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Ne oe a INVESTIGAGAO CRIMINAL, CIENCIAS CRIMINAIS E FORENSES Radicalizagdo politico-ideolégica e comportamento crimi- EL eel ae Cem EAe CCL RAL LR) ON CO LEC LLCO Pre ena ae eee eam Te PMC R ON MDa Re eens cen eR A ee aCee Ce A Tra eg ne er R Oar RN gee de radicalizagao Islamica no norte de Marrocos . “Terrorism Ree CULE MgC glen ett a PU ee ae MOC le gt Tate Ue eam ae a Cm Tete C801) OCC RN RRO m Re ance eee eR Rc Dnata Re RO eMac as en (do) Terrorista . Contributo para o entendimento da a } éncia vivencial do terrorista . 4 ns a 2 Investigagao Criminal. IC3F N® 2 Revista Semestral de Investigagao Criminal, Ciéncias Criminais e Forenses Propriedade e edi¢do: ASFICP] - Associagio Sindical dos Funcionarios de Investi- gacdo Criminal da Policia Judiciaria - Rua Gomes Freire, n° 174, 1119-007, Lisboa. Diretor Executivo: Jorge Mourao. Dire¢ao Editorial: Afonso Costa, Carlos Costa, Jodo Paulo Ventura e José Leal. Conselho Consultivo: Professor Doutor Candido da Agra, Professor Catedrdtico da Faculdade de Direito da Universidade do Porto | Professora Doutora Eugénia Cunha, Professora Catedrética FCTUC, Consultora Nacional para a Antropologia Forense do INML | Professora Doutora Constanga Urbano de Sousa, Doutorada em Direito Comunitdrio, docente universitdria | Professor Doutor Rui Abrunhosa Gongalves, Doutorado em Psicologia, Professor Associado da Escola de Psicologia da Universidade do Minho | Dr. Agostinho Soares Torres, Juiz Desembargador no Tribunal da Relagdo de Lisboa | Dr. Vitor Magalhaes, Procurador da Reptiblica no Departamento Central de Investigagdo e Accdo Penal (DCIAP) | Dr. Anténio Santos Carvalho, Juiz Consetheiro no Tribunal de Contas | Dr. Adriano Cunha, vice-Procurador Geral da Reptiblica | Profes- sora Doutora Fatima Pinheiro, Directora do Departamento de Genética e Biologia do INML, Delegagito do Porto | Professora Doutora Mafalda Faria, Palinologista, Instituto Superior de Ciéncias da Satide Egas Moniz | Professor Doutor Duarte Nuno Vieira, Pro- {fessor Catedrético da Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra | Dr. Carlos Farinha, Director do Laboratorio de Policia Cientifica | Dr. Magalhaes e Silva, Advogado, antigo membro do Conselho Superior da Ordem dos Advogados, membro da Comissao Revisora do Cédigo de Processo Penal 1998 | Dr. José Braz, Assessor de Investigagtio Criminal da Policia Judicidria, aposentado, ex-dirigente da Policia Judiciéria, Revisao: Afonso Costa, Carlos Costa, Jodo Paulo Ventura e José Leal. Secretariado/publicidade/Assinaturas: Claudia Barros - Telefone: 915 799 104 / 225518814 - E-mail: asficpj.livraria@gmail.com Design e Paginacao: Atelier Joao Borges Impressao: Sersilito Tiragem: 500 Exemplares ISSN: 1647-9300 Depésito Legal: 322803/11 abril / 2018 Ne ERC: 2017/12063 NIPC: 501 638 687 Sede do Editor: Rua Gomes Freire, 174 - 1169 - 007 Lisboa Morada do Impressor: Sersilito - Travessa $4 e Melo, 209. Maia Sede da redaccao: ASFIC/P} - Rua Gomes Freire, 174 - 1169 - 007 Lisboa PVP: 10 Euros. Indice p.6 p.10 p.62 p.88 p. 100 p.116 p. 146 p.160 p.190 Nota Editorial - Diregao Editorial Radicalizago politico-ideolégica e comportamento criminal: caracterizacdo, prevencao e resposta - Jodo Paulo Ventura 0 Jihadismo como anti-movimento social - Felipe Pathé Duarte Diego da Investigagao criminal pelo Ministério Publico e autonomia técnica e tdctica dos érgaos de policia criminal - Thiagd Pierobom de Avila A situagao de Ceuta nos processos de radicalizagao Islamica no norte de Marrocos - Carlos Rontomé Romero "Terrorism and organized crime may be interlinked phenomena’ Discuss this referring to specific examples - George Cremona A Unidade de Coordenacao Antiterrorismo e a investigacao preventiva do terrorismo: a problematica da partilha de informacao no caso da radicalizagao de nacionais - Frederico Cortez O Perfil (do) Terrorista - Carlos Antonio de Pina Sarmento Contributo para o entendimento da experiéncia vivencial do terrorista ~ Hernani Carvalho Abstracts Dire¢do da investigacao criminal pelo Ministerio Publico e autonomia técnica e tactica dos orgaos de policia criminal 64 Directo da Investigagao criminal pelo Ministéria Pablico e autonomia técnica e tética dos 6rgaos de policia criminal Thiago Pierobom de Avila Promotor de Justiga do Ministério Pblico do Distrito Federal e Territérios (Brasil) e membro colabora- dor da Comissao de Controle Externo da Atividade Policial do CNMP. Professor de direito processual pe- nal e temas de direitos humanos no programa de pés-graduacao da FESMPDFT. Doutor em Ciéncias Juri- dico-Criminais pela Universidade de Lisboa, Mestre em Direito Pilblico pela Universidade de Brasilia e especialista em investigagao criminal pela Ecole Nationale de la Magistrature - Brasil. Resumo Este trabalho compara o sistema brasileiro e portugués de diregio da investigacao criminal, a luz do sistema acusatério positivado em ambas as Constitui¢des. No sis- tema brasileiro, a dire¢ao imediata da investigaco criminal é responsabilidade do delegado de policia, mas ha mecanismos de controle da atividade policial pelo Mi- nistério Publico que lhe permitem realizar uma dire¢ao mediata, especialmente atra- vés do acompanhamento obrigatério das investigagbes, da requisi¢ao de diligéncias s de policia criminal pos- e das recomendagGes. Apesar desse regramento, os 6r suem autonomia técnica e tatica no cumprimento das requisi¢ées. Introdugao 0 presente estudo tem por finalidade comparar os sistemas brasileiro ¢ portugués de investigaco criminal, apontando similitudes e divergéncias no que tange a titulari- dade do direcionamento da investigacao criminal, bem como destacar a autonomia técnica e tActica de que gozam os érgios de policia criminal. Aanilise comparativa de sistemas legais pode ser importante para revelar categorias que sao destacadas em um sistema e negligenciadas em outro, e que podem ser even- tualmente uma inspiragdo para reformas, ou ainda ser um alerta sobre caminhos pe- los quais nao se deve andar’. £ possivel perceber o surgimento de certas compreen- sdes partilhadas sobre o correto balanceamento entre os interesses do Estado, da comunidade, do individuo, especificamente no Ambito da fase investigativa, que + Sobre autilidade de estudos de direito comparado, ver Nelken, 2010. ‘Thiago Plerobom de Avila representam a depuracdo das diversas experiéncias positivas e negativas dos diver- sos paises. Apesar de a investigacao criminal ser uma fungdo tipica da atividade policial, estudos de direito comparado tém documentado a tendéncia de que a direcdo dessa ativi- dade nao seja uma prerrogativa privativa da Policia, sendo compartilhada com au- toridades ditas judiciarias, seja o Ministério Publico ou 0 juiz de instrugao*, Todavia, mesmo nos paises que retiram formalmente a direcao da investigacao da Policia, ha mecanismos para se restituir espagos de atuagao imediata e urgente até orientacao contraria da autoridade dirigente. Esse trabalho pretende esclarecer que, no con- texto brasileiro, a regulamentagiio infraconstitucional atual da investigac&o criminal permite reconhecer que ha um espaco inicial de liberdade a Policia para executar a investigacdo, mas o Ministério Puiblico a dirige mediatamente, compartilhando com a autoridade policial espasos (no Brasil, excessivamente largos) de autonomia exe- cutiva propria. 1. Caracteristicas gerais dos sistemas investigativos em Portugal e Brasil Aforma como ¢ regulamentada a tramitaco do inquérito e como as diligéncias pro- cessuais sao fiscalizadas reflete em grande medida a légica de funcionamento de um sistema processual penal, bem como os principios e preocupagdes que Ihe so sub- jacentes, Assim, é necessario compreender as diferengas estruturais entre o sistema portugués ¢ brasileiro para, em um segundo momento, comparar a direcdo da in- vestigacao criminal. Uma primeira diferenga crucial entre os sistemas brasileiro e portugués é sobre 0 papel da Policia e do Ministério Piiblico. No sistema portugués, a lei ja deixa claro que a investigagao criminal é de titularidade do Ministério Pablico, sendo a Policia um érgao auxiliar daquele. Entende-se que o fundamento para a dire¢ao do inquérito pelo Ministério Pablico estaria respaldado constitucionalmente no art. 219.1 da Cons- tituigo da Repiblica Portuguesa - CRP/1976, que prevé como atribuicdo do Minis- tério Piblico exercer a aco penal orientado pelo principio da legalidade, bem como oseuart. 32,5 estabelece que “o processo criminal possui estrutura acusatéria”. Nessa linha, estabelece o art. 53.2.b do CPP que compete ao Ministério Publico dirigir o inquérito, o art. 55.1 que compete aos érgaos de policia criminal - OPC - coadjuvar as autoridades judiciérias com vista a realizacao das finalidades do processo, Sobre o tema, v. Avila, 2016. 65 66 Direcdo da Investigagio criminal pelo Ministério Pablico # autonomia técnica ¢ tictiea des Orgaos de policia criminal esclarecendo 0 art. 56 que os OPC's atuam no processo sob a dire¢ao das autorida- des judiciarias e na sua dependéncia funcional’. Tais disposigdes sao reforgadas pelo art. 263 do CPP, que estabelece que o Ministério Publico dirige o inquérito e os OPC’s © assistem, sob sua direta orientacéo e dependéncia funcional e pelo art. 2° da Lei n. 48/2008 (Lei de Organizacaio da Investigacao Criminal) no mesmo sentido. Assim, a atuagao policial nfo 6 auténoma, é dependente da direeao do Ministério Publico. Os OPC’s apenas possuem competéncia prépria para a realizacdio das chamadas medi- das cautelares de policia (CPP, art. 248-253), mas ainda assim essas sao realizadas no interesse do Ministério Publico e sao pelo mesmo validadas, para serem incluidas no inquérito. Segundo Pinto de Albuquerque, “a diregdo do inquérito pelo Ministério Ptiblico é uma caracteristica fundamental da estrutura acusatéria do processo penal portugués” Em Portugal os membros do Ministério Puiblico so denominados de magistrados e possuem o status de autoridade judiciaria, cf. art. 19, alinea “b”, do CPP portugués, de sorte que quando a lei deseja referir-se apenasa uma atribuigao de magistrado ju- dicial, o faz utilizando a expresso “juiz” ou “juiz de instrugao”*. Esse estatuto deriva de sua posicao constitucional, j4 que a CRP trata do Ministério Piblico logo apés 0 Po- der Judicial, ainda dentro do mesmo capitulo, ¢ em diversos capitulos 0 equipara & magistratura judicial’. Segundo Canotilho, 0 Ministério Publico é concebido como um “elo de ligaco” entre o poder judicial e 0 poder politico’. Contudo, o estatuto entre ambos nao é coincidente, ja que o Ministério Piiblico nao é considerado no texto cons- titucional portugués como um érgfio de soberania (CRP, art. 113)", bem como os ma- gistrados do Ministério Public possuem uma menor independéncia em compara- 40 com a magistratura judicial, jA que aqueles estéo sujeitos a uma dependéncia > Segundo Cunha, 1993-111, ofato de a Policia coadjuvar 0 Ministério Publico nas finalidades do processo significa que 1 Policia também possul a finalidade de exercer a seguranca piblica, mas quando se trata de uma investiga¢3o criminal ‘a competéncia principal € do Ministério PUblico, de sorte que o “ato final au definitivo em que aquele ato praticado pelo ‘oadjtitor se integra & um ate do titular, do drgdo principal’. Assim, o Ministério Publico é o érwao principal (coadjuvado) ea Policia o 6rgao auxiliar (coadjuvante). * Albuquerque, 2009:151. No mesmo sentido, os acdrddos TC n. 7/1987 e n. 23/1990. Segundo Costa, 1994:239, essa fimula “dependéncia funcional vs. autonomia técnica” procura manter a legitimidade da condugao das investigacdes pelo titular da ago penal, bem como assegurar a ligacao da Policia com o Poder Executivo. * Segundo o preamblo do CPP, o Ministérlo Publico nao tem oestatuto de parte, "mas o de uma autGntice magistratura, sujeita a0 estrito dever de objetividade”. Ver Moura, 1988:98. Segundo Dias, 1988:22-23, a autonomia entre Ministério Pablico e magistratura judicial é principal caractetistica da cestrutura acusatoria do proceso penal, essa prevista expressamente no art. 32.5 da CRP. Sobre esse estatuto de magis- tratura e sua evolugio historica, ver Carmo, 2004:103-5. Apesar desse status de magistratura, o Ministério Publico por- fugués ainda acumula as fungBes de representaszo do Estado em juizo para as demats causas (Pereira, 2004:123), o que, nosso ver, pode ser um fator de eventual diminuigao ce sua imparcialidade, pois interesses do Estado e da sociedade podem eventualmente colidir (defendendo a manultencao desse sistema por razdes de tradigao historica, ver Moura, 2009:82), "canotilho, 2003:684. Utilizando a expressao “elo de permeio”: Costa, 1994:223. « Ainda que alguns argumentem que sua insersao dentro do titulo constitucional dos Tribunals Ihe asseguraria alguma equiparagio: ver Almeida, 2006:201. ‘Thiago Pierobom de Avila hierdrquica, que em grande medida vincula sua atuacio com orientacées gerais dos superiores dentro da hierarquia do Ministério Publico portugués. Apesar de nao ser 6rgao de soberania, e de suas fungdes nao serem jurisdicionais em sentido estrito, mas poderem ser reconduzidas a agdes executivas (promover a ac3o penal e a de- fesa da legalidade democratica), nao se trata de um drgao administrativo ordinario, pois esta cercado de diversas garantias constitucionais de independéncia, como a auto-organizagao (através do Procurador-Geral da Repitblica), autonomia estatuta- ria e reserva de lei para regramento* ACRP, em seu art. 272, refere-se genericamente a “Policia” (ou forcas de seguranga), indicando que essa fungao de policia, de manutencao da ordem, é una, ainda que de- senvolvida pelos diversos érgios estatais de seguranca publica. 0 CPP utiliza a ex- pressio “Srgaos de policia criminal’, referindo-se aos 6rgaos que eventualmente te- nham interveniéncia no processo penal’®, 0 conceito de OPC é dado pelo art. 1.c do CPP, que define como nele inclufdos "todas as entidades e agentes policiais a quem caiba levar a cabo quaisquer actos ordenados por uma autoridade judiciéria ou de- terminados por este Cédigo”. Portanto, 0 conceito do CPP de OPC é um conceito aberto"; esse conceito é complementado pela LOIC, Lei n. 49/2008, art. 3.1 que es~ tabelece que em Portugal ha trés instituigdes que sao consideradas OPC's de compe- téncias genérica: Policia Judiciaria PJ, Pol{cia de Seguranga Publica ~ PSP,ea Guarda Nacional Republicana ~ GNR. Outras instituigdes podem receber encargo legal para 0 exercicio de competéncias criminais especificas, como, v.g, € 0 caso do Servigo de Estrangeiros e Fronteiras - SEF para os crimes ligados A Lei de Estrangeiros (Lei n, 23/2007, art. 188.1)", A competéncia da PJ consta de um rol de crimes, enquanto ada GNRe PSP é expressamente subsididria para os crimes que, a principio, nao se- jam da competéncia da PJ e Ihes sejam designados pelo Ministério Puiblico (Let ° Para uma visdo geral do estatuto do Ministério Publico, ver Cunha, 1993:94-99, Mesquita, 2003:33-51; Carmo, 2004, Aparentemente, essa visia da Ministério Pablica como magistratura vem de sua evolucao historica decorrente da sepa: ragio das fungBes de acusar ejulgar, que antes eram cumuladas pelo juiz no sistema inquisitivo,e que hoje the 6 atributda para complementar o funcionamento da Administracao da justica Penal. Seu enquadramento constitucional dentro do Po- ‘der Judicial parece refletira antiga posigao de Dias, 2004:361-394, de que o Ministério Publico ¢ um érgao aut6nomo de administragao da justica, uma ‘magistratura paralel,cujas atividades convergem para um fim comum, 0 cumprimento do fim da justica penal (puni¢ao dos eriminosos), de Sorte que a Ministério Publico teria uma “funcéo de colaboracao com o juiz na descoberta da verdade e na realizagao do direito” (Dias, 2004-365), obedecendo a critétios de estrta lega- lidade e objetividade (tmpossoalidade). Sobre estatuto constitucional e processual penal da Policia em Portugal, ver Cunha, 1993:99-104; Mesquita, 2003:121 etsey. Sobre esse conceito aberto de OPC no CPP portugues, Costa, 1994:239, arma que essa técnica legislativa “espelia vantagern da eficticia do esvaziamento de tenses institucionais, se bem que possa permitir wma definigdo muito vasta, atra: ds das lets de polict, do que sefam OPC" Sobre as diversas insttuigdes de que pode se servir o Ministério Pablico para serem OPC ea polémica sobre a (no) admissibilidade dea guarda municipal exercer funges de prevengo criminal: ver Valente, 2009.76. 67 68 Diregtio da Investigagio criminal pelo Ministério Piblico e autonomia técnica e téctica dos érgdos de polfcla criminal 1. 49/2008, art. 6)"2. Os eventuais conflitos entre as forcas policiais sao solucionados pelo Ministério Piiblico, que deve “promover a cooperacdo entre os érgaos de policia criminal envolvidos, através das formas consideradas adequadas”. (art. 5.3 e art. 9 da LOIC). No processo penal portugués, os OPC’s sao vistos como “auxiliares dos sujeitos processuais”, ou ainda como “sujeitos processuais acess6rios” (Dias, 1988:12). Todas as investigagdes criminais conduzidas por essas instituic6es devem ser dirigidas pelo Ministério Publico. No sistema portugués, a Polfcia possui autonomia organizacional, técnica e tatica, mas atua sob a dependéncia funcional do Ministério Piiblico. Isso significa que se trata de duas organizacées distintas, tendo a Policia autonomia para organizar in- ternamente seus servigos, ainda que haja mecanismos de possfvel participagao na gestio administrativa da Policia (como a possibilidade de os cargos diretivos de ni- vel nacional ou territorial serem ocupados por Magistrados Judiciais ou do Ministé- rio Piiblico)'*. A dependéncia funcional se expressa na condugao das investigacées, que esto sob responsabilidade do Ministério Piblico, mas s4o executadas pela Po- licia'§, O Ministério Piiblico expede diretivas com requisicées de diligéncias & Policia, que é vinculada a sua obediéncia; se eventualmente um agente de policia entende que a ordem é ilegal deve consultar seu superior, que se também tiver esse entendi- mento deverd consultar o superior do magistrado do Ministério Puiblico, para sanar o impasse”®, 0 Ministério Piblico dirige o que seré feito e a Policia como e quando sera feito, de forma a assegurar a seguranga dos policiais e a eficiéncia da diligéncia””. ‘Também questdes organicas ou relativas ao funcionamento interno da hierarquia Sobre a delegacdo de diligéncias em um processo especifica, ver Mesquita, 2003:149. Ha regras pré-estabelecidas para fixacdo genérica da competéncia das diversas Policas, mas os casos imitrofes de competéneia s4o solucionadas pelo Mi nisterio Pablico (conforme Lei n. 49/2008, art §.3, art. 8° e 9°), o que, em termos praticos, acaba por transformar o M- histério Publico portugués em um érgao de classificacao das competéncias das Policias, ou de solugao de seus conflitos de competéncia. Também os funciondrias do Ministério Pablico equiparam-se a OPC para as diligéncias delegatlas pelos magistrados do Ministerio Pablico, cf DL n. 343/199 (Bstatuto dos Funciondrios da justiga), Mapa I, alineas“',")"e” Como salienta Costa, 1994:225, a P] & principal insttuicao vocacionada a investigagao criminal, bem como ¢ a prota~ gonista dos prineipais atrtos institucionals com Ministério Publico. ' Nesse sentido: art. 40 da Lei n.37/2008 (Lei Organica da Policia Judiciaria). 35 A dependéncia funcional significa que os OPC’s obedecem as ordens emanadas do Ministério Pablico na dirego do in~ ‘quérito; hd portanto, uma dupia dependénecia funcional: estio tanto incluidos numa estrutura administrativa policial, @ ortanto vinculados aessa hierarquie, bem come devem obediéncia as determinagSes do Ministério Piblicn situagao que fventualmente pode gerar atritos insttucionals (Cunha, 1993:115), mas que devem ser solucionados com a aproxima- ‘Glo comunicativa entre as instituigbes (Moura, 2009:83-82). Em relagdo 8 coadjuvagio da Policia a0 Ministério Publica, vvor ainda: Mesquita, 2003:128, Dias, 2004:398-400, Silva, 2008:269-283, "A principio, vinculagao policial ao atendimento da requisicao é tamanha que alguns autores chegam a utilizar a ex: pressio “ordem": Albuquerque, 2009:697 e Silva, 200969. Todavia, Cunha, 1993:118, entende que, tecnicamente, o Mi- histério Pablico nio expece ordens, mas diretivas, j& que “enquanto a ordem implica um ato de mera execucdo (mera mente aplicativo, mecdnico) a diretiva implica da parte do ente subordinado urna ctitude valorativa, palo menos quanto d {forma e meios da sua execupio” Destacando que se houve questionamento da diretriz, esa ser analisada em dltima ins~ tincia dentro do proprio Ministério Pablico, ver Moura, 1986:106, ‘Cunha, 1993:132. 0 conceito de autonomia técnica e tética & dado pela Lei n. 49/2008 (LOIG), art 2.6: “A autonomta técnica assenta na utilizagtio de um conjunto de conkecimentos e métodos de agir adequacios ea autonomia técticn consiste ina escolha do tempo, lugar ¢ modo adequados & prética dos actos correspondentes ao exercicio das atribuigdes legals dos ope’: Thiago Pierobom de Avila policial esto subtraidas do poder de direcao do Ministério Pablico, j4 que a depen- déncia organizatéria, administrativa e disciplinar da Policia é feita pelo Poder Exe- cutivo"®. Ha uma relagao de interdisciplinaridade complementar entre Policia e Mi- nistério Publico, com supremacia do Ministério Pablico na direcio da investigacao criminal, mas sem hierarquia (Cunha, 1993:147). Assim, quando um OPC toma conhecimento de um crime, possui a obrigacao de rea- lizar a comunicagio do fato ao Ministério Publico, no prazo maximo de 10 dias (CPP, art. 248.1). Apés tomar conhecimento do crime, havendo indicios minimos do fato, © Ministério Publico profere um despacho instaurando o inquérito, podendo delegar (dar por encargo) a realizaco de diligéncias aos OPC’s ou avocar a investigacdo para que ele mesmo a conduza. Ha diligéncias que so privativas do Ministério Publico, portanto, ndo podem ser delegadas (art. 270.2 do CPP portugués). No caso de avocar a investigacao, as diligéncias podem ainda ser delegadas aos funcionarios do Minis- tério Puiblico ou conduzidas diretamente pelos magistrados do Ministério Piiblico”. Para maioria dos crimes ordindrios, conduto, j4 hd delegagdes genéricas feitas pelo Procurador-Geral da Reptiblica autorizando os OPC’s aja iniciarem as investigasées, sempre com comunicacao imediata das diligéncias ao magistrado do Ministério Pti- blico competente para fiscalizar concretamente aquele inquérito**, Assim, hé dois ti- pos de delegagdes: especificas (com uma lista de diligéncias para serem realizadas num processo concreto, jd instaurado) ou genéricas (para que a Policia jé defina pre- liminarmente 0 rumo das investigagées, a uma lista de crimes predeterminada). A instauragao de inquérito para investigagao de crime é obrigatéria, conforme art. 262.2 do CPP, que acolhe o principio da legalidade no ambito da investigacao, segundo o qual nao ha investigacao criminal fora do inquérito conduzido pelo Ministério Puiblico (instituctonalizando 0 monopélio da investigacao criminal pelo Ministério Pablico), bem como o principio da obrigatoriedade*. ® silva, 2008:270; Mesquita, 2003:129; Moura, 1988:107. Para Casta, 1994:235, o exereicio do poder de orientasao do Ministério Piblico deve respeitar a estrutura administrativa e orgdnica das entidades policiais. Assim, cabe a0 superior hlerdrquico na Policia definir qual funcionério desempenharé a dilizéncia requerida pelo Ministério Pilblico,e assegurar que esse desempenho se dé de forma eficiente. Apesar desse entendimento corrente, registre-se que hé irresignapdes no Ministério Piblico quando ocorre interferéncia politica na P| para remover funclondrios que estavam sendo "excessiva- mente eficientes’. Nesse sentido, ver critica de Almeida, 2006:207, que defence quea direcao de P| ndo deveria poder re- ‘mover funcionérios que esto no exercicio de uma investigacao sem a prévia autorizacao do magistrado que lhe encar- regou as diligéncias (ctande casos concretos de interferncla politica - como o caso Apito Dourado), » Expressdo utilizada por Valente, 200%:120, lembrando que essa relado em verdade ultrapassa os limites do processo ppenal, também atuando em areas como o direito civil (arrestos, egistros de acidentes de transito), direito administra tivo (interdi;o de vias pGblicas) e eventualmente de trabalho (em operagdes conjuntas com outras institui¢oes (SEF ou IGT) quanto as condigbes de trabalho), ® Bstabelece o Din. 343/1999 (Estatuto dos Funcionarios da Justisa), Mapa | alfneas “Je "I", que compete aos fan- ciondrios da estrutura co Ministério Pablico all designados exercer no ambito do inquérito as funcSes que competem aos OPC's ou seja, executar as diligéncias de investigacao que Ihes forem incumbidas pelo magistrado do Ministério Pablico Nesse sentido, ver Mesquita, 2003:147. Também defendendo essa posstbilidade, ver Moura, 1988:105, * portugal, 2002. ® Sobre o principio da obrigatoriedade, ver Moura, 1988-99, 69 70 Diresdo da Investigasao criminal pelo Ministério Publico e autonomia técnica e tactica das 6rgios de policia criminal A tramitagao do inquérito é direta entre 0 Ministério Ptiblico e os OPC’s, havendo in- tervengao do juiz de instrucao de forma pontual apenas nas diligéncias que por lei ne- cessitem expressamente de sua intervencdo (a lista dessas diligéncias consta dos art. 268 e 269 do CPP portugués). 0 juiz de instrugao possuia “tarefa essencial [..] de controlar os atos do Ministério Puiblico que contendam diretamente com direitos e li- berdades do arguido” (Albuquerque, 2009:637)®. Apés a conclusao do inquérito, o Ministério Publico pode decidir pelo arquivamento ow o oferecimento de acusacao piiblica (esta correspondente a dentincia no sistema brasileiro). 0 arquivamento poderia violar interesses da vitima e o oferecimento de dentincia poderia ofender interesses do acusado. Em ambas as situagées é possfvel que os que se sintam prejudicados com a decisao do Ministério Publico solicitem a abertura da instrugao preliminar, que é um procedimento conduzido pelo juiz de ins- trugao destinado a verificar 0 acerto da decisao do Ministério Publico (de arquiva- mento ou de acusa¢ao). Na instrucao, o juiz de instrugao possui poderes de investi- gar livremente o caso, assistido pelos OPC’s (art. 288 do CPP portugués), seguindo-se um debate instrutorio entre as partes. Caso se confirme o acerto da decisao de acusar, verificando-se a presenga de indicios suficientes da pratica de crime e sua autoria, o juiz de instrugao proferira uma decisao de prontincia, submetendo o réu a fase de julgamento. A fase de instrucao nao ocorre nos procedimentos especiais (art. 286.3 do CPP portugués) e esta limitada ao fato que lhe é proposto pela acusagao, portanto, configura-se como uma fase de “comprovagio judicial” (e nao uma fase livre para in- vestigar)™. A fase de julgamento sera conduzida por um juiz diverso do juiz de ins- truco. Assim, inquérito, instrugao e julgamento serao fases processuais conduzidas respectivamente pelo Ministério Puiblico, juiz de instrugao e juiz, todos considera- dos pelo cédigo como “autoridades judiciarias”**. Jano Brasil, a Constituigo da Reptiblica Federativa do Brasil - CRFB/1988 positivou em seu art. 129, inciso I, o sistema acusatorio, ao prever que compete privativamente © Ver ainda: Silva, 2009:163. Ressaltando a inexisténcia de qualquor responsabilidad conjunta ou solidéria entre Mi nistério Publico¢ juiz de instrucdo na fase do inquérito, ji que essa fase esta sob exclusiva dominio do Ministério Pablico (cxceto a intervengao provocada para as medidas restritivas de direitos fundamentais), ver Mesquita, 2003:171, 0 qual Indica que o juiz atua como um “|ulz de liberdades”. Ainda que na fase de instrugao os OPC's estejam a disposicao do juz de instrugio, trata-se aqui de uma vinculasao ce "grau intermédio", quando comparada & vinculacdo 20 Ministério Pi- biico na fase do inguérito, aqui uma vinculaezo de “grau méximo ou mats forte” cf. Dias, 1988:23. * Dias, 1988:16, para o qual essa vinculaco do juiz de instrucdo ao fato que Ihe é submetido é uma derivagio da maxima acusatoriedade exigida pela CRP, art. 32.5. Como adverve Costa, 1994:240, a instrugao no deveria ser alargada para ser ‘um autZinomo suplemento de Investiga¢ao decorrente do inguérito, mas sim um momento processual de camprovacao (apeser relatar a tendéncia da jurisprudéncia de alargamento do espago cognitiva dessa fase) © Moura, 1988:98.0 objeto central desse traballio ndo ¢o de verificar 0 acerto ou nio desse modelo de instrucio preliminar no sistema portugués. Contudo, nao podemos deixar de registrar que esse modelo, ainda que justificado na necessidade de ‘conferir algum nivel de contraditério entre a acusago eo inicio do julgamento, parece pecar por conferir um estatuto du plo ao juz de instrugZo: ele ser o investigador que julgard sobre o recebimento da deniincia e sobre a restrigao de direi tos fundamentais durante a instrucio. Criticando 0 “impeto da Constituigio eserita’, e advoganda uma “interpretagio di- namica’, ver Moura, 1968: 109. Criticando a duplicagdo de procedimentos entre inguéritoe instruczo, ver Pereira, 2004:122. Defendendo que os casos de tnvestigacao ex officio pelo tribunal deveriam ser residuais, ver Mesquita, 2003:63, ‘Thiago Pierobom de Avila a0 Ministério Pablico promover a aco penal ptiblica. Todavia, ao contrario, a legis- lagao infraconstitucional brasileira atribui formalmente a diregao da investigacao criminal as autoridades policiais (que, alias, se expressa no préprio nome do proce- dimento: inquérito policial - IP), ainda que materialmente haja varias disposigdes que permitam ao Ministério Publico requisitar diligéncias a autoridade policial e, nessa medida, se crie materialmente uma gestao compartilhada do direcionamento da investigacao. Em regra, a comunicacao do delito ¢ feita as autoridades policiais, que possuem autonomia para diretamente instaurar um procedimento de investi- gagdo criminal (ainda que a lei também admita que as comunicagdes sejam encami- nhadas diretamente ao Ministério Puiblico - CPP, art. 27). Para as infragoes de menor potencial ofensivo (com pena maxima nao superior a dois anos) 0 procedimento seré um termo circunstanciado - TC, com uma série de simplificagées procedimentais previstas na Lei n.9.099/1995 (ver art. 69)*®. Para os demais casos, a autoridade po- licial deveré instaurar o IP, o qual, apés sua instauragao, dever4 ser conclufdo em re- gta no prazo maximo de 30 dias se o indiciado estiver solto ou de 10 dias se o mesmo estiver preso (art. 10, caput, do CPP brasileiro). A previsio do CPP brasileiro, de 1941, 6 a tramitacao triangular do inquérito poli- cial, sendo ele encaminhado ao juiz, que autua 0 procedimento e o encaminha ao Mi- nistério Piblico. Muitos Estados editaram normativas estabelecendo a possibilidade de tramitagao direta do IP, excluindo 0 Poder Judicidrio quando nao ha medidas res- tritivas de direitos fundamentais”. Ao receber os autos do IP, o Ministério Piiblico po- der decidir pelo arquivamento, oferecimento de dentincia ou requisicao de novas di- liggncias*. O art. 82, § 32, da LC n. 75/1993 estabelece que a requisi¢do de diligéncias pelo Ministério Publico é de atendimento obrigatério e seu nao atendimento gera responsabilizagao, de sorte que, ao requisitar novas diligéncias, cria-se material mente uma cumulagao de atribui¢es para a condugio da linha de investigaco. 0 entendimento majoritdrio é o de que 0 juiz brasileiro nao pode participar ativa- mente da fase de investigacao, determinando diligéncias de oficio, pois isso signifi- caria 0 esvaziamento de sua imparcialidade (especialmente porque no Brasil 0 mesmo juiz que acompanha a investigagao sera o juiz que julgaré a posterior acao penal, nao existindo regra de impedimento)”. Também nao pode o magistrado 290 TC consiste em uma narrativa concisa da comunicacio da vitima, a versio do investigado, 0 rol de testemunhas acom- panhado de im breve relato das testemunhas ¢ admissfo de laudo médico em substituicdo 20 tradicional exame de corpo de dito (ainda que na maioria dos casos se continue a utilizar os exames oftcials da polcia), com encamintamento ime diato (ou em data préxima) ao Juizado Especial Criminal para atentativa de conciliarSo ou realizacao de acordo processual. °Exemplos: Provimenta n, 119/2007 da Corregedoria-Geral da Tribunal de |ustisa do Parang; Resolugio n. 10/2017 da Presidéncia do Tribunal de justia do Distrito Federal e Territérios; Resolugao n, 63/2009 do Conselho da justia Federal. * Sobre requisigao do Ministério Pablico, ver art. 16 e 47, sobre o arquivamento ver art. 28, todos do CPP brasileiro. ® Nesse sentido, ver precedente do STF que deciarou inconstitucional o art. 3® da Lei n. 9.034 /1995, 0 qual previaa pos sibilidade de o juiz condusir investigagbes em relagio ao crime organizado, assentando que o juiz nao pode ter iniciativa, na fase das investigases: STP, Pleno, ADI 1570/DF, rel. Min, Mauricio Corréa, j. 12 dea. 2004, D]U 22 out. 2004. n 7 Diressio da Investigacto criminal pelo Ministérlo P6blico e autonomla tévalea e tictica des 6ngios de polfcia criminal indeferir diligéncias ordinarias requeridas pelo Ministério Publico a autoridade po- licial (como oitiva de testemunhas ou pericias ordinarias). Sua atuacdo decisiva est na apreciagao das medidas restritivas de direitos fundamentais, como a decretagao da prisao preventiva, busca domicilidria, interceptacées telefénicas e quebra do sigilo bancario, fiscal e telefénico (entendendo-se como este tiltimo 0 acesso aos extratos das ligagées telefdnicas), as medidas investigativas mais intrusivas tfpicas da crimi- nalidade organizada, como concessao de colaboracdo premiada, interceptacao am- biental, fiscalizac4o a posteriori da aco controlada e infiltra¢io policial (Lei n. 12.850/2013), ou ainda as intervengGes corporais legalmente qualificadas, como a extracao de amostra corporal para obtencao de perfil genético (Lei n. 12.037/2009 com as alteracbes da Lei n. 12.654/2012). 0 juiz também exerce a funcao anémala de fiscal do principio da obrigatoriedade da acao penal, pois quando 0 Ministério Publico decide pelo arquivamento o magistrado deve fiscalizar se realmente era 0 caso de se arquivar e, caso discorde dessa posicao do Ministério Publico, podera encaminhar os autos do IP ao Procurador-Geral de Jus- tiga para eventual reapreciagao dessa decisao de arquivamento, a qual se for confir- mada ser acatada pelo magistrado. Assim, ainda que formalmente seja 0 juiz a de- cidir pelo arquivamento do IP, em tiltima instancia a palavra final sobre essa questo pertence ao Ministério Ptiblico, levando muitos doutrinadores a afirmar que mate- rialmente o Ministério Puiblico decide e 0 juiz homologa 0 arquivamento do 1P**. £ ve- dado as autoridades policiais arquivarem o IP, cf. art. 17 do CPP brasileiro. Também 6 vedado ao juiz arquivar 0 IP sem manifestacao do Ministério Puiblico nesse sentido, exceto na situagdo excepcional de atipicidade manifesta. No Brasil, a investigacao criminal é conduzida basicamente pela Policia Civil (no &m- bito estadual) e pela Policia Federal (no ambito federal) ¢ o funcionario piblico en- carregado de coordenar as investigacées (até requisi¢o ministerial em sentido con- trario) chama-se delegado de policia; no ambito estadual as atividades de policiamento ostensivo e de seguranca s4o desempenhadas pela Policia Militar, a qual, contudo, néio exerce fungSes de investigacio (exceto dos crimes militares pra- ticados por seus membros)°. Em Portugal, 0 inquérito é considerado como uma fase processual, cuja realizagdo obrigatéria no procedimento comum*. Esse carater processual seria acentuado pelo Wer por todos: Rangel, 2009, 3 Ha controvérsias no Brasil sobre a possibilidade ou no de a Policia Militar conduzir Termos Circunstanciados, relati= vos i Lei n. 9.099 /1995, mas nao entraremos nessa discussao por nao ser 0 objeto principal desse estudo. ® Trata-se de um processo antes do exercielo da a¢30 penal, mas tendente ao exercicio do direito de ac3o penal: Dia 1988:8-9, Ver sobre a obrigatoriedade do inguérito no procedimento ordinério: Silva, 2009:77; Mesquita, 2003:94. Se- gundo Albuquerque, 2009:687, 0 inquérito nio seria obrigat6rio nos procedimentos especias (sumério, breviado e su- marissimo); todavia, tal afirmasao nao é endossada por outros doutrinadores. ‘Thiago Pierobom de Avila fato de ser conduzido por uma autoridade judiciaria (o Ministério Publico). Ao con- trdrio, no Brasil entende-se que o IP nao integra a fase processual (que corresponde a fase da acdo penal e que se inicia com o oferecimento da demincia), mas constitui uma fase pré-processual, tendo um caréter administrativo. Também se entende que o IP nao é uma fase obrigatoria para 0 ajuizamento da acusacao, pois se o Ministério Piiblico tiver conhecimento do crime de forma ja respaldada por outras informagoes (vg, uma sindicancia administrativa), poder dispensar a requisi¢ao de instauragao de IP e jé oferecer dentincia com fundamento nessas informacées”’. Em Portugal, o Procurador-Geral da Reptiblica possui a competéncia de fiscalizar su- periormente a atividade dos érgaos de polfcia criminal. Para exercer essa atribuicao de fiscalizacao superior da atividade policial, o PGR portugués pode: a) solicitar aos OPC’s informagées sobre sua atividade investigativa; b) ordenar inspegoes aos ser- vigos policiais, para fiscalizar o cumprimento da lei no ambito da atividade de in- vestigacao criminal; c) emitir diretivas ou instrugdes genéricas sobre o cumprimento da lei pelos OPC’s no Ambito da atividade de investigagao criminald) ordenar a rea- lizagao de inquéritos ou sindic&ncias aos PC's em relagao a fatos praticados no am- bito da investigacao criminal desenvolvida no inquérito, por iniciativa prépria, a so- licitago dos membros do Governo ou por solicitacao dos dirigentes maximos da prépria instituic&o policial (LOIC, art. 16). Como em Portugal nao so os OPC’s a instaurarem e conduzirem o inquérito, eles de- vem dar conhecimento da noticia do crime ao Ministério Puiblico para que este possa dar inicio formalmente ao proceso de investigagao. 0 CPP portugués disciplinaa co- municacao da noticia de crime pela Policia ao Ministério Puiblico como sendo uma “medida cautelar de polfcia” (ep{grafe sobre o art. 248). Essa natureza 6 explicada porque a conducao do inquérito pertence ao Ministério Publico no sistema portu- gués; assim, se a Policia tomar conhecimento de um crime, devera documentar essa informacao de forma cautelar para repass4-la ao Ministério Pablico, que faré 0 juizo de instauracao do inquérito e ordenaré as medidas necessarias para a conducao das investigagSes. Nessa situagao, é Iicito aos OPC’s a realizagao de atos urgentes neces- sarios a preservacao da prova (medidas cautelares e de policia), conforme o art. 249 (Albuquerque, 2009:640; Silva, 2009:67-70). Oart. 248.1 do CPP portugués estabelece a obrigatoriedade dessa comunicagao dar- se no mais curto prazo de tempo, que nao pode exceder a 10 dias. Esse dispositivo, combinado com 0 art. 249 do CPP, que permite a realizacao de diligéncias urgentes pelos OPC’s para assegurar os meios de prova sem ordem do Ministério Publico e ® Por exemplo, se no ambito de uma sindicancia administrativa de érgao pilblico se toma conhecimento da pritica de crime, cdpia dessa sindicancia é encaminhada ao Ministério Pablico e se este entender que ofato jf esti suficientemente provado, poder dispensar a IP e J4 ajulaar a dentinela 73

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