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Paula Brener
Mestranda na Faculdade de Direito da UFMG. Graduada em Direito pela Universidade
Federal de Minas Gerais (2018). Advogada criminalista. Professora do Centro de Estudos
em Direito e Negócios (CEDIN) e do curso de pós-graduação em advocacia criminal da
Escola Superior de Advocacia da Ordem dos Advogados do Brasil, Minas Gerais
(ESA/OABMG). ORCID: 0000-0002-9588-0332 brener.paula@outlook.com
Sumário:
Introdução
A opção pelo transplante legal do instituto italiano tem seu fundamento inspirador na
semelhança que a doutrina brasileira identifica entre as operações Mãos Limpas e Lava
Jato. Ambas se caracterizam pelo envolvimento de relevantes partidos políticos e
empresas do país, bem como pela imputação de crimes econômicos de grande
complexidade. Os processos dependeram de um forte apoio popular às forças tarefas
envolvidas, tanto no caso Lava Jato como em relação aos procuradores italianos. Parece,
portanto, ser este o elemento de aproximação entre os ordenamentos que enseja a
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proposta . Contudo, embora as operações, especialmente em seus aspectos processuais,
possam se assemelhar, o transplante legal do tipo da associação de tipo mafioso é um
salto inadequado e apressado para a resolução de problemas do sistema brasileiro, que
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desconsidera particularidades históricas, sociológicas e culturais entre os países .
Não obstante, como se verá mais à frente, a proposta do Pacote Anticrime opta por
distanciar-se do standard internacional, buscando inspiração na lei italiana, norma de
forte matriz sociológica.
Nos anos 1970, soma-se a essa abordagem uma compreensão voltada à criminalidade
econômica, resultado da nova preocupação com a transnacionalidade e difusão do
fenômeno da criminalidade organizada empresarial. Assim, o país amplia o escopo de
sua abordagem, voltando-se para o problema da corrupção e adotando uma
compreensão mais abrangente e voltada às empresas frente ao funcionalismo público.
Nesse sentido, foi promulgado o Organized Crime Control Act 1970 e o Racketeer
Influenced and Corrupt Organizations Act (RICO). Optou-se então não por um conceito
sociológico, mas dogmático de organizações criminosas, sendo os objetos das condutas
delimitados pelos elementos de valoração global do fato “extorsiva” (racketeering) ou
“ilegal” (unlawfull) (e.g. “ racketeering debt ”; “ racketeering activity ”; “ collection of
unlawful debt”).
Tal abordagem possui grandes repercussões sobre o sistema prisional do país e explica
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parte do diagnóstico de Richard Posner . Um dos grandes expoentes da Escola de
Chicago, Posner identifica no modelo punitivo neoliberal norte-
Em resposta aos atos políticos desses grupos, para além do delito comum de
organização criminosa já tipificado no artigo 570 bis do Código Penal Espanhol, foram
realizadas inúmeras reformas, com destaque para a aprovação da LO 7/2000, da LO
7/2003 e da LO 5/2010, voltadas para o enfrentamento específico às organizações
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Organização criminosa no direito comparado: desafios da
harmonização normativa e problemas dos transplantes
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terroristas, como espécie do gênero das organizações criminosas – sobretudo do ETA .
Nesse sentido, são definidas e tipificadas nos artigos 571 a 580 do Código Penal da
Espanha inúmeras condutas referentes ao pertencimento, à atuação, à colaboração, ao
favorecimento, ao financiamento, dentre outras formas de participação em referidos
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grupos .
O Código Penal Espanhol define as organizações criminosas em seu artigo 570 bis como
as agrupações formadas “por mais de duas pessoas, com caráter estável ou por tempo
indefinido, que, de maneira concertada e coordenada repartam entre si tarefas ou
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funções com o fim de cometer delitos” . As organizações ou grupos terroristas são
aqueles que tem por fim a comissão dos delitos de terrorismo, arrolados no artigo 573
do Código Penal Espanhol, desde que os realizem com qualquer das seguintes
finalidades:
Importante ressalvar que ambos os países possuem ordenamentos jurídico penais únicos
e caracterizados por relevantes particularidades jurídico-penais e contextuais, o que
inclusive se reflete nos diferentes contextos que motivaram as respectivas modificações
legislativas. Não obstante as peculiaridades de cada um desses países, o enfrentamento
à criminalidade em ambos se inspirou em uma estética tipológica centrada no conceito
de terrorismo, adotando uma técnica sociológica para o enfrentamento normativo do
problema. Essa opção parece ser explicada por um elemento comum que caracterizava a
criminalidade organizada nos dois países nesse período: uma forte substância política.
Conforme Manuel Cancio Meliá, “as finalidades e o significado políticos perseguidos por
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aqueles que realizam essas infrações outorgam um caráter específico a esse âmbito” .
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Organização criminosa no direito comparado: desafios da
harmonização normativa e problemas dos transplantes
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Percebe-se de forma muito clara o elemento político da atuação delitiva do grupo para
que se amolde ao conceito de organizações ou grupos terroristas. Elemento esse que é
evidente na atuação do ETA, o qual, enquanto grupo separatista e independentista,
apresentava a proposta política de forma explícita como a finalidade de sua atuação.
O Código Penal italiano apresenta inicialmente um tipo penal mais amplo voltado para as
associações para delinquir (associazione per delinquere) – artigo 416 do Código Penal
Italiano. Para além do referido tipo, criou-se a fattispecie das associações de tipo
mafioso, no qual se oferece um conceito sociológico de crime organizado, voltado para
sua particular manifestação na Itália.
Essa conformação histórico cultural é o fundamento para a escolha italiana pela adoção
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em lei de um conceito de inspiração sociológica de organização criminosa , buscando
um retrato do fenômeno mafioso em um tipo penal. Esse retrato, contudo, afasta-se
completamente da realidade brasileira, a começar pelo próprio uso da expressão “de tipo
mafioso” como nomen juris do tipo penal, o que já começa por limitar seus contornos. É
nesse ponto que se encontra a moldura da fattispecie, a partir da compreensão
consolidada de forma secular do que seja a Máfia, o grupo que originalmente conformou
o fenômeno na Itália, operando especificamente na Sicília, e atualmente denominado
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Cosa Nostra . Importante compreender que, no país o uso do termo máfia, em sua
forma estrita, é historicamente referenciado a essa organização siciliana modelo que
funciona como um limitador do tipo penal, que, mantendo o recorte sociológico,
enumera na sequência as demais organizações tradicionais italianas que operam na
forma modelar: a organização napolitana denominada Camorra, a calabresa
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N’drangheta, e a Sacra Corona Unita que opera na Puglia .
Conforme Geoffrey Samuel, é comum o comparatista cair em erro por empreender uma
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análise meramente funcional de um outro direito, voltada para objetivos específicos .
Essa forma de fazer direito comparado, fundamentada única e exclusivamente em uma
rápida análise funcional, em geral, leva à ilusão de que é compatível a introdução ou
recepção de normas de outro sistema jurídico pelo sistema pátrio. Entretanto, a
observação do mesmo instituto sob o prisma do método estruturalista e hermenêutico
torna evidente diversas incompatibilidades. No caso das organizações criminosas no
Pacote Anticrime, como se verá no tópico seguinte, essa falha se torna rapidamente
evidente, afinal, de fato, do ponto de vista funcional, na Itália, o tipo penal da
associação de tipo mafioso possui grande relevância, amoldada à cultura do país e seu
desenvolvimento histórico. Contudo, o mesmo instituto importado para o ordenamento
brasileiro resta deslocado, carente de significação e moldura delimitadora.
Nesse sentido, René David, em sua análise sistêmica dos direitos, destaca a
peculiaridade de cada sistema jurídico, a qual deve ser levada em conta no trabalho do
comparatista e orientá-lo em sua pesquisa. Tal compreensão, conforme o autor, permite
verificar essa falha e afastar a má aplicação dos transplantes normativos. Afinal,
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Organização criminosa no direito comparado: desafios da
harmonização normativa e problemas dos transplantes
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O projeto Anticrime, ao propor o transplante legal desse tipo penal italiano para o
ordenamento brasileiro, comete a primeira falha na medida em que o importa de forma
isolada e não como uma especial manifestação de organizações para o cometimento de
delitos. Ademais, e talvez aqui o ponto de maior fragilidade, não se transplantou com o
tipo o seu nomen juris. Como visto anteriormente, na Itália optou-se por uma
conceituação sociológica do crime organizado, orientada pela compreensão histórica e
cultural da Máfia. Nesse sentido, Giovanni Flick afirma que o tipo penal italiano capta
uma realidade criminológica e sociológica, traduzindo-a em lei. Em suas palavras, uma
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“fotografia jurídica” (fotografia giuridica) do fenômeno mafioso. Essa opção legislativa
se expressa já no nomen juris da fattispecie, associações de tipo mafioso, a qual
emoldura o tipo penal e limita a sua aplicação ao vincular o tipo a uma específica
manifestação histórico-cultural.
Note-se que o controle da atividade econômica pode ser obtido de forma lícita, com o
legítimo sucesso do empreendimento, por meio da inovação e das condições do
mercado. Além disso, o sentimento de intimidação propiciado pela força de um vínculo
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associativo empresarial não possui caráter em si ilícito . Na verdade, o que se deve
reprimir são os abusos de posição dominante e demais usos ilícitos desse vínculo, as
quais são tipificadas em normas especificamente voltadas para a proteção da livre
concorrência e das relações de consumo.
Em última análise, termina-se por tipificar uma organização criminosa sem crimes. Disso
resulta uma enorme abertura do conceito proposto, o que representa uma afronta o
princípio constitucional da legalidade penal e à própria função de garantia do tipo penal.
Puro, Amigo dos Amigos e Milícias – tampouco é suficiente para a limitação do tipo
penal. Isso porque são essas organizações extremamente recentes, sem a mesma
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infiltração cultural e consolidação histórica que a Máfia . Tratam-se de grupos
historicamente localizados e intermitentes, o que potencialmente tornaria a norma
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rapidamente obsoleta, com a simples alteração de seus nomes ou de suas
conformações. Isso se deve à própria história contingente do comércio de drogas no
Brasil, conforme apontado por Benjamin Lessing, mercado que teria surgido na década
de 1980 e crescido a partir de então conforme se estruturavam os grupos do Comando
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Vermelho e do Primeiro Comando da Capital.
Além disso, essa enumeração configura mais uma falha da proposta legislativa, uma vez
que torna confusa sua opção político-criminal: inicialmente o texto parece objetivar o
enfrentamento à macrocriminalidade econômica, voltando-se para a atividade econômica
e a criminalidade de empresa, em seguida, contudo, volta-se para o enfrentamento do
tráfico organizado, de forma seletiva e estigmatizante, sem mencionar qualquer grupo
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empresarial em seu rol exemplificativo . Confusão esta que termina por representar
verdadeiro etiquetamento do que se compreende por crime organizado, em um viés
seletivo que muito se aproxima a um direito penal do inimigo. Parece a norma estar
menos preocupada com os fatos, com o modus operandi e com as próprias atividades
delituosas do que com a feição, as características e o nome adotado por cada grupo.
E mais, poderia se antever uma paradoxal aplicação do instituto que permitiria restar
“fora desta estigmatização a macrocriminalidade econômica, em regra praticada nos
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corredores do poder econômico e do poder político” . A confusão político-criminal na
redação do tipo poderia acabar por surpreender as expectativas sociais no momento de
sua aplicação, servindo como potencial anteparo defensivo para as práticas delitivas não
rotuladas.
Embora o tema dos transplantes legais volte a chamar a atenção da doutrina com as
diversas propostas de reformas penais e processuais penais inspiradas em direitos de
matriz do common law, interessante observar que em 2004, em estudos de Direito
Comparado voltados para a criminalidade organizada, Sheila Jorge Selim de Sales já
apontava para a inviabilidade de uma transposição tout court para a legislação penal
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brasileira de institutos e normas que integram o direito italiano , antevendo a
impossibilidade da importação de um tipo penal de recorte marcadamente sociológico
para o país e os problemas que esse transplante acarretaria.
Espera-se que referida proposta legislativa não seja de fato adotada, sendo mantida a
atual redação da Lei 12.850/13 (LGL\2013\7484), cuja opção por uma conceituação
dogmática é mais acertada, inicialmente por apresentar um conceito melhor emoldurado
ao prever condutas realizadas “mediante a prática de crimes”. Ademais, evitando-se a
categorização das organizações criminosas, a norma vigente permite a aplicação do tipo
penal das organizações criminosas às mais diferentes conformações de grupos
estruturados para a prática de crimes. Trata-se ainda de um texto que privilegia um
tratamento harmonizado ao plano internacional, aproximando-se das considerações da
Convenção de Palermo, ratificada pelo Brasil e promulgada no âmbito nacional pelo
Decreto 5.015/2004 (LGL\2004\1276). Note-se que a proposta apresentada no Pacote
caminha na contramão da agenda político-criminal global, a qual se dirige a uma
harmonização dos conceitos envolvendo a criminalidade transnacional, de modo a
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facilitar a cooperação e coordenação entre países .
Conclusões
É necessária a adoção de uma análise mais complexa, que de fato aprofunde sobre os
níveis técnicos e práticos de vulnerabilidades de cada sistema, levando em consideração
a série de déficits sociais e econômicos da sociedade que ambientam o problema, de
modo a superar a busca por soluções no tipo penal, mas sim postular uma política de
segurança pública melhor articulada, bem definida e voltada para o futuro. Afinal, “uma
política de segurança só faz algum sentido no contexto de uma verdadeira Política
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interna bem definida, sincronizada e coordenada” . Uma estratégia que, para além das
falhas pontuais e contingenciais, volte-se para os problemas estruturais e aos networks
ilícitos existentes, buscando a solução real para falhas sistêmicas. Política esta que deve
se atentar para o panorama internacional de harmonização de conceitos e aproximação
entre normas jurídicas para o enfrentamento ao crime organizado, sem, contudo, fechar
os olhos às peculiaridades nacionais e dimensões socioculturais que conformam as
diferentes tradições jurídicas.
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2 .Nota sobre a tradução: não há uma tradução precisa para o português da palavra
omertà, a qual deve ser compreendida como uma espécie de pacto de silêncio,
caracterizado pela recusa generalizada em cooperar com as instâncias oficiais.
3 .Tradução livre: “Articolo 416 bis, Associazioni di tipo mafioso anche straniere. 3.
L’associzione è di tipo mafioso quando coloro che ne fanno parte si avvalgono della forza
di intimidazione del vincolo associativo e della condizione di assoggettamento e di
omertà ce ne deriva per commettere delitti, per acquisire in modo diretto o indiretto la
gestione o comunque il controllo di attività economiche, di concessioni, di
autorizzazzioni, appalti e servizi pubblici o per realizzare profitti o vantaggi ingiusti per
sé o per altri ovvero al fine di impedire od ostacolare il libero esercizio del voto o di
procurare voti a sé o ad altri in occasione di consultazioni elettorali. [...] 8. Le
disposizioni del presente articolo si applicano anche alla camorra, alla ‘ndrangheta e alle
altre associazioni, comunque localmente dominante, anche straniere, che valendisi della
forza intimidatrice del vincolo associativo perseguono scopi corrispondenti a quelli delle
associazioni di tipo mafioso.”
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Organização criminosa no direito comparado: desafios da
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b) ‘Infração grave’ – ato que constitua infração punível com uma pena de privação de
liberdade, cujo máximo não seja inferior a quatro anos ou com pena superior;
c) ‘Grupo estruturado’ – grupo formado de maneira não fortuita para a prática imediata
de uma infração, ainda que os seus membros não tenham funções formalmente
definidas, que não haja continuidade na sua composição e que não disponha de uma
estrutura elaborada; [...]”
8 .A defesa de uma unificação do Direito foi uma tendência no século XX, período de um
animado positivismo sobre o Direito Comparado. Nesse sentido: ZIMMERMANN,
Reinhard. Savigny’s Legacy. Legal History, Comparative Law and the Emergence of a
European Legal Science. Law Quarterly Review, Londres, v. 112, 1996. Esse
posicionamento que atualmente é considerado utópico e radical, bem como indesejável,
tendo em vista o valor do pluralismo que se reconhece hoje nas diferentes culturas
jurídicas. VOGEL, Joachim. La internacionalización del derecho penal y el proceso penal.
Trad. Alfonso Galán Muñoz. Revista Penal, Valencia, n. 22, 2008. p. 160-161.
important, in passing the Patriot Act, Congress provided for only modest, incremental
changes in the law. Congress simply took existing legal principles and retrofitted them to
preserve the lives and liberty of the American people from the challenges posed by a
global terrorist network”. Department of Justice Website, What is the USA Patriot web,
Highlights of the USA Patriot Act. Disponível em:
[www.justice.gov/archive/ll/highlights.htm]. Acesso em: 09.06.2019.
16 .Nesse ponto, nota-se que as teorias neoliberais do direito penal são complexas e
variam muito em suas formas. No entanto, a brevidade do presente artigo nos obriga à
um recorte do tema pelas características que mais comumente e reiteradamente podem
ser observadas nas teorias neoliberais, talvez pecando pela simplicidade que o curto
espaço nos obriga. Vale em nota destacar alguns dos elementos apresentados por Pat
O’Malley em seu trabalho, em geral comuns a estas correntes e que são relevantes para
o trabalho: a) punição economicamente racionalizada; b) foco da justiça no consumidor,
no público; c) elaboração de procedimentos visando a consumerização da justiça (nesse
sentido a ampliação da participação da vítima no processo penal); d) ampliação do
punitivismo. Para maior aprofundamento crítico ver: O’MALLEY, Pat. Rethinking
Neoliberal Penality. Legal Studies Research Paper, Sidney: Sydney Law School, n. 15/67,
ago. 2015. p. 2-3.
18 .Não obstante o Código Penal Espanhol mantenha a previsão do tipo penal das
organizações criminosas – artigo 570 bis –, confere-se amplo destaque às organizações
e grupos terroristas, tipificadas nos artigos 571 e seguintes.
ESPANHA. Ley orgânica 10/1995 - Código Penal. 23 de novembro de 1995. Jefatura del
Esado. BOE n. 281 de 24.11.1995. Última modificação: 28.04.2015. Ref. BOE-A-
-1995-25444.
Quando várias pessoas se reúnam com o fim de cometer delitos, cada uma delas será
apenada, por essa conduta apenas, com prisão de três a seis anos. Quando o concerto
seja para cometer delitos de genocídio, desaparecimento forçado de pessoas, tortura,
deslocamento forçado, homicídio, terrorismo, narcotráfico, sequestro extorsivo, extorsão
ou para organizar, promover, armar ou financiar grupos armados à margem da lei, a
pena será de prisão de seis a doze anos e multa de dois mil até vinte mil salários
mínimos mensais legalmente vigentes. (...)”. COLÔMBIA. Ley 599 de 2000 – Código
Penal. 24 de julho de 2000. Congresso da Colômbia. DO. n. 44097 de 24.07.2000.
24 .Artigo 340 do Código Penal Colombiano. COLÔMBIA. Ley 599 de 2000 – Código
Penal. 24 de julho de 2000. Congresso da Colômbia. DO. n. 44097 de 24.07.2000.
25 .Artigo 349 do Código Penal Colombiano. COLÔMBIA. Ley 599 de 2000 – Código
Penal. 24 de julho de 2000. Congresso da Colômbia. DO. n. 44097 de 24.07.2000.
27 .CANCIO MELIÁ, Manuel. Derecho penal del enemigo y delitos de terrorismo: algunas
consideraciones sobre la regulación de las infracciones en materia de terrorismo en el
código penal español después de la LO 7/2000. Revista Ibero-Americana de Ciências
Penais, Porto Alegre, n. 5, v. 3, 2002. p. 216.
29 .COSTA, Helena Regina Lobo da. Os rumos da política criminal cinco anos depois do
11 de setembro. Política criminal e dogmática penal: entre a judicialização e a
administrativização. In: TOLEDO, Otávio Augusto de Almeida; LANFREDI, Luís Geraldo
Sant’Ana; SOUZA, Luciano Anderson de; SILVA, Luciano Nascimento (Coord.).
Repressão penal e crime organizado: novos rumos da política criminal após o 11 de
setembro. São Paulo: Quartier Latin, 2009. p. 65.
30 .COSTA, Helena Regina Lobo da. Os rumos da política criminal cinco anos depois do
11 de setembro. Política criminal e dogmática penal: entre a judicialização e a
administrativização. In: TOLEDO, Otávio Augusto de Almeida; LANFREDI, Luís Geraldo
Sant’Ana; SOUZA, Luciano Anderson de; SILVA, Luciano Nascimento (Coord.).
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31 .Destaca-se: “Esso consiste nel fatto che, essendo a mafia un fenomeno sociale
indissociabile dalla politica, la sua formazione e i suoi sviluppi coincidono con le vicende
di un tenace sistema di potere che ha caratterizzato la Sicilia. Si potrebbe assirittura
sostenere che la storia della Sicilia politica è di per sé la storia della mafia. È sensato
ricercare le premesse nei molti secoli durante i quali si riprodusse in Sicilia
l’ordenamento feudale di cui sarebbe stata decretata la liquidazione soltanto nel 1812”.
SCARPINO, Salvatore. Storia dela mafia. Milão: Fenice 2000, 1994. p. 11.
32 .SCARPINO, Salvatore. Storia dela mafia. Milão: Fenice 2000, 1994. Embora esse
seja o período identificado como a origem da máfia, os historiadores italianos apontam
para as suas manifestações primordiais, também denominadas pré-mafiosas, séculos
antes. Assim, apenas a título de curiosidade, destaca-se breve excerto da lição de
Vicenzo Ruggiero: “El origen del fenómeno mafioso se remonta al feudalismo y está
confirmado por el hecho de que el covabulomafio (o maffia) es muy probablemente de
origen árabe: los arabes dominaron Sicilia desde el siglo IX al siglo XI, pero mantuvieron
una notable influencia sobre la cultura de la isla hasta el siglo XIII y por un periodo de
tiempo no indiferente durante el cual precisamente se introduce a Sicilia el régimen
feudal, ocurrido durante la primera mitad del siglo XII por obra de los normandos” e “La
estrecha relación entre mafia y poder político no seria comprensible sin tomar en cuenta
que la mafia siciliana en su origen no fue un fenómeno de las clases subalternas,
excluidas como tales de cualquier acuerdo de poder, sino de las clases poseedoras del
dominio político y económico de la isla, es decir de la vieja nobleza feudal y de los
grandes latifundistas, de quienes los mafiosos siempre fueron valiosos aliados en la
lucha contra las reivindicaciones campesinas” (RUGGIERO, Vincenzo. Crimine
organizzato: una proposta di aggiornamento delle definizioni. Dei Delitti e Delle Pene:
Rivista de Studi Sociali, Storici e Giuridici Sulla Questione Criminale, Bologna, n. 3, 1992.
p. 159-160.) Destaca-se ainda os apontamentos de Guaracy Mingardi: “A primeira
referência oficial feita à Máfia ocorreu em um tribunal siciliano em 1832, 22 anos antes
de Garibaldi unificar a Itália. Embora sem nominar a organização, o tribunal mencionou
‘irmandades’ de criminosos. Em 1863, peça ‘I Mafiusi di la Vicária’ usa pela primeira vez
o termo mafioso para se referir aos membros da organização” (MINGARDI, Guaracy. O
que é crime organizado: uma definição das ciências sociais. Revista do ILANUD, São
Paulo, n. 8, 1998. p. 9).
33 .RESKI, Petra. Máfia: padrinhos, pizzarias e falsos padres. Trad. André Delmonte. Rio
de Janeiro: Tinta Negra Bazar Editorial, 2010. p. 90-91. Vale apresentar em nota o
excerto completo: “Desde a sua origem, a Cosa Nostra faz um esforço para se fundir
com o mundo onde vive e de onde nasceu. Isso é importante para sua sobrevivência. A
Máfia quer ser invisível, quer fazer parte da sociedade. Ela sempre contou com uma
aversão dos italianos ao Estado e há séculos vende com sucesso a ilusão de estar
lutando por uma Justiça mais elevada – como se ela lutasse por uma justiça individual
perante um Estado poderoso: isso ela tem em comum com a Igreja católica, que
também só se submete com relutância à justiça terrena. Em várias partes do Sul da
Itália, o Estado ainda é visto como uma força de ocupação – como se os normandos, os
Staufer, os Bourbons, Aragões e austríacos tivessem passado por ali ainda ontem”.
35 .Traduçao nossa do original: “Si potrebbe dire, forzando solo un poco i termini della
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realtà storica, che lo Stato unitario, almeno per quanto riguarda il comportamento della
gran parte della classe politica, nacque in Sicilia nell’ambito di una strategia politica di
tipo mafioso”. SCARPINO, Salvatore. Storia dela mafia. Milão: Fenice 2000, 1994. p. 17.
37 .RESKI, Petra. Máfia: padrinhos, pizzarias e falsos padres. Trad. André Delmonte. Rio
de Janeiro: Tinta Negra Bazar Editorial, 2010. p. 97.
38 .SCARPINO, Salvatore. Storia dela mafia. Milão: Fenice 2000, 1994. p. 24.
39 .SALES, Sheila Jorge Selim de. Escritos de Direito Penal. Belo Horizonte: Faculdade
de Direito da UFMG, 2004. p. 191.
40 .Nesse sentido: “Para referir-se a esta segunda e mais ampla acepção, utiliza-se
frequentemente a expressão ‘organizações de tipo mafioso’, com a qual se visa aludir a
formas de organização, onde são detectáveis as características típicas do originário
modelo criminal mafioso, tal como se desenvolveu historicamente e se apresenta hoje na
Sicília”. RINALDI, Stanislao. Criminalidade organizada de tipo mafioso e poder político na
Itália. Revista Brasileira de Ciências Criminais, São Paulo, n. 22, v. 6, 1998. p. 11.
42 .Nesse sentido: “L’art. 416 bis si pone quindi sempre ocme norma speciale rispetto
all’aart. 416 c.p. se non per l’illicità penale del fine, per quella della condotta strumentale
necessaria per la configurazione del reato. Conseguentemente la contestazione
dell’associazione di tipo mafioso, se correttamente effettuata, comprenderà sempre
esplicitamente o implicitamente la contestazione di un’associazione per delinquere
finalizzata a porre in esse condotte di violenza privata o di estorsione (consumata o
tentata”. SPAGNOLO, Giuseppe. Ai confini tra associazione per delinquere e associazione
di tipo mafioso [Comentário de jurisprudência]. Rivista Italiana di Diritto e Procedura
Penale. Milano, v. 32, 1989.
47 .ANCEL, Marc. Utilidades e métodos do direito comparado. Trad. Sérgio José Porto.
Porto Alegre: Fabris, 1980. p. 111-113.
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48 .ANCEL, Marc. Utilidades e métodos do direito comparado. Trad. Sérgio José Porto.
Porto Alegre: Fabris, 1980. p. 113.
49 .Nota sobre a tradução: não há uma tradução precisa para o português da palavra
omertà, a qual deve ser compreendida como uma espécie de pacto de silêncio,
caracterizado pela recusa generalizada em cooperar com as instâncias oficiais.
2. Coloro che promuovono, dirigono o organizzano l’associazione sono puniti, per ciò
solo, con la reclusione da dodici a diciotto anni.
3. L’associzione è di tipo mafioso quando coloro che ne fanno parte si avvalgono della
forza di intimidazione del vincolo associativo e della condizione di assoggettamento e di
omertà ce ne deriva per commettere delitti, per acquisire in modo diretto o indiretto la
gestione o comunque il controllo di attività economiche, di concessioni, di
autorizzazzioni, appalti e servizi pubblici o per realizzare profitti o vantaggi ingiusti per
sé o per altri ovvero al fine di impedire od ostacolare il libero esercizio del voto o di
procurare voti a sé o ad altri in occasione di consultazioni elettorali. [...]
8. Le disposizioni del presente articolo si applicano anche alla camorra, alla ‘ndrangheta
e alle altre associazioni, comunque localmente dominante, anche straniere, che valendisi
della forza intimidatrice del vincolo associativo perseguono scopi corrispondenti a quelli
delle associazioni di tipo mafioso.”.
59 .SALES, Sheila Jorge Selim de. Escritos de Direito Penal. Belo Horizonte: Faculdade
de Direito da UFMG, 2004. p. 120.
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60 .SALES, Sheila Jorge Selim de. Escritos de Direito Penal. Belo Horizonte: Faculdade
de Direito da UFMG, 2004. p. 121.
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