Você está na página 1de 10

Unidade 5: POLÍTICAS DA EDUCAÇÃO PARA O SECULO XXI

(Texto baseado no Relatório da Comissão para a educação para o século XXI para a UNESCO)

5.1. Opções educativas para o século XXI

No mundo actual, pais, alunos, trabalhadores, desempregados, empresas, colectividades locais,


governos, crianças, jovens alunos, etc., esperam algo da educação, e exigem dos sistemas
educativos mais e melhor.

Na verdade, solicitados por todo o lado, os sistemas educativos devem dar respostas não só às
exigências culturais e éticas, mas também vencer o desafio da tecnologia, que constitui uma das
principais vias de acesso ao século XXI.

Porém, a educação não pode fazer tudo e, algumas esperanças podem se transformar em
desilusões. Neste caso, é preciso que se façam opções que podem ser difíceis quando está em
causa a equidade e a qualidade dos sistemas educativos. É por isso que essas opções são da
sociedade e podem variar segundo os países. Contudo, deve haver coerência entre as opções e as
estratégias adoptadas. Por um lado, entre estas estratégias, estão os recursos oferecidos pela
sociedade de informação e as possibilidades criadas pela inovação e pela descentralização. Por
outro lado, estas estratégias carecem de uma regulamentação do conjunto da educação e, este
papel cabe ao político, a quem compete:

▪ Definir o futuro por uma visão a longo prazo;


▪ Assegurar ao mesmo tempo a estabilidade do sistema educativo e a sua capacidade de se
reformar;
▪ Garantir a coerência do conjunto, estabelecendo prioridades; e
▪ Abrir um verdadeiro debate da sociedade sobre as opções económicas e financeiras.

5.1.1. Oportunidades oferecidas pela inovação e descentralização


De entre as oportunidades que a inovação e a descentralização oferecem, destacam-se o projecto
educativo e a autonomia das escolas.
a) O projecto educativo evidencia a vontade de alcançar juntos os objectivos que permitam
melhorar a vida da instituição escolar e a qualidade de ensino. Grande parte das reformas
tendentes à descentralização redundaram num fracasso porque na sua grande maioria são
decididas nos serviços centrais dos ministérios, sem uma verdadeira consulta aos
diferentes actores e sem a avaliação dos resultados.
Para que as reformas educativas tenham sucesso, a UNESCO recomenda que se associem os
diferentes actores sociais à tomada de decisões, através de debates.

As condições para a abertura desses debates são:


▪ Vontade do governo central, de abrir um espaço de tomada de decisões democráticas,
onde possam ser levadas em conta as expectativas de todos os actores;
▪ As instituições do sistema educativo devem dar prova de vontade de se adaptar às
condições locais e adoptar uma atitude aberta perante a mudança.

b) A autonomia das escolas constitui um factor essencial de desenvolvimento das iniciativas


locais, e manifesta-se de duas maneiras, a saber:
▪ Na gestão dos recursos atribuídos, em que parte deles deve ser decidida a nível escolar; e
▪ Num forte estímulo à inovação, que depende essencialmente das condições locais.

É por isso que a UNESCO recomenda uma descentralização dos sistemas educativos, apoiada na
autonomia das escolas e da participação efectiva dos agentes.

5.1.2. Necessidade de uma regulamentação do conjunto do sistema


Seja qual for a organização do sistema educativo, o Estado deve assumir um certo número de
responsabilidades para com a sociedade civil.

É neste âmbito que os poderes públicos devem exercer duas tarefas fundamentais, a saber:

▪ Suscitar um amplo acordo entre os diferentes actores sobre a importância da educação e


sobre o seu papel na sociedade, sobretudo nos países em desenvolvimento, onde um
diálogo permanente com todos os partidos políticos, associações profissionais ou outros,
sindicatos e empresas, pode assegurar a estabilidade e a durabilidade dos programas
educativos; e
▪ Assegurar a gestão programada das interdependências entre os diferentes elementos do
sistema educativo, sem perder de vista o carácter orgânico das relações entre as diferentes
categorias de ensino.
Em suma, as políticas educativas devem ser a longo prazo para que fique assegurada a
continuidade das opções e a concretização das reformas, e devem-se apoiar numa análise
rigorosa dos sistemas educativos.

Assim se justifica o papel do Estado que diz respeito, principalmente às opções de sociedade que
imprimem a sua marca na educação, mas também à regulamentação do conjunto do sistema,
assim como à promoção do valor da educação.

5.1.3. Opções económicas e financeiras


A prossecução dos objectivos de natureza colectiva, como a educação, implicam opções
económicas e financeiras sempre difíceis, apesar de se colocarem de maneiras diferentes,
segundo as principais categorias de países, onde:

▪ Os países desenvolvidos, apesar de se confrontarem com uma procura crescente de


escolarização, encontram meios de resolver esta situação; e
▪ Os países em desenvolvimento, que esmagados entre as crescentes necessidades ligadas
ao aumento demográfico, aos atrasos de escolarização e à escassez de recursos
disponíveis, que se associam ao abrandamento da actividade económica, ao peso da
dívida externa e a concorrência entre os sistemas educativos e os outros domínios de
intervenção do Estado na utilização dos recursos públicos, sentem na verdade o peso das
dificuldades financeiras.

Nesta perspectiva, a UNESCO traça as seguintes orientações para o futuro:

▪ Aumentar os recursos públicos, em vez de outras despesas, é uma necessidade para todos
os países, sobretudo nos países em desenvolvimento;
▪ Mobilizar os recursos financeiros privados, a fim de limitar a pressão exercida sobre o
orçamento dos Estados;
▪ Recorrer aos sistemas de financiamento, combinando fundos públicos e privados em
proporções variáveis, segundo os níveis de ensino, para assegurar a gratuidade de ensino;
▪ Descentralizar a administração das escolas e conferir-lhes maior autonomia;
▪ Introduzir medidas para melhorar a relação custo/eficácia nos países em desenvolvimento
através de acções, como o prolongamento do ano escolar, construção de escolas a custos
reduzidos e o desenvolvimento do ensino à distância;
▪ Reexaminar as modalidades de financiamento da educação numa perspectiva mais ampla,
procurando conciliar a igualdade de oportunidades com a diversificação dos percursos
individuais no final da escolarização obrigatória, financiada com fundos públicos, no
âmbito do princípio da educação ao longo de toda a vida; e
▪ Atribuir a cada jovem, no momento em que começa a sua escolaridade um crédito de
tempo para a educação, correspondente a determinado número de anos de ensino.

5.1.4. Recurso aos meios oferecidos pela sociedade da informação


De entre os meios oferecidos pela sociedade de informação, destacam-se as novas tecnologias,
que estão gerando, sob nossos olhos, uma verdadeira revolução que afecta, tanto as actividades
ligadas à produção e ao trabalho, como as ligadas à educação e formação.

Tendo em conta que as sociedades actuais são sociedades de informação, nas quais o
desenvolvimento das tecnologias pode criar um ambiente cultural e educativo susceptível de
diversificar as fontes do conhecimento e do saber, a UNESCO está consciente dos contrastes
profundos entre países industrializados e em desenvolvimento em matéria de capacidade de
investimento, de potencial de pesquisa e concepção, de resultados comerciais ou de taxas de
rentabilidade. Como resultado, os países em desenvolvimento, por terem níveis de escolaridade
menos elevados e infra-estruturas menos desenvolvidos, em contraste com os países
desenvolvidos, as prioridades em matéria de utilização das tecnologias na educação serão
também diferentes.

O debate actual gira em torno da utilização das tecnologias de informação em larga escala no
futuro. Com isto, pretende-se indicar um certo número de pontos relacionados com a sua
utilização na educação e sobre os quais, a comunidade internacional poderá reflectir no futuro.
Tais são os casos:

▪ Da utilização dessas tecnologias no ensino à distância, recorrendo a vectores muito


diversificados, como cursos por correspondência, rádio, televisão, suportes áudio-visuais,
ensino por telefone ou teleconferência;
▪ Da convergência do ensino à distância com outros tipos de actividades à distância, como
o tele-trabalho;
▪ Do recurso ao computador e aos sistemas multimédia; e
▪ Da tecnologia do disco compacto.

5.1.5. Recomendações em torno dos meios oferecidos pela sociedade de informação


▪ A questão da utilização das novas tecnologias na educação constitui uma opção
financeira, social, política e, deve ser uma das preocupações dos governos e das
organizações internacionais;
▪ Dado que os países em desenvolvimento estão actualmente em desvantagem por
possuírem menos capacidade tecnológica e recursos financeiros limitados, tudo deve ser
feito para que a diferença entre eles e os países ricos não aumente ainda mais;
▪ Criar centros experimentais ligados em rede aos estabelecimentos escolares pode ser um
meio relativamente pouco dispendioso para uma ampla difusão da informação e do
conhecimento;
▪ A formulação de políticas de difusão nos países em desenvolvimento representa, pois, um
desafio para a educação e exige estreita cooperação entre empresas, governos e
organizações internacionais.
Apesar de tudo, a UNESCO adverte que o desenvolvimento das tecnologias não substitui de
forma alguma o livro e o professor.

5.2. Os quatro pilares da educação

Futuramente, não bastará que cada um acumule no início da vida uma determinada quantidade de
conhecimentos de que se possa abastecer indefinidamente. Antes pelo contrário, será necessário
aproveitar e explorar, do começo ao fim da vida, todas as ocasiões de actualizar, aprofundar e
enriquecer estes primeiros conhecimentos e de se adaptar a um mundo em mudanças. Esta
reflexão nos leva à ideia de uma educação ao longo de toda a vida, que se baseia em quatro
pilares, que são: aprender a conhecer, aprender a fazer, aprender a viver juntos e aprender a ser.

5.2.1. Aprender a conhecer


Este tipo de aprendizagem visa o domínio dos principais instrumentos do conhecimento,
combinando uma cultura geral, com possibilidade de trabalhar em profundidade um pequeno
número de matérias. Isto significa, aprender a aprender para se beneficiar das oportunidades
oferecidas pela educação ao longo de toda a vida.

Nesta perspectiva:

▪ A educação básica deve permitir à criança o acesso, de forma adequada às metodologias


científicas, de modo a tornar-se para toda a vida amiga da ciência.
▪ No ensino secundário e superior, a formação inicial deve fornecer a todos os alunos os
instrumentos, os conceitos e as referências resultantes dos avanços da ciência e dos
paradigmas do nosso tempo.
▪ Como o conhecimento é vasto e evolui infinitamente, torna-se cada vez mais inútil tentar
conhecer tudo, devendo-se porém especializar depois do ensino básico.
▪ Deve-se do princípio ao fim do ensino, cultivar simultaneamente, duas tendências: a
cultura geral e a formação cultural.
Neste sentido, a educação primária é fundamental e deve ser bem sucedida, devendo transmitir às
pessoas o impulso e as bases que façam com que continuem a aprender ao longo de toda a vida,
no trabalho, mas também fora dele.

5.2.2. Aprender a fazer


É um tipo de aprendizagem que está estreitamente ligada não só a questão de formação
profissional, mas de maneira mais ampla às competências que tornem as pessoas a enfrentar
numerosas situações e a trabalhar em equipa. É também aprender no âmbito das diversas
experiências sociais e de trabalho que se oferecem aos jovens e adolescentes.
A análise a este tipo de aprendizagem incide sobre duas economias que dominam o mundo: as
economias industriais e as outras economias.

Nas economias industriais domina o trabalho assalariado e o seu futuro depende da sua
capacidade de transformar o progresso dos conhecimentos em inovações geradoras de novas
empresas e de novos empregos.

Actualmente assiste-se, tanto na indústria, como nos serviços, à substituição do trabalho humano
pelas máquinas que tornam o trabalho cada vez mais imaterial, acentuando o carácter cognitivo
das tarefas.

Perante a nova dinâmica que se assiste, o aprender a fazer já não significa somente preparar
alguém para tarefa material bem determinada, mas também significa oferecer competência
profissional, onde as tarefas físicas são substituídas por tarefas de produção mais intelectuais e
mentais, que se acentuam com o impressionante crescimento do sector dos serviços.

Nas outras economias domina o trabalho informal e a sua natureza é muito diversificada. Aí as
competências são do tipo tradicional e a aprendizagem não se destina, apenas a um só trabalho,
mas tem como objectivo mais amplo preparar o indivíduo para a participação formal ou informal
no desenvolvimento, afigurando-se como uma qualificação mais social do que profissional.

Nestas economias, encara-se o futuro como estando estreitamente ligado à aquisição da cultura
científica que lhes dará acesso à tecnologia moderna, sem negligenciar com isso as capacidades
específicas de inovação e de criação, ligadas ao contexto local.

Uma questão se coloca para ambas economias: como aprender a comportar-se, eficazmente,
numa situação de incerteza e como participar na criação do futuro?
5.2.3. Aprender a viver juntos, aprender a viver com os outros
Este tipo de aprendizagem visa desenvolver a compreensão do outro e a percepção da
interdependência no respeito pelos valores do pluralismo, da compreensão mútua e da paz, ou
seja, realizar projectos comuns e preparar-se para gerir conflitos.

Numa altura em que o mundo actual se caracteriza por:

▪ Violência, que se opõem a esperança no progresso da humanidade;


▪ Clima de concorrência na actividade económica, tanto no interior de cada país, como
entre países; e
▪ Tensão entre os mais favorecidos e os pobres, que divide as nações do mundo e exacerba
as rivalidades históricas.
Para melhorar a situação, o aprender a viver juntos e com os outros representa um dos maiores
desafios da educação, devendo:

▪ Conduzir à progressiva descoberta do outro; e


▪ Conduzir à participação de todos em projectos comuns ao longo de toda a vida, para
evitar ou resolver conflitos latentes.
A descoberta do outro consiste em:

▪ Transmitir conhecimentos, desde a tenra idade, sobre a diversidade da espécie humana e,


por outro, levar as pessoas a tomar consciência das semelhanças e da interdependência
entre todos os seres humanos do planeta;
▪ Dar à criança e ao adolescente uma visão ajustada do mundo, quer na família, na escola e
na comunidade, ajudando-as a descobrir-se a si mesmas; e
▪ Conceber métodos de ensino que encorajem o diálogo e a troca de argumentos, que
podem levar ao reconhecimento do outro.
Os projectos e objectivos comuns se concretizam através:

▪ Do desenvolvimento de programas para iniciar os jovens em projectos de cooperação,


desde a infância, no campo das actividades desportivas, culturais e sociais;
▪ Da participação dos professores e alunos em projectos comuns, que podem dar origem a
aprendizagem de métodos de resolução de conflitos e enriquecem a sua relação; e
▪ Da continuação dessas acções por outras organizações educativas e associações.
5.2.4. Aprender a ser
Este tipo de aprendizagem visa desenvolver a personalidade do indivíduo, de modo que esteja
em altura de agir com cada vez maior capacidade de autonomia, discernimento e
responsabilidade pessoal.

Para que tal aconteça:

▪ O ser humano deve ser preparado, desde a juventude, a elaborar projectos autónomos e
críticos, bem como a formular os seus próprios juízos de valor, para poder decidir por si
mesmo e agir nas diferentes circunstâncias da vida;
▪ Deve-se fornecer às crianças as forças e as referências intelectuais que lhes permitam
compreender o mundo que as rodeia, de forma a comportar-se nele como actores
responsáveis e justos;
▪ Conferir a todos os seres humanos a liberdade de pensamento, discernimento, sentimento
e imaginação de que necessitam para desenvolver os seus talentos e permanecerem
donos do seu próprio destino;
▪ Deve-se dar importância à imaginação e criatividade, como claras manifestações da
liberdade humana; e
▪ Deve-se oferecer às crianças e aos jovens adolescentes todas as ocasiões possíveis de
descoberta e de experimentação nos campos estético, artístico, desportivo, científico,
cultural e social.

Em suma, o aprender a conhecer significa aquisição dos instrumentos de compreensão; o


aprender a fazer significa aquisição de instrumentos para poder agir sobre o meio envolvente; o
aprender a viver juntos significa aquisição de instrumentos para participar e cooperar com os
outros em todas as actividades humanas; e o aprender a ser é a via que integra os três pilares
anteriores.
Estes quatro pilares do saber constituem um só, dado que existem entre eles múltiplos pontos de
contacto, de relacionamento e de permuta, por isso, na óptica da comissão, devem inspirar e
orientar as reformas educativas, tanto ao nível da elaboração de programas, como ao nível da
definição de novas políticas pedagógicas.

Você também pode gostar