Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
Unidade II
5 CONDIÇÕES DE PRODUÇÃO DO TEXTO
Caro aluno, o texto a seguir é de autoria de Chico Buarque, notório compositor. Ao ler o texto, você
pode afirmar que se refere a um contexto atual, vivido pelos meninos hoje?
Doze anos
(BUARQUE, 1997)
Os meninos hoje passam por brincadeiras como as descritas na letra de música? Pensando nos
centros urbanos, tal quadro descrito é possível?
117
Unidade II
Verificamos que a letra de música, um texto escrito aqui reproduzido, relaciona-se a um contexto.
Veremos, a partir desta seção, a relação entre os textos, em especial os escritos, e o contexto.
A escrita alfabética é considerada uma tecnologia (algo feito com instrumentos – tinta, caneta, papel
– inventados pelo homem para estender suas capacidades naturais), porém não pode ser desvinculada
de seu contexto de uso e de seus usuários; ao entrar no contexto linguístico e cultural de diferentes
línguas, passa a ser modificada por esses contextos.
Por isso, a escrita hoje é vista como uma série de práticas socioculturais variadas. As variações
ocorrem em línguas diferentes, é claro, mas também dentro da própria língua do falante, por exemplo,
entre camadas sociais distintas. Grupos sociais diferentes usam materiais escritos de maneiras diferentes,
ainda que dentro de um mesmo universo cultural. Pais de classes sociais mais favorecidas tendem a
explorar com suas crianças os livros infantis, preparando-as para o tipo de linguagem que encontrarão
na vida escolar. Por outro lado, crianças de classes sociais menos favorecidas tendem a adquirir mais
habilidades de interação oral (desafio, exibição) que contribuem para formas culturais como o rap.
Na área da educação, cada língua, assim como cada cultura, é vista não como algo homogêneo, mas
sim composta por variantes socioculturais determinadas pelos usuários e os contextos e finalidades em
que são usadas. A linguagem, assim como a cultura, se manifesta como variantes locais particularizadas
em contextos específicos.
Uma decorrência dessa concepção heterogênea de linguagem é não ver a língua como
compartimentada em “quatro habilidades” estanques: ler, escrever, ouvir, falar. O uso da língua quase
sempre envolve escrita e oral, compreensão e produção simultaneamente. O exemplo citado é a “leitura”
de livros infantis por pais para seus filhos. Nessa prática, ocorre leitura, compreensão oral, e intenso
uso das ilustrações, relacionando-as com o texto escrito. Além disso, as novas formas de comunicação
introduzidas pelo uso do computador são inovadoras da prática escrita, introduzindo ícones, imagens,
abreviações e modificando as regras da escrita tradicional.
A escrita pode ser focada sob três perspectivas, na concepção de Koch e Elias (2009): foco na língua,
no escritor e na interação.
A escrita com enfoque na língua relaciona-se à concepção de linguagem como um sistema pronto,
acabado, devendo o autor se apropriar desse sistema e de suas regras. Nesse sentido, o sujeito é visto
como predeterminado pelo sistema e o texto, por sua vez, é visto como simples produto de uma
codificação realizada pelo autor. Basta, então, o conhecimento da língua tanto para produção quanto
a leitura de um texto.
118
COMUNICAÇÃO E EXPRESSÃO
O texto, nesse enfoque, é considerado um produto do pensamento e intenções do autor sem levar
em conta as experiências e os conhecimentos do leitor nem a interação que envolve o processo da
escrita e da leitura.
Por fim, a escrita vista com enfoque na interação é encarada como produção textual, que exige do
autor ativação de conhecimentos vários. A escrita não é compreendida apenas como apropriação das
regras da língua, mas como interação escritor-leitor.
A escrita é evidentemente uma produção com base nos elementos da língua e na sua forma de
organização, mas requer a mobilização de um vasto conhecimento compartilhado entre escritor e
leitor.
Diante da escrita, o leitor aciona os conhecimentos prévios e os confronta com o texto, construindo
o sentido. Ele percorre as marcas linguísticas deixadas pelo autor para entender o texto, assumindo
papel de sujeito ativo ao inferir e interagir com dados do texto. O autor e o leitor de um texto
são social e ideologicamente constituídos e, assim caracterizados, são produtores de sentido. Seus
comportamentos, sua linguagem e a configuração de sentido são determinados pelo momento
sócio-histórico. Portanto, o sentido de um texto nunca é o mesmo, pois pode ser lido em diferentes
momentos da vida (e de maturidade) do leitor, portanto pode ser mudado, revestindo-se assim de
uma pluralidade de sentidos.
119
Unidade II
Para que duas ou mais pessoas possam compreender-se mutuamente, é preciso que seus
conhecimentos sejam parcialmente semelhantes, ou melhor, seus conhecimentos devem ser
compartilhados uma vez que é impossível duas pessoas partilharem exatamente os mesmo
conhecimentos.
Em uma situação de interação, atuamos com base no contexto. O contexto é alterado, ampliado,
e as pessoas se encontram obrigadas a ajustar-se aos novos contextos que se vão ocasionando
sucessivamente. O conhecimento de mundo de cada um, já é por si mesmo um contexto.
Assim, a escrita pode ter seu significado alterado em função de fatores contextuais, e o contexto
pode ser usado para justificar o que deve ser dito e também para o que não deve.
Hoje em dia reconhecemos de forma bastante ampla que muito da produção de sentido depende
fundamentalmente do contexto e que, além disso, não há uma definição única de quanto ou de que tipo
de contexto é necessário para a descrição da linguagem.
Nós temos o contexto imediato, que abrange os participantes da comunicação, local e tempo da
interação, objetivo da comunicação e meio de propagação do texto. Esse contexto ocorre em torno de
outro contexto – o mediado, constituído por aspecto social, histórico e cultural. Voltemos à letra de
música Doze anos, de Chico Buarque, tomando-a como exemplo.
Na letra de música, o autor evoca o tempo em que ele era um menino de doze anos marcado
por brincadeiras como matar passarinho, colecionar minhocas, jogar muito botão, rodopiar pião, jogar
futebol na rua, comer fruta no pé, entre outros aspectos indicadores de um contexto mediado.
Esse tempo retratado na letra de música é bem diferente deste que vivenciamos atualmente. Os
garotos vivem em centros urbanos com predominância de predios e escassez para brincadeiras ao ar
livre, bem como a inexistência expressiva da natureza. Hoje TV, computador, videogame ocupam lugar
das antigas brincadeiras.
Vejamos outro texto, de um escritor conhecido por mim e por muitos outros apreciadores de texto
poético. Sobre o texto:
• indicaremos o contexto imediato: participantes, local e data, objetivo do texto e como ele foi
propagado.
• discutiremos o contexto mediado.
• relacionaremos o título com o posicionamento do autor sobre o assunto.
120
COMUNICAÇÃO E EXPRESSÃO
Professor de História
Quando eu conto
Que nesta terra
A nudez era tão natural
E que o pecado e a malícia vieram de longe,
A bordo de treze naus
Quando eu conto
que os corpos nus
Mirados pelo vento
Vestidos com a inocência
Foram violados por olhos cúpidos
Ultrajados por olhos sedentos
Quando eu conto
Que trouxeram tantos deuses
Novas crenças, todas vãs
Eu já tinha minha fé
Eu já tinha meu pajé
Eu queria trocar meu Tupã?
Quando eu conto
Que o Deus que aqui chegou
Trazido do além-mar
Viajou com o invasor?
Com certeza na primeira maré
Levou um à proa, e o outro se pôs na ré
Quando eu conto
Que tanto se fez
Em nome de uma fé
Matou-se, vestiu-se
E levou o que da terra se apanhava
Para uma desconhecida e longínqua Sé
Quando eu conto
Que para cá trouxeram a Cruz
e contaram seu significado
E sem que ficassem chocados
Cruzaram os corpos mortos e despidos
Com corpos mortos de meninos nus
121
Unidade II
Quando eu conto
Que tudo que eu conto é verdade
Ah Tupã. que impunidade!
Já não existe Tupi, Tapuia ou Timbira...
Podia ser tudo um conto
Podia ser tudo mentira
(CHAIM, 2008)
O contexto imediato constitui-se dos participantes específicos à situação comunicativa: são o autor
Roberto Chaim e nós, leitores do poema. Postado no site especialista em textos literários, o poema é
contemporâneo e alcança internautas interessados em poema. O mundo virtual – via sites – é a forma
mais utilizada atualmente por escritores e outros artistas para a divulgação de seus trabalhos. Essa
forma intensifica a interação entre o autor e leitor, uma vez que não há editora mediando o contato.
Por tratar de um texto literário, o poema tem a função lúdica, estética (trabalha com a matéria
prima: a língua) e também de denúncia. No caso, o assunto nos dá o contexto mediado: a chegada dos
estrangeiros ao continente americano e a repercussão para a vida e a cultura dos índios.
O posicionamento do autor é nítido sobre o assunto. O ponto de vista não é do europeu conquistador,
considerando-se grande aventureiro em nome de uma nação europeia. Também não é do ponto de vista
indígena, porque traz em seu discurso um distanciamento sobre este grupo social, além de demonstrar
conhecimentos, crenças e valores do mundo ocidental europeu. Assim, em uma posição, talvez mediadora
(entre conquistadores e conquistados), pende para o lado dos índios na não aceitação da dizimação dos
índios e da sua cultura.
O título explica a escolha do assunto, afinal, esse assunto faz parte do conteúdo programático de
aulas de História, mas não indica o ponto de vista assumido. Na área de história, como já foi dito neste
livro-texto, hoje há duas perspectivas para o estudo: a história vista de cima ou a história vista de baixo.
Percebemos que o poeta Chaim assume a segunda perspectiva, para a qual o Brasil representou não
uma conquista vitoriosa, mas quase que um genocídio, com milhares de índios mortos e devastação na
cultura local. Não é uma aula de história contada pelo herói, com direito a matar quem não quisesse se
converter ao Cristianismo.
Lembrete
Uma publicação, cujo contexto imediato é fundamental, é a carta do leitor. Devido ao seu caráter
transitório, extremamente vinculado ao momento da notícia, a seção carta do leitor apenas é compreendida
pelo leitor que acompanha as leituras do jornal ou da revista no mesmo ciclo de publicação (semana ou
mês) em que foi divulgada. Descontextualizada, ou seja, retirada daquele momento em que conversa
122
COMUNICAÇÃO E EXPRESSÃO
com a notícia da semana (no caso do jornal) ou do mês (no caso da revista mensal), a carta do leitor
causa dificuldade na leitura. Vejamos um trecho de uma carta do leitor:
Os ataques terroristas a Nova York e a grande crise na Argentina mostram que em 2001
o mundo virou de cabeça para baixo. E o caos está só começando. Daniel Silva Souza, São
Paulo, SP.
Veiculada na revista Época em 31 de dezembro de 2001, hoje o leitor pode ter dificuldade para
recuperar o contexto da carta. O leitor se lembra do evento com as torres em Nova York, devido à
repercussão internacional constante desde então, mas pode não se lembrar que tipo de crise ocorreu
na Argentina.
Diferente dessa carta, outra ocorrida no mesmo mês e ano, mas na revista Superinteressante,
apresenta o seguinte conteúdo:
Os políticos têm o dever de criar leis severas para proteger nosso patrimônio (Piratas da
Floresta, novembro, pág. 51). Hoje os piratas entram aqui quando querem e saem com o que
querem. Reinaldo Ribeiro, Barueri, SP.
(ROJO, 2001)
No caso dessa segunda carta do leitor, ela dialoga com reportagem publicada no mês anterior na
mesma revista. A reportagem foi intitulada como Piratas da floresta e tratou dos desmandos do país.
O autor da carta do leitor pode corroborar a notícia ou discordar dela. No caso acima, o autor afirma a
opinião jornalística sobre o assunto.
A charge é constituída pela linguagem não verbal (figuras) e, geralmente, pela linguagem verbal. Em
uma das charges de Angeli, temos a seguinte caracterização:
• A flora brasiliense
Fraudulência (Vegetale corruptus) – Árvore da família das Maracutaias, suas sementes chegaram
ao país com as caravelas e hoje, mesmo com raízes espalhadas por todo o território nacional,
123
Unidade II
seu caule espesso e sua copa frondosa estão fincados no Planalto Central, bem no coração do
Brasil.
• no plano de fundo, os símbolos da Capital do país: os prédios do Planalto Central, onde se reúnem
os políticos brasileiros;
• em destaque, uma árvore frondosa com homens engravatados no seu tronco e ramos; das copas
saem as folhas em forma de cédula.
O leitor reconhece nessa charge o contexto – não imediato, pois é difícil recuperar a qual notícia
essa charge se vincula, mas o contexto mediado, relacionado à história do país, em especial à história de
corrupção política. O contexto da charge, na verdade, exige do leitor uma grande dose de conhecimento
de mundo e da capacidade de inferência.
O leitor precisa recuperar a informação de que a linguagem da charge é uma paráfrase da obra
Flora brasiliensis, produzida entre 1840 e 1906, pelos editores Carl Friedrich Philipp von Martius, August
Wilhelm Eichler e Ignatz Urban, com a participação de 65 especialistas de vários países e contém
tratamentos taxonômicos de 22.767 espécies, a maioria de angiospermas brasileiras, reunidos em 15
volumes, divididos em 40 partes, com um total de 10.367 páginas. O leitor precisa perceber também que
ao satirizar os políticos corruptos o autor emprega jargão da ciência natural.
O efeito de sentido encontra-se, então, na relação entre o gênero textual – charge – com o tipo de
discurso – jornalístico.
Sobre a escrita, em conclusão, ressaltamos a síntese feita por Koch e Elias (2009, p. 84):
O contexto possibilita avaliar o que é adequado ou não do ponto de vista dos modelos interacionais
construídos culturamente. Um exemplo é a charge de Angeli, publicada na Folha de S. Paulo, cujo
cenário é o interior de uma mansão e em cujas escadas centrais desce a esposa acompanhada por uma
legião de empregadas. O marido a espera no fim da escada e diz:
Exemplo de aplicação
1. A letra de música Tupi or not tupi é do compositor e cantor Biafra. Sobre ela, podemos fazer
algumas considerações:
125
Unidade II
To be or not to be...
Tupi or not Tupi...
To be or not to be...
Tupi or not... Tupi or not...
Tupi or not Tupi...
To be or not to be...
Tupi or not Tupi...
To be or not to be...
Tupi or not... Tupi or not...
Tupi or not Tupi...
ê macumbabebê, ê macumbê...
ê macumbabá, Macumbá!
I. Quem fala no texto representa a voz social do índio brasileiro que se contrapõe à formação
ideológica colonialista.
II. No texto, há referência à literatura inglesa (Hamlet, de Shakespeare) e brasileira (poema Tupi or
not tupi, de Oswald de Andrade).
III. O caráter dialógico do discurso consiste na multiplicidade de vozes, no caso, do índio que dirige
o discurso para o branco, europeu, construindo relação simétrica entre as vozes.
126
COMUNICAÇÃO E EXPRESSÃO
Comentário: A alternativa correta é D). O contexto imediato é constituído por nós, ouvintes ou
leitores da letra de música e pelo compositor, situados na mesma época e ambiente sociocultural.
Fortemente marcado é o contexto mediado ao recuperar um momento histórico brasileiro: a colonização
e as consequências para o povo indígena. Esse texto também recupera o contexto cultural ao fazer
referência à peça teatral Hamlet e ao poema brasileiro Tupi or not tupi. Ao leitor cabe relacionar ambas
as obras, uma vez que a frase notória da peça Hamlet é “Ser ou não ser, esta é a questão”, sendo em
inglês To be or not to be, fonemas parodiados por Oswald de Andrade pela proximidade sonora como
Tupi or not tupi, fazendo remissão à língua indígena tupi.
2. A ilustração abaixo não tem linguagem verbal, objeto desta seção do livro-texto, mas é um ótimo
motivo de leitura e verificação do contexto. Assim, leia o texto abaixo e discuta as possíveis inferências
históricas. Explica-se que no centro do peito da personagem o círculo está na cor vermelha.
Comentário: Caro aluno, você deve ter contextualizado a ilustração ao tsunami no Japão ocorrido
em março de 2011 e as consequências, observadas por meio dos: restos de madeira, casas, fábricas,
meio de transporte, sujeira e alagamento. É possível perceber a nacionalidade pelo formato do cabelo
do jovem, pela mascote na mão do jovem e pelo círculo vermelho que sugere a bandeira nacional
japonesa. Além desses aspectos contextuais, outro, de nível mundial, pode ser recuperado: o símbolo da
radiação, que aparece no canto inferior à direita da ilustração e sugere a importância dada pelo autor
ao problema das usinas nucleares e a dissipação de sua radioatividade.
127
Unidade II
6 INTERTEXTUALIDADE
Monte Castelo
É só o amor, é só o amor.
Que conhece o que é verdade.
O amor é bom, não quer o mal.
Não sente inveja ou se envaidece.
É só o amor, é só o amor.
Que conhece o que é verdade.
Ainda que eu falasse a língua dos homens.
E falasse a língua dos anjos, sem amor eu nada seria.
É uma letra de música de muito sucesso e nela ocorre a intertextualidade de forma explícita, ou seja,
há cópia de trechos de outros textos nela. Há trecho do poema de Luis Vaz de Camões:
128
COMUNICAÇÃO E EXPRESSÃO
(CAMÕES, 2008)
Verificamos que o músico estabelece um diálogo com o poeta Camões, ao utilizar uma das estrofes
de seu poema. Caso o leitor não tenha esse conhecimento, a intertextualidade não será reconhecida
e, portanto, também não será reconhecida a essência da mensagem sobre o tema “amor”. A escolha de
uma mesma caracterização os une no papel de poetas, cuja proposta é difundir um valor ou ponto de
vista sobre o amor.
Intertexto é o diálogo que cada texto estabelece com outros textos. Já dizia Bakhtin (1986, p. 291):
“cada enunciado é um elo da cadeia muito complexa de outros enunciados”. Ainda segundo Bakhtin
(1986, p. 162),
o texto só ganha vida em contato com outro texto (com contexto). Somente
neste ponto de contato entre textos é que uma luz brilha, iluminando tanto
o posterior como o anterior, juntando dado texto a um diálogo. Enfatizamos
que esse contato é um contato dialógico entre textos. Por trás desse contato
está um contato de personalidades e não de coisas.
129
Unidade II
Koch, Bentes e Cavalcante (2008) afirmam que a tarefa de identificar a presença de outro ou de
outros textos em um texto escrito, por exemplo, depende muito dos conhecimentos do leitor, ou seja,
depende de seu conhecimento de mundo ou enciclopédico, de seu conhecimento linguístico e de seu
conhecimento interacional. O primeiro deles, o conhecimento chamado enciclopédico, é fundamental
para que o leitor consiga atribuir sentido a um dado texto que recorre a outros textos. Nesse sentido:
Para falar em intertexto, precisamos dar um breve resumo sobre as vozes presentes no texto. Os
textos têm a propriedade intrínseca de se constituir a partir de outros textos. Por isso, todos eles são
atravessados, ocupados, habitados pelo discurso do outro. Um texto remete a duas concepções diferentes:
aquela que ele defende e a outra em oposição à qual ele se constrói. Nele, ressoam duas vozes, dois
pontos de vista, e o discurso é sempre a arena em que se discutem esses pontos.
Por exemplo, através de alguns vídeos assistidos, visualizamos que a divulgação de um dos anúncios
da BomBril “Mon Bijou” faz alusão à beleza e ao charme do ator Reynaldo Gianecchini com a marca
famosa e cheirosa “Bombril-Mon Bijou”, pois na propaganda o ator proclama uma cantada para as
mulheres e elas acabam jogando peças íntimas para ele, em sinal de não resistência ao ator. É esta a ideia
que o locutor pretende passar para seu público específico: que eles(as) não podem resistir a consumir a
marca predileta pelas mulheres brasileiras; afinal, é uma marca irresistível. Conseguimos perceber essa
intenção através do slogan que enuncia da seguinte forma: “É mais do que bom. É Bombril.”
É essencial identificarmos a presença do intertexto no exemplo citado acima, porque sabemos que
o intertexto não faz referência somente aos textos literários e sim a anúncios publicitários, imagens/
vídeos, músicas, filmes, entre outros.
Quando ocorrem situações em que o intertexto está presente, precisamos, como já dito na seção
anterior, mobilizar nosso conhecimento de mundo ou enciclopédico para atribuir sentido ao texto. Esse
movimento nos leva a perceber que há diferentes formas a que um autor pode recorrer para inserir
outros textos em seu texto. A essas diferentes formas, chamamos “tipos de intertexto” e esses tipos nos
permitem caracterizar a intertextualidade.
130
COMUNICAÇÃO E EXPRESSÃO
As autoras Koch, Bentes e Cavalcante (2008) afirmam que podemos separar a intertextualidade,
inicialmente, em duas correntes: a denominada stricto sensu e a denominada lato sensu. Essas correntes
determinam o grau de explicitação e a natureza do intertexto utilizado na composição textual.
Por intertextualidade stricto sensu, entendemos aquela que ocorre geralmente “quando, em um
texto, está inserido outro texto (intertexto) anteriormente produzido, que faz parte da memória
social de uma coletividade ou da memória discursiva dos interlocutores” (p. 17). Assim, as sequências
argumentativas stricto sensu são aquelas que apresentam uma ordenação ideológica de argumentos
e/ou contra-argumentos. Nelas predominam elementos modalizadores, verbos introdutores de opinião,
operadores argumentativos etc.
Por intertextualidade lato sensu, entende-se aquela de sentido mais amplo e, portanto, mais
difícil de ser percebida, afirmam as autoras ser aquela que indica que “qualquer texto se constrói
como um mosaico de citações e é a absorção e transformação de um outro texto” (p.85). Esse tipo de
intertextualidade é mais difícil de ser percebida porque remete a outras vozes textuais de forma indireta,
apresentando fragmentos textuais de diferentes gêneros, o que torna menos evidente a descoberta do
texto “escondido”.
Observação
131
Unidade II
Assim, podemos dizer que a intertextualidade temática se resume nos temas ou assuntos que são
tratados e retomados nos diferentes discursos que circulam socialmente.
Exemplo de aplicação
Espinho na roseira
(ABUJAMRA, 1995)
a. A letra de música Espinho na roseira, de André Abujamra, faz intertexto com o poema Quadrilha,
de Carlos Drummond de Andrade por meio de dois aspectos: a estrutura e o conteúdo. Compare
os dois textos: como eles se estruturam em relação aos encontros e desencontros amorosos? O
final das histórias é idêntico?
b. Leia a letra de música seguinte e compare-a com Espinho na roseira. Existe intertextualidade entre
elas?
Sobradinho
Sá e Guarabyra
Comentário: Tanto o poema de Drummond quanto a letra de música de Sá e Guarabyra serviram para
a construção de Espinho na roseira. Existe, portanto, uma relação intertextual. Da música Sobradinho,
foi usada a expressão “o sertão vai virar mar”, que se tornou refrão; do poema de Drummond, todo o
assunto – desencontro amoroso – é usado na letra, em uma intertertualidade temática explícita, bem
como a forma como a história se desenvolve na letra: X ama Y, que tem relação com Z e assim por diante.
O final é idêntico: aquela pessoa que não almejava um relacionamento é a única que efetivamente
consegue.
a) Tente descobrir de que texto Milton Nascimento retirou o primeiro verso do texto Itamarandiba.
Itamarandiba
b) Agora tente descobrir de que texto Carlos Drummond de Andrade retirou o primeiro verso de seu
texto:
(ANDRADE, 2003)
c) Por fim, tente descobrir de que texto Olavo Bilac retirou o título do seu poema Nel mezzo del
camin.
(BILAC, 1978)
Comentário: O enigma tornou-se uma brincadeira, uma vez que a resposta era obtida em
texto posterior. É uma forma bem humorada para a percepção de cada texto remete a outro,
com ocorrência da intertextualidade. Assim, Milton Nascimento recorre a Drummond, que, por
sua vez, ironizou Bilac. Este segue uma tradição e se volta ao primeiro verso da obra A divina
comédia, de Dante Alighieri, cujo início transcrevo aqui na versão original (italiana) e em nossa
língua. São autores de época diferente: Dante Alighieri, italiano, da Idade Média; os outros são
brasileiros. Bilac é do fim do século XIX; Drummond lançou-se na literatura um pouco antes da
135
Unidade II
metade do século XX. Entre os poetas e músicos, os artistas de forma geral, há um constante
diálogo.
(ALIGHIERI, 1998)
136
COMUNICAÇÃO E EXPRESSÃO
Entre outros exemplos, temos a Oração do Internauta (apud KOCH; BENTES; CAVALCANTE. 2008) ,
que tem como intertexto a oração da liturgia cristã “Pai Nosso”.
Oração do Internauta
Satélite nosso que estais no céu, acelerado seja o vosso link, venha a nós o vosso host, seja feita
vossa conexão, assim em casa como no trabalho.
O download nosso de cada dia nos daí hoje, perdoai nosso tempo perdido no Chat, assim como
nós perdoamos os banners de nossos provedores.
Amém!
No contexto dessa nova “oração”, é utilizada a oração do Pai Nosso para apresentar elementos
específicos do contexto da informática. Nesse caso, se o leitor não tem nenhuma informação sobre o
tema ou se não conhece a oração do Pai Nosso, fica mais difícil compreender e atribuir sentido ao texto.
Notemos, portanto, que o conhecimento de mundo do leitor é imprescindível para a compreensão e
percepção do intertexto.
Koch, Bentes e Cavalcante (2008), para explicar a intertextualidade explícita, recorrem à obra escrita
por Koch em 2004, na qual esta cita trechos das obras de Mondana e van Dijk, utilizados por ela como
argumento de autoridade. A autora afirma que para explicar uma dada posição teórica, ela faz uso dos
dois autores citados, destacando a maneira como ambos se referem ao tal posicionamento teórico. Ela
recorre à voz desses dois autores para impor confiabilidade ao seu texto, e os trechos citados funcionam
como argumento de autoridade, que ajudam a comprovar sua posição teórica. O intertexto explícito
está, justamente, na apresentação dos trechos desses dois autores.
A intertextualidade acontece na interação face a face, usada para a retomada da fala do parceiro.
Nesse sentido:
É sempre importante que o leitor procure identificar o fenômeno e pensar nas escolhas feitas pelo
autor, perguntando-se sempre, ao ler um texto: “por que e para que o autor citou a fonte, se tem a
opção de não fazê-lo?”.
Ela ocorre quando introduzimos, no próprio texto, intertexto alheio, sem qualquer menção explícita
da fonte, com o objetivo quer de seguir-lhe a orientação argumentativa, quer de contrariá-lo, colocá-lo
em questão, de ridicularizá-lo ou argumentar em sentido contrário.
Ocorre também intertextualidade das semelhanças, que é identificada pela presença de paráfrases e
conhecida também por captação. A intertextualidade das diferenças é chamada também de subversão,
que consiste em enunciados irônicos ou parodísticos.
Nesse sentido, é esperado que o leitor conheça o texto fonte para poder entender o texto atual,
pois quando não há reconhecimento do texto original na memória discursiva, perde-se o sentido da
intertextualidade no texto atual. Os intertextos mais fáceis de serem reconhecidos são os que usam ditos
populares, músicas populares, provérbios, pois fazem partes da cultura popular. Já nos textos literários,
jornalísticos, publicitários, políticos, bordões de programas humorísticos e outros, “o reconhecimento do
intertexto é menos garantido, visto que depende da amplitude dos conhecimentos que o interlocutor
tem representado em sua memória” (KOCH; BENTES; CAVALCANTE, 2008, p.35). A não depreensão do
texto fonte, nesses casos, empobrece a leitura ou praticamente impossibilita a construção de sentidos
intencionados pelo produtor do texto.
Seus suspiros,
Suspiros a sabiá!
Exemplo de aplicação
Leia os textos 1 e 2:
Texto 1
Canção do exílio
(DIAS, 1996)
139
Unidade II
Texto 2
Comentário: O poema Canção do exílio ficou muito famoso pelo sentimento de nacionalismo
muito intenso. O texto desconsidera problemas da época (contexto histórico, político etc.) e
descreve apenas a natureza, que ainda era muito rica. O poema virou um símbolo e, décadas
depois, o autor do nosso Hino Nacional copiou, com ligeiras adaptações, trecho do poema. Assim,
a resposta correta é D).
Intertextualidade genérica
A intertextualidade intergenérica ou híbrida é definida como gênero que exerce a função de outro.
Revela a capacidade de operação e maleabilidade que dá aos gêneros enorme capacidade de adaptação
e ausência de rigidez. Como modelo cognitivo de contexto que contém parâmetros relevantes da
interação comunicativa e do contexto social:
As relações intertextuais existem para dar unidade aos textos, para estabelecer seus limites e,
também, para mostrar como esses textos estão ordenados. A intertextualidade genérica, na verdade, nos
mostra como os textos se constituem de modo heterogêneo, como são abertos e dinâmicos, passíveis
de modificações sempre.
Partindo dessa premissa, uma narrativa ou uma descrição diferem uma da outra e também de
outras narrativas e outras descrições. As sequências reconhecidas como descritivas, por exemplo,
141
Unidade II
Ademais, verifica-se teoricamente que os tipos são agrupados como narrativos, descritivos,
argumentativos, expositivos ou injuntivos; dessa maneira, é enfatizado que os gêneros textuais são
constituídos por dois ou mais tipos. Portanto, a presença de vários tipos textuais em um dado gênero é
denominada de heterogeneidade tipológica.
A intertextualidade lato sensu, entretanto, não é vista de forma tão aparente, pois é preciso que haja
uma remissão discursiva a outras vozes textuais, ainda que de forma indireta para que ela ocorra. Dessa
forma, esse tipo de intertextualidade (tipológica) irá configurar-se a partir da noção de intertexto como
componente textual natural. Para que esse intertexto seja evidenciado pelos interlocutores torna-se,
portanto, necessário um desempenho discursivo maior, uma vez que, à relação intertextual não subjaz
uma remissão a textos que fazem parte da memória cognitiva cultural e socialmente partilhada. A
intertextualidade lato sensu apresenta fragmentos textuais de diferentes naturezas de uma forma bem
menos evidenciável.
Intertextualidade tipológica decorre do fato de se poder depreender, entre tipos textuais – narrativas,
descritivas, expositivas etc. – um conjunto de características comuns, em termos de estruturação, seleção
lexical, uso de tempos verbais, advérbios (de tempo, lugar, modo etc.) e outros elementos que permitem
reconhecê-las como pertencentes à determinada classe.
Concluindo, recorremos à metáfora do iceberg. Por mais que percebamos algo no texto só vemos
uma parte superficial dele.
Exemplo de aplicação
Oficina
As próximas atividades são preparatórias para o entendimento do filme Matrix (o primeiro da trilogia)
no que diz respeito à intertextualidade.
A – A alegoria da caverna é uma criação do filósofo Platão (V a.C.) para tratar do jogo aparência
e essência. Segundo ele, temos de ultrapassar o que vemos a fim de alcançarmos a ideia. A alegoria é
recontada por Jostein Gaarder, no livro O mundo de Sofia.
Alegoria da caverna
figuras, elas projetam sombras bruxuleantes na parede da caverna. Assim, a única coisa
que as pessoas da caverna podem ver é este “teatro de sombras”. E como essas pessoas
estão ali desde que nasceram, elas acham que as sombras que veem são a única coisa
que existe.
Agora, o feliz habitante das cavernas pode andar livremente pela natureza, desfrutando
da liberdade que acabara de conquistar. Mas as outras pessoas que ainda continuam lá
dentro da caverna não lhe saem da cabeça. E por isso ele decide voltar. Assim que chega lá,
ele tenta explicar aos outros que as sombras na parede não passam de trêmulas imitações
da realidade. Mas ninguém acredita nele. As pessoas apontam para a parede da caverna e
dizem que aquilo que veem é tudo o que existe; é a única verdade que existe; é a realidade.
Por fim, acabam matando-o.
(GAARDER, 1995)
Uma alegoria é uma representação figurativa que tem dois planos: o da representação figurada,
literal e visível, e o da significação encoberta. Alegoria é um modo de expressão literária e artística que,
através de um conjunto de imagens, mostra uma realidade com significado simbólico.
A decifração de uma alegoria depende sempre de uma leitura intertextual, que permite identificar
num sentido abstrato um sentido mais profundo, sempre de caráter moral. Recurso artístico e
literário que, por intermediário de imagens figuradas, mostra uma realidade com significado
simbólico.
Na literatura clássica uma das alegorias mais conhecidas é o mito da caverna na obra República de
Platão (Livro VII). Por que o leitor pode considerar a Alegoria da caverna uma alegoria?
143
Unidade II
2. A alegoria platônica está estruturada em dois níveis, como aponta no quadro o estudioso Jorge
Claudio Ribeiro, na obra Platão: ousar a utopia:
a. Identifique os tipos de ideia que nos vêm “empacotados”. Quem as emite? Qual nossa reação
espontânea diante delas?
b. Em que situações a violência material e a prisão da mente se fortalecem uma a outra?
c. Que fatores contribuem para a libertação de um país ou de um grupo? Dê exemplos.
d. Relate as etapas de alguma descoberta importante que você (algum amigo ou grupo de pessoas)
fez em direção ao crescimento como ser humano.
e Dê sua interpretação sobre os pontos principais da Alegoria da caverna. Debata suas conclusões
com os colegas de curso.
C – Você já ouviu falar do escritor português José Saramago com certeza. Entre outros livros, ele
escreveu A caverna.
a) Pelo título, que intertexto ocorre no livro, ou seja, a que outro texto o livro faz referência?
b) Ainda pelo título, que hipótese pode ser levantada sobre o tema do livro?
c) Leia um trecho do livro:
Há quem leve a vida inteira a ler sem nunca ter conseguido ir mais além da leitura, ficam
pregados à página, não percebem que as palavras são apenas pedras postas a atravessar
a corrente de um rio, se estão ali é para que possamos chegar à outra margem, a outra
144
COMUNICAÇÃO E EXPRESSÃO
margem é que importa, A não ser, A não ser, quê, A não ser que esses tais rios não tenham
duas margens, mas muitas, que cada pessoa que lê seja, ela, a sua própria margem, e que
seja sua, e apenas sua, a margem a que terá de chegar.
D – Caça-palavras
Jesus (a.C. – 29-36? d.C.) é a figura central do cristianismo. Para a maioria dos cristãos
Jesus é Cristo, a encarnação de Deus e o “Filho de Deus”, que teria sido enviado à Terra para
salvar a humanidade. Acreditam que foi crucificado, morto e sepultado, desceu à mansão
dos mortos e ressuscitou no terceiro dia (na Páscoa). Para os adeptos do islamismo, Jesus
é conhecido no idioma árabe como Isa (ىسيع, transl. Isaā), Ibn Maryam (“Jesus, filho de
Maria”). Os muçulmanos tratam-no como um grande profeta e aguardam seu retorno antes
do Juízo Final. Alguns segmentos do judaísmo o consideram um profeta, outros um apóstata.
Os quatro evangelhos canónicos são a principal fonte de informação sobre Jesus.
Embora tenha pregado apenas em regiões próximas de onde nasceu, a província romana
da Judeia, sua influência difundiu-se enormemente ao longo dos séculos após a sua morte,
ajudando a delinear o rumo da civilização ocidental.
P R J E S U S A S P
R R X G J I Ç S S R
O E X B G J E S P O
F S T E R C E I R O
H S M A N I D A O F
H U M A N I D A F E
I S J E S E A G E T
K C T E R C E S T A
F I D T E R C E A M
V T D U R Y H A G F
A O U T E R C E D C
E U Q U A T R U S D
b. Relacione o episódio bíblico sobre Cristo com a Alegoria da caverna, de Platão, identificando no
episódio o que seria:
• A caverna.
• A sombra.
145
Unidade II
E – Você conhece a história de Alice no País das Maravilhas, de Lewis Carrol. Crie ilustrações adequadas
para o público infantil para o trecho da obra:
Alice faz-se de convidada duma festa de chá louco, onde estão presentes o Chapeleiro
Maluco, a Lebre de Março e o Arganaz que permanece adormecido durante uma grande parte
da festa.Todos eles desafiam Alice com enigmas lógicos, porém estes revelam uma incoerência
nas suas declarações. O Chapeleiro Maluco revela que está perpetuamente destinado a beber
chá porque o Tempo puniu-o em vingança, parando o tempo às 6 da tarde, a hora do chá. Alice
sente-se insultada e cansada de ser bombardeada com tantos enigmas e sai imediatamente,
afirmando que esta era a festa mais estúpida de chá em que já tinha ido. Entretanto encontra
uma porta num tronco de uma árvore e entra, voltando novamente para o átrio inicial. Desta
vez, abre primeiro a pequena porta, depois come um pedaço do cogumelo que estava guardado
no bolso e por fim entra apressadamente no tão desejado jardim...
O mágico de Oz
(Wizard of Oz, 1939)
Direção: Victor Fleming, Richard Thorpe, King Vidor
Roteiro: L. Frank Baum, Noel Langley
Gênero: Aventura/Fantasia/Musical
Origem: Estados Unidos
Duração: 101 minutos
Tipo: Longa-metragem
Sinopse: Após um tornado em Kansas, Dorothy vai parar com sua casa e seu cachorro
na fantástica Oz, onde as coisas são coloridas, bonitas e mágicas. Porém, o seu maior desejo
é retornar de volta para casa, para isso ele deve encontrar um mágico, que lhe mostrará
como realizar esse seu desejo. Para chegar até ele, contudo, Dorothy viverá uma aventura
inesquecível através do caminho de tijolos amarelos.
Mágico de Oz
Racionais Mc’s
Hey mano, será que ele terá uma chance, quem vive nesta porra,
merece uma arrevanche, é um dom
que você tem de viver, é um dom que você recebe pra sobreviver,
história chata, mas você tá ligado?
que é bom lembrar, que quem entrar é um em cem, pra voltar, quer
dinheiro pra vender, tem um
monte aí, tem dinheiro quer usar, tem um monte aí, tudo dentro
de casa, vira fumaça, é foda, será
que DEUS deve ta provando minha raça? só desgraça, gira em torno
daqui, falei do JB, é o que
queria fazer, rezei pra um moleque que pediu, qualquer trocado
qualquer moeda, me ajuda tio? pra
mim não faz falta, uma moeda não neguei, e não quero saber, o
que que pega se eu errei,
independente a minha parte eu fiz, tirei um sorriso ingênuo,
fiquei um terço feliz, se diz que
moleque de rua rouba, o governo, a polícia no Brasil quem não
rouba? Ele só não têm diploma pra
roubar, ele não se esconde atrás de uma farda suja, é tudo uma
questão de repercussão irmão, é
uma questão de pensar, ah, a polícia sempre dá o mau exemplo,
lava minha rua de sangue, leva o
ódio pra dentro, pra dentro, de cada canto da cidade, pra cima
dos quatro extremos da
simplicidade, a minha liberdade foi roubada, minha dignidade
violentada, que nada, os manos se
ligar, parar de se matar, amaldiçoar, levar pra longe daqui essa
porra, não quero que um filho meu
um dia DEUS me livre morra, ou um parente meu acabe com um tiro
na boca, é preciso morrer pra
DEUS ouvir minha voz, ou transformar aqui no mundo mágico de
OZ...
148
COMUNICAÇÃO E EXPRESSÃO
Figura 16
G – Espelho:
o Um espelho
o Um amigo
149
Unidade II
O que acontece?
A mão toca no espelho é a mesma que vê no espelho?
Quando joga aos espelhos e levanta a mão direita, qual é a mão que o seu amigo levanta?
Um espelho plano reflete a imagem real, embora invertida em termos de direita e esquerda.
3. “Espelho, espelho meu, existe um intelectual mais sabido do que eu?” Num primeiro nível, a
reflexão sobre o espelho será sempre um questionamento do ego sobre si mesmo. Mas o espelho nunca
responde, ou melhor, nunca discorda, ao contrário, seu silêncio eternamente cúmplice se faz íntimo das
mais desmesuradas comparações.
H – Criatividade:
1. Faça uma lista de filmes e/ou livros de ficção que imaginam o futuro da humanidade, separando-
os em duas colunas:
otimistas apocalípticos
2. Leia sobre Nabucodonosor, segundo duas fontes: a história e a Bíblia. O futuro profetizado por ele
é otimista ou apocalíptico?
História:
150
COMUNICAÇÃO E EXPRESSÃO
Nabucodonosor se orgulhava de sua Babilônia, que ele dizia ter criado por suas próprias
mãos, com a força de seu poder, para glória de sua magnificência. Mas ele se preocupava
em como seria quando ele não fosse mais o governante.
[...]
Relato bíblico:
Como todos os antigos, Nabucodonosor acreditava nos sonhos como um dos meios pelos
quais os deuses revelavam sua vontade aos homens. Segundo a Bíblia, em uma noite, Deus
decidiu revelar a Nabucodonosor o futuro em uma profecia, não só do Império da Babilônia,
mas também a história de toda a humanidade. Nabucodonosor sonhou com uma grande
estátua, a cabeça era de ouro, o peito e os braços de prata, o ventre e coxas de bronze, as
pernas de ferro e os pés eram parte de ferro e parte de barro. Enquanto admirava a estátua,
uma grande pedra veio do alto e acertou os pés da estátua que acabou sendo totalmente
destruída. Depois disso a pedra cresceu até cobrir toda a face da terra.
No dia seguinte ao pensar no sonho, o rei percebeu que não conseguia se lembrar de
nada. Não conformado com o esquecimento procurou ajuda dos sábios de sua corte. Exigiu
que eles o fizessem lembrar do sonho e também dessem a sua interpretação.
Daniel não estava presente quando os sábios foram convocados e notificados da difícil tarefa.
Se o mistério não fosse solucionado todos os sábios seriam executados. A severidade do castigo não
estava fora do tom com os costumes desses tempos. No entanto, era um passo temerário do rei
porque os homens cuja morte tinha ordenado constituíam a classe mais culta da sociedade. Daniel
pediu um tempo para buscar o auxílio de Deus e então solucionar o que parecia impossível.
Segundo a Bíblia, uma noite Deus enviou a Daniel o mesmo sonho do rei. Algum tempo
depois Daniel foi levado até Nabucodonosor. Daniel descreveu o sonho com exatidão ao rei,
contou até mesmo o que Nabucodonosor pensara antes de dormir. Nabucodonosor não tinha
nenhuma dúvida que aquele era o sonho e que Deus havia revelado essas coisas a Daniel.
3. Imagine o futuro. Como será a sociedade? Os valores éticos? A política? A natureza? Produza uma
história criativa, diferente daquelas conhecidas por você.
I – Nomes:
Saiba mais
I – Intertextualidade:
1. Logo no início do filme, Neo procura algo no livro oco intitulado Simulations and simulacra, de
Jean Baudrillard. Pelo título, indique uma hipótese para a presença do livro no filme.
2. O filme faz referência ao livro Alice no País das Maravilhas. De que forma ocorre a intertextualidade,
isto é, referência ao livro no filme, e qual é a importância do episódio para o personagem principal,
Neo.
3. O filme faz referência também à história O mágico de Oz. Qual é a frase que explicita tal referência
e em que contexto do filme ela ocorre?
1. Identifique no filme:
a. O que representa a caverna.
b. O que são as sombras.
c. Quem é a pessoa que se liberta da caverna.
d. A realidade conhecida.
152
COMUNICAÇÃO E EXPRESSÃO
3. No filme, há o discurso direto: “Os olhos doem, porque você nunca os usou.” Relacione essa fala
com o mito da caverna.
1. Uma ideia filosófica adotada no filme é “Conheça a ti mesmo”, que era colocada no templo Apolo
em Delfos. A mesma frase aparece no filme, mas em latim. Onde fica a frase?
2. Neo aprende que o intelecto (mente) é mais importante que a matéria (os sentidos). Que personagem
do filme sabe que Matrix não é real, mas quer voltar ao mundo da ilusão, ou seja, escolhe a vida
só de prazer (sensorial)?
3. Procure a música final do filme, do grupo Rage Against the Machine, e faça uma relação entre a
letra da música e o filme.
IV – A morte de Neo nos remete a dois textos: ao mito da caverna e à Bíblia, em especial, ao episódio
sobre Jesus Cristo.
1. Compare a morte de Neo com a morte da pessoa que se liberta da caverna e com a de Jesus Cristo,
comparando as semelhanças e diferenças, bem como a causa da morte.
2. Matrix foi lançado na Páscoa de 1999, em uma relação clara do filme com a Bíblia. Indique a
importância dessa data comemorativa e as implicações para o filme.
3. Identifique do filme semelhanças entre Neo e Jesus Cristo: concepção, batismo, tentação, morte e
ressurreição, ascensão corporal; cidade prometida.
4. No filme há uma placa na nave: “Mark III nº11/ Nebuchadnezzar; Made in USA; Year 2069”. Indique
a relação da placa com a Bíblia.
V – Nomes:
Neo
Morfeu
Trinity
Cypher
Existem duas categorias de conteúdo implícito, comumente utilizadas nas situações de comunicação
do nosso cotidiano: os pressupostos e os subentendidos. Ambos exigem do ouvinte/leitor o conhecimento
153
Unidade II
e o reconhecimento de alguns índices no texto, que auxiliam na tarefa de interpretação de alguns tipos
de informação.
É possível pressupor que André deixou de fumar, por intermédio do verbo “tornar-se”, que significa
“vir a ser”. Como dito anteriormente, há palavras e expressões no enunciado que indicam um sentido,
construído por uma informação pressuposta.
É fundamental detectar os pressupostos, pois eles são um recurso argumentativo que visa conduzir
o leitor a aceitar certas ideias, pois a ideia implícita não está em discussão, apresentada como se fosse
aceita por todos, e a explícita apenas contribui para confirmá-la.
• “Para que o Brasil se torne um país do primeiro mundo será preciso privatizar as empresas estatais,
abrir a economia ao ingresso de produtos estrangeiros e terminar com os direitos trabalhistas que
oneram a folha de pagamento e a Previdência Social” (Exemplo dado por Platão e Fiorin, 2001).
• existem países do primeiro mundo que se desenvolveram com base num setor estatal muito forte,
que ainda é mantido;
• há países do primeiro mundo, como o Japão, que mantêm uma economia muito protegida da
concorrência externa;
• na maioria dos países do primeiro mundo, os trabalhadores têm mais direitos que no Brasil, e as
empresas e o Estado, mais encargos com os trabalhadores.
154
COMUNICAÇÃO E EXPRESSÃO
• o Brasil não ingressará no primeiro mundo, mesmo que privatize o setor estatal, abra a economia
e acabe com os direitos trabalhistas, porque isso depende de outros fatores;
• encargos trabalhistas não são ônus, mas meio de manter a mão de obra viva.
O subentendido, por sua vez, não vem marcado por expressões linguísticas; é um processo de
construção de sentido que se organiza a partir da percepção do ouvinte/leitor. O falante pode negar
a interpretação de seu ouvinte/receptor. O subentendido é um recurso utilizado em situações de
comunicação, nas quais o sujeito não quer se comprometer com o que disse.
Existem, portanto, produções textuais que só fazem sentido se o leitor tiver a habilidade e os conhecimentos
necessários para desvendar a sua mensagem. As piadas são gêneros textuais desse tipo. Várias vezes, em uma
roda de amigos, a graça de uma piada é motivo de chacota para aqueles que “viajaram”, sem encontrar
nenhum sentido na mensagem. O problema provavelmente é não encontrar as informações implícitas.
Exemplo de aplicação
Comentário: O léxico “primeira” pressupõe: que tenho outras filhas; que não tenho filhos; que as
outras filhas nasceram depois da Julinha. O advérbio “totalmente” nos leva a pressupor que não há no
Brasil nenhum estrangeiro produtor agrícola.
2. (UNICAMP) Na tira abaixo, a lesma Flecha manifesta duas opiniões contraditórias, uma explícita e
uma implícita (isto é, subentendida).
Figura 17
155
Unidade II
b. Segundo este texto, em qual das duas opiniões Flecha realmente acredita?
c. Qual é a passagem da tira que permitiu que você chegasse a essa conclusão? Justifique.
Comentário: Flecha deixa implícita a opinião dele de que há diferença entre homem e mulher, ou
seja, ele é machista. A passagem “aliás, típica” comprova a opinião de Flecha. É típico das mulheres fazer
pergunta e, para ele, pergunta desnecessária.
Metáfora é uma figura de linguagem que altera o sentido das palavras por intermédio do acréscimo
de um significado que aproxima os termos por uma relação de semelhança. Ocorre quando duas palavras
possuem um traço de sentido semelhante. Observe como ocorre a metáfora, no trecho da poesia de
Camões, utilizado como ilustração anteriormente:
Ao definir amor por fogo ou ferida, o autor desloca o sentido da palavra amor para outro universo
de interpretação: “quente” e “dolorido” são características que justapõem amor a fogo e a ferida.
A metáfora é uma espécie de comparação, porém, sem o conectivo que a estabelece: “Amor é como
fogo“ (comparação); “amor é fogo” (metáfora).
A metáfora não está apenas no domínio da literatura, mas na linguagem cotidiana. Afinal, diz respeito
à forma como nós compreendemos e conceituamos o mundo que nos cerca. Vejamos o caso do futebol,
paixão nacional. Você tem ideia de quantas metáforas nós relacionamos ao futebol? Por exemplo, na
manchete de jornal aparece:
Nesse enunciado, o futebol é ligado à guerra, com o emprego da palavra “guerra”. Por conseguinte,
temos uma metáfora: futebol é guerra. O estudioso Oliveira (2005) fez um levantamento no jornal
Agora São Paulo das metáforas referentes ao futebol. Na verdade, são muitas metáforas e ele selecionou
apenas algumas.
Deixo para você, caro aluno, a identificação de a que campo semântico as metáforas das manchetes
e leads fazem parte:
G – Futebol é guerra.
R – Futebol é religião.
M – Futebol é morte.
N – Futebol é novela.
D – Futebol é amor.
Saiba mais
157
Unidade II
Na manchete, por exemplo, “Lucas vive lua de mel com o Timão”, temos a metáfora “futebol é
amor”, devido ao termo lua de mel. Se você prestar atenção à forma como as pessoas de forma geral,
os jornalistas, os próprios jogadores referem-se ao futebol, perceberá essas e outras metáforas criadas.
Como disse, a metáfora se encontra na nossa linguagem recorrentemente.
Vejamos outra situação. Como bem aponta Ilari (2001), algumas propriedades são associadas
convencionalmente a certos animais: a raposa costuma ser tomada como símbolo da astúcia, o touro
como símbolo da força etc. Assim, construímos linguagem metafórica no nosso dia a dia que relacionamos
essas propriedades às pessoas.
• … que é um cavalo.
• …que é um tatu.
• …que é uma cobra.
Temos uma metáfora, mas para ela ser criada pelo autor e entendida pelo interlocutor, há necessidade
de conhecimento compartilhado entre eles, uma vez que precisam saber um pouco sobre os hábitos das
galinhas sobre dormir ao anoitecer. Na nossa concepção, o horário de dormir desses bichos é muito cedo.
Outra situação de criação de metáfora no cotidiano envolve falar de certas cores e formas como um
modo de intensificar a propriedade expressa por um adjetivo. Por exemplo:
Indica uma alteração sanguínea no rosto da pessoa, mudando-lhe a cor. Por isso, atribuímos a cor
roxa, por exemplo, para essa alteração, criando, assim, mais uma metáfora.
Agora, pense nas várias maneiras como poderiam ser completadas as frases a seguir:
• … verde de…
• …branco de…
158
COMUNICAÇÃO E EXPRESSÃO
• …quadrado de…
• …seco de…
Uma das ideias mais usuais é “verde de raiva”; tão famosa, que o personagem Hulk é literalmente
transformado em um ser da cor verde, representando essa expressão tão conhecida. À cor verde,
atribuímos também a inveja.
Observação
A metonímia, por sua vez, é o processo de alteração de sentido, por meio do acréscimo de um
significado que aproxima os termos por relação de contiguidade, inclusão, implicação, interdependência
e coexistência entre dois termos.
Professor de História
Roberto Chaim
Quando eu conto
Que nesta terra
A nudez era tão natural
E que o pecado e a malícia vieram de longe,
A bordo de treze naus
Quando eu conto
que os corpos nus
Mirados pelo vento
Vestidos com a inocência
Foram violados por olhos cúpidos
Ultrajados por olhos sedentos
Quando eu conto
Que trouxeram tantos deuses
Novas crenças, todas vãs
Eu já tinha minha fé
Eu já tinha meu pajé
Eu queria trocar meu Tupã?
159
Unidade II
Quando eu conto
Que o Deus que aqui chegou
Trazido do além-mar
Viajou com o invasor?
Com certeza na primeira maré
Levou um à proa, e o outro se pôs na ré
Quando eu conto
Que tanto se fez
Em nome de uma fé
Matou-se, vestiu-se
E levou o que da terra se apanhava
Para uma desconhecida e longínqua Sé
Quando eu conto
Que para cá trouxeram a Cruz
e contaram seu significado
E sem que ficassem chocados
Cruzaram os corpos mortos e despidos
Com corpos mortos de meninos nus
Quando eu conto
Que tudo que eu conto é verdade
Ah Tupã, que impunidade!
Já não existe Tupi, Tapuia ou Timbira...
Podia ser tudo um conto
Podia ser tudo mentira
(CHAIM, 2008).
No poema, os versos:
nudez indígena
pecado e malícia europeu
Quanto à concepção religiosa e moral, uma vez que a palavra “pecado” remete ao contexto religioso
e, com base nesse contexto, cria-se uma dicotomia: inocência do povo indígena (“nudez tão natural”) x
pecado do povo europeu.
160
COMUNICAÇÃO E EXPRESSÃO
Quando eu conto
Que para cá trouxeram a Cruz
O léxico cruz torna-se uma metonímia ao implicar o Cristianismo, religião trazida à América pelos
europeus conquistadores.
A proposta é a leitura do texto seguinte, verificando dois aspectos: 1. qual é a verdadeira intenção
do autor; 2. que tipo de argumento ele usa para nos convencer de que sua ideia é correta. Cuidado, caro
aluno, porque o autor está cheio de artimanhas.
Dúvidas
André Laurentino
Existem coisas que eu não entendo. É uma frase presunçosa, logo no começo. Meu
querido André, existem coisas que nem o Stephen Hawkins entende. Qual a novidade?
A novidade é que as coisas que eu não entendo são simples e prosaicas. Eu sou simples
e prosaico; passo a vida disfarçando, mas quem acredita? Talvez a esperança seja enganar a
mim mesmo. Não dá: eu sei dos meus truques. Então, acabemos com isto (a enganação) e
com isto (a introdução). Vamos às dúvidas:
A) Futebol. Por que a barreira nunca ouve as instruções do goleiro? É ele quem orienta onde
os jogadores devem ficar, mas ninguém se importa. Viram as costas. Dá aflição ver aqueles
gritos desesperados. Parece um flanelinha estressado querendo merecer o pagamento.
B) Cinema. Quando aparece alguém digitando ou datilografando, por que os atores nunca teciam
a barra de espaço? Será que eles só escrevem palavras como “inconstitucionalissimamente”?
161
Unidade II
C) Sotaque. Por que, nos comerciais de rádio, sempre que ouvimos um nordestino
falando, nunca é um nordestino falando? Usam um paulista imitando o sotaque.
Cheguei a pensar que não existem aqui nordestinos que possam ir ao estúdio. É mais
fácil encontrar um norueguês do que um cearense. Mas meu porteiro garante que não
(ele é de Sergipe) e jura que recebe convites diários para gravar comerciais de rádio.
Mas, seu André, quem vai ficar na portaria? Tem razão. Esta dúvida, ao menos, deve
estar explicada
D) Bíblia. Gênesis, o começo de tudo. Adão e Eva têm dois filhos: Caim e Abel. Depois
de matar o irmão, Caim se casa com uma mulher. Mas que mulher é esta? A única mulher
da história até aqui era Eva. E, assim mesmo, era a sogra. Que eram os pais da nora de
Eva?
F) Telefonia. Por que se diz “chama chama e ninguém atende”? Não podia ser só um
“chama”? Olha como também funciona: “Ligou para fulano?”, ‘’Liguei, mas chama e ninguém
atende”. Hum... Então insiste mais um pouquinho: liga até chamar chamar e ninguém
atender.
G) Pronúncia. Por que se diz ‘trânzito’ se se escreve ‘trânsito’? Outra: por que se diz
‘muinto’ se se escreve ‘muito’?
H) Por que o plástico do CD tem que ser impossível de abrir? Já existe tecnologia e
maquinário para se colocar uma fitinha vermelha que rasga a embalagem. Vide qualquer
pacote de biscoito. Será que o inventor do plástico de CD nunca comeu biscoito?
(LAURENTINO, 2007)
Percebeu, caro aluno, como o texto nos leva ao engano? Ardiloso, o autor apresenta uma
série de dúvidas, que no fundo servem como argumentos, para nos distrair de sua verdadeira
intenção: “Por que chocolate engorda e rúcula não?” Publicado na época da Páscoa, momento
em que o volume de consumo de chocolate aumenta, o texto é construído com humor e com
base na argumentação.
Falar em argumentação implica considerar que saber ler e escrever nos exige muito mais do que
dominar técnicas e regras gramaticais. É necessário agir sobre o mundo e defender-se dele; reconhecer
a intencionalidade de seu texto e do texto do outro; interagir, para que a sua proposta comunicativa
seja eficaz; saber utilizar textos de informação e textos de opinião; reconhecer os tipos de argumentos
adequados para uma determinada situação de uso; reconhecer os tipos de discursos; saber elaborar
textos argumentativos.
162
COMUNICAÇÃO E EXPRESSÃO
Argumentação é um procedimento que tem por objetivo levar o indivíduo a reconhecer e aderir a
uma determinada tese ou “verdade”. Para essa finalidade, são utilizados argumentos (proposições ou
frases declarativas) para defesa de uma ideia ou ponto de vista.
Como dito no parágrafo anterior, a informação é a base de uma boa argumentação, e a opinião
transforma a informação em argumento. Vale ressaltar que opinião não significa, nesse contexto,
uma representação da visão de mundo meramente subjetiva: dizer se a cor azul é mais bonita do que
a rosa; o procedimento exige muito mais, pois implica “provar” que o seu ponto de vista sobre um
determinado tema é pertinente e passível de adesão. As condições de argumentação e os procedimentos
argumentativos nortearão o desenvolvimento de textos persuasivos.
Segundo Abreu (2001), a primeira condição de argumentação é definir uma tese e saber para que tipo
de problema essa tese é resposta. Por exemplo, um bom vendedor é aquele que identifica as necessidades
de seu público e sabe aproveitá-las como informação para o desenvolvimento de seus argumentos.
Uma segunda condição é ter uma linguagem comum com o público para quem se dirige o texto. O
uso da língua deve obedecer a níveis de formalidade, de acordo com o grau de escolaridade, formação
e especialização profissional de seu público.
A terceira condição é causar empatia, um contato positivo com o seu público, para garantir uma
receptividade positiva em relação aos seus argumentos. Veja as sugestões propostas por Abreu (2001,
39):
Nunca diga, por exemplo, que vai usar cinco minutos de alguém, se
vai precisar de vinte minutos. É preferível dizer que vai usar uma meia
hora.
Outra fonte de contato positivo com o outro é saber ouvi-lo. [...] Devemos
também aprender a ouvir como nossos olhos! A postura corporal do outro,
suas expressões faciais, a maneira como anda, gesticula e até mesmo a
maneira como se veste nos dão informações preciosas.
A quarta condição é agir de forma ética, para que a argumentação não se torne uma manipulação.
• exemplificação: busca justificar os pontos de vista exarados por meio de exemplos. São marcadores
sintáticos principalmente: mais importante que, superior a, de maior relevância que, por exemplo,
considerando, analisando os dados, pelos dados, segundo;
• explicitação: o objetivo do texto é explicar, esclarecer os pontos de vista apresentados. São seus
principais marcadores sintáticos: isto é, haja vista, quer dizer, na verdade, considera-se, denomina-
163
Unidade II
se, chama-se, segundo, consoante, do ponto de vista, no pensamento de, parece-me, a meu ver,
em meu entender;
• enumeração: o autor do texto tem em vista apresentar uma sequência de elementos que provem
a sua opinião. São seus principais marcadores sintáticos: primeiro, segundo, um, outro, por último,
sucessivamente, respectivamente, antes, depois, ainda, em seguida, então, presentemente, outrora,
atualmente, antes de, depois de, no passado, hoje, ontem, ao lado de, adiante (...);
• comparação: texto que procura, mediante comparação, provar o que é apresentado como opinião
do autor. São seus principais marcadores sintáticos: da mesma forma, tal como, tanto quanto,
assim como, igualmente, em contraste, em oposição, ao contrário, por um lado, por outro lado,
de outro lado, mais que, menos que, pior que. A comparação nem sempre é explícita; ela pode
transformar-se em metáfora.
• síntese: retomada do que já foi dito anteriormente. Por exemplo, ao defender a ideia de que
é necessária uma política de preservação do meio ambiente para garantir a sobrevivência de
gerações futuras e desenvolver argumentos que demonstrem a pertinência dessa defesa, pode-se
retomar essa ideia no final do texto argumentativo;
• dedução: com base na defesa de uma ideia, é possível deduzir uma conclusão. São utilizadas
expressões do tipo: de acordo com, logo, deduzindo etc.;
• relação de causa e consequência: as causas e as consequências relacionadas à defesa de ideia
são apontadas por expressões do tipo: por causa de; graças a; em virtude de (causa), de forma
que, de modo que, consequentemente (consequência);
• por interrogação: recurso utilizado quando se deseja gerar uma dúvida que se transforma
em tema para a reflexão; por exemplo, é possível transformar a afirmação da necessidade de
uma política para preservação do meio ambiente em um questionamento como Sem política de
preservação do meio ambiente, as gerações futuras sobreviverão?
• citação direta, parafraseada ou parodiada: recurso que traz ao texto o ponto de vista de outro,
muitas vezes uma autoridade no assunto. Esse recurso também é reconhecido como um recurso
de autoridade. Observe o exemplo citado por Andrade e Medeiros (2001, p. 168):
Dizia Oscar Wilde que nosso único dever para com a história é reescrevê-la. Estou fazendo a minha
parte...
Rabos e pelos
Os homens em sua evolução foram ganhando coisas e perdendo coisas. Algumas perdas
foram graves. Os ganhos foram poucos.
164
COMUNICAÇÃO E EXPRESSÃO
O olfato, por exemplo, foi uma perda essencial. Qualquer bicho tem faro melhor que o
nosso, se orienta por ele para procurar comida e namorada. Andam até no escuro, guiados
pelos cheiros.
Grave, também, foi a perda do focinho e o encolhimento da boca, mas teve a vantagem
de permitir que a gente abandonasse o hábito de usar a boca antiga para carregar as coisas.
Para isso, começamos a usar as mãos, que também se aperfeiçoaram com o polegar, que
permite manipulações delicadas.
A perda mais grave, a meu juízo, foi a do belo rabão dos macacos. Trocamos o rabo
pela bunda acolchoada que temos. Mau negócio. Nada nos podia ser mais útil do que
bons rabos. Com eles, nos verteríamos em primatas desbundados. A única vantagem que
trouxe foi nos dar a possibilidade de usar cadeiras para sentar, mas não seria ruim sentar
no rabo enrodilhado no chão. Pense só na beleza que seria passear, pulando de galho em
galho, com a garantia que o rabo dá para se equilibrar. Melhor, ainda, seria nas fábricas,
nas escolas, em toda parte, os seres providos de rabos teriam os pés e as mãos livres para
fazer coisas. A professora, por exemplo, ficaria controlando a turma,pendurada pelo rabo
no lustre. Em lugar das carteiras, teríamos traves, de parede a parede, onde o pessoal se
dependuraria, liberando as patas e as mãos para o trabalho. Dependurado nas traves,
você podia segurar o livro com a mão esquerda, pegar a caneta com a mão direita, usar
a pata esquerda para consultar o dicionário e, ainda, a pata direita para coçar a orelha.
Formidável, não é?
A perda mais radical foi a da posição quadrúpede, que usamos durante muitos milhões
de anos, para a posição ereta. Como quadrúpedes, púnhamos as quatro patas no chão, o
que dava muito mais solidez.
Sobre duas patas, ficamos sempre meio desequilibrados e, depois, quando se perde uma,
fica muito complicado viver e trabalhar. A consequência principal da adoção da posição
bípede foi a dor ciática, que castiga demais os velhos. É uma dor terrível no traseiro. Dizem
que é a saudade da nossa posição quadrúpede, porque, enquanto tínhamos quatro patas no
chão, as vísceras se dependuravam na espinha, postas em posição vertical.
165
Unidade II
Conforme é possível observar, os autores brincam com a questão da evolução humana, elaborando,
a partir da posição do humano no topo da cadeia evolutiva, a falsa questão: “Você acha que valeu a
pena?”
Sem ignorar o tom de humor com que é tomada a questão pelos autores, verificamos que o
texto é argumentativo e a opinião dos autores sobre o assunto é explicitada logo no primeiro
parágrafo: ao caracterizar as perdas, comparadas aos ganhos, como as mais graves já fazem uma
avaliação.
Empregam o termo argumentativo “por exemplo” e explanam sobre a importância de ter olfato no
sentido de faro, que leva o animal a detectar um cheiro à longa distância. O humano não tem mais esse
olfato/faro, significando grande perda.
Convém lembrar que nem todos os argumentos têm a mesma veemência, sendo necessário distribuí-
los gradativamente no discurso. Podemos optar por uma de três soluções: por ordem decrescente, por
ordem crescente ou abrir e fechar o texto com os argumentos mais fortes. No caso do texto de Ribeiro e
Ziraldo, os autores expõem os exemplos argumentativos por ordem de importância crescente. Os outros
exemplos são:
Nesse argumento, a perda é reforçada pelo uso do adjetivo lamentável no grau superlativo.
A perda mais grave, a meu juízo, foi a do belo rabão dos macacos.
Para os autores, o rabo constitui-se como um órgão muito útil. Os autores, por conseguinte,
exemplificam as várias utilidades do rabo para o humano.
A perda mais radical foi a da posição quadrúpede, que usamos durante muitos milhões de anos, para
a posição ereta.
A justificativa dos autores é o equilíbrio perdido; afinal, andar sobre duas patas causa desequilíbrio
e dor ciática.
166
COMUNICAÇÃO E EXPRESSÃO
No texto, os argumentos vêm acompanhados de termos da língua que são opinativos. A cada perda,
um termo reforçador da opinião:
radical
mais grave
lamentabilíssima
grave
perda essencial
O texto argumentativo é estruturado e suas partes são organizadas segundo a função de cada uma
delas no texto:
Uma das dificuldades que temos ao escrever um texto argumentativo, mas que envolve outros
tipos textuais também, é dar início a ele. Como fazer nosso leitor aderir às nossas ideias, concepções,
pontos de vista, se não dermos uma introdução, no mínimo, adequada, quem sabe até interessante, um
verdadeiro chamariz? Pensando nessa dificuldade, apresento as dezoito formas para começar um texto,
seguindo as propostas de Viana (1998):
Listamos aqui dezoito formas de começar um texto. Elas vão das mais
simples as mais complexas.
167
Unidade II
Ao dizer que há duas convicções errôneas, fica logo clara a direção que o
parágrafo vai tomar. O autor terá de explicitá-lo na frase seguinte.
As duas primeiras frases criam uma oposição (de um lado / de outro) que
estabelecerá o rumo da argumentação. Também se pode criar uma oposição
dentro da frase, como neste exemplo:
“As pessoas chegam ao ponto de uma criança morrer e os pais não chorarem
mais, trazerem a criança, jogarem num bolo de mortos, virarem as costas e
irem embora”. O comentário do fotógrafo Sebastião Salgado, falando sobre
o que viu em Ruanda, é um acicate no estado de letargia ética que domina
algumas nações do Primeiro Mundo.
Para Marx a religião é o ópio do povo. Raymond Aron deu o troco: o marxismo
é o ópio dos intelectuais. Mas nos Estados Unidos o ópio do povo é mesmo
ir às compras. Como as modas americanas são contagiosas, é bom ver de
que se trata.
Esse recurso deve ser usado quando não sabemos textualmente a citação. É
melhor citar de forma indireta que de forma errada .
O corriqueiro adágio de que o pior cego é o que não quer ver se aplica com
perfeição na análise sobre o atual estágio da mídia: desconhecer ou tentar
ignorar os incríveis avanços tecnológicos de nossos dias, e supor que eles não
terão reflexos profundos no futuro dos jornais é simplesmente impossível.
Sempre que você usar esse recurso, não escreva o provérbio simplesmente.
Faça um comentário sobre ele para quebrar a ideia de lugar-comum que
todos eles trazem. No exemplo acima, o autor diz “o corriqueiro adágio”
e assim demonstra que está consciente de que está partindo de algo por
demais conhecido.
Você pode começar narrando um fato para ilustrar o tema. Veja que a
coesão do parágrafo seguinte se faz de forma fácil; a palavra tem a retoma
a questão que vai ser discutida.
15. Uma sequência de frases nominais (frases sem verbo) (tema: a impunidade
no Brasil)
Mas o que significa, afinal, esta palavra, que virou bandeira da juventude?
Com certeza não é algo que se refira somente à política ou às grandes
decisões do Brasil e do mundo. Segundo Tarcísio Padilha, ética é um estudo
filosófico da ação e da conduta humanas cujos valores provêm da própria
natureza do homem e se adaptam às mudanças da história e da sociedade.
As partes de um texto argumentativo podem ser reconhecidas nos exemplos de artigo, editorial,
crônica, entre outros textos que circulam em nosso meio social.
Artigo de opinião é um gênero textual como são gêneros textuais receita, poema, conversação,
debate, entre tantos outros existentes na nossa sociedade. Os gêneros podem ser orais (falados, tais
como a conversação e o debate) ou escritos (receitas, poemas, romance etc.).
No caso do gênero textual artigo de opinião, a sua função é convencer o leitor de uma determinada
ideia, influenciá-lo, transformar os valores do leitor por meio de um processo de argumentação a favor
172
COMUNICAÇÃO E EXPRESSÃO
da opinião do produtor. Tal tipo de gênero envolve operação constante de sustentação das afirmações
realizadas pelo produtor sobre o assunto, bem como apresentação de dados consistentes, que possam
convencer o leitor.
É fundamental o produtor do texto colocar-se no lugar do outro – do seu leitor. Como o artigo
de opinião baseia-se no que pensa o autor sobre um assunto, e como o autor se serve do texto para
apresentar argumentos que convençam o leitor de que seu posicionamento é o mais adequado, o mais
favorável etc., o produtor, ao se colocar no lugar do leitor, tem condição de antecipar as opiniões do
leitor e refutá-las no artigo de opinião. Dessa forma, o produtor constrói seu texto conduzindo o leitor
a fim de influenciá-lo e de transformar sua opinião, seus valores.
Artigo publicado no jornal O Estado de São Paulo pede que governo e setor
privado apoiem projetos comunitários que tentam conter ingresso de adolescentes
no tráfico
Marie-Pierre Poirier
173
Unidade II
Mas, além de refletir sobre a lógica econômica que está por trás da violência contra essas
crianças, temos de dar atenção ao recorte racial dos assassinatos de crianças e adolescentes
nas grandes cidades brasileiras. O documentário expõe contundentemente uma das mais
graves violências sofridas por crianças e adolescentes negros moradores das áreas pobres
e periféricas dos centros urbanos. Dos 17 adolescentes do documentário, apenas um
sobreviveu. Todos eram afrodescendentes. O documentário sinaliza para o crime e para a
morte, mas sinaliza também para o preconceito. Expõe a forma violenta como crianças pretas
e pardas estão morrendo nas cidades. Seria este um dos temas centrais a ser destacado na
Conferência Regional das Américas, a ser realizada em julho, que deverá avaliar, após cinco
anos, os avanços ocorridos nas Américas no combate ao racismo, à discriminação racial, à
xenofobia e a intolerâncias correlatas?
cidadãos, qualquer criança negra e pobre que caminha pela rua se constitua em ameaça e
em símbolo de violência. É este mesmo medo, gerador de discriminação e preconceitos, que
serve para legitimar táticas de “guerra” e de “combate” ao crime que não fazem diferença
entre moradores e criminosos e já levaram à morte um número enorme de crianças – quase
sempre negras – que brincavam na porta de suas casas.
Como começar a reverter esta situação sem atuar exclusivamente sobre os sintomas?
A ideia é intervir antes da chamada “idade da morte”. Estudos do Unicef revelam que
entre os 11 e os 14 anos de idade crianças e adolescentes vivem o seu período de maior
vulnerabilidade. É nessa fase que são registrados os maiores índices de evasão escolar, de
ingresso nas redes de trabalho infantil, de uso de drogas, de exploração sexual, de abandono
da casa e de ingresso no tráfico de drogas. Trata-se de uma idade que deve ser percebida
como uma “janela de oportunidades” para programas e projetos de prevenção e redução dos
homicídios, que têm maior incidência entre os 15 e os 19 anos.
Já faz 20 anos que o Brasil convive com assassinatos de crianças nos grandes centros
urbanos. No ano passado, o Unicef ajudou o governo brasileiro a organizar, em São Paulo,
uma consulta nacional sobre a violência contra a criança, que faz parte do Estudo Global que
será lançado pela ONU em outubro. Além disso, assim como muitas outras organizações e
agências, temos acompanhado e apoiado projetos comunitários que reconhecem esses fatos
e tentam conter o ingresso de adolescentes no tráfico, mas também resgatar aqueles que
já ingressaram. São projetos que fazem dos adolescentes os protagonistas da reconstrução
de sua própria identidade.
(POIRER, 2006)
• Uso da primeira pessoa do plural: “No domingo, 19 de março, os jovens personagens que havíamos
conhecido no filme Cidade de Deus”; “os gritos de socorro dos falcões continuam a reverberar em
nossa consciência”.
A autora recorre a verbos e pronomes colocados na primeira pessoa do plural (nós). Essa recorrência
demonstra que não há impessoalidade da terceira pessoa (se havia; sua etc.), mas também não é o
texto totalmente pessoal (eu havia conhecido; minha consciência etc.). A recorrência da primeira
pessoa do plural leva a inclusão de outros no discurso, uma vez que a responsabilidade é de todos
nós brasileiros.
• Uso do presente do indicativo na apresentação das questões (dois aspectos/ ideias a serem
defendidos). No caso do texto exemplificado, são duas: 1. “as crianças e as famílias moradoras
das favelas ou de bairros periféricos das metrópoles brasileiras vivem expostas cotidianamente
a situações de alta violência”; 2. “temos de dar atenção ao recorte racial dos assassinatos de
crianças e adolescentes nas grandes cidades brasileiras.”
O tempo presente é fundamental no texto, porque é indicador de que a situação apontada no texto
é atual, vivida hoje.
O uso do tempo presente no argumento confirma o índice alto de violência sofrida pelos jovens
brasileiros na atualidade.
• Presença de citação de textos alheios: Falcão - Meninos do Tráfico; Souza; Silva, 2002; Dowdney,
2003; Núcleo de Estudos da Violência, da USP.
A autora não faz citação direta no seu texto, ou seja, ela não copia trechos do documentário Falcão
nem da obras citadas (Souza, Dowdney, Núcleo de Estudos da Violência), mas utiliza informações destes
textos. Esse recurso chama-se intertextualidade e confere ao texto de Poirier credibilidade. As menções
aos outros textos ajudam na argumentação apresentada pela produtora.
A expressão “além disso” é uma demonstração de que há um argumento anterior à expressão e que
vem outro posteriormente a ela. Há, no mínimo, dois argumentos para provar a opinião da autora.
Além desses recursos linguísticos, destaca-se um outro no texto devido à constante recorrência.
Temos então:
176
COMUNICAÇÃO E EXPRESSÃO
Tal recurso pode aparecer como recursos de persuasão, para enfatizar determinadas ideias. No texto,
então, a autora utiliza construção frasal interrogativa a fim de envolver o leitor e levá-lo a pensar como
ela.
• Apresentação da tese: na opinião da autora, há dois aspectos da realidade brasileira que precisam
ser analisadas: brasileiros jovens vivem sob violência por serem pobres e brasileiros jovens morrem
cedo devido ao racismo. Enfim, o fator econômico e o fator xenofóbico causam violência e
morte.
• Apresentação de argumentos no que se refere à sua maior ou menor força locucional.
No caso do texto exemplificado, os argumentos partem da maior força para menor força.
Vejamos:
– crescimento de 417% de homicídios de adolescentes brasileiros de 15 a 19 anos, desde 1980
(argumento com maior força locucional);
– em 2002 foram assassinados no Brasil 7.961 meninos e meninas (argumento com maior força
locucional);
– estudos revelam que entre os 11 e os 14 anos de idade crianças e adolescentes vivem o seu período
de maior vulnerabilidade quanto à violência (argumento com menor força locucional);
– adolescentes são ajudados por organizações a se posicionar melhor tanto ante as dores e os
preconceitos que sofrem (argumento com menor força locucional).
No texto opinativo, a autora recorre primeiro aos argumentos mais fortes e por isso mais convincentes
para provar que sua opinião é adequada. No entanto, ela poderia começar pelo argumento mais fraco e
fazer o processo oposto: do mais fraco para o mais forte.
Lembrete
A seguir mais dois exemplos de artigo de opinião, sobre o mesmo assunto: os resultados de exames
do ENEM (Exame Nacional do Ensino Médio) e do PISA (teste da Organização para Cooperação e
Desenvolvimento Econômico, OCDE, sobre desempenho escolar em 32 países) a que foram submetidos
177
Unidade II
os estudantes brasileiros em 2001. O primeiro texto “O provão dos provões” foi publicado na Folha de
S. Paulo em 06/12/2001 e o segundo texto “Últimos lugares” foi publicado no Jornal do Commercio
(Pernambuco) em 27/12/2001.
Clóvis Rossi
São Paulo – Já fazia algum tempo que eu vinha assuntando a educação no Brasil para
tentar entender o desempenho do governo Fernando Henrique Cardoso nessa área vital.
Conversa aqui, conversa dali, lê aqui, lê ali, inclinava-me provisoriamente por ver, como é
quase uma regra na gestão FHC, o copo meio vazio, meio cheio, conforme o ponto de vista
de cada qual.
Do meu ponto de vista, necessariamente vazio, não por má vontade, ao contrário do que
supõem o governo e seus áulicos, mas porque o nível de expectativa que tinha antes de o
governo começar era muito alto.
Logo, o mínimo que esperava era que o governo ficasse muito perto de encher o copo
nessa área. Não ficou, do que dá prova o mais recente resultado do Enem (Exame Nacional
do Ensino Médio).
A pior notícia, no entanto, está contida no fato de que o Brasil foi o último colocado num
certo Pisa (Programa Internacional de Avaliação de Alunos), que mediu o entendimento de
textos por parte de alunos de 32 países, os 29 da OCDE (Organização para a Cooperação e
Desenvolvimento Econômico), supostamente os mais industrializados do planeta, mais o
Brasil, a Letônia e a Rússia.
Cabe, é claro, um desconto: com uma ou outra exceção, são todos países desenvolvidos,
com uma história antiga de qualidade educacional. Mesmo assim, daria, em tese, para
competir pelo menos com República Tcheca, Polônia, Grécia, Portugal, Rússia, Letônia e
México.
(ROSSI, 2006)
178
COMUNICAÇÃO E EXPRESSÃO
Do ponto de vista das marcas linguísticas, o texto acima de Clóvis Rossi constitui-se de:
• Uso de primeira pessoa do singular: “Já fazia algum tempo que eu vinha assuntando a educação
no Brasil”; “inclinava-me provisoriamente”; “Do meu ponto de vista...”.
Apesar da organização de artigo de opinião se dar quase sempre em terceira pessoa, por marcar uma
impessoalidade e objetividade ao texto, nós encontramos variações quanto a essa organização. No texto
de Poirier, encontramos a primeira pessoa do plural; no texto acima, de Rossi, temos a primeira pessoa
do singular; um “eu” claramente marcado no artigo de opinião por meio de verbo, pronome pessoal (eu,
me) e pronome possessivo (meu).
O autor é conhecido pela irreverência com que escreve ao romper o aspecto formal dos gêneros
textuais. Confirmamos tal afirmação pelo uso da primeira pessoa e pela informalidade na língua em
alguns do texto: emprego de termos como: “do meu ponto de vista”, “o copo meio vazio, meio cheio”,
“o diabo”.
• uso do pretérito em uma explicação ou apresentação de dados: “Já fazia algum tempo que eu
vinha assuntando a educação no Brasil”; “o nível de expectativa que tinha antes de o governo
começar era muito alto”.
O emprego do pretérito marca bastante o artigo de opinião de Clóvis Rossi. Por meio desse tempo
verbal, o produtor aponta:
• suas considerações anteriores ao texto sobre o governo: “... esperava era que o governo ficasse
muito perto de encher o copo nessa área [educação]”;
• trata da reação governamental sobre o resultado do PISA: “Paulo Renato Souza, que disse que os
resultados poderiam ser piores.”;
• e indica o próprio resultado dos testes: “o Brasil foi o último colocado num certo Pisa”;
• presença de citações de palavras alheias: “Conversa aqui, conversa dali, lê aqui, lê ali”; “supõem
o governo e seus áulicos”; “prova o mais recente resultado do Enem”; “Paulo Renato Souza, que
disse que os resultados poderiam ser piores”.
O produtor constrói o artigo de opinião com base em textos mencionados ou relatados. Nos parágrafos
1 e 2, o autor faz alusão a artigos anteriores, em que mostrava seu descontentamento com o desempenho
do governo na área da educação. No parágrafo 3, o autor faz alusão ao resultado do ENEM, publicado na
mídia. Por fim, temos o relato de um fragmento do discurso do Ministro da Educação na época.
• Articulação coesiva por operadores argumentativos: “conforme o ponto de vista de cada um”;
“Logo, o mínimo que esperava...”; “mesmo assim, daria, em tese...”.
179
Unidade II
para mostrar que o autor tinha determinada consideração sobre o governo e que esperava resultado
positivo devido justamente a essa opinião.
• Apresentação da tese (opinião do autor): posição crítica do autor sobre o desempenho do governo
na área da educação.
• Apresentação dos argumentos: no caso, o autor apresenta os argumentos em uma ordem
que vai dos menos para os mais fortes. O autor, para sustentar sua opinião sobre a atuação
desfavorável em relação à educação, apresenta o resultado dos testes do ENEM e do PISA
(argumento mais fraco) e apresenta o discurso conformista do Ministro da Educação
(argumento mais forte).
• Apresentação de contra-argumentos: “Do meu ponto de vista, necessariamente vazio, não por má
vontade (...) mas porque o nível de expectativa que tinha antes de o governo começar era muito
alto.”; “Cabe, é claro, um desconto: com uma ou outra exceção, são todos países desenvolvidos,
com uma história antiga de qualidade educacional. Mesmo assim, daria, em tese, para competir
pelo menos com República Tcheca, Polônia, Grécia, Portugal, Rússia, Letônia e México.” São
construções para responder às possíveis objeções do leitor.
Últimos lugares
Luciano Marinho
Um fato? Uma realidade? Um sintoma gravíssimo, que não deveria passar despercebido
por aqueles que fazemos educação neste país. Um sintoma gravíssimo, até porque demonstra
uma problemática conjuntural, e não apenas individual. Muito provavelmente, esse fato
não tem a ver com deficiências emocionais ou cognitivas.
Não obstante, tais resultados exigem uma reflexão emergencial, não só de natureza
pedagógica (metodológica e técnicas de aprendizagem) mas também ético-institucional.
No artigo de opinião “Últimos lugares”, o leitor depara-se com as seguintes ocorrências da língua:
• Existe somente uma marca de pessoa no texto: “Um sintoma gravíssimo, que não deveria passar
despercebido por aqueles que fazemos educação neste país.”
Quando o autor se coloca como educador, marca uma única vez a pessoa (nós, primeira pessoa do
plural). Assim, embora defenda sua opinião, o texto é impessoal.
• Uso do presente do indicativo no decorrer do texto. Exemplos: “tais resultados exigem uma reflexão
emergencial”; “é obvio, pois, que a certeza da aprovação implica desinteresse...”.
O motivo temático e os argumentos são atuais à produção do texto, por isso a recorrência do uso
presente no texto.
181
Unidade II
O autor apresenta uma série de termos entre aspas, que indicam distanciamento do produtor do
texto, e o produtor pode expressar um julgamento sobre o caráter apropriado das palavras entre aspas,
ou as aspas indicam que os termos pertencem a outros discursos. O autor recorre a outros textos: dos
responsáveis oficiais pela educação que implantaram o sistema de “promoção automática”, de alguns
professores que defendem a “ludicidade” na sala de aula; de alguns jovens, cuja opção profissional é
desvalorizada.
• Articulação coesiva por operadores argumentativos: “até porque”, “Não obstante”, “não só...
mas também”, “Pois, somente um estudo sistemático e responsável, sério e acumulativo, é que
transformaria toda essa frustrante condição de incompetência.”
• Apresentação dos argumentos: o texto apresenta uma série de argumentos para mostrar que o
fracasso no exame não é um problema apenas individual.
Com base na apresentação sobre artigo científico, a qual serve para aumentar o nosso conhecimento
em relação a esse gênero textual, mostraremos as etapas para produção de artigo científico.
Exemplo de aplicação
O segundo passo é conscientizar-se, caro aluno, sobre alguns fatores contextuais. Antes de iniciar
seu texto, reflita sobre:
• Quem será o seu interlocutor ao qual o texto será destinado? (É um especialista no assunto? É
leigo? É um grupo estudantil do Ensino Médio? Dependendo do interlocutor (leitor), todo o contexto
precisa ser adaptado: linguagem mais formal ou menos formal, aprofundamento ou não no assunto
etc.).
• Qual é a finalidade para a produção do texto? (Que objetivo você tem ao escrever o texto: ensinar,
esclarecer, impor seu ponto de vista...?).
• Em que suporte será divulgado o texto? (Site, revista ou jornal de bairro, jornal com maior
circulação estadual, mural...).
Quarto passo trata-se da produção do texto. Para tal, pode voltar às dicas de como iniciar um texto,
apresentado na seção anterior. Siga a ordem escolhida para expor os argumentos: dos mais fortes para
os mais fracos ou vice-versa.
Depois da produção, leia o texto e verifique as possíveis correções em relação à gramática, às ideias,
se estão coerentes, se há uma conclusão.
Quinto passo consiste em maior consciência sobre a própria produção. Faça uma análise do texto:
183
Unidade II
8.2 Resenha
Artigo científico e resenha são gêneros textuais diferentes entre si e, quando são publicados,
aparecem em seção distinta nos periódicos acadêmicos e publicações em geral. Na revista Língua
Portuguesa, por exemplo, da edição nº 64, de fevereiro de 2011, encontramos no sumário os seguintes
títulos:
15 Pílulas
16 Ensino
18 Técnica
25 Estilo
26 Retórica
...
63 Cinema
64 Berço da palavra
65 Plano de aula
66 Figura
O texto da página 63 é uma resenha sobre cinema. Geralmente, a resenha é disposta no final da
publicação, seja de revista científica, seja de revista menos específica. Mais um exemplo de sumário (que
informa o número da página em que inicia o texto, o título do texto e o autor). Dessa vez é da revista
Estudos urbanos e regionais, uma publicação da associação nacional de pós-graduação e pesquisa em
planejamento urbano e regional.
ARTIGOS
184
COMUNICAÇÃO E EXPRESSÃO
RESENHAS
No sumário acima exemplificado, fica explícita a separação entre os artigos científicos e a resenha.
Tal distinção deve-se à diferença funcional: o artigo científico baseia-se em teoria e dados comprováveis
e a resenha é um resumo com opinião, sem base teórica.
Para corroborar, temos outro exemplo de sumário em que a resenha é apresentada no final (do
sumário), distante de outros textos “mais sérios”, como reportagem. No caso abaixo, verificamos
que a resenha aparece em seção que dá opinião sobre evento cultural, em especial na seção “Arte e
Espetáculo”.
Seções
VEJA.com
Carta ao Leitor
Entrevista José Serra
Lya Luft
Leitor
Blogosfera
Panorama
Imagem da Semana
Datas
Holofote
SobeDesce
Conversa com Monique Evans
Números
Radar
Veja Essa
Brasil
Eleições Delegado confirma tentativa de espionagem contra tucanos
Governo A irresponsabilidade fiscal
185
Unidade II
Internacional
Estados Unidos Vazamento de óleo domina a política
Geral
Especial ”Cala boca Galvão”: um fenômeno planetário
Copa 2010 A seleção isolada do país
Vuvuzela: risco para os ouvidos
Jabulani: o teste da bola
O futebol se concentra na Europa
Memória José Saramago
Gente
Medicina Os avanços contra o câncer
Beleza As brasileiras estão maiores e cheias de curvas
Plástica: como passar dos 60 anos ainda bela
Educação Aulas cronometradas
Negócios Barras de ouro vendidas em máquinas
Comportamento Uberaba: a cidade do espiritismo
Arquitetura As obras espetaculares de Santiago Calatrava
Guia
Viagem Medidas que agilizam o embarque
Como cuidar da saúde em voos de longa duração
A resenha é um texto presente em diversos suportes, tais como revista, jornal, internet, e sua temática
volta-se para objetos culturais: filmes, shows, livros, entre outras manifestações.
O autor seleciona informações e as sintetiza, ampliando o texto com comentários e avaliações sobre
o assunto, considerando o contexto imediato. Sobre a função desse gênero, contamos com explicação
de Goldstein, Louzada e Ivamoto (2009, p.113):
Solidão na cidade
Em Quanto dura o amor?, diretor recorre a roteiro multitrama para amarrar diversos
estilos de vida
186
COMUNICAÇÃO E EXPRESSÃO
Sérgio Rizzo*
Curiosamente, o título original do projeto – que faz referência ao prédio onde vive a
protagonista – ainda se mantém em um dos sites sobre o longa na internet. O tal condomínio
fictício ocupou, nas filmagens, um dos pontos mais simbólicos de São Paulo, a esquina da
avenida Paulista com a rua da Consolação.
Uma jovem do interior (Silvia Lourenço) se instala ali para tentar a sorte como atriz. A
advogada com quem divide o apartamento (Maria Clara Spinelli) e uma cantora que faz
sucessos em clubes noturnos (Danni Carlos) representam para ela dois modos bem distintos
de viver na cidade grande e de lidar com a solidão. O tema entrelaça outros personagens no
roteiro multitrama do diretor Roberto Moreira (Contra Todos) e de Anna Muylaert (diretora
de Durval Discos e É Proibido Fumar).
O mais frágil de todos talvez seja um outro morador do condomínio, Jay (Fábio Herford),
que se apaixona por uma prostituta (Leilah Moreno). Ele é caracterizado no filme como
“escritor de um livro só”: alguém que despontou como um talento, ao publicar sua primeira
obra, mas que jamais confirmou essa expectativa, frustração especialmente dolorosa para
o próprio sujeito.
QUANTO DURA O AMOR? - Brasil, 2009, 83 min. Direção: Roberto Moreira. Roteiro:
Moreira e Anna Muylaert, baseado em argumento de Silvia Lourenço e Geórgia Costa Araújo.
Com Silvia Lourenço, Danni Carlos, Paulo Vilhena, Maria Clara Spinelli, Gustavo Machado,
Fábio Herford, Leilah Moreno. Distribuição em DVD: Europa.
No texto, verificamos trechos que são resumo do filme e trechos que são comentários. Exemplos:
187
Unidade II
• Uma jovem do interior (Silvia Lourenço) se instala ali para tentar a sorte como atriz. (é um trecho
constituído de resumo)
• O mais frágil de todos talvez seja um outro morador do condomínio... (trecho constituído de
comentário).
Steven Johnson
188
COMUNICAÇÃO E EXPRESSÃO
Uma das teses interessantes levantadas no livro é sobre como esses sistemas
aprendem. As cidades aprendem, o corpo humano aprende, as formigas aprendem,
sempre a partir da interação com vizinhos, por meio de feedbacks positivos e negativos,
que determinam as modificações e adaptações no sistema. Mas, “a web também está
aprendendo?”, pergunta Johnson. Existe a chance das grandes redes de computadores
189
Unidade II
O mundo da programação está se tornando cada vez mais darwinista e menos criacionista.
Se antes a boa programação era aquela em que havia total controle do autor, hoje avança
uma forma mais oblíqua, na qual os desenvolvedores fazem o programa amadurecer, um
resgate dos conceitos da seleção natural. Nos jogos baseados em inteligência emergente,
programar as regras faz parte do jogo e tomará um tempo considerável do jogador. Nesse
momento o autor arrisca prever algumas mudanças de comportamento resultantes do
convívio com o novo paradigma. Para ele, crianças familiarizadas com jogos emergentes
podem se tornar mais tolerantes com a fase exploratória que precede o jogo em si, e na qual
nem os objetivos nem as regras ainda estão claros.
Na terceira e última parte do livro estão algumas questões sobre o futuro da emergência
artificial. O que acontecerá quando as experiências em mídia e os movimentos políticos
forem delineados por forças bottom-up e não top-down? A emergência segue na direção
de melhorar cada vez mais aplicações de software capazes de desenvolver uma teoria sobre
nossas mentes. Os programas que fazem um levantamento dos nossos gostos e interesses
são o começo de um mundo em que poderemos interagir mais regularmente com a mídia,
pois o software reconhecerá nossos hábitos, antecipará nossas necessidades e se adaptará
às nossas mudanças de humor. O software, assim como o cérebro, será capaz de reconstruir
estados mentais, quase leitores de mentes.
No capítulo final, fica clara a visão otimista de Jonhson e sua crença em um mundo
onde a lógica bottom-up se espalha por todos os cantos. Algo que parece questionável pois
se os sistemas emergentes estão presentes na lógica de desenvolvimento das cidades, com
a eficiência para organizar e estruturar a vida dos homens no caos urbano, porque essas
cidades nunca abandonaram as formas top-down de organização? A conclusão do livro,
entretanto, é de que a emergência está se expandindo pouco a pouco para ocupar várias,
senão todas, as instâncias das nossas vidas. A propaganda, o trabalho e a política ganham
outra face influenciados pelo modo bottom-up.
(MARIUSO, 2005)
190
COMUNICAÇÃO E EXPRESSÃO
Exemplo de aplicação
Considerando seu curso em andamento, caro aluno, escolha uma obra e faça uma resenha. Pode
ser tanto uma obra a cuja opinião você seja favorável, ou uma obra que você rejeitou. Faça um breve
resumo da obra e intercale comentários.
Não se esqueça de que em seu texto, há necessidade de informar o livro lido e o autor.
Em linhas gerais, podemos dizer que a divulgação científica opera uma espécie de tradução do
jargão científico. O jornalista tem a função de escrever sobre uma descoberta científica recente de tal
forma que seja acessível à população em geral.
A seguir um exemplo de divulgação científica:
191
Unidade II
Bolo e suco de cascas de maçã, torta fria e pizza colorida de legumes. De quebra,
pão integral de talos e cascas de banana à milanesa. Eis algumas receitas baratas
e nutritivas que podem ajudar a combater o desperdício e a fome no Brasil. É o
que afirma a mestre da UFSC, professora Maria Benedita da Silva Prim, 40 anos,
responsável por pesquisa que é literalmente um prato cheio para o programa “Fome
Zero” de Lula.
Dentro da central estudada, Benedita teve ainda acesso às “notas vermelhas” de outras
fontes de abastecimento de Santa Catarina. Somando o desperdício de beterraba, cenoura
e couve-flor das centrais de Blumenau, Tubarão e São José, a perda revelada foi de 15
toneladas por ano, o equivalente a R$ 4 milhões.
O retrato do desperdício fica mais palpável quando Benedita coloca na ponta do lápis
quantas cestas básicas poderiam ter sido compradas com o dinheiro jogado fora na zona
rural, comercial e pelo Ceasa de São José. Levando em consideração valores de 2001, o
192
COMUNICAÇÃO E EXPRESSÃO
cálculo revelou que se a quantia fosse gasta em comida, cerca de 542 mil carentes teriam a
chance de levar para a casa 86 mil cestas. Os alimentos seriam suficientes para garantir as
refeições durante um ano.
Junto aos alunos descobriu as diferentes vantagens dos dois “erres” – reduzir e
reaproveitar – como ela mesma faz questão de expressar. “A mídia dá muita ênfase para a
reciclagem, que é o terceiro ‘r`. Mas ninguém fala que esse processo é caro, envolve gasto
de energia, e de água. É por isso que os restos orgânicos devem ter preferência”, observa
a professora.
193
Unidade II
O texto permite, então, que o leitor não especialista obtenha informação sobre o tema. Um dos
recursos para a aproximação com o leitor é a explicação de termos no decorrer do texto.
Exemplo de aplicação
• autoria;
• pesquisa recente divulgada;
• responsável ou responsáveis pela pesquisa;
• relevância para o público em geral;
• exemplo de linguagem que é próxima do leitor
Resumo
194
COMUNICAÇÃO E EXPRESSÃO
Exercícios
1. O quadro O grito, datado de 1893 e reproduzido abaixo, é uma pintura de autoria do norueguês
Edvard Munch. Trata-se de uma das obras mais importantes do Expressionismo, movimento artístico
de vanguarda do início do século XX. Os artistas expressionistas não procuravam retratar a realidade
fielmente, mas projetar, na obra, a sua subjetividade, mostrando, assim, a realidade modificada pelo seu
psiquismo.
Figura 18
195
Unidade II
Por ter se tornado muito famoso, O grito serviu de inspiração para muitas outras produções, como a
ilustrada a seguir, com o personagem Homer, do desenho animado Os Simpsons.
Figura 19
Resposta: B.
I. Afirmativa verdadeira.
Justificativa. O personagem do quadro revela angústia e desespero, como se pode perceber no seu
gesto e na sua expressão.
196
COMUNICAÇÃO E EXPRESSÃO
Figura 20
A) Somente I.
B) Somente I e II.
C) Somente II e III.
D) Somente I e III.
E) Todas as afirmativas.
Figura 2
Imagem extraída de: BRASIL. Banco Central do Brasil. Conhecendo a nota de 10 Reais: dicas e
passatempos para você conhecer nosso dinheiro de verdade! Disponível em: <http://www.bcb.gov.
br/Pre/PEF/PORT/publicacoes_cartilha10reais.pdf>. Acesso em: 22 jun. 2011.
Figura 3
Figura 4 e Figura 5
Figura 7
CHAMBERS, E. Anatomic chart from Cyclopaedia. 1728. Formato: JPEG. Disponível em: <http://images.
library.wisc.edu/HistSciTech/EFacs/Cyclopaedia/Cyclopaedia01/M/0132.jpg>. Acesso em: 22 jun. 2011.
Figura 8
Figura 9
Figura 10
Figura 11
198
Figura 12
Figura 13
Figura 14
Figura 15
Figura 16
Figura 17
VERÍSSIMO, L. F. As cobras.
Figura 18
MUNCH, E. The scream. 1893. 1 original de arte, caseína/crayon encerado e tempera sobre papel
(cartão). Disponível em: <http://www.ibiblio.org/wm/paint/auth/munch/munch.scream.jpg>. Acesso
em: 22 jun. 2011.
Figura 19
Figura 20
Disponível em <http://www.google.com.br/imgres?imgurl=http://bp0.blogger.com/_hzYIkj5NGyU/
RnLztJfsdaI/AAAAAAAACV4/BujQKGUW0Xk/s400/jean156.jpg&imgrefurl=http://professormedeiros.
blogspot.com>. Acesso em 02 jul.2011.
199
REFERÊNCIAS
Audiovisuais
ABUJAMRA, A. Espinho na roseira/Drumonda. In: KARNAK. Karnak. Tinitus: c1995. 1 CD. Faixa 7.
BUARQUE, C. Doze anos: Chico Buarque. In: BUARQUE, C. Ópera do malandro. Polygram, c1997. 1 CD.
Faixa 6.
BUARQUE, C.; GIL, G. Cálice. Intérpretes: Chico Buarque, Milton Nascimento. In: BUARQUE, C. Chico
Buarque. Polygram/Philips, c1978. 1 CD. Faixa 2.
FACE DA MORTE. Televisão. In: FACE DA MORTE. O crime do raciocínio. 1999. 1 CD. Faixa 3.
GUARABYRA, G.; SÁ; L. C. Sobradinho. In: No sertão: viola e cordas. Kuarup Discos, c1998. 1 CD. Faixa 9.
O MÁGICO DE OZ (Wizard of Oz). Direção: Victor Fleming, Richard Thorpe, King Vidor. Estados Unidos:
1939. (101 min.).
RACIONAIS MC’S. Mágico de Oz. In: RACIONAIS MC’S. Sobrevivente no inferno. Cosa Nostra, c2000.
1CD. Faixa 10.
THE MATRIX. Direção: Wachowski Brothers. Estados Unidos: 1999 (primeiro filme da série). (136 min.).
VILLA-LOBOS, D.; BONFÁ, M.; RUSSO, R. Monte castelo. In: LEGIÃO URBANA. As quatro estações. EMI,
c1995. 1 CD. Faixa 06.
VANDRÉ, G. Pra não dizer que não falei das flores. In: VANDRÉ, G. Geraldo Vandré. Som Livre, p2000. 1
CD. Faixa 16.
Textuais
ABREU, C. J. M. DIAS, G. In: RAMOS, F. J. da S. (org.). Grandes poetas românticos do Brasil. São Paulo:
Edições LEP Ltda, 1952.
200
ALIGHIERI, D.A divina comédia. São Paulo: 34, 1998.
ANDRADE, M. M.; MEDEIROS, J.B. Comunicação em língua portuguesa para os cursos de jornalismo,
propaganda e letras. 2. ed. São Paulo: Atlas, 2001.
AZEVEDO, Ricardo. Você diz que sabe muito, borboleta sabe mais! São Paulo: Moderna, 2007.
BANDEIRA, Manuel. Poesia completa e prosa. Rio Janeiro: Nova Aguilar, 1993.
BÍBLIA. Português. Bíblia sagrada: edição revista e atualizada. Tradução de João Ferreira de Almeida.
Rio de Janeiro: Sociedade Bíblica do Brasil, 1993.
CAMARGO, T. N. Ordem direta e inversa. Folha.com. São Paulo 20 ou. 2010. Disponível em: <http://
www1.folha.uol.com.br/folha/educacao/ult305u446.shtml>. Acesso em: 17 jun. 2011.
CAMÕES. L. V. de. O amor é fogo que arde sem se ver. s/d. Disponível em: < http://users.isr.ist.utl.
pt/~cfb/VdS/camoes.html>. Acesso em: 21 jun. 2011.
CAROL, L. Alice no país das maravilhas. Trad. Clélia Regina Ramos. Petrópolis: Arara Azul, 2002.
Disponível em: < http://www.ebooksbrasil.org/eLibris/alicep.html> Acesso em: 22 jun. 2011.
201
CHAIM, R. Professor de história. 2008. In: RECANTO DAS LETRAS. Disponível em: <http://www.
recantodasletras.com.br/poesias/954997> Acesso em: 21 jun. 2011.
DELL’ISOLA, R.L.P. Leitura: inferências e contexto sociocultural. Belo Horizonte: Formato, 2001.
DIAS, G. Poemas de Goncalves Dias. 14. ed. Rio de Janeiro: Ediouro, 1996.
FIORIN, J. L. (Org.). Introdução à linguística I: objetos teóricos. 5. ed. São Paulo: Contexto, 2006.
_______ . Introdução à linguística II: princípios de análise. 4.ed. São Paulo: Contexto, 2005.
_______. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. 37. ed. Rio de Janeiro: Paz
e Terra, 2008.
FRIEDRICH, C.; MARTIUS, P. von; EICHLER, A. W.; URBAN, I. Flora Brasiliensis. Disponível em:< http://
florabrasiliensis.cria.org.br/opus>. Acesso em: 21 jun. 2011.
GAARDER, J. O mundo de Sofia: romance da história da filosofia.10. ed. São. Paulo:Editora Schwarcz
LTDA,1995. 555p
GOLDSTEIN, N.; LOUZADA, M.S.; IVAMOTO, R. O texto sem mistério: leitura e escrita na universidade.
São Paulo: Ática, 2009.
ILARI, R. Introdução à semântica: brincando com a gramática. 2. ed. São Paulo: Contexto, 2001.
_______ .Introdução ao estudo do léxico: brincando com as palavras. 2. ed. São Paulo: Contexto, 2003.
_______. O texto e a construção dos sentidos. 2. ed. São Paulo: Contexto, 1998.
KOCH, I.G.V.; ELIAS, V.M. Ler e escrever: estratégias de produção textual. São Paulo: Contexto, 2009.
_______. Ler e Compreender os Sentidos do Texto. 3. ed. São Paulo: Contexto, 2010.
KOCH, I. G. V.; BENTES, A. C.; CAVALCANTE, M. M. Intertextualidade: diálogos possíveis. 2. ed. São
Paulo: Cortez, 2008.
202
KOCH, I. G. V; TRAVAGLIA, L. C. A coerência textual. 5. ed. São Paulo: Cortez, 1990.
LIBERATO, Y., FULGÊNCIO, L. É possível facilitar a leitura: um guia para escrever claro. São Paulo:
Contexto, 2007.
MARCUSCHI, L. A. Gêneros Textuais: Definição e funcionalidade. In: DIONÍSIO, A.; MACHADO, A.;
BEZERRA, M. Gêneros textuais e ensino. 4. ed. Rio de Janeiro: Lucena, 2005.
MARIUSO, P. Emergência: a dinâmica de rede em formigas, cérebros, cidades e softwares. 2005. In:
COMCIÊNCIA. Disponível em: < http://www.comciencia.br/resenhas/2005/10/resenha1.htm>. Acesso
em: 22 jun. 2011.
MARTINS, E. Manual de redação e estilo: O Estado de S. Paulo. 2001. Disponível em: <http://www.
estadao.com.br/manualredacao/esclareca/o.shtm>. Acesso em: 17 jun. 2011.
MEDEIROS, A. Rabos e pelos. 2001. In: FOLHA DE SÃO PAULO, São Paulo, 22 dez.1996, p.1-4.
MUSSALIM, F., BENTES, A. C. (Org.). Introdução à linguística: domínios e fronteiras. 5. ed. São Paulo:
Cortez, 2005, vol. 1.
OLIVEIRA, A. S. Metáforas em campo: o futebol e sua plurivalência metafórica no jornal Agora São
Paulo. Dissertação de Mestrado. São Paulo: PUC, 2005.
PLATÃO, F.; FIORIN, J.L. Lições de texto: leitura e redação. 4. ed. São Paulo: Ática, 2001.
POIRER, M. P. Especialista pede que governo e setor privado apoiem projetos comunitários. In: ESTADO
DE S. PAULO. 20 abr. 2006. Disponível em: < http://www.coav.org.br/> Acesso em: 22 jun. 2011.
PREFEITURA DE SALVADOR. Secretaria Municipal da Educação, Cultura Esporte e Lazer. Como ensinar
conceitos matemáticos. Disponível em:< http://www.secult.salvador.ba.gov.br>. Acesso em: 21 jun.
2011.
QUEIROZ, R. de. Talvez o último desejo. In: SANTOS, Joaquim Ferreira dos (Sel.). As cem melhores
crônicas brasileiras. São Paulo: Objetiva, 2007.
203
REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS URBANOS E REGIONAIS. ANPUR, UFBA, Vol. 5, nº 1, 2003.
RIBEIRO, D.; ZIRALDO. Noções de coisas. São Paulo: FTD, 1995. p.48-9.
ROJO, R. A prática de linguagem em sala de aula: praticando os PCNs. SP: Mercado de Letras, 2001.
RONCARATI, Cláudia. As cadeias do texto: construindo sentidos. São Paulo: Parábola, 2010.
ROSSi, C. O Provão dos provões. In: Folha de São Paulo: 6 dez. 2006.
SHIMIZU, H. ; JONES, F. A geração digital entra em cena. Época. São Paulo, Globo, 19 out .1998.
VASCONCELOS, J. T. M. de; SCANAVACCA, M. I.; SAMPAIO, R. O.; GRINBERG, M.; SOSA, E. A.; OLIVEIRA,
S. A. de. Tratamento cirúrgico da fibrilação atrial por isolamento da parede posterior do átrio esquerdo
em doentes com valvopatia mitral reumática crônica: um estudo randomizado com grupo controle.
Arquivo Brasileiro de Cardiologia. v.83, n.3. São Paulo, set. 2004.)
VELOSO, C. Menino do Rio. In: Literatura comentada. Sao Paulo: Abril Cultural, 1981.
VIANA, A. C. (Org.). Roteiro de redação: lendo e argumentando. São Paulo: Scipione, 1998.