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ISSN 2525-7374

Volume 33 | Número 3 | Jul-Set 2018

BRASPEN
JOURNAL
Volume 33 | Número 3 | Julho-Setembro/2018
BRASPEN JOURNAL

Brazilian Society of Parenteral


and Enteral Nutrition
ISSN 2525-7374

BRASPEN Journal Volume 33 – número 3


Julho/Setembro de 2018

Publicação Oficial
Brazilian Society of Parenteral Sociedade Brasileira de Nutrição Parenteral e Enteral (SBNPE)
and Enteral Nutrition Federación Latinoamericana de Nutrición Parenteral y Enteral (FELANPE)
Indexada na base de dados LILACS – Literatura Latino-Americana e do Caribe em Ciências da Saúde

Editora Chefe: Silvana Paiva Orlandi


José Eduardo de Aguilar-Nascimento   Universidade Federal de Pelotas, Faculdade de Nutrição
  Diretor do Curso de medicina, UNIVAG, Mato Grosso   (Pelotas, RS, Brasil)
  (Várzea Grande, MT, Brasil) Simone Vasconcelos Generoso
  Universidade Federal de Minas Gerais, Departamento de Nutrição
Editora Executiva:   (Belo Horizonte, MG, Brasil)
Lilian Mika Horie
  GANEP Educação (São Paulo, SP, Brasil) Enfermeiros
MEMBROS DO CONSELHO EDITORIAL: Leticia Faria Serpa
  Hospital Alemão Oswaldo Cruz (São Paulo, SP, Brasil)
Antonio Carlos Ligocki Campos
  Universidade Federal do Paraná, Departamento de Cirurgia do Setor de Maria Isabel Pedreira de Freitas
  Ciências da Saúde (Curitiba, PR, Brasil)   Universidade Estadual de Campinas, Faculdade de Enfermagem
  (Campinas, SP, Brasil)
Dan Linetzky Waitzberg
  Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, Departamento Suely Itsuko Ciosak
  de Gastroenterologia (São Paulo, SP, Brasil)   Universidade de São Paulo, Departamento de Enfermagem em Saúde
  Coletiva (São Paulo, SP, Brasil)
Maria Isabel Toulson Davisson Correia
  Universidade Federal de Minas Gerais, Departamento de Cirurgia Bióloga
  (Belo Horizonte, BH, Brasil) Raquel Susana Matos de Miranda Torrinhas
  Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, Departamento
EDITORES ASSOCIADOS NACIONAIS   de Gastroenterologia (São Paulo, SP, Brasil)
Médicos EDITORES ASSOCIADOS INTERNACIONAIS
Alessandra Miguel Borges
  Centro de Pesquisas Oncológicas de Florianópolis (CEPON) Alessandro Laviano
  (Florianópolis, SC, Brasil)   University of Rome (Roma, Itália)

Carlos Antonio Bruno da Silva Andrew Ukleja


  Universidade de Fortaleza, Diretoria do Centro de Ciências da Saúde   Department of Gastroenterology at Cleveland Clinic Florida (Weston,
  (Fortaleza, CE, Brasil)   Florida, Estados Unidos)

José Raimundo Araujo de Azevedo Carla Prado


  Hospital São Domingos, Serviço de Terapia Intensiva (São Luis, MA, Brasil)   University of Alberta (Alberta, Canadá)

Melina Gouveia Castro Carol Ireton Jones


  Hospital Mario Covas (São Paulo, SP, Brasil)   Nutrition Therapy Specialist, Carrollton, Texas (Carrollton, Texas,
  Estados Unidos)
Odery Ramos Júnior
  Universidade Federal do Paraná, Disciplina de Gastroenterologia e Gordon Jensen
  Faculdade Evangélica de Medicina do Paraná, Disciplina de   University of Vermont College of Medicine (Burlington, Vermont,
  Gastroenterologia (Curitiba, PR, Brasil)   Estados Unidos)

Paulo Roberto Leitão de Vasconcelos Nicolas Velasco


  Universidade Federal do Ceará, Faculdade de Medicina   Pontifical Catholic University of Chile (Santiago, Chile)
  (Fortaleza, CE, Brasil) Luiza Kent Smith
Roberto Carlos Burini   University of Saskatchewan (Saskatoon, Saskatchewan, Canada)
  Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho, Departamento Paula Alves
  de Saúde Pública (Botucatu, SP, Brasil)   Instituto Portugues de Oncologia do Porto de Francisco Gentil
Roberto José Negrao Nogueira   (IPOPFG-E.P.E) (Porto, Portugal)
  Universidade Estadual de Campinas, Faculdade de Ciências Médicas Remy Meier
  (Campinas, SP, Brasil)   Medical University Hospital Liestal (Liestal, Switzerland)
Pediatria Robert Martindale
Mario Cicero Falcão   Oregon Health & Science University (Eugene, Oregon, Estados Unidos)
  Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, Departamento Stephen McClave
  de Pediatria (São Paulo, SP, Brasil)   University of Louisville (Louisville, Kentucky, Estados Unidos)
Rubens Feferbaum Vanessa Fuchs
  Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, Departamento   Universidad ANAHUAC and UNAM (Cidade do México, México)
  de Pediatria (São Paulo, SP, Brasil)
COMITÊ CONSULTIVO
José Vicente Spolidoro
  Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, Faculdade Joel Faintuch
  de Medicina, Departamento de Pediatria (Porto Alegre, RS, Brasil)   Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, Departamento
  de Gastroenterologia (São Paulo, SP, Brasil)
Nutricionistas
Steven B. Heymsfield
Cristina Martins   Pennington Biomedical Research Center (Baton Rouge, Louisiana,
  Fundação Pró-Renal Brasil (Curitiba, PR, Brasil)   Estados Unidos)
Diana Borges Dock Nascimento Secretária:
  Universidade Federal de Mato Grosso, Departamento de Nutrição Vanice Silva de Oliveira Freitas
  (Cuiabá, MT, Brasil)
Revisora Científica:
Graziela Ravacci Rosangela Monteiro
  Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, Departamento
  de Gastroenterologia (São Paulo, SP, Brasil) Projeto Gráfico, Diagramação e Revisão:
Criativa Comunicação e Editora
Mariana Raslan Paes Barbosa
  Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Mato Grosso do Sul Impressão:
  (Campo Grande, MS, Brasil) Pontograf
Faintuch J & Ramos O

Brazilian Society of Parenteral and Enteral Nutrition


www.braspen.org

Presidente:  Comitê de Fonoaudiologia: 


Diogo Oliveira Toledo Maria de Fatima Lago Alvite

Vice-Presidente:  Comitê da Criança e do Adolescente 


Haroldo Falcão Ramos Cunha
José Vicente Noronha Spolidoro
Primeiro Secretário: 
Melina Gouveia Castro Comitê de Reabilitação Intestinal: 
Silvio Jose de Lucena Dantas
Segundo Secretário: 
Gilmária Millere Tavares Comitê de Assistência Domiciliar: 
Denise Philomene Joseph Van Aanholt
Primeiro Tesoureiro: 
Ivens Augusto Oliveira de Souza 
Membros do Comitê Educacional:  
Segundo Tesoureiro: José Eduardo Aguilar Nascimento
Arnaldo Aires Peixoto Junior Robson Freitas de Moura
Odery Ramos Junior
Comitê de Defesa Profissional:
Sérgio Henrique Loss
Maria Isabel T. Davisson Correia
Guilherme Duprat Ceníccola
Comitê de Farmácia:  Cristiane Comeron Gimenez Verotti
Lívia Maria Gonçalves Barbosa Dirce Akamine
Márcia Antunes
Comitê de Nutrição:
Karla Lopes Pereira Gomes
Leticia Fuganti Campos
Maria Izabel Pedreia de Freitas
Comitê de Enfermagem:  Mariade Fatima Lago Alvite
Cláudia Satiko Takemura Matsuba Ana Maria Furkim

Sociedade Brasileira de Nutrição Parenteral e Enteral


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Rev Bras Nutr Clin 2014; 29 (2): XX-XX


2
Sumário

Editorial/ Editorial
O Fortalecimento do Braspen Journal ................................................................................................................................................ 213
The Strengthening of Braspen Journal
José Eduardo de Aguilar-Nascimento

Artigos Originais/Original Articles

Adesão à terapia nutricional oral de pacientes com neoplasias de cabeça e pescoço..................................................................... 215
Adherence to oral nutritional therapy of patients with head and neck neoplasms
Taíne Paula Cibulski, Tamara Becker, Camila Baldissera, Tatiane Basso, Daiana Argenta Kümpel

Terapia nutricional enteral em pacientes graves: início precoce ou tardio?..................................................................................... 221


Enteral nutrition therapy in critically ill patients: early or late onset?
Mariane Gaudio Luiz1, Francine Bonamigo Carpenedo, Larissa Jeffery Contini

Avaliação do custo-benefício entre vegetais minimamente processados e in natura em uma unidade de alimentação e
nutrição hospitalar do município de Tubarão, SC.............................................................................................................................. 227
Evaluation of the cost-benefit between fresh and unprocessed vegetables in a hospital food and hospital nutrition unit in the
city of Tubarão, SC
Samara Heidemann, Anderson Cargnin-Carvalho

Fontes dietéticas de antioxidantes consumidas pela população brasileira: Inquérito Nacional de Alimentação 2008-2009...... 238
Dietary sources of antioxidants consumed by the Brazilian population: National Survey of Food 2008-2009
Gelvani Locateli, Camila Tureck, Vanesa Gesser Correa, Eloá Angélica Koehnlein4

Manual de orientação nutricional para pacientes ostomizados....................................................................................................... 248


Nutritional guidance manual for ostomized patients
Gisele Ferreira de Barros do Nascimento, Jamilie Suelen dos Prazeres Campos

Avaliação do risco cardiovascular a partir de medidas antropométricas de pacientes atendidos no ambulatório de


Nutrição do Centro de Hipertensão e Diabetes da Universidade Federal de Pelotas...................................................................... 271
Evaluation of cardiovascular risk from anthropometric measurements of patients attended at the Nutrition outpatient clinic
of the Hypertension and Diabetes Center of the Federal U
­ niversity of Pelotas
Tainá Lima Lucas Rosa, Betina Fernanda Dambrós, Débora Simone Kilpp, Lúcia Rota Borges, Renata Torres Abib Bertacco

Análise comparativa de métodos para estimativa de estatura em idosos do estado de São Paulo............................................... 276
Comparative analysis of methods for estimation of height in the elderly of the state of São Paulo
Karina Amaral Ferreira, Joice Rodrigues Campos, Leticia Alves do Nascimento, Jéssica de Jesus Lima, Viviane Chaer Borges,
Jéssica Rodrigues de Oliveira, Luciana Setaro

Qualidade da dieta de pacientes com doenças cardiovasculares atendidos em um hospital de alta complexidade.................... 282
Quality of patients’ diet with cardiovascular diseases attended in a high complexity hospital
Jamile Zanin, Andriele Pinheiro Nunes, Maria Cristina Zanchim, Daiana Argenta Kümpel

Comparação do perfil antropométrico e alimentar de pacientes hospitalizados com pancreatite aguda, doenças
hepáticas e transtornos da vesícula biliar........................................................................................................................................... 290
Comparison of the anthropometric and alimentary profile of hospitalized patients with acute pancreatitis, liver diseases and
gallbladder disorders
Camila da Silva Florintino, Simone Carla Benincá, Dalton Luiz Schiessel, Caryna Eurich Mazur
Rev Bras Nutr Clin 2014; 29 (2): XX-XX
3
Faintuch J & Ramos O

Informações nutricionais de crianças e adolescentes atendidos na clínica de nutrição de uma universidade............................. 296
Nutritional information of children and teenagers attended in the university nutrition clinic
Lauane Cristina Marques Costa, Paula Garcia Pianura, Laís Fabíola Pansani Maniglia

Ângulo de fase em pacientes hospitalizados: relação com parâmetros antropométricos............................................................. 303


Phase angle in hospitalized patients: relationship with anthropometric parameters
Jéssica Andressa Soares de Carvalho, Thaline Milany da Silva Dias, Maísa Guimarães Silva Primo, Jordana Rayane Sousa
Aguiar, Maria da Cruz Moura e Silva, Lídia Ribeiro de Carvalho, Ana Lina De Carvalho Cunha Sales, Suelem Torres de Freitas

Associação entre estado nutricional com tempo de internamento e prognóstico em pacientes em Terapia Nutricional
em uma Unidade de Terapia Intensiva de um Hospital da rede privada da cidade de Lauro de Freitas-BA.................................. 308
Association between nutritional status with hospitalization time and prognosis in patients in Nutritional Therapy in a
Intensive Care Unit of a Hospital of the private network of the city of Lauro de Freitas-BA
Thiago Laranjeira Alves, Mara Regina Soares Pereira, Viviane Almeida Lima Leite, Alzira Cristina de Santana Rodrigues,
Claudia Maria West Nano Rego, Luiz Carlos de Oliveira Silva, Murilo Costa Safira Andrade, Fernando Jorge Cotrim Arantes

Conhecendo o perfil nutricional, clínico e dietético de pacientes hospitalizados imunodeprimidos............................................. 313


Knowing the nutritional, clinical and dietary profile of hospitalized immunosuppressed patients
Rozinéia de Nazaré Alberto Miranda, Luanny Kaísa de Oliveira Kauffmann, Amanda Fernandes Pinto, Aldair da Silva Guterres

Aplicação de indicadores de qualidade em terapia nutricional enteral em um hospital público de Salvador-BA........................ 320
Application of quality indicators in enteral nutritional therapy in a public hospital of Salvador-BA
Sacha Kiss Carvalho Machado, Thaisy Cristina Honorato Santos Alves

Excreção de zinco na urina em indivíduos com síndrome metabólica em uso de terapias anti-hipertensivas............................. 326
Urinary zinc excretion in subjects with metabolic syndrome using antihypertensive therapies
Isabelli Luara Costa da Silva, Erika Paula Silva Freitas, Eduardo Paixão da Silva, Giovanna Melo de Carvalho, Jainara da
Silva Soares, Lucia de Fátima Campos Pedrosa, Josivan Gomes de Lima, Karine Cavalcanti Maurício Sena-Evangelista

Instruções aos Autores / Instructions for Authors....................................................................................................335

Rev Bras Nutr Clin 2014; 29 (2): XX-XX


4
E
Editorial

O Fortalecimento do BRASPEN Journal


The Strengthening of Braspen Journal

Voltamos recentemente de Guadalajara, no México, onde participamos do Congresso


da Federación Latinoamericana de Terapia Nutricional, Nutrición Clínica y Metabolismo
(Felanpe). Foi um momento rico, tanto cientificamente quanto socialmente, um excelente
trabalho do Comitê Organizador. Um dos pontos importantes do evento foi a homenagem ao
Prof. Dr. Dan Waitzberg. Ele foi homenageado na sessão de abertura do evento, recebendo das
mãos do Presidente da FELANPE, Dr. Humberto Arenas, um troféu com o título de “Campeão
Mundial da Nutrição”, por ter “conseguido excelência na prática da educação e investigação
em Nutrição”. Para nós da BRASPEN, foi um motivo de muito orgulho e aproveitamos esse
editorial para saudar esse ilustríssimo membro e ex-presidente da nossa Sociedade. No evento,
apresentamos a nova revista a vários colegas latino-americanos, ressaltamos os objetivos do
BRASPEN Journal e nos oferecemos a publicar seus estudos.
É com prazer que apresentamos o número 3, volume 33 do BRASPEN Journal. Esse número
representa uma publicação ininterrupta desde o lançamento da Revista. Esse esforço da equipe
do BRASPEN Journal tem um norte: elevar a revista de categoria e inseri-la em plataformas
mais robustas da literatura médica. Nesse primeiro objetivo, rumamos para conseguir acesso
e sermos indexados pela SciELO. Para isso, muito esforço tem sido empregado e é graças
também aos autores que continuadamente enviam seus artigos que tudo isso será possível
em breve. Nesse esforço, o site para envio de artigos, dentro da parceria com a ScholarOne,
já está no ar e pode ser acessado pelo link https://mc04.manuscriptcentral.com/braspenj .
Este número atende a um dos propósitos do BRASPEN Journal, que é ser conhecido, lido
e escrito por todas as regiões do Brasil. No computo desta edição, vemos que esse propósito
vem sendo atendido, visto que temos artigos das regiões Norte, Nordeste, Centro-Oeste,
Sul e Sudeste do País. Isso nos deixa feliz como Editor e nos impele ainda mais para ir ao
encontro do ao próximo objetivo.
A BRASPEN também segue sua trajetória com o Congresso de Foz de Iguaçu-2019 em
adiantada fase de organização e que certamente será um marco científico e social na nossa
Sociedade. A campanha “Diga Não à Desnutrição” continua crescendo e certamente é conhe-
cida em todo o País.

Um abraço a todos

José Eduardo de Aguilar-Nascimento


Editor

BRASPEN J 2018; 33 (3): 213


213
CITE OS ARTIGOS DO BRASPEN JOURNAL NAS SUAS PUBLICAÇÕES.
AS CITAÇÕES ROBUSTECERÃO NOSSAS CHANCES DE INDEXAÇÃO.

BRASPEN J 2018; 33 (3): 213


214
A Artigo Original
Adesão à TNO de pacientes com neoplasias de cabeça e pescoço

Adesão à terapia nutricional oral de pacientes


com neoplasias de cabeça e pescoço
Adherence to oral nutritional therapy of patients with head and neck neoplasms

RESUMO
Taíne Paula Cibulski¹
Tamara Becker¹ Introdução: O câncer de cabeça e pescoço refere-se às neoplasias malignas com sítio primário no
Camila Baldissera2 trato aerodigestivo superior. A desnutrição apresenta alta incidência e interfere de forma negativa
Tatiane Basso3 na qualidade de vida e na tolerância ao tratamento. Método: Estudo descritivo de delineamento
Daiana Argenta Kümpel4 transversal, realizado com adultos e idosos, portadores de neoplasia maligna de cabeça e pescoço
em tratamento radioterápico, no período de julho a outubro de 2016. Os dados foram coletados
por meio de questionário formulado pelas pesquisadoras, contendo dados sociodemográficos,
clínicos, físicos, antropométricos e de adesão à terapia nutricional oral. Resultados: Participaram
do estudo 11 pacientes, com maior prevalência do gênero masculino (81,8%) e idade senil
(63,6%). Houve prevalência das neoplasias de orofaringe (36,4%) e laringe (27,3%). O estado
nutricional pelo Índice de Massa Corporal demonstrou que 63,6% encontravam-se eutróficos e
90,9% apresentaram perda de peso grave. Pela Avaliação Subjetiva Global Produzida pelo Próprio
Paciente, 90,9% dos pacientes estavam desnutridos. Dentre as características dos suplementos
nutricionais, prevaleceu o consumo de produtos hipercalóricos (100%), em pó (63,6%), sem sabor
(63,7%), consumidos preferencialmente em temperatura ambiente (72,7%), com leite (63,7%).
Considerando a adesão, a maioria dos pacientes (81,8%) aderiu à terapia nutricional oral. Dentre
os fatores relatados que interferiram na adesão estão: dificuldade financeira para aquisição do
produto (9,1%) e náuseas/odinofagia (9,1%). Todos os pacientes relataram lembrar/compreender
as orientações quanto ao uso do suplemento nutricional e consideraram importante sua utilização.
Conclusões: A maioria dos pacientes aderiu à terapia nutricional oral e dentre os fatores que
limitaram a adesão estão a dificuldade financeira para adquirir o suplemento nutricional e os
sintomas provocados pelo tratamento oncológico. A atuação do nutricionista se faz necessária
junto ao paciente com neoplasia de cabeça e pescoço, a fim de contribuir para melhora na adesão
ao tratamento, desfecho da doença e qualidade de vida.

ABSTRACT
Introduction: Head and neck cancer refers to malignant neoplasms with primary site in upper
aerodigestive tract. Malnutrition has a high incidence and negative influence on quality of life and
Unitermos: treatment tolerance. Methods: Cross-sectional descriptive study performed in adults and elderly
Neoplasias de Cabeça e Pescoço. Terapia Nutricional. people, who carried malignant head and neck neoplasm and were under radiotherapy, from
Suplementos Nutricionais. July to October 2016. Data were collected through questionnaire produced by the researchers,
including sociodemographic, clinical, physical, anthropometric and adherence to oral nutritional
Keywords: therapy data. Results: Eleven patients participated in the study, and there was prevalence of the
Head and Neck Neoplasms. Nutritional Therapy. male gender (81.8%) and senile age (63.6%). There was prevalence of oropharynx (36.4%) and
Dietary Supplements. larynx (27.3%) neoplasms. The nutritional status by the Body Mass Index showed that 63.6% of
the participants were eutrophic, 90.9% presented severe weight loss. According to the Subjective
Endereço para correspondência: Global Assessment Produced by the Patient, 90.9% of patients were malnourished. Among the
Taíne Paula Cibulski characteristics of nutritional supplements, there was prevalence of hypercaloric (100%), powder
(63.6%), and flavorless (63.7%) food intake, preferably consumed at room temperature (72.7%)
Rua Uruguai, 1382/501 – Centro – Passo Fundo, RS,
with milk (63.7%). Considering adherence, most patients (81.8%) accepted oral nutritional therapy.
Brasil – CEP: 99010-110 Among the factors reported to interfere with adherence are financial difficulty to purchase the
E-mail: tainecibulski@gmail.com product (9.1%) and nausea/odynophagia (9.1%). All patients reported remembering/understanding
the instructions regarding the use of nutritional supplements and found their use important.
Submissão Conclusions: Most patients accepted oral nutritional therapy and among the factors that limited
19 de junho de 2017 adherence are financial difficulty to purchase nutritional supplements and symptoms caused by
the oncological treatment. The work of the nutritionist is necessary for the patient with head and
Aceito para publicação neck neoplasm in order to contribute to improving adherence to treatment, disease outcome,
27 de agosto de 2017 and quality of life.

1. Nutricionista residente do Programa de Residência Multiprofissional Integrada em Saúde do Idoso e Atenção ao Câncer da Universidade de
Passo Fundo, Hospital São Vicente de Paulo e Secretaria Municipal de Saúde de Passo Fundo, Passo Fundo, RS, Brasil.
2. Fisioterapeuta residente do Programa de Residência Multiprofissional Integrada em Saúde do Idoso e Atenção ao Câncer da Universidade de
Passo Fundo, Hospital São Vicente de Paulo e Secretaria Municipal de Saúde de Passo Fundo, Passo Fundo, RS, Brasil.
3. Nutricionista Clínica do Hospital São Vicente de Paulo (HSVP). Especialista em Nutrição Clínica, Metabolismo e Estética. Preceptora da Residência
Multiprofissional em Atenção ao Câncer do HSVP, Passo Fundo, RS, Brasil.
4. Nutricionista. Especialista em Tecnologia e Controle de Qualidade em Alimentos, Mestra em Envelhecimento Humano. Orientadora e tutora
da Residência Multiprofissional Integrada em Saúde do Idoso e Atenção ao Câncer da Universidade de Passo Fundo, Hospital São Vicente de
Paulo e Secretaria Municipal de Saúde de Passo Fundo, Passo Fundo, RS, Brasil.

BRASPEN J 2018; 33 (3): 215-20


215
Cibulski TP et al.

INTRODUÇÃO doença e tratamentos concomitantes (pré ou pós-cirúrgico


O câncer de cabeça e pescoço (CCP) refere-se às e/ou quimioterapia). Os mesmos foram atendidos pelo setor
neoplasias malignas com sítio primário no trato aerodigestivo de radioterapia do HSVP, em acompanhamento nutricional
superior e possui comportamento clínico diferente para cada ambulatorial, com indicação de TNO pela nutricionista do
subsítio, seja cavidade oral, orofaringe, laringe, hipofaringe setor. Foram excluídos deste estudo menores de 18 anos e
ou nasofaringe1. A estimativa do Instituto Nacional do os indivíduos diagnosticados com outros tipos de neoplasias
Câncer (INCA) para o Brasil, biênio 2016-2017, apontava malignas.
a ocorrência de cerca de 11.140 novos casos de câncer Os dados pessoais e clínicos – tais como idade, esco-
da cavidade oral em homens e 4.350 em mulheres; para o laridade, estado civil, diagnóstico e comorbidades – foram
câncer de laringe, estimavam-se 6.360 novos casos para os coletados em prontuário manual. Já as informações comple-
homens e 990 para as mulheres. No estado do Rio Grande mentares foram questionadas diretamente ao paciente e/ou
do Sul, estimavam-se, para câncer da cavidade oral e laringe, acompanhante.
cerca de 1.110 e 750 novos casos, respectivamente2. Para definição da classe econômica, foi aplicado o
A desnutrição apresenta incidência de 30% a 50% nos Critério de Classificação Econômica Brasil da Associação
pacientes com CCP e interfere de forma negativa na quali- Brasileira de Empresas de Pesquisa, por meio de um sistema
dade de vida, bem como na diminuição da tolerância ao de pontos, sendo os indivíduos agrupados em classe econô-
tratamento, no aumento dos riscos de infecção, na maior mica A1, A2, B1, B2, C1, C2, D ou E5.
demanda de cuidados e custos hospitalares. Frequentemente, Na avaliação antropométrica, foram aferidos o peso
a toxicidade do tratamento de quimioterapia ou radioterapia corporal (kg) e a altura (m) para o cálculo do Índice de
causa efeitos colaterais que limitam a ingestão oral, por Massa Corporal (IMC), conforme normas padronizadas6.
isso, muitas vezes, o tratamento não pode ser realizado sem Para a classificação do estado nutricional, foram adotados
um suporte nutricional adequado e intensivo. As estratégias os seguintes critérios para adultos: baixo peso (IMC < 18,5
incluídas na terapia nutricional consistem em orientação kg/m²), eutrofia (IMC: ≥ 18,5 e < 25 kg/m²), sobrepeso
nutricional, suplementos nutricionais orais e nutrição enteral3. (IMC: ≥ 25,0 e < 30 kg/m²) e obesidade (IMC: ≥ 30),
A Terapia Nutricional Oral (TNO) é indicada ao paciente proposto pela Organização Mundial da Saúde (OMS)7; e,
oncológico com o intuito de aumentar a ingestão dietética e para idosos: baixo peso (IMC < 22 kg/m2), eutrofia (IMC
prevenir efeitos colaterais, como a perda de peso e a inter- ≥ 22 e < 27 kg/m2) e sobrepeso/obesidade (IMC >27 kg/
rupção do tratamento4. Embora os suplementos nutricionais m²), proposto por Lipschitz8. O excesso de peso foi conside-
orais ofereçam benefícios significativos, existem alguns fatores rado para adultos quando o IMC ≥ 25 kg/m2 e para idosos
que podem limitar sua ingestão. Nesse sentido, este estudo quando o IMC > 27 kg/m2.
teve como objetivo verificar a adesão da TNO nos pacientes A perda de peso do paciente foi identificada em um
com neoplasia de cabeça e pescoço em um hospital de alta período de até seis meses anteriores à data da avaliação.
complexidade do norte do Rio Grande do Sul. O cálculo do percentual de perda de peso (%PP) foi reali-
zado calculando-se a diferença entre o peso usual e o peso
MÉTODO atual, sendo este resultado multiplicado por 100 e dividido
pelo peso usual. O paciente foi classificado de acordo com
O presente estudo teve como característica ser descritivo Blackburn et al.9, com os seguintes pontos de corte: perda
de delineamento transversal, realizado com adultos e idosos, significativa de peso no período de um mês (≤ 5%), três meses
portadores de neoplasia maligna de cabeça e pescoço em (≤7,5%) e seis meses (≤10 %), e perda grave quando em
tratamento radioterápico, no período de julho a outubro de um mês (> 5%), três meses (>7,5%) e seis meses (> 10%).
2016, no Hospital São Vicente de Paulo (HSVP), em Passo
Para avaliação do risco nutricional, utilizou-se a Avaliação
Fundo, RS.
Subjetiva Global Produzida pelo Próprio Paciente (ASG-PPP),
As informações foram coletadas por meio de um ques- protocolo específico para pacientes oncológicos na versão
tionário formulado pelas pesquisadoras, contendo dados traduzida e validada por Gonzalez et al.10. A parte inicial é
sociodemográficos, clínicos, físicos, antropométricos e de composta de perguntas sobre alteração do peso e ingestão
adesão à TNO. Os pacientes foram avaliados pela própria alimentar, sintomas que interferiram na alimentação e alte-
pesquisadora em até 15 dias após a data de início do uso ração da capacidade funcional. A segunda parte é relativa
do suplemento nutricional. à doença e sua relação com os requerimentos nutricionais,
Incluíram-se, no estudo, todos os pacientes de ambos os estresse metabólico e exame físico. A partir da somatória
sexos, adultos e idosos, portadores de neoplasia maligna de dos pontos, o escore total indicou o nível da intervenção
cabeça e pescoço, independentemente do estadiamento da nutricional. O diagnóstico nutricional foi definido com
BRASPEN J 2018; 33 (3): 215-20
216
Adesão à TNO de pacientes com neoplasias de cabeça e pescoço

base na ASG-PPP, que propõe as categorias A (bem nutrido


Tabela 1 – Perfil sociodemográfico de pacientes com neoplasias de cabeça
ou anabólico), B (desnutrição moderada ou suspeita) e C e pescoço (n=11).
(desnutrição importante). Variável Categoria n %
Para avaliação da adesão à terapia nutricional, foram Sexo Feminino 2 18,2
verificados: volume utilizado, características e aceitação do
Masculino 9 81,8
produto, informações quanto às orientações de uso e fatores
Faixa etária 51 – 59 anos 4 36,4
que influenciaram no consumo adequado, entre eles, falta
de compreensão das orientações, dificuldade financeira, não ≥ 60 anos 7 63,6
gostou, não achou importante, esqueceu-se de usar, dificul- Estado civil Casado/união estável 7 63,6
dades para preparar e presença de sintomas gastrointestinais. Separado/divorciado 1 9,1
Os dados foram analisados no programa SPSS versão Viúvo 3 27,3
18.0. Para as análises de associação, foi aplicado o teste Presença de Sim 6 54,5
Qui-quadrado, considerando o nível de significância de acompanhante Não 5 45,5
95% (p≤0,05).
Escolaridade EFI 9 81,8
A pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa EFC 1 9,1
da Universidade de Passo Fundo, sob parecer de número
EMC 1 9,1
1.612.564. Os pacientes participaram do estudo mediante
Classe econômica B2 1 9,1
assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.
C1 2 18,2
C2 2 18,2
RESULTADOS
D-E 6 54,5
O estudo foi composto por 11 pacientes, com preva- EFI=Ensino Fundamental Incompleto; EFC=Ensino Fundamental Completo; EMC=Ensino
lência do sexo masculino (81,8%) e faixa etária entre 52 e Médio Completo.

83 anos, sendo a maioria na idade senil. Verificou-se baixa


escolaridade (81,8%) e a maioria era casado(a) ou vivia em
união estável, comparecendo ao atendimento nutricional
Tabela 2 – Parâmetros nutricionais e antropométricos de pacientes com
acompanhado(a). No que diz respeito à classe econômica, neoplasias de cabeça e pescoço (n=11).
ficou evidente um panorama de baixo poder aquisitivo, pois Parâmetros Classificação do esta- n %
mais da metade (54,5%) dos pacientes em estudo pertenciam do nutricional
às classes D e E, conforme a Tabela 1. IMC Baixo peso 3 27,3
Segundo a localização anatômica das neoplasias, os Eutrofia 7 63,6
dados demonstraram prevalência para orofaringe (36,4%) Excesso de peso 1 9,1
e laringe (27,3%), seguida de outras localizações, como
% PP Perda grave 10 90,9
lábio, hipofaringe, nasofaringe e seio maxilar, que, juntas,
Perda significativa 1 9,1
correspondem a 36,4% dos casos.
ASG-PPP Bem nutrido 1 9,1
A radioterapia apareceu como modalidade única de trata-
mento em 54,5% dos pacientes. A outra parcela de enfermos Desnutrição moderada 6 54,5
ou suspeita
realizava a radioterapia em associação com a quimioterapia.
A maioria dos pacientes (63,6%) não referiu comorbidades. Desnutrição importante 4 36,4
IMC=Índice de Massa Corporal; %PP=Porcentagem de Perda de Peso; ASG-PPP=Avaliação
Em relação ao estado nutricional, notou-se que 63,6% Subjetiva Global Produzia pelo Próprio Paciente.
dos pacientes encontravam-se eutróficos pelo IMC, porém,
quando avaliados pela porcentagem de perda de peso,
observou-se perda grave de peso de forma acentuada Quanto ao uso da TNO, a maioria dos pacientes foi
(90,9%); e, pela ASG-PPP, somente 9,1% encontravam-se avaliada entre seis e dez dias (45,5%) do início do uso do
bem nutridos. Considerando o período de perda de peso
suplemento nutricional. O tempo mínimo e máximo de uso
referente a um, três e seis meses, conforme sugerem Black-
até a data da avaliação foi de cinco e 15 dias, respectiva-
burn et al.9, verificou-se que 72,7% dos pacientes apresen-
taram prevalência de perda de peso no período de um mês, mente. Dentre as características, prevaleceu o consumo de
sendo classificados como perda de peso grave. Por meio da produtos hipercalóricos (100%), em pó (63,6%), sem sabor
ASG-PPP, observou-se que 90,9% dos pacientes apresen- (63,7%), consumido preferencialmente em temperatura
taram algum grau de desnutrição (Tabela 2). ambiente (72,7%) e com leite (63,7%).
BRASPEN J 2018; 33 (3): 215-20
217
Cibulski TP et al.

A maioria dos pacientes (90,9%) nunca havia utilizado o significativa à grave em todos os pacientes estudados, porém,
suplemento nutricional. No que se refere à aceitação, 72,7% pelo cálculo do IMC, a maioria encontrava-se eutrófico.
disseram gostar do produto, 18,2% acharam indiferente e Embora o cálculo do IMC apresente prevalência de eutrofia
9,1% não utilizaram. O valor calórico médio foi de 314 kcal também em outros estudos11,14,15, sabe-se que a perda de
(±92,3) e, de proteínas, 16,1 gramas (±18,5). Todos os peso contribui para a piora do prognóstico clínico, ou seja,
pacientes relataram lembrar e compreender as orientações indivíduos que durante o tratamento oncológico reduzem
quanto ao uso do suplemento nutricional e consideraram mais de 10% do seu peso usual são considerados com alto
importante sua utilização. risco nutricional e, consequentemente, têm o pior desfecho
Quanto à adesão, a maioria dos pacientes (81,8%) aderiu da doença16. Segundo dados do Inquérito Luso-brasileiro de
à TNO proposta, porém, 18,2% não aderiram de forma inte- Nutrição Oncológica17, alguns tumores, como cavidade oral
gral. Dentre os fatores relatados que interferiram na adesão, e faringe, promovem maiores impactos nutricionais e, como
pode-se citar a dificuldade financeira para aquisição do consequência, apresentam maior frequência de pacientes
produto (9,1%) e náuseas/odinofagia (9,1%). com relato de perda de peso.
Quando associadas as características sociodemográficas Ainda em relação ao estado nutricional, verificou-se
e a adesão à TNO, os resultados não mostraram diferenças prevalência de desnutrição pela ASG-PPP, considerada
significativas entre sexo (p=0,655), faixa etária (p=0,382), padrão ouro para avaliação de risco nutricional do paciente
estado civil (p=0,497), escolaridade (p=0,762) e classe oncológico. Estudo realizado por Bauer et al.18 constatou
econômica (p=0,145). Também não foi observada asso- que a ASG-PPP apresentou sensibilidade de 98% e especifi-
ciação estatisticamente significativa entre adesão à TNO com cidade de 82% para determinar a desnutrição em pacientes
a avaliação nutricional pelo IMC (p=0,685), %PP (p=0,818) com câncer.
e ASG-PPP (p=0,818). Quanto ao consumo dos suplementos nutricionais orais,
verificou-se que os produtos em pó, sem sabor e consumidos
em temperatura ambiente foram preferidos pelos pacientes.
DISCUSSÃO
Estudo realizado por Nieuwenhuizen et al.19 assegura que
O sexo masculino e a faixa etária mais avançada foram não basta apenas a indicação do suplemento nutricional
identificados no presente estudo como características preva- oral: faz-se necessário, também, garantir a aceitação do
lentes nos pacientes com CCP e esses dados assemelham-se produto.
com estudos de outros pesquisadores11,12. Segundo dados do Com o objetivo de aumentar a adesão à suplementação,
INCA2, os cânceres de cavidade oral e laringe, para homens, algumas medidas preventivas podem ser estabelecidas, entre
aparecem entre os dez mais incidentes estimados para 2016, elas: variar o sabor do produto, diminuir volume, associar
ocupando a 5ª e a 8ª posição, respectivamente. Essas líquido e pó e facilitar a utilização, sugerindo preparações19.
doenças apresentam maior incidência no gênero masculino Esse dado nos remete à autonomia do paciente, pois apre-
pelos fatores de risco relacionados ao estilo de vida desses sentar alternativas para o consumo se torna essencial para
indivíduos, tais como, etilismo, tabagismo e as infecções pelo melhorar a tolerância e garantir a adesão à TNO.
Papiloma Vírus Humano (HPV).
Vários fatores podem interferir na adesão ao trata-
No Brasil, a chance de ter CCP é 2,5 vezes mais elevada mento. O grau de escolaridade e o nível socioeconômico
em indivíduos com baixo nível de escolaridade. Dados de são alguns deles. A escolaridade influencia diretamente
um estudo sobre os fatores associados ao CCP mostram que na adesão, porque, quanto mais baixo for o nível de
os pacientes com grau de instrução de ensino fundamental escolaridade, mais difícil o entendimento e a compre-
incompleto estavam entre os maiores valores de acometi- ensão do tratamento e das suas orientações dietéticas20.
mento, tanto para o câncer de lábio e cavidade oral (52,3%) Constatou-se que, apesar da baixa condição socioeconô-
quanto para os demais tipos em cabeça e pescoço (49,7%)13. mica instalada, em geral, os pacientes aderiram à TNO.
Assim como no presente estudo, observou-se baixa situação Por outro lado, este fator foi determinante para aqueles
socioeconômica entre os pesquisados. que não aderiram.
A desnutrição, que frequentemente está presente no Estudo conduzido na Argentina por Villagra et al.21
paciente oncológico, é um fator preditor de morbimortali- abordou a adesão aos suplementos nutricionais orais em
dade. Os pacientes com CCP estão entre os que apresentam pacientes hospitalizados e constatou que os pacientes oncoló-
maior risco de desnutrir14 e, desta forma, a avaliação precoce gicos tiveram significativamente uma menor adesão (32,7%)
do estado nutricional é fundamental. do que aqueles com outros diagnósticos clínicos (61,9%)
Ao avaliar-se o estado nutricional sob diferentes métodos, (p=0,02), e a presença de sintomas gastrointestinais foi
observou-se que a perda de peso ocorreu de forma determinante para a não adesão desses pacientes.
BRASPEN J 2018; 33 (3): 215-20
218
Adesão à TNO de pacientes com neoplasias de cabeça e pescoço

Outros fatores envolvidos são os sintomas provocados 18]. Disponível em: http://www.inca.gov.br/estimativa/2016/
pela terapia antineoplásica. Diversas reações decor- estimativa-2016-v11.pdf
3. Garófolo A. Nutrição clínica, funcional e preventiva aplicada à
rentes do tratamento oncológico, como alterações nas oncologia: teoria e prática profissional. Rio de Janeiro: Rubio;
glândulas salivares e mucosa oral, podem acarretar em 2012.
prejuízo na qualidade de vida relacionada à saúde dos 4. Sociedade Brasileira de Nutrição Parenteral e Enteral, Associação
Brasileira de Nutrologia. Terapia nutricional na oncologia.
pacientes e também influenciar na condução e adesão Projeto Diretrizes. São Paulo: Associação Médica Brasileira/
ao tratamento22,23. Conselho Federal de Medicina; 2011.
Sabe-se da alta prevalência de complicações causadas 5. Associação Brasileira de Empresas e Pesquisas - ABEP. Critério
de classificação econômica Brasil. São Paulo: ABEP; 2015.
pela terapia antineoplásica e sua relação com a alimentação. 6. World Health Organization. Defining the problem of overweight
Segundo o Inquérito Brasileiro de Nutrição Oncológica24, and obesity. In: World Health Organization. Obesity: preventing
que avaliou 4.822 pacientes com câncer em 45 instituições and managing the global epidemic: report of a WHO Consulta-
tion (WHO Technical Report Series, 894). Geneva: World Health
brasileiras, 45,1% dos pacientes apresentaram algum grau
Organization; 2000. p. 241-3.
de desnutrição e, nessa população, 26% apresentavam 7. World Health Organization. Physical status: the use and interpre-
anorexia, 33,4% sofriam com náuseas e vômitos, e, outros tation of anthropometry. Geneva: World Health Organization;
10,7% acusavam odinofagia, fatores que prejudicam dire- 1995.
8. Lipschitz DA. Screening for nutritional status in the elderly. Prim
tamente a ingestão alimentar. Murphy et al.25 destacam, em Care. 1994;21(1):55-67.
pesquisa, que 76% dos pacientes em quimiorradioterapia ou 9. Blackburn GL, Bistrian BR, Maini BS, Schlamm HT, Smith MF.
radioterapia para CCP apresentaram odinofagia, relatada Nutritional and metabolic assessment of the hospitalized patient.
como dor intensa na boca e garganta, interferindo no ato JPEN J Parenter Enteral Nutr.1977;1(1):11-22.
10. Gonzalez MC, Borges LR, Silveira DH, Assunção MCF, Orlandi
de se alimentar. SP. Validação da versão em português da avaliação subje-
Outro aspecto que repercute na adesão é o envolvimento tiva global produzida pelo paciente. Rev Bras Nutr Clín.
2010;25(2):102-8.
do profissional que está prestando as orientações, já que ele 11. Drumond JPN, Armond JE. Incidência do câncer oral na cidade de
deve incentivar o indivíduo a participar e a aderir às decisões São Paulo: estudo retrospectivo de 6 anos. Rev Bras Cir Cabeça
e ações. Pode-se considerar que, apesar da baixa condição Pescoço. 2015;44(1):1-6.
socioeconômica e da presença de efeitos colaterais que 12. Ottosson S, Zackrisson B, Kjellén E, Nilsson P, Laurell G.
Weight loss in patients with head and neck cancer during and
interferiram na adesão à TNO, o profissional nutricionista after conventional and accelerated radiotherapy. Acta Oncol.
foi fundamental ao instruir o paciente, orientando a respeito 2013;52(4):711-8.
da terapia nutricional proposta. 13. Ribeiro ILA, Medeiros JJ, Rodrigues LV, Valença AMG, Lima
Neto EA. Fatores associados ao câncer de lábio e cavidade oral.
Rev Bras Epidemiol. 2015;18(3):618-29.
CONCLUSÃO 14. Brasil. Ministério da Saúde. Instituto Nacional de Câncer José
Alencar Gomes da Silva. Consenso Nacional de Nutrição Onco-
Conclui-se que a maioria dos pacientes com neoplasias lógica. 2ª ed. Rio de Janeiro: INCA; 2015.
de cabeça e pescoço aderiu à TNO e, dentre os fatores 15. Vieira EMM, Galvão ACP, Costa HCBAL, Amorim ACL,
Pinto JV, Ribeiro RGSP, et al. Perfil nutricional de pacientes
que limitaram a adesão, está a dificuldade financeira para oncológicos atendidos no ambulatório de cabeça e pescoço de
adquirir o suplemento nutricional e os sintomas provocados um hospital filantrópico do município de Cuiabá (MT), Brasil.
pelo tratamento oncológico. Todos os pacientes estavam Arch Health Invest. 2014;3(3):76-83.
16. Basso T, Damo CC, Cibulski TP, Pelissaro E, Simor F, Castelli
cientes da importância do uso do suplemento nutricional
TM. Estado nutricional de pacientes ambulatoriais subme-
e afirmaram compreender as orientações repassadas pela tidos à quimioterapia e radioterapia. Rev Med Ciênc Saúde.
nutricionista. Esse fato reforça a necessidade da atuação do 2015;41(4):94-101.
nutricionista na equipe multiprofissional, prestando assis- 17. Brasil. Ministério da Saúde. Instituto Nacional de Câncer José de
Alencar Gomes da Silva. Inquérito Luso-Brasileiro de Nutrição
tência nutricional precoce, a fim de evitar ou atenuar a perda Oncológica do Idoso: um estudo multicêntrico. Rio de Janeiro:
de peso e, também, contribuir para uma melhora na adesão INCA; 2015.
ao tratamento, no desfecho da doença e na qualidade de 18. Bauer J, Capra S, Ferguson M. Use of the scored Patient-Gene-
rated Subjective Global Assessment (PG-SGA) as a nutrition
vida do paciente oncológico.
assessment tool in patients with cancer. European journal of
clinical nutrition. Eur J Clin Nutr. 2002;56(8):779-85.
19. Nieuwenhuizen WF, Weenen H, Rigby P, Hetherington MM.
REFERÊNCIAS Older adults and patients in need of nutritional support: review
1. Sociedade Brasileira de Oncologia Clínica - SBOC. Manual de of current treatment options and factors influencing nutritional
condutas. Rev Soc Bras de Oncol Clín 2011 [acesso 2016 Abr intake. Clin Nutr. 2010;29(2):160-9.
Abr 21]. Disponível em: http://www.sboc.org.br/downloads/ 20. Veras RFS, Oliveira JS. Aspectos sócio-demográficos que
MANUAL_CONDUTAS_2011.pdf influenciam na adesão ao tratamento anti-hipertensivo. Rev
2. Brasil. Ministério da Saúde. Estimativa 2016: Incidência de RENE. 2009;10(3):132-8.
câncer no Brasil [Internet]. Instituto Nacional de Câncer José 21. Villagra A, Merkel MC, Rodriguez Bugueiro JR, Lacquaniti N,
Alencar Gomes da Silva. Rio de Janeiro; 2015 [acesso2016 Abr Remoli R. Adherencia a los suplementos nutricionales orales en

BRASPEN J 2018; 33 (3): 215-20


219
Cibulski TP et al.

pacientes internados con patología clínica-quirúgica. Nutr Hosp. 24. Brasil. Ministério da Saúde. Instituto Nacional de Câncer José
2015;31(3):1376-80. de Alencar Gomes da Silva. Inquérito Brasileiro de Nutrição
22. Paula JM, Sawada NO. Qualidade de vida relacionada à saúde de Oncológica. Rio de Janeiro: INCA; 2013.
pacientes com câncer em tratamento radioterápico. Rev RENE.
25. Murphy BA, Beaumont JL, Isitt J, Garden AS, Gwede CK,
2015;16(1):106-13.
23. Santos PAS, Cunha TRS, Cabral EK, Soares BLM, Maio Trotti AM, et al. Mucositis-related morbidity and resource
R, Burgos MGPA. Triagem nutricional por meio do MUST utilization in head and neck cancer patients receiving radiation
no paciente oncológico em radioterapia. Rev Bras Cancerol. therapy with or without chemotherapy. J Pain Symptom Manage.
2016;62(1):27-34. 2009;38(4):522-32.

Local de realização do estudo: Hospital São Vicente de Paulo, Passo Fundo, RS, Brasil.

Conflito de interesse: Os autores declaram não haver.

BRASPEN J 2018; 33 (3): 215-20


220
A Artigo Original
Terapia nutricional enteral em pacientes graves

Terapia nutricional enteral em pacientes graves:


início precoce ou tardio?
Enteral nutrition therapy in critically ill patients: early or late onset?

RESUMO
Mariane Gaudio Luiz1
Francine Bonamigo Carpenedo2 Introdução: As diretrizes europeia, brasileira, norte-americana e canadense classificam a oferta
Larissa Jeffery Contini3 de nutrição enteral em pacientes graves como precoce ou tardia, por serem oferecidas em dife-
rentes tempos, porém, quando precoce, apresenta vantagens, já na tardia os pacientes podem
desenvolver desnutrição. Em hospitais, esse comprometimento acomete 50% dos internados,
sendo que quanto mais cedo for administrada a dieta, menor a possibilidade de problemas. Para
assegurar a eficácia da Terapia Nutricional Enteral aos pacientes, a Agência Nacional de Vigilância
Sanitária passou a exigir dos hospitais uma Equipe Multiprofissional de Terapia Nutricional e,
dentre os profissionais, um nutricionista. Método: Estudo transversal observacional conduzido no
Pronto Atendimento Médico do Hospital Regional de Mato Grosso do Sul, de julho a outubro de
2015, com 133 participantes e 42 excluídos. Foram incluídos indivíduos com idade ≥ a 18 anos,
de ambos os sexos, em nutrição enteral exclusiva, sendo utilizado um formulário para coletar do
prontuário a faixa etária, gênero, motivos da admissão, tempo para início da nutrição enteral e
motivo do jejum. O início da terapia nutricional foi classificado em precoce ou tardio, segundo
as Diretrizes Brasileiras em Terapia Nutricional. Resultados: Dos 91 participantes, 32,9% (n=30)
eram adultos e 67% (n=61) idosos, com idade média de 45 e 76 anos, respectivamente, sendo
que, em ambas as faixas etárias, o sexo masculino foi mais prevalente. Não houve associação
estatística significativa entre as faixas etárias e a nutrição enteral precoce, porém nas internações
predominou nos pacientes idosos. Ao todo, 86,8% (n=79) receberam nutrição enteral precoce.
Com relação aos motivos da nutrição enteral tardia, não houve similaridade entre adultos e
idosos, no entanto, pode-se destacar os distúrbios gastrointestinais com 41,6% (n=5), seguido
por instabilidade hemodinâmica em 25% (n=3). Conclusão: No presente estudo, a maioria
dos participantes recebeu nutrição enteral precoce, conforme as recomendações das Diretrizes
Brasileiras em Terapia Nutricional.

ABSTRACT
Unitermos: Introduction: The European, Brazilian, American and Canadian Guidelines classify the supply
Estado Nutricional. Nutrição Enteral. Trato Gastroin- of enteral nutrition in severe patients as early or late because they are offered at different times;
testinal. Translocação Bacteriana. Desnutrição. however, when early, it has advantages, and in the late one, patients may develop malnutrition.
In hospitals, this impairment affects 50% of the hospitalized, and the earlier administered the diet,
Keywords: the fewer problems they would have. To ensure the effectiveness of Enteral Nutrition Therapy for
Nutritional Status. Enteral Nutrition. Gastrointestinal patients, the National Sanitary Surveillance Agency now requires a Multiprofessional Nutrition
Tract. Bacterial Translocation. Malnutrition. Therapy Team from the hospitals and among the professionals, a nutritionist. Methods: Obser-
vational transversal study conducted at the Medical Care Unit of the Regional Hospital of Mato
Endereço para correspondência: Grosso do Sul from July to October 2015, with 133 participants and 42 excluded. We included
individuals aged ≥ 18 years of both genders in exclusive enteral nutrition, using a form to collect
Mariane Gaudio Luiz
the age, gender, reasons for admission, time for beginning of enteral nutrition and reason for
Rua Joaquim Lopes Bogalhos, 30 – Veredas – Osvaldo fasting. The initiation of nutritional therapy was classified as early or late according to the Brazilian
Cruz, SP, Brasil – Guidelines on Nutritional Therapy. Results: Of the 91 participants, 32.9% (n=30) were adults and
CEP: 17700-000 67% (n=61) the elderly, with an average age of 45 and 76 years, respectively, and in both age
E-mail: mariane_gaudio@hotmail.com groups the male sex was most prevalent. There was no significant statistical association between
the age groups and the early enteral nutrition, but in the hospitalizations the elderly patients
Submissão predominated. Overall, 86.8% (n=79) received early enteral nutrition. Regarding the reasons of
4 de janeiro de 2018 late enteral nutrition, there were no similarities between adults and elderly. However, gastrointes-
tinal disturbances were observed with 41.6% (n=5) followed by hemodynamic instability in 25%
Aceito para publicação (n=3). Conclusion: In the present study, the majority of the participants received early enteral
15 de abril de 2018 nutrition, according to the recommendations of the Brazilian Guidelines on Nutrition Therapy.

1. Nutricionista do Programa de Residência Multiprofissional Integrada à Saúde, área de concentração: Intensivismo - Hospital Regional de Mato
Grosso do Sul (HRMS), Universidade Anhanguera (UNIDERP), Campo Grande, MS, Brasil.
2. Nutricionista formada pela Universidade Católica Dom Bosco e especialização em Nutrição Clínica pela Universidade Gama Filho, Campo
Grande, MS, Brasil.
3. Nutricionista preceptora da Unidade de Terapia Intensiva do Hospital Regional de Mato Grosso do Sul (HRMS), Campo Grande, MS, Brasil.

BRASPEN J 2018; 33 (3): 221-6


221
Luiz MG et al.

INTRODUÇÃO O profissional nutricionista é o responsável por um


A nutrição enteral (NE) em pacientes graves pode ser clas- conjunto de cuidados relacionados à alimentação e à
sificada como precoce ou tardia1. Deste modo, o comitê de nutrição em seus diferentes níveis de complexidade e de
intervenção, de acordo com as características individuais e
especialistas da Sociedade Europeia de Nutrição Parenteral e
o tipo de enfermidade. Além de oferecer uma alimentação
Enteral (ESPEN)2 recomenda que os pacientes graves hemo-
segura, contribui ainda para corrigir e evitar deficiências nutri-
dinamicamente estáveis e com o trato gastrointestinal (TGI)
cionais que colaboram para o aumento das complicações
funcionante sejam alimentados precocemente, nas primeiras
e da mortalidade; identificar em tempo hábil os pacientes
24 horas da admissão. Entretanto, as Diretrizes Brasileiras em
que requerem um apoio nutricional especializado e indivi-
Terapia Nutricional (DITEN)3, a Sociedade Norte-Americana de
dual, triar e identificar aqueles em risco nutricional ou com
Nutrição Parenteral e Enteral (ASPEN)4 e a Canadian Critical
desnutrição prévia15.
Practice5 sugerem que, para esses pacientes, a alimentação por
via alternativa deve ocorrer em até 48 horas iniciais do trata- Diante de tais constatações, propõe-se a realização
mento, após a estabilização hemodinâmica, precedendo às deste estudo, visando verificar o tempo de início da terapia
respostas hipermetabólicas e hipercatabólicas que se instalam de nutrição enteral (TNE) em pacientes com indicação para
nas primeiras 72 horas após a lesão inicial. este tratamento, admitidos no Pronto Atendimento Médico
(PAM) Adulto do Hospital Regional de Mato Grosso do Sul
É possível perceber que as Diretrizes ainda não estabe-
(HRMS), seguindo os parâmetros recomendados nas DITEN.
leceram um consenso sobre o tempo de início para nutrição
enteral precoce (NEP), porém pode ser administrada entre
24-48 horas6 por apresentar diversas vantagens3, sendo MÉTODO
que aqueles que demoram para receber NE podem evoluir
Estudo transversal observacional, conduzido na sala de
para um quadro de desnutrição, por ocorrer uma alteração
emergência do PAM adulto do HRMS Rosa Pedrossian de
funcional, estrutural e de desenvolvimento orgânico, em Campo Grande, MS, de julho a outubro de 2015. Foram
consequência de um desequilíbrio nutricional entre a ingestão incluídos os participantes com idade ≥ a 18 anos, conside-
e a utilização dos nutrientes afetados por circunstâncias rando idosos aqueles com idade ≥ a 60 anos, de ambos os
adversas, como alterações na absorção, transporte, utili- sexos, mediante a assinatura do Termo de Consentimento
zação, excreção e reserva de nutrientes7. Livre e Esclarecido, tendo como critério de exclusão aqueles
Em ambiente hospitalar, esse comprometimento do estado que não estavam em NE exclusiva, institucionalizados e os
nutricional acomete cerca de 50% dos pacientes, tendo que faleceram antes do início da NE.
como causa a própria injúria, a baixa ingestão alimentar8 e Os dados foram coletados diariamente por meio de um
mobilização de proteínas para reparar os tecidos lesionados formulário contendo os seguintes itens: idade, sexo, data de
pelo intenso catabolismo9. admissão, motivo da internação e do jejum e tempo para
Nesses pacientes com déficit nutricional ou naqueles sem início da NE.
previsão de ingestão por via oral em 3 a 5 dias, uma terapia Após a coleta, os motivos da internação foram agrupados
nutricional (TN) adequada iniciada de forma precoce pode em: instabilidade hemodinâmica (uso de droga vasoativa
melhorar a resistência às infecções, promover a cicatrização em altas dosagens, choque séptico, hipoperfusão, parada
das feridas, impedir que a desnutrição não se agrave3, reduzir cardiorrespiratória), distúrbios: do aparelho digestório
o balanço nitrogenado negativo, tempo de internação6, (pancreatite e cirrose hepática), metabólico (hiperglicemia e
custos hospitalares10, risco de falência múltipla de órgãos e acidose metabólica); doenças: neurológica (acidente vascular
morbimortalidade11,12. encefálico, crises convulsivas, epilepsia), oncológica (câncer
Além dessas vantagens, é possível preservar a proteína de esôfago), pulmonar (pneumonia aspirativa ou adquirida
muscular13, por fornecer combustível extra para a massa na comunidade, doença pulmonar obstrutiva crônica, asma),
magra, auxiliar o paciente durante toda a resposta ao psiquiátrica (intoxicação exógena, tentativa de suicídio),
estresse5, impedir a degeneração do TGI por manter o orga- urológica (infecção do trato urinário) e outros (rebaixamento
nismo funcionante11, estimular o fluxo sanguíneo e induzir a do nível de consciência, dispneia, insuficiência respiratória,
liberação de agentes endógenos5. disfagia, tosse, algia torácica, vertigem).
Para garantir essa eficácia e segurança da TNE aos Os motivos do jejum foram divididos em: distúrbios
pacientes, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária metabólicos (acidose metabólica), gastrointestinais (êmese,
(ANVISA)14 passou a exigir que os hospitais possuam uma distensão abdominal, sonda nasogástrica aberta com alto
Equipe Multiprofissional de Terapia Nutricional (EMTN), que débito, hemorragia digestiva alta, algia abdominal); instabili-
deve ser constituída por pelo menos um médico, um enfer- dade hemodinâmica (uso de droga vasoativa em altas dosa-
meiro, um farmacêutico e um nutricionista. gens, choque séptico, hipoperfusão); doenças neurológicas
BRASPEN J 2018; 33 (3): 221-6
222
Terapia nutricional enteral em pacientes graves

(acidente vascular encefálico, crises convulsivas, epilepsia) e


Tabela 1 – Distribuição dos participantes de acordo com as causas de
realização de exame (ultrassonografia de abdome). admissão no Pronto Atendimento Médico (PAM).
Os resultados são descritos em média e desvio padrão Causas de admissão no PAM Adultos Idosos
para variáveis numéricas, e como número (n) ou porcentagem (n=30) (n=61)
(%) para as categóricas. As associações foram calculadas pelo Distúrbio do aparelho digestivo 3,3% (n=1) 3,2% (n=2)
teste Qui-quadrado. Considerou-se um nível de significância de Distúrbio gastrointestinal 10,0% (n=3) 13,1% (n=8)
5%, sendo os testes realizados por meio do software estatístico Distúrbio metabólico 6,6% (n=2) 3,2% (n=2)
Bioestat 5.316. O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética e Doença neurológica 13,3% (n=4) 6,6% (n=4)
Pesquisa Plataforma Brasil, com o parecer número 1129.551.
Doença oncológica 3,3% (n=1) 0,0% (n=0)
Doença respiratória 10,0% (n=3) 19,7% (n=12)
RESULTADOS Doença psiquiátrica 13,3% (n=4) 1,6% (n=1)
Durante o período de coleta dos dados foram admitidos Doença urológica 0,0% (n=0) 6,6% (n=4)
no PAM 133 participantes, dos quais 91 foram incluídos no Instabilidade hemodinâmica 13,3% (n=4 6,6% (n=4)
estudo. A amostra foi constituída por 67% (n=61) de idosos, Outros 26,7% (n=8) 39,3% (n=24)
com idade entre 60 e 96 anos, com média de 76,02±9,99
anos. Já a idade dos adultos 32,9% (n=30) selecionados
variou de 20 a 58 anos e média de 45,53±11,10 anos. 76,7% (n=23) dos adultos em NEP. Entre os adultos que
Em ambas as faixas etárias, o sexo masculino foi o mais receberam NE tardia, em 16,7% (n=5) ocorreu em até 60
prevalente, sendo representado, respectivamente, por 65,5% horas e 6,7% (n=2) em até 72 horas.
(n=40) e 63,3% (n=19) da amostra. Nos participantes idosos, foi observado que 52,4%
As principais causas de admissão no PAM entre os idosos (n=32) receberam a NE nas primeiras 24 horas de internação
foram classificadas como doenças respiratórias em 19,7% hospitalar, enquanto 26,2% (n=16) em até 36 horas e 13,1%
(n=12) e gastrointestinais em 13,1% (n=8). Nos adultos, (n=8) em até 48 horas, totalizando 91,8% (n=56) de idosos
não houve um maior destaque de nenhuma das causas, com NEP. Entre os demais, 4,9% (n=3) receberam em até
com distribuição semelhante entre elas. A ausência de 60 horas e 3,3% (n=2) em até 72 horas, um total de 8,2%
participantes adultos e idosos em todos os motivos impediu (n=5) de idosos em NE tardia.
a verificação de associação estatística. Os valores de todas No geral, a NEP foi administrada de 24-48 horas em
as causas estão detalhados na Tabela 1. 86,8% (n=79) de todos os participantes, sendo 46,1% (n=42)
Em relação ao tempo para iniciar a TNE após admissão nas primeiras 24 horas. Quando realizada a comparação
hospitalar, foi identificada entre os adultos que 33,3% (n=10) entre adultos e idosos, não foi identificada associação esta-
receberam a NE em até 24 horas, outros 33,3% (n=10) tisticamente significativa, demonstrando que a NEP não está
em até 36 horas e 10% (n=3) em até 48 horas, totalizando relacionada à faixa etária do indivíduo (p=0,06) (Figura 1).

Figura 1 - Representação gráfica do número dos participantes adultos (n=30) e idosos (n=61) de acordo com o tempo de início da nutrição enteral.
(*) Associação estatística não significativa pelo teste Qui-quadrado.

BRASPEN J 2018; 33 (3): 221-6


223
Luiz MG et al.

Figura 2 - Representação gráfica dos motivos para nutrição enteral tardia de 12 participantes.

Os motivos identificados para NE tardia foram diversos e ou menos benefícios do que a iniciada em até 48 horas1.
não houve semelhança entre os motivos para idosos e adultos. Porém, são comprovados seus benefícios quando adminis-
Dentre os participantes com atraso na administração da dieta, trada precocemente em pacientes graves, após estabilidade
pode-se observar que a presença de distúrbios gastrointestinais hemodinâmica2-4.
foi o principal agente em 41,6% (n=5), seguido por instabi- Para elucidar essas vantagens, várias metanálises compa-
lidade hemodinâmica em 25% (n=3). As demais causas e raram a NEP com a NE tardia, demonstrando que os pacientes
respectivos valores estão representados na Figura 2. que receberam NEP dentro de 48 horas apresentaram redução
na mortalidade e nas infecções, com queda significativa no
DISCUSSÃO tratamento de pneumonias e melhora da ingestão alimentar,
porém não houve diferença significativa com relação ao tempo
De acordo com os resultados, independentemente da
de internação hospitalar e ventilação mecânica4.
idade, os participantes do sexo masculino são os mais admi-
tidos no ambiente hospitalar. Isso pode ser reflexo das ques- Em revisão retrospectiva, Khalid et al.19 compararam
tões culturais e de gênero, pois há vários séculos sustentou-se pacientes graves em uso de baixas doses de vasopressores
uma cultura patriarcal em que o homem cultiva a ideia de que receberam NEP após iniciar a ventilação mecânica
rejeição da possibilidade de adoecer, expondo-se mais às com NE tardia. Os resultados obtidos foram satisfatórios,
doenças, acreditando ser invulnerável e forte. A procura de apresentando diminuição na mortalidade e no número de
um serviço de saúde, numa perspectiva preventiva, pode ser infecções nos pacientes com NEP, principalmente naqueles
associada a fraqueza, medo e insegurança, o que insinua que receberam vários vasopressores simultaneamente5,19.
dúvidas de sua masculinidade17. Em uma pesquisa realizada por formulário eletrônico,
Na Figura 1, é notável o predomínio da população idosa. 84% (n=96) dos médicos intensivistas referiram a intenção
Isso pode ser explicado em virtude da transição demográfica, de prescrever a NEP em até 48 horas da admissão12, análise
uma vez que o aumento da expectativa de vida faz com que esta muito similar ao do presente trabalho.
estes indivíduos apresentem frequentemente exacerbações O estudo em questão não identificou associação estatis-
das doenças e internações hospitalares recorrentes18. ticamente significativa entre adultos e idosos que receberam
No presente estudo, 86,8% (n=79) dos participantes, NEP, demonstrando que a mesma não está relacionada à
entre adultos e idosos, receberam NEP dentro das 48 horas, faixa etária dos indivíduos (p=0,06) (Figura 1).
entre estes, 46,1% (n=42) logo nas primeiras 24 horas. A Figura 2 mostra que os principais motivos que
As Diretrizes ainda não entraram em um consenso com influenciaram na NE tardia foram as complicações do TGI
relação ao melhor tempo para iniciar a NEP13, inclusive se com 41,6% (n=5) e a instabilidade hemodinâmica com
a NE administrada nas primeiras 24 horas apresenta mais 25% (n=3), totalizando 66,6% (n=8) dos participantes
BRASPEN J 2018; 33 (3): 221-6
224
Terapia nutricional enteral em pacientes graves

acompanhados no estudo, sendo as mesmas dificuldades REFERÊNCIAS


mencionadas por Pasinato et al.10. Em tais condições, é 1. Fremont RD, Rice TW. How soon should we start inter-
contraindicado o início da NE, pois, nesse momento, a ventional feeding in the ICU? Curr Opin Gastroenterol.
presença do alimento no TGI irá comprometer ainda mais a 2014;30(2):178-81.
2. Kreymann KG, Berger MM, Deutz NE, Hiesmayr M, Jolliet P,
perfusão esplâncnica, aumentando a demanda de oxigênio Kazandjiev G, et al.; DGEM (German Society for Nutritional
na mucosa do intestino, levando à perda da integridade epite- Medicine); ESPEN (European Society for Parenteral and Enteral
lial, predispondo a translocação bacteriana e a sepse3-5,20. Nutrition). ESPEN Guidelines on Enteral Nutrition: Intensive
care. Clin Nutr. 2006;25(2):210-23.
Além das condições clínicas que contraindicam o início 3. Projeto Diretrizes. Associação Médica Brasileira e Conselho
da NEP, Mehta21 revelou que a NE tardia pode ocorrer em Federal de Medicina Volume IX. Terapia nutricional no perio-
virtude de uma combinação de prescrição inadequada ou peratório. São Paulo: AMB/CFM; 2011.
insuficiente, sendo assim, a presença de um nutricionista 4. McClave SA, Taylor BE, Martindale RG, Warren MM, Johnson
DR, Braunschweig C, et al.; Society of Critical Care Medicine;
ajuda a resolver a questão em discussão. American Society for Parenteral and Enteral Nutrition. Guide-
O IBRANUTRI revelou que quase metade dos pacientes lines for the Provision and Assessment of Nutrition Support
Therapy in the Adult Critically Ill Patient: Society of Critical
internados em rede pública no Brasil apresentavam algum
Care Medicine (SCCM) and American Society for Parenteral and
grau de desnutrição, identificando que apenas 20% dos Enteral Nutrition (A.S.P.E.N.). JPEN J Parenter Enteral Nutr.
4000 prontuários analisados continham informações sobre 2016;40(2):159-211.
questões relacionadas à nutrição. A ausência desses dados 5. Critical Care Nutrition. Canadian clinical practice guidelines
2013. [Internet]. 2016 [acesso 2016 Fev 7]. Available from:
pode estar associada com o retardo no início da TN e na
http://www.criticalcarenutrition.com/docs/cpgs2012/2.0.pdf
piora do estado nutricional desses indivíduos8. 6. Borges VC, Barone MG, Oliveira PM. Terapia nutricional enteral
A incapacidade de fornecer a NEP pode ocorrer mais precoce. In: Toledo D, Castro M, eds. Terapia nutricional em
UTI. Rio de Janeiro: Rubio; 2015. p. 91-8.
como um marcador de gravidade da doença (isto é, os 7. Fonseca MM, Mello MC, El-Kik RM. Frequência de realização
pacientes que podem receber NE são menos graves do que de triagem nutricional em pacientes adultos hospitalizados. Rev
aqueles que não podem) do que um mediador de compli- Grad [Internet]. 2012;5(1) [acesso 2016 Fev 7]. Disponível em:
cações e maus resultados6. http://revistaseletronicas.pucrs.br/ojs/index.php/graduacao/
article/view/11408
Considerando as vantagens e as dificuldades da insti- 8. Waitzberg DL, Caiaffa WT, Correia MI. Hospital malnutrition:
tuição da NE, estudos apontam que a NEP foi praticada em the Brazilian national survey (IBRANUTRI): a study of 40000
50% e 63% de seus pacientes internados3,10, diferentemente patients. Nutrition. 2001;17(7-8):573-80.
9. Nunes MS, Valença RCA, Gurgel RKC, Silva EIL, Barreto LMD,
do percentual desta pesquisa, que se aproximou mais da Saldanha V, et al. Análise das solicitações de comprimidos adap-
totalidade da amostra. tados para pacientes críticos de um hospital universitário. Rev
Bras Farm Hosp Serv Saúde (São Paulo). 2013;4(4):23-30.
Neste cenário, para que a TN seja efetiva, o conhecimento
10. Pasinato VF, Berbigier MC, Rubin BA, Castro K, Moraes RB,
da equipe de saúde parece ser parte relevante do processo. Perry YDS. Terapia nutricional enteral em pacientes sépticos
Entretanto, pesquisas apontam não ser rara a heterogenei- na unidade de terapia intensiva: adequação às diretrizes
dade no conhecimento teórico e na prática da TN12. nutricionais para pacientes críticos. Rev Bras Ter Intensiva.
2013;25(1):17-24.
Contudo, a EMTN procura ao máximo garantir a totali- 11. Anjos Junior LA, Rosa RS, Reis JB, Pegoraro VA, Caporossi C.
dade da NEP22, mesmo que existam poucas implantadas em Terapia nutricional enteral em pacientes críticos: qual o papel
âmbito regional e nacional12, sendo que o nutricionista dentro do enfermeiro nesse processo? Rev COORTE. 2014(4):53-9.
12. Cunha HFR, Salluh JIF, França MF. Atitudes e percepções em
das unidades de alta complexidade garante aos pacientes terapia nutricional entre médicos intensivistas: um inquérito via
graves uma adequada assistência nutricional, utilizando-se internet. Rev Bras Ter Intensiva. 2010;22(1):53-63.
de métodos e técnicas específicas23. 13. Silva FM, Bermudes ACG, Maneschy IR, Zanatta GAC, Fefer-
baum R, Carvalho WB, et al. O impacto da introdução precoce
de terapia nutricional enteral na redução da morbimortalidade na
CONCLUSÃO terapia intensiva pediátrica: uma revisão sistemática. Rev Assoc
Med Bras 2013;59(6):563-70.
Com base nos resultados, é possível evidenciar que 14. Brasil. Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA).
o HRMS segue o preconizado pelas DITEN, tanto para o Resolução da Diretoria Colegiada - RCD N° 63, de 6 de julho de
2000 [Internet]. [citado 2015 Jan]. Disponível em: http://crn3.
início da NEP quanto na identificação dos pacientes com
org.br/Areas/Admin/Content/upload/file-071120157932.pdf
contraindicação para a nutrição. Isto pode ser reflexo de 15. Seta MH, O'Dwyer G, Henriques P, Sales GLP. Cuidado nutri-
uma equipe assistencial atualizada e comprometida com a cional em hospitais públicos de quatro estados brasileiros:
atenção à saúde de qualidade, uma vez que o nutricionista contribuições da avaliação em saúde à vigilância sanitária de
serviços. Ciênc Saúde Coletiva. 2010;15(Supl. 3):3413-22.
tem participação fundamental nesta decisão. Contudo, são
16. Ayres M, Ayres Júnior M, Ayres DL, Santos AS. BioEstat
necessários mais estudos para elucidar a associação do 5.0: aplicações estatísticas nas áreas das ciências biológicas e
tempo aos benefícios da NEP. médicas. Belém: MCT; IDSM; 2007. 364 p.

BRASPEN J 2018; 33 (3): 221-6


225
Luiz MG et al.

17. Lima SBS, Magnago TSBS, Schardong AC, Peres RR, Ceron 21. Mehta NM. Feeding the gut during critical illness: it is about
MDS, Prochnow A, et al. Perfil clinico-epidemiológico dos time. JPEN J Parenter Enteral Nutr. 2014;38(4):410-4.
pacientes internados no pronto-socorro de um hospital univer- 22. Oliveira NS, Caruso L, Bergamaschi DP, Cartolano FC, Soriano
sitário. Rev Saúde (Santa Maria). 2013;39(1):77-86. FG. Impacto da adequação da oferta energética sobre a mortali-
18. Storti LB, Fabrício-Whebe SCC, Kusumota L, Rodrigues RAP, dade em pacientes de UTI recebendo nutrição enteral. Rev Bras
Marques S. Fragilidade de idosos internados na clínica médica Ter Intensiva. 2011;23(2):183-9.
da unidade de emergência de um hospital geral terciário. Texto 23. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde.
Contexto Enferm. 2013;22(2):452-9. Portaria Nº 120, de 14 de abril de 2009. Institui mecanismos
19. Khalid I, Doshi P, DiGiovine B. Early enteral nutrition and para a organização e implantação de Unidades de Assistência
outcomes of critically ill patients treated with vasopressors and e Centros de Referência de Alta Complexidade em Terapia
mechanical ventilation. Am J Crit Care. 2010;19(3):261-8. Nutricional, no âmbito do Sistema Único de Saúde - SUS
20. Yang S, Wu X, Yu W, Li J. Early enteral nutrition in critically [Internet]. Brasília: Ministério da Saúde; 2014. [citado 2014 Nov
ill patients with hemodynamic instability: an evidence-based 14]. Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/
review and practical advice. Nutr Clin Pract. 2014;29(1):90-6. sas/2009/prt0120_14_04_2009.html

Local de realização do estudo: Hospital Regional de Mato Grosso do Sul (HRMS), Campo Grande, MS, Brasil.

Conflito de interesse: Os autores declaram não haver.

BRASPEN J 2018; 33 (3): 221-6


226
A Artigo Original
Avaliação do custo-benefício entre vegetais minimamente processados e in natura

Avaliação do custo-benefício entre vegetais


minimamente processados e in natura em uma
unidade de alimentação e nutrição hospitalar do
município de Tubarão, SC
Evaluation of the cost-benefit between fresh and unprocessed vegetables in a hospital food
and hospital nutrition unit in the city of Tubarão, SC

RESUMO
Samara Heidemann1
Anderson Cargnin-Carvalho2 Introdução: A Unidade de Alimentação e Nutrição (UAN) hospitalar visa fornecer alimentos
que supram as necessidades nutricionais de seus pacientes, mas que apresentem características
higiênico-sanitárias, sensoriais e simbólicas adequadas a essa população. Dentre a gama de
alimentos, estão inseridos os vegetais, que são fundamentais para uma alimentação equilibrada.
Objetivo: Avaliar o custo-benefício entre vegetais minimamente processados e in natura em uma
unidade de alimentação e nutrição hospitalar do município de Tubarão, SC. Método: A presente
pesquisa foi classificada como do tipo observacional, transversal e quantitativa. Foram avaliados
12 diferentes vegetais sob variáveis como: fator de correção, tempo de higienização e pré-preparo;
custos com mão de obra, água, luz, equipamentos e resíduos. Resultados: Dentre os vegetais,
a menor perda é com o agrião - 2,71% e 1,03% de Fator de Correção (FC) e a máxima a couve-
flor - 36,73% e 1,58% de FC. Em relação ao custo benefício, 50% dos vegetais processados têm
custo inferior do que os in natura manipulados. Conclusão: A maioria dos FC está dentro do
Unitermos: pré-estabelecido pela literatura e, apesar do custo elevado dos vegetais processados, viabilizar
Verduras. Análise Custo-Benefício. Estado Nutricional.
a aquisição dos mesmos seria de grande benefício para a UAN.
Apoio Nutricional.

Keywords: ABSTRACT
Vegetables. Cost-Benefit Analysis. Nutritional Status. Introduction: The Hospital Nutrition and Nutrition Unit (UAN) aims to provide foods that meet
Nutritional Support. the nutritional needs of its patients, but which present hygienic-sanitary, sensorial and symbolic
characteristics appropriate to this population. Among the range of foods are inserted the vegeta-
Endereço para correspondência: bles, which are essential for a balanced diet. Objective: To evaluate the cost-benefit of minimally
Samara Heidemann processed and in natura plants in a hospital feeding and nutrition unit in the municipality of Tubarão,
Rua Orleans, 190/201 – Centro – Lauro Muller, SC, SC. Methods: The present research was classified as observational, transversal and quantitative.
Brasil – CEP: 88880-000 Twelve different vegetables were evaluated under variables such as: correction factor, hygiene
Email: samara_rf@hotmail.com
time and pre-preparation; costs of labor, water, light, equipment and waste. Results: Among the
Submissão vegetables, the lowest loss is with watercress - 2.71% and 1.03% of Correction Factor (CF) and
19 de julho de 2017 the maximum of cauliflower - 36.73% and 1.58% of CF. In relation to the cost-benefit, 50% of
the processed vegetables have a lower cost than the fresh ones handled. Conclusion: Most CFs
Aceito para publicação are within the range established by the literature and, despite the high cost of processed plants,
2 de outubro de 2017 making them viable would be of great benefit to UAN.

1. Nutricionista pós-graduada em Nutrição Esportiva pela Universidade do Sul de Santa Catarina (UNISUL), Lauro Muller, SC, Brasil.
2. Nutricionista graduado pela Universidade do Sul de Santa Catarina, especialização em Nutrição Esportiva pela Universidade Gama Filho,
Mestre em Ciências da Saúde da Universidade do Sul de Santa Catarina, docente nos cursos de Nutrição, Educação Física e Medicina e co-
ordenador da Especialização em Nutrição Esportiva, da Universidade do Sul de Santa Catarina (UNISUL), Tubarão, SC, Brasil.

BRASPEN J 2018; 33 (3): 227-37


227
Heidemann S & Cargnin-Carvalho A

INTRODUÇÃO Os vegetais são entregues ou comercializados in natura,


A Unidade de Alimentação e Nutrição (UAN) é carac- sem passarem pelo processo de lavagem e sanitização prévia,
podendo apresentar resíduos de produtos químicos na sua
terizada por realizar atividades técnico-administrativas
superfície. A higienização deve ser feita em local apropriado,
necessárias ao processo de manipulação, preparo, arma-
com água potável e produtos desinfetantes específicos,
zenamento, distribuição de alimentos e refeições nutricio-
regularizados pela ANVISA, e deve atender às instruções
nalmente completas, assim como atender às exigências
recomendadas pelo fabricante. Além da remoção mecânica
microbiológicas1.
de partes deterioradas e de sujidades sob água corrente
Uma alimentação adequada é de suma importância potável, existe a necessidade da desinfecção por imersão
para o excelente desempenho do organismo, tanto para em solução desinfetante. Quando realizada com solução
as coletividades sadias como as enfermas. Para indivíduos clorada, os vegetais devem permanecer imersos por 15 a
hospitalizados, o tipo de alimento a ser consumido, a apre- 30 minutos, seguidos de enxágue final com água potável11.
sentação e a procedência devem ser levados em conta, visto
Mesmo com um adequado processo de sanitização, não
que há uma maior debilidade dos mesmos2.
é possível saber se os vegetais estão 100% seguros para o
A alimentação hospitalar, como parte dos cuidados ofere- consumo, consequentemente, terão que ser examinados,
cidos aos pacientes, deve integrar qualidades e funções, de selecionados, lavados, cortados, sanitizados e armazenados
forma a prevenir, melhorar e/ou recuperar a saúde da popu- pelo próprio consumidor. Dessa maneira, acabam por difi-
lação que atende. Dessa maneira, uma Unidade de Alimen- cultar sua utilização em um cardápio padronizado, sendo
tação e Nutrição (UAN) hospitalar visa fornecer alimentos esse um dos principais aspectos envolvidos na gestão de
que supram as necessidades nutricionais de seus pacientes, qualidade12.
mas que, concomitantemente, apresentem características
O setor de alimentação coletiva enfrenta periodicamente
higiênico-sanitárias, sensoriais e simbólicas adequadas a
mudanças decorrentes do crescimento da concorrência
essa população3,4.
e competitividade entre as empresas. Com isso, torna-se
Para que a atenção nutricional seja completa e de quali- imprescindível a criação de um diferencial competitivo, por
dade, realizar um planejamento e um controle adequado de meio de melhorias da qualidade, dos produtos e serviços
todas as etapas executadas na unidade é de suma impor- oferecidos5.
tância, visto que possibilita maior padronização e garantia
Tais mudanças trazem consigo inovações tecnológicas
na qualidade dos processos realizados5.
referentes aos equipamentos, produtos alimentícios e
Dentre a gama de alimentos disponíveis e utilizados nas processos produtivos. Relacionando aos alimentícios, é
UANs, estão inseridos os vegetais, que apresentam em sua possível observar a inserção de vegetais minimamente
composição vitaminas, minerais e fibras, sendo fundamentais processados, ou seja, que já sofreram alterações em sua
na manutenção de uma alimentação equilibrada. De acordo estrutura física, dentre as quais podem-se citar o descas-
com a Organização Mundial da Saúde, deve-se ingerir uma camento, os cortes específicos e as embalagens. Dessa
quantidade diária de 400 g de vegetais6,7. maneira, os mantêm frescos, com qualidade nutricional e
Apesar das recomendações, a maioria da população total aproveitamento2.
não consome quantidades adequadas de vegetais. No Um fator relevante nesse tipo de subproduto está rela-
Brasil, segundo dados da Pesquisa de Orçamento Familiar8, cionado ao seu custo final, pois se percebe um desequilí-
a população consome apenas ¼ do recomendado. Uma brio nos preços dos produtos minimamente processados se
alimentação rica em tais alimentos deve ser recomendada, comparados aos in natura. É possível observar, ao longo do
visto que apresentam baixo valor calórico, são ricos em fibras, tempo, uma redução neste comparativo de preço, porém,
aumentando a saciedade, protegem contra danos oxidativos, não o bastante para atrair os consumidores que acreditam
além de conter substâncias anti-inflamatórias. Deste modo, nestes produtos. O diferencial de preço parece ser maior
o consumo de vegetais está diretamente ligado à prevenção do que o mercado está disposto a pagar, situação que, no
de doenças crônicas não transmissíveis9. entanto, não impede que o mercado tenha crescimento, mas
A inclusão dos vegetais nos cardápios implica um torna o processo de expansão mais lento13.
planejamento físico-funcional envolvendo desde o processo De acordo com Moretti & Machado14, no Brasil, o início
de recepção, armazenamento, até o pré-preparo. Paralela- da atividade de processamento mínimo de frutas e hortaliças
mente, segue com o acréscimo da gestão de suprimentos e ocorreu no final da década de 70, com a chegada das redes
recursos humanos, visto que esse tipo de alimento apresenta de fast-food, principalmente nos estados do Sudeste do
características distintas quanto à perecibilidade, densidade Brasil. Segundo Sato et al.15, essa técnica ainda é recente,
e complexidade de pré-preparo10. embora se apresente como um setor de mercado em fase de
BRASPEN J 2018; 33 (3): 227-37
228
Avaliação do custo-benefício entre vegetais minimamente processados e in natura

crescimento, consolidação e esteja voltado para um perfil de A utilização da máscara, no entanto, não é obrigatória
consumidor com poder aquisitivo mais elevado. para todos os procedimentos relacionados aos alimentos,
Esses alimentos podem ser considerados como minima- mas acrescenta maior segurança e diminuição dos riscos de
mente processados, e o processo inicial pode diminuir a contaminação. Quando utilizada, deve ser mantida corre-
manipulação do colaborador, diminuindo, assim, possíveis tamente posicionada sobre a boca e o nariz. As máscaras
riscos de contaminação16. devem ser trocadas frequentemente durante a jornada de
trabalho e descartadas imediatamente após o uso23.
Algumas falhas no serviço de alimentação podem resultar
em doenças transmitidas por alimentos, dentre as quais O processamento prévio dos vegetais está relacionado
podemos citar: a preparação do alimento precocemente, a uma diminuição do tempo de manipulação do alimento
as condições de tempo e temperaturas desapropriadas; a na Unidade de Alimentação e Nutrição. Como os vegetais
cocção inadequada ou insuficiente para inativar os micro- devem ser consumidos no mesmo dia em que são produzidos,
organismos patogênicos; o contato excessivo com as super- observa-se uma grande pressão temporal das atividades,
fícies de equipamentos, utensílios e objetos contaminados; principalmente nos horários que antecedem à distribuição,
a contaminação cruzada; ou os manipuladores infectados visto que o volume de produção é em larga escala24.
por micro-organismos17. Para quantificar a perda de alimentos in natura decor-
A manipulação é um processo que, muitas vezes, pode rente das etapas de produção, utiliza-se o Fator de Correção
levar à contaminação, sendo o manipulador o principal (FC), que é um indicador de desperdício. Esse é definido
responsável, decorrente da falta de orientação e capacitação. como a relação entre o Peso Bruto (PB) do vegetal como foi
O manipulador pode desconhecer os riscos originados da adquirido e o Peso Líquido (PL) do vegetal depois de limpo
manipulação inadequada, devido ao fato que, nem sempre, e preparado para utilização. O FC é capaz de determinar
apresenta conhecimento sobre os cuidados na preparação, a quantidade exata de alimento que será descartada e que
armazenamento, manipulação, exposição ao consumo e deve ser empregado no planejamento quantitativo de um
hábitos higiênicos18. cardápio e, consequentemente, no seu valor nutricional25,26.
A produção de refeições é considerada um processo extre- Ainda, alguns fatores podem estar relacionados ao valor
mamente dependente da utilização intensiva de mão de obra, do FC dos vegetais, como a capacitação do manipulador,
sendo esta uma grande problemática do setor. O nível de conhe- utensílios e dos equipamentos utilizados no processamento,
cimento dos indivíduos que atuam nesta área muitas vezes pode tipo de apresentação e corte do produto, qualidade, grau
ser baixo, o que pode acarretar altos índices de rotatividade e de amadurecimento e sazonalidade27.
absenteísmo. Com baixa escolaridade e, muitas vezes, com No gerenciamento de uma UAN, o controle de desper-
baixos salários, os resultados operacionais sofrem implicações dício é um fator de grande relevância, pois se trata de uma
graves, do ponto de vista orçamentário e de qualidade19. questão não somente ética, mas também econômica. Além de
Segundo a Resolução RDC nº 216, de 15 de setembro ocorrer a otimização do uso de matéria-prima e insumos, dos
de 200420, os manipuladores devem adotar procedimentos processos produtivos e das práticas operacionais, também
que minimizem o risco de contaminação dos alimentos se reduzem os custos de produção com menos perdas28.
preparados por meio da antissepsia das mãos e pelo uso de Para Amaral29, o desperdício é sinônimo de falta de quali-
utensílios ou luvas descartáveis, bem como o uso de máscaras dade, assim um planejamento adequado é de fundamental
para proteção do rosto. importância para que não existam produções excessivas e
Durante o processo de manipulação dos vegetais, os consequentes sobras. A quantidade de desperdício pode
colaboradores ficam expostos a diversos riscos físicos, decor- variar entre as UANs e diversos fatores podem estar dire-
rentes do uso de materiais cortantes, bem como o contato tamente relacionados, logo, deve ser evitado em todas as
com equipamentos elétricos utilizados no pré-preparo. Além etapas do processo de produção, em acordo com as boas
disso, devido à frequência dos movimentos repetitivos, podem práticas de fabricação. O desperdício envolve desde os
sofrer ao longo dos anos os riscos da ergonomia local21,22. alimentos que ainda não foram utilizados, até as preparações
As luvas descartáveis utilizadas durante a manipulação prontas que sobram nos pratos, ou ainda aquelas que nem
dos vegetais com o objetivo de prevenção de contaminação chegaram a ser servidas30.
devem ser descartadas sempre que houver interrupção do Os resíduos originários do desperdício de alimentos, na
procedimento, ou quando produtos e superfícies não higieni- maior parte das vezes, possuem um valor potencial. Deste
zadas forem tocados com as mesmas luvas, para se evitar a modo, ao se pensar em desperdício e geração de resíduos,
contaminação cruzada. As mesmas não podem ser utilizadas existe a correlação das consequências imediatas que podem
em procedimentos que envolvam calor e para o uso de equi- ser desencadeadas, podendo citar o desfavorecimento nos
pamentos cortantes que acarretem riscos de acidentes11,23. âmbitos econômico, social, individual e ambiental31.
BRASPEN J 2018; 33 (3): 227-37
229
Heidemann S & Cargnin-Carvalho A

Um fator diretamente relacionado ao desperdício e que que ocorrem nos processos de higienização, manipulação
precisa ser considerado durante o processo de manipulação e seleção desses alimentos, será possível avaliar a relação
dos alimentos é a geração de resíduos. O Brasil está entre os custo-benefício entre a aquisição de vegetais in natura ou
países que mais desperdiçam alimentos no mundo - cerca de minimamente processados.
35% da produção agrícola é desperdiçada. Estima-se que,
desde a produção até a mesa, 30% a 40% de produtos como
MÉTODO
verduras, folhas e frutas são descartados32.
Moretti & Machado14, em seus estudos sobre o aprovei- A presente pesquisa foi classificada como do tipo obser-
tamento de resíduos do processamento mínimo de frutas e vacional, transversal e quantitativa e foi desenvolvida em
hortaliças, relatam que os resíduos decorrentes desse tipo uma Unidade de Alimentação e Nutrição Hospitalar, do
de produto variam entre 30% a 70% da matéria-prima tipo autogestão, no município de Tubarão, SC. Atualmente,
processada. a unidade hospitalar do presente estudo é referência no
estado de Santa Catarina, com 410 leitos. O mesmo presta
Uma UAN que produz grande quantidade de refeições,
diversos serviços à comunidade local, assim como para
consequentemente, também terá uma geração elevada de
comunidades vizinhas39.
resíduos, e estes devem ter seu destino adequado para evitar
complicações futuras33. As variáveis averiguadas para a realização do trabalho
foram: fator de correção (peso bruto e peso líquido), tempo
Ressalta-se a importância do manejo correto dos resíduos
produzidos, dando preferência aos processos de reciclagem e de higienização e pré-preparo, custos com: mão de obra,
coleta seletiva. Essa prática torna-se uma atitude sustentável, água, luz, equipamentos, descartáveis, sanitizante e resíduos.
por poupar o uso de energia e recursos naturais futuros34. Para determinar o fator de correção de cada vegetal,
Outras estratégias, de acordo com Veiros & Proença , 35 utilizou-se como base, a fórmula criada por Araújo et al.40,
podem ser adotadas para minimizar os resíduos de uma que calcula a relação entre o peso bruto do alimento e peso
UAN, podendo ser citadas: a educação e conscientização; líquido (FC= PB/PL).  Para a sua obtenção, foram retiradas
a elaboração de cardápios sustentáveis: a inclusão de as folhas danificadas, as raízes, cascas e os talos centrais.
alimentos próprios da região ou da época; a seleção de Ou seja, o peso integral foi considerado como PB e após as
fornecedores; o descarte apropriado de todo o lixo; a retiradas, obteve-se o PL.
utilização de produtos reciclados; e o emprego de técnicas As pesagens foram realizadas na balança da cozinha da
adequadas de preparo. UAN, de marca Filizola® modelo MF-60, com capacidade
A utilização de vegetais minimamente processados, em subs- máxima de 60 kg e carga mínima de 250 g, com precisão
tituição aos produtos in natura, é uma alternativa para a redução de 10 g.
tanto de resíduos como do consumo de água e energia36. O tempo total utilizado para higienização e pré-preparo
O uso da água em uma UAN se faz muito importante nos de cada vegetal foi obtido com um cronômetro, portado pela
processos de execução, tanto na produção, que envolve a pesquisadora. O mesmo foi acionado desde o momento em
cocção dos alimentos, como na higienização dos mesmos, que as auxiliares responsáveis pela preparação das saladas
dos utensílios e também do ambiente. Porém, deve-se iniciaram o processo de higienização e pré-preparo até o
realizar um uso consciente dessa água, evitando excessos momento que antecede o porcionamento.
e desperdícios37. O custo mensal da mão de obra foi obtido a partir de
A energia elétrica tem papel importante para o processo dados repassados pela nutricionista responsável do local.
de produção de uma UAN, pois auxilia no aprimoramento A partir disso, calculou-se o valor por hora trabalhada da
do serviço, seja com o uso de equipamentos, ou por fornecer colaboradora (1 hora x custo de mão de obra/total de horas
iluminação adequada ao ambiente. Por isso, a iluminação trabalhadas no mês).
deve ser bem planejada, garantindo adequada higienização Para avaliar o consumo de água em cada processo, foi
do ambiente e das máquinas, inspeção das matérias-primas, cronometrado o tempo estimado para a vazão de 1 litro de
conforto físico dos operadores, assim como evitar distorção água da torneira da pia, localizada na área de manipulação
de cores no ambiente, reduzindo erros e acidentes de de saladas. Após, cronometrou-se o tempo em que a torneira
trabalho38. da pia permanecia aberta durante o processo de higienização
Devido ao número elevado de refeições que utilizam e pré-preparo de cada tipo de vegetal. Dessa maneira, foi
vegetais no seu preparo, a importância para a saúde humana possível calcular quantos litros de água tinham sido utilizados
e ainda por se tratar de uma unidade hospitalar, faz-se neces- durante o período cronometrado de pré-preparo. Posterior-
sária a realização do presente estudo. Dessa forma, por meio mente, calculou-se o custo água a partir do valor de 1 m³
de variáveis pré-estabelecidas, que irão estimar as perdas (litros obtidos x valor m³/1.000 litros).
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Avaliação do custo-benefício entre vegetais minimamente processados e in natura

As estimativas do consumo da luz foram realizadas a luz, equipamentos, custo de mão de obra, descartáveis,
partir do tempo utilizado para realização das atividades sanitizante, valor do vegetal in natura e processado.
de higienização e pré-preparo, na qual necessitavam de A coleta ocorreu entre os dias 15 e 28 de outubro de
uma lâmpada incandescente ligada. Esse equipamento 2015, no período matutino, na área de manipulação de
é essencial ao processo, pois a manipulação de saladas saladas de uma Unidade de Alimentação e Nutrição hospi-
necessita de cuidados elevados referentes a possíveis talar. Os dados foram coletados pela responsável por esta
corpos estranhos provindos da produção agrícola. Por pesquisa, que estava devidamente capacitada e familiarizada
conseguinte, foi calculado o consumo em Watts (W) para tal atividade.
em determinado período, e multiplicou-se pelo valor O roteiro realizado para a coleta dos dados da pesquisa
correspondente a 1 kW/h (tempo do equipamento x custo está representado no Quadro 1.
kW/h/60 minutos).
Os dados da pesquisa foram obtidos e armazenados por
Em relação ao consumo elétrico dos equipamentos, meio do programa Microsoft Office Excel® e expostos através
cronometrou-se o tempo em que o aparelho ficou ligado do Microsoft Office Word®.
para o processamento do vegetal. Posteriormente,
calculou-se o gasto em Watts (W) no determinado
período, e multiplicou-se pelo valor correspondente a 1
kW/h (tempo do equipamento x custo kW/h/60 minutos). Quadro 1 – Roteiro de coleta de dados. Tubarão, 2015.

Para o custo com o sanitizante, foi calculada a 1º Verificação dos tipos de vegetais in natura utilizados na preparação
quantidade utilizada para cada tipo de vegetal. Assim, das saladas;
obteve-se o valor final utilizado seguindo orientações do 2º Quantificação do peso bruto de cada vegetal, ou seja, sem retirada
fabricante, no qual indicava uma quantidade de 66 g do de qualquer parte do mesmo;
produto para cada 10.000 mL de água. Dessa forma, 3º Quantificação do peso líquido de cada vegetal, ou seja, desprezan-
calculou-se quanto custaria a porção indicada (66g x do partes não comestíveis ou inadequadas ao consumo;
valor do produto/2.000 g). 4º Cálculo do custo com sanitizante para cada vegetal;

Com relação ao custo com descartáveis, foi observado 5º Obtenção do tempo utilizado desde a higienização até o pré-
preparo;
que, para cada tipo de vegetal, a manipuladora utilizava
um par de luvas e uma máscara. Portanto, calculou-se o 6º Obtenção da quantidade de água utilizada, a partir do tempo para
cada vegetal;
custo de cada descartável a partir do custo total de uma
caixa de cada descartável (luvas: 2 unidades x valor da 7º Verificação do tempo de uso de equipamentos;
caixa fechada/100 unidades; máscara: 1 unidade x valor 8º Observação dos descartáveis utilizados;
da caixa fechada/50 unidades). 9º Cálculo do fator de correção;
Os resíduos gerados durante todos os processos 10º Obtenção dos preços dos vegetais in natura e minimamente
observados foram obtidos a partir do descarte de partes processados;
não comestíveis ou impróprias para o consumo dos vege- 11º Determinação dos valores reais finais das hortaliças in natura,
tais. Quantificou-se o total descartado com a diferença ­considerando as perdas, despesas com mão de obra, água, luz,
­equipamentos e resíduos.
entre a pesagem bruta do vegetal e a pesagem líquida.
Fonte: Elaborado pela autora, 2015.
Após isso, multiplicou-se o valor descartado pelo peso
pago pela unidade por cada 1 quilograma de resíduo
(quantidade de resíduo x valor de 1 kg).
Em relação à coleta de dados, os responsáveis foram RESULTADOS E DISCUSSÃO
previamente informados sobre a justificativa, os objetivos
No presente estudo, foram coletados dados de 12 tipos de
do estudo e todas as dúvidas acerca da pesquisa foram
vegetais in natura, entre os dias 15 e 30 de outubro de 2015,
devidamente esclarecidos. Também foram esclarecidos
em uma Unidade de Alimentação e Nutrição hospitalar, do
que as informações obtidas seriam confidenciais, e que
numa futura publicação, seria mantida a privacidade da município de Tubarão, SC.
Unidade de Alimentação e Nutrição participante. A primeira variável analisada no estudo foi o fator de
Visando à uniformidade dos dados, foi desenvol- correção, que serve como parâmetro para quantificação
vido um formulário padrão para a coleta de dados. O das perdas ou adequações no momento de compra de
mesmo apresenta questões relacionadas às informações, mercadoria. Assim, um controle do fator de correção está
como: tipo do vegetal, peso bruto, peso líquido, tempo relacionado ao controle de perdas de vegetais, com conse-
de higienização até o pré-preparo, de água corrente, quente diminuição de custos para a unidade24.
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Heidemann S & Cargnin-Carvalho A

Dados referentes ao fator de correção também podem ser Segundo Schneider 43, a qualidade da matéria-prima no
encontrados na literatura, servindo como um comparativo da ato da compra e recebimento é fundamental, visto que o
qualidade da matéria-prima ou do pré-preparo para cada estado de maturação, as condições de acondicionamento e
tipo de vegetal. Dessa forma, torna-se viável compreender transporte no qual o produto é submetido podem interferir
se as técnicas utilizadas durante a manipulação estão sendo no resultado final do alimento.
realizadas de maneira correta, ou então, dentro de um Quando relacionados aos hospitais, verifica-se grande
patamar pré-estabelecido. preocupação na qualidade dos produtos ofertados pelos
Na Tabela 1, estão dispostos os valores referentes ao fornecedores que, frequentemente, descumprem regras e
peso bruto, peso líquido, FC, total de perdas e referências requisitos considerados indispensáveis para o setor hospitalar,
literárias, para possíveis comparações. entre as quais está o controle na utilização de agrotóxicos, as
Analisando a Tabela 1, observa-se uma variação entre os condições higiênico-sanitárias, a procedência e as condições
resultados de FC, no qual a perda mínima ocorreu durante a de transporte6.
manipulação do agrião com 2,71% e 1,03% de FC. Em contra- Ao correlacionar o maior fator de correção entre os vege-
partida, a perda máxima ocorreu com a couve-flor, visto que tais selecionados, Degiovanni et al.6 encontraram resultados
36,73% do peso bruto são perdidos durante os procedimentos semelhantes. Em sua análise, acompanhou o pré-preparo de
realizados, totalizando um FC de 1,58%. sete hortaliças in natura utilizadas nas principais refeições de
Esses valores são justificados, visto que durante o uma UAN hospitalar no município de Ribeirão Preto (SP). Os
processo de manipulação observou-se excessiva retirada autores verificaram que o fator de correção da couve flor
de cascas e partes não comestíveis que pode proporcionar (2,38%) foi superior aos demais vegetais analisados. No
uma cadeia de custos, riscos em potencial físico e mecânico. presente estudo, esse vegetal também apresentou superiori-
Estas perdas influenciaram na quantidade total produzida, dade, porém seu FC foi de 1,58%.
causando aumento nos custos da UAN para cada tipo de Ricarte et al.44 realizaram um estudo com 17 tipos de
vegetal. frutas e verduras em um restaurante universitário, na cidade
É importante destacar a influência do manipulador, pois de Fortaleza, e encontraram resultados divergentes com os
na fase de pré-preparo podem ser retiradas as partes que dados obtidos. No estudo realizado pelos autores, a alface,
habitualmente são consumidas, mas que, dependendo da o repolho, o pimentão, a cenoura e a beterraba obtiveram
preparação ou do estado físico do vegetal, não são utili- valores superiores de FC. Por outro lado, a cebola, o pepino
zadas. É necessário que treinamentos sejam realizados na e o tomate ficaram abaixo.
UAN, visando ao reaproveitamento das perdas de maneira a Quando comparado com as recomendações de
minimizar os custos, assim como estar atento ao recebimento Ornelas26, o valor encontrado do FC da acelga, alface e
das mercadorias42. cebola estão dentro do adequado. Já a cenoura, verificada

Tabela 1 – Peso bruto, peso líquido, fator de correção e perdas, comparadas à literatura, dos diferentes vegetais analisados em uma Unidade de ­Alimentação
e Nutrição hospitalar. Tubarão, 2015
Vegetal PB (g) PL (g) FC (%) Perdas (%) Ornelas (2007)26 Luna (1996)41
Acelga 1000 642,9 1,56 35,71 1,54 – 1,66 NR
Agrião 1000 972,9 1,03 2,71 1,78 NR
Alface 1000 861,4 1,16 13,86 1,09 – 1,33 1,31 - 1,48
Beterraba ralada 1000 751,8 1,33 24,82 1,61 – 1,88 1,38 - 1,59
Brócolis 1000 888,2 1,13 11,18 NR NR
Cebola 1000 842,5 1,19 15,75 1,03 – 2,44 1,19 - 1,41
Cenoura ralada 1000 770,1 1,30 22,99 1,17 1,22 - 1,41
Couve-flor 1000 632,7 1,58 36,73 2,22 - 2,46 NR
Pepino 1000 845 1,18 15,50 1,42 NR
Pimentão 1000 852,3 1,17 14,77 1,26 1,25 - 1,33
Repolho 1000 786 1,27 21,40 1,72 1,29
Tomate 1000 821,8 1,22 17,82 1,25 1,23 - 1,26
Fonte: Elaborado pela autora, 2015.
PB=Peso Bruto; PL=Peso Líquido; FC=Fator de Correção; NR=Não Relacionado

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Avaliação do custo-benefício entre vegetais minimamente processados e in natura

no presente estudo, apresentou valores superiores. Em período intermediário, no qual ocorre uma variação de
contrapartida, o agrião, a couve-flor, a beterraba, o pepino, preços devido à maior procura, porém os preços perma-
o pimentão, o repolho e o tomate apresentaram valores necem mais equilibrados. Apenas o pepino não estava na
inferiores, tornando-se positivos, visto que quanto menor o época de colheita, na qual há uma tendência de custos
FC menores serão as perdas de cada vegetal. elevados de compra. Percebeu-se, com isso, que a sazo-
Comparando o FC do presente estudo com o de Luna nalidade pode não ter prejudicado os fatores de correção
& Teixeira41, verificam-se divergências referentes aos valores encontrados.
da alface, beterraba, pimentão, repolho e tomate, visto que Além dos fatores que antecedem à chegada do vegetal
esses estão superiores aos de Tubarão, 2015. Os demais, na unidade, outros que ocorrem desde a higienização até o
cenoura e cebola, encontram-se entre os valores mínimos e pré-preparo devem ser avaliados. Isso ocorre porque o tipo
máximos da literatura. de procedimento realizado para o preparo pode onerar mais
De acordo com Paula et al.45, fatores externos, como a custos de produção à unidade.
qualidade do alimento que chega à unidade, dependem Para avaliar o custo real de determinado vegetal pronto
de boas práticas de produção e de transporte, tornando-se para o consumo deve ser levada em conta uma diversidade
difíceis de serem controlados. O cuidado na seleção de de gastos, tais como: energia, água, equipamentos utilizados,
fornecedores é essencial para o sucesso da unidade, de mão de obra, descartáveis, sanitizantes, resíduos e a perda
acordo com Schneider43, no setor de hortifrutigranjeiros, há decorrente de partes não alimentícias.
o predomínio da informalidade, baixo padrão de qualidade Para tanto, na Tabela 2, encontram-se valores referentes
e, consequentemente, baixa exigência fiscal e sanitária. ao custo de 1 quilo do produto in natura adicionados ao FC,
A sazonalidade de cada vegetal também exerce grande assim como custos de água, luz, equipamento, descartáveis,
influência sobre o preço final do produto. A maioria dos vegetais sanitizantes e resíduos.
apresenta, ao longo do ano, flutuação nos preços pagos. Muitas A partir do conhecimento de todo processo e incidência
vezes, tal situação pode se tornar ainda mais acentuada, devido de valores para cada serviço, sejam eles diretos ou indiretos,
a variações na oferta e na demanda ao longo das estações do foi possível avaliar o custo de cada etapa de produção dos
ano, associadas a uma climatologia desregulada46. vegetais dentro de uma UAN.
Os vegetais avaliados estavam, em sua maioria, em Analisando a Tabela 2, verifica-se que a acelga, a alface
época de safra segundo dados da CEAGESP47, apresen- e o brócolis apresentam os valores mais elevados, quanto
tando preços acessíveis e justificados de apresentar maior ao custo da água durante processamento. O elevado
qualidade. O pimentão e a acelga estavam dentro de um consumo de água deve-se, principalmente, ao processo de

Tabela 2 – Estimativa de custos com água, luz, equipamentos, mão de obra, resíduos, descartáveis, sanitizante e fator de correção, Tubarão. 2015.
Vegetal Preço bruto Água Luz Equipamento Mão de obra Descartáveis Sanitizante Resíduo Total
+ FC (R$) (R$) (R$) (R$) (R$) (R$) (R$) (R$)
Acelga 3,94 0,19 0,16 NA 2,43 0,35 1,47 0,09 5,72
Agrião 1,03 0,09 0,04 NA 0,92 0,35 1,30 0,01 3,19
Alface 6,64 0,21 0,06 NA 1,31 0,35 0,87 0,04 3,65
Beterraba 2,87 NA 0,04 0,08 0,79 0,35 1,44 0,06 3,36
ralada
Brócolis 12,23 0,22 0,05 NA 1,17 0,35 1,44 0,03 4,49
Cebola 4,86 0,08 0,12 NA 2,52 0,35 1,44 0,04 5,21
Cenoura 3,07 NA 0,05 0,16 0,86 0,35 1,44 0,06 3,53
ralada
Couve-flor 3,90 0,06 0,02 NA 0,33 0,35 1,44 0,10 3,34
Pepino 2,31 NA 0,05 NA 0,98 0,35 1,44 0,04 3,17
Pimentão 4,02 0,10 0,14 NA 2,78 0,35 1,44 0,04 5,36
Repolho 0,85 0,02 0,04 0,18 0,78 0,35 1,44 0,06 3,07
Tomate 3,53 0,03 0,02 NA 0,32 0,35 1,44 0,05 2,74
Fonte: Dados da pesquisa, 2015.
FC=Fator de correção; NA=Não se Aplica

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Heidemann S & Cargnin-Carvalho A

higienização realizado nos vegetais in natura. Relacionado processo de higienização. De acordo com Gomes et al.51, a
ao pré-preparo do brócolis, pode-se observar um descuido lavagem eficiente, associada à sanitização, é o único trata-
do manipulador, que, no momento da coleta de dados, mento eficaz na redução dos microrganismos existentes em
permanecia com a torneira aberta, tanto na higienização vegetais minimamente processados.
quanto na separação dos ramos, aumentando a quantidade Outro ponto a ser analisado na UAN está relacionado
de água utilizada. aos custos decorrentes da geração de resíduos, que está
O uso racional da água deve ser implementado na diretamente correlacionado ao fator de correção. Quanto
unidade e levado em consideração, pois, além de estar maior o FC, maior será a geração de resíduos e, consequen-
relacionado ao aumento de custos para a unidade, auxilia temente, o custo final do produto. Ainda conforme a Tabela
na preservação de bens de serviços ambientais. 2, verifica-se que a couve-flor e a acelga apresentaram
Em relação ao equipamento de iluminação, verificou-se os maiores custos agregados à geração de resíduos, já o
que o pimentão, a acelga e a cebola tiveram os maiores agrião, com pouca perda durante a produção, teve o valor
custos. Isso se deve ao maior tempo de pré-preparo, conse- mais baixo encontrado.
quentemente, com um maior período de acendimento. A Além do lado financeiro relacionado aos maiores custos
iluminação exerce uma forte influência no comportamento de produção, um controle integrado na geração de resíduos
das pessoas, sua utilização adequada aumenta a eficiência está diretamente ligado à sustentabilidade da unidade. A
do trabalho e diminui os riscos de acidentes3. gestão adequada dos resíduos tem como objetivo diminuir os
Relacionando o custo com equipamentos que perma- impactos socioambientais causados pela geração, transporte,
necem ligados e que são necessários para realizar o destinação e disposição final dos mesmos52.
processamento de alguns vegetais, como picar ou ralar, Agregando-se, portanto, os valores de cada variável,
observou-se um acréscimo no custo final de R$ 0,08, R$ pode-se confrontar os custos finais dos vegetais in natura
0,16, R$ 0,18 na beterraba ralada, cenoura ralada e no com os minimamente processados. Essa relação está sendo
repolho, respectivamente. demonstrada na Tabela 3.
Além do custo com a energia elétrica gasta pelo equi- Conforme a relação custo benefício explícita na Tabela
pamento, deve ser levado em consideração o fato de o 3, observa-se que mesmo com as variáveis que implicam na
equipamento passar por manutenção periódica para manter adição de custos dos vegetais in natura, a metade (50%) apre-
um bom estado funcional. Segundo Souza48, a manutenção sentou valores inferiores. Apenas a acelga, o agrião, o brócolis,
tem como objetivo suavizar as falhas dos equipamentos e as a cebola, a cenoura e o pimentão apresentariam maior viabi-
possíveis consequências para a produção. Em contrapartida, lidade caso fossem adquiridos na forma processada.
pode onerar custos adicionais frequentes à unidade.
O custo com a mão de obra referente ao manipulador
das saladas foi avaliado de acordo com o tempo utilizado Tabela 3 – Relação custo benefício entre vegetais in natura e minimamente
na produção de cada vegetal in natura. Dessa maneira, a processados. Tubarão, 2015.
acelga, a cebola e o pimentão oneraram maiores custos Vegetal In natura Adicionais Custo final Processado Relação
em relação a essa variável para a unidade de alimentação (R$) (R$) (R$) (R$) (R$)
e nutrição hospitalar. Acelga 2,90 5,72 8,62 5,9 -2,72
Além dos custos com a mão de obra em si, evidencia- Agrião 17,50 3,19 20,69 18,9 -1,79
se que os manipuladores de alimentos exercem um papel Alface 5,83 3,65 9,48 14,9 5,42
muito importante durante a preparação desses produtos. Ao
Beterraba 2,30 3,36 5,66 6,5 0,84
ponto que a maioria das doenças veiculadas por alimentos ralada
ocorre principalmente pela manipulação inadequada dos
Brócolis 11,00 4,49 15,49 12,9 -2,59
colaboradores49. Segundo Rego et al.50, devem dar-se aos
Cebola 4,20 5,21 9,41 7,9 -1,51
manipuladores conhecimentos teórico-práticos necessários
para capacitá-los e levá-los ao desenvolvimento de habili- Cenoura 2,50 3,53 6,03 5,9 -0,13
ralada
dades e de atividades específicas na área de alimentos.
Couve-flor 2,85 3,34 6,19 12,9 6,71
Quando observados os custos com descartáveis, verificou-
se que todos os tipos de vegetais apresentam o mesmo valor Pepino 2,00 3,17 5,17 5,4 0,23
acrescido. Isso deve-se ao fato da utilização de um descartável, Pimentão 3,50 5,36 8,86 7,9 -0,96
tanto a máscara quanto a luva, para cada vegetal diferente. Repolho 0,70 3,07 4,67 6,2 1,53
Em relação aos custos com sanitizantes, verifica-se que Tomate 3,00 2,74 5,74 7,5 1,76
essa variável torna-se indispensável quando relacionada ao Fonte: Dados da pesquisa, 2015.

BRASPEN J 2018; 33 (3): 227-37


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Avaliação do custo-benefício entre vegetais minimamente processados e in natura

Entretanto, alguns pontos devem ser levados em conta Quando observados e comparados os custos finais de
nessa relação custo-benefício. Ressalta-se que, por se cada vegetal in natura e minimamente processados, verifica-
tratar de uma UAN hospitalar, todos os possíveis riscos se que, do total, metade da produção das saladas seria
de contaminação devem estar ainda mais em ênfase e viabilizada pela substituição dos produtos processados. Este
serem eliminados. Sendo assim, com a aquisição dos índice pode estar associado às diversas variáveis analisadas
vegetais processados haverá um menor contato do que contribuem para que o valor do produto in natura tenha
manipulador, com consequente diminuição dos riscos adicional de custos finais.
de contaminação. Visando melhorias e estratégias para diminuir riscos de
Relacionado ainda ao manipulador, verifica-se que os contaminação, gastos com colaboradores e se tratando de
maiores adicionais de custos dos vegetais in natura estão uma Unidade de Alimentação e Nutrição com uma grande
ligados à mão de obra. Na estimativa de custos das variáveis, demanda de refeições, sugere-se a viabilidade na aquisição
foi verificado apenas o tempo utilizado para a higienização de vegetais minimamente processados dos 50% que apre-
e pré-preparo de cada vegetal, devendo salientar que o sentaram custos inferiores. Para o restante, seria interessante
custo com a mão de obra será fixo a cada mês, indepen- uma análise criteriosa para a sua compra.
dentemente da produtividade ou de horas trabalhadas em Os dados referentes ao presente estudo serão repas-
cada preparação. sados a coordenação de nutrição da Unidade de Alimen-
Para tanto, com a viabilização de compras dos vegetais tação e Nutrição hospitalar, para que a mesma analise a
minimamente processados, a unidade seria beneficiada com disponibilidade da implementação de compra de vegetais
a diminuição de mão de obra, ou então realizando um rema- minimamente processados. Essa atitude de troca de matéria-
nejamento de umas das colaboradoras para outro setor. Com prima, além de beneficiar a unidade, beneficiará o meio
isso, a unidade reduziria gastos com novas contratações, ambiente, visto que a diminuição de desperdício está dire-
diminuindo custos finais associadas à produção. tamente ligada à sustentabilidade, que ganha cada vez mais
em ênfase na sociedade.
Ainda com a viabilidade da aquisição de vegetais
minimamente processados, diversos custos relacionados
a aspectos ambientais seriam diminuídos. De acordo com REFERÊNCIAS
Corrêa & Lange53, a maior preocupação na produção de 1. Wendisch C. Avaliação da qualidade de unidades de alimen-
refeições em escala industrial centra-se em medidas para tação e nutrição (UAN) hospitalares: construção de um instru-
evitar o desperdício do alimento depois de pronto. Porém, é mento. Rio de Janeiro; 2010. [acesso 2015 Out 15]. Dispo-
nível em: http://bvssp.icict.fiocruz.br/lildbi/docsonline/get.
necessário considerar as etapas de pré-preparo e preparo e php?id=2322
todas as incidências que ocorrem sobre elas. 2. Proença RPC, Sousa AA, Veiros MB, Hering B. A atenção
alimentar e nutricional na produção de refeições. In: Proença
RPC, Sousa AA, Veiros MB, Hering B, eds. Qualidade nutri-
CONCLUSÃO cional e sensorial na produção de refeições: série nutrição.
Florianópolis: UFSC; 2005. p. 29-54.
O presente estudo avaliou a relação custo beneficio de 12 3. Teixeira SMFG, Oliveira ZMC, Rego JC, Biscontini TMB.
diferentes vegetais servidos em uma Unidade de Alimentação Administração aplicada às unidades de alimentação e nutrição.
São Paulo: Atheneu; 2000.
e Nutrição hospitalar. Visando diminuição de gastos com a 4. Sousa AA, Proença RPC. Tecnologias de gestão dos cuidados
produção foram verificadas diversas variáveis relacionadas nutricionais: recomendações para qualificação do atendimento
ao aumento do custo final do produto, dentre os quais nas unidades de alimentação e nutrição hospitalares. Rev Nutr.
2004;17(4):425-36.
estavam o fator de correção. 5 Akutsu RC, Botelho RA, Camargo EB, Sávio KEO, Araújo
Verificou-se que a maioria dos FC encontrados está dentro WC. Adequação das boas práticas de fabricação em serviços de
alimentação. Rev Nutr. 2005;18(3):419-27.
das metas pré-estabelecidas pela literatura, sendo que o 6. Degiovanni GC, Japur CC, Sanches APLM, Mattos CHPS,
vegetal que tem a menor perda é o agrião (2,71%) e FC de Martins LS, Reis CV, et al. Hortaliças in natura ou minimamente
1,03%. Em contrapartida, a perda máxima ocorreu com a processadas em unidades de alimentação e nutrição: quais
aspectos devem ser considerados na sua aquisição? Rev Nutr.
couve-flor (36,73%), totalizando um FC de 1,58%. 2010;23(5):813-22.
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Local de realização do estudo: Universidade do Sul de Santa Catarina (UNISUL), Tubarão, SC, Brasil.

Conflito de interesse: Os autores declaram não haver.

BRASPEN J 2018; 33 (3): 227-37


237
A Artigo Original
Locateli G et al.

Fontes dietéticas de antioxidantes consumidas


pela população brasileira: Inquérito Nacional de
Alimentação 2008-2009
Dietary sources of antioxidants consumed by the Brazilian population: National Survey of Food
2008-2009

RESUMO
Gelvani Locateli1
Camila Tureck2 Introdução: Este trabalho teve como objetivo identificar os alimentos consumidos pela população
Vanesa Gesser Correa3 brasileira que apresentam maiores teores de antioxidantes. Método: Foram utilizados os dados do
Eloá Angélica Koehnlein4 Inquérito Nacional de Alimentação da Pesquisa de Orçamentos Familiares 2008-2009, conside�
rando a forma de consumo habitual dos alimentos e o tamanho da porção. Resultados: O açaí,
achocolatados, milho e preparações, vinho e chocolate foram os alimentos que apresentaram
os maiores teores de antioxidantes na dieta brasileira. Além desses, alguns grupos alimentares
se destacaram por apresentar maiores quantidades de antioxidantes tanto por 100 g quanto por
porção, como as frutas para vitamina C, fenólicos totais e flavonoides; as carnes e ovos para
Unitermos: vitamina E, selênio e zinco; e farinha, massas, biscoitos e panificados para cobre e manganês.
Vitaminas. Minerais. Compostos Fenólicos. Antioxi�
Para vitamina A, destacaram-se as hortaliças, frutas e laticínios. Conclusão: Ressalta-se a neces�
dantes. Dieta.
sidade de aumentar o consumo de oleaginosas, frutas e hortaliças para elevar a ingestão diária
Keywords: de antioxidantes pela população brasileira.
Vitamins. Minerals. Phenolic Compounds. Antioxi�
��������
dants. Diet. ABSTRACT
Introduction: This study aimed to identify the dietary sources of antioxidants consumed by the
Endereço para correspondência: Brazilian population. Methods: We used the data from the National Survey of Food of the Family
Eloá Angélica Koehnlein Budget 2008-2009, whereas the form of habitual consumption of food and the size of their
Rua Edmundo Gaievski, 1000 – Realeza, PR, Brasil – portion. Results: Acai, cocoa power, corn and preparations, wine and chocolate were the foods
CEP 85770-000 – Caixa Postal 253. with the highest levels of antioxidants in the Brazilian diet. In addition to these foods, some food
Email: eloa.koehnlein@uffs.edu.br
groups stood out as sources of antioxidants per 100 g and per portion, as fruits for vitamin C, total
Submissão phenolics and flavonoids; meat and eggs for vitamin E, selenium and zinc; and flour, pasta, biscuits
19 de julho de 2017 and baked products for copper and manganese. For vitamin A, various food groups stood out,
especially vegetables, fruits and dairy products. Conclusion: We emphasize the need to increase
Aceito para publicação food consumption of oilseed, fruits and vegetables to increase the daily intake of antioxidants by
5 de outubro de 2017 the Brazilian population.

1. Graduada em Nutrição pela Universidade Federal da Fronteira Sul, Realeza, PR, Brasil.
2. Residente Multiprofissional em Neurologia pela Universidade da Região de Joinville (UNIVILLE), Joinville, SC, Brasil.
3. Mestre em Ciências de Alimentos. Universidade Estadual de Maringá (UEM). Departamento de Bioquímica, Maringá, PR, Brasil.
4. Doutora em Ciências de Alimentos pela Universidade Estadual de Maringá (UEM). Docente na Universidade Federal da Fronteira Sul, Realeza,
PR, Brasil.

BRASPEN J 2018; 33 (3): 238-47


238
Fontes dietéticas de antioxidantes consumidas pela população brasileira

INTRODUÇÃO em consideração a porção média e a forma habitual de


Os radicais livres são produzidos naturalmente pelo consumo, podendo ser esta crua, cozida, refogada ou
metabolismo humano, mas em excesso podem gerar uma frita. Além disso, para as categorias da POF (2008-2009)
descritas como “preparações à base de” considerou-se o
condição denominada estresse oxidativo. Este resulta do
alimento principal.
desequilíbrio entre a produção de radicais livres e neutrali-
zação destes pela ação de nossas defesas antioxidantes, o Nas preparações levou-se em consideração o ingrediente
que gera a oxidação de biomoléculas, e conduz, consequen- presente em maior quantidade, na proporção utilizada. A
temente, à perda de suas funções e/ou desequilíbrios home- quantificação do teor de vitaminas (A, C e E) e minerais
ostáticos, que podem estar associados à gênese de diversas (cobre, manganês, selênio e zinco) antioxidantes foi feita
doenças1, inclusive as doenças crônicas não transmissíveis, por meio das tabelas de composição de alimentos disponí-
como as doenças cardiovasculares2 e o câncer3. Deve-se a veis10-14, sendo utilizada preferencialmente a Tabela Brasileira
isso a importância do estudo de moléculas antioxidantes, que de Composição de Alimentos10, quando esta dispunha de
podem prevenir ou minimizar as consequências do estresse informações sobre o conteúdo dos antioxidantes. Em cada
oxidativo4. alimento, foram utilizados os dados de pelo menos duas
referências, para cálculo do teor médio.
Os antioxidantes agem inibindo a ação ou produção dos
radicais livres, e, ainda, favorecendo o reparo e reconstituição Para a quantificação do teor de compostos fenólicos e
de estruturas afetadas5. Eles podem ser de ação enzimática ou suas subclasses (flavonoides, ácidos fenólicos e fenólicos
não enzimática, e sua origem pode ser endógena ou dietética. totais) foram selecionados 46 alimentos de origem vegetal
Entre as substâncias antioxidantes dietéticas, destacam-se as que potencialmente apresentariam esses compostos. Para
vitaminas A, C e E, alguns minerais, sendo eles o cobre, o alimentos consumidos na forma cozida, foram utilizados
manganês, o selênio e o zinco; e compostos fenólicos, como fatores de rendimento para conversão dos alimentos crus
os flavonoides e ácidos fenólicos1. para forma habitual de consumo.
Dados sobre o consumo de antioxidantes pela popu- Para a quantificação do teor de compostos fenólicos de
lação brasileira são escassos. Um estudo realizado por cada alimento selecionado, foi utilizada a base de dados
nosso grupo estimou o consumo médio diário de vitaminas Phenol-Explorer, sendo que para os cereais foram utili-
antioxidantes em 309 ug de vitamina A, 93 mg de vitamina zados os dados obtidos por cromatografia líquida de alta
C e 5,3 mg de vitamina E6. Para os minerais antioxidantes, eficiência (HPLC) após hidrólise, e para os cereais que não
o consumo foi de 11,7 mg de zinco, 107,6 ug de selênio, dispunham dos teores por este método foi utilizada a HPLC,
1,35 mg de cobre e 2,9 mg de manganês6. Já o consumo assim como para os demais alimentos14. Para alimentos que
de compostos fenólicos e flavonoides estimado por outro não possuíam seus teores disponíveis na fonte principal de
estudo realizado por nosso grupo foi de 2,31 g e 374,12 pesquisa, foram utilizados artigos científicos escolhidos de
mg, respectivamente7. Também, o consumo de fenólicos acordo com a compatibilidade de espécie e variedade do
totais foi estimado em 460,15 mg/dia, dos quais 314 alimento analisado.
mg/dia seriam de ácidos fenólicos e 138,92 mg/dia de Os teores de vitaminas, minerais e compostos fenólicos
flavonoides8. para cada 100 g/mL de alimentos pesquisados foram
Diante da importância dos antioxidantes para a saúde ordenados de forma decrescente, a fim de descrever os
humana, este trabalho teve como objetivo descrever os alimentos da dieta brasileira com maiores teores desses
alimentos consumidos pela população brasileira no Inquérito compostos. Além disso, realizou-se o cálculo do teor de
Nacional de Alimentação 2008-2009, que apresentam os antioxidantes de acordo com a porção média per capita
maiores teores de antioxidantes, considerando a quantidade consumida e ordenados de forma decrescente para identi-
por 100 g de alimento e porção média consumida. ficar os 10 alimentos consumidos pela população brasileira
em sua dieta habitual que apresentam maiores teores de
antioxidantes.
MÉTODO
Em seguida, estes alimentos foram classificados em
Os alimentos foram selecionados a partir do primeiro grupos, podendo ser cereais; bebidas; frutas; hortaliças;
dia de registro alimentar de 34.003 indivíduos com dez ou farinhas, massas, panificados e biscoitos; oleaginosas;
mais anos de todo o país, e que responderam ao Inquérito óleos e gorduras; leguminosas; doces; raízes e tubérculos;
Nacional de Alimentação da Pesquisa de Orçamentos salgados e sanduíches; molhos e condimentos; carne e ovos;
Familiares 2008-2009 (POF 2008-2009)9. Do total de e, laticínios, com a finalidade de identificar em quais grupos
alimentos relatados, foram selecionados 87, de acordo alimentares estão presentes um maior número de alimentos
com as maiores prevalências de consumo, levando-se ricos em antioxidantes.
BRASPEN J 2018; 33 (3): 238-47
239
Locateli G et al.

RESULTADOS com 6,9 mg, e os queijos os últimos colocados, com 2,32


mg. Para o cobre, o grupo das farinhas, massas, panificados
Alimentos da dieta brasileira com maiores teores e biscoitos, cereais e doces se destacaram com 2 itens cada,
de antioxidantes por 100 g/mL sendo que as vísceras apresentaram o maior teor (2,7 mg)
Para a vitamina C, os grupos das frutas (5 itens) e horta- e o pão integral ficou na última colocação, com 0,12 mg.
liças (2 itens) apresentaram as maiores densidades (mg/100 No que diz respeito ao selênio, o grupo das carnes e
g ou mL), sendo que o alimento com maior teor de vitamina ovos (7 itens) foi o que mais apresentou alimentos com
C foi a couve manteiga, com 108 mg/100 g, e o último foi maiores densidades neste mineral. No entanto, as olea-
a batata-doce, com 20,5 mg/100 g. Os grupos das raízes e ginosas se destacaram com 284,1 μg/100 g, enquanto
tubérculos (2 itens) e farinhas, massas, panificados e biscoitos as carnes bovinas ficaram com a última colocação, com
(2 itens) apresentaram maior número de alimentos densos em 27,7 μg. Para o teor de manganês, o grupo dos cereais
vitamina E, apesar de não integrarem nenhum dos grupos apresentou maior número de itens alimentares densos deste
citados, o milho e preparações ficaram na primeira colocação mineral (3 itens), e no ranking, os cereais matinais ficaram
(12 mg/100 g), enquanto as vísceras ficaram na última colo- em primeiro lugar, com 2,76 mg, e o milho e preparações
cação (1,51 mg/100 g). Para a vitamina A, os grupos das à base deste ficaram na décima colocação, com 0,56 mg,
hortaliças (4 itens) e carnes e ovos (2 itens) destacaram-se e como pode ser verificado na Tabela 2.
as vísceras apresentaram o maior teor de vitamina A (2491,7 Em relação aos fenólicos totais, o grupo das frutas foi
μg/100 g) e a abóbora moranga o menor teor (148,8 μg/100 o que apresentou maior número de itens alimentares com
g), conforme pode ser observado na Tabela 1. maiores densidades desses compostos (4 itens), seguido das
Em relação aos minerais, o grupo das carnes e ovos bebidas (2 itens); o achocolatado se destacou, com 1492
apresentou o maior número de alimentos densos em zinco mg, e na última colocação ficou a salada de frutas, com
(5 itens), sendo as carnes salgadas as primeiras colocadas, 48,9 mg. Para flavonoides, o grupo das frutas também se

Tabela 1 – Teores dos 10 alimentos com maior quantidade de vitaminas antioxidantes por 100g consumidos pela população brasileira: Inquérito Nacional
de Alimentação 2008-2009.
Ranking Vitamina C Vitamina E Vitamina A
Alimentos ou Grupo Teor (mg) Alimentos ou Grupo Teor (mg) Alimentos ou Grupo Teor (μg)
preparações preparações preparações
1 Couve manteiga Hortaliças 108,4 Milho e prepa- Cereais 12,29 Vísceras Carnes e ovos 2491,8
rações (fubá e
pipoca)
2 Mamão formosa Frutas 70,2 Óleos e gorduras Óleos e gorduras 10,92 Batata-doce Raízes e 819,8
tubérculos
3 Laranja-pera Frutas 53,7 Oleaginosas Oleaginosas 6,51 Cenoura Hortaliças 583,0
4 Tangerina poncã Frutas 39,8 Batata-inglesa frita Raízes e 6,31 Leite em pó Laticínios 481,6
tubérculos integral
5 Abacaxi pérola Frutas 35,4 Farofa (farinha Farinha, massas, 6,04 Couve manteiga Hortaliças 290,7
de mandioca) panificados e
biscoitos
6 Salada de Frutas 34,7 Couve-manteiga Hortaliças 5,13 Alface crespa Hortaliças 243,6
frutas (mamão,
banana, laranja,
maçã)
7 Mandioca Raízes e 29,7 Feijão verde/corda Leguminosas 4,69 Óleos e Óleos e 229,2
tubérculos gorduras gorduras
8 Repolho branco Hortaliças 25,5 Batata-doce Raízes e 2,22 Queijos Laticínios 216,1
tubérculos
9 Sucos/refrescos/ Bebidas 22,3 Biscoito recheado Farinha, massas, 1,76 Ovo de galinha Carnes e ovos 180,2
sucos em pó (biscoito recheado panificados e
reconstituídos e waffles) biscoitos
10 Batata-doce Raízes e 20,5 Vísceras Carnes e ovos 1,51 Abóbora mo- Hortaliças 148,8
tubérculos ranga

BRASPEN J 2018; 33 (3): 238-47


240
Fontes dietéticas de antioxidantes consumidas pela população brasileira

Tabela 2 – Teores dos 10 alimentos com maiores quantidades de minerais antioxidantes por 100g consumidos pela população brasileira: Inquérito Nacional
de ­Alimentação 2008-2009.
Ranking Zinco Selênio Cobre Manganês
Alimentos Grupo Teor Alimentos Grupo Teor Alimentos Grupo Teor Teor Alimentos ou Teor
ou (mg) ou (μg) ou (μg) (mg) preparações (mg)
preparações preparações preparações
1 Carnes Carnes e 6,90 Oleaginosas Oleaginosas 284,1 Vísceras Carnes e 2,79 Cereais mati- Cereais 2,76
salgadas ovos ovos nais (aveia)
(carne seca
e charque)
2 Prepara- Carnes e 6,40 Peixes Carnes e 110,0 Oleaginosas Oleaginosas 1,11 Pão integral Farinha, 1,88
ções à base ovos frescos e ovos massas,
de carne prepara- panificados e
bovina ções biscoitos
3 Carne Carnes e 5,95 Peixes em Carnes e 64,4 Achocolata- Doces 0,74 Oleaginosas Oleaginosas 1,88
bovina ovos conservas ovos dos
(atum e
sardinha)
4 Achocolata- Doces 3,91 Peixes Carnes e 59,4 Mamão Frutas 0,69 Abacaxi pérola Frutas 1,64
dos salgados ovos formosa
(bacalhau)
5 Leite em Laticínios 3,53 Pão integral Farinha, 40,3 Chocolates Doces 0,40 Biscoito Farinha, 1,38
pó integral massas, salgado massas,
panificados panificados e
e biscoitos biscoitos
6 Linguiça Carnes e 3,50 Carne suína Carnes e 39,0 Cereais Cereais 0,39 Molhos e Molhos e 1,14
ovos ovos matinais condimentos condimentos
(aveia)
7 Vísceras Carnes e 3,36 Cereais Cereais 34,0 Molhos Molhos 0,34 Couve Hortaliças 0,90
ovos matinais e condi- e condi- manteiga
(aveia) mentos mentos
8 Oleaginosas Oleagi- 3,34 Prepara- Carnes e 33,0 Milho e Cereais 0,27 Achocolatados Doces 0,63
nosas ções à base ovos prepara-
de carne ções (fubá e
bovina pipoca)
9 Cereais Cereais 2,84 Ovo de Carnes e 31,8 Biscoito Farinha, 0,27 Arroz integral Cereais 0,62
matinais galinha ovos recheado massas,
(aveia) (biscoito panificados
recheado e e biscoitos
waffles)
10 Queijos Laticínios 2,32 Carne Carnes e 27,7 Pão integral Farinha, 0,27 Milho e prepa- Cereais 0,56
bovina ovos massas, rações (fubá e
panificados pipoca)
e biscoitos

destacou, com 5 itens, seguido do grupo dos doces (2 itens), Fontes dietéticas brasileiras de antioxidantes por
sendo que o achocolatado, com 1467 mg, ficou no topo porção
do ranking, e a manga ficou com a última colocação, com Para a vitamina C, as frutas (6 itens) e as raízes e tubér-
14,4 mg. Já em relação aos ácidos fenólicos, os grupos das culos (2 itens) foram os grupos com maior número de itens
bebidas, cereais e raízes e tubérculos se destacaram com alimentares com elevados teores dessa vitamina por porção,
maior número de alimentos densos desses compostos, cada sendo que a laranja-pera, com 147 mg, foi o alimento com
grupo com 2 itens, sendo que a farofa ocupou a primeira maior teor por porção e a manga, com 37,97 mg, ficou na
posição do ranking, com 277 mg, e o arroz integral a 20ª 20ª colocação. Em relação à vitamina E, os grupos das raízes
posição, com 12,2 mg (Tabela 3). e tubérculos (2 itens) e carnes e ovos (2 itens) apresentaram
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241
Locateli G et al.

Tabela 3 – Teores dos 10 alimentos com maiores quantidades de compostos fenólicos por 100g consumidos pela população brasileira: Inquérito Nacional
de Alimentação 2008-2009.
Ranking Flavonoides Ácidos Fenólicos Fenólicos totais
Alimentos ou Grupo Teor Alimentos ou Grupo Teor Alimentos ou Grupo Teor
preparações (mg) preparações (mg) preparações (mg)
1 Achocolatados Doces 1466,7 Farofa (farinha Farinha, massas, 277,3 Achocolatados Doces 1492,3
de mandioca) panificados e
biscoitos
2 Chocolates Doces 319,0 Milho e preparações Cereais 200,5 Chocolates Doces 319,0
(fubá e pipoca)
3 Açaí Frutas 317,2 Café Bebidas 87,7 Açaí Frutas 317,2
4 Uva rubi Frutas 149,2 Batata-inglesa Raízes e 28,4 Farofa (farinha Farinha, 277,3
tubérculos de mandioca) massas,
panificados e
biscoitos
5 Maçã fuji Frutas 141,7 Batata-inglesa frita Raízes e 28,4 Milho e prepa- Cereais 200,5
tubérculos rações
(fubá e pipoca)
6 Vinho tinto Bebidas 109,4 Achocolatados Doces 25,4 Uva rubi Frutas 151,2
7 Salada de Frutas 48,0 Cenoura Hortaliças 23,0 Maçã fuji Frutas 144,1
frutas (mamão,
banana, laranja,
maçã)
8 Laranja-pera Frutas 44,9 Feijão preto Leguminosas 20,1 Vinho tinto Bebidas 121,2
9 Couve manteiga Hortaliças 34,5 Chá (chá mate e Bebidas 13,6 Café Bebidas 88,9
chimarrão)
10 Feijão preto Leguminosas 27,7 Arroz integral Cereais 12,2 Salada de Frutas 48,9
frutas (mamão,
banana, laranja,
maçã)

maior número de alimentos com elevados teores dessa número de alimentos fontes, ambos com 2 itens cada, sendo
vitamina por porção. No entanto, o milho e preparações que as vísceras, com 3,43 mg, ficaram na primeira posição
ficaram com a primeira colocação, com 17,9 mg, e os peixes e o biscoito recheado, com 0,29 mg, ficou na 20ª posição.
frescos e preparações em última, com 2,23 mg. Para a vita- E, para o manganês destacaram-se os grupos dos cereais (3
mina A, destacaram-se os grupos das hortaliças (3 itens) e itens), seguido das farinhas, massas, panificados e biscoitos
carnes e ovos (2 itens), sendo que as vísceras, com 3069,7 (2 itens) e bebidas (2 itens). No entanto, o abacaxi, com 2,45
μg, ocuparam a primeira posição no rank e o leite em pó mg, ficou no topo do ranking, e o feijão preto, com 0,67 mg,
integral a última, com 112,7 μg, como pode ser observado no final do mesmo, como pode ser visualizado na Tabela 5.
na Tabela 4. Para os fenólicos totais, verificou-se que os grupos das
Em relação aos minerais, os grupos de carnes e ovos (7 frutas (4 itens), bebidas e doces (2 itens cada) apresentaram
itens) se destacou com maior número de alimentos fontes de maior número de alimentos com maiores quantidades desses
zinco, sendo que as carnes salgadas se destacaram com 8,35 compostos por porção, sendo que o açaí, com 811 mg, ficou
mg, e na última colocação ficaram as preparações à base na primeira posição e em última posição ficou a laranja-pera,
de aves, com 2,54 mg. Para o selênio, também destacou-se com 123,2 mg. No que diz respeito aos flavonoides, também
o grupo das carnes e ovos (6 itens), seguido das farinhas, verificou-se que os grupos das frutas (5 itens), bebidas e doces
massas, panificados e biscoitos (2 itens). Peixes frescos e (2 itens cada) se destacaram e o açaí também foi o alimento
preparações ficaram com a primeira posição, com 340 μg, que apresentou maior teor desses compostos por porção
e na última colocação ficou a pizza, com 33,6 μg. (811,4 mg). Em relação aos ácidos fenólicos, os grupos
Já para o cobre, os grupos das frutas e das farinhas, dos cereais, raízes e tubérculos, leguminosas e das bebidas,
massas, panificados e biscoitos se destacaram com maior ambos com 2 itens cada, apresentaram maior quantidade
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Fontes dietéticas de antioxidantes consumidas pela população brasileira

Tabela 4 – 10 fontes dietéticas de vitaminas antioxidantes consumidas pela população brasileira: Inquérito Nacional de Alimentação 2008-2009.
Ranking Vitamina C Vitamina E Vitamina A
Alimentos ou Grupo Porção Teor Alimentos ou Grupo Porção Teor Alimentos ou Grupo Porção Teor
preparações (g) (mg) preparações (g) (mg) preparações (g) (μg)
1 Laranja-pera Frutas 274,1 147,19 Milho e prepa- Cereais 146 17,94 Vísceras Carnes e 123,2 3069,7
rações (fubá e ovos
pipoca)
2 Mamão Frutas 200,9 140,93 Feijão Leguminosas 183,6 8,61 Batata-doce Raízes e 207,2 1698,5
formosa verde/corda tubérculos
3 Tangerina Frutas 253,5 100,89 Batata-doce Raízes e 207,2 4,60 Cenoura Hortaliças 45,5 265,3
poncã tubérculos
4 Salada Frutas 175,4 60,81 Batata- Raízes e 72,5 4,57 Sopas e Sopas e 415,9 158,5
de frutas inglesa frita tubérculos caldos caldos
(mamão, ba-
nana, laranja,
maçã)
5 Sucos/ Bebidas 265,3 59,18 Farofa (farinha Farinhas, 48,7 2,94 Couve Hortaliças 51,7 150,3
Refrescos/ de mandioca) massas manteiga
Sucos em panificados e
pó reconsti- biscoitos
tuídos
6 Mandioca Raízes e 194,4 57,64 Oleaginosas Oleaginosas 41,5 2,70 Abóbora Hortaliças 99 147,3
tubérculos moranga
7 Couve man- Hortaliças 51,7 56,02 Couve manteiga Hortaliças 51,7 2,65 Mamão Frutas 200,9 129,3
teiga formosa
8 Abacaxi Frutas 150 53,10 Peixes salgados Carnes e 277,1 2,49 Ovo de Carnes e 66,1 119,1
pérola (bacalhau) ovos galinha ovos
9 Batata-doce Raízes e 207,2 42,37 Manga Frutas 213,3 2,40 Sanduíches Salgados e 126,4 117,7
tubérculos tommy atkins sanduíches
10 Manga Frutas 213,3 37,97 Peixes frescos e Carnes e 309,1 2,23 Leite em pó Laticínios 23,4 112,7
tommy atkins preparações ovos integral

de alimentos fontes desses compostos, sendo que o milho e em sua forma habitual de consumo contêm óleo adicionado
preparações, com 293 mg, ficaram no topo do ranking, e para o preparo10, o que pode ter contribuído para o teor de
o arroz integral, com 18,7 mg, na 20ª posição (Tabela 6). vitamina E deste alimento.
Em função disso, a pipoca, doce ou salgada, destacou-se
DISCUSSÃO como alimento de importante contribuição para o consumo
dessa vitamina, respondendo por 3,5% do consumo pela
Ao analisar comparativamente os teores de antioxi-
população brasileira6. Na dieta norte-americana15 e na dieta
dantes dos alimentos por 100 g ou 100 mL e por porção
brasileira6, o grupo dos cereais também se destacou como
média consumida, verificou-se que houve diferenças nos
alimentos que se destacaram como sendo mais densos alimentos de importante contribuição para o consumo de
(maiores quantidades de antioxidante por 100g) ou fontes vitamina E. Já como fonte dietética, o grupo dos cereais não
(maiores quantidades de antioxidantes por porção média apresentou os maiores teores de vitamina E nem por 100 g
consumida), o que demonstra que não somente o conteúdo nem por porção.
de antioxidantes do alimento, mas também a quantidade Os grupos alimentares que apresentaram maior contri-
per capita consumida pode influenciar o aporte desses buição para a ingestão total de vitamina A no Brasil foram
compostos na dieta. os laticínios, carnes e ovos6; e os vegetais, na população
O milho e preparações foram os alimentos com maiores norte-americana15. Como fonte dietética, os grupos que se
quantidades de vitamina E. No entanto, é importante destacar destacaram quando se considerou o tamanho da porção
que nesse item foram considerados o fubá e a pipoca, que normalmente consumida foram as hortaliças e carnes e ovos.
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Locateli G et al.

Tabela 5 – 10 fontes dietéticas de minerais antioxidantes consumidas pela população brasileira: Inquérito Nacional de Alimentação 2008-2009.

Zinco Selênio Cobre Manganês

Ran- Alimentos Grupo Por- Teor Alimentos Grupo Por- Teor Alimentos Grupo Por- Teor Alimentos Grupo Por- Teor
king ou prepa- ção (mg) ou prepa- ção (mg) ou prepa- ção (μg) ou prepa- ção (μg)
rações (g) rações (g) rações (g) rações (g)

1 Carnes Carnes 121 8,35 Peixes Carnes e 309,1 340,0 Vísceras Carnes e 123,2 3,434 Abacaxi Frutas 150 2,453
salgadas e ovos frescos e ovos ovos pérola
(carne prepara-
seca e ções
charque)

2 Prepa- Carnes 128,7 8,24 Peixes Carnes e 277,1 164,5 Mamão Frutas 200,9 1,386 Chá (chá Bebidas 426 1,340
rações e ovos salgados ovos formosa mate e
à base (bacalhau) chimarrão)
de carne
bovina

3 Carne Carnes 101,4 6,03 Oleagino- Oleagino- 41,5 117,9 Chá (chá Bebidas 425,7 0,970 Cereais Cereais 35,5 0,980
bovina e ovos sas sas mate e matinais
chimarrão) (aveia)

4 Peixes Carnes 309,1 4,34 Carne Carnes e 180,3 70,2 Oleagino- Oleagino- 41,5 0,462 Arroz Cereais 154 0,952
frescos e e ovos suína ovos sas sas integral
prepara-
ções

5 Chá (chá Bebidas 425,7 4,20 Peixes em Carnes e 66,3 42,7 Milho e Cereais 146 0,401 Vinho tinto Bebidas 242 0,883
mate e conservas ovos prepara-
chimar- (atum e ções (fubá
rão) sardinha) e pipoca)

6 Carne Carnes 180,3 4,19 Prepa- Carnes e 128,7 42,5 Salada Frutas 175,4 0,371 Milho e Cereais 146 0,819
suína e ovos rações ovos de frutas prepara-
à base (mamão, ções (fubá
de carne banana, e pipoca)
bovina laranja,
maçã)

7 Vísceras Carnes 123,2 4,14 Macarrão Farinhas, 155,8 37,2 Chocolates Doces 85,3 0,341 Oleagino- Oleagino- 41,5 0,778
e ovos e prepa- massas, sas sas
rações à panifi-
base de cados e
macarrão biscoitos

8 Milho e Cereais 146 2,93 Prepa- Carnes e 145,1 35,5 Feijão Legumino- 177,1 0,319 Pão Farinhas, 39,7 0,746
prepara- rações à ovos preto sas integral massas,
ções (fubá base de panificados
e pipoca) aves e biscoitos

9 Pizzas Salga- 219,9 2,58 Massas Farinhas, 238,8 34,2 Massas Farinhas, 238,8 0,291 Massas Farinhas, 239 0,695
dos e massas, massas, massas,
sanduí- panifi- panificados panificados
ches cados e e biscoitos e biscoitos
biscoitos

10 Prepa- Carnes 145,1 2,54 Pizzas Salgados 219,9 33,6 Biscoito Farinhas, 106 0,290 Feijão Legumino- 177 0,673
rações à e ovos e sanduí- recheado massas, preto sas
base de ches (biscoito panificados
aves recheado e e biscoitos
waffle)

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Fontes dietéticas de antioxidantes consumidas pela população brasileira

Tabela 6 – Dez fontes dietéticas de compostos fenólicos consumidas pela população brasileira: Inquérito Nacional de Alimentação 2008-2009.
Ranking Vitamina C Vitamina E Vitamina A
Alimentos ou Grupo Porção Teor Alimentos ou Grupo Por- Teor Alimentos ou Grupo Porção Teor
preparações (g) (mg) preparações ção (mg) preparações (g) (mg)
(g)
1 Açaí Frutas 255,8 811,4 Milho e prepa- Cereais 146 292,76 Açaí Frutas 255,8 811,4
rações (fubá e
pipoca)
2 Achocolatados Doces 26,5 388,7 Café Bebidas 162,9 142,88 Achocolatados Doces 26,5 395,5
3 Chocolates Doces 85,3 272,1 Farofa (farinha de Farinhas, 48,7 135,03 Vinho tinto Bebidas 241,9 293,2
mandioca) massas,
panificados e
biscoitos
4 Vinho tinto Bebidas 241,9 264,5 Chá (chá mate e Bebidas 425,7 57,81 Milho e prepa- Cereais 146 292,8
chimarrão) rações (fubá e
pipoca)
5 Maçã fuji Frutas 157,9 223,8 Feijão preto Leguminosas 177,1 35,60 Chocolates Doces 85,3 272,1
6 Uva rubi Frutas 144,5 215,6 Batata-inglesa Raízes e 119 33,74 Maçã fuji Frutas 157,9 227,5
tubérculos
7 Laranja-pera Frutas 274,1 123,2 Preparações à Leguminosas 229,5 23,06 Uva itália Frutas 144,5 218,5
base de feijão
8 Salada de Frutas 175,4 84,3 Batata-inglesa frita Raízes e 72,5 20,55 Café Bebidas 162,9 144,9
frutas tubérculos
(mamão,
banana,
laranja, maçã)
9 Feijão preto Legumino- 177,1 49,1 Cerveja Bebidas 885,4 20,28 Farofa (farinha Farinhas, 48,7 135,0
sas de mandioca) massas,
panificados
e biscoitos
10 Preparações à Legumino- 229,5 31,8 Arroz integral Cereais 153,5 18,70 Laranja-pera Frutas 274,1 123,2
base de feijão sas

Essa diferença entre os grupos fontes, principalmente primeira colocação no ranking por porção. Porém, estes
no que tange às hortaliças, e os alimentos normalmente contribuíram com 12,33% do consumo total deste mineral
consumidos pela população brasileira que apresentaram pela população brasileira, que foi inferior à contribuição da
maior contribuição para o consumo de vitamina A, pode carne bovina6. Isso se deve possivelmente ao baixo consumo
estar relacionada ao baixo consumo de hortaliças e frutas, de peixe quando comparado às demais carnes9. E apesar
do qual menos de 10% da população consome a quantidade das oleaginosas serem importantes fontes de selênio por
preconizada de 400 g/dia9. 100 g, o tamanho de sua porção habitualmente consumida
Estes dois grupos também se sobressaíram como fontes pela população brasileira foi pequeno, o que refletiu em sua
dietéticas de vitamina C. Ao analisar o consumo total dessa posição no ranking por porção.
vitamina pela população brasileira, verificou-se que apenas As bebidas, em especial o café, foram apontadas como
o grupo das frutas apresentou maior contribuição para a o grupo que mais contribuiu para o consumo de cobre pela
ingestão total6. Já na população norte-americana, o grupo população brasileira6, o que se deve especialmente ao seu
dos vegetais, que inclui as hortaliças, apresentou maior amplo consumo, já que teores de cobre do café por 100g
destaque na contribuição para a ingestão desta vitamina15. não foram expressivos. O mesmo ocorreu com o grupo das
Em relação ao selênio, o grupo das carnes e ovos, em leguminosas em relação ao manganês, que se destacou pela
especial os peixes, apresentaram os maiores teores desse importante contribuição para o consumo deste mineral na
mineral tanto por 100g, como por porção média consumida, dieta dos brasileiros6, mas não apresentou teores significa-
sendo que os peixes frescos e preparações ficaram com a tivos para serem considerados fontes de manganês.
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Locateli G et al.

Já o grupo dos cereais apresentou vários alimentos com de compostos fenólicos, possuem teores maiores destes em
grandes quantidades de manganês por 100 g e por porção 100 g, como os vinhos tinto, branco e rosé17.
média, destacando-se como grupo fonte para este mineral. É relevante citar a importância do açaí como alimento
O mesmo ocorreu para o zinco, considerando o grupo com boas quantidades de compostos fenólicos em 100
das carnes e ovos, que também se destacou como grupo g, bem como por porção média consumida. No Brasil, o
denso, tanto por 100 g quanto fonte por porção média, e consumo dessa fruta se restringia à região Norte, onde
foi importante grupo contribuinte para a ingestão de zinco é amplamente produzida, mas atualmente o açaí e seus
pela população brasileira6. produtos têm atraído muita atenção devido às suas proprie-
Apesar da combinação típica brasileira “arroz com feijão” dades benéficas à saúde20.
ser apontada como os alimentos que mais contribuíram
para o consumo de minerais antioxidantes pela população
CONCLUSÃO
brasileira6, em função de seu grande consumo16, estes não
são representativos entre as principais fontes dietéticas destes Os principais grupos que apresentaram o maior número
antioxidantes. O feijão ainda pode ser observado no ranking de alimentos fontes em vitaminas antioxidantes e compostos
por porção do cobre e manganês, mas o mesmo não ocorreu fenólicos foram as hortaliças e frutas; já para a maioria dos
com o arroz. minerais, o grupo das carnes e ovos se destacou. Somente
para os ácidos fenólicos verificou-se que o grupo dos cereais
As frutas e vegetais foram apontadas como os principais
se destacou.
grupos fontes de fenólicos por porção, quando foram anali-
sados os alimentos que continham mais de 1 mg destes por Dentre os alimentos investigados, destaca-se que os que
porção17. Porém, ao se analisar alimentos da dieta brasileira apresentaram os maiores teores de antioxidantes por porção
que contêm maiores quantidades de fenólicos, verificou-se consumida pelos brasileiros foram o açaí, achocolatados,
que apenas o grupo das frutas se destacou. O grupo das milho e preparações, vinho e chocolates.
hortaliças apresentou pequena representação, o que pode ser Ainda é possível salientar a necessidade de aumentar o
explicado pelo baixo consumo, principalmente, de verduras9, consumo de alimentos dos grupos das oleaginosas, frutas
o qual foi menor entre os homens e entre os adolescentes, do e hortaliças, por constituírem-se alimentos com importante
que entre as mulheres e idosos9. O grupo das frutas, na dieta densidade de antioxidantes que podem contribuir para elevar
norte-americana, também apresentou maior contribuição a ingestão diária desses compostos pela população brasileira.
para ingestão de compostos fenólicos quando comparado
aos produtos horticolas18.
REFERÊNCIAS
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não se destacou entre os alimentos que mais contribuíram
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Pesquisa de Orçamentos Familiares 2008-2009: Análise do
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BRASPEN J 2018; 33 (3): 238-47


246
Fontes dietéticas de antioxidantes consumidas pela população brasileira

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Local de realização do estudo: Universidade Federal da Fronteira Sul, Realeza, PR, Brasil.

Conflito de interesse: Os autores declaram não haver.

BRASPEN J 2018; 33 (3): 238-47


247
A Artigo Original
Nascimento GFB & Campos JSP

Manual de orientação nutricional para pacientes


ostomizados
Nutritional guidance manual for ostomized patients

RESUMO
Gisele Ferreira de Barros do Nascimento1
Jamilie Suelen dos Prazeres Campos2 Introdução: Na região Norte do Brasil, no ano de 2016, segundo as estimativas do Instituto
Nacional do Câncer, os cânceres de cólon e reto ocupavam o 3º lugar em incidência em homens
e 4º lugar em mulheres. A maioria dos pacientes com câncer intestinal recebe a indicação de
realização de estomas intestinais, procedimento cirúrgico que consiste na exteriorização do íleo
(ileostomia) ou do cólon (colostomia) para o meio extracorpóreo através da parede abdominal.
Método: Por meio de uma revisão bibliográfica foi elaborado o material em forma de livreto-
cartilha informativa com proposta de orientação nutricional, alimentos a serem evitados, cardápios,
de acordo com evolução de consistência da dieta e receitas com alimentos habitualmente consu-
midos na região Norte para pacientes ostomizados. Resultados: Para a entrega aos pacientes,
esta foi impressa em formato de livreto. Dentro da cartilha foram abordados os seguintes tópicos:
(1) Introdução, (2) Conceito, (3) Orientações Nutricionais, (4) Proposta de Cardápio com alimentos
Unitermos:
regionais, (5) Receitas. Conclusão: Com a realização deste estudo, concluiu-se que existe uma
Ostomia. Nutrição. Alimentação. Manuais.
grande necessidade de mais estudos relacionados à alimentação voltados para esse público.
Keywords:
Ostomy. Nutrition. Feeding. Handbooks. ABSTRACT
Introduction: In the North region of Brazil, according to the National Cancer Institute’s estimates
Endereço para correspondência: of 2016, colon and rectum cancers were in the third place in incidence in men and 4th place in
Gisele Ferreira de Barros do Nascimento women. The majority of patients with intestinal cancer receive an indication of intestinal stomata, a
Rodovia Augusto Montenegro, 4100/704, Bloco D surgical procedure that consists of the exteriorization of the ileum (ileostomy) or colon (colostomy)
–. Bairro Parque verde – Belém, PA, Brasil – CEP: to the extracorporeal medium through the abdominal wall. Methods: The material in the form of
66635-110 informative booklet and nutritional orientation proposal, foods to be avoided, menus, according
E-mail: giselenutri1@gmail.com
to diet consistency evolution and recipes with foods usually consumed in the North region for
Submissão ostomized patients will be elaborated. Results: For the delivery to patients, this was printed in
12 de novembro de 2017 booklet format. The following topics were addressed in the booklet: (1) Introduction, (2) Concept,
(3) Nutritional Guidelines, (4) Proposal of Menu with regional foods, (5) Recipes. Conclusion:
Aceito para publicação With the accomplishment of this study it was concluded that there is a great need for more studies
7 de março de 2018 related to the feeding directed to this public.

1. Nutricionista. Pós-Graduada em Nutrição - Centro Universitário do Pará (CESUPA), Belém, PA, Brasil.
2. Nutricionista. Mestre em Saúde Ambiente e Sociedade da Amazônia. Docente do curso de Nutrição da Clínica do Centro Universitário do Pará
(CESUPA), Belém, PA, Brasil.

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248
Manual de orientação nutricional para ostomizados

INTRODUÇÃO
auxiliem na regulação da homeostase orgânica prejudicada,
De acordo com o Instituto Nacional de Câncer José
equilíbrio hidroeletrolítico e adequada absorção de macro
Alencar Gomes da Silva (INCA)1, nos países desenvolvidos,
e micronutrientes.
como os Estados Unidos, nos últimos anos observa-se
estabilidade ou diminuição da incidência de cânceres intes- Dessa forma, faz-se necessária a elaboração de um
tinais, o que pode ser considerado uma consequência da manual educativo de orientação nutricional para pacientes
eficácia na detecção e remoção de lesões pré-cancerosas. ostomizados, a fim de melhorar a adesão das orientações
Em contrapartida, nos países em desenvolvimento, como nutricionais.
os da América Central e do Sul e Leste Europeu, é possível
identificar um padrão de crescimento desses índices. MÉTODO
Segundo o guia “Falando sobre câncer do intestino”2, o Para a criação do material, foi realizada uma revisão
câncer do intestino é uma doença tratável e frequentemente bibliográfica sobre o tema, utilizando-se as bases de dados
curável. O seu tratamento primário é a cirurgia, que consiste PubMed, SciELO e Lilacs, assim como livros e sites de insti-
na retirada do tumor juntamente com parte do intestino e tutos científicos relacionados com a temática.
os linfonodos adjacentes, sendo que o local e extensão da
Foram usadas palavras chaves como: ostomia, nutrição
ressecção intestinal influenciarão no tamanho do intestino
para ostomizado e estomia, para busca de estudos cien-
remanescente, estando diretamente relacionados à funcio-
tíficos. Foram relacionados artigos de 2006 a 2016, em
nalidade do órgão em questão.
língua inglesa e portuguesa. Após a leitura completa dos
Na região Norte do Brasil, no ano de 2016, segundo materiais levantados, foi elaborado o material em forma
as estimativas do INCA 1, os cânceres de cólon e reto de livreto-cartilha informativa, com proposta de orientação
ocuparam o 3º lugar em incidência em homens e 4º lugar nutricional, alimentos a serem evitados, cardápios, de
em mulheres, correspondendo à estimativa de 440 e 480 acordo com evolução de consistência da dieta e receitas
novos casos para cada 100 mil habitantes da região, com alimentos habitualmente consumidos na região Norte
respectivamente. para pacientes ostomizados. Utilizou-se como base o
A ressecção ileal, segundo Rocha3, acarreta conse­ modelo de cartilha informativa do INCA para a elaboração
quên­cias nutricionais mais importantes do que a ressecção da cartilha referida neste estudo.
jejunal, pois aquele segmento desempenha funções únicas As propostas de cardápio para evolução de consistência
de reabsorção intestinal dos sais biliares, gordura e da de dieta foram elaboradas baseando-se no padrão médio
vitamina B12. Ressecções colônicas também resultam em de refeições, visando à harmonia das preparações para
grande impacto nutricional, tendo em vista a importância uma alimentação variada e balanceada. Elaborou-se um
do cólon em sua atuação no esvaziamento gástrico, na cardápio único para cada etapa da consistência da dieta, ou
absorção de volume maior de fluidos e dos ácidos graxos seja, um cardápio para líquida completa, um para pastosa,
de cadeia curta, na capacidade de fermentar os carboi- um para branda e um para geral.
dratos mal digeridos, obtendo mais energia adicional para
Realizou-se, assim, a criação do material com linguagem
o organismo e a preservação do nitrogênio.
simples e de maneira didática, a fim de facilitar o enten-
Ainda em consonância com Rocha et al.4, a maior parte dos dimento do público alvo e, assim, favorecer maior adesão
pacientes com câncer intestinal tem a indicação de realização às informações dadas.
de estomas intestinais, procedimento cirúrgico que consiste na
exteriorização do íleo (ileostomia) ou do cólon (colostomia)
RESULTADOS
para o meio extracorpóreo através da parede abdominal,
podendo ser uma condição temporária ou definitiva. A cartilha informativa elaborada a partir deste estudo
Boekel & Posse e Rocha et al. ressaltam que o paciente
5 4 está apresentada no Apêndice. Para a entrega aos pacientes,
submetido a uma operação cirúrgica intestinal, que retorna esta foi impressa em formato de livreto.
para a casa após a alta hospitalar, precisa tomar alguns Na cartilha, foram abordados os seguintes tópicos: (1)
cuidados com relação a sua alimentação. Dentre outros Introdução, (2) Conceito, (3) Orientações Nutricionais, (4)
fatores, o fracionamento das refeições, a consistência e Proposta de Cardápio com alimentos regionais, (5) Receitas.
composição da dieta implicam na manutenção ou melhora Na introdução, abordou-se a finalidade do material e
do estado nutricional do paciente, considerando que suas informações referentes aos tópicos em questão. No tópico
funções intestinais normais estão comprometidas, o que seguinte, os conceitos foram descritos a partir de perguntas
resulta na necessidade de condutas dietoterápicas que para melhor entendimento dos leitores.
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Nascimento GFB & Campos JSP

O tópico de Orientações Nutricionais dispõe de infor- CONCLUSÃO


mações sobre alimentação saudável para atenuar sinais e Com a realização deste estudo concluiu-se que existe
sintomas provenientes da ostomia, bem como Orientações uma grande necessidade de mais estudos relacionados à
para evolução de Consistência da Dieta. A Proposta de alimentação voltados para esse público. Os pacientes osto-
Cardápio com alimentos regionais foi realizada para facilitar mizados necessitam de bastante atenção dos profissionais
adesão da dieta pelos ostomizados englobando alimentos da área da saúde, principalmente para acompanhamento
culturais da região Norte. periódico ao longo da vida.
Foram elaboradas receitas para variar o cardápio, Assim, isso é de grande auxílio para a saúde desses
atenuando a monotonia alimentar pelo paciente. pacientes, pois com uma alimentação adequada é possível
evitar problemas e desconfortos com o trânsito intestinal,
principalmente em público.
DISCUSSÃO
O manual criado durante este trabalho conta com
Tal como mencionam Echer6 e Oliveira et al.7, algumas informações muito importantes para os pacientes sobre
informações nutricionais relevantes ao paciente enterectomi- sua alimentação e cuidados com a saúde. Desta maneira,
zado e/ou ostomizado sobre cuidados domésticos próprios é possível se ter maior autonomia e facilidade para sanar
não são fornecidas de forma clara, o que pode refletir em algumas dúvidas que possa ocorrer com o tempo. As orien-
distúrbios nutricionais importantes. O desenvolvimento de tações são de fácil entendimento para atender ao paciente
materiais educativos, como cartilhas, favorece a compre- ostomizado da melhor maneira possível.
ensão das orientações objetivadas, além de também ser
uma forma de auxiliar os indivíduos a conhecerem melhor REFERÊNCIAS
o processo saúde/doença e seguirem mais tranquilamente
durante o período de recuperação. 1. Brasil. Ministério da Saúde. Instituto Nacional de Câncer José
Alencar Gomes da Silva (INCA). Estimativa 2016: Incidência
Fonseca et al.8 indicam que, quando o material educa- de Câncer no Brasil. Rio de Janeiro: INCA; 2015.
tivo é de fácil compreensão, o indivíduo adquire maior 2. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Assistência à Saúde.
Instituto Nacional de Câncer. Falando sobre câncer do intestino.
conhecimento e o material torna-se capaz de suscitar o Rio de Janeiro: INCA; 2003.
desenvolvimento de habilidades e favorecer a autonomia, 3. Rocha JJR. Estomas intestinais (ileostomias e colostomias) e anas-
tomada de decisão e o empoderamento de suas ações, tomoses intestinais. Medicina (Ribeirão Preto). 2011;44(1):51-6.
4. Rocha EEM, Correia MTD, Borges VC, Dias MCG, Rocha GO,
sabendo que estas influenciam em seu estado de saúde. Borges A, et al. Terapia nutricional na síndrome do intestino
Após a análise destas diversas situações envolvidas curto - insuficiência/falência intestinal. São Paulo: Sociedade
Brasileira de Nutrição, Parenteral e Enteral Associação Brasi-
no cuidado pós-operatório de pacientes que tiveram leira de Nutrologia; 2011.
tratamentos cirúrgicos de ressecção intestinal e ostomia, 5. Boekel SV, Posse R. Manual de fichas técnicas de preparações
para nutrição clínica. Rio de Janeiro: Rubio; 2013.
e considerando o escasso acervo público de informações
6. Echer IC. Elaboração de manuais de orientação para o cuidado
referentes à alimentação e nutrição direcionadas a esses em saúde. Rev Lat Am Enferm. 2006;13(5):754-7.
pacientes, percebe-se a necessidade de elaboração de 7. Oliveira MS, Santos MCL, Almeida PC, Panobianco MS,
Fernandes AFC. Avaliação de manual educativo como estratégia
um material educativo como estratégia para fornecer de conhecimento para mulheres mastectomizadas. Rev Lat Am
orientações nutricionais ao público em questão. Na Enferm. 2012;20(4):668-76.
tentativa de conferir maior adesão pelo paciente às infor- 8. Fonseca LMN, Leite AM, Mello DF, Silva MAL, Lima RAG,
Scochi CGS. Tecnologia educacional em saúde: contribuições
mações contidas no material, optou-se por regionalizar para a enfermagem pediátrica e neonatal. Esc Anna Nery.
o mesmo. 2011;15(1):190-6.

Local de realização do estudo: Centro Universitário do Pará (CESUPA), Belém, PA, Brasil.

Conflito de interesse: Os autores declaram não haver.

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APÊNDICE

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A Artigo Original
Risco cardiovascular a partir de medidas antropométricas

Avaliação do risco cardiovascular a partir de


medidas antropométricas de pacientes atendidos no
ambulatório de Nutrição do Centro de Hipertensão
e Diabetes da Universidade Federal de Pelotas
Evaluation of cardiovascular risk from anthropometric measurements of patients attended at the
Nutrition outpatient clinic of the Hypertension and Diabetes Center of the Federal ­University
of Pelotas

RESUMO
Tainá Lima Lucas Rosa1
Betina Fernanda Dambrós1 Introdução: As doenças cardiovasculares (DCV) são as principais causas de mortalidade mundial
Débora Simone Kilpp2 e estão associadas com o excesso de gordura corporal, principalmente abdominal. Com base nisto,
Lúcia Rota Borges3 o presente estudo teve o objetivo de analisar o risco cardiovascular de pacientes hipertensos e/ou
Renata Torres Abib Bertacco3 diabéticos de um ambulatório especializado, utilizando Índice de Conicidade (IC), Relação Cintura
Estatura (RCEst) e Circunferência do Pescoço (CP) como parâmetros e avaliar correlação do IC
com os demais indicadores. Método: Foi realizado um estudo transversal com dados secundários
de 138 pacientes, adultos e idosos, de ambos os sexos, atendidos no Ambulatório de Nutrição
do Centro de Hipertensão e Diabetes da UFPel. Foram analisadas variáveis sociodemográficas
e antropométricas para avaliar o risco de DCV, além de ser realizado o teste de correlação de
Pearson para correlacionar os indicadores, adotando o nível de 5% de significância. Resultados:
Dos 138 pacientes avaliados, 67,39% eram do sexo feminino; os indivíduos apresentaram excesso
de peso e hipertensão como comorbidades predominantes. O IC excedeu a média recomendada
para homens (1,36±0,09), e para mulheres (1,37±0,16), assim como a CP, que teve média geral
além do recomendado (39,75±4,65 cm) e RCEst aumentada (0,67±0,12). O IC correlacionou-se
positivamente com CP, tanto em homens (p<0,0001, r=0,5891) quanto em mulheres (p=0,0006,
r=0,3523), com RCEst no sexo masculino (p<0,0001, r=0,7921) e no sexo feminino (p<0,0001,
r=0,7225) e com o Índice de Massa Corporal em homens (p<0,0003, r=0,5119) e em mulheres
(p=0,0060, r=0,3952). Conclusão: Com base nos índices antropométricos usados para avaliação,
a maioria dos pacientes hipertensos e/ou diabéticos atendidos no ambulatório apresentou alto
risco de desenvolver DCV, sendo que o IC se correlacionou positivamente com os demais indica-
dores de risco cardiovascular analisados.
Unitermos:
Doenças Cardiovasculares. Antropometria. Hiperten- ABSTRACT
são. Diabetes Mellitus. Introduction: Cardiovascular diseases (CVD) are the main cause of worldwide mortality and are
associated with excess body fat, especially abdominal. Based on this, the present study aimed to
Keywords: analyze the cardiovascular risk of hypertensive and / or diabetic patients of a specialized outpa-
Cardiovascular Diseases. Anthropometry. Hyperten- tient clinic, using Conicity Index (CI), Waist-to-Height Ratio (WHtR) and Neck Circumference (NC)
sion. Diabetes Mellitus. as a parameter and to evaluate the correlation of the CI with the other indicators. Methods:
A cross-sectional study was carried out with secondary data from 138 patients, adults and the
Endereço para correspondência: elderly, assisted at the Nutrition Outpatient Clinic of the Hypertension and Diabetes Center of
Tainá Lima Lucas Rosa UFPel. Sociodemographic and anthropometric variables were analyzed to assess the risk of CVD.
Av. Fernando Osório, 2753/bloco 5/apto 401 – Pearson correlation test was performed, considering 5% level of significance. Results: Most of
Pelotas, RS, Brasil – CEP: 96055-000 patients evaluated were female (67.39%) and presented overweight and hypertension as predo-
E-mail: nanallr@hotmail.com minant comorbidities. CI exceeded the recommended mean for men (1.36±0.09), and for women
(1.37±0.16), as well as NC that had general mean beyond the recommended (39.75±4.65 cm) and
Submissão increased WHtR (0.67±0.12). The CI was positively correlated with CP in both in men (p<0.0001,
17 de outubro de 2017 r=0.5891) and in women (p=0.0006, r=0.3523), with mREC in men (p<0.0003, r=0.7921), and
in women (p<0.0001, r=0.7225) and with Body Mass Index in men (p<0.0003 r=0.5119) and
Aceito para publicação in women (p=0.0060, r=0.3952). Conclusion: Patients presented high risk for CVD, and CI was
21 de janeiro de 2018 positively correlated with other cardiovascular risk indicators analyzed.

1. Acadêmica da Faculdade de Nutrição da Universidade Federal de Pelotas, Pelotas, RS, Brasil.


2. Nutricionista da Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares (EBSERH), Hospital Escola – Universidade Federal de Pelotas (HE/UFPel), Pelotas,
RS, Brasil.
3. Professor Doutor, Universidade Federal de Pelotas, Faculdade de Nutrição, Departamento de Nutrição, Pelotas, RS, Brasil.

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271
Rosa TLC et al.

INTRODUÇÃO do Ambulatório de Nutrição do Centro de Hipertensão e


As doenças cardiovasculares (DCV) são as principais Diabetes da UFPel, no período de janeiro a dezembro do
causas de mortes em todo o mundo1. Estima-se que 17,7 ano de 2016. Foram analisadas variáveis sociodemográ-
milhões de pessoas morreram por estas doenças em 2015, ficas, tais como escolaridade, cor da pele, estado civil,
representando 31% de todas as mortes em nível global2. tabagismo e hábito de consumo de bebidas alcoólicas,
Dentre elas, destacam-se: infarto agudo do miocárdio presença de comorbidades e medidas antropométricas,
(IAM), acidente vascular cerebral (AVC), arritmias cardíacas como peso, estatura, CC e CP.
e isquemias3. Há condições que favorecem o seu desen- A partir do peso corporal e da estatura, determinou-se
volvimento, tais como idade avançada, fatores genéticos o índice de massa corporal (IMC) dos participantes, que
e étnicos, hipertensão arterial sistêmica (HAS), diabetes foram classificados de acordo com os valores indicados pela
mellitus (DM), dieta aterogênica, inatividade física e excesso Organização Mundial de Saúde (OMS)11, para adultos, e
de peso4. A prevalência de obesidade e sobrepeso atinge Lipschitz12 para idosos (mais de 60 anos). As medidas de
cada vez mais indivíduos, que se tornam mais predispostos CC foram mensuradas com fita métrica na altura da cicatriz
à ocorrência de eventos cardiovasculares5. umbilical13.
O diagnóstico de obesidade pode ser feito a partir de O IC foi calculado conforme previamente descrito
análise da proporção de gordura corporal, ou por meio de na literatura14. A aferição da CP foi feita com o paciente
interpretação de indicadores antropométricos, que permitem sentado, na base do pescoço, na altura da cartilagem
identificar casos de obesidade generalizada e obesidade cricotireoidea, sendo aferida abaixo da proeminência em
centralizada (androide), considerada um grande fator de indivíduos do sexo masculino, quando presente15.
risco cardiovascular6. Os pontos de corte adotados para avaliação do IC foram
A medida da distribuição dos depósitos de gordura na baseados na literatura9, sendo 1,25 e 1,18 para homens
região visceral é feita com maior precisão por meio de e mulheres, respectivamente. Quanto à classificação da
exames de imagem, porém, em estudos populacionais e na circunferência do pescoço, utilizaram-se os valores de 37
prática clínica, consideram-se apropriadas medidas antro- cm para sexo masculino e 34 cm para feminino, conforme
pométricas, como circunferência da cintura (CC), índice de estudo de Frizon & Boscaini15. A RCEst foi calculada a partir
conicidade (IC) e relação cintura-estatura (RCEst)7,8. da divisão do comprimento da cintura pela estatura16. O
O IC foi considerado um dos melhores indicadores de ponto de corte para a mesma foi 0,50, independentemente
risco coronariano, sendo determinado por uma equação do sexo e da faixa etária6.
matemática na qual são utilizados os valores de peso, Para análise dos dados, foram utilizados os programas
estatura e circunferência da cintura do sujeito9. Além deste Microsoft Excel® e Graphpad Prism. As variáveis contí-
indicador, outra medida que também está associada a riscos nuas de distribuição normal foram apresentadas como
cardiometabólicos é a circunferência do pescoço (CP), médias e seus respectivos desvios padrões (DP). Foram
pois quando aumentada indica um acúmulo de gordura correlacionados os indicadores por meio do teste de
na parede das artérias carótidas, associado ao desenvol- correlação de Pearson, sendo adotado um nível de
vimento de DCV10. significância de 5%.
Com base nisso, o presente estudo tem o objetivo de
analisar o risco cardiovascular de pacientes hipertensos e/ RESULTADOS
ou diabéticos de um ambulatório especializado, utilizando o
Foram incluídos no estudo 138 pacientes, sendo 93
IC, RCEst e CP como parâmetros, e avaliar se há correlação
mulheres e 45 homens, equivalente a todos os pacientes
do IC com os demais indicadores.
atendidos neste período. Na população avaliada, predo-
minou a cor de pele branca, nível de escolaridade inferior
MÉTODO ao ensino fundamental completo, casadas, que nunca
Trata-se de um estudo transversal, com a utilização de fumaram e que não consumiam bebidas alcoólicas (Tabela
dados secundários de um projeto previamente aprovado 1). A média de idade no sexo feminino foi de 55,54±13,29
pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Faculdade de Medicina anos e no sexo masculino, 56,74±11,74 anos.
da Universidade Federal de Pelotas (UFPel), em Pelotas, A maioria dos adultos e dos idosos apresentou excesso
RS, sob o número 1.659.342. Foram coletados dados de de peso (93,59% e 83,33% respectivamente), sendo que,
pacientes adultos e idosos, de ambos os sexos, usuários destes, 67,95% dos adultos foram classificados com algum
BRASPEN J 2018; 33 (3): 271-5
272
Risco cardiovascular a partir de medidas antropométricas

Tabela 1 – Caracterização da amostra de pacientes atendidos no ambulató- Tabela 2 – Índice de conicidade, circunferência do pescoço e razão Cintura
rio de Nutrição do Centro de Hipertensão e Diabetes. Pelotas, 2017 (N=138). Estatura da amostra. Pelotas, 2017 (N=138).
Características N (%) Sexo Índice de conicida- Circunferência do Razão Cintura
Sexo (n=138) de (Média ± DP) Pescoço Estatura
(Média ± DP) (Média ± DP)
Masculino 45 32,61
Homens 1,36 0,09 43,01 4,22 0,64 0,09
Feminino 93 67,39
Mulheres 1,37 0,16 38,21 3,98 0,68 0,12
*Cor da Pele (n=129)
DP=Desvio Padrão
Branca 107 82,95
Não Branca 22 17,05
grau de obesidade. A HAS destacou-se entre as comorbi-
Escolaridade (n=138)
dades presentes.
Analfabeto/ Ensino Fundamental 27 19,57
Incompleto O IC apresentou média de 1,36±0,09 para homens
Fundamental Completo/ 50 36,23 e 1,37±0,16 para mulheres (Tabela 2), ultrapassando
Fundamental Incompleto nos dois sexos os valores recomendados (1,25 e 1,18),
Fundamental Completo/Médio 28 20,29 enquanto apenas três mulheres e seis homens adultos
Incompleto estavam adequados (dados não apresentados).
Médio Completo/ Superior 29 21,01
Incompleto Estavam abaixo do ponto de corte para RCEst 6,66% dos
Superior Completo 4 2,90 homens e 2,15% das mulheres (dados não apresentados).
*Estado Civil (n=137) Quanto à média de CP, obteve-se 43,01±4,22 cm para o
sexo masculino e 38,21±3,98 cm para o sexo feminino,
Solteiro 30 21,90
sendo que 19,35% das mulheres e apenas 8,88% dos
Casado 79 57,66
homens estavam dentro do valor recomendado (dados não
Divorciado 13 9,49
apresentados).
Viúvo 15 10,95
O IC correlacionou-se positivamente com CP, tanto
Tabagismo (n=138)
em homens (p<0,0001, r=0,5891) quanto em mulheres
Sim 16 11,59
(p=0,0006, r=0,3523), com RCEst no sexo masculino
Não 65 47,10
(p<0,0001, r=0,7921) e no sexo feminino (p<0,0001,
Ex-fumantes 57 41,31
r=0,7225) e com IMC em homens (p<0,0003, r=0,5119)
*Consumo de álcool (n=137)
e em mulheres (p=0,0060, r=0,3952).
Sim 35 25,55
Não 102 74,45
IMC adultos (n=78) DISCUSSÃO
Baixo Peso 1 1,28 Para avaliar o risco de desenvolvimento de doenças
Eutrofia 4 5,13 coronarianas, o IMC isoladamente não é o método mais
Sobrepeso 20 25,64 adequado, devendo ser associado a outros índices, como
Obesidade grau 1 19 24,36 CC e IC17. Um estudo que teve por objetivo avaliar diferentes
Obesidade grau 2 16 20,51 indicadores antropométricos de obesidade abdominal em
Obesidade grau 3 18 23,08 mulheres concluiu que o IC foi o indicador que apresentou o
*IMC Idoso (n=60) melhor poder discriminatório para risco de desenvolvimento
Baixo Peso 3 5 de doença cardiovascular, utilizando o escore de risco de
Eutrofia 7 11,67
Framingham como base18. O IC apontou risco de DCV para
a maioria desta amostra, e se correlacionou positivamente
Excesso de Peso 50 83,33
com CP, RCEst e IMC.
**Comorbidades (n=138)
HAS 109 78,98 Em um recente estudo transversal nacional, que envolveu
DM 105 76,09
mais de 1000 pacientes adultos obesos e com tolerância
* Os valores encontram-se incompletos por falta de informação nas anamneses
diminuída à glicose, encontrou-se associação da CP
** Foi realizada soma de pacientes com HAS isolado e associado a outras afecções, como DM ao risco de síndrome metabólica, acúmulo de gordura
e doença renal, dos 138 pacientes.
O mesmo foi feito para DM.
visceral e resistência à insulina19. O mesmo foi eviden-
DM=Diabetes Mellitus; HAS=Hipertensão Arterial Sistêmica; IMC=Índice de Massa Corporal ciado anteriormente pelo nosso grupo de pesquisa em
BRASPEN J 2018; 33 (3): 271-5
273
Rosa TLC et al.

pacientes ambulatoriais, em que foi observada correlação 4. Moura JRA, Guimarães MR, Teixeira SEXM, Carvalho EL,
Machado ALG, Silva RV. Perfil lipídico de universitários
da CP com peso, IMC, pressão arterial e aumento de risco
e associação com risco cardiovascular. Rev Enferm UFPI.
cardiovascular20. 2017;6(1):40-6.
A maioria da presente amostra apresentou CP aumen- 5. Cuppari L. Guias de Medicina Ambulatorial e Hospitalar -
Nutrição - Nutrição Clínica no Adulto. 3ª ed. São Paulo:
tada, e considerando que estes indivíduos são pacientes Manole; 2014
diabéticos e/ou hipertensos, a aplicação deste indicador 6. A ssociação Brasileira para o Estudo da Obesidade e da
antropométrico pôde ser útil para verificar aqueles que Síndrome Metabólica. Diretrizes Brasileiras de Obesidade. 4ª
ed. São Paulo: ABESO; 2016.
possuíam mais resistência à insulina, além de risco para 7. Cornier MA, Després JP, Davis N, Grossniklaus DA, Klein
DCV e, desta forma, nortear futuras intervenções nutricionais S, Lamarche B, et al.; American Heart Association Obesity
mais específicas. Committee of the Council on Nutrition; Physical Activity and
Metabolism; Council on Arteriosclerosis; Thrombosis and
Um outro estudo realizado com funcionários de um Vascular Biology; Council on Cardiovascular Disease in the
Centro de Reabilitação Física e Auditiva da Bahia21, que Young; Council on Cardiovascular Radiology and Intervention;
Council on Cardiovascular Nursing, Council on Epidemiology
teve por objetivo identificar fatores de risco cardiovascu- and Prevention; Council on the Kidney in Cardiovascular
lares, apontou a HAS como comorbidade mais prevalente, Disease, and Stroke Council. Assessing adiposity: a scientific
seguida por dislipidemia e DM, assim como nesta amostra, statement from the American Heart Association. Circulation
2011;124(18):1996-2019.
na qual também a hipertensão se apresentou de forma
8. Ben-Noun LL, Laor A. Relationship between changes in
predominante, tanto isolada quanto associada com DM neck circumference and cardiovascular risk factors. Exp Clin
ou doença renal. Cardiol. 2006;11(1):14-20.
9. Pitanga FJ, Lessa I. Anthropometric indexes of obesity as an
A RCEst foi um dos indicadores em que a população instrument of screening for high coronary risk in adults in the
mais distanciou-se dos valores adequados, o que prediz city of Salvador - Bahia. Arq Bras Cardiol. 2005;85(1):26-31.
maior risco de doenças relacionadas ao coração, já que 10. Pimenta IL, Sanches RC, Pereira JPR, Houri BF, Machado
ELG, Machado FSG. Medidas das circunferências abdominal
esta é considerada um ótimo índice para diagnosticar a e cervical para mensurar riscos cardiovasculares. Rev Med
distribuição de adiposidade abdominal e riscos metabó- Minas Gerais. 2014;24(Suppl 9):S16-9.
licos22. Um estudo realizado na Universidade de Hong Kong 11. World Health Organization (WHO). Obesity: preventing and
managing the global epidemic. Geneva: WHO; 2000. 253 p.
avaliou IMC, relação cintura-quadril, CC e RCEst para 12. Lipschitz DA. Screening for nutritional status in the elderly.
determinar qual destes métodos resultaria no melhor índice Prim Care. 1994;21(1):55-67.
antropométrico para discriminar alto risco coronariano, 13. Brasil. Ministério da Saúde. Vigilância Alimentar e Nutricional
- Sisvan: orientações básicas para a coleta, processamento,
sendo a RCEst considerada melhor indicador23, assim como análise de dados e informação em serviços de saúde. Brasília:
para avaliação de idosos24. Ministério da Saúde; 2004.
14. Roriz AK, Passos LC, Oliveira CC, Eickemberg M, Moreira
PA, Sampaio LR. Evaluation of the accuracy of anthropometric
CONCLUSÃO clinical indicators of visceral fat in adults and elderly. PLoS
One. 2014;9(7):e103499.
Com base nos índices antropométricos avaliados, a 15. Frizon V, Boscaini C. Circunferência do pescoço, fatores de
maioria dos pacientes hipertensos e/ou diabéticos aten- risco para doenças cardiovasculares e consumo alimentar. Rev
Bras Cardiol. 2013;26(6):426-34.
didos no ambulatório especializado apresentou alto risco 16. Motamed N, Perumal D, Zamani F, Ashrafi H, Haghjoo M,
de desenvolver DCV, sendo que o IC se correlacionou posi- Saeedian FS, et al. Conicity index and waist-to-hip ratio are
tivamente aos demais indicadores de risco cardiovascular superior obesity indices in predicting 10-year cardiovascular
risk among men and women. Clin Cardiol. 2015;38(9):527-34.
analisados. 17. Ferreira LS, Honorato D, Stulbach T, Narciso P. Avaliação
do IMC como indicativo de gordura corporal e comparação
de indicadores antropométricos para determinação de risco
REFERÊNCIAS cardiovascular em frequentadores de academia. Rev Bras Nutr
1. I Diretriz Brasileira de Prevenção Cardiovascular. Arq Bras Esp. 2013;7(42):324-32.
Cardiol. 2013;101(6 Supl. 2):1-63. 18. Almeida RT, Almeida MMG, Araújo TM. Obesidade abdominal
2. Organização Pan Americana da Saúde/Organização e risco cardiovascular: desempenho de indicadores antropomé-
Mundial da Saúde [Internet]. Brasília; 2017 [citado 2017 tricos em mulheres. Arq Bras Cardiol. 2009;92(5):375-80.
Jun 14]. Disponível em: https://www.paho.org/bra/index. 19. Stabe C, Vasques AC, Lima MM, Tambascia MA, Pareja JC,
php?option=com_content&view=article&id=5253:doe Yamanaka A, et al. Neck circumference as a simple tool for
ncas-cardiovasculares&Itemid=839 identifying the metabolic syndrome and insulin resistance:
3. Brasil. Ministério de Saúde. Portal Brasil. Doenças cardio- results from the Brazilian Metabolic Syndrome Study. Clin
vasculares causam quase 30% das mortes no País [Internet]. Endocrinol (Oxf). 2013;78(6):874-81.
Brasília; 2014 [citado 2017 Mai 13]. Disponível em: http:// 20. Silva MW, Pretto ADB, Borges LR. Association between neck
www.brasil.gov.br/saude/2011/09/doencas-cardiovasculares- circumference and cardiovascular risk in patients from a clinic
causam-quase-30-das-mortes-no-pais of nutrition. Rev Bras Nutr Clin. 2015;30(4):285-90.

BRASPEN J 2018; 33 (3): 271-5


274
Risco cardiovascular a partir de medidas antropométricas

21. Chaves CS, Leitão MPC, Braga Junior ACR, Sirino ACA. Iden- 23. Ho SY, Lam TH, Janus ED; Hong Kong Cardiovascular Risk
tification of risk factors for cardiovascular health personnel. Factor Prevalence Study Steering Committee. Waist to stature
Arq Ciênc Saúde. 2015;22(1):39-47. ratio is more strongly associated with cardiovascular risk
factors than other simple anthropometric indices. Ann Epide-
22. Hsieh SD, Yoshinaga H, Muto T. Waist-to-height ratio, a simple
miol. 2003;13(10):683-91.
and practical index for assessing central fat distribution and 24. Benedetti TRB, Meurer ST, Morini S. Índices antropométricos
metabolic risk in Japanese men and women. Int J Obes Relat relacionados a doenças cardiovasculares e metabólicas em
Metab Disord. 2003;27(5):610-6. idosos. Rev Educ Fis. 2012;23(1):123-30.

Local de realização do estudo: Faculdade de Nutrição da Universidade Federal de Pelotas, Pelotas, RS, Brasil.
Conflito de interesse: Os autores declaram não haver.

BRASPEN J 2018; 33 (3): 271-5


275
A Artigo Original
Ferreira KA et al.

Análise comparativa de métodos para estimativa


de estatura em idosos do estado de São Paulo
Comparative analysis of methods for estimation of height in the elderly of the state of São Paulo

RESUMO
Karina Amaral Ferreira1
Joice Rodrigues Campos1 Introdução: A antropometria é uma das etapas realizadas na avaliação nutricional, sendo impres-
Leticia Alves do Nascimento1 cindível para a determinação do estado nutricional. A população idosa apresenta relativo impe-
Jéssica de Jesus Lima1 dimento para mensuração deste parâmetro devido às particularidades fisiológicas dessa fase da
Viviane Chaer Borges2
Jéssica Rodrigues de Oliveira3 vida, principalmente no que diz respeito à aferição da estatura real. Objetivo: Analisar e comparar
Luciana Setaro4 a estatura mensurada em idosos com a envergadura, com a fórmula preditiva de Chumlea e com
a fórmula preditiva de Rabito. Método: Foram selecionados 60 idosos não institucionalizados e
não hospitalizados residentes no estado de São Paulo. Foram aferidas as seguintes medidas antro-
pométricas: estatura, altura do joelho e semienvergadura. Os dados coletados foram utilizados
para cálculo da estatura pela envergadura, da estatura pela fórmulas preditivas de Chumlea e de
Rabito. A análise foi realizada com média, desvio padrão, teste t-Student, coeficiente de correlação
de Pearson por R²; considerou-se significância estatística de 95%. Resultados: Pela análise do
teste t-Student, a fórmula preditiva de Rabito foi a que demonstrou resultados mais próximos da
estatura aferida nos idosos do estudo, seguida de Chumlea. A estatura estimada pelo dobro da
semienvergadura demonstrou superestimar a estatura aferida. Já considerando a correlação de
Pearson, a fórmula de Chumlea apresentou melhor reprodutibilidade, seguida por Rabito e a
envergadura. Conclusão: Sugere-se a realização de mais estudos com análise semelhante e com
uma população maior, a fim de verificar se os resultados obtidos com esse estudo se confirmam.

ABSTRACT
Unitermos: Introduction: Anthropometry is one of the steps performed in the nutritional evaluation, being
Antropometria. Nutrição em Saúde Pública. Nutrição
essential for the determination of nutritional status. The elderly population presents a relative
do Idoso. Idoso. Estatura.
impediment to the measurement of this parameter due to the physiological peculiarities of this
Keywords: phase of life, especially with regard to the measurement of the actual height. Objective: To
Anthropometry. Nutrition, Public Health. Elderly Nu- analyze and compare the height measured in the elderly with the wingspan, with the predictive
trition. Aged. Body Height. formula of Chumlea and with the predictive formula of Rabito. Methods: We selected 60 non-
institutionalized and non-hospitalized elderly people living in the State of São Paulo. The following
Endereço para correspondência: anthropometric measures were measured: height, knee height and semi-span. The data collected
Karina Amaral Ferreira were used to calculate stature by span, stature by the predictive formula of Chumlea and Rabito.
Rua das Orquídeas, 230, Parque Santa Delfa – Franco The analysis was performed with mean, standard deviation, t-Student test, Pearson correlation
da Rocha, SP, Brasil – CEP: 07809-210. coefficient by R², where a statistical significance of 95% was considered. Results: By the analysis
E-mail: karinaferreira.nutricao@gmail.com
of the t-Student test, the predictive formula of Rabito was the one that showed results closer to the
Submissão stature measured in the elderly of the study, followed by Chumlea. High estimated at double the
21 de janeiro de 2018 half-span showed to overestimate the stature measured. Considering Pearson’s correlation, the
formula of Chumlea presented better reproducibility, followed by Rabito and the scale. Conclusion:
Aceito para publicação Further studies with similar analysis and with a larger population are suggested in order to verify
15 de abril de 2018 if the results obtained with this study are confirmed.

1. Discente do Curso de Graduação em Nutrição pela Universidade Anhembi Morumbi, São Paulo, SP, Brasil.
2. Nutricionista, graduada pelo Faculdade de Ciências da Saúde São Camilo, doutora em Ciências da Saúde pela Universidade Federal de São
Paulo. Especialista em nutrição enteral e parenteral pela Sociedade Brasileira de Nutrição Parenteral e Enteral (SBNPE). Docente do curso de
nutrição pela Universidade Anhembi Morumbi, São Paulo, SP, Brasil.
3. Nutricionista, graduada pela Universidade Anhembi Morumbi, mestre em Ciências (Nutrição em Saúde Pública) pela Faculdade de Saúde
Pública - Universidade de São Paulo e doutoranda pela mesma instituição, docente do Curso de Graduação em Nutrição pela Universidade
Anhembi Morumbi, São Paulo, SP, Brasil.
4. Nutricionista, graduada pelo Centro Universitário São Camilo, Especialista em Fisiologia do Exercício - UNIFESP, Mestre em Nutrição Humana
Aplicada - USP Doutora em Ciências dos Alimentos – FCF-USP. Docente do curso de nutrição pela Universidade Anhembi Morumbi, São Paulo,
SP, Brasil.

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276
Análise comparativa de métodos para estimativa de estatura em idosos

INTRODUÇÃO Desta forma, o objetivo deste estudo foi verificar se


Um dos indicadores importantes para o diagnóstico nutri- existe diferença significativa entre a estatura mensurada em
cional é a antropometria, sendo uma das etapas realizadas idosos com a estatura obtida a partir de fórmulas preditivas:
na avaliação nutricional. O adequado estado nutricional envergadura, estatura obtida pela fórmula de Chumlea et
ao longo da vida é essencial para melhor qualidade de al.7 e Rabito et al.8. E, dentre essas fórmulas preditivas, qual
vida e longevidade. O envelhecimento apresenta alterações o método que mais se aproxima do valor real da estatura.
físicas e fisiológicas importantes no organismo humano, que
podem alterar o estado nutricional, muitas vezes causando MÉTODO
desnutrição1.
Trata-se de um estudo transversal no qual foram avaliados
O estado nutricional de idosos exerce influência sobre a 60 idosos não institucionalizados e não hospitalizados,
expectativa de vida desses, além de influência na morbidade escolhidos ao acaso, no período de setembro de 2017, com
e na redução das capacidades funcionais. A desnutrição em idade maior ou igual a 60 anos, residentes do estado de São
idosos é relatada em até 15% dos pacientes ambulatoriais e Paulo. Os critérios de exclusão do estudo foram adultos <60
em quase metade dos hospitalizados. Esse fator acarreta em
anos, pacientes em terapia nutricional e/ou com dificuldades
maior tempo de internação, aumento da taxa de reinternações,
motoras relacionadas à alimentação, idosos que não deam-
maior susceptibilidade à lesão de pressão e maior mortalidade.
bulassem e/ou que fossem portadores de doenças mentais ou
Desta forma, a detecção precoce da desnutrição tem impor-
senis (esquizofrenia, transtorno bipolar do humor, Alzheimer,
tante influência com a morbimortalidade do idoso1,2.
Parkinson, demência senil, depressão) ou qualquer outro
Uma das medidas necessárias para a avaliação do estado transtorno que dificultasse a transmissão de informações e,
nutricional é a estatura. Essa medida pode ser obtida pela assim, a coleta de dados.
forma convencional, com o indivíduo em pé. Sabe-se que,
O projeto foi aprovado pela Comissão Nacional de Ética
a partir dos 40 anos, a estatura tende a reduzir cerca de 1,0
em Pesquisa com Seres Humanos, com número de protocolo
a 2,5 cm por década devido às alterações morfológicas do
68419017.1.000.5492. Todos os idosos assinaram o Termo
envelhecimento. Porém, existem situações nas quais os idosos
de Consentimento Livre e Esclarecido.
com complicações clínicas podem não conseguir manterem-
se eretos em posição ortostática1,3. Para a coleta de dados, foi aplicado um questionário
com informações relativas à idade e ao gênero, seguido da
Na impossibilidade de aferir a estatura, pelo fato do
aferição das seguintes medidas antropométricas: estatura,
indivíduo estar acamado ou impossibilitado de deambular,
altura do joelho e semienvergadura.
vários métodos são preconizados para realizar a avaliação
nutricional. Dentre eles, as fórmulas preditivas para estimar O material utilizado foi um estadiômetro da marca
a estatura são as mais utilizadas. A partir de segmentos Sanny, com precisão de 1 mm, um antropômetro horizontal
corporais dos pacientes, ou partes destes, pode-se estimar ou infantômetro, com precisão de 1 mm, e uma fita métrica
a estatura, como comprimento do braço, a altura do joelho, inelástica, com precisão de 1 mm.
a envergadura e/ou semienvergadura, além de outros4,5. A estatura foi aferida com o auxílio de um estadiômetro,
O estado nutricional é um dos importantes indicadores estando o idoso (a) com os pés e pernas paralelos, com
para a prescrição dietética, além de verificar a eficácia braços relaxados e estendidos, e as palmas das mãos voltadas
do tratamento dietoterápico em pacientes hospitalizados. para o corpo. A cabeça foi posicionada no plano de Frank-
A estatura, além do fator genético, representa condições furt (quando a margem inferior da abertura do orbital e a
socioeconômicas, demográficas e de saúde vivenciadas pelo margem superior do meato auditivo externo estiverem em
indivíduo. Para definir o estado nutricional e, consequente- uma mesma linha horizontal), e feito contato das panturrilhas,
mente, a resposta terapêutica, é necessária a aferição de calcanhares, nádegas, ombros e região occipital, ou então
peso e da estatura, para consequente emprego do Índice pelo menos dos calcanhares, nádegas e ombros, além da
de Massa Corporal (IMC)3,4. cabeça na base do estadiômetro.
Apesar do IMC possuir limitações, entre elas não avaliar Após todos os pontos entrarem em contato com o
a distribuição da gordura corporal ou verificar a quantidade instrumento, foi abaixada a barra horizontal até o topo da
de massa magra em um indivíduo, é um método bastante cabeça (livre de tiaras, fitas, tranças, bobes ou penteados
utilizado, pois com seu resultado apresenta o diagnóstico de volume). Em seguida, foi realizada a leitura e anotado
nutricional inicial do paciente e a conduta terapêutica o valor obtido1,9.
a ser iniciada em pacientes hospitalizados. Além de ser A aferição da semienvergadura foi realizada com uma
uma técnica rápida e de baixo custo, oferece resultado fita métrica inelástica e com o idoso em pé, com o braço
confiável1,4,6. direito estendido perpendicularmente ao corpo, formando
BRASPEN J 2018; 33 (3): 276-81
277
Ferreira KA et al.

um ângulo de 90º e com o pulso reto e palmas das mãos Para comparação das médias, utilizou-se o Teste
voltadas para frente. Foi localizada a ponta da clavícula t-Student. A correlação entre as medidas de estatura aferidas
direita e a incisura esternal e, em seguida, foi medida a e estimadas foi verificada utilizando-se a correlação de
distância a partir da extremidade do dedo médio até a linha Pearson pelo R². Esse valor apresenta maior confiabilidade
média do corpo (incisura esternal)9,10. nos resultados, sendo que, quanto mais próximo ao valor
A altura do joelho foi medida colocando o paciente de 1, maior a correlação entre os valores obtidos, ou seja,
sentado o mais próximo possível da ponta da cadeira ou está mais próximo do valor mensurado (estatura aferida). Foi
assento, com os pés apoiados em chão firme, formando considerada significância estatística de 95%. A tabulação
um ângulo de 90º. Com o auxílio de um infantômetro, foi dos dados foi feita com o programa Jamovi®0.8.0.9.
medido o comprimento do joelho entre o calcanhar e o ponto
ósseo externo logo abaixo da rótula (cabeça da tíbia), na RESULTADOS
perna esquerda10,11.
Participaram do estudo 60 idosos, com predomínio do
As fórmulas utilizadas para os cálculos foram feitas
sexo feminino (53%). A idade média (DP) dos participantes
baseadas na fórmula preditiva de Chumlea et al.7, cálculo
do estudo foi de 70,2 (±6,84) anos, sendo que a idade
esse que foi desenvolvido para estimar a altura em idosos
mínima no geral foi de 60 anos e a idade máxima, 84 anos
americanos; e pela fórmula preditiva de Rabito et al.8, utili-
(p=0,754). Para mulheres, a média resultou em 69,4 (±7,59)
zada para estimar a altura de brasileiros acima de 18 anos.
As fórmulas estão descritas na Tabela 1, já o cálculo para anos, com idade mínima de 60 anos e máxima de 84 anos.
encontrar a envergadura foi feito a partir da multiplicação Para homens, a média resultou em 70,5 (±6,01) anos, com
da semienvergadura por 27,8,12. idade mínima de 61 anos e máxima de 83 anos.

Ao final da coleta de dados, como contribuição por ter A Tabela 2 apresenta a correlação e a descrição das
participado da pesquisa, foram realizadas orientações gerais medidas estimadas por Chumlea, pela envergadura e por
sobre alimentação e hábitos de vida saudáveis e entregue Rabito, com informações sobre a média, desvio padrão e o
um folder explicativo sobre o tema para cada participante, p encontrados para os idosos.
de acordo com as dicas adaptadas da Sociedade Brasileira A envergadura calculada a partir do dobro da semien-
de Geriatria e Gerontologia (SBGG)13. vergadura foi o método que apresentou maior diferença
significativa com relação aos demais, sendo que a medida
calculada pelo método de Rabito e Chumlea foi a medida que
mais se aproxima da estatura aferida nos idosos do estudo,
Tabela 1 – Cálculos utilizados para estimativa de altura, segundo Chumlea
e Rabito. sendo o primeiro o que teve o resultado mais próximo ao da
estatura mensurada. A Figura 1 demonstra a correlação entre
Fórmulas preditivas para estatura por Chumlea et al.7
a estatura real e as estimadas pelas fórmulas na amostra. É
Homens Altura = 64,19 – (0,04 x idade) + (2,02 x AJ*)
possível perceber que as estimativas de estatura apresentam
Mulheres Altura = 84,88 – (0,24 x idade) + (1,83 x AJ*)
boa correlação com a estatura real.
Fórmulas preditivas para estatura por Rabito et al.8
O índice de correlação e o intervalo de confiança [IC (95%)]
Homens Altura = 63,525 – (3,237 x 1) – (0,06904 x idade) + (1,293 encontrados na Figura 1 demonstraram que a fórmula preditiva
x semienvergadura)
de Chumlea foi a que demonstrou melhor correlação, sendo o
Mulheres Altura = 63,525 – (3,237 x 2) – (0,06904 x idade) + (1,293
valor de R² 0,749 [R 0,865 (0,783-0,918)]. As demais fórmulas
x semienvergadura)
BAJ=Altura do joelho.
também demonstraram correlação positiva com a estatura
Fonte: Chumlea et al.7 Rabito et al.8. aferida, sendo os valores de R² 0,646 [R 0,804 (0,691-0,879)]

Tabela 2 – Médias da estatura aferida com a estatura estimada por Chumlea pela envergadura e por Rabito, na amostra total e de acordo com o gênero,
São Paulo, 2017.
Variáveis de exposição Geral (n=60) Masculino (n=28) Feminino (n=32)
Média DP p Média DP p Média DP p
Estatura aferida (cm) 159,20 ±8,63 - 166,14 ±6,73 - 153,13 ±4,56 -
Chumlea et. al. (cm)7
160,32 ±8,63 0,052 166,67 ±6,50 0,546 154,76 ±4,26 0,036
Envergadura (cm) 164,74 ±9,57 <0,001 171,86 ±5,83 <0,001 158,50 ±7,67 <0,001
Rabito et al.8 (cm) 160,20 ±7,46 0,099 166,53 ±3,80 0,691 154,69 ±5,07 0,046

BRASPEN J 2018; 33 (3): 276-81


278
Análise comparativa de métodos para estimativa de estatura em idosos

e R² 0,705 [R 0,840 (0,744-0,901)] para a envergadura e para com a altura aferida, onde R² 0,583 [R 0,763 (0,546-0,885)].
a fórmula preditiva de Rabito, respectivamente. De acordo com a Figura 3, o método de Rabito apresentou
Para homens, conforme demonstrado na Figura 2, melhor correlação com a estatura aferida para mulheres,
Chumlea foi o método que melhor apresentou a correlação com valor de R² 0,380 [R 0,616 (0,341-0,794)].

Figura 1 - Correlação entre a estatura aferida e diversas fórmulas de estimativa de estatura Chumlea et al.7 ; Rabito et al.8 em idosos (n=60). São Paulo, 2017.

Figura 2 - Correlação entre a estatura aferida e diversas fórmulas de estimativa de estatura (Chumlea et al.7 ; Rabito et al.8; Envergadura) em homens idosos (n=28). São
Paulo, 2017.

Figura 3 - Correlação entre a estatura aferida e diversas fórmulas de estimativa de estatura (Chumlea et al.7; Rabito et al. 8; Envergadura) em mulheres idosas (n=32).
São Paulo, 2017.

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279
Ferreira KA et al.

DISCUSSÃO o sexo feminino. Porém, assim como verificado nesse estudo,


Diversas equações foram elaboradas com intuito de se os autores verificaram que a fórmula preditiva por Rabito foi
estimar a estatura, principalmente se tratando de pacientes a que mais se aproximou da estatura real nas mulheres4.
enfermos que possuem dificuldade de manter-se eretos ou Houve dificuldades durante a mensuração das variáveis
até mesmo em idosos devido ao alto risco de queda. Uma antropométricas, tendo em consideração a perda do equi-
das melhores formas utilizadas para a estimativa da estatura, líbrio, menor mobilidade e diminuição da massa muscular.
ao longo do tempo, foi a partir da estrutura de ossos longos, Essa dificuldade é natural considerando as características
principalmente da medida da altura do joelho, sendo uma inerentes ao envelhecimento, principalmente na mensuração
medida que pouco se altera ao longo da vida. Apesar desta da semienvergadura, devido à rigidez articular e ao tempo
medida ser uma das mais utilizadas para estimar a estatura, a necessário para ser realizada a medida3.
medida que se refere ao dobro da semienvergadura também
é muito utilizada devido a sua fácil aplicação14,15. CONCLUSÃO
Foi realizado um estudo com 180 idosos, com prevalência
As fórmulas preditivas de Chumlea e Rabito demonstraram
da população feminina e que não tinham dificuldades em
ser métodos que podem ser utilizados como métodos alter-
deambular, a fim de verificar a eficácia dos métodos de
nativos para se estimar a estatura em idosos. O cálculo da
estimativa da estatura nessa faixa etária. Os autores encon-
traram correlação entre a estatura aferida com a estatura estatura a partir da semienvergadura mostrou superestimar a
estimada por Chumlea, sendo o valor de R 0,84 e o intervalo estatura de idosos desse estudo. Sugerem-se mais estudos com
de confiança (IC95%) de 0,66-0,91. Esses resultados são análise semelhante e com uma população maior, a fim de veri-
muito similares aos encontrados neste estudo, independente ficar se os resultados obtidos com esse estudo se confirmam.
da diferença de gênero entre os estudos16.
Um trabalho semelhante, sobre a estimativa de estatura, REFERÊNCIAS
foi realizado, porém a amostra se deu por 62 pacientes 1. Souza R, Fraga JS, Gottschall CBA, Busnello FM, Rabito EI.
oncológicos maiores de 18 anos. Foi estimada a estatura pela Avaliação antropométrica em idosos: estimativas de peso e altura
e concordância entre classificações de IMC. Rev Bras Geriatr
fórmula de Chumlea e a envergadura pela semienvergadura.
Gerontol. 2013;16(1):81-90.
Os resultados demonstrados nesse estudo verificaram 2. Sampaio HAC, Sabry MOD. Nutrição em doenças crônicas:
que o método proposto por Chumlea possui maior repro- prevenção e controle. 2ª ed. São Paulo: Atheneu; 2013.
3. Lima MFS. Aplicabilidade das equações de estimativa de peso
dutibilidade com relação à medida pelo dobro da semien- e estatura e em idosos residentes em instituições de longa
vergadura, sendo a correlação entre a estatura aferida pela permanência no município de Natal – RN. Natal [Dissertação de
estimada por Chumlea de R² 0,5967 (IC95% 1,64-1,74) e mestrado]. Natal: Universidade Federal do Rio Grande do Norte;
2014. [acesso 2017 Nov 17]. Disponível em: https://repositorio.
entre a estatura aferida pelo dobro da semienvergadura de
ufrn.br/jspui/handle/123456789/19628
R² 0,7147 (IC95% 1,69-1,74)16. 4. Melo APF. Análise comparativa de métodos de estimativa
Outro estudo estimou a estatura de 60 pacientes com de altura em adultos e idosos hospitalizados [Dissertação
de mestrado]. Florianópolis: Universidade Federal de Santa
ventilação mecânica de uma Unidade de Terapia Intensiva, Catarina; 2014. [acesso 2017 Mar 25]. Disponível em: https://
sendo encontrada boa correlação na formula de Chumlea, repositorio.ufsc.br/handle/123456789/129237?show=full
com um R2 0,78917. 5. Melo APF, Salles RK, Vieira FGK, Ferreira MG. Methods for
estimating body weight and height in hospitalized adults: a
Estudo realizado em Niterói, Rio de Janeiro, avaliou 90 comparative analysis. Rev Bras Cineantropom Desempenho
idosos do sexo feminino, com idade entre 60 e 84 anos. Na Hum. 2014;16(4):475-84.
pesquisa foi encontrada diferença significativa em Chumlea, 6. Pereira IFS, Spyrides MHC, Andrade LMB. Estado nutricional de
idosos no Brasil: uma abordagem multinível. Cad Saúde Pública.
com R² 0,65, e Rabito, com R² 0,88. No estudo em questão, 2016;32(5):e00178814.
a fórmula preditiva de Chumlea foi a que mais se aproximou 7. Chumlea WC, Roche AF, Steinbaugh ML. Estimating stature
da estatura aferida, o que difere no estudo em questão, sendo from knee height for persons 60 to 90 years of age. J Am Geriatr
a estatura estimada por Rabito o valor que mais se aproximou Soc. 1985;33(2):116-20.
8. Rabito EI, Vannucchi GB, Suen VMM, Castilho Neto LL,
da estatura aferida dos idosos18. Marchini JS. Weight and height prediction of immobilized
Foi observado em um estudo elaborado com 142 adultos patients. Rev Nutr. 2006;19(6):655-61.
9. Santos EA, Camargo RN, Paulo AZ. Análise comparativa de
entre 20 a 60 anos que os valores encontrados utilizando a fórmulas de estimativa de peso e altura para pacientes hospita-
altura do joelho foram os que tiveram menor diferença média lizados. Rev Bras Nutri Clin. 2012.27(4):218-25.
significativa (p>0,05), comparado aos cálculos utilizando 10. Bon AMX, Leung MCA, Galisa MS, Mesquita DM. Atendimento
a semienvergadura. Os autores também relatam que as nutricional: uma visão prática. Adultos e idosos. São Paulo: M.
Books: 2013. 136 p.
medidas utilizando a semienvergadura podem superestimar 11. Rossi L, Caruso L, Galante AP. Avaliação nutricional: Novas
a estatura em 9 cm para o sexo masculino e em 6 cm para perspectivas. 2ª ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan; 2015.

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280
Análise comparativa de métodos para estimativa de estatura em idosos

12. Henz L. Avaliação da aplicabilidade das fórmulas preditivas de 16. Campos JADB, Prado CD, Pinelli C, Garcia PPNS. Métodos
peso e estatura: uma revisão narrativa [Trabalho de Conclusão de estimativa de peso e altura na avaliação de desnutrição de
de Curso]. Porto Alegre: Universidade Federal do Rio Grande pacientes com câncer. Alim Nutr. 2012;23(4):681-8.
do Sul; 2016. 17. L’her E, Martin-Babau J, Lellouche F. Accuracy of height esti-
13. Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia. Dicas. [acesso mation and tidal volume setting using anthropometric formulas
2017 Mar 25]. Disponível em: http://sbgg.org.br/dicas/ in na ICU Caucasian population. Ann Intensive Care. 2016;6:55.
14. Yugue SF, Ide HW, Tiengo A. Comparação da avaliação antro- [acesso 2017 Out 17]. Disponível em: https://www.ncbi.nlm.nih.
pométrica em pacientes internados por intermédio de métodos gov/pmc/articles/PMC4916127/
estimativos e diretos. Rev Ciênc Saúde. 2011;1(3):1-10. 18. Silva LC. Comparação da estatura medida e estimada por dife-
15. Closs VE, Feoli AMP, Schwanke CHA. Altura do joelho como rentes equações em mulheres idosas residentes de Niterói, Rio de
medida alternativa confiável na avaliação nutricional de idosos. Janeiro Trabalho de conclusão de curso]. Niterói: Universidade
Rev Nutr. 2015;28(5):475-84. Federal Fluminense; 2016.

Local de realização do estudo: Universidade Anhembi Morumbi, São Paulo, SP, Brasil.

Conflito de interesse: Os autores declaram não haver.

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281
A Artigo Original
Zanin J et al.

Qualidade da dieta de pacientes com doenças


cardiovasculares atendidos em um hospital de
alta complexidade
Quality of patients’ diet with cardiovascular diseases attended in a high complexity hospital

RESUMO
Jamile Zanin1
Andriele Pinheiro Nunes1 Introdução: As doenças crônicas não transmissíveis estão entre os maiores problemas de saúde
Maria Cristina Zanchim2 pública nos dias atuais e são responsáveis por grande parte das mortes ocorridas no país, sendo as
Daiana Argenta Kümpel2 doenças cardiovasculares as que aparecem como a principal causa. O consumo de alimentos ricos
em gordura e com alta densidade energética, a inatividade física, o hábito de fumar e consumo
excessivo de álcool, ganham destaque no aumento do risco cardiovascular. Em contrapartida,
o consumo de frutas e vegetais é considerado importante fator na sua prevenção. Objetivo:
Avaliar a qualidade da alimentação de pacientes com doenças cardiovasculares atendidos
em um hospital de alta complexidade. Método: Trata-se de um estudo transversal, realizado
com adultos e idosos, internados com diagnóstico de doença cardiovascular. As características
sociodemográficas e diagnóstico principal foram obtidos do prontuário eletrônico. Investigou-se
a presença de fatores de risco implicados no desenvolvimento destas doenças e o recebimento
de orientação nutricional. Para avaliação do estado nutricional, foi realizado o cálculo do Índice
de Massa Corporal e aferida a circunferência da cintura (CC). Na avaliação da qualidade da
alimentação foi utilizado o questionário “Como está sua alimentação?” do Ministério da Saúde
de 2006. Resultados: Participaram do estudo 76 pacientes, sendo a maioria do sexo masculino
(52,6%), com idade média de 65,5±11,6 anos. A hipertensão arterial sistêmica e a inatividade
física estavam presentes em 69,7% e 90,8% dos pacientes, respectivamente. A maior parte dos
participantes tinha excesso de peso (46,1%) e algum risco para o desenvolvimento de complicações
metabólicas relacionadas à CC (77,3%). Em relação à qualidade da dieta, 63,2% dos pacientes
apresentaram uma alimentação parcialmente adequada. Conclusão: Conclui-se que considerável
parcela dos cardiopatas estudados apresentava qualidade de alimentação deficitária, além de
expressivo excesso de peso e acúmulo de gordura abdominal.

ABSTRACT
Introduction: The chronic non-communicable diseases are among the biggest public health
Unitermos: problems nowadays and are responsible for the most part of the deaths in Brazil, and cardiovascular
Doenças Cardiovasculares. Consumo Alimentar. diseases appear as the main cause. Consuming foods rich in fat and with high energy density,
Dieta. Pacientes Internados. physical inactivity, smoking and excessive consumption of alcohol are among the main risk factors
for the development of these diseases. Fruits and vegetables are considered an important factor
Keywords: in its prevention. Objective: To evaluate the quality of patients’ diet with cardiovascular diseases
Cardiovascular Diseases. Food Consumption. Diet. that were attended in a hospital of high complexity. Methods: A cross-sectional study, with adults
Inpatients. and elderly patients, hospitalized with a diagnosis of cardiovascular disease. The sociodemographic
characteristics and main diagnosis were taken from the chart. It was investigated the presence
Endereço para correspondência:
of risk factors for the development of these diseases and the receipt of nutritional orientation. To
Jamile Zanin
evaluate the nutritional status, the body mass index and waist circumference (WC) were calculated.
Rua Bento Gonçalves, 270/402 – Edifício Albatroz,
– Centro – Marau, RS, Brasil – In the evaluation of the feed’s quality was used the questionnaire “How is your feed?” from the
CEP: 99150-000. Ministry of Health, Brazil - 2006. Results: A total of 76 patients have participated in the study,
E-mail: jamile.zanin@gmail.com most of the masculine gender with mean age of 65.5±11.6 years. The most observed risk factors
are systemic arterial hypertension (SAH) and physical inactivity, observed in 69.7% and 90.8% of
Submissão the patients, respectively. Most of the participants presented overweight (46.1%) and some risk for
15 de abril de 2018 the development of metabolic complications related to elevated WC (77.3%). Regarding the diet’s
quality, 63.2% of the patients presented a partially adequate diet. Conclusion: It was concluded
Aceito para publicação that a considerable proportion of the patients with heart disease present deficient feeding, besides
3 de julho de 2018 being overweight and accumulating abdominal fat.

1. Acadêmica do Curso de Nutrição. Universidade de Passo Fundo, Passo Fundo, RS, Brasil.
2. Nutricionista. Mestre em Envelhecimento Humano pela Universidade de Passo Fundo. Professora do Curso de Nutrição na Universidade de
Passo Fundo, Passo Fundo, RS, Brasil.

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282
Qualidade da Dieta de pacientes com doenças cardiovasculares

INTRODUÇÃO MÉTODO
As doenças crônicas não transmissíveis (DCNT) estão Trata-se de um estudo transversal com adultos e idosos,
entre os maiores problemas de saúde pública nos dias de hoje de ambos os gêneros, com diagnóstico de doença cardio-
e são responsáveis por grande parte das mortes ocorridas vascular, atendidos nos postos de internação do Hospital São
no Brasil. No ano de 2011, 800.118 óbitos foram relacio- Vicente de Paulo (HSVP), da cidade de Passo Fundo, RS, no
nados às DCNT, sendo que as doenças cardiovasculares período de julho a agosto de 2017.
apareceram como a principal causa, seguida das neoplasias, Para o cálculo amostral, levou-se em consideração um
doenças respiratórias e diabete mellitus¹. nível de confiança de 95%, poder estatístico de 80%, razão
As enfermidades cardiovasculares representaram a maior não exposto: exposto de 1:3, prevalência da doença no grupo
parte das despesas do Sistema Único de Saúde (SUS), no exposto de 60%, considerando exposição excesso de peso
período de 2008 a 2012, totalizando cerca de 51,3% dos e consumo alimentar inadequado razão de prevalência de
gastos, visto que a presença de uma morbidade crônica como 2,0, totalizando 120 pacientes. Entretanto, no período da
esta impacta diretamente na qualidade de vida do paciente, pesquisa, foi possível alcançar uma amostra de 76 pacientes.
gerando a necessidade de muitos cuidados em saúde². Como critérios de exclusão foram considerados: tempo
O consumo de alimentos ricos em gordura e com alta de internação superior a 72 horas; ser gestante ou lactante;
densidade energética, a inatividade física, o fumo e consumo pacientes em uso de terapia nutricional enteral ou parenteral
excessivo de álcool estão entre os principais fatores de risco exclusiva; com quadro clínico paliativo; os internados nas
para desenvolvimento destas doenças³. Ainda, a história unidades de terapia intensiva, salas de recuperação ou emer-
familiar de hipertensão arterial, o diabetes e as dislipidemias gência; amputados ou com membro corporal engessado;
potencializam o risco para o desenvolvimento de doença com ascite ou edema; e aqueles incapazes de responder
cardiovascular, especialmente quando encontradas em às perguntas ou que estivessem sem acompanhante no
parentes de primeiro grau e associadas a um estilo de vida momento da avaliação.
inadequado4. Foram coletados dados de prontuários e aplicado um
Dados da literatura têm demonstrado que os compor- questionário padronizado elaborado pelas pesquisadoras.
tamentos mais prevalentes em pacientes que apresentam Dos prontuários foram obtidos os dados referentes ao gênero,
doença cardiovascular são o hábito de fumar, a inatividade idade, cor da pele, estado civil, escolaridade, profissão e
física e consumo excessivo de gorduras de origem animal5. diagnóstico clínico da internação. Utilizou-se para avaliação
Rombaldi et al.6 comprovaram isso ao avaliar adultos e da classe econômica o questionário Critério de Classificação
idosos, identificando frequência de consumo exagerado Econômica Brasil-ABEP9, no qual o nível socioeconômico
de alimentos ricos em gordura, como lácteos integrais e foi definido a partir da quantidade de itens presentes na
gordura aparente das carnes, excedendo as recomendações residência, grau de instrução do chefe de família e o acesso
preconizadas pelo Ministério da Saúde, principalmente nos a serviços públicos.
grupos mais jovens e de maior nível econômico, implicando Na sequência, investigou-se o recebimento de orientações
assim no aumento do risco para o desenvolvimento de sobre a alimentação para a afecção em questão, bem como
doenças crônicas. informações sobre o estilo de vida com relação à prática de
Em contrapartida, o consumo de frutas e vegetais é atividade física e fatores de risco para desenvolvimento de
considerado um fator importante na prevenção e controle doença cardiovascular, como o hábito de fumar, presença
das doenças cardiovasculares, pois estes grupos de alimentos de dislipidemias, hipertensão arterial e diabetes mellitus.
apresentam baixa densidade energética, fibras solúveis e Para avaliação do estado nutricional, o peso corporal foi
insolúveis e são boas fontes de micronutrientes³. Além disto, mensurado em balança digital com capacidade para 150 kg
as frutas, quando consumidas na quantidade adequada e precisão de 100 g, com o paciente descalço e com roupas
(3 porções/dia)7, estão relacionadas à proteção para a leves. A estatura foi mensurada pelo estadiômetro acoplado à
obesidade abdominal e hipertrigliceridemia. Entretanto, um balança, com capacidade para 200 cm e precisão de 0,1cm,
consumo inadequado destes grupos é comumente observado com o paciente em pé, descalço, em posição ortostática,
na população adulta8. com os calcanhares juntos, costas retas e braços estendidos
Tendo em vista que o consumo alimentar está direta- ao longo do corpo.
mente relacionado com o desenvolvimento e tratamento Ambos, peso e estatura, foram mensurados seguindo os
das doenças cardiovasculares, este estudo teve como parâmetros descritos pelo manual do Sistema de Vigilância
objetivo avaliar a qualidade da alimentação de portadores Alimentar e Nutricional (SISVAN)10. A partir das variáveis
dessas enfermidades, atendidos em um hospital de alta peso e estatura, foi realizado o cálculo do Índice de Massa
complexidade. Corporal (IMC) por meio da equação: peso/estatura²,
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283
Zanin J et al.

bem como a classificação do estado nutricional para este


Tabela 1 – Características demográficas e socioeconômicas dos pacientes
marcador, segundo os pontos de corte estabelecidos pela participantes do estudo. Passo Fundo, RS, 2017 (n=76).
Organização Mundial da Saúde (OMS)11, para os adultos,
Variáveis Categorias n %
e Lipschitz12, para os idosos.
Sexo
A circunferência da cintura (CC) foi aferida com a fita
Masculino 40 52,6
métrica no ponto médio localizado entre as costelas e a crista
ilíaca, sem comprimir os tecidos. Nos casos em que não foi Feminino 36 47,4
possível identificar a menor curvatura, foi utilizada a medida Estado civil
2 cm acima da cicatriz umbilical. O risco para complicações Solteiro 5 6,6
metabólicas associadas à obesidade foi estimado, conside- Casado 54 71,1
rando os pontos de corte preconizados pela OMS11.
União estável 5 6,6
Na avaliação da qualidade da alimentação, foi utilizado o
Divorciado 6 7,9
questionário “Como está sua alimentação?” elaborado pela
Coordenação Geral de Alimentação e Nutrição do Ministério Viúvo 6 7,9
da Saúde do Brasil– CGAN/MS7. O teste conta com 18 Cor da pele
perguntas relacionadas ao consumo alimentar do indivíduo, Branco 67 88,2
envolvendo o número de refeições realizadas diariamente, Não branco 9 11,8
quantidade consumida de alimentos de diferentes grupos
Faixa etária
como verduras e legumes, frutas, leite e derivados, feijões,
36 a 39 anos 1 1,3
doces, gorduras e embutidos, tipo de gordura utilizada no
preparo das refeições, adição de sal, consumo hídrico e a 40 a 49 anos 7 9,3
prática de atividade física. A partir destas, os indivíduos foram 50 a 59 anos 15 19,7
classificados de acordo com as seguintes categorias: até 60 a 69 anos 25 32,9
28 pontos – “inadequado”; entre 29 a 42 – “parcialmente 70 anos ou 28 36,8
adequado”; 43 pontos ou mais – “adequado”. mais
O estudo foi aprovado pela Comissão de Pesquisa e Pós- Escolaridade
Graduação do HSVP e pelo Comitê de Ética da Pesquisa da Ensino 33 43,4
Universidade de Passo Fundo, sob parecer de nº 2.125.265. fundamental
Os indivíduos foram preservados pelo Termo de Consenti- incompleto
mento Livre e Esclarecido. Ensino 15 19,7
Os dados foram digitados e analisados no software de fundamental
completo
estatística, sendo realizadas análises descritivas de frequên-
cias, média e desvio padrão. Ensino médio 3 3,9
incompleto
Ensino médio 15 19,7
RESULTADOS completo
Foram avaliados 76 pacientes, dos quais 40,8% estavam Ensino superior 1 1,3
hospitalizados para tratamento por cardiopatia isquêmica. incompleto
A média de idade foi de 65,5±11,6 anos, sendo 30,3% Ensino superior 9 11,8
adultos, 69,7% idosos e 52,6% do gênero masculino. A completo
maioria era casada (71,1%), branca (88,2%), com ensino Profissão
fundamental incompleto (43,4%), aposentados (40,8%) Aposentado 31 40,8
e pertencentes à classe econômica C (43,4%), conforme Do lar 11 14,5
Tabela 1.
Outros 34 44,7
Quanto ao estilo de vida e fatores de risco para o
Classe econômica
desenvolvimento das doenças cardiovasculares, observou-
se predominância de pacientes com Hipertensão Arterial Classe A 5 6,6
Sistêmica (HAS) (69,7%), 56,6% referiram não apresentar Classe B 29 38,2
dislipidemias e 30,3% relataram ser diabéticos. Em relação Classe C 33 43,4
à prática de atividade física, 90,8% declararam não praticar Classe D ou E 9 11,8
nenhum tipo de exercício e apenas 10,5% tinham hábito de
BRASPEN J 2018; 33 (3): 282-9
284
Qualidade da Dieta de pacientes com doenças cardiovasculares

fumar. Sobre os cuidados com a alimentação, 55,3% afir-


Tabela 3 – Estado nutricional dos pacientes participantes do estudo. Passo
maram ter recebido alguma orientação nutricional, sendo Fundo, RS, 2017 (n=76).
que, destes, a maioria citou o médico como fonte da mesma
Variáveis Categorias n %
(Tabela 2).
IMC adulto
Sobre o estado nutricional, a média de peso encontrada
foi de 77,7±19,2 kg, a estatura de 162,9±21,4 cm e o IMC Eutrófico 8 10,5
28,3±5,8 kg/m². Somando-se os adultos e idosos avaliados, Sobrepeso 5 6,6
o excesso de peso corporal se mostrou presente em 46,1% Obesidade 10 13,1
e quanto à CC, 77,3% apresentaram algum risco para o IMC idoso
desenvolvimento de complicações metabólicas (Tabela 3).
Baixo peso 3 4
Quando avaliada a qualidade da alimentação, observou-
Eutrófico 30 39,4
se que 35,5% dos pacientes apresentavam alimentação
inadequada, 63,2% parcialmente adequada e apenas 1,3% Excesso de peso 20 26,3
tinham uma alimentação adequada. Sobre o fracionamento CC
das refeições, a maioria (57,9%) realizava de três a quatro Sem risco de complicações 17 22,4
refeições diariamente. Com relação às frutas e verduras, metabólicas
apenas 27,6% e 32,9% obtiveram o consumo adequado Risco elevado de complica- 17 22,4
destes grupos, respectivamente. Verificou-se ainda, que ções metabólicas
42,1% ingeriam entre 4,5 e 7,5 porções de carboidratos Risco muito elevado de 42 55,3
diariamente. complicações metabólicas
Referente ao consumo de carnes e ovos, 56,6% manti- CC=Circunferência da Cintura; IMC=Índice de Massa Corporal

nham o consumo habitual de uma porção desses alimentos


diariamente, entretanto, 42,1% não retiravam a gordura
aparente das carnes. O consumo de peixes semanal mostrou-
se presente em 50% dos pacientes. Ainda, 73,6% ingeriam
entre uma a duas porções de lácteos ao dia, sendo que o
Tabela 2 – Estilo de vida e fatores de risco para desenvolvimento de consumo deste grupo de alimentos na forma integral foi
doenças cardiovasculares dos pacientes participantes do estudo. Passo
relatado por 78,9% dos avaliados.
Fundo, RS, 2017 (n=76).
Quando avaliado o consumo de leguminosas, a maioria
Variáveis Categorias n %
(51,3%) não ingeria ou tinha um consumo inferior ao ideal
Atividade física (menos que cinco porções semanais). E em relação às
Não 69 90,8 frituras e embutidos, apenas 19,7% e 17,1% referiam nunca
Sim 7 9,2 consumir ou consumir menos que duas porções sema-
Hábito de fumar nais; e para o grupo dos doces a frequência evidenciada
de baixo consumo, isto é, nunca consumir ou consumir
Não 68 89,5
menos que duas porções semanais, foi de 25% e 26,3%,
Sim 8 10,5 respectivamente.
HAS
Quando questionados sobre o tipo de gordura utilizada
Não 23 30,3 na preparação de alimentos em domicílio, os óleos vegetais
Sim 53 69,7 aparecem com maior frequência (65,8%), seguidos pela
Dislipidemia banha animal ou manteiga (31,6%). Em relação à adição de
sal nos alimentos já servidos no prato, 73,7% dos pacientes
Não 43 56,6
relataram não adicionar. O consumo de bebidas alcoólicas
Sim 33 43,4
foi negado pela maioria dos participantes (72,4%) (Tabela 4).

Diabete mellitus Não 53 69,7


DISCUSSÃO
Sim 23 30,3
Como em outros estudos realizados com pacientes cardio-
Orientação nutricional
patas hospitalizados, a pesquisa apresentou maior número
Não 34 44,7 de indivíduos do sexo masculino, casados, da raça branca e
Sim 42 55,3 com idade superior a 60 anos13-15. O diagnóstico principal
HAS=Hipertensão Arterial Sistêmica de internação encontrado na maioria dos entrevistados foi
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285
Zanin J et al.

Tabela 4 – Qualidade da dieta dos pacientes participantes do estudo. Passo Continuação Tabela 4 – Qualidade da dieta dos pacientes participantes
Fundo, RS, 2017 (n=76). do estudo. Passo Fundo, RS, 2017 (n=76).
Variáveis Consumo alimentar n % Variáveis Consumo alimentar n %
Frutas Não como frutas, nem suco de 17 22,4 Lácteos Não consumo leite, nem derivados 4 5,3
frutas natural todos os dias
3 ou mais copos de leite ou 16 21,1
3 ou mais unidades/fatias/pedaços/ 21 27,6 pedaços/fatias/porções
copos de suco natural
2 copos de leite ou pedaços/ 28 36,8
2 unidades/fatias/pedaços/copo de 22 28,9 fatias/porções
suco natural
1 ou menos copos de leite ou 28 36,8
1 unidade/fatias/pedaços/copo de 16 21,1
pedaços/fatias/porções
suco natural
Tipo de lácteos Integral 60 78,9
Legumes e ver- Não como legumes, nem verduras 15 19,7
duras todos os dias Com baixo teor de gorduras 16 21,1
3 ou menos colheres de sopa 15 19,7 Frituras e Raramente ou nunca 15 19,7
embutidos
4 a 5 colheres de sopa 21 27,7
Todos os dias 3 3,9
6 a 7 colheres de sopa 19 25
De 2 a 3 vezes por semana 27 35,5
8 ou mais colheres de sopa 6 7,9
De 4 a 5 vezes por semana 18 23,7
Leguminosas Não consumo 6 7,9
Menos que 2 vezes por semana 13 17,1
2 ou mais colheres de sopa por dia 29 38,2
Doces em geral Raramente ou nunca 19 25
Consumo de menos de 5 vezes por 33 43,4
semana Menos que 2 vezes por semana 20 26,3
1 colher de sopa ou menos por dia 8 10,5 De 2 a 3 vezes por semana 19 25
Carboidratos Nenhuma porção - - De 4 a 5 vezes por semana 5 6,6
gerais Todos os dias 13 17,1
Menos de 3 porções 14 18,4 Gordura utilizada Banha animal ou manteiga 24 31,6
De 3 a 4,4 porções 27 35,5 Óleo vegetal, como soja, girassol, 50 65,8
De 4,5 a 7,5 porções 32 42,1 milho, algodão ou canola

Mais que 7,5 porções 3 3,9 Margarina ou gordura vegetal 2 2,6

Carnes Não consumo nenhum tipo de 5 6,6 Sal adicionado Sim 20 26,3
carne Não 56 73,7
1 pedaço/fatia/colher de sopa ou 43 56,6 Refeições diárias Menos que 3 refeições 11 14,5
1 ovo
De 3 a 4 refeições 45 59,2
2 pedaços/fatias/colheres de sopa 22 28,9
De 5 a 6 refeições 20 26,3
ou 2 ovos
Uso de álcool Diariamente 3 3,9
Mais de 2 pedaços/fatias/colheres 6 7,9
de sopa ou mais de 2 ovos 1 a 6 vezes na semana 4 5,3
Eventualmente ou raramente 14 18,4
(menos de 4 vezes ao mês)
Não consumo 55 72,4
Gordura das Remove a gordura aparente 38 50
carnes
Não remove a gordura aparente 32 42,1
Não como carne vermelha ou 6 7,9 a cardiopatia isquêmica, diferentemente do verificado em
frango outras pesquisas, que identificaram o acidente vascular
Peixes Não consumo 9 11,8 encefálico e a insuficiência cardíaca congestiva como as
Somente algumas vezes no ano 20 26,3
principais razões para a internação13,14.
Entre os fatores de risco pesquisados, o mais prevalente
2 ou mais vezes por semana 9 11,8
foi a HAS (69,7%), achado semelhante ao observado por
De 1 a 4 vezes por mês 38 50
Lemos et al.16 (75,7%), ambos envolvendo pacientes com

BRASPEN J 2018; 33 (3): 282-9


286
Qualidade da Dieta de pacientes com doenças cardiovasculares

enfermidades cardiovasculares, confirmando que esta A CC é uma medida que se caracteriza pelo acúmulo de
condição representa um fator de risco independente, linear gordura na região mesentérica, estando diretamente relacio-
e contínuo para a gênese da doença cardiovascular³. No nada ao risco de desenvolvimento de doenças cardiovascu-
entanto, Dutra & Fonseca17 preconizam que mudanças nos lares (DCV)15. O risco de complicações metabólicas asso-
hábitos alimentares e no estilo de vida podem ser suficientes ciadas à CC acima dos padrões recomendados é encontrado
para redução dessa morbidade e da mortalidade por doença com frequência em indivíduos portadores destas doenças,
cardiovascular. achado verificado neste e em outros estudos que avaliaram
A presença de DM foi observada em 30,3% da amostra, este padrão, indicando ser um importante marcador na
corroborando com o encontrado em outras pesquisas, nas população estudada15,20.
quais os percentuais foram de 32% e 40,1%15,16. Mesmo Na classificação geral da alimentação dos pacientes
sendo um fator de risco importante para o desenvolvimento entrevistados, a presente pesquisa encontrou que 98,7% dos
de cardiopatias e primordial no surgimento de doença pacientes não apresentaram uma alimentação adequada,
aterosclerótica, mais da metade dos participantes relataram indicando a necessidade de mudança de alguns hábitos para
não apresentar dislipidemias, sendo este um achado posi- alcançar uma melhora na qualidade de vida. Os resultados
tivo, já que se distanciou do valor encontrado por Gomes encontrados foram semelhantes a um estudo realizado
et al.15, em 50 cardiopatas atendidos em um hospital de com pacientes que apresentavam DCNT acompanhados
Belém-PA (94%). pelo Serviço de Saúde Comunitária do Grupo Hospitalar
No Brasil, dados do sistema Vigitel de 2016 mostraram Conceição que, ao avaliar o consumo alimentar, encontrou
que a prática de atividade física no tempo livre passou de que 76% não apresentaram uma alimentação adequada21.
30,3%, em 2009, para 37,6%, em 201618, sendo esta uma Com relação à ingestão de frutas e verduras, apenas
medida muito importante para o controle das dislipidemias, 27,6% e 32,9%, respectivamente, alcançaram o preconi-
doença arterial coronariana e fator protetor para o infarto zado pelo Guia Alimentar para a População Brasileira, que
agudo do miocárdio19. Porém, os resultados da presente recomenda o consumo de pelo menos três porções destes
pesquisa em relação à prática de exercícios mostraram que dois grupos diariamente7. O consumo destes grupos de
por mais que tenha ocorrido um aumento da atividade física alimentos, considerados indispensáveis no dia a dia, também
por parte da população, 90,8% dos entrevistados ainda foi mensurado nos estudos de Silva et al.22 e Campos et al.23,
permanecem inativos, resultado superior ao encontrado em mostrando resultados que se aproximaram da pesquisa em
outros estudos com pacientes cardíacos no estado do Rio questão, isto é, que maior parte dos avaliados não alcançava
Grande do Sul5,19. os índices recomendados.
Ao questionar sobre o uso de tabaco, apenas 10,5% No que diz respeito às fontes de carboidratos, como
relataram que mantinham o hábito de fumar, enquanto outros arroz, milho, trigo, pães, massas, batata e mandioca, que
reportaram abandono do vício após a doença instituída, podem ser consumidos em até seis porções/dia, distribuídas
como apontado por Petersen et al.19. A cessação do taba- ao longo das refeições7, foi observada maior frequência de
gismo representa um achado importante entre os pacientes consumo na categoria entre 4,5 a 7,5 porções diárias. Este
em questão, pois revela que esta faceta de autocuidado está resultado é interessante, visto que os níveis de colesterol
sendo incorporada no tratamento da doença cardiovascular. e triglicerídeos podem aumentar com o consumo elevado
Um achado comum observado em portadores de doenças de carboidratos, favorecendo o desenvolvimento de DCV
cardiovasculares é o aumento do IMC, dado que pode ser e que a redução da quantidade ingerida deste nutriente e
observado nesta pesquisa, na qual 46,1% dos entrevistados substituição dos simples pelos complexos mostra-se benéfica
para tratamento das dislipidemias. Entretanto, apenas 43,4%
apresentaram excesso de peso. Gomes et al.15 e Petersen et
atenderam a frequência adequada do uso de leguminosas
al.19 também encontraram em seus estudos a média de valor
(pelo menos cinco vezes na semana).
do IMC maior que o recomendado (28,71 kg/m² e 29,7 kg/
m², respectivamente) em pacientes cardiopatas, compro- O consumo diário de uma porção de carnes e/ou ovos foi
vando que este fator é constantemente encontrado nesta observado em 56,6% dos pacientes cardíacos, atendendo a
população. O IMC elevado é considerado um indicador de adequação proposta pelo Guia Alimentar7. Entretanto, muitos
risco para saúde, pois está relacionado com várias compli- relataram não remover a gordura aparente das carnes, fator
cações metabólicas, além da classificação com relação ao que contribui para o aumento dos níveis séricos de colesterol,
peso. De acordo com os dados da pesquisa Vigitel de 2016, o que eleva o risco de desenvolvimento de cardiopatia ou
mais da metade da população brasileira encontra-se acima das complicações associadas a esta3.
do peso, tornando-se um grupo com um risco elevado para Esse achado é semelhante ao encontrado no último
desenvolvimento de cardiopatias18. Vigitel, no qual um terço da população adulta referiu não
BRASPEN J 2018; 33 (3): 282-9
287
Zanin J et al.

remover o excesso de gordura desses alimentos18. A ingestão CONCLUSÃO


de peixes foi relatada como mensal pela metade dos partici- Diante dos achados, conclui-se que, apesar da maioria
pantes, dado considerado benéfico, pois, de acordo com a estar eutrófica, considerável parcela dos cardiopatas estu-
Sociedade Brasileira de Cardiologia³, este alimento auxilia dados apresentava qualidade de alimentação deficitária,
na redução da hipercolesterolemia por ser uma carne magra. além de expressivo excesso de peso e acúmulo de gordura
O hábito de consumir leite e derivados com regulari- abdominal.
dade (de duas a três porções) se manteve entre os pacientes Sendo assim, frente aos achados e sabendo-se da impor-
estudados (57,9%), entretanto, na forma integral, resultado tância do tratamento dietoterápico, mostra-se necessário
semelhante ao encontrado na pesquisa Vigitel de 2016, na o acompanhamento e reforço nas orientações nutricionais
qual mais da metade da população adulta referiu consumir
durante o período de internação, com o objetivo de dimi-
diariamente lácteos, porém, integrais18. Acerca desse assunto,
nuir as complicações, melhorando o prognóstico clínico e a
a Sociedade Brasileira de Cardiologia afirma que o consumo
qualidade de vida destes pacientes.
destes alimentos na forma desnatada serve como fator de
proteção contra a hipercolesterolemia3, sendo uma recomen-
dação forte para pacientes com doenças cardiovasculares, REFERÊNCIAS
por mais que seja um hábito de pouca adesão por este grupo. 1. Malta DC, Moura L, Padro RR, Escalante JC, Schmidt MI,
Duncan BB. Mortalidade por doenças crônicas não transmis-
Quanto à ingestão habitual de frituras e doces, os resul- síveis no Brasil e suas regiões, 2000 a 2011. Epidemiol Serv
tados encontrados mostraram-se inferior ao estudo realizado Saúde. 2014;23(4):599-608.
por Silveira et al.24, no qual o consumo destes grupos também 2. Soto PHT, Raitz GM, Bolsoni LL, Costa CKF, Yamaguchi UM,
foi adequado em grande parte da população estudada Massuda ME. Morbidades e custos hospitalares do Sistema Único
de Saúde para doenças crônicas. Rev Rene. 2015;16(4):567-75.
(72,3%; 76,3%; vs. 89,45%; 94,20%, respectivamente), o 3. Faludi AA, Izar MCO, Saraiva JFK, Chacra APM, Bianco HT,
que é interessante, visto que evitar gordura, alimentos ricos Afiune Neto A, et al. Atualização da Diretriz Brasileira de Disli-
em sódio e açúcar são as principais recomendações que os pidemias e Prevenção da Aterosclerose – 2017. Arq Bras Cardiol.
2017;109(2 Supl. 1):1-76.
profissionais de saúde fazem aos pacientes para prevenção 4. Rolande DMS, Fantini JP, Cardinalli Neto A, Cordeiro JA,
e tratamento das doenças cardiovasculares. Bestetti RB. Determinantes prognósticos de pacientes com
insuficiência cardíaca sistólica crônica secundária à hipertensão
Em relação ao consumo de gordura utilizada na prepa-
arterial sistêmica. Arq Bras Cardiol. 2012;98(1):76-83.
ração dos alimentos, os óleos vegetais foram citados com 5. Muniz LC, Schneider BC, Silva ICM, Matijasevich A, Santos
maior frequência. O Guia Alimentar7 e a V Diretriz Brasileira IS. Fatores de risco comportamentais acumulados para
de Dislipidemias e Prevenção da Aterosclerose3 recomendam doenças cardiovasculares no sul do Brasil. Rev Saúde Pública.
2012;46(3):534-42.
um consumo moderado de óleos vegetais e uma ingestão 6. Rombaldi AJ, Silva MC, Neutzling BM, Azevedo MR, Curi PH.
ocasional, e em pouca quantidade, de manteiga, marga- Fatores associados ao consumo de dietas ricas em gordura em
rinas sólidas e gordura de porco. Já é bem estabelecido adultos de uma cidade no sul do Brasil. Ciênc Saúde Coletiva.
2014;19(5):1513-21.
que a gordura saturada está diretamente relacionada com a
7. Brasil. Ministério da Saúde. Guia alimentar: como ter uma
elevação do LDL-c plasmático e, consequentemente, com o alimentação saudável. Brasília: Ministério da Saúde; 2013.
risco de desenvolver um evento cardiovascular, sendo assim 8. Castanho GKF, Marsola FB, Mclellan KCP, Nicola M, Moreto F,
a substituição deste tipo de gordura na dieta por mono e Burini RC. Consumo de frutas, verduras e legumes associado à
síndrome metabólica e seus componentes em amostra popula-
poli-insaturada é considerada uma estratégia para o controle cional adulta. Ciênc Saúde Coletiva. 2013;18(2):385-92.
da elevação dos níveis de colesterol25. 9. Associação Brasileira de Empresas de Pesquisa (ABEP). Critério
de Classificação Econômica Brasil. São Paulo: Abep; 2014.
Ainda, reduzir a ingestão de sal na dieta é considerado
10. Brasil. Orientações para a coleta e análise de dados antropomé-
uma das melhores apostas para redução do risco de eventos tricos em serviços de saúde: Norma Técnica do Sistema de Vigi-
cardiovasculares, já que sua restrição é reconhecida como lância Alimentar e Nutricional - SISVAN. Brasília: Ministério
prevenção primária e secundária da hipertensão arterial3. da Saúde; 2011.
11. World Health Organization (OHW). Obesity: preventing and
Nessa direção, por serem pacientes crônicos e talvez mais managing the global epidemic. Report of a WHO Consultation
interessados na busca de um comportamento mais saudável, on Obesity. Geneva: WHO; 1998.
mais da metade dos avaliados (73,7%) relatou não adicioná- 12. Lipschitz DA. Screening for nutritional status in the elderly. Prim
Care. 1994;21(1):55-67.
lo aos alimentos já servidos no prato. De igual forma, a 13. Christmann M, Costa CC, Moussalle LD. Avaliação da qualidade
maioria dos participantes não tinha o hábito de ingerir de vida de pacientes cardiopatas internados em um hospital
bebidas alcoólicas, outro fator que pode ser considerado público. Rev AMRIGS. 2011;55(3):239-43.
positivo, visto que ainda existem controvérsias sobre a segu- 14. Fantini JA, Gaglianone CC, Ribeiro RCHM, Cesarino CB, Rodri-
gues CC, Beccaria LM. Perfil clínico dos pacientes com doenças
rança e benefícios do consumo de baixas doses de álcool cardiovasculares atendidos na emergência de um hospital de
para o coração3. ensino. Rev Enferm UFPE On Line. 2015;9(12):1078-84.

BRASPEN J 2018; 33 (3): 282-9


288
Qualidade da Dieta de pacientes com doenças cardiovasculares

15. Gomes MN, Maciel MG, Torres RS, Barbosa SNAA. Relação à síndrome metabólica em Belém-PA. Rev Bras Nutr Clin.
entre variáveis antropométricas, bioquímicas e hemodinâmicas 2009;25(3):224-32.
de pacientes cardiopatas. Int J Cardiovasc Sci. 2015;28(5):392-9. 21. Bortoluz S, Lima LA, Nedel FB. Condições de saúde e utilização
16. Lemos KF, Davis R, Moraes MA, Azzolin K. Prevalência de um serviço de atenção primária em pacientes hipertensos e/
de fatores de risco para síndrome coronariana aguda em ou diabéticos. Rev Ciênc Saúde. 2016;9(3):156-66.
pacientes atendidos em uma emergência. Rev Gaúcha Enferm. 22. Silva CL, Costa THM. Barreiras e facilitadores do consumo
2010;31(1):129-35. de frutas e hortaliças em adultos de Brasília. Sci Med (Porto
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enfermeiro. Rev Bras Ciênc Vida. 2017;5(2):1-26. Fatores associados ao consumo adequado de frutas, legumes
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Brasília: Ministério da Saúde; 2017. idosos e sua associação com consumo alimentar, diabetes
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lomay E, et al. Fatores de risco cardiovasculares e comorbidades 2016;107(6):509-17.
em ambulatórios de cardiologia da região metropolitana de Porto 25. Santos RD, Gagliardi ACM, Xavier HT, Magnoni CD, Cassani
Alegre, RS. Rev AMRIGS (Porto Alegre). 2011;55(3):217-23. R, Lottenberg AMP, et al. Sociedade Brasileira de Cardiologia.
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pacientes portadores de doenças cardiovasculares associadas Arq Bras Cardiol. 2013;100(1 Supl. 3):1-40.

Local de realização do estudo: Hospital São Vicente de Paulo (HSVP)/Universidade de Passo Fundo (UPF), Passo Fundo, RS,
Brasil.

Conflito de interesse: Os autores declaram não haver.

BRASPEN J 2018; 33 (3): 282-9


289
A Artigo Original
Florintino CS et al.

Comparação do perfil antropométrico e alimentar


de pacientes hospitalizados com pancreatite
aguda, doenças hepáticas e transtornos da
vesícula biliar
Comparison of the anthropometric and alimentary profile of hospitalized patients with acute
pancreatitis, liver diseases and gallbladder disorders

RESUMO
Camila da Silva Florintino¹ Introdução: Na pancreatite e em algumas doenças hepáticas, é comum a desnutrição, devido ao
Simone Carla Benincá2 processo inflamatório que acontece nessas doenças. Já pacientes acometidos por transtornos da
Dalton Luiz Schiessel3 vesícula biliar apresentam um estado nutricional de eutrofia à obesidade, visto que o excesso de
Caryna Eurich Mazur4 peso é um fator de risco para seu desenvolvimento. Objetivo: Comparar o perfil antropométrico e
alimentar de pacientes hospitalizados por pancreatite, doenças hepáticas e transtornos da vesícula
biliar. Método: Estudo retrospectivo realizado entre maio e novembro de 2016, sendo utilizados
dados secundários de pacientes com diagnóstico clínico de pancreatite aguda, doenças hepáticas
e transtornos das vias biliares, em dois hospitais de um município do Centro-Oeste do Paraná. Os
dados foram armazenados em uma base de dados para posterior análise. Resultados: Partici-
param do estudo 26 pacientes, dos quais 7 (26,9%) foram diagnosticados com doenças hepáticas,
8 (30,8%) com pancreatite aguda e 11 (42,3%) com transtornos da vesícula biliar. A média de idade
foi de 65±17,9 anos, sendo 15 (57,7%) do sexo masculino. O etilismo foi observado em 30,8% dos
pacientes. Com relação à prescrição dietoterápica, o jejum foi prescrito para 8 (30,7%) pacientes,
seguido pela dieta branda (26,9%). Quanto ao estado nutricional, 42,3% (n=11) estavam eutróficos
e 23,1% (n=6) tiveram depleção da massa magra. O estado nutricional entre os grupos de doenças
apresentou diferença significante (p=0,05). Isso pode ser justificado principalmente pela prescrição
dietoterápica, na qual percebeu-se que os pacientes com pancreatite aguda apresentaram Índice de
Massa Corporal menor entre os grupos e foram aqueles com maior prescrição de jejum. Conclusão:
Os pacientes hospitalizados por doenças hepáticas, pancreatite e transtornos da vesícula biliar não
apresentaram, em sua maioria, desnutrição, mas houve diferença do estado nutricional entre os
grupos. Para uma melhor análise antropométrica e alimentar, é necessária avaliação mais criteriosa
da composição corporal e do consumo alimentar, com maior número de participantes.
Unitermos:
Estado Nutricional. Dietoterapia. Fígado. Pâncreas. ABSTRACT
Vesícula Biliar. Introduction: In pancreatitis and some liver diseases malnutrition is common due to the inflammatory
process that occurs in these diseases. Already in patients affected by gallbladder disorders have a
Keywords: nutritional status of obesity eutrophy, since excess weight is a risk factor for developing these dise-
ases. Objective: To verify and compare the anthropometric and alimentary profile of patients with
Nutritional Status. Diet Therapy. Liver. Pancreas. pancreatitis, liver diseases and hospitalized gallbladder disorders. Methods: A retrospective study was
Gallbladder. carried out from May to November, 2016. Secondary data (medical records) of patients with clinical
diagnosis of acute pancreatitis, liver diseases and biliary tract disorders were used in two hospitals in
Endereço para correspondência: a city in the Center-West of Paraná. The data were stored in a database for further analysis. Results:
Caryna Eurich Mazur Twenty-six patients participated in the study, of which 7 (26.9%) with hepatic diseases, 8 (30.8%) with
Universidade Estadual do Centro-Oeste – Departa- acute pancreatitis and 11 (42.3%) with gallbladder disorders. The mean age presented was 65±17.9
years, of which 15 (57.7%) were male. About 8 (30.8%) had the habit of drinking alcoholic drinks, being
mento de Nutrição. Rua Simeão Varela de Sá, 3 – Vila an important risk factor in the development of liver diseases and acute pancreatitis. Regarding dietary
Carli – Guarapuava, PR, Brasil – CEP: 85040-080 prescription, fasting was prescribed in 8 (30.7%) patients, followed by the soft diet (26.9%). Regarding
E-mail: carynanutricionista@gmail.com nutritional status, 42.3% (n=11) were eutrophic and 23.1% (n=6) had lean mass depletion. However,
the nutritional status between the groups showed significant statistical differences (p=0.05). This can
Submissão be justified mainly by dietary prescribing, in which patients with acute pancreatitis had a lower Body
4 de janeiro de 2018 Mass Index among the other groups. This group had higher fasting prescription. Conclusion: Therefore,
with this study, it was possible to identify that patients hospitalized for liver diseases, pancreatitis and
gallbladder disorders did not present malnutrition in the majority of cases, but statistical difference
Aceito para publicação was observed between the groups. For a better anthropometric and food analysis, a more careful
15 de abril de 2018 evaluation of body composition and food consumption is required.

1. Nutricionista formada pela Universidade Estadual do Centro-Oeste (UNICENTRO). Pós-graduada em Nutrição clínica pela Faculdade Campo
Real. Professora no Curso de Nutrição da Faculdade Campo Real, Guarapuava, PR, Brasil.
2. Bacharel em Nutrição pela Universidade Estadual do Centro-Oeste. Mestre e Doutora) em Ciências da Saúde, com ênfase em Gastroenterologia
Clínica pela Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), Guarapuava, PR, Brasil.
3. Graduado em Nutrição pela Universidade Federal do Paraná. Mestre e Doutor em Biologia Celular e Molecular pela Universidade Federal do
Paraná. Professor do Departamento de Nutrição da Universidade Estadual do Centro-Oeste, Guarapuava, PR, Brasil.
4. Graduada em Nutrição pela Universidade Estadual do Centro-Oeste. Mestre em Segurança Alimentar e Nutricional pela Universidade Federal
do Paraná. Doutoranda do Programa de Pós-Graduação em Medicina Interna na Universidade Federal do Paraná. Professora do Departamento
de Nutrição da Universidade Estadual do Centro-Oeste, Guarapuava, PR, Brasil.

BRASPEN J 2018; 33 (3): 290-5


290
Perfil antropométrico e alimentar de pacientes com pancreatite aguda, doenças hepáticas e transtornos da vesícula biliar

INTRODUÇÃO Na pancreatite e em algumas doenças hepáticas, é


O sistema gastrintestinal (SGI) é formado por órgãos ocos comum a desnutrição, devido ao processo inflamatório que
em série, que se comunicam nas duas extremidades com o acontece nessas doenças6,13,14. Já pacientes acometidos
meio ambiente, constituindo o denominado trato gastrin- por transtornas da vesícula biliar apresentam um estado
testinal (TGI) e os órgãos anexos. Os órgãos anexos são: o nutricional de eutrofia a obesidade, visto que o excesso de
pâncreas, o fígado e a vesícula biliar, os quais apresentam peso é um fator de risco para desenvolver essas doenças15.
funções primordiais para a sobrevivência humana, pois Diante disso, o objetivo do estudo foi verificar e comparar
estão presentes nos processos de digestão e metabolismo o perfil antropométrico e alimentar de pacientes com pancre-
dos nutrientes. Por isso, qualquer disfunção nesses órgãos atite, doenças hepáticas e transtornos da vesícula biliar assis-
compromete a ingestão alimentar, afetando o estado nutri- tidos em dois hospitais de um município do Centro-Oeste
cional dos pacientes acometidos1,2. do Paraná.
No Brasil, em 2016, 4.683 pacientes foram internados
para o tratamento de doenças do fígado; já para tratamento MÉTODO
de pancreatite aguda e outros tipos de doenças do pâncreas
Trata-se de estudo retrospectivo realizado com dados
houve 2.529 internações. Os internamentos por transtornos
secundários (prontuários) de pacientes com diagnóstico
das vias biliares e pâncreas foram 6.860 pacientes, em
clínico de pancreatite aguda, doenças hepáticas e trans-
setembro de 20163.
tornos das vias biliares em dois hospitais de um município
A pancreatite aguda é a inflamação do pâncreas, pode
do Centro-Oeste do Paraná.
variar de grau moderado a grave, ocasionando autodi-
gestão, necrose e hemorragia do tecido pancreático2. A As avaliações dos prontuários aconteceram após a
pancreatite leva a dores abdominais fortes, com perda de aprovação deste estudo pelo Comitê de Ética em Pesquisa
células acinares pancreáticas e fibrose, que eventualmente com Seres Humanos (COMEP) da Universidade Esta-
pode avançar para insuficiência exócrina e endócrina do dual do Centro-Oeste (UNICENTRO), sob o parecer
pâncreas4,5. Já as doenças hepáticas podem ser agudas ou 1.593.833/2016, com coleta de dados no período de julho
crônicas, hereditárias ou adquiridas. As principais doenças a novembro de 2016.
que acometem o fígados são: hepatites virais, alcoólica, Os prontuários pertenciam ao nutricionista responsável
autoimune e fulminante, doença hepática gordurosa não pelo paciente. Foi utilizado um formulário estruturado que
alcoólica, doença hepática alcoólica, cirrose hepática e continha questões de identificação: gênero, idade, data da
carcinoma hepatocelular2,6. internação, diagnóstico clínico, prescrição dietoterápica.
Os principais sintomas das doenças hepáticas são icterícia, Além disso, havia questões sobre antecedentes pessoais
dor e distensão abdominal e hemorragia digestiva. Entretanto, (dislipidemias, hipertensão arterial sistêmica, diabetes
em casos crônicos geralmente são assintomáticos, apresen- mellitus, excesso de peso, câncer) e estilo de vida (etilismo
tando anormalidades em parâmetros bioquímicos7. Em geral, o e tabagismo). Também foi analisado se houve alteração
consumo excessivo de bebidas alcoólicas é um fator etiológico autorreferida de peso recente.
comum na pancreatite e nas doenças hepáticas2,8. O sistema Para avaliação nutricional antropométrica, foram cole-
biliar pode ser afetado por várias doenças, sendo as principais: tados dados de peso, estatura, pregas cutâneas tricipital
colestase, colelitíase, colecistite e colangite2. (PCT) e subescapular (PCSE), circunferência do braço (CP)
Os fatores de risco para desenvolver doenças da via e da circunferência da panturrilha (CP) e a medida da altura
biliar são multifatoriais e incluem: aumento da idade, gênero do joelho (AJ). Nos pacientes em que não foi possível aferir
feminino, alta ingestão calórica, baixa ingestão de fibras, peso e estatura, os valores foram estimados de acordo com
alto consumo de carboidratos refinados, hipertrigliceridemia, as equações propostas por Chumlea et al.16. Para classificar
sedentarismo, paridade, perda rápida de peso e excesso de o estado nutricional de adultos e idosos, foram utilizadas as
peso9. Em alguns casos, pode ser necessária a retirada da classificações da OMS17 e OPAS18, respectivamente.
vesícula biliar; embora apresente importantes funções, o A análise estatística foi realizada com auxílio do software
corpo consegue se adaptar com sua ausência2,10. SPSS® versão 22.0. Para a análise, foram utilizados valores
Sabe-se que o estado nutricional de pacientes hospitali- descritivos (percentuais, médias e desvios-padrão) com o
zados influencia sua evolução clínica. No âmbito hospitalar, uso do teste ANOVA com Post Hoc de Tukey. Além disso,
a desnutrição está presente em cerca de 20 a 50% dos casos. foi aplicado o teste de Shapiro Wilk para verificar a norma-
Dessa forma, a detecção precoce do estado nutricional do lidade da amostra. Para as análises numéricas normais, foi
paciente agiliza a melhor escolha do tratamento clínico e utilizado o teste Kruskal Wallis. Foram consideradas variáveis
nutricional11,12. significativas quando p<0,05.
BRASPEN J 2018; 33 (3): 290-5
291
Florintino CS et al.

RESULTADOS internados, sendo 14,3% (n=1) para pacientes com doenças


hepáticas e 12,4% (n=1) para pacientes com pancreatite aguda.
Participaram do estudo 26 pacientes, com média de
idade de 65,8±17,9 anos, sendo 42,3% (n=11) do gênero Com relação à alteração do peso dos pacientes, em
feminino e 57,7% (n=15) do gênero masculino (Tabela 1). 61,5% (n=16) houve diminuição do peso recente, já 11,5%
O diagnóstico clínico de doenças hepáticas esteve presente (n=3) relataram ter ganho de peso e 26,9% (n=7) não
em 26,9% (n=7) dos casos, sendo os distúrbios mais observaram alteração do peso recente. Estratificando os
relatados: doença alcoólica do fígado, cirrose, hepatite pacientes, entre aqueles com doenças hepáticas, 57,1%
alcoólica, esplenomegalia e esteatose hepática. Os casos (n=4) expuseram apresentar redução do peso e 28,6% (n=2)
de pancreatite aguda compreenderam 30,8% (n=8) dos sem alteração do peso atualmente. Na pancreatite aguda, a
pacientes. Já os casos de transtornos da vesícula biliar foram maioria dos pacientes (87,5%; n=7) disse ter alteração do
observados em 42,3% (n=11) dos pacientes internados. Os peso, com redução do mesmo. Já no grupo de pacientes
mais encontrados foram: colecistopatia litiásica, colelitíase, com transtornos da vesícula biliar, 57,1% (n=4) observaram
colecistite aguda, coledocolitíase com ruptura da vesícula redução do peso, 14,3% (n=1) notaram ter ganho de peso e
biliar, calculose da vesícula biliar sem colestite e calculose 28,6% (n=2) não apresentaram alteração de peso recente.
da vesícula biliar com colecistite aguda. Quanto ao perfil antropométrico (Tabela 3), quando
Foram observadas diferenças significativas com relação foram comparados os valores absolutos do Índice de
à idade dos grupos das doenças estudadas (Tabela 1). Os Massa Corporal (IMC) houve diferença estatística entre os
pacientes com pancreatite aguda apresentam menor idade grupos das doenças (p=0,05), na qual a pancreatite aguda
(49,6±21,0 anos) comparados com as outras doenças, já apresentou IMC menor (24,8±4,2) comparada aos outros
os pacientes com transtornos da vesícula biliar apresentam grupos e às doenças hepáticas, que apresentaram um IMC
maior idade (65,8±17,9 anos). maior (28,3±8,7). Essa mesma lógica também se deu para
Quanto à prescrição dietoterápica (Tabela 2), o jejum a análise da circunferência da panturrilha (CP), na qual a
foi indicado em 30,8% (n=8) dos casos, e 62,5% (n=5) em pancreatite aguda apresentou média de 29,8±6,8 e as
pacientes com pancreatite aguda, seguido pela dieta branda doenças hepáticas, média de 38,1±4,2. No que se refere
(26,9%; n=7), prescrita principalmente para pacientes com aos valores da CB e CMB, há diferença nos valores absolutos
transtornos da vesícula biliar (45,5%; n=5). Houve prescrição entre os grupos (p<0,05), principalmente entre as doenças
de terapia nutricional enteral em 7,7% (n=2) dos pacientes hepáticas e pancreatite aguda.

Tabela 1 – Comorbidades e estilo de vida de pacientes com doenças hepáticas, pancreatite aguda e transtornos na vesícula.
Total (n=26) Doenças Hepáticas Pancreatite Aguda Transtornos na vesícula p-valor
(n=7) (n=8) (n=11)
Idade (anos) 57,4±18,4 53,1±11,2 49,6±21,0‡ 65,8±17,9‡ 0,02*
Gênero
Feminino (n;%) 11 (42,3) - 4 (50) 7 (63,6)
0,72†
Masculino (n;%) 15 (57,7) 7 (100) 4 (50) 4 (36,4)
Comorbidades
Dislipidemias (n;%) 3 (11,5) 1 (14,3) 1 (12,5) 1 (9,1)
HAS (n;%) 7 (65,4) 3 (42,9) 1 (12,5) 3 (27,3)
0,54†
Obesidade (n;%) 6 (23,1) 3 (42,9) 2 (25) 1 (9,1)
DM (n;%) 7 (26,9) 2 (28,6) 2 (25) 3 (27,3)
Câncer (n;%) - - - -
Tabagismo
Fuma (n;%) 4 (15,4) 1 (14,3) 3 (37,4) -
Ex-fumante (n;%) 5 (19,2) 2 (28,6) 1 (12,5) 2 (18,2) 0,12†
Não fumante (n;%) 17 (65,4) 4 (57,1) 4 (50) 9 (81,8)
Etilismo (n;%) 8 (30,8) 6 (85,7) 1 (12,5) 1 (9,1)
HAS=Hipertensão arterial sistêmica; DM=Diabetes Mellitus; n=Número; %=Percentual
* Relativo ao teste de Anova
† Relativo ao teste de Kruskal Wallis
‡ Divergem entre si pelo post-hoc de Tukey

BRASPEN J 2018; 33 (3): 290-5


292
Perfil antropométrico e alimentar de pacientes com pancreatite aguda, doenças hepáticas e transtornos da vesícula biliar

Tabela 2 – Prescrição dietoterápica de pacientes com doenças hepáticas, pancreatite aguda e transtornos da vesícula biliar.
Total (n=26) Doenças Hepáticas Pancreatite Aguda Transtornos na vesícula
(n=7) (n=8) (n=11)
Dieta branda (n;%) 7 (26,9) 1 (14,3) 1 (12,5) 5 (45,5)
Dieta líquida (n;%) 2 (7,7) - - 2 (18,2)
Dieta livre (n;%) 6 (23,1) 4 (57,1) 1 (12,5) 1 (9,1)
Dieta pastosa (n;%) 1 (3,8) 1 (14,3) - -
Jejum (n;%) 8 (30,8) - 5 (62,5) 3 (27,3)
TNE (n;%) 2 (7,7) 1 (14,3) 1 (12,5) -
TNE=Terapia Nutricional Enteral

Tabela 3 – Perfil antropométrico dos pacientes com doenças hepáticas, pancreatite aguda e transtornos da vesícula biliar.
Total (n=26) Doenças Hepáticas Pancreatite Aguda Transtornos na vesícula p-valor
(n=7) (n=8) (n=11)
IMC – kg/m² (média/DP) 26,1±6,0 28,3±8,7‡ 24,8±4,2‡ 25,6±5,3 0,05*
Desnutrição (n;%) 6 (23,1) 1 (14,3) 2 (25) 3 (25,3) 0,32†
Eutrofia (n;%) 11 (42,3) 3 (42,9) 3 (37,5) 5 (45,5)
Sobrepeso (n;%) 4 (15,4) 1 (14,3) 2 (25) 1 (9,1)
Obesidade (n;%) 5 (19,2) 2 (28,6) 1 (12,5) 2 (18,1)
CP – cm (média/DP) 32,6±6,1 38,1±4,2*** 29,8±6,8*** 32,7±5,5 0,03*
Sem depleção (n;%) 5 (19,2) 2 (28,6) 2 (25) 1 (9,1) 0,12†
Com depleção (n;%) 6 (23,1) - 1 (12,5) 5 (45,5)
CB – cm (média/DP) 28,1±7,2 23,9±11,7‡ 30,7±3,8‡ 28,9±4,5 0,04*
CMB – cm (média/DP) 24,6±6,6 20,2±9,8‡ 27,4±4,2‡ 25,3±4,2 0,05*
IMC=Índice de massa corporal; CP=circunferência da panturrilha; CB=circunferência do braço; CMB=circunferência muscular do braço.
Em 15 pacientes não foi aferida a CP
* Relativo ao teste de Anova
† Relativo ao teste de Kruskal Wallis
‡ Divergem entre si pelo post-hoc de Tukey

DISCUSSÃO Sabe-se que a ingestão alcoólica, uma das principais etiolo-


Analisando os resultados, foram observadas diferenças gias da pancreatite e também das doenças hepáticas, é um
significativas em relação à idade dos grupos das doenças fator independente que leva à desnutrição13,14. O tabagismo
estudadas. Torres et al.19 observaram que a prevalência de não apresentou resultados expressivos no presente estudo,
colelitíase aumentou com a idade em ambos os sexos, sendo no qual 65,4% (n=17) relataram não ter o hábito de fumar.
1,7% na faixa etária de 20 a 29 anos e 5,2% naqueles de Outro fator de risco importante no desenvolvimento
60 a 69 anos (p>0,05). Assim como no presente estudo, das doenças estudadas é o gênero, visto que nas doenças
no qual os pacientes com transtornos da vesícula biliar hepáticas todos os pacientes eram do gênero masculino.
apresentam idade superior quando comparados aos outros Um estudo epidemiológico da morbimortalidade no gênero
grupos. Entretanto, em relação aos outros grupos não foi masculino indica o alcoolismo como um dos principais fatores
encontrada na literatura essa relação com a idade. Outro de risco para doenças do aparelho digestivo, com destaque
resultado importante é a idade dos pacientes com pancreatite, para a cirrose hepática, informada ou não, com associação
a mais baixa entre os grupos (49,6±21,0 anos). ao alcoolismo20.
O etilismo é considerado fator de risco importante para No presente estudo, os transtornos da vesícula biliar
desenvolver as doenças hepáticas e pancreatite aguda, tendo acometeram principalmente as mulheres (63,4%; n=7). Em
sido constatado nesse estudo que 30,8% (n=8) dos pacientes um estudo randomizado, Menezes et al.21 constataram que a
tinham o hábito de ingerir bebidas alcoólicas, sendo mais colelitíase foi quatro vezes mais frequente no gênero feminino.
evidente no grupo das doenças hepáticas: 85,7% (n=6). A literatura mostra que a formação de cálculos biliares em
BRASPEN J 2018; 33 (3): 290-5
293
Florintino CS et al.

mulheres deve-se, principalmente, ao número de gestações, CONCLUSÃO


uso de anticoncepcionais orais e fatores hormonais naturais Diante disso, com esse estudo foi possível identificar que
devido ao estrogênio9. os pacientes hospitalizados por doenças hepáticas, pancre-
Com relação à prescrição dietoterápica, neste estudo atite e transtornos da vesícula biliar não apresentaram, em
o jejum esteve prescrito para 30,8% (n=8) dos pacientes, sua maioria, desnutrição. Isso demonstra o cenário do estado
principalmente na pancreatite aguda (62,5%; n=5). O jejum nutricional da população brasileira, em que mais da metade
é prescrito com a finalidade de evitar a dor que está asso- está com excesso de peso.
ciada aos mecanismos secretórios de enzimas pancreáticas Entretanto, o estado nutricional entre os grupos apre-
e bile, com o repouso pancreático. Nos casos mais leves da senta diferenças estatísticas significantes. Isso pode ser
pancreatite aguda, 2 a 5 dias de repouso seriam suficientes justificado principalmente pela prescrição dietoterápica, na
para resolução da dor, critérios utilizados comumente até qual se percebeu que os pacientes com pancreatite aguda
o início da dieta oral, entretanto, a utilização da dieta oral apresentaram IMC menor com relação aos outros grupos,
desde o início do quadro não altera a evolução do processo. sendo o grupo com maior prescrição de jejum. Para uma
Dessa forma, é indicada uma dieta líquida clara, hipolipídica, melhor análise antropométrica e alimentar, é necessária
evoluindo conforme a tolerância do paciente. apreciação mais criteriosa dos métodos de avaliação e
Em casos mais graves, a utilização da terapia nutricional composição corporal, além do consumo alimentar. Portanto,
enteral (TNE) precoce pode ser benéfica para o prognóstico sugerem-se novos estudos, especialmente com delineamento
do paciente2,22. Em geral, a via de escolha para alimentação e longitudinal, para associar com as variáveis expressas na
suplementação deve ser a oral. A indicação de TNE ou terapia presente pesquisa.
nutricional parenteral (TNP) vai depender da condição clínica
do paciente, os riscos e os benefícios de cada método. A TNE REFERÊNCIAS
é indicada se o SGI estiver funcionando plenamente. Dessa
1. Aires MM. Fisiologia. 3ª ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan;
forma, indica-se terapia nutricional quando a ingestão oral 2008.
for menos que 60% e/ou nos casos de desnutrição grave6. 2. Hasse JM, Materese LF. Terapia nutricional para doenças hepa-
tobiliares e pancreáticas. In: Mahan KL, Escott-Stump S,
No presente estudo, apenas 14,3% (n=1) das doenças Raymond JL, eds. Alimentos, nutrição e dietoterapia. 13ª ed.
hepáticas e 25% (n=2) dos pacientes com pancreatite aguda Rio de Janeiro: Elsevier; 2012.
apresentaram desnutrição. Mas, 62,5% (n=16) dos pacientes 3. Brasil. Ministério da Saúde. Portal da Saúde. Departamento de
informática do SUS - DATASUS. [acesso 2017 2017 Jan 30].
relataram apresentar diminuição do peso recente, principal- Disponível em: http://www2.datasus.gov.br/DATASUS/index.
mente nas doenças hepáticas (57,1%; n=4) e na pancreatite php?area=0201
aguda (87,7%; n=7). Normalmente, o estado nutricional na 4. Turner R. Chronic pancreatitis: negotiating the complexi-
ties of diagnosis and management. Aust Fam Physician.
pancreatite aguda é alterado devido ao processo inflama-
2015;44(10):718-22.
tório que leva a hipermetabolismo e hipercatabolismo. O 5. Habtezion A. Inflammation in acute and chronic pancreatitis. Curr
resultado desse processo é o grande catabolismo de massa Opin Gastroenterol. 2015;31(5):395-9.
magra13,14,23. 6. Jesus RP, Nunes ALB, Magalhães LP, Buzzini R. Terapia nutri-
cional nas doenças hepáticas crônicas e insuficiência hepática.
Assim como na pancreatite, em portadores de doenças In: Sociedade Brasileira de Nutrição Parenteral e Enteral. Projeto
hepáticas, a desnutrição é uma das complicações mais Diretrizes. São Paulo: Associação Médica Brasileira/Conselho
Federal de Medicina; 2011.
comum6,24. Entretanto, os dados do estado nutricional dos 7. Brasil. Ministério da Saúde. Manual de perícia médica. Brasília:
pacientes do presente estudo se dão apenas pela análise Ministério da Saúde; 2005.
do IMC, sendo uma limitação desta pesquisa, pois não foi 8. Cuppari L. Guia de nutrição: nutrição clínica no adulto. 2ª ed.
São Paulo: Manole; 2005.
avaliada, nos pacientes, a composição corporal. 9. Nunes EC, Rosa RS, Bordin R. Internações por colicistite e cole-
Em geral, em outros estudos com transtornos da vesícula litíase no Ria Grande do Sul, Brasil. ABCD Arq Bras Cir Dig.
2016;29(2):77-80.
biliar pode-se observar relação da formação de cálculos 10. Santos JS, Sankarankutty AK, Salgado Júnior W, Kemp R,
biliares (colelitíase) e a inflamação da vesícula biliar (cole- Módena JLP, Elias Júnior J, et al. Colecistectomia: aspectos
cistite) com o excesso de peso15,25. No presente estudo, técnicos e indicações para o tratamento da litíase biliar e das
neoplasias. Medicina (Ribeirão Preto). 2008;41(4):449-64.
45,5% (n=5) apresentaram eutrofia e foi o grupo que mais
11. Duchini L, Jordão AA, Brito TT, Diez-Garcia RW. Avaliação
evidenciou a depleção da massa muscular por meio da e monitoramento do estado nutricional de pacientes hospitali-
análise da CP (45,5%; n=5). Isso pode ser pelo fato que se zados: uma proposta apoiada na opinião da comunidade cientí-
trata do grupo com maior idade (65,8±17,9) entre os grupos fica. Rev Nutr. 2010;23(4):513-22.
12. Dias CA, Burgos MGPA. Diagnóstico nutricional de pacientes
estudados. Sabe-se que é comum haver depleção da massa cirúrgicos. ABCD Arq Bras Cir Dig. 2009;22(1):2-6.
muscular em idosos e em indivíduos hospitalizados, portanto, 13. Silva SS, Frangella VS. Cuidados nutricionais na pancreatite crônica:
a CP é uma avaliação importante nessa fase da vida26,27. uma atualização. Mundo Saúde (São Paulo). 2009;33(1):73-9.

BRASPEN J 2018; 33 (3): 290-5


294
Perfil antropométrico e alimentar de pacientes com pancreatite aguda, doenças hepáticas e transtornos da vesícula biliar

14. Carvente TC, Freitas AR, Martins RD, Libera Júnior ED, Gil dieta hipolipídica nos sintomas digestivos no pós-operatório
JZ, Toledo CF. Aspectos nutricionais em paciente portador imediato da colecistectomia por videolaparoscopia. Rev Col
de pancreatite crônica: relato de caso. J Health Sci Inst. Bras Cir. 2012;40(3):203-7.
2013;31(4):448-52. 22. Shils ME, Shike M, Ross AC, Benjamin C, Cousins RJ. Nutrição
15. Nunes EC. Internações por colecistite e colelitíase no Rio Grande moderna na saúde e na doença. 10ª ed. São Paulo: Manole; 2009.
do Sul, triênio 2011-2013 [Trabalho de conclusão de curso]. 23. Nascimento JEA. Terapia nutricional na pancreatite aguda. In:
Porto Alegre: Faculdade de Medicina da Universidade Federal Sociedade Brasileira de Nutrição Parenteral e Enteral. Projeto
do Rio Grande do Sul; 2015. Diretrizes. São Paulo: Associação Médica Brasileira e Conselho
16. Chumlea WM, Guo S, Roche AF, Steinbaugh ML. Prediction of Federal de Medicina; 2011.
body weight for the nonambulatory elderly from anthropometry. 24. Nishikawa H, Yoh K, Enomoto H, Iwata Y, Kishino K, Shimono
J Am Diet Assoc. 1988;88(5):564-8. Y, et al. Factors associated with protein-energy malnutrition in
17. World Health Organization (WHO). Physical status: the use and
chronic liver disease: analysis using indirect calorimetry. Medi-
interpretation of anthropometry. Geneva: WHO; 1995.
cine (Baltimore). 2016;95(2):e2442.
18. Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS). XXXVI Reunión
25. Sousa KPQ, Souza PM, Guimarães NG. Fatores antropométricos,
del Comitê Asesor de Investigaciones en Salud - Encuestra
Multicêntrica - Salud Beinestar y Envejecimeiento (SABE) en bioquímicos e dietéticos envolvidos na litíase biliar. Comun
América Latina e el Caribe. OPAS; 2001 Jul 9-11; Kingston, Ciênc Saúde. 2008;19(3):261-70.
Jamaica. 26. Najas N, Yamatto TH. Avaliação na maturidade: avaliação
19. Torres OJM, Barbosa ES, Pantoja PB, Diniz MCS, Silva JRS, do estado nutricional de idosos. Nestle Nutrition. [acesso
Czeczko NG. Prevalência ultra-sonografia de litíase biliar em 2017 Jan 31]. Disponível em: http://www.ufjf.br/renato_nunes/
pacientes ambulatoriais. Rev Col Bras Cir. 2005;32(1):47-8. files/2014/03/Avallia%C3%A7%C3%A3o-do-estado-Nutri-
20. Laurenti R, Jorge MHPM, Gotlieb SLD. Perfil epidemioló- cional-de-Idosos.pdf
gico da morbi-mortalidade masculina. Ciênc Saúde Coletiva. 27. Peixoto LG, Barbosa CD, Nahas PC, Rossato LT, Oliveira EP.
2005;10(1):35-46. A circunferência de panturrilha está associada com a massa
21. Menezes HL, Fireman PA, Wanderley VE, Mendonça MMC, muscular de indivíduos hospitalizados. Rev Bras Nutr Clin.
Bispo RKA, Reis MR. Estudo randomizado para avaliação da 2016;31(2):167-71.

Local de realização do estudo: Centro Universitário Campo Real, Guarapuava, PR, Brasil.

Conflito de interesse: Os autores declaram não haver.

BRASPEN J 2018; 33 (3): 290-5


295
A Artigo Original
Costa LCM et al.

Informações nutricionais de crianças e


adolescentes atendidos na clínica de nutrição de
uma universidade
Nutritional information of children and teenagers attended in the university nutrition clinic

RESUMO
Lauane Cristina Marques Costa1
Paula Garcia Pianura1 Introdução: A obesidade é uma doença multifatorial que consiste no acúmulo de gordura corporal
Laís Fabíola Pansani Maniglia2 e que tem se mostrado um problema nutricional crescente na população pediátrica. Por este motivo,
o objetivo do presente estudo foi avaliar os resultados de atendimentos nutricionais prestados
a crianças e adolescentes na clínica de nutrição de uma universidade. Método: Trata-se de um
estudo transversal, para o qual foram selecionados 30 prontuários de pacientes de 4 a 16 anos
de idade, de ambos os sexos, em acompanhamento nutricional. Foram analisados os registros
alimentares, as histórias clínicas, bem como as medidas antropométricas de peso, estatura, índice
de massa corporal (IMC) e circunferências. Os prontuários utilizados no estudo eram referentes a
atendimentos prestados no período de março de 2014 a novembro de 2016 e os valores mínimo
e máximo do tempo de acompanhamento nutricional foram de um a 18 meses, respectivamente.
Resultados: No início do acompanhamento nutricional, nenhum indivíduo estava eutrófico, de
acordo com o IMC, e 70% apresentavam circunferência abdominal acima do percentil 90. Após o
período de intervenção, houve uma melhora nas escolhas alimentares, caracterizada pela redução
do consumo de produtos ultraprocessados, ricos em açúcares refinados e gorduras e pelo aumento
do consumo de frutas e hortaliças. Conclusões: As crianças e os adolescentes apresentam um
estilo de vida que favorece o consumo de alimentos ultraprocessados de baixo valor nutricional.
Ao final desse trabalho, pôde-se afirmar que o tempo de tratamento é fundamental para o auxílio
Unitermos: da mudança de hábitos alimentares.
Obesidade. Nutrição da Criança. Adolescente. Estado
Nutricional.
ABSTRACT
Keywords: Introduction: Obesity is a multifactorial disease that consists in the accumulation of body fat,
Obesity. Child Nutrition. Adolescent. Nutritional and is a growing disease in the pediatric population. For this reason, the objective of the present
Status. study was to evaluate the results of nutritional care provided to children and adolescents in the
nutrition clinic of a university. Methods: A cross-sectional study was carried out in which 30
Endereço para correspondência: medical records of patients between 4 and 16 years of age, of both sex, in nutritional care were
Fabíola Pansani Maniglia selected, in which the food pattern and 24-hour recalls were analyzed, then calculated and evalu-
Av. Dr. Armando de Sales Oliveira, 201 – Parque ated according to age recommendations. The minimum and maximum values of the nutritional
Universitário – Franca, SP, Brasil – monitoring time were between one and 18 months, respectively. Results: At the beginning of the
CEP: 14404-600 nutritional follow-up, no individual was eutrophic according to the body mass index, and 70%
E-mail: fa_nutricao@hotmail.com
presented abdominal circumference above the 90th percentile. After the intervention period, there
Submissão was an improvement in the food choices, characterized by the reduction of the consumption of
27 de janeiro de 2018 ultraprocessed products rich in refined sugars and fats and by increasing consumption of fruits and
vegetables. Conclusion: Children and adolescents have a lifestyle that favors the consumption of
Aceito para publicação ultraprocessed foods with low nutritional value. At the end of this work it can be stated that the
15 de abril de 2018 time of treatment is fundamental in the aid of eating habits’ change.

1. Graduanda do Curso de Nutrição da Universidade de Franca, Franca, SP, Brasil.


2. Nutricionista. Doutora em Ciências pela Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo. Docente dos Cursos de
Nutrição e Enfermagem da Universidade de Franca, Franca, SP, Brasil.

BRASPEN J 2018; 33 (3): 296-302


296
Informações nutricionais de crianças e adolescentes

INTRODUÇÃO resultados positivos no tratamento nutricional. Além disso, é


possível perceber que esses pacientes conseguem partilhar
A obesidade consiste no acúmulo de tecido gorduroso
mais sobre suas dúvidas, medos e inseguranças, possibili-
em todo o corpo e, atualmente, é considerada um problema
tando um elo de confiança entre o profissional e o paciente,
de saúde pública crescente entre crianças e adolescentes,
o que contribui para o êxito do tratamento7.
os quais apresentam maior risco de permanecerem acima
do peso na vida adulta. É uma doença grave e multifa- Com base nas informações acima, o objetivo deste
torial, podendo ser causada por problemas genéticos, estudo foi avaliar os resultados de atendimentos nutricionais
alterações endócrino-metabólicas e distúrbios nutricionais. prestados a crianças e adolescentes em uma clínica de
Além disso, está associada ao desenvolvimento de outras nutrição universitária do interior de São Paulo.
doenças crônicas, como doenças cardiovasculares, diabetes
mellitus, dislipidemias, distúrbios psicossociais e desordens MÉTODO
ortopédicas1,2.
Para a realização do presente estudo, foram selecio-
Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), nados 30 prontuários de crianças e adolescentes de quatro
estima-se que, em 2025, o número de crianças com sobre- a 16 anos, atendidos no período de março de 2014 a
peso e obesidade no mundo poderá chegar a 75 milhões3. novembro de 2016, na clínica de Nutrição da Universidade
Dentre os possíveis fatores que podem levar o indivíduo de Franca, em Franca, SP.
à obesidade na infância e juventude, estão o desmame
Para que se pudesse utilizar o prontuário para a coleta
precoce ou a ausência de aleitamento materno, a intro- dos dados, era imprescindível que o mesmo contivesse o
dução inadequada de alimentos pelos pais e familiares que Termo de Consentimento Livre Esclarecimento (TCLE) assi-
não têm conhecimentos sobre nutrição e as demais escolhas nado pelos pais ou responsáveis, autorizando a obtenção
alimentares realizadas ao longo do período de crescimento4. de suas informações, as quais foram mantidas em sigilo
De acordo com os dados do Sistema de Vigilância de conforme os aspectos éticos que regem a pesquisa, sob o
Fatores de Risco e Proteção para Doenças Crônicas por parecer de número 1.997.140. Outro critério adotado para
Inquérito Telefônico (Vigitel) do ano de 2016, houve um a escolha dos prontuários era que o mesmo contivesse, no
aumento no consumo de frutas e hortaliças e redução no mínimo, dois atendimentos nutricionais, para que se pudesse
consumo de refrigerantes, mas, ainda assim, os índices de estabelecer uma comparação entre as consultas e observar
excesso de peso continuam a subir na população brasileira. os efeitos da intervenção nutricional.
A pesquisa mostra, ainda, uma diminuição do consumo As informações colhidas nos prontuários foram: idade,
de arroz e feijão e pesquisadores afirmam que este tipo de sexo, peso, estatura, medidas de circunferência braquial
modificação no padrão alimentar pode estar associada à (CB) e circunferência da cintura (CC), bem como o histórico
praticidade e economia de tempo destinado ao preparo de clínico e familiar, a prática de exercício físico, o objetivo do
refeições equilibradas, levando ao consumo de alimentos atendimento nutricional e o tempo de acompanhamento, o
com alto teor energético e reduzido valor nutricional, que qual foi estabelecido entre a primeira e a última consulta.
contribuiriam para o aumento de peso4,5. Por meio das medidas de peso e estatura, calculou-se
Além desses fatores que colaboram para o ganho de o índice de massa corporal (IMC), o qual foi avaliado pela
peso, os avanços tecnológicos e o entretenimento fazem curva de crescimento da OMS, de acordo com as respectivas
com que as crianças se interessem mais por opções apáticas faixas etárias8. Já as adequações das circunferências do
de diversão, como jogos online ou em tablets e celulares, braço e da cintura foram avaliadas conforme as recomen-
que resultam na falta de interação pessoal e as tornam dações de Taylor et al.9 e Frisancho10.
mais acomodadas, reduzindo drasticamente a realização A Tabela 1 apresenta a classificação do estado nutri-
de atividades físicas, tanto esportivas quanto lúdicas6. cional de acordo com os percentis da curva de crescimento
O tratamento da obesidade infantil conta com medidas para o IMC.
como: modificação do hábito alimentar, evitando alimentos Além destes dados, também foram colhidas as infor-
ultraprocessados e dando preferência a alimentos in natura, mações referentes à alimentação dos pacientes, sendo que
e estimulando a prática de atividade física regular. Estudos na primeira consulta foi obtido um registro da alimentação
demonstram que crianças que recebem orientação nutri- habitual do indivíduo e, nas demais consultas, realizou-se
cional e participam de forma ativa nas consultas apresentam o recordatório de 24 horas. Os recordatórios e os registros
BRASPEN J 2018; 33 (3): 296-302
297
Costa LCM et al.

Tabela 1 – Classificação do Índice de Massa Corporal segundo os percentis Tabela 2 – Características pessoais e do tratamento dos pacientes (n=30).
propostos pela Organização Mundial da Saúde (OMS). Franca (SP), 2017.

Percentil Classificação Variável n %

< P3 Baixo peso Sexo

< P3 ao P 85 Adequado Feminino 17 56,7

P 85 ao < P97 Sobrepeso Masculino 13 43,3

>P 97 Obesidade Idade


Fonte: OMS, 20178. 4 a 7 anos 4 13,3

8 a 11 anos 14 46,7
da alimentação habitual tiveram suas informações digitadas
12 a 16 anos 12 40,0
no software DietPro versão 5i para que se pudesse estimar o
Atividade física
consumo energético e de macronutrientes e, posteriormente,
compará-lo às necessidades e recomendações diárias de Sim 19 63,3
ingestão das Dietary Reference Intakes (DRI)11,12. Não 11 36,7
Posteriormente, todos os dados foram tabulados para a
Classificação do estado nutricional pelo IMC
realização de uma análise descritiva, composta de média,
Adequado 0 0,0
desvio padrão, mediana e valores mínimo e máximo.
Para verificar se houve influência do tempo de tratamento Sobrepeso 13 43,3

sobre as variáveis de CB, CC e IMC, utilizou-se o teste de Obesidade 17 56,7


Kruskal-Wallis devido à não parametrização dos dados e Motivo da consulta
considerou-se um nível de significância menor que 0,05.
Perda de peso 16 53,3

Perda de peso e reeducação 12 40,0


RESULTADOS alimentar
A partir dos 30 prontuários analisados, pôde-se observar Perda de peso e controle de 2 6,6
que os principais objetivos do tratamento nutricional foram: exames
perda ponderal, reeducação alimentar, controle de exames Tempo de tratamento
bioquímicos e prevenção de doenças relacionadas ao
Menor ou igual a 1 mês 14 46,7
histórico familiar.
2 a 5 meses 10 33,3
Vale ressaltar que problemas relacionados à síndrome
metabólica no histórico familiar dos participantes do estudo 6 a 18 meses 6 20,0
corresponderam a 83,3%, sendo que doenças como IMC=Índice de Massa Corporal.

obesidade, diabetes mellitus e hipertensão arterial eram


encontradas em maior escala, seguidas de dislipidemia.
crianças e adolescentes foram caracterizados por alimentos
A média e o desvio padrão de idade dos participantes foi
ultraprocessados, ricos em carboidratos simples e gorduras,
de 10,7±3,2 anos e os valores mínimo e máximo do tempo
como biscoito recheado, pizza, chocolate e sorvete.
de acompanhamento nutricional foram um e 18 meses,
respectivamente. A Tabela 2 apresenta as informações Sobre o teor de gorduras e sódio nas refeições, observou-
pessoais e referentes ao tratamento dos jovens atendidos. se que, no início do tratamento, havia grande presença de
De acordo com os dados do primeiro atendimento dos alimentos fritos e fast food, além de um consumo médio per
indivíduos, nenhum deles estava eutrófico, de acordo com o capita elevado de óleo e sal, equivalente a 20,4±11,6mL
IMC, e 70% apresentavam circunferência abdominal acima e 6,0±3,8g, respectivamente. Dados negativos também
do recomendado. foram observados sobre a ingestão hídrica dos indivíduos.
A respeito dos aspectos alimentares, no início do acom- Constatou-se que apenas uma criança ingeria a quantidade
panhamento nutricional, os itens mais consumidos pelas necessária de água, segundo as recomendações das DRIs.
BRASPEN J 2018; 33 (3): 296-302
298
Informações nutricionais de crianças e adolescentes

Tabela 3 – Valores de média e desvio padrão (DP) das medidas antropométricas conforme a faixa etária e o tempo de tratamento dos indivíduos.

Idade 4 a 7 anos 8 a 11 anos 12 a 16 anos

T0 T1 T0 T1 T0 T1
Tempo de tratamento
menor ou igual a 1 mês 2 a 5 meses 6 a 18 meses

IMC (kg/m²) 30,98±4,68 30,49±4,85 36,37±1,99 23,90±3,05 28,39±4,46 27,63±4,99

CB (cm) 32,16± 4,52 28,96±4,21 28,37±1,77 26,46±2,55 30,07±4,31 29,65±4,46

CC (cm) 86,38±11,10 88,00± 11,19 81,07±6,32 78,79±7,98 87,69±11,42 86,65±12,96


T0=primeiro atendimento; T1=último atendimento; Δ=variação das medidas; IMC=índice de massa corporal; CB:=circunferência braquial; CC=circunferência da cintura.

Tabela 4 – Valores de energia e macronutrientes referente aos dados alimentares obtidos na primeira (T0) e última consulta (T1), conforme o grupo etário
dos pacientes.

Grupo etário Tempo Energia/Macronutriente Média Desvio padrão Mínimo Mediana Máximo

Energia (kcal) 1859,77 332,23 1433,59 1887,54 2230,41

T0 Carboidratos (g) 54,77 4,93 48,83 54,74 60,77

Lipídios (g) 26,26 3,29 21,39 27,63 28,39

4 a 7 anos Proteínas (g) 18,97 3,46 16,00 17,96 23,97

Energia (kcal) 1726,41 431,13 1265,22 1678,99 2282,43

T1 Carboidratos (g) 60,13 2,62 52,33 60,97 62,31

Lipídios (g) 25,41 4,28 21,39 25,12 30,02

Proteínas (g) 16,27 2,10 13,65 16,68 18,08

Energia (kcal) 1464,24 414,63 730,73 1420,51 2356,56

T0 Carboidratos (g) 56,07 6,28 42,37 54,39 66,15

Lipídios (g) 25,39 5,72 15,41 25,95 36,00

8 a 11 anos Proteínas (g) 18,55 3,37 12,67 19,16 22,49

Energia (kcal) 1258,36 318,84 801,03 1260,28 1804,00

T1 Carboidratos (g) 55,23 8,81 38,32 54,86 74,33

Lipídios (g) 24,69 6,51 14,05 23,12 35,96

Proteínas (g) 20,09 4,07 11,62 19,55 25,71

Energia (kcal) 1696,43 740,08 867,62 1540,77 3633,00

T0 Carboidratos (g) 54,50 5,29 9,44 54,88 63,87

Lipídios (g) 26,01 6,44 16,72 21,18 37,02

12 a 16 anos Proteínas (g) 19,49 5,09 9,44 18,90 27,80

Energia (kcal) 1808,42 8,06 770,99 1801,52 3633,00

T1 Carboidratos (g) 55,75 8,06 43,84 54,42 66,11

Lipídios (g) 28,58 7,69 18,58 29,32 40,84

Proteínas (g) 16,88 2,21 13,31 17,19 21,34

BRASPEN J 2018; 33 (3): 296-302


299
Costa LCM et al.

Ao serem comparados os valores de gasto energético total entre os familiares dos pacientes assistidos. O estudo de
e de consumo energético no início do tratamento, observou- Pontes et al.14 com 301 adolescentes, de 12 a 19 anos,
se que, no grupo de 4 a 7 anos de idade, houve 86,5% de evidenciou vários fatores de risco significativos, entre eles a
adequação. Já nos grupos de 8 a 11 anos e 12 a 16 anos, hipertensão arterial e a hipertrigliceridemia em filhos com
as porcentagens de adequação foram ainda menores, corres- pais que apresentavam problemas semelhantes de saúde.
pondendo a 79,8% e 66,7%, respectivamente. Os autores também observaram a relação entre o excesso
Sobre os resultados do acompanhamento nutricional, a de peso em adolescentes e a frequência de pelo menos
Tabela 3 mostra as alterações nas medidas antropométricas, um componente das doenças crônicas não transmissíveis
conforme a idade dos pacientes e em relação ao tempo (DCNT) que estabelecem uma associação entre a obesidade
de tratamento. e a síndrome metabólica.
Após o acompanhamento nutricional, 14 dos 30 Dados dietéticos que podem estar associados às DCNT
pacientes cujos atendimentos foram analisados apre- apresentadas pelos familiares dos pacientes atendidos são a
sentaram perda ponderal. Notou-se, também, que 21 alta ingestão per capita de óleo e sal, as quais ultrapassam
indivíduos mantiveram a CC acima do percentil 90, oito os valores preconizados pela Organização Mundial de
encontravam-se entre os percentis 50 e 90 e apenas um Saúde15,16.
permaneceu exatamente no percentil 50. Veiga et al.17, ao avaliarem o consumo de micronu-
Os resultados do teste de Kruskal-Wallis mostraram não trientes por adolescentes, identificaram que a maior inade-
haver associação entre o tempo de tratamento e os valores quação correspondeu ao sódio, o qual ultrapassou em 70%
de CB (p=0,17), de CC (p=0,74) e de IMC (p=0,15). o valor de ingestão máxima tolerável. Sabe-se que o sódio e
a gordura também estão fortemente presentes nos alimentos
Quanto às escolhas alimentares, após o período de inter-
industrializados e caracterizados como fast food, os quais
venção, houve uma melhora caracterizada pela redução de
eram bastante consumidos pelos jovens no início do trata-
produtos ultraprocessados, ricos em açúcares refinados e
mento. No estudo de Porto et al.18, realizado com crianças
gorduras, e pelo aumento do consumo de frutas e hortaliças.
de 5 a 10 anos, estudantes da rede pública e privada da
A Tabela 4 apresenta a média, o desvio padrão, a
cidade do Rio de Janeiro, verificou-se associação entre o
mediana e os valores mínimo e máximo dos macronutrientes
alto consumo desses alimentos e os índices de sobrepeso
e energia consumidos pelos pacientes na primeira e na
e obesidade. Já as crianças que informaram comer poucas
última consulta.
vezes este tipo de alimento eram classificadas em eutrofia.
Outra grave inadequação constatada esteve relacionada
DISCUSSÃO
à baixa ingestão hídrica pelos jovens estudados na presente
Os resultados dos atendimentos nutricionais prestados a pesquisa. Sabe-se que a necessidade hídrica diária se dá
crianças e adolescentes no presente estudo mostraram alta conforme a faixa etária e o sexo do indivíduo e, de acordo
prevalência de sobrepeso e obesidade. Por meio dos dados com essas recomendações, somente uma criança ingeriu o
colhidos nos prontuários, foi encontrada uma porcentagem valor adequado19. No estudo realizado por Scabar et al.20
de 77% de obesidade e 23% de sobrepeso no sexo mascu- com 483 adolescentes, de ambos os sexos, com idade entre
lino; já no sexo feminino, 47% foram classificados como 13 e 16 anos, os pesquisadores avaliaram a ingestão de
obesas e 53% como sobrepeso. água e de outras bebidas pelos adolescentes durante um
Porcentagens inferiores foram vistas por Marques et período de 45 dias e verificaram que o líquido mais consu-
al.13 em sua pesquisa com 86 crianças, de 7 a 10 anos. mido pelos jovens foi a água, seguida do refrigerante, leite,
Os autores encontraram que 17,5% das meninas estavam suco, café, chá e suco natural. Os autores ainda apontam
com sobrepeso e 25% com obesidade, enquanto que entre que 82,2% dos adolescentes ingeriam até dois copos de
os meninos esses valores foram de 4,3% para sobrepeso e água por dia e apenas 17,8% informaram consumir mais
13% para obesidade. Eles ainda citam que o aumento na de dois copos por dia, evidenciando uma inadequação na
porcentagem de sobrepeso e obesidade nas crianças em hidratação destes indivíduos.
idade escolar cresceu nos últimos anos. A respeito da adequação do consumo energético
Segundo os dados colhidos em prontuários no presente comparado ao gasto energético total dos integrantes desta
estudo, foi possível observar uma porcentagem significativa pesquisa, percebeu-se que as porcentagens se reduzem com
de 83,3% de doenças relacionadas à síndrome metabólica o aumento da idade. Notou-se, também, que os valores
BRASPEN J 2018; 33 (3): 296-302
300
Informações nutricionais de crianças e adolescentes

encontrados não justificam o excesso de peso apresentado REFERÊNCIAS


pelos jovens em tratamento nutricional. Autores que inves- 1. Sahoo K, Sahoo B, Choudhury AK, Sofi NY, Kumar R, Bhadoria
tigaram a associação entre o padrão alimentar e o risco AS. Childhood obesity: causes and consequences. J Family
Med Prim Care. 2015;4(2):187-92.
cardiometabólico em crianças e adolescentes apontaram 2. Conde WL, Borges C. O risco de incidência e persistência
que existem dificuldades no inquérito alimentar deste da obesidade entre adultos Brasileiros segundo seu estado
público e, por isso, recomendam cautela na utilização e nutricional ao final da adolescência. Rev Bras Epidemiol.
2011;14(Suppl. 1):71-9.
interpretação destes resultados21. 3. World Health Organization (WHO). Global nutrition targets
Ainda sobre os dados dietéticos, os pacientes que obti- 2025: childhood overweight policy brief (WHO/NMH/
NHD/14.6). Geneva: WHO; 2014.
veram resultados mais satisfatórios quanto à perda ponderal 4. Maniglia FP, Pimentel JCS, Vieira JM. Padrão alimentar de
e redução das medidas de circunferência foram aqueles crianças: influências familiares. Nutr Pauta. 2017;25:20-5.
5. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em
que apresentaram aumento do consumo de alimentos mais Saúde. Departamento de Vigilância de Doenças e Agravos
saudáveis, como frutas e hortaliças, além de diminuição do Não transmissíveis e Promoção da Saúde. VIGITEL Brasil
consumo de refrigerantes e alimentos com alto teor de sódio 2016: Vigilância de Fatores de Risco e Proteção para Doenças
Crônicas por Inquérito Telefônico. Brasília: Ministério da
e gorduras. Resultados semelhantes são reportados por Saúde; 2016.
Mello et al.22 e Silva et al.23, os quais constataram redução 6. Aires APP, Souza CCL, Benedetti FJ, Blasi TC, Kirsten VR.
no consumo de salgadinhos, doces, refrigerantes e demais Consumo de alimentos industrializados em pré-escolares. Rev
AMRIGS. 2011;55(4):350-5.
produtos industrializados, além da ingestão aumentada 7. Rocha EM, Silva MMS, Gomes MPC, Marinho TMRT, Silva
de frutas e hortaliças em jovens em tratamento nutricional. JVL. Relato de experiências do grupo de apoio aos pacientes
obesos atendidos na clínica escola de nutrição. Entre Aberto
Vale ressaltar que, na presente pesquisa, o tempo de Rev Ext. 2015;1(1):1-12.
tratamento não influenciou a perda ponderal e a redução 8. World Health Organization (WHO). Obesity and overweight.
[Internet]. Geneva: WHO; 2017 [citado 2017 Fev 11].
da CB e CC. No estudo de Mello et al.22, realizado no Rio Disponível em: http://www.who.int/mediacentre/factsheets/
Grande do Sul com crianças e adolescentes, verificou-se fs311/en
que um período menor que seis meses de tratamento pode 9. Taylor RW, Jones IE, Williams SM, Goulding A. Evaluation
of waist circumference, waist-to-hip ratio, and the conicity
ser considerado ineficaz, já que a mudança de hábitos pode index as screening tools for high trunk fat mass, as measured
ser lenta e fatores externos e psicológicos podem influenciar by dual-energy X-ray absorptiometry, in children aged 3-19 y.
Am J Clin Nutr. 2000;72(2):490-5.
negativamente na perda de peso. Como a maior parte dos
10. Frisancho AR. Anthropometric standards for the assessment
participantes do presente trabalho apresentou um tempo of growth and nutritional status. Ann Harbor: University of
de tratamento inferior a 6 meses, acredita-se que isso pode Michigan Press; 1990.
11. Institute of Medicine (US). Food and Nutrition Board. Dietary
ter influenciado na manutenção ou perda de peso, como Reference Intakes (DRIs): Estimated Average Requirements.
afirmaram os autores acima. [Internet]. Washington; 2017 [citado 2017 Fev 11]. Dispo-
nível em: http://www.nationalacademies.org/hmd/~/media/
Files/Activity%20Files/Nutrition/DRI-Tables/5Summary%20
CONCLUSÃO TableTables%2014.pdf?la=en
12. Institute of Medicine (US). Food and Nutrition Board. Energy.
De acordo com os dados analisados nos prontuários, In: Institute of Medicine (US). Food and Nutrition Board.
Dietary Reference Intakes – Energy, carbohydrate, fiber, fat,
as crianças e os adolescentes estão inseridos em um estilo fatty acids, cholesterol, protein, and amino acids. Washington:
de vida que favorece o excesso de peso, caracterizado The National Academy Press; 2002. p. 107-264.
pela inatividade física e pelo consumo de alimentos de alta 13. Marques MS, Silva JR, Lima CAG, Maia EMGC. Prevalência de
sobrepeso e obesidade entre crianças de 7 a 10 anos atendidas
densidade energética e baixo valor nutricional. em uma unidade de Estratégia Saúde da Família - ESF. Rev
O atendimento nutricional promoveu aumento da Bras Med Fam Comunidade. 2015;10(37):1-9.
14. Pontes LM, Amorim RJM, Lira PIC. Componentes da síndrome
ingestão de alimentos saudáveis e redução do consumo metabólica e fatores associados em adolescentes: estudo caso-
de produtos industrializados, porém, os resultados desta controle. Rev AMRIGS. 2016;60(2):121-8.
15. World Health Organization (WHO). Diet, nutrition and the
modificação do padrão alimentar ainda foram discretos
prevention of chronic diseases. 2003 [Internet]. [acesso 2017
nos valores antropométricos dos indivíduos. Mar 12]. Disponível em: http://apps.who.int/iris/bitstream/
handle/10665/42665/WHO_TRS_916.pdf?sequence=1
Acredita-se que a duração do tratamento nutricional
16. World Health Organization (WHO). Obesity: preventing and
pode influenciar na promoção de mudança de hábitos managing the global epidemic: Report of a WHO consultation
alimentares e, consequentemente, na melhoria das medidas on obesity. Geneva: WHO; 2000.
17. Veiga GV, Costa RS, Araújo MC, Souza AM, Bezerra IN,
antropométricas, visando à preservação da saúde e quali- Barbosa FS, et al. Inadequate nutrient intake in Brazilian
dade de vida. adolescents. Rev Saúde Pública. 2013;47(Suppl 1):212S-21S.

BRASPEN J 2018; 33 (3): 296-302


301
Costa LCM et al.

18. Porto ACV, Pires BAB, Coelho SC. Frequência de consumo 21. Rocha NP, Milagres LC, Longo GZ, Ribeiro AQ, Novaes JF.
de fast food em crianças de uma escola pública e uma escola Associação entre padrão alimentar e risco cardiometabólico
privada do município de Nova Iguaçu no Rio de Janeiro em crianças e adolescentes: uma revisão sistemática. J Pediatr
e sua influência no perfil nutricional. Acta Pediatr Port. (Rio J). 2017;93(3):214-22.
2013;44(6):301-5. 22. Mello ED, Luft VC, Meyer F. Atendimento ambulatorial indivi-
19. Institute of Medicine, Food and Nutrition Board (US). Dietary dualizado versus programa de educação em grupo: qual oferece
Reference Intakes for Water, Potassium, Sodium, Chloride, mais mudança de hábitos alimentares e de atividade física em
Sulfate. Washington: National Academy Press; 2004. 617 p. crianças obesas? J Pediatr (Rio J). 2004;80(6):468-74.
20. Scabar LF, Amaral RC, Slater B, Frazão P. Ingestão de água e 23. Silva JVL, Timóteo AKCD, Santos CD, Fontes G, Rocha EMM.
bebidas por adolescentes: comparação de uma medida auto- Consumo alimentar de crianças e adolescentes residentes em
aplicável com recordatórios de 24 horas. Rev Bras Odontol. uma área de invasão em Maceió, Alagoas, Brasil. Rev Bras
2014;71(1):28-34. Epidemiol. 2010;13(1):83-93.

Local de realização do estudo: Universidade de Franca, Franca, SP, Brasil.

Conflito de interesse: Os autores declaram não haver.

BRASPEN J 2018; 33 (3): 296-302


302
A Artigo Original
Ângulo de fase em pacientes hospitalizados

Ângulo de fase em pacientes hospitalizados:


relação com parâmetros antropométricos
Phase angle in hospitalized patients: relationship with anthropometric parameters

RESUMO
Jéssica Andressa Soares de Carvalho1
Thaline Milany da Silva Dias1 Introdução: A alta prevalência mundial de desnutrição em pacientes internados tem sido ampla-
Maísa Guimarães Silva Primo1 mente documentada. A implementação de uma avaliação rotineira para detectar a desnutrição
Jordana Rayane Sousa Aguiar1 tem sido dificultada pela carência de um critério universal. Um dos marcadores atualmente
Maria da Cruz Moura e Silva2
Lídia Ribeiro de Carvalho2 investigado é o ângulo de fase (AF), obtido por meio da Bioimpedância Elétrica (BIA). Método:
Ana Lina De Carvalho Cunha Sales3 Trata-se de um estudo transversal, descritivo e observacional realizado com pacientes internados
Suelem Torres de Freitas4 no Hospital Universitário da Universidade Federal do Piauí. A avaliação do estado nutricional dos
pacientes foi realizada por avaliação antropométrica, utilizando-se o índice de massa corporal
(IMC), prega cutânea tricipital, circunferência do braço e circunferência muscular do braço, a fim
de verificar a concordância com a medida do ângulo de fase. Resultados: Nesse estudo não
foram encontrados valores significativos do AF associado ao sexo, escolaridade, renda e estado
nutricional. Verificou-se que apenas a circunferência do braço apresentou correlação positiva e
significativa (r=0,371, p=0,010) e também concordância com ângulo de fase padronizado (AFP)
padronizado considerada moderada (k=0,445), com valores significativos (p=0,002). Conclu-
sões: Não houve associação significativa entre o AFP e variáveis como sexo, renda, escolaridade
e estado nutricional. No entanto, houve correlação significativa apenas com a circunferência do
braço, com a qual observou-se também uma concordância moderada.
Unitermos: ABSTRACT
Antropometria. Estado Nutricional. Avaliação Nutri-
Introduction: The high prevalence of malnutrition in hospitalized patients worldwide has been
cional. Pacientes Internados.
widely documented. The implementation of a routine evaluation to detect malnutrition has been
Keywords: hampered by the lack of a universal criterion. One of the currently investigated markers is the
Anthropometry. Nutritional Status. Nutrition Assess- Phase Angle (PA), obtained through the Electric Bioimpedance (BIA). Methods: This is a cross-
ment. Inpatients. sectional, descriptive and observational study performed in patients hospitalized at the University
Hospital of the Federal University of Piauí. The evaluation of the nutritional status of the patients
Endereço para correspondência: was performed through the anthropometric evaluation, using body mass index (BMI), tricipital
Jéssica Andressa Soares de Carvalho cutaneous fold, arm circumference and muscular circumference of the arm in order to verify
Quadra A9 casa 50 – Conjunto Planalto Uruguai – agreement with the measurement of the angle of phase. Results: In this study were not found
Teresina, PI, Brasil – CEP: 64057-417 significant values with the PA associated with gender, schooling, income and nutritional status. It
E-mail: dressacarvalho28@gmail.com
was verified that only the circumference of the arm showed a positive and significant correlation
Submissão (r=0.371, p=0.010) and also a concordance with standardized phase angle (SPA) considered
27 de dezembro de 2017 moderate (k=0.445) with significant values (p=0.002). Conclusions: There was no significant
association between SPA and variables such as sex, income, schooling and nutritional status.
Aceito para publicação However, there was only a significant correlation with the circumference of the arm, in which a
17 de abril de 2018 moderate agreement was also observed.

1. Nutricionista. Residência pelo Programa Multiprofissional e em Área Profissional da Saúde do Hospital Universitário da Universidade Federal
do Piauí (UFPI-HU), Teresina, PI, Brasil.
2. Mestre; Nutricionista do Hospital Universitário da Universidade Federal do Piauí (UFPI-HU), Teresina, PI, Brasil.
3. Doutoranda. Nutricionista do Hospital Universitário da Universidade Federal do Piauí (UFPI-HU), Teresina, PI, Brasil.
4. Estatística. Universidade Federal do Pará- PROPLAN/UFPA, Belém, PA, Brasil.

BRASPEN J 2018; 33 (3): 303-7


303
Carvalho JAS et al.

INTRODUÇÃO enumeração e sorteios, a fim de que fosse garantida a todos


A alta prevalência mundial de desnutrição em pacientes a mesma probabilidade de participarem da pesquisa.
internados tem sido amplamente documentada. A dete- No entanto, a amostra foi constituída por 48 pacientes,
rioração e a dificuldade em manter o estado nutricional devido a perdas como: dados incompletos no prontuário, e/
adequado são comuns em pacientes hospitalizados e estão ou não conseguiram participar de todas etapas do estudo.
diretamente relacionadas à efetividade do tratamento e à Este estudo seguiu as determinações da Resolução
qualidade de vida1,2. 466/2012 e foi submetido e aprovado pelo Comitê de Ética
A avaliação nutricional torna-se desafio maior e o prin- em Pesquisa do Hospital Universitário da Universidade Federal
cipal instrumento de diagnóstico de distúrbios nutricionais do Piauí – HU- UFPI, CAAE: 59439616.9.0000.8050. Em
que irá direcionar a intervenção adequada do profissional e relação ao protocolo do estudo, foi iniciado com a coleta de
auxiliar no acompanhamento da recuperação e/ou manu- dados realizada pela nutricionista residente e colaboradores
tenção do estado de saúde do indivíduo3. da Unidade de Nutrição Clínica do HU-UFPI, e se deu entre
os meses de junho de 2017 a setembro de 2017, totalizando
A implementação de uma avaliação rotineira para
4 meses de coleta de dados.
detectar a desnutrição tem sido dificultada pela carência
de um critério universal para identificá-la, uma vez que não Foram utilizados formulários específicos para a coleta e
existe consenso em relação ao melhor método para avaliar registro dos dados. As informações obtidas diretamente com
o estado nutricional. Ainda não se dispõe de um “padrão- paciente foram coletadas na própria enfermaria, com total
ouro” descrito na literatura que propicie fazer diagnóstico das discrição. Para descrição das características socioeconômicas
alterações nutricionais com alto nível de eficácia4. e demográficas dos participantes, foram consideradas infor-
mações relacionadas a idade, sexo, estado civil, ocupação/
Dessa forma, faz-se necessário investigar a utilização
profissão, grau de escolaridade e data de nascimento.
de possíveis marcadores que sofram a mínima interferência
possível dessas condições e que tenham boa concordância A avaliação do estado nutricional dos pacientes foi reali-
com os métodos tradicionais de avaliação do estado nutri- zada pela antropometria, utilizando-se o índice de massa
cional. Um dos marcadores atualmente investigado é o corporal (IMC), prega cutânea tricipital, circunferência do
ângulo de fase (AF), obtido por meio da bioimpedância braço e circunferência muscular do braço, a fim de verificar
elétrica (BIA). Este tem despertado interesse nas últimas a concordância com a medida do ângulo de fase. A análise
décadas por ser método objetivo, rápido e não invasivo5. deste foi realizada utilizando-se o aparelho de Bioimpedância
Elétrica Segmentar Direta Multifrequência (DSM-BIA) s10
O AF, por ser capaz de refletir a integridade das
Inbody® portátil, tetrapolar com oito eletrodos.
membranas celulares e a distribuição hídrica entre o meio
intra e extracelular, vem sendo interpretado como indicador Após esses processos, as informações foram organizadas
do estado de saúde. Além disso, evidências têm sugerido em planilhas do Excel® para realização de análise descritiva
que o AF também está associado a alterações no estado das variáveis observadas no grupo estudado. Posteriormente,
nutricional, podendo ser utilizado como ferramenta para o os dados foram exportados para software Statistical Package
diagnóstico nutricional6. for Social Sciences (SPSS v.17.0), para análise estatística
dos resultados. O teste de Shapiro-Wilk foi aplicado para
Neste contexto, o estudo realizará a avaliação do estado
verificar a normalidade dos dados. Em seguida, usou-se o
nutricional por meio de parâmetros antropométricos e sua
teste de Mann Whitney para variáveis com distribuição não
relação com ângulo de fase padronizado em pacientes
paramétrica.
hospitalizados.
A fim de identificar a existência de associações entre as
variáveis analisadas, utilizou-se o teste de Mann Whitney e
MÉTODO Kruskall Wallis. Para o estudo de correlações, foi utilizado o
Trata-se de um estudo transversal, descritivo e observa- coeficiente de correlação de Spearman para variáveis com
cional e foi realizado com pacientes internados no Hospital distribuição não paramétrica. A diferença foi estatisticamente
Universitário da Universidade Federal do Piauí (HU-UFPI), significante quando o valor de p<0,05, adotando-se um
de Teresina, PI. Para o cálculo do tamanho da amostra, intervalo de confiança de 95%.
foi considerada a prevalência de risco nutricional para os Já a concordância entre os métodos foi verificada
pacientes internados de 50%, o nível de confiança de 84%, utilizando-se o coeficiente Kappa. Os seguintes critérios na
a margem de erro de 10% e uma correção de 10% para interpretação dos valores de Kappa foram utilizados: k≤0,20
compensar possíveis perdas, atingindo-se um n=51 pacientes (concordância pobre); 0,21≤k≤0,40 (concordância fraca);
internados a serem estudados. Seguindo a definição do 0,41≤k≤ 0,60 (concordância moderada); 0,61≤k≤0,80
tamanho amostral, os pacientes foram selecionados após (concordância boa); k > 0,80 (concordância muito boa)7.
BRASPEN J 2018; 33 (3): 303-7
304
Ângulo de fase em pacientes hospitalizados

RESULTADOS
Tabela 2 – Valores médios, desvios padrão e mediana da idade, parâmetros
Os resultados referentes às características socioeco- antropométricos, composição corporal e ângulo de fase padronizado de
pacientes hospitalizados. Teresina, 2017.
nômicas e estado nutricional da amostra estudada estão
dispostos na Tabela 1. Entre os 48 pacientes, 52,1% eram Masculino Feminino
do sexo feminino e 47,9%, do sexo masculino. Em relação à Variáveis Média ± DP Média ± Media- Média ± Mediana
escolaridade, 31,3%, possuíam ensino fundamental incom- DP na DP
pleto e 31,3% ensino fundamental completo, demonstrando Idade (anos) 49,79±16,57 53,8±15,4 58 46,0±17,0 49
a baixa escolaridade da população em estudo. A maior parte IMC (kg/m²) 23,59±4,05 23,9±4,01 24,1 23,2±4,12 22,5
(52,1%) apresentou renda familiar superior a um salário PCT (mm) 11,02±5,33 8,94±2,89 8,1 12,9±6,32 13,2
mínimo. Além disso, quanto ao estado nutricional predomi- CB (cm) 26,82±4,32 27,2±2,63 28 26,4±5,47 26
naram pacientes eutróficos com 60,4%, no entanto, houve
CMB (cm) 23,63±4,61 24,6±2,74 24,6 22,7±5,74 21,4
18% com baixo peso.
AFP (Xc/R) -1,69±2,46 -1,33±3,19 -2,3 -2,0±1,49 -2,0
A Tabela 2 mostra que a idade média dos pacientes IMC=Índice de Massa Corporal; PCT=prega cutânea tricipital; CB=Circunferência do braço;
foi de 49,79±16,57 anos para ambos os sexos; o valor CMB=Circunferência muscular do braço; AFP=ângulo de fase padronizado
médio de IMC (23,59±4,05 kg/m²) está condizente com
eutrofia segundo ponto de corte preconizado pela OMS8.
Os valores relacionados à composição corporal, segundo Tabela 3 – Valores de mediana de variáveis como sexo, escolaridade,
o sexo, apresentaram-se inadequados para todos parâme- renda e estado nutricional associados ao ângulo de fase padronizado.
Teresina, 2017.
tros, indicando desnutrição, exceto circunferência muscular
do braço (CMB) no sexo feminino, que estava adequado, Variáveis Mediana (IC 95%) p
indicando eutrofia, segundo valores de referência propostos Sexo
por Frisancho9. Quanto ao ângulo de fase padronizado (AFP), Feminino -2,04 (-2,86; -1,11)
0,893*
verificou-se que os pacientes em questão não possuem risco, Masculino -2,02 (-2,83; -1,54)
apresentando média de AFP de -1,69±2,46 Xc/R. Escolaridade
Os valores medianos das variáveis sexo, risco e estado Não Alfabetizado -2,34 (-3,78; -1,07)
nutricional associadas ao AFP estão apresentados na Tabela
Ensino Fundamental -2,60 (-2,95; -1,31)
3. Não foram encontradas diferenças estatísticas significativas incompleto 0,876**
entre os grupos (p<0,05).
Ensino Fundamental -2,35 (-3,00; -1,42)
Ensino Médio -1,66 (-3,89; -0,38)
Renda Familiar (salários mínimos)
Tabela 1 – Características socioeconômicas e estado nutricional de pa-
cientes hospitalizados. Teresina, 2017. ≤1 -2,36 (-2,86; -1,60)
0,457*
Variáveis N % >1 -1,78 (-2,78; -1,04)
Sexo Estado Nutricional
Feminino 25 52,1 Baixo Peso -2,57 (-2,86;- 088)
Masculino 23 47,9 Eutrofia -2,34 (-2,71; -1,54)
0,622**
Escolaridade Sobrepeso -1,55 (-3,19; 2,71)
Não Alfabetizado 9 18,8 Obesidade -0,17 (-2,95; 6,39)
Ensino Fundamental Incompleto 15 31,3
Ensino Fundamental 15 31,3
A Tabela 4 demonstra os resultados da análise de corre-
Ensino Médio 9 18,8 lação entre AFP e os parâmetros antropométricos. Verificou-se
Renda Familiar (salários mínimos) que apenas a circunferência do braço apresentou correlação
≤1 23 47,9 positiva e significativa (r=0,371, p=0,010) com o AFP.
>1 25 52,1 Por meio da análise de concordância pelo coeficiente
Estado Nutricional de Kappa, avaliou-se o AFP teria boa concordância com os
Baixo Peso 9 18,8 diferentes métodos de identificação do estado nutricional
Eutrofia 29 60,4
(Tabela 5). Verificou-se que das variáveis estudadas a
CB apresentou uma concordância com o AFP conside-
Sobrepeso 7 14,6
rada moderada (k=0,445), com valores significativos
Obesidade 3 6,3 (p=0,002),
BRASPEN J 2018; 33 (3): 303-7
305
Carvalho JAS et al.

mesmos, pois de acordo com Costa4, o ângulo de fase está


Tabela 4 – Coeficientes de correlação entre o ângulo de fase padronizado
e os parâmetros antropométricos e de composição corporal de pacientes diretamente relacionado às membranas celulares (quantidade
hospitalizados. Teresina, 2017. e estado funcional), que é o que a reactância representa.
Peso IMC PCT CB CMB Indivíduos com IMC mais elevado têm mais células de
r=0,167 r=0,152 r=0,191 r=0,371 r=0,267 gordura (ou células musculares), e isso resulta em maiores
AFP valores de ângulo de fase.
p=0,256 p=0,302 p=0,193 p=0,010* p=0,067
AFP=Ângulo de Fase Padronizado; IMC=Índice de Massa Corporal; PCT=prega cutânea No presente estudo, não foi observada associação signi-
tricipital; CB=Circunferência do braço; CMB=Circunferência muscular do braço; *Correlação de ficativa entre o AFP e os gêneros, porém, valores maiores
Spearman (p<0,05).
foram verificados nos homens quando comparados às
mulheres. Achado semelhante foi apontado por Francisco13,
que identificou superioridade significativa do ângulo de fase
Tabela 5 – Concordância entre o ângulo de fase padronizado, parâmetros
antropométricos e de composição corporal. Teresina, 2017. demonstrado pelos homens em relação às mulheres até a
oitava década de vida, sendo que após esta idade os valores
Indicadores Coeficiente Kappa p
tendem a igualar-se.
IMC (kg/m²) 0,089 0,404
Foi demonstrado nessa pesquisa que não houve valores
PCT (mm) -0,011 0,926
significativos (p<0,05) também para escolaridade, renda e
CB (cm) 0,445 0,002* estado nutricional associados ao AFP. Por ser o primeiro estudo
CMB (cm) 0,308 0,022 que avalia a associação entre o AFP e as variáveis citadas, a
IMC=Índice de Massa Corporal; PCT=prega cutânea tricipital; CB=Circunferência do braço; comparação dos resultados com outros estudos fica prejudicada.
CMB=Circunferência muscular do braço
Em relação à correlação entre o AFP e os parâmetros
antropométricos, apenas a circunferência do braço apre-
DISCUSSÃO sentou uma correlação positiva e significativa (r=0,371,
p=0,010) com AFP, resultado semelhante ao encontrado
No presente estudo, em relação à análise socioeconômica
por Costa4. No entanto, estudos evidenciam relações signi-
da população estudada, dados semelhantes foram encon-
ficativas também entre AFP, CMB e IMC.
trados por Silva & Menezes10, em pacientes hospitalizados. No
A correlação significativa desses parâmetros com o AFP
que diz respeito ao estado nutricional, foi verificada predo-
pode reforçar a indicação deste método como indicador
minância de pacientes eutróficos, superando a prevalência
bastante sensível do estado nutricional em pacientes hospi-
de baixo peso comumente encontrada em pacientes hospi-
talizados, uma vez que avalia a quantidade de membranas
talizados, corroborando com os achados de Fillipini et al.11.
celulares intactas. Porém, no presente estudo, só houve
No entanto, o IMC não é um parâmetro que deve ser correlação com CB. Isso pode ter ocorrido devido a alguns
utilizado de forma isolada, pois pode sofrer alterações que fatores limitantes que podem ter influenciado os resultados
não retratam a realidade nutricional do paciente, já que não encontrados, como o tamanho amostral que limitou a repre-
considera as condições clínicas que podem alterar a fisiologia sentatividade da amostra e a heterogeneidade da mesma.
dos tecidos. Sendo assim, deve ser avaliado em conjunto com
A respeito da concordância do AFP com os parâmetros
outros parâmetros de avaliação nutricional.
antropométricos, verificou-se que das variáveis estudadas a
Os valores relacionados à composição corporal, segundo CB apresentou concordância com AFP considerada mode-
o sexo, apresentaram-se inadequados para todos parâmetros rada (k=0,445), com valores significativos (p=0,002),
indicando desnutrição, exceto CMB no sexo feminino, que discordando de Singh & Bakshi14 com coeficiente de concor-
estava adequado, indicando eutrofia, segundo valores de dância pobre.
referência proposto por Frisancho9, resultados semelhantes
Em relação à concordância do AFP com CMB, obteve-se
foram encontrados por Pena12.
uma concordância fraca (k=0,308), sendo semelhante aos
Quanto ao AFP, verificou-se no presente estudo que os encontrados no estudo de Pimentel et al.15 com valores do
pacientes em questão não possuem risco, apresentando coeficiente de 0,167. Para a concordância entre AFP e IMC
média de AFP de -1,69±2,46 Xc/R, Tendo em vista que e PCT, verificou-se o menor valor de concordância, 0,089 e
valores de AFP≤2 são indicativos de desnutrição. No entanto, -0,011, respectivamente. Segundo Pena12, essa baixa concor-
Pena12 verificou que 28,1% possuíam valores reduzidos de dância encontrada entre os marcadores de BIA, como o AFP,
AFP (≤2) em pacientes oncológicos pré-operatórios. e os demais métodos de avaliação do estado nutricional
Cabe ressaltar que, no presente estudo, o fato dos deve-se ao fato de que o AFP e parâmetros antropométricos
pacientes não apresentarem risco nutricional segundo AFP podem expressar diferentes aspectos e níveis de deficiência
deve-se à ocorrência de um maior IMC (eutrofia) entre os nutricional.
BRASPEN J 2018; 33 (3): 303-7
306
Ângulo de fase em pacientes hospitalizados

Tem-se observado que o processo de desnutrição 3. Silva DMM, Santos CM, Moreira MA. Perfil nutricional de
estaria relacionado a alterações moleculares como nas pacientes internados em um hospital público de Recife-PE. Dest
Acad (Lajeado). 2016;8(3):97-108.
membranas celulares que podem ser vistas por meio do 4. Costa GLOB. Ângulo de fase nutricional enquanto indicador no
AFP. Neste sentido, o AFP, por ser capaz de refletir alte- câncer do trato digestório [Dissertação de mestrado]. Salvador:
rações moleculares, é considerado um indicador mais Universidade Federal da Bahia; 2012.
5. Paiva SI, Borges LR, Halpern-Silveira D, Assunção MC, Barros
precoce em relação à antropometria para a detecção da AJ, Gonzalez MC. Standardized phase angle from bioelectrical
desnutrição16. impedance analysis as prognostic factor for survival in patients
with cancer. Support Care Cancer. 2012;19(2):187-92.
Dessa forma, não se pode afirmar que o AFP concorde 6. Malecka-Massalska T, Mlak R, Smolen A, Morshed K. Bioe-
com os métodos de avaliação nutricional utilizados, já que lectrical impedance phase angle and subjective global asses-
os dados encontrados neste trabalho sugerem que o AFP não sment in detecting malnutrition among newly diagnosed
pode ser utilizado como um único método de avaliação de head and neck cancer patients. Eur Arch Otorhinolaryngol.
2015;273(5):1299-305.
referência, uma vez que não demonstrou boa concordância 7. Petrie A, Sabin C. Medical statistics at a glance. London:
em relação aos métodos usados no ambiente hospitalar, Blackwell Science; 2000. 138 p.
sendo interessante a utilização do mesmo em combinação 8. World Health Organization (WHO). Technical Report Series
- Physical status: the use and interpretation of anthropometry.
com outros métodos de avaliação nutricional. Geneva: WHO; 2005.
9. Frisancho AR. Anthropometric standards: an interactive nutri-
tional reference of body size and body composition for children
CONCLUSÃO and adults. 4th ed. Ann Arbor: University of Michigan Press;
2011.
No presente estudo, foi possível constatar que não houve 10. Silva GM, Menezes GGS. Avaliação do perfil sócio demográfico
associação significativa entre o AFP e variáveis como sexo, e hábitos de vida dos pacientes hospitalizados no munícipio de
renda, escolaridade e estado nutricional. No entanto, houve Lagarto, Sergipe. Sc Plena. 2014;10(3):2-9.
11. Fillipini K, Gomes CC, Carvalho APPF, Vieira LL. Acceptance
correlação significativa apenas com a circunferência do of low sodium diet with salt potassium chloride (light salt)
braço e AFP, tendo sido observada, após análise pelo teste in patients hospitalized in a public hospital. Rev Aten Saúde.
de concordância, concordância moderada. Já com o IMC, 2014;12(41):11-8.
12. Pena NF. Associação do ângulo de fase padronizado com estado
PCT e CMB, a concordância foi fraca ou pobre. Assim, o
nutricional e desfechos clínicos em pacientes cirúrgicos oncoló-
AFP como marcador de estado nutricional em pacientes gicos [Dissertação de mestrado]. Belo Horizonte: Universidade
hospitalizados necessita ser investigado mediante estudos de Minas Gerais; 2016.
com amostras maiores. 13. Francisco SIS. Ângulo de fase como indicador do estado
funcional em idosos [Dissertação de mestrado]. Lisboa: Univer-
sidade de Lisboa; 2015.
14. Singh K, Bakshi N. Nutrition assessment and its effect on various
REFERÊNCIAS clinical variables among patients undergoing liver transplant.
1. Aquino RC, Philippi ST. Identificação dos fatores de risco de Hepatobiliary Surg Nutr. 2016;5(4):358-71.
desnutrição em pacientes internados. Rev Assoc Med Bras. 15. Pimentel LR, Sampaio EJ, Sena MHLG, Ferreira AJF, Amaral
2011;57(6):637-43. MTR, Sousa VS, et al. Ângulo de fase e marcadores tradicionais
2. Caccialanza R, Cereda E, Klersy C, Bonardi C, Cappello S, Quar- do estado nutricional em pacientes renais crônicos antes e após
leri L, et al. Phase angle and handgrip strength are sensitive early a hemodiálise. Nutr Clín Diet Hosp. 2017;37(2):125-31.
markers of energy intake in hypophagic, non-surgical patients 16. Barbosa-Silva MC, Barros AJ. Bioelectric impedance and indi-
at nutritional risk, with contraindications to enteral nutrition. vidual characteristics as prognostic factors for post-operative
Nutrients. 2015;7(3):1828-40. complications. Clin Nutr. 2005;24(5):830-8.

Local de realização do estudo: Hospital Universitário – Universidade Federal do Piauí, Teresina, PI, Brasil.

Conflito de interesse: Os autores declaram não haver.

BRASPEN J 2018; 33 (3): 303-7


307
A Artigo Original
Alves TL et al.

Associação entre estado nutricional com tempo


de internamento e prognóstico em pacientes em
Terapia Nutricional em uma Unidade de Terapia
Intensiva de um Hospital da rede privada da
cidade de Lauro de Freitas-BA
Association between nutritional status with hospitalization time and prognosis in patients in
Nutritional Therapy in an Intensive Care Unit of a Hospital of the private network of the city
of Lauro de Freitas-BA

RESUMO
Thiago Laranjeira Alves1 Introdução: O estado nutricional interfere diretamente no quadro clínico do paciente e na resposta
Mara Regina Soares Pereira2 ao tratamento. A má nutrição no paciente hospitalizado pode acarretar aumento do risco de morbi-
Viviane Almeida Lima Leite3 mortalidade, influenciar na duração e na frequência das internações e, consequentemente, elevar os
Alzira Cristina de Santana Rodrigues4 custos de hospitalização. O objetivo deste artigo é avaliar indicadores do estado nutricional, tempo de
Claudia Maria West Nano Rego5 internamento e prognóstico de pacientes em terapia nutricional em uma unidade hospitalar privada
Luiz Carlos de Oliveira Silva6 da cidade de Lauro de Freitas-BA. Método: Estudo prospectivo com pacientes com idade ≥18 anos,
Murilo Costa Safira Andrade7 com abordagem quantitativa de pacientes internados no período de janeiro a outubro de 2016. Foi
Fernando Jorge Cotrim Arantes8 adotada ficha de acompanhamento no tempo mínimo previsto de 48 horas de internação. Após a
inclusão do paciente, foram coletados dados presentes em seu prontuário até a interrupção da dieta,
alta hospitalar ou óbito. Em relação ao tempo de internamento, foi adotado um período ≤7 dias com
bom prognóstico e ≥7 dias com prognóstico ruim. Resultados: Em média, os pacientes permaneceram
18,3 dias internados (p<0,00). Os pacientes apresentaram 47,4% de desnutrição, sendo que 9,4%
foram classificados com desnutrição grave. A mortalidade hospitalar foi de 41,4% (n=110). Aproxima-
damente 57,5% dos pacientes permaneceram internados por ≥7dias. Observou-se associação entre
desnutrição e mortalidade (p<0,029), sendo que dentre os pacientes que foram a óbito, 50,9% (n=56)
eram desnutridos. Observou-se associação também entre tempo de internamento ≥7 dias e estado
nutricional (p<0,013). Conclusão: De forma geral, a prevalência de desnutrição é elevada. A intervenção
Unitermos: nutricional precoce em pacientes com risco de desnutrição leva a um melhor prognóstico, reduzindo
Desnutrição. Avaliação Nutricional. Mortalidade. Tempo os índices de morbidade e mortalidade e melhorando a qualidade de vida.
de Internação.
ABSTRACT
Introduction: Nutritional status interferes directly with the patient’s clinical condition and response to
Keywords: treatment. Poor nutrition in the hospitalized patient can increase the risk of morbidity and mortality,
Malnutrition. Nutritional Assessment. Mortality. Length influence the duration and frequency of hospitalizations and consequently increase hospitalization
of Stay. costs. The objective of this article is to evaluate indicators of nutritional status, length of hospital stay
and prognosis of patients in nutritional therapy in a private hospital in the city of Lauro de Freitas-BA.
Endereço para correspondência: Methods: Prospective study with patients aged ≥18 years, with a quantitative approach of hospitalized
Thiago Laranjeira Alves patients from January to October 2016. Follow-up records were used in the minimum predicted time
Universidade Federal da Bahia, Escola de Nutrição – of 48 hours of hospitalization. After inclusion of the patient, data were collected in his medical records
Rua General Labatut, 30 – Barris – Salvador, BA, Brasil until the interruption of the diet, hospital discharge or death. Regarding hospitalization time, a period
– CEP: 40070-100 of ≤7 days with good prognosis and ≥7 days with poor prognosis were adopted. Results: On average,
E-mail: maotla@hotmail.com the patients remained 18.3 days hospitalized (p<0.00). The patients presented 47.4% of malnutrition,
and 9.4% were classified with severe malnutrition. The hospital mortality rate was 41.4% (n=110).
Approximately 57.5% of the patients remained hospitalized for ≥7 days. There was an association
Submissão between malnutrition and mortality (p<0.029), and among the patients who died, 50.9% (n=56) were
15 de dezembro de 2017 malnourished. There was also an association between hospitalization time ≥7 days and nutritional status
(p<0.013). Conclusion: In general, the prevalence of malnutrition is high. Early nutritional intervention
Aceito para publicação in patients at risk of malnutrition leads to a better prognosis, reducing morbidity and mortality rates
2 de fevereiro de 2018 and improving quality of life.

1. Nutricionista especialista em Nutrição Clínica pela Escola de Nutrição da Universidade Federal da Bahia, Salvador-BA, Brasil. Membro da equipe de terapia nutricional
do Hospital Aliança em Salvador, BA, Brasil.
2. Nutricionista especialista em Nutrição Clínica pela Escola de Nutrição da Universidade Federal de Pernambuco, Brasil. Coordenadora do Serviço de Nutrição e Dietética
do Hospital Aeroporto e Membro da equipe da terapia nutricional do Hospital Aeroporto, Lauro de Freitas, BA, Brasil.
3. Nutricionista especialista em Terapia Nutricional e Nutrição Clínica pelo GANEP Nutrição Humana, Brasil. Membro da equipe de terapia nutricional do Hospital Aero-
porto, Lauro de Freitas, BA, Brasil.
4. Graduada em Nutrição pela União Metropolitana de Educação e Cultura/Lauro Freitas, Brasil. Nutricionista assistente do Hospital Aeroporto, Lauro de Freitas, BA, Brasil.
5. Graduada em Nutrição pela União Metropolitana de Educação e Cultura/Lauro Freitas, Brasil. Membro da equipe de terapia nutricional do Hospital Aeroporto, Lauro
de Freitas, BA, Brasil.
6. Médico especialista em Terapia Nutricional pela Sociedade Brasileira de Nutrição Enteral e Parenteral. Especialista em Medicina Intensiva pela Associação de Medicina
Intensiva Brasileira. Coordenador médico da equipe de terapia nutricional do Hospital Aeroporto, Lauro de Freitas, BA, Brasil.
7. Médico especialista em Terapia Nutricional pela Sociedade Brasileira de Nutrição Enteral e Parenteral. Membro da equipe de terapia nutricional do Hospital Aeroporto,
Lauro de Freitas, BA, Brasil.
8. Médico especialista em Terapia Nutricional pela Sociedade Brasileira de Nutrição Enteral e Parenteral. Especialista em Medicina Intensiva pela Associação de Medicina
Intensiva Brasileira. Membro da equipe de terapia nutricional do Hospital Aeroporto, Lauro de Freitas, BA, Brasil.

BRASPEN J 2018; 33 (3): 308-12


308
Estado nutricional, tempo de internamento e prognóstico em pacientes em Terapia Nutricional

INTRODUÇÃO Após a inclusão do paciente, foram coletados dados


presentes em seu prontuário até a interrupção da dieta, alta
O estado nutricional interfere diretamente no quadro
hospitalar ou óbito. Em relação ao tempo de internamento,
clínico do paciente e na resposta ao tratamento. A má
foi adotado um período ≤7 dias com bom prognóstico e ≥7
nutrição no paciente hospitalizado pode acarretar aumento
dias com ruim prognóstico.
do risco de morbimortalidade, influenciar na duração e na
frequência das internações e, consequentemente, elevar os A avaliação nutricional foi realizada por meio do proto-
custos de hospitalização1. colo de avaliação nutricional padronizado pelo Serviço de
Nutrição e Dietética do HA/BA, no qual a altura foi estimada
Estudos evidenciam que a prevalência de desnutrição
pela fórmula da altura do joelho (diferenciada para ambos
hospitalar tem se mostrado elevada no Brasil2,3. Nas últimas
os sexos) e o peso ideal (PI), estimado pelo Índice de Massa
três décadas, os estudos relacionados à avaliação do estado
Corporal (IMC) médio para a idade, quando ambos eram
nutricional neste grupo mostram que grande parte dos
desconhecidos. Adotaram-se para reavaliação nutricional os
pacientes chega ao hospital com algum grau de desnutrição,
pacientes que ficaram em Terapia Nutricional (TN) a partir
podendo apresentar piora do quadro clínico conforme seu
do 7º dia de internamento.
estado nutricional durante o período de internação4.
Para os idosos, foi preconizada a circunferência da
Neste contexto, a Terapia Nutricional Enteral (TNE) é uma
panturrilha (CP), conforme a classificação para ambos
alternativa que pode ser utilizada em pacientes com impos-
os sexos, e para o grupo dos adultos a circunferência
sibilidade parcial ou total de manter a alimentação por via
do braço (CB) foi classificada segundo a Organização
oral, sendo adotada apenas quando o trato gastrointestinal
Mundial da Saúde (OMS). Após aferição das medidas
estiver funcionante5. O uso da TNE está associado à redução
antropométricas, foram adotados como pontes de cortes:
do risco de diversas complicações, atuando positivamente manteve, melhorou ou piorou as medidas antropomé-
sobre o estado nutricional e, consequentemente, prevenindo tricas. Os valores do IMC foram classificados segundo a
os agravos causados pela desnutrição6. OMS. O cálculo das necessidades energéticas e proteicas
Sabe-se que a terapia nutricional adequada, tanto para a foi determinado de acordo com a doença e o estado
manutenção como para a repleção da composição corporal, nutricional do paciente, conforme recomendações para
é totalmente dependente de uma provisão planejada, indi- pacientes críticos.
vidualizada e precisa de calorias e nitrogênio7. Apesar de Para a análise dos dados, foi utilizado o Programa Statis-
a literatura enfatizar a importância da oferta nutricional tical Package for Social Sciences (SPSS), versão 20.0 (SPSS
apropriada, é observado frequentemente que os pacientes Inc., Chicago, IL, USA). Os dados foram compilados em uma
que estão em uso da TNE recebem valores inferiores aos planilha no software Excel (2010). Para verificar a norma-
prescritos, seja em relação a calorias, assim como relacio- lidade das distribuições das variáveis, foi utilizado o teste
nados aos macronutrientes8. Kolmogorov-Smirnov. As variáveis categóricas são apresen-
Considerando a importância da triagem para o adequado tadas como frequências e percentuais, e as variáveis contí-
cuidado e manejo nutricional, o presente estudo teve por nuas como média±desvio padrão ou ainda como medianas
objetivo avaliar indicadores do estado nutricional, tempo com intervalo interquartis. O teste do Qui-quadrado foi
de internamento e prognóstico de pacientes ingressantes empregado para testar a associação entre as variáveis
na TNE em uma unidade hospitalar privada da cidade de categóricas e o teste t de Student para a comparação entre
Lauro de Freitas-BA. amostras independentes; os testes não paramétricos Mann-
Whitney e Kruskal-Wallis foram utilizados para comparação
entre medianas.
MÉTODO
Quanto ao tamanho amostral, foi considerada uma
Foi realizado um estudo prospectivo com pacientes com margem de erro de 4%, intervalo de confiança de 95%
idade ≥18 anos, de ambos os sexos, internados na Unidade (IC95%) e uma prevalência de adequação às diretrizes de
de Terapia Intensiva (UTI) de um hospital particular da cidade 95%. Diferenças foram consideradas estatisticamente signi-
de Lauro de Freitas-BA, no período de janeiro a outubro de ficativas quando p<0,05.
2016, por meio de fichas de acompanhamento, no tempo
mínimo previsto de 48 horas de internação, que necessitavam
RESULTADOS
de suporte nutricional por via enteral ou com indicação para
a mesma, além de pacientes que receberam dieta via oral Dos 266 pacientes em TNE avaliados no período de dez
com necessidade de suplementação oral ou via parenteral. A meses (janeiro a outubro de 2016), admitidos na UTI do
amostragem foi não probabilística, não possuindo inferência hospital, 51,5% eram do sexo feminino e 48,5%, do sexo
estatística. masculino. Em 73,4% dos pacientes, a fase da vida era
BRASPEN J 2018; 33 (3): 308-12
309
Alves TL et al.

predominantemente idosa. Em média, os pacientes perma- A mortalidade hospitalar foi de 41,4% (n=110). Aproxi-
neceram 18,3 dias internados (p<0,00). madamente 57,5% dos pacientes permaneceram internados
A Figura 1 apresenta o estado nutricional, por meio da por ≥7 dias. Observou-se associação entre desnutrição e
triagem nutricional, com até 48 horas de internamento. Os mortalidade (p<0,029), sendo que, dentre os pacientes que
pacientes apresentaram 47,4% de desnutrição, sendo que foram a óbito, 50,9% (n=56) eram desnutridos. Observou-se
9,4% foram classificados com desnutrição grave. associação também entre tempo de internamento ≥ 7 dias
A distribuição dos indicadores de reavaliação nutricional e estado nutricional (p<0,013) (Figura 2).
dos pacientes no período de janeiro a outubro indicou que
a aferição das medidas antropométricas foi discrepante
DISCUSSÃO
entre os grupos durante todo o período analisado (p<0,03).
Ressaltamos o elevado percentual de piora muscular A desnutrição hospitalar contribui definitivamente para
(76,72%), o que pode ser explicado pelo elevado catabo- a elevação dos índices de morbimortalidade. Conforme
lismo muscular que é inerente do paciente crítico (dados diversos levantamentos publicados, de 30% a 50% dos
não apresentados em tabelas). pacientes internados em hospitais gerais apresentam

Figura 1 - Diagnóstico nutricional dos pacientes em terapia nutricional em um hospital privado da cidade de Lauro de Freitas, BA. Fonte: UTI, HA, 2016.

Figura 2 - Percentual de mortalidade e tempo de internamento de acordo com o estado nutricional, em um hospital privado em Lauro de Freitas, BA.

BRASPEN J 2018; 33 (3): 308-12


310
Estado nutricional, tempo de internamento e prognóstico em pacientes em Terapia Nutricional

algum grau de desnutrição9,10. Um estudo que envolveu do tempo de internação hospitalar, proporcionando maior
13 países da América Latina demonstrou que, dos 9348 reembolso diário do Sistema Único de Saúde ao hospital.
doentes hospitali­zados envolvidos, 50,2% apresentavam Num estudo de coorte, avaliando uma amostra de 709
des­nutrição11. Comparando nossos achados com outros doentes, com o objetivo de relacionar o estado nutri­cional de
autores, podemos observar que a prevalência de 47,4% de doentes hospitalizados com a morbidade, a mortalidade, o
desnutrição corrobora a afirmação de que ao longo das aumento do tempo de internamento e os custos associados,
últimas quatro décadas a prevalência da desnutrição tem verificou-se que a incidência de complicações foi superior no
permanecido elevada12. grupo de doentes des­nutridos: 27% versus 16,8%. Este gru­po
O estudo mais recente na nossa área é o Inquérito Brasi- apresentou ainda maior tempo de internamento: 16,7±24,5
leiro de Avaliação Nutricional Hospitalar (IBRANUTRI), estudo dias versus 10,1±11,7 dias25.
transversal, multicêntrico, envolvendo 12 estados brasileiros
e o Distrito Federal, com amostra de 4.000 doentes. Este
CONCLUSÕES
nos revelou que 43,5% dos pacientes eram nutridos, 39,1%
potencialmente ou moderadamente desnutridos e 17,4% De uma forma geral, a prevalência de desnutrição é
gravemente desnutridos10. elevada. No entanto, existe uma variação considerá­vel que
se deve à ausência de uma definição e critério uniforme
A relação entre massa corporal e mortalidade em
para o diagnóstico nutricional, o que pode comprometer o
pacientes críticos não é bem clara. Sabe-se que o estado
conhecimento da sua verdadeira di­mensão.
nutricional interfere diretamente em sua evolução clínica,
melhorando o prognóstico de vários processos patológicos É indiscutível que o estado nutricional do doente não
clínicos e cirúrgicos13,14.  O paciente hospitalizado previa- deve ser negligenciado pelos profissionais e sistemas de
mente desnutrido apresenta maior índice de complicações, saúde, sendo crucial a implementação de protoco­los de
algumas fatais, e recuperação prolongada15.  rastreio e avaliação nutricional no momento da admissão
hospitalar, não só para corrigir a desnutri­ção existente como
A TN deve ser iniciada entre 24 a 48 horas após a
também prevenir o declínio do estado nutricional durante o
admissão em pacientes hemodinamicamente estáveis,
internamento.
sendo um importante fator na diminuição do estresse
fisiológico e na manutenção da imunidade16. Kurihayashi Um diagnóstico adequado é essencial para que uma
et al.17,  avaliando 25 pacientes internados em UTI com terapia nutricional seja iniciada o mais breve possível e
nutrição parenteral total, observaram que, quando o suporte permita uma intervenção dietoterápica eficiente. O diag-
nutricional foi iniciado precocemente, a mortalidade pode nóstico necessita ser precoce e o monitoramento do estado
ser reduzida em até 13%. nutricional é um dever de toda equipe de saúde que atende
ao paciente internado. A intervenção nutricional em pacientes
No estudo de Khalid et al.18, 60% dos pacientes críticos
com risco de desnutrição leva a melhor prognóstico, redu-
estudados receberam NE precoce, em até 48 horas. Ainda
zindo os índices de morbidade e mortalidade e melhorando
neste estudo, demonstrou-se que NE precoce foi positiva-
a qualidade de vida.
mente associada a um menor risco de mortalidade hospitalar.
Em ambiente hospitalar, a desnutrição está associada
a um prolongamento do tempo de internamento e a um REFERÊNCIAS
aumento dos custos19,20. O rastreio e ava­liação nutricional 1. Konturek PC, Herrmann HJ, Schink K, Neurath MF, Zopf Y.
e o início precoce do tratamento de pessoas desnutridas Malnutrition in hospitals: it was, is now, and must not remain a
provaram ser custo-efetivos21. Um estudo descreveu um problem! Med Sci Monit. 2015;21:2969-75.
2. Alencar MG, Leitão MBS, Prado LVS. Evolução do estado
aumento de 60% nos custos dos doentes que sofreram um nutricional de pacientes internados na clínica médica de um
declínio no seu estado nutricional durante o internamento hospital filantrópico de Pernambuco – Brasil. Nutr Clin Diet
(45.762 dó­lares versus 28.631 dólares)22. Hosp. 2015;35(3):8-16.
3. Santos TMP, Silva AKS, Santos CBA, Souza MSG, Lacerdas DC,
Hernández et al. 23 associaram a desnutrição a um Santos Júnior JA,et al. Desnutrição: uma enfermidade presente
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Local de realização do estudo: Hospital Aeroporto, Lauro de Freitas, BA, Brasil.

Conflito de interesse: Os autores declaram não haver.

BRASPEN J 2018; 33 (3): 308-12


312
A Artigo Original
Perfil nutricional de pacientes imunodeprimidos

Conhecendo o perfil nutricional, clínico e dietético


de pacientes hospitalizados imunodeprimidos
Knowing the nutritional, clinical and dietary profile of hospitalized immunosuppressed patients

RESUMO
Rozinéia de Nazaré Alberto Miranda1
Luanny Kaísa de Oliveira Kauffmann2 Introdução: A síndrome da imunodeficiência adquirida é uma doença que fragiliza o sistema
Amanda Fernandes Pinto2 imunológico e debilita seu portador, favorecendo a ocorrência de infecções oportunistas. O
Aldair da Silva Guterres3 objetivo deste estudo é identificar o perfil nutricional, clínico e alimentar de pessoas vivendo com
HIV/AIDS internados no Hospital Universitário João de Barros Barreto. Método: A pesquisa foi
realizada na Clínica de Doenças Infecciosas e Parasitárias e tratou-se de um estudo transversal e
descritivo, com uma amostra de 54 pacientes, de ambos os sexos, adultos, na faixa etária de 20
a 59 anos, internados no período de abril a outubro de 2014. Utilizou-se formulário próprio para
o levantamento das características demográficas, socioeconômicas, antropométricas, clínicas e
dietéticas. Para verificação das diferenças de médias, foi realizada a análise de variância (ANOVA),
considerando estatisticamente significantes os valores de p<0,05. O grau de associação entre
as variáveis foi medido pela correlação de Pearson. Resultados: Prevalência do sexo masculino,
os pacientes possuem um nível econômico baixo, assim como baixa escolaridade. Todos as
variáveis antropométricas utilizadas: Índice da Massa Corporal (IMC), prega cutânea tricipital,
circunferência braquial e circunferência muscular do braço evidenciaram predominância do estado
de desnutrição, demonstrando déficit de massa magra e gordura corporal. Encontrou-se ainda
significativa correlação linear do IMC com as outras medidas antropométricas compartimen-
tadas. Os sintomas gastrointestinais estão associados, com maior prevalência para náuseas com
vômitos. Quando comparado com o recomendado à ingestão dietética dos pacientes, verificou-se
expressivo consumo de alimentos energéticos, significativo consumo de alimentos construtores e
baixa ingestão de alimentos reguladores. Conclusão: A maioria dos pacientes apresentou estado
nutricional de desnutrição e o perfil alimentar, de modo geral, caracterizou-se por prevalência
de hábitos alimentares saudáveis.

ABSTRACT
Introduction: Acquired Immunodeficiency Syndrome is a disease that weakens the immune system
Unitermos: and its carrier, favoring the occurrence of opportunistic infections. The objective of this study is to
HIV. Antropometria. Estado Nutricional. Desnutrição. identify the nutritional, clinical and dietary profile of people living with HIV / AIDS hospitalized
Dieta Saudável. at João de Barros Barreto University Hospital. Methods: The research was carried out at the
Infectious and Parasitic Diseases Clinic and it was a cross-sectional and descriptive study, with a
Keywords: sample of 54 patients of both sexes, adults, aged between 20 and 59 years, hospitalized from
HIV. Anthropometry. Nutritional Status. Malnutrition. April to October of 2014. A specific form was used to survey the demographic, socioeconomic,
Healthy Diet. anthropometric, clinical and dietary characteristics. In order to verify the differences of averages, the
analysis of variance (ANOVA) was performed, considering statistically significant values of p<0.05.
Endereço para correspondência:
The degree of association between variables was measured by Pearson’s correlation. Results:
Amanda Fernandes Pinto
Travessa 9 de Janeiro, 3286 – Cremação – Belém, PA, Male prevalence, patients with a low economic level, as well as a low level of education. All the
Brasil – CEP: 66065-155. anthropometric variables used: Body Mass Index (BMI), tricipital cutaneous fold, arm circumference
E-mail: amandanutriclinica@gmail.com and arm muscle circumference evidenced a predominance of the malnutrition state, demonstrating
a deficit of both lean and fat mass. It was also found a significant linear correlation between BMI
Submissão and other compartmentalized anthropometric measurements. Gastrointestinal symptoms most
15 de janeiro de 2018 frequently found were nausea and vomiting. In the analysis of dietary intake of patients, there
was significant consumption of energetic and builder foods and low intake of regulator foods
Aceito para publicação compared to recommendations. Conclusion: The majority of patients presented nutritional status
8 de abril de 2018 of malnutrition and the dietary profile, in general, was characterized by healthy eating habits.

1. Nutricionista, Doutora em Biologia de Agentes Infecciosos e Parasitários. Docente da Faculdade de Nutrição, Instituto de Ciências da Saúde,
Universidade Federal do Pará, Belém, PA, Brasil.
2. Nutricionista formada pela Universidade Federal do Pará, Belém, PA, Brasil.
3. Nutricionista, Doutora em Biologia de Agentes Infecciosos e Parasitários. Técnica do Hospital Universitário João de Barros Barreto. Universidade
Federal do Pará, Belém, PA, Brasil.

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313
Miranda RNA et al.

INTRODUÇÃO do braço (CMB), presença ou não de alterações gastroin-


A síndrome da imunodeficiência adquirida (SIDA) é a testinais (vômitos, náuseas diarreias, distensão abdominal)
manifestação clínica extrema pelo vírus da imunodeficiência e dietéticas (questionário de frequência alimentar – QFA)
humana (HIV)1. Caracterizada por uma doença de espectro e aplicadas no período de maio a agosto de 2014, por
amplo, degenerativa, crônica, com curso clínico variável, demanda espontânea de internação.
progressiva supressão do sistema imunológico, indução a A avaliação antropométrica foi realizada mediante
infecções oportunistas recorrentes, alterações nutricionais, aferição das medidas de peso (kg), estatura (m), PCT (mm)
debilitação progressiva e morte1. e CB (cm). As medidas de peso e estatura foram realizadas
em balança e analisador corporal digital científico Wiso Care
O HIV pode originar no seu portador um acentuado
W721, com medidor de altura por ultrassom, capacidade
e contínuo estado de desnutrição devido a uma ingestão
para 180 kg e precisão de 100 g.
alimentar diminuída, ao aumento das necessidades ener-
Para a pesagem, o paciente foi colocado no centro da
géticas, à alteração da absorção e do metabolismo dos
plataforma da balança, em posição ortostática (ereta e com
nutrientes, influenciando a competência imunológica,
os braços estendidos ao longo do corpo), sem sapatos,
tornando o soropositivo mais suscetível a infecções oportu-
casacos ou quaisquer tipos de acessórios. A altura foi medida
nistas e redução na eficácia do tratamento2.
com o paciente em posição ereta, com os pés juntos e
Os sinais e sintomas da desnutrição mais característicos olhando para frente, em posição de Frankfurt.
são a perda de peso, perda de massa magra e massa gorda,
O IMC foi calculado a partir dos dados de massa corporal
déficit em micronutrientes (vitaminas e minerais) e compe- e estatura, através da fórmula IMC = Peso kg/m2, seguindo
tência imunitária diminuída2. o padrão de referência para adultos e classificados conforme
É fundamental uma avaliação nutricional criteriosa nesses os parâmetros estabelecidos pela World Health Organization
indivíduos, investigando as deficiências nutricionais de forma (WHO)5.
global ou isolada, sendo necessário um estudo dos índices A PCT foi aferida no ponto médio, entre o acrômio
antropométricos, clínicos, dietéticos e bioquímicos3. A manu- e o olecrano, realizados em triplicata e obtida a média
tenção do estado nutricional depende de uma combinação aritmética das medidas, determinando-se o valor final. A
de fatores como ingestão apropriada de alimentos, absorção análise da PCT foi comparada com o padrão de referência
eficiente de nutrientes e metabolismo adequado4. de Frisancho6.
O papel da nutrição é fundamental para melhorar o Para a medida da CB, foi utilizada fita métrica inelástica,
estado nutricional do doente por meio da avaliação, diag- seguindo a técnica para mensuração, segundo Augusto et
nóstico, intervenção e monitorização nutricional, devendo al.7 e Kamimura et al.8, verificada no ponto médio, entre
fornecer ao doente uma terapia nutricional individualizada o acrómio e o olecrano do braço não dominante. O valor
e aconselhamento nutricional, a fim de evitar a desnutrição, encontrado foi confrontado com os valores de referência
promovendo a saúde e qualidade de vida dos mesmos2. estabelecido por Frisancho6 segundo os gêneros e idade.
O presente estudo teve por objetivo avaliar o perfil nutri- A CMB foi utilizada para determinação da massa muscular
cional, clínico e dietético de portadores de HIV-1 internados (Kamimura et al.8, utilizando-se as medidas CB e PCT, através
em um hospital universitário. da fórmula: CMB = CB – (0,314 x PCT).
Sua interpretação realizou-se segundo o padrão de
MÉTODO normalidade de Frisancho6 e os resultados classificados por
meio dos valores de referência adaptados de Blackburn &
Tratou-se de um estudo com delineamento transversal, Thorntor9, citados por Kamimura et al.8.
prospectivo, descritivo, com 54 pacientes que estavam Foram coletadas informações sobre a evolução clínica do
conscientes, orientados, de ambos os sexos, adultos de 20 paciente referente a alterações gastrintestinais possíveis de
a ≤ 60 anos, internados na clínica de Doenças Infecciosas e serem vivenciadas durante o período de internação, como
Parasitárias do Hospital Universitário João de Barros Barreto, vômitos, diarreias, distensão abdominal, cólicas abdominais
Belém, PA, que depois de informados sobre o estudo a ser e monilíase oral.
realizado, concordaram em participar da pesquisa e assi-
A identificação de hábitos alimentares foi realizada com o
naram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.
QFA adaptado de acordo com a regionalidade. Classificados
Foi elaborado um formulário próprio para coleta de em grupos: leite e derivados, energéticos (arroz, macarrão
características demográficas (idade e sexo), socioeconômicas e farinha), proteínas (carne de gado, frango, peixe e ovos),
(estado civil, escolaridade e renda familiar), antropométricas reguladores, açúcares e ultraprocessados. O questionário
(Índice de Massa Corporal - IMC), prega cutânea tricipital apresentou quatro opções de frequência (diário, semanal,
(PCT), circunferência braquial (CB) e circunferência muscular mensalmente e raramente ou nunca) e a análise foi feita
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314
Perfil nutricional de pacientes imunodeprimidos

segundo as recomendações da pirâmide alimentar e Guia


Tabela 2 – Classificação das variáveis antropométricas segundo faixa etária
Alimentar da População Brasileira10. em portadores de HIV/AIDS, Belém-PA.
Os dados da pesquisa foram compilados e armazenados
em um banco de dados do programa Excel versão 2007
Antropometria N (%) κ (DP) Anova

e posteriormente analisados no programa Bioestat 5.011. IMC


Tabelas e figuras foram elaboradas no programa Microsoft Desnutrição 30 (55,5) 16,3a (±1,7)
Excel. Para verificar as diferenças de médias, foi realizada a Eutrofia 21 (38,9) 21,0b (±1,9) 0,037
análise de variância (ANOVA). Foram considerados estatis-
Sobrepeso 2 (3,7) 27,0c (±0,8)
ticamente significantes os valores de p<0,05.
Obesidade 1 (1,9) 37,0**
O presente estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em
Pesquisa do Hospital Universitário João de Barros Barreto de PCT
acordo com a resolução nº466 /2012 do Conselho Nacional Desnutrição 50 (92,6) 6,2a (±3,1)
de Saúde, sob o número de 637.225/2014. Eutrofia 2 (3,7) 11,5b (±2,1) 0,002
Obesidade 2 (3,7) 17,0c (±1,4)
RESULTADOS CB
Dos 54 pacientes que participaram do estudo, houve Desnutrição 43 (79,6) 22,2a (±3,8)
predominância do sexo masculino (53,7%), com idade Eutrofia 10 (18,5) 28,5a (±2,1) 0,948
entre 20 e 40 anos (72,2%). A renda familiar de 88,9% dos
Obesidade 1 (1,9) 43,0**
pacientes encontrava-se entre 1 a 3 salários mínimos mensais
e, em relação à escolaridade, a maioria dos pacientes CMB
(66,7%), apresentou de 1 a 8 anos de estudo (Tabela 1). Desnutrição 30 (55,5) 19,6a (±3,7)
A classificação do estado nutricional com valores médios Eutrofia 18 (33,4) 23,27a (±3,8) 0,282
e desvio padrão, segundo faixa etária, é apresentada na Excesso de peso 6 (11,1) 26,65a (±5,6)
Tabela 2. Em relação ao IMC, 55,5% apresentaram desnu-
IMC=Índice de massa corporal; PCT=Prega cutânea tricipital; CB=Circunferência do braço;
trição, seguidos de 38,9% com eutrofia. As demais variáveis CMB=Circunferência muscular do braço; ** Não há desvio padrão, pois apresenta somente um
indivíduo; abc Letras diferentes entre linhas representam diferença significativa entre médias
compartimentadas apresentaram predominância de desnu- pelo teste Anova.
trição, sendo PCT 92,6%, CB 79,6% e CMB 55,5%.

Tabela 3 – Distribuição dos sintomas gastrointestinais associados, encon-


Tabela 1 – Distribuição percentual dos aspectos socioeconômicos e de-
trados em pacientes internados com HIV/AIDS, Belém-PA.
mográficos de portadores de HIV/AIDS, Belém-PA.
Sintomas Gastrointestinais N=54 %
Variáveis N=54 (%)
Sexo Náuseas + vômitos 14 25,92

Masculino 29 53,7 Distensão abdominal + monilíase oral 8 14,81

Feminino 25 46,3 Diarreia + distensão abdominal 5 9,25


Idade Diarreia + monilíase oral 4 7,40
20ǀ----41 39 72,2 Náuseas + vômito + distensão abdominal + 4 7,40
diarreia
41ǀ----60 15 27,8
Estado Civil Distensão abdominal + náuseas + vômito + 4 7,40
monilíase oral
Sem companheiro (a) 36 66,7
Monilíase oral 3 5,55
Com companheiro (a) 18 33,3
Náuseas + vômito + diarreia 2 3,70
Renda Familiar (SM)
Distensão abdominal 2 3,70
1a3 48 88,9
Náusea + diarreia + distensão abdominal 2 3,70
4a7 5 9,3
Mais de 10 1 1,9 Náusea + vômito + distensão abdominal 2 3,70

Escolaridade Náusea + diarreia 1 1,85


1 a 8 anos de estudo 36 66,7 Náusea + vômito + diarreia + monilíase oral 1 1,85
9 a 11 anos de estudo 14 25,9 Vômito + diarreia + distensão abdominal 1 1,85
Mais de 12 anos de estudo 4 7,4 Vômito + diarreia + monilíase oral 1 1,85

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Miranda RNA et al.

Figura 1 - Frequência de consumo de alimentos energéticos, construtores e reguladores encontrados em pacientes internados com HIV/AIDS, Belém-PA.

As associações entre os sintomas gastrointestinais aves e ovos, semanalmente. Alimentos reguladores, como
descritos relataram náusea associada a vômito em maior verduras, legumes e frutas, são consumidos diariamente
percentual (25,92%) nos pacientes, conforme a Tabela 3. e/ou semanalmente; ausência de consumo de alimentos
Analisando o QFA (Figura 1), de acordo com a gordurosos e embutidos.
fre­quência relativa da ingestão de alimentos, observa-se
que os alimentos energéticos, como pão, arroz e farinha,
DISCUSSÃO
são consumidos diariamente, seguidos de batata, macarrão
e biscoitos, semanalmente. Alimentos construtores, como Estudo realizado por Grangeiro et al.12 e Pieri et al.13
o leite, se fazem presentes diariamente na refeição dos encontraram resultados semelhantes (85,6% e 62%, respecti­
pacientes, assim como o feijão, seguido de carnes, peixes, vamente), ao encontrado neste estudo (53,7%) em relação
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316
Perfil nutricional de pacientes imunodeprimidos

à predominância do sexo masculino. Ainda hoje se observa semelhante ao encontrado por Feitosa & Cabral 19, que
que os casos da infecção pelo HIV entre homens são maiores, encontraram valores altos de desnutrição usando esse
o que se fundamenta no fato dos mesmos preocupar-se parâmetro. Segundo Guterres20, a CB representa a soma
pouco com sua saúde, principalmente no que diz respeito à das áreas constituídas pelos tecidos gorduroso, muscular e
prevenção de doenças. Porém, com a feminização da doença ósseo, portanto, valores baixos de CB relacionam-se a um
e a dificuldade que as mulheres encontram de negociar o déficit nutricional geral.
uso do preservativo com o seu parceiro, este cenário vem A CMB avalia a magnitude da massa muscular corporal.
mudando13. Neste estudo, foi detectada presença de desnutrição, seme-
A maior incidência de pacientes com a doença foi encon- lhante ao estudo feito por Silva et al.21, o qual apontou 64,3%
trada na faixa etária de 20 a 40 anos, também observado de pacientes com desnutrição ou déficit de adequação.
por Motta et al.14. Esta incidência maior é compreendida A perda de massa magra, considerada a massa celular,
por um período de maior atividade sexual, associado a um está vinculada a um pior prognóstico da doença22. De acordo
maior descuido no modo de prevenção, como o uso de com Moutinho et al.15, diversos mecanismos podem estar
preservativos e, consequentemente, a falta deste compro- relacionados à ocorrência de desnutrição em pacientes com
misso leva a uma maior capacidade de adquirir e propagar AIDS, tais como: baixa ingestão calórico-proteica, alterações
a doença14. metabólicas, diarreias, infecções oportunistas, alterações
No perfil socioeconômico, encontramos supremacia de neurológicas, fatores psicológicos, interação droga-nutriente
pacientes com nível econômico baixo, associado também e deficiência de vitaminas A, C, B12, B6 e minerais, como
à baixa escolaridade. Esses resultados são semelhantes ao zinco e selênio.
achado obtido por Motta et al.14, que observaram que o É muito comum em pacientes com HIV/AIDS a presença
número de pessoas infectadas pelo HIV com baixo padrão de sintomas gastrointestinais. Os sintomas clínicos especí-
socioeconômico está aumentando. A baixa escolaridade ficos de cada doença e os efeitos colaterais decorrentes
encontrada torna-se relevante, pois a compreensão sobre do tratamento com múltiplas drogas podem ter influência
a enfermidade requer um nível satisfatório de escolaridade. direta sobre a ingestão proteico-calórica, afetando o apetite
Populações com mais anos de estudo têm maior acesso dos pacientes, com a presença de sintomas como náuseas,
à informação, métodos de prevenção e compreensão do vômitos, diarreia, distensão abdominal e monilíase oral.
impacto positivo do tratamento na evolução clínica da
Em estudo feito por Castro et al.17, as alterações gastroin-
doença12.
testinais foram tidas como principais causas de internação
A maioria dos pacientes relatou não possuir companheiro, em 31% dos pacientes. Neste estudo, foi relatada a presença
resultados corroborado com os dados de Pieri et al.13, que de vários sintomas gastrointestinais nos pacientes, acome-
descrevem que, após o indivíduo descobrir que foi infectado tendo todos, sem exceção. Estes sintomas comprometeram
pelo HIV, ele acaba sendo abandonado pelo companheiro. a ingestão total ou parcial de alimentos, em todas as suas
A desnutrição é uma das alterações nutricionais mais consistências, levando os pacientes a ter consequências
comumente relatadas em portadores do HIV/AIDS, sendo nutricionais negativas.
de grande significância para o prognóstico da evolução da O bom estado nutricional é uma condição fundamental
doença15. para a melhora na qualidade de vida desses pacientes. Muitos
O IMC revelou predomínio de estado de desnutrição dos sintomas gerados pela doença, como diarreia, perda de
nestes pacientes. Estudo de desenho semelhante realizado peso, náusea ou vômitos, são possíveis de manejo com uma
por Ribeiro16 observou elevada predominância de baixo peso apropriada nutrição23.
em pacientes hospitalizados por HIV/AIDS, comprometendo Analisando a ingestão dietética, pelo QFA, por grupos de
a função imunológica e qualidade de vida dos mesmos. alimentos, observou-se que, no grupo dos alimentos energé-
Neste estudo, também foi relatada desnutrição na ticos, o consumo de cereais, massas e tubérculos é bastante
avaliação nutricional utilizando as medidas comparti- expressivo, ressaltando o consumo diário de alimentos como
mentadas (PCT, CB e CMB). Esta desnutrição é explicada arroz, farinha e pão. O nível socioeconômico baixo dos
devido ao fato de a perda de peso ser a complicação mais pacientes reflete a escolha destes alimentos, que são os mais
visível e significante ao longo da evolução da infecção baratos dentro da pirâmide alimentar.
pelo HIV17. Verificou-se baixa frequência de consumo de alimentos
Ladeira & Silva demonstraram em seu estudo que a
18
gordurosos e industrializados, para a maioria dos pacientes
maioria dos pacientes apresentou uma baixa reserva de do estudo, demonstrando ser um resultado satisfatório,
gordura subcutânea (PCT), corroborando com a pesquisa. indicando que os pacientes hospitalizados pesquisados,
A classificação da CB evidenciou ocorrência de desnutrição, quando realizam sua consulta no Serviço de Atendimento
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317
Miranda RNA et al.

Especializado (SAE) a nível ambulatorial, recebem orientação REFERÊNCIAS


do profissional nutricionista sobre reduzir estes alimentos, 1. Perrut JF, Santos EP, Oliveira BR, Carneiro ACLL, Oliveira GL,
confirmando terem conhecimento básico do que seria uma Ervilha Junior AB, et al. Risco nutricional e sua associação com
alimentação saudável, assim como são também alimentos o tempo e desfecho da internação de pacientes com AIDS em um
hospital de referência em infectologia de Belo Horizonte. Espaç
mais caros. Saúde. 2014;5(1):57-65.
A alteração no metabolismo dos lipídios é frequente em 2. Silva AMTM. VIH e nutrição: o combate à doença através da
intervenção nutricional [Trabalho Acadêmico]. Porto: Univer-
pacientes que vivem com HIV, independentemente do uso da sidade Fernando Pessoa; 2013.
Terapia Antirretroviral de Alta Potência (TARV), pois somente 3. Sena EA, Freitas CHSM, Pontes ALS. O papel do nutricionista na
a infecção pelo vírus já é capaz de causar dislipidemias em atenção aos portadores do HIV/AIDS no sistema penitenciário
brasileiro: uma revisão da literatura. Rev Bras Ciênc Saúde.
50% dos casos, principalmente pelo HDL baixo, sendo muito 2014;18(Suppl. 2):169-78.
importante um controle de alimentos gordurosos24. 4. Bassichetto KC, Bergamaschi DP, Garcia VRS, Veras MASM.
O grupo dos alimentos construtores apresentou consumo Fatores associados à desnutrição em pessoas com 20 anos e mais,
com HIV/AIDS, em serviços públicos de saúde no município de
diário de leite e feijão. Dentre as carnes, o frango apresentou São Paulo, Brasil. Cad Saúde Pública. 2014;30(12):2578-86.
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das carnes, são crescentes. assessment of nutritional status. J Clin Nutr. 1981;34(1):2540-5.
7. Augusto ALP, Alves DC, Mannarino IC, Gerudes M. Terapia
O menor poder aquisitivo desses indivíduos não possibilita nutricional. São Paulo: Atheneu; 1995.
uma grande aquisição de alimentos variados, levando-os a 8. Kamimura MA, Baxman A, Sampaio LR, Cuppari L. Avaliação
ter uma alimentação mais básica e tradicional, que por sua nutricional. 2ª ed. In: Cuppari L, org. Guia de nutrição: nutrição
clínica do adulto. Barueri: Manole; 2005.
vez apresenta itens de boa qualidade nutricional, a exemplo
9. Blackburn GL, Thornton PA. Nutritional assessment of the
do arroz e feijão. Pessoas com maior renda costumam se hospitalized patient. Med Clin North Am (Philadelphia).
alimentar fora de casa e tendem a consumir alimentos mais 1979;63(5):11103-15.
gordurosos, como refrigerantes, frituras e fast food. 10. Brasil. Ministério da Saúde. Secretária de Atenção à Saúde.
Departamento de Atenção Básica. Coordenação-Geral da Polí-
Aos alimentos reguladores, referidos no estudo, como as tica de Alimentação e Nutrição. Guia alimentar para a população
frutas, verduras e legumes, salienta-se que mesmos apre- brasileira: promovendo a alimentação saudável. Brasília: Minis-
tério da Saúde; 2006.
sentam um consumo diário, entretanto, a ingestão ainda é 11. Ayres M, Ayres Junior M, Ayres DL, Santos AS. BioEstat 5.0:
pequena, não cobrindo o que preconiza a pirâmide alimentar Aplicações estatísticas nas áreas das ciências biológicas e
de 3 a 5 porções de frutas e hortaliças de cores variadas, médicas. Belém: MCT; IDSM; CNPq; 2007. 364 p.
12. Grangeiro A, Holcman MM, Onaga ET, Alencar HDR, Placco
assim como quando comparado ao consumo recomendado
ALN, Teixeira PR. Prevalência e vulnerabilidade a infecção pelo
pelo Guia Alimentar da População Brasileira9. Comprova-se HIV de moradores de rua em São Paulo, SP. Rev Saúde Pública.
o baixo consumo de frutas regionais, com exceção do açaí 2012;46(4):674-84.
e alimentos protetores como farelos. 13. Pieri FM, Laurenti R. HIV/AIDS: perfil epidemiológico de
adultos internados em Hospital Universitário. Ciênc Cuid Saúde.
Realizada em 2008 e 2009, a Pesquisa de Orçamento 2012;11(Suppl):144-52.
Familiar25 apontou que o arroz, feijão, carne bovina e pão 14. Motta WKS, Nóbrega DRM, Santos MGC, Gomes DQC, Godoy
GP, Pereira JV. Aspectos demográficos e manifestações clínicas
apresentaram maiores frequências de consumo. Na Região bucais de pacientes soropositivos para o HIV/Aids. Rev Odontol
Norte, destaca-se o consumo de farinha de mandioca, peixes UNESP. 2014;43(1):61-7.
frescos e de açaí, mostrando similaridade com os resultados 15. Moutinho ABA, Pretto ADB, Moreira NA. Evolução do estudado
nutricional de pacientes com AIDS atendidos em um ambulatório
encontrados nesse estudo. de nutrição. Rev Bras Obes Nutr Emagr. 2015;9(51):85-95.
16. Ribeiro CSA. Prevalência de alterações nutricionais e fatores
de risco para desnutrição em pacientes hospitalizados por
CONCLUSÃO HIV/AIDS [Dissertação de mestrado]. Salvador: Universidade
Federal da Bahia; 2010.
Este estudo mostrou que a maioria dos pacientes encon- 17. Castro AP, Magalhaes M, Lirio M, Paste AA. Perfil socioe-
trou-se desnutrida, com perda de massa magra e gordura conômico e clínico dos pacientes internados com HIV/AIDS
corporal. Ressalta-se a importância da utilização do IMC em hospital de Salvador, Bahia. Rev Baiana Saúde Pública.
2013;37(Suppl. 1):122-32.
combinado com outras variáveis antropométricas para um
18. Ladeira POC, Silva DCG. Estado nutricional e perfil alimentar
diagnóstico mais eficaz do estado nutricional. Os sintomas de pacientes assistidos pelo Programa de DST/AIDS e Hepatite
gastrintestinais observados são um aspecto clínico impor- Virais de um Centro de Saúde de Itaperuna-RJ. DST-J Bras
tante para a manutenção do estado de desnutrição. O perfil Doenças Sex Transm. 2012;24(1):28-31.
19. Feitosa SMC, Cabral CP. Anemia em pacientes HIV-positivo
alimentar, de modo geral, se caracterizou por prevalência de atendidos em um hospital universitário de Pernambuco-Nordeste
hábitos alimentares saudáveis dos mesmos. do Brasil. DST-J Bras Doenças Sex Transm. 2011;23(2):69-75.

BRASPEN J 2018; 33 (3): 313-9


318
Perfil nutricional de pacientes imunodeprimidos

20. Guterres AS. Implantação de um protocolo ambulatorial de with HIV/AIDS. A manual on nutritional care and support
acompanhamento, orientação e terapia nutricional a portadores for people living with HIV/AIDS. Rome: WHO/FAO;
do HIV-1 [Tese de doutorado]. Belém: Universidade Federal do 2002.
Pará; 2014. 24. Silva IRP, Dias RM, Dutra CDT, Mendes ANL, Libonati RMF.
21. Silva VS, Mori RMSC, Guimarães SM. Alterações nutricionais Dislipidemia e estado nutricional em pacientes HIV positivo
em pacientes com lipodistrofia associada ao HIV/Aids de uma com síndrome lipodistrófica. Rev Epidemiol Control Infect.
unidade de referência do município de Belém – Pará. DST-J Bras 2014;4(3):200-7.
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22. Santos KM. Intervenções neurológicas em pacientes adultos Pesquisa de Orçamentos Familiares: 2008-2009. Análise do
infectados pelo vírus da imunodeficiência humana. Int J Nutrol. Consumo Alimentar Pessoal no Brasil [Internet]. Rio de
2016;9(1):119-27. Janeiro: IBGE; 2011. [acesso 2015 Ago 23]. Disponível em:
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nization of the United Nations (WHO /FAO). Living well pdf

Local de realização do estudo: : Hospital Universitário João de Barros Barreto, Belém, PA, Brasil.

Conflito de interesse: Os autores declaram não haver.

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A Artigo Original
Machado SKC & Alves TCHS

Aplicação de indicadores de qualidade em terapia


nutricional enteral em um hospital público de
Salvador-BA
Application of quality indicators in enteral nutritional therapy in a public hospital of Salvador-BA

RESUMO
Sacha Kiss Carvalho Machado1
Thaisy Cristina Honorato Santos Alves2 Introdução: A Terapia Nutricional Enteral (TNE) tem sido empregada para manter e/ou melhorar
as condições nutricionais dos pacientes hospitalizados. Avaliar a TNE por intermédio da aplicação
de indicadores de qualidade contribui para melhoria da assistência, sendo uma ferramenta prática
e de baixo custo. Método: Estudo longitudinal, quantitativo, observacional e prospectivo, reali-
zado nas enfermarias clínicas e cirúrgicas de um hospital público da cidade de Salvador-BA, entre
setembro de 2013 e maio de 2015. Incluídos pacientes adultos e idosos em uso de TNE exclusiva.
Diariamente, ocorreu a coleta dos dados relacionados ao volume de dieta enteral infundido e
às intercorrências associadas à infusão da dieta. A partir desses dados foram calculados os indi-
cadores com análise percentual dos resultados. Resultados: Os indicadores que atenderam de
forma satisfatória às metas propostas foram: frequência de saída inadvertida de sonda enteral
em pacientes em TNE (1,2%), frequência de obstrução de sonda em pacientes em TNE (0,6%) e
frequência de pacientes sob TNE que recuperaram ingestão oral (30,5%). Apresentaram resultados
inferiores à meta: porcentagem de pacientes com volume de NE infundido maior que 70% do
volume prescrito, cujo resultado foi de 65,3% de volume de dieta enteral infundida e frequência
de jejum digestório por mais de 24h em pacientes em TNE, cuja meta limite era até 10% e o
resultado encontrado foi 25,7%. Conclusões: Infere-se que aplicar indicadores de qualidade em
terapia nutricional torna-se um instrumento útil para monitoramento da assistência nutricional,
podendo contribuir para melhoria do suporte clínico nutricional ofertado aos pacientes.
Unitermos:
Indicadores de Qualidade. Terapia Nutricional. ABSTRACT
­Nutrição Enteral. Introduction: Enteral Nutritional Therapy (ENT) has been used to maintain and / or improve
the nutritional status of hospitalized patients. The evaluation of ENT through the application of
Keywords:
Quality Indicators. Nutrition Therapy. Enteral quality indicators contributes to improved care. It is a functional and low-cost tool. Methods:
­Nutrition. A quantitative, observational and prospective longitudinal study carried out in the clinical and
surgical wards of a public hospital in the city of Salvador, Bahia, in the period between September
Endereço para correspondência: 2013 and May 2015. It included adult and elderly patients on exclusive ENT. Data related to the
Thaisy Cristina Honorato Santos Alves volume of infused enteral diet and to the intercurrences associated with the infusion of the diet
Universidade do Estado da Bahia – Departamento were collected daily. The indicators with percentage analysis of the results were calculated from
Ciências da Vida – Colegiado de Nutrição. Rua Silveira this data. Results: The indicators which met the proposed goals were: inadvertent exit frequency
Martins, 2555 – Cabula – Salvador, BA, Brasil – CEP: of enteral catheter in ENT patients (1.2%), frequency of probe obstruction in ENT patients (0.6%),
41150-000 and frequency of patients under ENT that regained oral intake ability (30.5%). The results shown
E-mail: thaisyhonorato@yahoo.com.br
were below the target values: the percentage of patients with infused EN volume greater than
Submissão 70% of the prescribed volume, which resulted in a 65.3% volume of infused enteral diet. A fasting
12 de fevereiro de 2018 frequency of more than 24 hours in ENT patients, whose target limit was up to 10% and the result
found was 25.7%. Conclusions: It can be inferred that employing quality indicators in nutritional
Aceito para publicação therapy is a useful tool for monitoring nutritional assistance, and it may add to the improvement
5 de maio de 2018 of nutritional clinical support offered to patients.

1. Nutricionista. Especialista em Nutrição Clínica sob a forma de Residência Multiprofissional. Pós-graduada em Fitoterapia, Irecê, BA, Brasil.
2. Nutricionista. Mestre em Alimentos, Nutrição e Saúde. Pós-graduada em Nutrição Clínica. Docente do Curso de Nutrição da Universidade do
Estado da Bahia, Salvador, BA, Brasil.

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Indicadores de qualidade em TNE em hospital público de Salvador-BA

INTRODUÇÃO foi realizada até o momento de descontinuação da terapia


Terapia nutricional (TN) consiste na oferta de nutrientes nutricional enteral exclusiva, óbito ou alta da unidade, não
pela via oral, enteral e/ou parenteral, objetivando o forneci- ultrapassando o prazo máximo de 4 semanas de permanência
mento da quantidade necessária de nutrientes para o funcio- no estudo. O monitoramento dos pacientes nesse estudo
namento corporal adequado, a manutenção ou recuperação foi realizado de acordo com o tempo de acompanhamento
do estado nutricional, favorecendo a evolução clínica, e estipulado, totalizando até 4 semanas para cada paciente. Os
dados foram coletados diariamente pelos pesquisadores nos
visando à diminuição no risco de complicações, tempo de
prontuários e na etiqueta da dieta enteral, sendo anotados
internamento, morbidade e mortalidade1.
em formulário específico.
Evidências científicas sugerem que uma oferta nutricional
Os indicadores de qualidade aplicados foram propostos
apropriada é parte integrante do tratamento de pacientes
pela Força Tarefa em Nutrição Clínica do Comitê de Nutrição
doentes criticamente, podendo atenuar a resposta metabólica
do ILSI - International Life Sciences Institute Brasil e pela
ao estresse, impedir a lesão celular e promover uma resposta
Diretriz Brasileira de Terapia Nutricional: Indicadores de
imune favorável2-4.
Qualidade (Tabela 1)4,5. Os indicadores avaliados foram:
Os pacientes em TN devem ser monitorizados de maneira
habitual, sendo esta avaliação responsável por garantir ao frequência de saída inadvertida de sonda enteral em
paciente o acesso à TN adequada, tendo como resultado a pacientes em TNE, frequência de obstrução de sonda em
recuperação clínica a custos baixos. Para tal, foram propostos pacientes em TNE, frequência de jejum digestório por mais de
programas de qualidade, visando ao melhor atendimento 24h em paciente em TNE, frequência de pacientes sob TNE
ao paciente5. que recuperaram ingestão oral e porcentagem de pacientes
Em junho de 2008, a Força-Tarefa de Nutrição Clínica com volume de Nutrição Enteral (NE) infundido maior que
do International Life Sciences Institute (ILSI) Brasil publicou 70% do prescrito.
36 Indicadores de Qualidade em Terapia Nutricional (IQTN) Realizou-se análise descritiva dos dados de forma a
propostos por um conjunto de especialistas em Nutrição caracterizar a amostra levantada na pesquisa e os resultados
Clínica do Brasil, como uma ferramenta de gestão para foram compilados no programa Microsoft Excel® 2010. Poste-
contribuir com a avaliação e revalidação de estruturas e riormente, foram aplicados os indicadores de qualidade, que
processos dentro de padrões de qualidade adotados6. estão de acordo com o publicado pelo ILSI Brasil.
Nesse contexto, o objetivo do trabalho é avaliar o serviço
de Terapia Nutricional Enteral (TNE) em pacientes internados
nas enfermarias médica e cirúrgica de um hospital público Tabela 1 – Indicadores de qualidade aplicados para os pacientes em TNE.
de Salvador-BA, por meio da aplicação de indicadores de Indicador Fórmula Meta
qualidade propostos pela ILSI.
Frequência de saída nº de saída inadvertida de sonda <10% em
inadvertida de sonda enteral x 100 Enferma-
MÉTODO enteral nº total de pacientes em TNE x nº rias
dias com sonda enteral
Estudo longitudinal, quantitativo, observacional e pros-
pectivo, incluindo pacientes maiores de 18 anos (adultos Frequência de obstru- nº de sondas obstruídas em <5%
ção de sonda pacientes em TNE
e idosos), de ambos os sexos, internados nas enfermarias
clínicas de um hospital público da cidade de Salvador-BA. x 100
nº total de pacientes em TNE
Constitui subprojeto de um projeto maior intitulado:
Frequência de jejum nº pacientes com jejum <10%
“Terapia Nutricional Enteral em um hospital público da digestório por mais >24h x 100
cidade de Salvador – BA: comparação entre volume prescrito de 24h nº total de pacientes em TNE
e administrado, e sua relação com a ingestão de energia e
Frequência de pa- nº de pacientes que recuperaram a >30%
nutrientes e com o estado nutricional de pacientes hospi-
cientes sob TNE que alimentação oral x 100
talizados”, submetido e aprovado pelo Comitê de Ética da recuperaram ingestão Total de pacientes em TN enteral ou
Universidade do Estado da Bahia com número de Parecer: oral parenteral
218.433. A coleta de dados ocorreu entre setembro de 2013
Porcentagem de pa- nº de pacientes que receberam volu- >70%
e maio de 2015, após assinatura do Termo de Consentimento
cientes com volume me acima de 70% do prescrito x100
Livre e Esclarecido (TCLE) pelos pacientes ou responsáveis. de nutrição enteral nº total de pacientes
Não foram incluídos no estudo pacientes que apresentaram infundido maior que
recusa à assinatura do TCLE. 70% do prescrito
O acompanhamento iniciou-se no primeiro dia de intro- TN =terapia nutricional; TNE=terapia nutricional enteral.
Fonte: Força Tarefa em Nutrição Clínica (ILSI Brasil, 2008)6; Diretriz Brasileira de Terapia Nutri-
dução da nutrição enteral ou admissão na enfermaria e cional: Indicadores de Qualidade (2011)7.

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Machado SKC & Alves TCHS

RESULTADOS
Tabela 3 – Comparação entre a meta estabelecida pelos indicadores de
Avaliou-se um total de 144 pacientes em TN enteral qualidade e os resultados encontrados.
exclusiva, sendo 50,7% do sexo masculino e 68,8% idosos. Indicador Meta Resultado
O diagnóstico clínico mais frequente nos pacientes foi o de Frequência de saída inadvertida de <10% em 1,2%
doenças cardiovasculares, correspondendo a 41,6% dos sonda enteral em pacientes em TNE Enfermarias
internamentos. As características descritivas da amostra Frequência de obstrução de sonda em <5% 0,6%
encontram-se listadas na Tabela 2. pacientes em TNE
Os resultados da aplicação dos indicadores estão Frequência de jejum digestório por mais <10% 25,7%
de 24h em paciente em TNE
descritos na Tabela 3. Os indicadores que atenderam
de forma satisfatória às metas propostas e expressaram Frequência de pacientes sob TNE que >30% 30,5%
recuperaram ingestão oral
as condições determinantes para a qualidade da terapia
foram: frequência de saída inadvertida de sonda enteral em Porcentagem de pacientes com volume >70% 65,3%
de nutrição enteral infundido maior que
pacientes em TNE, frequência de obstrução de sonda em 70% do prescrito
pacientes em TNE e frequência de pacientes sob TNE que TNE=terapia nutricional enteral.
recuperaram ingestão oral.
No entanto, dois dos indicadores mostraram inade-
quação, sendo eles: porcentagem de pacientes com volume resultado foi de 65,3% de volume de dieta enteral infun-
de NE infundido maior que 70% do volume prescrito, cujo dido, e frequência de jejum digestório por mais de 24h
em pacientes em TNE, cuja meta era menor que 10% e o
resultado encontrado foi 25,7%, apresentando desacordo
Tabela 2 – Características demográficas e clínicas dos pacientes internados com o alvo estabelecido, 15,7 pontos percentuais acima
em uso de TNE exclusiva nas enfermarias de clínica médica e cirúrgica de da meta esperada. Os motivos centrais para justificar esse
um hospital público. Salvador/BA, 2014 (n=144). resultado são os jejuns prolongados pré e pós-operatórios,
Características N % para realização de exames e/ou procedimentos e intercor-
Sexo rências clínicas.
Feminino 71 49,3
Masculino 73 50,7 DISCUSSÃO
Faixa Etária
Um procedimento de qualidade é aquele em que os
Adulto 45 31,2
indicadores exprimem uma resposta muito próxima do que
Idoso 99 68,8 se estabeleceu por objetivo, e que os melhores resultados
Motivo da introdução da TNE são obtidos pelo equilíbrio entre a qualidade dos recursos
Dificuldade ou impossibilidade de 129 89,6 humanos e dos processos6.
alimentação via oral
Infere-se que apenas o acompanhamento constante das
Outras causas 15 10,4 ações realizadas pelos profissionais e pelas instituições pode
Tempo de permanência no estudo assegurar a prestação de um bom serviço, a habilidade
Até 1 semana 65 45,1 de inovação, a progressão para patamares de saúde mais
>1 a 2 semanas 36 25,0 elevados e a utilização de recursos de modo efetivo, eficaz
>2 a 3 semanas 17 11,8 e eficiente6,7.
> 3 a 4 semanas 26 18,1 Os indicadores de qualidade em terapia nutricional são
Enfermidade de base do internamento hospitalar instrumentos significativos para o acompanhamento da TN
ofertada. Sua aplicação continuada possibilita diagnosticar
Doenças do trato gastrointestinal (TGI) 35 24,5
prováveis dificuldades existentes, por meio da análise da
Doenças cardiovasculares 60 41,6
evolução ou retrocesso dos resultados obtidos, permitindo,
Doenças do TGI e cardiovasculares 12 8,3 assim, a melhoria contínua dos processos e operações em TN8.
Outras 37 25,6
Estudos corroboram que a aplicação dos IQTN é uma
Via de administração de dieta nova possibilidade de avaliação da assistência prestada, visto
Sonda nasogástrica ou nasoenteral 137 95,1 que o prosseguimento de protocolo de conduta instituído
Gastrostomia 7 4,9 possibilita identificar e estabelecer estratégias diante dos
n=Número de pacientes; %=Frequência relativa dos pacientes processos que necessitam de melhorias1,9.
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Indicadores de qualidade em TNE em hospital público de Salvador-BA

O presente estudo demonstrou, ao final do acompa- digestório, por exemplo, sugere-se seja feita a abreviação
nhamento, que três, dos cinco indicadores de qualidade do jejum pré-operatório com oferta de solução enriquecida
aplicados, estavam de acordo com as metas pré-estabele- de carboidratos até duas horas antes da operação13.
cidas. Os indicadores que não atingiram a meta proposta Outro ponto relevante é a predominância de idosos na
relacionaram o volume infundido versus prescrito, no qual se amostra analisada. Sabe-se que, juntamente com as alte-
pretendia um valor superior a 70%, tendo encontrado, entre- rações decorrentes do envelhecimento, é habitual o uso de
tanto, o valor de 65,3% de volume infundido; e a frequência fármacos associados que acabam acarretando em complica-
de jejum digestório por mais de 24h em paciente em TNE, ções na ingestão, absorção e utilização de diversos nutrientes,
que objetivava um valor inferior a 10%, sendo encontrado além de que o sistema imune pode estar debilitado durante a
o valor de 25,7%, o que pode acarretar em piora do estado internação, o que pode levar ao comprometimento do estado
nutricional para o paciente em uso da TNE. de saúde geral dos pacientes hospitalizados14.
Cabe salientar que, alguns dos principais fatores Estudo brasileiro realizado na clínica cirúrgica de um
comumente alistados como justificativa para baixa infusão hospital regional do Distrito Federal, em 2014, utilizou o
de dieta enteral são problemas com a sonda, como saída IQTN com o objetivo de monitorar a assistência nutricional
inadvertida ou obstrução, o que não foi o caso da amostra em pacientes cirúrgicos15. Os pesquisadores aplicaram
estudada10. Isso sugere que outros fatores possam estar 9 indicadores de qualidade e, ao final de três meses, os
colaborando para tal fato, como por exemplo: atraso na indicadores que apresentaram resultados inferiores à meta,
administração da dieta, jejum para exames e procedi- apesar da melhora observada durante o estudo, foram: jejum
mentos, falha na comunicação entre profissionais, recusa digestório (37,5%) e perda de proteínas viscerais (37,5%).
do tratamento nutricional, e/ou problemas logísticos Observou-se piora dos resultados ao longo da pesquisa,
operacionais, como atrasos injustificados na entrega ou com ênfase no terceiro mês, o indicador de frequência de
instalação da dieta. diarreia (25%). Concluiu-se que o uso de IQTN é viável e
Ribas et al.10 realizaram estudo com 134 pacientes e os resultados sugeriram que estes sejam uma ferramenta útil
concluíram que as três principais intercorrências encon- para monitoramento da assistência nutricional.
tradas para a não administração da dieta enteral foram Outro estudo avaliou pacientes adultos em Nutrição
recusa ao tratamento, problemas logísticos operacionais Enteral (NE) com diagnóstico de paralisia cerebral, em uma
e pausa para exames e procedimentos. Episódios relacio- instituição pública de Curitiba-PR, em 201416. O referido
nando obstrução ou perda acidental de sonda nasoenteral estudo concluiu que os indicadores relacionados à frequência
tiveram resultados ínfimos, semelhante aos resultados do de administração adequada de energia, proteína e de inter-
presente trabalho. corrências relacionadas à administração de NE apresentaram
Em 2017, foram divulgados os resultados do Screening baixa porcentagem de adequação, refletindo a importância
Day, um estudo observacional transversal, realizado em de seu monitoramento.
Unidades de Terapia Intensiva (UTI) de oito países da América Em Belém-PA, foi realizado estudo em um hospital parti-
Latina, incluindo o Brasil11. Um total de 1053 pacientes cular com pacientes em NE, que demonstrou adequação
em 116 hospitais participaram da avaliação. Dentre os nos seguintes indicadores: triagem nutricional nas primeiras
resultados, foi apontado que 40,3% dos pacientes não 24 horas de internação, estimativa do gasto energético,
atingiram as necessidades calculadas e consumiram em aporte calórico entre 25 a 40 kcal/kg/dia, tempo de ingestão
média 688,8±455,2 kcal/dia a menos do que a quantidade reduzida > 48 horas e episódios de diarreia17. Os autores
esperada ou prescrita. concluí­ram que a efetividade dos indicadores de quali-
Minimizar ocorrências que possam interferir no volume dade em relação ao tempo de permanência do paciente
de dieta infundida é dever da equipe assistencial, visto que no ambiente hospitalar pode predizer a evolução clínica e
ofertar aporte adequado de nutrientes é imprescindível para melhora dos parâmetros de qualidade de vida.
a manutenção da mucosa do trato gastrointestinal, redução Pesquisa semelhante realizada em uma UTI de um hospital
da translocação bacteriana, do risco de infecções e do tempo público de Goiânia-GO, em 2013, com a aplicação de
de internação, bem como para evitar a maior suscetibilidade IQTN, mostrou que 18,2% dos pacientes estiveram em jejum
a infecções, e piora da resposta imune5,7,10. digestório por mais de 24 horas, 54,5% tiveram episódios de
Ao mesmo tempo, almejando também alcançar a diarreia e 31,8% de obstipação18. Ressaltou-se a importância
infusão de dieta prescrita, preconiza-se o início do suporte do controle de intercorrências danosas relacionadas à TNE na
nutricional enteral, quando necessário, precocemente, entre tentativa de reduzir tempo de permanência na UTI, número
24 e 48 horas após a internação, considerando também o e gravidade de complicações, taxa de mortalidade e custos
estado hemodinâmico do paciente12. Em cirurgias do trato nessas unidades.
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Machado SKC & Alves TCHS

Estudo de Oliveira et al.19 publicado em 2018, realizado instrumento de baixo custo, pode fazer parte da rotina da
em UTI de um hospital universitário, acompanhou durante equipe de nutrição, para que as metas almejadas sejam
dois anos as rotinas de nutrição com aplicação de cinco de fato cumpridas.
IQTN propostos pela ILSI. Durante o período, três indica- Assim, as informações coletadas nesse estudo podem
dores mantiveram-se acima da meta proposta (frequência servir como referência teórica para a equipe de terapia
de diarreia, jejum > 24h, e disfunção glicêmica). Os dois nutricional multiprofissional do referido hospital, que está
indicadores restantes só puderam ser analisados no segundo em fase de implantação, a fim de contribuir de forma eficaz
ano do estudo após a criação de protocolos específicos. para a qualidade da TN ofertada.
Foram eles: frequência de estimativa de energia e proteína
e frequência de conformidade na prescrição de TNE, que
REFERÊNCIAS
estiveram em acordo com a meta estabelecida.
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Os estudos supracitados exemplificaram, por meio da parenteral nutritional therapy according to disease and outcome.
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Care Medicine (SCCM) and American Society for Parenteral and
Sabe-se que a diminuição do aporte calórico e de Enteral Nutrition (A.S.P.E.N.). JPEN J Parenter Enteral Nutr.
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enteral é uma possível razão da desnutrição hospitalar, bem
Kazandjiev G, et al.; ESPEN (European Society for Parenteral
como do maior tempo de internamento, do aumento dos and Enteral Nutrition). ESPEN Guidelines on Enteral Nutrition:
gastos hospitalares e maior prevalência de óbitos10,11,14. Intensive care. Clin Nutr. 2006;25(2):210-23.
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Até mesmo nos estudos realizados em UTIs, onde se supõe estado nutricional precedente ao uso de nutrição enteral. Arq
controles rígidos e monitoramento constante, observa-se que Gastroenterol. 2009;46(3):219-24.
as metas nutricionais prescritas não são atingidas, eviden- 5. Dias MCG, Van Aanholt DPJ, Catalani LA, Rey JSF, Gonzales
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a finalidade de otimizar o fornecimento de nutrientes para Conselho Federal de Medicina; 2011.
6. Waitzberg DL, Mateos A, Verotti C. Indicadores de Qualidade
os pacientes assistidos11,16. em Terapia Nutricional. São Paulo: ILSI Brasil; 2008.
Torna-se importante salientar que investir em treinamento 7. Waitzberg DL, Enck CR, Miyahira NS, Mourão JRP, Faim
MMR, Oliseski M, et al. Terapia Nutricional: Indicadores
da equipe e padronização de rotinas relacionadas à terapia de Qualidade. Projeto Diretrizes da Sociedade Brasileira de
enteral. São ações práticas que trazem benefícios para todos Nutrição Parenteral e Enteral. Brasília: Associação Médica
os envolvidos e minimizam as consequências relacionadas à Brasileira e Conselho Federal de Medicina; 2011.
8. Verotti CCG. Contribuição para seleção de dez indicadores de
oferta inadequada de nutrientes aos enfermos5-7. qualidade em terapia nutricional [Dissertação de mestrado]. São
Diante do exposto, fica claro que administrar terapia Paulo: Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo;
nutricional precoce, atingir as metas nutricionais propostas, 2012.
9. Aranjues AL, Caruso L, Teixeira ACC, Soriano FG. Monitoração
evitar pausas desnecessárias durante a administração da da terapia nutricional enteral em UTI: indicador de qualidade?
dieta, minimizar jejuns prolongados e monitorar o volume Mundo Saúde. 2008;32(1):16-23.
da dieta infundida são fatores que devem ser acompa- 10. Ribas BLP, Garcia RS, Abib RT. Motivos para interrupção da
terapia nutricional enteral em pacientes hospitalizados. Rev Bras
nhados diariamente por uma Equipe Multidisciplinar de Nutr Clin. 2014;29(4):331-4.
Terapia Nutricional. Tal monitoramento proporcionará mais 11. Vallejo KP, Martínez CM, Matos Adames AA, Fuchs-Tarlovsky
adequado controle da qualidade nutricional do serviço V, Nogales GCC, Paz RER, et al. Current clinical nutrition prac-
tices in critically ill patients in Latin America: a multinational
oferecido e consequente repercussão na assistência pres- observational study. Crit Care. 2017;21(1):227.
tada aos clientes/pacientes. 12. Reintam Blaser A, Starkopf J, Alhazzani W, Berger MM, Casaer
MP, Deane AM, et al.; ESICM Working Group on Gastro-
intestinal Function. Early enteral nutrition in critically ill
CONCLUSÃO patients: ESICM clinical practice guidelines. Intensive Care
Med. 2017;43(3):380-98.
A aplicação de indicadores de qualidade em terapia 13. Aguilar-Nascimento JE. ACERTO – acelerando a recuperação
nutricional pode auxiliar no monitoramento do serviço total pós-operatória. 3ª ed. Rio de Janeiro: Rubio; 2016.
14. Graciano RDM, Ferretti REL. Nutrição enteral em idosos na
nutricional existente, sendo uma ferramenta aliada para a Unidade de Terapia Intensiva: prevalência e fatores associados.
manutenção da qualidade do serviço ofertado. Por ser um Geriatr Gerontol. 2008;2(4):151-5.

BRASPEN J 2018; 33 (3): 320-5


324
Indicadores de qualidade em TNE em hospital público de Salvador-BA

15. Sá JSM, Marshall NG. Indicadores de Qualidade em Terapia em um hospital particular na cidade de Belém – PA. Rev Bras
Nutricional como ferramenta de monitoramento da assistência Nutr Clin. 2014;29(1):20-5.
nutricional no paciente cirúrgico. Rev Bras Nutr Clin. 18. Brandão VL, Rosa LPS. Nutrição enteral em pacientes internados
2015;30(2):100-5. em unidade de terapia intensiva: análise dos indicadores de
16. Luz ERL, Mezzomo TR. Estado nutricional e indicadores de qualidade. Brasília Med. 2013;50(3):200-5.
qualidade em terapia nutricional enteral em pacientes institucio- 19. Oliveira BADS, Pontes ERJC, Rosa TCA. Resolution of
nalizados com paralisia cerebral. Demetra. 2015;10(1):189-202. control and monitoring instrument of nutritional therapy in
17. Bezerra RGS, Costa VL, Figueira MS, Andrade RS. Indicadores the intensive care unit of a university hospital. Nutr Hosp.
de qualidade na terapia nutricional enteral em sistema fechado 2018;35(1):19-24.

Local de realização do estudo: Hospital Geral Roberto Santos (HGRS) – Secretaria de Saúde do Estado da Bahia (SESAB),
Universidade do Estado da Bahia (UNEB), Salvador, BA, Brasil.

Financiamento: FAPESB – Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado da Bahia/ Programa Institucional de Bolsas de Iniciação
Científica (PIBIC) Bolsa: PIBIC/FAPESB - Pedido Nº 2270/2013

Conflito de interesse: Os autores declaram não haver.

BRASPEN J 2018; 33 (3): 320-5


325
A Artigo Original
Silva ILC et al.

Excreção de zinco na urina em indivíduos com


síndrome metabólica em uso de terapias anti-
hipertensivas
Urinary zinc excretion in subjects with metabolic syndrome using antihypertensive therapies

RESUMO
Isabelli Luara Costa da Silva¹
Erika Paula Silva Freitas²
Introdução: As anormalidades fisiopatológicas que fazem parte da síndrome metabólica podem
Eduardo Paixão da Silva¹ acarretar em aumento da zincúria, especialmente diante do uso de anti-hipertensivos. Objetivo:
Giovanna Melo de Carvalho¹ Avaliar a zincúria de indivíduos com síndrome metabólica submetidos à terapia anti-hipertensiva.
Jainara da Silva Soares¹ Método: Foram selecionados 34 indivíduos adultos e idosos diagnosticados com síndrome
Lucia de Fátima Campos Pedrosa3 metabólica. Os indivíduos foram divididos em dois grupos: monoterapia e terapia combinada,
Josivan Gomes de Lima4 conforme a utilização de anti-hipertensivos. Foram realizadas medidas antropométricas e análises
Karine Cavalcanti Maurício Sena-Evangelista5 bioquímicas. O zinco na dieta foi avaliado por meio de dois recordatórios de 24 horas. As deter-
minações de zinco na urina 24h foram realizadas por espectrofotometria de absorção atômica.
Resultados: Os indivíduos apresentaram média de idade de 47,7 anos no grupo monoterapia e
51,1 anos para a terapia combinada, com predominância do sexo feminino (87,5%). No grupo
de monoterapia, houve predominância do uso de bloqueadores dos receptores de angiotensina
e bloqueadores beta-adrenérgicos (ambos n=6; 33,3%) e, no grupo terapia combinada, prevale-
ceram as combinações de bloqueadores dos receptores de angiotensina e diurético (n=7; 43,8%).
Os valores de zinco na urina de 24 horas [323,15 µg Zn/24horas (42,7-1405,2) vs. 358,7 µg
Zn/24horas (195,5-632,4); p=1,000] e consumo médio de zinco [6,5 (2,6) vs. 6,3 (3,9) mg/dia;
p=0,841] não diferiram significativamente entre os grupos. A hiperzincúria foi registrada em 22,2%
dos indivíduos em monoterapia e 14,3% dos indivíduos em terapia combinada. Foram obtidas
correlações estatisticamente significativas (todos p<0,05) entre a zincúria e zinco da dieta no
grupo monoterapia (Rs= 0,527; p=0,025) e triglicerídeos no grupo terapia combinada (Rs=0,582;
p=0,037). Conclusão: Não houve alteração da zincúria em função da terapia anti-hipertensiva
utilizada, entretanto, os indivíduos do grupo monoterapia apresentaram maior frequência de
hiperzincúria e também correlação positiva com o zinco da dieta.

ABSTRACT
Introduction: The pathophysiological abnormalities of metabolic syndrome can lead to an increase
Unitermos: in zincuria, especially in the presence of antihypertensive drugs. Objective: This study aimed to
Síndrome Metabólica. Zinco. Urina. Anti-­Hipertensivos. evaluate the zincuria of individuals with metabolic syndrome undergoing antihypertensive therapy.
Method: We selected 34 adult and elderly individuals diagnosed with metabolic syndrome. Subjects
Keywords: were divided into two groups: monotherapy and combination therapy, according to the use of
Metabolic Syndrome. Zinc. Urine. Antihypertensive antihypertensives. Anthropometric measurements and biochemical analyzes were performed. Zinc
Agents. intake was evaluated by means of two 24-hour recall. The determination of 24-h urinary zinc
excretion was performed by atomic absorption spectrophotometry. Results: Individuals presented a
Endereço para correspondência: mean age of 47.7 years in the monotherapy group and 51.1 years for the combined therapy, with
Karine Cavalcanti Maurício de Sena Evangelista a predominance of females (87.5%). In the monotherapy group, the use of angiotensin receptor
Departamento de Nutrição/UFRN – Av. Sen. Salgado blockers and beta-adrenergic blockers (both n=6; 33.3%) predominated, and combinations of
Filho, 3000 – Lagoa Nova – Natal, RN, Brasil – CEP: angiotensin and diuretic receptor blockers (n=7; 43.8%). The 24-h urinary zinc excretion [323.15
59078-970 μg Zn / 24 hours (42.68-1405.20) vs. 358.70 μg Zn/24 hours (195.47-632.42); p=1,000], and
the zinc intake [6.5 (2.6) vs. 6.3 (3.9) mg/day, p=0.841] did not differ significantly between
E-mail: kcmsena@yahoo.com.br groups. Hyperzincuria was recorded in 22.2% of the individuals in monotherapy and 14.3% of the
individuals in combination therapy. Statistically significant (all p<0.05) correlations were observed
Submissão between zincuria and zinc intake in the monotherapy group (Rs=0.527, p=0.025), and between
15 de fevereiro de 2018 zincuria and triglycerides in the combination therapy group (Rs=0.582, p=0.037). Conclusion:
There was no change in zincuria as a result of the antihypertensive therapy used, however, the
Aceito para publicação individuals in the monotherapy group presented a higher frequency of hyperzincuria and also a
2 de maio de 2018 positive correlation with zinc intake.

1. Graduanda (o) do Curso de Nutrição da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, RN, Brasil.
2. Nutricionista, Mestre em Nutrição pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, RN, Brasil.
3. Nutricionista, Doutora em Ciências dos Alimentos pela Universidade de São Paulo. Docente do Departamento de Nutrição - Universidade
Federal do Rio Grande do Norte, Natal, RN, Brasil.
4. Médico endocrinologista, Doutor em Ciências da Saúde pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Docente do Departamento de
Medicina Clínica - Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, RN, Brasil.
5. Nutricionista, Doutora em Ciências pela Universidade de São Paulo. Docente do Departamento de Nutrição - Universidade Federal do Rio
Grande do Norte, Natal, RN, Brasil.

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326
Excreção de zinco na urina de indivíduos com síndrome metabólica

INTRODUÇÃO envolvendo o público de indivíduos com SM, esse estudo


A síndrome metabólica (SM) pode ser caracterizada por tem como objetivo avaliar a excreção de zinco na urina de
fatores de risco cardiovascular que se relacionam intima- indivíduos com SM considerando o uso de diferentes terapias
mente com a adiposidade central e a resistência à insulina. anti-hipertensivas. Os resultados desse estudo podem auxiliar
Os principais componentes da SM são a obesidade central, na fundamentação de condutas clínico-nutricionais voltadas
alterações da homeostase da glicose, como hiperglicemia ou para o manejo dessa interação.
diabetes mellitus (DM) tipo 2, elevação da pressão arterial,
hipertrigliceridemia e valores inferiores de lipoproteína de MÉTODO
baixa densidade (HDL-c)1.
Caracterização da população
Dentre as anormalidades metabólicas que fazem parte da Esse trabalho é do tipo transversal e foi derivado de
condição clínica de SM, destaca-se a presença de hipertensão
um estudo maior intitulado “Avaliação do status de zinco
arterial sistêmica. A hiperglicemia e hiperinsulinemia, carac-
em pacientes com Síndrome Metabólica”. O estudo foi
terísticas da SM, estimulam a ativação do sistema renina-
aprovado pelo Comitê de Ética e Pesquisa do Hospital
angiotensina-aldosterona e do sistema simpático, levando
Universitário Onofre Lopes (CEP - HUOL) (nº CAAE:
ao aumento da absorção de sódio nos rins que resultam em
38566914.5.0000.5292). Os indivíduos da pesquisa
vasoconstricção arterial. O tecido adiposo também influencia
assinaram um Termo de Consentimento Livre e Esclarecido,
nesse processo por meio da produção de aldosterona1,2.
formalizando a sua participação.
Considerando a multicausalidade da SM, o tratamento
A amostra foi obtida por conveniência, composta por 34
inclui estratégias farmacológicas e comportamentais e dentre
indivíduos, os quais foram distribuídos em grupos conside-
as possibilidades terapêuticas mais comuns destaca-se a utili-
rando a terapia anti-hipertensiva. Foram considerados como
zação de medicamentos para as comorbidades associadas
critérios de inclusão indivíduos adultos e idosos, de ambos
(hipoglicemiantes, hipolipemiantes e anti-hipertensivos),
os sexos e com o diagnóstico de SM em uso de medicação
além de modificações dietéticas3. Nesse sentido, os planos
anti-hipertensiva, atendidos entre março de 2015 e fevereiro
alimentares incluindo os antioxidantes são priorizados,
de 2016, no Ambulatório de Endocrinologia do Hospital
visando controlar o estresse oxidativo presente na SM4.
Universitário Onofre Lopes (HUOL) da Universidade Federal
Dentre os nutrientes antioxidantes, o zinco está intimamente
do Rio Grande do Norte, em Natal, RN.
ligado a essa condição clínica, pois, além de sua atividade
antioxidante, possui ação na secreção de insulina e na Os fatores de exclusão compreenderam: DM tipo 1, DM
hipertensão arterial5,6. tipo 2, uso de glicocorticoides nos últimos 3 meses, alterações
da função renal [clearance de creatinina estimado pelo Modi-
A avaliação do status de zinco no organismo é realizada
fication of Diet in Renal Disease (MDRD) < 60mL/minuto]
considerando os biomarcadores envolvidos no seu processo
e hepática (valores três vezes acima da faixa de referência
homeostático, tais como a ingestão dietética, concentrações
das transaminases), insuficiência cardíaca descompensada,
no plasma e no eritrócito. A mensuração da excreção de
com histórico de doença cardiovascular ou evento cardiovas-
zinco na urina de 24h tem se mostrado um biomarcador
potencial, entretanto, essa é suscetível a estados fisiológicos e cular, pessoas com problemas de memória ou saúde mental,
metabólicos específicos e se mostra pouco sensível à ingestão estado de gravidez ou lactação ou uso de suplemento de
de zinco da dieta7. vitamínico-mineral.

Atualmente, a relação existente entre o aumento da perda Foram considerados como portadores da SM aqueles
de zinco através da urina diante da utilização de terapias anti- indivíduos que apresentaram pelo menos três das seguintes
hipertensivas e a presença de hipertensão arterial tem sido alterações: perímetro da cintura > 102 cm em homens e >
explorada em estudos de revisão8. Autores demonstraram que 88 cm em mulheres; triglicerídeos ≥ 150 mg/dL; HDL-c <
indivíduos portadores de hipertensão arterial submetidos à 40 mg/dL em homens e < 50 mg/dL em mulheres; pressão
farmacoterapia possuíam maior excreção de zinco na urina arterial ≥ 130 mmHg ou ≥ 85 mmHg11. O ponto de corte da
do que indivíduos saudáveis. Essa tendência parece se manter glicemia de jejum foi alterado para ≥ 100 mg/dL conforme
mesmo em indivíduos que receberam dietas planejadas recomendações da American Diabetes Association12.
com ingestão adequada de minerais, permanecendo com
concentrações elevados de perdas urinárias9,10. Avaliação antropométrica e medida da pressão
Dessa forma, considerando os resultados encontrados na arterial
literatura que indicam uma possível relação entre a utilização Para a avaliação do perímetro da cintura, foi utilizada fita
de terapias anti-hipertensivas e o aumento da excreção métrica inextensível e a medida foi realizada em duplicata.
de zinco na urina, bem como a escassez de publicações A mensuração seguiu o padrão de referência do National
BRASPEN J 2018; 33 (3): 326-34
327
Silva ILC et al.

Cholesterol Education Program (NCEP-ATP III)11. Mediante As determinações de zinco na urina foram realizadas
as medidas de peso e estatura, a classificação do Índice de por espectrofotometria de absorção atômica, utilizando-se
Massa Corporal (IMC) para adultos foi realizada de acordo o equipamento Spectra Varian AA-240 (Varian®, EUA), do
com os pontos de corte da World Health Organization13. Núcleo de Ensino e Pesquisa em Petróleo e Gás (NUPEG)
Para os idosos, utilizou-se os pontos de corte propostos do Departamento de Engenharia Química – UFRN, consi-
por Lipschitz14. A pressão arterial sistólica e diastólica, por derando um comprimento de onda de 231,9 nm, fenda de
sua vez, foi avaliada durante a consulta clínica, seguindo 1,0 nm, amperagem de 5,0 mA, fator de expansão 1,0
as recomendações da 7ª Diretriz de Hipertensão Arterial15, e fluxo da amostra de 5 mL/min. As curvas foram prepa-
considerando-se os pontos de corte do NCEP-ATP III11. radas utilizando-se como padrão a solução de zinco Tritisol
(Merck®), definindo-se os pontos na curva, nas concentrações
de 0,0; 0,1; 0,2; 0,3; 0,5 e 1,0 µg/mL.
Avaliação bioquímica
As análises bioquímicas foram realizadas por meio de As análises foram realizadas em duplicata e o resultado
coleta de sangue dos participantes após jejum noturno de foi obtido a partir das médias dos valores, estabelecendo-se
12 horas. As dosagens de triglicerídeos e glicemia de jejum um coeficiente de variação inferior a 10%. A determinação
foram realizadas pelo método enzimático, enquanto que a da concentração de zinco na urina foi realizada seguindo
concentração de HDL-c foi analisada por ensaio colorimé- o método proposto por Kiilerich et al.16. As amostras de
trico direto. Para todos os métodos, foram utilizados os kits urina foram diluídas em água deionizada na proporção de
da Wiener-Lab (Equipamento CMD 800ix1). 1:1 (2mL/2mL). Em seguida, as mesmas foram cuidadosa-
mente homogeneizadas sob agitação e lidas por aspiração
em chama direta, após ajuste das condições de leitura do
Avaliação da terapia anti-hipertensiva
aparelho. Os resultados foram expressos em µg Zn/24h,
A definição dos grupos conforme terapia anti-hipertensiva
considerando como referência valores de 300 a 600µg
foi baseada nas recomendações da 7ª Diretriz de Hipertensão
Zn/24horas17.
Arterial15, que indica quais são os critérios para o esquema de
monoterapia o de terapia combinada, bem como as classes
de medicamentos utilizadas atualmente. A monoterapia foi Avaliação do zinco da dieta
estabelecida para os indivíduos selecionados que faziam uso O consumo de zinco na dieta foi obtido por meio do
de apenas um fármaco, enquanto aqueles que utilizavam dois método recordatório de 24 horas (R24h), aplicado duas
fármacos ou mais foram classificados no grupo de terapia vezes, com intervalo de 30-45 dias. A análise das dietas foi
combinada. realizada utilizando o software Virtual Nutri Plus 2.0®. Para
Entre os anti-hipertensivos utilizados pelos indivíduos do avaliar a ingestão dietética de zinco, foi tomado como base
estudo e suas respectivas classes de medicamentos, foram o valor de Estimated Average Requirements (EAR) segundo
identificados: (1) Diuréticos (hidroclorotiazida e furosemida); Food and Nutrition Board (FNB) - Institute of Medicine18, o
(2) Inibidores adrenérgicos – betabloqueadores (atenolol, qual apresenta valor de 6,8 mg ao dia para mulheres e 9,4
bisoprolol e metoprolol); (3) Bloqueadores dos canais de mg ao dia para homens.
cálcio (anlodipino e nifedipino); (4) Inibidores da Enzima
Conversora de Angiotensina (ECA) (captopril, enalapril, Análises estatísticas
perindopril, ramipril); (5) Bloqueadores dos receptores de A análise descritiva incluiu média e desvio padrão, para
angiotensina (losartana). as variáveis quantitativas que apresentaram uma distribuição
normal, e frequências relativas (percentuais) e absolutas,
Avaliação das concentrações de zinco na urina para as variáveis categóricas. As distribuições de frequência
Para avaliação das concentrações de zinco na urina, das variáveis qualitativas foram comparadas utilizando o
inicialmente, todo o material utilizado nos procedimentos teste qui-quadrado (κ2). O teste de Shapiro-Wilk foi aplicado
de coleta da amostra e análise da urina foi devidamente inicialmente antes de realizar os testes de comparações
desmineralizado em solução de ácido nítrico 20% por, no das variáveis quantitativas, no sentido de identificar se os
mínimo, 12 horas, e enxaguado com água desmineralizada, dados seguiam uma distribuição normal. Para as amostras
de acordo com protocolo estabelecido. A urina de 24h foi independentes com distribuição normal, na comparação
armazenada em recipiente desmineralizado em geladeira entre os grupos, foi usado o Teste “T”-Student, enquanto
durante a coleta, e no momento da entrega o material foi que para as de distribuição assimétrica utilizou-se o teste
homogeneizado, verificado o volume total e separadas duas U-Mann-Whitney.
alíquotas que foram armazenadas a -20°C até o momento As correlações entre a excreção de zinco na urina e
das análises. zinco da dieta foram estabelecidas pelo Teste de correlação
BRASPEN J 2018; 33 (3): 326-34
328
Excreção de zinco na urina de indivíduos com síndrome metabólica

de Spearman. Para todos os testes, considerou-se estatisti- uso de bloqueadores dos receptores de angiotensina e
camente significantes os resultados cujos níveis descritivos bloqueadores beta-adrenérgicos (ambos n=6;33, 3%). No
de valores de p foram inferiores a 0,05. As análises foram grupo terapia combinada, prevaleceram as combinações
realizadas pelo programa Statistical Package for the Social de bloqueadores dos receptores de angiotensina e diuré-
Science v. 17.0. tico (n=7; 43,8%), inibidores da enzima conversora de
angiotensina (combinação de dois fármacos) e diurético e
RESULTADOS bloqueadores dos receptores de angiotensina, diuréticos e
bloqueadores adrenérgicos (combinação de três fármacos)
Não houve diferença de idade entre os grupos, predomi- (ambos n=3; 18,8%).
nando o sexo feminino em ambos os tipos de terapia. A média
Com relação à excreção de zinco na urina 24h,
do IMC dos indivíduos com SM da monoterapia foi signi-
não foram observadas diferenças significativas entre os
ficativamente inferior quando comparada com aqueles em
grupos (p=1,000), registrando-se valores de mediana
uso da terapia combinada (p=0,034). A classificação dessa
dentro dos valores de referência tanto para a monote-
medida demonstrou que os indivíduos com SM do grupo
rapia [323,2 µg Zn/24horas (42,7-1405,2)] quanto para
terapia combinada apresentou significativamente maior
frequência de obesidade em relação ao grupo monoterapia a terapia combinada [358,7 µg Zn/24horas (195,5-
(p=0,003). Considerando os componentes utilizados para o 632,4)] (Figura 2).
diagnóstico da SM, não observamos diferenças significativas Analisando individualmente a excreção de zinco na urina
entre os grupos (todos p>0,05), apenas uma tendência a dos indivíduos com SM por grupo de terapia anti-hipertensiva,
maiores medianas de perímetro da cintura no grupo terapia observamos que a hiperzincúria foi registrada em 22,2% dos
combinada (Tabela 1). indivíduos em monoterapia e em 14,3% dos indivíduos em
As Figuras 1A e 1B apresentam as principais classes terapia combinada (Figura 3).
de medicamentos anti-hipertensivos utilizados pelos indi- Ao avaliar o zinco da dieta, não se observou diferença
víduos com SM em monoterapia e terapia combinada, significativa entre os grupos (p=0,841). Os indivíduos em
respectivamente. Observou-se que, no grupo de indiví- monoterapia apresentaram um consumo médio de zinco
duos com SM em monoterapia, houve predominância do de 6,5 mg/dia (2,6), enquanto que aqueles em terapia

Tabela 1 – Características gerais e componentes de diagnóstico da SM dos indivíduos com SM em uso de monoterapia anti-hipertensiva ou terapia combinada.
Terapias anti-hipertensivas
Variáveis Monoterapia Terapia combinada p-valor
(n=18) (n=16)
Idade (anos)a 47,7 (6,0) 51,1 (12,5) 0,302
Sexo b

Masculino 4 (22,2) 2 (12,5) 0,660


Feminino 14 (77,8) 14 (87,5) 0,660
IMC (kg/m²)a 32,0 (6,0) 37,1 (7,5) 0,034
Classificação do IMC b

Eutrofia - - -
Sobrepeso 8 (44,4) - -
Obesidade/Excesso de peso 10 (55,6) 16 (100,0) 0,03
Componentes de diagnóstico da SM
PC (cm)c 97,3 (90,0-127,0) 106,3 (91,8-135,7) 0,070
PAS (mmHg) c
130,0 (120,0-190,0) 135,0 (110,0-200,0) 0,832
PAD (mmHg) c
90,0 (80,0-120,0) 90,0 (80,00-110,0) 0,759
GJ (mg/dL)c 94,0 (75,0-147,0) 104,5 (69,0-125,0) 0,277
HDL-c (mg/dL) a
44,6 (7,8) 44,5 (5,6) 0,981
TG (mg/dL) a
170,9 (57,2) 171,6 (86,0) 0,979
a=Dados apresentados como média (desvio padrão); b=Dados apresentados como número (percentual); c=Dados apresentados como mediana (mínimo-máximo); IMC=Índice de Massa Corporal;
PC=Perímetro da cintura; PAS=Pressão arterial sistólica; PAD=Pressão arterial diastólica; GJ=Glicemia de jejum; TG=Triglicerídeos; SM=Síndrome Metabólica.

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Figura 1 - Classes de medicamentos anti-hipertensivos mais utilizados pelos dos indivíduos com SM em uso de terapia anti-hipertensiva.

combinada obtiveram uma ingestão média de 6,3 (3,9) mg/ DISCUSSÃO


dia. Os indivíduos do sexo feminino de ambos os grupos
Nesse estudo pioneiro com enfoque na zincúria de indi-
apresentaram uma ingestão média de zinco (5,5±1,7 vs.
víduos com SM em função do uso de terapias anti-hiperten-
5,7±3,2 mg/dia, p= 0,934) inferior ao ponto de corte da
sivas, verificamos uma população predominantemente de
Estimated Average Requirements (EAR), enquanto que os
indivíduos do sexo feminino, com percentuais expressivos de
homens (9,9±1,3 vs. 10,2±7,5 mg /dia, p=0,857) ultra-
passaram os valores estabelecidos11. obesidade. Apesar da diversidade nas terapias anti-hiperten-
sivas, observamos que valores de zinco na urina 24h não
Foi observada, ainda, correlação estatisticamente signi-
diferiram significativamente entre os grupos, e que consumo
ficante entre a excreção de zinco na urina e zinco da dieta
médio de zinco do sexo feminino foi abaixo do ponto de
no grupo de indivíduos com SM em uso de monoterapia
corte. O zinco da dieta apresentou-se correlacionado com
anti-hipertensiva (R=0,527; p=0,025), fato não registrado
no grupo terapia combinada (R=0,380; p=0,18). Em a zincúria apenas no grupo monoterapia, e o componente
relação às correlações entre a excreção de zinco na urina e triglicerídeo foi correlacionado positivamente com a zincúria
os componentes da SM, somente foi encontrada associação somente no grupo terapia combinada.
significante com os triglicerídeos no grupo terapia combinada Em relação às alterações dos componentes da SM, o
(R=0,582; p=0,037). maior valor de perímetro da cintura e percentual de indivíduos
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330
Excreção de zinco na urina de indivíduos com síndrome metabólica

Figura 2 - Excreção de zinco na urina dos indivíduos com síndrome metabólica em uso de terapia anti-hipertensiva.

Figura 3 - Distribuição individual da excreção de zinco na urina dos indivíduos com síndrome metabólica em uso de terapia anti-hipertensiva.

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Silva ILC et al.

com obesidade sugerem que o grupo em terapia combinada Uma das medicações prescritas com frequência para os
se encontra em uma condição de maior comprometimento indivíduos com SM em uso de terapia combinada no nosso
metabólico. Esses dados estão condizentes com a própria estudo foram os diuréticos. A relação dessa classe de medi-
fisiopatologia da SM, na qual, em situações do aumento do camento com a zincúria é controversa. Alguns pesquisadores
tecido adiposo, o mesmo se expande e libera metabólitos sugerem que o aumento da excreção de zinco na urina
biologicamente ativos denominados adipocitocinas, tais causada por esses medicamentos é decorrente da inibição
como ácidos graxos livres, glicerol, proteína C reativa e da sua reabsorção nos túbulos renais.
mediadores pró-inflamatórios.Essas substâncias são capazes Os diuréticos que atuam nos túbulos contorcidos distais
de interferir na sensibilidade à insulina, estresse oxidativo, dos rins, tais como os tiazídicos, geram aumento da zincúria.
coagulação, metabolismo energético e inflamação, gerando Existem indicações de que o uso prolongado desses medica-
uma resposta danosa ao organismo2. Essa situação de mentos pode levar à depleção do zinco no organismo, até
mais alto risco cardiovascular observada no grupo terapia mesmo diminuindo seus níveis teciduais22. Por outro lado, um
combinada justifica o uso de associações de fármacos para estudo desenvolvido para avaliar o efeito da furosemida sobre
controle da pressão arterial, quando metas terapêuticas não
a zincúria em humanos parece indicar que esse diurético não
são atingidas15.
potencializou a excreção de zinco na urina23.
No geral, os indivíduos com SM do presente estudo faziam
Um ponto importante para ser avaliado é a ingestão de
uso de diversas classes medicamentosas, principalmente os
zinco na dieta e a associação com a excreção de zinco na
bloqueadores dos receptores de angiotensina, diuréticos,
urina. Avaliando a ingestão de zinco por sexo foi possível
inibidores da ECA, bloqueadores adrenérgicos (betablo-
constatar maior consumo no sexo masculino, em relação ao
queadores) e bloqueadores dos canais de cálcio. Embora
feminino, em ambos os grupos, destacando-se ainda percen-
a literatura registre que o uso predominante de fármacos
tuais expressivos de ingestão abaixo da EAR em todos os
bloqueadores dos receptores de angiotensina, inibidores da
grupos. Essa inadequação pode estar relacionada ao baixo
enzima conversora de angiotensina e diurético pode estar
consumo de alimentos fontes de zinco na dieta, principal-
relacionado ao aumento da excreção de zinco na urina10,19,
mente aqueles de origem animal, uma vez que a condição
a hiperzincúria, surpreendentemente, foi maior no grupo
clínica de SM requer restrições dietéticas que incluem os
monoterapia.
alimentos fonte de zinco24,25.
Os nossos resultados corroboram os registrados por
O baixo consumo de zinco da dieta encontrado nas
Golik et al. 20, que compararam a excreção de zinco na
participantes do sexo feminino corrobora com os achados de
urina entre os fármacos utilizados isoladamente e em
outros estudos, que ao analisarem o status de zinco em indi-
combinações. Os achados desse estudo indicaram que
víduos portadores de hipertensão durante a farmacoterapia,
os participantes submetidos à monoterapia apresentaram
constataram que, mesmo possuindo baixo consumo dietético
maior excreção de zinco na urina comparados àqueles em
terapia combinada. Uma possível explicação pontuada do mineral, os participantes com hipertensão apresentaram
pelos autores para esse achado é que os diuréticos maior excreção de zinco na urina quando comparados a um
inibem o efeito de hiperzincúria causado pelo fármaco grupo controle saudável9.
inibidor da enzima conversora de angiotensina, justifi- Apesar de autores indicarem que apenas uma situação
cando menor zincúria no grupo terapia combinada, já de depleção grave, ou seja, ingestão menor que 1 mg de
que esse grupo inclui maior número de indivíduos em zinco por dia, é capaz de alterar a excreção7, no grupo de
uso de diuréticos. indivíduos com SM em monoterapia foi encontrada uma
A literatura ainda não avançou na definição de meca- correlação positiva entre o zinco na dieta e a zincúria. Outros
nismos que expliquem a zincúria e o a terapia anti-hiperten- estudos parecem sugerir que a excreção do zinco pode sofrer
siva. Samaras et al.21 propõem que o aumento da zincúria modulação a partir da ingestão dietética, quantidade absor-
por utilização de inibidores da ECA e bloqueadores dos vida e necessidades fisiológicas23. Entretanto, em situação
receptores de angiotensina II pode estar ligado ao fato de semelhante a esse estudo, observou-se que, mesmo quando
que a angiotensina II age indiretamente na reabsorção do os indivíduos eram submetidos a uma dieta com níveis ótimos
mineral em nível tubular, portanto, quando sua produção é de minerais, os mesmos mantinham a zincúria aumentada10.
dificultada, a reabsorção de zinco em nível urinário também Quanto às associações entre os componentes da SM e a
fica prejudicada. Um exemplo é a losartana, fármaco excreção de zinco na urina, destacamos a associação signi-
bloqueador dos receptores de angiotensina II, muito utili- ficativa entre as concentrações de triglicerídeos e a zincúria
zado pela nossa população, que comumente pode causar no grupo de indivíduos com SM em terapia combinada.
depleção do zinco no organismo devido ao aumento da Esse achado foi confirmado somente no grupo que aparen-
sua excreção. temente apresenta perfil metabólico mais comprometido,
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332
Excreção de zinco na urina de indivíduos com síndrome metabólica

principalmente pelo maior percentual de indivíduos com 3. Sofer S, Stark AH, Madar Z. Nutrition targeting by food timing:
obesidade e a presença de PC aumentado. Esses resultados time-related dietary approaches to combat obesity and metabolic
syndrome. Adv Nutr. 2015;6(2):214-23.
reforçam a possível relação entre a quantidade de gordura 4. de la Iglesia R, Loria-Kohen V, Zulet MA, Martinez JA, Reglero
visceral, mobilização de ácidos graxos livres, aumento da G, Ramirez de Molina A. Dietary strategies implicated in the
síntese de triglicerídeos a nível hepático e as alterações do prevention and treatment of metabolic syndrome. Int J Mol Sci.
status de zinco no organismo, principalmente em indivíduos 2016;17(11):pii: E1877.
5. Tubek S. Role of zinc in regulation of arterial blood pressure
clinicamente mais complicados, como aqueles em uso de and in the etiopathogenesis of arterial hypertension. Biol Trace
múltiplos anti-hipertensivos24. Elem Res. 2007;117(1-3):39-51.
As principais limitações do estudo são: (1) Por se tratar de 6. Prasad A. Discovery of human zinc deficiency: its impact on
human health and disease. Adv Nutr. 2013;4(2):176-90.
um recorte de um estudo maior, o número reduzido de parti- 7. King JC, Brown KH, Gibson RS, Krebs NF, Lowe NM, Siekmann
cipantes limitou análise em maior escala da possível relação JH, et al. Biomarkers of nutrition for development (BOND): zinc
entre a excreção de zinco na urina, terapias e medicamentos review. J Nutr. 2016;146(4):858S-85S.
anti-hipertensivos, porém os resultados encontrados já 8. Braun L, Rosenfeldt F. Pharmaco-nutrient interactions: a syste-
matic review of zinc and antihypertensive therapy. Int J Clin
sinalizam para a importância de explorar essa temática, Pract. 2013;67(8):717-25.
especialmente em indivíduos que usam anti-hipertensivos 9. Marcinek K, Suliburska J, Krejpcio Z, Bogdański P. Evaluation
em múltiplas classes de medicamentos; (2) A ausência de of mineral status in hypertensive patients undergoing pharma-
registro da informação sobre o tempo de utilização da cotherapy. Rocz Panstw Zakl Hig. 2015;66(1):61-7.
10. Suliburska J, Bogdański P, Szulinska M, Pupek-Musialik D. The
terapia anti-hipertensivas; (3) Erros aleatórios durante a influence of antihypertensive drugs on mineral status in hyper-
avaliação da ingestão dietética de zinco. Entretanto, o tensive patients. Eur Rev Med Pharmacol Sci. 2014;18(1):58-65.
caráter inovador desse trabalho corrobora a necessidade 11. National Cholesterol Education Program (NCEP) Expert Panel
de veiculação desses dados, a fim de melhor conhecer a on Detection, Evaluation, and Treatment of High Blood Choles-
terol in Adults (Adult Treatment Panel III). Third Report of
zincúria no contexto dos medicamentos anti-hipertensivos. the National Cholesterol Education Program (NCEP) Expert
Panel on Detection, Evaluation, and Treatment of High Blood
Cholesterol in Adults (Adult Treatment Panel III) final report.
CONCLUSÃO Circulation. 2002;106(25):3143-421.
Os indivíduos com SM em uso da monoterapia anti- 12. American Diabetes Association. Diagnosis and classification of
diabetes mellitus. Diabetes Care. 2004;27 Suppl 1:S5-S10.
hipertensiva ou terapia combinada apresentaram valores de 13. World Health Organization (WHO). Obesity: preventing and
excreção de zinco na urina dentro dos valores de referência, managing the global epidemic. Report of the WHO Consultation
sem diferença significativa entre os grupos. A avaliação da (Technical Report Series 894). Geneva: World Health Organiza-
excreção de zinco na urina de 24 horas é considerada um tion; 2000.
14. Lipschitz DA. Screening for nutritional status in the elderly. Prim
biomarcador potencial. Apesar dos avanços, é necessário Care. 1994;21(1):55-67.
um aprofundamento, a fim de definir pontos de corte mais 15. Malachias MVB, Souza WKSB, Plavnik FL, Rodrigues CIS,
precisos e confiáveis. Brandão AA, Neves MFT, et al. 7ª Diretriz Brasileira de Hiper-
tensão Arterial. Arq Bras Cardiol. 2016;107(3 Supl. 3):1-83.
Além disso, como perspectiva futura ressalta-se 16. Kiilerich S, Christensen MS, Naestoft J, Christiansen C. Deter-
conhecer esse parâmetro de acordo com as classes medi- mination of zinc in serum and urine by atomic absorption
camentosas de anti-hipertensivos, assim como com relação spectrophotometry; relationship between serum levels of
a diferentes combinações dos componentes da SM. Nesse zinc and proteins in 104 normal subjects. Clin Chim Acta.
1980;105(2):231-9.
sentido, os resultados encontrados nesse trabalho podem 17. Gibson R. Assessment of chromium, copper and zinc status. In:
auxiliar na fundamentação de condutas clínico-nutricionais Principles of nutritional assessment. 2nd ed. New York: Oxford
voltadas ao público do estudo, servindo como ferramenta University Press; 2005; p. 683-748.
no manejo da SM. 18. Institute of Medicine. Dietary reference intakes for vitamin
A, vitamin K, arsenic, boron, chromium, copper, iodine, iron,
manganese, molybdenum, nickel, silicon, vanadium, and zinc /
REFERÊNCIAS panel on micronutrients. Washington: National Academy Press;
2001; 789 p.
1. Sociedade Brasileira de Hipertensão; Sociedade Brasileira de 19. Koren-Michowitz M, Dishy V, Zaidenstein R, Yona O, Berman
Cardiologia; Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabo- S, Weissgarten J, et al. The effect of losartan and losartan/hydro-
logia; Sociedade Brasileira de Diabetes; Associação Brasileira chlorothiazide fixed-combination on magnesium, zinc, and nitric
para Estudos da Obesidade. I Diretriz Brasileira de Diagnós- oxide metabolism in hypertensive patients: a prospective open-
tico e Tratamento da Síndrome Metabólica. Arq Bras Cardiol. label study. Am J Hypertens. 2005;18(3):358-63.
2005;84(Supl 1):1-28. 20. Golik A, Averbukh Z, Cohn M, Maor J, Berman S, Shaked U, et
2. Kaur J. A comprehensive review on metabolic syndrome. Cardiol al. Effect of diuretics on captopril-induced urinary zinc excretion
Res Pract. 2014;2014:943162. Eur J Clin Pharmacol. 1990;38(4):359-61.

BRASPEN J 2018; 33 (3): 326-34


333
Silva ILC et al.

21. Samaras D, Samaras N, Lang PO, Genton L, Frangos E, Pichard 23. Cohen N, Golik A. Zinc balance and medications commonly
C. Effects of widely used drugs on micronutrients: a story rarely used in the management of heart failure. Heart Fail Rev.
told. Nutrition. 2013;29(4):605-10. 2006;11(1):19-24.
24. Samson SL, Garber AJ. Metabolic syndrome. Endocrinol Metab
22. Chiba M, Katayama K, Takeda R, Morita R, Iwahashi K, Onishi
Clin North Am. 2014;43(1):1-23.
Y, et al. Diuretics aggravate zinc deficiency in patients with liver 25. VanWormer JJ, Boucher JL, Sidebottom AC, Sillah A, Knickel-
cirrhosis by increasing zinc excretion in urine. Hepatol Res. bine T. Lifestyle changes and prevention of metabolic syndrome
2013;43(4):365-73. in the Heart of New Ulm Project. Prev Med Rep. 2017;6:242-5.

Local de realização do estudo: Hospital Universitário Onofre Lopes, Ambulatório de Endocrinologia e Departamento de Nutri-
ção, Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, RN, Brasil.

Conflito de interesse: Os autores declaram não haver.

Financiamento da Pesquisa: Fundação de Apoio à Pesquisa do Rio Grande do Norte – FAPERN; Brasil / Coordenação de
Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior – CAPES, Brasil – Edital de apoio aos Programas de Pós-Graduação 006/2004).

Trabalho apresentado no 14º Congresso Nacional da Sociedade Brasileira de Alimentação e Nutrição (SBAN), em São Paulo, SP,
no dia 30 de agosto de 2017, na modalidade pôster.

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Instruções aos Autores

SUBMISSÃO DOS MANUSCRITOS

Os trabalhos podem ser submetidos pelo site do BRASPEN. 3. Formatação


O sistema de submissão utilizado pelo BRASPEN Journal é o ScholarOne. O tutorial Os trabalhos devem ser apresentados em Microsoft Word (.doc / .docx). Utilizar letra
para submissão de manuscritos encontra-se no tópico deste site em “Tutorial de submissão tamanho 11 e fontes: Times, Times New Roman, Helvetica, Arial, e Symbol para caracteres
de artigos científicos“. especiais. Por favor, use espaçamento duplo em todo o texto e adicionar numeração de
linha em todas as páginas. Padrão Tipo 10 ou 12 pontos e espaçamento são preferidos ao
Critérios de autoria e contribuição individual espaçamento proporcional.

Sugerimos os autores a adotar os critérios de autoria dos artigos, de acordo com as 4. Manuscrito
recomendações do International Committee of Medical Journal Editors. Dessa forma, apenas Os manuscritos podem ser submetidos nos idiomas português, inglês e espanhol,
as pessoas que contribuíram diretamente para o conteúdo do estudo devem ser listadas obedecendo à ortografia vigente, empregando linguagem fácil e precisa e evitando-se a
como autores. informalidade da linguagem coloquial. Só serão aceitos artigos originais, de revisão sistemática
Os autores devem satisfazer os seguintes critérios, a fim de ser capaz de assumir a ou de revisão a convite do corpo editorial.
­responsabilidade pública pelo conteúdo do estudo: Os manuscritos devem ser divididos em Introdução, Método, Resultados, Discussão e
• Ter concebido e planejado as atividades que levaram ao estudo ou interpretados os Conclusão (Artigos Originais).
dados que ela apresenta, ou ambos; Os manuscritos não poderão exceder a 5.000 palavras (Artigos Originais) e 7.500 palavras
• Ter escrito o estudo ou revisado versões sucessivas e participou no processo de revisão; (Artigos de Revisão Sistemática) no total, incluindo Referências.
• Ter aprovado a versão final. É mandatória a inserção do item Conflito de Interesse imediatamente antes das Referências.
As pessoas que não preencham os requisitos acima e que tiveram participação puramente O número de referências não deve superior a 25 para Artigos Originais e 50 para Revisão
técnica ou de suporte geral devem ser mencionadas na seção de agradecimentos. Sistemática.
Na submissão, o tipo de contribuição de cada autor ao realizar o estudo e preparação Agradecimentos sucintos são opcionais, entretanto, a indicação de financiamento da
do manuscrito nas seguintes áreas deve ser explicitado: ­pesquisa, o nome da agência financiadora e o número do processo são requeridos.
• Design de estudo Recomenda-se aos autores que, previamente à submissão de seu manuscrito, utilizem o
• Coleta, análise e interpretação de dados check list correspondente à categoria de artigo:
• Elaboração e revisão final do manuscrito • CONSORT (CONsolidated Standards of Reporting Trials) check list e fluxograma para
ensaios controlados e randomizados, disponível em http://www.consort-statement.org/
Estrutura do Artigo • STARD (Standards for Reporting of Diagnostic Accuracy) check list e fluxograma para
estudos de acurácia diagnóstica, disponível em: http://www.stard-statement.org/
O BRASPEN JOURNAL adota os Requisitos de Vancouver - Uniform Requirements for • PRISMA (Preferred Reporting Items for Systematic Reviews and Meta-analyses)
Manuscripts Submittedto Biomedical Journals, organizados pelo International Committee of check list e fluxograma para revisões sistemáticas, disponível em: http://www.prisma-
Medical Journal Editors - “Vancouver Group”, disponíveis em www.icmje.org. A obediência às statement.org/
instruções é condição obrigatória para que o trabalho seja considerado para análise. • STROBE check list para estudos observacionais em epidemiologia, disponível em:
a) Página de Rosto http://www.strobe-statement.org/index.php?id=strobe-home
b) Resumoe Abstracte Palavras-chaves (unitermos, keywords) em Português e Inglês
c) Manuscrito 5. Referências
d) Referências As referências dos documentos impressos e eletrônicos devem ser normalizadas de
e) Tabelas e Figuras acordo com o estilo Vancouver, elaborado pelo International Committee of Medical Journal
Editors, disponível em: http://www.icmje.org
1. Página de Rosto Títulos de periódicos devem ser abreviados de acordo com o List of Journals Indexed for
Deve assinalar o título do artigo, que não deve ultrapassar 200 caracteres. MEDLINE (disponível em: http://www.nlm.gov/tsd/serials/lji.html).
Devem ser informados nome completo dos autores com respectivas titulações, e-mail As referências serão limitadas a 25 (Artigos Originais) e 50 (Artigos de Revisão, Siste-
e serviço ao qual estão vinculados (até três níveis hierárquicos institucionais e apresen- mática).Com esses números reduzidos,cabe restringir ao máximo introduções históricas,
tado em ordem decrescente, por exemplo, universidade, faculdade e departamento), metodologias pormenorizadas, discussões com revisão da literatura e citações repetitivas.
cidade, estado e país em que está localizada. Quando um autor é afiliado a mais de uma Os autores devem se concentrar nos achados centrais do protocolo e na sua comparação
instituição, cada afiliação deve ser identificada separadamente. Quando dois ou mais com a literatura recente, preferencialmente dos últimos 3-5 anos.
autores estão afiliados à mesma instituição, a identificação da instância é feita uma única As citações bibliográficas, no texto, devem ser sobrescritas e numeradas na ordem em
vez. Informar o nome e endereço completo do autor correspondente (não esquecer que são citadas.
telefone, celular e fax). Caso haja até 6 autores, devem todos ser listados, sendo que para maior número, os
Deve ser informada a instituição em que o trabalho foi desenvolvido. As afiliações não primeiros 6 seguidos de et al. devem ser utilizados. Salvo circunstâncias excepcionais, não
devem vir acompanhadas das titulações ou minicurrículos dos autores. será admitida citação de resumo, comunicação pessoal, literatura comercial ou outras fontes
Caso o trabalho tenha sido apresentado em eventos científicos, como congresso ou que não revistas e livros científicos, bem como artigos e portais eletrônicos reconhecidos.
simpósios, devem ser mencionados: nome do evento, local e data da apresentação. Nas citações de pesquisadores ao longo do texto, deve-se citar o primeiro autor, seguido
Acrescentar contagem de palavras do Resumo, e do Manuscrito, bem como número de da expressão “et al.” ou o autor único se for o caso, sempre com a respectiva referência
Tabelas, Figuras e Anexos. em sobrescrito.
Reproduzimos abaixo alguns exemplos mais comuns de referências empregadas nos
2. Resumo e Palavras-chaves artigos. Outros modelos podem ser acessados no site: http://www.nlm.nih.gov/bsd/­
Os resumos devem ser estruturados (Introdução, Método, Resultados e Conclusões) e uniform_requirements.html
não devem exceder a 300 palavras.
Nesta mesma página, devem ser incluídos 3 a 10 unitermos (palavras-chaves) que Modelos de referências
definam o assunto do trabalho, assim com a respectiva tradução para o inglês (abstract and
keywords). Esses unitermos podem ser consultados nos endereços eletrônicos: http://decs. – Artigo padrão
bvs.br/ que contém termos em português, espanhol ou inglês, ou www.nlm.nih.gov/mesh, Burjonrappa SC, Miller M. Role of trace elements in parenteral nutrition support of the
para termos somente em inglês. surgical neonate. J Pediatr Surg. 2012;47(4):760-71.

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– Artigo com mais de 6 autores O BRASPEN JOURNAL sugere aos seus revisores que sigam as diretrizes propostas pelo
Moriya T, Fukatsu K, Maeshima Y, Ikezawa F, Hashiguchi Y, Saitoh D, et al. The effect of COPE Ethical Guidelines for Peer Reviewers, disponível em: http://publicationethics.org/files/
adding fish oil to parenteral nutrition on hepatic mononuclear cell function and survival after Ethical_guidelines_for_peer_reviewers_0.pdf
intraportal bacterial challenge in mice. Surgery. 2012;151(5):745-55.
– Artigo cujo autor é uma organização Direitos Autorais e Responsabilidade pelo Conteúdo do Artigo
Diabetes Prevention Program Research Group. Hypertension, insulin, and proinsulin in O texto dos trabalhos é de inteira responsabilidade dos autores que o assinam. Assim, ao
participants with impaired glucose tolerance. Hypertension. 2002;40(5):679-86. enviar uma submissão, esta deverá vir acompanhada de uma autorização para a publicação
do trabalho e cessão de direitos autorais para o BRASPEN JOURNAL, constando local,
– Livro padrão data e assinatura original de todos os autores. No texto deve constar que todo conteúdo,
Braunwald E, Zipes DP, Libby P, Bonow R. A textbook of cardiovascular medicine. 8th incluindo gráficos e figuras, é próprio ou devidamente autorizado conforme documentação
ed. Philadelphia: Saunders Elsevier; 2008. anexa, sendo que os autores se responsabilizam pela veracidade das informações. Caso um
– Capítulo de livro ou mais autores possua conflito de interesse, seu nome, da empresa e a natureza do vínculo
Meltzer PS, Kallioniemi A, Trent JM. Chromosome alterations in human solid tumors. In: ou benefício deverão ser informados. Na hipótese contrária, deverá ser esclarecido que
Vogelstein B, Kinzler KW, eds. The genetic basis of human cancer. New York: McGraw-Hill; nenhum dos autores possui conflito de interesse. É proibida a inserção de qualquer texto,
2002. p.93-113. figura ou esquema obtidos da internet, salvo aqueles acompanhados de permissão escrita,
ou mediante comprovação de que se trata de portal de livre acesso. Fica ressalvada a citação
– Website
de artigos ou portais eletrônicos científicos, devidamente referenciados na seção Referências.
Brasil. Ministério da Saúde. DATASUS. Mortalidade para causas selecionadas – 2006
Todos os manuscritos publicados tornam-se propriedade permanente do BRASPEN
[Internet]. Brasília; 2007 [citado 2010 jul. 16]. Disponível em: http://www2.datasus.gov.
JOURNAL e não podem ser publicados sem o consentimento por escrito de seu editor.
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form_requirements.html mente submetidos a outro periódico e nem devem ter sido publicados anteriormente, com
conteúdo semelhante ao apresentado ao BRASPEN JOURNAL. Caso os autores desejem
6. Tabelas e Figuras inserir tabela, gráfico ou outro material publicado anteriormente, deverá ser anexada
Todas as figuras e tabelas devem ser inseridas após o texto, numeradas sequencialmente, autorização assinada por representante legal da editora da Revista ou Livro em questão,
em algarismos arábicos, seguindo sua ordem de citação. permitindo a utilização pelo BRASPEN JOURNAL. Em se tratando de protocolo ou rotina
As tabelas devem ser apresentadas apenas quando necessárias para a efetiva compreensão de Hospital ou Instituição Acadêmica, documento equivalente autorizando a transcrição
do trabalho, não contendo informações redundantes já citadas no texto. deverá ser providenciado.
O corpo do texto deve trazer a indicação de onde as tabelas e figuras deverão ser inseridas. Os autores são responsáveis pelo conteúdo e informações contidas em seus manuscritos.O
As figuras e tabelas devem vir acompanhadas de suas respectivas legendas. Os símbolos BRASPEN JOURNAL rejeita com veemência o plágio e o autoplágio.
e abreviações empregados devem ser explicados na primeira vez em que utilizados, tanto
no texto quanto nas tabelas. Pesquisa com Seres Humanos e Animais
Tabelas e figuras devem ser autoexplicativas, não sendo necessário ao leitor retornar ao Os estudos envolvendo humanos e animais devem informar, no item Método, o nome
texto para seu completo entendimento. da Comissão Ética Institucional que aprovou o protocolo (enviar declaração assinada que
aprova a pesquisa), consoante à Declaração de Helsinki [World Medical Association (http://
POLÍTICA EDITORIAL www.wma.net/en/30publications/10policies/b3/)] e da Resolução a Resolução 466/2012 do
Conselho Nacional de Saúde (http://conselho.saude.gov.br/resolucoes/2012/Reso466.pdf),
Avaliação pelos pares (peer review) lembrando-se da necessidade de TCLE (termo de consentimento livre e esclarecido para
Previamente à publicação, todos os artigos enviados ao BRASPEN JOURNAL passam todos os participantes da pesquisa em duas vias assinadas e ficando uma com o ­participante e
por processo de revisão e arbitragem, como forma de garantir seu padrão de qualidade outra com o pesquisador. As pesquisas com prontuários ou banco de dados necessitam de au-
e a isenção na seleção dos trabalhos a serem publicados. Inicialmente, o artigo é avaliado torização, por escrito, do responsável legal pelos documentos ou diretor clínico da Instituição.
pela administradora da ferramenta de publicação, para verificar se está de acordo com Na experimentação com animais, os autores devem seguir o CIOMS (Council for Inter-
as normas de publicação e completo. Após verificação estrutural inicial, será acusado o national Organization of Medical Sciences) Ethical Code for Animal Experimentation (WHO
recebimento por e-mail com a devida numeração, iniciando-se o processamento editorial. Chronicle 1985; 39(2):51-6) e os preceitos do Colégio Brasileiro de Experimentação Animal
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no qual fazem uma apreciação rigorosa de todos os itens que compõem o trabalho. Ao
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evitar nomes comerciais ou de empresas.
corrigido segundo as recomendações. De posse desses dados, o editor toma a decisão
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para melhor julgamento. do envolvido autorizando publicação, mesmo que os olhos estejam vendados ou o rosto
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sugestões/exigências foram atendidas. Em casos excepcionais, quando o assunto do Política para Registro de Ensaios Clínicos
manuscrito assim o exigir, o Editor poderá solicitar a colaboração de um profissional que A Revista Brasileira de Nutrição Clínica, em apoio às políticas para registro de ensaios
não conste da relação do Conselho Editorial para fazer a avaliação. Todo esse processo clínicos da Organização Mundial de Saúde (OMS) e do International Committee of Medical
é realizado por e-mail. Journal Editors (ICMJE), reconhecendo a importância dessas iniciativas para o registro e
O sistema de avaliação é o duplo cego, garantindo o anonimato em todo processo de divulgação internacional de informação sobre estudos clínicos, em acesso aberto, somente
avaliação. A decisão sobre a aceitação do artigo para publicação ocorrerá, sempre que pos- aceitará para publicação artigos de pesquisas clínicas que tenham recebido um número de
sível, no prazo de três meses a partir da data de seu recebimento. As datas do recebimento identificação em um dos Registros de Ensaios Clínicos validados pelos critérios estabelecidos
e da aprovação do artigo para publicação são informadas no artigo publicado com o intuito pela OMS e ICMJE, disponível no endereço: http://clinicaltrials.gov ou no site do PubMed ou
de respeitar os interesses de prioridade dos autores. Assim que uma decisão de Aceitação, registro na Plataforma Brasil (www.saude.gov.br/plataformabrasil). O número de identificação
Revisão ou Rejeição for alcançada, o autor correspondente será informado eletronicamente. deve ser registrado ao final do resumo.

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