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Curso de Fisiologia 2013 Ciclo de Neurofisiologia 120

Departamento de Fisiologia, IB Unesp-Botucatu Profa. Silvia M. Nishida

FISIOLOGIA MUSCULAR

MUSCULATURA DO CORPO

Tendemos a pensar que movimento está sempre associado ao deslocamento do organismo, isto
é, a mudança dele de um lugar para o outro. Pensar assim é uma ilusão, pois vários movimentos estão
sendo realizados enquanto estamos parados: os dedos coçando um ponto do corpo; o estômago
misturando e propelindo o seu conteúdo; o coração ejetando e fazendo circular o sangue através do
sistema circulatório, o diafragma e os músculos intercostais garantindo a respiração, etc.
Os órgãos efetuadores de movimento do nosso corpo são formados de células musculares
geradores de tensão mecânica e são de três tipos histológicos: fibras musculares estriadas
esqueléticas e cardíacas e fibras musculares lisas.

Fibras musculares esqueléticas Fibras musculares cardíacas Fibras musculares lisas

Formam o tecido muscular esquelético, Formam o coração cujo órgão funciona Formam os demais órgãos viscerais do
cujos músculos em sua maioria está como uma bomba ejetora cíclica, corpo (bexiga, trato gastrointestinal,
associada a esqueletos; são propulsionando o sangue através dos útero, etc.). Como a musculatura
responsáveis pela execução de vasos. cardíaca está apenas sob controle
atividades voluntárias e reflexas do reflexo.
organismo.

A grande maioria do músculo estriado esquelético está associada ao esqueleto e garante a


execução de movimentos e posturas do nosso corpo possibilitando a sua relação com o meio externo
(obter água e nutrientes, relacionar-se com outras pessoas, defender-se contra as adversidades, etc.).
Nem toda musculatura estriada chamada esquelética está diretamente associada aos elementos ósseos
como os esfíncteres anais, vesicais e a musculatura facial. Os movimentos desejados ou intencionados
é possível porque exercemos controle voluntário de áreas corticais associativas motoras diretamente
sobre os núcleos motores somáticos da medula e do tronco encefálico. Já a atividade das fibras
musculares lisas e cardíacas (assim como das glândulas) não estão sujeitas ao domínio consciente (a
não ser que você, intencionalmente, simule medo ou ansiedade como fazem os atores. Ao “dar vida” à
personagem, o ator poderá simular o estado emocional planejado e recrutar o conjunto de reações
somáticas e viscerais apropriados ao contexto.
Seja como for, a expressão motora somática revela uma infinidade de movimentos, dos mais
sublimes (artísticos), complexos (produção de ferramentas tecnológicas), elaborados (linguagem) aos
brutos (lutas). Veremos que a expressão motora somática está, intimamente, articulada a ajustes
viscerais (respiratórias, fluxo e pressão sanguínea, metabólicas) e endócrinas.

Distribuição e características da musculatura esquelética

Nos animais vertebrados, a musculatura esquelética


corresponde aproximadamente a 40% do peso corporal e os
demais tipos de tecido muscular (liso e cardíaco), apenas 10%.
Além do sistema músculo-esquelético expressar os nossos
padrões de comportamento gerando tensão mecânica,
desempenha outras funções fisiológicas como na
termorregulação (gerador de calor), jejum prolongado
(neoglicogênese).
Os músculos podem movimentar partes do corpo
porque cada extremidade de um músculo está presa a um osso
por meio de um tendão que muitas vezes se estende sobre uma
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articulação. Os músculos deslocam 2 ou mais ossos através de uma articulação móvel, ou então,
deslocam tecidos. A maioria das articulações possui dois grupos de músculos funcionalmente distintos:
os músculos flexores que em atividade diminui o ângulo articular e os extensores cuja ação
antagônica aumenta o ângulo. Um movimento pode ser simples, envolvendo alguns grupos musculares
(por exemplo, o movimento de flexão da perna) ou muito complexos, envolvendo ações coordenadas de
vários grupos musculares, como numa dança ou no lançamento de disco. Por traz desta complexidade
aparente de movimento, está o circuito nervoso envolvido.

Classificação funcional do músculo esquelético

Os músculos são classificados, funcionalmente em músculos flexores, extensores, abdutores


adutores, pronadores ou supinadores. Nos animais quadrúpedes os músculos extensores dos
membros anteriores e posteriores garantem que o corpo se mantenha
em pé, sustentando o peso do corpo contra a gravidade. Por isso, os
músculos extensores são também chamados de músculos anti-
gravitacionários. Nos seres humanos que são bípedes, os músculos
extensores dos membros inferiores, do tronco e do pescoço garantem a
postura ortostática e os membros anteriores são mantidos livres para
realizar tarefas como carregar objetos enquanto se locomove ou
manipular e fabricar utensílios. Nosso design corporal está adaptado
para caminhar e correr sobre os dois pés.
Outra classificação que auxilia muito quando levamos em conta
o controle do SNC sobre o movimento e a postura do corpo é a
diferenciação dos músculos em mediais (axiais e proximais) e laterais
(distais). Os músculos da cintura pélvica e escapular (=músculos
proximais dos membros) e da coluna vertebral (=músculos axiais) são
responsáveis pelo equilíbrio postural e ereto do nosso corpo. Já os
músculos distais dos membros e dos movimentos intrínsecos dos
dedos, por exemplo, não participam primariamente da postura, mas de
atividades relacionadas com a manipulação.

Fontes de energia da contração muscular esquelética

Para que o músculo possa entrar em e manter a sua atividade, necessita de energia metabólica,
ou seja de ATP. Ao ser hidrolisado enzimaticamente, parte da energia liberada é utilizada para a
geração de força mecânica e a outra parte é perdida na forma de calor. Como a disponibilidade de ATP
é pequena nas fibras musculares, é necessária uma fonte adicional de energia como o fosfato de
creatina que transfere o grupo fosfórico para o difosfato de adenosina e restaura rapidamente os níveis
de ATP. Mas como a fonte de fosfato de creatina é muito limitada, num exercício muscular prolongado, o
ATP passa a ser obtido pela oxidação completa de carboidratos e de ácidos graxos. A fonte de
carboidrato muscular é armazenada na forma de glicogênio (cerca de 0,5 a 2% do peso muscular
fresco) e contribui com cerca de 100 vezes mais do que a fonte de fosfato de creatina. Conforme as
propriedades mecânicas das fibras musculares serão utilizadas o metabolismo aeróbico ou anaeróbico
como estudaremos mais tarde.
Assim, num exame cuidadoso da musculatura, é possível observar depósitos de glicogênio
dentro das fibras musculares e de tecido gorduroso entremeando as fibras musculares.

Níveis de organização morfológica do músculo esquelético (para melhor consolidação das


informações veja os vídeos A Contração Muscular – Meis, UFRJ)

Devemos conhecer bem a organização morfológica da musculatura esquelética para


compreendermos os mecanismos da contração muscular. O músculo esquelético é constituído de feixes
paralelos de fibras musculares cujas células possuem diâmetro que variam de 10 a 80 m e
comprimentos de algumas a dezenas de mm. Cada fibra muscular é envolvida por uma membrana
denominada sarcolema, constituída de uma membrana citoplasmática e uma camada fina de
polissacarídeos e de fibrilas de colágeno. As fibras musculares afunilam-se em suas extremidades
fundindo-se com os elementos fibrosos e tendinosos que se ligam aos ossos. Entre os feixes de fibras
musculares estão os suprimentos sangüíneos, nervosos e tecidos adiposo.
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Dentro da fibra muscular estão as miofibrilas (feixes cilíndricos de proteínas) dispostas


paralelamente, apresentando padrões repetitivos de estrias transversais. Os pacotes de miofibrilas estão
mergulhados no mioplasma intercalados por grânulos de glicogênio, enzimas glicolíticas e produtos
intermediários, ATP, ADP, AMP, fosfato, fosfato de creatina, eletrólitos e outras estruturas subcelulares.
O retículo endoplasmático das fibras musculares (retículo sarcoplasmático) armazena íons Ca++ e
possui canais de Ca voltagem-dependentes. O retículo sarcoplasmático (RS) é uma estrutura volumosa
(14% da fibra), formada de túbulos que se anastomosam e acompanham as miofibrilas; possuem
extremidades que terminam em sacos (cisternas terminais). Neste ponto, são trespassados pelos
túbulos transversais (túbulos T) que se originam do sarcolema formando uma estrutura tríade. Os
túbulos T dispõem-se perpendicularmente ao RS e às miofibrilas, formando uma rede transversal e
reticulada no interior da fibra muscular. Funcionalmente comunicam o meio extracelular
transversalmente ao longo da fibra muscular.

Organização molecular do sarcômero

As miofibrilas possuem unidades repetitivas denominadas sarcômeros. O sarcômero constitui a


unidade contrátil da fibra muscular e está limitada pelas linhas Z. No músculo de todos os vertebrados,
o comprimento do sarcômero é semelhante sendo em torno de 3,5m no estado de repouso e de 1,5m
quando contraído. Cada sarcômero apresenta uma organização molecular constituída de filamentos
finos e filamentos grossos. A partir da linha Z, os filamentos finos estendem-se paralelamente para
ambos os sentidos sendo intercalados pelos filamentos grossos, apenas na região central do sarcômero.
Tal organização produz um padrão de bandas transversais que varia conforme o estado de contração
muscular. Os filamentos grossos são constituídos de macromoléculas de miosina e os filamentos finos,
de moléculas de actina, tropomiosina e troponina.
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A miosina corresponde a 55% da proteína miofibrilar e cada filamento grosso é formado de 200
a 400 dessas macromoléculas; Cada miosina é formada por duas cadeias: uma leve e outra pesada. Na
cadeia pesada a cabeça possui dois sítios ativos: uma que possui alta afinidade pela actina e uma outra
catalítica que hidrolisa o ATP. As moléculas de miosina se juntam e formam um feixe de forma que as
cabeças ficam destacadas do eixo principal e fisicamente próximos aos filamentos de actina. Apesar da
elevada afinidade que as moléculas de miosina tem pela actina, o músculo em repouso (relaxado) tem a
as moléculas de tropomiosina obstruindo o sitio de ligação entre elas.
A actina constitui 20 a 25% da proteína miofibrilar e ocorre em duas formas (actina G e actina
F) que, quando polimerizadas, formam cordões duplos helicoidais. Cada molécula de actina G liga-se
com grande afinidade a um íon Ca++ e a uma molécula de ATP.
A tropomiosina é uma molécula formada por duas cadeias peptídicas separadas e que estão
enroladas entre si.
A troponina é uma proteína globular com função reguladora e possui três subunidades: C que
++
se liga a íons Ca ; I que é inibitória e T que se liga à tropomiosina. No músculo relaxado as moléculas
de tropomiosina estão obstruindo o sítio de ligação da actina com a miosina...como estes sítios de
ligação são desobstruídos?

Antes de prosseguirmos vamos apropriar de alguns conceitos básicos.

Unidade motora

As fibras musculares esqueléticas só se contraem sob comando neural (diferente da


musculatura cardíaca e lisa que possuem propriedades miogênicas). Lembremos que a musculatura da
cabeça e do pescoço é inervada por motoneurônios situados respectivamente no tronco encefálico e
porções mais altas da medula cervical; todos os demais músculos do corpo são inervados por
motoneurônios de origem medular.
Uma fibra muscular só recebe a inervação de um único motoneurônio, mas o motoneurônio
pode inervar várias fibras musculares. Chamamos de unidade motora o motoneurônio e as fibras
musculares por ele inervadas. O tamanho das unidades motoras varia: podemos encontrar unidades
motoras cuja relação de inervação de um único motoneurônio inervando 1700 fibras musculares ou
apenas dezenas. Quanto menor é um músculo e menos fibras musculares um motoneurônio controla
maior será a precisão motora como é o caso dos músculos oculares extrínsecos.
Os motoneurônios que inervam as fibras musculares são todos mielinizados e são do tipo A
cujos axônios ao se aproximarem das fibras musculares ramificam-se e perdem a bainha de mielina. Os
terminais se justapõem a uma depressão do sarcolema denominada placa motora. A placa forma
muitas pregas juncionais e a região pré-sinaptica possui zonas ativas onde a acetilcolina (Ach), o NT
exclusivo de todas as junções neuromusculares esqueléticas são secretadas.
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O mecanismo de neurotransmissão na junção é o mesmo já estudado na transmissão sináptica


nervosa. Os receptores de ACh são nicotínicos (ionotrópicos) e ao se ligarem a ACh abrem canais
iônicos causando influxo resultante de Na e provocando PEPS. O potencial elétrico despolarizante é
chamado potencial de placa motora e propaga-se para fora da placa abrindo canais de Na e K
voltagem dependentes distribuídos ao longo de todo o sarcolema e dos túbulos T. A freqüência dos PA
gerada nas unidades musculares é diretamente proporcional a freqüência de estimulação do neurônio
motor. E lembre-se: as fibras musculares esqueléticas só se contraem sob estimulação nervosa daí
falarmos em unidade motora.
Cada impulso nervoso libera cerca de 60 vesículas de Ach (cada vesícula contem
aproximadamente 10.000 moléculas de Ach), suficientes para desencadear um potencial de ação
completo. Entretanto, mesmo em repouso, pacotes de Ach são liberados espontaneamente, produzindo
“microdespolarizações” na membrana pós-sinaptica. A despolarização causada por um pacote de
vesícula (quanta) é denominada potencial de placa em miniatura. Somente com a chegada de
estimulação nervosa e com a liberação de vários quanta de vesículas de ACh é que se torna possível a
produção de um potencial de placa capaz de causar o PA.

Miastenia grave é uma doença auto-imune onde o próprio organismo produz anticorpos contra
os receptores nicotínicos, dificultando a neurotransmissão. Como consequência um dos sinais da
doença é a fraqueza muscular que piora ao longo do dia (Veja discussão de caso na aula teórico-
prática).

Finalmente: como ocorre a contração muscular esquelética?


Veja o vídeo sobre o mecanismo molecular da contração muscular (MEIS, UFRJ)

++
Quando o músculo não está sob estimulação nervosa, isto é, quando está relaxado a [Ca ] no
mioplasma é insignificante em relação ao meio extracelular. Com a chegada do impulso nervoso, a fibra
muscular gera PAs e propaga a atividade elétrica pelos túbulos T atingindo as cisternas do retículo
sarcoplasmático. A função dos túbulos T é a de garantir a rápida propagação da onda de
despolarização em direção às cisternas do RE, interior das quais estão armazenados o Ca++, necessário
para inicio ao processo de contração dos sarcômeros. A despolarização tem a função de abrir os
++
canais de Ca voltagem dependentes (rianodina) que ficam situados nas membranas do túbulos T as
quais estão acoplados a moléculas receptoras de diidropiridina localizadas na membranas da cisterna.
Com a chegada das ondas de despolarização os canais de cálcio abrem-se e os íons se difundem para
o mioplasma a favor do seu elevado gradiente de concentração. Os íons Ca ligam-se com elevada
afinidade aos sítios da troponina C, modificando a sua organização espacial, tornando livre o sítio T
que poderá se ligar à tropomiosina. Agora, o complexo formado pode desobstruir o sítio de ligação da
actina com a miosina. A formação do complexo actina-miosina forma a ponte cruzada entre o filamento
fino e o grosso.

Como a miosina tem um sítio catalítico para a hidrólise de ATP, esta união torna a energia
química disponível para o dobramento da cabeça de miosina e os filamentos finos sofrem um ciclo de
arraste para o centro, isto é, os filamentos finos deslizam-se sobre os grossos de forma que o
sarcômero sofre encurtamento (diminui o se comprimento). Com a hidrólise do ATP, a molécula de
miosina perde a afinidade pela actina, desliga-se restabelecendo a sua posição original. Mas se há mais
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ATP e Ca++ disponíveis no mioplasma, o ciclo das pontes cruzadas restabelece-se e o deslizamento
progride com o encurtamento cada vez maior do sarcômero. Assim, as fibras musculares, como um
todo, encurtam-se. Cada ciclo pode mover o filamento fino cerca de uns 10nm e para cada molécula de
troponina ativa, sete sítios fixadores de miosina são descobertos.

Denominamos acoplamento excitação-contração (ou acoplamento eletro-mecânico), ao


processo em que a atividade elétrica da fibra muscular (PA) é transformada em atividade mecânica
(encurtamento do sarcômero), ou seja, na conversão (transdução) de atividade elétrica em mecânica.

Relaxamento muscular

Se não vier comandos do SNC por meio dos motoneurônios, a fibra muscular deixa de gerar PA
e como conseqüência, os canais de Ca++ voltagem-dependentes se fecham. As moléculas de ATPase
++
Ca dependente situadas sobre a membrana da cisterna seqüestram ativamente os íons de volta para
dentro do reticulo. Com a troponina sem o Ca++, a tropomiosina volta a impedir a ligação da miosina com
a actina, provocando o relaxamento muscular.

Rigor mortis
Com a morte vem a falência circulatória, falta de oxigênio e a
inoperância do controle nervoso sobre a musculatura. A desnaturação de
proteínas faz com que os íons Ca++ extravasem para o mioplasma e o
músculo começa contrair progressivamente utilizando a via anaeróbica. A
contração progride e não haverá relaxamento o que leva ao estado de rigor
mortis, ou seja, estado de enrijecimento muscular generalizado. A instalação
completa da rigidez vai de 10 minutos a muitas horas após a morte; é
bastante dependente da temperatura. Este estado não é permanente já os
filamentos contráteis sofrem autólise. Durante a instalação da rigidez, ocorre
uma queda brusca de pH por causa do aumento de acido lático (glicólise).

MECÂNICA DA CONTRAÇÃO MUSCULAR


O sistema contrátil depende da concentração de Ca++ disponível no
mioplasma, ou seja, da freqüência com que as fibras musculares da unidade
motora estão sendo estimuladas. Para cada PA em uma unidade motora
ocorre um abalo mecânico (ou espasmo muscular) ou uma breve
contração seguida de relaxamento. O abalo começa uns 2 ms após o inicio
da despolarização e sua duração varia de acordo com tipo de fibras
musculares, ou seja, se são de contração rápida ou lenta.
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Cada abalo apresenta uma resposta mecânica do tipo tudo-ou-nada; se um segundo estimulo
for aplicado antes que o relaxamento do primeiro abalo tenha começado, haverá uma superposição das
respostas mecânicas que se denomina somação, resultando numa tensão maior. A aplicação de
estímulos cada vez mais freqüentes produzirá contrações musculares sustentadas e uniformes
denominada tétano. A força desenvolvida num tétano perfeito é de 4 vezes maior em relação a um
abalo isolado.
Durante a fase das somações registra-se o que se chama “fenômeno da escada”. Assim, uma
maneira de aumentar a força de contração máxima de uma unidade motora é aumentando a freqüência
de estimulação das unidades musculares.
Como visto, um músculo pode ser constituído poucas a várias unidades motoras. Além da
frequência de estimulação da unidade motora, o desempenho mecânico do músculo como um todo
depende da quantidade de unidades motoras em atividade. Para se aumentar o desempenho mecânico
de um músculo isso pode ser feito recrutando-se a atividade de todas as suas unidades motoras. É por
causa dessa organização morfo-funcional é que podemos graduar precisamente a força muscular. Do
contrário, se todas as fibras musculares de um músculo fossem inervadas pôr um único motoneurônio,
todas as fibras musculares se contrairiam, sempre, de uma única vez. O recrutamento é realizado em
uma determinada ordem onde as unidades motoras mais fracas (em termos de potencia mecânica) são
recrutadas primeiro e depois as mais potentes.

Contrações isométricas e isotônicas


A contração muscular é o estado de atividade mecânica. O músculo se comporta como um
sistema de dois componentes no qual a parte contrátil (sarcômeros) está em série com o componente
elástico (tendões e tecido conjuntivo). Quando os sarcômeros se encurtam a parte elástica é tracionada
e se uma das extremidades do músculo for móvel, causará movimento e se ambas estão fixas, causará

Contração isotônica Contração isométrica

apenas tensão (ou estresse). Denominamos contrações isométricas quando a força está sendo
exercida nos pontos de fixação muscular sem o encurtamento significativo das fibras musculares. Nesse
tipo de contração, as pontes cruzadas se estabelecem aumentando a tensão ou a rigidez do músculo. O
desenvolvimento deste tipo de força ocorre tipicamente nos músculos posturais ou quando um músculo
atua contra uma força oposta. Apesar de não ocorrer trabalho externo, o músculo realizou o que
chamamos de trabalho interno. Quando as fibras musculares encurtam-se e uma carga externa é
movida de um lugar para outro temos a realização de trabalho externo e dizemos que houve
contração isotônica. Nesse caso, o músculo se encurtou gerando tensão mecânica constante
(movimento). No exemplo o bíceps ergue a carga e realiza movimento, ou seja, “trabalha”
isotonicamente. Quando se tenta puxar um cordão e este não sai do lugar, não há movimento e dizemos
que o músculo está “trabalhando” isometricamente. Na prática, em nosso dia-a-dia, estamos o tempo
todo realizando contrações musculares isométrica e isotônica. Lembre-se do braço de ferro da aula
prática. Você seria capaz identificar um tipo e outro de contração?

Relação entre a força máxima e o comprimento do músculo

A força máxima desenvolvida durante a contração tetânica depende do comprimento inicial do


músculo quando a atividade teve inicio. O músculo possui elementos elásticos em série e em paralelo
(todos os elementos situados entre as pontes cruzadas e as extremidades dos tendões). Quando um
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músculo é passivamente estirado ele tende a retornar ao seu comprimento inicial (de repouso). Trata-se
da propriedade elástica do músculo que pode ser descrita numa curva de tensão passiva.
Quando um músculo executa uma
contração isométrica, a tensão ativa
gerada pelas pontes cruzadas é
adicionada a tensão passiva. Na figura
mais adiante é mostrada a curva em
tracejado que corresponde a curva de
tensão ativa. Ela mostra que a faixa
operacional ótima do músculo encontra-se
situa-se dentro de uma pequena faixa de
comprimento inicial do sarcômero. Se o
músculo inicia a sua contração quando as
fibras encontravam-se próximas ao
comprimento em repouso; então a
superposição dos filamentos finos e
grossos será tal que todas as cabeças
miosínicas podem formar pontes
cruzadas. Ou seja, será possível
desenvolver o máximo de força.
Mas se o músculo iniciar a
contração a partir de distensão passiva, o
grau de superposição será menor assim
como o número de pontes cruzadas
formadas. Neste caso, o desempenho
mecânico será drasticamente baixo. O mesmo se verificará quando o músculo tenta se contrair a partir
de um grau de sobreposição já existente entre os filamentos.
Em suma, os músculos esqueléticos estão adaptados de tal forma que geram a sua força
máxima a partir do comprimento inicial de repouso e dentro de uma faixa muito estreita em torno desse
comprimento. Essa faixa de desempenho ótimo é denominada faixa operacional real do músculo.

Sistema de alavancas
Quando um músculo isolado é
submetido a contrair-se suportando uma carga de
7 Kg, ele ira gerar uma força equivalente e puxará
o objeto com um deslocamento 1cm (que
corresponde ao encurtamento muscular). Mas na
prática, o músculo está associado a elementos
ósseos e a tecidos conjuntivos. Juntos constituem
um sistema de alavancas que amplificam a força
gerada pela atividade muscular.

Suponha que a mesma carga de 7Kg seja


movida pelo antebraço graças à ação do bíceps e
seus agonistas. Como o bíceps tem a sua
inserção além da articulação móvel do cotovelo
formando uma alavanca a tensão mecânica
resultante será amplificada para 49Kg.

Tipos de fibras musculares


As fibras musculares diferem quanto à velocidade de contração, ao tipo de abalo mecânico,
resistência à fadiga e às vias metabólicas preferenciais para a utilização de energia química. Do ponto
de vista prático, há fibras musculares quase incansáveis como os músculos posturais que ficam
tonicamente contraídos quase o tempo todo e outros que ficam alternando entre a contração e o
relaxamento como os músculos dos dedos ou dos membros. Um mesmo músculo ora pode realizar
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muita força e ora realizar delicados movimentos musculares. A tabela a seguir exemplifica os tipos de
fibras musculares que possuímos no corpo.

Tipos de fibras musculares esqueléticas


Características Tipo I (L) Tipo IID( RF) Tipo IIA (RRF)
Comprimento das fibras Curtas Longas Intermediárias
Tipo de contração das fibras Lenta Rápida Rápida
Metabolismo Oxidativo Glicolitico oxidativo e glicolítico
Cor “Vermelha” “Branca” “Intermediaria”
Suprimento sanguíneo Muito vascularizado Pouco vascularizado Intermediario
Mitocôndrias Muitas Poucas Intermediário
Grânulos de Glicogênio Raro Abundante Intermediários
Mioglobina Muitas Poucas Intermediária
Força contrátil Pequena Grande Intermediária
Resistência a fadiga Grande Pequena Intermediária

Fibras glicolíticas (Tipo IID)

Fibras intermediárias (Tipo IIA)

Fibras oxidativas (Tipo I)

As propriedades metabólicas e
mecânicas das fibras musculares também estão
associadas aos tipos específicos de
motoneurônios. Assim, podemos falar em
IIB unidades motoras glicolíticas ou oxidativas.
Num mesmo músculo há todos os tipos de
unidades motoras e o seu recrutamento vai
IIA depender da força de contração que se deseja
do músculo que obedece a lei do
recrutamento. Veja o gráfico ao lado: se
desejamos fazer um esforço leve são recrutadas
unidades motoras oxidativas (I) cujos
I motoneurônios disparam mais facilmente. Se a
carga aumenta, são recrutadas fibras
musculares mistas (IIA) e se aumenta ainda
mais, são recrutadas fibras glicoliticas(IIB).

Em nosso cotidiano estamos geralmente recrutando unidades motoras vermelhas fracas e


lentas, porém bastante resistentes à fadiga. Já as unidades brancas são recrutadas quando requeremos
grande esforço muscular, rapidez e potência. Entretanto, há um tipo intermediário de fibras vermelhas
que realizam contrações rápidas, de precisão e força moderada e de resistência.
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Os motoneurônios destas respectivas fibras também variam em ordem crescente de tamanho. Esta
organização tem 3 conseqüências importantes:
1) o recrutamento ordenado facilita a tarefa de modular a força de contração do músculo;
2) as unidades lentas e as intermediárias são as constantemente recrutadas e são sempre usadas.
3) Os motoneurônios maiores são recrutados nas emergências em que tarefas específicas de
grande esforço muscular são requeridas.

Exercício muscular
Observe a aparência dos dois atletas: um pratica corridas de velocidade (100m rasos) e o outro,
é maratonista (corridas de 42 Km). Que tipos de fibras musculares cada um estaria recrutando durante
as respectivas provas? Descreva a aparência física de cada um em relação a compleição física e como
respiram durantes as provas. Justifique a sua resposta.
Ao realizamos exercícios musculares
podemos optar por dois tipos de treinamento: para
melhorar a resistência ou a força. Para melhorar a
resistência os exercícios recomendados são aqueles
que recrutam fibras musculares aeróbicas e
exercícios de longa duração “trabalhando” os
músculos com cargas leves. Com o tempo a
quantidade de mitocôndrias e a densidade capilar irão
aumentar; a resistência ao fluxo sanguíneo irá
diminuir e aumentar a perfusão sanguínea
melhorando o condicionamento cárdio-respiratório.
Mas se o objetivo é buscar a performance
mecânica, os exercícios recomendados são os
exercícios de curta duração com cargas pesadas
umas duas ou três vezes por semana. O resultado
será o aumento de miofilamentos contráteis e
conseqüente hipertrofia das fibras musculares
solicitadas.
Uma corrida de 100m visa velocidade, ou
seja, desenvolver força muscular máxima em
curtíssimo tempo (potência máxima). Como vimos, o
aumento da força muscular obtém-se aumentando
massa muscular. Para isso, o atleta deve fazer
exercícios com cargas cada vez maiores. Isso
provoca microlesões nos sarcômeros fazendo com
que as células satélites promovam reparos ou
aumento de miofibrilas contráteis. As minúsculas células satélites ficam alojadas entre o sarcolema e a
lamina basal. As lesões iniciam processo inflamatório e os mediadores químicos estimulam a
proliferação e diferenciação das células satélites. Estas então migram para os sítios das lesões no
interior das fibras musculares e promovem síntese protéica e aumento dos sarcômeros. Como
conseqüência ocorre a hipertrofia muscular.

Já vimos que o ATP é a fonte de energia necessária para o músculo em atividade ou em


repouso. Na disciplina de Bioquímica vocês estudaram que as moléculas de ATP originam-se de três
fontes: de vias metabólicas aeróbicas, anaeróbicas e do fosfato de creatina. Quando o músculo está em
repouso, qualquer sobra de ATP é convertido em fosfato de creatina. Esta é a fonte imediata de ATP.
Imagine-se fazendo exercício por 1 hora, sem parar: Tão logo você começa, o músculo em atividade
recruta ATP provindo da degradação do fosfato de creatina e do metabolismo anaeróbico de fontes de
carboidratos (glicogênio). Estas fontes, no entanto, são insuficientes; são fontes de energia muito
fugazes. Então se você estiver aquentando firme, depois de uns 30 minutos, começa finalmente a
“queimar” ácidos graxos. Fica claro porque o atleta fundista é “magrinho” ou “sequinho”?
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Fadiga muscular
A fadiga é uma condição temporária em que a força muscular não
pode mais ser gerada pelo músculo por problemas metabólicos. A figura ao
lado exemplifica tipos de fibras musculares com diferentes perfis de
resistência: as fibras do tipo IID (RF) fadigam-se muito rapidamente e as do
tipo I (L) são muito resistentes. Durante a fadiga, o músculo está em
atividade, mas não consegue gerar força mecânica. Nesta condição, o atleta
sente-se extremamente exausto.

Desnervação
Quando os nervos motores são danificados, ocorrem fasciculações musculares (contrações
irregulares e pequenas) causadas pela liberação espontânea de Ach. Vários dias depois ocorre
fibrilação (contrações assincrônicas das fibras musculares) causadas por um aumento de sensibilidade
dos receptores nicotínicos. Cerca de 3 a 4 meses depois inicia-se o processo de atrofia muscular
(diminuição do tamanho das fibras musculares). Após 1 a 2 anos as fibras musculares degeneradas são
trocadas por tecido conjuntivo e tecido adiposo.
Se após a secção os motoneurônios forem estimulados adequadamente, pode ocorrer
regeneração dos axônios e a recuperação motora. É interessante observar que os motoneurônios
possuem fatores tróficos que regulam a atividade das fibras musculares que ele inerva: se fibras
brancas tiverem os motoneurônios grandes trocados experimentalmente, por motoneurônios pequenos
que inervam as fibras vermelhas, as suas propriedades metabólicas e mecânicas serão modificadas e
vice-versa.

Problematização

Júlio é um corredor velocista. Antes de uma grande prova para a qual treinou muito, sofreu um acidente
automobilístico, quebrando a perna. Ficou em repouso no inicio e depois já podia andar engessado e
com muletas. Depois que retirou o gesso, ficou muito surpreso com o estado da sua musculatura.
Descreva com o que Julio ficou surpreso e explique.

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