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EM LEITURA DE CHARGES
RESUMO
Este trabalho abordará a leitura e suas relações com a construção de conhecimento, analisando a
imbricação do visual e do verbal em charges selecionadas do jornal Folha de S. Paulo,
objetivando contribuir com o ensino de leitura como prática social. Quanto à concepção de
linguagem, adotamos a perspectiva dialógica, representada por Bakhtin e seu Círculo, que
considera a linguagem como um processo interativo, social, histórico e dialógico. Como
resultado, constatamos a viabilidade e a importância de se utilizar a charge como subsídio para o
ensino de leitura, uma vez que possibilita o aluno adentrar em outros universos, conhecer outros
discursos, discutir sua realidade e ter novas maneiras de expressar sua opinião.
Introdução
Vivemos rodeados de informações que circulam por diversos meios e por diversos
gêneros discursivos, em tempo real, viabilizadas pela informatização e pelos meios
multimídias de circulação, além dos convencionais.
Um elevado número de pesquisas foi e continua sendo realizado sobre os gêneros
do discurso, visando tanto à descrição de gêneros como também a sugestões didáticas
para sua abordagem em sala de aula. Essa postura visa atender à proposta dos Parâmetros
Curriculares Nacionais (PCNs) de fundamentar o ensino da língua materna nos gêneros
do discurso, sejam eles orais ou escritos. Isso nos leva a crer que os alunos serão os
maiores beneficiados, pois estudarão na sala de aula gêneros discursivos com que lidam
no seu cotidiano.
Tendo em vista que as atividades de leitura devem permitir ao aluno ampliar e
desenvolver sua capacidade discursiva, que está intimamente ligada à sua formação
social, e consequentemente ao uso social da linguagem, torna-se relevante a utilização
1
Doutora em Linguística pela UFPB; professora do Instituto Federal do Tocantins – IFTO.
E-mail: anrpaula@yahoo.com.br
- demonstrar que a charge não deve ser vista como um texto isolado, e sim como um texto
cujo significado assenta-se nas suas intersecções com outras produções textuais,
alargando-se a concepção de intertextualidade;
- mostrar que a charge informa e opina sobre um tema por meio da representação de um
mundo “às avessas”, aguçando pela própria inversão de valores sociais que promove uma
visão mais límpida da realidade, despertando, assim, o aluno para este tipo de leitura.
Análise do Corpus
2
Trecho do discurso de posse do Presidente Luíz Inácio Lula da Silva. Disponível em:
<http://www.sfiec.org.br/artigos/temas/discurso_de_posse_do_presidente_Luiz_Inacio_Lula_da_Silva.ht
m>. Acesso em: 20 set. 2014.
Na charge I, nota-se o desenho de uma família pobre, numerosa, mal vestida, com
perfil padrão para ser beneficiada pelo programa Fome Zero. No cenário, percebe-se que
as moradias são precárias, falta coleta de lixo e falta saneamento básico. A família e um
cachorro vira-lata encontram-se diante de uma casa, em um local de rara vegetação, onde
provavelmente ocorre o fenômeno da seca. Na parte superior da casa, como também nas
demais casas em volta, há um outdoor com a logomarca da campanha Fome Zero. Na
logomarca não faltou a bandeira brasileira estilizada, recurso comum na publicidade
política. A marca do programa é composta por um garfo e uma faca sobre um prato azul
colocado em cima de uma mesa retangular verde com toalha amarela em formato de
losango. Em baixo do desenho aparece a frase: “Fome Zero”.
Na parte verbal do texto, o título da charge “A alma do negócio” retoma a ideia já
muito conhecida e repisada e que estamos acostumados a ouvir o tempo todo que a
“propaganda é a alma do negócio”. Em outras palavras, o que se tem admitido
corriqueiramente é que sem publicidade, nenhuma atividade pode prosperar.
Por outro lado, uma análise mais atenta da expressão pode nos conduzir a
inúmeras inquietações próprias do nosso tempo. Nesse sentido, não deve ser absurdo
pensar que o negócio devesse ter sido submetido a um processo de “humanização”, e não
causar estranhamento falar que um negócio tenha alma. E essa alma, tal qual a humana,
não é uma entidade concreta, mas abstrata, imaterial. Dessa forma, podemos fazer uma
leitura de que o programa Fome Zero pode configurar-se apenas em um projeto ilusório,
de difícil concretude. Essa desconfiança sobre a concretização do programa do governo
também fica implícita quando o homem dirige-se à sua esposa dizendo: “Tenha calma,
mulher! A propaganda eles já lançaram, agora só resta criarem o produto!”.
Charge II
A charge II, assim como a charge I, tem como tema o programa Fome Zero. O
interessante é que ela foi publicada três anos depois da charge I. Por que será que Angeli
produziu essa charge?
Quanto ao conteúdo temático, temos outro momento contextual, as eleições de
2006. No dia 24 de junho de 2006, três dias antes da publicação da charge, o presidente
Luiz Inácio Lula da Silva se lança como candidato à reeleição. Na oficialização de sua
candidatura, Lula falou:
Volto a ser candidato porque o Brasil, hoje, está melhor do que o Brasil
que encontrei três anos e meio atrás, mas pode - e precisa - melhorar
Assim, o presidente Lula se colocava mais uma vez como o homem que poderia
resolver os problemas sociais brasileiros. Os bons resultados de programas criados para
combater à pobreza, como o Bolsa-Família, principal instrumento do Fome Zero, foram
decisivos para sua candidatura à reeleição.
Intertextualmente a charge II se relaciona com o lançamento da candidatura de
Lula à reeleição, o qual prometia que no segundo mandato continuaria avançando na
erradicação da fome e no combate à pobreza. Em um tom denunciante, o chargista está
cobrando as promessas realizadas por Lula naquele primeiro de janeiro de 2003.
3
Trecho do discurso de candidatura à reeleição do Presidente Luíz Inácio Lula da Silva. Disponível em:
<http://www1.folha.uol.com.br/folha/brasil/ult96u79810.shtml>. Acesso em: 27 set. 2014.
Referências
ABSTRACT
This work will approach the reading and their relationships with the knowledge construction,
analyzing the overlap between the visual and verbal charges selected in the newspaper Folha de
S. Paulo, aiming to contribute with the teaching of reading as social practice. As conception of
language, we adopt the dialogical perspective, represented for Bakhtin and his Circle, that the
language considers as an interactive process, social, historical and dialogical. As result, we
evidence the viability and the importance of using the charge as a subsidy for the teaching of
Recebido em 29/04/2015.
Aprovado em 30/06/2015.