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RESENHA CRÍTICA DA AULA INAUGURAL 2021.

2 PPGIBA – UFAM

CARACTERIZAÇÃO DA IMUNIDADE CELULAR E HUMORAL NA INFECÇÃO


HUMANA PELO VÍRUS DA FEBRE AMARELA, DA AUTORA ANDRÉA
TEIXEIRA CARVALHO

Autor da resenha crítica: José Alexandre Pires de Almeida

RESUMO

Andréa Teixeira de Carvalho é pesquisadora em saúde pública da Fundação


Oswaldo Cruz (Fiocruz) de Minas Gerais, associada ao Grupo Integrado de
Pesquisas em Biomarcadores do Instituto e autora da aula inaugural do
Programa de Pós-graduação em Imunologia Básica e aplicada da Universidade
Federal do Amazonas (PPGIBA – UFAM) em 27 de agosto de 2021,
“Caracterização da Imunidade Celular e Humoral na Infecção Humana pelo Vírus
da Febre Amarela”.

De acordo com a autora, entre os anos de 2017 e 2018, durante um surto de


Febre Amarela (FA) em Minas Gerais, seu grupo de pesquisadores iniciaram um
projeto junto ao Hospital Eduardo de Menezes (referência no tratamento de
doenças infecciosas e parasitárias em Minas Gerais), com o intuito de realizar
um acompanhamento do perfil imunológico dos pacientes por cerca de 3 meses
após a fase aguda de infecção pelo vírus da FA, no entanto, após o contato de
um dos médicos com a responsabilidade pelo manejo clínico dos pacientes do
referido projeto, houve o relato de uma condição inesperada quanto à alguns
pacientes (de acordo com os dados apresentados pela autora, cerca de 10% da
casuística), onde alguns destes, que haviam recebido alta por melhoras clínicas
relacionadas à doença, estavam retornando ao hospital com sintomas da doença
e piora dos parâmetros clínicos, em especial; citólise hepática grave, elevação
importante das transaminases (AST e ALT), porém, com RT-qPCR FA (-), sendo
assim denominada naqueles instante Hepatite Tardia ou Hepatite Persistente.
Ainda de acordo com Andréa, em um contato realizado pelo Hospital Saint-Louis,
na França, e por meio de dados apresentados no relato de caso Hepatitis
Rebound after Infection with Yellow Fever Virus (Denis et al, 2019), após um
período de férias no Brasil, dois franceses apresentaram quadro clínico com
aquele que já estava sendo acompanhado por ela e sua equipe (níveis de ALT
e AST estavam muito altos, associado à um quadro de astenia), onde os autores
do estudo francês chegaram à conclusão de que a FA poderia induzir à Hepatite
persistente com citólise hepática. Em 2018 e 2019, as equipes do Hospital das
Clínicas (HC) da FM-USP trataram 133 das 571 pessoas com febre amarela
registradas no estado. Das 133, 59 morreram, 3 sobreviveram depois de
transplante de fígado e 71 sobreviveram sem transplante. Das 71, 58 foram
acompanhadas por até 12 meses, depois de deixarem o hospital, com resultados
negativos dos testes para o vírus da febre amarela, no entanto, os níveis das
enzimas do fígado continuavam altos. Os exames de um dos pacientes
detectaram material genético do vírus no sangue. Em 26 pacientes, o equivalente
a 45% dos 58 acompanhados, a hepatite se manifestou em geral três meses
após a regularização das funções do fígado, que justificara a dispensa hospitalar.
As análises de amostras do fígado de nove deles indicaram lesões diferentes
das registradas na febre amarela aguda, onde cinco casos eram de hepatite
moderada e quatro leve.

O fato de haver uma escassez de dados na literatura que suporte avaliar a


resposta imune celular após a infecção humana pelo vírus amarílico selvagem,
a necessidade da identificação de biomarcadores potenciais de prognóstico e
monitorização, bem como as contribuições científicas futuras para o manejo de
pacientes com FA, fez com que fosse formado um grupo científico com o intuito
de prover possíveis respostas à tais questionamentos. De acordo com Andréa,
atualmente, os dados obtidos do objeto de estudo da pesquisa não estão
publicados, no entanto, com a conclusão da dissertação, a expectativa é que
ainda no mês de setembro do corrente ano sejam devidamente publicados.

O estudo explanado tem como proposta avaliar e caracterizar a imunidade


humoral e celular de indivíduos infectados pelo vírus amarílico selvagem ou
vacinal, quantificar os níveis circulantes de fatores solúveis na população
estudada e comparar os dados da resposta imune celular dos pacientes com FA
com aqueles obtidos de indivíduos imunizados e indivíduos saudáveis sem
associação com a vacina. Os grupo avaliados no estudo não publicado são
constituídos por um grupo febre amarela com n = 96, os quais passaram por uma
avaliação médica, tendo sido aplicado o Termo de Consentimento livre e
Esclarecido (TCLE), bem como a coleta de amostras de material orgânico na
fase aguda da doença e no período de convalescença (6 meses); um grupo
controle com n = 172 de indivíduos saudáveis e doadores de sangue e um
terceiro grupo referência com n = 41, composto de indivíduos saudáveis e
imunizados com o vírus amarílico vacinal 17DD (vírus atenuado). Em relação ao
perfil humoral, mais especificamente em relação aos Títulos de Anticorpos
Neutralizantes por meio do Teste de Neutralização de Redução de Placas
(PRNT), durante a fase aguda da infecção, os pacientes com FA apresentaram
títulos maiores se comparados aos indivíduos vacinados. Quanto ao perfil de
imunidade celular (dosagem de citocinas, quimiocinas e fatores de crescimento),
o ensaio foi realizado por meio de Luminex (BioRad). De forma global, o nível de
das quimiocinas CCL4 e CCL5 e da citocina reguladora IL-5, foram menores nos
pacientes com FA se comparados aos pacientes vacinados. Ao analisar
subgrupos quanto às necessidades de cuidados médicos (gravidade da doença
e necessidade de manejo clínico mais específico), revelou que os pacientes
internados em CTI e aqueles que progrediram para óbito, exibiram um perfil mais
pró-inflamatório. Já os pacientes que evoluíram para um quadro de hepatite
tardia, apresentaram um menor nível de quimiocinas, citocinas inflamatórias e
fator de crescimento se comparados aos pacientes que não evoluíram com
episódio de hepatite tardia. Vale ressaltar que os paciente que evoluíram para
óbito, apesar de apresentarem um perfil de imunidade celular mais estável,
apresentaram níveis mais elevados de vários mediadores em comparação aos
pacientes que receberam alta. Em linhas gerais, o subgrupo de não hepatite
tardia exibiu um perfil pró-inflamatório mais proeminente nos estágios iniciais
(D1-15) em comparação com o subgrupo de hepatite tardia (D61-90). Em
resumo, pode-se dizer que os pacientes exibem perfis diferenciados de
biomarcadores na fase aguda da doença e quando são segregados quanto ao
desfecho clínica (alta clínica ou óbito) ou morbidade, ou seja, presença ou não
de hepatite tardia (Fradico et al, Dados não publicados). Em linhas gerais,
mediante os dados obtidos, resta a consideração de que uma melhor resposta
clínica à infecção pelo Vírus da Febre Amarela está atrelada à uma resposta
imune controlada pelo hospedeiro, que reconhece e elimina o patógeno invasor,
enquanto limita o dano colateral dos próprios tecidos (em especial o tecido
hepático), resultante de uma resposta imune exagerada (CONG et al., 2016). Em
um relato de caso publicado em 17 de fevereiro de 2020, ao avaliar a resposta
humoral via Cinética do IgG anti-VFA circulante no período de convalescença,
foi constatado um aumento progressivo dos níveis séricos de IgG anti-VFA, com
um pico no 197⁰ dia após o início dos sintomas (REZENDE, I. M. et al., 2020).

Em resumo, os dados propostos reforçam a ocorrência de hepatite tardia após a


infecção pelo vírus da febre amarela, os resultados destacam a necessidade de
um acompanhamento prolongado destes pacientes, mais especificamente
quanto aos cuidados hepáticos, no entanto, mais estudos são necessários para
investigar e esclarecer quanto a persistência viral e a resposta imune que causa
a hepatite tardia após a febre amarela (REZENDE, I. M. et al., 2020). Mediante
o levantamento destes dados, subsídios importantes são fornecidos para as
políticas públicas, visando estabelecer medidas com maior eficácia quanto o
manejo clínico da Febre Amarela.

REFERÊNCIAS

CASADIO, L. et al. Late-onset relapsing hepatitis associated with yellow fever.


New England Journal of Medicine. v. 382, n. 21, p. 2059-61. 21 mai. 2020.

DENIS, B. et al. Hepatitis rebound after infection with yellow fever virus. Emerging
Infectious Diseases. v. 25, n. 6, p. 1248-49. 17 jun. 2019.

REZENDE, I. M. et al. Late-relapsing hepatitis after yellow fever. Viruses. v. 12,


n. 2, 222, p. 1-9. 17 fev. 2020.

CONG Y, et al. Characterization of Yellow Fever Virus Infection of Human and


Non-human Primate Antigen Presenting Cells and Their Interaction with CD4+ T
Cells. PLoS Negl Trop Dis 10(5): e0004709, may 2016.

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