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Universidade do Estado do Pará

Centro de Ciências Sociais e Educação


Curso de Bacharelado em Secretariado Executivo Trilíngue

Lúcio Mauro Cavalcante Ribeiro

TRANSPORTE COLETIVO POR ÔNIBUS NA REGIÃO


METROPOLITANA DE BELÉM:
Uma análise das práticas regulatórias e da outorga do serviço à luz
das normas infraconstitucionais e municipais

Belém
2017
Lúcio Mauro Cavalcante Ribeiro

TRANSPORTE COLETIVO POR ÔNIBUS NA REGIÃO


METROPOLITANA DE BELÉM:
Uma análise das práticas regulatórias e da outorga do serviço à luz das
normas infraconstitucionais e municipais

Trabalho de conclusão de curso apresentado ao


curso de Bacharelado em Secretariado Executivo
Trilíngue da Universidade do Estado do Pará,
como requisito parcial para a obtenção do título de
Bacharel em Secretariado Executivo Trilíngue.
Orientador: Prof. Dr. Roberto Paulo Bibas Fialho.

Belém
2017
Lúcio Mauro Cavalcante Ribeiro

TRANSPORTE COLETIVO POR ÔNIBUS NA REGIÃO


METROPOLITANA DE BELÉM:
Uma análise das práticas regulatórias e da outorga do serviço à luz das
normas infraconstitucionais e municipais

Trabalho de conclusão de curso apresentado ao


curso de Bacharelado em Secretariado Executivo
Trilíngue da Universidade do Estado do Pará,
como requisito parcial à obtenção do título de
Bacharel em Secretariado Executivo Trilíngue.
Orientador: Prof. Dr. Roberto Paulo Bibas Fialho.

Data de aprovação: ___/___/______

Banca Examinadora

_________________________________________ - Orientador
Prof.º Roberto Paulo Bibas Fialho
Dr. em Educação em Ciências e Matemática
Universidade do Estado do Pará (UEPA)

_________________________________________ - Examinadora
Prof.ª Simaia do Socorro Sales das Mercês
Dr.ª em Arquitetura e Urbanismo
Universidade Federal do Pará (UFPA)

_________________________________________ - Examinador
Prof.º Humberto Mariano de Almeida
Ms. em Direito
Universidade do Estado do Pará (UEPA)
AGRADECIMENTOS

Com a conclusão desta etapa, quero agradecer primeiramente à minha


mãe, uma mulher maravilhosa que sempre esteve ao meu lado me apoiando nas
minhas decisões. Sei que a senhora, se pudesse, faria muito mais por mim, mas ter a
sua compreensão e amor já é o maior presente que um filho pode ter.

Ao meu orientador, por acreditar nesta pesquisa e por ter respeitado o meu
tempo. Sua atenção e disposição foram fundamentais para a evolução desse
trabalho.

Aos meus amigos de dentro e fora da academia, principalmente os que


ganhei no Movimento Estudantil. Apesar de todas as difamações e perseguições de
uma instituição onde predomina o corporativismo e o mau uso do dinheiro público,
conseguimos deixar a nossa marca e mostrar que ainda existem pessoas dispostas
a lutar por uma educação pública de qualidade e que promova o desenvolvimento
social. Agradeço pelos bons momentos e principalmente por sempre estarem ao meu
lado nos períodos mais difíceis.

Por fim, a todos os que colaboraram direta e indiretamente para a


realização desta pesquisa, e a cada entrevistado pelas relevantes informações
prestadas.
RESUMO

RIBEIRO, Lúcio Mauro Cavalcante. Transporte coletivo por ônibus na Região


Metropolitana de Belém: Uma análise das práticas regulatórias e da outorga do
serviço à luz das normas infraconstitucionais e municipais. 2017. 136f. Trabalho de
Conclusão de Curso (Bacharelado em Secretariado Executivo Trilíngue).
Universidade do Estado do Pará: Belém-PA, 2017.

O sistema de transporte coletivo por ônibus que atende a Região Metropolitana de


Belém é composto por 20 empresas, que juntas somam 165 linhas e 182 itinerários
(117 de abrangência municipal e 65 metropolitanos), sendo prestados nos tipos
convencional e seletivo, atendendo em média 21 milhões de passageiros por mês.
Sua operação consiste predominantemente no atendimento dos bairros pelas linhas
rumo ao centro, fato que gera uma superposição de itinerários nos principais
corredores e consequentemente a degradação das condições de trânsito (MERCÊS,
1998), somando-se a isso a instabilidade regulatória no ato do gerenciamento do
transporte coletivo pelo Poder Público, o que compromete a eficiência do serviço e o
bem-estar social, tendo em vista o predomínio da delegação do mesmo à pessoa
jurídica de direito privado sob um caráter precário e desconexo da legislação atual
(DAOU, 2007). Diante do exposto, o objetivo geral deste trabalho é analisar a forma
como é delegada à iniciativa privada a operação do serviço de transporte coletivo por
ônibus na Região Metropolitana de Belém e o que estaria contribuindo para o não
cumprimento das normas infraconstitucionais e municipais. Trata-se de uma pesquisa
exploratória com abordagem qualitativa, que se enquadra nos procedimentos:
bibliográfico, documental e pesquisa de campo. Os resultados obtidos evidenciam a
precariedade do processo de outorga do serviço, uma vez que este ocorre com a
expedição de meras Ordens de Serviço (quando a Lei Nº 8.987 determina licitações
competitivas para a celebração de contratos de concessão ou permissão), além de
que as relações de poder e de interesse entre o Poder Público e as empresas
operadoras estariam contribuindo para a manutenção desse quadro, em detrimento
dos direitos dos usuários deste serviço público essencial.

Palavras-chave: Legislação, Outorga do serviço, Regulamentação, Transporte


coletivo
ABSTRACT

RIBEIRO, Lúcio Mauro Cavalcante. Transporte coletivo por ônibus na Região


Metropolitana de Belém: Uma análise das práticas regulatórias e da outorga do
serviço sob à luz das normas infraconstitucionais e municipais. 2017. 136f. Trabalho
de Conclusão de Curso (Bacharelado em Secretariado Executivo Trilíngue).
Universidade do Estado do Pará: Belém-PA, 2017.

The system of collective transports of buses, which attend the Metropolitan Area of
Belém, is composed by 20 companies. The total consists of 165 bus lines and 182
itineraries (117 of municipal scope and 65 metropolitans), which are provided as
conventional and selective types and, moreover, they attend 21milions of passengers
per month. Its operation predominantly consists on attendance through line from
district to downtown. This fact causes an overlay of itineraries in main access roads
and, consequently, difficulties of traffic conditions (MERCÊS, 1998). Moreover, there
is regulatory instability in management of collective transports for administration,
which less the efficiency of service and social well-being, besides of predominance of
the same administration of private nature, which shows a precarious service and
disconnected of current legislation (DAOU, 2007). Faced with that, the objective of
this work is analyze how the private administration manages the system of collective
transports in Metropolitan Area of Belém and what are the reasons related to non-
compliance of infraconstitutional and municipal rules. This is an exploratory research
with qualitative approach based on these procedures: bibliography, documentary and
field research. The collected results proves that there is a precariousness in the
process of grants of service (Law no. 8.987 determines competitive biddings for the
execution of concession of contracts or permissions). Apart of that, there are interests
and power relations between government and operating companies, which
contributes for maintenance of this scenario to the detriment of right of users of this
essential public service.

Keywords: Legislation, Granting of service, Regulation, Public transport.


LISTA DE FIGURAS

Figura 1 - As três esferas do desenvolvimento sustentável ....................................12


Figura 2 - Fluxograma do processo de desenho regulatório .................................. 29
Figura 3 - Fórmula básica para o cálculo das tarifas do transporte público por ônibus
................................................................................................................................. 34
Figura 4 - Política tarifária de transporte coletivo urbano em um contexto de política
pública ..................................................................................................................... 37
Figura 5 - Municípios que compõem a Região Metropolitana de Belém ................. 42
Figura 6 - Manchas de aglomerados subnormais em municípios da RMB ............. 44
Figura 7 - Serviço de bonde elétrico na Avenida Portugal no início do século XX, em
Belém ...................................................................................................................... 47
Figura 8 - ônibus “Zepelim” no bairro de São Brás, na década de 1950 ................. 48
Figura 9 - Representação esquemática de um sistema tronco-alimentado ............ 59
Figura 10 - Rotas propostas para a implementação do sistema troncal de ônibus 61
Figura 11 - Composição do Consórcio Público metropolitano ............................... 62
Figura 12 - Projeto de corredor troncal e urbanização para a BR 316 ................... 63
Figura 13 - Corredores troncais e fluviais propostos pelo BRT Belém .................. 65
Figura 14 - Ônibus articulado do sistema BRT Belém ........................................... 66
Figura 15 - Representação esquemática de linhas radiais .................................... 67
Figura 16 - Ônibus de linha convencional que circula na Grande Belém .............. 68
Figura 17 - Etapas para a concessão e permissão do serviço de transporte público
de acordo com a LOM/Bel .......................................................................................72
Figura 18 - Ciclo do transporte coletivo por ônibus na RMB .................................. 84
Figura 19 - Veículo sendo lacrado pela Operação Corujão .................................... 86
Figura 20 - Sujeitos e entidades elencadas para a fase de entrevistas ................. 88
LISTA DE SIGLAS E ABREVIATURAS

ALEPA – Assembleia Legislativa do Estado do Pará


ANTP – Associação Nacional dos Transportes Públicos
AMUB – Autarquia de Mobilidade Urbana de Belém
ARCON-PA – Agência de Regulação e Controle de Serviços Públicos do Estado do
Pará
AS – Aglomerados Subnormais
BNDES – Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social
BRT – Bus Rapid Transit
CETRAN – Conselho Estadual de Trânsito
CF – Constituição Federal
CGO – Custo do Gerenciamento Operacional do Serviço
CMB – Câmara Municipal de Belém
CONBEL – Conselho Deliberativo da Região Metropolitana de Belém
COSANPA – Companhia de Saneamento do Pará
CPI – Comissão Parlamentar de Inquérito
CT - Custos Operacionais Totais
CTBel – Companhia de Transportes do Município de Belém
DET – Delegacia Estadual de Trânsito
DETRAN/PA – Departamento de Trânsito do Estado do Pará
DOM-Belém – Diário Oficial do Município de Belém
EBTU – Empresa Brasileira de Transportes Urbanos
EFB – Estrada de Ferro Belém-Bragança
EMTU/Bel – Empresa Metropolitana de Transporte Urbano
EV/2003 – “Estudo de Viabilidade Econômica para o Melhoramento do Sistema de
Transporte na Região Metropolitana de Belém
EV/2009 – “Estudo Preparatório para o Projeto do Sistema de Transporte por Ônibus
da Região Metropolitana de Belém
FAPESPA - Fundação Amazônia de Amparo a Estudos e Pesquisas do Pará
FDTU – Fundo de Desenvolvimento do Transporte Urbano
FNTU – Fundo Nacional de Transportes Urbanos
GEIPOT – Empresa Brasileira de Planejamento de Transportes
IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
IPEA – Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada
IPK – Índice de Passageiros por Quilômetro
IPKe – Índice de Passageiros por Quilômetro equivalentes
JICA - Agência de Cooperação Internacional do Japão
JUCEPA – Junta Comercial do Estado do Pará
LOM/Bel – Lei Orgânica do Município de Belém
MCidades – Ministério das Cidades
MPF – Ministério Público Federal
MPPA – Ministério Público do Estado do Pará
NGTM – Núcleo de Gerenciamento de Transporte Metropolitano
NTU – Associação Nacional das Empresas de Transportes Urbanos
OAB/PA – Ordem dos Advogados do Brasil – Secão Pará
OS – Ordem de Serviço
PAC – Programa de Aceleração do Crescimento
PAITT – Plano de Ações Imediatas de Trânsito e Transportes
PDTU – Plano Diretor de Transportes Urbanos
PDTU/1991 – Plano Diretor de Transporte Urbano da Região Metropolitana de Belém
PDTU/2001 – Plano Diretor de Transporte Urbano da Região Metropolitana de Belém
PDU/Bel – Plano Diretor do Município de Belém
PEC – Proposta de Emenda Constitucional
PIB – Produto Interno Bruto
PL – Projeto de Lei
PLANMOB – Plano de Mobilidade Urbana
PlanMob/Belém – Plano de Mobilidade Urbana de Belém
PMB – Prefeitura Municipal de Belém
PNMU – Política Nacional de Mobilidade Urbana
RII – Recomendações para Implantação Imediata para o Sistema de Transportes
Urbanos da Região Metropolitana de Belém
RSTCOMB – Regulamento do Serviço de Transporte Coletivo por Ônibus do
Município de Belém
RTC/Bel – Estudo de Racionalização do Transporte Coletivo da Região Metropolitana
de Belém
SEGUP – Secretaria de Estado de Segurança Pública e Defesa Social
SEINFRA – Secretaria Especial de Infraestrutura e Logística para o Desenvolvimento
Sustentável
SEMOB – Secretaria Nacional de Transportes e da Mobilidade Urbana
SEMOB – Superintendência Executiva de Mobilidade Urbana de Belém
SEMUTRAN – Secretaria Municipal de Transportes e Trânsito de Ananindeua
SNTU – Sistema Nacional de Transportes Urbanos
STF – Supremo Tribunal Federal
STJ - Supremo Tribunal de Justiça
STPC/RMB – Sistema de Transporte Público Coletivo da Região Metropolitana de
Belém
TAC – Termo de Ajustamento de Conduta
TCM-PA – Tribunal de Contas dos Municípios do Estado do Pará
TJ-PA – Tribunal de Justiça do Estado do Pará
TRANSCOL – Estudo de Transportes Coletivos
TVT - Taux du Versement Transport
USAID – Agência dos Estados Unidos para o Desenvolvimento Internacional
SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ............................................................................................................. 11
2 GESTÃO E REGUMENTAÇÃO DO TRANSPORTE COLETIVO ............................... 19
2.1 HISTÓRICO DAS POLÍTICAS NACIONAIS VOLTADAS PARA O TRANSPORTE
PÚBLICO ........................................................................................................................ 21
2.2 O TRANSPORTE COLETIVO URBANO NO ÂMBITO DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL
............................................................................................................................. ............ 24
2.2.1 O TRANSPORTE COLETIVO URBANO NO ÂMBITO INFRACONSTITUCIONAL
(LEI DA MOBILIDADE URBANA) ................................................................................... 25
2.3 REGULAMENTAÇÃO DO TRANSPORTE PÚBLICO URBANO .............................. 26
2.4 PROCESSOS DE OUTORGA DO SERVIÇO DE TRANSPORTE PÚBLICO NO
BRASIL ........................................................................................................................... 30
2.4.1 CONCESSÃO DO SERVIÇO PÚBLICO ................................................................ 30
2.4.2 PERMISSÃO DO SERVIÇO PÚBLICO ................................................................. 32
2.5 PROCESSO LICITATÓRIO ...................................................................................... 33
2.6 TARIFAÇÃO E FINANCIAMENTO DO TPU ............................................................. 34
2.6.1 POLÍTICA TARIFÁRIA ........................................................................................... 36
2.7 A IMPORTÂNCIA DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA PARA O TRATAMENTO DA
QUESTÃO ...................................................................................................................... 38
3 REGIÃO METROPOLITANA DE BELÉM: CARACTERIZAÇÃO E HISTÓRICO DAS
POLÍTICAS DE TRANSPORTES URBANOS ................................................................ 41
3.1 ASPECTOS GEOGRÁFICOS E SOCIOECONÔMICOS DA RMB ........................... 41
3.2 EVOLUÇÃO HISTÓRICA DO TRANSPORTE PÚBLICO NA RMB ........................... 46
3.3 FORMAÇÃO DA GESTÃO DO TRANSPORTE PÚBLICO POR ÔNIBUS NA REGIÃO
METROPOLITANA DE BELÉM ...................................................................................... 49
3.4 PLANOS DE TRANSPORTE PÚBLICO URBANO PARA A REGIÃO
METROPOLITANA DE BELÉM ...................................................................................... 54
3.5 PLANO DE MOBILIDADE URBANA DE BELÉM ...................................................... 56
3.6 SISTEMA TRONCO-ALIMENTADOR DE ÔNIBUS (BRT) ........................................ 59
3.6.1 BRT METROPOLITANO ........................................................................................ 60
3.6.2 BRT BELÉM ........................................................................................................... 64
4 PRÁTICAS REGULATÓRIAS E CONTRATUAIS DO TRANSPORTE COLETIVO POR
ÔNIBUS NA GRANDE BELÉM ...................................................................................... 67
4.1 LEI ORGÂNICA DO MUNICÍPIO DE BELÉM ........................................................... 69
4.2 OUTORGA DO SERVIÇO DE TRANSPORTE COLETIVO POR ÔNIBUS ............... 72
4.2.1 MODELO DE CONTRATAÇÃO UTILIZADO PELA SEMOB – ORDEM DE SERVIÇO
......................................................................................................................................... 73
4.2.2 REGULAMENTO DO SERVIÇO DE TRANSPORTE COLETIVO POR ÔNIBUS DO
MUNICÍPIO DE BELÉM .................................................................................................. 74
4.3 A QUESTÃO TARIFÁRIA ......................................................................................... 76
4.4 COMPOSIÇÃO EMPRESARIAL E PROPOSTA DE EDITAL DE LICITAÇÃO
ENCAMINHADA PELA PMB ........................................................................................... 77
4.5 POSSÍVEIS MOTIVOS DA ATUAL FORMA DE OUTORGA DO SERVIÇO DE
TRANSPORTE COLETIVO ............................................................................................ 80
4.6 DENÚNCIAS ENVOLVENDO O SETOR EMPRESARIAL E O PODER PÚBLICO
MUNICIPAL .................................................................................................................... 85
5. PESQUISA DE CAMPO, ANÁLISES E RESULTADOS ............................................ 88
5.1 APLICAÇÃO DAS ENTREVISTAS ........................................................................... 89
5.2. ANÁLISE DAS PRÁTICAS REGULATÓRIAS E DO PROCESSO DE OUTORGA DO
SERVIÇO DE TRANSPORTE COLETIVO POR ÔNIBUS NA RMB
........................................................................................................................................ 90
5.2.1 AVALIAÇÃO DO SERVIÇO DE TRANSPORTE PÚBLICO NA GRANDE BELÉM
......................................................................................................................................... 90
5.2.2 OUTORGA DO SERVIÇO DE TRANSPORTE COLETIVO E CONTRATOS
ADMINISTRATIVOS ....................................................................................................... 91
5.2.3 ATUAÇÃO DO PODER PÚBLICO FRENTE À QUESTÃO .................................. 94
5.2.4 RELAÇÃO ENTRE PODER CONCEDENTE E EMPRESAS OPERADORAS....... 96
5.2.5 LICITAÇÃO DO SETOR ........................................................................................ 98
5.3 RESULTADOS .......................................................................................................... 99
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS E RECOMENDAÇÕES PARA TRABALHOS FUTUROS
............................................................................................................................. .......... 102
REFERÊNCIAS ............................................................................................................ 107
APÊNDICES ................................................................................................................. 116
ANEXOS ....................................................................................................................... 118
11

1 INTRODUÇÃO

Tendo afirmado o seu caráter essencial pela Constituição Federal, o


transporte coletivo possui grande importância nas cidades em virtude do seu aspecto
social e democrático, chegando muitas vezes a ser o único meio acessível às pessoas
de baixa renda que necessitam se deslocar por grandes distâncias no perímetro
urbano. O transporte coletivo por ônibus, por sua vez, é o modal1 mais utilizado nas
cidades brasileiras, chegando a 87% do total de viagens, sendo o restante realizado
por metrôs, trens urbanos e barcas (BRASIL, 2015).
Compete aos municípios legislar sobre assuntos de interesse local, onde
se inclui o transporte coletivo, que pode ser prestado de maneira direta ou sob regime
de concessão ou permissão mediante realização de processo licitatório,
determinações constitucionais que estão regulamentadas pelas Leis Federais Nº
8.666/93 (Lei de Contratos e Licitações) e Nº 8.987/95 (Lei das Concessões). Além
destas, a Lei Nº 12.587/2012 (Lei da Mobilidade Urbana), que estabelece uma série
de normas visando melhorar a mobilidade e a acessibilidade nas grandes cidades,
institui algumas regras adicionais a fim de qualificar a forma de concessão do serviço
de transporte público coletivo, que deve ser priorizado juntamente com os meios de
deslocamento não motorizados. Quanto aos serviços de transporte público coletivo
intermunicipais de caráter urbano, estes devem ser prestados diretamente pelos
Estados ou por delegação ou gestão associada, conforme o inciso I, Art. 17. da Lei da
Mobilidade Urbana.
Na Região Metropolitana de Belém, instituída na década de 1970 ainda
durante a ditadura militar (1964-1985), a gestão do transporte coletivo metropolitano
está a cargo da capital paraense por força de convênio com mais quatro municípios.
Os vários estudos e planos de transporte realizados para a região ainda não foram
cumpridos na maioria dos aspectos pelas consecutivas administrações municipais,
que delegam o serviço de transporte coletivo por ônibus à iniciativa privada sob regime
jurídico irregular e provisório, apesar de a Lei Orgânica do município de Belém e as

1Termo usado para designar as modalidades de transporte tanto de mercadorias como de passageiros,
sendo as principais: rodoviário, ferroviário, aéreo e aquaviário, se encontrando em cada um os mais
variados modais de transportes, como os próprios ônibus (rodoviário) (HALLMANN, 2012).
12

normas infraconstitucionais 2 determinarem a realização de licitação para a sua


outorga3 (PINHEIRO et al, 2014).
Esta monografia tem como objetivo inicial analisar a forma como o Poder
Público delega a prestação do serviço de transporte coletivo por ônibus à iniciativa
privada e por que o mesmo não estaria cumprindo os preceitos infraconstitucionais e
municipais, resultados que servirão de subsídio para posteriores estudos que deverão
tratar sobre a sustentabilidade da mobilidade urbana com ênfase no Transporte
Público, através das esferas econômica, social e ambiental, como sugere a figura
abaixo.

Figura 1 - As três esferas do Desenvolvimento Sustentável

Fonte: Adaptado de Brasil (2006)

A difusão do conceito de mobilidade Urbana Sustentável no Brasil tem sido


coordenada pelo Ministério das Cidades por meio da Secretaria Nacional de
Transporte e da Mobilidade Urbana (SEMOB), a fim de nortear as políticas de gestão

2 As Normas Infraconstitucionais são Leis que estão hierarquicamente abaixo da Constituição Federal,
que é considerada a Lei Maior do Estado (LENZA, 2012).
3 Para esta pesquisa, as expressões “delegação” e “outorga” serão utilizadas como sinônimos, como

assim também são utilizadas na Lei Nº 8.987/95 (BRASIL, 1995).


13

pública para o tratamento da questão (BRASIL, 2006). No trabalho que se apresenta,


a Administração Pública será analisada em âmbito nacional e local, através
principalmente das práticas regulatórias e da efetivação de contratos de outorga do
serviço de transporte coletivo.
Trata-se, portanto, de um trabalho com uma visão macro do Secretariado
Executivo, uma vez que visa superar o olhar fragmentado da produção de
conhecimento na área através da exploração do campo da interdisciplinaridade,
fundamental para o enfrentamento e resolução dos mais variados problemas de
cunho social e organizacional, considerando também que o profissional de
Secretariado Executivo vem ganhando cada vez mais destaque na realização de
atividades de gestão, onde se inclui a gestão pública (BILERT, 2014). A
Administração Pública, por sua vez, que está intrinsecamente ligada ao Secretariado,
traz uma gama de assuntos que podem ser investigados por compor a área de
atuação desta profissão, sobretudo no que diz respeito à governança pública, que
tem como objetivo, de acordo com Löffer (2001, apud KASSIER e HEIDEMANN,
2006), uma série de reformas administrativas em conjunto pelo Estado, pela iniciativa
privada e sociedade civil, visando soluções inovadoras dos problemas sociais e
buscando artifícios para garantir um futuro desenvolvimento sustentável para todos
os envolvidos, que também pode ser alcançado pela qualificação dos sistemas de
transporte público urbano.

a) Problemática

A Região Metropolitana de Belém enfrenta diariamente uma série de


problemas de trânsito e de transporte, transtornos compartilhados com maior ou
menor intensidade nas demais metrópoles brasileiras. Além dos atuais fatores
sociais, políticos e econômicos, tais problemas também derivam de decisões
passadas relativas às políticas urbanas, como a implementação de medidas de
priorização ao uso do automóvel em detrimento do transporte coletivo, prática ainda
comum nas cidades de países em desenvolvimento e que contribui para o aumento
dos custos do sistema (VASCONCELLOS, 2000). Logo, em decorrência da não
priorização dos modais coletivos durante a gestão urbana, tem-se um crescimento do
número de veículos particulares e consequentemente do aumento do número de
14

acidentes, índices de poluição e congestionamentos (ANTP, 1997), fato que também


vem ocorrendo na Grande Belém quando se observa que a frota de veículos quase
triplicou no período de 2006 a 2016, de acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia
e Estatística (IBGE) (2016).
A operação do serviço de transporte coletivo na RMB consiste
predominantemente no atendimento dos bairros pelas linhas de ônibus rumo ao
centro, fato que gera uma superposição de itinerários nos principais corredores e
consequentemente a degradação das condições de trânsito (BELÉM, 2016).
A instabilidade regulatória no ato do gerenciamento do transporte coletivo
pelo Poder Público compromete a eficiência do serviço e o bem-estar social, tendo em
vista o predomínio da delegação do mesmo à pessoa jurídica de direito privado sob
um caráter precário e desconexo da legislação atual. Tal situação, de acordo com
Daou (2007), se deve à “relação patrimonialista” estabelecida entre as empresas de
transporte e o poder concedente, característica histórica que tem afetado inovações
no setor como a integração física e tarifária.
A partir desta problemática, surge a seguinte pergunta: como é realizada a
outorga do serviço de transporte coletivo às empresas do setor na RMB?

b) Justificativa

A presente pesquisa tem como finalidade maior cumprir o seu papel social
diante de um assunto que, se não é de interesse geral, afeta a toda a sociedade e a
organização de uma cidade: o transporte público urbano. Tal serviço, fundamental
para o funcionamento das urbes, garante tanto o acesso às necessidades básicas dos
cidadãos como a redução de externalidades negativas do trânsito, contanto que o
mesmo ofereça conforto, segurança, confiabilidade, acessibilidade e rapidez, atributos
que apenas são possíveis com a devida regulamentação aplicada à rede (BERTUCCI,
2011).
As manifestações onde milhões de brasileiros foram às ruas no ano de
2013, que tinham entre as pautas principais a redução do valor das tarifas do
transporte público e a melhoria da qualidade do serviço e da mobilidade urbana
fizeram com que o tema ganhasse maior destaque nas agendas de governo, segundo
a Agência Senado (2014), todavia poucas intervenções ocorreram no que diz respeito
15

às relações jurídicas estabelecidas entre o Estado e as empresas operadoras para a


efetivação de contratos administrativos para a prestação do serviço de transporte
coletivo.
Durante a pesquisa foi possível observar certa dificuldade de acesso às
informações acerca dos contratos do serviço de transporte público (obtidas apenas
por meio de solicitação formal ao órgão gestor), o que evidencia a falta de
transparência por parte da entidade responsável pelo gerenciamento do sistema
regular de transporte coletivo de Belém e RMB.
Considerando algumas especificidades que acometem a população da
Grande Belém, como o maior comprometimento de renda média domiciliar com o
transporte público em todo o país (IPEA, 2016), faz-se necessário ampliar e qualificar
o debate acerca do objeto de estudo proposto, principalmente no que diz respeito às
questões regulamentares, organizacionais e institucionais, a fim de traçar as
melhores alternativas para a melhoria da mobilidade, acessibilidade e
sustentabilidade urbanas, além de uma melhor prestação do serviço de transporte
coletivo.

c) Objetivos geral e específicos

O objetivo geral deste trabalho é analisar o processo de outorga do serviço


de transporte coletivo por ônibus na Região Metropolitana de Belém à luz das normas
infraconstitucionais e municipais.

Tal objetivo, portanto, para ser alcançado, deverá perpassar pelos


seguintes objetivos específicos:

• Apresentar de forma geral a abordagem Constitucional e


Infraconstitucional acerca do serviço de transporte coletivo urbano, no qual
é atribuído o caráter essencial pela Lei Maior e o histórico das políticas
voltadas para o setor a fim de compreender a conjuntura atual de sua
prestação e regulação;
16

• Descrever os aspectos socioeconômicos da Região Metropolitana de


Belém, a evolução histórica da prestação do serviço de transporte público
e de sua gestão, além dos planos e estudos voltados para a qualificação
do setor; e
• Investigar aspectos gerenciais, regulamentares e contratuais do serviço
de transporte coletivo por ônibus em âmbito local, a fim de identificar a
aplicação dos preceitos infraconstitucionais e municipais, assim como a
atuação do Poder Concedente quanto ao cumprimento das normas e a sua
relação com as empresas operadoras.

d) Metodologia

Esta pesquisa é um estudo exploratório com abordagem qualitativa, nível


escolhido por buscar desenvolver, esclarecer e modificar conceitos e ideias, além de
se constituir na primeira etapa de uma investigação mais ampla (GIL, 2008). Para
Bogdan & Biklen (2003), a pesquisa qualitativa requer do pesquisador um contato
constante com o meio e com o objeto a ser investigado, sendo os dados coletados em
campo predominantemente descritivos. Além disso, é necessário preocupar-se antes
de tudo com os processos que antecedem o problema, uma vez que os mesmos
contribuirão para a comprovação das hipóteses definidas.
Tal pesquisa se enquadra em três procedimentos: bibliográfico, documental
e pesquisa de campo, onde o último se dará de forma intrínseca por ter como objetivo
não o entendimento de um fenômeno genérico, mas sim a compreensão de um caso
em particular (MAZZOTTI, 2006), aqui aplicado à Região Metropolitana de Belém.
De acordo com o exposto, o presente trabalho (que seguirá o método
hipotético-dedutivo), acompanhará as seguintes etapas:

• Revisão bibliográfica por meio de livros, artigos científicos, teses,


dissertações e sites da Internet, que trazem consigo informações
relevantes sobre o tratamento constitucional e legislativo atribuído ao
Transporte Público Urbano, sobre o histórico de suas políticas em âmbito
nacional e local e sobre aspectos gerenciais do mesmo, contribuindo assim
17

para um maior entendimento sobre as relações institucionais e práticas


regulatórias frente à matéria;
• Análise de documentos, jornais e periódicos de interesse da presente
pesquisa, obtidos tanto na Internet como em órgãos públicos, a exemplo
da Superintendência Executiva de Mobilidade Urbana de Belém (SEMOB)
e da Câmara Municipal de Belém (CMB), cuja verificação do material
coletado servirá tanto para complementar as informações obtidas de outras
fontes como para confrontar as mesmas com a teoria acumulada, servindo
também para o embasamento de perguntas durante a etapa de entrevistas;
• Entrevistas com representações dos seguintes órgãos da Administração
Pública e de outras entidades: Superintendência Executiva de Mobilidade
Urbana de Belém (SEMOB), Núcleo de Gerenciamento de Transporte
Metropolitano (NGTM), Câmara Municipal de Belém (CMB) (dois
representantes), Ministério Público do Estado do Pará (MPPA) e Ordem
dos Advogados do Brasil – Seção Pará (OAB/PA), além de um especialista
externo da Área Jurídica, participantes estes que devem possuir afinidade
com a questão do Transporte Público Urbano e/ou com a sua legislação.
Tais sujeitos foram selecionados em virtude do próprio estudo do assunto
da pesquisa, onde os mesmos atuam direta e/ou indiretamente com a
questão. Optou-se, aqui, pelo tipo de pesquisa semi-estruturada, por
possuir maior versatilidade e possibilidade de se obter resultados mais
aprofundados com relação ao que se busca. Um modelo do roteiro de
perguntas dos entrevistados se encontra nos Apêndices deste Trabalho
(Apêndice A).

Conforme o acúmulo bibliográfico e documental, as contribuições dos


entrevistados serão confrontadas com o levantamento inicial realizado no decorrer da
presente pesquisa, a fim de comparar não apenas a compatibilidade, mas também a
relevância das informações obtidas por meio de entrevistas semi-estruturadas,
método que consiste em um roteio não fixo de perguntas que pode ser modificado
parcialmente ou em sua totalidade, conforme a necessidade durante a entrevista
(ASSIS, 2013). Trata-se, portanto, de uma etapa essencial para a conclusão do
estudo, já que a análise das contribuições dos entrevistados deve considerar que
18

estes não são somente sujeitos empíricos de experiência e existência


individualizadas, mas também parte de uma história social ideologicamente marcada,
inseridos na realidade do objeto estudado (FERNANDES, 2008).

e) Estrutura do Trabalho

Esta monografia se desenvolve ao longo de seis capítulos, que se inicia


pela introdução do tema, pela problemática, justificativa, objetivos geral e específico,
metodologia e a apresentação de sua estrutura. O segundo capítulo contextualizará
sobre a legislação vigente referente ao transporte coletivo de forma macro,
evidenciando as competências dos entes federativos e os aspectos regulamentares
sob a luz da CF e das normas infraconstitucionais, além de destacar os procedimentos
legais para a outorga do serviço e o histórico das políticas de transporte voltadas para
o setor. O terceiro capítulo apresentará os aspectos socioeconômicos e a formação
histórica do transporte público na Região Metropolitana de Belém, além da formação
da gestão do transporte em âmbito local e os planos e estudos realizados por
diferentes órgãos, visando equacionar os problemas desde então existentes
envolvendo o mesmo. O quarto capítulo tratará sobre os aspectos gerenciais,
regulamentares e contratuais do transporte coletivo por ônibus na Grande Belém,
dando ênfase à atual forma de outorga do serviço à pessoa jurídica de direito privado
e às exigências legais para a sua concessão. O quinto capítulo trata da análise das
entrevistas de sujeitos pertencentes a entidades públicas e externas, cujas
contribuições mais relevantes serão comparadas com o acúmulo bibliográfico e
documental. O sexto capítulo, por fim, fará as considerações finais da pesquisa e
recomendações para trabalhos futuros.
19

2 GESTÃO E REGULAMENTAÇÃO DO TRANSPORTE COLETIVO

O presente capítulo toma como ponto de partida a Constituição Federal de


1988, onde o inciso XX do Art. 21, além do caput do Art. 182 (BRASIL, 1988) impõem
à União o dever de instituir diretrizes gerais que tratem do desenvolvimento urbano,
mas conferem ao Poder Público Municipal a execução das políticas urbanas. Logo, o
atributo municipalista (onde as gestões locais podem gozar de maior autonomia
administrativa) fica evidente no texto constitucional relacionado ao tema, em particular
ao transporte urbano. Nessa mesma linha, o inciso V do Art. 30. incube aos municípios
a prestação de serviços públicos de interesse local, entre os quais o próprio transporte
coletivo, sem deixar de ressaltar que apenas a este serviço é atribuído o caráter
essencial pela CF (BRASIL, 2015).
A mobilidade urbana está entre as prioridades de qualquer gestão pública,
devendo ter por base um planejamento urbano consistente e com ênfase em
investimentos em infraestrutura para o transporte público, fazendo-se necessário
repensar a forma de organização das cidades e torná-las mais compactas, com
estímulo à ocupação mista do solo urbano a fim de reduzir a necessidade de grandes
deslocamentos e garantir a eficiência energética e ambiental por meio de tecnologias
adequadas à demanda a ser atendida, com qualidade na prestação do serviço e tarifas
acessíveis à população (SANTOS et al, 2015). Para Amouzou (2000), a organização
do sistema de transporte público tende a ser mais complexo devido a problemas tanto
de natureza técnica como social e política, havendo assim um grande desafio a ser
enfrentado pelos governos de países em desenvolvimento como o Brasil no que tange
à oferta com qualidade dos serviços públicos, tais como: saúde, educação,
saneamento, segurança, moradia e transporte coletivo, sendo o último capaz de
proporcionar tanto aos seus usuários diretos como aos usuários de outras
modalidades de transporte o cumprimento de suas atividades no tempo previsto com
mais liberdade e maior facilidade, o que contribui para a ativação do desenvolvimento
econômico, social e cultural.
Devido ao declínio expresso pela queda de demanda e de produtividade
dos serviços (também à instabilidade institucional no que diz respeito às relações
entre poder público e agentes privados), faz-se necessário modernizar e atualizar as
políticas que tratam da regulação do serviço de transportes, visando a redução de
20

externalidades e a recuperação do estado de bem-estar para toda a sociedade. Logo,


as respostas para os problemas detectados nos sistemas de transportes públicos
encontram-se em novos paradigmas regulatórios, organizacionais e institucionais,
com a adoção de normas transparentes e estáveis que atribuam riscos e
responsabilidades tanto para agentes públicos como privados, condição primordial
para uma gestão eficaz dos sistemas de transportes coletivos urbanos, com ênfase
na equidade e bem-estar social (GOMIDE, 2004).
O Art. 6º da CF, que já previa como direitos sociais dos cidadãos a
educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a
previdência social, a proteção à maternidade e à infância e a assistência aos
desamparados, agora também garante o transporte como direito constitucional, fato
ocorrido em setembro de 2015 com a aprovação PEC 74/2013 (Emenda
Constitucional 90/2015) (SENADONOTÍCIAS, 2015).
De fato, o transporte público urbano possui papel social primordial na
sociedade, atendendo principalmente aos cidadãos mais desprovidos de renda que
precisam desta modalidade para realizar suas atividades básicas e inclusive ter
acesso às oportunidades de trabalho, porém a falta de planejamento e a ineficiência
do sistema atual geram consequências que atingem a sociedade como um todo,
causando a perda da demanda do transporte, elevação das tarifas, restrição de
acesso às redes de ensino e elevação dos gastos com procedimentos de saúde.
Assim, os custos para a sociedade do atual sistema de transporte público são
inaceitáveis e constituem um grande obstáculo do ponto de vista estratégico, afetando
tanto a qualidade de vida da população como a competitividade econômica do país
em escala global (GHETTI, 2014). Com o fim de reverter esse quadro tendencialmente
negativo, faz-se necessária a implementação de políticas urbanas que garantam a
melhoria da circulação de pessoas e de mercadorias, o que deve ser seguido pelas
três esferas de governo com uma eficaz regulação, que é o conjunto de regras de
conduta e controle de atividades econômicas de domínio público ou privado, onde o
Estado pode intervir tanto para orientar o mercado como para garantir o interesse
público (MENDES, 2011).
Sendo o transporte público um serviço essencial e previsto na Constituição
como direito social, faz-se mister conhecer o processo histórico das políticas voltadas
para o seu planejamento e como este é oferecido à população, considerando que
21

compete às Administrações Municipais a regulação do setor que é operado pela


iniciativa privada na maioria das cidades brasileiras, no intuito de garantir a qualidade
e o acesso ao serviço e a facilitação do desenvolvimento urbano.

2.1 HISTÓRICO DAS POLÍTICAS NACIONAIS VOLTADAS PARA O TRANSPORTE


PÚBLICO

Criado em 11/10/1965, o Grupo Executivo de Integração da Política de


Transportes (GEIPOT), vinculado ao então Ministério da Viação e Obras Públicas,
tinha como objetivo apoiar o governo na coordenação e desenvolvimento de uma série
de estudos de transportes, conforme acordo de Assistência Técnica fechado no
mesmo ano entre o Estado brasileiro e o Banco Internacional para a Reconstrução e
Desenvolvimento (BIRD). O Banco Internacional, solicitado pelo governo do Brasil
para realizar levantamentos de dados de setores estratégicos para a economia
nacional, concluiu que o país não possuía um órgão capaz de desenvolver e gerenciar
políticas de transportes, surgindo então a recomendação de criação do Grupo
Executivo, que foi instituído através do Decreto nº 57.003/65 (ARAÚJO et al, 2012). O
mesmo órgão, em 1969, mantendo igual sigla e desta vez com subordinação ao
Ministério dos Transportes, passou a se chamar “Grupo de Estudos para a Integração
da Política de Transportes”, mas apenas entre 1971 e 1972 o Grupo passou a
desenvolver estudos específicos para os transportes urbanos (BRASIL, 2015).
A criação do GEIPOT também ocorreu por questões financeiras, uma vez
que o Estado Brasileiro, na época sob uma ditadura militar, passou a requerer
financiamentos a organismos internacionais como o próprio Banco Mundial e a
Agência dos Estados Unidos para o Desenvolvimento Internacional (USAID),
almejando a realização de grandes obras de infraestrutura afim de garantir o sucesso
de sua política econômica, com alta subordinação ao capital estrangeiro (ARAÚJO et
al, 2012).
Composto por técnicos de alto escalão, o GEIPOT ampliou os seus estudos
envolvendo transportes urbanos, passando a ser criada, em 1973, a Empresa
Brasileira de Planejamento de Transportes. São destaques da EBTU o Plano de Ação
Imediata de Transportes e Tráfego (PAITT), o Estudo de Transporte Coletivo
(TRANSCOL) e o Plano Diretor de Transporte Urbano (PDTU), além da criação das
22

nove primeiras Regiões Metropolitanas (BRASIL, 2015). A EBTU foi instituída no auge
da crise internacional do petróleo e do crescimento desordenado das cidades, o que
gerou inúmeros problemas para os transportes urbanos. Soma-se a isto a justificativa
de que os governos locais, acometidos pelo crescimento demográfico acentuado,
contavam com recursos limitados para investimentos e viviam sob crescente
dependência do governo federal. A Empresa Brasileira de Transportes Urbanos, que
passou a gerenciar o Fundo de Desenvolvimento dos Transportes Urbanos (FDTU),
também iniciou controle sobre o Sistema Nacional de Transportes Urbanos (SNTU),
que foi constituído de forma ampla e passou a gerenciar a infraestrutura viária
expressa, existente nos níveis Federal, Estadual e Municipal (VASCONCELLOS e
MENDONÇA, 2010).
Na década de 1980, com o advento da crise do petróleo e com o aumento
das passagens do transporte público, a EBTU e o GEIPOT passaram a auxiliar as
prefeituras dos municípios na elaboração de um manual destinado aos técnicos locais
para o cálculo de suas tarifas, cuja metodologia é utilizada até hoje pela maioria das
cidades brasileiras. (BRASIL, 2015). A EBTU também participou da instituição do
Vale-Transporte, onde os empregadores, que são beneficiários indiretos do sistema
de transporte público, passaram a participar do custeio do mesmo. Diante do alto nível
de endividamento do país junto a organismos estrangeiros, o governo passou a
transferir recursos do FNTU para o pagamento da dívida e o descapitalizou, o que
levou a Empresa Brasileira de Transportes Urbanos à decadência (SILVA et al, 2013).
Ao fim da década de 1980, após enfrentar uma série de problemas de natureza legal
e institucional, a EBTU transformou-se em uma agência de fomento, priorizando
medidas de baixo custo e buscando a racionalização dos sistemas existentes,
entrando em extinção no ano de 1991 após a aprovação da Lei nº 8.029, de 12 de
abril de 1990, que autorizava o Governo Nacional (já sob nova conjuntura política) a
dissolver ou privatizar algumas entidades da Administração Pública federal, o que foi
o caso da Empresa Brasileira de Transportes Urbanos (BRASIL, 2015).
O desmanche das políticas federais voltadas para o transporte coletivo, já
notadas durante o regime ditatorial, ficaram mais evidentes a partir da Constituição de
1988, que passou a delegar aos municípios a responsabilidade quanto à prestação
dos serviços de transportes de passageiros (VASCONCELLOS e MENDONÇA, 2010),
o que enfraqueceu ainda mais o apoio político e financeiro ao GEIPOT até que ele
23

entrasse em um processo de liquidação na segunda metade da década de 1990,


encerrando oficialmente suas atividades em 2008 por meio da Medida Provisória nº
427 de 2008 (ARAÚJO e BRASILEIRO, 2012).
Os problemas de ordem urbana, após a extinção de órgãos encarregados
de planejar e executar políticas públicas voltadas principalmente para a questão do
transporte coletivo, passaram a se intensificar em seus diversos aspectos, fato que
levou à promulgação da Lei nº 10.257, em 2001, conhecida como Estatuto da Cidade
(que tem entre as suas diretrizes a obrigatoriedade de um plano de transporte urbano
para cidades com mais de 500 mil habitantes) (MOROTOMI e TOURINHO, 2014); e
a criar o Ministério das Cidades no ano de 2003, responsável pela implantação e
desenvolvimento das políticas públicas urbanas (VASCONCELLOS et al, 2011).
A criação do Ministério das Cidades, decorrente de movimentos sociais que
pautavam desde a década de 1970 a redemocratização do país e a reforma urbana,
veio em um momento em que o governo federal pouco participava das discussões e
elaboração de políticas voltadas para as cidades brasileiras, passando a ocupar um
vazio institucional que se estendia desde a década de 1990 (MARICATO, 2006). O
MCidades, conforme Decreto nº 4.665, é composto pelos seguintes órgãos
específicos: Secretaria Nacional de Habitação; Secretaria Nacional de Saneamento
Ambiental; Secretaria Nacional de Transporte e da Mobilidade Urbana; e Secretaria
Nacional de Acessibilidade e Programas Urbanos. Sendo a SEMOB a centralizadora
da pasta relativa à mobilidade urbana, ressalte-se os importantes trabalhos realizados
pela mesma, como o embasamento do Projeto de Lei nº 1.687 e o texto da Lei da
Mobilidade Urbana.
Após a criação em 2004 por parte do referido Ministério de um conjunto de
publicações (Cadernos MCidades) visando apresentar suas medidas pretendidas de
desenvolvimento urbano, a Presidência da República encaminhou ao Congresso
Nacional o Projeto de Lei nº 1.687, que propunha instituir as políticas de mobilidade
urbana e contou com a participação de diversos grupos de interesse, compostos tanto
por representantes do governo como da sociedade civil organizada. Após os devidos
trâmites, o PL, enfim, é aprovado e se converte na Lei nº 12.587, sancionada em 03
de janeiro de 2012, instituindo assim as diretrizes da Política Nacional de Mobilidade
Urbana (PNMU) (BRASIL, 2015).
24

A Lei da Mobilidade Urbana, que determina aos municípios com mais de


20 mil habitantes a elaboração de planos com o fim de planejar o crescimento das
cidades de forma ordenada, também impõe à União a prestação de assistência
técnica e financeira aos entes federados e também a oferta de capacitação técnica
para garantir o cumprimento dos princípios da Lei, primando pela qualificação dos
serviços de transporte público e não motorizados. No mais, a promulgação desta Lei
fornece respaldo jurídico para que os municípios implantem medidas para, por
exemplo, dar preferência ao transporte coletivo em vias públicas em detrimento do
transporte privado (BRASIL, 2013). Ainda sobre o transporte público, a Lei Nº
12.587/2012 também apresenta diretrizes adicionais a serem observadas nas Leis da
Concessões e Licitações (Lei nº 8.666/1993 e Lei nº 8.987/1995, respectivamente),
principalmente no que diz respeito às penalidades aplicáveis, riscos econômicos,
metas de qualidade do serviço, condições e meios de controle pelo Poder Concedente
e fontes de receitas extratarifárias (MINISTÉRIO DAS CIDADES, 2013 apud BRASIL,
2015).

2.2 O TRANSPORTE COLETIVO URBANO NO ÂMBITO DA CONSTITUIÇÃO


FEDERAL

A Constituição Federal, enquanto lei máxima que define direitos e deveres


dos cidadãos, atribui aos municípios a responsabilidade maior quanto a prestação
(diretamente ou sob regime de concessão ou permissão) dos serviços de transporte
público urbano, cabendo à União estabelecer as diretrizes para o transporte e
mobilidade urbana de forma geral (BRASIL, 1988). Sendo assim, as atribuições dos
municípios em relação à prestação do serviço de transporte público de passageiros
estão assim definidas:

Art. 30. Compete aos Municípios:


I – legislar sobre assuntos de interesse local;
[...] V – organizar e prestar, diretamente ou sob regime de concessão ou
permissão, os serviços públicos de interesse local, incluído o de transporte
coletivo, que tem caráter essencial [...]

Sendo legislado tanto em esfera Federal como Estadual e Municipal, o


transporte público urbano só é tratado diretamente na CF pelos Municípios, ficando
25

os Estados a cargo das normas infraconstitucionais – neste caso a Lei Nº 12.587/2012


(Lei da Mobilidade Urbana).

2.2.1 O TRANSPORTE COLETIVO URBANO NO ÂMBITO


INFRACONSTITUCIONAL (LEI DA MOBILIDADE URBANA)

A Política Nacional de Mobilidade Urbana (PNMU), instituída pela Lei Nº


12.587/2012 (BRASIL, 2012), visa garantir a equidade e o acesso de todos os
cidadãos ao Sistema de Mobilidade Urbana, onde todas as esferas do Poder Público
tem como grande desafio integrar as políticas urbanas que por décadas foram
secundarizadas (BRASIL, 2015b). O Capítulo IV da referida Lei é quem especifica as
atribuições legais de cada esfera, o que será visto a seguir.

a) Quanto à União:

Art. 16. São atribuições da União:


I - prestar assistência técnica e financeira aos Estados, Distrito Federal e
Municípios, nos termos desta Lei;
II - contribuir para a capacitação continuada de pessoas e para o
desenvolvimento das instituições vinculadas à Política Nacional de
Mobilidade Urbana nos Estados, Municípios e Distrito Federal, nos termos
desta Lei;
III - organizar e disponibilizar informações sobre o Sistema Nacional de
Mobilidade Urbana e a qualidade e produtividade dos serviços de transporte
público coletivo;
IV - fomentar a implantação de projetos de transporte público coletivo de
grande e média capacidade nas aglomerações urbanas e nas regiões
metropolitanas;
[...] § 1o A União apoiará e estimulará ações coordenadas e integradas entre
Municípios e Estados em áreas conurbadas, aglomerações urbanas e regiões
metropolitanas destinadas a políticas comuns de mobilidade urbana, inclusive
nas cidades definidas como cidades gêmeas localizadas em regiões de
fronteira com outros países, observado o art. 178 da Constituição Federal.

b) Quanto aos Estados:

Art. 17. São atribuições dos Estados:


I - prestar, diretamente ou por delegação ou gestão associada, os serviços
de transporte público coletivo intermunicipais de caráter urbano, em
conformidade com o § 1º do art. 25 da Constituição Federal;
II - propor política tributária específica e de incentivos para a implantação da
Política Nacional de Mobilidade Urbana; e
III - garantir o apoio e promover a integração dos serviços nas áreas que
ultrapassem os limites de um Município, em conformidade com o § 3º do art.
25 da Constituição Federal.
26

Parágrafo único. Os Estados poderão delegar aos Municípios a organização


e a prestação dos serviços de transporte público coletivo intermunicipal de
caráter urbano, desde que constituído consórcio público ou convênio de
cooperação para tal fim.

c) Quando aos Municípios:

Art. 18. São atribuições dos Municípios:


I - planejar, executar e avaliar a política de mobilidade urbana, bem como
promover a regulamentação dos serviços de transporte urbano;
II - prestar, direta, indiretamente ou por gestão associada, os serviços de
transporte público coletivo urbano, que têm caráter essencial;
III - capacitar pessoas e desenvolver as instituições vinculadas à política de
mobilidade urbana do Município [...]

2.3 REGULAMENTAÇÃO DO TRANSPORTE PÚBLICO URBANO

A regulamentação do transporte público consiste na definição e aplicação


de normas gerais e específicas para a realização do serviço, sendo definidos os
procedimentos relativos ao processo de concessão ou permissão, fiscalização,
cálculos tarifários, punição das empresas que cometerem infrações, etc. (FERRAZ e
TORRES, 2001). A mesma constitui uma tarefa complexa por envolver diversos
interesses institucionais e econômicos, mas é essencial para uma atuação mais
efetiva do Poder Público no combate à privilégios e ineficiências durante a sua
prestação, o que requer conhecimento técnico e alterações de ordem operacional.
Sendo assim, de acordo com a Agência Nacional dos Transportes Urbanos (ANTP)
(1997, p. 134):

A regulamentação do transporte público tem o objetivo de estabelecer a base


legal para a prestação do serviço e, em decorrência, as obrigações e deveres
das entidades públicas e privadas envolvidas. A regulamentação é uma
necessidade decorrente da própria Constituição Federal de 1988 [...] sendo,
portanto fundamental para a organização dos serviços de transporte e para
garantir à administração o controle necessário.

Os serviços públicos só podem ser prestados se houver uma disciplina


normativa que possa regulamentá-los, onde haverá regras para a sua prestação.
Cabendo à entidade legal o processo de regulamentação, o mesmo poderá ser
formalizado através de leis, decretos e outros atos regulamentares, removendo assim
quaisquer obstáculos que possam inviabilizar a execução do serviço, tendo em vista
27

o objetivo de atender à coletividade (CARVALHO FILHO, 2015). Na questão do


Transporte Público Urbano, no âmbito da União, o processo de prestação deste
serviço está devidamente regulamentado pelas Leis Federais Nº 8.666/93 (Lei de
Contratos e Licitações – BRASIL, 1993), Nº 8.987/95 (Lei das Concessões – BRASIL,
1995) e Nº 12.587/2012 (Lei da Mobilidade Urbana – BRASIL, 2012).
O ideal para uma melhor oferta do serviço de transporte público à
população seria a sua disposição por meio de redes integradas, o que é raro nas
cidades brasileiras devido à forte resistência por parte dos operadores privados, que
temem reduzir a sua margem de lucro ao ter que compartilhar a receita arrecadada
no sistema com outras empresas que atuam no setor, fato que se agrava quando se
observa a dificuldade de coordenação político-institucional das várias instâncias e
jurisdições do governo responsáveis frente à questão (GOMIDE, 200-?). Segundo o
mesmo o autor, a situação relatada produz um ambiente desfavorável para o
desenvolvimento do setor, já que os agentes envolvidos estariam caminhando sem
interesse na promoção de investimentos para a melhoria dos serviços.
A operação do serviço de transporte coletivo por ônibus foi delegada ao
setor privado na grande maioria das cidades brasileiras, sendo poucas as situações
onde ocorreram processos licitatórios para a sua outorga. Os contratos firmados
mediante licitação, costumeiramente presentes em municípios cuja gestão da
mobilidade urbana é mais organizada, ocasionam uma regulação mais eficaz por parte
do setor público no que tange à qualidade e custos do serviço, mas ainda é comum
nas cidades a delegação do serviço desconexa das normas infraconstitucionais, o que
significa maior fragilidade no controle e fiscalização do sistema por parte de qualquer
gestão, podendo haver interferência significativa do segmento empresarial no
planejamento urbano e no setor de transportes, cujos interesses econômicos acabam
se sobressaindo aos interesses coletivos previstos pelo Poder Concedente (BNDES,
2012).
Um fato a ser observado é que os transportes públicos urbanos são tidos
como monopólios naturais, já que são raros os casos de competição aberta no sistema
em decorrência da forte e peculiar estrutura de custos (com elevados custos médios),
o que para os operadores privados geraria concorrência ruinosa (ARAGÃO, 2004).
Por outro lado, o Poder Público, no intuito de defender os interesses coletivos, não
pode permitir que empresários naturalmente monopolistas operem com baixa
28

eficiência e qualidade, além da cobrança de tarifas abusivas por meio de um serviço


de caráter essencial, o que torna obrigatório o uso de métodos que garantam a
prestação dos serviços de forma regular. A estratégia mais comum para este caso é
a da concessão do serviço público, onde uma empresa ou consórcio obtém do
governo o direito de prover um serviço sob determinado tempo e condições
privilegiadas em termos de poder de mercado.
A segurança aparente aos concessionários não implica na ausência total
de competição, uma vez que esta pode ser instaurada no ato da distribuição do direito
de operação, geralmente através de processo licitatório, onde duas ou mais empresas
ou consórcios podem se candidatar à prestação do serviço quando a Administração
Pública seleciona (após publicação de edital específico) o licitante que se propor a
oferecer o melhor serviço sob os menores custos e tarifas, fato que estimula o
concessionário atual a buscar meios para melhorar a qualidade do serviço e ter
condições de voltar em uma próxima licitação (ARAGÃO et al, 2002).
Para a teoria econômica, a regulação de determinados serviços públicos
se justifica na incapacidade do mercado, nas suas livres forças, de prover um serviço
de qualidade e universal aos usuários, tendo em vista que a sua desorganização daria
maior liberdade para os operadores praticarem ações que vão contra o interesse
coletivo, como a redução da oferta de linhas em horários menos rentáveis, competição
por passageiros com sobreposição de linhas em horários de pico, a elevação das
tarifas, entre outros, causando deseconomias para todo o sistema (GOMIDE, 200-?).
A regulação dos monopólios tende a se apresentar como uma tarefa
bastante complicada devido à variedade de medidas possíveis juntamente com a
possibilidade de efeitos negativos ou positivos sobre a estrutura produtiva e seus
produtores, no caso as empresas operadoras. Logo, faz-se necessário um
planejamento qualificado pelo Poder Público, que deve verificar as falhas a equacionar
para depois definir quais objetivos pretende alcançar, passando então a estudar que
tipo de estratégia se enquadraria no seu objetivo para posteriormente aplicar a medida
regulatória cabível, cabendo ainda uma avaliação dos possíveis efeitos, dos custos
administrativos e finalmente adotar os passos legais para a sua seleção (ARAGÃO et
al, 2002).
29

Figura 2 - Fluxograma do processo de desenho regulatório

Fonte: Aragão et al (2002)

Trata-se, porém, de um processo cíclico, já que são criadas novas


situações ao mercado com a imposição da regulação, o que não impede que os entes
regulados criem mecanismos capazes de manipular o processo e capturar para si os
seus interesses, fato que exige do Poder Público atualizações periódicas das práticas
regulatórias (ARAGÃO et al, 2002).
Para um pleno funcionamento da Administração Pública, esta deve ser
disciplinada pelo Direito Administrativo, que institui a atividade administrativa pública
estatal e regula o seu desenvolvimento. Vale destacar que sua função é promover a
satisfação de interesses essenciais, relacionados à promoção de direitos
fundamentais, onde tal desempenho requer uma organização harmoniosa e contínua
(JUSTEN FILHO, 2014). Todavia, no caso dos transportes públicos, onde a regulação
se dá por meio dos contratos celebrados entre o Poder Público e operadores privados
(contratos de outorga), a situação do ponto de vista legal também está longe do ideal,
tendo em vista que a maioria das cidades brasileiras não possui contratos de
concessão vigentes, o que é determinado pelo Art. 175 da Constituição Federal e pela
Lei Ordinária nº 8.987/1995, que também ordena a realização de licitação (NITZKE,
2015).
30

2.4 PROCESSOS DE OUTORGA DO SERVIÇO DE TRANSPORTE PÚBLICO NO


BRASIL

O transporte público urbano é um serviço onde o titular é o Poder Público


de cada município, como assim manda a Constituição Federal, que determina também
que ocorra o devido processo licitatório para a outorga do serviço através da
concessão ou permissão. Destaca-se que cabe apenas ao Poder Público a outorga
de um serviço público, não sendo transferida a titularidade deste ao concessionário
ou permissionário que tem como função apenas a sua execução (NITZKE, 2015).
A Lei das Concessões inovou o instituto da outorga de serviço público no
país, advinda da necessidade de garantir a ampliação da oferta dos serviços com
níveis consideráveis de qualidade, sem maiores comprometimentos ao orçamento
público. Sendo assim, a concessão e a permissão do serviço público possuem
características normativas que são referências para o desenvolvimento político,
econômico e social, devendo também dar garantias ao concessionário ou
permissionário. (GODOY, 2015).
O serviço de transporte coletivo tende a ser melhor quando controlado pelo
Poder Público, determinando aspectos referentes à quantidade, à qualidade e preços
que serão cobrados à população, cabendo também à Administração Pública a
exigência de licitação, fator que estimula a concorrência e melhorias na prestação do
serviço por conta da “ameaça” de entrada de novas empresas regulamentadas
(AZAMBUJA, 2002).

2.4.1 CONCESSÃO DO SERVIÇO PÚBLICO

A concessão do serviço público é o instituto do qual o Estado delega a


particular e por sua conta em risco (através de concorrência) a execução de um
serviço também público, nas condições fixadas e alteráveis unilateralmente pelo órgão
gestor, mas sob garantia contratual de um equilíbrio econômico-financeiro cuja
remuneração se dá pela própria exploração do serviço, geralmente por meio de tarifas
cobradas dos usuários (BANDEIRA DE MELLO, 2013). Nessa relação jurídica, a
Administração Pública é denominada de concedente e o operador do serviço de
concessionário, havendo também em tal modalidade uma tríplice participação de
31

sujeitos, uma vez que ocorre uma interação entre o Poder Público, o concessionário
e os usuários, que carregam o ônus de remunerar diretamente o serviço prestado por
particular, que terá um prazo determinado para a realização de suas atividades
(CARVALHO FILHO, 2015).
No contrato de concessão do serviço público, a titularidade dos serviços
continua nas mãos do Poder Concedente, cabendo aos concessionários apenas a
execução dos mesmos. Os prestadores do serviço são pessoas jurídicas de direito
privado que realizam serviços para a Administração Pública e não diretamente para
os usuários (sob o regime da Lei Nº 8.666/93), podendo ocorrer nos contratos a
intervenção por parte do Poder Público na empresa ou consórcio em caso de
descumprimento das cláusulas contratuais (NITZKE, 2015).
O desenho de uma concessão contém vários componentes básicos,
destacando-se, todavia, de acordo com Aragão et al (2002), as seguintes questões
que permeiam o debate das concessões do serviço público:

• A questão tarifária: esta apresenta os pontos mais polêmicos, como a


clareza de sua estrutura, a autoridade tarifária do Poder Público e o nível
de liberdade dos concessionários de variar os preços, as fontes alternativas
de remuneração, eventuais processos de compensação mútua de receitas
(câmara de compensação), funcionamento do sistema de subsídio cruzado
(quando este afeta as economias das empresas) e as regras de indexação
e revisão das tarifas;

• O prazo do contrato: tal prazo deve ser suficiente para a recuperação do


capital investido até a concessão tornar-se atrativa para os investidores,
servindo também, em contrapartida, de instrumento de indução à eficiência;

• O processo de contratação: nesta, a licitação competitiva para os


processos de concessão tem sido progressivamente adotada, inclusive
imposta por lei. Apesar de sua complexa aplicação (devendo ser
regulamentado mediante edital), a mesma é primordial para garantir maior
transparência e isonomia, além do clima competitivo entre os licitantes.
32

No domínio da Lei Nº 8.987/95, a concessão de serviço público (que


também admite obras públicas) ocorre mediante concorrência, podendo ser o
prestador de serviço uma pessoa jurídica ou consórcio de empresas que demonstre
capacidade para a sua realização, por sua conta em risco e por prazo determinado,
devendo também se sujeitar à fiscalização do poder concedente com a participação
dos usuários. Acerca dos encargos do Poder Concedente, além do seu dever de
regulamentar e fiscalizar constantemente o serviço, cabe também a aplicação das
penalidades regulamentares e contratuais, a intervenção ou extinção da concessão
nos casos previstos em lei e no contrato, assim como estimular o aumento da
qualidade, da competitividade e a formação de associações de usuários em prol de
interesses relativos ao serviço.

2.4.2 PERMISSÃO DO SERVIÇO PÚBLICO

A CF brasileira menciona o instituto da permissão nos artigos 30. e 175.


juntamente com o da concessão, não sendo encontrados aspectos no texto
constitucional que diferenciem os mesmos, com exceção de normas
infraconstitucionais.
Nota-se grande divergência na doutrina jurídica quanto ao que venha ser
de fato a permissão do serviço público, sobretudo porque parte dos autores brasileiros
discorrem sobre o assunto de forma desconexa do Direito Positivo (GASPARINI, 2012
apud GODOY, 2015). Sendo assim, o estudo do instituto da permissão deve ser
realizado à luz da Constituição Federal e das legislações que fazem referência ao
mesmo, que lhe atribuíram um caráter contratual.
A Lei Nº 8.987/95 (BRASIL, 1995) assim define e disciplina a permissão:

Art. 2o Para os fins do disposto nesta Lei, considera-se:


[...] IV - permissão de serviço público: a delegação, a título precário, mediante
licitação, da prestação de serviços públicos, feita pelo poder concedente à
pessoa física ou jurídica que demonstre capacidade para seu desempenho,
por sua conta e risco.
[...] Art. 40. A permissão de serviço público será formalizada mediante
contrato de adesão, que observará os termos desta Lei, das demais normas
pertinentes e do edital de licitação, inclusive quanto à precariedade e à
revogabilidade unilateral do contrato pelo poder concedente.
33

No texto infraconstitucional, apesar da similaridade quanto ao tratamento


da concessão e da permissão (de natureza contratual), é possível notar que a
permissão do serviço público se distingue quanto a possibilidade de ser conferida à
pessoa física ou jurídica sob título precário (sem direitos de indenização), mediante
contrato de adesão e somente para serviços, enquanto a concessão só ocorre com
pessoa jurídica ou consórcio de empresas, além de admitir a realização de obras
públicas (RANGEL, 2012).

2.5 PROCESSO LICITATÓRIO

A licitação é um procedimento administrativo de caráter obrigatório do


Poder Público, que apesar de primar pela igualdade entre os licitantes, deve escolher
a melhor e mais vantajosa proposta para a Administração Pública, podendo ser
lançado edital para a realização de obras, serviços, concessões, permissões,
compras, alienações ou locações (PAULO e ALEXANDRINO, 2015).
Na Constituição Federal, a obrigatoriedade da licitação pode ser vista por
meio do inciso XXI do Art. 37:

XXI – ressalvados os casos especificados na legislação, as obras, serviços,


compras e alienações serão contratados mediante processo de licitação
pública que assegure igualdade de condições a todos os concorrentes, com
cláusulas que estabeleçam obrigações de pagamento, mantidas as
condições efetivas da proposta, nos termos da lei, o qual somente permitirá
as exigências de qualificação técnica e econômica indispensáveis à garantia
do cumprimento das obrigações (BRASIL, 1988, p. 38).

A Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993 (Lei das Licitações), é quem


regulamenta o Art. 37, inciso XXI, da CF, estabelecendo normas gerais sobre
licitações e contratos administrativos no âmbito das três esferas de poder.
O processo licitatório pode ser visto como uma oportunidade de
reorganização do setor, onde podem ser montados novos modelos contratuais que
induzam o setor privado à competitividade e ao estímulo da eficiência, todavia, o
tratamento “patrimonialista” há décadas instaurado pelas empresas operadoras em
relação ao serviço é um grande desafio para o Poder Público, já que as relações
históricas entre os governos e as empresas operadoras (onde o setor privado
34

dispunha de grande liberdade para a definição de tarifas e dos itinerários, quase sem
interferências) ainda influenciam e causam um grande movimento de resistência por
parte dos últimos quanto à regulação do serviço de transporte público (DAOU, 2007).
Soma-se a isto, também, o fato de que nem sempre a obrigatoriedade das licitações
se traduz em um melhor desempenho do sistema de transporte coletivo, considerando
a limitada capacidade de monitoramento das autoridades locais e até mesmo a falta
de transparência no ato do processo licitatório, o que dá margem para a prática de
atos que vão contra o interesse público (NITZKE, 2015).

2.6 TARIFAÇÃO E FINANCIAMENTO DO TPU

Os serviços de transporte público por ônibus no país são custeados


majoritariamente pela arrecadação das passagens, que também servem de base para
a afixação dos preços por outras modalidades coletivas nos aglomerados urbanos
devido à importância deste modal. Nota-se que os mecanismos atuais de fixação da
tarifa do transporte estão levando os sistemas coletivos de transporte a um ciclo
vicioso, considerando os constantes aumentos das passagens e consequentemente
a perda de demanda (CARVALHO, 2016).
A fórmula atual de cálculo da tarifa do transporte coletivo é baseada no
modelo sugerido pelo GEIPOT/EBTU, desenvolvida no início da década de 1980 e
que resultou no lançamento das Instruções Práticas para Cálculo de Tarifas de Ônibus
Urbanos, servindo de modelo para diversos municípios do país (BRASIL, 2015c).

Figura 3 - Fórmula básica para o cálculo das tarifas do transporte público por ônibus

Fonte: Carvalho et al (2013)


35

Tal modelo de cálculo é baseado na fórmula de custo médio, onde o custo


quilométrico do sistema é dividido pelo Índice de Passageiros por Quilômetro (IPK), o
que significa que os usuários pagantes (equivalentes) são os responsáveis pelo
pagamento de todos os custos da rede (CARVALHO et al, 2013). São vários os
conflitos entre o Poder Público e os empresários do setor que circundam este método
no momento de discussão da tarifa, onde problemas de assimetria e informações em
geral beneficiam os operadores privados em virtude das falhas de monitoramento e
até mesmo ausência de conhecimento técnico por parte da autoridade pública
(CARVALHO, 2016).
Nos últimos anos se observou no Brasil um crescimento acima da inflação
das tarifas do transporte coletivo por ônibus, enquanto que itens referentes ao
transporte individual tiveram crescimento abaixo da mesma. Isso tende a se agravar
quando se observa que o transporte público é custeado quase que integralmente pela
arrecadação das tarifas sem qualquer contrapartida do poder concedente, oposto ao
que ocorre em diversos países da Europa e da América do Norte, onde o sistema de
transportes recebe recursos diretamente dos governos oriundos ou não de impostos
específicos, visando a redução das passagens e consequentemente o aumento da
acessibilidade ao modal coletivo. O maior exemplo brasileiro se encontra na cidade
de São Paulo, cujo sistema conta com uma cobertura de 20% para o custeio das
gratuidades e descontos para segmentos de usuários, pagos com recursos
orçamentários do Município e do Estado, e que ainda assim estão bem abaixo do nível
médio de subvenções europeias. (CARVALHO et al, 2013).
36

Gráfico 1 - Receitas dos sistemas de ônibus urbano de São Paulo

RECEITAS DOS SISTEMAS DE ÔNIBUS URBANO - SÃO PAULO (MAIO/2014)

3%

22%

75%

Arrecadação tarifária Subvenção da PMSP Recursos diversos (multas e transferências)

Fonte: Gomide e Carvalho (2016)

Observa-se por meio do gráfico que a arrecadação tarifária dos


passageiros corresponde a ¾ da cobertura do sistema de ônibus urbano de São
Paulo, enquanto que a contrapartida da PMSP e de outros recursos totaliza 25% da
receita para o ano de 2014, situação praticamente inversa à verificada na França, cujo
exemplo será mostrado mais à frente.

2.6.1 POLÍTICA TARIFÁRIA

O valor pago pela população para ter acesso ao serviço de transporte


coletivo está ligado a uma política tarifária, sendo a sua formulação estabelecida pela
Administração Pública. Tal questão está ligada a políticas públicas mais amplas, que
geram efeitos sobre a condição socioeconômica dos usuários, sobre o uso e ocupação
do solo e sobre a sustentabilidade econômico-financeira do sistema de transporte
coletivo (NTU, 2005), como mostra a figura abaixo.
37

Figura 4 - Política tarifária de transporte coletivo urbano em um contexto de política pública

Fonte: NTU (2005)

A definição das tarifas deve ser estipulada de acordo com as legislações


vigentes sobre o tema, neste caso a Lei da Mobilidade Urbana, que possui como pano
de fundo a possibilidade de o sistema de transporte público funcionar não apenas com
a arrecadação das passagens, mas também com subsídios públicos e outras fontes
de receita, como de usuários indiretos e de causadores de externalidades negativas
(CARVALHO, 2016).
Um aspecto importante da política tarifária diz respeito à concessão de
descontos e gratuidades disponibilizadas para grupos sociais específicos, entretanto
esta política é aplicada na maioria das cidades brasileiras sem qualquer contrapartida
do Poder Concedente, mas sim do usuário direto do sistema de transportes. Isso
porque no Brasil, os custos das isenções tarifárias são transferidos para as passagens
de ônibus (subsídio cruzado), o que acaba elevando o valor final da mesma. Tal
prática contribui para a exclusão de milhões de usuários do serviço, principalmente
desempregados e outros segmentos que não tem acesso, por exemplo, ao Vale-
Transporte, política nacional que determina que o empregador (que é beneficiário
indireto do sistema de transportes) pague pelo transporte de seus empregados,
podendo descontar o máximo de 6% do salário bruto destes (CARVALHO et al, 2013).
Um exemplo a ser seguido seria o sistema de financiamento do transporte
público da Região da Ilha de França 4 , que conta com uma série de fontes de

4Uma das 13 regiões administrativas da França, possuindo 8 departamentos e Paris como cidade
principal (WIKIPEDIA, 2017).
38

financiamento que asseguram o barateamento das tarifas, como mostra o gráfico


abaixo.

Gráfico 2 – Composição da receita do Sistema de Transporte Público da Ilha de França

COMPOSIÇÃO DA RECEITA DO SISTEMA DE TRANSPORTE PÚBLICO


DA ILHA DE FRANÇA

3%

20%
30%

9%

38%

Passageiros Empregadores Taxa de transporte (VT) Subsídios públicos Outras receitas

Fonte: Carvalho et al (2013)

Nota-se no gráfico uma forte alimentação do sistema com recursos


externos, por meio da Taxa de Contribuição para o Transporte, no francês Taux du
Versement Transport (TVT), tratando-se de um imposto que incide sobre as empresas
com base no número de trabalhadores formais, instituído em 1972 e em
funcionamento até hoje, que taxa as empresas com base em seu número de
empregados contratados. Os passageiros, por sua vez, não pagam mais que 30% do
valor da tarifa, fato que tende tanto auxiliar aos usuários de baixa renda que dependem
do transporte público para a realização de suas atividades, como também a atrair parte
da demanda que utiliza o transporte individual.

2.7 A IMPORTÂNCIA DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA PARA O TRATAMENTO DA


QUESTÃO

Funcionando como instrumento do governo para planejar, organizar, dirigir


e controlar suas ações, a Administração Pública constitui um importante segmento da
ciência da Administração e visa a garantia da plena satisfação das necessidades
39

coletivas básicas, onde o progresso e o desenvolvimento de uma nação passam


obrigatoriamente pela Administração. Nessa perspectiva, países, estados e
municípios se adequam para atender aos interesses coletivos e proporcionar uma
ampla variedade de serviços públicos capazes de melhorar horizontalmente a
qualidade de vida da sociedade (CHIAVENATO, 2008).
O planejamento e a gestão do transporte público devem propiciar a
qualidade de vida, a justiça social e o uso e ocupação racional do solo urbano,
contribuindo assim para as atividades comerciais e para a eficiência econômica das
cidades, o que obriga tal serviço a ser tratado em conjunto com o planejamento geral
dos núcleos urbanos. É necessário também contemplar dois aspectos importantes
que afetam consideravelmente a qualidade de vida da população: a acessibilidade e
a mobilidade. (FERRAZ E TORRES, 2001).
O órgão gestor deve propor e implementar ações que ampliem o acesso ao
sistema de transporte coletivo, garantindo a modicidade tarifária5 para os usuários, o
que exige maior eficiência e redução dos custos operacionais e concessão de
subsídios para o atendimento das camadas sociais mais vulneráveis, além da taxação
dos beneficiários indiretos e causadores de externalidades negativas no trânsito. Faz-
se necessário também o estímulo à competitividade entre as empresas operadoras,
onde esta não deve ocorrer nas ruas com a disputa por passageiros, mas sim
controlando a entrada de novos operadores no setor por meio de licitações
competitivas (ANTP, 1998 apud AZAMBUJA, 2002). Para Couto (2011, p. 06):

A politização do setor, a falta de estrutura de pessoal e equipamentos e a


dificuldade de enfoque no desempenho e nos resultados, características
fortes em muitos órgãos gestores do transporte coletivo urbano brasileiro,
agravam os problemas relacionados com a gestão dos serviços de transporte.
Além disso, as regulamentações dos serviços de transporte, aspectos
estruturantes para o direcionamento da qualidade, ainda são embasadas em
metodologias definidas no início dos anos 1980 e ambas as entidades que
direta ou indiretamente operam o sistema (i.e., o poder público e as empresas
operadoras) pouco evoluíram no que diz respeito aos mecanismos de gestão
e operação dos serviços.

O fato é que o transporte público brasileiro chegou a um nível baixo e de


grande desvalorização, cuja crise do mesmo é assistida com poucas ações da União,
Estados e Municípios. A não aplicação de recursos para qualificar e ampliar o acesso

5Trata-se de um direito subjetivo de um usuário de um serviço público, visando garantir a isonomia e


a inclusão social, com a cobrança de tarifas acessíveis (GONÇALVES, 2013).
40

ao sistema, o bloqueio às reformas regulatórias por parte dos operadores privados,


assim como o boicote destes à realização de licitações, tem gerado não apenas um
desmonte a nível nacional do setor, mas também a desmoralização das
administrações setoriais, ao ponto das mesmas se “desinteressarem” na
implementação de ações para melhorar o serviço. (ARAGÃO, 2004). O setor
empresarial de transporte público, que se congrega em uma classe organizada
nacionalmente e com forte poder de pressão sobre o Poder Público em todas as
esferas, é geralmente beneficiado pela manutenção de permissões precárias de
serviço ou licitações para concessões com “cartas marcadas”, lesando assim a
mobilidade e a acessibilidade dos usuários (SILVEIRA e COCCO, 2013). Com isso,
os cidadãos devem agir para a consecução do bem-comum e busca pela equidade,
uma vez que estes não teriam apenas direitos, mas também obrigações perante a
sociedade, cobrando a responsabilização dos maus gestores por atos praticados
contra a Legislação vigente e contra o interesse público (CHIAVENATO, 2008).
A regulação de serviços como o próprio transporte público se faz
necessária para garantir o bem-estar da sociedade, tendo em vista que ainda são
crescentes os índices de congestionamentos, de poluição do ar e de exclusão dos
mais pobres dos serviços nas grandes cidades, porém o que se observa é que o Poder
Público, quando busca desempenhar o seu papel regulador, dá ênfase ao tratamento
de problemas tradicionais que tendem a contribuir para a sobreposição de linhas e
para o fechamento do mercado pelo segmento empresarial, em detrimento de práticas
que visem melhorar a eficácia social e o atendimento da população.
A reversão desse quadro exige maior participação dos setores sociais na
fiscalização dos serviços, cobrando do Poder Público maior transparência e
compromisso no tratamento da coisa pública, devendo o legislador atuar sob a égide
de uma visão estratégica e com enfoque sistêmico de pequeno, médio e longo prazo,
primando por práticas sustentáveis de operação do transporte público, como o seu
funcionamento por meio de integração física, lógica e tarifária, dando atenção também
para as modalidades individuais e não-motorizadas (GOMIDE, 2004).
41

3 REGIÃO METROPOLITANA DE BELÉM: CARACTERIZAÇÃO E HISTÓRICO


DAS POLÍTICAS DE TRANSPORTES URBANOS

Serão abordados neste capítulo alguns aspectos socioeconômicos e a


formação histórica do transporte coletivo por ônibus na Grande Belém, cujo espaço
urbano cresceu desordenadamente a partir do traçado da antiga Estrada de Ferro
Belém-Bragança (EFB). A Região Metropolitana de Belém (RMB) conta com uma
série de estudos e planos voltados para o equacionamento dos problemas do
transporte, que tinham entre as suas proposições a implementação de um sistema
tronco-alimentado e a realização de processo licitatório para um melhor
funcionamento da rede, medidas que até então não foram concretizadas por uma série
de fatores de ordem econômica e política. Com tais informações, pretende-se auxiliar
para uma melhor compreensão de como ocorre a gestão e delegação do serviço de
transporte coletivo na atualidade, questão que será tratada mais à frente.

3.1 ASPECTOS GEOGRÁFICOS E SOCIOECONÔMICOS DA RMB

A Região Metropolitana de Belém está situada na foz do rio Pará e é


composta por 07 (sete) municípios, sendo eles: Belém, Ananindeua Marituba,
Benevides, Santa Bárbara do Pará, Santa Izabel e Castanhal, possuindo terreno
parcialmente peninsular devido a sua implantação às margens do rio Guamá e da baía
de Guajará (IPEA, 2016). Instituída por meio da Lei Complementar Federal 14/1973
durante a Ditadura Militar, a RMB foi formada inicialmente pelos municípios de Belém
e Ananindeua, aderindo a esta após 22 anos os municípios de Marituba, Benevides e
Santa Bárbara do Pará, através da Lei Complementar Estadual 27/1995, e
posteriormente os municípios de Santa Izabel do Pará e Castanhal por meio das Leis
Complementares Estaduais 72/2010 e 76/2011, respectivamente (Pereira e Vieira,
2016). São 3.565,8 km2 de extensão territorial, com população estimada em 2.275.032
milhões de habitantes e PIB per capita de R$ 10.886,71 (dez mil, oitocentos e oitenta
e seis reais e setenta e um centavos), conforme o censo demográfico do Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE (2010). Do total de habitantes da RMB,
61,25% estão concentrados na sede Belém, sendo a maior densidade demográfica
registrada no município de Ananindeua e o maior crescimento populacional relativo
42

no município de Santa Bárbara do Pará, que registrou no período de 2000 a 2010 um


aumento de 7.369 para 11.683 habitantes, ao mesmo tempo em que o município se
destaca como o único em toda a Região Metropolitana de Belém com população
predominantemente rural, chegando a 68% do total (IPEA, 2016).

Figura 5 - Municípios que compõem a Região Metropolitana de Belém

Fonte: FAPESPA (2016)

A caracterização demográfica da RMB se constitui por um contingente


populacional relativamente pequeno na área insular (conjunto de ilhas), apesar de sua
considerável dimensão territorial. Na parte continental, por sua vez, que possui maior
densidade populacional, existe uma grande concentração de atividades no centro
tradicional de comércio e serviços, local inicial da ocupação da capital e principal polo
de atração de deslocamentos urbanos, que corresponde ao perímetro que vai do
bairro da Cidade Velha até a Avenida Dr. Freitas, no bairro do Marco, limite definido
da 1ª légua patrimonial (TOBIAS, 2005).
De acordo com a Fundação Amazônia de Amparo a Estudos e Pesquisas
do Pará (FAPESPA) (2017), é predominante na RMB os empregos formais nos
43

setores de Serviços (193.896), da Administração Pública (162.452) e do Comércio


(111.740), totalizando com os demais setores 548.170 empregos formais, sendo
416.999 apenas na cidade de Belém.

Gráfico 3 – Empregos formais por setor na Região Metropolitana de Belém

EMPREGOS FORMAIS POR SETOR NA RMB


6.622
1% 5.635
1%

32.469 35.356
6% 7%
193.896
35%
111.740
20%

162.452
30%

TOTAL: 548.170

Serviços Administração Pública


Comércio Construção Civil
Indústria de Transformação Agropecuária, extração vegetal, caça e pesca
Outros
Fonte: Elaboração própria com base em dados da FAPESPA (2016)

Segundo o IPEA (2016), a RMB possui a maior incidência dentre todas as


Regiões Metropolitanas do país de domicílios localizados em locais precários ou de
favela, nos chamados Aglomerados Subnormais. O município de Marituba, como o 4º
mais populoso da Região, é o município metropolitano brasileiro com o maior índice
relativo de domicílios situados em áreas precárias, tendo 77% de seus domicílios em
tal condição. Em escala metropolitana, Marituba é seguido por Ananindeua (61,1%),
Belém (54,4%) e Benevides (1,5%), não constando dados para os demais municípios
(Santa Bárbara, Santa Izabel e Castanhal).
É possível observar por meio da figura que os domicílios em AS se
encontram predominantemente na área de maior densidade populacional da Região
Metropolitana de Belém, como mostra a figura abaixo.
44

Figura 6 - Manchas de Aglomerados Subnormais em municípios da RMB

Fonte: IPEA (2016)

Foi ao final da década de 1960 que se observou um significativo avanço do


tecido urbano para além dos limites do cinturão institucional6, começando inicialmente
pela implantação de conjuntos habitacionais do Sistema Financeiro de Habitação
(como os conjuntos Nova Marambaia e Cidade Nova), ocorrendo ao final da década
seguinte um expressivo crescimento demográfico nas áreas mais precárias da Região
Metropolitana, fato que deu largada ao processo de conurbação7 da região e impactou
fortemente a malha viária das áreas de expansão da RMB, que se consolidou sem
nenhuma organização funcional e com sérios problemas de continuidade e
acessibilidade (PARÁ, 2006). O Principal corredor da Região Metropolitana de Belém,
a BR 316, tem como origem de seu traçado a extinta EFB, que passa pelo território
dos sete municípios que compõem a RMB.
A Região Metropolitana de Belém, seguindo a tendência das grandes
cidades, constituiu o seu espaço urbano desordenadamente, sobretudo nas áreas de
expansão que são utilizadas majoritariamente pelas classes mais desfavorecidas,

6 Considerado como uma vasta área de extensão de terra, o cinturão institucional foi formado no intuito
de conter a expansão urbana da capital paraense, constituído por várias instituições públicas e bases
militares (CORRÊA, 1989).
7 Ocorre quando o limite de duas ou mais cidades parece indefinido por conta do forte processo de

expansão urbana, como é o caso das atuais Regiões Metropolitanas brasileiras (TESSARI, 2009).
45

enquanto que as com melhores condições econômicas tendem a se situar na região


central, onde se concentra a maioria das atividades econômicas (TOBIAS, 2005). A
RMB é a Região Metropolitana brasileira que apresenta o maior comprometimento de
renda média domiciliar com o transporte público, chegando a superar em 86% a média
nacional (IBGE, 2008 apud IPEA, 2016). Enquanto no Brasil a média de gastos com
transportes de uma família compromete em 2,2% a sua renda, a da RMB atinge 4,1%
no total, chegando a 6% para as famílias em maior condição de vulnerabilidade social.
Dois motivos que podem ser considerados para a grande despesa com transporte
coletivo registrada na Grande Belém são a não aplicação de qualquer subsídio por
parte do Poder Público local que vise garantir a mobilidade dos mais necessitados e
a não integração do sistema de transporte público, fato que obriga o usuário a pagar
mais de uma passagem quando necessário embarcar em mais de uma condução para
chegar ao seu destino. Observa-se, também, que questões como os altos valores das
tarifas de ônibus, a qualidade do serviço e outros fatores estão contribuindo para um
aumento em demasia da frota particular de veículos na Região Metropolitana, como
apresenta o gráfico.

Gráfico 4 – Evolução da frota de veículos na RMB

EVOLUÇÃO DA FROTA DE VEÍCULOS NA RMB


2006 2009 2016

675.255

428.898

349.965
244.469 123.386
240.144 69.357
22.200 16.331 12.268 2.815
176.156 55.652 2016
31.040 8.207 5.971 3.838 788
34.261 19.651 2009
4.233 3.435 2.044 364
2006
TOTAL Belém Ananindeua Castanhal Marituba Santa Izabel Benevides Santa
Bárbara

Fonte: Elaboração própria com base em dados do IBGE (2016)


46

Dentre todos os municípios que compõem a RMB, Santa Bárbara do Pará


registrou o maior aumento percentual no período entre 2006 e 2016, chegando a
quase 800%. A Região Metropolitana como um todo registrou uma variação de 281%
no mesmo período, fato que tende a se agravar em meados de 2021, quando a frota
deverá chegar a 1,2 milhão de veículos nas ruas (PORTAL ORM, 2014). Os anos de
2006 e 2009 foram escolhidos por se tratarem do período no qual se realizaram os
últimos estudos voltados para o transporte coletivo por ônibus na RMB, fato que será
abordado mais à frente.
A crescente frota de automóveis vem causando uma série de problemas à
população local, entre eles está o maior gasto de tempo para se deslocar de casa para
o trabalho, cuja variação na Grande Belém foi a maior registrada entre todas as RM’s
do país, com 35,4% durante o período de 1992 a 2012, passando de 24,3 minutos
para 32,8 minutos. A RMB é seguida por Salvador, com 31,2%; São Paulo, com
19,6%; Recife, com 19,8%; e Belo Horizonte, com 13%. As demais Regiões
Metropolitanas registraram variações abaixo dos 10% para o mesmo período
(PEREIRA e SCHWANEN, 2013).
São vários os motivos que tem contribuído para o agravamento de
problemas no serviço de transporte público e outras externalidades negativas, fato
que torna necessário conhecer sua formação histórica e realização de políticas
voltadas para o setor, para inclusive compreender como tal serviço vem sendo
ofertado à população na atualidade, sobretudo no que diz respeito à forma de
contratos firmados entre o poder concedente e as empresas operadoras.

3.2 EVOLUÇÃO HISTÓRICA DO TRANSPORTE PÚBLICO NA RMB

As seges eram os meios mais comuns e precários de transporte em Belém


no século XVIII, transportando normalmente de 4 a 8 passageiros à tração animal.
Posteriormente, em 1868, iniciou-se o serviço de transporte coletivo através dos
bondes, sendo a sua operação concedida com exclusividade ao americano James B.
Bond, por meio de um contrato com duração de 30 anos. A desorganização do sistema
de transportes fez com que o governo municipal intervisse na questão, transferindo
em 1905, para a empresa organizada em Londres (denominada Pará Eletric Railways
And Lighting Company) a permissão do serviço de transporte coletivo, que passou a
47

funcionar com sistema de tração elétrica, em substituição à tração animal (CRUZ,


1973).

Figura 7 - Serviço de bonde elétrico na Avenida Portugal no início do século XX, em Belém

Fonte: Belém (2014)

Correa (1989) destaca que os principais serviços públicos oferecidos pelo


Governo Municipal, incluído o de transportes por bondes elétricos, foram prestados
até meados da década de 1930 com certa regularidade, até que ao final da mesma
década problemas de ordem econômico-financeira passaram a afetar funcionalmente
setores estratégicos para o meio urbano, além de questões do ambíguo e típico
nacionalismo do Estado Novo. Durante esse período a concessionária inglesa, que
também prestava serviços de energia elétrica, iniciou uma política de contenção de
gastos em contrapartida à ação de não investimentos do Estado, o que comprometeu
a expansão do sistema de bondes e gerou a queda na sua qualidade, onde ocorriam
frequentes paralizações em decorrência das consecutivas interrupções de energia
elétrica, que por consequência causavam inúmeros transtornos ao tráfego em geral.
48

Os bondes foram aos poucos sendo substituídos por ônibus até a suspensão oficial
de suas atividades em 1947, após processo de intervenção federal.
Vale destacar que nas décadas de 1940 e 1950 circulavam em Belém os
“Zepelins”, modelo de ônibus fabricado na capital do Pará e inspirado nos dirigíveis
“Zeppelins”, de origem alemã. Há relatos de que o primeiro veículo teria sido
construído em 1948, possuindo carroceria em madeira e revestido de chapas de aço
e linóleo, com bancos em couro acolchoados e com uma “aeromoça” no lugar do
cobrador (MENDES, 1998 apud SOARES, 2014).

Figura 8 - Ônibus “Zepelim” no bairro de São Brás, na década de 1950

Fonte: LEXICAR BRASIL (2014)

Em decorrência das políticas de integração nacional concentradas na


Região Sudeste, houve grande concorrência às pequenas indústrias locais, o que teria
causado o fim precoce dos Zepelins, de fabricação mais artesanal (SOARES, 2014),
sendo a pequena frota existente transferida sobretudo para a cidade de São Luís, no
Maranhão, enquanto o único exemplar que restou em Belém teria sido desmontado e
sua madeira utilizada para fazer fogueira de São João (LEXICAR BRASIL, 2014).
O serviço de transporte coletivo por ônibus, apesar de oferecer maior
dinamismo durante a sua operação, já causava na década de 1960 inúmeros
problemas à população local, uma vez que as cerca de 200 empresas que exploravam
o serviço costumavam circular em alta velocidade e competir por passageiros nas
49

ruas, além da ausência de presteza e conforto nos coletivos sob altos valores
tarifários. A população urbana da capital, por sua vez, que se concentrava nos limites
da primeira légua patrimonial, passou a exceder no decorrer da mesma década os
limites do cinturão institucional, cujas vias principais correspondem às atuais BR 316
e Augusto Montenegro. Tal fato se deve ao alto valor da terra no núcleo principal e à
exclusão das classes populares das políticas urbanas direcionadas sobretudo aos
segmentos de renda mais elevada, iniciando assim um intenso processo de
periferização na Região Metropolitana de Belém e de intensificação dos problemas
que envolvem o Transporte Público Urbano (PENTEADO, 1968).

3.3 FORMAÇÃO DA GESTÃO DO TRANSPORTE PÚBLICO POR ÔNIBUS NA


REGIÃO METROPOLITANA DE BELÉM

O processo de periferização 8 que marca a constituição da Região


Metropolitana de Belém está diretamente ligado às características socioeconômicas
das camadas populacionais de menor renda, uma vez que estas, acometidas pela
ausência de infraestrutura, equipamentos e serviços de consumo coletivo na área de
expansão (além de oportunidades de emprego), ficaram obrigadas à realização de
longos e diários deslocamentos à área central por meio do transporte coletivo, que
além de ser a principal opção de transporte para este segmento, ainda era oferecido
precariamente e com baixíssima regulamentação por parte do poder concedente
(MERCÊS, 1998).
No quadro abaixo é possível observar os órgãos que já foram responsáveis
pela gestão do transporte coletivo por ônibus na RMB, onde os quatro primeiros eram
administrados pelo governo do Pará e os três últimos pelo município de Belém, que
gerencia o sistema regular de transporte da Região Metropolitana por meio da
SEMOB, sob força de convênio com outros municípios.

8Tal processo ocorre não somente com a distância entre o centro e uma área mais distante do tecido
urbano, mas também com as distâncias sociais existentes entre os dois polos, cuja periferia pode ser
caracterizada pelas condições precárias e desprovidas de serviços públicos (NEGRI, 2001).
50

Quadro 1 – Histórico da gestão do transporte coletivo por ônibus na Grande Belém


ÓRGÃO RESPONSÁVEL PERÍODO CARACTERÍSTICAS

DET – Delegacia Estadual de Trânsito 1960 Vinculada à Secretaria de Segurança Pública do


a 1972 Estado do Pará – SEGUP, no âmbito estadual
CETRAN – Conselho Estadual de Trânsito 1966 Instalado com base no novo Código Nacional
a 1969 de Trânsito à época
DETRAN/PA – Departamento de Trânsito 1972 Evolução da DET, autarquia vinculada ao
do Estado do Pará a 1982 Sistema Nacional de Trânsito e à SEGUP
EMTU/Bel – Empresa Metropolitana de 1983 Vinculada ao governo estadual, por meio da
Transporte Urbano a 1991 SETRAN
CTBel – Companhia de Transportes do 1991 Empresa pública vinculada ao gabinete do
Município de Belém a 2002 Prefeito de Belém
CTBel – Companhia de Transportes do 2002 Mudança de razão jurídica, tornando-se uma
Município de Belém a 2012 autarquia
AMUB – Autarquia de Mobilidade 2012 Mudança nominal. Manteve a razão jurídica e
Urbana de Belém a 2013 passou a dispor de novas competências
SEMOB – Superintendência Executiva de 2013 até o Convertida em Superintendência, dispondo de
Mobilidade Urbana momento autonomia administrativa e financeira e
vinculada ao Gabinete do Prefeito de Belém
Fonte: Elaboração própria com base em dados de Mercês (1998 e 2004) e Belém (2016)

A gestão do Transporte Público se encontrava, na década de 1960, no


âmbito do Governo do Estado por meio da Delegacia Estadual de Trânsito (vinculada
à Secretaria de Estado de Segurança Pública e Defesa Social - SEGUP), cuja atuação
se restringia à expedição de autorizações às empresas para a operação do serviço e
a questões de tráfego em geral. Observa-se que o Estado no mesmo período, apesar
de deter respaldo legal para regulamentar o setor, não exercia o seu papel de maneira
efetiva a fim garantir o ordenamento do serviço, cujas decisões costumavam partir do
próprio segmento empresarial. A DET, em decorrência das disposições do Código
Nacional de Trânsito (que também gerou o Sistema Nacional de Trânsito), passa a
realizar apenas funções executivas e voltadas para a engenharia de tráfego, ficando
o Conselho Estadual de Trânsito (CETRAN) (instituído em 1966) responsável pelo
serviço de transporte público na capital. Tal conselho, por conseguinte, começou a
perder sua influência em 1969, quando assume a DET algumas funções relativas ao
transporte. A Delegacia Estadual de Trânsito, em 1972, se converte no Departamento
de Trânsito do Estado do Pará (DETRAN/PA), que ficou responsável pelas funções
do transporte público mesmo sem qualquer referência legal que lhe delegasse
deveres sobre a questão (MERCÊS, 1998).
51

Na década de 1970 surgem mudanças mais significativas no tratamento do


Transporte Público Urbano em âmbito nacional, com grande mobilização de
movimentos sociais que reivindicavam a redemocratização do país e melhores
condições de vida, onde estava inclusa a questão do transporte. Para a Região
Metropolitana de Belém, são formulados pelo Governo do Pará e GEIPOT os
primeiros planos setoriais, incluindo o Estudo de Transporte Coletivo (TRANSCOL),
onde foram detectados, de acordo com levantamento de Mercês (2004), os seguintes
problemas na operação do serviço de transporte coletivo por ônibus:

• Diversas áreas não atendidas;


• Atendimento das áreas recém-ocupadas a partir de meras extensões
das linhas existentes;
• Várias linhas com itinerários superpostos;
• Atendimento insuficiente da periferia; e
• Resistência do segmento empresarial a mudanças no sistema de
transportes.

Havia na época a pretensão dos gestores locais de angariar recursos


financeiros junto ao Governo Federal com a elaboração de planos de transportes,
todavia a resistência dos empresários do setor ocorre em um momento em que estes
(consolidados por meio da constituição de empresas e alteração das relações formais
de concessão) já consideravam a prestação do serviço como um “direito natural”,
questão que somada à omissão do Estado inviabilizou a implementação da maioria
das propostas de regulação do setor. Posteriormente, em 1982, foi criado o Sistema
de Transporte Público de Passageiros da Região Metropolitana de Belém e a Empresa
Metropolitana de Transporte Urbano (EMTU/Bel) (MERCÊS, 2004).
A EMTU/Bel, vinculada à Secretaria de Estado de Transportes (SETRAN),
teria por finalidade a efetivação das diretrizes aprovadas pelo Conselho Deliberativo
da Região Metropolitana de Belém (CONBEL), além de:
52

[...] disciplinar, delegar e fiscalizar a operação e a exploração dos serviços


integrantes do sistema, propor e executar a política tarifária desses serviços,
aplicar penalidades regulamentares e rescindir o contrato de concessão da
empresa que, comprovadamente, se tornasse incapaz moral, financeira ou
tecnicamente para executar em condições satisfatórias o serviço de
transporte coletivo de passageiros (MERCÊS, 1998, p. 194).

A gestão do transporte público em âmbito metropolitano passa a ser


realizada de fato a partir de 1983 por meio da EMTU/Bel, criada especialmente para
tal finalidade, todavia as concessionárias continuaram operando e ampliando as suas
linhas através de meras Ordens de Serviço, sem qualquer processo de concorrência.
Tal empresa atuou efetivamente até o ano de 1991, quando foi extinta por meio da Lei
nº 5.723/92. Assumiu posteriormente as funções relativas ao transporte urbano a
empresa pública denominada Companhia de Transportes do Município de Belém
(CTBel), criada em 1989 por força da Lei Municipal nº 7.475, que não possuía qualquer
atribuição legal para gerir o transporte metropolitano, além do da capital.
Com a extinção do órgão metropolitano, os municípios que integravam a
Grande Belém passaram a enfrentar problemas no que diz respeito à concessão de
linhas de ônibus, descontos e gratuidades, fixação da tarifa e arrecadação de tributos,
fato que só foi equacionado em 1992 com a celebração de convênio entre os
municípios de Belém e Ananindeua, tratando tanto o transporte público de
passageiros como serviços de taxi (MERCÊS, 2004). Em dezembro de 2002, muda-
se a razão jurídica da CTBel de empresa para Autarquia Especial, “entidade integrante
da Administração Pública indireta, reguladora e gestora dos sistemas de transporte e
trânsito do município de Belém” (Lei nº 8.227/02), além de responsável pela
exploração direta ou delegação dos serviços de transporte público por meio de
concessão, permissão ou autorização. Em 2012 é alterada a denominação da CTBel
para Autarquia de Mobilidade Urbana de Belém (AMUB), que já inclui entre as suas
competências a elaboração do Plano Municipal de Mobilidade Urbana, integrado ao
Plano Diretor Municipal (PDU/Bel), em conformidade com o disposto no parágrafo 1º,
Art. 24. da Política Nacional de Mobilidade Urbana (Lei nº 12.587/12).
Em 2013, por força da Lei Ordinária nº 9031/13, é transformada a AMUB
em Superintendência Executiva de Mobilidade Urbana (SEMOB), com sede na capital
paraense e caracterizada por sua autonomia administrativa e financeira e patrimônio
próprio, com personalidade jurídica de direito público e vinculação ao Gabinete do
53

Prefeito de Belém. De acordo com a referida Lei, por meio do seu Art. 17., consideram-
se atribuições mínimas da SEMOB:

I - coordenar, programar e executar a política nacional de transporte público


no Município;
II - disciplinar, conceder, operar e fiscalizar os serviços de transporte público
de passageiros em geral no âmbito do Município;
III - desenvolver o planejamento e a programação do Sistema de Transporte
Público de Passageiros, integrando-o com as decisões sobre planejamento
urbano do Município de Belém e no aglomerado;
IV - detalhar operacionalmente o sistema de transporte público de
passageiros no Município de Belém, fixando itinerários, freqüências, horários,
lotação, equipamentos, turnos de trabalho, integração intermodal, locais e
tempos de parada e critérios para atendimentos especiais;
[...] VI - fiscalizar segundo os parâmetros definidos, as operações e a
exploração do transporte público de passageiros por ônibus, por táxi e por
transportes especiais, promovendo as correções, aplicando as penalidades
regulamentares nas infrações e arrecadando valores provenientes de multas;
VII - elaborar estudos, executar e fiscalizar a política e os valores tarifários
fixados para cada modalidade de transporte público de passageiros;
VIII - administrar a execução do regulamento e das normas sobre transporte
público de passageiros no Município de Belém;
IX - realizar diretamente ou através de terceiros contratados ou convenentes,
estudos, pesquisas e trabalhos técnicos requeridos à administração do
transporte público de passageiros, e ao aprimoramento técnico e gerencial
das empresas operadoras, no Município de Belém;
X - atuar junto a órgãos públicos e privados no âmbito do Município, do Estado
e da União, que atuem sobre os segmentos, que afetam o trânsito e o
transporte público de passageiros, visando compatibilizar as ações de
interesse comum no Município de Belém;
XI - executar as atividades relacionadas com o planejamento, circulação,
operação e fiscalização do trânsito e dos transportes urbanos, que em virtude
de delegação ou convênio, venham a lhe ser atribuídas por órgão ou entidade
da Administração Pública no âmbito da União, do Estado e do Município de
Belém e dos demais municípios do aglomerado urbano;
XII - coordenar a elaboração de estudos, programas e projetos relacionados
com o sistema viário e o sistema de circulação do Município de Belém;
XIII - analisar e decidir sobre a implementação de planos e projetos referente
a loteamentos, conjuntos habitacionais, qualquer tipo de equipamento
urbano, construção ou eventos, que possam vir a influenciar a fluidez do
trânsito e o sistema de transporte urbano;
XIV - manter sistemas informatizados, capazes de coletar, processar,
analisar, e fornecer dados e informações referentes ao Sistema de Transporte
Público de Passageiros, em seus aspectos cadastrais, operacionais e
econômicos;
XV - combater o transporte ilegal de passageiros.
Parágrafo único. Entenda-se como Sistema de Mobilidade Urbana o conjunto
organizado e coordenado dos modos de transporte de serviços e de infra-
estrutura que garantem os deslocamentos de pessoas e cargas no território
do Município.

Desde a extinção da EMTU/Bel, a RMB não possui um órgão que gerencie


o seu sistema de transporte coletivo por ônibus, ficando tal função até o momento a
cargo da Superintendência Executiva de Mobilidade Urbana, como mostram os incisos
54

III e XI, Art. 17., da Lei nº 9031/13. Ressalta-se que durante a existência da EMTU/Bel,
apenas dois municípios constituíam a RMB, compondo a Região na atualidade um
total de sete municípios. Este quadro de concentração poderá mudar após a
introdução do sistema troncal de ônibus na RMB, cujo gerenciamento se dará pela
constituição de um Consórcio Público formado pelo Governo do Pará em conjunto
com os municípios que integram a Região Metropolitana (JICA, 2010).

3.4 PLANOS DE TRANSPORTE PÚBLICO URBANO PARA A REGIÃO


METROPOLITANA DE BELÉM

Há um considerável número de planos e estudos voltados para o sistema


de transportes urbanos na Grande Belém, onde a maioria de suas diretrizes não foi
implementada. Os primeiros foram elaborados pelo GEIPOT e divididos em três
etapas com diferentes níveis de abrangência, conforme citam Morotomi e Tourinho
(2014). O quadro abaixo apresenta os planos realizados e a autoria dos mesmos.

Quadro 2 – Planos e estudos voltados para o sistema de transporte coletivo urbano da RMB
PLANO/ESTUDO ANO INSTITUIÇÕES

Recomendações para Implantação Imediata para o 1978


Sistema de Transportes Urbanos da Região
Metropolitana de Belém – RII
Estudo de Transportes Coletivos – TRANSCOL 1980 Empresa Brasileira de Planejamento de
Estudo de Racionalização do Transporte Coletivo da 1986 Transportes – GEIPOT
Região Metropolitana de Belém – RTC/Bel
Plano Diretor de Transporte Urbano da Região 1991
Metropolitana de Belém – PDTU/1991
Plano Diretor de Transporte Urbano da Região 2001
Metropolitana de Belém – PDTU/2001 Governo do Estado do Pará. Agência de
Estudo de Viabilidade Econômica para o 2003 Cooperação Internacional do Japão – JICA
Melhoramento do Sistema de Transporte na Região
Metropolitana de Belém – EV/2003
Diretrizes de Ordenamento Territorial para a Região 2006 Governo do Estado do Pará. Secretaria
Metropolitana de Belém Executiva de Desenvolvimento Urbano e
Regional – SEDURB
Estudo Preparatório para o Projeto do Sistema de 2010 Governo do Estado do Pará. Agência de
Transporte por Ônibus da Região Metropolitana de Cooperação Internacional do Japão – JICA
Belém – EV/2009
Fonte: Adaptado de Azevedo Filho (2012)

Intitulado de “Recomendações para Implementação Imediata para o


Sistema de Transportes Urbanos da Região Metropolitana de Belém” (RII), tal estudo,
55

de 1978, baseava-se na exposição de problemas e recomendação de soluções de


rápida execução, visando tanto a melhoria do sistema de transportes como a oferta
de dados para ações futuras e mais efetivas (AZEVEDO FILHO, 2012). Já a segunda
etapa, por meio do “Estudo de Transporte Coletivo” (TRANSCOL), de 1980, deu
ênfase aos problemas do transporte público metropolitano e objetivou a organização
e a otimização do sistema de transporte por ônibus com a priorização do mesmo no
sistema viário, além da adequação do serviço à demanda então existente. A terceira
e última etapa, que deveria ser constituída pela elaboração do Plano Diretor de
Transportes Urbanos (PDTU), acabou não ocorrendo devido à ausência de
instrumentação e de respaldo político para a sua viabilização, conforme levantamento
de Lamarão Corrêa (1989). Sendo assim, o ciclo de planos elaborados pelo GEIPOT
para a Grande Belém foi finalizado com a realização do Estudo de Racionalização do
Transporte Coletivo da Região Metropolitana de Belém, em 1986 (RTC/Bel), que se
apresentava basicamente como uma atualização menos ambiciosa do estudo anterior.
Foi no ano de 1991 que o PDTU foi finalizado, sob autoria do Governo do
Estado do Pará em convênio com a Agência de Cooperação Internacional do Japão
(JICA), ao mesmo tempo em que o GEIPOT se encontrava em processo de extinção.
Tal plano consiste em uma análise profunda dos problemas existentes no transporte
urbano metropolitano àquela época, onde se realizou uma pesquisa domiciliar e se
propôs a reformulação do sistema de transportes por meio da criação de linhas
troncais e alimentadoras (AZEVEDO FILHO, 2012). A reforma administrativa em
âmbito Federal, que inclusive decretou a extinção da EBTU, seria um dos motivos da
não realização de estudos de viabilidade econômica e da obtenção de financiamento
junto a órgão externo para o cumprimento de diretrizes existentes no Plano, de acordo
com Morotomi e Tourinho (2014). Soma-se a isso a transferência da gestão do sistema
de transporte coletivo metropolitano para o município de Belém (antes
responsabilidade da EMTU/Bel), que dispunha de baixa capacidade de endividamento
e não possuía interesse político em incorporar as diretrizes do PDTU, considerando a
sua ausência no processo de elaboração do documento.
Com a não implementação das medidas contidas no Plano, ocorreu a sua
atualização (PDTU/2001) também através de convênio entre o Governo do Estado e
a JICA, que inovou em poucos aspectos com relação ao estudo anterior. A JICA, após
a elaboração dos Planos Diretores de Transportes Urbanos de 1991 e 2001, executou
56

o projeto denominado “Estudo de Viabilidade Econômica para o Melhoramento do


Sistema de Transporte na Região Metropolitana de Belém” (EV/2003), sendo o
mesmo atualizado posteriormente em virtude da não implementação das medidas
propostas no estudo, o que gerou um novo documento denominado “Estudo
Preparatório para o Projeto do Sistema de Transporte por Ônibus da Região
Metropolitana de Belém (JICA, 2010).
O objetivo maior do projeto é a introdução de um sistema troncal de ônibus
na Região Metropolitana de Belém, a ser implementado em vias estratégicas (com a
criação de canaletas e faixas exclusivas para ônibus articulados em vias já existentes)
e sem a necessidade de pagamento de tarifa adicional em transbordo, com operação
realizada por empresas de ônibus licitadas.

3.5 PLANO DE MOBILIDADE URBANA DE BELÉM

O Plano de Mobilidade Urbana (PLANMOB) é o instrumento de efetivação


da Política Nacional de Mobilidade Urbana, sendo o mesmo obrigatório para
municípios com população acima de 20.000 (vinte mil) habitantes, de acordo com o §
1o, Art. 24. da Lei Federal nº 12.587/2012, que também determina a sua atualização
em prazo não superior a 10 anos e a sua compatibilização aos respectivos Planos
diretores de cada município, ou neles inserido. A capital paraense, por sua vez,
elaborou o seu Plano de Mobilidade no ano de 2016, tendo como objetivos a promoção
do bem-estar da população, por meio de medidas que visam a normatização do
transporte coletivo e individual, propondo também intervenções físicas e operacionais
de apoio à efetivação de políticas públicas, alinhadas ao Plano Diretor do Município
de Belém (PDU/Belém) (BELÉM, 2016).
Trata-se, pois, do mais recente estudo a abordar aspectos sobre políticas
públicas de mobilidade urbana, que mesmo sendo direcionado à cidade de Belém
propõe ações integradas visando o equacionamento da governança metropolitana,
além de uma efetiva racionalização do sistema de transporte e a sua integração física
e tarifária, primando pela requalificação e valorização urbana. Porém, na atualidade,
a SEMOB (responsável pelo gerenciamento e exploração do sistema municipal e
metropolitano de transporte coletivo), de acordo com o Plano de Mobilidade Urbana
57

de Belém (PlanMob/Belém) (2016), exerce suas funções regulatórias diante da


seguinte realidade:

• o ônibus é o principal modal de transporte coletivo em Belém e no


entorno;
• elevada defasagem tecnológica no atual sistema de transporte
público por ônibus, caracterizado pela baixa atratividade e falta de
competitividade e sustentabilidade, o que contribui para a migração
para o transporte individual e desregulamentado;
• sistema de transporte por ônibus de modelo frágil, com grande
sobreposição de itinerários nos principais corredores de transporte
e no centro principal, onde também está situado o centro histórico
da capital;
• baixa atratividade do sistema nas áreas periféricas e insuficiência
de ligações interbairros;
• delegação inadequada do serviço de transporte coletivo por ônibus,
que se dá sem processo licitatório e via ordens de serviço, o que
evidencia grande fragilidade jurídica para o órgão gestor e
operadores privados;
• modelo obsoleto de gestão tarifária, sendo necessária a integração
e um tipo de remuneração do sistema alternativo à tarifa única, de
modo que não prejudique aos usuários e nem a qualidade e a
sustentabilidade econômica do sistema; e
• falta de regulação durante a ocupação do solo urbano, em virtude
da disposição de atividades causadoras de impacto na mobilidade.

Os problemas elencados no plano são basicamente os mesmos apontados


nas duas últimas décadas por estudos anteriores, cujas propostas de resolução não
foram cumpridas pelas consecutivas administrações municipais por motivos de ordem
política e econômica. Destaca-se, entretanto, o reconhecimento da autarquia
responsável pelo gerenciamento do serviço de transporte coletivo quanto à
precariedade no ato da delegação do serviço aos operadores privados, onde não há
o cumprimento da legislação federal que determina a realização de licitação para sua
58

outorga, somando-se a isso o fato de que a Grande Belém possui alta irregularidade
no uso do solo, com ocupações habitacionais desordenadas e implantação aleatória
de comércios formais e informais, que fazem com que o reordenamento urbano e a
construção de novas vias principais só sejam possíveis sob altos custos com
desapropriações.
É estabelecida pelo PlanMob/Belém (2016) uma série de diretrizes e
objetivos a serem implantados em horizontes temporais de curto (2020), médio (2024)
e longo prazo (2028). No que diz respeito ao Transporte Público, as ações previstas
são as seguintes:

• Até 2020 – Elaborar estudos para definição de modos de transporte público


coletivo para operação em conjunto com o sistema BRT;
• Até 2020 – Desenvolver programa para implantação dos corredores: Av.
Senador Lemos, Av. Centenário, Av. Júlio Cézar e Av. Pedro Álvares Cabral,
para a expansão do sistema BRT;
• Até 2020 – Regulamentar o transporte público coletivo realizado por
veículos de pequeno porte para operar no atendimento de áreas periféricas
de difícil acesso;
• Até 2020 – Fomentar o desenvolvimento de aplicativos para dispositivos
móveis oferecendo informações acerca do sistema de transporte público
coletivo;
• Até 2024 – Reestruturar o sistema complementar de transporte público
coletivo terrestre reordenando as linhas de ônibus existentes ou criando
novas linhas;
• Até 2024 – Climatizar os veículos do sistema troncal de transporte público
coletivo, e 30% do sistema das linhas alimentadoras e convencionais, por
ocasião da renovação da frota;
• Até 2024 – Fomentar a implantação de estacionamentos fora do CHB que
sejam integrados ao sistema de transporte público coletivo;
• Até 2028 – Dotar de mobiliário urbano os pontos de parada de ônibus
destinados a utilização dos usuários do transporte público coletivo e
requalificar os já existentes contemplando, dentre outros itens, o atendimento
da acessibilidade universal; a previsão de cobertura dos abrigos; a instalação
de lixeiras e de painéis eletrônicos com informações aos usuários;
• Até 2028 – Implantar um sistema de transporte público fluvial no Município
de Belém integrado aos demais modais, contemplando terminais hidroviários:
UFPA, Ilha do Combu, Outeiro, Mosqueiro, Palha, Ilha Grande, Praça
Princesa Isabel, Cotijuba, Ver-o-peso e Icoaraci, bem como a inclusão de
linha regular fluvial integrada ao BRT através dos Terminais do Ver-o-peso e
Icoaraci;
• Até 2028 – Criar itinerários de coletivos de pequeno e médio porte, para a
alimentação circular no CHB, e integrá-los ao sistema BRT;
• Até 2028 – Disciplinar o tráfego interno de transporte público coletivo no
CHB;
• Até 2028 – Priorizar a implantação de um sistema de transporte público
circular no CHB. (BELÉM, 2016, p. 77)

Nota-se que a proposições apresentadas pelo Plano dão ênfase a medidas


relacionadas ao sistema Bus Rapid Transit (BRT), que está em fase de
59

implementação desde o ano de 2012. Na prática, Belém e sua Região Metropolitana


continuam com uma concepção operacional obsoleta e antieconômica do transporte
público, problema que espera-se ser minimizado com a execução do novo sistema.

3.6 SISTEMA TRONCO-ALIMENTADOR DE ÔNIBUS (BRT)

O sistema tronco-alimentador consiste na operação de ônibus articulados


ou biarticulados em pistas segregadas ou exclusivas 9 , atendendo à demanda de
passageiros das linhas alimentadoras distribuídas nos bairros. É possível com este
sistema uma integração tanto operacional como física e tarifária, gerando maior
comodidade e rapidez aos usuários, tendo em vista que as linhas alimentadoras, ao
abastecerem o sistema troncal, retornam ao seu local de origem, fato que reduz a
sobreposição de itinerários nos principais corredores urbanos e traz melhorias à
mobilidade urbana (FERRAZ e TORRES, 2001), conforme representação da figura 9.

Figura 9 – Representação esquemática de um sistema tronco-alimentado

Fonte: Adaptado de Alves et al (2015)

9 Pistas segregadas não permitem interferências longitudinais ou transversais, não havendo


cruzamentos em nível. Já as pistas ou faixas exclusivas podem estar ao centro ou nas laterais das
vias, podendo ou não possuir duplicação para ultrapassagem e com poucas possibilidades de
cruzamentos em nível (SEDU/PR, 2002).
60

Para que se qualifique as condições de acessibilidade e mobilidade da


população, faz-se necessário reestruturar as Regiões Metropolitanas no que tange à
modelagem dos sistemas de trânsito e transporte e agregar valor ao sistema de
transporte público, que deve se sobrepor ao transporte individual. Logo, o transporte
coletivo pode ser um fator de indução ou limitação do desenvolvimento das cidades,
sendo fundamental ações contínuas de melhoria nas áreas de infraestrutura e de
gestão, e este é um dos objetivos que subsidiam a escolha do sistema BRT para a
Região Metropolitana de Belém, além de significar uma etapa decisiva para a
reformulação da atual forma de operação e delegação do serviço (FERRARO, 2011).

3.6.1 BRT METROPOLITANO

A criação de um sistema integrado de transporte já vinha sendo proposta


desde a elaboração do PDTU/1991, realizado pela JICA sob encomenda do Governo
do Estado, que também é responsável pela execução de obras de infraestrutura para
a implementação do Sistema de Transporte de Ônibus da RMB, cujo último estudo
(EV/2009) abrangeu os cinco municípios então pertencentes à Região
Metropolitana10.
O objetivo do sistema troncal por ônibus é qualificar o Sistema de
Transporte Público Coletivo da Região Metropolitana de Belém (STPC/RMB), opção
que reduz os congestionamentos de tráfego e otimiza os tempos de deslocamento, o
que também garante uma gestão eficiente do transporte público, de acordo com a
JICA (2010).

10Santa Izabel do Pará e Castanhal só passam a compor a Grande Belém a partir dos anos 2010 e
2011, respectivamente, de acordo com as Leis Complementares Estaduais 72/2010 e 76/2011.
61

Figura 10 – Rotas propostas para a implementação do sistema troncal de ônibus

Fonte: JICA (2010)

As 19 intervenções 11 sugeridas pelo projeto Ação Metrópole sofreram


alterações nos anos posteriores à realização do estudo no que diz respeito a
responsabilidade pela execução de parte das obras (o que será visto no próximo item
do trabalho), ficando sob encargo do Estado apenas o corredor BR 316.

11 Os 19 empreendimentos citados correspondem em sua maioria à implementação de corredores de


linha troncal. O Ação Metrópole, na sua totalidade, possui 39 projetos viários, incluindo a adequação
e construção de novas vias de transporte (JICA, 2010).
62

O Núcleo de Gerenciamento de Transporte Metropolitano 12 (NGTM) é o


órgão responsável pela implementação do Sistema Integrado de Transporte da
Região Metropolitana de Belém, devendo o mesmo ser extinto ao final das devidas
intervenções. Quanto ao gerenciamento do sistema troncal de ônibus, este se dará
pela constituição de um Consórcio Público por parte do Governo do Pará em conjunto
com municípios que integram a RMB, cabendo ao tal a delegação, a regulação e o
controle da linha troncal (JICA, 2010).

Figura 11 – Composição do Consórcio Público Metropolitano

Fonte: JICA (2010)

O presente Consórcio deverá gerenciar o transporte público por ônibus


metropolitano, que funcionará com os sistemas troncal, alimentador e convencional,
ambos operados por empresas privadas devidamente licitadas. No mais, são
atribuições do STPC/RMB (JICA, 2010, 7-7):

(1) Planejar o STPC/RMB, definindo sua configuração física e operacional,


integração com outros modais e o modelo de exploração e financiamento dos
serviços de transporte oferecidos;
(2) Estruturar e desenvolver os processos licitatórios para delegação de
serviços do STPC/RMB, conferindo concessão, permissão ou autorização,
para prestação dos mesmos, bem como gerir os contratos e atos
administrativos deles decorrentes, exercendo todos os poderes legais e
regulamentares que lhe forem outorgados;
(3) Proceder à fixação e ao reajuste das tarifas pagas pelos usuários do
STPC/RMB, obedecendo às condições estabelecidas na legislação em vigor;
[...] (10) Intervir na prestação do serviço, nos casos e condições previstos em
lei, podendo para tanto se utilizar de autorizações especiais ou temporárias a
outros operadores para que realizem os serviços; e/ou da requisição dos
meios, bens ou instalações dos operadores sob intervenção;

12Criado através da Lei Nº 7.573/11, vinculado à Secretaria Especial de Infraestrutura e Logística para
o Desenvolvimento Sustentável (SEINFRA).
63

(11) Extinguir as concessões e permissões e cancelar as autorizações do


STPC/RMB, nos casos previstos em lei, em contrato ou ato administrativo;
[...] (25) Exercer todas as demais atribuições previstas neste instrumento, na
legislação e nos regulamentos específicos relacionados com a prestação dos
serviços integrantes do STPC/RMB.

As atribuições em destaque se enquadram à legislação vigente ao definir


que a delegação do serviço de transporte público só poderá ser efetuada mediante
realização de processo licitatório, podendo o Consórcio Público firmar contratos de
concessão ou permissão com as empresas privadas, assim como emitir autorizações
especiais ou temporárias em caso de intervenção, além de poder extinguir as
concessões ou permissões nas condições previstas por lei. No entanto, a
institucionalização do Consórcio Público, assim como o cumprimento de suas
diretrizes, ainda depende da concretização das obras de infraestrutura do sistema
troncal metropolitano, onde parte do projeto é apresentado na figura abaixo.

Figura 12 – Projeto de corredor troncal e urbanização para a BR 316

Fonte: Agência Pará (2015)

Seu início está sujeito à seleção de uma das sete propostas submetidas
para a realização de obras de implementação da devida infraestrutura do BRT na BR
64

316 13 , cujo trecho, com extensão de 10,7 km, vai de Belém até o município de
Marituba.

3.6.2 BRT BELÉM

O projeto inicial do BRT da capital paraense previa basicamente a


construção de um corredor troncal entre os bairros de São Brás e Icoaraci, cuja obra
teve início em 2012 sob conflito com o projeto Ação Metrópole (elaborado pelo
Governo do Pará), tendo em vista a recusa por parte Prefeitura Municipal de Belém
(PMB), sob Administração de Duciomar Costa, em compatibilizar o projeto municipal
com o estadual (JUSBRASIL, 2012), que já incluía os corredores Almirante Barroso e
Augusto Montenegro no seu escopo.
As obras foram paralisadas em novembro de 2012 após liminar proferida
pela 1ª Vara da Fazenda Pública, mediante ação 14 ajuizada pela Companhia de
Saneamento do Pará (COSANPA) contra o município e a Construtora Andrade
Gutierrez, em decorrência dos riscos causados pela obra ao abastecimento de água
na Grande Belém, só sendo retomadas no ano seguinte com uma nova administração
municipal (2013/2016), após assinatura de um Termo de Ajustamento de Conduta
(TAC) (PARÁ, 2013) firmado entre o Ministério Público Federal (MPF), o Ministério
Público do Estado do Pará (MPPA), a PMB e a Caixa Econômica Federal,
determinando ao município a adequação do projeto, além de sua compatibilização
com o projeto estadual e a realização de nova licitação para a conclusão das
intervenções físicas, passando assim a contar com recursos da segunda fase do
Programa de Aceleração do Crescimento (PAC).
Após as devidas adaptações, o projeto municipal foi ampliado de 19 km
para 55 km, que deverão ser integrados ao transporte fluvial, obedecendo aos
dispostos do PDU/Bel e da Política Nacional de Mobilidade Urbana (PNMU).

13 Edital de Licitação Pública Internacional nº 001/ 2017 – NGTM, de 16 de agosto de 2017,


participando um total de sete empresas e consórcios: (Ata da sessão de abertura das propostas
técnicas, de 06 de novembro de 2017).
14 Processo: 0045452-22.2012.814.0301. TJ-PA
65

Figura 13 – Corredores troncais e fluviais propostos pelo BRT Belém

Fonte: Belém (2016)

De todo o projeto, apenas o trecho que vai de São Brás até o Estádio
Olímpico do Pará (Mangueirão) (com 10 km de extensão) está concluído, que funciona
de modo improvisado através de linhas expressas, com os mesmos ônibus das linhas
66

convencionais em conjunto com um número reduzido de veículos articulados, em fase


experimental. A totalidade das obras, por sua vez, não ficará pronta até o fim da atual
Administração Municipal (2021), de acordo com declaração do prefeito de Belém
Zenaldo Coutinho em entrevista a uma emissora local (G1 GLOBO, 2017).

Figura 14 – Ônibus articulado do sistema BRT Belém

Fonte: Diário do Pará (2016)

Assim como o BRT Metropolitano, o projeto municipal também prevê a


abertura de concorrência pública para a delegação do serviço de transporte público,
o que tem mobilizado tanto o Poder Executivo como o Poder Legislativo, que durante
o ano de 2017 alterou dispositivos da Lei Orgânica do Município de Belém (LOM/Bel)
no Capítulo de Transportes.
67

4 PRÁTICAS REGULATÓRIAS E CONTRATUAIS DO TRANSPORTE COLETIVO


POR ÔNIBUS NA GRANDE BELÉM

O capítulo que se inicia abordará as responsabilidades, aspectos legais e


os modelos de contratação do serviço convencional de transporte coletivo urbano da
RMB, cujo gerenciamento (realizado pela Superintendência Executiva de Mobilidade
Urbana de Belém) abrange cinco dos sete municípios da Região Metropolitana.
O atual sistema de transporte público de passageiros na Grande Belém
transporta em média 21 milhões de passageiros equivalentes por mês, dispondo de
uma frota de 2.042 mil veículos, distribuídos nos tipos: Leve (713), Pesado (1.314) e
Especial (15), com cerca de 13 milhões de quilômetros rodados mensalmente e uma
média 1,62 passageiros por quilômetro equivalentes15 (IPKe) (BELÉM, 2017). São 20
as empresas privadas a compor o sistema de transporte coletivo por ônibus, que
prestam serviços nos tipos Convencional e Seletivo com um total de 165 linhas,
predominantemente radiais (caracterizadas pela ligação dos bairros com o centro
principal) (BELÉM, 2016), como mostra a figura abaixo.

Figura 15 – Representação esquemática de linhas radiais

Fonte: Adaptado de Alves et al (2015)

15Dados extraídos dos anexos do Decreto Nº 87.154/2017 – PMB, de 19 de janeiro de 2017, publicado
no Diário Oficial do Município de Belém, Nº 13.208, Ano LVIII.
68

As mesmas atuam sob regime jurídico precário, sem ter passado até o
momento por qualquer processo licitatório, fato que inviabiliza, por exemplo, a
integração física e tarifária do sistema local.

Figura 16 - Ônibus de linha convencional que circula na Grande Belém

Fonte: Belém Buss (2017)

Ressalta-se que três órgãos em sua maioria gerenciam as linhas de ônibus


que circulam em território metropolitano, pertencentes a esferas administrativas
distintas. Além da SEMOB (autarquia responsável tanto pelas linhas da capital
paraense como das que operam em âmbito metropolitano), há também a Secretaria
Municipal de Transporte e Trânsito (SEMUTRAN) (que regula as linhas que circulam
exclusivamente no município de Ananindeua) e a Agência de Regulação e Controle
de Serviços Públicos do Estado do Pará (ARCON) (encarregada pelo transporte
intermunicipal de passageiros com tarifas e serviços diferenciados, onde estão
incluídos os municípios de Santa Izabel do Pará e Castanhal), interessando para esta
pesquisa apenas as linhas reguladas pelo primeiro órgão.
A influência política, econômica e social da cidade-sede da RMB é um
atributo que contribui para que a mesma mantenha até hoje o controle sobre o sistema
metropolitano de transporte coletivo através da SEMOB, fato que pode ser
comprovado inclusive por meio dos vários estudos voltados para o setor e que
sugerem a integração metropolitana da rede (BELÉM, 2016).
69

4.1 LEI ORGÂNICA DO MUNICÍPIO DE BELÉM

A Lei Orgânica é considerada a mais importante norma dos municípios,


organizando o exercício do poder local e reafirmando os preceitos constitucionais,
indicando as competências dos poderes Executivo e Legislativo e determinando as
diretrizes das políticas municipais (IGAM, 2014).
Criada em 30/03/1990, a Lei Orgânica do Município de Belém obedecerá
aos princípios da publicidade, legalidade, impessoalidade, moralidade e ao preceito
da participação popular no planejamento municipal e demais normas das
Constituições Federal e Estadual, podendo também realizar consórcios e estabelecer
convênios com outros municípios, com o Estado ou com a União para o
equacionamento de problemas comuns (LOM/Bel, 2017).
A LOM/Bel também é responsável pela normatização da prestação do
serviço regular de transporte coletivo de Belém, atendendo, sobretudo às demandas
sociais do cidadão, como as de deslocamento, “[...] no exercício da garantia
constitucional da liberdade de locomoção e, no seu planejamento, organização,
implantação, gerenciamento, operação, prestação e fiscalização [...]” (LOM/Bel,
2017).
O Art. 147.16 (que discorre sobre a administração do sistema de transporte
por ônibus no município) determina que:

Art. 147. O planejamento, gerenciamento, regulação, controle e fiscalização


do sistema de transporte e do tráfego urbano são atividades de competência
municipal, podendo o Município delegar a operação e prestação do serviço
de transporte e outros serviços de gerenciamento a pessoa jurídica, por meio
de prévia licitação pública de concessão ou permissão de serviços públicos,
nos termos da legislação específica, sendo essas delegações regidas pelos
seguintes critérios:
I – a concessão de serviço público será feita pelo Município mediante prévia
autorização da Câmara Municipal de Belém e ainda realização de processo
licitatório, na modalidade de concorrência, a pessoa jurídica que exerça
atividade empresarial de transporte coletivo de passageiros ou consórcio de
empresas que demonstre capacidade técnica e financeira para seu
desempenho.
II – a permissão de serviço público será realizada a título precário, mediante
prévia licitação pública, da prestação de serviços públicos, feita pelo
Município a sociedade cooperativa de transporte coletivo de passageiros, que
demonstre capacidade técnica e financeira para seu desempenho.
III – o sistema de transporte e do tráfego urbano do Município observará os
seguintes princípios:

16Redação dada após aprovação (em 05 de dezembro) do Projeto Nº 485, de 04 de setembro de 2017,
sendo a atualização anterior realizada pela Emenda Nº 013, de 04 de julho de 2017).
70

a) caráter especial do contrato de concessão ou permissão, de sua


prorrogação, das penalidades a elas aplicáveis bem como das condições de
fiscalização, suspensão, intervenção, caducidade e rescisão. (AC)
(Acréscimo)
b) período contratual dos contratos de permissão até 10 anos, podendo
estes serem renovados desde que obedecidos os critérios da Lei e, nos
contratos de concessão até 6 anos, podendo ser renovado por igual período,
conforme parecer técnico emitido pelo órgão gestor; (AC)
c) as permissionárias terão a sua frota estabelecida em no máximo
15% (quinze por cento) da frota operacional das concessionárias do
Município de Belém. (AC) (emenda) (grifo do original)
d) a tarifa da remuneração da prestação do serviço de transporte público
coletivo deverá ser constituída pelo preço público cobrado do usuário pelos
serviços somado à receita oriunda de outras fontes de custeio, de forma a
cobrir os reais custos do serviço prestado ao usuário pelas concessionárias
e permissionárias, respeitando o princípio da modicidade (AC) (emenda)
(grifo do original)
e) observância aos princípios da engenharia de tráfego; (AC)
f) garantia dos direitos do usuário; (AC)
g) adoção de política tarifária aprovada mediante lei que regulará os
casos de tarifação social; (AC)
h) obrigação de manter serviço adequado e permanente (AC)
i) padrões de segurança e manutenção; (AC)
j) obrigatoriedade de adaptação dos transportes coletivos para as
pessoas portadoras de deficiências; (AC)
k) as concessionárias ou permissionárias do sistema de transporte terão
seu regime de prestação de serviço público regulamentado pelo Município.
(AC)
Art. 147-A. Fica o órgão gestor autorizado a contratar empresa especializada
para a implantação e manutenção de infraestruturas de apoio relacionadas
aos serviços de transporte de passageiros, incluindo abrigos, pontos de
parada, e mobiliário urbano correlato. (AC)
Parágrafo Único. Esta contratação poderá ser realizada por contrato
administrativo regular ou por meio de concessão, caso demonstrada sua
viabilidade técnica e operacional, por prazo não superior a 20 anos. (AC)

No que tange ao transporte coletivo por ônibus, a nova Redação dá à


empresa ou consórcio a possibilidade de prorrogação do contrato de concessão por
mais 06 anos mediante parecer do poder concedente, o que deverá tornar o processo
licitatório mais atrativo para empresas de dentro e fora do estado, de acordo com o
autor da proposta de Emenda (CMB, 2017). Também é estendido o período dos
contratos de permissão17 de 06 para 10 anos à sociedade cooperativa de transporte
(à título precário e mediante concorrência pública, podendo ser renovado), cuja frota
não poderá exceder o total de 15% da frota operacional das concessionárias do
Município de Belém. Quanto à remuneração do serviço de transporte público, o seu
valor deverá ser constituído tanto pela tarifa como por receitas obtidas de outras fontes

17O período de 06 anos para os contratos de permissão, definido pela Emenda 021, de 27 de
dezembro de 2002, não abrangia o transporte alternativo, que só passou a ser amparado na LOM/Bel
com a Emenda nº 013, de 04 de julho de 2017.
71

de custeio (como veiculação de propaganda nos veículos), além da possibilidade de


criação de Lei que regulamente a instituição de tarifação social, que abre a
possibilidade do Poder Público participar (através de subsídios) do rateio da
passagem, hoje concentrada apenas no usuário do serviço que já paga os descontos
(como a meia passagem) e gratuidades por meio de subsídio cruzado.
O Art. 148. autoriza o Poder Público a intervir nas concessionárias ou
permissionárias de transporte público para garantir o cumprimento das cláusulas
contratuais e do Regulamento do Serviço de Transporte Coletivo por Ônibus do
Município de Belém (RSTCOMB), além de apurar denúncias de práticas que firam ao
ato administrativo de concessão ou permissão. Já o Art. 149. permite a criação de um
Fundo Municipal direcionado para a aquisição da Frota Pública, assim como a criação
de uma câmara de compensação tarifária relativa ao transporte público, essencial
para a remuneração de um sistema licitado e integrado.
Outro ponto importante do Capítulo V da LOM/Bel é o Art. 155., onde o
Município de Belém pode firmar convênios com o Estado ou com outros municípios a
fim de viabilizar o serviço de transporte metropolitano18, hoje gerenciado pela capital
paraense.
Tanto a concessão como a permissão do serviço de transporte público só
poderão ocorrer com a realização de licitação, devendo haver prévia autorização da
Câmara Municipal de Belém (CMB) para o caso da concessão. Após a efetivação dos
contratos, as empresas concessionárias e permissionárias, a fim de evitar
intervenções do Município deverão cumprir as cláusulas contratuais e as normas do
RSTCOMB, como determina a Lei Orgânica do Município de Belém, o que é
representado pela figura abaixo.

18A Lei Complementar Nº 027, de 19 de outubro de 1995, previa a criação de um Conselho


Metropolitano para tratar de assuntos e execução de serviços de interesse comum dos municípios que
compõem a RMB, onde se encaixaria a gestão do serviço de transporte coletivo por ônibus. Todavia,
o Conselho Metropolitano da Região Metropolitana de Belém nunca foi criado, e as questões relativas
ao transporte coletivo regular, incluindo decisões sobre as tarifas, são deliberadas pelo Conselho
Municipal de Transportes de Belém, cabendo ainda sanção do prefeito da capital (PARÁ, 1995).
72

Figura 17 – Etapas para a concessão e permissão do serviço de transporte público de acordo com a
LOM/Bel

Fonte: Elaboração própria com base em dados da LOM/Bel (2017)

A obrigatoriedade de licitação existe na LOM/Bel desde a sua criação na


década de 1990, em conformidade com as normas constitucionais e Leis Federais de
Contratos e Licitações e das Concessões. Porém, tais determinações nunca foram
aplicadas ao sistema de transporte coletivo da RMB, onde a delegação do serviço de
transporte ocorre por meio de Ordem de Serviço, ato no qual é atribuída erroneamente
uma natureza jurídica contratual pela autarquia responsável pelo gerenciamento do
transporte público regular da Grande Belém.

4.2 OUTORGA DO SERVIÇO DE TRANSPORTE COLETIVO POR ÔNIBUS

A Lei Nº 12.587 prevê, através do Art. 14., que são direitos dos usuários do
SNMU receber serviço adequado, participar do planejamento, fiscalização e avaliação
do sistema, assim como o Art. 6º da Lei Nº 8.987, que descreve por meio do § 1º que
“Serviço adequado é o que satisfaz as condições de regularidade, continuidade,
eficiência, segurança, atualidade, generalidade, cortesia na sua prestação e
modicidade das tarifas”. Todavia, para o cumprimento de tais preceitos, é necessário
haver uma estabilidade jurídica no que diz respeito à outorga do serviço de transporte
público à iniciativa privada, com o devido cumprimento das normais legais por quem
73

presta o serviço (sob os regimes da concessão ou permissão), o que não é o caso da


Região Metropolitana de Belém.
Como já citado no segundo capítulo deste trabalho, a regulação de
determinados serviços públicos se justifica na incapacidade do mercado, nas suas
livres forças, de prover um serviço com qualidade e universal aos usuários, tendo em
vista que a sua desorganização daria maior liberdade para os operadores praticarem
ações que vão contra o interesse coletivo (GOMIDE, 200-?), fato que requer não
apenas o cumprimento das normas infraconstitucionais e das cláusulas contratuais,
mas também uma atuação estatal sob o Princípio da Moralidade Administrativa 19,
indispensável para que interesses particulares não se sobressaiam ao interesse
público. Assim, independente do ato administrativo praticado para a delegação do
serviço de transporte coletivo, o setor privado sempre atuará visando o lucro, mas
prestando um serviço que é um direito social, o que exige do Estado uma adequada
regulação sob fiscalização e atuação da sociedade, em especial dos usuários do
serviço (JUSTEN FILHO, 2003).
A Superintendência Executiva de Mobilidade Urbana de Belém (SEMOB),
responsável tanto pela gestão do sistema de transporte coletivo da capital como da
RMB, delega o serviço às empresas do ramo através de Ordens de Serviço, um Ato
Administrativo que consiste na forma como determinado serviço contratado pela
Administração Pública deve ser realizado por terceiros, sob os aspectos gerenciais e
técnicos (JUSBRASIL, 2012).

4.2.1 MODELO DE CONTRATAÇÃO UTILIZADO PELA SEMOB – ORDEM DE


SERVIÇO
As Ordens de Serviços emitidas pela SEMOB possuem natureza
contratual entre o órgão regulador e as empresas operadoras, que devem cumprir
com todas as disposições presentes no Regulamento do Serviço de Transporte
Coletivo sob pena de imediata rescisão da O.S. O documento (Anexo II), além de
servir como contrato, também regulamenta procedimentos relativos à operação do
serviço, como itinerário, período de operação, quilometragem, número de viagens,
frota, tempo de percurso, intervalo entre viagens, entre outros.

19Princípio previsto pela CF, Art. 37, onde “A administração pública direta e indireta de qualquer dos
Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de
legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência [...]” (BRASIL, 1998).
74

Não consta na O.S. o seu tempo de vigência (onde na LOM/Bel é


atribuído o prazo de 10 anos para permissões e 06 para concessões), mas pode o
órgão gestor alterar dados operacionais da linha a qualquer momento para um melhor
atendimento do público usuário, sob os aspectos de demanda, nível de serviço,
segurança de tráfego e velocidade operacional, conforme o Parágrafo Único do Art.
18 do RSTCOMB (1991). Apesar de a atual redação da LOM/Bel atribuir o regime
permissionário apenas à sociedade cooperativa de transporte coletivo, a redação
dada pela Emenda 021/2002 (que alterou dispositivos do capítulo de transportes e
vigorou até julho de 2017) aplicava a permissão de serviço público de forma ampla,
onde se enquadrava o transporte por ônibus. Destaca-se ainda que a Ordem de
Serviço é emitida unicamente por linha da empresa cadastrada no sistema, tendo esta
que recolher o Custo do Gerenciamento Operacional do Serviço (CGO) mensalmente
ao órgão gestor.
As empresas operadoras, apesar de identificadas como
“permissionárias” nas Ordens de Serviços, não se enquadram na Lei Nº 8.987/95,
tendo em vista que a permissão de serviço público (sempre a título precário) só ocorre
mediante licitação, em consonância com o inciso IV do Art. 2º da mesma lei. Para
todos os efeitos, a doutrina jurídica já admitia a permissão condicionada ou contratual,
prática que concede ao permissionário maior segurança ao estabelecer prazos para
a prestação do serviço e limites à faculdade discricionária 20 do Poder Público de
revogar a permissão a qualquer momento, o que distancia o cunho unilateral do ato
administrativo da permissão e aproxima a permissão condicionada do instituto da
concessão, de natureza contratual e bilateral (RANGEL, 2012). Com isso, em hipótese
de compatibilidade entre a delegação do transporte coletivo da Grande Belém e a
aplicação dessa modalidade de permissão, a mesma tornou-se desnecessária com o
advento da Lei Federal Nº 8.987/95, que trata de forma similar a concessão e
permissão do serviço público ao atribuir para ambas uma natureza contratual.

4.2.2 REGULAMENTO DO SERVIÇO DE TRANSPORTE COLETIVO POR ÔNIBUS


DO MUNICÍPIO DE BELÉM

20A Discricionariedade ocorre quando uma Lei deixa espaço (dando autorização para a prática de atos
ou quando há casos omissos) para a livre atuação da Administração Pública sob a égide do interesse
público, devendo esta não ultrapassar o que determina o Legislador para que não proceda de forma
arbitrária (DI PIETRO, 2017).
75

Criado em 1991, o RSTCOMB é o responsável pela regulação do serviço


de transporte coletivo por ônibus de Belém e municípios da Região Metropolitana, por
força de convênio com os mesmos. Com o Regulamento ainda não atualizado, o seu
Art. 4. diz que o órgão gestor do sistema de transporte público poderá delegar tal
serviço mediante permissão e realização de processo licitatório, o que não cabe mais
devido às alterações no Capítulo de Transportes da LOM/Bel. Os Artigos 5. e 6., por
sua vez, revelam a necessidade de formalização de um Termo de Permissão para a
exploração do serviço, firmado entre o poder concedente e a empresa operadora, que
ainda pode ser renovado por igual período, modificado unilateralmente pelo órgão
gestor, sofrer suspensão parcial ou ser revogado (por extinção da linha ou denúncia
da permissão).
Para ser Permissionária do sistema de transporte por ônibus, a Empresa
Operadora, segundo o Art. 8, terá que possuir registro na Junta Comercial do Estado
do Pará (JUCEPA), dispor de capital suficiente para a execução dos serviços, frota de
ônibus de acordo com as demandas da linha, condições de idoneidade moral, técnica
e financeira e adequada infraestrutura própria ou locada para a guarda e manutenção
da frota. Já o Art. 13. estabelece algumas condições para justificar um possível
cancelamento da permissão, como a falência do permissionário, a cassação da
permissão, superveniência da lei ou decisão judicial, entre outros, motivos que não
constituem causa de indenização. Além da permissão, o órgão gestor também pode
delegar o serviço através do Termo de Autorização21, a ocorrer com os serviços de
caráter especial, experimental e extraordinário, que poderão reverter-se na forma de
Ordem de Serviço.
O RSTCOMB possui ao todo 76 artigos, distribuídos em 14 capítulos.
Quanto ao Termo de Permissão identificado do RSTCOMB, o mesmo não foi
localizado durante a pesquisa, alegando a SEMOB que a relação contratual entre o
órgão gestor e as empresas operadoras acontece unicamente via Ordem de Serviço,
havendo somente um cadastro das empresas, que devem se manter sempre
atualizadas sob porte dos documentos constantes no Art. 38 do Regulamento.

21 Autorização é um ato administrativo unilateral e precário, revisado no exercício de competência


discricionária que possibilita a um particular a prestação de um serviço público ou o uso temporário de
um bem também público, sem prazo determinado e sob risco de revogação a qualquer momento
(JUSTEN FILHO, 2014).
76

Com as duas últimas alterações ocorridas em 2017 no capítulo de


transportes da Lei Orgânica Municipal, será necessário atualizar o Regulamento afim
de adequá-lo à nova redação.

4.3 A QUESTÃO TARIFÁRIA

A tarifa padrão do serviço regular de transporte coletivo por ônibus de


Belém é a do tipo comum (podendo ser unificada ou não), deliberada pelo Conselho
Municipal de Transportes22 e homologada pelo Poder Público Municipal, cujo valor
atual é de R$ 3,10 (três reais e dez centavos), sendo R$ 1,55 (um real e cinquenta e
cinco centavos) para estudantes (BELÉM, 2017)23. A remuneração do sistema, por
sua vez, é coberta integralmente pelos usuários pagantes, que também custeiam por
meio de subsídio cruzado os descontos e gratuidades de várias categorias de
usuários, inexistindo qualquer contrapartida do Poder Concedente. Para calcular os
custos operacionais do sistema, o órgão gestor utiliza metodologia similar à do
GEIPOT, onde a fórmula se dá pela soma dos Custos Operacionais Totais (CT)
dividida pelo Índice de Passageiros por Quilômetro equivalentes (IPKe).
Considerada uma das capitais com a tarifa mais barata do país pelo Poder
Público local, a cidade de Belém, assim como a sua Região Metropolitana, ainda não
dispõe de um sistema integrado que possibilite ao usuário a utilização de outro ônibus
sem a obrigação de pagamento adicional. A questão tarifária sempre foi alvo de
reclamações da população em decorrência do alto valor cobrado e da qualidade do
serviço prestado, gerando manifestações de rua sempre que anunciado um novo
reajuste, todavia a falta de conhecimento e de auxílio técnico e jurídico perante o
assunto acaba sendo um dos fatores para as consecutivas derrotas populares durante
as reivindicações pela redução das tarifas, que também devem perpassar pela forma
como o sistema é operado e pela aplicação das leis e normas na delegação do serviço
à iniciativa privada, onde no caso da Grande Belém prevalece a fragilidade jurídica
dos contratos e a inexistência de licitação, que além de dever induzir as empresas a

22 Constituído pela Lei Municipal nº 7.873/98, formado por entidades governamentais, da iniciativa
privada e da sociedade civil organizada, sendo considerada uma instância consultiva e deliberativa do
Governo.
23 De toda a RMB, apenas as linhas do trajeto Belém-Mosqueiro / Mosqueiro-Belém não possuem

tarifa unificada, custando R$ 5,00 (cinco reais) o valor integral e R$ 2,50 (dois reais e cinquenta
centavos) para estudantes. PMB. Diário Oficial, Belém 19 jan. 2017. Caderno Nº 13.208, Ano LVIII.
77

uma melhor prestação do serviço, também deve garantir a modicidade tarifária aos
usuários, conforme o Art. 8º da Lei Nº 12.587/2012.

4.4 COMPOSIÇÃO EMPRESARIAL E PROPOSTA DE EDITAL DE LICITAÇÃO


ENCAMINHADA PELA PMB

O sistema de transporte coletivo que atende a RMB é composto por 20


empresas, que juntas somam 165 linhas e 182 itinerários (sendo 117 de situação
municipal e 65 metropolitanos).
As empresas que prestam serviços de transporte coletivo por ônibus na
Grande Belém são associadas ao Sindicato das Empresas de Transportes de
Passageiros de Belém (SETRANSBEL), pessoa jurídica de direito privado que
também administra o sistema Passe Fácil, responsável pela emissão das carteiras de
meia passagem, passe especial e vale transporte.

Quadro 3 - Relação das empresas que compõem o sistema local de transporte por ônibus
CÓDIGO NOME DA EMPRESA ABRANGÊNCIA
AA TRANSPORTADORA ARSENAL LTDA. MUNICIPAL
AE TRANSURB LTDA MUNICIPAL
AF VIAÇÃO FORTE LTDA METROPOLITANA
AI VIAÇÃO GUAJARÁ LTDA MUNICIPAL
AL AUTOVIAÇÃO MONTE CRISTO LTDA. MUNICIPAL
AM TRANSPORTES SÃO LUIZ LTDA. MUNICIPAL
AP VIAÇÃO RIO GUAMÁ LTDA. MUNICIPAL
AT TRANSPORTES NOVA MARAMBAIA LTDA. MUNICIPAL
AV AUTOVIÁRIA PARAENSE LTDA. METROPOLITANA
BD BELÉM RIO TRANSPORTES LTDA. MUNICIPAL
BG TRANSPORTES SÃO JOSÉ LTDA. MUNICIPAL
BJ VIALOC TRANSPORTES DE PASSAGEIROS LTDA. METROPOLITANA
BL ÁGUAS LINDAS LTDA. METROPOLITANA
BN BARATA TRANSPORTES LTDA. METROPOLITANA
BT VIALUZ TRANSPORTES LTDA. MUNICIPAL
BU TRANSPORTES CANADÁ LTDA. MUNICIPAL
CB ROSÁRIO DE FÁTIMA LTDA. METROPOLITANA
CC TRANS’UNI TRANSPORTES LTDA. MUNICIPAL
CG TRANSCOL TRANSPORTES E TURISMO LTDA. MUNICIPAL
CL TRANSCAPI TRANSPORTE DE PASSAGEIROS LTDA METROPOLITANA
Fonte: Adaptado de SEMOB (2017)
78

A prática da outorga por Ordem de Serviço no sistema de transporte local


poderá mudar com o edital de licitação encaminhado pela PMB ao Ministério Público
do Estado do Pará (MPPA), ao Ministério Público Federal (MPF) e ao Tribunal de
Contas dos Municípios do Estado do Pará (TCM-PA), em agosto de 2017. De acordo
com a SEMOB (2017), a licitação vai acabar com o sistema de autorizações precárias
dos ônibus da capital, que passará a ter uma nova logística alinhada ao BRT. O
objetivo do encaminhamento do edital para os órgãos anteriormente citados foi dar
maior transparência ao processo licitatório, disponibilizando todas as regras para
prévia análise.
Sua abertura estava prevista para o mês de dezembro, o que não ocorreu
por motivos não divulgados. Foi solicitado via ofício à SEMOB pela Coordenação de
Secretariado Executivo Trilíngue uma cópia da minuta do edital em setembro de 2017,
que respondeu apenas que os interessados devem aguardar a sua publicação no
Diário Oficial do Município de Belém (DOM-Belém). A finalidade da solicitação, além
de avaliar suas regras e outros aspectos legais de interesse do trabalho, era verificar
questões referentes à qualidade do serviço, como se as empresas teriam de introduzir
ar-condicionado nos ônibus24, questão polêmica que gerou grande debate durante o
ano de 2017.
No mês de dezembro foi aprovado em 2º turno pela CMB o Projeto de
Emenda do Vereador Victor Dias, que altera dispositivos da Lei Orgânica no Capítulo
de Transportes, aumentando o prazo dos contratos de concessão de 06 para 12 anos,
através de renovação do mesmo. De acordo com a bancada governista na Câmara, a
empresa vencedora do processo licitatório para a concessão do serviço de transporte
coletivo será obrigada a implantar o sistema de ar-condicionado nos ônibus, já que a
prorrogação da concessão seria uma condição para que as empresas refrigerassem
os coletivos (G1 GLOBO, 2017b). Tal obrigação, no entanto, não consta na Emenda

24 De autoria do Vereador Dr. Chiquinho, o Projeto de Lei que determinava a instalação de sistema de
ar-condicionado nos veículos de transporte coletivo de passageiros no prazo de até 04 anos foi barrado
pela maioria dos vereadores da CMB, sob justificativa de que o mesmo seria inconstitucional em
virtude da existência de uma outra Lei de igual teor aprovada em 2009, porém a Lei Municipal Nº
8661/2009 determina unicamente a implantação de refrigeração nos ônibus seletivos, de tarifa superior
aos ônibus de linha convencional. Sendo o ar-condicionado nos coletivos uma demanda histórica da
população, o veto parlamentar causou grande polêmica e mobilizou a opinião pública, fazendo com
que a Administração Municipal instituísse uma comissão para avaliar os custos necessários para
equipar a frota regular de ônibus da Grande Belém. Com a entrega pela SEMOB do relatório conclusivo
à CMB em junho de 2017, o Presidente da Câmara, Mauro Freitas, informou que uma audiência
pública seria marcada para apresentar os resultados da comissão à população, o que até o fim de
2017 não ocorreu (CMB, 2017).
79

aprovada, inexistindo até então uma garantia legal de que o sistema de ar-
condicionado nos coletivos seja realmente implantado, questão que só será
confirmada após a realização do devido processo licitatório para a outorga do serviço.
Uma nova possibilidade de licitar o sistema de transporte coletivo surge 25
anos após a única tentativa de abertura de concorrência pública que se tem na história
da RMB, ocorrida em 1992 através da CTBel. O objeto era licitar a linha Icoaraci Ver-
o-Peso I, cuja empresa selecionada exploraria o serviço mediante o regime
permissionário, conforme as determinações da LOM/Bel na época. As três empresas
que participavam da concorrência requereram a impugnação do processo, além de
uma delas que já havia entrado com uma ação judicial visando o cancelamento da
licitação. A decisão da justiça, então, foi desfavorável à CTBel, que foi obrigada a
cancelar a concorrência (MERCÊS, 2004). Espera-se, todavia, que a atual proposta
de licitação do sistema venha de fato qualificar o setor, com o devido cumprimento da
legislação federal e municipal, questão que deverá contar com exaustiva atuação
popular.
Ao analisar a literatura acumulada durante a pesquisa, assim como os
documentos obtidos tanto em repartições públicas como na internet, é possível
elencar os principais aspectos e a forma de delegação do serviço de transporte
coletivo por ônibus da RMB, que serão apresentados no quadro abaixo.

Quadro 4 – Principais aspectos do serviço regular de transporte coletivo da RMB


ITEM RESPOSTA
Órgão gerenciador do sistema Superintendência Executiva de Mobilidade Urbana de Belém -SEMOB
(desde 2013).
Forma de contratação do serviço Via Ordem de Serviço, sem realização de licitação.

Duração da delegação do 06 anos renováveis por mais 06 anos para os contratos de concessão, de
transporte coletivo por ônibus acordo com a LOM/Bel (não ocorre na prática).
Diretrizes da prestação do serviço Regulamento do Serviço de Transporte Coletivo por ônibus do Município
de transporte público de Belém – RSTCOMB.
Forma de operação Operação em linhas predominantemente convencionais e seletivas.

Média de passageiros 21 milhões de passageiros por mês.


transportados
Total de veículos 2.042 veículos.

Número de linhas e itinerários 165 linhas e 182 itinerários.

Tarifa padrão Tarifa integral de R$ 3,10, sendo R$ 1,55 para estudantes.


Remuneração do serviço Cobertura integral pelos usuários pagantes, sem subsídio público.

Fonte: Elaboração própria


80

4.5 POSSÍVEIS MOTIVOS DA ATUAL FORMA DE OUTORGA DO SERVIÇO DE


TRANSPORTE COLETIVO

A precariedade existente na forma de outorga do serviço de transporte na


RMB é histórica e pode ser justificada pela relação estabelecida entre o Poder Público
e o segmento empresarial, que por questões de ordem política e econômica já
considerava as linhas em que operava como um “direito natural”, havendo conflitos no
interior da categoria tanto para a ampliação como para a manutenção das áreas de
atuação, agindo o Estado como mero intermediador destas disputas. No decorrer da
expansão da Grande Belém, o Poder Público resolvia o problema da falta de
transporte coletivo nas áreas recém-ocupadas com a extensão do itinerário de linhas
já existentes ou com a criação de novas linhas mediante Ordem de Serviço, sem que
estas passassem por qualquer processo licitatório (MERCÊS, 1998).
Através de pesquisa realizada por Mercês (1998) (que pesquisa o período
de formação da questão da Área Metropolitana a partir do ano de 1966), destaca-se
a vigência de três principais contratos de concessão firmados de forma precária entre
o Estado e as empresas operadoras, que passaram a operar sob condições
privilegiadas. O primeiro, de 1971, foi editado pela DET e tinha validade de três anos,
podendo ser renovado. O segundo, de 1975, é editado pelo DETRAN, onde as
empresas poderiam atuar sob período indefinido até posterior elaboração de
regulamento de transporte específico (que conteria novas regras para a outorga do
serviço) e sua publicação no Diário Oficial, todavia as empresas continuaram a operar
sob prazo indeterminado. O terceiro, por sua vez, de 1983, também do DETRAN, tinha
validade de cinco anos, podendo ser renovado com alterações conforme julgamento
das partes, fato que expôs a redução da autoridade reguladora do Estado e deu maior
poder de decisão ao setor privado, já fortalecido e agindo como um cartel, organizados
através do SETRANSBEL.
As necessidades de transporte da população, dessa forma, eram atendidas
em conformidade com os interesses empresariais, passando a se organizar em
movimentos em prol da melhoria do serviço e da redução das tarifas, tendo destaque
a conquista da meia passagem após grandes manifestações públicas (sobretudo de
estudantes) ao final da década de 1980, conseguindo incluir o direito na LOM/Bel já
na década de 1990. Todavia, ainda eram extensos os problemas durante a prestação
81

do serviço, sobretudo no que diz respeito à sua regulamentação, que mesmo após
denúncia dos contratos de concessão de 1983 pela EMTU/Bel (a partir desse ano
responsável pela gerência do transporte público metropolitano, posteriormente ao
DETRAN), os mesmos permaneceram inalterados por parte do Governo do Estado
(MERCÊS, 2004).
Destaca-se que tais fatos foram anteriores ao advento da Constituição
Federal de 1988 (quando não havia a obrigatoriedade de licitação para a delegação
de serviços públicos), e mesmo com as novas regras vigorando para o instituto da
concessão e permissão, os contratos firmados em 1983 foram renovados sob força
de cláusula imperativa (no entendimento das empresas à época), indo a discussão
inúmeras vezes para a arena judicial, com vitórias para segmento empresarial. O
serviço de transporte público na RMB, desde então, vem sendo explorado sob a
expedição de Ordem de Serviço, o que por si só caracterizaria as empresas como
meras autorizadas, sendo a prática da outorga por Autorização não prevista nas Leis
de Licitações e de Concessões, e na Constituição Federal (1988) apenas os serviços
de transporte rodoviário interestadual e internacional de passageiros estão
contemplados.
Ao analisar os ciclos da oferta de transporte público propostos por Gómez-
Ibáñez e Meyer (1991) para países desenvolvidos e em desenvolvimento,
Vasconcellos (2000) elabora três ciclos aplicáveis à realidade brasileira, que
consistem na forma como o serviço de transporte vem sendo prestado e sob que tipo
de regulamentação. São eles: Ciclo “Selvagem”, Ciclo “Corporativista” e Ciclo da
“Irresponsabilidade”.
Após análise dos três, será apresentado o “Ciclo Selvagem” de
Vasconcellos (2000), ciclo que mais se aplica à realidade histórica do serviço de
transporte coletivo por ônibus da Região Metropolitana de Belém:

• Indivíduos começam a prestar o serviço em veículos próprios para


atender à demanda não atendida, obtendo altas receitas;
• Outros indivíduos são atraídos pela rentabilidade do negócio até o
ponto em que a oferta passa a ser maior à demanda;
• Reduz-se a qualidade do serviço, assim como se amplia a
competição por passageiros nas ruas em prol da lucratividade;
82

• Inicia-se uma organização em grupos como associações ou


cooperativas, estipulando regras próprias a fim de aumentar e/ou
proteger as receitas, excluindo os que não aceitarem as normas e
impedindo a entrada de novos operadores, podendo haver apoio
inclusive de setores do Estado e de negócios ilícitos;
• O serviço é concentrado nos corredores de maior demanda,
havendo aumentos desnecessários da tarifa e uma cobrança
mensal aos operadores para garantir a “proteção” do mercado;
• Pode haver a ajuda de políticos para a entrada no “negócio”;
• O resultado é a divisão do “mercado” entre máfias, que podem
coexistir na cidade pacificamente ou não; e
• Com o descontrole é iniciado processo de regulamentação ou
operação pública.

A análise da literatura acumulada durante a pesquisa, assim como os


documentos obtidos que evidenciam a forma de outorga do serviço de transporte
público na Grande Belém, comprovam a similaridade da trajetória do sistema local
com o Ciclo “Selvagem” criado por Vasconcellos, sendo necessárias algumas
adaptações a fim de elaborar um ciclo que poderia representar o caso da RMB,
especificamente para o transporte coletivo por ônibus, do período que vai desde a
primeira metade do século XX com a substituição dos bondes até os dias atuais.

• O serviço de transporte coletivo por ônibus inicia de forma individual


e substituindo gradativamente o serviço de bondes, suspenso
oficialmente em 1947 (CORRÊA, 1989);
• O interesse no negócio fez com que existissem na década de 1960
mais ou menos 200 empresas e proprietários individuais, em sua
maioria com um ou dois veículos, que operavam sob meras
autorizações concedidas pela DET (PENTEADO, 1968);
• Havia forte concorrência dos empresários antes e durante a
operação nas áreas mais centrais, havendo desinteresse em
atender as áreas periféricas, que sofriam constantemente com
irregularidades no serviço (MERCÊS, 1998);
83

• O gerenciamento do transporte coletivo, ainda sob responsabilidade


do Governo do Estado, era tratado como um “apêndice” dentro de
um órgão que legalmente controlava apenas questões de tráfego em
geral, com poder de polícia (MERCÊS, 1998);
• Os graves problemas no setor fizeram com que o CETRAN
intervisse na questão, a começar pela concentração dos vários
proprietários de ônibus em empresas ao final da década de 1960,
passando também a mediar os conflitos internos da categoria
(MERCÊS, 1998);
• Se estabeleceu uma relação jurídica mais estável e se ampliou a
possibilidade de controle do serviço, ao mesmo tempo em que se
contribuiu para o crescimento econômico das empresas (após
muitos proprietários deixarem o negócio) e para o estabelecimento
de relações com grupos dominantes politicamente (MERCÊS,
1998);
• Apesar de uma maior segurança jurídica, a regulamentação do setor
permaneceu precária e o serviço também, com os empresários já
fortalecidos e organizados no SETRANSBEL, agindo em cartel
(MERCÊS, 1998);
• Os planos e estudos realizados a partir da década de 1970 para
qualificar o setor não foram implementados, ao mesmo tempo em
que as áreas de expansão com ocupação já consolidadas se
tornaram objeto de interesse dos empresários, que passaram a
pleitear a extensão ou a criação de novas linhas (MERCÊS, 1998);
• O Governo do Estado compactuava com um serviço conveniente ao
setor empresarial, onde as poucas tentativas de reformular o sistema
ou se tornaram objeto de negociação, ou foram para a esfera judicial,
prevalecendo os interesses das empresas com base nos contratos
precários, cujo último de que se tem registro foi firmado em 1983
(MERCÊS, 2004);
• Na década de 1990 o gerenciamento do transporte público passa a
ser responsabilidade do Município de Belém (CTBel), que sofre
derrota após abertura da única da concorrência pública no ano de
84

1992, que tinha como objeto a linha Icoaraci Ver-o-Peso (MERCÊS,


2004); e
• Sob gerência da SEMOB, atua um total de 20 empresas na Grande
Belém, onde a criação de novas linhas e/ou ingresso de novos
operadores ocorre via Ordem de Serviço, sem realização de licitação
(BELÉM, 2016).

Figura 18 – Ciclo do transporte coletivo por ônibus na RMB

Fonte: Elaboração própria com base em dados de Penteado (1968), Corrêa (1989), Mercês (1998 e
2004) e Belém (2016)

Como se observa, os problemas existentes na relação jurídica firmada


entre o Poder Público e empresas para a outorga do serviço de transporte em âmbito
metropolitano perduram desde quando a regulação do serviço era de competência do
Governo do Estado na década de 1960, cujas operadoras do setor (que se constituem
em um oligopólio) acabaram se fortalecendo não somente por conta dos contratos
precários firmados naquela época, mas também pela própria atuação estatal que agia
85

muitas vezes para atender seus interesses, mesmo que tal conduta viesse a lesar o
interesse público.
Mesmo com o advento da Constituição Federal em 1988, assim como das
Leis Federais Nº 8.666/93 e Nº 8.987/95 (que estabelecem regras para a licitação e
outorga de serviços públicos mediante contratos administrativos), manteve-se não
somente a fragilidade jurídica do modelo de contratação do serviço, mas também
práticas de possíveis favorecimentos pelo Poder Concedente a empresas operadoras
por meio de alguns casos registrados a partir da eleição do atual chefe do Poder
Executivo Municipal.

4.6 DENÚNCIAS ENVOLVENDO O SETOR EMPRESARIAL E A PREFEITURA


MUNICIPAL DE BELÉM

Desde que assumiu a Prefeitura de Belém em 2013, Zenaldo Coutinho teve


seu nome associado a escândalos na prestação do serviço de transporte coletivo por
ônibus, a iniciar por um projeto de sua autoria que pretendia alterar na LOM/Bel o
prazo dos contratos de concessão de 06 para até 20 anos (podendo ser renovados),
além da criação de um Fundo Municipal de Transporte (cuja fonte de arrecadação
principal seriam os valores flutuantes dos vales transporte dos usuários) para
melhorias no sistema, sob alegação de as mudanças seriam uma forma de adequação
à Lei Federal Nº 12.587/2012 (BELÉM, 2015).
No intuito de garantir a aprovação de tal projeto (que foi apreciado na CMB
em sessão extraordinária), o mesmo também previa a regulamentação do transporte
alternativo da capital (através do inciso II do Art. 147.), onde a delegação do serviço
ocorreria via regime permissionário à sociedade cooperativa de transporte coletivo de
passageiros, mediante prévia licitação pública e com período contratual de 10 anos.
Os trabalhadores do transporte alternativo, por sua vez (no intuito de regulamentar o
setor até então desamparado pela Lei Orgânica), lotaram o espaço destinado ao
público na CMB para pressionar os parlamentares em favor do projeto, que ainda
assim foi rejeitado por vereadores da própria base aliada de Zenaldo Coutinho, que
teriam estranhado a forma de condução do projeto pelo Prefeito (DOL, 2015).
Apesar da não aprovação do projeto o Poder Executivo Municipal continuou
com ações que, ao invés de unicamente cumprir o seu papel regulador e garantir a
86

devida fiscalização para uma adequada prestação do serviço, acabaram contribuindo


com o crescimento exponencial de empresas de transporte coletivo, com destaque
para a “Operação Corujão”25, que retirou do sistema as empresas com veículos que
ofereciam riscos aos usuários, como foi o caso das empresas Eurobus e Transportes
Pinheiro (G1 GLOBO, 2014). Além das que tiveram suas Ordens de Serviço caçadas,
outras acabaram deixando o sistema por não conseguir atender as determinações da
SEMOB. Foram elas: Viação Perpétuo Socorro, Viação Princesa, Transporte Vianorte
e Vip Transportes (G1 GLOBO, 2014b).

Figura 19 – Veículo sendo lacrado pela Operação Corujão

Fonte: SEMOB (2015)

As linhas pertencentes às empresas desligadas do sistema foram


transferidas em sua maioria para a empresa Belém Rio Transportes LTDA, de
propriedade de Jacob Barata, que desde o início da gestão de Zenaldo triplicou de
20% para 62% a sua participação no sistema, sem qualquer processo licitatório. O
prefeito de Belém, por sua vez, teria recebido ilegalmente a quantia de R$
2.150.000,00 (Dois milhões, cento e cinquenta mil reais) do SETRANSBEL para sua
campanha em 2012, de acordo com uma gravação entre um ex-integrante do

25Operação que consistia na vistoria dos ônibus (sempre no turno da noite) que circulam na Grande
Belém afim de detectar possíveis irregularidades (SEMOB, 2015).
87

Sindicato e um empresário do ramo de combustíveis, divulgada pelo portal da Revista


Veja (2016). Além do valor para sua campanha, o áudio sugere que Zenaldo teria
favorecido Jacob Barata, fazendo menção à facilidade com que a empresa Belém Rio
cresceu na capital paraense.
O crescimento exponencial da Belém Rio também é alvo de denúncia de
dois ex-empresários do setor em entrevista para o blog Ver-o-Fato (2016), relatando
algumas práticas que teriam sido realizadas pela SEMOB contra empresas menores
para favorecer a Belém Rio, como a realização de falsas blitzes e a imposição de
construção de terminais, no intuito de transferir suas linhas para Jacob, que também
possui empresas de ônibus no Rio de Janeiro e vários outros negócios pelo Brasil e
em Portugal.
Além da imprensa, tais ex-empresários também levaram as denúncias ao
Ministério Público do Estado, onde incluíram acusações de que a Administração
Municipal estaria vendendo Ordens de Serviço para empresas de transporte da
capital, e também a ocorrência de um desvio milionário de verbas referentes às sobras
de vales transporte, cujos valores estariam sendo apropriados indevidamente pelo
SETRANSBEL e utilizados para o pagamento de propina à políticos. Porém, para
investigar tais denúncias, o MPPA precisaria de uma autorização do Tribunal de
Justiça do Estado do Pará (TJ-PA) e assim dar andamento aos trabalhos, todavia,
apesar das várias testemunhas e inclusive gravações, o pedido foi negado pela Seção
de Direito Penal do TJ-PA (BACANANEWS, 2017), que acatou em junho de 2017 um
recurso interposto pelo Prefeito de Belém para que o processo de investigação não
fosse aberto. O MPPA, em seguida, entrou com recurso (VER-O-FATO, 2017) no
Supremo Tribunal de Justiça (STJ), gerando o Processo de Nº 0004454-
66.2017.8.14.0000, de 19 de junho de 2017, contra a decisão da Seção de Direito
Penal do TJ-PA, o que ainda estava em tramitação (sob segredo de justiça) até o
fechamento do mesmo ano.
No âmbito do Poder Legislativo, foi aprovado na CMB em maio de 2017 um
requerimento autorizando a instalação de uma Comissão Parlamentar de Inquérito
(CPI) para investigar denúncias referentes ao desvio de valores do sistema Passe
Fácil, por parte do SETRANSBEL. Os nomes para compor a CPI deveriam ser
indicados pela Mesa Diretora em um prazo de 60 dias, prorrogáveis por mais 60 dias,
o que não ocorreu na Câmara (BELÉM, 2017).
88

5 PESQUISA DE CAMPO, ANÁLISES E RESULTADOS

O quinto capítulo discorrerá sobre os dados coletados através de


entrevistas, realizadas no formato semi-estruturado devido a possibilidade de
obtenção de resultados mais aprofundados quanto ao objeto estudado. O objetivo
geral deste trabalho pôde ser alcançado no decorrer do quarto capítulo com a análise
dos documentos obtidos principalmente na SEMOB e na CMB, fato que será
reforçado com a contribuição dos sujeitos escolhidos estrategicamente para a etapa
de entrevistas, sendo estes representados pela figura abaixo.

Figura 20 – Sujeitos e entidades elencadas para a fase de entrevistas

Fonte: Elaboração própria

Foram elencados 07 sujeitos para esta última etapa, dos quais 04


participaram por meio de gravações em áudio e 01 com o encaminhamento das
respostas à Coordenação do Curso de Bacharelado em Secretariado Executivo
Trilíngue (Anexo I), representando o Núcleo de Gerenciamento de Transporte
89

Metropolitano (NGTM) 26 . Compõem o quadro de entrevistados um Diretor da


Superintendência Executiva de Mobilidade Urbana de Belém (SEMOB), dois
parlamentares da Câmara Municipal de Belém (CMB) e um Professor de Direito
(Rede privada). O Ministério Público do Estado do Pará (MPPA) e a Comissão de
Trânsito da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB/PA), solicitados através dos
Ofícios 029/2017 SET e 038/2017 SET/CCSE/UEPA, respectivamente, não
atenderam ao pedido constante no documento, onde apenas o MPPA respondeu no
intuito de obter maiores informações quanto a pesquisa para encaminhar a demanda
à Promotoria competente, porém não houve retorno até o início do período de recesso
do órgão, em 19 de dezembro de 2017.
Devido à complexidade do objeto estudado, foram selecionados
representantes sobretudo de repartições públicas que tenham envolvimento direto ou
indireto com o serviço de transporte coletivo por ônibus, contemplando os três
poderes políticos (Executivo, Legislativo e Judiciário). Além destes, também foi
elencado um docente de direito da rede privada para explicar o que determinam as
normas infraconstitucionais para a delegação de serviços públicos, como o transporte
coletivo.

5.1. APLICAÇÃO DAS ENTREVISTAS

As entrevistas físicas ocorreram entre os meses de outubro e dezembro de


2017 nos locais de trabalho dos entrevistados, sendo os pedidos realizados por meio
de ofícios encaminhados pela Coordenação do Curso de Secretariado ou por
agendamento direto. Cada participante (com exceção do representante da SEMOB)
assinou um Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, que apresenta informações
sobre a pesquisa e autoriza a utilização do material coletado para uso exclusivo do
estudo (Apêndice B). Foi utilizado para este momento um aparelho celular com
gravador, cujos áudios foram organizados em pastas devidamente nomeadas. Os
entrevistados, por sua vez, serão identificados da seguinte forma:

26 A entrevista que se pretendia realizar com o NGTM seria presencial e com perguntas semi-
estruturadas, todavia a opção do órgão público em responder as perguntas previamente
encaminhadas apenas por escrito não permitiu a efetivação de novos questionamentos e a própria
análise neste capítulo específico. Sendo assim, foi optado por apresentar as informações
disponibilizadas pelo NGTM apenas nos anexos deste trabalho.
90

• Vereadora da Câmara Municipal de Belém (CMB) – (Entrevista 1);


• Diretor Geral da Superintendência Executiva de Mobilidade Urbana
(SEMOB) – (Entrevista 2);
• Professor de Direito (Rede privada) – (Entrevista 3); e
• Vereador da Câmara Municipal de Belém – (Entrevista 4).

Como já informado, não houve resposta por parte das representações


do MPPA e da OAB/PA, agentes que seriam de grande importância para a concessão
de informações referentes tanto à questão de denúncias e ações envolvendo o setor
como de aspectos jurídicos de interesse da presente pesquisa, demanda que não
ficou totalmente desamparada devido à participação de um professor de Direito.

5.2. ANÁLISE DAS PRÁTICAS REGULATÓRIAS E DO PROCESSO DE OUTORGA


DO SERVIÇO DE TRANSPORTE COLETIVO POR ÔNIBUS NA RMB

O item que se inicia apresentará as informações coletadas de maior


relevância durante a fase de entrevistas, que serão apresentadas por meio de
categorias distintas de análise.

5.2.1 AVALIAÇÃO DO SERVIÇO DE TRANSPORTE PÚBLICO NA GRANDE BELÉM

O serviço de transporte coletivo da Grande Belém está inserido em uma


complexa dinâmica socioeconômica, com alta incidência de domicílios situados em
locais precários e alto comprometimento médio da renda familiar com despesas
voltadas para o transporte público (IPEA, 2016). Tal fato tende a se agravar quando
se observa que o órgão responsável pela gerência do serviço, além de não cumprir o
que determina a CF, ainda possui grandes falhas quanto à fiscalização do serviço,
contribuindo assim para o desrespeito aos usuários por parte dos operadores privados
(Entrevista 1). O segundo entrevistado (Entrevista 2) faz um apanhado histórico da
prestação do serviço, destacando que o atual sistema se estende por mais de cinco
décadas e é delegado sob regime precário, havendo grande sobreposição de
itinerários e a sobrecarga dos principais corredores viários, tendo em vista a
predominância do sistema radial na organização das linhas. A gestão do transporte,
91

por sua vez, estaria ocorrendo de forma verticalizada e sem a participação da


sociedade, obrigada a utilizar veículos velhos oriundos sobretudo do Rio de Janeiro,
inexistindo a devida fiscalização para coibir esse tipo de prática (Entrevista 1).
Compõe o quadro de problemas do setor a ausência de um órgão gestor
metropolitano, tendo em vista que o gerenciamento do serviço é realizado por uma
autarquia municipal, fazendo com que hajam conflitos entre os municípios da RMB.
Além disso, a falta de integração tarifária estaria comprometendo diretamente o
acesso da população local ao serviço, tendo em vista que a renda média das famílias
da RMB está entre as menores do país (Entrevista 4).
Abordando a ineficiência do serviço, o terceiro entrevistado observa que o
problema:

[...] é fruto de uma organização [...] político-administrativa em Belém, onde


deixa margem para que tanto o empresariado, quanto a própria
Administração, possam evitar utilizar legislações estaduais e principalmente
federais, quanto à aplicação de uma organização mais jurídica, já que as
decisões se tornam cada vez mais políticas. (Entrevista 3).

A partir do comentário acima é possível inferir que a atuação do Poder


Público vem contribuindo para a manutenção dos problemas existentes durante a
prestação do serviço de transporte na RMB, ao invés de fiscalizar e garantir o
cumprimento das normas legais. As observações dos entrevistados 2 e 4, por sua vez,
estão constantes nos estudos e planos elaborados para o transporte da RMB.

5.2.2 OUTORGA DO SERVIÇO DE TRANSPORTE COLETIVO E CONTRATOS


ADMINISTRATIVOS

A precariedade na outorga do serviço de transporte coletivo por ônibus é


um problema histórico, que continuou mesmo após a regulamentação do Art. 175 da
Constituição Federal, através da Lei Ordinária Nº 8.987/1995. Tal exposição é
atestada pelo segundo entrevistado, ao relatar que os contratos firmados na época
em que o transporte público na RMB ainda era gerenciado pelo Estado:
92

[...] foram transformados numa mera autorização. Um instrumento de


delegação por outorga de autorização extremamente precário, baseado em
Ordem de Serviço, que você acaba misturando a parte contratual com a
definição dos parâmetros operacionais do serviço [...] instrumento [...] que
foge do que tem a legislação [...] (Entrevista 2).

Para a primeira entrevistada, o setor empresarial está à caráter para fazer


o que bem entende no serviço público, tendo em vista a ausência de fiscalização da
SEMOB, do MPPA e a falta de celeridade do Judiciário no que diz respeito ao
cumprimento da lei estaria colocando a população em um beco sem saída. Além disso,
os contratos existentes hoje (Ordem de Serviço) [...] “foram feitos para serem
guardados nas gavetas, onde sequer as rotas previstas são cumpridas pelas
empresas.” (Entrevista 1). O quarto entrevistado ressalta a antiga dificuldade de licitar
o sistema de transporte público, onde:

[...] os empresários nunca quiseram que o processo licitatório fosse a termo,


porque para eles é uma situação cômoda funcionar dessa forma precária com
a delegação. Isso prejudica a fiscalização, isso prejudica o gerenciamento do
sistema quando você tem uma Ordem Serviço, que é a forma como é feita
hoje (Entrevista 4).

A resistência dos empresários do setor também é relatada por Mercês


(1998), que conseguiam não somente manter e expandir de suas áreas de atuação
durante a gestão do serviço pelo Estado, mas também derrubar tentativas de
reformulação do sistema que viessem a atingir seus interesses, como a abertura de
uma concorrência pública em 1992, pela CTBel.
Foram alterados dispositivos da LOM/Bel no Capítulo de Transportes
durante o ano de 2017, estando entre as mudanças a possibilidade de prorrogação
dos contratos de concessão por mais seis anos, o que não foi positivo para o quarto
entrevistado, pois:

[...] ao que tudo indica foi uma exigência dos empresários, que foi aceita aqui
pela maioria dos vereadores, com o aval da Prefeitura Municipal de Belém, e
a gente avalia que [...] isso possibilita o aumento do monopólio no sistema,
porque com a quebra das pequenas empresas e o poder de fogo, poder
político e poder econômico das grandes empresas, a tendência é haver uma
concentração desse monopólio nas mãos dos grandes empresários, a
maioria deles de fora do Estado (Entrevista 4).

A colocação do quarto entrevistado tem como uma das bases um projeto


de autoria do Executivo Municipal, que previa o aumento da concessão do transporte
93

coletivo por ônibus de 06 para no mínimo 20 anos e que foi rejeitada pela maioria dos
vereadores da CMB. Para que ocorra a concessão de um serviço público, é
necessário que o prazo do contrato seja suficiente para a recuperação do capital
investido, assim como para garantir o seu equilíbrio econômico-financeiro, já que o
serviço de transporte coletivo por ônibus possui uma peculiar estrutura de custos e
requer grandes investimentos. Assim como deve ser garantido o equilíbrio econômico-
financeiro dos contratos de concessão, o Poder Concedente precisa estabelecer e
fazer cumprir as normas constantes nos contratos vigentes (que não deve ser nem
tão curto e nem tão longo, como propôs o Poder Executivo Municipal com um prazo
mínimo de 20 anos), afim de garantir tanto a regularidade do serviço como induzir o
concessionário a manter um padrão de qualidade, sob risco de penalidades e inclusive
a suspensão do mesmo, em conformidade com os casos previstos em lei (ARAGÃO,
2004).
O terceiro entrevistado, sob análise de outro aspecto, também critica o
aumento do prazo de concessão para o transporte coletivo da capital, uma vez que o
Poder Público:

[...] não pode utilizar a prerrogativa de querer prorrogar um Contrato


Administrativo sem obedecer o procedimento licitatório. Se a gente for
observar na Lei de Licitações e Contratos Administrativos (Nº 8.666/93) [...]
nós temos regras que tratam de licitação. [...] Então o quê que acontece? Em
primeiro lugar você realiza a licitação, em segundo lugar você assina o
contrato, e em terceiro lugar você fiscaliza pra saber se o contrato está sendo
devidamente cumprido. Então tu não podes prorrogar por mais 06 anos o que
de forma incorreta foi feito (Entrevista 3).

Para o entrevistado, o Poder Público Municipal está criando legislações sob


uma ausência de obediência normativa, como se não houvesse a necessidade de
cumprir as Leis Federais devido ao fato de a Constituição Federal atribuir aos
municípios a responsabilidade sobre o transporte coletivo, questão que pode ser
demonstrada com a forma como vem atuando não somente o Poder Executivo, mas
principalmente o Poder Legislativo com as recentes alterações na Lei Orgânica, que
deve ser redigida de acordo com os princípios e preceitos Constitucionais.
94

5.2.3 ATUAÇÃO DO PODER PÚBLICO FRENTE À QUESTÃO

O segundo entrevistado alega que há certa dificuldade política quanto à


gestão do serviço de transporte coletivo por ônibus na Grande Belém, uma vez que a
SEMOB não é responsável somente pelas linhas regulares que circulam na capital,
mas também das que tem origem em outros municípios da RMB, o que acaba
envolvendo: “[...] situações políticas de prefeitos não alinhados de um município para
outro, e que às vezes ameaçavam até impedir a operação de determinada linha em
detrimento do objetivo maior dos usuários” (Entrevista 2). O problema declarado
poderia ser estabilizado se houvesse o cumprimento da Lei Complementar Nº
027/1995, que previa a criação de um Conselho Metropolitano para tratar de assuntos
e serviços de interesse comum dos municípios que integram a RMB. O que existe na
atualidade é o Conselho Municipal de Transportes, onde outros municípios da Grande
Belém geralmente: “[...] vêm como ouvintes, mas sempre com a intenção de participar
de forma mais ativa, mas legalmente não teria como.” (Entrevista 2). Há, com isso,
um grande conflito no que tange à governança metropolitana, o que poderá ser
amenizado (ao menos na questão do transporte coletivo) com a criação de um
Consórcio Público previsto pelo Estado através do EV/2009, estudo cujas diretrizes já
estão em andamento.
A primeira entrevistada inicia sua fala reclamando da atuação das
instituições públicas, que estariam agindo em defesa dos empresários do setor de
transporte público em detrimento dos interesses do povo, destacando que:

Existe uma inércia do Poder Público nas esferas do Judiciário, do Ministério


Público, do Executivo e do Legislativo, né? [...] E essa é uma inércia
proposital. Eu não tenho dúvida disso. Não há um debate que se faça na
Câmara Municipal de Belém sobre conteúdo que envolva o transporte, seja
na discussão de mudanças na Lei Orgânica, seja na discussão de Plano
Diretor, seja numa simples cobrança através de uma audiência pública ou de
uma sessão especial que não tenha uma reação de um bloco político que se
conformou em defesa do setor empresarial, né [...] fica muito pouca coisa na
institucionalidade paraense para defender o interesse coletivo, o interesse do
povo (Entrevista 1).

A mesma também afirma que fez muitas denúncias ao Ministério Público


do Estado e não obteve respostas, além de uma série de tentativas de alertar a
população e fazer com que o Poder Público cumprisse as normas legais, mas sem
sucesso. Então:
95

[...] tem um crime cometido atrás do outro, em relação à improbidade,


descumprimento de normas, né [...] você pode ver, por exemplo, como a
população é violentada. Além de ter um péssimo serviço de transporte, sem
segurança, sem condições dignas [...] Hoje os servidores públicos que
compram aquele ticket do transporte, o Vale Digital, se eles deixam de usar
esse valor por dois, três dias, uma semana, por uma doença ou por uma
opção [...], eles não têm ressarcimento desse valor. Esse valor hoje ainda
está na mão do setor empresarial. É o SETRANSBEL que abocanha esse
valor do transporte pago e não usado. Isso deveria ser devolvido à população,
mesmo que fosse no mês subsequente, abatido no desconto. É grave! Isso é
muito grave! Esse Vale Digital [...] é descontado em folha e se ele não usa
ele não tem devolução. Então isso demonstra que o interesse público não
está à frente do interesse privado (Entrevista 1).

Não foram detectadas denúncias durante a pesquisa de que os valores


disponíveis nos vales digitais dos usuários estariam sendo abduzidos em períodos tão
curtos como os citados pela entrevistada, de dois ou três dias, mas há, de fato,
denúncias públicas de ex-empresários do setor de que o SETRANSBEL estaria se
apropriando de valores milionários das “sobras” dos Vales Transporte para pagamento
de propina a políticos, que por sua vez estariam vendendo Ordens de Serviço à
empresários de ônibus (VER-O-FATO, 2017).
Para o quarto entrevistado, também existe uma relação de subserviência
dos Poderes Executivo e da maioria do Legislativo diante dos empresários do setor,
dando para isso o exemplo do Projeto de Lei que previa a instalação de ar-
condicionado nos coletivos e que foi vetada na CMB, já que a bancada de oposição
apresentou um projeto:

[...] pra que colocasse explicitamente, que um dos requisitos do edital tivesse
que constar a refrigeração dos ônibus em Belém. Isso não foi feito. A gente
não tem essa garantia. O que há é uma promessa dos empresários junto ao
Executivo Municipal, no sentido de garantir refrigeração desses ônibus. Eu
até acho que hoje em dia, por conta do debate que se ampliou na sociedade,
será inevitável que a prefeitura tenha que colocar no edital a necessidade
refrigeração dos ônibus, mas isso poderia estar impresso na forma da Lei,
não haveria problema nenhum, nenhum óbice, a que a gente pudesse
colocar na Lei Orgânica a necessidade da refrigeração dos ônibus [...] mas
infelizmente a bancada do Prefeito aqui, não aprovou essa emenda [...] Ora,
se amanhã muda os empresários, ou se amanhã muda o Prefeito, essa
promessa pode cair por terra. [...] O legislador tá pra legislar, para fazer, pra
colocar em lei e não pra ouvir promessa. Então [...] a gente fica vendo que
realmente é uma relação de muita subserviência, tanto do Poder Executivo
quanto da maioria do Poder Legislativo, diante do poder dos empresários.

No que diz respeito à instalação de ar-condicionado nos ônibus, o


terceiro entrevistado afirma que é no edital de licitação que deve haver a prerrogativa
96

de refrigeração ou não dos coletivos, complementando que para garantir tal benefício
à população:

[...] antes deve haver um procedimento correto. Então não houve nem o
antes, e tão tendo o desejo de querer fazer o depois. [...] a gente tem que
obedecer a legislação, a gente tem que dar margem para a transparência
desses procedimentos, para que todos possam ter o conhecimento pra que
a gente possa, no final das contas, buscar melhorias para a população [...]
Eu acredito que tem que ser uma via onde todos têm que participar, porque
realmente Belém precisa ter melhorias no seu sistema de transporte e
trânsito [...] (Entrevista 3).

O comentário acima é reforçado pelo inciso II, Art. 18. da Lei Nº


8.987/95, que determina que o edital de licitação, a ser elaborado pelo Poder
Concedente, conterá de forma detalhada as condições necessárias para a prestação
adequada do serviço, neste caso o serviço de transporte coletivo por ônibus, o que
nos faz concluir que não cabe a uma casa legislativa determinar o que deve ser
regulado por contratos administrativos, firmados através de adequado procedimento
licitatório.

5.2.4 RELAÇÃO ENTRE PODER CONCEDENTE E EMPRESAS OPERADORAS

O quarto entrevistado, se baseando em denúncias, argumenta que há


grandes indícios de que o Poder Público Municipal estaria favorecendo grandes
empresários do setor de transporte coletivo, como o empresário Jacob Barata, citando
o exemplo de que:

[...] haviam várias empresas em Belém, várias empresas menores que foram
sucateadas pela gestão anterior da SEMOB. [...] essas empresas foram
quase que obrigadas a fazer a transferência para grandes empresas, entre
elas a Belém Rio, que é de propriedade do Senhor Jacob Barata, que é um
empresário que está preso no Rio de Janeiro, um grande magnata do
transporte em nível nacional, que tem suas raízes também aqui em Belém
(Entrevista 4).

As denúncias de vendas de Ordens de Serviço foram levadas ao Ministério


Público por ex-empresários do setor, cuja autorização para dar início às investigações
foi negada pela justiça estadual, o que está sob recurso no STJ. O empresário citado,
que triplicou de 20% para 62% a sua participação no sistema de transporte coletivo
da capital paraense na gestão de Zenaldo Coutinho (VEJA, 2016), também estaria
97

ingressando no transporte alternativo da capital, o que justificaria o interesse do


Município na regulamentação do setor, de acordo com a primeira entrevistada. A
mesma afirma que há 10 anos vem tentando aprovar um projeto que visa regulamentar
o transporte alternativo na CMB, o que consecutivamente foi rejeitado pela maioria
dos parlamentares da casa. No entanto:

[...] agora esse ano (2017), ele foi mascarado. Ele foi aprovado de forma
mascarada, nesse pacote de acordos que foi feito entre o interesse do
Executivo [...] porque supostamente tem um interesse de um empresário,
grande empresário do Transporte de Belém e do Brasil, que inclusive tá
preso, o Jacob Barata, que veio comprando uma parte significativa de linhas
de ônibus, aqui, de veículos, aqui em Belém, e que estaria entrando nesse
filão, digamos assim, que se transformou o transporte alternativo, se
sobrepondo aos interesses das cooperativas. Então houve uma aprovação
[... que] não enfrentou problemas na prática. E os interesses que estão por
trás disso são escusos. Não é com certeza o interesse dos trabalhadores
das cooperativas, que dão duro. Não é o interesse de colocar no sistema
para que eles sejam fiscalizados também, que possam atender com
qualidade a população, com segurança, com controle de profissionais
habilitados, qualificados para o atendimento [...] (Entrevista 1).

O transporte alternativo foi regulamentado na Lei Orgânica Municipal em


julho de 2017, através dos incisos II e III do Art. 147., sob regime permissionário e
com período contratual de 10 anos (podendo ser renovado), maior que o prazo para
os contratos de concessão, de 06 anos (com renovação por igual período). Trata-se,
pois, de mais uma grave denúncia contra a Administração Municipal, que acaba sendo
reforçada quando o Prefeito de Belém dá entrada em um agravo regimental para que
não fosse aberta investigação pelo MPPA contra si próprio, fato que dá margem para
a confirmação das denúncias. Já o quarto entrevistado faz outra grave denúncia, de
que o setor privado não poderá apenas operar o setor, mas também gerenciá-lo, em
conformidade com a nova redação dada ao Art. 147. da LOM/Bel:

[...] o mais grave que passou quase despercebido, que a maioria das pessoas
não percebeu, é que na mudança do Artigo 147. você passou a possibilidade
de que o gerenciamento do sistema, ou seja, já não só operação sistema,
mas também o gerenciamento do sistema, que estava exclusivamente na
esfera do Município, possa ser repassado para empresas privadas. Então
essa situação é ideal para o empresário. Além dele operar via concessão, ele
vai poder gerenciar o sistema. Então isso tira quase a competência mais
importante da SEMOB, que é fazer o gerenciamento do sistema, né?
Estabelecer quais são as linhas, quais são os horários, a regularidade entre
os ônibus, a frequência [...] e isso vai ficar a cargo dos empresários. Então
além de operar, ele vai se autogerenciar, quase como se você fosse colocar
o lobo pra tomar conta do galinheiro (Entrevista 4).
98

De fato, a nova redação dada ao Art. 147. da LOM/Bel diz que o Município,
que é responsável pelo planejamento, gerenciamento, fiscalização, entre outros,
poderá não somente delegar a operação e a prestação do serviço de transporte
coletivo sob prévia licitação pública, mas também outros serviços de gerenciamento à
pessoa jurídica, o que por si só oferece um alto risco ao Poder discricionário da
Administração Pública sob a prática de Atos Administrativos, que devem visar o
interesse público e não o privado. O entrevistado também informa que criou um projeto
de emenda para manter a LOM/Bel nos parâmetros que era anteriormente, garantindo
o gerenciamento do sistema de competência unicamente Municipal, no entanto a sua
emenda foi derrotada na CMB. Destaca ainda que está no aguardo de um parecer
jurídico para confirmar se há alguma inconstitucionalidade na Emenda aprovada
(Emenda Nº 013/2017), mas que independente ser inconstitucional ou não, trata-se
de uma imoralidade do ponto de vista político e administrativo (Entrevista 4).

5.2.5 LICITAÇÃO DO SETOR

De acordo com o segundo entrevistado, o edital que será lançado pela


Prefeitura Municipal de Belém dividirá o sistema de transporte coletivo da capital em
duas grandes áreas ou bacias, onde:

[...] as empresas [...ou] consórcio que ganhar a concorrência, ele terá


responsabilidade, um prazo para migrar do sistema atual pro sistema futuro
do BRT, que continuará com várias linhas convencionais, que terá linhas
alimentadoras, mas que terá uma racionalização grande, principalmente na
área de expansão da cidade, relacionadas a grande sobreposição que nós
temos (Entrevista 2).

O edital de licitação que deverá ser lançado nos primeiros meses de 2018
contemplará tanto as linhas atuais como as linhas troncais do BRT Belém, que
deverão ser acopladas ao BRT Metropolitano assim que este for concluído (Entrevista
2). Trata-se, pois, de um grande marco na história do setor de transporte coletivo, que
há décadas é prestado sem ter passado por qualquer processo de concorrência
pública.
Para o quarto entrevistado, a realização de licitação no sistema de
transporte coletivo é um avanço, porém o mesmo não possui confiança política na
Prefeitura. Além da necessidade de monitorar o processo licitatório, o entrevistado
99

afirma que precisa haver o suporte da sociedade civil no sentido de se empoderar e


ser protagonista desse processo, uma vez que é a principal interessada em um
transporte de melhor qualidade (Entrevista 4).
Para se realizar uma licitação, de acordo com o terceiro entrevistado, é
necessário que tanto os interessados regionais como os de outros estados participem
em pé de igualdade, dando margem para a chamada competitividade, que se resume,
por exemplo, na seleção da proposta mais vantajosa a ser apresentada pelos
concorrentes. Independente do serviço público a ser delegado, o que interessa é que
existe uma Legislação Federal que precisa ser cumprida, e para o seu cumprimento o
processo licitatório:

[...] tem que vislumbrar a proposta mais vantajosa, que seja garantido o
desenvolvimento nacional, e que almeje a isonomia perante os interessados.
Então quando a gente fala de isonomia perante os interessados, significa que
todos os interessados em pé de igualdade, desde o início da licitação, eles
devem participar do procedimento, de acordo com o que tiver no edital [...]
(Entrevista 3).

A delegação de um serviço público requer, por tanto, a realização de uma


licitação competitiva, em conformidade com a Lei Nº 8.987/95, porém esta exigência
federal nunca foi cumprida pelo órgão gestor responsável pelo transporte coletivo por
ônibus na RMB. Quanto à garantia de isonomia entre as empresas ou consórcios
concorrentes, esta só deverá ser confirmada com a abertura da concorrência e análise
de todo o processo decisório, para que este não seja viciado.

5.3 RESULTADOS

As informações coletadas durante a fase de entrevistas possuem alta


compatibilidade com a literatura e documentação acumulada no decorrer da pesquisa,
o que comprova o caráter precário e desconexo da legislação em vigor da outorga do
serviço de transporte coletivo por ônibus na Grande Belém. Além disso, o
descumprimento das normas durante a celebração dos “contratos” estaria diretamente
ligado às relações entre o Poder Público e segmento privado, relações estas que
podem estar comprometendo a devida prestação do serviço. Assim, é possível
destacar as principais falas dos entrevistados nas respectivas categorias de análise.
100

Quadro 5 – Principais falas dos entrevistados durante as sessões de entrevistas


Avaliação da Outorga do
forma de serviço de
operação do transporte Atuação do Relação entre poder
serviço de coletivo e poder público concedente e Licitação do
transporte contratos frente à empresas setor
público na administrativos questão operadoras
RMB
[...] é fruto de [...] foram Existe uma [...] haviam várias [...] as empresas
uma transformados inércia do poder empresas em Belém, [...ou] consórcio
organização numa mera público nas várias empresas que ganhar a
[...] político- autorização. Um esferas do menores que foram concorrência, ele
administrativa instrumento de Judiciário, do sucateadas pela terá
em Belém, delegação por Ministério gestão anterior da responsabilidade,
onde deixa outorga de Público, do SEMOB. [...] essas um prazo para
margem para autorização Executivo e do empresas foram migrar do
que tanto o extremamente Legislativo, né? quase que obrigadas sistema atual pro
empresariado, precário, [...] E essa é a fazer a sistema futuro do
quanto a baseado em uma inércia transferência para BRT, que
própria Ordem de proposital. Eu grandes empresas, continuará com
administração, Serviço, que não tenho dúvida entre elas a Belém várias linhas
possam evitar você acaba disso. Não há Rio, que é de convencionais,
utilizar misturando a um debate que propriedade do que terá linhas
legislações parte contratual se faça na Senhor Jacob Barata, alimentadoras,
estaduais e com a definição Câmara que é um empresário mas que terá
principalmente dos parâmetros Municipal de que está preso no uma
federais, operacionais do Belém sobre Rio de Janeiro, um racionalização
quanto à serviço [...] conteúdo que grande magnata do grande,
aplicação de instrumento [...] envolva o transporte em nível principalmente na
uma que foge do que transporte, seja nacional, que tem área de
organização tem a legislação na discussão de suas raízes também expansão da
mais jurídica, [...] (Entrevista mudanças na Lei aqui em Belém cidade,
já que as 2). Orgânica, seja (Entrevista 4). relacionadas a
decisões se na discussão de grande
tornam cada [...] os Plano Diretor, [...] o mais grave que sobreposição que
vez mais empresários seja numa passou quase nós temos.
políticas. nunca quiseram simples despercebido, que a
(Entrevista 3). que o processo cobrança através maioria das pessoas [...] tem que
licitatório fosse de uma não percebeu, é que vislumbrar a
a termo, porque audiência na mudança do proposta mais
para eles é uma pública ou de Artigo 147 você vantajosa, que
situação uma sessão passou a seja garantido o
cômoda especial que não possibilidade de que desenvolvimento
funcionar dessa tenha uma o gerenciamento do nacional, e que
forma precária reação de um sistema, ou seja, já almeje a
com a bloco político não só operação isonomia perante
delegação. Isso que se sistema, mas os interessados.
prejudica a conformou em também o Então quando a
fiscalização, defesa do setor gerenciamento do gente fala de
isso prejudica o Empresarial, né sistema, que estava isonomia perante
gerenciamento [...] fica muito exclusivamente na os interessados,
do sistema pouca coisa na esfera do município, significa que
quando você institucionalidade possa ser repassado todos os
tem uma ordem paraense para para empresas interessados em
serviço, que é a defender o privadas. Então essa pé de igualdade,
forma como é interesse situação é ideal para desde o início da
feita hoje coletivo, o o empresário. Além licitação, eles
(Entrevista 4). interesse do dele operar via devem participar
concessão, ele vai do procedimento,
101

povo (Entrevista poder gerenciar o de acordo com o


1). sistema. Então isso que tiver no edital
tira quase a [...] (Entrevista 3).
competência mais
importante da
SEMOB, que é fazer
o gerenciamento do
sistema, né?
Estabelecer quais
são as linhas, quais
são os horários, a
regularidade entre os
ônibus, a frequência
[...] e isso vai ficar a
cargo dos
empresários [...]
(Entrevista 4).

Fonte: Elaboração própria

Os resultados obtidos trazem informações de grande impacto e relevância


social que ultrapassam os objetivos desta pesquisa, tendo em vista que, assim como
no período histórico estudado por Mercês (1998 e 2004), o processo de outorga do
serviço de transporte coletivo por ônibus da RMB na atualidade estaria
intrinsecamente ligado às relações de poder e interesses entre o Poder Público e
empresas operadoras, que para atingir seus objetivos estaria prejudicando os direitos
dos usuários deste serviço público essencial. Merece destaque, também, a
necessidade de haver maior protagonismo da sociedade civil durante o processo
decisório do setor, como declarou o quarto entrevistado, tendo em vista que o
afastamento da população de tais discussões tem sido amplamente utilizado por
grupos dominantes para a efetivação de práticas ilícitas e que estariam sendo
acobertadas pela esfera Judicial, de acordo com o apontado nas entrevistas.
Para tanto, apesar das dificuldades que permearam esta etapa, foi possível
comparar as informações coletadas a fim de reafirmar o que já fora dito nos capítulos
anteriores, e que certamente contribuirá para debates e para a realização de
pesquisas futuras.
102

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS E RECOMENDAÇÕES PARA TRABALHOS


FUTUROS

O transporte coletivo é um serviço de competência dos Municípios,


cabendo a estes tanto a sua prestação direta como a sua delegação via regime de
concessão ou permissão, em consonância com o inciso V, Art. 30. da Constituição
Federal. De todos os direitos sociais previstos pela CF, apenas ao transporte coletivo
é atribuído o caráter essencial, que além de um direito em si, é um direito que garante
o acesso tanto a outros (como à educação, saúde, lazer, etc.) como a serviços e
oportunidades de trabalho. Percebe-se, com isso, que o transporte público possui um
papel primordial na sociedade, podendo interferir direta e indiretamente na qualidade
de vida da população e no desenvolvimento econômico de todo o país.
Apesar da essencialidade dada ao transporte coletivo, este é delegado à
iniciativa privada na maioria das cidades brasileiras, onde ocorre uma série de
conflitos entre o Poder Público e o segmento empresarial no que diz respeito à
prestação regular do serviço, fato que tende a se agravar quando se observa que
ainda é constante a fragilidade jurídica dos contratos firmados para a outorga do
serviço, desconexos das normas legais que tratam da questão, contribuindo assim
para dificuldades de controle e fiscalização do sistema por parte de qualquer gestão
pública e para a realização de práticas que acometem o interesse público em favor da
rentabilidade das empresas operadoras.
Para que ocorra a devida outorga do serviço de transporte coletivo, esta
deve seguir a seguinte base legal:

• Lei Nº 8.666/93 (Lei de Licitações e Contratos Administrativos);


• Lei Nº 9.987/95 (Lei das Concessões); e
• Lei Nº 12.587/2012 (Lei da Mobilidade Urbana)

Tais leis regulamentam alguns artigos da CF que tratam sobre a


contratação de serviços públicos, a sua prestação (sob concessão ou permissão) e
sobre a política urbana, que juntas possibilitam a aplicação de práticas regulatórias
que visam ampliar e qualificar o serviço de transporte coletivo sob níveis consideráveis
103

de qualidade e sem grandes comprometimentos ao orçamento público, além de


garantir a equidade e o acesso de todos os cidadãos ao sistema de mobilidade urbana.
A área estudada (RMB) é constituída por sete municípios (Belém,
Ananindeua, Marituba, Benevides, Santa Bárbara, Santa Izabel e Castanhal), com
população estimada em 2.275.032 milhões de habitantes e PIB per capita de R$
10.886,71 (dez mil, oitocentos e oitenta e seis reais e setenta e um centavos), segundo
o IBGE (2010). Transportando em média 21 milhões de passageiros equivalentes por
mês, o sistema de transporte coletivo da Grande Belém dispõe de uma frota de 2.042
mil veículos, distribuídos nos tipos: Leve (713), Pesado (1.314) e Especial (15),
composto por 20 empresas privadas que prestam serviços nos tipos Convencional e
Seletivo com um total de 165 linhas, predominantemente radiais (caracterizadas pela
ligação dos bairros com o centro principal) (BELÉM, 2016).
Cabe a uma autarquia municipal, a SEMOB, o gerenciamento das linhas
regulares tanto de Belém como das que tem origem em outros municípios da RMB,
inexistindo até então um órgão em nível estadual que administre o sistema de forma
integrada com as municipalidades pertencentes à Região Metropolitana (como havia
de 1983 até 1991, através da EMTU/Bel).
Apesar do advento da CF de 1988, além das leis federais que
posteriormente regulamentaram artigos voltados para a contratação e prestação de
serviços públicos, como o transporte coletivo, observou-se que nunca houve o devido
cumprimento normativo para a outorga do serviço de transporte coletivo por ônibus da
RMB, que é delegado às empresas sob a expedição de meras Ordens de Serviço
(sem qualquer concorrência pública), um Ato Administrativo que consiste na forma
como determinado serviço contratado pela Administração Pública deve ser realizado
sob os aspectos gerenciais e operacionais, mas que possui natureza contratual entre
o órgão gestor (SEMOB) e as operadoras privadas. Além das normas
infraconstitucionais, há também a Lei Orgânica do Município de Belém, que institui
regras para a devida prestação do serviço como a realização de licitação para a
celebração de contratos de concessão ou permissão, determinação que nunca
ocorreu no transporte local. Não há, portanto, nem o cumprimento das normas
infraconstitucionais e nem das normas municipais para a outorga do serviço de
transporte coletivo por ônibus da RMB.
104

Tal fragilidade jurídica que perdura há décadas reflete negativamente neste


setor, cujo excesso de linhas convencionais sobrecarrega as principais avenidas e
compromete a mobilidade urbana como um todo, gerando externalidades que
poderiam ser minimizadas se o sistema dispusesse de integração física e tarifária,
proposta que existe desde o PDTU/1991 e só em 2012 começou a ser implementada
(com o sistema BRT), sob uma série de problemas e irregularidades.
Sendo assim, o objetivo maior desta pesquisa pôde ser alcançado, que era
analisar o processo de outorga do serviço de transporte por ônibus da RMB à luz das
normas infraconstitucionais e municipais, o que foi possível com a análise documental
e realização de entrevistas com representações de entidades públicas. Vale destacar,
no entanto, que o ano de 2017 foi marcado por uma série de mudanças na legislação
municipal no que diz respeito à delegação do serviço (como a possibilidade de
prorrogação dos contratos de concessão), além da elaboração de um edital de
licitação pela Prefeitura Municipal de Belém (ainda não lançado oficialmente) que
servirá tanto para as linhas convencionais da capital como para as linhas troncais do
sistema BRT, o que causará mudanças substanciais no atual sistema.
O processo histórico de formação do setor demonstrado na parte
bibliográfica da pesquisa evidencia, por exemplo, que é necessária a atuação do
Poder Público para o seu ordenamento e regulação, tendo em vista que o transporte
coletivo de Belém até a década de 1960 contava com cerca de 200 empresas e
proprietários individuais, causando uma série de transtornos ao tráfego urbano e o
não atendimento de áreas recém-ocupadas (menos rentáveis), tendo em vista o
tratamento mercadológico dado ao setor. Mesmo com algumas intervenções do órgão
gestor na época (que proporcionaram maior estabilidade jurídica entre o Poder
Concedente e setor privado) as empresas, já organizadas em cartel, passaram a deter
maior influência sobre o sistema em prol de seus interesses, fato que ainda se
apresenta na atualidade e que possui respaldo através de denúncias já judicializadas,
onde estariam envolvidos políticos como o próprio prefeito da capital paraense,
denunciado por suposto favorecimento a empresas como a Belém Rio LTDA, cujo
proprietário foi preso duas vezes em 2017 por envolvimento em um esquema de
corrupção no Rio de Janeiro.
Se por um lado a regulação estatal (sob a égide do Direito
Administrativo) se faz necessária para a concretização de direitos e preservação do
105

interesse público, por outro, o interesse público estaria ameaçado por motivos de
corrupção e cooptação de agentes públicos, fato que também poderia justificar o
descumprimento das normas infraconstitucionais e municipais durante a outorga do
serviço de transporte coletivo por ônibus da RMB. Diante de uma série de denúncias,
será lançado um edital para licitar as linhas de ônibus que operam na cidade de
Belém (que serão adequadas ao sistema BRT), fato que exigirá intensa participação
da população e de entidades representativas para que ocorra o devido cumprimento
da legislação, que por si só já garantiria que o serviço fosse prestado com maior
regularidade. O mesmo deverá ocorrer com o BRT Metropolitano (do Governo do
Estado), que após a efetivação das obras de infraestrutura será integrado ao projeto
municipal para o seu pleno funcionamento.
Recomenda-se, devido aos novos fatos que rodeiam o transporte público
na Grande Belém, que para trabalhos futuros sejam pesquisados:

• O edital de licitação a ser lançado pela Prefeitura Municipal de


Belém, assim como todo o seu andamento e compatibilidade às
legislações federais e municipais;
• As relações de interesses entre o Poder Público local e as empresas
de transporte coletivo por ônibus, apurando o andamento das
denúncias e processos existentes, assim como a busca por novos
fatos; e
• O BRT Metropolitano, sobretudo no que diz respeito à abertura de
concorrência pública para a operação do sistema e à
institucionalização de um Consórcio Público para o seu
gerenciamento.

Conclui-se, por fim (na impossibilidade de prestação direta do serviço de


transporte coletivo) que o relacionamento entre Poder Concedente e empresas de
transporte precisa ser revisto não somente do ponto de vista jurídico, mas também do
ponto de vista ético e moral, devendo a população se organizar e se apropriar tanto
do debate jurídico como do econômico, afim de dar maior consistência e propriedade
às suas reivindicações, cobrando também do Poder Judiciário que cumpra o seu
papel. Espera-se, também, que um dia os vários problemas envolvendo o transporte
106

público que tanto acometem a população possam dar lugar a um sistema bem
gerenciado e que proporcione melhor qualidade de vida a todos, direito que ainda está
distante da realidade local.
107

REFERÊNCIAS

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APÊNDICES

APÊNDICE A
Modelo do roteiro de perguntas dos entrevistados
117

APÊNDICE B
Modelo do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido

ANEXOS
118

ANEXO I
Respostas das perguntas para entrevista com o Núcleo de Gerenciamento de
Transporte Metropolitano (NGTM)
119
120

ANEXO II
Modelo de Ordem de Serviço utilizado para a delegação do serviço de
transporte coletivo por ônibus na RMB
121

ANEXO II
Modelo de Ordem de Serviço utilizado para a outorga do serviço do transporte
coletivo por ônibus na RMB
122
123
124
125
126
127
128
129
130
131
132
133
134
135
136

Universidade do Estado do Pará


Centro de Ciências Sociais e Educação
Curso de Secretariado Executivo Trilíngue
Rua do Una, nº 158 – Belém – Pará – Brasil – 66 050-540 – Telégrafo

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