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UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ

CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS E LETRAS


FACULDADE DE LETRAS/LIBRAS
Introdução aos Estudos da Literatura
Profa. Márcia Pinheiro
O QUE É LITERATURA?
Literatura?
O que é um clássico?
1. Os clássicos são aqueles livros dos quais, em geral, se ouve dizer:
“Estou relendo ...” e nunca “estou lendo”;
2. Os clássicos são livros que exercem uma influência particular quando
se impõem como inesquecíveis e também quando do se ocultam nas
dobras da memória, mimetizando-se como inconsciente coletivo ou
individual;
3. Toda releitura de um clássico é uma leitura de descoberta como a
primeira;
4. Um clássico é um livro que nunca terminou de dizer aquilo que tinha
para dizer.
“Clássica é a obra que tem dimensão universal: consegue atravessar
gerações, fronteiras e nacionalidades, sem perder as suas
características.” Renato Rocha é músico e compositor.
“A permanência. Que se torna referência e influencia novas gerações.
Que fica inesquecível. Aquela obra que a cada vez que se olha,
surpreende, não envelhece. A obra que fica na memória, que não se
esquece.” Ascânio MMM, Escultor.
“No sentido mais amplo, literatura é tudo o que é impresso (ou mesmo
manuscrito), são todos os livros que a biblioteca contém (incluindo-se aí o
que se chama literatura oral, doravante consignada). Essa acepção
corresponde à noção clássica de “belas-letras” as quais compreendiam
tudo o que era a retórica e a poética podiam produzir, não somente a
ficção, mas também a história, a filosofia e a ciência, e, ainda, toda a
eloquência. Contudo, assim entendida, como equivalente à cultura, no
sentido que essa palavra adquiriu desde o século XIX, a literatura perde sua
“especificidade”: sua qualidade propriamente literária lhe é negada.””
(COMPAGNON, Antoine. O demônio da teoria: literatura e senso
comum. Trad. Cleonice Paes Barreto Mourão e Consuelo Fortes Santiago.
Belo Horizonte: UFMG, 2001. 33 p.)
“Se a teoria literária existe, parece óbvio que haja alguma coisa chamada literatura,
sobre a qual se teoriza. Podemos começar, então, por levantar a questão: o que é
literatura? Muitas têm sido as tentativas de se definir literatura. É possível, por exemplo,
defini-la como a escrita “imaginativa”, no sentido de ficção – escrita esta que não é
literalmente verídica. Mas se refletirmos, ainda que brevemente, sobre aquilo que
comumente se considera literatura, veremos que tal definição não procede. A literatura
inglesa do séc. XVII inclui Shakespeare, Webster, Marel e Milton; mas compreende
também os ensaios de Francis Bacon, os sermões de John Donne, a autobiografia
espiritual de Bunyan, e os escritos de Sir Thomas Browne, qualquer que seja o nome
que se dê a eles. (...) A distinção entre “fato” e “ficção”, portanto, não parece nos ser
muito útil, e uma das razões para isto é a de que a própria distinção é muitas vezes
questionável. Já se disse, por exemplo, que a oposição que estabelecemos entre verdade
“histórica” e verdade “artística”, de modo algum se aplica às antigas sagas irlandesas1.
No inglês de fins do séc. XVI e princípios do séc. XVII, a palavra “novel” foi usada, ao
que parece, tanto para os acontecimentos reais quanto para os fictícios, sendo que até
mesmo as notícias de jornal dificilmente poderiam ser consideradas factuais.”
Os romances e as notícias não eram claramente factuais, nem claramente
fictícios, a distinção que fazemos entre estas categorias simplesmente não
era aplicada. Certamente Gibbon achava que escrevia a verdade histórica, e
talvez também fosse este o sentimento dos autores do “Gênese”, tais
obras, porém, são lidas hoje como “fatos” por alguns, e como “ficção” por
outros; Newman sem dúvida achava que suas meditações teológicas eram
verdades, mas muitos leitores as consideram hoje “literatura”. Além disso,
se a “literatura” inclui muito da escrita “factual”, também exclui uma boa
margem de ficção. As histórias em quadrinhos do Super-homem e os
romances de Mills e Boon são ficção, mas isso não faz com que sejam
geralmente considerados como literatura, e muito menos como Literatura.
O fato de a literatura ser a escrita “criativa” ou “imaginativa” implicaria
serem a história, a filosofia e as ciências naturais não criativas e destituídas
de imaginação?
“Talvez nos seja necessária uma abordagem totalmente diferente. Talvez a
literatura seja definível não pelo fato de ser ficcional ou “imaginativa”, mas
porque emprega a linguagem de forma peculiar. Segundo essa teoria, a
literatura é a escrita que, nas palavras do crítico russo Roman Jakobson,
representa uma “violência organizada contra a fala comum”. A literatura
transforma e intensifica a linguagem comum, afastando-se sistematicamente
da fala cotidiana. Se alguém se aproximar de mim em um ponto de ônibus e
disser: “Tu, noiva ainda imaculada da quietude”, tenho consciência imediata
de que estou em presença do literário. Sei disso porque a tessitura, o ritmo e
a ressonância das palavras superam o seu significado abstrato – ou, como os
lingüistas diriam de maneira mais técnica, existe uma desconformidade entre
os significantes e os significados. Trata-se de um tipo de linguagem que
chama a atenção sobre si mesma e exibe sua existência material, ao contrário
do que ocorre com frases tais como “Você não sabe que os motoristas de
ônibus estão em greve?”” EAGLETON, Terry. Teoria da literatura: uma
introdução. Tradução Waltensir Dutra. São Paulo: Martins Fontes, 2003. pp.
Fato: Ficção
“A literatura é ação porque interfere indiretamente nas consciências, no
sentido de humanizar o próprio homem. A ação da literatura atua
internamente na consciência do leitor. A literatura é um meio convincente
de ação, pois o receptor fica mais tempo diante da mensagem artística do
que o receptor das outras artes, como a pintura e a música. Um romance
estabelece um alto grau de intimidade com seu leitor. O leitor demora mais
tempo com ele, vive mais tempo com ele. A mensagem tem tempo para
explicar-se, consolidar-se. A literatura é discurso como o pensamento, e
assim há um maior intercâmbio de formação de conceitos no texto interno
do leitor.”
CÂNONE Conjunto de obras escritas, da literatura universal, ou
particularmente de uma literatura nacional, considerado como o
modelo literário a ser seguido, por ser a “melhor” representação
da linguagem e da cultura pela crítica literária.
CLÁSSICO
ESTÉTICA Estudo dos processos de criação artística e dos produtos
originados – a obra de arte , considerando-se o efeito que o belo suscita
nas emoções e sentimentos humanos.
ESTILO/ESTILÍSTICA: Caracterização dos modos de construção de
uma obra de arte, a partir do conjunto de elementos expressivos da
linguagem utilizada, que imprimem valoração à obra em conformidade
com os padrões estéticos do momento (estilo de época). A estilística é o
estudo do uso da linguagem verbal pelo poeta ou prosador, quer dizer, o
emprego individual que estes fazem dos recursos de uma língua visando a
imprimir maior expressividade à sua mensagem, pela capacidade de
sugestionar e emocionar mediante determinados processos e efeitos.
Há muitos conceitos de
Literatura
“Ideologia é a maneira de interpretar o mundo de acordo com os
interesses da classe social do interpretante. A ideologia é um fenômeno
(quase) inconsciente; não nos damos conta de que nossas avaliações e
perspectivas são ideológicas, pois quando temos consciência disto elas
deixam de ser ideológicas. O empresário que monta uma grande fábrica,
despendendo grande soma de capital, considera-se um gerador de
empregos e de riqueza. O mesmo homem pode ser considerado, dentro de
outra postura ideológica, um explorador da capacidade de trabalho
humana. Todas as duas interpretações são ideológicas.” ( SAMUEL, Rogel,
1985, p. 110)
“Não podemos reduzir o sentido da literatura essencialmente à sua forma
ideológica, ou à crítica da ideologia dominante. Alguns teóricos defendem
a tese de que a arte faz parte da superestrutura (a ideologia dominante que
se manifesta na religião, na filosofia, no direito e na política da classe
dominante). Arte, porém, é forma, além de ser mensagem. Assim, a arte
resiste mesmo quando determinadas estruturas sociais desaparecem,
mesmo quando já não importa a ideologia em que se inseria. Foi Marx o
primeiro a ver como a arte grega perdurava, mesmo já tendo desaparecido
aquele tipo de sociedade e de economia grega.”( SAMUEL, Rogel, 1985, p.
111)
“a arte pode ser inteiramente gratuita”, independente das condições sociais
e históricas de sua produção, sem revelar ser uma imitação do homem? E
por que ela, sendo gratuita, pode ser política e ideológica? O valor estético
de uma obra-de-arte é totalmente universal?
LITERATURA

FICÇÃO
A Literatura tem várias conceituações, ou seja, sua
mente não pode ficar presa a um conceito apenas.
A espera do entendimento do conceito de
Literatura!!!
INTERPRETAÇÃO Considerando-se a formação da palavra
interpretação, que contem o prefixo latino inter-, que signica posição
intermediária, reciprocidade, e o elemento de composição preter- (do latim
praeter), conclui-se que interpretar signica “ir além de, transcender”.
Portanto, análise e interpretação são procedimentos consecutivos na
análise do texto literário, mas não são sinônimos. Por quê? Analisar é o
primeiro passo para interpretar, uma vez que só podemos interpretar
depois de conhecer as partes constituintes de nosso objeto, o que é
realizado pela análise.
A Literatura pode representar uma ideologia?
Conceito de ideologia
“sistema de ideias sustentadas por um grupo social, as quais refletem,
racionalizam e defendem os próprios interesses e compromissos
institucionais, sejam estes morais, religiosos, políticos ou econômicos”.
“conjunto de convicções filosóficas, sociais, políticas etc. de um indivíduo
ou grupo de indivíduos”
Vamos ler um texto da professora Regina
Zilberman
A partir de exemplos de textos literários, um poema e uma prosa,
observamos que a organização interna desses textos remete a sociedade
em que ocorre a produção literária, com valores verossímeis histórica e
socialmente tratados.
A obra literária simula lidar com coisas e pessoas conhecidas, porém deixa
claro que aquelas nunca tiveram existência concreta, tangível ou
mensurável. Reais são apenas as palavras que as enunciam e que, mediante
um arranjo sintático, constroem uma pararealidade que imita o nosso
mundo cotidiano.
Sentido de conotativo e sentido de denotativo
Conotativo não real Sentido literal, real.
“Maria estava parada há mais de meia hora no ponto do ônibus. Estava
cansada de esperar. Se a distância fosse menor, teria ido a pé. Era preciso
mesmo ir se acostumando com a caminhada. O preço da passagem estava
aumentando tanto! Além do cansaço, a sacola estava pesada. No dia
anterior, no domingo, havia tido festa na casa da patroa. Ela levava para
casa os restos. O osso do pernil e as frutas que tinham enfeitado a mesa.
Ganhara as frutas e uma gorjeta. O osso, a patroa ia jogar fora. Estava
feliz, apesar do cansaço. A gorjeta chegara numa hora boa. Os dois filhos
menores estavam muito gripados. Precisava comprar xarope e aquele
remedinho de desentupir nariz. Daria para comprar também uma lata de
Toddy. As frutas estavam ótimas e havia melão. As crianças nunca tinham
comido melão. Serás que os meninos iriam gostar de melão?”
“Um certo Miguilim morava com sua mãe, seu pai e seus irmãos, longe,
longe daqui, muito depois da Vereda-do-Frango-d'Água e de outras
veredas sem nome ou pouco conhecidas, em ponto remoto, no Mutúm.
No meio dos Campos Gerais, mas num covoão em trecho de matas, terra
preta, pé de serra. Miguilim tinha oito anos. Quando completara sete, havia
saído dali, pela primeira vez: o Tio Terêz levou-o a cavalo, à frente da sela,
para ser crismado no Sucuriju, por onde o bispo passava. Da viagem, que
durou dias, ele guardara aturdidas lembranças, embaraçadas em sua
cabecinha. De uma, nunca pôde se esquecer: alguém, que já estivera no
Mutúm, tinha dito: ― “É um lugar bonito, entre morro e morro, com
muita pedreira e muito mato, distante de qualquer parte; e lá chove
sempre...””.
A obra literária não ocorre no vazio, uma vez que sempre existe um pano
de fundo, um cenário, um espaço, em que as ações das personagens de
uma narrativa ocorrem. Portanto, há sempre uma referência de
verossimilhança na obra literária. Como vimos, no caso dos fragmentos do
conto “O inferno” e do romance Vidas Secas, de Graciliano Ramos, este
cenário (onde se desenvolve a cena, a ação) é a região Nordeste do Brasil.
Como identicar a presença desse espaço nos textos?
Há marcas textuais que dão indícios que é um texto literário?
Por que a obra literária não é uma cópia da realidade e sim uma realidade possível de
acontecer (verossimilhança)?

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