. PEDIDO REVISIONAL
PROCEDENTE. (TJPR – 5ª C.Criminal - 0023879-54.2019.8.16.0000 -
Cascavel - Rel.: Desembargadora Maria José de Toledo Marcondes Teixeira
- J. 18.07.2019)

Revisão Criminal - Ementa: Revisão criminal. Estupro de vulnerável.


Condenação. Palavra da vítima. Retratação. Justificação. Absolvição. 1. O
decreto condenatório amparado na palavra na vítima para reconhecer a
existência do crime de estupro de vulnerável deve ser desconstituído
quando houver a retratação dela em audiência de justificação e não existir
elementos capazes de desfazer a nova versão apresentada acerca dos
fatos. 2. Revisão criminal conhecida e provida. (TJAM – 4001718-
49.2018.8.04.0000 - Relator (a): Elci Simões de Oliveira; Comarca: Manaus/
AM; Órgão julgador: Câmaras Reunidas; Data do julgamento: 12/09/2018;
Data de registro: 13/09/2018).

Dessa forma, não resta alternativa para o Poder Judiciário que não seja a
revisão da sentença proferida para que seja reconhecida a atipicidade da conduta
perpetrada pelo autor desta ação, resultando em sua absolvição, conforme o
Diploma Procedimental:

Art. 386. O juiz absolverá o réu, mencionando a causa na parte dispositiva,

2 AVENA, Norberto. Processo Penal. 11. ed. Rio de Janeiro: Forense, São Paulo: Método, 2019, p.
2286.
3 LIMA, Renato Brasileiro de. Manual de processo penal: volume único. 7. ed. Salvador: JusPodivm,
2019, p. 1863.
desde que reconheça:
III – não constituir o fato infração penal;

Ademais, em razão dos prejuízos, em especial, de ordem extrapatrimonial


sofridos, o CPP já traz previsão de que se deve fixar compensação pecuniária
correspondente:

Art. 630. O tribunal, se o interessado o requerer, poderá reconhecer o direito


a uma justa indenização pelos prejuízos sofridos.
§ 1o Por essa indenização, que será liquidada no juízo cível, responderá a
União, se a condenação tiver sido proferida pela justiça do Distrito Federal
ou de Território, ou o Estado, se o tiver sido pela respectiva justiça.

Tem-se, destarte, que é razoável a concessão de indenização pois a


responsabilidade do Estado é objetiva na exigência por uma persecução penal
escorreita, caracterizando erro do Judiciário a falsidade da prova que levou à
condenação. Veja-se confirmação em julgados recentes:

Condenação por roubo. Revisão criminal sustentando erro na identificação


do autor do fato criminoso e a consequente indenização. 1 - Todas as
provas periciais juntadas comprovam que houve utilização de documento
falso em nome do requerente na tramitação da ação penal, não se tratando
da mesma pessoa, sendo imperiosa a revisão da sentença condenatória
proferida com erro na identificação do agente do delito. 2 - Sendo a
responsabilidade do Estado objetiva, há erro judiciário passível de
indenização, a qual terá o seu quantum apurado no juízo cível. 3 - Pedido
revisional procedente. Parecer acolhido. (TJGO, Revisão Criminal 5695358-
65.2019.8.09.0000, Rel. EDISON MIGUEL DA SILVA JUNIOR, Seção
Criminal, julgado em 22/05/2020, DJe de 22/05/2020)

Assim, as circunstâncias demandam que seja arbitrada indenização em


patamar mínimo de “R$…”, levando em conta o constrangimento peculiar pela
condenação do crime de estupro de vulnerável, além das diversas violências que
são realizadas contra alguém que está sob essa pecha.
3 DOS PEDIDOS

Diante do exposto, requer-se:


a) o recebimento e o conhecimento do presente recurso, tendo em vista a
sua admissibilidade, com fundamento no art. 105, II, “a”, da CRFB/1988 e no art. 30
da Lei nº 8.038/1990;
b) a intimação do Ministério Público estadual, na pessoa do seu(ua)
procurador(a)-geral, para se manifestar no prazo de dez dias, com base no art. 625,
§ 5º, do CPP;
c) a total procedência desta ação para que seja revisto o processo
criminal “nº...” que resultou na condenação do impetrante, tendo como
consequências:
c.1) a sua absolvição no tocante ao crime de estupro de vulnerável que
lhe estava sendo imputado na ação mencionada, sendo expedido o respectivo
alvará de soltura, considerando que este se encontra cumprindo pena em “local de
detenção…”, o qual é administrado por “Nome e Prenomes…”, sendo restabelecidos
todos os direitos perdidos em virtude da condenação, com base art. 626 do CPP.
c.2) seja arbitrada mínimo indenizatório no valor de “R$...”, a ser liquidado
definitivamente no juízo cível, com base no art. 630 do CPP.
Nesses termos, pede deferimento.
“Local...”, “data...”.

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ADVOGADO
OAB/“UF...” “Nº...”

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