Você está na página 1de 18

Conteúdo

atualizado CONTEÚDO
com a nova
Lei de Licitações GRATUITO

LICITAÇÃO
Previsão constitucional
e infraconstitucional,
competência legislativa e
exceções ao dever de licitar

Edgar Guimarães
Autor
Edgar Guimarães

LICITAÇÃO
Previsão constitucional
e infraconstitucional,
competência legislativa
e exceções ao dever
de licitar

*Esse material é protegido por direitos autorais sendo vedada a reprodução não autorizada,
gratuita ou onerosamente, sob pena de ressarcimento, em caso de infração aos direitos
autorais.

É permitido citar os excertos em petições, pareceres e demais trabalhos, desde que seja
informada a fonte, garantidos os créditos dos autores dos artigos, do órgão emanador da
decisão ou informação e da publicação específica, conforme a licença legal prevista no
artigo 46, III da Lei nº 9.610/1998.
Licitação
Previsão constitucional e infraconstitucional,
competência legislativa e exceções ao dever
de licitar

Edgar Guimarães

Advogado. Pós-Doutor em Direito pela Università del Salento


(Itália). Doutor e Mestre em Direito Administrativo pela PUC/SP;
Bacharel em Ciências Econômicas pela FESP/PR. Professor
de Licitação nos cursos de Pós-graduação do Instituto de
Direito Romeu Felipe Bacellar e da Universidade Positivo;
Consultor Jurídico (aposentado) do Tribunal de Contas do
Estado do Paraná; Presidente do Instituto Paranaense de
Direito Administrativo; Membro dos Institutos Brasileiro de
Direito Administrativo, do Instituto dos Advogados do Paraná
e do Conselho Científico do Instituto Romeu Felipe Bacellar.
Árbitro da Câmara de Arbitragem e Mediação da FIEP/PR.
Conselheiro da OAB/PR. Autor de livros e artigos jurídicos.
Sumário

Previsão constitucional e infraconstitucional...................... 6

Competência legislativa.........................................................10

Exceções ao dever de licitar..................................................14

Referências bibliográficas.....................................................17
A Administração Pública não produz todos os bens e serviços
necessários ao atendimento dos interesses públicos primários e
secundários, tendo, na maioria das vezes, de se socorrer no mercado,
contratando particulares, pessoas físicas ou jurídicas, com capacidade
para suprir estas demandas.

Objetivando a satisfação de tais interesses, inúmeras relações


contratuais são celebradas tendo por objeto uma gama das mais variadas
possíveis. Via de regra estas relações são concretizadas mediante os
denominados contratos administrativos.

É natural que todas as pessoas busquem a melhor proposta


quando da realização de negócios. “Essa busca é, para umas, facultativa,
e, para outras, obrigatória. Para as pessoas particulares é facultativa.
Para, por exemplo, as públicas (União, Estado-Membro, Distrito Federal,
Município, autarquia) e governamentais (empresa pública, sociedade de
economia mista, fundação), é, quase sempre, obrigatória ...”1.

Diferentemente dos particulares que gozam de total liberdade


quando pretendem adquirir, alienar, locar bens, ou ainda contratar a
execução de determinada obra ou a prestação de determinado serviço2,
a Administração Pública, por celebrar contratos no interesse de terceiros,
no caso, dirigidos à satisfação do interesse público3, deve anteceder suas
contratações de uma competição que assegure igualdade de condições
na disputa a todos os interessados que demonstrarem capacidade para

1 GASPARINI, Diogenes. Direito Administrativo, 17ª ed. atualizada por Fabrício Motta. São
Paulo: Saraiva, 2012, p. 532.
2 Essa liberdade costumeiramente era denominada de autonomia da vontade. Recentemente,
por conta dos fenômenos da massificação das relações contratuais, que trouxe consigo uma maior
intervenção do Estado nas relações privadas, a liberdade de contratar deferida aos particulares passou
a ser denominada de autonomia privada.
3 “A noção de interesse público (contempla) um significado denso, complexo e juridicamente
conformado (...). Para atar a noção às amarras jurídicas, vedando o seu emprego distorcido por parte
dos administradores para fins escusos, impõe-se afivelar o seu conteúdo a determinadas normas que
operam como sujeições da Administração Pública, necessárias ao alcance do interesse da sociedade:
os princípios constitucionais da Administração Pública, estabelecidos no art. 37, caput, da Constituição
Federal.”. (BACELLAR FILHO, Romeu Felipe. A noção jurídica de interesse público no Direito
Administrativo brasileiro. In: BACELLAR FILHO, Romeu Felipe; HACHEM, Daniel Wunder (Coords.).
Direito administrativo e interesse público: estudos em homenagem ao professor Celso Antônio Bandeira
de Mello. Belo Horizonte: Fórum, 2010. p. 95.)

Licitação - Previsão constitucional e infraconstitucional, competência legislativa e exceções ao dever de licitar 5


executar satisfatoriamente as prestações contratuais. Essa competição
é denominada de licitação.

Previsão constitucional e infraconstitucional

A Constituição Federal de 1988 em seu artigo 37, inciso XXI,


prescreve expressamente o dever de licitar, ao estabelecer comando no
seguinte sentido:
“Art. 37 (...)
XXI – ressalvados os casos especificados na legislação, as
obras, serviços, compras e alienações serão contratados
mediante processo de licitação pública que assegure
igualdade de condições a todos os concorrentes, com
cláusulas que estabeleçam obrigações de pagamento,
mantidas as condições efetivas da proposta, nos
termos da lei, o qual somente permitirá as exigências
de qualificação técnica e econômica indispensáveis à
garantia do cumprimento das obrigações”.

Ainda que a Constituição Federal de 1988 não fizesse previsão


alguma acerca da questão, surgem inúmeros fundamentos para defender
que, mesmo assim, cumpriria à Administração Pública anteceder suas
contratações de licitação.

Isso se deve ao fato de que é possível categorizar a licitação


como um resultado, um produto, do princípio republicano. Ocorre que,
dentro de um ideário republicano, não seria admissível que os negócios
realizados em nome e nos interesses da res publica o fossem conforme a
livre escolha dos agentes incumbidos de zelar por ela. É natural, para não
dizer lógico e coerente com a opção republicana, que essa escolha fosse
feita de modo impessoal, fundamentada em justificativas decorrentes da
aplicação de critérios de seleção previamente detalhados e levados ao
conhecimento de todos os possíveis interessados.

Licitação - Previsão constitucional e infraconstitucional, competência legislativa e exceções ao dever de licitar 6


A licitação, dentro dessa ideia, consiste no processo administrativo
por meio do qual a Administração Pública, assegurada a igualdade de
participação a todos os possíveis interessados, seleciona a proposta
mais vantajosa ao interesse público, conforme regras previamente
definidas e divulgadas.

No plano infraconstitucional este panorama, por óbvio, não poderia


ser diferente. Assim, a Lei nº 14.133/2021 estabelece normas gerais de
licitação e contratação para a Administração Pública direta, autárquica e
fundacional da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios,
e abrange, igualmente, os órgãos do Poder Legislativo e Judiciário da
União, dos Estados e do Distrito Federal e os órgãos do Poder Legislativo
dos Municípios, quando no desempenho de função administrativa, bem
como os fundos especiais e as demais entidades controladas direta ou
indiretamente pela Administração Pública.

De acordo com a Lei nº 14.133/2021, a licitação constitui a regra e


o processo licitatório deve alcançar os seguintes objetivos:

“Art. 11. O processo licitatório tem por objetivos:


I - assegurar a seleção da proposta apta a gerar
o resultado de contratação mais vantajoso para a
Administração Pública, inclusive no que se refere ao ciclo
de vida do objeto;
II - assegurar tratamento isonômico entre os licitantes,
bem como a justa competição;
III - evitar contratações com sobrepreço ou com preços
manifestamente inexequíveis e superfaturamento na
execução dos contratos;
IV - incentivar a inovação e o desenvolvimento nacional
sustentável”.

Não são abrangidas pela Lei nº 14.133/2021 as licitações e


contratações das empresas públicas, das sociedades de economia mista
e das suas subsidiárias, que continuam regidas pela Lei nº 13.303, de

Licitação - Previsão constitucional e infraconstitucional, competência legislativa e exceções ao dever de licitar 7


30 de junho de 2016, submetendo-se apenas às disposições constantes
do art. 178 da Lei nº 14.133/2021 que promoveram alteração no Código
Penal, ao inserir no novel Diploma os crimes antes previstos pela Lei nº
8.666/1993.

Conforme bem ensinaram Lúcia Valle Figueiredo e Sérgio Ferraz,


em verdade, “o princípio da licitação é uma realidade categórica,
que conforma, em nosso país, o sistema jurídico das contratações
administrativas. E, como tal, obteve ele expressa consagração, no inciso
XXI do artigo 37 da Constituição Federal.”4

Dessume-se do cenário delineado que, ao contratar com terceiros,


impõe-se ao poder público a obrigatoriedade de instaurar previamente
a competição entre os eventuais interessados, por meio da licitação
pública. A contratação direta, ou seja, sem licitação, se constitui, então,
em exceção a esta regra de caráter geral.

Assim, tem-se como atual as lições de Hely Lopes Meirelles no


sentido de que “a licitação se constitui no antecedente necessário do
contrato administrativo e este, por sua vez, é o consequente lógico da
licitação. A licitação é o procedimento administrativo preparatório do
contrato; é condição para a sua formalização. Pela licitação se seleciona a
melhor proposta; pelo contrato se vinculam as partes para a consecução
de seu objeto”.5

Com base nessa ordem de ideias, a licitação não é o único


caminho pelo qual a Administração Pública celebra contratos. Não se
deve olvidar, como afirmado, que a regra a ser observada quando o
Poder Público contrata com terceiros é a instauração prévia da licitação.
Todavia, pode o caso concreto se subsumir a uma das hipóteses
legais de licitação dispensada, dispensável ou inexigível, fato este que

4 FERRAZ, Sérgio e FIGUEIREDO, Lúcia Valle, Dispensa e Inexigibilidade de Licitação, 3ª ed.,


São Paulo: Malheiros, 1994, p. 15.
5 MEIRELLES, Hely Lopes, Licitação e Contrato Administrativo, 12ª ed., São Paulo: Malheiros,
1999, p. 22.

Licitação - Previsão constitucional e infraconstitucional, competência legislativa e exceções ao dever de licitar 8


autoriza o afastamento do processo licitatório permitindo a consequente
contratação direta6.

Desta feita, o processo licitatório apresenta-se como regra geral a


ser observada por ocasião das contratações públicas com terceiros, se
caracterizando a contratação direta, como exceção a esta regra e, como
tal, deve ser tratada.

Alertamos, contudo, que o fato de a licitação constituir a regra e


as hipóteses de dispensa e inexigibilidade de licitação em exceções, não
faz com que a contratação direta seja um procedimento menos nobre.
Tão pouco o simples fato de celebrar a contratação diretamente deveria
ser, por si só, razão para despertar o temor de ações dos órgãos de
controle.

Só faz sentido o legislador excepcionar a aplicação de uma regra


que decorre diretamente da Constituição quando essa regra não se revela
a solução ótima para o atendimento de uma determinada situação fática.

Com base nessa argumentação lógica, não seria exagero


reconhecer que, nas situações descritas na norma que autorizam a
contratação por dispensa e inexigibilidade de licitação, a contratação
direta deva ser a regra. Nesse sentido, cabe mencionar a lição de Gustavo
Schiefler e Gustavo Justino de Oliveira7:

“Em outras palavras, não se pode considerar que a


contratação direta configura um procedimento menos
nobre ou mais arriscado quando o ordenamento jurídico
brasileiro lhe prescreve as hipóteses cabíveis. Pelo
contrário, as hipóteses de contratação direta existem
justamente porque configuram, para aquelas situações,
a forma mais eficiente e coerente para que determinada

6 Conforme artigos 74, 75 e 76 da Lei nº 14.133/2021 e artigos 29 e 30 da Lei nº 13.303/2016.


7 SCHIEFLER, Gustavo; OLIVEIRA, Gustavo Justino de. Contratação de serviços técnicos
especializados por inexigibilidade de licitação pública. Curitiba: Zênite, 2015. p. 70.

Licitação - Previsão constitucional e infraconstitucional, competência legislativa e exceções ao dever de licitar 9


necessidade pública seja satisfeita.
Embora haja uma evidente preferência pela aplicação da
licitação pública como condicionante para a celebração
dos contratos administrativos, essa preferência não se
transfere para os casos ressalvados na legislação.
O que ocorre é o oposto, quando a legislação ressalva
da licitação alguma hipótese de contratação, surge uma
preferência pelo modelo de contratação direta, e a própria
realização da licitação pública deve ser detalhadamente
motivada”.

Competência legislativa

Consoante evidenciado no tópico anterior, a disciplina


jurídica regedora das licitações encontra fundamento quer no plano
constitucional, quer no infraconstitucional, cabendo ressaltar, a seguir, a
competência legislativa das pessoas políticas que integram a Federação
para a normatização da matéria.

No âmbito da Constituição, cabe salientar, em especial, o


dispositivo relacionado à competência legislativa. A este propósito
o artigo 22, inciso XXVII, ao estabelecer dita competência legiferante,
assim dispõe:

“Art. 22 – Compete privativamente à União legislar sobre:


(...)
XXVII - normas gerais de licitação e contratação, em
todas as modalidades, para as administrações públicas,
diretas, autárquicas e fundacionais da União, Estados,
Distrito Federal e Municípios, obedecido o disposto no
art. 37, XXI, e para as empresas públicas e sociedades
de economia mista, nos termos do art. 173, § 1º, III”.

Pelo comando acima transcrito, infere-se que à União compete

Licitação - Previsão constitucional e infraconstitucional, competência legislativa e exceções ao dever de licitar 10


legislar, de forma privativa, tão-somente sobre normas gerais de licitação
e contratação, cabendo às demais pessoas políticas (Estados-Membros,
Municípios e Distrito Federal), a faculdade de legislar as normas não
gerais, ou seja, as normas específicas.

Neste ponto a grande questão que se apresenta é a conceituação


clara e objetiva de normas gerais e normas específicas. Esta conceituação
é imprescindível em face da necessidade de se fixar os limites legislativos
conferidos pela Carta de 1988 às pessoas políticas acima nominadas.

Conceituar norma geral constitui, em verdade, tarefa dificílima e


que há muito vem sendo discutida no plano da doutrina. Por esta razão,
preferimos adotar um critério negativista ou residual para se chegar a uma
conclusão. Assim, em outras palavras e de uma forma despretensiosa
e infinitamente sintética, pode-se afirmar que não são normas gerais
aquelas que descem a detalhes, preciosismos, especificidades.

Essa também é a orientação adotada por Adilson Abreu Dallari8


ao tratar da competência da União para legislar sobre normas gerais de
licitação e contratação:

“Mas é preciso deixar bem claro que o que compete


à União é expedir normas gerais sobre licitações e
contratações. É muito difícil dizer o que é norma geral.
Vários autores tentaram fazê-lo, mas é realmente muito
difícil conceituá-la. É mais fácil chegar à norma geral
pelo caminho inverso, dizendo o que não é norma geral.
Não é norma geral aquela que corresponde a uma
especificação, a um detalhamento. Portanto, norma
geral é aquela que cuida de determinada matéria ampla.
Norma geral é aquela que comporta uma aplicação
uniforme pela União, Estado e Município; norma geral é

8 DALLARI, Adilson Abreu. Aspectos jurídicos da licitação. 4ª ed. São Paulo: Saraiva, 1997. p.
20.

Licitação - Previsão constitucional e infraconstitucional, competência legislativa e exceções ao dever de licitar 11


aquela que não é completa em si mesma, mas exige uma
complementação”.

De outra sorte, defendemos como critério delimitador de seu


conceito a análise dos elementos contidos na própria Constituição da
República, de onde se conclui tratar-se de norma geral todas aquelas
relacionadas, v.g., à observância dos princípios da Administração Pública,
à obrigatoriedade de contratação somente mediante processo seletivo
prévio de licitação (o dever de licitar), à garantia da competitividade e da
igualdade no certame, às exceções à licitação (hipóteses de contratação
direta), etc.

Essa conclusão se alinha com o conceito de norma geral definido


por Diogo de Figueiredo Moreira Neto9, ao afirmar que normas gerais
“são declarações principiológicas que cabe à União editar, no uso de
sua competência concorrente limitada, restrita ao estabelecimento de
diretrizes nacionais sobre certos assuntos, que deverão ser respeitados
pelos Estados-Membros na feitura de suas respectivas legislações,
através de normas específicas e particularizantes que as detalharão, de
modo que possam ser aplicadas, direta e imediatamente, a relações e
situações concretas a que se destinam, em suas respectivos âmbitos
políticos”.

A importância da exata compreensão e distinção entre normas


gerais e específicas no que toca à licitação reside justamente na
possibilidade que têm os Estados-Membros, os Municípios e o Distrito
Federal de, ao legislar sobre tal matéria, fixarem regras diversas das
estabelecidas para a Administração Pública Federal, respeitando,
porém, todo o conteúdo jurídico determinado no artigo 37 caput e inciso
XXI, exatamente pela necessidade de conferir a estes aspectos um
tratamento uniforme em todas as unidades da Federação, vez que esta é
a orientação do próprio texto constitucional.

9 Diogo de Figueiredo Moreira Neto, Competência concorrente limitada – o problema da


conceituação de normas gerais. RIL, 100:127.

Licitação - Previsão constitucional e infraconstitucional, competência legislativa e exceções ao dever de licitar 12


Neste contexto, vale registrar a lição de Alice Gonzales Borges10,
segundo a qual “são normas gerais aquelas que, por alguma razão,
convém ao interesse público sejam tratadas por igual, entre todas as
ordens da Federação, para que sejam devidamente instrumentalizados e
viabilizados os princípios constitucionais com que têm pertinência.”

Dessa forma, será norma geral toda aquela que, relacionada aos
aspectos acima citados, possuir um âmbito de incidência nacional,
circunscrevendo-se a qualquer pessoa política, de qualquer dos níveis
da Federação, como observa Geraldo Ataliba11, que as define como “leis
nacionais; leis que não se circunscrevem ao âmbito de qualquer pessoa
política, mas que os transcendem aos três. Não se confundem com a
lei federal, estadual ou municipal e têm seu campo próprio e específico,
excludente das outras três e reciprocamente”.

Considerando que a contratação sem licitação constitui exceção à


regra geral, estando intimamente ligada ao dever de licitar estabelecido no
plano constitucional e infraconstitucional, como também aos princípios
jurídicos que devem nortear as ações administrativas, concluímos que as
hipóteses de licitação dispensada, dispensável e inexigível previstas na
Lei nº 14.133/2021 são normas gerais, cabendo exclusiva e privativamente
à União fixar a respectiva disciplina jurídica.

Assim, as demais pessoas políticas integrantes da federação ao


legislar sobre licitações e contratações públicas, não poderão, em suas
respectivas leis, criar outras hipóteses de contratação direta diferentes
daquelas previstas na legislação federal. De igual sorte também não
poderão ampliar as hipóteses estabelecidas na Lei nº 14.133/2021.

Isso, no entanto, não impede a edição de leis estaduais, distrital

10 GONZALES BORGES, Alice. Normas Gerais no Estatuto de Licitações e Contratos


Administrativos, São Paulo: Revista dos Tribunais, 1991, p. 22.
11 ATALIBA, Geraldo, Normas Gerais na Constituição – leis nacionais, leis federais e seu regime
jurídico, Estudos e Pareceres de Direito Tributário, vol. 3, p. 15.

Licitação - Previsão constitucional e infraconstitucional, competência legislativa e exceções ao dever de licitar 13


e municipais para reduzir o âmbito de hipóteses de contratação direta
definido pela Lei nº 14.133/2021 ou para reduzir o alcance das hipóteses
estabelecidas nesta lei. Nesse sentido, entendemos possível um Estado
editar lei local para reduzir os limites que autorizam a contratação direta
por dispensa de licitação em razão do valor, por exemplo. Na medida
em que esta lei não amplia, mas ao invés disso, restringe a hipótese
de exceção ao dever de licitar fixada pela Lei nº 14.133/2021, não
enxergamos qualquer inconstitucionalidade.

Exceções ao dever de licitar

Conforme registrado anteriormente, o artigo 37, inciso XXI da


Constituição Federal consigna expressamente o dever de licitar e
determina que a licitação é a regra geral a ser observada por ocasião
das contratações públicas, mas, por outro lado, o mesmo dispositivo
constitucional remete o operador do direito à legislação ordinária ao
mencionar as exceções a este dever, ou seja, a contratação direta.

Com base nessa competência outorgada pela Carta da Republica,


a Lei nº 14.133/2021 consigna três categorias de contratação direta:
a licitação dispensada, dispensável e inexigível. Ditas categorias
apresentam, cada qual, marcas determinantes da sua aplicabilidade e
até mesmo no que respeita a certos aspectos jurídicos e procedimentais.

A licitação dispensada trata de casos de alienação de bens


móveis e imóveis, taxativamente fixados na lei, que permitem, a juízo
da autoridade competente, a não realização da licitação. Assim, mesmo
diante da possibilidade de instaurar o processo licitatório, o legislador
oportunizou o seu afastamento.

As hipóteses referentes à esta primeira categoria estão arroladas


no art. 76 (licitação dispensada) e correspondem a situações que
autorizam o agente público a, de plano, não licitar.

Licitação - Previsão constitucional e infraconstitucional, competência legislativa e exceções ao dever de licitar 14


As disposições constantes do art. 75 dizem respeito a licitação
dispensável e, em sua maioria, comportam a opção entre licitar e
dispensar o certame, sempre mediante a devida, suficiente e necessária
motivação. Isso fica claro quando se infere situações consignadas neste
artigo em que o legislador, objetivando assegurar maior agilidade à
contratação, por exemplo, previu o afastamento do processo licitatório,
ainda que presente a possibilidade concreta de sua instauração.

Cabe salientar, ainda, que o rol apresentado pelos incisos do art.


75 da Lei nº 14.133/2021 é taxativo, ou seja, só é possível dispensar a
licitação se o caso concreto se subsumir adequadamente a uma daquelas
hipóteses legais.

Por fim, o art. 74 dispõe que a licitação é inexigível sempre que


houver inviabilidade de competição. Neste caso, o dever de licitar é
afastado de forma absoluta e peremptória, ou seja, se a competição é
inviável, por conseguinte, a licitação é materialmente impossível de ser
instaurada.

Em apertada síntese: (i) na licitação dispensada, basta a


ocorrência de uma das hipóteses do art. 76 da Lei nº 14.133/2021 para
autorizar o afastamento do dever de licitar; (ii) em se tratando de licitação
dispensável, prevista nos incisos do art. 75 da Lei nº 14.133/2021, a
rigor, existe a possibilidade de realizar a licitação, todavia, privilegiando
outros valores jurídicos, entendeu o legislador ser o caso de reconhecer
que a dispensa do dever de licitar revela-se opção mais conveniente
e vantajosa; e (iii) consoante dispõe o art. 74 da Lei nº 14.133/2021, a
licitação será inexigível quando ficar evidenciada a inviabilidade de
competição, tornando o processo licitatório materialmente impossível de
ser instaurado.

Definidas essas relevantes questões, sedimenta-se o ambiente


adequado para discutir alguns elementos relacionados aos comandos
que devem ser observados quanto à interpretação e aplicação das regras
jurídicas que estabelecem hipóteses de contratação direta por dispensa

Licitação - Previsão constitucional e infraconstitucional, competência legislativa e exceções ao dever de licitar 15


ou inexigibilidade de licitação.
Para tanto, é necessário posicionar a contratação direta a partir
dos vetores fornecidos pela hermenêutica e, também, o conjunto de
princípios aplicáveis e que cumprirão a relevante finalidade de possibilitar
que a interpretação das regras que lhes são peculiares seja feita de
modo harmônico com as demais que constituem o regime jurídico a que
pertencem.

Licitação - Previsão constitucional e infraconstitucional, competência legislativa e exceções ao dever de licitar 16


Referências bibliográficas

ATALIBA, Geraldo, Normas Gerais na Constituição – leis nacionais,


leis federais e seu regime jurídico, Estudos e Pareceres de Direito
Tributário, vol. 3.

BACELLAR FILHO, Romeu Felipe; HACHEM, Daniel Wunder (Coords.).


Direito administrativo e interesse público: estudos em homenagem
ao professor Celso Antônio Bandeira de Mello. Belo Horizonte: Fórum,
2010.

DALLARI, Adilson Abreu. Aspectos jurídicos da licitação. 4ª ed. São


Paulo: Saraiva, 1997.

MOREIRA NETO, Diogo de Figueiredo. Competência concorrente


limitada – o problema da conceituação de normas gerais. RIL,
100:127.

FERRAZ, Sérgio e FIGUEIREDO, Lúcia Valle, Dispensa e Inexigibilidade


de Licitação, 3ª ed., São Paulo: Malheiros, 1994.

GASPARINI, Diogenes. Direito Administrativo, 17ª ed. atualizada por


Fabrício Motta. São Paulo: Saraiva, 2012.

GONZALES BORGES, Alice. Normas Gerais no Estatuto de Licitações


e Contratos Administrativos, São Paulo: Revista dos Tribunais, 1991.

MEIRELLES, Hely Lopes, Licitação e Contrato Administrativo, 12ª ed.,


São Paulo: Malheiros, 1999.

SCHIEFLER, Gustavo; OLIVEIRA, Gustavo Justino de. Contratação de


serviços técnicos especializados por inexigibilidade de licitação
pública. Curitiba: Zênite, 2015.

Licitação - Previsão constitucional e infraconstitucional, competência legislativa e exceções ao dever de licitar 17


Fique
por dentro

Cursos e Eventos

Curso Online

Contratação
Direta 5 a 8 Outubro
na Nova Lei
Inscreva-se
de Licitações

Podcast Fórum

FÓRUM
Convida

#01 CONTRATAÇÃO
DIRETA
Jorge Ulisses Jacoby Fernandes
& Fabrício Motta

OUÇA AO PODCAST

Você também pode gostar