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V45m
Vasconcelos, Carlos Eduardo de
Mediação de conflitos e práticas restaurativas/Carlos Eduardo de Vasconcelos. – 6. ed. – Rio de Janeiro: Forense; São
Paulo: MÉTODO, 2018.
Inclui bibliografia
ISBN 978-85-309-8182-2
Em 2018, 11 anos passados da primeira edição deste livro, estamos começando a refletir sobre
como não perder e, nessa perspectiva, como elaborar um novo foco. A que foco pretende-se fazer
referência? Ao estado das mudanças recentes e daquelas que estão ocorrendo, nesse campo, no
Brasil e no mundo.
Em 2007, eram raras, em nosso país, publicações de brasileiros sobre métodos e metodologias
de construção de consenso. Escrevemos, então, com os olhos voltados para um futuro de esperanças.
Quase tudo estava à nossa frente a ser edificado. Dali em diante, as pesquisas, os intercâmbios
internacionais, as novas práticas e os renovados desafios foram moldando conhecimentos que eram
testados, recriados e amadurecidos. E fomos estreitando nossos vínculos com instituições nacionais e
internacionais igualmente comprometidas com o desenvolvimento dessa grande rede.
Do ponto de vista estratégico, alguns dos mais significativos acontecimentos recentes, no Brasil,
ocorreram no plano da normatização, destacando--se a Resolução nº 125/2010 do CNJ, o Código de
Processo Civil (Lei nº 13.105/2015) e a Lei de Mediação (Lei nº 13.140/2015). Para tanto, têm sido
brilhantes as contribuições de entidades do nível do CONIMA, do FONAME, do IBDFAM, da OAB
do CBAr, da ENAM, da ENFAM e, mais recentemente, do ICFML, entre outras.
As edições anteriores desta obra foram construídas como em ondas sucessivas, surfadas em
necessário equilíbrio. É chegado o momento de focar, ainda mais consistentemente, na qualidade da
pedagogia e da administração dos métodos adequados de solução de controvérsias, nos âmbitos
extrajudicial, judicial (pré-processual e processual) e no da administração pública. É tempo de
acolher as novas práticas e saberes oriundos de profissionais aptos a negociar, mediar, conciliar,
atuar como avaliadores neutros, como membros de comitês de resolução de disputas (DRBs), como
facilitadores de diálogos apreciativos, como árbitros, como facilitadores de práticas restaurativas.
Não é por acaso que priorizamos, nesta obra, a teoria do conflito, o paradigma sistêmico da
nova linguagem do direito, o novo sistema multiportas de acesso à justiça, as práticas colaborativas e
resolutivas na advocacia, a composição de conflitos no âmbito da administração pública, a
comunicação construtiva, as etapas da mediação, os modelos mais aplicados, casos para práticas
simuladas e as várias espécies de práticas restaurativas.
Esta obra está intimamente alinhada ao empenho global, com vistas ao ano de 2030, pelo
cumprimento dos 17 Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (ODM), das Nações Unidas, estando
aqui especialmente destacados os objetivos 4, 5, 16 e 17, a saber:
CONCLUSÃO
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
Teoria e evolução histórica do conflito
1. CARACTERIZAÇÃO DO CONFLITO
O conflito é dissenso, que está latente ou manifestado numa disputa. Decorre de expectativas,
valores e interesses contrariados. Embora seja contingência da condição humana, e, portanto, algo
natural, numa disputa conflituosa costuma-se tratar a outra parte como adversária, infiel ou inimiga.
Cada uma das partes da disputa tende a concentrar todo o raciocínio e elementos de prova na busca
de novos fundamentos para reforçar a sua posição unilateral, na tentativa de enfraquecer ou destruir
os argumentos da outra parte. Esse estado emocional estimula as polaridades e dificulta a percepção
do interesse comum.
Portanto, o conflito ou dissenso é fenômeno inerente às relações humanas. É fruto de percepções
e posições divergentes quanto a fatos e condutas que envolvem expectativas, valores ou interesses
comuns e contraditórios.
O conflito não é algo que deva ser encarado negativamente. É impossível uma relação
interpessoal plenamente consensual. Cada pessoa é dotada de uma originalidade única, com
experiências e circunstâncias existenciais personalíssimas. Por mais afinidade e afeto que exista em
determinada relação interpessoal, algum dissenso, algum conflito, estará presente. A consciência do
conflito como fenômeno inerente à condição humana é muito importante. Sem essa consciência
tendemos a demonizá-lo ou a fazer de conta que não existe. Quando compreendemos a
inevitabilidade do conflito, somos capazes de desenvolver soluções autocompositivas. Quando o
demonizamos ou não o encaramos com responsabilidade, a tendência é que ele se converta em
confronto e violência.
O que geralmente ocorre no conflito processado com enfoque adversarial é a hipertrofia do
argumento unilateral, quase não importando o que o outro fala ou escreve. Por isso mesmo, enquanto
um se expressa, o outro já prepara nova argumentação. Ao identificarem que não estão sendo
entendidas, escutadas, lidas, as partes se exaltam e dramatizam, polarizando ainda mais as posições.
A solução transformadora do conflito depende do reconhecimento das diferenças e da
identificação dos interesses comuns e contraditórios, subjacentes, pois a relação interpessoal funda-
se em alguma expectativa, valor ou interesse comum.
As relações interpessoais, com sua pluralidade e liberdade de expressão de percepções,
sentimentos, crenças, direitos e interesses, ampliam as vivências de conflito. A negociação desses
conflitos é um labor comunicativo quotidiano em nossas vidas. Nesse sentido, o conflito não tem
solução. O que se podem solucionar são disputas pontuais, mas os nossos conflitos podem sempre
ser transformados pelo modo como lidamos com eles.
Indo mais adiante na busca do compreender a condição humana, é necessário que nos
reconheçamos como seres vivos, constituídos de forças cósmicas, biológicas, sociais, psíquicas,
emocionais, que nos impulsionam em direções contraditórias, embora fundamentalmente
complementares. Em cada um de nós atuam impulsos aparentemente fragmentadores, de
autoafirmação, e impulsos potencialmente integrativos, de religação, que, em suas expressões
equifinais, se concertam e se excluem, num contínuo dinamismo. Vivemos, pois, em meio ao desafio
de administrar, de afinar, de compreender e de integrar essas polaridades, entre nós e em cada um,
para que os nossos conflitos interpessoais, que podem ser construtivos, não descambem para a
destrutividade.
Estados emocionais de raiva, de indignação ou de medo exercem grande poder sobre pessoas
infelizes, decepcionadas, deprimidas, revoltadas, que são as mais prováveis vítimas de reatividades
irrefletidas, a ponto de, muito de repente, se perceberem acusadas da prática de crime. Prevenir a
violência equivale a compreender a nossa intersubjetividade/interdependência, e praticar,
construtivamente, em situação de violência manifesta, a arte da guerra (uso protetivo da força) e a
arte da paz (resistência pacífica), na construção de consensos razoáveis.
Recentemente, numa fila de banco, escutei a voz de um senhor à minha frente, que se voltava em
minha direção. “Não tem jeito! Este é um mundo cão! Aquela mulher na cama com outro homem. E
não é de hoje. Sempre dei do melhor para ela. Meus filhos estão muito revoltados. Estou
desmoralizado”. E estendeu o braço acionando o dedo como num gatilho. Parece que as pessoas
percebem quando alguém é observador e receptivo. Escutei, escutei. Validei com a minha atenção e o
meu silêncio os sentimentos daquele homem. Quando senti que ele desejava escutar a minha opinião,
procurei a empatia, expressando como deve ser um desafio viver isto sem cair na tentação de tornar-
se um assassino e amargar anos de penitenciária. E perguntei: uma mulher assim é tão importante
para você? Ele respondeu: ela foi a maior decepção da minha vida. Aquela mulher é uma peste. Por
nada no mundo eu a quero de volta. Então perguntei. O que você gostaria que acontecesse agora?
“Que ela morresse!” E quanto a você, o que você está sentindo em relação ao seu futuro? Eu sinto
que preciso de uma outra companheira que me ajude a cuidar dos meus filhos. Os seus filhos são
menores? Respondeu que sim e que eram dois filhos homens. Eles gostam da mãe? Fomos deixando
outras pessoas passarem à frente na fila. Ele, então, falou que, quanto a isto, não tem o que reclamar e
que a mãe cuida bem dos filhos, que são muito apegados a ela. Após esse diálogo em que as
perguntas eram respondidas de coração, fui percebendo que aquele homem estava diferente. Estava
empoderado, como que se expressando por meio de outra “persona”, que, no entanto, era uma outra
expressão dele próprio, após o desabafo e a reflexão. Era possível perceber que a necessidade
implícita dele era de reconhecimento, de afago e de aceitação da ideia de dar um tempo ao tempo e a
si próprio para reconstruir uma ambiência familiar. E como tínhamos outras coisas a fazer, dirigimo-
nos ao caixa, não sem antes ele colocar, sobre o meu ombro esquerdo, aquele mesmo braço do “dedo
no gatilho”, agradecendo, emocionado, o que chamou de “orientação”.
As pessoas matariam menos se fossem reconhecidas em seu sofrimento e escutadas na sua dor.
A maldade existe, sim, mas ela tem a cara do sofrimento, seja o de hoje, seja o da infância. A não
escuta desse sofrimento é o alimento dos processos destrutivos que ocasionam a escalada do conflito
na direção do confronto e da violência, numa sociedade ainda dominada pela cultura da culpa, do
julgamento e do castigo.
A partir da segunda metade do século passado, autores como Rudolph Rummel, William Uri,
Morton Deutsch e outros inovaram em suas pesquisas e abordagens sobre o conflito.
É interessante observar em Rummel1 o que ele denomina fases ou níveis do conflito,
distinguindo a) o conflito latente, b) o conflito real ou atual (disputa), bem como c) o modo como se
dá a exteriorização desse conflito manifesto (o processo).
Conflito latente é aquele observado no contexto das causas políticas, psicológicas e sociais que
compõem o quadro conflituoso e que permanecem latentes no indivíduo ou no grupo, sem produzir
qualquer efeito aparente. Nessa circunstância contextual, as posições ou disposições opostas formam
a estrutura cuja resolução, mediante análise psicológica, pode prevenir o conflito manifesto.
Conflito manifesto é aquela oposição de interesses, atitudes e poderes já ativada mediante
demonstrações sintomáticas ou explícitas. São manifestações típicas da busca de soluções. O que
comumente se destaca nessa busca são as ameaças, demandas, terrorismos, assassinatos, agressões e
guerras. Portanto, é o complexo de atitudes que compõem o conflito manifesto, na sua expressão mais
definida: a disputa ou o embate (violência).
Exteriorização do conflito (drama) é o modo como o conflito manifesto (confronto ou embate)
vai revelar o balanceamento do poder resultante da decisão de manifestar um comportamento de
disputa ou agressão.
Como desdobramento dessa abordagem, Rummel2 formula o que ele denomina Espiral do
Conflito, que vai além daquelas três fases ou níveis antes referidos.
Eis como aquele autor descreve as fases de espiral do conflito:
Primeira fase: Latente – potencialidades e estruturas do conflito. Onde quer que exista mais de
um homem, um grupo, uma sociedade, uma cultura, estará presente o conflito (latente) nos papéis,
iminências, e sentimentos, envolvendo religiões, economias, políticas, interesses, autoestima,
superego etc.
Segunda fase: Início – manifestação do conflito (disputa ou confronto). Envolve a decisão de
manifestar o conflito de posições e interesses opostos e a consequente situação de instabilidade e
incerteza.
Terceira fase: Balanceamento de poder – administração de forças. Confrontação de poder
resultante da decisão de manifestar um comportamento de disputa.
Quarta fase: Equilíbrio de poder – estrutura de expectativas. A busca do equilíbrio, por meio de
estruturas ou processos institucionalizados ou não (resolução).
Quinta fase: Interrupção do equilíbrio – acomodação de forças. É a fase intermediária entre o
conflito resolvido e o latente, que dará origem a novas disputas. Portanto, é o fim e o início da
espiral de Rummel.
Conforme verificamos nesta perspectiva de Rummel, o conflito evolui numa espiral, de latente a
manifesto (disputa), seguindo-se a fase do balanceamento de poder (a confrontação), sequenciada
pela fase da busca do equilíbrio (institucionalizado ou não), chegando à acomodação (conflito
latente), que dará origem a novas disputas e assim ocorrendo como fenômeno inerente às relações
humanas.
Em realidade, o conflito interpessoal compreende esse aspecto relacional (expectativas e
crenças desencontradas, sentimentos e ressentimentos intercambiados), compreende o aspecto
objetivo (interesse objetivo ou material envolvido) e compreende a trama (o seu processo, o seu
desdobramento).
Daí entender-se que o conflito interpessoal se compõe de três elementos: relação interpessoal,
problema objetivo e trama ou processo.
Tradicionalmente, concebia-se o conflito como algo a ser suprimido, eliminado da vida social;
e que a paz seria fruto da ausência de conflito. Não é assim que se concebe atualmente, a partir de
uma visão sistêmica. A paz é um bem precariamente conquistado por pessoas ou sociedades que
aprendem a lidar com o conflito. O conflito, quando bem conduzido, evita a violência e pode resultar
em mudanças positivas e novas oportunidades de ganho mútuo.
Durkheim4 refere que certo nível de criminalidade seria benéfico, funcional e necessário
socialmente, sendo, inclusive, traço normal e inevitável de toda sociedade. Essa ideia estaria
fundada em três pressupostos: “a) crime provoca punição que, por sua vez, reforça solidariedade nas
comunidades; b) a repressão de crimes auxilia a estabelecer e manter limites comportamentais no
interior de comunidades (em níveis não anômicos); c) incrementos excepcionais nas taxas de
criminalidade podem alertar ou advertir autoridades para problemas existentes nos sistemas sociais
onde ocorrem tais taxas de criminalidade”.
Que o conflito é inerente à relação humana, isso é pacífico. Também não se discute que do
conflito pode nascer o crime e que essa evolução do conflito para o crime tem sido uma constante na
história. No entanto, a nossa hipótese é no sentido de que o crime só se converte em necessidade
social quando as condições de vida e as políticas públicas são excludentes, injustas e corruptas.
Com efeito, não apenas as causas da violência são sistêmicas (uma sociedade baseada na
injustiça, na desigualdade econômica e exclusão do pobre, etc.), mas os efeitos também o são, ou
seja, há uma mútua reverberação entre causas e efeitos, assim como entre criminosos e não
criminosos. A resultante são efeitos de violência e instabilidade, manifestados em depressões,
medos, neuroses, repressões e efeitos sociais deletérios, os quais reverberam, indo além, do humano
aos seres não humanos, numa rede comum, a rede ecológica.5
Em suma, conflitos decorrem da convivência social do homem com suas contradições. Eles
podem ser divididos em quatro espécies que, de regra, incidem cumulativamente, a saber:
Conforme Morton Deutsch,6 o modo de lidar com o conflito, o meio de resolver o conflito, pode
ser construtivo ou destrutivo. Para esse autor, os processos destrutivos caracterizam-se pelo
enfraquecimento ou rompimento da relação social preexistente à disputa, em virtude da feição
competitiva de como essa é conduzida. Nesses processos destrutivos o conflito tende a expandir-se
em espiral, frequentemente tornando-se independente de suas causas iniciais.
Já os processos construtivos, segundo Deutsch, são aqueles em que as partes vão fortalecendo a
relação social preexistente à disputa, consoante valores, técnicas e habilidades que veremos mais
adiante, ao cuidarmos da mediação e da comunicação construtiva.
Essa importante contribuição de Morton Deustch contrariou a ontologização do conflito, em que
ele era visto como um mal em si mesmo. Morton Deustch aproximou a teoria do conflito da filosofia
da linguagem e da psicanálise junguiana, ao reconhecer o alcance afetivo da intersubjetividade
cambiante pelo diálogo construtivo; que enseja o potencial transformador do conflito.
Segundo Morin,7 “A compreensão humana nos chega quando sentimos e concebemos os humanos
como sujeitos; ela nos torna abertos a seus sofrimentos e suas alegrias. Permite-nos reconhecer no
outro os mecanismos egocêntricos da autojustificação, que estão em nós, bem como as retroações
positivas (no sentido cibernético do termo) que fazem degenerar em conflitos inexplicáveis as
menores querelas”.
Concluímos esta parte com as seguintes proposições: a) os conflitos não podem ser eliminados
porque são inerentes às relações humanas, tendo eles um potencial gerador de problemas e de
oportunidades; b) eles podem ser processados de modo construtivo ou destrutivo; c) sociedade em
que se pratica cultura de paz é aquela que lida construtivamente com os conflitos; d) lidar
destrutivamente com o conflito é transformá-lo, pela polaridade, em espiral de confronto e violência;
e) lidar construtivamente é obter, pela via do conflito, novas compreensões, com estreitamento dos
vínculos interpessoais e do tecido social; f) são elementos do conflito a relação interpessoal, o
problema objetivo e sua trama ou processo; g) grosso modo, há conflitos de estrutura, de valores, de
informação, e de interesses; h) o conflito evolui numa espiral, de latente a manifesto (disputa),
seguindo-se a fase do balanceamento de poder (a confrontação), sequenciada pela fase da busca do
equilíbrio (institucionalizado ou não), chegando à acomodação (conflito latente), que dará origem a
novas possíveis disputas.
1 RUMMEL, Rudolf J. Understanding conflict and war. New York: John Wiley and Sons, 1976, v. II
p 235-239, apud SERPA, Maria de Nazareth.Mediação, uma solução judiciosa para conflitos.
Belo Horizonte: Del Rey, 2017.
2 RUMMEL, Rudolf J. op. cit. v. II, p. 62 e v. III, p. 63, apud SERPA, Maria de Nazareth. Mediação,
uma solução judiciosa para conflitos. Belo Horizonte: Del Rey, 2017.
3 JANDT, F.E. Conflict resolution through communication. New York, 1984, apud SERPA, Maria
de Nazareth. Mediação, uma solução judiciosa para conflitos. Belo Horizonte: Del Rey, 2017.
4 RATTON JR., José Luiz de Amorim. Racionalidade, política e normalidade do crime em Émile
Durkheim. Revista Científica Argumentum da Faculdade Marista do Recife, Recife: Faculdade
Marista, vol. 1, 2005, p. 111-129.
5 PELIZZOLI, Marcelo L. Paz e conflito. Visão sistêmico-fenomenológica. In: PELIZZOLI, Marce
(Org.). Cultura de paz: restauração e direitos. Recife: Ed. Universitária da UFPE, 2010. p. 13-31.
6 DEUSTCH, Morton.A Resolução do Conflito: processos construtivos e destrutivos. New Haven
(CT) Yale University Press, 1977 – traduzido e parcialmente publicado em AZEVEDO, André
Gomma de (org.). Estudos em Arbitragem, Mediação e Negociação. V 3. Brasília: Ed. Grupos de
Pesquisa, 2004.
7 MORIN, Edgar. A cabeça bem-feita: repensar a reforma, reformar o pensamento. Tradução Eloá
Jacobina. 16. ed. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2009. p. 51.
8 URY, William. Chegando à paz – Resolvendo conflitos em casa, no trabalho e no dia a dia. Rio de
Janeiro: Campus, 2000. p. 54-66.
9 HARARI, Yuval Noah.Sapiens – Uma breve história da humanidade. Tradução de Janaína
Marcoantônio. Porto AlegreS: L&PM, 2016. p. 30-36.
10 DAN, Wei. Mediação na China: passado, presente e futuro. In: CASELLA, Paulo Borba; SOUZA
Luciane Moessa de (Org.). Mediação de conflitos. Novo paradigma de acesso à justiça. Belo
Horizonte: Fórum, 2009. p. 342.
11 SANTOS, Boaventura de Sousa.O Estado heterogêneo e o pluralismo jurídico. Conflito e
transformação social. Uma paisagem das justiças em Moçambique. Boaventura de Sousa Santos e
João Carlos Trindade (orgs.). Porto: Edições Afrontamento, 2003. 1.º vol., p. 47-89.
12 FOUCAULT, Michel. Microfísica do poder. Organização e tradução de Roberto Machado. Rio de
Janeiro: Graal, 2006. p. 290-292.
13 FOUCAULT, Michel.Vigiar e punir: nascimento da prisão. Tradução de Raquel Ramalhete. 31.
ed. Petrópolis: Vozes, 2006. p. 18.
14 ALMEIDA, Alberto Carlos. A Cabeça do Brasileiro. Rio de Janeiro: Record, 2007. p. 45-110.
15 FAORO, Raymundo. Os donos do poder. 5. ed. São Paulo: Colombo, 2012. 929 p.
16 URI, William. Op. cit., p. 108.
17 COMPARATO, Fábio Konder.Ética: direito, moral e religião no mundo moderno. São Paulo:
Companhia das Letras, 2006. p. 18, 716 p.
18 SOUTO, Cláudio.Tempo do direito alternativo: uma fundamentação substantiva. Porto Alegre:
Livraria do Advogado, 1997. p. 79-81.
19 MAYER, Dayse de Vasconcelos. A democracia capturada: a face oculta do poder: um ensaio
jurídico-político. São Paulo: Método, 2009. p. 254.
20 BAUMAN, Zygmunt.Amor líquido. Sobre a fragilidade dos laços humanos. Tradução de Carlos
Alberto Medeiros. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2004. p. 131-138.
21 ROSENBERG, Marshall B.Comunicação não violenta. Técnicas para aprimorar
relacionamentos pessoais e profissionais. Tradução Mário Vilela. São Paulo: Ágora, 2006. p.
223-229.
O paradigma sistêmico da ciência e a
linguagem do Direito: o lugar da mediação
de conflitos
O novo paradigma integra sistema e problema, estrutura e função. O sistema é definido como um
complexo de elementos em interação; conjunto de componentes em estado de interação. Sistema é,
portanto, um “todo” integrado de componentes com tendência a manter-se, mesmo que haja
substituição de membros individuais. A interação no sistema dá-se mediante uma causalidade
circular, uma influência bidirecional, recursiva. Especialmente em sistemas vivos, essa causalidade
comunica-se com o ambiente externo, acarretando substituições de membros individuais, nessas
trocas que acontecem em meio à teia da vida que se desdobra e se transforma permanentemente. Pois
o “ser” da existência é a metamorfose da ação de existir, tal como nós a compreendemos a cada
instante. Não há sistema sem problema ou sistematização sem problematização.
O universo conhecido caracteriza-se como uma estrutura escalonada, constituída pela
superposição de níveis de sistemas; cada um desses níveis constituindo-se como um todo irredutível
aos seus níveis ou componentes inferiores.
Os membros individuais de um sistema são, ao mesmo tempo, todo e parte (holons/holograma).
Cada holon teria duas tendências: uma integrativa (onda), que atua enquanto parte de um todo maior,
expressando a interdependência da integração que faz o sistema viável; outra afirmativa
(corpúsculo), que opera como o todo, preservando a sua individualidade e expressando autonomia.
A essa ideia de um mundo como totalidade organizada deve ser agregado o conceito de
acoplamento estrutural, desenvolvido por Maturana, que explora as “fronteiras” entre sistemas.
As fronteiras, as “separações” entre os sistemas, devem ser vistas entre aspas, pois os sistemas
são, ao mesmo tempo, funções e estruturas que se retroalimentam dialeticamente. Afinal de contas, o
que chamamos de sistema é uma idealização do nosso modo de perceber o mundo, um modo
simplificado pela racionalização, embora experimentado, medido, sentido, sistematizado; temos,
portanto, um significado possível a cada vivência para um significante sempre mais complexo, em
metamorfose.
Com essa observação inicial quisemos destacar que o novo paradigma da ciência funda-se na
abordagem sistêmica, em que as relações são focadas para além do modo de pensar disjuntivo do
tipo “ou-ou”. Essa dialética disjuntiva, dos séculos XIX e XX, inspirada no iluminismo cientificista
de Hegel, pregava um confronto excludente entre “tese” e “antítese”, de modo que a síntese
decorreria da remoção da tese anterior e implantação da sua antítese.
No campo dos conflitos intersubjetivos, essa noção de dialética estimulou o confronto entre as
classes sociais, na perspectiva de que a tomada do poder pela classe trabalhadora resultaria na
“síntese” socialista/comunista, com a eliminação da “tese” (capitalista) e implantação da antítese
(socialista).
A dialética do novo paradigmática acolheu/retomou a dialética da contradição/antagonismo no
fluxo dos processos existenciais, mas num ambiente de complementaridade, em que esses
desencontros (ordem/caos) vão realimentando a metamorfose tese-antítese, em que a síntese também
não existe em si mesma, pois corresponde ao contínuo processo de mudança.
Nessa nova perspectiva, os conflitos devem ser compreendidos enquanto expressões sistêmicas
de padrões comportamentais, de condicionamentos relacionais, sociais, econômicos, culturais, sem o
maniqueísmo ontológico das posições excludentes, porque as contradições e os antagonismos
expressam complementaridades dinâmicas, que podem ser compreendidas e facilitadas mediante
processos construtivos, que acolhem o modo de problematizar, pensar e concretizar o atendimento de
necessidades comuns e contraditórias do tipo “e-e”.
Segue, adiante, com base na pedagogia de Maria Esteves de Vasconcellos,1 um resumo das três
dimensões que caracterizam esse novo paradigma da ciência contemporânea.
E a física ainda nos trouxe um terceiro problema: o da objetividade. Embora a relação entre o
sujeito que conhece e o objeto que é conhecido seja, de há muito, tema discutido no campo da teoria
do conhecimento, esse estudo somente foi formalmente introduzido no campo da física quando
Heisenberg formulou seu notável “princípio da incerteza”, segundo o qual, em mecânica quântica,
não se pode ter, simultaneamente, valores bem determinados para a posição e para a velocidade.
Comprovou Heisenberg que, “ao se lançar luz sobre um elétron, a fim de poder “vê-lo”, isso
inevitavelmente o colocava fora de curso, afetando sua velocidade ou sua posição”.
Diz Maturana4 que, “Na realidade, em sistemas dinâmicos, tais como os sistemas vivos, a
estrutura está em contínua mudança. Quando me movimento, altero minha estrutura, porque a estrutura
é tanto os componentes quanto as suas relações. Felizmente posso mudar a minha estrutura sem
perder minha organização. Enquanto puder fazer isso, ou isso acontecer comigo, estarei vivo”. E esse
movimento ocorre no contexto de relações. Segundo Maturana, “Sempre que tivermos organismos
que, através de um histórico de interações, continuem interagindo entre si, temos um domínio
linguístico. Mas é bom notar que a adaptação, a invariável da adaptação, é uma coerência estrutural,
significando que a estrutura do sistema pode ser descrita como detentora de uma correspondência
mútua que se manifesta de forma dinâmica. Costumo chamar isto de acoplamento estrutural. A mesma
coisa acontece entre os organismos. Se houver uma coerência no histórico de interações, eles estão
mutuamente adaptados. Vão continuar a interagir entre si enquanto houver coerência, enquanto
permanecerem mutuamente adaptados, porque cada interação resultará na seleção de uma mudança
estrutural específica. Sempre que isto acontecer, estabelece-se um domínio linguístico. Se este
domínio linguístico permitir um reajustamento na interação linguística, teremos então uma
linguagem”.
Com isto, ficam excluídas as ideias de neutralidade e de uma objetividade sem aspas. Pois o
observador exerce, mesmo inconscientemente, uma intervenção perturbadora sobre aquilo que quer
conhecer. Em lugar daquela objetividade clássica, temos uma intersubjetividade.
Enfim, o terceiro aspecto do novo paradigma remete-nos à dimensão da intersubjetividade,
compreendendo uma teoria científica do observador, coconstrução da realidade na linguagem,
determinismo estrutural, acoplamento estrutural, fechamento estrutural do sistema, objetividade entre
parênteses, espaços consensuais, multiversa, múltiplas verdades, narrativas, construção da
realidade, sistema observante, visão de segunda ordem, referência necessária ao observador,
autorreferência, reflexividade, transdisciplinaridade.
Essa metódica estruturante não assegura uma única solução correta, mas orienta no sentido da
melhor decisão. Porque, conforme o novo paradigma na linguagem do Direito, não há verdade nas
ciências; apenas métodos e metodologias que, em se fazendo criteriosamente analíticos, poderão ser
muito bem fundamentados. Daí por que os postulados ajudam o aplicador do direito a não atuar com
discricionariedade (autoritarismo), porque ele poderá substituir as suas escolhas pessoais por
critérios analíticos adequados. E mais, em vez de arbitrariamente inventar nomes para o que cada um
entenda como sendo mais um princípio – em artifícios metafísicos de um panprincipiologismo – deve
o aplicador do direito bem fundamentar a sua decisão na análise dos postulados (metanormas).
E como o novo paradigma da ciência contempla o pensamento sistêmico, por que a única saída
será, invariavelmente, o cumprimento da pena privativa de liberdade? Os danos foram reparados? Os
desvios foram recuperados? Inexistem antecedentes? O autor pediu perdão à cidadania? Reparou, de
algum modo razoável, as ofensas morais e as perdas materiais que acarretou? Por que, com enfoque
restaurativo – e, portanto, não meramente punitivo – não ousarmos estabelecer critérios outros, para
a eventual adoção de programas voltados para a reparação dos danos? Sobre os fundamentos de uma
justiça restaurativa sugerimos a leitura do Capítulo XI.
Insistimos, pois – com esta perspectiva novo paradigmática – que a interpretação jamais se
esgota numa operação lógica de subsunção (submetimento) de algum “fato” a alguma “norma”. Não
há fato em si mesmo ou texto normativo em si mesmo; há eventos tão somente, em sua dinâmica. Pois
o texto normativo é um programa normativo (estrutura) que se expressa na dialética material dos
eventos a que está remetido (problematização) e se completa, enquanto retórica ou linguagem
jurídica, na análise de critérios ou postulados que fundamentem a sua concretização (função).
Em suma, a linguagem jurídica constrói, continuamente, um sistema aberto para os demais
subsistemas sociais.
1 VASCONCELLOS, Maria José Esteves de. Pensamento sistêmico: o novo paradigma da ciência. 4
ed. Campinas: Papirus, 2005. p. 101-146.
2 MORIN, Edgard.Introdução ao pensamento complexo. Traduzido do francês por Eliane Lisboa.
Porto Alegre: Sulina, 2006. p. 102-103, 120 p.
3 PRIGOGINE, Ilya. As leis do caos. Trad. Roberto Leal Ferreira. São Paulo: UNESP, 2002. p. 79-
84.
4 MATURANA, Humberto.O que se observa depende do observador. Gaia – Uma teoria do
conhecimento. Organizado por William Irvin Thompson. Trad. Sílvio C. Leite. 3. ed. São Paulo:
Gaia, 2001. p. 61-76.
5 DWORKIN, Ronald. Uma questão de princípio. Trad. Luis Carlos Borges. São Paulo: Martins
Fontes, 2000. 593 p.
6 VASCONCELOS, Carlos Eduardo de. A cultura de paz na metódica do direito e na prática da
mediação de conflitos. In: PELIZZOLI, Marcelo; SAYÃO, Sandro (Org.). Diálogo, mediação e
justiça restaurativa: cultura de paz. Recife: Ed. Universitária da UFPE, 2012. p. 129-158.
7 MÜLLER, Friedrich. Teoria estruturante do direito . Trad. Peter Naumann e Eurides A. Souza. 3.
ed. São Paulo: RT, 2011. 300 p.
8 WARAT, Luis Alberto. Direito e sua Linguagem. 2. ed. Porto Alegre: Sérgio Antônio Fabris
Editor, 1995. p. 120.
9 HÄBERLE, Peter.Hermenêutica constitucional. A sociedade aberta dos intérpretes da
Constituição: contribuição para a interpretação pluralista e “procedimental” da Constituição.
Trad. Gilmar Ferreira Mendes. Porto Alegre: Fabris, 2002. 55 p.
10 ÁVILA, Humberto. Teoria dos Princípios – da definição à aplicação dos princípios jurídicos. 16.
ed. São Paulo: Malheiros, 2015. p. 226.
11 Ávila, Humberto. Op. cit., p. 202-204.
12 HARARI, Yuval Noah. Homo Deus: uma breve história do amanhã. Trad. Paulo Geiger. São Paulo:
Companhia das Letras, 2016. p. 331-332.
13 CAPRA, Fritjof. A teia da vida. São Paulo: Cultrix, 2000. p. 25-27.
14 BORGES, José Souto Maior.O contraditório no processo judicial (uma visão dialética). São
Paulo: Malheiros, 1996. 112 p.
15 BORGES, op. cit., p. 50.
16 VASCONCELOS, Carlos Eduardo de. Dialética nos contraditórios judicial e arbitral: a arte do
direito e sua regulação. Revista Brasileira de Arbitragem, Porto Alegre: Síntese, Curitiba:
Comitê Brasileiro de Arbitragem, n. 28, 2011, p. 7-29.
17 ADEODATO, João Maurício. Uma teoria retórica da norma jurídica e do direito subjetivo. São
Paulo: Noeses, 2011.
18 GADAMER, Hans-Georg. Verdadee método I. Traços fundamentais de uma hermenêutica
filosófica. Trad. Flávio Paulo Meurer. 12. ed. Petrópolis: Vozes, 2012. p. 576.
Resolução Adequada de Disputas (RAD):
introdução aos métodos e capacitações de
mediadores extrajudiciais e judiciais, de
acordo com a Resolução 125/10 do CNJ
O que é negociação?
É o planejamento, a execução e o monitoramento, sem a interferência de terceiros, envolvendo
pessoas, problemas e processos, na transformação ou restauração de relações, na solução de disputas
ou trocas de interesses. A negociação, em seu sentido técnico, deve estar baseada em princípios.
Deve ser cooperativa, pois não tem por objetivo eliminar, excluir ou derrotar a outra parte. Nesse
sentido, a negociação (cooperativa), dependendo da natureza da relação interpessoal, pode adotar o
modelo integrativo (para relações continuadas e com vistas a ampliar os campos de atuação comum)
ou o distributivo (para relações episódicas, quando se busca compartir os bens materiais e imateriais
em negociação). Em qualquer circunstância busca-se um acordo de ganhos mútuos.
Nem sempre é possível resolver uma disputa negociando diretamente com a outra pessoa
envolvida. Nesses casos, para retomar o diálogo, será preciso contar com a colaboração de uma
terceira pessoa, que atuará como mediadora.
O que é mediação?
Mediação é método dialogal de solução ou transformação de conflitos interpessoais em que os
mediandos escolhem ou aceitam terceiro(s) mediador(es), com aptidão para conduzir o processo e
facilitar o diálogo, a começar pelas apresentações, explicações e compromissos iniciais,
sequenciando com narrativas e escutas alternadas dos mediandos, recontextualizações e resumos
do(s) mediador(es), com vistas a se construir a compreensão das vivências afetivas e materiais da
disputa, migrar das posições antagônicas para a identificação dos interesses e necessidades comuns e
para o entendimento sobre as alternativas mais consistentes, de modo que, havendo consenso, seja
concretizado o acordo.
Cabe, portanto, ao mediador, com ou sem a ajuda de comediador, colaborar com os mediandos
para que eles pratiquem uma comunicação construtiva e identifiquem seus interesses e necessidades
comuns.
Há vários modelos ou escolas de mediação, tais como a mediação facilitativa (satisfativa,
linear ou tradicional de Harvard), a mediação avaliativa (ou conciliação), a mediação transformativa
e a mediação circular--narrativa (ou narrativa). De regra, recomenda-se, independentemente do
modelo adotado, a realização de encontros preparatórios ou entrevistas de pré-mediação.
A mediação é tida como um método dialogal e autocompositivo, no campo da retórica material
e, também, como uma metodologia, em virtude de constituir um procedimento baseado num complexo
interdisciplinar de conhecimentos científicos extraídos especialmente da comunicação, da
psicologia, da sociologia, da antropologia, do direito e da teoria dos sistemas. E é, também, como
tal, uma arte, em face das habilidades e sensibilidades próprias do mediador.
O que é arbitragem?
A arbitragem é um instituto do Direito. É prevista em leis e convenções internacionais, com
destaque para a Convenção de Nova York, de 1958. Aqui no Brasil a norma básica sobre arbitragem
é a Lei 9.307/1996 (“Lei Marco Maciel”), com as alterações introduzidas pela Lei 13.129/2015. As
pessoas podem optar pela solução das suas disputas por intermédio da arbitragem. Nesse caso, o
papel do terceiro é diferente do que ocorre na mediação, pois a ele especialmente cabe decidir, ao
término de processo em que deverá colher provas e arrazoados jurídicos. Mas é preciso destacar
que, na dinâmica do processo arbitral, é dever do árbitro ou do painel de árbitros atuar de modo
colaborativo e buscar a conciliação desde o início.
Trata-se de instituto com duas naturezas jurídicas que se completam: a contratual e a
jurisdicional. Pelo contrato as pessoas optam por se vincular a uma jurisdição privada, sujeita, no
entanto, a princípios de ordem pública, como os da independência, da imparcialidade, do “livre”
convencimento do árbitro, do contraditório e da igualdade. Assim, a arbitragem pressupõe a livre
opção das partes (autonomia da vontade) por meio de uma convenção de arbitragem – cláusula
contratual denominada “compromissória”, firmada antes do surgimento de qualquer conflito, ou
“compromisso arbitral”, quando já há conflito e as partes, de comum acordo, decidem solucioná--lo
por intermédio de arbitragem. Firmada a convenção de arbitragem, as partes ficam irrevogavelmente
vinculadas à jurisdição arbitral, consoante regulamento previamente aceito, podendo contar com o
apoio de instituição arbitral especializada na administração desse procedimento.
A convenção de arbitragem confere, pois, efeitos negativos e positivos. Negativos no sentido de
subtrair poder jurisdicional ao juiz estatal que seria competente para apreciar a matéria. Positivos no
sentido de que esse poder jurisdicional passa a ser do árbitro, após a sua aceitação e confirmação
das partes. A propósito, as partes podem escolher um número ímpar de árbitros, sendo costumeira a
escolha de um ou três. Honorários e custas são suportados por igual pelas partes, salvo acordo
noutro sentido.
As matérias que podem ser objeto de processo arbitral são as que dizem respeito a direitos
patrimoniais disponíveis; aqueles relativos a bens que têm valor econômico e podem ser objeto de
operações de compra e venda, doação, permuta, transação, etc. A lei estabelece prazo máximo de
seis meses para a conclusão de uma arbitragem, podendo as partes, de comum acordo, reduzir ou
ampliar esse prazo. É considerada privada a arbitragem entre particulares. É chamada de mista a
arbitragem entre particulares e entidades da Administração Pública. É conhecida como pública a
arbitragem entre entes públicos, inclusive estados nacionais.
Portanto, trata-se de alternativa processual à disposição das pessoas capazes, com a vantagem
de que as partes podem escolher árbitros especialistas na matéria em discussão. Esse aspecto, aliado
à rapidez de um procedimento que não comporta recursos para outras instâncias, possibilita soluções
rápidas, que contemplam o dinamismo da vida moderna. E como o poder de impor o cumprimento de
decisões é privativo do Estado (coercio ou estrito poder de império), o não cumprimento espontâneo
de medida ou de sentença arbitral poderá ensejar constrição ou execução judicial. A comunicação
entre o árbitro e o Poder Judiciário dá-se por meio de Carta Arbitral. Eventual nulidade do
procedimento ou da sentença arbitral poderá ser objeto de “ação de nulidade”. O Supremo Tribunal
Federal já se pronunciou pela constitucionalidade desse instituto.
Sobre esses temas destacamos os Enunciados4 1 a 13:
49. Os Comitês de Resolução de Disputas (Dispute Boards) são método de solução consensual
de conflito, na forma prevista no § 3° do art. 3º do Código de Processo Civil Brasileiro.
76. As decisões proferidas por um Comitê de Resolução de Disputas (Dispute Board), quando
os contratantes tiverem acordado pela sua adoção obrigatória, vinculam as partes ao seu
cumprimento até que o Poder Judiciário ou o juízo arbitral competente emitam nova
decisão ou a confirmem, caso venham a ser provocados pela parte inconformada.
80. A utilização dos Comitês de Resolução de Disputas (Dispute Boards), com a inserção da
respectiva cláusula contratual, é recomendável para os contratos de construção ou de obras
de infraestrutura, como mecanismo voltado para a prevenção de litígios e redução dos
custos correlatos, permitindo a imediata resolução de conflitos surgidos no curso da
execução dos contratos.
1. ESPAÇOS INFORMATIVOS
São considerados espaços informativos (cursos, palestras, seminários, workshops)
todos aqueles que se dediquem a divulgar e informar sobre os instrumentos de
resolução alternativa de disputas (RAD), suas aplicações e benefícios.
Certificados
Poderão ser conferidos certificados de participação que citarão a qualidade do
espaço frequentado (cursos, palestras, seminários, workshops) e sua carga horária.
A. MÓDULO TEÓRICO-PRÁTICO
Este módulo compõe-se de aulas teóricas e simulações da prática.
1.3) Frequência
A participação entendida como necessária inclui um mínimo de 90% de
frequência.
OBSERVAÇÃO: A frequência apenas no módulo teórico-prático permitirá que seja
expedido certificado de participação – salientando-se o aprendizado de noções básicas
de Mediação.
1.4) Avaliação
Ao término desta etapa ou no curso da seguinte, faz-se necessária uma avaliação
de conhecimento, ficando a critério da Instituição ou do docente responsável a sua
forma (trabalhos sobre os temas apresentados, estudos de casos, resenhas de livros,
paper sobre o conteúdo) e aplicação.
B. ESTÁGIO SUPERVISIONADO
Este estágio compreende a prática supervisionada de casos reais. Ele é
imprescindível e não pode ser substituído pela prática simulada.
Durante o seu curso, o estagiário deverá passar por três diferentes posições no
exercício da Mediação – Mediador, comediador e observador –, apresentando relatório
do trabalho realizado/da experiência vivida.
2.2) Certificação
Somente serão conferidos certificados de capacitação básica em Mediação,
habilitando para atuar como mediador aqueles que cumprirem suas duas etapas
(módulo teórico-prático e estágio supervisionado), em conformidade com o que elas
exigem. A prontidão para o exercício da Mediação será definida entre o estagiário e o
supervisor, não ficando exclusivamente norteada pelo número de horas exigidas.
Carga horária
Para os cursos de capacitação em áreas específicas sugere-se que sejam
ministrados em um mínimo de 20 (vinte) horas.
5. CAPACITAÇÃO EM SUPERVISÃO
As Instituições capacitadoras, com a intenção de multiplicar sua tarefa de ensino,
mantendo a qualidade e excelência, poderão oferecer aos profissionais por ela
capacitados a oportunidade de ascender à função de supervisores. Para tal, deverão
construir requisitos e programar atividades e cursos que os qualifiquem para o
desempenho da função.
6. CAPACITAÇÃO EM DOCÊNCIA
As Instituições capacitadoras, com a intenção de multiplicar sua tarefa de ensino
mantendo a qualidade e excelência, poderão oferecer aos profissionais por ela
capacitados a oportunidade de ascender à docência. Para tal, deverão construir
requisitos e programar atividades e cursos que os qualifiquem para o desempenho da
função.
II – Facultativo
1. Instrutores
Os conciliadores/mediadores capacitados nos termos dos parâmetros indicados
poderão se inscrever no curso de capacitação de instrutores, desde que preencham,
cumulativamente, os seguintes requisitos:
1 SANDER, Frank. Varieties of dispute processing. Minnesota: West Publishing, 1979, p. 65/87.
2 CEZAR FERREIRA, Verônica A. da Motta.Família, separação e mediação: uma visão
psicojurídica. São Paulo: Método, 2007. 270 p.
3 CACHAPUZ, Rozane da Rocha. Mediação nos conflitos e direito de família. Curitiba: Juruá, 2011
171 p.
4 Referência: Centro de Estudos Judiciários do Conselho da Justiça Federal, I Jornada “Prevenção e
Solução Extrajudicial de Litígios”, 22 e 23 de agosto de 2016, Brasília – DF.
5 LEVY, Fernanda Rocha Lourenço. Cláusula escalonada: a mediação comercial no contexto da
arbitragem. São Paulo: Saraiva, 2013. p. 328.
6 CONFORTI, Franco. Facilitación de diálogos apreciativos. In: BRAGA NETO, Adolfo; SALES
Lilia Maia de Morais (Org.). Aspectos atuais sobre a mediação e outros métodos extra e
judiciais de resolução de conflitos. Rio de Janeiro: GZ Ed, 2012. p. 143-265.
7 VALENÇA, Antônio Carlos. Fundamentos teóricos da mediação: Método da investigação
apreciativa da ação-na-ação. Caderno de Campo – Mediação: Método da Investigação
Apreciativa da Ação-na-ação. Antônio Carlos Valença (org.). Recife: Bagaço, 2009. p. 51-132.
8 Referência: Centro de Estudos Judiciários do Conselho da Justiça Federal, I Jornada “Prevenção e
Solução Extrajudicial de Litígios”, 22 e 23 de agosto de 2016, Brasília – DF.
9 ALMEIDA, Tânia. Mediação de Conflitos para iniciantes, praticantes e docentes/ Coordenadoras
Tânia Almeida, Samantha Pelajo e Eva Jonathan. Salvador: Ed. JusPodivm, 2016.
10 Referência: Centro de Estudos Judiciários do Conselho da Justiça Federal, I Jornada “Prevenção e
Solução Extrajudicial de Litígios”, 22 e 23 de agosto de 2016, Brasília – DF.
O NCPC (Lei 13.105/2015) e a Lei de
Mediação (13.140/2015) no sistema
multiportas de acesso à justiça
O texto menciona que o processo civil será ordenado, disciplinado e interpretado conforme os
valores e normas fundamentais... Ora, os valores e normas fundamentais estão insculpidos nos
princípios constitucionais da CF/88.
Tais princípios, que fundamentam o modo como a sociedade brasileira instituiu o seu Estado
Democrático, estão enunciados desde o Preâmbulo da Constituição da República Federativa do
Brasil, onde consta que os representantes do povo brasileiro, reuniram-se em Assembleia Nacional
Constituinte para instituir um Estado Democrático, destinado a assegurar o exercício dos direitos
sociais e individuais; a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a
justiça como os valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada
na harmonia social e comprometida, na ordem interna e internacional, com a solução pacífica das
controvérsias.
Com efeito, os incisos II, III e IV do art. 1º da CF/1988 elencam, dentre os fundamentos da
República Federativa do Brasil, a cidadania, a dignidade da pessoa humana e também os valores
sociais do trabalho e da livre-iniciativa. Ali também constando os direitos e as garantias
fundamentais dos arts. 5º a 17. Extraímos daí que precisaremos ter como critérios para relações
pacíficas e construtivas entre todos a liberdade igual, a igualdade de oportunidades e o
asseguramento de existência digna, na ambiência de uma estabilidade democrática.
Em tal contexto, os processos judiciais, inclusive em sede adjudicatória, deverão, conforme o
novo CPC, priorizar os procedimentos cooperativos que promovam, na medida do possível, a
solução pacífica e consensual das controvérsias.
Com efeito, é de conhecimento público que dificilmente a pacificação social é obtida por meio
de sentença, que se resume, via de regra, à imposição de textos normativos para solucionar aquela
parcela de lide levada a juízo, sem compreender a concretude do conflito, qual seja, as necessidades
humanas e sociais a serem reconhecidas e pacificadas. Daí porque emana desses princípios
fundamentais a necessidade do fortalecimento, no âmbito processual, do papel da cidadania
democrática, comprometida com a solução pacífica das controvérsias. Essa atuação deve justamente
acontecer em ambientes de transparência, de cooperação e de controle social da administração da
justiça, e pelos procedimentos institucionais de mediação e conciliação.
O novo CPC, em sua característica de texto inspirado no constitucionalismo contemporâneo,
prioriza a cooperação, a boa-fé, a prevalência do campo material sobre o formal, o diálogo
processual, a não surpresa, a duração razoável do processo, reconhecendo as suas disposições
normativas como instrumentos para a concretização dos princípios constitucionais.
As atuais inovações do CPC resgatam, portanto, uma dívida histórica do direito processual civil
para com a Constituição da República. Estávamos reféns da supervalorização de processos de
ganha-perde, com ênfase para as particularidades formais, que hipertrofiavam os mecanismos
adjudicatórios e aviltavam as possibilidades dos métodos autocompositivos. Conforme veremos
adiante, acolhe-se, agora, no processo civil brasileiro, a estratégia de algum modo anunciada pela
Resolução 125/2010 do CNJ, conhecida como sistema multiportas de acesso à justiça. Ou seja, o
Poder Judiciário não é mais um local apenas para o julgamento, mas para encaminhamentos vários e
para o tratamento adequado de conflitos.7
“Art. 2º O processo começa por iniciativa da parte e se desenvolve por impulso oficial,
salvo as exceções previstas em lei.
Art. 3º Não se excluirá da apreciação jurisdicional ameaça ou lesão a direito.
§ 1º É permitida a arbitragem, na forma da lei.
§ 2º O Estado promoverá, sempre que possível, a solução consensual dos conflitos.
§ 3º A conciliação, a mediação e outros métodos de solução consensual de conflitos
deverão ser estimulados por juízes, advogados, defensores públicos e membros do
Ministério Público, inclusive no curso do processo judicial.”
O caput deste artigo 3º enuncia, ao seu modo, um princípio insculpido no art. 5º, XXXV, da Lei
Maior, que tem a seguinte redação: “A lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou
ameaça de direito”. E o faz aprimorando o significado, ao substituir “apreciação do Poder
Judiciário” por “apreciação jurisdicional”. No âmbito deste princípio, e consoante já pacificado
pelo STF, as pessoas capazes podem optar, nos limites constitucionais e legais, pela jurisdição
arbitral, evitando a via única de judicialização de ameaças ou lesões de direito.
O § 1º parece desnecessário, à primeira vista. A lei de arbitragem é reconhecida pelo STF
como em conformidade com a Constituição/88. No entanto, considerando o acolhimento de um
sistema multiportas de acesso à justiça, essa referência é adequada, especialmente quando cotejada
com a do art. 359, em que se percebe que o Juiz deverá buscar a conciliação, podendo recomendar a
mediação ou conciliação, também lhe sendo permitido sugerir a opção pela arbitragem, o que
implicaria na assinatura de compromisso arbitral, com a consequente extinção do processo judicial.
Os §§ 2º e 3º consubstanciam o cerne da mudança de paradigma do processo civil brasileiro. Os
métodos consensuais saíram daquela situação subalterna, aviltada, intuitiva, estigmatizada, como
eram praticados sob o paradigma formalista do CPC anterior, para a condição de instrumentos do
princípio da promoção da paz, ou da pacificação, tal como lhes reservara, implicitamente, a
Constituição Federal de 1988.
Sempre que possível, a solução será consensual. Esse é um compromisso da cidadania e um
dever dos operadores do direito e do Estado. Pode-se perceber nisso um princípio da preferência
pelas soluções consensuais.
Mas, para que os efeitos práticos sejam alcançados, será necessária uma mudança profunda no
senso comum teórico e nas práticas dos juristas brasileiros. Os operadores do direito precisarão
assumir atitudes mais colaborativas no sentido de uma boa gestão dos conflitos, defendendo as suas
teses sem apegos narcísicos e arrogância, tendo em conta que elas não passam de pré-compreensões
em face das possibilidades múltiplas. As soluções mais apropriadas serão aquelas que satisfaçam as
pessoas envolvidas, ao se sentirem atendidas em suas necessidades reais de concretização do direito.
“Art. 4º As partes têm o direito de obter em prazo razoável a solução integral do mérito,
incluída a atividade satisfativa.
Art. 5º Aquele que de qualquer forma participa do processo deve comportar-se de
acordo com a boa-fé.
Art. 6º Todos os sujeitos do processo devem cooperar entre si para que se obtenha, em
tempo razoável, decisão de mérito justa e efetiva”.
Cada um desses três artigos destaca um princípio: no art. 4º, o princípio da razoável duração do
processo associado à objetividade, em busca da solução do mérito, nisto incluída a atividade
satisfativa; o cumprimento espontâneo ou forçado. No art. 5º, o princípio da boa-fé, que supõe
comportamento objetivamente colaborativo e ético. No art. 6º, o princípio da cooperação, que
pressupõe conduta comprometida com o objetivo processual da efetividade de uma decisão de mérito
em tempo razoável, justa e efetiva. Percebe-se que o novo CPC reconhece a necessidade da
cooperação para que se obtenha, em tempo razoável, a decisão de mérito justa e efetiva.
Implicitamente proclama que não há cooperação sem o primado da boa-fé. Assim, superado, como é
de se esperar, o velho padrão da litigiosidade, do engodo e da violência verbal de uma cultura
maniqueísta, poderemos construir o caminho da razoável duração do processo.
O art. 7º busca esclarecer o significado do efetivo contraditório, que engloba as garantias que
devem ser asseguradas às partes, as sanções aplicáveis pelo juiz no processo, em paridade de
tratamento. Com efeito, contraditório efetivo é necessariamente colaborativo, deve priorizar soluções
consensuais, não permite a má-fé, manipulações, barganhas e procrastinações, de modo a ensejar
solução de mérito justa e efetiva, em tempo razoável, incluindo a atividade satisfativa.
O art. 8º, que, de algum modo, reproduz dispositivos da LINDB (Lei de Introdução às Normas
do Direito Brasileiro), traz como novidade o intento de orientar e exigir o manejo, no microuniverso
processual, de metanormas estruturantes de hermenêutica jurídica, ao destacar os critérios analíticos
(postulados) da proporcionalidade e da razoabilidade, na aplicação do ordenamento jurídico. Quem
sabe, em face da necessidade de proibição de excessos. Cabe-nos enunciar a distinção entre
proporcionalidade e razoabilidade, que, no nosso entender, está bem didática e precisa na lição de
Humberto Ávila8. Segundo Ávila, o postulado (regra sobre aplicação de normas) da
proporcionalidade exige que o Poder Legislativo e o Poder Executivo escolham, para a realização
dos seus fins, meios adequados, necessários e proporcionais, em sentido estrito. “Um meio é
adequado se promove o fim. Um meio é necessário se, dentre todos aqueles meios igualmente
adequados para promover o fim, for o menos restritivo relativamente aos direitos fundamentais. E um
meio é proporcional, em sentido estrito, se as vantagen s que promove superam as desvantagens que
provoca”9. A aplicação da proporcionalidade exige, portanto, a relação de causalidade entre meio e
fim, de tal sorte que, adotando-se o meio, promove-se o fim.
Diferentemente da proporcionalidade, o postulado da razoabilidade, conforme a lição de Ávila,
não diz respeito a uma relação de causalidade entre um meio e um fim positivado, mas à relação que
decorre do dever de harmonização do geral com o individual (dever de equidade), como instrumento
para determinar se as circunstâncias do fato levam à presunção de estarem dentro da normalidade, ou
para expressar em que medida se dará a aplicabilidade da regra geral quando do enquadramento do
caso concreto (dever de congruência).
“Art. 190. Versando o processo sobre direitos que admitam autocomposição, é lícito às
partes plenamente capazes estipular mudanças no procedimento para ajustá-lo às
especificidades da causa e convencionar sobre os seus ônus, poderes, faculdades e
deveres processuais, antes ou durante o processo.
Parágrafo único. De ofício ou a requerimento, o juiz controlará a validade das
convenções previstas neste artigo, recusando-lhes aplicação somente nos casos de
nulidade ou de inserção abusiva em contrato de adesão ou em que alguma parte se
encontre em manifesta situação de vulnerabilidade.”
“Art. 471. As partes podem, de comum acordo, escolher o perito, indicando-o mediante
requerimento, desde que:
I – sejam plenamente capazes;
II – a causa possa ser resolvida por autocomposição.
§ 1º As partes, ao escolher o perito, já devem indicar os respectivos assistentes técnicos
para acompanhar a realização da perícia, que se realizará em data e local previamente
anunciados.
§ 2º O perito e os assistentes técnicos devem entregar, respectivamente, laudo e
pareceres em prazo fixado pelo juiz.
§ 3º A perícia consensual substitui, para todos os efeitos, a que seria realizada por
perito nomeado pelo juiz.”
O que temos a comentar sobre os artigos acima é o fato de que, em face daqueles princípios da
duração razoável do processo, da boa-fé e da cooperação, as partes e seus advogados ganham em
poder e maior autonomia, especialmente nas causas que podem ser resolvidas por autocomposição.
Esse empoderamento abrange a tomada consensual de iniciativas como a estipulação de mudanças no
procedimento com vistas a ajustá-lo às especificidades da causa, inclusive convencionando a
respeito de ônus, poderes, faculdades e deveres processuais, antes ou durante o processo (art. 190),
assim como também podem (art. 471), de comum acordo, escolher o perito e assistentes técnicos,
indicando-os mediante requerimento.
Essa ampliação das possibilidades de se convencionar o andamento do processo, mediante os
chamados negócios processuais, estimula e assegura o protagonismo responsável e cooperativo,
flexibilizando a condução do processo civil e aproximando-o da praticidade contratual-jurisdicional
do processo arbitral.
Esperamos que muito cedo possamos tirar proveito dessas mudanças alvissareiras. E que os
magistrados, advogados, defensores públicos e membros do Ministério Público ajustem suas atitudes
e promovam as necessárias mudanças na logística, no redimensionamento, na reestruturação dos
espaços, na realocação dos recursos, nas capacitações e reciclagens, consoante práticas
cooperativas. A jornada é desafiadora.
Como o CNJ irá reger toda essa mudança de paradigma? Com quais critérios os presidentes de
Tribunais e suas equipes irão redirecionar os esforços e recursos no sentido de mudanças eficazes?
14. A mediação é método de tratamento adequado de controvérsias que deve ser incentivado
pelo Estado, com ativa participação da sociedade, como forma de acesso à Justiça e à
ordem jurídica justa.
C – Disposições sobre o novo papel do juiz (arts. 139, V e VIII, 359, 932)
“Art. 139. O juiz dirigirá o processo conforme as disposições deste Código, incumbindo-
lhe:
.....................................................................................................
V – promover, a qualquer tempo, a autocomposição, preferencialmente com auxílio de
conciliadores e mediadores judiciais”;
Conforme este inciso VIII do art. 139, ao determinar, a qualquer tempo, o comparecimento
pessoal das partes, para ouvi-las sobre os fatos da causa, sem que sobre elas possa incidir a pena de
confesso, está-se fortalecendo essas mesmas partes, que, nestas condições, passam a gozar de maior
liberdade. Constata-se, pois, que coexistem, no novo CPC, as duas modalidades de oitiva das partes;
interrogatório (sob pena de confesso) e depoimento pessoal (sem incidência de pena de confesso),
com implicações absolutamente distintas.
Na audiência de instrução e julgamento:
Este inciso I não é claro quanto à possibilidade da mediação em instâncias superiores. Ocorre
que, ao admitir que cabe ao relator homologar a autocomposição das partes, entendemos como
implícita a possibilidade da utilização de mediadores em qualquer instância, haja vista os princípios
da razoável duração, da boa-fé e da cooperação, que norteiam todas as fases do processo.
16. O magistrado pode, a qualquer momento do processo judicial, convidar as partes para
tentativa de composição da lide pela mediação extrajudicial, quando entender que o
conflito será adequadamente solucionado por essa forma.
20. Enquanto não for instalado o Centro Judiciário de Solução de Conflitos e Cidadania
(Cejusc), as sessões de mediação e conciliação processuais e pré-processuais poderão ser
realizadas por meio audiovisual, em módulo itinerante do Poder Judiciário ou em
entidades credenciadas pelo Núcleo Permanente de Métodos Consensuais de Solução de
Conflitos (Nupemec), no foro em que tramitar o processo ou no foro competente para o
conhecimento da causa, no caso de mediação e conciliação pré-processuais.
21. É facultado ao magistrado, em colaboração com as partes, suspender o processo judicial
enquanto é realizada a mediação, conforme o art. 313, II, do Código de Processo Civil,
salvo se houver previsão contratual de cláusula de mediação com termo ou condição,
situação em que o processo deverá permanecer suspenso pelo prazo previamente acordado
ou até o implemento da condição, nos termos do art. 23 da Lei 13.140/2015.
67. Nos colégios recursais, o relator poderá, monocraticamente, encaminhar os litígios aos
Centros Judiciários de Solução de Conflitos e Cidadania.
Art. 144. Há impedimento do juiz, sendo-lhe vedado exercer suas funções no processo:
I – em que interveio como mandatário da parte, oficiou como perito, funcionou como
membro do Ministério Público ou prestou depoimento como testemunha;
II – de que conheceu em outro grau de jurisdição, tendo proferido decisão;
III – quando nele estiver postulando, como defensor público, advogado ou membro do
Ministério Público, seu cônjuge ou companheiro, ou qualquer parente, consanguíneo ou
afim, em linha reta ou colateral, até o terceiro grau, inclusive;
IV – quando for parte no processo ele próprio, seu cônjuge ou companheiro, ou parente,
consanguíneo ou afim, em linha reta ou colateral, até o terceiro grau, inclusive;
V – quando for sócio ou membro de direção ou de administração de pessoa jurídica
parte no processo;
VI – quando for herdeiro presuntivo, donatário ou empregador de qualquer das partes;
VII – em que figure como parte instituição de ensino com a qual tenha relação de
emprego ou decorrente de contrato de prestação de serviços;
VIII – em que figure como parte cliente do escritório de advocacia de seu cônjuge,
companheiro ou parente, consanguíneo ou afim, em linha reta ou colateral, até o
terceiro grau, inclusive, mesmo que patrocinado por advogado de outro escritório;
IX – quando promover ação contra a parte ou seu advogado.
.....................................................................................................
Art. 145. Há suspeição do juiz:
I – amigo íntimo ou inimigo de qualquer das partes ou de seus advogados;
II – que receber presentes de pessoas que tiverem interesse na causa antes ou depois de
iniciado o processo, que aconselhar alguma das partes acerca do objeto da causa ou
que subministrar meios para atender às despesas do litígio;
III – quando qualquer das partes for sua credora ou devedora, de seu cônjuge ou
companheiro ou de parentes destes, em linha reta até o terceiro grau, inclusive;
IV – interessado no julgamento do processo em favor de qualquer das partes.
.....................................................................................................
Art. 148. Aplicam-se os motivos de impedimento e de suspeição:
I – ao membro do Ministério Público;
II – aos auxiliares da justiça;
III – aos demais sujeitos imparciais do processo.
.....................................................................................................
“Art. 149. São auxiliares da Justiça, além de outros cujas atribuições sejam
determinadas pelas normas de organização judiciária, o escrivão, o chefe de secretaria,
o oficial de justiça, o perito, o depositário, o administrador, o intérprete, o tradutor, o
mediador, o conciliador judicial, o partidor, o distribuidor, o contabilista e o regulador
de avarias”.
Embora sujeito aos motivos de impedimento e de suspeição dos juízes, é importante notar que
os artigos acima dão tratamento específico e expedito à superação desses incidentes no âmbito da
mediação e da conciliação. Compreende-se que a revelação ou alegação de impedimento ou
suspeição deve produzir efeito imediato, substituindo-se o mediador ou conciliador.
“Art. 172. O conciliador e o mediador ficam impedidos, pelo prazo de 1 (um) ano,
contado do término da última audiência em que atuaram, de assessorar, representar ou
patrocinar qualquer das partes”.
Este art. 172 estabelece um impedimento específico para conciliadores e mediadores. Quem
tenha atuado numa mediação judicial estará impedido, pelo prazo de 1 (um) ano contado da última
audiência de mediação, de assessorar, representar ou patrocinar qualquer das partes. Entendemos
esta quarentena como adequada, em consonância com os imperativos de independência e
imparcialidade do mediador ou do conciliador. Entendemos que tal limitação não atinge a hipótese
de ambas as partes, ao término de mediação ou conciliação que resulte em acordo extrajudicial,
contratarem aquele mediador, caso seja ele advogado, para requerer a respectiva homologação
judicial.
“Art. 175. As disposições desta Seção não excluem outras formas de conciliação e
mediação extrajudiciais vinculadas a órgãos institucionais ou realizadas por intermédio
de profissionais independentes, que poderão ser regulamentadas por lei específica.
Parágrafo único. Os dispositivos desta Seção aplicam-se, no que couber, às câmaras
privadas de conciliação e mediação.”
O art. 175 esclarece que as disposições do CPC sobre conciliação e mediação judicial não se
confundem com as mediações extrajudiciais em geral, que podem ser reguladas consoante lei
específica.
É reconhecida a existência de métodos autocompositivos no plano das relações privadas,
independentes. As normas do NCPC não excluem a possibilidade de criação e atuação de câmaras de
conciliação e mediação extrajudiciais.13 A propósito, a matéria é objeto da Lei da Mediação.
Convém refletir a respeito do sentido e alcance do parágrafo único transcrito anteriormente. Em
que sentido essas disposições se aplicam às câmaras privadas de conciliação e mediação?
Entendemos que tais câmaras estarão vinculadas aos dispositivos em comento apenas na hipótese em
que se comprometam a atuar consoante exigências específicas, quando credenciadas pelo tribunal
para capacitar mediadores judiciais e/ou administrar mediações e conciliações judiciais.
G – Disposições sobre cadastro de mediadores e câmaras (arts. 167 a 169, 173 e 174):
Destacamos este § 5º. Entendemos que, estando cadastrados como mediadores judiciais perante
tribunais estaduais, os advogados ficam impedidos de exercer a advocacia em varas onde também
atuem como mediadores. Na hipótese de estarem cadastrados como mediadores para atuar em varas
da Justiça Federal, ficam impedidos de exercer a advocacia no âmbito das respectivas varas. Não
nos parece que o impedimento deva atingir a atuação do advogado que apenas opera como mediador
no âmbito do CEJUSC da respectiva comarca ou seção, pois apenas ali ele estaria privado do
exercício da advocacia.
O impedimento em apreço não atinge o advogado não cadastrado como mediador no tribunal,
que pode livremente atuar como mediador judicial, quando indicado pelas partes, inclusive na
mesma comarca, seção ou subseção judiciária onde advoga. É que prevalece a autonomia das partes,
consoante o art. 168 e seu § 1º. Com efeito, no parágrafo em referência consta que o mediador
escolhido consensualmente pelas partes para atuar em determinada mediação judicial não precisa
estar cadastrado no tribunal. Afinal, somente os cadastrados no tribunal gozarão das vantagens da
distribuição de casos para conciliar ou mediar.
Quanto ao § 6º, entendemos que a opção por quadro próprio, provido mediante concurso
público, pode e deve coexistir com o cadastramento de mediadores judiciais sem vínculo funcional.
Vislumbramos um crescimento geométrico das demandas pela mediação, tal como vem ocorrendo em
outros países e imaginamos, em especial para as demandas beneficiadas pela gratuidade da justiça, a
estruturação de quadro de conciliadores e mediadores providos mediante concurso público, que
atuarão nas próprias instalações dos Centros Judiciários de Soluções Consensuais de Conflitos, sem
custos para as partes; mas não vemos como isto poderá acontecer sem a coexistência com os
conciliadores e mediadores privados cadastrados e remunerados consoante parâmetros razoáveis. É
esse cadastro que viabilizará a expansão de um novo campo de atuação de conciliadores e
mediadores judiciais, com a necessária elasticidade.
Muito relevante a disposição contida neste art. 174 e incisos. A matéria é objeto de lei especial,
na qual são estabelecidas as condições de atuação dessas câmaras.
H – Disposições sobre petição inicial, tutela, defesa e audiência (arts. 154, 303 a 308, 334 e
335):
“Art. 154. Incumbe ao oficial de justiça:
.....................................................................................................
VI – certificar, em mandado, proposta de autocomposição apresentada por qualquer das
partes, na ocasião de realização de ato de comunicação que lhe couber.
Parágrafo único. Certificada a proposta de autocomposição prevista no inciso VI, o juiz
ordenará a intimação da parte contrária para manifestar-se, no prazo de 5 (cinco) dias,
sem prejuízo do andamento regular do processo, entendendo-se o silêncio como
recusa”.
Mais uma vez aqui, no inciso VI e parágrafo único, constatamos o apoio à autocomposição. O
desejável seria que os advogados tivessem a prática de discutir e combinar entre eles e com seus
clientes, previamente, os termos de uma transação e seu encaminhamento ao juiz competente, com
pedido de homologação.
“Art. 303. Nos casos em que a urgência for contemporânea à propositura da ação, a
petição inicial pode limitar-se ao requerimento da tutela antecipada e à indicação do
pedido de tutela final, com a exposição da lide, do direito que se busca realizar e do
perigo de dano ou do risco ao resultado útil do processo.
§ 1º Concedida a tutela antecipada a que se refere o caput deste artigo:
.....................................................................................................
II – o réu será citado e intimado para a audiência de conciliação ou de mediação na
forma do art. 334”;
“Art. 305. A petição inicial da ação que visa à prestação de tutela cautelar em caráter
antecedente indicará a lide e seu fundamento, a exposição sumária do direito que se
objetiva assegurar e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo.”
.....................................................................................................
“Art. 308. Efetivada a tutela cautelar, o pedido principal terá de ser formulado pelo
autor no prazo de 30 (trinta) dias, caso em que será apresentado nos mesmos autos em
que deduzido o pedido de tutela cautelar, não dependendo do adiantamento de novas
custas processuais.
.....................................................................................................
§ 3º Apresentado o pedido principal, as partes serão intimadas para a audiência de
conciliação ou de mediação, na forma do art. 334, por seus advogados ou pessoalmente,
sem necessidade de nova citação do réu.
§ 4º Não havendo autocomposição, o prazo para contestação será contado na forma do
art. 335.”
Observe-se que, em todas essas situações previstas nos artigos 303, 305 e 308, a busca do
consenso está expressamente contemplada. Na hipótese do 308, § 3º, apresentado o pedido principal,
as partes serão intimadas para a audiência de conciliação ou de mediação, por seus advogados ou
pessoalmente, sem necessidade de nova citação do réu.
Audiência de Conciliação ou Mediação:
“Art. 334. Se a petição inicial preencher os requisitos essenciais e não for o caso de
improcedência liminar do pedido, o juiz designará audiência de conciliação ou de
mediação com antecedência mínima de 30 (trinta) dias, devendo ser citado o réu com
pelo menos 20 (vinte) dias de antecedência.
§ 1º O conciliador ou mediador, onde houver, atuará necessariamente na audiência de
conciliação ou de mediação, observando o disposto neste Código, bem como as
disposições da lei de organização judiciária.
§ 2º Poderá haver mais de uma sessão destinada à conciliação e à mediação, não
podendo exceder a 2 (dois) meses da data de realização da primeira sessão, desde que
necessárias à composição das partes.
§ 3º A intimação do autor para a audiência será feita na pessoa de seu advogado.
§ 4º A audiência não será realizada:
I – se ambas as partes manifestarem, expressamente, desinteresse na composição
consensual;
II – quando não se admitir a autocomposição.
§ 5º O autor deverá indicar, na petição inicial, seu desinteresse na autocomposição, e o
réu deverá fazê-lo, por petição, apresentada com 10 (dez) dias de antecedência,
contados da data da audiência.
§ 6º Havendo litisconsórcio, o desinteresse na realização da audiência deve ser
manifestado por todos os litisconsortes.”
“Art. 335. O réu poderá oferecer contestação, por petição, no prazo de 15 (quinze) dias,
cujo termo inicial será a data:
I – da audiência de conciliação ou de mediação, ou da última sessão de conciliação,
quando qualquer parte não comparecer ou, comparecendo, não houver autocomposição;
II – do protocolo do pedido de cancelamento da audiência de conciliação ou de
mediação apresentado pelo réu, quando ocorrer a hipótese do art. 334, § 4º, inciso I;
III – prevista no art. 231, de acordo com o modo como foi feita a citação, nos demais
casos”.
Não havendo autocomposição, conta-se o prazo de 15 dias para a contestação a partir do evento
que a inviabilize no momento inicial. As hipóteses são: expressa manifestação do desinteresse de
ambas as partes; não comparecimento de uma ou de ambas as partes às sessões; conclusão da(s)
sessão(ões) sem que se tenha obtido a autocomposição.
I – Disposições sobre título executivo (arts. 487, 515, 725, VIII, 784, IV):
Cumprimento de Sentença:
“Art. 515. São títulos executivos judiciais, cujo cumprimento dar--se-á de acordo com os
artigos previstos neste Título:
.......................................................................................................
II – a decisão homologatória de autocomposição judicial;
III – a decisão homologatória de autocomposição extrajudicial de qualquer natureza;
.......................................................................................................
VII – a sentença arbitral;
.......................................................................................................
§ 2º A autocomposição judicial pode envolver sujeito estranho ao processo e versar
sobre relação jurídica que não tenha sido deduzida em juízo.”
Os incisos II e III deste art. 515 realçam a qualidade de título executivo judicial da
autocomposição judicial; ou da autocomposição extrajudicial de qualquer natureza, após
homologada.
Em consonância com o sentido e alcance deste novo CPC, o § 2º assinala que a autocomposição
judicial pode envolver sujeito estranho ao processo e versar sobre relação jurídica que não tenha
sido deduzida em juízo. Essa flexibilidade ou essa abertura para o mundo da vida representa
inestimável avanço sobre o formalismo, com vistas à pacificação social. Com efeito, mais importante
do que aspectos formais deduzidos em juízo é o acolhimento das necessidades identificadas e
consensuadas na autocomposição.
Procedimentos de Jurisdição Voluntária:
Para que possa valer como título executivo extrajudicial, a transação acordada
extrajudicialmente precisará de ser referendada, conforme o caso, pelo Ministério Público, pela
Defensoria Pública, pela Advocacia Pública, pelos advogados dos transatores ou por conciliador ou
mediador credenciado pelo tribunal. Mediador credenciado é mediador cadastrado? As
autocomposições realizadas por cidadãos capazes, em suas negociações diretas ou com o apoio de
mediadores extrajudiciais (comunitários, escolares, empresariais, familiares etc.) não valerão como
título executivo extrajudicial, salvo se assinadas pelos advogados de ambas as partes ou
referendados conforme o inciso IV deste artigo 784? Esta exigência seria um retrocesso, pois vai no
sentido oposto de uma cultura de promoção da paz. Em boa hora, a Lei (especial) da Mediação
tornou-a sem efeito, consoante a redação do parágrafo único do seu art. 21.
De positivo, são dispensadas formalidades como as assinaturas de testemunhas e a não
obrigatoriedade de se requerer a homologação judicial.
“Art. 565. No litígio coletivo pela posse de imóvel, quando o esbulho ou a turbação
afirmado na petição inicial houver ocorrido há mais de ano e dia, o juiz, antes de
apreciar o pedido de concessão da medida liminar, deverá designar audiência de
mediação, a realizar-se em até 30 (trinta) dias, que observará o disposto nos §§ 2º e 4º.
§ 1º Concedida a liminar, se essa não for executada no prazo de 1 (um) ano, a contar
da data de distribuição, caberá ao juiz designar audiência de mediação, nos termos
dos §§ 2º a 4º deste artigo.
§ 2º O Ministério Público será intimado para comparecer à audiência, e a Defensoria
Pública será intimada sempre que houver parte beneficiária de gratuidade da justiça.
§ 3º O juiz poderá comparecer à área objeto do litígio quando sua presença se fizer
necessária à efetivação da tutela jurisdicional.
§ 4º Os órgãos responsáveis pela política agrária e pela política urbana da União, de
Estado ou do Distrito Federal e de Município onde se situe a área objeto do litígio
poderão ser intimados para a audiência, a fim de se manifestarem sobre seu interesse no
processo e sobre a existência de possibilidade de solução para o conflito possessório.
§ 5º Aplica-se o disposto neste artigo ao litígio sobre propriedade de imóvel”.
Aqui há duas hipóteses para a prática da mediação. A primeira, antes de concedida a liminar,
quando a audiência de mediação é designada para realizar-se no prazo de trinta dias. A segunda
hipótese, quando a liminar não é executada no prazo de 1 (um) ano. Em ambas as hipóteses,
caracteriza-se a obrigatoriedade do procedimento.
“Art. 694. Nas ações de família, todos os esforços serão empreendidos para a solução
consensual da controvérsia, devendo o juiz dispor do auxílio de profissionais de outras
áreas de conhecimento para a mediação e conciliação.
Parágrafo único. A requerimento das partes, o juiz pode determinar a suspensão do
processo enquanto os litigantes se submetem a mediação extrajudicial ou a atendimento
multidisciplinar”.
Compreender que a conjugalidade pode haver terminado, mas não a parentalidade; perceber que
a alienação parental pode acarretar a “morte inventada” de um pai ou de uma mãe, com sérias
consequências para os filhos; assegurar o apoio que empodere esses pais na superação dos
sofrimentos e maus-tratos recíprocos, é o que se espera de um Estado que compreende a importância
da família e da educação. De nada importam as regras jurídicas sem a compreensão de que ali, para
muito além dos belos arrazoados, há dramas humanos, há sofrimentos, há dificuldades em lidar com
mudanças e perdas. As próprias partes poderão requerer a suspensão do processo para fins de
mediação extrajudicial, com mediadores de livre escolha, ou atendimento multidisciplinar, que pode
englobar, por exemplo, vários modelos ou alternativas de terapia familiar.
Consoante o art. 695, nas ações de família a mediação é obrigatória.16 No campo dos conflitos
familiares é onde mais sentimos a necessidade do diálogo bem construído; haja vista, especialmente,
as repercussões sobre filhos e outros parentes próximos. Profissionais de outras áreas do
conhecimento deverão estar disponíveis para mediar; daí porque este é um campo em que se prevê a
comediação. A mediação ou conciliação – nesta hipótese obrigatória – poderão ser judiciais ou
extrajudiciais, consoante a preferência das partes. Sem prejuízo de providências jurisdicionais para
evitar o perecimento do direito, o juiz suspenderá o processo enquanto as partes estiverem
participando das mediações ou de algum outro atendimento multidisciplinar, sem estabelecimento
prévio de prazos, pois as mediações e outros tratos poderão necessitar de várias sessões.
Especialmente em questões de família, inúmeras legislações, como a francesa, a canadense, a
chilena, legislações da Argentina e dos EUA17, por exemplo, adotam a obrigatoriedade de prévio
comparecimento e participação em mediações. Identificou-se, naqueles e em inúmeros outros países
que, em virtude da cultura da litigiosidade, os operadores do direito, quando ainda desconhecem as
vantagens das dinâmicas consensuadas, tendem a desencorajar os respectivos clientes,
inviabilizando, assim, o trato mediador. Portanto, pelo menos até que se consolide o novo paradigma,
tem sido pedagogicamente recomendada a obrigatoriedade de comparecimento e participação. A
experiência Argentina nos é revelada, em detalhes, por Sérgio Abrevaya.18
Sobre esses temas destacamos o enunciado 55:19
“Art. 221. Suspende-se o curso do prazo por obstáculo criado em detrimento da parte ou
ocorrendo qualquer das hipóteses do art. 313, devendo o prazo ser restituído por tempo
igual ao que faltava para sua complementação.
Parágrafo único. Suspendem-se os prazos durante a execução de programa instituído
pelo Poder Judiciário para promover a autocomposição, incumbindo aos tribunais
especificar, com antecedência, a duração dos trabalhos”.
“Art. 313. Suspende-se o processo:
.....................................................................................................
VIII – Nos demais casos que este Código regula”.
Sobre esses temas destacamos os enunciados 22, 29, 39, 44, 58, 63, 71, 78 e 79:20
22. A expressão “sucesso ou insucesso” do art. 167, § 3º, do Código de Processo Civil não deve
ser interpretada como quantidade de acordos realizados, mas a partir de uma avaliação
qualitativa da satisfação das partes com o resultado e com o procedimento, fomentando a
escolha da câmara, do conciliador ou do mediador com base nas suas qualificações e não
nos resultados meramente quantitativos.
29. Caso qualquer das partes comprove a realização de mediação ou conciliação antecedente à
propositura da demanda, o magistrado poderá dispensar a audiência inicial de mediação ou
conciliação, desde que tenha tratado da questão objeto da ação e tenha sido conduzida por
mediador ou conciliador capacitado.
39. A previsão de suspensão do processo para que as partes se submetam à mediação
extrajudicial deverá atender ao disposto no § 2º do art. 334 da Lei Processual, podendo o
prazo ser prorrogado no caso de consenso das partes.
44. Havendo processo judicial em curso, a escolha de mediador ou câmara privada ou pública
de conciliação e mediação deve observar o peticionamento individual ou conjunto das
partes, em qualquer tempo ou grau de jurisdição, respeitado o contraditório.
58. A conciliação/mediação, em meio eletrônico, poderá ser utilizada no procedimento comum e
em outros ritos, em qualquer tempo e grau de jurisdição.
63. A perspectiva da conciliação judicial, inclusive por adesão, em razão ou no bojo de
Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas, é compatível com o Código de Processo
Civil (Lei 13.105, de 16 de março de 2015) e com a Lei da Mediação (Lei 13.140, de 26
de junho de 2015).
71. Tendo havido prévio e comprovado requerimento administrativo, incumbe à Administração
Pública o dever de comprovar em juízo que adotou as providências legais e
regulamentares para a aferição do direito da parte.
78. Recomenda-se aos juízes das varas de família dos tribunais onde já tenham sido implantadas
as oficinas de parentalidade que as partes sejam convidadas a participar das referidas
oficinas, antes da citação nos processos de guarda, visitação e alienação parental, como
forma de fomentar o diálogo e prevenir litígios.
79. O Judiciário estimulará o planejamento sucessório, com ações na área de comunicação que
esclareçam os benefícios da autonomia privada, com o fim de prevenir litígios e
desestimular a via judiciária.
• Não é feita distinção entre conciliação e mediação, pois caberá ao mediador praticar as suas
técnicas e habilidades, e, portanto, o(s) modelo(s) mais apropriado(s), consoante as
características do conflito e as necessidades desveladas durante o procedimento.
• A mediação – extrajudicial ou judicial – pode ser aplicada para solucionar quaisquer
controvérsias que admitam transação; podendo versar sobre todo o litígio ou parte dele.
• Na hipótese de existir previsão contratual de cláusula de mediação, as partes deverão
obrigatoriamente comparecer pelo menos à primeira reunião de mediação.
• Os mediadores extrajudiciais não dependem de registro em cadastro de mediadores ou de
graduação em nível superior, mas devem ser capacitados e merecer a confiança das partes.
• Os mediadores judiciais, para obterem o cadastramento no Tribunal, deverão comprovar
habilitação através de escola credenciada de formação de mediadores e necessitarão estar
graduados há pelo menos dois anos em curso de nível superior.
• A medição considera-se instituída na data da reunião em que é firmado o termo inicial de
mediação – momento em que se dá a suspensão do prazo prescricional –, e considera-se
encerrada com a lavratura de seu termo final.
• Em virtude da confidencialidade, nenhuma informação revelada durante o procedimento de
mediação será admitida perante terceiros como prova em processo arbitral ou judicial.
Quanto a esta questão, convém comentar a redação do art. 7º da LM. Ali consta,
literalmente, que o mediador não poderá atuar como árbitro, nem funcionar como
testemunha em processos judiciais ou arbitrais pertinentes a conflito em que tenha atuado
como mediador. Deve-se entender que este dispositivo não veda a utilização das técnicas e
habilidades da mediação pelos árbitros que estão buscando facilitar uma conciliação
durante processo arbitral, sem prejuízo da autonomia das partes em acordarem noutro
sentido.
• É estimulada e regulada a autocomposição de conflitos envolvendo órgãos da Administração
Pública direta e indireta de todos os entes federados; sendo essas práticas indispensáveis à
razoável duração dos processos e à redução dos altos custos da litigiosidade envolvendo
entes públicos.
• A lei aplica-se, no que couber, a outros meios consensuais de resolução de disputas, como a
mediações comunitárias, escolares e penais.
• É viável a realização de mediação via internet ou por qualquer outro meio que permita a
transação à distância.
Mediação Extrajudicial –
Procedimento: Art. 21. O Convite para
iniciar o procedimento de mediação
extrajudicial poderá ser feito por qualquer
meio de comunicação e deverá estipular o
escopo proposto para a negociação, a
data e o local da primeira reunião.
Parágrafo único. O convite formulado por
uma parte à outra considerar-se-á
rejeitado se não for respondido em até 30
(trinta) dias da data de seu recebimento.
Art. 22. A previsão contratual de
mediação deverá conter, no mínimo:
I – Prazo mínimo e máximo para a
realização da primeira reunião de
mediação, contado a partir da data de
recebimento do convite;
II – Local da primeira reunião de
mediação;
III – Critérios de escolha do mediador ou
equipe de mediação;
IV – Penalidade em caso de não
comparecimento da parte convidada à
primeira reunião de mediação.
§ 1º A previsão contratual pode substituir
a especificação dos itens acima
enumerados pela indicação de
regulamento, publicado por instituição
idônea prestadora de serviços de
mediação, no qual constem critérios claros
para a escolha do mediador e realização
da primeira reunião de mediação.
§ 2º Não havendo previsão contratual
completa, deverão ser observados os
seguintes critérios para a realização da
primeira reunião de mediação:
I – Prazo mínimo de 10 (dez) dias úteis e
prazo máximo de 3 (três) meses,
contados a partir do recebimento do
convite; Disposições Finais:
Art. 41. A Escola Nacional de Mediação e
Conciliação, no âmbito do Ministério da
Justiça, poderá criar banco de dados sobre
boas práticas em mediação, bem como
manter relação de mediadores e de
instituições de mediação.
Art. 42. Aplica-se a esta Lei, no que
couber, às outras formas consensuais de
resolução de conflitos, tais como
mediações comunitárias e escolares e
àquelas levadas a efeito nas serventias
extrajudiciais, desde que no âmbito das
suas competências.
Parágrafo único. A mediação nas relações
de trabalho será regulada por lei própria.
Art. 43. Os órgãos entidades da
administração pública poderão criar
câmaras para a resolução de conflitos
entre particulares, que versem sobre
atividades por eles reguladas ou
supervisionadas.
1 VASCONCELOS, Carlos Eduardo de. Dialética nos contraditórios judicial e arbitral: a arte do
direito e sua regulação. Revista Brasileira de Arbitragem, Porto Alegre: Síntese; Curitiba:
Comitê Brasileiro de Arbitragem, n. 28, 2011, p. 7-29.
2 CAPPELLETTI, Mauro; GARTH, Bryant. Acesso à justiça. Porto Alegre: Fabris, 1988. p. 11-13.
3 GRINOVER, Ada Pellegrini.Os fundamentos da justiça conciliativa. In: GRINOVER, Ada
Pellegrini; WATANABE, Kazuo; LAGRASTA NETO, Caetano (Coords.).Mediação e
gerenciamento do processo. São Paulo: Atlas, 2007. p. 1-5.
4 WATANABE, Kazuo. A mentalidade e os meios alternativos de solução de conflitos no Brasil.
In: GRINOVER, Ada Pellegrini; WATANABE, Kazuo; LAGRASTA NETO, Caetano (Coords.
Mediação e gerenciamento do processo. São Paulo: Atlas, 2007. p. 6-10.
5 HABERMAS, Jürgen.Direito e democracia: entre facticidade e validade. 2. ed. Tradução de
Flávio B, Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003. vol. II, p. 146.
6 WALD, Arnold de Paula e AZEVEDO, André Gomma.Escritórios devem aposentar grupos
contenciosos e criar setores resolutivos. Consultor Jurídico, 13 maio 2018. Disponível em:
<https://www.conjur.com.br/2018-mai-13/opiniao-escritorios-aposentar--grupos-contenciosos>.
7 AZEVEDO NETO João Luiz Lessa de.O novo CPC adotou o modelo multiportas!!! E agora?
Artigo debatido na reunião da Comissão de Conciliação, Mediação e Arbitragem da OAB/PE, em
08 de abril de 2015. 15 p.
8 ÁVILA, Humberto. Teoria dos Princípios – Da definição à aplicação dos princípios jurídicos. 16.
ed. São Paulo: Malheiros, 2015. p. 201-202.
9 ÁVILA, Humberto. Op. cit., p 212.
10 Referência: Centro de Estudos Judiciários do Conselho da Justiça Federal, I Jornada “Prevenção e
Solução Extrajudicial de Litígios”, 22 e 23 de agosto de 2016, Brasília – DF.
11 Referência: Centro de Estudos Judiciários do Conselho da Justiça Federal, I Jornada “Prevenção e
Solução Extrajudicial de Litígios”, 22 e 23 de agosto de 2016, Brasília – DF.
12 Referência: Centro de Estudos Judiciários do Conselho da Justiça Federal, I Jornada “Prevenção e
Solução Extrajudicial de Litígios”, 22 e 23 de agosto de 2016, Brasília – DF.
13 WAMBIER, Teresa Arruda Alvim (Coord.). Primeiros Comentários ao Novo Código de Processo
Civil, artigo por artigo. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015. p. 323.
14 D URSO, Leonardo. Italy’s Required Initial Mediation Session: Bridging The Gap between
Mandatory and Voluntary Mediation. Alternatives – The Newsletter of the International Institute
for Conflict Prevision and Resolution. Disponível em: <www.outnewletter.com>. View this
newsletter online at onlinelibrary.wiley.com. Alternatives DOI 10.1002/alt. Acesso em 2 maio
2018.
15 ALVES, Jones Figueiredo e MONTENEGRO FILHO, Misael. Manual de Audiências Cíveis. 7. ed.
rev. e atual. São Paulo: Atlas, 2016. p. 10.
16 CUNHA, Leonardo Carneiro da. Procedimento especial para as ações de família no Projeto do
Novo Código de Processo Civil. In: FREIRE, Alexandre; DANTAS, Bruno; NUNES, Dierl
DIDIER JR., Fredie; MEDINA, José Miguel Garcia; FUX, Luiz; CAMARGO, Luiz Henriq
Volpe de; OLIVEIRA, Pedro Miranda de.Novas Tendências do Processo Civil: estudos sobre o
Projeto de Novo Código de Processo Civil. Salvador: Juspodivm, 2013, p. 31-32.
17 GABBAY, Daniela Monteiro. Mediação e Judiciário no Brasil e nos EUA. Condições, Desafios e
Limites para a institucionalização da Mediação no Judiciário. Coord.: Ada Pellegrini Grinover
e Kazuo Watanabe. Brasília, DF: Gazeta Jurídica, 2013.
18 ABREVAYA, Sérgio. Mediación prejudicial. Una mirada sobre el sistema prejudicial en la
Argentina. Buenos Aires: Libraria Histórica, 2008. 164 p.
19 Referência: Centro de Estudos Judiciários do Conselho da Justiça Federal, I Jornada “Prevenção e
Solução Extrajudicial de Litígios”, 22 e 23 de agosto de 2016, Brasília – DF.
20 Referência: Centro de Estudos Judiciários do Conselho da Justiça Federal, I Jornada “Prevenção e
Solução Extrajudicial de Litígios”, 22 e 23 de agosto de 2016, Brasília – DF.
21 Esse quadro comparativo foi elaborado em colaboração com colegas da Comissão Especial de
Conciliação, Mediação e Arbitragem do CFOAB, na montagem de Asdrubal Junior.
22 Referência: Centro de Estudos Judiciários do Conselho da Justiça Federal, I Jornada “Prevenção e
Solução Extrajudicial de Litígios”, 22 e 23 de agosto de 2016, Brasília – DF.
23 Referência: Centro de Estudos Judiciários do Conselho da Justiça Federal, I Jornada “Prevenção e
Solução Extrajudicial de Litígios”, 22 e 23 de agosto de 2016, Brasília – DF.
Direitos humanos como fundamento político-
jurídico da mediação (Declaração Universal –
ONU/1948)
Conhecer esses desafios relacionados aos diretos humanos é algo fundamental à formação dos
mediadores de conflitos.
1 Fonte: <http://www.pnud.org.br/seguranca/reportagens/index>.
2 Fonte: <https://nacoesunidas.org/pos2015/agenda2030/>.
3 Palestra da abertura da III Conferência Internacional de Direitos Humanos, organizada pela OAB,
em Teresina (Piauí), nos dias 16 a 18 de agosto de 2006.
Comunicação (construtiva) na mediação de
conflitos e na cultura de paz
2. ESCUTA ATIVA
O mediador sabe que, por mais que tudo pareça pronto para que as pessoas cheguem a um
acordo, algo muito significativo pode estar guardado, omitido. As pessoas não se entendem sem
terem sido efetivamente escutadas. As pessoas precisam dizer o que sentem e, na mediação, esta
pode ser a primeira vez que isto está sendo possível. A melhor comunicação é aquela que reconhece
a necessidade de o outro se expressar. Em vez de conselhos e sermões, escute sempre, com toda
atenção, o que está sendo falado e sentido pelo outro. Aconselhar, salvo situações muito especiais, é
colocar-se acima, como alguém que se aproveita da dificuldade do outro para lhe lançar a
superioridade das suas supostas virtudes. Dar conselhos normalmente apresenta-se como expediente
de uma cultura de dominação. Aconselhar é um modo de assistencialismo. O conselho bloqueia as
necessidades de expressão, reconhecimento e emancipação do aconselhado. O facilitador ou
mediador deve estar consciente de que a necessidade primeira do mediando é a de expressar as suas
razões e sentimentos. Escute e escute, ativamente.
Somente pessoas que se sentem verdadeiramente escutadas estarão dispostas a escutar. “Escute”
a comunicação não verbal. Observe o movimento corporal do outro. Quem não compreende um olhar
também não compreenderá uma longa explicação. “Escute” os olhos, observe. Tenha claro que
escutar ativamente não é apenas ouvir. É identificar-se, compassivamente, sem julgamentos. É ter em
conta o drama do ser humano que está ali com você, e suas legítimas contradições. “Escute” o
sofrimento e as necessidades do outro e perceba, por trás de palavras rudes, ressentidas, uma
possível súplica, uma proposta implícita. Escutar, portanto, é, antes de tudo, atitude de
reconhecimento; essa necessidade básica de todos nós nas relações interpessoais. Precisamos estar
conscientes de que é a partir da escuta que se estabelece uma circularidade coevolucionária na
comunicação humana.
O aprendizado da escuta é um desafio para todos nós, na cultura brasileira, em que se confunde
a fala com o poder e o silêncio com a fraqueza. Quando conseguimos ultrapassar a superficialidade
percebemos que o poder do silêncio, da escuta, é transformador. Ao treinarmos a nossa mente
meditativa, e, portanto, com a atitude do observador desprovido de preconceitos, poderemos
perceber, por trás dos ruídos, as propostas implícitas, as súplicas verdadeiras, ocultadas pela
aparência do palavreado. Consoante o educador Paulo Freire: “Aceitar e respeitar a diferença é uma
dessas virtudes sem o que a escuta não se pode dar”.5
O mediador de conflitos deve ser aquele alguém que compreende e assume a importância dessa
atitude compassiva, dessa paciência, dessa serenidade. Não é especialmente pelo discurso, mas,
acima de tudo, pela escuta ativa, apoiada em atitude de acolhimento, que será construída a
credibilidade e a empatia entre mediador e mediandos. Já ouvi muitos depoimentos emocionados de
pessoas dizendo-se aliviadas por terem tido, enfim, a oportunidade de falar para companheiros(as)
ou ex-companheiras(os) e deles(as) escutar palavras e gestos que, por tantas razões, nunca puderam
ser reveladas.
Exercício: relacione e exemplifique como são praticadas as habilidades comunicativas
referidas neste item.
4. RECIPROCIDADE ESCUTA-FALA
No encontro de mediação é importante que todos sejam informados de que cada um terá o seu
momento de narrar e o seu momento de escutar, e que não serão aceitas interferências na fala do
outro, sendo este um dos pactos a constar do termo inicial da mediação. Também devem ficar
conscientes de que a escuta é uma grande oportunidade para conhecer os sentimentos aparentes e o
ponto de vista do outro. Nos círculos restaurativos, onde são muitos os participantes, a palavra vai
passando em círculo, possibilitando a todos a fala sobre as questões colocadas pelo facilitador.
Em algumas culturas o facilitador adota a tradição de circular algum objeto de pequeno porte,
com valor simbólico, como “objeto da palavra”, que vai passando de um em um entre os
participantes, podendo falar apenas quem esteja de posse do “objeto da palavra”. Trata-se de
exercício em que é valorizado o silêncio; algo pouco reconhecido na cultura ocidental, em que se
superestimam a fala, a verbalização, a oratória. Imagina-se que quem está com a fala está com o
poder. Isso é uma ilusão, porque as relações igualitárias de confiança só são construídas entre
pessoas que sabem escutar.
Fale claramente, mas respeite o igual desejo, direito ou necessidade do outro de falar. Após
escutar ativamente o que o outro tem a dizer, estabeleça, na mediação, no círculo ou na negociação
direta, uma comunicação em que todos respeitem o direito do outro de se expressar. O mediador
deve, portanto, obter, logo no início da mediação, a concordância de ambas as partes com a regra da
não interferência na fala do outro. E deve assegurar, firmemente, igual direito de expressão.
Equilibrar o direito de expressão contribui para equilibrar o poder. Na condução da reciprocidade
escuta-fala, o mediador mantém-se sereno, atento, empático, assertivo e imparcial em suas escutas,
indagações e resumos.
Adote, pois, como critério, em qualquer dinâmica interpessoal, uma comunicação “de mão
dupla”. Pessoas que falam, e falam sem perceber que o outro não está mais a fim de ouvir,
comunicam-se destrutivamente. Comunicação construtiva é empática, equitativa e circular, no sentido
de algo coconstruído. Essa atitude de respeito humaniza a vivência do procedimento. É comum, em
nossos diálogos e negociações diretas, a existência de pessoas mais tímidas, que tendem a se omitir,
ou de pessoas loquazes, que costumam monopolizar a conversa. Devemos ter a sensibilidade de
estimular o tímido, por meio de conotações positivas e de perguntas, e sensibilizar o loquaz a
valorizar o diálogo. Reuniões privadas (em separado) podem ajudar no fortalecimento do diálogo
equitativo.
Praticar a reciprocidade escuta-fala pode não ser fácil quando as pessoas estão muito
competitivas e/ou magoadas. Certa feita fui procurado para mediar um conflito entre duas mulheres
executivas. Elas estavam no mesmo nível hierárquico, ocupavam duas diretorias que precisavam
estar dialogando e tomando decisões em comum. Entretanto, elas eram muito empreendedoras e
competitivas. Haviam adquirido o hábito de atribuir as suas raivas à outra, pois temiam a
concorrência. Vinham fazendo acusações recíprocas, inclusive na última reunião da diretoria. Num
último encontro a primeira teria chamado a segunda de mentirosa, porque esta se negara a confirmar
que determinadas informações haviam sido repassadas para o presidente sem o prévio conhecimento
da outra. Ambas desconfiavam que a outra estivesse levando para o presidente versões
desabonadoras. Ambas haviam sido chamadas a atenção e imaginavam que tudo era consequência da
maledicência da outra. Esse ambiente estava trazendo desgaste para ambas e perda de produtividade.
Em nossa primeira reunião conjunta combinei, entre outras coisas, que ambas narrassem os seus
pontos de vista pessoais (sentimentos-ideias) a respeito das questões em foco, na forma de
mensagens do tipo eu penso, eu tive a impressão, eu me senti..., evitando acusações e julgamentos da
outra, pois aquela era uma oportunidade de colaboração em busca de uma compreensão, de um
entendimento. Assim fizeram. “No meu ponto de vista está ocorrendo o seguinte”, “fiquei muito
preocupada quando soube que estaria acontecendo aquilo”. “Fico muito chateada com este problema
porque até o ano passado éramos boas amigas.”
A história é longa, mas ficou claro que ambas haviam criado um monstro chamado culpa,
julgamento e castigo. E cada uma aprendera a ver o monstro na outra. As dúvidas foram uma a uma
esclarecidas, assumiram responsabilidades e compromissos, pediram perdão e se sentiram aliviadas.
Uma reunião foi o bastante naquela mediação. Tenho notícias de que estão muito bem.
É fundamental que tenhamos sempre em conta que nossas mensagens, salvo quando
consubstanciam prova material de alguma conduta indevida, não passam de ponto de vista. O nosso
ponto de vista é sempre o de agora, não é o de sempre. Daí por que não devemos utilizar a linguagem
condenatória, invasiva, tipo você fez isto e não devia, em que o outro se sente acusado e condenado
por alguém que se acha detentor do monopólio da verdade e da virtude.
Quando fizer alguma observação sobre o comportamento de alguém, use a primeira pessoa.
Exemplo: “Não gostei do que vi. Eu não agiria assim”. Imagine que uma mãe, numa mediação, ao
narrar determinado problema, afirma “essa minha filha é muito ingênua, cai na conversa de qualquer
um e não tem condições de ir desacompanhada para essa festa”. Esta é uma frase que julga e acusa.
Caso essa mãe houvesse aprendido a utilizar a mensagem do ponto de vista pessoal, não teria
humilhado ou sido ofensiva. Teria dito algo assim: “Penso que a minha filha ainda é muito nova e
fico com medo de pessoas espertas, que possam importuná-la; daí por que não vou deixá-la sozinha”.
Veremos, mais adiante, a habilidade como os mediadores lidam com frases ofensivas, que
devem ser por eles reformuladas, para que expressem mensagens do ponto de vista pessoal, de modo
apreciativo. O mediador poderia recontextualizar a frase da mãe assim: “Pelo que estou percebendo
a senhora, enquanto mãe, está preocupada com as pessoas que a sua filha poderá encontrar nesse
lugar, é isto?”.
Esse modo de comunicação evita que se julgue ou se fale pelo outro. É também conhecido como
“linguagem eu” ou “mensagem como opinião pessoal”. O mediador, em determinadas situações, pode
orientar os mediandos a utilizarem a primeira pessoa.
Quem respeita a reciprocidade escuta-fala não costuma dizer “Você não devia ter feito isso ou
aquilo”. Fala-se por si, nunca pelo outro. Diga: “Eu penso que isto poderia ter sido feito da seguinte
forma...”. A “linguagem eu” evita que a outra pessoa se sinta invadida ou julgada por você. Nossas
experiências em mediação indicam o poder da “mensagem do ponto de vista pessoal”.
Quando as pessoas adotam a primeira pessoa e falam sobre como perceberam o comportamento
da outra, dá-se uma transformação. As expectativas de ofensa são substituídas pelo alívio de um
possível reconhecimento. Viabiliza-se a admissão de uma possibilidade de reconhecimento,
afastando o hermetismo da polêmica.
O mediador deve colaborar para que os mediandos falem na primeira pessoa. Especialmente na
fase inicial de um processo de mediação é importante que os ânimos exaltados não se expressem na
forma de acusações pessoais, mas na forma de impressões sobre como cada um dos interessados
sente e percebe o problema.
Embora o mediador, no papel de facilitador do processo comunicativo, não transmita, de regra,
suas opiniões pessoais, situações podem ocorrer, eventualmente, em que alguma orientação aos
mediandos se torne necessária. Exemplo: que tal cada um de vocês falar apenas a respeito do seu
ponto de vista? Como, “no meu entendimento...”, “na minha opinião...”, “eu sinto”, “eu gostaria
que...” etc. Nas relações sociais em geral, a força comunicativa está em expressar o seu sentimento e
opinião pessoais sobre aquele problema e estar sereno e atento para perceber os sentimentos e
necessidades do outro. De qualquer modo, mesmo que esse sentimento e opinião ainda não
expressem as necessidades reais suas e do outro, mesmo que ainda verbalizem necessidades
aparentes, posições excludentes e preconceitos, é por este caminho que se pode avançar na
reciprocidade do diálogo.
São recorrentes, no Brasil, os conflitos de vizinhança. Exemplo: pessoas, na casa vizinha, após
as 22 horas, com som ligado em volume inaceitável. Como o nosso padrão comunicativo ainda está
contaminado pela cultura de dominação (o coronel mandão dos territórios colonizados como que
substituído por pequenos e iludidos coronéis urbanos), ficamos sem jeito para resolver esses
problemas. Afinal de contas, não temos essa força opressora dos velhos coronéis. Não devemos
ofender com desabafos de baixo calão, ou lançar, sobre o vizinho, a etiqueta da ignorância, ou ir lá
quebrar o som e esmurrar a cara do irresponsável! Sabemos das histórias de crimes ocorridos em
situações semelhantes, mas não estamos felizes em nos omitir e perpetuar o abuso. Este é o dilema
entre o enfrentamento e a fuga.
A mensagem do ponto de vista pessoal, em que você, na primeira pessoa, expressa o seu
sentimento, a sua necessidade, o seu problema e solicita colaboração, é muito mais poderosa.
Exemplo: “Vizinho, você vai bem?”. “Estou precisando da sua ajuda”. Noto que o amigo é
apaixonado por música; eu também. Mas estou com um problema que só você pode resolver. Posso
contar? Minha mulher está grávida (minha filha está estudando para o vestibular ou com dificuldade
para dormir ou minha mãe, muito velhinha, está acordada... seja o que for, exponha o problema). O
que você poderia fazer para me ajudar?
Os brasileiros têm sangue quente tanto para perder o controle quanto para se sensibilizar.
Somos muito empáticos e calorosos e isto pode ser uma qualidade excepcional que outros povos não
sabem desfrutar. Você pode inclusive convidar o vizinho para tomar uma água ou um café em sua
casa; é possível que ele sinta empatia ao escutar, pessoalmente, o transtorno que está causando.
Mesmo que o resultado não tenha sido o inicialmente desejado, algo aconteceu: você nem foi
dominado pela raiva nem se omitiu. Ademais, nem sempre os resultados positivos desse rapport
ocorrem imediatamente. Dê algum tempo ao tempo.
O bom mediador não deve ter medo de divergências. Quem não sabe dizer não, também não
sabe dizer sim. Quem não sabe dizer sim costuma omitir-se das suas responsabilidades sociais. A
pessoa assertiva, comunicando-se construtivamente, é capaz de superar o impasse entre o confronto e
a fuga.
A pessoa que se omite para evitar conflitos deixa de expressar os seus sentimentos e opiniões.
Em seguida, vem a sensação de impotência, por achar que tem sempre alguém lhe impondo o que
deve ser feito. Ao sentir-se vítima da suposta manipulação, fica a remoer um misto de raiva e culpa,
num déficit de autoestima.
Em nosso país – ainda marcado pelos vícios do colonialismo e da escravidão – persiste uma
comunicação de oprimidos e opressores. Daí a cultura do “bonzinho”. Mas o “bonzinho” não é
confiável. A dissimulação é a sua moeda de troca. A moral do bonzinho é rigidamente hierarquizada.
Volta-se para agradar o poderoso, favorecer o parente e enganar o mais frágil. Essa cultura
desconhece a impessoalidade da justiça.
Essa “ética da amizade”, do chamado “homem cordial” a que se referia Sérgio Buarque de
Holanda (Raízes do Brasil), costuma favorecer o nepotismo e a esperteza, em vez de contemplar o
interesse público. Nossa cultura continua contaminada pela mania da “meia conversa”, em que não se
distingue as questões de princípio das questões de mero interesse pessoal ou grupal.
Somos levados a confundir tolerância com conivência. A falta de assertividade contribui para o
paradoxo da violência, pois excesso de omissão, de acomodação, converte-se em excesso de
agressão. A pessoa assertiva é confiável. Baseia-se em princípios e é capaz de renunciar às
facilidades ilícitas. É corajosa sem ser inconsequente. Daí por que a assertividade é algo que se
pratica serenamente, sem as mágoas e as explosões de raiva dos que se mantiveram omissos. Quando
estamos autoafirmados, assertivos, somos capazes de receber um não com naturalidade. E somos
capazes de dizer sim à decência e à generosidade.6
Enfim, a assertividade deve ser praticada com serenidade, para não ser confundida com
intolerância. A mensagem do ponto de vista pessoal é o modo de tornar respeitosa e eficaz a
assertividade. Essa eficácia será possível mediante a prática da reciprocidade escuta-fala.
Exercício: elabore texto narrando um diálogo ocorrido entre as partes em uma mediação
supostamente facilitada por você, em que tenha sido praticada, adequadamente, a reciprocidade
escuta-fala, utilizando-se entre elas a técnica da mensagem do ponto de vista pessoal (mensagem-eu).
a) Se o senhor não pagar essa conta até este final de semana, eu vou protestar o título.
b) Caso você não retire o que disse e acabe com essa história de que eu não presto e que tenho
mania de tomar o que é dos outros, vou dar queixa na polícia.
c) Se você continuar pagando essa mixaria de pensão para o meu filho, vou entrar na justiça e
nunca mais você vê ele.
d) Você tem a mania de mentir e esta é a terceira vez que fica aí enrolando e não paga a
prestação do carro.
e) Nunca mais vou contratar essa sua empresa incompetente. O meu apartamento está cheio de
rachaduras e não tenho condições de ficar em casa.
f) Se você continuar a construção desse muro que está invadindo o meu terreno, juro que vou
derrubar tudo.
g) É um absurdo a altura do som da sua casa a qualquer hora do dia e da noite. Se não acabar
logo com isso, vou quebrar esse som.
h) Ele é muito mulherengo; tem outra família, dois filhos fora do casamento, e ainda tem a sem-
vergonhice de dizer que não tem dinheiro para pagar a minha pensão.
i) Esse meu filho é irresponsável. Chega tarde ao trabalho e não presta contas do dinheiro que
retirou da empresa.
j) Essa síndica é muito encrenqueira. Não posso deixar o meu carro na rua. Vou continuar
estacionando na vaga do seu Geraldo, que gosta de reclamar, mas que está sempre viajando
e deixa a vaga livre.
A negociação, em seu sentido técnico, deve estar baseada em princípios. Deve ser cooperativa,
pois não tem por objetivo eliminar, excluir ou derrotar a outra parte. Nesse sentido, ela adota,
conforme a característica da relação interpessoal, um modelo integrativo ou um modelo distributivo.
O modelo integrativo é aquele normalmente adotado nas parcerias, alianças, relações de
interdependência, em que manter ou conseguir um relacionamento de longa duração é importante.3 O
modelo distributivo é o adotado nas negociações episódicas, sem perspectiva de geração de rede ou
parcerias, alianças, relações de interdependência etc. A mediação seria um terceiro modelo de
negociação cooperativa, denominado negociação com apoio em terceiros.
São, portanto, três modelos básicos de negociação: integrativo (buscase ampliar, expandir, o
campo reconhecido como de interesses comuns); distributivo (busca-se dividir ou trocar entre as
partes o campo de interesses em disputa); apoiado em terceiro (busca-se um terceiro, o mediador de
confiança, que possa facilitar uma solução).
Na negociação integrativa prioriza-se a análise de problemas e oportunidades para a tomada de
decisão. É uma negociação que tem a característica de um planejamento compartilhado. Na
negociação distributiva os interesses comuns estão subjacentes; ocultados por posições excludentes.
Ocorre que, na prática, as negociações costumam acontecer em três diferentes níveis de
abordagem, quais sejam: com enfoque predominantemente baseado em posições, em interesses ou em
valores, tal como preleciona Eugênio do Carvalhal, dependendo das circunstâncias a seguir
referidas.
A abordagem com enfoque preponderantemente baseado em posições cristaliza-se em
argumentos manipulativos, radicaliza os seus posicionamentos, ergue muros, tem dificuldade de fazer
concessões, e cada uma das partes apenas pensa em ganhar. Nessa abordagem, atingir objetivos é
mais importante do que satisfazer as necessidades. O que mais vale é o jogo ou a barganha
posicional. O poder manipulador prevalece e as ações fisiológicas são bastante comuns.
A abordagem com enfoque predominantemente baseado em interesses é a que caracteriza as
relações formais, negociais, em que padrões técnicos, éticos e legais dão objetividade aos acordos
buscados. Nessa abordagem, as partes tentam atender a seus interesses, podendo trocar de objetivos
com a clara intenção de satisfazer as suas necessidades. A racionalidade é parte integrante da
maioria dos argumentos e proposições. São buscados critérios objetivos.
A abordagem com enfoque predominantemente baseado em valores (princípios) é sustentada
pela coerência das partes com suas escalas de valores. Os valores, como normas, princípios e
padrões sociais aceitos e mantidos por indivíduos e instituições, são o referencial básico que norteia
o comportamento nas mais diversas situações. As técnicas recomendadas pela Escola de Harvard
estimulam abordagens com este enfoque, em que os interesses comuns são identificados e
priorizados.
A adoção de abordagens está relacionada a duas variáveis principais. Quando os interesses são
vistos como antagônicos e os recursos são escassos, fica facilitada uma abordagem baseada em
posições, numa barganha posicional de ganha-perde. Quando os interesses são percebidos como
comuns e os recursos são abundantes, fica facilitada a abordagem baseada em princípios, em que
prevalecem soluções de ganha-ganha.
Considerando essas três abordagens, o autor antes referido considera a negociação um processo
que se desenvolve num determinado ambiente, entre duas ou mais partes que abordam uma dada
situação (problema ou oportunidade), a partir de interesses comuns e antagônicos. Para isso, segundo
regras do jogo (cooperativas, integrativas, competitivas, distributivas, transparentes ou ocultas...), as
partes utilizam modos de comunicação através das quais manifestam comportamentos de influência,
para confrontar e discutir propostas explícitas, com o objetivo de alcançarem um acordo.
O bom negociador sabe que toda negociação comporta as fases de planejamento, execução e
controle. Na fase de planejamento – tão importante quanto a fase de execução – o negociador e/ou a
equipe de negociadores estuda tanto o caso objetivo quanto o perfil dos negociadores oponentes, em
suas circunstâncias pessoais, culturais e econômicas, buscando identificar e simular quais seriam ou
poderiam ser o estilo, os valores, os interesses, necessidades e possíveis estratégias, bem como os
possíveis limites a que estariam circunscritos. Colocar-se no lugar do outro é um ótimo recurso. Esse
planejamento também passa por igual exame dos próprios interesses, necessidades, estratégias e
limites.
Um bom planejamento é meio caminho para uma boa execução, que é a fase da negociação em
que ocorrem os encontros, quando o planejamento é posto em prática. A última fase é a de
monitoramento, em que os resultados são avaliados e trabalhados, para fins de ajustes, retomadas,
implantações e/ou aprendizados. Enfim, tudo na perspectiva de uma solução de ganhos mútuos.
Portanto, negociação, quando baseada em princípios, não se confunde com barganha posicional do
tipo ganha-perde, com o mero intuito de levar vantagem.
Esses estudos e pesquisas em negociação estão muito avançados no Brasil, destacando-se o
trabalho pioneiro da equipe de Eugênio do Carvalhal, por meio do curso “Negociação: Fortalecendo
o Processo”, em suas renovadas versões, desde 1984, na Fundação Getulio Vargas.4
A tempestade de ideias é uma técnica adotada para a negociação das questões substantivas, para
a identificação de interesses e opções. Trata-se de momento criativo, sem compromisso, sem
vinculação. Daí por que se deve deixar acertado que as ideias que fluem não passam de imaginação
criativa, sem qualquer sentido de proposta objetiva. A lógica é separar o ato criativo do ato crítico:
inventar primeiro, decidir, caso haja consenso, depois. E deixar que fluam todas as possibilidades,
sem censura. Como requisito para a tempestade de ideias, deve-se definir o objetivo, mudar o
ambiente, criar uma atmosfera informal, escolher um facilitador imparcial. Durante a sessão da
tempestade de ideias, devem-se colocar os participantes lado a lado, para lidar, em conjunto, com o
problema, convencionar a ausência de crítica, a confidencialidade e a socialização das ideias,
produzir uma lista de ideias abordando o problema sob os mais variados enfoques, registrar as ideias
em quadro-negro ou em grandes folhas de papel que todos possam ler.
No fechamento da tempestade de ideias devem-se adotar critérios para identificar as opções
mais fortes e mais fracas. É importante que se atribua pesos diferentes às várias opções, com base
nas suas características. Caracterizam-se como mais fortes as opções substantivas, permanentes,
abrangentes, definitivas, incondicionais e obrigatórias. Caracterizam-se como mais fracas as opções
processuais, provisórias, parciais, condicionadas, contingentes e não obrigatórias.
É comum, em negociações complexas, a prática unilateral e simulada de tempestade de ideias
como parte do planejamento de uma reunião de negociação. Nestas hipóteses, costumam-se
estabelecer prazos e definir quais e como essas ideias devem ser apresentadas na mesa de
negociação.
d) Insistir em critérios objetivos: tentar conciliar as diferenças com base na vontade (barganha
posicional) pode acarretar sérios danos. Para sair do terreno subjetivo da vontade de qualquer das
partes é necessária a identificação de critérios objetivos. Estes são padrões norteados por
princípios. Eis alguns padrões: preço de mercado, custo de reposição, valor contábil depreciado,
preços competitivos, projeção de tendências, precedente, opinião científica, padrões profissionais,
padrões morais, tratamento igualitário, tradição, reciprocidade, etc. A negociação baseada em
princípios contempla os padrões objetivos para um acordo sensato e duradouro.
Numa negociação com critérios objetivos, além dos padrões, os procedimentos também devem
ser justos. Padrões justos para as questões substantivas e procedimentos justos para lidar com os
interesses. Exemplo de padrão justo: cortar o bolo em duas partes iguais para as duas crianças que o
disputam. Exemplo de procedimento justo: uma das crianças corta o bolo e a outra escolhe. Ao lidar
com critérios objetivos devem-se ter em conta três requisitos: d1) cada questão deve ser apresentada
como uma busca conjunta; d2) os negociadores devem estar abertos às reflexões sobre quais são os
padrões mais apropriados e como devem ser aplicados; d3) deve-se admitir que se ceda a esta ou
àquela pressão, mas não se admite que se ceda em detrimento de princípios.
e) Conhecer as suas chances de retirada. E quando os negociadores do outro lado da mesa
assumem uma atitude dominadora? Especialmente para essas situações, adota-se a técnica
denominada “Chances de Retirada” (também conhecida como MAPAN – Melhor Alternativa Para um
Acordo Negociado, ou MAANA – Melhor Alternativa à Negociação de um Acordo).
A falta de Chances de Retirada, (MAPAN ou MAANA), enfraquece o negociador. Desconhecer
essas possibilidades deixa-o vulnerável. Exemplo: a negociação por um piso mínimo indesejado,
mas razoável, consoante as circunstâncias. Esse piso mínimo deve comportar alguma margem de
reserva, algum espaço para movimentar-se.
Na elaboração da sua Chance de Retirada, anote uma lista de providências que você poderia
tomar caso não chegue a um acordo. Avalie, também, o poder do outro: procure conhecer qual seria a
Chance de Retirada dele. Quando a outra parte for poderosa, mais evidente ficará a sua necessidade
de negociar com base em méritos, princípios, critérios. Mais relevante será contar com uma
alternativa, ou chance de retirada.5
Para se fazer uma ideia das bases de poder, Eugênio Carvalhal6 destaca oito: poder coercitivo
(dominação), poder de conexão (ligações de influência), poder de recompensa (prêmio ou punição),
poder de referência (traços pessoais), poder de informação (acesso ou posse), poder de especialista
(habilidade ou conhecimento), poder legal (quando atribuído pela organização) e poder legitimado
(quando sustentado por liderados).
Essa minitécnica deve estar apoiada numa epistemologia baseada na teoria do observador, que
contempla a possibilidade de diferentes versões para os fatos, descrições e explicações
apresentadas. Tais reflexões nunca devem ter por objeto as pessoas, mas apenas o material das
conversações. Podem ser feitas associações com situações semelhantes, deve-se adotar conotação
positiva, que contribua para a legitimação dos mediandos em suas posições, evitando-se resumos que
fechem a questão. O mediador, responsável pelo processo, pode, a qualquer momento, solicitar à
equipe reflexiva que suspenda as suas reflexões. O mediador também pode solicitar aos mediandos
que comentem o que escutaram, salvo quando o próprio mediador, com ou sem comediador, tenha
desempenhado o papel da equipe reflexiva. Deve-se destacar que essa técnica é menos praticada,
haja vista o seu custo e suas dificuldades na formação de uma boa equipe reflexiva.
3.2.1Capacitação e empatia
Na mediação transformativa o foco inicial está na apropriação (“capacitação”, “autoafirmação”,
fortalecimento, “empoderamento”) dos mediandos, de modo que esses atores – pessoas, grupos,
comunidades – recuperem reflexivamente seu próprio poder restaurativo, afastando-se de modelos
em que um “expert” decide “conceder” poder às pessoas “objeto”.
Ela também pode ser conceituada como um método/processo coevolutivo de afirmação e
transformação, com a colaboração de mediador, sem hierarquia, da apropriação à integração,
recursivamente, para viabilizar o reconhecimento das diferenças, a identificação dos interesses e
necessidades comuns, opções, dados de realidade e o entendimento (acordo).
Joseph Folger e Barush Bush17 lembram que, nos anos setenta, estudiosos de vários campos do
conhecimento, incluindo as ciências políticas e o direito, foram percebendo que a visão
individualista do mundo, que definiu e circunscreveu o papel das nossas instituições, estava
sendo substituída por uma visão relacional, que sugere a importância de se desenvolver instituições
com papéis ampliados, social, cultural e ecologicamente. Instituições enquanto instrumentos não
apenas para a proteção dos direitos e liberdades individuais, mas também para o desenvolvimento da
comunidade cívica e interconexão humana.
Os referidos autores, a partir do livro A Promessa da Mediação, de 1994 (revista e ampliada
em 2005, com enfoques sobre teoria e espiral do conflito), passaram a focar nos padrões
intersubjetivos de relações continuadas, rompendo com certa ideologia individualista presente nas
práticas da mediação nos Estados Unidos. Passaram a mostrar como os mediadores podem seguir,
conscientemente, uma abordagem que permite e ajuda as partes a aproveitarem as oportunidades que
o conflito apresenta para a capacitação (autodeterminação) e construção da empatia
(reconhecimento).
Tais autores, que trabalham e desenvolvem a mediação transformativa, argumentam que um
enfoque na capacitação (autodeterminação) caracteriza que o mediador observa pontos do
procedimento em que os mediandos, ainda autocentrados em função do conflito, têm a oportunidade
de se apropriarem de uma maior clareza em relação a seus objetivos, recursos, opções e
preferências. Então, o mediador vai trabalhando com essas oportunidades, por intermédio do apoio
aos processos mentais e emocionais dos próprios mediandos em direção ao esclarecimento e à
tomada de decisões. Alegam que um enfoque na empatia (reconhecimento) caracteriza que o
mediador observa em que medida os mediandos enfrentam a consideração da perspectiva, pontos de
vista e experiências do outro. E o mediador vai trabalhando para o estímulo dos esforços dos
mediandos em busca de uma compreensão compartilhada.
É nesse sentido que a mediação é potencialmente transformadora; por oferecer aos mediandos a
oportunidade de desenvolver e integrar, pela interação, suas capacidades de autodeterminação e de
reconhecimento.
Contudo, é preciso ter em conta que autodeterminação e reconhecimento não compõem uma
dualidade. Integram, sim, uma circularidade, que passa por seu necessário pressuposto: a interação.
Vimos que a interação é conflituosa e que essa conflituosidade se manifesta de modo explícito,
especialmente quando as acomodações hierárquicas não são opressivas. Qual seja, quando não se
está sob “a paz dos cemitérios”. Assim, as interações são o pano de fundo das autodeterminações e
dos reconhecimentos, ou dos seus contrários. Portanto, ao escutar e questionar os mediandos, o
mediador deve focar a interação, o padrão de interação, enfim, o modo como o conflito é construído
e o seu potencial de conversão em confronto e violência; pois a abordagem não é individualista, mas
relacional. Cada um de nós é alguém diferente em função daquele com quem nos relacionamos.
A mediação transformativa pode constituir a oportunidade de romper padrões relacionais e
transformar a natureza destrutiva daquele determinado conflito. Identificar a natureza da interação é o
caminho para a identificação dos interesses, expectativas e valores comuns subjacentes. Assim, as
perguntas a serem formuladas pelo mediador devem ser apenas relacionais.
Ao explorar a relação, estará sendo reforçada a autoafirmação dos mediandos e abrindo-se a
porta do reconhecimento. A mediação opera uma ética de alteridade, enquanto acolhimento da
diferença que o outro é na relação e no mundo da vida. Essa ética de alteridade incide sobre um
fenômeno circular e dialético, que nasce da relação, substancializa-se pela autodeterminação e se
integra, construtivamente, pelo reconhecimento. Esse foco na interação e em suas mudanças é o
chamado “microfoco” a ser praticado pelo mediador, pois a mediação transformativa justamente
enseja a transformação dessa interação.
3.2.2Padrões de interação
Stephen Littlejohn e Kathy L. Domenici18 recomendam que, a fim de colaborar para a obtenção
de resultados transformativos, os mediadores devem aprender a pensar na disputa em termos
sistêmicos e consoante abordagens múltiplas.
Em primeiro lugar, os mediadores precisam procurar conexões. Os eventos na disputa devem
ser vistos como parte de algum padrão maior. E nunca há apenas um padrão. O que está ocorrendo
entre pessoas e não é criação de apenas uma delas. Portanto, o argumento de um mediando é parte de
um episódio; é parte de uma relação ou de uma série de interações que, juntas, definem o self da
relação, produto inacabado de muitos padrões.
Em segundo lugar, os mediadores devem observar as regras implícitas em cada um desses
padrões. Como em gramática, as afirmativas que fazem parte de um sistema de interações que
incluem um vocabulário de direitos, deveres, obrigações, proibições, possibilidades etc. Essas
regras, esses códigos de conduta, dão forma e estrutura à realidade que vai sendo criada e, ao mesmo
tempo, constituem um indicativo de como se comportar em cada situação.
Em terceiro lugar, o mediador deve, ainda, perceber que esses padrões, regras e códigos de
conduta estão situados num contexto ou conjunto de contextos. O conjunto de regras pode variar de
um contexto para outro, que podem estar relacionados a outros contextos. É importante observar de
que forma esses contextos se relacionam, se reforçam ou se repelem.
Em quarto lugar, o mediador deve perceber que um sistema de interações constitui ações
interligadas, e deve observar como uma ação se liga à outra.
Em quinto e último lugar, deve o mediador ter em conta que os eventos de um sistema são
cíclicos e refletem uns aos outros. Não se deve assumir determinado ponto de vista a respeito de um
sistema com base em padrões causais simples. Será necessário compreender os circuitos causais
complexos em sua causalidade mútua.
Ao perceber esses eventos e adotando questionamentos, resumos e espelhamentos, com instantes
em que pratica o apoio e instantes em que pratica um afastamento, o mediador pode ajudar os
mediandos a ultrapassarem padrões de interação repetitivos e insalubres.
Para todas essas conduções, também são adotadas as seguintes técnicas:
a) Verificação: este é o modo como o mediador pode obter a opinião dos mediandos a respeito
de como devem atuar no procedimento ou de como estão se sentindo em cada momento. Esse modelo
de mediação não é compatível com regras preestabelecidas. Nos esclarecimentos de abertura da
mediação, as diretrizes serão construídas com os mediandos. A atitude diretiva do mediador, comum
em outros modelos, não é acolhida neste. No entanto, quando os mediandos estiverem confusos e
pedirem, o mediador poderá comentar sobre como tem sido produtiva a prática da colaboração
durante o procedimento. Essa verificação poderá ser praticada em qualquer instante do
procedimento. Exemplo: uma das partes faz afirmações que podem ter causado mal-estar à outra. O
mediando pode perguntar à outra parte se ela está confortável com essa situação, ou o que ela
gostaria que acontecesse para se sentir mais motivada e tranquila. Como o processamento da
conversa deve ser o mais autêntico e natural, o mediador não deve reformular ou reenquadrar as
afirmações de quem quer que seja. Que fluam livremente os sentimentos, pois este é o caminho
necessário à transformação, que se dá na interação.
b) Espelhamento: é quando o mediador olha nos olhos e fala de volta ao mediando o que ele
acaba de dizer, usando palavras próximas às que ele expressou. O bom espelhamento capta o tom
tanto das palavras quanto do emocional do mediando que acaba de falar, com o máximo de
naturalidade. A frase espelhada pode iniciar do seguinte modo:
“Então, para você, o que está acontecendo é que…” “...você está se sentindo...”. O
espelhamento é útil para o mediador, pois reforça o seu entendimento. Também é útil para o
espelhado, porque reflete de volta a sua manifestação. E é útil para o outro mediando, pois permite a
ele mais tempo para a escuta.
c) Resumo: os resumos são oportunidades para clarear as conversas que vão acontecendo. No
enfoque transformativo, os resumos não tentam induzir no sentido de um acordo. Eles devem
expressar o que cada um narrou e abrir caminho para a continuidade ou a troca de enfoque, conforme
a vontade dos mediandos. Eles também servem para ajudar os mediandos quando, eventualmente
enfraquecidos ou autocentrados, perdem o rumo. Como nas demais habilidades deste enfoque
transformativo, o resumo não tem fins diretivos. Não deve suavizar ou diluir diferenças ou
discordância. Deve ressaltar diferenças pontuais. Enfim, o resumo é frequentemente seguido da
“verificação”.
1 FISHER, Roger; URY, William; PATTON, Bruce. Como chegar ao sim. A negociação de acordos
sem concessões (Projeto de Negociação da Harvard Law School). Rio de Janeiro: Imago, 1994.
p. 33-113.
2 URI, William. Op. cit., p. 86-108.
3 DIAMOND, Stuart. Getting more: how to negotiate to archieve your goals in the real world. New
York: Crown Publishing, 2010. p. 247-278.
4 CARVALHAL, Eugênio do.Negociação: Fortalecendo o processo: como construir relações de
longo prazo. 2. ed. Rio de Janeiro: Vision, 2002.
5 URI, William. Supere o não. Negociando com pessoas difíceis. São Paulo: Best Seller, 2005.
6 CARVALHAL, op. cit. p. 97.
7 AZEVEDO, André Gomma. Fatores de efetividade de processos de resolução de disputas: uma
análise sob a perspectiva construtivista. In: CASELLA, Paulo Borba; SOUZA, Luciane Moessa d
(Org.). Mediação de conflitos. Novo paradigma de acesso à justiça. Belo Horizonte: Fórum,
2009.
8 RISKIN, Leonard L. Tomada de decisão em mediação: O novo “gráfico antigo” e o sistema do
“novo gráfico novo”. Estudos em arbitragem, mediação e negociação. v. 4. André Gomma de
Azevedo e Ivan Machado Barbosa (orgs.). Brasília: Grupos de Pesquisa, 2007. p. 129-170.
9 WARAT, L.A. O ofício do mediador. Florianópolis: Fundação Boiteux, 2004. p. 26.
10 STITT, Allan J. Mediação empresarial: aspectos jurídicos relevantes.Mediação empresarial no
Canadá. 2. ed. Coordenação de Carla Zamith Boin Aguiar. São Paulo: Quartier Latin, 2010. p.
108-128.
11 ALMEIDA, Tania. Mediação e conciliação: dois paradigmas distintos, duas práticas diversas.
Mediação de conflitos. Novo paradigma de acesso à justiça. Belo Horizonte: Fórum, 2009. p. 93-
102.
12 AZEVEDO, André Gomma (org). Manual de mediação judicial. Brasília/DF: Ministério da Justiça
e Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento – PNUD, 2010.
13 NAZARETH, Eliana Riberti. Mediação: algumas considerações. Revista do Advogado. São Paulo:
AASP – Associação dos Advogados de São Paulo, 2006. p. 129-133.
14 SUARES, Marinés.Mediación: conducción de disputas, comunicación y técnicas. 5. reimp.
Buenos Aires: Paidós, 2005. p. 241-242.
15 Idem, ibidem, p. 244-304.
16 VEZZULLA, Juan Carlos.Mediação de conflitos com adolescentes autores de ato infracional.
Florianópolis: Habitus, 2006. p. 87.
17 FOLGER, P. Joseph; BARUCH BUSH, Robert. Mediação transformativa e intervenção de
terceiros: as marcas registradas de um profissional transformador . Novos paradigmas em
mediação, organizado por Dora Schnitman e Stephen Littlejohn. Porto Alegre: Artes Médicas Sul,
1999. p. 85-100.
18 LITTLEJOHN, Stephen; DOMENICI, Kathy. Objetivos e métodos de comunicação na mediação.
Novos paradigmas em mediação, organizado por Dora Schnitman e Stephen Littlejohn. Porto
Alegre: Artes Médicas Sul, 1999. p. 209-223.
O procedimento de mediação: pré-mediação
e etapas
1. PRÉ-MEDIAÇÃO
A pré-mediação – salvo em matéria penal – não é uma condição sempre necessária da
mediação. Há situações em que se dá início à mediação sem passar por uma pré-mediação. Mas a
experiência tem indicado que as entrevistas de pré-mediação contribuem para a capacitação dos
futuros mediandos a se expressarem enquanto protagonistas responsáveis, com maior desenvoltura e
propriedade. Ou mesmo para que se possa constatar alguma anormalidade que comprometa a atuação
de ambas ou de alguma das pessoas envolvidas na disputa; hipóteses em que outros encaminhamentos
poderão ser mais adequados. Durante as entrevistas devem ser anotados os dados de identificação,
endereço e contatos dos solicitantes e solicitados.
Todos esses cuidados e providências devem ser observados na fase de pré-mediação, que
também deve incluir as informações sobre honorários do mediador e custas procedimentais
eventualmente envolvidas.
É comum o alongamento da pré-mediação. Quando o mediador percebe animosidades, desejos
de vingança ou desencontros grosseiros de posições, precisará de tempo para novas reuniões em
separado, até que se verifique a mudança de atitude e se viabilize o encontro construtivo. Isso não
significa que o mediador teme o conflito, ou que pretenda que ele não seja revelado nos encontros de
mediação. A preparação é efetuada para que a boa condução desse conflito seja internalizada como
responsabilidade de todos os integrantes desse processo colaborativo.
Há, também, inclusive no Brasil, experiências de pré-mediação por meio de dinâmicas
transdisciplinares, organizadas em Grupos de Pré-Mediação (GPMs), em que os participantes têm a
oportunidade de compartilhar as técnicas de comunicação, desconstruir narrativas pessoais, ampliar
as possibilidades de alteração dos pontos de vista, desconstruir os padrões de gênero vigentes na
respectiva cultura, esclarecer direitos e deveres, obter a facilitação dos futuros encontros de
mediação e a capacitação para negociação de acordos mutuamente satisfatórios5.
2. ETAPAS DO PROCEDIMENTO
O encontro de mediação é processado numa sequência de conduções. Costumamos dividir a
mediação em seis etapas, apenas para fins didáticos, visando facilitar o seu andamento. Há autores
que preferem considerar a pré-mediação como primeira etapa e subdividir em três as duas etapas que
designamos como quarta e quinta, totalizando assim, oito etapas, e adotando nomenclatura própria.
Como exemplo, citamos Adolfo Braga Neto e Lia Castaldi6, que adotam a pré-mediação como
primeira etapa e designam as demais etapas, sucessivamente, como Abertura, Investigação, Agenda,
Criação de Opções, Avaliação das Opções, Escolha das Opções e Solução. Na prática, as etapas não
são perceptíveis, pois o procedimento de mediação caracteriza-se por avanços e recuos que vão
possibilitando o esclarecimento das razões, a expressão dos sentimentos, as recontextualizações e
compartilhamentos de resumos e agendas, a superação das resistências, a construção do diálogo e as
tomadas de decisões.
É de responsabilidade do(s) mediador(es) chegar(em) com antecedência às reuniões, para
verificar as condições ambientais, providenciar papéis e canetas para as devidas anotações,
concentrar-se no que vão realizar, organizar mesa redonda, cadeiras em círculo e recepcionar os
participantes, de modo que, ao se iniciar a reunião, sendo mais de um mediador, fiquem juntos,
indiquem aos mediandos a também ficarem lado a lado, ladeados, quando presentes, pelos seus
advogados.
Eis como, na prática, devem evoluir as etapas da mediação:
Recomenda-se que os mediadores tenham à sua frente uma lista com estes pontos a destacar
naquele momento inicial. Também recomendamos que os mediandos disponham de alguma folha de
papel em que possam anotar aspectos que queiram comunicar no seu momento de fala.
Esta declaração de abertura é de imensa importância, pois é momento de acolhimento e empatia,
que vai ensejando aos mediandos sentimentos de normalidade e de segurança. Após cada
esclarecimento, recomenda-se que, olhando nos olhos, o mediador pergunte se há alguma dúvida a
esclarecer. Feitos estes esclarecimentos, será recomendável que todos assinem um Termo Inicial de
Mediação, em que conste a concordância de todos com o comportamento antes combinado. Para
efeitos legais, considera-se instituída a mediação na data da sua primeira reunião conjunta.
Sugerimos, então, fazer constar do Termo Inicial de Mediação, após a nomeação e qualificação
dos participantes, compromissos no sentido de:
a) colaboração e entendimento em busca de uma solução amigável para o conflito, com o apoio
do(s) mediador(es);
b) não interferência na fala do outro;
c) comparecerem às reuniões de mediação com pontualidade, nos horários agendados de comum
acordo;
d) manutenção da confidencialidade, sabendo que as informações e sentimentos revelados
durante a mediação não poderão ser utilizados e não valerão como prova em qualquer
outro ambiente ou processo;
e) participação em reuniões privadas (individuais) sempre que o mediador entender oportuno
para a melhor fluidez do procedimento.
Concluído e discutido o resumo, os mediandos estão mais receptivos à identificação das suas
necessidades e interesses comuns. Já apropriados pela circularidade da comunicação, capacitam-se a
superar a rigidez das posições polarizadas do início do procedimento.
Neste momento, o mediador poderá fazer perguntas que facilitem a identificação de interesses
comuns. Quais serão os interesses comuns dos pais que se separaram? Quais são os interesses
comuns de dois vizinhos que se estranharam? Quais são os interesses comuns de dois dirigentes da
empresa? Esses interesses não serão identificados, verdadeiramente, se as questões e sentimentos da
relação não estiverem bem apropriados e o padrão relacional transformado pela comunicação
construtiva.
Sempre que houver a possibilidade de acordos parciais, o mediador deverá incentivá-los. Os
acordos parciais podem aumentar a confiança na interação. Eles devem, necessariamente, decorrer
do diálogo entre os mediandos, com a colaboração do mediador. Tendo em conta que os acordos
devem ir das questões mais simples ou mais consensuais às mais complexas ou contraditórias, nessa
ordem. Para conflitos que englobam várias questões, recomenda-se uma agenda para cuidar de cada
um conforme a ordem agendada.
Em qualquer momento, caso o mediador constate resistências, ambiguidades, ou receios
significativos em um ou em ambos os mediandos, pode ser oportuno propor – respeitada a igualdade
de tratamento – a realização de reuniões privadas, em separado (caucus). Essas reuniões privadas
podem ser muito produtivas. Costumam ser realizadas em um ou vários encontros alternados e
equitativos, sendo nessas reuniões privadas a ocasião quando o mediador, por exemplo, propõe a
dinâmica de inversão de papéis, em que um se imagina no lugar do outro. Em outras situações, pode
ser preferível suspender a sessão para que os mediandos promovam avaliações ou exames,
conversem mais à vontade com seus advogados ou outros profissionais, e obtenham informações
sobre dados de realidade ou critérios objetivos necessários às suas decisões. Quando a mediação
circula sobre tais questões, é porque ela terá atingido, pedagogicamente, uma quinta etapa.
3.1 Pré-reuniões
Em verdade, como nas demais escolas de mediação, esta é a fase de pré-mediação. O encontro
de mediação deve ser precedido de reuniões para dar a conhecer a cada uma das partes,
isoladamente, as características do processo de mediação, explicar a respeito da confidencialidade,
firmar o acordo de confidencialidade, explicar as razões da gravação em vídeo (se for o caso),
firmar o acordo de aceitação da gravação em vídeo (se necessário), ajustar honorários e definir a
questão do tempo disponível. Nesse modelo de mediação, o mediador deve estar acompanhado,
necessariamente, de um comediador.
As pré-reuniões são, portanto, preparatórias, com vistas à boa condução dos encontros
subsequentes.
41. Além dos princípios já elencados no art. 2º da Lei 13.140/2015, a mediação também deverá
ser orientada pelo Princípio da Decisão Informada.
a) imparcialidade (os mediandos e respectivos interesses devem ser tratados com igualdade,
com isenção). Diferentemente do que ocorre no tocante ao princípio da independência, é a
conduta isenta do mediador a medida da imparcialidade. Deve-se esclarecer que não se
espera do mediador uma neutralidade, haja vista o seu inevitável envolvimento emocional
durante o processo. Espera-se, no entanto, que esse envolvimento não comprometa a sua
isenção. O conceito de neutralidade pode ser adotado nos conflitos internacionais,
considerando-se neutro o mediador de um terceiro país não envolvido nesse conflito;
b) credibilidade (o facilitador ou o mediador deve ser idôneo e merecedor da confiança). Em
mediação, a confiança é essencial e antecede a aptidão. Daí a nossa insistência no
entendimento da moral contemporânea e na incorporação dos valores da honestidade e do
altruísmo;
c) aptidão (o facilitador e o mediador devem ter a capacitação necessária para atuar naquele
tipo de conflito). As improvisações que setores do Poder Judiciário praticam ou
praticaram em relação às conciliações judiciais afrontam o princípio da aptidão. Neste
livro trazemos comentários a respeito da indispensável formação ou capacitação de
mediadores;
d) confidencialidade (o facilitador, o mediador, os mediandos e quaisquer outras pessoas que
participem ou observem a mediação, se obrigam a guardar sigilo a respeito do que ali for
revelado). A boa-fé e a transparência entre os mediandos devem ser construídas num
ambiente de confiança, que supõe o compromisso irrevogável de sigilo. O princípio da
confidencialidade supõe que as revelações ocorridas durante uma mediação não podem ser
utilizadas em outro ambiente, judicial ou não, sem a prévia anuência de ambos os
mediandos;
e) diligência (o facilitador ou o mediador deve realizar as suas tarefas com o máximo de
dedicação). Não há diligência sem esmero e paciência. O tempo da mediação é ditado pela
complexidade do caso e pelas necessidades dos mediandos. Não cabe ao mediador impor
tempos e modos. Ser diligente é deixar fluir a mediação com plena oportunidade para a
restauração de relações e viabilização do entendimento.
II – Princípios Fundamentais:
No desempenho de sua função, a instituição deverá proceder com imparcialidade,
independência, competência, diligência e confidencialidade, bem como exigir que esses princípios
sejam rigidamente observados pelo(s) mediador(es), árbitro(s) e demais atores do procedimento,
visando proporcionar aos demandantes uma decisão justa e eficaz da controvérsia. Cabe igualmente à
instituição respeitar e zelar pela observância aos princípios fundamentais do processo.
Nota Explicativa
A escolha da instituição é derivada da confiança nela depositada pelas partes, desde o início,
com sua indicação, durante todo o decorrer do procedimento, até o seu final. Essa confiança é
imanente à sua conduta quanto ao desenrolar de todo o procedimento, motivo pelo qual a instituição
deverá sempre ser imparcial, no sentido de evitar qualquer privilégio a uma das partes em detrimento
da outra; independente, entendendo-se não estar vinculada a qualquer das partes envolvidas na
controvérsia; competente, no sentido de conhecer profundamente os parâmetros ditados pelas partes e
pelo seu próprio regulamento para a organização e a administração do procedimento; e diligente,
pressupondo-se que não poupará esforços para proceder da melhor maneira possível quanto à
execução das suas funções.
Notas Explicativas
A instituição deverá atuar com suma prudência na sua relação com as partes, seus representantes
e advogados. Seu relacionamento não deve gerar nenhum vestígio de dúvida quanto à sua
imparcialidade e independência.
A instituição é responsável unicamente pela organização e administração do procedimento
arbitral, devendo evitar a execução de qualquer atividade ou prática de atos jurisdicionais, que
competem exclusivamente ao(s) árbitro(s). Seu comportamento deverá, portanto, estar
necessariamente em conformidade com a posição que detém.
A instituição deverá manter comportamento probo e urbano para com as partes, seus
representantes e advogados, mediador(es), árbitro(s) e demais atores do procedimento, dentro e fora
do processo.
No exercício da sua missão, a instituição deverá garantir às partes, seus representantes e
advogados e demais atores acesso às informações necessárias para o acompanhamento e
compreensão do procedimento, de forma a possibilitar a todos uma participação efetiva e consciente.
Todavia, deverá ser igualmente respeitado o sigilo das informações, salvo se as partes
expressamente estipularem o contrário.
A instituição deverá garantir tratamento igualitário e respeitoso a todos os envolvidos, inclusive
aos representantes e advogados das partes.
1. Zelar para que o(s) árbitro(s) ou o(s) mediador(es) não viole(m) o Código de Ética dos
árbitros e dos mediadores do CONIMA;
2. Exigir do(s) mediador(es) e árbitro(s) a primazia no atendimento pleno da convenção arbitra
ou de mediação, bem como do regulamento aplicável;
3. Caso a instituição tenha em seu regulamento a prerrogativa de escolha de árbitro(s) e
mediador(es), buscar o melhor perfil para o caso concreto;
4. Exigir do(s) árbitro(s) e mediador(es) que garanta(m) sua independência, imparcialidade e
disponibilidade na condução do procedimento;
5. Exigir do(s) árbitro(s) e mediador(es) que execute(m) suas missões com competência,
discrição e diligência, de forma a atender as expectativas normais das partes;
6. Exigir do(s) mediador(es) e árbitro(s) que execute(m) sua obrigação de revelação.
Notas Explicativas
A instituição deverá, de acordo com suas próprias regras, submeter ao(s) árbitro(s) e
mediador(es) questionário para apuração das situações que deverão ser evitadas por eles, as quais
poderão levantar dúvidas a respeito da sua imparcialidade, independência, disponibilidade e
competência para conduzir os procedimentos, caso tenham sido indicados pelas partes ou pela
instituição e estejam na iminência de aceitar o encargo.
A instituição que tomar conhecimento da existência de eventuais situações não reveladas, mas
que poderão conduzir as partes a questionarem a independência ou imparcialidade do(s) árbitro(s)
ou mediador(es), deverá solicitar ao(s) envolvido(s) que informe(m) aos demais participantes do
processo a respeito de tal fato, para se evitar o risco de uma eventual anulação posterior do
procedimento. Caso os envolvidos omitam essa(s) informação(ões), deverá a instituição avaliar os
efeitos da sua indicação sobre a imparcialidade e a independência do(s) árbitro(s) ou do(s)
mediador(es), antes de validá-la.
Notas Explicativas
Todos os deveres elencados neste item pressupõem uma conduta da instituição de forma
inatacável, no sentido de não ser objeto de qualquer crítica pelas partes, seus representantes e
advogados, mediador(es), árbitro(s) ou por outras pessoas eventualmente interessadas na
controvérsia. Daí ser imprescindível sua atribuição de manter a integridade da administração do
procedimento, com extrema retidão em todas as suas ações e atitudes.
A instituição deve ter consciência de que a sua principal obrigação é realizar atos
administrativos que contribuam para o bom andamento dos procedimentos de arbitragem e de
mediação, respeitando a missão de cada ator do procedimento.
1. Nunca se manifestar de forma depreciativa com relação a outra instituição buscando, com ist
auferir vantagens para si própria;
2. Promover o clima de cooperação junto a outras instituições, objetivando o bom andamento
dos processos de mediação e arbitragem e, consequentemente, o sucesso dos objetivos a
que se propõem;
3. Facilitar a troca de experiências entre as instituições de mediação e arbitragem, visando ao
aperfeiçoamento dos benefícios a serem oferecidos à sociedade, como resultado da
utilização dos métodos extrajudiciais de resolução de controvérsias.
Notas Explicativas
A instituição deverá agir com ética na relação com outras entidades administradoras de
procedimentos de mediação e arbitragem.
Ao identificar comportamentos antiéticos e, até mesmo, ilegais por parte de outras instituições,
a instituição deverá comunicá-los ao CONIMA, para que seja instaurado o respectivo procedimento
disciplinar, com o intuito de se apurar os fatos alegados e se tomar as providências cabíveis.
A instituição deve reconhecer que, a partir da colaboração mútua entre as diversas instituições,
a própria mediação e a arbitragem estarão sendo fortalecidas e corretamente divulgadas em nosso
país.
Notas Explicativas
A instituição ocupa uma posição privilegiada e de grande importância no processo de difusão e
promoção dos institutos da arbitragem e da mediação, devendo, por isso, contribuir da melhor forma
possível para o seu sucesso em nosso país. A escolha do método a ser utilizado pelas partes
envolvidas em uma controvérsia deriva do exercício da autonomia da vontade, podendo elas lançar
mão de quaisquer meios de resolução de disputas que não entrem em conflito com os bons costumes e
a ordem pública, não cabendo às instituições fazerem qualquer tipo de divulgação contrária à
utilização de mecanismos diversos daqueles incluídos na sua prestação de serviços.
Na divulgação dos seus serviços não deverá a instituição utilizar artifícios que possam induzir
os usuários a erro em relação à natureza privada da sua atividade, sobretudo levando-os a crer que
estão diante de órgão jurisdicional dotado do poder coercitivo privativo do Estado. A instituição
deverá ter consciência das consequências que poderão advir de tal comportamento, inclusive na
esfera criminal.
5. POSTURAS EM MEDIAÇÃO
Hoje, pelo Brasil afora, são inúmeras as experiências de mediação comunitária, com variadas
motivações.1 Algumas com caráter prevalentemente emancipatório, outras mais voltadas à prevenção
da violência. Umas com o objetivo de contribuir para o protagonismo social, outras com o intuito de
reduzir a pressão sobre o aparelho judicial. A maioria, porém, almejando concretizar, de algum
modo, todas essas necessidades.
Além de iniciativas diretas de comunidades e organizações sociais, centenas de prefeituras,
secretarias de educação, secretarias de segurança pública ou de segurança cidadã, ou de
desenvolvimento social, vêm procurando implantar o apoio às comunidades no desenvolvimento de
novas competências e habilidades comunicativas no trato do conflito, pela via da mediação e das
práticas restaurativas em geral.
A destacar, como política pública em âmbito nacional, o Programa Nacional de Segurança
Pública com Cidadania – Pronasci, do Ministério da Justiça, que contempla a mediação em Programa
de Justiça Comunitária e que vem estimulando, com a participação do Poder Judiciário, a
implantação de Núcleos de Justiça Comunitária em todas as regiões do país. Na perspectiva
pedagógica de submeter à apreciação dos estudiosos uma experiência específica, neste Capítulo
estaremos narrando como, na prática, foi implantada e inicialmente desenvolvida, em Pernambuco,
como política pública de estado, a mediação comunitária.
A Fundação Joaquim Nabuco contratou-nos, em 2005, para desenvolver o conteúdo temático e
atuar como coordenador didático da disciplina “Relações Interpessoais e Mediação de Conflitos” no
âmbito de um programa federal de capacitação de agentes sociais de prevenção da violência na
Região Metropolitana do Recife. Foram capacitadas mais de mil e quinhentas lideranças
comunitárias, gestores, jovens de quinze a vinte e quatro anos e guardas municipais em fundamentos
de direitos humanos, segurança pública, preservação do local do crime, comunicação construtiva nas
relações interpessoais e conhecimentos introdutórios à mediação de conflitos, abrangendo oficinas
sobre conflito e técnicas de pré-mediação.
Subsequentemente e em função desse trabalho, aceitamos o convite da então Secretaria de
Justiça e Direitos Humanos do Estado de Pernambuco para assumir a recém-criada Gerência de
Prevenção e Mediação de Conflitos. Desenvolvemos, então, um programa denominado Núcleos de
Mediação Comunitária – voltado às comunidades de baixa renda – numa perspectiva de
protagonismo social. Procuramos integrar pessoas já capacitadas no programa conduzido pela
Fundação Joaquim Nabuco, com vistas a oportunizar aplicações concretas e voluntárias dos
conhecimentos e habilidades adquiridos. E continuamos com reciclagens e novas capacitações, de
modo que essas e outras pessoas se motivassem a atuar como facilitadores de mediação, assumindo,
voluntariamente, a responsabilidade pela implantação, funcionamento e desenvolvimento de Núcleos
de Mediação de Conflitos em suas associações, escolas e igrejas.
1. CARACTERÍSTICAS DO PROGRAMA
Público Beneficiário:
Comunidades de baixa renda,
Sociedade Civil Organizada.
Área de Abrangência:
Estado de Pernambuco, a partir de experiência piloto na Região Metropolitana do Recife.
Parcerias:
Tribunal de Justiça do Estado de Pernambuco
Ministério Público do Estado de Pernambuco
Prefeituras Municipais
Secretarias Estaduais e Municipais
Defensoria Pública do Estado de Pernambuco
Instituições de Ensino
Organizações não governamentais
Justificativa:
Objetivos do Programa:
a) Geral:
Contribuir para o desenvolvimento de uma cultura de paz e direitos humanos, mediante a
capacitação e atuação estruturadas de facilitadores comunitários de mediação;
b) Específicos:
Promover a sensibilização e a capacitação das comunidades para a importância das soluções
negociadas e não adversariais de conflitos, com ênfase para a mediação;
Cadastrar gestores municipais, lideranças comunitárias, estudantes e profissionais já
capacitados pelos Cursos de “Fundamentos de Direitos Humanos, Relações Interpessoais e
Mediação de Conflitos”, que manifestem interesse em atuar, voluntariamente, como facilitadores de
mediação nas comunidades;
Instalar um Núcleo de Mediação Comunitária de Conflitos na própria sede da Secretaria, em
Recife e, subsequentemente, cadastrar os Núcleos de Mediação Comunitária de Conflitos
disponibilizados, sem custo, pelas comunidades e instituições, na Região Metropolitana do Recife;
Em etapas subsequentes, capacitar lideranças que se empenhem na instalação de Núcleos de
Mediação Comunitária de Conflitos em outros municípios do Estado;
Atribuir aos mediadores a supervisão dos Núcleos, cabendo-lhes estimular a empatia entre os
facilitadores de mediação e os responsáveis pelas instituições onde eles funcionam, esclarecer
dúvidas, apoiar a atuação dos facilitadores, assegurar estrutura satisfatória e procedimentos que
concorram para a divulgação e o desenvolvimento das atividades de prevenção e mediação na
comunidade correspondente;
Articular essas ações com esforços semelhantes que venham a ser desenvolvidos por outras
instituições como o TJPE, o MPPE, Universidades, Defensoria Pública e Municípios;
Estimular e colaborar com o trabalho que venha a ser desenvolvido com objetivos semelhantes
por instituições idôneas, sem fins lucrativos, da sociedade civil.
Metas:
Firmar convênio com o Centro de Mediação de Arbitragem de Pernambuco – CEMAPE,
entidade sem fins lucrativos com notória especialização, filiada ao Conselho Nacional das
Instituições de Mediação e Arbitragem – CONIMA, que cooperará com o suporte técnico e a
disponibilização de mediadores;
Selecionar, progressivamente, entre os alunos dos cursos de capacitação, aqueles que tenham
mostrado interesse e aptidão para atuarem, voluntariamente, como facilitadores comunitários nos
Núcleos de Mediação Comunitária de Conflitos a serem instalados por iniciativa deles, em espaços
das respectivas comunidades;
Promover reuniões de integração e cursos de reciclagem para esses facilitadores comunitários
de mediação e novos cursos de capacitação para outros interessados em atuar como facilitadores nas
comunidades, estreitando as relações entre os facilitadores de mediação e os mediadores inscritos no
Núcleo de Mediação Comunitária de Conflitos instalado na sede da SEJUDH;
Articular, em combinação com os gestores municipais, lideranças comunitárias, igrejas,
instituições de ensino e demais parceiros, os Núcleos de Mediação Comunitária de Conflitos, onde
os facilitadores de mediação recebem, separadamente, as partes em conflito, realizam as entrevistas
de pré-mediação e, quando necessário, direcionam os encaminhamentos ou agendam as mediações
com o mediador responsável pela orientação do respectivo núcleo;
A partir de 2007, dar sequência à progressiva consolidação, diversificação e implantação do
projeto em outros municípios do Estado, com ênfase para a juventude nas escolas públicas.
Estratégia de Ação:
A articulação é o eixo fundamental para a execução do projeto. Por intermédio dessa
articulação deverão resultar parcerias com órgãos do Governo Federal, Estadual e Municipal, do
Poder Judiciário, do Ministério Público, da Defensoria Pública, das Universidades e da sociedade
civil organizada, para uma ação integrada, em que sejam respeitados os interesses e as diferenças de
cada comunidade.
O método interdisciplinar da mediação de conflitos demanda, em princípio, uma capacitação
básica de, pelo menos, sessenta horas teórico--práticas e estágio supervisionado de cinquenta horas.
Daí por que, para ganhar tempo e eficácia, deu-se início ao projeto com o aproveitamento de
mediadores já capacitados ou em fase final de capacitação, indicados pelo Centro de Mediação e
Arbitragem de Pernambuco, instituição idônea, sem fins lucrativos, filiada ao Conselho Nacional das
Instituições de Mediação e Arbitragem – CONIMA. Esses mediadores receberão uma remuneração
módica por mediação com acordo, por atividades docentes ou por ações de orientação nos Núcleos
de Mediação Comunitária, haja vista a necessidade de um trabalho continuado, regular e cada vez
mais efetivo.
Os mediadores inscritos no Núcleo de Mediação Comunitária de Conflitos da Secretaria
atenderão a comunidade nos respectivos Núcleos de Mediação Comunitária, consoante as suas
disponibilidades de agenda;
Esse projeto prevê, pois, uma atuação integrada e uma relação de complementaridade entre
facilitadores de mediação voluntários, nas suas respectivas comunidades, e mediadores
especialistas, remunerados, que se deslocam entre as comunidades.
Os facilitadores comunitários de mediação, após devidamente capacitados, com um mínimo de
vinte horas-aula, desempenharão papel estratégico e voluntário da maior relevância na multiplicação
da cultura de paz e direitos humanos, prevenindo a violência nas pré-mediações.
Após as entrevistas de pré-mediação – que devem ser realizadas no respectivo Núcleo de
Mediação – o facilitador de mediação solicita, caso necessário, o agendamento das mediações que
vão sendo aceitas pelas partes. Escolhido o mediador em combinação com o Núcleo central, é
marcada a data e o local para o início da mediação.
Com o desenvolvimento do Programa, os facilitadores de mediação que se tenham destacado
pela competência, ética e compromisso com a comunidade poderão ser selecionados para participar
de cursos de capacitação em mediação, quando, desde que aprovados, serão cadastrados como
mediadores junto à Secretaria.
Em conflitos envolvendo ilícitos de menor potencial ofensivo, as mediações penais serão
utilizadas como atividade-meio para a restauração das relações entre vítima, ofensor e comunidade,
mediante práticas restaurativas nos próprios Núcleos ou perante Juizados Especiais Criminais.
Nesse caso, com caráter voluntário e complementar à atuação judicial.
Essas mediações – que devem ser realizadas na perspectiva de prevenir a criminalização – são
especialmente recomendadas para casos em que caibam suspensão do processo, transação penal,
medidas e penas alternativas, no contexto de práticas restaurativas, dentre as quais o monitoramento
dos acordos (Lei 9.099/1995).
Eis alguns exemplos: acidentes de trânsito; violência doméstica; abuso de autoridade; lesão
corporal leve; ameaça; injúria, calúnia, difamação; estelionato e outros delitos para os quais a pena
privativa de liberdade não seria superior a dois anos, ou a quatro, no tocante a idosos.
O programa abrange, portanto, as seguintes ações:
3. AVALIAÇÃO DE RESULTADOS
Após aquela capacitação, em 2005, por intermédio da Fundação Joaquim Nabuco, seguiram-se
outras ações até dezembro de 2006, como segue: capacitação de mais 700 pessoas, dentre líderes
comunitários, guardas municipais, jovens, professores, assistentes sociais, psicólogos e outros;
reuniões de reciclagem para cerca de 790 facilitadores e mediadores; palestras de sensibilização, em
comunidades, universidades e órgãos estatais, para um público em torno de 3.100 pessoas; visitas de
verificação a entidades interessadas na instalação de Núcleos de Mediação Comunitária; 28
inaugurações de Núcleos de Mediação Comunitária, na Região Metropolitana, em Caruaru e em
Floresta; 719 mediações realizadas em matéria cível e penal, inclusive no 1.º Juizado Especial
Criminal do Recife; 7.200 atendimentos, aproximadamente, à razão de dez
atendimentos/encaminhamentos por mediação.
Em torno de duzentas pessoas atuaram de modo consistente, como facilitadores voluntários de
mediação ou como mediadores. A média mensal, no final de 2006, era de 50 (cinquenta) mediações
com acordo formal. Por espécie de conflito os percentuais são os seguintes: vizinhança, 22%;
ameaça, 18%; lesão corporal leve, 16%; difamação/injúria, 14%; gênero, 11%; familiar, 7%;
consumo, 5%; trânsito, 2%; desacato, 1%; calúnia, 1%; condomínio, 1%; furto, 0,5%; propriedade e
posse, 0,5%; constrangimento, 0,5%; relações trabalhistas, 0,5%.
A atuação dos Núcleos é instável, mas a ação individual, difusa, das pessoas capacitadas, tem
produzido um efeito multiplicador. Apenas sete dos núcleos inaugurados vinham apresentando
resultados constantes e crescentes. Como qualquer semeadura, a colheita dos resultados depende de
cuidados e está sujeita a adversidades.
Um desses núcleos foi instalado em prédio público, no bairro popular de Brasília Teimosa, no
Recife, voltado para a segurança e apoio à mulher, com espaços para palestras e capacitações,
mediação de conflitos, central de medidas e penas alternativas (Secretaria de Justiça e Direitos
Humanos), atendimentos e orientações sobre saúde (Secretaria de Saúde), tráfico de seres humanos e
delegacia da mulher (Secretaria de Defesa Social), atendimento psicossocial (Secretaria de
Desenvolvimento Social) e atendimento jurídico com a Defensoria Pública.
Outro Núcleo atuou de modo integrado, mediante parceria entre a Secretaria de Justiça e
Direitos Humanos, o Tribunal de Justiça de Pernambuco e o Centro de Mediação e Arbitragem de
Pernambuco. Foi instalado no 1.º Juizado Especial Criminal do Recife, como experiência piloto de
práticas restaurativas no âmbito do Judiciário.
4. INDICADORES DE DESEMPENHO
Houve uma redução dos homicídios de proximidade (vizinhança). Em relação a esse tipo de
crime, acreditamos que uma das razões dessa diminuição decorra da legislação que restringe o porte
de armas e as rondas policiais. Embora não tenhamos elementos para comprovar, estamos seguros da
contribuição que o programa trouxe e poderá trazer para a solução pacífica das disputas nas
comunidades onde foi instalado.
Fragilidades:
1 BRAGA NETO, Adolfo; SALES, Lilia Maia de Morais. Mediação de conflitos no contexto
comunitário. Aspectos atuais sobre a mediação e outros métodos extra e judiciais de resolução
de conflitos. Adolfo Braga Neto e Lilia Maia de Morais Sales (org.). Rio de Janeiro: GZ Ed.,
2012. p. 21-35.
2 SCURO NETO, Pedro.Sociologia ativa e didática: um convite ao estudo da ciência do mundo
moderno. São Paulo: Saraiva, 2004. p. 214.
3 SIX, Jean François.Dinâmica da mediação. Tradução de Giselle Groeninga de Almeida, Águida
Arruda Barbosa e Eliana Riberti Nazareth. Belo Horizonte: Del Rey, 2001.
Justiça Restaurativa: círculos ou encontros
de mediação vítima-ofensor e outras práticas
restaurativas, especialmente na escola
Uma detalhada avaliação dessas questões e parâmetros é básica em qualquer projeto de justiça
restaurativa.
Recomendações e Desafios:
Segundo o Relatório ILANUD, o principal desafio que se apresenta para os programas de
Justiça Restaurativa analisados consiste na sua orientação a uma finalidade político-criminal, com
uma maior inserção no marco de profundas transformações no sistema tradicional de justiça. Por
assim dizer, seu potencial efetivamente transformador reside na sua finalidade político-criminal de
reduzir o controle penal formal. Do contrário, se for ela somente uma opção adicional de que se pode
valer o Estado, além do sistema de justiça tradicional, não apresentando com ele alguma
interlocução, representará apenas um incremento da intervenção penal.
No que toca à finalidade institucional, e com o fim de averiguar se a Justiça Restaurativa
representa de fato um aprimoramento do sistema de justiça, o Relatório recomenda que sejam
realizadas sondagens no que toca à satisfação da vítima e do ofensor e à mudança de percepção dos
operadores envolvidos na justiça tradicional. Esse tipo de pesquisa, no entanto, só apresentará
resultados confiáveis no futuro, quando os programas já consolidados tiverem reunido um número
significativo de casos.
No que concerne à finalidade político-criminal, a principal recomendação a ser feita, visando a
uma política criminal de redução do controle penal formal e a não extensão da rede penal, é aumentar
os casos passíveis de entrada na justiça restaurativa. Trata-se de uma ação em longo prazo, mas que
deve estar no horizonte dos programas de justiça restaurativa.
Assim, entende-se que não se devem restringir a priori os casos em razão da natureza da
infração ou da quantidade da pena, pois a adoção de critérios restritivos e rigorosos possibilita a
entrada para a justiça restaurativa de casos insignificantes ou de bagatela que sequer deveriam entrar
no sistema de justiça, pois contam com a atuação do controle informal. Com efeito, o trato concreto,
restaurativo do delito costuma revelar particularidades essenciais, imprevisíveis e inalcançáveis à
tipificação legal, que convertem essa tipificação, em vários casos, em algo inapropriado, porque iria
obstaculizar a promoção da paz social – bem maior, constitucionalmente protegido.
Esse é um aspecto sobre o qual não nos furtamos de comentar. Entendemos que o princípio
constitucional da promoção da paz oferece o fundamento, nas condições atuais do direito penal
brasileiro e nos limites da razoabilidade em situações concretas, de uma justiça restaurativa capaz de
ir além, de ultrapassar, de mitigar o rigor formal da indisponibilidade referida em regras textuais do
direito positivado. Exemplo: um cidadão de bons antecedentes, em atitude descontrolada de quem
está num dia atormentado, após envolver-se numa colisão de veículos, reage a ofensas e agride
alguém que o injuriou e ameaçou; e esse alguém, em virtude dessa agressão, sofre um derrame e fica
inutilizado para o trabalho. A lei prevê a punição devida e esta será aplicada, tal como ocorre com
aqueles que se envolvem nesse tipo de situações. Seria razoável a aplicação dos princípios e
práticas da justiça restaurativas em situações como esta? Entendemos, em tese, que sim. Falta a
checagem das particularidades subjetivas e objetivas que irão eventualmente fundamentar a inclusão
deste caso/pessoas em algum programa restaurativo.
Em que condições as práticas restaurativas poderiam ser razoavelmente adotadas? A) A
primeira condição é que o autor deste fato – antes ou depois de sentença condenatória – deseje
assumir a responsabilidade pelo seu ato e pretenda reparar o dano moral e material causado, pois
lamenta e se arrepende do que praticou e se sente no dever de promover a reparação possível do mal
causado à família vitimada. B) A segunda condição é que a família vitimada, previamente informada
do desejo do autor do fato, queira ou aceite participar de um diálogo com este, em um encontro ou
círculo restaurativo para o qual os interessados foram previamente preparados, encontro ou círculo
este conduzido por facilitadores qualificados, em que essas vítimas possam expressar os seus
sofrimentos, as suas raivas, as suas dificuldades e necessidades morais e materiais, resultantes do
ocorrido. Imaginemos, então, que essas práticas restaurativas sejam bem-sucedidas e que vítimas e
ofensor encontrem um caminho de paz, de reparação e de conciliação. Como isto deveria repercutir
sobre as regras que atribuem pena, em função do princípio de promoção da paz? Em um país que
valida a delação premiada, não seria adequado premiar a reparação legitimada? Um país produtor de
presídios desumanos, com espaço para menos de trezentos e cinquenta mil pessoas, mas onde se
encontram depositados 40% de presos provisórios dentre os mais de setecentos mil prisioneiros,
teria autoridade moral para negar a implantação de amplos programas restaurativos?
Segundo o Relatório do ILANUD, um indicador de êxito importante para apurar o sucesso da
justiça restaurativa, em seus programas e práticas preventivas nas comunidades, com a justiça
tradicional, é o contraponto; qual seja, a abordagem restaurativa está contemplando a sua finalidade
político-criminal? Está contribuindo para a redução do controle penal formal, pela diminuição do
número de casos que entram na justiça tradicional?5 A recomendação é no sentido de que os
programas devem buscar e acompanhar essa evolução.
A aplicação da justiça restaurativa nas escolas em casos de adolescentes em conflito com a lei,
com intervenção colaborativa, externa, de justiça e segurança, e, portanto, vinculada à justiça formal,
se, por um lado, incentiva a justiça tradicional a adotar práticas restaurativas, por outro, acarreta o
risco de ampliar o controle penal formal ao invés de diminuí-lo. Com efeito, ao desnecessariamente
trazer para o controle externo casos que, geralmente, não iriam para o sistema formal de justiça, e
que, muitas vezes, não se configuram como infração penal, aumenta-se a demanda pelo sistema de
justiça.
Esta é uma questão complexa. Por um lado, sair da esfera da justiça pode implicar o
enfraquecimento da justiça restaurativa em seu potencial de atuação diferenciada no seio da justiça
tradicional. Por outro lado, atrelar--se umbilicalmente à justiça formal a ponto de atrair para ela os
casos que não são definidos como crime implica uma indesejável extensão da rede penal. A
existência de bem estruturados programas de justiça restaurativa no ambiente da escola, com os
níveis de atuação que veremos adiante, pode ser o melhor modo de evitar este desvio.
Em uma perspectiva institucional, deve-se cuidar para que a adoção da Justiça Restaurativa não
signifique uma enxurrada de casos encaminhados ao Poder Judiciário. Isso pode colocar em xeque a
própria vantagem qualitativa que a Justiça Restaurativa representa na solução dos conflitos. Será
melhor optar por manter-se fora da seara do Poder Judiciário aqueles casos que possam vir a ser
satisfatoriamente prevenidos ou resolvidos em outra instância, como, por exemplo, nas práticas
restaurativas em comunidades e escolas.
Outra recomendação do Relatório é a adequação da aplicação da justiça restaurativa ao nicho
institucional mais propício a explorar o contraponto oferecido pela justiça restaurativa à justiça
tradicional. Outra questão importante é o da definição do momento por excelência de aplicação da
justiça restaurativa no interior do sistema de justiça. Recomenda o Relatório que seja o momento
anterior ao início do processo ou o momento inicial do processo. Outro ponto que precisa ser mais
bem trabalhado, buscando sua superação, é a centralidade que assume a justiça tradicional na justiça
restaurativa. Uma ação para evitar essa sobreposição é dar mais autonomia aos círculos/encontros
restaurativos.
O procedimento restaurativo não deve ser paralelo ao procedimento tradicional e nem deve
objetivar corrigi-lo. A suspensão deste último, como ficou constatado, na época, no programa piloto
de Brasília, parece ser a melhor forma de se garantir a autonomia da justiça restaurativa. A
autonomia também é conquistada com o respeito ao acordo feito por um círculo/encontro
restaurativo. Os programas também precisam deixar mais claro que, em caso de descumprimento,
deve-se tentar, via círculo/encontro restaurativo, apurar o motivo do não cumprimento, antes de se
tomar qualquer decisão pelos operadores do direito atuantes na justiça tradicional.
Os programas devem ter sempre em conta que o acordo deve ser proporcional ao delito. O fato
de impor limites (proporcionalidade, equidade, legalidade) ao acordo restaurativo não retira das
partes o seu poder de decisão, nem exclui o seu “empoderamento”. Quanto à participação dos
envolvidos, é preciso garantir uma maior colaboração das vítimas (foi recorrente na fala dos
programas a dificuldade de trazer a vítima e a dificuldade de a vítima aceitar participar até o final) e
também da comunidade. Para a vítima, já é consenso nos programas a necessidade de criação de um
serviço de apoio. Com relação à comunidade, é preciso ampliar sua participação nos círculos/
encontros restaurativos, por meio da vizinhança, família, amigos, etc. Outra maneira é buscar
facilitadores da comunidade.
Outro ponto, nesse caso visando garantir a voluntariedade da participação de todos e o melhor
aproveitamento da oportunidade dada às partes, é dar ênfase também na preparação das partes para o
círculo/encontro restaurativo. Com efeito, essa preparação é fundamental, pois o encontro da vítima
com o ofensor não deve ocorrer sem que ambos possam previamente, em reuniões separadas,
recontextualizar os seus papéis na construção do fato e, de algum modo, dar início à identificação das
necessidades reais a serem atendidas.
Com relação à gestão, o Relatório em exame refere-se a um problema unânime apresentado por
todos os programas. Trata-se da consolidação da equipe de trabalho. O vínculo como voluntário dos
facilitadores, por diversas vezes, estrangulou o regular funcionamento dos programas, pois implica
em restrições de tempo e de disponibilidade para com o programa de Justiça Restaurativa.
Para concluir, pode-se afirmar que os programas piloto de Justiça Restaurativa do Distrito
Federal, de Porto Alegre e de São Caetano foram os primeiros passos na colaboração da justiça
restaurativa com um movimento de flexibilização da justiça tradicional no Brasil. E buscaram assim
fazê-lo tendo em vista as particularidades de nossa realidade social. São três programas peculiares,
que refletem a especificidade de cada região e o contexto em que estão inseridos. Dita colaboração
foi fundamental para o melhor desenvolvimento destas e de outras experiências de Justiça
Restaurativa no país.
O Relatório faz as seguintes ressalvas:
A Justiça Restaurativa não deve ser entendida como redução de investimentos por parte do
Poder Judiciário: é preciso mais investimentos e apoio estatal para a sua consecução;
A Justiça Restaurativa não deve ser vista como meio de tornar a justiça mais rápida: percebeu-
se o quanto é importante o período de preparação para o encontro restaurativo;
Os programas avaliados são ainda incipientes para afirmar que a Justiça Restaurativa
potencialmente contribui para a redução da reincidência: de fato, é preciso um tempo maior para
qualquer avaliação de resultado.
A Justiça Restaurativa deve ser concebida como um instrumento de política criminal que vise à
inovação da intervenção penal. Apresenta um novo olhar e uma nova forma de intervenção sobre o
crime. Rompe com os modelos retributivo e terapêutico, que já deram mostras do seu esgotamento. É
nesse ponto que reside seu potencial transformador. É nesse aspecto que deve ser mais bem
explorada.6
A avaliação do ILANUD aponta pontos fortes e pontos fracos em cada um dos programas piloto
em referência, reconhece a importância de todos eles, apresentando, ao final, as seguintes
recomendações para os programas de justiça restaurativa em geral:
a) O mediador não é um juiz e, portanto, que não está ali para julgar;
b) O processo de mediação é informal, contudo estruturado a ponto de permitir que cada
mediando tenha a sua oportunidade de se manifestar, sem interrupções;
c) Os mediandos terão oportunidades de apresentar perguntas umas às outras, bem como aos
acompanhantes, que também poderão se manifestar, desde que resumidamente e que não
tirem o enfoque do contato direto entre vítima e ofensor;
d) Os mediandos terão, no momento próprio, a oportunidade de dialogar sobre modos de
resolver a situação e reparar os danos;
e) O acordo somente será redigido se os mediandos estiverem satisfeitos com a solução
encontrada, sem qualquer espécie de coação;
f) Todos os debates ocorridos na mediação e nas sessões preliminares serão mantidos na mais
absoluta confidencialidade e não poderão ser utilizados como prova em eventuais
processos cíveis ou criminais;
g) Caso haja advogados presentes na mediação, estes são importantes para a condução do
processo, porque bons advogados auxiliam o desenvolvimento da mediação e, por
consequência, o alcance dos interesses do seu cliente, pois sugerem soluções criativas aos
impasses que eventualmente surjam nas mediações;
h) Havendo necessidade, o mediador poderá optar por prosseguir com a mediação, fazendo uso
de sessões individuais (privadas), nas quais os mediandos se encontram separadamente
com o mediador; e
i) O papel das partes na mediação consiste em ouvir atentamente umas às outras, escutar sem
interrupções, utilizar linguagem não agressiva, e efetivamente trabalhar em conjunto para
achar as soluções necessárias.
O desenvolvimento da mediação em geral, com suas fases, foi indicado no capítulo VIII deste
livro, estando ali importantes referenciais que podem ser úteis à condução de mediações ou círculos
restaurativos. Destacamos, porém, que, além dos pré-círculos (ou pré-mediações) e dos círculos ou
mediações restaurativas propriamente ditos, os processos restaurativos contemplam os pós-círculos
(ou pós-mediações), em que os participantes compartilham os sentimentos e compreensões sobre os
resultados atingidos e monitoram seus desdobramentos na comunidade participante.
Quanto à autocomposição penal no Brasil, o marco regulatório, que inicialmente resumia-se ao
previsto na Lei 9.099/1995 e na Lei 10.259/2001, atualmente ampliou a perspectiva, consoante a Lei
12.594/2012 (Lei do Sinase – Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo). Em verdade, tais
regras devem ser compreendidas e interpretadas consoante os fundamentos constitucionais da
cidadania, da dignidade da pessoa humana e da promoção da paz, inclusive porque aplicações mais
amplas e em situações decorrentes de crimes de maior gravidade, os programas restaurativos a eles
relacionados poderão e deverão ser estruturados no acolhimento desses valores constitucionais.
São três, basicamente, as situações de conflito sobre as quais um projeto de mediação escolar
debruça-se: a) conflitos intersubjetivos envolvendo questões emocionais e de desrespeito; b)
conflitos oriundos de infrações de natureza disciplinar dentro das escolas; c) conflitos ou situações
de violência gerados por atos infracionais de natureza leve, estes compreendidos como os que não
chegam a afetar a segurança dos indivíduos presentes no local (exemplos: lesões de natureza leve;
ameaça; injúria; dano ao patrimônio).12
A seguir procuramos detalhar abordagens específicas nessas práticas de diálogo e restaurativas,
que podem ser introduzidas no ambiente escolar.
Nota: verifiquem, nas afirmações acima, que, em lugar de admoestação, censura ou ameaça, o
professor expressa, de modo claro e sincero, o que ele está sentindo ao verificar o acontecido.
Adiante seguem, pela ordem, perguntas circulares que professores facilitadores podem
formular, nas mediações informais, em face de agressões/ ofensas entre os seus alunos, de modo a
prevenir desdobramentos e oportunizar a restauração dos vínculos afetivos entre eles, no ambiente da
sala de aula.
Conforme o exemplo da letra b acima, em que se faz referência aos Círculos de Compreensão,
problemas como zombaria, bullying ou trapaça também podem ser abordados indiretamente, sem
confrontar o infrator. Nesta hipótese o facilitador inicia o círculo solicitando a cada um dos
participantes, por exemplo: “Pense numa situação em que você foi vítima de bullying e conte como
foi”. E/ou “Pense em uma situação em que você cometeu algum ato de bullying e descreva como foi”.
7. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Procuramos trazer, com base em experiências várias e em nossas observações enquanto
pesquisador e mediador de conflitos, algumas orientações teóricas sobre a justiça restaurativa em
suas várias abordagens voluntárias de trato e cura material dos efeitos concretos do fenômeno das
ilicitudes e nos debruçamos sobre como implantar, especialmente em nossas escolas, a política
pública de Cultura de Paz. Política esta que deve estar associada à prática do diálogo regrado,
conforme os métodos de construção de consensos, de prevenção das intolerâncias preconceituosas e
de restauração de vínculos, em suas aplicações na escola, na comunidade e nos ambientes de justiça
e de política pública de segurança.
Examinamos, de passagem, aspectos da insegurança, da instabilidade e das mutações e
diferenciações acentuadas de valores, em face do incremento continuado e crescente da revolução
virtual dos conhecimentos. Vimos que afeto e cognição devem estar juntos e sempre no processo
pedagógico. Que a escola precisa acentuar a validação de sentimentos entre todos os participantes do
ofício pedagógico.
Exemplificamos como poderiam ser implantadas as práticas em sala de aula, num primeiro
nível, com foco na prevenção e no cuidar dos conflitos quotidianos da relação discente-docente.
Exemplificamos como poderiam ser cuidados os problemas relacionados a casos de maus-tratos
reiterados, envolvendo estudantes com maiores dificuldades, num segundo nível. E exemplificamos
práticas de terceiro nível, em que a escola precisará de apoios institucionais externos.
Por fim, apresentamos proposta sobre como lidar com os valores, técnicas e habilidades
comunicativas a serem desenvolvidos na escola, por meio de círculos de diálogo, círculos
restaurativos e encontros de mediação, demonstrando as previsíveis e substanciais mudanças que
inevitavelmente ocorrem no quotidiano da comunidade escolar. Com efeito, os nossos padrões
comunicativos, inclusive na escola, ainda reproduzem os valores coloniais, escravocratas e
semifeudais, como fantasmas linguístico-comportamentais herdados da dominação patrimonialista e
cartorial que corrompe as nossas boas intenções e práticas sociais.
Enfim, acreditamos ser possível afirmar que dispomos de um capital extraordinário: a
criatividade e ludicidade da nova cultura em redes de relações interpessoais – presenciais ou
virtuais – que já atuam em círculos, em que, em meio a ambiguidades, podemos observar as
oportunidades do desenvolvimento de inovadores protagonismos que vão rompendo com os feudos
cartoriais arquetípicos da velha tradição patrimonialista.
Validamos tudo isto, sem preconceitos. As práticas que sugerimos estão voltadas para o futuro.
Acreditamos que elas abrem caminhos que favorecem a ludicidade, a criatividade, o afeto e a
responsabilidade coletiva.
Aprendemos que o limite maior a superar não está na juventude, mas no modo pouco criativo e,
por vezes, reacionário como alguns educadores e as políticas públicas (punitivas) lidam com ela.
Observamos que esse limite está na concepção de escola como salas de aula, que isoladamente não
oferecem as condições ecológicas necessárias à convivência saudável, que não dispensa espaços
para exercícios e competições esportivas, artísticas e científicas, sob a orientação de docentes
comprometidos e o olhar de familiares solidários.
Sobre a justiça restaurativa e a mediação escolar podemos destacar os seguintes
enunciados 26, 27, 28, 38 e 52:20
A abordagem pragmática objeto deste livro não estaria completa sem a apresentação de certo
número de casos muito recorrentes de conflitos, sintetizados adiante.
E para que servem esses casos? Para a simulação de mediações. Em nossos cursos costumamos
apresentar casos com o seguinte formato: O texto do mediando “a”, o texto do mediando “b” e o texto
do mediador. Nos textos dos mediandos “a” e “b” repetimos o mesmo histórico do caso, mas, na
parte final de cada texto, sob os títulos situação, posição e interesse, cada um deles contém pequenos
adendos onde constam as circunstâncias existenciais básicas de cada um, as suas respectivas
posições unilaterais e o que poderia constituir o interesse comum.
Como o texto do mediador apenas repete o histórico básico constante dos dois textos dos
mediandos e resume-se a recomendar a prática das técnicas ensinadas, não precisaremos, aqui,
transcrevê-lo. Esclarecemos, no entanto, que costumamos montar os casos em três páginas, as duas
primeiras para cada um dos mediandos e a terceira para o mediador. Cópias adicionais são entregues
aos comediadores e observadores, para que todos na sala tenham alguma função a desempenhar.
Por ocasião dessas práticas, verificamos como os mediandos estão sendo recebidos pelo
mediador, os esclarecimentos iniciais, a utilização das habilidades comunicativas, a evolução do
processo e a avaliação coletiva, consoante as percepções dos observadores.
Eis, portanto, os casos, envolvendo várias espécies de conflito.
Situação de Jorge:
Jorge é uma pessoa doente, idosa, e está prestes a ter um enfarte por causa da situação.
Não quer ter seu muro derrubado nem tampouco perder seus 2m de terreno. Foi falar com seu
vizinho do lado esquerdo, mas este não quis nem saber da história, pois disse que a confusão não é
com ele. Os outros moradores também dizem o mesmo.
Ele mora na rua há 10 anos e nunca teve confusão com ninguém. Nem quer pensar na vergonha
de ter seu muro derrubado.
Posição de Jorge:
Não quer que derrubem seu muro e nem quer perder seus 2m de terreno.
Interesse de Jorge:
Ter seu muro inteiro e viver em paz com os vizinhos.
Situação de Paulo:
Paulo está muito irritado porque perdeu 2m de terreno. Segundo ele, a construção da casa que
tinha planejado vai ficar comprometida sem o terreno na sua medição correta. E isso ele não acha
justo, assumir sozinho o prejuízo pelo erro dos outros.
Por que ele tem que ceder 2m de seu terreno?
Posição de Paulo:
Derrubar o muro de Jorge e fazer o seu, avançando os 2m de terreno que foi invadido.
Interesse de Paulo:
Recuperar seus 2m de terreno e viver em paz com os novos vizinhos.
Situação de Ana:
João foi uma terrível decepção em sua vida. Esse homem se transformou, nos últimos quatro
anos, em uma pessoa deprimida, arredia, um fantasma daquele homem bom e empreendedor que ela,
apesar de tudo, ainda ama. Quando engravidou de Joãozinho, sentiu-se rejeitada, tal o desinteresse de
João por seu segundo filho. Não acreditava no que estava acontecendo. João cada vez mais distante.
Teve até que tomar as dores de Pedro, irmão de João, injustamente expulso de casa. Embora nunca
tenha tido a oportunidade de comprovar, está convencida de que João deve ter arranjado uma amante
desde o tempo em que ela ainda estava grávida do Joãozinho. Embora tenha percebido os ciúmes de
João quanto a Pedro, nunca o traiu, embora estivesse muito só. Arrepende-se de ter ido ao cinema
com Pedro sem uma prévia comunicação a João. Tem notícia de que tal fato gerou algumas
insinuações maldosas. Ana está com raiva da atitude arredia de João e sofre com a sua ausência,
inclusive por conta das dificuldades por que passou sozinha durante este último ano.
Posição de Ana:
Quer que seja determinada uma pensão de R$ 800,00 em favor de cada um dos filhos.
Interesse de Ana:
Salvar o casamento e ter João de volta em casa.
Texto de João:
Histórico do Caso:
Ana e João casaram-se em 1994. Ele, integrante do departamento comercial de uma empresa,
ela, bancária. Têm, atualmente, dois filhos: Aninha e Joãozinho, com 8 e 4 anos, respectivamente.
Embora inicialmente felizes, começaram a surgir problemas no relacionamento durante a segunda
gravidez de Ana. Dois meses antes de Ana engravidar de Joãozinho, o casal aceitou abrigar em casa
um dos irmãos de João, de nome Pedro, que, por estar desempregado e inadimplente, foi despejado
do apartamento onde residia sozinho. Passado o primeiro mês, João foi ficando enciumado,
suspeitando que estivesse havendo uma aproximação excessiva entre sua mulher e Pedro, seu irmão.
Um dos amigos de João lhe confidenciou que teria visto Ana e Pedro juntos, de tarde, no cinema.
Quando Ana lhe deu a notícia de que estava novamente grávida, João ficou desconsertado. Não lhe
saía da cabeça a ideia de que o filho não era seu.
Não tendo coragem de expor as suas suspeitas para a mulher – até porque ela estava grávida e,
afinal de contas, não havia provas –, João determinou ao seu irmão, com certa rispidez, que se
mudasse para qualquer outro lugar, sob o pretexto de que precisava preparar o quarto para o novo
filho. Joãozinho nasceu e João sempre muito calado e sem ânimo. Vez por outra chegava muito tarde
ou viajava para trabalhos pouco prováveis. Tornara-se muito esquecido, constantemente deixando o
celular desligado. A relação entre Ana e João nunca mais voltou a ser a mesma. Três anos após o
nascimento de Joãozinho, João, inesperadamente e sem dar qualquer satisfação, abandonou a família.
Ana e os filhos começaram a passar por sérias necessidades. Joãozinho está agressivo e Aninha
muito deprimida. Ambos com problemas na escola. Ana, desesperada, conseguiu, um ano após o
desaparecimento de João, descobrir o seu paradeiro. Este foi recentemente notificado para
comparecer perante a Defensoria Pública, onde Ana solicitara apoio.
Situação de João:
Ana foi uma terrível decepção. Aquela mulher companheira, sensual e bonita foi capaz de traí-
lo com o seu próprio irmão. E justamente com aquele irmão a quem concedeu abrigo em momento de
necessidade. Com isto, grande tristeza, solidão e uma profunda mágoa da mulher e do irmão. Foi em
decorrência de sua baixa autoestima que João pediu transferência para outro Estado, na tentativa de
se afastar de todos aqueles sofrimentos. De nada adiantara aquelas noites em que procurara se
divertir ou os fins de semana em que participou de grupos de terapia. A saudade da sua filha Aninha
o atormentava. A namorada que arranjara e com quem desfrutou bons momentos não suportou a sua
eterna insatisfação. Constantemente se lamentando de como havia sido infeliz no casamento e como a
vida é cruel.
Posição de João:
Não reconhece Joãozinho como seu filho: Ana deve assumir as consequências pela destruição
do casamento.
Interesse de João:
Proteger Aninha. Construir um ambiente familiar saudável.
Interesse:
Identificar os responsáveis e obter a reparação devida.
Interesse:
Ser excluído da questão. Ser excluído de um conflito que não lhe diz respeito.
Interesse:
Resolver, sigilosamente, este conflito, para que não seja afetado o seu conceito profissional.
Situação de Nabuco:
Está há vinte e cinco anos no Departamento Jurídico da empresa e costuma afirmar que não
estaria há tanto tempo em tão conceituada organização se não fosse competente. Especialmente
porque, inicialmente com vinte advogados, o Departamento Jurídico estava, agora, com apenas oito e
o boato era de que o objetivo era deixá-lo com apenas cinco. Acentua que, embora esteja ocorrendo
uma descentralização das atividades de acompanhamento de processos, as orientações conceituais,
as estratégias de ação jurídica, devem emanar do Departamento Jurídico, vinculado, diretamente, ao
Diretor Administrativo do Grupo. Consoante o costume da casa, sempre que surge fato jurídico novo
– fato que ultrapassa a rotina processual –, o Departamento Jurídico é consultado. Assim – alega
Nabuco –, há uma evidente ascendência do Departamento Jurídico sobre os advogados e prepostos
indicados pelas Unidades Industriais para acompanhamento dos processos do seu particular
interesse.
Afinal de contas, o Presidente do Grupo costuma cobrar do Diretor Administrativo qualquer
insucesso nas causas trabalhistas. Em todos os processos trabalhistas, o Diretor Administrativo
continua exigindo que, na medida do possível, um advogado do Departamento Jurídico acompanhe o
seu andamento, mesmo quando haja advogado da unidade designado para o mesmo fim. Essa medida
é tomada por razões de segurança, haja vista que os advogados das Unidades são, por definição,
menos experientes.
Alega, também, Nabuco, que os problemas trabalhistas na Unidade Fábrica Papel I têm estado
acima da média das demais unidades similares, o que denota a existência de uma situação que exige
especial cuidado do Departamento Jurídico, inclusive na investigação das possíveis causas. Tudo
indica que o Gerente da Unidade, cioso na busca de melhores resultados, entra facilmente em conflito
com os seus subordinados. Nabuco não está disposto a perdoar a ofensa e comunica o fato ao seu
Diretor que solicita uma mediação do conflito entre Nabuco e Veloso. Nabuco quer uma punição
para Veloso.
Posição de Nabuco:
Exigir a punição a Veloso.
Interesse de Nabuco:
Ter reconhecida a sua competência profissional.
Texto de Veloso:
Histórico do Caso:
O Grupo Empresarial Álvares Cabral, fabricante de artefatos de papel, continua empenhado no
aumento da sua competitividade. Tem reduzido, drasticamente, a sua estrutura piramidal, na
perspectiva de uma administração cada vez mais cooperativa e integrada. Resolveu, também,
descentralizar para as suas várias Unidades Industriais as atividades administrativas que melhor se
prestem a ser ali desenvolvidas. Os diretores afirmam que cada Unidade deve assumir
responsabilidades e adotar a atitude que teria se fosse uma empresa independente; devendo ser
avaliada consoante critérios objetivos, inclusive mediante a comparação dos seus resultados com os
das demais unidades. Ocorre que, em passado recente, o Grupo Industrial era muito centralizado.
Quase tudo que não era atividade propriamente industrial se resolvia no Escritório Central.
Nos últimos anos os quadros e atividades do Escritório Central foram sendo reduzidos,
enquanto as Unidades iam assumindo novas responsabilidades. As pessoas do Escritório Central
continuam se comportando como se fora a própria elite da organização. Mas as pessoas das Unidades
se veem em vantagem no contato direto com a alta administração. Há um conflito latente nas relações
entre os executivos das Unidades e os do Escritório Central. Embora o Departamento Jurídico seja
central e, portanto, lotado no Escritório Central, algumas atividades de advogado são exercidas no
âmbito da Unidade. É o caso da advocacia trabalhista. Cada Unidade cuida dos seus processos
trabalhistas. No entanto, o Departamento Jurídico central é responsável pela orientação técnica.
Assim, os advogados trabalhistas lotados na Unidade estão hierarquicamente subordinados à
administração da Unidade, mas estão tecnicamente subordinados à orientação do Departamento
Jurídico.
Eis o conflito que surgiu: em pleno corredor da Justiça do Trabalho, na presença de pessoas do
Grupo Concorrente, o advogado Joaquim Nabuco, do Departamento Jurídico do Escritório Central
do Grupo, repreendeu, rispidamente, o advogado Chico Veloso, designado pelo Gerente da Unidade
Fábrica Papel I. Segundo Nabuco, Chico Veloso teria desacatado a sua orientação na condução de
processo trabalhista. Na audiência de conciliação, Chico Veloso, nas palavras de Nabuco, teria se
precipitado no fechamento de um acordo altamente lesivo aos interesses da empresa.
Nabuco, de modo incisivo, afirmou que Chico Veloso era um despreparado e que a sua
precipitação teria comprometido a obtenção de um melhor resultado para o Grupo Empresarial.
Revoltado, Chico Veloso replicou, afirmando que estava ali obedecendo à orientação do Gerente da
Unidade, vez que a Unidade estava muito insegura quanto à atuação dos integrantes do Departamento
Jurídico, que não conheciam a realidade laboral dos empregados lotados na Unidade. Na troca de
insultos que se seguiu, Chico Veloso chegou a qualificar Joaquim Nabuco de “preguiçoso e
arrogante”. No que foi chamado de “rábula insolente”.
Situação de Veloso:
Como consequência da descentralização das atividades do Grupo Álvares Cabral, Veloso foi
contratado para integrar o núcleo jurídico da Unidade Fábrica Papel I. Dita unidade opera, a
exemplo das demais, como uma empresa independente. Tem a responsabilidade de, mensalmente,
apresentar os resultados obtidos. Superávit ou perda. E o passivo trabalhista concorre para reduzir
os ganhos operacionais. Assim, em vista de tantas reclamações, o Gerente da Unidade está muito
atento no acompanhamento das causas trabalhistas. Chico Veloso, apesar de novo na Unidade, tem-se
revelado um profissional dedicado, ativo e competente, sempre atento a prazos e habilidoso no trato
com os juízes. Graças a ele e aos outros colegas advogados lotados na Unidade, o passivo trabalhista
vem sendo reduzido.
Ademais, com a redução dos advogados do Departamento Jurídico do Escritório Central, não é
mais possível confiar na disponibilidade de alguém dali em todas as situações. Enfim, é voz corrente
que não cabe ao Departamento Jurídico o acompanhamento desses processos, muito embora as
dúvidas e questões jurídicas novas devam ser esclarecidas com o seu apoio.
Daí por que Veloso, como de costume, tomou as iniciativas que lhe cabiam e, com a rapidez e
esperteza que o caracterizam, encaminhou a negociação, concretizando um acordo bastante razoável.
Está perplexo e preocupado com as repercussões do seu desentendimento com o colega Nabuco.
Afinal, Nabuco é ligado à diretoria da empresa e isto pode custar a perda do emprego de Veloso.
Embora entre os colegas, lá na Unidade, se comente que Nabuco é preguiçoso e prepotente, Veloso
está convencido de que errou ao afirmar isto em público. Após contar o fato ao seu Gerente, foi
convencido a aceitar uma Mediação.
Posição de Veloso:
Atuar livremente, sem a ingerência de Nabuco.
Interesse de Veloso:
Manter o seu bom conceito dentro da organização e garantir uma convivência harmônica com os
colegas.
Situação de Sílvio:
Sílvio está aflito com a situação, pois gosta muito do filho e quer acompanhar melhor seu
crescimento. Além do mais, quer muito que ele tenha uma convivência, e um bom relacionamento
com o meio-irmão.
Não acha justo não poder desfrutar da companhia do filho no seu espaço familiar.
Posição de Sílvio:
Não abre mão de levar Pedro para sua casa, pois para ele, esse é o lugar ideal para os dois se
relacionarem nos finais de semana.
Interesse de Sílvio:
Poder passar os finais de semana com Pedro na sua casa, e manter uma relação amigável com
Telma.
Situação de Telma:
Telma está angustiada. Pedro é louco pelo pai e sabe que faz o filho sofrer ao proibir suas
visitas. Reconhece que Sílvio tem o direito de ver Pedro, mas não admite que este seja levado a
conviver com a outra mulher do seu “marido”, e muito menos de vê-lo brincando com aquele menino:
o “filho bastardo”. Acha que este não é um ambiente sadio para o filho.
Posição de Telma:
Telma não admite que Sílvio leve Pedro para a casa da “outra”, e muito menos admite que ele
brinque com seu meio-irmão.
Interesse de Telma:
Viver em paz; e principalmente que Sílvio jamais deixe de visitar Pedro, pois sabe como é
importante a figura do pai na vida do filho.
Situação de Joana:
Joana está muito brava, pois fez muitos planos para ter essa estante. Economizou dinheiro com
muito sacrifício, desenhou a estante conforme o espaço que dispõe em casa, e agora recebe uma
estante totalmente diferente do que combinou com Sérgio.
O valor que dispõe não é suficiente para mandar fazer em outro lugar, e além do mais, não acha
justo perder dinheiro assim.
Joana ameaça fazer propaganda negativa da Marcenaria de Sérgio e ir para Juizado Especial de
Pequenas Causas.
Posição de Joana:
Ter seu dinheiro de volta para mandar fazer sua estante.
Interesse de Joana:
Ter uma estante conforme o planejado.
Texto de Sérgio (Você é Sérgio)
Histórico do Caso:
Joana contratou com Sérgio um serviço de marcenaria.
Deu-lhe 50% do valor adiantado para confecção de uma estante de livros.
Ao receber a estante pronta, Joana alega que esta não veio de acordo com o que foi tratado.
O modelo é totalmente diferente e o material usado é de péssima qualidade.
Ela agora exige que Sérgio devolva-lhe o dinheiro. Mas Sérgio diz que não devolve, porque
gastou tempo e material para fazer a estante e, por isso, se devolver o dinheiro terá prejuízo. E isso
ele não quer ter.
Joana ameaça fazer propaganda negativa da Marcenaria de Sérgio e ir para Juizado Especial de
Pequenas Causas.
Situação de Sérgio:
Sérgio está revoltado com Joana, pois ela já anda pela vizinhança falando mal da sua
marcenaria.
Segundo ele, fez tudo conforme o combinado: tipo de madeira, o tamanho do móvel, as
divisórias, etc.; inclusive, pelo preço que foi acertado, era impossível fazer melhor do que fez.
O problema, ao que parece, afirma ele, é que ela pensa uma coisa e diz outra.
Posição de Sérgio:
Não devolver o dinheiro, pois não pode ter prejuízo.
Interesse de Sérgio:
Que Joana receba a estante satisfeita, e assim possa resgatar a imagem da sua marcenaria na
comunidade.
Situação de José:
José está revoltado. As águas que constantemente alagam a sua casa já deixaram doentes o seu
filho de dois anos e a sua mulher. Ambos com bronquite. Essas águas contaminadas poderão trazer
outras complicações de saúde, além do terrível desconforto da eterna molhação e umidade. Exige
José, para início de conversa, que o muro seja imediatamente derrubado. E ainda exige que Antônio
pague R$ 600,00 (seiscentos reais) a título de indenização pelos incômodos causados à sua família e
para fazer face às despesas com remédios.
Posição de José:
Antônio deve derrubar o muro e indenizá-lo.
Interesse de José:
Resolver o problema da água em sua sala e restaurar a relação com Antônio.
Situação de Antônio:
Antônio vinha tendo problemas com o desaparecimento de ferramentas do terraço onde realiza
os seus serviços de marcenaria. Além disso, a sua mulher está pretendendo criar galinhas no quintal.
Para evitar outros problemas de furto de ferramentas e proteger as galinhas, construiu um muro em
torno de sua casa em seu terreno, tendo o cuidado de não invadir os terrenos dos vizinhos. Está
convencido de que não tem qualquer responsabilidade por problemas que possam acontecer na casa
do vizinho José.
Posição de Antônio:
Manter o muro e não responder pelos problemas alegados por José.
Interesse de Antônio:
Proteger a sua casa e restaurar as boas relações com o vizinho.
Situação de Amélia:
Amélia não aguenta mais o barulho da música, chegando a ficar, às vezes, até com dor de
cabeça. Não pode dormir, assistir televisão, nem sua filha estudar.
Sua casa é muito pequena, por isso não existe nenhum ambiente em que a música não a
incomode.
Posição de Amélia:
Amélia não quer ser incomodada pelo som de Artur.
Interesse de Amélia:
Viver em paz em sua casa, e manter boas relações com a vizinhança.
Situação de Denise:
Denise está irritada com as agressões de Amélia. A toda hora ela faz escândalos e ameaça
invadir sua casa para quebrar o som do menino. Artur não pode mais escutar músicas em paz.
Posição de Denise:
Denise quer que seu filho possa continuar a escutar o seu som, no volume, dia e hora que quiser.
Interesse de Denise:
Acabar com as brigas da vizinha; e que seu filho possa escutar o som em paz.
Situação de Márcia:
Márcia está aflita, pois sua casa está ficando, a cada dia que passa, mais cheia de goteiras,
consequentemente úmida, e com mofo nas paredes e móveis.
Seus filhos são alérgicos, e por isso só vivem gripados e cansados. Além dos mais, à noite, é
uma zoadeira danada. Os bichanos ficam namorando no telhado e ninguém consegue dormir direito.
Posição de Márcia:
Márcia quer que Socorro mande consertar seu telhado e não quer ver mais nenhum gato por
perto.
Interesse de Márcia:
Telhado sem goteiras, livre de gatos, e viver em paz com os vizinhos.
Situação de Socorro:
Socorro está angustiada, porque gosta muito dos seus gatos e não admite que ninguém faça mal a
eles. Ela é viúva, vive muito sozinha, e os gatos são as suas únicas companhias.
Acha que não foram os seus gatos que danificaram o telhado da vizinha e diz que, mesmo que
tenham sido eles, não teria como pagar o conserto.
Posição de Socorro:
Manter a criação de gatos, e não consertar o telhado de Márcia.
Interesse de Socorro:
Poder criar seus gatos em paz e acabar com as brigas da vizinha.
a) Uma casa de quatro quartos e demais dependências, em bairro nobre, onde a divorciada
continuava morando com os três filhos, que, segundo Ricardo, vale R$ 480.000,00 e que,
segundo Romilda, vale R$ 360.000,00.
b) Uma pequena casa, de dois quartos, em bairro popular, que pertencera aos pais de Ricardo, e
onde ele se encontra enquanto não se resolve o problema da partilha, e que, segundo este,
vale R$ 20.000,00, mas que, conforme Romilda, vale R$ 40.000,00.
c) A biblioteca jurídica, herdada por Ricardo de seu pai, também advogado, abrangendo 2.000
exemplares que ele estimava em R$ 20.000,00, enquanto Romilda lhe atribuía o valor de
R$ 40.000,00.
d) O título de sócio do Clube Náutico, avaliado em R$ 20.000,00.
e) Um automóvel Honda Civic, modelo 2010, avaliado em R$ 30.000,00.
f) Uma aplicação financeira em banco oficial, no montante de R$35.000,00.
Além das divergências quanto aos valores atribuídos por cada um aos bens comuns, constatam-
se toda uma má vontade, todo um ambiente de acusações de parte a parte, o que dificulta o trabalho
do mediador. Mas o fato de haverem procurado a mediação denotava que, no fundo, ambos gostariam
de obter a solução para aquele impasse.
Situação de Ricardo:
Exige Ricardo, para início de conversa, que a casa de maior valor seja vendida, dividindo-se
por igual o produto dessa venda. E que fique para ele tanto a casa pequena, onde se encontra
provisória e precariamente residindo, quanto a biblioteca, herdadas dos seus pais, desde que pelos
valores por ele atribuídos de R$ 20.000,00 e R$ 40.000,00, respectivamente. Aceita que, em
compensação, Romilda fique com o Honda, de igual valor. Propõe que Romilda, a quem coube a
guarda dos filhos, vá com eles para a casa dos pais dela, até que seja adquirido, com metade do
valor da casa a ser vendida, um apartamento em nome dos filhos, onde mãe e filhos residirão.
Continuará pagando a pensão alimentícia, ajustada judicialmente, aos dois filhos e, com o produto
que lhe couber da casa, acrescido do produto da venda de outros bens que lhe couberem, espera
comprar uma casa ou apartamento decente para ele próprio morar.
Posição de Ricardo:
A sua proposta deve ser aceita.
Interesse de Ricardo:
Resolver o problema da melhor maneira possível.
a) Uma casa de quatro quartos e demais dependências, em bairro nobre, onde a divorciada
continuava morando com os três filhos, que, segundo Ricardo, vale R$ 240.000,00 e que,
segundo Romilda, vale R$ 180.000,00.
b) Uma pequena casa, de dois quartos, em bairro popular, que pertencera aos pais de Ricardo, e
onde ele se encontra enquanto não se resolve o problema da partilha, e que, segundo este,
vale R$ 10.000,00, mas que, conforme Romilda, vale R$ 20.000,00.
c) A biblioteca jurídica, herdada por Ricardo de seu pai, também advogado, abrangendo 2.000
exemplares que ele estimava em R$ 20.000,00, enquanto Romilda lhe atribuía o valor de
R$ 40.000,00.
d) O título de sócio do Clube Náutico, avaliado em R$ 10.000,00.
e) Um automóvel Honda Civic, modelo 2002, avaliado em R$ 30.000,00.
f) Uma aplicação financeira em banco oficial, no montante de R$ 35.000,00.
Além das divergências quanto aos valores atribuídos por cada um aos bens comuns, constatam-
se toda uma má vontade, todo um ambiente de acusações de parte a parte, o que dificulta o trabalho
do mediador. Mas o fato de haverem procurado a mediação denotava que, no fundo, ambos gostariam
de obter a solução para aquele impasse.
Situação de Romilda:
Não admite e considera uma ofensa essa atitude de Ricardo em querer, a qualquer custo, vender
a casa da família. Ali ela se encontra bem instalada, ao lado dos filhos. Alega que os filhos, os
maiores prejudicados, não querem sair da casa. Entende que, mantendo os filhos na casa, o trauma da
separação dos pais é minimizado. Defende que, com a partilha dos bens, metade da casa seja doada
aos filhos, com usufruto vitalício em seu favor, ficando em seu nome a outra metade.
Não se importa que o restante dos bens fique com Ricardo. Segundo ela, quanto ao futuro,
Ricardo, homem e advogado que é, tem muito mais condições de ganhar dinheiro do que ela, mulher
e Procuradora Municipal. Além do mais, a pensão dos filhos, no montante de R$ 1.000,00, seria
insuficiente.
Posição de Romilda:
Não sai da casa e quer uma pensão maior para os filhos.
Interesse de Romilda:
Preservar o bem-estar e garantir uma boa educação para os filhos.
Posição de Helena:
Helena está irredutível, pois quer continuar a fazer seus despachos, e naquela encruzilhada.
Interesse de Helena:
Helena deseja viver em paz com a vizinha, mas quer que seja respeitada a sua crença.
Situação de Alice:
Alice, por ser evangélica, não admite ver, praticamente na sua porta, despachos de Umbanda,
pois acha que isso é coisa de Satanás e que, sendo assim, só atrai coisa ruim. Está até desconfiada
que, ultimamente, Helena está fazendo despachos para lhe prejudicar, pois anda meio adoentada.
Posição de Alice:
Impedir que Helena faça seus trabalhos de Umbanda na esquina de sua casa.
Interesse de Alice:
Viver em paz com a vizinhança e não encontrar mais despachos de Umbanda na esquina de sua
casa.
12.º CASO – DA FAZENDA DE CAMARÕES ARRENDADA
Queremos Camarões (Solicitante)
Camarões VIP (Solicitada)
A – Posição de Queremos Camarões S.A (Arrendatária Solicitante):
Ao final pede: