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IDENTIFICAÇÃO DOS PROBLEMAS E SOLUÇÕES ENVOLVIDOS NO ACIDENTE DO

SPACE SHUTTLE CHALLENGER


1. Introdução

A corrida espacial representou um gigantesco avanço no setor aeroespacial

mundial. EUA e URSS desenvolveram notáveis tecnologias com o objetivo de levar o

homem à Lua, desde o desenvolvimento do Saturn-V, veículo norte-americano do

programa Apollo desenvolvido pela agência espacial local (NASA), e da Soyuz veículo

soviético desenvolvido pela, hoje, agência espacial russa. Após o fim do programa Apollo,

a NASA voltou seu foco para o produção de novas tecnologias para levar o homem ao

espaço que fossem mais baratas, mais leves e mais sofisticadas.

Os Space-Shuttles (ônibus espaciais), máquinas mais complexas que o homem já

criou, nasceram desse contexto. Diversos veículos foram criados, dentre eles a

Challenger, a fim de cumprir diferentes missões, como posicionar satélites em órbita e/ou

auxiliar na construção e utilização da Estação Espacial Internacional (ISS).

Os veículos são contruídos em segmentos. Consistem no próprio Space-Shuttle,

acoplado a um tanque de combustível líquido que, por sua vez, é acoplado a dois

propulsores de combustível sólido, como mostra a Figura 1. Todos esses componentes

são, também, divididos, e cada segmento deve ser extremamente bem selado. Anéis de

segmento (O-rings), feitos de borracha, fazem o papel de vedar os segmentos afim de

formar uma proteção contra os gases de exaustão superaquecidos, os quais são

produzidos com uma pressão incrível durante a combustão no lançamento. Há dois O-

rings, o primário, para fazer o papel de vedar os gases, e o secundário, que tem o papel

de Backup, como podemos ver na Figura 2.


Figura 1 – Componentes de um Space-Shuttle (fonte: nasa.gov)

O fato do tanque de combustível líquido do ônibus espacial estar “colado” à cabine

já é um fator de risco, tendo em vista que qualquer problema que potencialmente cause

uma explosão coloca a vida dos astronautas em sérios riscos. Isso não era um problema

no Saturn-V, por exemplo, já que os tanques de combustível ficavam a uma distância

maior do módulo de comando e o veículo contava com um sistema de ejeção do cockpit,

não presente nos Space-Shuttles.

Figura 2 – Representação dos O-Rings primário e secundário da Challenger (fonte:

choo.ischool.utoronto.ca)

Apesar de tudo, os Space-Shuttles são veículos considerados notavelmente

seguros, com alguns engenheiros estimando as chances de erros graves sendo de 1 em

100.000. Testes em diferentes condições de temperaturas e pressões para todos os

componentes do ônibus espacial, incluindo os O-rings foram realizados, apresentando

resultados que servem como parâmetros de segurança para os lançamentos.

2. Identificação do problema

Antes do lançamento do ônibus espacial Challenger em 28 de Janeiro de 1986, foi

observado um problema nos O-rings de outras Shuttles em missões anteriores. O anel

primário apresentou uma “rotação” inesperada, que fazia com que não selasse os

segmentos. Com isso, gás super aquecido vaza muito fácil pelo primeiro O-ring,
inutilizando-o, e danificando, além do anel secundário, a estrutura do segmento não-

vedado, conforme a Figura 3.

Figura 3 – Estrutura danificada da missão STS-51-L, com a Challenger (fonte: Challenger

Space Shuttle – The untold story)

Os engenheiros também se mostraram preocupados com o desempenho dos anéis

em baixas temperaturas, inferindo que as condições climáticas no dia do lançamento do

veículo, o qual apresentou tais resultados, podia ter interferido no desempenho dos O-

rings. O material dos O-rings é pensado de tal maneira que seja flexível, para que as

vibrações mecânicas, devido à extrema potencia do veículo, não prejudique o seu

desempenho. Em baixas temperaturas, entretanto, os anéis perdem um pouco dessa

característica, perdendo, também, eficiência.

Resultados anteriores ao acidente mostraram que danos consideráveis foram

detectados a temperaturas próximas de 75 oF, em um dos lançamentos do veículo. Tais

danos são consequências diretas do mal comportamento elástico dos O-rings nessas
o
condições. Registros revelaram que as temperaturas alcançaram 53 F no dia do

acidente, o que pode ser considerado um problema diretamente relacionado à tragédia

em si.

O trabalho Challenger: fine-tuning the odds until something breaks dos americanos

William H. Starbuck e Frances J. Milliken sugere 11 possíveis hipóteses para o mal

funcionamento dos anéis:


(1) As seções transversais circulares dos O-rings não apresentavam área

superficial suficiente em contato com o metal;

(2) Alguns O-rings foram instalados incorretamente;

(3) Alguns O-rings possuiam diâmetro menor que o especificado;

(4) Partículas de poeira faziam com que os anéis não vedassem os segmentos

corretamente, fazendo com que vazamentos em alta pressão ocorressem;

(5) Vazamentos em alta pressão movendo o O-ring primário de sua posição

original, impossibilitando-o de vedar corretamente duranto o lançamento;

(6) Vazamentos em alta pressão criando “buracos” na estrutura isolante;

(7) Os anéis primarios estavam sofrendo erosão por conta dos buracos criados na

estrutura isolante;

(8) Os O-rings primarios não vedariam o segmento a menos que fossem

pressurizados pelos gases superaquecidos vazados pelos buracos na estrutura isolante;

(9) As estruturas isolantes possuiam deficiências desconhecidas;

(10) Baixas temperaturas enrijeceram a estrutura isolante o suficiente para essa

última deixar de responder a altas pressões dentro do motor durante combustão;

(11) Baixas temperaturas enrijeceram os O-rings o suficiente para eles deixarem de

selar os segmentos;

Somado à esses graves problemas, relata-se a questão de múltiplos adiamentos, o

que implicou em uma pressão crescente pelo lançamento da Challenger. Após seis

adiamentos devido a problemas técnicos e condições climáticas adversas a pressão vinda

do Kennedy Space Center superou os avisos dos engenheiros da então Morton Thiokol,

empresa responsável pelos O-rings.

A junção dos fatos acarretou na decisão do lançamento do ônibus espacial, mesmo

em condições adversas, ocasionando o acidente. A tragédia em si é o maior sintoma do

problema, que se resume no mal funcionamento dos o-rings em baixas temperaturas, O

movimento rotacional do anel primario e a negligência do conjunto Morton Thiokol e NASA

na resolução do problema identificado.


3. Solução do(s) problema(s)

Uma das soluções adotadas pelos engeheiros da Morton Thiokol e NASA, foi a de

colocar não apenas dois O-rings para vedar os segmentos, mas três, agora cotando com

um anel adicional de Backup.

Além disso, os engenheiros da Thiokol estavam redesenhando todas as vedações

dos segmentos um ano antes do desastre da Challenger em 1985, o que impossibilitou a

troca na Shuttle que sofreu o acidente, mas sim nas suas sucessoras. O novo material

teria o objetivo de resolver os problemas da rotação do anel primário, além de se

comportar de maneira satisfatória em baixas temperaturas.

Segundo Richard C. Cook, ex-analista financeiro da NASA “[A solução no] sistema

de vedação era um gigantesco passo. Mas estava acontecendo muito lentamente. Os

engenheiros sabiam sobre a necessidade de um conserto, mas, antes que esse fosse

realizado, eles respiravam fundo a cada lançamento”.

Tanto NASA como a Thiokol e outros fornecedores sabiam do problema mas

continuaram com o programa sem dar a devida atenção. A negligência levantada por

ambas as partes poderia ter sido evitada se o principal foco fosse a segurança dos

envolvidos na missão.

4. Conhecimentos relacionados à(s) solução(ões) e disciplinas necessárias

Os propulsores à base de combustível sólido exigem conhecimento teórico

avançado acerca do assunto, uma vez que a reação do combustivel sólido + comburente

na câmara de combustão libera gases em alta pressão, fato esse que representa

exatamente o problema do presente trabalho. Tal conhecimento pode ser adquirido

cursando a disciplina Sistemas de propulsão II.

Sobre a questão dos vazamentos dos gases a alta pressão, ocasioando buracos na

estrutura isolante, é necessário um estudo aplicado sobre os gases produto da

combustão, a transferência de calor entre esses gases e os O-rings, e o resultado dessa

interação. Para isso, são necessárias Termodinâmica Aplicada I, Transferência de Calor


aplicada a Sistemas Aeroespaciais, e Dinâmica do Gases, para a compreensão total

desse processo.

O enrijecimento da borracha dos O-rings a baixas temperaturas, bem como sua

solução, pode ser melhor compreendido com o conhecimento de propriedades

termodinâmicas dos materiais. As disciplinas de Termodinâmica Aplicada I, e de Materiais

e suas Propriedades fornecem subsídios teóricos para a desenvolvimento do projeto

responsável pela vedação dos segmentos da Challenger.

Por fim, todos os tópicos citados necessitam de uma revisão final, a fim de evitar

falhas, imperfeições, e promover a confiabilidade do projeto. Para tal, a disciplina

Confiabilidade de Componentes e Sistemas oferece embasamento suficiente para atestar

a garantia de qualidade da Shuttle. Com isso, atesta-se que, após o cálculo de riscos, a

realização final do projeto será puramente escolha dos responsáveis, recaindo sobre a

ética dos autores.

5. Curso(s) e Área de Atuação

As disciplinas as quais apresentam os conhecimentos necessários para a

resolução dos problemas no acidente da Challenger apresentam uma notável tendência.

As disciplinas estão presentes nos cursos:

(1) Engenharia Aeroespacial;

(2) Engenharia de Materiais;

Uma análise dessa tendência sugere que os cursos de Engenharia Aeroespacial e

Engenharia de Materiais relacionam-se intimamente, se entrelaçando com frequência.

A Engenharia Aeroespacial tem como objetivo o estudo e desenvolvimento de

tecnologias relacionadas a veículos que transitam na atmosfera e fora dela. O

desenvolvimento dessa área é importante devido ao fato de o Brasil ainda ser dependente

de outros países no setor. A área de atuação do curso de Aeroespacial é exemplificada

por: Mecânico de aeronaves em emrpesas aéreas, pesquisa e desenvolvimento em

empresas com foco aeroespacial, controle de missões espaciais, planejamento de

exploração espacial (Space-X, NASA, etc.), etc. além do núcleo comum da engenharia,

que integra áreas como logística, planejamento e controle.


6. Referências

C. J. Maranzano, R. Krzysztofowicz, Bayesian Reanalysis of the Challenger O-Ring Data,

Risk Analysis, Vol. 28, No. 4, pg 1053-1067, 2008

J. K. Esser, J. S. Lindoerfer, Groupthink and the Space Shuttle Challenger

Accident: Toward a Quantitative Case Analysis, Journal of Behavioral Decision Making,

Vol. 2, pg. 167-177, 1989

W. H. Starbuck, F. J. Milliken, CHALLENGER: FINE-TUNING THE ODDS

UNTIL SOMETHING BREAKS, Journal of Management Studies, pg. 319-340, 1988

Case Study 1,The Challenger Space Shuttle disaster and the Solid-Fuel Rocket Booster

(SRB) project

NASA.GOV, https://www.nasa.gov/returntoflight/system/system_STS.html

Documentary: Challenger Space Shuttle – The untold story, National Geographic, 2006

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