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FISIOLOGIA MUSCULAR
MUSCULATURA DO CORPO
Tendemos a pensar que movimento está sempre associado ao deslocamento do organismo, isto
é, a mudança dele de um lugar para o outro. Pensar assim é uma ilusão, pois vários movimentos estão
sendo realizados enquanto estamos parados: os dedos coçando um ponto do corpo; o estômago
misturando e propelindo o seu conteúdo; o coração ejetando e fazendo circular o sangue através do
sistema circulatório, o diafragma e os músculos intercostais garantindo a respiração, etc.
Os órgãos efetuadores de movimento do nosso corpo são formados de células musculares
geradores de tensão mecânica e são de três tipos histológicos: fibras musculares estriadas
esqueléticas e cardíacas e fibras musculares lisas.
Formam o tecido muscular esquelético, Formam o coração cujo órgão funciona Formam os demais órgãos viscerais do
cujos músculos em sua maioria está como uma bomba ejetora cíclica, corpo (bexiga, trato gastrointestinal,
associada a esqueletos; são propulsionando o sangue através dos útero, etc.). Como a musculatura
responsáveis pela execução de vasos. cardíaca está apenas sob controle
atividades voluntárias e reflexas do reflexo.
organismo.
articulação. Os músculos deslocam 2 ou mais ossos através de uma articulação móvel, ou então,
deslocam tecidos. A maioria das articulações possui dois grupos de músculos funcionalmente distintos:
os músculos flexores que em atividade diminui o ângulo articular e os extensores cuja ação
antagônica aumenta o ângulo. Um movimento pode ser simples, envolvendo alguns grupos musculares
(por exemplo, o movimento de flexão da perna) ou muito complexos, envolvendo ações coordenadas de
vários grupos musculares, como numa dança ou no lançamento de disco. Por traz desta complexidade
aparente de movimento, está o circuito nervoso envolvido.
Para que o músculo possa entrar em e manter a sua atividade, necessita de energia metabólica,
ou seja de ATP. Ao ser hidrolisado enzimaticamente, parte da energia liberada é utilizada para a
geração de força mecânica e a outra parte é perdida na forma de calor. Como a disponibilidade de ATP
é pequena nas fibras musculares, é necessária uma fonte adicional de energia como o fosfato de
creatina que transfere o grupo fosfórico para o difosfato de adenosina e restaura rapidamente os níveis
de ATP. Mas como a fonte de fosfato de creatina é muito limitada, num exercício muscular prolongado, o
ATP passa a ser obtido pela oxidação completa de carboidratos e de ácidos graxos. A fonte de
carboidrato muscular é armazenada na forma de glicogênio (cerca de 0,5 a 2% do peso muscular
fresco) e contribui com cerca de 100 vezes mais do que a fonte de fosfato de creatina. Conforme as
propriedades mecânicas das fibras musculares serão utilizadas o metabolismo aeróbico ou anaeróbico
como estudaremos mais tarde.
Assim, num exame cuidadoso da musculatura, é possível observar depósitos de glicogênio
dentro das fibras musculares e de tecido gorduroso entremeando as fibras musculares.
A miosina corresponde a 55% da proteína miofibrilar e cada filamento grosso é formado de 200
a 400 dessas macromoléculas; Cada miosina é formada por duas cadeias: uma leve e outra pesada. Na
cadeia pesada a cabeça possui dois sítios ativos: uma que possui alta afinidade pela actina e uma outra
catalítica que hidrolisa o ATP. As moléculas de miosina se juntam e formam um feixe de forma que as
cabeças ficam destacadas do eixo principal e fisicamente próximos aos filamentos de actina. Apesar da
elevada afinidade que as moléculas de miosina tem pela actina, o músculo em repouso (relaxado) tem a
as moléculas de tropomiosina obstruindo o sitio de ligação entre elas.
A actina constitui 20 a 25% da proteína miofibrilar e ocorre em duas formas (actina G e actina
F) que, quando polimerizadas, formam cordões duplos helicoidais. Cada molécula de actina G liga-se
com grande afinidade a um íon Ca++ e a uma molécula de ATP.
A tropomiosina é uma molécula formada por duas cadeias peptídicas separadas e que estão
enroladas entre si.
A troponina é uma proteína globular com função reguladora e possui três subunidades: C que
++
se liga a íons Ca ; I que é inibitória e T que se liga à tropomiosina. No músculo relaxado as moléculas
de tropomiosina estão obstruindo o sítio de ligação da actina com a miosina...como estes sítios de
ligação são desobstruídos?
Unidade motora
Miastenia grave é uma doença auto-imune onde o próprio organismo produz anticorpos contra
os receptores nicotínicos, dificultando a neurotransmissão. Como consequência um dos sinais da
doença é a fraqueza muscular que piora ao longo do dia (Veja discussão de caso na aula teórico-
prática).
++
Quando o músculo não está sob estimulação nervosa, isto é, quando está relaxado a [Ca ] no
mioplasma é insignificante em relação ao meio extracelular. Com a chegada do impulso nervoso, a fibra
muscular gera PAs e propaga a atividade elétrica pelos túbulos T atingindo as cisternas do retículo
sarcoplasmático. A função dos túbulos T é a de garantir a rápida propagação da onda de
despolarização em direção às cisternas do RE, interior das quais estão armazenados o Ca++, necessário
para inicio ao processo de contração dos sarcômeros. A despolarização tem a função de abrir os
++
canais de Ca voltagem dependentes (rianodina) que ficam situados nas membranas do túbulos T as
quais estão acoplados a moléculas receptoras de diidropiridina localizadas na membranas da cisterna.
Com a chegada das ondas de despolarização os canais de cálcio abrem-se e os íons se difundem para
o mioplasma a favor do seu elevado gradiente de concentração. Os íons Ca ligam-se com elevada
afinidade aos sítios da troponina C, modificando a sua organização espacial, tornando livre o sítio T
que poderá se ligar à tropomiosina. Agora, o complexo formado pode desobstruir o sítio de ligação da
actina com a miosina. A formação do complexo actina-miosina forma a ponte cruzada entre o filamento
fino e o grosso.
Como a miosina tem um sítio catalítico para a hidrólise de ATP, esta união torna a energia
química disponível para o dobramento da cabeça de miosina e os filamentos finos sofrem um ciclo de
arraste para o centro, isto é, os filamentos finos deslizam-se sobre os grossos de forma que o
sarcômero sofre encurtamento (diminui o se comprimento). Com a hidrólise do ATP, a molécula de
miosina perde a afinidade pela actina, desliga-se restabelecendo a sua posição original. Mas se há mais
Curso de Fisiologia 2013 Ciclo de Neurofisiologia 125
Departamento de Fisiologia, IB Unesp-Botucatu Profa. Silvia M. Nishida
ATP e Ca++ disponíveis no mioplasma, o ciclo das pontes cruzadas restabelece-se e o deslizamento
progride com o encurtamento cada vez maior do sarcômero. Assim, as fibras musculares, como um
todo, encurtam-se. Cada ciclo pode mover o filamento fino cerca de uns 10nm e para cada molécula de
troponina ativa, sete sítios fixadores de miosina são descobertos.
Relaxamento muscular
Se não vier comandos do SNC por meio dos motoneurônios, a fibra muscular deixa de gerar PA
e como conseqüência, os canais de Ca++ voltagem-dependentes se fecham. As moléculas de ATPase
++
Ca dependente situadas sobre a membrana da cisterna seqüestram ativamente os íons de volta para
dentro do reticulo. Com a troponina sem o Ca++, a tropomiosina volta a impedir a ligação da miosina com
a actina, provocando o relaxamento muscular.
Rigor mortis
Com a morte vem a falência circulatória, falta de oxigênio e a
inoperância do controle nervoso sobre a musculatura. A desnaturação de
proteínas faz com que os íons Ca++ extravasem para o mioplasma e o
músculo começa contrair progressivamente utilizando a via anaeróbica. A
contração progride e não haverá relaxamento o que leva ao estado de rigor
mortis, ou seja, estado de enrijecimento muscular generalizado. A instalação
completa da rigidez vai de 10 minutos a muitas horas após a morte; é
bastante dependente da temperatura. Este estado não é permanente já os
filamentos contráteis sofrem autólise. Durante a instalação da rigidez, ocorre
uma queda brusca de pH por causa do aumento de acido lático (glicólise).
Cada abalo apresenta uma resposta mecânica do tipo tudo-ou-nada; se um segundo estimulo
for aplicado antes que o relaxamento do primeiro abalo tenha começado, haverá uma superposição das
respostas mecânicas que se denomina somação, resultando numa tensão maior. A aplicação de
estímulos cada vez mais freqüentes produzirá contrações musculares sustentadas e uniformes
denominada tétano. A força desenvolvida num tétano perfeito é de 4 vezes maior em relação a um
abalo isolado.
Durante a fase das somações registra-se o que se chama “fenômeno da escada”. Assim, uma
maneira de aumentar a força de contração máxima de uma unidade motora é aumentando a freqüência
de estimulação das unidades musculares.
Como visto, um músculo pode ser constituído poucas a várias unidades motoras. Além da
frequência de estimulação da unidade motora, o desempenho mecânico do músculo como um todo
depende da quantidade de unidades motoras em atividade. Para se aumentar o desempenho mecânico
de um músculo isso pode ser feito recrutando-se a atividade de todas as suas unidades motoras. É por
causa dessa organização morfo-funcional é que podemos graduar precisamente a força muscular. Do
contrário, se todas as fibras musculares de um músculo fossem inervadas pôr um único motoneurônio,
todas as fibras musculares se contrairiam, sempre, de uma única vez. O recrutamento é realizado em
uma determinada ordem onde as unidades motoras mais fracas (em termos de potencia mecânica) são
recrutadas primeiro e depois as mais potentes.
apenas tensão (ou estresse). Denominamos contrações isométricas quando a força está sendo
exercida nos pontos de fixação muscular sem o encurtamento significativo das fibras musculares. Nesse
tipo de contração, as pontes cruzadas se estabelecem aumentando a tensão ou a rigidez do músculo. O
desenvolvimento deste tipo de força ocorre tipicamente nos músculos posturais ou quando um músculo
atua contra uma força oposta. Apesar de não ocorrer trabalho externo, o músculo realizou o que
chamamos de trabalho interno. Quando as fibras musculares encurtam-se e uma carga externa é
movida de um lugar para outro temos a realização de trabalho externo e dizemos que houve
contração isotônica. Nesse caso, o músculo se encurtou gerando tensão mecânica constante
(movimento). No exemplo o bíceps ergue a carga e realiza movimento, ou seja, “trabalha”
isotonicamente. Quando se tenta puxar um cordão e este não sai do lugar, não há movimento e dizemos
que o músculo está “trabalhando” isometricamente. Na prática, em nosso dia-a-dia, estamos o tempo
todo realizando contrações musculares isométrica e isotônica. Lembre-se do braço de ferro da aula
prática. Você seria capaz identificar um tipo e outro de contração?
músculo é passivamente estirado ele tende a retornar ao seu comprimento inicial (de repouso). Trata-se
da propriedade elástica do músculo que pode ser descrita numa curva de tensão passiva.
Quando um músculo executa uma
contração isométrica, a tensão ativa
gerada pelas pontes cruzadas é
adicionada a tensão passiva. Na figura
mais adiante é mostrada a curva em
tracejado que corresponde a curva de
tensão ativa. Ela mostra que a faixa
operacional ótima do músculo encontra-se
situa-se dentro de uma pequena faixa de
comprimento inicial do sarcômero. Se o
músculo inicia a sua contração quando as
fibras encontravam-se próximas ao
comprimento em repouso; então a
superposição dos filamentos finos e
grossos será tal que todas as cabeças
miosínicas podem formar pontes
cruzadas. Ou seja, será possível
desenvolver o máximo de força.
Mas se o músculo iniciar a
contração a partir de distensão passiva, o
grau de superposição será menor assim
como o número de pontes cruzadas
formadas. Neste caso, o desempenho
mecânico será drasticamente baixo. O mesmo se verificará quando o músculo tenta se contrair a partir
de um grau de sobreposição já existente entre os filamentos.
Em suma, os músculos esqueléticos estão adaptados de tal forma que geram a sua força
máxima a partir do comprimento inicial de repouso e dentro de uma faixa muito estreita em torno desse
comprimento. Essa faixa de desempenho ótimo é denominada faixa operacional real do músculo.
Sistema de alavancas
Quando um músculo isolado é
submetido a contrair-se suportando uma carga de
7 Kg, ele ira gerar uma força equivalente e puxará
o objeto com um deslocamento 1cm (que
corresponde ao encurtamento muscular). Mas na
prática, o músculo está associado a elementos
ósseos e a tecidos conjuntivos. Juntos constituem
um sistema de alavancas que amplificam a força
gerada pela atividade muscular.
muita força e ora realizar delicados movimentos musculares. A tabela a seguir exemplifica os tipos de
fibras musculares que possuímos no corpo.
As propriedades metabólicas e
mecânicas das fibras musculares também estão
associadas aos tipos específicos de
motoneurônios. Assim, podemos falar em
IIB unidades motoras glicolíticas ou oxidativas.
Num mesmo músculo há todos os tipos de
unidades motoras e o seu recrutamento vai
IIA depender da força de contração que se deseja
do músculo que obedece a lei do
recrutamento. Veja o gráfico ao lado: se
desejamos fazer um esforço leve são recrutadas
unidades motoras oxidativas (I) cujos
I motoneurônios disparam mais facilmente. Se a
carga aumenta, são recrutadas fibras
musculares mistas (IIA) e se aumenta ainda
mais, são recrutadas fibras glicoliticas(IIB).
Os motoneurônios destas respectivas fibras também variam em ordem crescente de tamanho. Esta
organização tem 3 conseqüências importantes:
1) o recrutamento ordenado facilita a tarefa de modular a força de contração do músculo;
2) as unidades lentas e as intermediárias são as constantemente recrutadas e são sempre usadas.
3) Os motoneurônios maiores são recrutados nas emergências em que tarefas específicas de
grande esforço muscular são requeridas.
Exercício muscular
Observe a aparência dos dois atletas: um pratica corridas de velocidade (100m rasos) e o outro,
é maratonista (corridas de 42 Km). Que tipos de fibras musculares cada um estaria recrutando durante
as respectivas provas? Descreva a aparência física de cada um em relação a compleição física e como
respiram durantes as provas. Justifique a sua resposta.
Ao realizamos exercícios musculares
podemos optar por dois tipos de treinamento: para
melhorar a resistência ou a força. Para melhorar a
resistência os exercícios recomendados são aqueles
que recrutam fibras musculares aeróbicas e
exercícios de longa duração “trabalhando” os
músculos com cargas leves. Com o tempo a
quantidade de mitocôndrias e a densidade capilar irão
aumentar; a resistência ao fluxo sanguíneo irá
diminuir e aumentar a perfusão sanguínea
melhorando o condicionamento cárdio-respiratório.
Mas se o objetivo é buscar a performance
mecânica, os exercícios recomendados são os
exercícios de curta duração com cargas pesadas
umas duas ou três vezes por semana. O resultado
será o aumento de miofilamentos contráteis e
conseqüente hipertrofia das fibras musculares
solicitadas.
Uma corrida de 100m visa velocidade, ou
seja, desenvolver força muscular máxima em
curtíssimo tempo (potência máxima). Como vimos, o
aumento da força muscular obtém-se aumentando
massa muscular. Para isso, o atleta deve fazer
exercícios com cargas cada vez maiores. Isso
provoca microlesões nos sarcômeros fazendo com
que as células satélites promovam reparos ou
aumento de miofibrilas contráteis. As minúsculas células satélites ficam alojadas entre o sarcolema e a
lamina basal. As lesões iniciam processo inflamatório e os mediadores químicos estimulam a
proliferação e diferenciação das células satélites. Estas então migram para os sítios das lesões no
interior das fibras musculares e promovem síntese protéica e aumento dos sarcômeros. Como
conseqüência ocorre a hipertrofia muscular.
Fadiga muscular
A fadiga é uma condição temporária em que a força muscular não
pode mais ser gerada pelo músculo por problemas metabólicos. A figura ao
lado exemplifica tipos de fibras musculares com diferentes perfis de
resistência: as fibras do tipo IID (RF) fadigam-se muito rapidamente e as do
tipo I (L) são muito resistentes. Durante a fadiga, o músculo está em
atividade, mas não consegue gerar força mecânica. Nesta condição, o atleta
sente-se extremamente exausto.
Desnervação
Quando os nervos motores são danificados, ocorrem fasciculações musculares (contrações
irregulares e pequenas) causadas pela liberação espontânea de Ach. Vários dias depois ocorre
fibrilação (contrações assincrônicas das fibras musculares) causadas por um aumento de sensibilidade
dos receptores nicotínicos. Cerca de 3 a 4 meses depois inicia-se o processo de atrofia muscular
(diminuição do tamanho das fibras musculares). Após 1 a 2 anos as fibras musculares degeneradas são
trocadas por tecido conjuntivo e tecido adiposo.
Se após a secção os motoneurônios forem estimulados adequadamente, pode ocorrer
regeneração dos axônios e a recuperação motora. É interessante observar que os motoneurônios
possuem fatores tróficos que regulam a atividade das fibras musculares que ele inerva: se fibras
brancas tiverem os motoneurônios grandes trocados experimentalmente, por motoneurônios pequenos
que inervam as fibras vermelhas, as suas propriedades metabólicas e mecânicas serão modificadas e
vice-versa.
Problematização
Júlio é um corredor velocista. Antes de uma grande prova para a qual treinou muito, sofreu um acidente
automobilístico, quebrando a perna. Ficou em repouso no inicio e depois já podia andar engessado e
com muletas. Depois que retirou o gesso, ficou muito surpreso com o estado da sua musculatura.
Descreva com o que Julio ficou surpreso e explique.